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    o URBANISMO COMO MODO DE VIDA *

    LoUIS WIRTHTraduo de MARINA CORRA TREUHERZ

    I.. A CIDADE E A CIVILIZAOCONTEMPORNEAS

    Da mesma forma como o incio da civilizao ocidental assinalado pela fixao permanente de povos anteriormente'nmades na bacia do Mediterrneo, assim tambm o incio doque pode ser considerado marcante~ente moderno em n?ssacivilizao caracterizado pelo crescimento das grandes CIda-des. Em nenhum lugar do mundo a humanidade se afastoumais da natureza orgnica do que sob as condies de vidacaracter st icas das grandes c.dades. O mundo contemporneoj no mais apresenta o quadro de pequeno~ ,~upos humanosisolados, espalhados atravs de u~. vasto terntor:o, ~o~o Sum-ner descreveu a sociedade primitiva. 1 A caractenstlc~ mar-cante do modo de vida do homem na idade moderna e a suaconcentrao em agregados s'gantescos em torno dos q~ais ~staglomerado um nmero menor de centros e. ~e. on~e irradiamas idias e as prticas que chamamos de civilizao. ,

    O grau em que o mundo contemporneopo.der ser cha-mado de "urbano" no medido inteira ou pre~lsamente ~laproporo da populao total que habita. as c:~ades. As In-fluncias que as cidades exercem sobre a VIda social do home,:nso maiores do que poderia indicar a proporo da populaao "Urbanism as Way of Life", The American Journal of, Soc~o-.Iogy, vol. XLIV, n? 1, Julho de 1938. Copyrigth by The Universty

    - o f Chicago Press.1 William Graham Sumner, Folkways (Boston, 1906). p. 12.

    O URBANISMO COMO MODO DE VIDA 91urbana, pois a cidade no somente , em graus sempre cres-centes, a moradia e o local de trabalho do homem moderno,como o centro in.ciador e controlador da VIda econmica,poltica e cultural que atraiu as localidades mais remotas domundo para dentro' de sua rbita e interligou as diversas reas.os diversos povos e as diversas atividades num universo,

    O crescimento das cidades e a urbanizao do mundo um dos fatos mais notveis dos tempos modernos. Apesar dese r impossvel precisar-se qual a proporo do total estimadoda populao mundial de aproximadamente 1.80J.000.000 que urbana, 69,2% do total da populao dos pases que fazemdistino entre reas urbanas e rurais so urbanos, 2 Almdisso, considerando o fato da populao mundial no ser dis-tribuda uniformemente e do crescimento das cidades no sermu'to desenvolvido em alguns dos pases que s recentementeforam alcanados pela industrializao, essa mdia superestimaa extenso qual chegou a concentrao urbana nos pasesonde o impacto da revoluo industrial foi mais forte e de datamenos recente. Essa mudana de uma sociedade rural parauma predominantemente urbana que se verificou no espao detempo de uma s gerao em reas industrializadas como n05EUA e no Japo foi acompanhada por alteraes profundase em praticamente todas as fases da vida social. So essasmodificaes e suas ramificaes que sol.citam a ateno dosocilogo par o estudo das diferenas entre o modo de vidarural e urbano. O exame dessa questo um pr-requisitoindispensvel para a compreenso e o possvel domnio de al-guns dos problemas contemporneos ma's cruciais da vidasocial, pois provavelmente fornecer uma das perspectivas maisreveladoras para a compreenso das alteraes que se pro-cessam na natureza humana e na ordem social. g- J que a cidade o produto do crescimento e no dacriao instantnea, deve-se esperar que as influncias a~e. elaexerce sobre os modos de vida no sejam capazes de eliminarcompletamente os modos de associao humana que predo-

    2 S, V. Pearson, The Growth and Distr ibution of Populat ion(Nova York, 1935), p. 211.a Embora a vida rural nos EUA tivesse por um longo perodode tempo sido sujeita a considervel interesse por parte dos rgo~governamentais, o caso mais notvel de um relatrio gl~balizante foiaquele submetido pela Country Li je Commission ao presidente Theo-dore Roosevelt em 1909, valendo a pena notar que nenhuma consultaoficial igualmente ampla sobre a vida urbana foi iniciada at o esta-belecimento do Research Committee on Urbanism of the NationalResources Committee. (Cf. Our Cities: Their Role in the NationalEconomy; Washington, Government Printing Office, 1937.)

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    o URBANISMO COMO MODO DE VIDA 9392 o FENMENO URBANQminavam anteriormente. Em maior ou menor escala, portanto,a nossa vida social tem a marca de uma sociedade anterior,de iolk, possuindo os modos caractersticos da fazenda, ?aherdade e da vila. A influncia histrica reforada pela cir-cunstncia da populao da cidade em si ser recrutada, emlarga escala, do campo, onde persiste um modo de vida remi-niscente dessa forma anterior de existncia. Conseqentementeno devemos esperar encontrar variao abrupta e descontnuaentre tipos de personalidades urbana e rural. A cidade e ocampo podem ser encarados como dois plos em. relao. aos,quais todos os aglomerados humanos tendem a se dispor. Visua-lizando-se a sociedade urbano-industrial e a rural de [olk comotipos ideais de comunidades, poderemos obter uma perspectivapara anlise de modelos bsicos de associao humana con-forme aparecem na civilizao contempornea.

    11. UMA DEFINIO SOCIOLGICA DA CIDADE

    corno nico critrio. Alm do mais, no difcil demonstrar-seque comunidades cujo nmero de habitantes se acha abaixodaquele arbitrariamente estabelecido, compreendido dentro daesfera de influncia de centros metropolitanos, podero reivin- 'dicar o reconhecimento como comunidades urbanas com muito.mais razo do que outras maiores, com existncia rna.s isolada,numa rea predominantemente rural. Finalmente, deveria serreconhecido que as definies do recenseamento so indevida-mente influenciadas pelo fato de que a c.dade, em termos-estatsticos, sempre um conceito administrativo no qual oslimites legais desempenham um papel decisivo no delineamentoda rea urbana. Em nenhum lugar nota-se mais claramente essefato do que nas concentraes de populao nas periferias degrandes centros metropolitanos que cruzam limites administra--tivos arbitrrios da cidade, do municpio, do estado e da nao.Enquanto identificarmos o urbanismo com a entidade f--sica da cidade, encarando-o meramente como rigidamente deli-mitado no -espao, e procedermos como se as caractersticas'urbanas cessassem abruptamente de se manifestarem alm dalinha fronteiria arbitrria, provavelmente no chegaremos anenhum conceito adequado de urbanismo como um modo dev.da. Os desenvolvimentos tecnolgicos no transporte e na co-municao, que virtualmente assinalam uma nova poca na his-'tria humana, acentuaram o papel das cidades como elementos,dominantes na nossa civilizao e estenderam ,enormemente omodo de vida urbano para alm dos limites da prpria cidade.A predominncia da cidade, especialmente da grande ci--dade, poder ser encarada como uma conseqncia da con--centrao, em cidades, de instalaes e atividades industriais e-comerciais, financeiras e administrativas, de linhas de trans-porte e comuncao e de equipamento cultural e recreativo-como a imprensa, estaes de rdio, teatros, bibliotecas, museus,-salas de concerto, peras, -hospitais, instituies educacionaissuperiores, centros de pesquisa e publicao, organizaes pro-fissionais e instituies religiosas, e beneficentes. No fossepela atrao e pelas sugestes que a cidade exerce sobre a~ulao rural atravs desses instrumentos, as diferenas entreos modos de vida rural e urbano seriam ainda maiores do que-so. A urbanizao j no denota' meramente o processo pelo, qual as pessoas so atradas a uma localidade intitulada cidadee incorporadas em seu sistema de vida.' Ela se refere tambmjquela acentuao cumulativa da,s caractersticas oue distinguemo modo de vida associado com o crescimento das c'dades e,finalmente, com a,>mudanas de sentido dos modos de vida. reconhecidos como urbanos que so aparentes entre os povos,

    Apesar da importncia preponderante da c'dade em nossacivilizao, nosso conhecimento da natureza do urbanismo edo processo de urbanizao insuficiente. Vrias tentativasforam na verdade feitas para isolar as caractersticas que dis-tinguem a vida urbana. Gegrafos, historiadores, cientistas, eco-nomistas e cientistas polticos incorporaram os pontos de vistadas suas respectivas disc'plnas em definies diferentes dacidade. Embora de nenhum modo se pretenda super-Ias, li !elaborao SOCiolgicade uma abordagem da cidade podercasualmente servir para chamar a ateno para as inter-re-laes entre elas existentes, por meio da nfase dada s carac-ters ticas peculiares da cidade como uma determinada formada associao humana. Uma definio sociologicamente signi-ficativa do que seja cidade procura selecionar aoueles e'ementosdo urban'smo que a marcam como um modo distinto de vidados agrupamentos humanos.Caracterizar uma comunidade como sendo urbana, ape-nas tomando como base o tamanho" obviamente arbitrrio.]j difcil defender a presente definio do recenseamento quedesigna como urbana uma comunidade de 2.500 ou mais ha-bitantes e todas as outras como rurais. A situao seria idn-tica se o critrio fosse de uma populao de 4.000, 8.000,10.000, 25.0800 ou 100.000, pois apesar de nesse ltimo casapodermos sentir que estvamos mais proximamente lidando comum agregado urbano do que seria o caso em comunidades detamanho menor, nenhuma def'nio de urbanismo poder serconsiderada. satisfatria apenas se considerando os nmeros.

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    o FENMENO URBANO

    ~ejam eles quais forem, que tenham ficado sob o encantamentodas influncias que a cidade exerce por meio do poder de suasinstituies e personalidades, atravs dos meios de comunica-o e transporte.

    As deficincias que dizem respeito ao nmero de habi-tantes como critrio de urbanismo se aplicam na sua maioriatambm densidade de populao. Quer aceitemos a densidadede 10.000 pessoas por milha quadrada, conforme props MarkJefferson,4 ou 1.000 que Wilcox 5 preferiu encarar como cri-trio de grupamentos urbanos, est claro que, a no ser que adensidade seja correlacionada com

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    98 o FENMENO URBANOrentes daquelas que inicialmente lhes deram origem e que, con-seqentemente, o modo de vida u.bano poder ser perpetuadosob condies bem diferentes daquelas necessrias para a suaorigem.

    Devemos a esta altura apresentar alguma justificativa paraa escolha dos termos principais que formam a nossa definiode cidade. Foi feita a tentativa de faz-Ia a mais inclusiva eao mesmo tempo a mais significativa possvel, sem, no entanto,sobrecarreg-Ia com suposies desnecessrias. D'zer que sonecessrios grandes nmeros para constituir uma cidade, sig-nifica , evidentemente, grandes nmeros em relao a uma reade ocupao restrita ou de alta densidade. No obstante, hboas razes para se tratar grandes nmeros e densidade comofatores separados, po's cada um deles pode estar ligado a con-seqncias sociais signf'cativamente diferentes. Do mesmoI~odo, a necessidade de se acrescentar homogeneidade quan-tidade de populao, como um critrio necessrio e distinto dourban'smo, poderia ser posta em dvida, porque de se espe-rar que a amplitude de diferenas cresa proporcionalmente quantidade. Em sua defesa, poderamos dizer que a cidadeapresenta uma espcie de grau de heterogeneidade de popula-o que no pode ser de responsabilidade exclusiva da lei dosgrandes nmeros ou no pode ser representada adequadamentepor meio da curva normal de d'stribuio. Como a populaoda cidade no se reproduz a si mesma, ela tem que recrutarseusm'grantes de outras cidades, do interior e - at recen-temente nos Estados Unidos - de outros pases. A cidade temsido, dessa forma, o 'cadinh das raas. dos povos e das cul- 'turas e o mais favorvel campo de Criao de novos hbridosbiolgicos e culturais. Ela no s tolerou como recompensoudiferenas individuais. Reuniu povos dos confins da terra porqueeles so diferentes e, por isso, teis uns aos outros e no porquesejam homogneos e de mesma mentalidade. 10H uma. quantidade de proposies sociolgicas referentes relao entre: a) quantidade de populao; b) densidadeda populao; c) heterogeneidade de habitantes e vida grupal,que podem ser formuladas com base na observao e pesquisa.

    10 Poder parecer necessrio justificar a incluso do termo "per-"manente" na definio. Nossa falha em dar uma justificao extensivapara esta caracterst ica do urbano reside no fato bvio de que, a noser que os grupamento humanos se fixem mais ou menos permanen-temente numa localidade, as caractersticas da vida urbana no podemsurgir, e, concomitantemente, a vida de grandes nmeros de indivduosheterogneos reunidos sob condies densas no possvel sem o de-senvolvimento de uma estrutura tecnolgica.

    o URBANISMO COMO MODO DE VIDA 99Tamanho do Agregado Populacional

    Desde a Poltica de Aristteles, 11 tem-se reconhecido queo aumento do nmero de habitantes de uma comunidade aci-ma de certo limite afetar as relaes entre eles e o carterda cidade. Grandes nmeros envolvem, como j foi dito, umaquantidade maior de variaes individuais. Alm disso, quanto~aior o nmero de indivduos participando de um processo deinterao, tanto maior a diferenciao potencial entre eles. de se esperar que os traos pessoais, as ocupaes, a v.da cul-tural e as idias dos membros de uma comunidade urbanapodero, por isso, variar entre plos mais amplamente sepa-rados do que aqueles de habitantes rurais.Pode-se infer ir , fac ilmente, que tais variaes do origem separao espacial de indivduos de acordo com a cor' he-rana tnica, status econmico e social, gostos e preferncias,Os vnculos de parentesco, de urbanidade e os sentimentos ca-racterst.cos da vida em conjunto durante geraes sob umatradio de folk comum tendero a desaparecer e, no melhordos casos, tendero a ser fracos num agregado cujos membros11 Vide esp. VII. 4. 4-14. Traduzido por B. Jowet, do qual a se-guinte passagem pode ser citada:"Existe um limite para o tamanho dos Estados, assim como hum limite para outras coisas, plantas, animais, implementos; pois ne-nhum destes conserva seu poder natural quando so demasiadamentegrandes ou demasiadamente pequenos, mas ou e.es perdem totalmentesua natureza ou so estragados... (Um) Estado, quando compostode muito poucos, no como um Estado deveria ser, auto-suficiente;quando composto de demais, apesar de auto-suficiente em todas asmeras necessidades, uma nao e no um Estado, sendo praticamenteincapaz de Governo constitucional. Pois quem pode ser o general deuma to vasta multiplicidade, ou quem o arauto, a no ser que eletenha a voz de um Estentor?"Um Estado somente' comea a existir quando alcana uma po-pulao que seja suficiente para uma boa vida na comunidade poltica:poder, na verdade, exceder esse nmero. Mas como eu dizia, devehaver um limite. O que deve ser o limite poder facilmente s ~ r deter-minado atravs da experincia. Porque tanto governantes como gover-nados tm deveres a cumprir; as funes especiais de um governanteso comandar e julgar. Mas se so os cidados de uma comunidadeque devem julgar e distribuir cargos conforme os mritos, ento devemconhecer os caracteres uns dos outros; enquanto no possurem esseconhecimento, tanto a eleio aos cargos como as decises nas causaslegais falharo. Quando a populao muito grande, ter-se- estabe-lecido manifestamente ao acaso, o que no deveria ocorrer. Almdisso, num Estado excessivamente popu.oso, os estrangeiros e os foras-teiros logo adquiriro os direitos de cidadania, pois quem os desco-brir? Claramente, ento, o melhor limite para uma populao de umEstado o maior nmero suficiente para os propsitos da vida e podeser verificado num relance. E basta no que concerne ao tamanho da

    cidade."

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    100 o FENMENO URBANOapresentam origens e formao to diversas. Sob tais circuns--tncias, a concorrncia e os mecanismos formais de controlefornecem os substantivos para os vnculos de solidariedadenos qua.s se confia para se manter unida uma sociedade .defolk.

    O aumento do nmero de habitantes de uma comunidadepara mais de algumas centenas obrigatoriamente limitar a pos-sibilidade de cada um dos membros da comunidade conhecerpessoalmente todos os outros. Max Weber, reconhecend~ osign.ficado social desse fato, salientou que, do ponto de vistasociolgico, os grandes nmeros de habitantes e a densidadedo agrupamento significam que as relaes de conhecimentopessoal mtuo entre os habitantes, inerentes a uma viz.nhana,esto faltando. 1~ O aumento do nmero, pois, envolve umamodificao no carter das relaes sociais.Conforme salienta Simmel:"(Se) o incessante contato externo de uma quantidade depessoas na cidade devesse ser correspondido pelo ~esmo nmerode reaes interiores como numa pequena vila, na qual conhe-cemos quase todas as pessoas que encontramos e com cadauma das quais temos uma relao positiva, estaramos comple-tamente atomizados internamente e cair amos numa condiomental indescritvel". 13 A multiplicao de pessoas num estadode interao sob condies que tornam impossvel seu contatocomo personalidades completas produz aquela segmentao derelaes humanas que tem sido utilizada s vezes por estudiososda vida mental das cidades como uma explicao do carter"esquizide" da personalidade urbana. Isso no quer dizer queos habitantes. urbanos tm menor numero de conhecimentosdo que os habitantes rurais, pois o inverso pode ser realmenteverdadeiro; quer dizer, na verdade, que, em relao ao nmerode pessoas que eles vem e com quem se encontram sistema-tcamente no transcurso da vida diria, eles conhecem umaproporo menor e com estes mantm relaes menos inten-sivas.Caracteristicamente, os cidados encontram-se uns aosoutros em papis bastante segmentrios. Dependem, certamente,de ma's pessoas para as satisfaes de suas necessidades davida do que a populao rural e por isso so associados a umnmero maior de grupos organizados, mas dependem menosde pessoas determinadas, e sua dependncia de outros confi-

    :l2 Op. cit., p. 514.18 Georg Simmel, "Die Grosstdte und das Geisteslehen". DieGrosstdt, ed. Theodor Petermann (Dresden, 1903), pp. 187-206.

    O URBANISMO COMO MODO DE VIDA 101na-se a um aspecto altamente fracionado da esfera de ativi-dades dos outros. Isso essencialmente o que se quer dizerquando se afirma que a cidade se caracteriza mais por contatossecundrios do que primrios. Os contatos da cidade podemna verdade ser face a face, mas so, no obstante, impessoais,supe.fic.ais, transitrios e segment rios. A reserva, a indife-rena e o ar blas que os habitantes da cidade manifestamem suas relaes podem, pois, ser encarados como instrumen-tos para se imunizarem contra exigncias pessoais e expecta-tivas de outros.O superf.cialismo, o anonimato, e o carter transitrio dasrelaes urbano-sociais explicam, tambm, a sotisticao e araconalidade geralmente atribudas ao habitante da cidade.Nossos conhecidos tm a tendncia de manter uma relao deutilidade para ns, no sentido de que o papel que cada umdesempenha em nossa vida sobejamente encarado com ummeio para alcanar os fins desejados. Embora, portanto, o in- \divduo ganhe, por um lado, certo grau de emancipao ouliberdade de controles pessoais e emocionais de grupos ntimos,perde, por outro lado, a espontnea auto-expresso, a moral,e o senso de partic.pao, implcitos na vida numa sociedadeintegrada. Isso constitui essencialmente o estado de ano m ia oude vazio social a que se refere Durkheim ao tentar explicar asvrias formas de desorganizao em soc.edade tecnolgica.O carter segmentrio e as feies ut ilitaristas das rela-es interpessoais na cidade encontram sua expresso insttu-cional na proliferao de trabalhos especializados que vemosna sua forma mais desenvolvida entre as profisses.As operaes do nexo pecunlrio conduzem a relaespredatrias, que tendem a obstruir o funcionamento eficienteda ordem social a no ser que sejam fiscalizadas por cdigosprofissiona.s e tica ocupacional. O estmulo utilidade e efi-cincia sugere a adaptabilidade do mecanismo associativo paraa organizao de empresas nas quais os indivduos s se podemengajar em grupos. A vantagem que a companhia tem sobreo empresrio individual e a empresa composta de dois sciosno mundo urbano-industrial deriva no s da possibilidade queela oferece de centralizar os recursos de milhares de indivduosou do privilgio legal da responsabilidade limitada e sucessoperptua, mas do fato de que a companhia uma entidadeideal.A especializao dos indivduos especialmente em suasocupaes s pode continuar, como salientou Adam Smith, combase num mercado ampliado, o que, por sua vez, acentua adiviso do trabalho. Esse mercado ampliado , somente em

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    102 o FENMENO URBANOparte, suprido pelo interior; em grande parte ele encontradoentre os grandes nmeros que_a prpria cidade contm. A do-minncia da cidade, sobre o interior que a cerca, torna-seexplicvel em termos da diviso do trabalho promovida e oca-sionada pela cidade. O extremo grau de interdependncia e oequilbrio instvel da vida urbana esto intimamente associadoscom a diviso do trabalho e a especializao das ocupaes.Essa interdependncia e instabilidade aumentada pela tendn-cia de-cada cidade em se especializar naquelas funes que lheso mais vantajosas.Numa comunidade composta de grande nmero de indi-vduos que no se conhecem intimamente e cujo nmero excessivo para se reunirem num s lugar, torna-se necessrioefetuar a comunicao por meios indiretos e articular interessesindiv.duais por um processo de delegao. Especificamente nacidade, os interesses so efetivados atravs de representao.O indivduo pouco conta, mas a voz do representante ouvidacom uma deferncia proporcional ao nmero de indivduosem nome dos qua's ele fala. Embora essa caracterizao deurbanismo na medida em que deriva de grandes nmeros noexaure de forma alguma as inferncias sociolgicas que pode-riam ser tiradas do nosso conhecimento das relaes do ta-manho de um grupo com o comportamento caracterstico dosmembros, para no nos alongarmos, as afirmaes feitas po-dero servir para exemplificar a espcie de proposies quepodero ser desenvolvidas.

    DensidadeComo no caso dos nmeros, assim tambm no caso daconcentrao num espaco limitado. emergem certas conseqn-cias relevantes na anlise sociolgica das cidades. Destas, s6podem ser indicadas algumas.Conforme Darwn salientou para a flora e a fauna e con-forme Durkheim 14 notou no caso das sociedades humanas, umaumento numrico para uma rea constante (isto , um cres-cimento da densidade) tende a produzir d'ferenciao e espe-cializao, pois somente dessa forma que a rea poder su-portar o aumento numrico. A densidade. pois, refora o efeitoque os nmeros exercem sobre a divers'ficao dos homens ede suas atividades e sobre o aumento da complexidade daestrutura social.

    14 E. Dnrkheim, De Ia Division du Travail Social (Paris, 1932),p. 248.

    O URBANISMO COMO MODO DE VIDA 103Do lado subjetivo, conforme sugeriu Simmel, o contatofsico estreito de numerosos ind.vduos produz necessariamentea mudana nos rne'os atravs dos quais nos orientamos emrelao ao meio urbano, especialmente em relao aos nossosconcidados, Tipicamente, nossos contatos fs'cos so estreitos,mas nossos contatos sociais so distantes. O mundo urbanotem em alta conta o reconhecimento visual, Vemos o uniformeque denota o papel dos funcionrios e esquecemos as excen-tr.cdades pessoais que se acham ocultas por trs do uniforme.Temos a tendncia de adquirir e desenvolver uma sensib'lidadea um mundo de artefatos e somos progressivamente distancia-dos, cada vez mais, do mundo da natureza.Estamos expostos a vivos contrastes entre esplendor e mi-sria, entre riqueza e pobreza, inteligncia e ignornc'a, ordeme caos. A concorrncia pelo espao grande, de tal forma quecada rea geralmente tende a se ded'car atividade que pro-duza melhor retorno econmico. O local de trabalho tende ase dissociar do local de moradia, pois a proximidade de esta-belecimentos industriais e comere.ais torna uma rea indese-jvel, econmica e socialmente, para fins residenciais.A densidade, os valores da terra, os aluguis, a acessibi-lidade, a salubridade, o prestgio, consideraes estticas, aausncia de inconvenientes tais como barulho, fumaa e su-jeira\ determ'nam a atratividade de vrias reas da cidade comolocais para o estabelecimento de diferentes camadas da popu-lao. O local e a natureza do trabalho, a renda, as caracte-rsticas raciais, tnicas, o status social, os costumes, hbitos,gostos, preferncias e preconceitos esto entre os fatores sig-nificantes de acordo com os quais a populao urbana sele-cionada e distribuda em locais mais ou menos distintos. Ele-mentos populacionais diversos, habitando localidade compacta,

    tendem portanto a se separar uns dos outros na medida emque suas necessidades e modos de vida so incompatveis unscom os outros e na medida em que sejam antagnicos. Domesmo modo, pessoas de status e necessidades homogneos,consciente ou inconscientemente, se dirigem ou so foradaspara a mesma rea.As diferentes partes da cidade, portanto, adquirem fun-es especializadas, A cidade, conseqentemente, tende a pa-.recer um mosaico de mundos soe.ais nos quais abrup~a.,atranscrio de um para o outro. A justificao de petSOiJal1-:.dades e modos de vida divergentes tende a produzir uma pers-pectiva relativista e um senso de tolerncia de diferenas que

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    104 o FENMENO URBANOpodero ser encaradas como pr-requisitos para a racionalidadee que conduzem secularizao da vida. 15

    A vida em contato estreito e o trabalho em comum, deindivduos sem laos sentimentais ou emocionais, desenvolvemum esprito de concorrncia, engrandecimento e exploraomtua. Para neutralizar a responsabilidade e a desordem empotencial, surge a tendncia de se utilizarem controles formais.Sem a aderncia rgida a rotinas previsveis, uma grande so-ciedade compacta dificilmente seria capaz de sustentar a simesma. Q_relgio e o sinal de trnsito simbolizam a base danossa ordem soc:aIIlOmumlouroano. Contato fsico estreitofreqente, aHdo a grande distncia social, acentua a reservade indivduos no-ligados entre si e, a no set que seja com-'Pensada por outras oportunidades de reao; d origem solido.

    O necessrio movimento freqente de um grande nmerode indivduos num habitat congestionado ocasiona atrito e irri-tao. As tenses nervosas que derivam dessas frustraes soacentuadas pelo ritmo acelerado e pela complicada tecnologiasob os quais a vida em reas densas tem de ser vivida.

    H eterogeneidndeA interao social entre uma tamanha variedade de tiposde personalidades num ambiente urbano tende a quebrar arigidez das castas e a complicar a estrutura das classes e por-tanto induz a um arcabouo mais ramificado e diferenciado deestratificao social do que em sociedades mais integradas.A crescida mobilidade do indivduo, que o coloca dentro docampo de estmulos recebidos de um grande nmero de indi-vduos d.ferentes e o sujeita a um status flutuante no seio de

    grupos sociais diferenciados que compem a estrutura socialda cidade, tende para a aceitao da instabilidade e insegu-rana no mundo como norma geral. Esse fato contribui, tam-bm, para a sofisticao e o cosmopolitismo do hab'tante daCidade. Nenhum grupo isolado possuidor da fidelidade exclu-siva do indivduo. Os grupos aos quais ele se acha filiadono se prestam rapidamente a um simples arranjo hierrquico.15 difcil determinar-se a extenso na qual a separao dapopulao em reas cul turai s e ecolgicas distintas e a resultante ati-tude social de tolernci I, raciona.idade e mentalidade secular so funoda densidade em contrnposiao heterogeneidade. Muito provavelmenteestamos aqui lidando com fenmenos que so conseqncia das ope-raes simul tneas de ambos os fatores.

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    O URBANISMO COMO MODO DE ViDA 105Devido aos seus diferentes interesses emanados de diferentesaspectos da v.da social, o indivduo se torna membro de gru-pos bastante divergentes, cada um dos quais funciona somentecom refe.ncia a um segmento da sua personalidade. Nem essesgrupos permitem, facilmente, que seja feito um arranjo con-cntrico de modo a fazer com que o mais estreito se incluana c.rcunerncia dos mais inclusivos, como o que se verificanas comunidades rurais ou em sociedades primitivas. Na ver-dade, os grupos aos quais a pessoa est tipicamente filiada sotangenciais uns aos outros ou se entrecortam de forma alta-mente varivel.A substituio dos membros do grupo , geralmente, r-pida, em parte como resultado da liberdade de circulao dapopulao e em parte como resultado de sua mobilidade social.O local de residncia, o local e a caracterstica do emprego,a renda e a receita, flutuam, e o trabalho de manter juntas asorganizaes e de promover relaes de amizade ntimas e du-radouras entre os membros difcil. Isso se aplica notavel-mente s reas situadas dentro da cidade, nas qua.s as pessoasse segregam mais em virtude de diferena de raa, lngua, rendae status social do que atravs de escolha ou atrao positivaa pessoas como elas mesmas. Em geral, o habitante da cidadeno o proprietrio da sua prpria casa e, considerando queuma permanncia transitria no gera tradies e sentimentosde unio, s raramente ele um vizinho na verdadeira expres-so da palavra. H poucas oportunidades para o indivduoconseguir um conceito do que seja cidade como um todo oupara examinar o seu lugar no esquema geral. Conseqente-mente, difcil para ele determinar o que lhe seja "mais con-veniente" e decid.r entre os assuntos e os lderes que lhe soapresentados pelas agncias de sugesto das massas. Os indi-vduos que integram a sociedade compem as massas fluidasque tornam to imprevisvel e, portanto, to problemtico ocomportamento coletivo na comunidade urbana.Apesar da cidade, atravs do recrutamento de tipos va-riados para executar seus diversos trabalhos, e da acentuaode seu carter sui generis atravs da concorrncia e do prmiopela excentricidade, novidade, desempenho efic'ente e inventi-vidade, produz.r uma populao altamente diferenciada, elatambm exerce uma influncia niveladora. Onde quer que es-tejam concentradas grandes quantidades de indivduos de cons-tituies diferentes, entra tambm o processo de despersonali-zao. Essa tendncia niveladora interente, em parte, baseeconmica da cidade. O desenvolvimento das grandes cidades,pelo menos na era moderna, repousa em larga escala so bre a

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    106 o FENMENO URBANOfora concentradora do vapor. O crescimento -da fbrica pos-sibilitou a produo em massa para um mercado impessoal.A mxima explorao das poss.bilidades da diviso do trabalhoe da produo em massa s possvel, porm, com a padro-nizao de processos e produtos. Uma economia monetriacaminha lado a lado com esse sistema de produo. Progressi-vamente, medida que as cidades se desenvolveram baseadasnesse sistema de produo, o nexo pecunirio que implica apossibilidade de aquisio de bens e servios deslocou as re-laes pessoais como base de associao. Nessas circunstncias,a individualidade deve se r substituda por categorias. Quandograndes nmeros de indivduos tm de fazer uso comum defacilidades e instituies, deve ser feito um arranjo a fim deajustar as facilidades e instituies s necessidades da mdiadas pessoas e no s de determinados indivduos. Os serviosde unidade pblica, das instituies recreativas, educacionais eculturais devem ser ajustados s necessidades coletivas. Domesmo modo, as insti tuies culturais, tais como as escolas, os - Icinemas, o rdio e os jornais, em virtude de sua clientelaoriunda das massas, devem necessariamente operar como in-fluncias niveladoras. O processo polt ico conforme aparecena vida urbana no poderia ser entendido sem levarmos emconta os apelos massa por meio das modernas tcnicas depropaganda. Se o indivduo participar de qualquer forma navida social, polt ica e econmica da cidade, dever subordinarum pouco de sua individualidade s exigncias da comun'dademaior e nessa medida fazer parte de movimentos coletivos.IV. A RELAO ENTRE A TEORIA DO URBANISMO E A PESQUISA

    SOCIOLGICAPor meio de um corpo terico como o delineado ac'ma

    para fins ilustrativos, o complicado e multilateral fenmeno dourbanismo poder ser analisado em termos de um nmero li-mitado de categorias bsicas. A abordagem sociolgica da ci-dade adquire, portanto, uma unidade essencial e coerncia,possibilitando ao investigador emprico no somente focalizarmais distintamente os problemas e processos que pertencemapropriadamente ao seu campo, mas tambm tratar o seu as-sunto de maneira mais integrada e sistemtica. Algumas dasverificaes tpicas da pesquisa emprica no campo do urba-nismo, com especial referncia aos EUA, podero ser indi-cadas para provar as proposies tericas estabelecidas nas p-ginas anteriores, podendo-se esboar alguns dos problemascruciais para posterior estudo.

    O URBANISMO COMO MODO DE VIDA 107Com base nas trs variveis, nmero, densidade do agru-pamento e grau de heterogeneidade da populao urbana, pa-rece possvel explanarem-se as caractersticas da vida urbanae explicarem-se as -diferenas entre cidades de vrios tamanhose tipos.O urbanismo como um modo de vida caracterstico podeser abordado empiricamente de trs perspectivas inter-relacio-nadas: 1) como uma estrutura fsica consistindo uma base depopulao, uma tecnologia e uma ordem ecolgica; 2) comoum sistema de organizao social envolvendo uma estruturasoc.al caracterstica, uma srie de instituies sociais e ummodelo 'tpico de relaes sociais; 3) como um conjunto deatitudes de idias e uma constelao de personalidades dedi-cadas a formas tpicas' do comportamento coletivo e sujeitasa mecanismos caractersticos de controle social.

    o Urbanismo na Perspectiva EcolgicaConsiderando que, no caso da estrutura fsica e dos pro-cessos ecolgicos, somos capazes de operar com ndices bas-

    tante objetivos, possvel chegarmos a resultados bem precisose geralmente quantitativos, A "dominncia" da cidade sobreo hinterland torna-se explicvel atravs das caractersticas fun-cionais da cidade que derivam em grande parte do efeito dosnmeros e da densidade. Muitas das instalaes tcnicas e dasespecializaes e organizaes que surgem da vida urbana spodero crescer e prosperar em cidades onde a procura sejasuficientemente grande. A natureza e mbito dos servios pres-tados por essas organizaes e instituies e as vantagens deque elas gozam sobre as instalaes menos desenvolvidas decidades menores do margem dominncia das cidades e dependncia de regies cada vez mais vastas em relao metrpole central.A composio da populao urbana mostra a atuao defatores seletivos e diferenciadores. As cidades contm uma pro-poro maior de pessoas jovens do que as reas rurais, ondese nota uma predominncia de pessoas de idade e de crianas.Nesse aspecto, como em muitos outros, quanto maior a cidade,tanto mais aparente essa caracterstica especfica do urba-nismo. Com exceo das maiores cidades, que atraram grandenmero de estrangeiros homens, e em alguns tipos especiaisde cidades, h uma predominncia numrica de mulheres sobreos homens. A heterogeneidade da populao urbana tambmassinalada por linhas raciais e tnicas. Os estrangeiros e seusfilhos constituem aproximadamente dois teros de todos os ha-I

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    108 o FENMENO URBANObitantes de cidades com um milho ou mais de habitantes. Suaproporo na populao urbana =v= m~da que d.:~inuio tamanho da cidade, at que nas areas rurais eles participamsomente com um sexto. do total da populao. *

    Da mesma forma, as cidades maiores atraram mais ne-gros e outros grupos raciais do que as comunidade~ peq~en~s.Considerando que a idade, o sexo, a raa e a or:gem etn:case acham associados com outros fatores como ocupao e inte-resse, verifica-se claramente que uma das caractersticas prin-cipais do habitante urbano a sua dessemelhana d~s seusconcidados. Nunca dantes tantos povos de traos diversos,como o caso das nossas c.dades, foram aglomerados em con-tato fsico to estreito como nas grandes cidades da Amrica.As cidades, em geral, e as americanas em particular, so for-madas de uma gama heterognea de povos e culturas, de ~o-dos de vida altamente diferenciados entre os quais muitasvezes h apenas um mnimo de comun.cao, a maior dasindiferenas e a maior tolerncia, por vezes rdua luta, massempre o contraste mais marcante.

    A falha da populao urbana em se reproduzir parece seruma conseqncia biolgica de uma ~0':Ilbinao d: fatores nocomplexo da vida urbana, e o declnio da natal:dade pode.geralmente, ser encarado como um dos sinais mais mar~antesda urbanizao do mundo ocidental. Embora a proporao debitos nas cidades se apresente ligeiramente maior do que nocampo, a diferena fundamental entre a falha das cidades dosnossos dias e das cidades do passado em manterem a sua po-pulao que no passado o motivo. est~ya na alta. taxa demortalidade nas cidades, enquanto hoje, ja que as Cidades setornaram mais habitveis do ponto de vista de sade, o fatose deve baixa natalidade, Essas caractersticas biolgicas dapopulao urbana so sociologicamente significantes, no s0-mente porque refletem o modo urbano de existncia, m~s .taII.t-bm porque condicionam o crescimento e a futura dom:nanc:adas cidades e sua organizao social bsica. Considerando queas cidades so consumidoras e no produtoras de homens, ovalor da vida humana e a avaliao social da personalidadeno deixaro de ser afetados pelo saldo entre nascimentos ebitos. O padro de aproveitamento da terra, de valor da terra.aluguis e propriedade, a natureza e o funcionamento das estru-turas fsicas, da habitao, dos meios de transporte e comu-nicao, das utilidades pblicas - essas e muitas outras fases

    * N. do' Org. - ~ preciso no esquecer que essas observaes SC )referem aos Estados Unidos na dcada de 30.

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    O URBANISMO COMO MODO DE VIDA 109do mecanismo fsico das cidades no so fenmenos isoladossem relao com as cidades como entidade social, porm soafetadas e afetam o modo de v.da urbano.o Urbanismo como Forma de Organizao SocialOs traos caractersticos do modo de vida urbano tmsido descritos sociologicamente como consistindo na substitui-o de contatos pr.mrios por secundrios, no enfraquecimentodos laos de parentesco e no declnio do significado social dafamlia, no desaparecimento da vizinhana e na corroso dabase tradicional da solidariedade soc.al. Todos esses fenmenospodem ser veri ficados substancialmente atravs de ndices obje-tivos. Assim, por exemplo, as baixas e declinantes taxas dereproduo urbana sugerem que a cidade no conduz ao tipotradicional de vida familiar, inclusive a educao de crianase a manuteno do lar como local em tomo do qual giram asatividades vitais. A transferncia de atividades industriais, edu-cacionaise de recreao, para instituies especializadas forado lar, privou a famlia de algumas das suas funes histricasma's caractersticas. Nas cidades, mais provvel que as mesestejam empregadas, mais freqentemente h inqui linos nascasas de famlia, os casamentos tendem a ser retardados e aproporo de pessoas solteiras e no-comprometidas maior.As famlias so menores e mais freqentemente sem filhos doque as famlias do campo. A famlia como unidade social estemancipada do grupo de parentesco maior, caracterstico docampo, e os membros individuais seguem os seus prprios inte-resses divergentes na sua vida vocac.onal, educacional, religiosa,recreat iva e pol tica.Funes tais como a preservao da sade, os mtodos de

    aliv'ar os sofrimentos associados com a insegurana pessoal esocial, provises para melhoria da educao, da recreao eda cultura, deram or.gem a instituies altamente especializadasnum mbito comunitrio, estadual e mesmo nacional. Os mes-mos fatores que trouxeram maior insegurana pessoal tambmso responsveis pelos contrastes cada vez maiores entre indi-vduos, existentes nomundo urbano. Embora a cidade tenhaderrubado as rgidas l.nhas de casta da sociedade pr-indus-trial, aguou e diferenciou grupos de rendas e status. Geral-mente, h uma proporo maior de adultos da populaourbana ~em empregados do que adultos da populao rural.A classe dos "trabalhadores de gravata", comprendendo-secomo tais os empregados comerciais, bancrios e burocratas,

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    110 o FENMENO URBANO proporcionalmente mais numerosa nas gr.andes cidades, noscentros metropolitanos e nas pequenas c:dades do que nocampo.Como um todo, a cidade desencoraja uma. vida econmicana qual o indivduo, numa poca de cris~, tenha uma ba~ede subsistncia qual recorrer, e desencoraja o e~prego a~to-nomo. Se bem aue as rendas dos habitantes das cidades sejammaiores, em mdia, do que as do interior, parece,q~e o custode vida maior nas cidades maiores. A casa propna envolvemaiores nu s e mais rara. Os aluguis so maiores e absor-vem uma proporo maior da receita. Ap:sar do habi~ante dacidade se ve: beneficiado com muitos servios comunais, gasta. uma grande proporo da sua renda com itens como recreaoe aperfeioamento da educao e uma propo~o me_nor comalimentos. Aquilo que os servios da comun:dade nao of~re-cem, o habitante urbano obrigado a comprar, e pode-se dizerque praticamente no existe nenhuma necessidade humana quedeixou de ser explorada pelo comercialismo. Fornecer emo-es e meios de escapar ao tdio, monotonia e ~ rotina tor-na-se, pois, uma das principais funes da recreaao urbana, aqual, na melhor das hipteses, fornece meIOSpara a auto-ex-presso criadora e a associao espontnea dos grupos, masque, mais tipicamente no mundo urba~o, !esulta em ~o,nt.em-plao passiva, por um lado, ou sensac.onais faanhas inditas,por outro. . .Reduzido a um estgio de virtual impotncia como indi-vduo, o habitante urbano esfora-se para fazer parte de ~u-pos organizados de interesses s~~elh~ntes para o~ter _seus ~ms.Isso resulta numa enorme multplcao de orgamzaoes vo.un-trias com um nmero de objetivos to variados quanto asnecessidades e interesses humanos. Embora de um lado os laosde associao humana estejam enfraquecidos, a existncia ur-bana envolve um grau de interdependn~i~ maior ,e~tre o~ ho-mens e uma forma ma's complicada; frgil e voltil de nter-relaes mtuas sobre muitas fases das quais o indivduo .~omotal no consegue exercer quase .nen~um controle. F~e~uente-mente h apenas uma relao muito tenue entre a poSI~Oec

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    112 o FENMENO URBANCObviamente, portanto, nas tendncias emergentes nosistema de comunicao e na tecnologia de produo e dis-tribu.o surgida na civilizao moderna que devemos procuraros sintomas que iro indicar o provvel desenvolvimento futurodo u.banismo como modo de vida. O sentido das atuais modi-ficaes no urbanismo transformaro, para o bem ou para .0mal, no somente as cidades, mas o mundo. Alguns dos mais

    bsicos desses fatores ou processos e as possibilidades de dire-o e controle deles so um convite para estudo mais deta-lhado.Somente na medida em que o sociolgo tiver uma com-preenso clara do que seja a cidade como entidade social epossuir uma teoria razovel sobre urbanismo, podei'~ e'e ~e-senvolver um corpo unificado de conhecimentos, POiS aqu:loque passa por "Sociologia Urbana" certamente no o atual-mente. Se se tomar como ponto de partida uma teoria sobreurbanismo como a delineada nas pginas anteriores, a serelaborada, testada e revista' luz de mais anlises e pesquisaemprica, pode-se esperar que seja determinado o critrio derelevncia e validade de dados concretos. Esse sortimento he-terogneo de informaes separadas que foram incorporadasem tratados de Sociologia sobre a cidade poder, ass'm, serfiltrado e incorporado num corpo coerente de conhecimentos,A propsito, somente por meio de uma teoria desse tipo, osocilogo escapar da ftil prt'ca de enunciar, em nome dacinc'a sociolgica, uma variedade de julgamentos, s vezesinsusctveis, relativos a problemas tais como pobreza, habi-tao, planejamento urbano, higiene; administrao municipal,polic'amento, mercadologia, transporte e outros itens tcnicos.Embora o sociollogo no possa solucionar qualquer dessesproblemas prticos - pelo menos no por si s - ele poder,se descobrir sua funo apropriada, constribuir para a suacompreenso e soluo. As perspect ivas de. faz-lo so maisclaras atravs de uma abordagem geral, terica, do que poruma abordagem ad hoc.

    SUMRIOA urbanizao do mundo, que um dos fatos mais not-veis dos tempos modernos, trouxe modif'caes profundas empraticamente todas as fases da vi~a social. A recente e rpidaurbanizao nos Estados Unidos responsvel pela a~de~ados nossos problemas urbanos e pela nossa falta de consciencradeles. Apesar do predomnio do urbanismo no mundo ~odern?,

    ainda sentimos falta de uma definio sociolgica do que seja

    o URBANISMO ~OMO MODO DE VIDAcidade, a qual levaria em conta, adequadamente, o fato de que,enquanto a cidade o local caracterstico do urbanismo, omodo de vida urbano no se confina s cidades. Para finali-dades sociolgicas, uma cidade uma fixao relativamentegrande, densa e permanente de indivduos heterogneos. Osgrandes nmeros so responsveis pela variabilidade indivi-dual, pela relativa ausncia de conhecimento pessoal ntimo,pela segmentao das relaes humanas as quais so em grandeparte annimas, superficiais e transitrias e por caractersticascorreia tas. A densidade envolve diversificao e especializao,a coincidncia de contato fsico estreito e relaes sociais dis-tantes, contrastes berrantes, um padro complexo de segregao,a predominncia do controle social formal, e atrito acentuado,entre outros fenmenos. A heterogeneidade tende a quebrarestruturas sociais rgidas e a produzir maior mobilidade, insta-bi lidade e insegurana, e a fi liao de indivduos a uma varie-dade de grupos sociais opostos e tangenciais com um alto graude renovao dos seus componentes. O nexo pecunirio tendea deslocar as relaes pessoais, e as instituies tendem aatender s necessidades das massas em vez do indivduo. Oindivduo, portanto, somente se torna eficaz atravs de gruposorganizados. O complexo fenmeno do urbanismo poder apre-sentar unidade e coerncia se a anlise sociolgica se fizer luz de tal corpo terico. A evidncia emprica referente Ecologia, Organizao Social e Psicologia Social do modode vida urbano confirma a eficcia dessa abordagem.

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