5- Sensores Dos Marcapassos Cardíacos Artificiais

download 5- Sensores Dos Marcapassos Cardíacos Artificiais

of 5

Transcript of 5- Sensores Dos Marcapassos Cardíacos Artificiais

  • 7/25/2019 5- Sensores Dos Marcapassos Cardacos Artificiais

    1/5

    89Revista da SOCERJ - Abr/Mai/Jun 2002

    O corao promove a variao de seu dbitosistlico por aumento da sua pr-carga, aumentoda fora de contrao e aumento da frequnciacardaca. Destas trs variveis, a frequnciacardaca aquela capaz de ser modificada maisrapidamente durante uma nova situaometablica, como, por exemplo, correr. A corretaadequao deste mecanismo regulatrio permite

    um incremento de at 40% do dbito cardaco em3 batimentos cardacos durante o exerccio fsicovigoroso 1.

    A necessidade da modulao da frequncia cardacafoi, portanto, muito cedo percebida pela cincia daestimulao cardaca artificial. Uma excelentemaneira de lidar com esse problema foi o adventodos marcapassos bicamerais, capazes de sentir aresposta sinusal e promover a contrao ventricularcorrespondente. O problema que freqentementenos distrbios do rimo cardaco, o ndulo sinusalapresenta tambm disfuno, gerando respostas

    inadequadas demanda metablica do organismo.Para tal era necessrio o desenvolvimento de umsensor, capaz de informar ao marcapasso anecessidade de alterao de sua frequncia deestimulao. acerca das caractersticas dessessensores que trataremos aqui.

    Sistemas Biolgicos de Sinalizao

    O corao, como qualquer componente de umsistema biolgico, necessita alterar sua respostafrente a uma srie de fatores. Os organismos

    vivos desenvolveram complexos sistemas deregulao baseados em sensores para diversosparmetros e controles baseados em alas defeedbackpositivo e negativo 2.

    Os sistemas biolgicos trabalham utilizando umsistema de controle chamado de ala fechada. Umsistema de ala fechada onde o prprio produtodesse sistema controla negativamente sua produo.Tomemos como exemplo a regulao da funotireoideana.

    Nesse tipo de sistema de controle, o prprio produtofinal (hormnio tireoidiano) controla a suaproduo. Um sistema deste tipo requer muitopouca ou nenhuma interferncia externa.

    A maioria dos marcapassos em uso atualmenteutiliza um sistema de ala aberta, em que o produtofinal desse sistema (freqncia cardaca) nocontrola o parmetro utilizado para determinar sua

    alterao. Vejamos como exemplo o marcapassocom sensor de movimento ou atividade.

    5Artigo de

    Reviso

    Sensores dos marcapassos cardacos artificiais

    Nilson Araujo de Oliveira Junior, Washington Maciel,Eduardo Andra, Luiz Gustavo Belo de Moraes,

    Hecio Carvalho e Jacob Ati

    Hospital Universitrio Clementino Fraga Filho UFRJClnica So Vicente

  • 7/25/2019 5- Sensores Dos Marcapassos Cardacos Artificiais

    2/5

    90 Vol XV No2

    Como vemos, nesse sistema o movimento do corpodetectado pelo sensor informa ao marcapasso queele deve aumentar a freqncia cardaca, porm esteaumento de freqncia no inibe o sensor demovimento, ento, enquanto houver movimento,haver aumento progressivo da freqncia cardaca.Logo necessria a presena de interferncia externa

    (mdico) que determina no programa do marcapassoqual a freqncia mxima que este atingir, mesmoque continue o estmulo (movimento) 3.

    Apesar de um sistema de ala fechada serteoricamente ideal, por que a maioria dos sistemasutiliza a ala aberta? Para entender isso temos deentender um pouco sobre a modulao fisiolgicada freqncia cardaca.

    Modulao Fisiolgica da FreqnciaCardaca

    O corao tem como funo primordial promovero dbito cardaco adequado s demandasmetablicas do organismo. Para tal necessrio umsistema de monitorizao destas demandas e issose faz atravs de uma complexa interao entre osistema nervoso autnomo, o sistema nervosocentral e o sistema endcrino e parcrino.

    Exerccio, mudanas posturais, emoo, estado psprandial, respostas vagais, alteraes circadianas efebre so situaes que modificam a resposta do

    ndulo sinusal4

    . Em ltima anlise, todos essesfatores regulatrios sinalizam algo em comum:alterao no consumo de oxignio pelos tecidos(VO2). fcil, portanto, intuir a dificuldade de seconstruir um sensor artificial ideal para substituirtodas essas aferncias de resposta regulatria 5.

    O sensor artificial ideal

    Um sensor artificial ideal para um marcapasso devesubstituir completamente a funo cronotrpica dondulo sinusal. Portanto ele deve exibirproporcionalidade s alteraes de VO

    2, cintica da

    resposta igual a do ndulo sinusal, sensibilidade atodos os fatores que alteram a VO2 e especificidade,sendo insensvel a fatores no relacionados sua

    funo. Ainda h necessidade de se respeitar fatoresde ordem prtica, como tamanho, durabilidade,consumo de energia e preo.

    Tendo esses conceitos em mente, vamos analisar ossensores mais comuns presentes nos marcapassosatuais, suas vantagens e limitaes.

    Sensores de Atividade e Acelermetros

    Sem dvida o tipo de sensor mais utilizado. Vriosfatores contriburam para seu largo uso como: custo,baixo consumo de bateria, possibiliade de uso comqualquer tipo de cabo de estimulao, alm doconceito de um sensor de atividade ser de fcilcompreenso, tanto pelos mdicos como pelos

    pacientes.

    Existem vrios tipos de mecanismos para detectaratividade (entendemos aqui atividade pormovimento do corpo). O mais utilizado atualmenteso os sensores de cermica piezoeltrica 6. Ummaterial piezoeltrico aquele capaz de gerar umacorrente eltrica caso seja submetido a um esforomecnico. So muito utilizados em aparelhoseletrnicos e por isso tem baixo custo.

    Os sensores piezoeltricos so colocados na carcaado marcapasso. Durante o movimento, ondas devibrao atingem o marcapasso, ocasionado pressosobre este sensor e este gerar uma quantidade decorrente proporcional 7(Figura 2).

    Figura 2Marcapasso com sensor de atividade. O sensor montado nacarcaa do marcapasso sofre vibrao do tecido subjacentedurante o movimento, gerando corrente eltrica. A intensidade

    da corrente gerada proporcional quantidade de vibrao(movimento).

  • 7/25/2019 5- Sensores Dos Marcapassos Cardacos Artificiais

    3/5

    91Revista da SOCERJ - Abr/Mai/Jun 2002

    Um dos problemas deste tipo de sensor que aquantidade de presso exercida sobre o sensor irvariar dependendo da massa de tecido subjacentea este, logo a intensidade de resposta tambm

    variar. Uma maneira de se minimizar esta varivelfoi adotada por alguns marcapassos, em que osensor est suspenso dentro da carcaa deste,acoplado a um peso de massa constante. Esse pesoexerce presso sobre o sensor durante o movimentodevido a sua fora inercial, porm, como a massaagora constante, a resposta torna-se proporcionalapenas acelerao do corpo. A este sistemachamamos acelermetro.

    Apesar se todas essas vantagens, os sensores deatividade so tipicamente sistemas de ala aberta,

    como j discutimos. A quantidade de movimentono totalmente proporcional demandametablica. Para adequar essa varivel medida correta resposta de freqncia do miocrdio necessria a interveno de um operador externo(mdico) atravs de parmetros programveis deresposta. Dizendo de outra forma, a resposta dosensor precisa ser traduzida para o estimuladorcardaco atravs uma curva sensor-resposta e essacurva tem de ser modificvel para permitir aadequao desta resposta para cada paciente emparticular. Os parmetros mais comuns deprogramao deste tipo de marcapasso so:8

    Limiar (threshold) Define o nvel mnimo deestmulos sensados que devem ser excedidospara gerar a resposta do marcapasso. Se o limiarfor muito baixo, qualquer mnima atividadegerar resposta; se muito alto, somenteatividades vigorosas geraro resposta.

    Frequncia mxima do sensor - Limita a respostaa uma frequncia mxima. Impede queestimulao muito vigorosa do sensor eleve afrequncia a nveis indesejados.

    Resposta - Fator que correlaciona o nvel deresposta do marcapasso atividade mensurada

    pelo sensor. Este parmetro controla aproporcionalidade da resposta do macapasso atividade exercida pelo paciente.

    Tempo de Resposta - Determina quorapidamente o marcapasso atingir a frequnciaadequada atividade mensurada pelo sensor.Este parmetro garante uma resposta deacelerao gradual e fisiolgica.

    Tempo de recuperao - Determina uma curvade reduo gradual da frequncia cardaca, umavez cessada a atividade. Este parmetro evitaquedas abruptas da freqncia cardaca.

    Fica claro que devido a suas carcatersticas, o sensorde atividade pode apresentar respostasinadequadas, como, por exemplo, em pacientes

    expostos a ambientes com intensa vibrao externa(operadores de mquinas pesadas), caractersticasdo terreno por onde o paciente se exercita (exercciocom bicicletas estticas geram menos resposta do

    que andar de bicicleta na rua), colocao do sensorsubpeitoral por compresso da caixa torcicadurante a respirao, entre outros. A maioria destesproblemas pode ser superado com corretaprogramao do sensor.

    Sensores de Volume-Minuto

    Historicamente, a mensurao da respirao foireconhecida como um dos primeiros parmetroscandidatos a realizar o controle da freqncia demarcapassos definitivos. Em 1982, Rossi e

    colaboradores desenvolveram um dos primeirosmarcapassos capazes de produzir uma resposta defreqncia por deteco dos movimentosrespiratrios. Em verdade, os sensores demovimento advieram de pesquisas para sensoresde movimento da caixa torcica, porm logo sedescobriu que o rudo gerado pelo movimentodo corpo era mais facilmente mensurvel e eficazcomo regulador da variao da freqncia cardaca.

    Modernamente, os marcapassos medem o volumeminuto atravs de medidas de bio-impedncia. Otrax apresenta-se eletricamente como um meioresistivo corrente eltrica; como a impedncia deum sistema eltrico inversamente proporcional aovolume do meio condutor, as alteraes nestaimpedncia, no caso da caixa torcica, estaroligadas ao movimento respiratrio. Logo possivelaferir estas mudanas de impedncia geradas porsinais eltricos deflagrados pelo marcapasso, semnecessidade de eletrodos ou sensores especiais.

    Apesar de confiveis, simples e de baixo consumo,os sensores de volume minuto apresentamalgumas caractersticas que limitam seu uso. 10

    Primeiramente, possuem um tempo de respostalento, o que os tornam pouco adequados durante oincio de um exerccio; depois a variao dafreqncia respiratria e da freqncia cardaca nopossuem uma correlao linear, necessitando deuma correo atravs do software interno dosmarcapassos; ltimo, pacientes com doenasrespiratrias podem ter respostas no fisiolgicas(embora alguns autores relatem que isto no seriaum problema) e por fim, em raros pacientes,respostas anmalas de mecanismo no bemestabelecido podem ocorrer.

    Por estes motivos, tem havido uma tendncia ao usode marcapassos com sensores mistos,principalmente de atividade e de volume minuto.

  • 7/25/2019 5- Sensores Dos Marcapassos Cardacos Artificiais

    4/5

    92 Vol XV No2

    Atravs de software, h tanto o cross-checkingda resposta de cada sensor, gerando correes a

    eventuais respostas indevidas, como o peso decada sensor durante o exerccio varia (ver figura 3),gerando uma resposta mais fisiolgica aoexerccio 11.

    Programando marcapassos com controlede freqncia

    O uso de testes ergomtricos muito til paraavaliar a adequao da resposta de freqncia demarcapassos. Esta aferio tanto pode ser realizadade uma maneira formal com uso de protocolosestandartizados, com estimativa do limiaranaerbico, etc. Apesar desta ser a maneira maiscientfica, freqentemente as clnicas demarcapasso utilizam avaliaes informais,usando diferentes protocolos capazes de seremutilizados no prprio ambulatrio de marcapasso,ou uso de critrios empricos.12

    Qualquer que seja o critrio utilizado, importantedurante o seguimento destes pacientes acessar ahabilidade para execuo das tarefas dirias einterpretar os histogramas de ativao.13 A presenade uma concentrao de batimentos em zonasextremas de freqncia pode ser indicativo deover ou undersensing do sensor modulador da

    freqncia.

    Tabela 1

    Parmetro Marcapasso Fabricante

    Resposta ventricular evocada Precept Guidant

    Diplos, Inos2 BiotronikQT evocado TX, Quintech, Vitatron

    RhytmxTemperatura Kelvin 500 Cook

    Thermos Biotronik

    Delatatrax 2503 MedtronikSvO2 Oxypace Medtronik

    Outros Sensores Moduladores daFreqncia Cardaca

    Muitos tipos diferentes de sensores foram testados,porm no ganharam grande aceitao devido aocusto elevado, baixa confiabilidade, ao consumoelevado de bateria e a outros fatores. A Tabela 1mostra alguns dos tipos de sensores testados 14.

    Atualmente, algum interesse tem sido despertadopelos sensores de resposta ventricular evocada.Modernos marcapassos dotados destes sensores tmdemonstrado ser confiveis e com consumoadequado da bateria. Como baseado na captao

    da resposta evocada ventricular, o que guardacorrelao com o potencial de ao cardaco, estetipo de sensor permite o uso de uma tecnologia demalha fechada 15. Em teoria, desnecessriaqualquer programao e permite uma adequaoindividulizada automtica para cada paciente. Estesistema possui ainda a vantagem de reagirrapidamente a alteraes autonmicas do corao,sendo capazes de reagir a emoes, testes de clculoe de memria de maneira muito prxima fisiolgica. A tecnologia de malha fechada veiosolucionar o problema de programao destessensores, que em geral resultava trabalhoso edemorado.

    Concluso

    A resposta de freqncia veio acrescentar um ganhode qualidade estimulao cardaca artificial,permitindo uma substituio fisiolgica da funodo sistema excitocondutor do corao. Aincorporao de novos softwares confiveis e cadavez mais prximos aos sistemas de controlefisiolgicos do organismo acarretaro respostas de

    freqncia cada vez mais adequadas s demandasmetablicas do organismo, com programabilidadee seguimento cada vez mais simples e rpidos. Sem

  • 7/25/2019 5- Sensores Dos Marcapassos Cardacos Artificiais

    5/5

    93Revista da SOCERJ - Abr/Mai/Jun 2002

    dvida a tecnologia dos sensores ir evoluir para amensurao fiel de parmetros do estado inotrpicoe autonmico do corao. Quem sabe, em um futuroprximo, ultrapassem a mera funo de alterar a

    freqncia de estimulao dos marcapassos,tornando-se armas diagnsticas para o seguimentoda teraputica da insuficincia cardaca, da rejeiode transplantes e de outros estados mrbidos docorao.

    Referncias:

    1. Staniforth AD, Andrews R, Harrison M, Perry A,Cowley AJ. Value of improved treadmill exercisecapacity: lessons from a study of rate responsive

    pacing. Heart. 1998 Oct; 80(4):383-6.2. Werner J, Hexamer M, Meine M, Lemke B. Restorationof cardio-circulatory regulation by rate-adaptivepacemaker systems: the bioengineering view of aclinical problem. IEEE Trans Biomed Eng 1999 Sep;46(9):1057-64.

    3. Strobel JS, Kay GN. Programming of sensor drivenpacemakers. Cardiol Clin 2000 Feb; 18(1):157-76, ix.

    4. Kimmerly DS, Shoemaker JK. Hypovolemia andneurovascular control during orthostatic stress. :Am J Physiol Heart Circ Physiol 2002 Feb;282(2):H645-55.

    5. Katritsis D, Shakespeare CF, Camm AJ. New andcombined sensors for adaptive-rate pacing. ClinCardiol 1993 Mar; 16(3):240-8.

    6. Roberts DH, Baxter SE, Brennan PT, Gammage MD.Comparison of externally strapped versus implantedaccelerometer- or vibration-based rate adaptivepacemakers during various physical activities. PacingClin Electrophysiol 1995 Jan; 18(1 Pt 1):65-9.

    7. Alt E, Matula M, Theres H, Heinz M, Baker R. Thebasis for activity controlled rate variable cardiacpacemakers: an analysis of mechanical forces onthe human body induced by exercise and

    environment.: Pacing Clin Electrophysiol 1989 Oct;12(10):1667-80.

    8. Greco EM, Guardini S, Ferrario M, Romano S. Howto program rate responsive pacemakers. Pacing ClinElectrophysiol 2000 Feb; 23(2):165-73.

    10. Ellenbongen K. Wilkoff B. Clinical Cardiac pacing andDefibrillation pp 272 W.B. Saunders, 2nded.

    10. Slade AK, Pee S, Jones S, Granle L, Fei L, Camm AJ.New algorithms to increase the initial rate responsein a minute volume rate adaptive pacemaker. PacingClin Electrophysiol 1994 Nov; 17(11 Pt 2): 1960-5.

    11. Clementy J, Barold SS, Garrigue S, Shah DC, Jais

    P, Le Metayer P, Haissaguerre M. Clinicalsignificance of multiple sensor options: rate responseoptimization, sensor blending, and trending. Am JCardiol 1999 Mar 11;83 (5B): 166D-171D.

    12. Provenier F, Jordaens L. Evaluation of six minutewalking test in patients with single chamber rateresponsive pacemakers. Br Heart J 1994 Aug;72(2):192-6.

    13. Sulke N, Dritsas A, Chambers J, Sowton E. Is accuraterate response programming necessary? Pacing ClinElectrophysiol 1990 Aug; 13(8):1031-44.

    14. Ellenbongen K. Wilkoff B. Clinical Cardiac pacing andDefibrillation pp 223 W.B. Saunders, 2nded.

    15. Schaldach M. New aspects in electrostimulation of theheart. Med Prog Technol 1995; 21(1):1-16.