4.6 Setor de Couro e Derivados - feb.unesp.br limpa/Van/Couro/Detor de... · As empresas de...
-
Upload
truonghanh -
Category
Documents
-
view
216 -
download
2
Transcript of 4.6 Setor de Couro e Derivados - feb.unesp.br limpa/Van/Couro/Detor de... · As empresas de...
4.6 Setor de Couro e Derivados
4.6.1 Introdução e delimitação do setor
O setor de couro e derivados encontra-se entre os setores em que o Brasil
tradicionalmente apresenta fortes indicadores de competitividade. As receitas de
exportação desse grupo de produtos em muito supera aquelas obtidas pelo segmento de
carnes, o que faz desse setor um importante elemento do sistema agroindustrial de
bovinocultura de corte.
Mesmo diante de indicadores que atestam a importância do setor de couro e
derivados, há ameaças de relevo ao desempenho do setor, dadas sobretudo pela
concorrência direta de países asiáticos com menores custos da mão-de-obra e pelo
crescimento da utilização de materiais alternativos ao couro, em especial sintéticos.
Esta sessão procura investigar os principais elementos para um adequado
posicionamento estratégico do sistema agroindustrial de bovinocultura de corte tendo
em vista uma maior competitividade do setor de couro e derivados. Para isso, o texto
subdivide-se em sete partes, além desta introdução: a) aspectos institucionais, b)
tendências de mercado, c) tecnologia, procurando avaliar o grau de capacitação
tecnológica das empresas atuantes no setor, d) insumos, identificando os gargalos à
competitividade decorrentes da oferta de fatores de produção, e) estrutura de mercado,
com ênfase ao aproveitamento de economias de escala e de logística (localização) f)
gestão, identificando a intensidade de uso das principais ferramentas de gestão e g)
relações de mercado, apresentando aspectos relativos à coordenação vertical da cadeia
produtiva.
Fluxo produtivo
A cadeia produtiva de couro e derivados inicia-se, de fato, na atividade de
bovinocultura, em que os diferentes sistemas de criação podem resultar em peles de
qualidades distintas, impondo restrições ao processamento do couro e derivados. Esta
seção, no entanto, concentra-se no fluxo tecno-produtivo após a extração do couro nos
frigoríficos, enfocando especificamente o processamento do couro e sua transformação
em bens finais. As relações entre processamento do couro e sistemas de criação na
bovinocultura são comentadas na seção 4.6.5, que trata dos problemas de qualidade da
matéria-prima.
A Figura 4.6.1 apresenta os principais segmentos da cadeia de couro e
derivados, todos eles fortemente presentes no Brasil. Na configuração mais comum do
fluxo produtivo, o couro salgado é fornecido pelos frigoríficos aos curtumes, que podem
processá-lo total (couros acabados) ou parcialmente (wet blue ou semi-acabados
(crust)). Os curtumes, por sua vez, abastecem as empresas nacionais − tendo destaque a
indústria de artefatos de couro e, sobretudo, a de calçados − assim como o mercado
externo. Finalmente, as empresas de artefatos de couro e calçados abastecem ambos os
mercados externo e interno.
Figura 4.6.1
Cadeia de Couro e Derivados
Como característica geral do fluxo técnico produtivo pode-se destacar a presença
de etapas tecnologicamente separáveis e produtos intermediários estáveis, ou seja,
passíveis de armazenamento e transporte. Portanto, é possível a um país ou região deter
apenas algumas etapas do processo produtivo, adquirindo os insumos e/ou ofertando
produtos junto ao mercado internacional. Nesse sentido, o fato de o Brasil apresentar
todas as etapas do processo produtivo constitui um elemento distintivo, havendo
IndústriaFrigorífica
MercadoInterno
Mercado Externo
Curtumes
Indústria de Calçados
Indústria de Artefatos de Couro
Couro salgado
Couro wet blue,semi-acabado eacabado
diversos países que concentram sua produção em apenas uma das etapas, como a Itália
na produção de calçados.
Quanto aos valores do fluxo produtivo, há uma considerável divergência de
informações na literatura e nos dados utilizados pelas organizações que atuam no setor.
Segundo publicação do BNDES, utilizada para análises de concessão de crédito às
empresas do setor, da produção dos curtumes, apenas 30% destina-se ao mercado
externo, enquanto 70% destina-se às empresas brasileiras de calçados e artefatos de
couro (Gorini & Siqueira, 1998). Em contraposição, segundo dados coletados junto ao
Decex e ao CICB, calcula-se em 51,8% a exportação física direta de couro (número de
peles exportadas) e em 24,8% as exportações indiretas de peles, na forma de calçados e
outros artefatos. Diante disso, pode-se afirmar que 76,6% das peles produzidas no Brasil
são exportadas direta ou indiretamente, o que configura um dos setores industriais
brasileiros mais abertos ao comércio exterior.
As empresas de calçados e outros artefatos, por sua vez, absorvem 48,2% da
produção física de couro. Uma vez que 24,8% são exportados, de acordo com dados do
CICB, tem-se um coeficiente de exportações de 51,4%, o que é também bastante
expressivo. Esses dados, contudo, mais uma vez contrastam com informações utilizadas
pelo BNDES, que revelam que apenas 30% da produção de calçados é exportada
(Gorini & Siqueira, 1998). Nesse caso, no entanto, não há uma inconsistência dos
dados. Como será detalhado na seção 4.6.6, embora a produção de calçados no Brasil
seja diversificada, sendo numerosa a produção a partir de produtos sintéticos, as
exportações são predominantemente de produtos derivados de couro, o que revela a
maior competitividade desse segmento.
Uma análise mais adequada do fluxo produtivo do setor deve também considerar
a presença das importações, uma vez que o Brasil, ao reduzir as tarifas de importação no
início da década de 90, permitiu a entrada de produtos importados nos diversos elos da
cadeia produtiva. De fato, conforme é analisado detalhadamente na seção 4.6.6, as
importações de couro foram crescentes, sobretudo de países do Mercosul. Essas
importações, no entanto, atingiram, em seu momento de pico em 1997, apenas 10% da
produção local.
4.6.2. Ambiente Institucional
Esta seção dedica-se à apresentação de aspectos institucionais relevantes ao setor
de couro e derivados não contemplados na seção 4.1, relativa ao ambiente institucional
da cadeia produtiva de pecuária de corte. O objetivo não é uma apresentação exaustiva
de todas as normas que regulam os negócios ligados ao couro, mas o tratamento dos
principais aspectos institucionais que têm impactos sobre a competitividade do setor.
Nesse sentido, destacam-se três tópicos: custos ambientais (tratamento de efluentes),
aspectos fiscais e barreiras tarifárias às exportações brasileiras. Esses três elementos,
conjuntamente, operam − mesmo que legitimamente, como é o caso da legislação
ambiental − de modo a reduzir a competitividade e rentabilidade dos negócios ligados
ao couro no Brasil.
4.6.2.1. Legislação ambiental e trabalhista
A indústria de curtumes, na ausência de cuidados adicionais com o tratamento
de efluentes, é potencialmente danosa ao meio ambiente e pode implicar riscos de
segurança de trabalho. O principal prejuízo possível são os efluentes decorrentes do
tratamento a cromo, durante a etapa de wet blue. Além disso, algumas aparas já tratadas
quimicamente podem contaminar o meio ambiente se descartadas inapropriadamente.
Como conseqüência, a legislação ambiental impõe uma série de obrigações aos
curtumes, para o tratamento de efluentes, as quais têm como efeito indireto aumentar os
custos incorridos na atividade de curtimento. Segundo entrevistas, o atendimento aos
requisitos da legislação não foi verificado em todo o país, concentrando-se em São
Paulo e Rio Grande do Sul.
Duas conseqüências do cumprimento parcial da legislação podem ser
antecipados: a) de um lado, os prejuízos ao meio ambiente continuam ocorrendo,
mesmo que em menor escala, o que pode justificar medidas neoprotecionistas (restrição
às exportações brasileiras) na União Européia; b) de outro, há uma perda de
competitividade das regiões em que a fiscalização ambiental é mais rigorosa, tornando
inviável a sobrevivência de curtumes que, em igualdade de condições, poderiam operar
eficientemente.
A maior parte dos gastos em tratamento de efluentes são fixos e assumidos no
momento de implantação da estação de tratamento. Desse modo, o principal efeito
econômico observado nos curtumes é a descapitalização, o que pode comprometer
outras estratégias de modernização. Além disso, pequenos curtumes algumas vezes não
dispõem de capital suficiente para arcar com os custos fixos iniciais.
Há tecnologias, muitas vezes rudimentares, que implicam menor prejuízo ao
meio ambiente (como o curtimento com o uso de tanino, extraído da casca do angico,
árvore comum no cerrado). No entanto, essas práticas não permitem a escala de
produção e qualidade requeridas pela indústria de curtimento. É importante destacar,
contudo, que o crescimento da demanda por produtos ‘ecologicamente corretos’ pode
desenvolver nichos de mercado que venham a utilizar-se de tecnologias de curtimento
alternativas.
No que se refere às normas que regulam a segurança no trabalho (classificação
nacional de atividades econômicas elaborada pelo Ministéiro do Trabalho), o setor de
curtimento e outras preparações do couro enquadra-se no grau de risco 4. Porém, o
Sindicouro possui uma liminar na justiça que faz vigorar o grau de risco 3 para esse
setor. Esta liminar tem sido renovada a cada 6 meses, desde 1997, e está vigente até
novembro de 1999.
Esse esforço para estabelecer o grau de risco 3 para esta indústria, diz respeito
fundamentalmente a um aumento de custo de cerca de 1,5% quando aumenta o grau de
risco para 4, decorrente da necessidade de contratação de técnicos e engenheiros de
trabalho. Este aumento de custo está relacionado principalmente às mudanças das
exigências feita pela norma regulamentadora número 4, (NR 4), que trata de serviços
especializados em engenharia de segurança e em medicina do trabalho. Essas
modificações podem ser visualizadas no quadro abaixo (4.6.1):
Quadro 4.6.1 – Grau de Risco e Necessidade de Contratações
Grauderisco
técnicos Número deempregados noestabelecimento
50a100
101 a250
251 a500
501 a1000
1001 a2000
2001 a3500
3501 a5000
Acima de 5000 paracada grupo de 4000 oufração acima de2000**
3 Técnico seg. trabalho 1 2 3 4 6 8 3eng. Segurança trabalho 1* 1 1 2 1aux. Enfermagem notrabalho
1 2 1 1
enf. do trabalho 1 1médico do trabalho 1* 1 1 2 1
4 Técnico seg. trabalho 1 2 3 4 5 8 10 3eng. Segurança trabalho 1* 1* 1 1 2 3 1aux. Enfermagem notrabalho
1 1 2 1 1
enf. do trabalho 1médico do trabalho 1* 1* 1 1 2 3 1
Obs: * tempo parcial (mínimo de três horas)** o dimensionamento total deverá ser feito levando-se em consideração o dimensionamento da faixa de 3.501 a5000 mais o dimensionamento do grupo de 4000 ou fração de 2000.
4.6.2.2. Aspectos Fiscais
O principal entrave à competitividade do setor de couros e derivados no âmbito
do ambiente institucional é o custo tributário, em especial às empresas exportadoras. A
Lei Complementar 87/96, conhecida como Lei Kandir, teve como propósito desonerar
de impostos as exportações brasileiras, isentando de ICMS as mercadorias destinadas ao
exterior. Com o mesmo objetivo, a Lei 9.363, também instituída em 1996, procurava
retirar das exportações o ônus fiscal decorrente da incidência do PIS e Cofins em cada
etapa da cadeia produtiva (tendo, portanto, efeito cumulativo). Para isso, o montante
pago na forma dessas contribuições, no caso de exportação do produto, poderia ser
recuperado como crédito sobre o Imposto de Produtos Industrializados (IPI). Setores
que não pagam IPI, como curtumes, ou que exportam parte relevante de sua produção
poderiam acumular créditos fiscais, não podendo fazer uso desses créditos diretamente
como desconto no IPI devido. Esse créditos acumulados poderiam ser, então,
recuperados em moeda ou na aquisição de insumos diversos. Em tese, este conjunto de
normas seria suficiente para desonerar de impostos as exportações brasileiras. No
entanto, as dificuldade burocráticas para a recuperação do crédito fiscal impossibilitam
a sua efetiva utilização. Como conseqüência, segundo dados do Centro das Indústrias de
Curtumes do Brasil (CICB), há curtumes com créditos acumulados em um montante
superior a 10% do valor total de suas exportações anuais, atingindo valores absolutos
superiores a 3 milhões de reais (Couro Business, no 2, 1998).
A carga tributária efetiva incidente sobre as exportações de couro e derivados é
relevante − dada a dificuldade de utilização dos créditos fiscais −, mas complexa de ser
calculada. Dois motivos em especial dificultam o cálculo: a) sua incidência não
uniforme entre as empresas de couro e derivados (há empresas que conseguem utilizar-
se do crédito fiscal mais facilmente) e b) os impostos em cascata são relativamente mais
onerosos em cadeias produtivas mais complexas. Supondo que haja quatro etapas de
processamento − cada uma das quais sendo tributada em 4,03%, por conta das alíquotas
de PIS, Cofins e CPMF − o custo acumulado desses impostos sobre as exportações
chega a 17,12%. O peso efetivo depende da capacidade de as empresas utilizarem-se do
crédito fiscal.
Uma conseqüência perversa em termos de eficiência econômica decorrente das
distorções tributárias é o aumento das importações de couro. Podendo utilizar-se do
mecanismo de draw-back − que isenta de impostos as importações de componentes para
a fabricação de produtos destinados à exportação −, algumas empresas calçadistas
optam pela importação do couro, eliminando a dificuldade de utilização do crédito
fiscal. Entre os custos da distorção tributária, portanto, pode-se destacar o custo
logístico, uma vez que há incentivos ao ‘passeio do couro’ (exportação e importação do
mesmo produto), e a desarticulação da cadeia produtiva, dada pelo enfraquecimento da
relação entre curtumes e empresas de calçados ou artefatos nacionais.
Finalmente, cabe destacar que a incidência de impostos para produtos destinados
ao mercado interno afeta desfavoravelmente os fabricantes de artefatos de couro (cintos,
roupas, bolsas, carteiras, etc.), que sofrem os efeitos da taxação de 10% do IPI. Este é o
único segmento do setor de vestuário que paga IPI (Revista da Indústria, 18/05/98).
4.6.2.3. Comércio Exterior
Um dos principais problemas identificados no setor de curtumes e derivados −
conforme é explorado em detalhe na seção 4.6.6, que trata do ambiente competitivo − é
a exportação de produtos de menor valor agregado. Um importante indutor desse
problema é um elemento do ambiente institucional que regula as transações de comércio
exterior: as tarifas de importação e exportação. A fim de inibir as importações de couros
acabados (de maior valor agregado, por exigir maior conteúdo tecnológico, trabalho e
insumos químicos), a União Européia aplicou uma sobretaxa de 6,5% sobre os couros
crust e acabados, não fazendo restrições às importações de wet blue. Em um setor que
opera com margens estreitas, esse diferencial de rentabilidade foi suficiente para induzir
o aumento das exportações brasileiras de wet blue, em detrimento das exportações de
produtos de maior valor agregado.
O Brasil utiliza prática semelhante de desestímulo à importação de produtos de
maior valor agregado. Com o intuito de proteger a indústria de calçados nacional da
forte concorrência em preços dos países do asiáticos − impulsionada pela valorização do
real entre 1994 e 1998 − o governo brasileiro elevou, em 1995, as tarifas de importação
desses produtos para 63%, havendo uma redução progressiva para o nível de 20% até
2001, em conformidade com a Tarifa Externa Comum do Mercosul (Gorini e Siqueira,
1999).
Duas outras medidas em utilização para estimular as exportações podem ser
destacadas. De um lado, o BNDES tem dado prioridade ao setor em investimentos
diversos, incluindo relocalização, modernização, programas de gestão e tratamento de
efluentes. Os únicos gargalos identificados pelos participantes do setor, segundo
entrevistas, é a disponibilidade de crédito para capital de giro e, no caso de pequenas
empresas, os obstáculos formais e burocráticos para a efetiva utilização das linhas de
crédito existentes.
De outro lado, calçados e couros crust e acabados são contemplados pelo
Programa Especial de Exportações (Proex), possibilitando financiamento e equalização
de juros internos e externos.
Dentre as barreiras ao livre comércio de produtos nacionais, impostas por outros
países, podem ainda ser citados:
§ No México, está em vigor uma lei que dificulta as exportações para aquele país.
Anteriormente, uma carta fiança era aceita ao invés de os exportadores terem que
efetuar o pagamento desta fiança. De acordo com a nova lei, a fiança deverá ser
paga e o reembolso pode levar até 6 meses.
§ A Argentina, criou dificuldades na aduana, tais como: diferença de peso entre o que
consta da documentação e o peso real é considerado como erro grave, levando a
Argentina a exigir fiança para liberação da mercadoria nestes casos. O impasse
continua e não há previsão de que seja resolvido.
§ A Europa tem criado dificuldades a alguns componentes para a fabricação de
calçados de segurança, pois exige que uma porcentagem destes componentes seja
de origem do Mercado Comum Europeu.
4.6.2.4. Associações de Representação de Interesses
O setor de couro e derivados conta com diversas associações de interesse, a
maior parte delas bastante atuante. Trata-se, a princípio, de uma vantagem do setor, uma
vez que diversos bens coletivos − como informações estatísticas e esforços para
disseminação de tecnologias − são disponibilizados às empresas do setor. Nesse sentido,
destaca-se o número de publicações de elevado nível cobrindo aspectos variados do
setor, como tecnologia, negócios e derivados.
Por outro lado, o número excessivo de associações de representação de
interesses, quando suas reivindicações não estão bem articuladas, tem o impacto
negativo sobre seu papel de interlocutores entre o setor produtivo e o setor público. Por
ocasião da definição de políticas públicas, se o setor de couro e derivados, mesmo
contando com diversas associações, conseguir chegar a uma pauta de reivindicações
comum, sua capacidade de influência nos rumos das decisões de governo é mais efetiva.
No entanto, no setor de couro houve divergências recentes que levaram ao surgimento
de duas associações de representação de interesse, em caráter nacional: CICB (Centro
das Indústrias de Curtumes do Brasil) e Abicouro (Associação Brasileira das Indústrias
de Couro). O primeiro foi fundado em 15 de janeiro de 1957, a partir da iniciativa de
curtidores nacionais para a criação de uma associação nacional de defesa dos interesses
do setor curtidor. O desenvolvimento de curtumes de wet blue, principalmente com o
deslocamento dos rebanhos para o Centro-Oeste, fez surgir algumas divergências de
interesses entre os curtumes. Particularmente, o grupo de curtumes que se localizava
junto às empresas calçadistas no Rio Grande do Sul tinha interesses conflitantes com
aqueles do grupo de exportadores de wet blue. Como conseqüência dessa divergência, a
Associação das Indústrias de Curtumes do Rio Grande do Sul (AICSUL) encabeçou o
processo de criação da Abicouro, em 13 de fevereiro de 1996, em Novo Hamburgo
(RS). Uma vez que essas divergências se transmitiam para as reivindicações junto às
autoridades públicas, a capacidade de o setor efetivamente se fazer representar era
limitada.
Durante a pesquisa de campo foi possível constatar que os grupos convergem
para uma mesma associação (o CICB), o que pode fortalecer a capacidade de o setor se
organizar.
4.6.3. Tendências de Mercado
No segmento de derivados de couro, as tendências são variadas. O fenômeno
mais claro é o crescimento da produção de calçados de borracha ou plástico, que é
explicada sobretudo pelos baixos preços. A segunda tendência identificada é o
crescimento da produção de tênis, equiparando-se à produção de calçados de couro. Em
ambos os casos, a produção nacional foi afetada pelas importações provenientes do
sudeste asiático, particularmente da China e Indonésia, com preços mais baixos.
O efeito dos produtos sucedâneos (em especial plásticos e borracha) é maior em
artefatos de couro do que no segmento de calçados. O consumidor deste último
necessita de características do couro que não são reproduzíveis em produtos sintéticos,
como respiração, absorção de transpiração, resistência e adaptabilidade ao pé. Além
disso, a estética no segmento de calçados é mais tradicional, em especial no segmento
de calçados masculinos, o que faz que a concorrência de produtos sintéticos seja menos
acentuada. No caso de artefatos de couro, a possibilidade de substituição por produtos
concorrentes é mais forte, uma vez que, na maior parte dos casos, as características
naturais do couro não tem a mesma essencialidade que tem em calçados e a estética
permite a utilização de aparência não natural dos produtos.
A utilização de estampa também é uma prática mais comum em artefatos de
couro que no segmento de calçados. Essa maior capacidade de aceitação do mercado
consumidor de estampas − sejam aquelas que imitam a pele de outros animais (como
jacaré), sejam estampas ‘artísticas’ − permite a utilização de peles de classificação
inferior (com maior número de defeitos) pela indústria de artefatos de couro. No caso de
calçados, no entanto, o mercado demanda predominantemente a pele sem estampa.
A principal forma de agregar valor ao couro, a confecção de calçados, encontra-
se limitada pela forte concorrência asiática nos mercados externos. Esse foi o motivo
que despertou as indústrias brasileiras de calçados a necessidade de caminhar para a
segmentação e especialização, a exemplo do que tem sido feito pelos italianos. No
segmento de calçados esportivos – de maior valor agregado – a reação das empresas ao
declínio de preços foi focalizar sua produção nos nichos de Fashion e esportes locais
(como futsal).
A maior parte do consumo interno da produção brasileira de couro é destinada à
indústria calçadista. Diante da crise enfrentada pelo setor e o aumento do uso de
materiais sintéticos, os curtumes perceberam a necessidade de avançar na exportação de
couro de maior valor agregado (semi-acabados e acabados), e não apenas exportar o wet
blue (estado primário de beneficiamento), na tentativa de obter melhores preços.
Além da tentativa de aumentar as vendas do couro de maior valor agregado, o
setor coureiro pretende promover campanhas de valorização do uso do couro e
desenvolver novos nichos de mercado. No mundo, um mercado em expansão para
couros bovinos é o de estofamento residencial e automotivo. Em oposição ao caso de
artefatos, o mercado de couro para estofamento exige peles de qualidade superior. O
maior gargalo é a obtenção de áreas extensas com poucos ou nenhum defeito. Nesse
sentido, o couro derivado de raças zebuínas tem uso limitado, uma vez que a presença
do cupim pode exigir a separação da pele em duas partes, dificultando o seu uso para
estofamentos. Este não é um problema insuperável, conforme é analisado na seção
4.6.5, mas trata-se de um obstáculo à exploração desse nicho de mercado.
Finalmente, a tendência de consumo de produtos naturais e/ou ‘ecologicamente
corretos’ ainda não modificou o padrão de consumo de derivados de couro na mesma
proporção que afetou outros segmentos, como o de alimentos. É possível, contudo,
identificar a emergência de nichos de mercado que tenham esses elementos como ponto
de apoio. A exploração desses novos nichos, de escala ainda insignificante, pode ser
atendida por curtumes artesanais, que se utilizam da casca do angico em substituição ao
cromo.
4.6.4. Tecnologia
4.6.4.1. Fluxo Tecno-Produtivo em Curtumes
Ainda no frigorífico, o couro pode ser conservado em sal até chegar às empresas
de curtumes mais distantes. O couro deve ser salgado num prazo máximo de quatro
horas após a esfola e o processo consiste na seguinte sequência de atividades: 1) lavar o
couro com água e deixar escorrer por duas horas, 2) colocar uma camada de sal grosso
(granulometria 1 a 3 mm) no chão, 3) empilhar os couros com o pêlo virado para baixo
e com as patas, cabeça e rabo dobrados para dentro, mantendo uma camada de sal entre
um couro e outro. O último couro da pilha deve ser colocado com o pêlo virado para
cima e uma camada de sal por cima. A altura máxima da pilha deve ser de 1,4 metros.
Dessa forma o couro pode ser conservado bem por cerca de 6 meses.
Uma vez no curtume, o couro é descarnado e aparado. Na sequência, o couro
sofre o processo de calagem por 24 horas para perder os pêlos e inchar, o que facilita
sua divisão horizontal. A pele bovina compõem-se de três camadas horizontais: 1) a
flor, de onde são eliminados os pêlos e que constitui a parte mais nobre do couro, 2) a
vaqueta, utilizada em artigos finos como forrações, bolsas, casacos; e 3) a raspa, que é o
colágeno, um tecido altamente proteico (86% de proteína).
Após a calagem, o couro passa pelo processo de curtimento a cromo, de onde sai
após 18 horas com um tom azulado. Por conta dessa coloração, o couro tratado − nesse
momento imune a bactérias − é denominado wet blue. A partir desse ponto as peças são
classificadas e é nessa etapa que fica transparente a deficiência da matéria-prima
nacional. Há uma grande incidência de peles de baixa classificação, conforme dados
apresentados na seção 4.6.5.1., o que reduz consideravelmente o valor médio obtido no
mercado internacional.
Para que o wet blue atinja padrão de semi-acabado, terá que passar por uma nova
seção de curtimento, refinar a espessura e homogeneizar a textura. Se a meta for o
produto acabado, a peça segue finalmente para a estamparia e o tingimento, de onde sai
maleável e sedoso.
Uma nova técnica de tingimento, lançada em Franca em fevereiro de 1997, é o
sistema de tingimento por tricromia, ou seja, três cores básicas são utilizadas para criar
90% do espectro cromático. Esta técnica foi desenvolvida a partir da parceria das
empresas Novartis (antiga Ciba-Geigy), Röhm e Stockhausen.
Fluxograma do beneficiamento do couro no curtume
Setor Ribeira:• Recebimento do couro cru ou salgado• Retirada dos pêlos através de solução de cal, sulfeto de sódio, tensoativos e amina.• Descarne do couro• Aparação do couro na mesa de refila• Divisão do couro em duas partes: couro e raspa de couro.
⇓
Setor de Curtimento:• Curtimento do couro em cromo (wet blue)• Classificação manual• Secagem do couro• Máquina de rebaixamento do couro, onde a espessura do couro é calibrado de acordo com o pedido
do cliente
⇓
Setor de Recurtimento:• Curtimento em ácido fórmico, amoníaco, sulfato de cromo, taninos vegetais, óleos, bicarbonato de
sódio e formiato de sódio.• Secagem do couro
⇓
Setor de Semi-acabados:• Amaciamento do couro na máquina moliça e através de batimentos nos fulões secos• Abertura do couro nos toglins (placas metálicas), para aumentar o espaçamento do couro• Lixamento do couro
⇓
Setor de Acabamento:• Aplicação de demão de tintas (resinas, ceras, penetrantes e pigmentos, água, óleo mineral, lacas,
complexo metálico, solventes e fixador de brilho)• Colocação do couro na prensa à 80° C.
⇓
Setor de Qualidade:• Inspeção final do couro
⇓
Setor de medição e de expedição:Fonte: Curtume Bela Franca.
4.6.4.2. Organizações de Apoio Tecnológico
O Brasil conta com um conjunto considerável de organizações de apoio à
qualificação da mão-de-obra e ao desenvolvimento tecnológico. Essa característica da
indústria de couro e derivados confere ao setor a capacidade de atualização tecnológica,
mesmo com a predominância de pequenas empresas, que isoladamente não teriam
condições de promover a capacitação tecnológica necessária para o confronto com a
concorrência internacional. As principais organizações encontram-se na região do Vale
dos Sinos, principal cluster de couro e derivados do Brasil. Essa convivência no mesmo
espaço facilita a interação e parcerias entre as organizações, o que permite explorar as
sinergias características da atividade tecnológica. A seguir, apresenta-se uma lista das
principais organizações de apoio.
Centro Tecnológico do Couro - Senai: inaugurado em março de 1964, o CTC Senai
oferece ensino médio (2° grau), cursos técnicos e programas de treinamento nas áreas
técnicas do couro e meio-ambiente, bem como nas áreas de desenvolvimento humano e
capacitação gerencial de pessoas que atuam nas empresas, além de assistência às
pequenas e médias empresas (parceria com SEBRAE). Colaboraram para o seu sucesso:
a Prefeitura de Estância Velha (RS), que cedeu o terreno e ajudou o início da
construção; a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul, que assumiu parte dos
custos de ensino; os Sindicatos de Curtume, que arrecadaram parte dos recursos
financeiros para o início do projeto; e, empresas e lideranças do setor, que colaboraram
com alojamentos para alunos de outras localidades, bem como material e máquinas para
a escola (ABQTIC, 1996). Atualmente, dos 4 laboratórios que o CT possui, 3 estão
credenciados ao Inmetro, podendo fazer analises para exportação.
Tanto o setor coureiro, como o calçadista, tiveram um avanço bastante
significativo no final da década de 60, quando formaram as primeiras turmas de técnicos
da Escola de Curtimento. Atualmente, tem-se alterado o perfil desse técnico, uma vez
que o mercado tem exigido uma atuação mais ampla desse profissional, como por
exemplo na área comercial.
Atenta a essas mudanças a Escola de Curtimento tem se adaptado rapidamente
(Revista do Couro, n. 132). O CT/Senai formou cerca de 1300 técnicos em curtimento,
sendo que destes, de 850 a 900 atuam no setor e uns 200 estão trabalhando na Ásia. Este
centro forma de 40 a 45 técnicos/ano e subsidia parte de seus estudos.
Na área de informação, o CT Couro coordena o Núcleo de Informação em
Couro, Calçados, Afins e Meio Ambiente, enquanto que na pesquisa aplicada são
desenvolvidos projetos de pesquisa com instituições de fomento como o CNPq e a
Fapergs. Dentre essas pesquisas, estão incluídos os testes de materiais, uma pesquisa
para definir o perfil do pé brasileiro, para que se possa elaborar calçados mais
adequados e confortáveis à realidade nacional, e uma pesquisa sobre necessidade dos
clientes (realizada em parceria com a ABQTIC, apresentada a seguir). Novos
investimentos estão planejados para que a Escola possa oferecer ao aluno um maior
contato com processos de automação na indústria de curtimento.
Associação Brasileira dos Químicos e Técnicos da Indústria do Couro (ABQTIC):
Fundada em 10 de novembro de 1971, na Escola de Estância Velha, a associação é
formada por técnicos, químicos e engenheiros que atuam na indústria de transformação
do couro. Atualmente a entidade possui cerca de 1000 associados e de 8 a 10 delegacias
regionais no Brasil. Na sede da associação, em Estância Velha, são realizadas reuniões
mensais e palestras educativas com autoridades do setor. Nas demais localidades, são
feitas reuniões semestrais e, no nordeste, é realizada uma reunião anual, onde também
ocorre um congresso de desenvolvimento tecnológico do setor. Em 1974, a Associação
iniciou as publicações da Revista do Couro, uma das importantes revistas de divulgação
de tecnologias.
Centro Tecnológico de Couro, Calçados e Afins (CTCCA): sediado em Novo
Hamburgo, RS, este centro está desenvolvendo um projeto em parceria com o
laboratório TECSA para o treinamento de profissionais da indústria para a utilização de
ensaios microbiológicos. Este projeto tem como objetivo, capacitar profissionais para a
utilização correta e avaliação crítica destes ensaios.
4.6.4.3. Principais Obstáculos e Tendências
A automação da indústria de couro e derivados, bem como o tratamento de
efluentes, são tendências irreversíveis. Porém ainda hoje, eles são considerados
obstáculos à evolução da competitividade do setor. Para se ter uma idéia, menos de 3%
dos curtumes brasileiros se beneficiam de algum tipo de automação.
Aliado à exigência mundial de aumento de produtividade e qualidade e redução
de custos, os curtumes brasileiros sofrem com a matéria-prima (pele) de inúmeras
procedências e diferentes características. Dada essa realidade da matéria-prima de
origem animal, as tecnologias tradicionais não são capazes de produzir uniformemente
peças dentro dos padrões de mercado.
Segundo Bogdawa, U.R. (1998) , a automação permite o controle de variáveis
como o tempo, temperatura, Ph, ação mecânica e concentração de produtos químicos,
que auxilia na solução dos problemas de falta de uniformidade e no aumento da
competitividade do setor. A automação permite a adaptação do processo físico-químico
às inúmeras condições da matéria-prima, utilizando um banco de dados referente aos
processos executados anteriormente com matéria-prima similar. Através da automação,
é possível gerar relatórios necessários à implantação de um programa de gestão da
qualidade e adaptar-se às exigências da ISO 9000.
De acordo com esse mesmo autor, os benefícios da automação são vários:
1. Unir o controle do processo físico-químico ao banco de dados, possibilita a
fabricação de lotes de couro com qualidade, consistência (padronização) e
economia de componentes significativos
2. A automação economiza de 10 a 12% a utilização de produtos químicos
3. Reduz o retrabalho devido a erro humano. Estima-se um retrabalho médio de 30%
em curtumes sem automação.
4. Com a automação, a base instalada pode ser utilizada 24 horas por dia, pois o
período noturno pode ser supervisionado por um número mínimo de funcionários,
dispensando a presença de pessoal técnico.
5. A automação permite uma otimização da utilização do produto químico. Este
“esgotamento” do produto químico pode diminuir a carga de efluentes em até 80%.
6. O “esgotamento” também possibilita a utilização do resíduo do tratamento de
efluentes como fertilizante de baixa produção nitrogênica.
7. Programas de lavagem e esgotamento automáticos, aliados ao controle de
posicionamento exato dos fulões, fazem com que a utilização de água seja reduzida
em até 30%. Processos de reciclagem de cromo também diminuem a quantidade de
efluentes a serem tratados. O tratamento de efluentes de curtumes é uma prática
que tem sido cada vez mais exigida dessa indústria. Isso se deve principalmente
aos efluentes altamente poluentes com alto teor de sais de cromo, entre outros
resíduos químicos. Cabe lembrar que o tratamento de efluentes é um item exigido
para a obtenção da certificação ISO 14000, a qual tende a tornar-se necessária ao
setor.
Uma sugestão às pequenas empresas, para se conseguir o tratamento de efluentes
a custos mais baixo e com maior escala, seriam as usinas comunitárias e/ou depositários
de resíduos sólidos comunitários. Na cidade de Franca, por exemplo, procurou-se
agrupar os curtumes em um bairro da cidade, para que o tratamento de efluentes fosse
viabilizado.
Uma pesquisa realizada por Anefalos e Silveira (1997), na região de Piracicaba,
estima que o investimento necessário para atender a regulamentação da CETESB
(instalação de estação de tratamento de água) em curtume de pequeno porte, que
utilizam tanino no processamento, seja, em média, R$150 mil. Para os processos à base
de cromo, as normas são mais rígidas devido a presença de mercúrio, o que eleva o
custo da estação.
Uma das tecnologias de automação utilizada na indústria de calçados e artefatos
italiana, e que a indústria brasileira deve vislumbrar, é o Computer Aided Design
(CAD). Esta tecnologia permite que o modelista ou operador elabore o modelo do
produto desejado, especificando medidas e escalas, reduzindo significativamente o
tempo gasto na confecção dos protótipos e dinamizando as alterações. A tecnologia
Computer Aided Manufacturing (CAM), aplica-se às atividades de corte, permitindo o
corte a jato d’água (water jet) e o corte a laser através da programação de instruções.
Pode ser utilizada tanto para couro como para materiais sintéticos. A adoção dessas
tecnologias, no entanto, é limitada pelo custo de aquisição dos equipamentos,
restringindo seu emprego a empresas de maior porte ou que, alternativamente,
compartilhem o uso dos equipamentos.
Portanto, existem tecnologias disponíveis para o setor de couros e derivados. No
entanto, mesmo diante dos benefícios citados, a taxa de investimento em automação
reduziu-se nos últimos anos. Isto se deveu principalmente à falta de financiamento e
dificuldade de acesso às linhas de crédito para a compra de maquinário e insumos
químicos, por exemplo. Para tentar reverter essa situação, as associações podem
desempenhar um importante papel, aproximando seus associados dos organismos de
fomento, como o BNDES. Esse papel é explorado nas propostas de política.
4.6.5. Insumos
4.6.5.1. Problemas de qualidade do couro
O principal obstáculo enfrentado pelo setor é a melhoria da qualidade de seu
produto final, cujo nível atual depende da melhoria da qualidade da matéria-prima, a
pele. O sistema de produção predominantemente empregado na pecuária − de pastejo
extensivo e longo período para abate − resulta em um couro com elevada incidência de
defeitos, por parasitas (sobretudo bernes e carrapatos), cortes, e outras marcas. Como o
pecuarista não percebe um retorno maior pela qualidade do couro, a prática de marcação
a ferro (para identificação dos animais) é disseminada, também prejudicando o couro.
A pele retirada do zebu, espécie predominante no Brasil, gera um couro com
porosidade distinta e menor brilho, se comparada ao das raças européias. Não
necessariamente uma porosidade distinta é uma desvantagem. A depender da moda, por
se assemelhar mais ao couro natural, o couro do zebu pode satisfazer o mercado. No
entanto, se a moda privilegiar o brilho (Italian look), a porosidade do couro do zebu
pode ser um obstáculo à qualidade do produto final.
O couro zebuíno apresenta também uma certa dificuldade de utilização devido
ao “cupim” do animal, embora já exista tecnologia para modificar sua forma, no
curtume. Essa característica limita a utilização do couro de zebu para o atendimento do
segmento de estofamentos, que vem apresentando intenso crescimento, conforme
comentado na seção 4.6.3. Uma outra característica dessa pele é que pelo fato de soltar
facilmente a “flor” no beneficiamento, essa pele exige um maior cuidado, sobretudo na
fase mais alcalina do processamento.
O fato de se abater animais mais velhos no Brasil tem como consequência
couros de pior qualidade, diferentemente do que ocorre na Itália, que utiliza couro de
bezerro, e do couro argentino, onde o animal também é abatido mais precocemente. Há
diversos motivos para uma elevada correlação entre qualidade do couro e idade de abate
do animal. Entre esses motivos, pode-se destacar: a) o menor tempo de exposição dos
animais aos parasitas e eventuais acidentes, b) a menor porosidade do couro de animais
jovens, e c) o abate de novilhas, evitando o efeito adverso da prenhez sobre a qualidade
do couro, uma vez que pode gerar estrias no mesmo.
Segundo Ferreira (1997), a remuneração do couro cru brasileiro na última
década chegou à metade do valor recebido pelo produtor americano, o que levou o
Brasil a deixar de ganhar cinco bilhões e seiscentos milhões de dólares, ou seja, o
equivalente a 18 milhões de bois. Isto aconteceu porque nos Estados Unidos apenas 5%
do couro apresentam defeitos, enquanto que no Brasil, 93% das peles ainda registram
problemas.
De acordo com um estudo realizado a partir do convênio Feevale/Senai/CTCCA,
60% dos defeitos dos couros brasileiros têm origem no campo, sendo 40% causados por
ectoparasitoses (berne, carrapato, bicheira), 10% devido à marcação a fogo dos animais
e 10% decorrentes de marcas de arame farpado, galhos e espinhos. Para evitar essas
perdas, seria necessário maior cuidado sanitário na criação, marcação a fogo segundo
determinações da lei n° 4.714 de 29/06/65, pastagens mais limpas e com cercas de
arame liso.
Nesta etapa da cadeia, cabe lembrar uma discussão bastante polêmica. Ao
contrário do que muitos dizem, o pecuarista também deveria receber pelo couro quando
vende o animal para o frigorífico. De acordo com Ferreira (1997), os frigoríficos
utilizam uma somatória de cada item que compõe o aproveitamento do bovino para
definir o preço final a ser pago ao pecuarista pela arroba do boi. Para um boi de 16
arrobas: o corte de traseiro representa um valor de 57% das arrobas do boi; o corte
dianteiro representa um valor de 22% das arrobas do boi; a ponta de agulha representa
um valor de 9% das arrobas do boi; o couro verde representa um valor de 7% das
arrobas do boi; e, os subprodutos representam um valor de 5% das arrobas do boi.
Porém, esse diferencial de preço não é suficiente para engajar os pecuaristas em práticas
que preservem o couro. Efetivamente, os frigoríficos não incorporam a remuneração do
couro no processo de negociação pela compra de bois para abate. Trata-se, portanto, de
um círculo vicioso que deve ser rompido para que seja possível uma melhor inserção da
produção brasileira de derivados de couro no mercado externo.
O transporte inadequado do gado da fazenda até o frigorífico é responsável por
mais 10% dos defeitos das peles. Nesta etapa, seria ideal substituir o uso do guizo
pontiagudo ou roseta por bastões de choque elétrico no manejo e fazer uma revisão da
carroceria do caminhão antes do embarque dos animais para evitar cantos vivos, pontas
de prego ou parafusos, travessas quebradas ou madeiras lascadas.
O pré-abate dos animais no frigorífico também exige algumas práticas
importantes para se obter um couro de boa qualidade. A vasoconstrição provocada pelo
banho frio antes do abate é uma delas. Sua finalidade é tornar a sangria mais eficiente e
evitar um defeito conhecido como “veiamento” nos couros curtidos.
A esfola mal feita durante o abate dos animais é responsável por cerca de 15%
dos defeitos dos couros brasileiros. É importante evitar sujar o couro do animal com
sangue, evitar a ruptura da camada superior do couro (flor), evitar fazer cortes, furos e
raias no couro durante a esfola e, se possível, adotar equipamentos para a esfola
mecânica (facas circulares e rotativas com acionamento por eletricidade ou ar
comprimido) substituindo o uso das facas manuais. Uma sangria limpa e completa
diminui a proliferação de bactérias, reduzindo perdas de qualidade na próxima etapa: a
conservação do couro. Acredita-se que cerca de 80% do couro é lixado para reduzir os
defeitos.
Estima-se que a má conservação do couro responda por cerca de 15% dos
problemas de baixa qualidade. A salga é um processo de conservação do couro, pois
reduz de 65% para 45% o seu teor de água, diminuindo o desenvolvimento de bactérias
que atacam e danificam a pele. O couro bem conservado evita problemas como flor
solta, flor nobucada, flor ardida e perda de resistência, além de dar uma melhor
classificação e maior rendimento da peça.
A partir da pesquisa realizada pela ABQTIC (Ferreira, 1997), tem-se que a
classificação dos couros dos grandes curtumes do Brasil é:
Tipo I-II III IV V VI Refugo
% de couro 8,56 25,34 30,55 19,61 10,70 5,24
Os autores levantam a questão do poder de compra de matéria-prima dos
curtumes envolvidos e a origem preponderante de frigoríficos poder estar favorecendo a
classificação para melhor.
As perdas do couro continuam durante o processo de beneficiamento. Num
curtume típico, é usual a perda total de um lote de couro a cada ano causado por erros
humanos. Além desta perda, um couro perde em média 3% de sua área útil cada vez que
deve ser reprocessado. Neste caso, Bogdawa, U. R. (1998), recomenda a automação da
indústria de transformação do couro animal em matéria-prima para produção de
calçados e vestimentas. A automação traria vários benefícios para a indústria, tais como:
redução das perdas de couro, aumento de sua qualidade, redução do uso de produtos
químicos, redução e otimização do tratamento de efluentes (Couro Business, nov./dez.,
1998).
Todas as perdas no couro mencionadas acima, desde a pecuária até o curtume,
levam a uma perda de competitividade do setor. As desvantagens competitivas
brasileiras têm sido exatamente as vantagens dos demais países, sobretudo, dos
europeus, particularmente dos italianos. Lá encontra-se capital a custo competitivo, a
melhor tecnologia, a forte indústria química e de máquinas, a capacidade de criação e
sustentação da moda. Recentemente a Itália, maior importador de pele brasileira,
inventou uma máquina que faz “funilaria” em peças perfuradas por berne. Dessa forma,
os italianos adquirem couros brasileiros, mais baratos, e os transformam em artigos mais
caros.
A solução que a indústria coureira tem encontrado para minimizar os defeitos do
couro, é estampar esse produto. Esse couro estampado encontra saída no mercado
interno, mais especificamente no segmento de artefatos de couro. Isto porque esse
produto tem valor reduzido quando destinado à exportação.
Dentre as ferramentas para a melhoria da qualidade do produto, os ensaios
microbiológicos podem colaborar para a redução de perdas por deterioração e colaborar
na qualificação de fornecedores, por exemplo, a seleção dos melhores biocidas e
adesivos. Acredita-se que cerca de 15% das perdas de couro no setor de ribeira deve-se
à ação de microorganismos, geralmente ocorrido sem conhecimento da real causa.
Além destes benefícios, este instrumento pode evitar que um consumidor
adquira um produto contaminado, o que prejudicaria a competitividade da marca ou da
empresa. Um produto contaminado, pode apresentar odores oriundo do
desenvolvimento de microorganismos, apresentar alterações de cor ou aspecto, e no
caso de calçados, pode reduzir a durabilidade devido à ação dos microorganismos e suas
enzimas e toxinas.
4.6.5.2. Insumos Químicos
A primeira e marcante descoberta da indústria química em benefício da indústria
de curtimento, foi o tanino sintético. Esta descoberta se deu um pouco antes da primeira
guerra mundial, quando os países da Europa tiveram os acessos aos tanantes naturais
bloqueados.
A integração da indústria química com a indústria de curtimento gerou várias
tecnologias de aplicação no mercado, como o acabamento sobre flor corrigida,
impregnação desta com finalidade de deixá-la mais firme, o acabamento “easy care”,
acidulação livre de sal com ácidos não inchantes, curtimento a cromo de alto
esgotamento, o “bioleather” e os acabamentos livres de solvente. Porém, a indústria
química não continua expandindo seus investimentos no setor coureiro como acontecia
há três décadas. Isto se deve ao crescimento de outros setores como o petroquímico e o
têxtil. Com isto, surgem empresas químicas menores que se dedicam especialmente aos
curtumes, mas muitas vezes sem possuir condições científicas e financeiras para
responder às necessidades tecnológicas do setor (Revista do Couro, n. 132).
4.6.5.3. Estrutura de Mercado: insumos químicos
As grandes empresas que dominam o mercado de insumos para a indústria de
curtimento são multinacionais, de capital estrangeiro. Na maioria das vezes a matéria-
prima utilizada para a produção desses insumos são importados, e aqui no Brasil só é
feita a formulação final do produto. Dentre essas empresas, estão: Basf, Bayer, Rohm
and Haas, TFL, etc. Existem ainda as empresas de porte médio, porém, também de
capital estrangeiro, como a Sthal, que é uma empresa holandesa com sede no Rio
Grande do Sul e filial em Franca. Esta empresa trabalha com produtos especificamente
para a indústria de curtimento e de calçados de couro e plástico. Esta é uma estrutura
semelhante ao que ocorre na Itália, onde existem empresas de insumos de médio porte
voltadas exclusivamente a esse setor, fazendo inclusive produtos sob encomenda.
As empresas de insumos nacionais, também chamadas de “municipais”, são
empresas que trabalham com produtos similares aos das multinacionais, porém com
baixa tecnologia. Conseguem ser mais competitivas em preço, devido à utilização de
matéria-prima nacional, que é mais barata. No entanto, o diferencial está na qualidade
desta matéria-prima. Por exemplo, existe um corante de uma empresa nacional que tem
um valor menor do que de outras empresas, mas é um produto danoso à saúde humana.
Os curtumes utilizam esse produto apenas para as peças destinadas ao mercado interno,
que é menos exigente. As peças que são destinadas à exportação são tratadas com
produtos de maior valor e melhor qualidade, ou seja, não prejudiciais à saúde humana,
pois é um mercado mais exigente. O Quadro 4.6.2 apresenta os principais insumos
utilizados em cada etapa e as principais empresas produtoras.
Quadro 4.6.2 - Os principais insumos químicos e empresas
Os principais insumos químicos:• Ribeira: bactericidas, ácido sulfúrico, ácido acético, ácido fórmico, sulfeto de sódio, hidróxido de
amônio, hidróxido de cálcio (cal apagada), tensoativo, cloreto de sódio, enzimas, ácido bórico, ácidolácteo, água.
• Curtimento: sal de cromo, tanino vegetal, tanino sintético, sal de cromo mascarado, sal de cromoauto-basificante, formiato de sódio, extrato tanante vegetal (guabracho, mimosa, acácia), sais dealumínio, sais de zircônio, sais de ferro e água.
• Recurtimento: sal de cromo, sal de alumínio, sal de zircônio, tanino vegetal, resina acrílica, taninosintético, bicarbonato de aônia, formiato de sódio, corante ácido, corante básico, corante complexo-metálico, óleo cru, óleo de mocotó, tensoativo não iônico, óleo sulfatado, óleo sulfitado, óleosulfonado, parafina clorada, álcool graxo sulfatado, parafina sulfoclorada, óleo mineral e água.
• Acabamento: pastas pigmentadas, corantes complexo-metálicos, ligantes naturais (caseína ealbumina), ligante acrílico, ligante bultadiênico, ligante poliuretânico, copolímeros de ácidos acrílcose metacrílicos, cera, filler, fosqueante, agente de toque, água, sabonete orgânico (thiner, álcool),penetrante,
Principais fabricantes de insumos:• BASF S/A• BAYER S/A• BUCKMAN LABORATÓRIOS LTDA• CLARIANT S/A• HENKEL S/A INDÚSTRIA QUÍMICA• KILLING S/A TINTAS E SOLVENTES• MK QUÍMICA DO BRASIL LTDA• SETA S/A EXTRATIVA TANINO DE ACÁCIA• STHAL BRASIL S/A• TANAC S/A• TFL DO BRASIL INDÚSTRIA QUÍMICA LTDA• ROHM AND HAAS LTDA.
Fabricantes de porte pequeno ou médio, que produzem exclusivamente e sobespecificação para o setor coureiro/ calçadista:• TITANCHIM BRASIL IND. COM. PROD. QUÍMICA LTDA• ENIA INDÚSTRIAS QUÍMICAS S/A• GETTI QUÍMICA LTDA• KEMIA TAU DO BRASIL IND. QUÍMICA LTDA• LAMBRA PRODUTOS QUÍMICOS AUXILIARES LTDA• LANGRO CHEME• OLEOQUIM IND. COM. DE PROD. QUÍMICOS LTDA• PELLI QUÍMICA LTDA.
4.6.6. Estrutura
4.6.6.1. Desempenho exportador:
Com a finalidade de se avaliar a competitividade de um determinado setor
frequentemente recorre-se à análise do desempenho recente nos principais mercados,
com especial ênfase ao desempenho em exportações. Esse tipo de análise apresenta a
vantagem de considerar todos os elementos relevantes para a sobrevivência e
crescimento de um grupo de empresa nos mercados, sejam fatores ligados a preços
(como custos de produção), sejam fatores ligados à conquista do consumidor por
qualidade, atendimento ou inovação de produto. Esse indicadores de desempenho no
mercado são chamados na literatura de indicadores de competitividade revelada, uma
vez que expressam a capacidade de as firmas competirem, revelada pelo desempenho
recente dessas firmas no mercado (Ferraz et alii, 1997). No entanto, esses indicadores
apresentam uma importante limitação. Trata-se de uma análise da competitividade
passada, sendo, portanto, um indicador imperfeito da competitividade futura. Empresas
podem estar enfrentando um desempenho sofrível, mas, ao mesmo tempo,
implementando estratégias que as coloquem em uma posição confortável para competir
no futuro. Em outras palavras, para uma melhor avaliação da competitividade futura (ou
seja, da capacidade de as empresas sobreviverem e crescerem no futuro) é necessária
uma análise das estratégias das empresas. Além disso, a competitividade de um setor
não depende apenas das estratégias das empresas, mas também da capacidade que essas
empresas, principalmente clientes e fornecedores, têm para implementar ações
conjuntas, estabelecendo uma melhor coordenação da cadeia produtiva.
Esta seção concentra-se na apresentação dos principais indicadores de
competitividade revelada, ou seja, da capacidade de crescimento e sobrevivência das
empresas componentes do setor de couro e derivados brasileiro verificada no período
passado recente. A principal ênfase é dada ao desempenho exportador dada a sua
relevância para o setor. As análises das estratégias das empresas, bem como das
relações de mercado entre os diversos elos da cadeia produtiva, são apresentadas,
respectivamente, nas seções 4.6.7. e 4.6.8..
A Tabela 4.6.1 apresenta o desempenho exportador recente do setor de couro no
Brasil, mensurado em quantidades de peles. Para o cálculo das exportações indiretas é
utilizado um coeficiente técnico, calculado pelo CICB, que indica o montante de peles
necessário para a produção do montante de calçados exportado.
O primeiro elemento a se destacar é o movimento das exportações de couro em
suas mais variadas formas (salgado, wet blue, semi-acabado e acabado). Observa-se um
crescimento em termos absolutos de cerca de 3 milhões de peças, em 1984, para mais de
15 milhões de peças, a partir de 1997. Em suma, observou-se um crescimento anual
médio de 12,4%, bastante acima do crescimento da economia, assim como da produção
nacional de couro (abate de animais), que cresceu à taxa média de 4,6% ao ano. Esse
fato demostra a capacidade de o mercado externo absorver a produção doméstica de
couro, assim como a competitividade desse segmento do setor de couro e derivados.
Conforme será visto a seguir, essa competitividade manifesta-se mais intensamente nos
produtos de menor valor agregado, como o wet blue.
Em contraposição, as exportações de derivados1 cresceram a uma taxa mais
modesta. No período entre 1984 e 1998, as exportações passaram de 6.857, em
equivalente de peças de couro (peles), para 7.000, o que equivale a um crescimento
anual médio de apenas 0,15%. Esses resultados conduzem, em uma análise de primeira
ordem, a um diagnóstico favorável ao setor de couro e derivados. As exportações são
crescentes, mesmo considerando o período de valorização da moeda brasileira entre
1994 e 1998. É interessante notar que, além de crescer em termos absolutos, as
exportações de couro e derivados crescem em termos relativos. Isso pode ser observado
na evolução do coeficiente de exportações, dado pela proporção da produção nacional
que se destina ao mercado externo direta ou indiretamente. Após apresentar um
desempenho oscilante no decorrer da década de 80 e início da de 90, com coeficientes
entre 48% e 61%, o setor encontrou uma trajetória ascendente, paradoxalmente no
período mais desfavorável em termos cambiais. Assim, em 1997, as exportações
representam 76,6% do total da produção doméstica.
Em uma análise de segunda ordem, no entanto, as ameaças ao setor se
sobressaem. O Brasil tem mostrado maior competitividade nos segmentos de menor
valor agregado, o que, como será visto a seguir, pode significar a queda do valor
exportado, mesmo que acompanhada de uma maior quantidade de peças de couro
exportadas.
A análise do comportamento das importações, por sua vez, apresenta tendências
menos nítidas. O comportamento no período foi errático, não apresentando uma
correspondência clara com a falta de produtos domesticamente, para a produção de
calçados e outros artefatos. Essa conclusão decorre da comparação entre exportações
diretas de couro e do desempenho do segmento de calçados.
1 Na tabela 5.6.1 estão contabilizados apenas os dados relativos a calçados, mas sua maior relevância nasexportações autoriza a extrapolação desses dados para artefatos em geral.
Por outro lado, parece clara a relação entre o movimento das importações e a
relação de preços internos e externos, motivada sobretudo pelas intervenções dos planos
de estabilização econômica, característica comum nas décadas de 80 e 90. O maior
coeficiente de importação (importações em relação à produção doméstica) é observado
em 1986, ano do Plano Cruzado. Nesse caso, o congelamento de preços teve duas
consequências fortes sobre o setor. De um lado, aumentou o consumo de bens
populares, como decorrência do aumento da massa salarial em termos reais. Como
consequência, o consumo de calçados apresentou crescimento intenso, aumentando a
procura por couro. De outro lado, o congelamento aliado a uma baixa taxa de juros
provocou uma fuga para ativos reais. Entre esses ativos, ganhou especial destaque a
utilização de bovinos como reserva de valor. A consequência foi uma redução do abate
em 1986 e 1987, reduzindo também a oferta de couro. A menor disponibilidade de
couro internamente parece ter sido o fator que induziu um aumento do coeficiente de
importações de couro, em 1986, para 23,4%.
Outro movimento das importações que está relacionado ao ambiente
macroeconômico é o crescimento do coeficiente de importações a partir de 1994, com a
implantação do Plano Real. Após um período recessivo, em que o consumo doméstico
em baixa não solicitava aumento de importações, o Plano Real reuniu duas condições
bastante favoráveis para o crescimento das importações de couro. De um lado, o
consumo interno aumentou com a redução da inflação, seja pelo fim do imposto
inflacionário, seja pela própria estabilidade de preços que permitiu um alongamento do
perfil do endividamento das famílias. De outro lado, a valorização cambial que marcou
os quatro anos de Plano Real era evidentemente propícia às importações. Com isso, o
coeficiente de importações cresce de 10,6%, em 1994, para 11,5%, em 1996,
apresentando uma queda nos anos subsequentes, devido a retração da atividade
econômica.
Tabela 4.6.1Evolução das importações e das Exportações Brasileiras de Couro
(Quantidade em mil peles)Ano Produção de Couro Exportação Direta Exportação Indireta Exportações Totais Coef.
Exportação
Importações Coef.Importação
1984 16.010 3.034 6.857 9.891 61,8% 2.611 16,3%
1985 17.330 3.260 6.285 9.545 55,1% 1.712 9,9%
1986 17.435 2.317 6.714 9.031 51,8% 4.077 23,4%
1987 16.893 3.408 6.649 10.057 59,5% 2.673 15,8%
1988 22.400 6.428 7.190 13.618 60,8% 2.941 13,1%
1989 23.000 5.104 8.095 13.199 57,4% 3.347 14,6%
1990 23.000 5.404 6.762 12.166 52,9% 2.622 11,4%
1991 23.500 5.142 6.333 11.475 48,8% 1.860 7,9%
1992 24.000 6.787 7.619 14.406 60,0% 1.884 7,9%
1993 24.500 6.317 8.714 15.031 61,4% 3.535 14,4%
1994 25.900 6.855 8.156 15.011 58,0% 2.737 10,6%
1995 26.900 9.691 6.570 16.261 60,4% 2.538 9,4%
1996 27.900 14.224 7.100 21.324 76,4% 3.198 11,5%
1997 29.100 15.019 7.200 22.219 76,4% 2.626 9,0%
1998 30.200 15.578 7.000 22.578 74,8% 2.593 8,6%
Fonte : MICT/SECEX e CICB
Tabela 4.6.2Evolução de Exportação e Importação de Couro
(em mil US$)Ano Exportações de
couro
Exportações de
Calçados
Importações de Couro Importações de
Calçados
Saldo da Balança % das Exportações
Mundiais de Couro
1984 122.100 1.072.000 272.661 - 921.439 -
1985 113.035 969.000 65.539 - 1.016.496 -
1986 91.035 1.028.000 161.485 - 957.550 -
1987 158.543 1.168.000 151.357 - 1.157.186 -
1988 311.500 1.281.000 137.692 - 1.454.808 -
1989 170.219 1.312.000 168.866 - 1.313.353 -
1990 248.106 1.184.000 122.924 - 1.309.182 7
1991 272.386 1.245.000 108.278 - 1.409.108 5
1992 386.870 1.473.450 164.890 18.936 1.676.494 5
1993 394.886 1.931.795 205.815 41.166 2.079.700 5
1994 459.764 1.624.087 190.919 89.014 1.803.918 7
1995 574.269 1.498.811 184.769 211.319 1.676.992 7
1996 677.809 1.650.111 158.987 211.709 1.957.224 8
1997 740.058 1.594.477 170.237 207.123 1.957.175 8
1998 671.189 1.387.077 145.067 116.034 1.797.165 nd
Fonte : MICT/SECEX e CICB
O desempenho exportador de fato é menos favorável quando se observa dados
relativos ao valor das exportações, ao invés da quantidade exportada. A Tabela 4.6.2
apresenta os valores das exportações e importações, em mil dólares correntes, dos dois
principais agregados do setor de couro e derivados: couro, em seus variados estágios de
produção, e calçados.
Observando-se a coluna relativa ao saldo da balança comercial do setor de couro e
derivados, pode-se destacar que o excepcional desempenho obtido em 1993 não foi ainda
superado. Nesse ano, as exportações de calçados atingiram seu ápice, sobretudo pelos
bons resultados obtidos no principal mercado consumidor: os EUA. A partir de então o
desempenho externo do setor calçadista foi ofuscado pela crescente competitividade dos
principais concorrentes asiáticos, em especial a China. Do ponto de vista agregado, o
setor apresentou uma pequena queda nos anos de 1994 e 1995, devido sobretudo à
valorização do câmbio. Nos anos seguintes, o saldo da balança estabilizou-se próximo a
dois bilhões de dólares, motivado principalmente pela restruturação da produção
doméstica.
O pior desempenho do segmento de calçados nos anos do Plano Real provocou
um redirecionamento das exportações rumo aos produtos de menor valor agregado, ou
seja, peças de couro que passaram a suprir a produção de calçados em outros países. Esse
fator está claro nos dados relativos à evolução da quantidade exportada, expressa na
Tabela 4.6.1. De fato, a Tabela 4.6.2 evidencia que o principal elemento para explicar a
sustentação do saldo da balança comercial do setor em 1996/7 foi o aumento do valor
exportado de couro.
A trajetória de redução do valor agregado às importações infelizmente continuou
em 1998, deteriorando os resultados da balança comercial. Nesse caso, apesar de um
aumento da quantidade exportada, em 1998, de 15.019 para 15.851, conforme mostra a
Tabela 4.6.1, observou-se uma queda no valor exportado, de 740 para 651 milhões de
dólares (Tabela 4.6.2). A explicação para esse fato está na redução do valor agregado
dentro do segmento de couros, com o aumento das exportações de wet blue e diminuição
das exportações de semi-acabados (crust) e acabados.
A figura 4.6.2 apresenta o desempenho recente das exportações de couro, em mil
unidades, por estágio de acabamento. O resultado indica claramente um crescimento das
exportações de wet blue, que sozinho explica o crescimento das exportações de couro,
havendo um pequeno decréscimo nas exportações dos demais tipos.
Figura 4.6.2Evolução das exportações de couro por tipo
Fonte: MICT/SECEX e CICB
Esse quadro não seria tão desfavorável se os preços relativos dos diversos estágios
de processamento do couro não se alterassem ou favorecessem as exportações de wet
blue. Ao contrário, após uma elevação do preço wet blue em 1997, houve uma intensa
queda em 1998, não acompanhada pelo preço tipos de couro de maior valor agregado.
Em outras palavras, o ano de 1998 marcou a especialização das exportações em um item
que apresentou queda dos preços relativos, o que deve resultar em um desempenho
inferior na balança comercial do setor.
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
16000
18000
1996 1997 1998
mil
cour
os
Wet blue
Acabado
Crust
Salgado
Tabela 4.6.3 - Evolução do Preço Médio dos Couros exportados (US$)
1996 1997 1998
Salgado 22,58 20,7 17,99
Wet blue 36,36 43,31 33,69
Semi- Acabado 60,08 73,71 71,66
Acabado 87,55 89,37 89,34
Fonte: MICT/SECEX e CICB
A deterioração do preço relativo entre wet blue e couros de maior valor agregado
está explícita na Figura 4.6.3, que apresenta os preços em uma mesma base 100, em
1996. Em 1998, enquanto os preços do couro acabado elevaram-se em 19,3% e do couro
semi-acabado em 2,0%, o wet blue experimentou uma queda de 7,3% em seus preços.
Figura 4.6.3Índice de preços de exportação de couros
Fonte: MICT/SECEX e CICB
Dada a relevância do Brasil no mercado internacional, é possível que o aumento
das exportações de wet blue tenha sido causa da queda do preço no mercado
internacional. Nesse sentido, é mais razoável o Brasil estipular cotas de exportações,
sustentando os preços em níveis mais altos.
0,0
20,0
40,0
60,0
80,0
100,0
120,0
140,0
1996 1997 1998
Salgado
Wet-Blue
Semi-Acabado
Acabado
Considerando a agregação de valor e o impacto ambiental como dois critérios
para a avaliação do desempenho recente do setor, a tendência que se apresenta é a pior
possível. Do ponto de vista de agregação de valor, a maior relevância do wet blue implica
um menor valor das exportações relativamente aos couros crust e acabado. Em termos de
valor, essa situação é superior apenas à exportação de couro salgado. No entanto, nesse
último caso o impacto ambiental da produção seria bastante reduzido, uma vez que a
utilização do cromo no processo de fabricação do wet blue constitui a etapa mais poluente
de toda a cadeia produtiva.
No que se refere às exportações de calçados, o quadro é inverso. Em que pese um
desempenho favorável no número de pares vendidos, o valor das exportações cresceu
significativamente nos últimos 20 anos como decorrência do aumento do valor médio dos
calçados exportados. Esse movimento positivo, no entanto, foi interrompido nos anos de
1997 e 1998, conforme é apresentado ao final desta seção.
Primeiramente, é necessário colocar a importância dos calçados de couro nas
exportações totais, elemento que justifica a utilização de dados agregados de exportações
de calçados como representativos do comportamento das exportações de calçados de
couro. Pode-se notar no Figura 4.6.4 que calçados de couro representam mais de 90% do
valor total exportado. Além disso, a expressividade das exportações de calçados de couro
evidencia que, sem qualquer dúvida, é este o segmento mais competitivo da indústria de
calçados brasileira, o que atesta a importância de um aprofundamento das relações entre
frigoríficos, curtumes e empresas calçadistas.
Figura 4.6.4Participação nas exportações por tipo de calçado (1993)
Fonte: MIC/SECEX
Figura 4.6.5Participação nas exportações por tipo de calçados (1998)
Fonte: MIC/SECEX
96%
1%
1% 1%1%
Injetados
Plásticos Moldados
Cabedal de Couro
Cabedal Têxtil
Outros
6%
88%
4% 1%
1%
Injetados
Plásticos Moldados
Cabedal de Couro
Cabedal Têxtil
Outros
Essa maior importância das exportações de calçados de couro era ainda mais
expressiva no início da década de 90, tendo havido nesse período um aumento da
participação de plásticos moldados e de têxtil, conforme evidencia a Tabela 4.6.4.
Tabela 4.6.4Exportações Brasileiras de Calçados por Tipo ( Valor US$ Milhões)
Tipo 1993 1994 1995 1996 1997 1998Injetados 22 15 15 18 17 14Plásticos Moldados 13 18 27 42 67 81Cabedal de Couro 1762 1450 1317 1433 1346 1161Cabedal Têxtil 24 32 36 40 59 54Outros 27 22 19 34 34 19Totais 1846 1537 1414 1567 1523 1330
Fonte: MIC/SECEX
A Tabela 4.6.5 apresenta o comportamento recente das exportações de calçados
de couro, o principal derivado exportado, e de artefatos, incluindo as participações dos
segmentos de outros materiais. O valor exportado é crescente no início da década,
interrompendo esta trajetória no período de valorização do real, de 1994 a 1998. De um
modo geral, esse crescimento do início da década acompanhou o crescimento das
exportações totais, de tal modo que a participação de calçados de couro permanecia no
patamar de 4%. Com os problemas cambiais, essa participação caiu acentuadamente,
caindo para 2,6%, em 1998. Esse fato revela que o setor de calçados sentiu
proporcionalmente mais os efeitos da valorização cambial, muito possivelmente por
tratar-se de um produto intensivo em mão-de-obra (cujos custos, em dólar, são muito
sensíveis às variações do câmbio) e de demanda sensível às variações de preço.
As exportações de artefato, por sua vez, são pouco relevantes, atingindo cerca de
3% do valor obtido por calçados. Em contraposição, houve nos últimos dois anos, apesar
de problemas cambiais, uma elevação expressiva das exportações desse segmento.
Considera-se que, dado o domínio da tecnologia, disponibilidade de mão-de-obra e de
matéria-prima, o potencial exportador do setor de artefatos é relativamente pouco
explorado.
Tabela 4.6.5Representatividade dos calçados nas exportações do Brasil
(valores em milhões de dólares)
ITEM 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998
Exportação Total 31 .414 31 .620 35 .862 38 .597 43 .545 46 .506 47 .747 52 .987 51 .120
Exportaçãode artefatos
31 ,5 36 ,9 30 ,3 25 ,9 31 ,2 40 ,8 45 ,9
Part . de artefatosnas exportações
0,09% 0,1% 0,07% 0,06% 0,06% 0,08% 0,09%
Exportaçãode ca lçados
1 .184 1 .245 1 .473 1 .932 1 .624 1 .500 1 .650 1 .508 1 .321
Part . de calçadosnas exportações
3,8% 3,9% 4,1% 5,0% 3,7% 3,2% 3,5% 2,8% 2,6%
Fonte : ABAEX, 1997 , a p u d Salomão (1998) e MICT/SECEX.
As exportações cresceram até 1996 em valor não somente pelo aumento da
quantidade exportada, mas também pela elevação do valor médio de venda. A Tabela
4.6.6 apresenta a evolução do valor médio dos calçados de couro exportados, o que pode
indicar uma mudança de posicionamento do produto brasileiro frente a concorrência
internacional. Embora o valor médio não constitua um indicador preciso da qualidade do
produto, o movimento observado na Tabela 4.6.6 deu-se ao mesmo tempo que
aumentavam as exportações do sudeste asiático, baseadas em preços baixos. Esses dois
elementos, conjuntamente, revelam a estratégia de empresas brasileiras em disputar
segmentos de mercado menos sensíveis a preços (em geral, mercados em que a qualidade
é uma variável-chave de concorrência). Essa mudança não é um fenômeno recente.
Segundo Costas (1994), o preço médio do calçado brasileiro em 1969, ano em que
começou a participar do mercado internacional, situava-se entre 1 e 2 dólares. O
incremento do valor do calçado deveu-se a melhorias na qualidade, em especial pela
padronização, o que foi fundamental na concorrência com países do sudeste asiático,
notadamente a China.
Esse posicionamento construído ao longo da década de 80 até os meados da
década de 90 encontra-se ameaçado por duas mudanças no mercado internacional: a) a
China passa a oferecer calçados de maior qualidade, concorrendo diretamente com os
calçados brasileiros em seu principal mercado, os EUA; e b) o processo de terceirização
da indústria italiana, passando a se utilizar dos baixos custos de mão-de-obra em países
do leste europeu. Em conseqüência dessa concorrência, houve uma interrupção do
crescimento do valor médio do par exportado, tendo havido até uma pequena retração em
1997 e 1998.
Tabela 4.6.6
Preço médio do calçado brasileiro para exportação
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998
US$ 8 ,34 US$ 9 ,36 US$ 9 ,21 US$ 10 ,63 US$ 8 ,97 US$ 10 ,25 US$ 10 ,98 US$ 10 ,69 US$ 10 ,16
Fonte : S ind ica to da Indús t r i a de Ca lçados de Franca S .P .
Para a análise do segmento de artefatos, é interessante dividi-lo em diversos
componentes, conforme discriminação na Tabela 4.6.7, em que artefatos de couro,
propriamente ditos, constituem apenas uma parte. Do desempenho de exportações e
importações ao longo da década, quatro movimentos devem ser destacados para uma
análise de competitividade: a) crescimento das exportações de artefatos de couro, b)
drástica redução das exportações de bolsas e malas, vestuário e cintos de couro, c)
crescimento da importação de artigos de outros materiais e d) importação de artigos de
couro para uso técnico.
No período em questão, as exportações de artefatos de couro mais do que
quadruplicaram, revelando, de fato, o potencial de inserção internacional do segmento.
Em contraposição, vestuário, cintos e bolsas e malas de couro tiveram desempenho
sofrível, sobretudo no período de valorização do real. A princípio, os principais
problemas que explicam esse fraco desempenho são a) dificuldade de competir em preços
(agravado pelo problema do câmbio) e b) necessidade de elevação de qualidade,
dificultada pela falta de matéria-prima de qualidade.
Entre os principais produtos importados destacam-se os artigos de outros
materiais (bolsas, malas e artefatos), revelando que a maior competitividade relativa do
Brasil nos artigos de couro. Finalmente, cabe comentar que, apesar dessa maior
competitividade nos produtos de couro, há uma importação crescente de artigos de couro
para uso técnico. Esse tipo de produto necessita maior esforço de marketing, no sentido
de aproximar a produção das necessidades técnicas, elaborando-se produtos sob
especificações. Há espaço, portanto, para o crescimento da produção brasileira com o
estreitamento das relações entre empresas demandantes e as produtoras de artigos de
couro.
Tabela 4.6.7
Evolução das exportações e importações de artefatos de couro por tipo
Exportação 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998US$ (FOB) US$ (FOB) US$ (FOB) U$$ (FOB) US$ (FOB) US$ (FOB) US$ (FOB)
Artefatos de Couro 8.184.897 10.740.620 8.824.998 11.603.967 16.093.353 27.624.572 36.877.182
Artefatos de Outros Materiais 667.186 617.760 651.777 595.346 3.829.277 3.055.702 1.694.599
Bolsas e malas de Couro 10.855.006 12.050.975 9.019.242 4.992.124 6.109.599 4.409.270 1.848.961
Bolsas de malas de outrosMateriais
2.140.264 2.406.746 2.119.356 1.870.616 1.694.171 2.160.960 1.960.940
Vestuário de Couro 5.468.141 5.557.549 4.832.010 3.749.182 28.737 33.754 37.107
Luvas de Couro 829.894 1.804.138 2.190.593 2.080.650 2.642.768 2.732.798 2.890.350
Cintos de Couro 2.913.111 3.376.626 2.201.450 613.057 324.589 338.757 193.010
Artigos para Uso Técnico deCouro
407.530 383.427 444.033 362.240 448.226 409.411 395.524
Importação 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998Artefatos de Couro 1.009.498 825.938 1.463.143 2.805.127 1.735.277 2.458.241 2.238.051
Artefatos de Outros Materiais 465.619 623.603 1.537.416 5.953.116 6.364.138 7.640.752 12.368.612
Bolsas e malas de Couro 299.374 526.629 1.367.602 5.708.633 2.836.871 4.724.371 3.363.109
Bolsas de malas de outrosMateriais
1.538.318 3.817.352 9.080.025 34.019.320 35.403.326 38.365.729 36.632.050
Vestuário de Couro 315.412 388.530 433.554 2.166.522 2.474.583 6.944.943 6.396.567
Luvas de Couro 105.686 99.075 372.910 1.042.937 784.437 713.832 486.130
Cintos e acessórios de Couro 146.569 253.193 835.261 2.601.514 2.593.905 2.947.125 1.480.856
Artigos para Uso Técnico deCouro
157.724 156.355 165.091 90.224 2.682.275 3.413.514 4.279.437
Finalmente, cabe comentar que uma potencial ameaça ao bom desempenho das
exportações brasileiras de couro e calçados é a elevada dependência de um único país
consumidor. Somando-se as exportações da cadeia produtiva de couro (Tabela 4.6.8), pode-
se notar que os EUA são responsáveis por aproximadamente metade do total exportado
pelo Brasil. Para agravar essa situação, os países asiáticos, que constituem os principais
concorrentes das empresas brasileiras, têm ampliado sua participação nos EUA.
Inicialmente essa concorrência dava-se somente pelo critério custo, o que permitiu às
empresas brasileiras a exploração de mercados de maior valor agregado. No entanto,
atualmente os produtos asiáticos evoluíram em qualidade, ameaçando o desempenho das
exportações brasileiras.
Outro elemento digno de nota na Tabela 4.6.8 refere-se ao elevado volume de
exportações de couro wet blue para a Itália, o país que se notabiliza pela sofisticação e
importância da indústria de calçados. De um lado, essa situação caracteriza um
posicionamento inadequado do Brasil, reservando as etapas de maior valor agregado e
maiores geradoras de emprego ao país importador. De outro lado, a dependência que a
indústria de calçados italiana tem com relação à matéria-prima brasileira permite o
estabelecimento de estratégias de estrangulamento da oferta de insumos, o que pode
conferir vantagem competitiva à indústria de calçados brasileira.
Tabela 4.6.8Exportação de Couro e Calçados por País: 1997 (em US$)
Couro Calçados TotalPaís wet blue Crust AcabadoEUA 1.019.682 34.179.253 22.220.584 1.044.761.811 1.102.181.330Itália 146.327.047 11.974.478 5.309.037 1.113.177 164.723.739Reino Unido 860.719 2.250.738 6.784.324 110.536.184 120.431.965Hong Kong 28.203.939 11.865.613 47.818.540 9.115.526 97.003.618Portugal 67.568.675 8.973.404 9.263.241 1.809.025 87.614.345Argentina 331.742 808.055 164.962 54.875.760 56.180.519Espanha 48.611.891 4.938.752 1.043.005 604.352 55.198.000Canadá 208.695 1.829.793 5.717.021 47.155.503 54.911.012Países Baixos 7.255.135 12.243.686 8.006.669 16.515.051 44.020.541Alemanha 2.281.058 3.814.668 7.764.815 21.627.774 35.488.315Bolívia - - - 30.984.089 30.984.089Paraguai 3.550.816 - - 25.346.102 28.896.918México 25.795.844 430.861 381.929 2.218.898 28.827.532Coréia do Sul 5.200.630 12.348.772 8.658.945 600.843 26.809.190Chile - - - 21.571.566 21.571.566Austrália 2.070.175 661.310 1.792.746 15.317.267 19.841.498Cingapura 4.155.175 10.210.870 2.356.311 1.275.182 17.997.538França 546.634 465.747 4.490.664 11.570.155 17.073.200Dinamarca - 61.392 3.756.208 12.466.195 16.283.795Rússia - - - 15.990.455 15.990.455Taiwan(Formosa) 7.534.267 738.954 2.653.178 3.187.418 14.113.817China 5.364.248 4.034.774 3.904.305 45.185 13.348.512Japão 6.699.902 2.734.479 80.751 2.651.604 12.166.736Malásia 382.959 1.726.662 9.661.080 76.438 11.847.139Uruguai 327.473 292.074 1.983.546 7.929.349 10.532.442Indonésia 1.213.094 1.488.209 6.963.215 123.741 9.788.259Índia 8.446.461 424.060 882.881 - 9.753.402Africa do Sul 1.163.052 818.820 5.097.615 1.994.540 9.074.027República Tcheca 107.101 71.336 1.184.188 7.260.046 8.622.671Colômbia 1.164.562 20.896 922.619 5.765.196 7.873.273Tailândia 6.151.505 760.976 801.748 101.485 7.815.714Polônia - - - 7.354.689 7.354.689Equador - - - 5.853.689 5.853.689Venezuela 1.931.284 287.758 203.542 3.282.451 5.705.035Perú - - - 4.449.279 4.449.279Panamá - - - 3.877.410 3.877.410Venezuela - - - 3.282.451 3.282.451Arábia Saudita - - - 3.045.819 3.045.819Nova Zelândia - - - 2.931.975 2.931.975Bélgica - - - 2.310.778 2.310.778Subtotal 384.473.765 130.456.390 169.867.669 1.510.978.458 2.195.776.282Outros Países 10.109.523 3.120.391 8.084.303 11.965.425 33.279.642Total 394.583.288 133.576.781 177.951.972 1.522.943.883 2.229.055.924
Fonte: MIC/SECEX