5S-PROFUNDÃO 2005
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Profundão 2005 – IX Encontro de Engenharia de Produção da UFRJ
Dificuldades na implantação de um programa de qualidade:
estudo de caso de uma recauchutadora
Paula Trindade (UFRJ) [email protected]
Resumo
O Artigo apresenta um estudo de caso sobre a implantação do Programa 5S de qualidade em
uma empresa de médio porte no ramo de recauchutagem de pneus interessada em obter
certificação de conformidade de seus produtos perante o Inmetro.
Palavras chave:Qualidade, Programa 5S, Certificação.
1. Introdução
O presente artigo tem como objetivo relatar as atividades desenvolvidas em um projeto de
consultoria em uma Média Empresa do setor de recauchutagem de pneus de passeio, situada
no estado do Rio de Janeiro, que busca melhorias de desempenho em suas operações,
motivada pela necessidade de ampliação da produção para atendimento à demanda crescente.
O foco desse estudo estará voltado para o planejamento e a implantação do projeto de
certificação e qualidade. Nesse sentido, este documento está estruturado em duas partes:
exposição da teoria que serviu como base para o projeto de pesquisa e apresentação do estudo
de caso na empresa em questão, que será apresentada posteriormente.
2. Estudo de caso
2.1. A empresa
O trabalho de campo foi realizado em uma unidade fabril do setor de recauchutagem de pneus
de passeio. Sua área produtiva está concentrada em 8.500 m² e está voltada para fabricação
dos pneus remolds. Atualmente, a empresa como um todo possui cerca de 300 funcionários.
Os pneus do tipo remold são produzidos a partir das carcaças de pneus usados, que, após
passar por uma análise minuciosa, recebe novas bandas de rodagem. No processo de
fabricação, toda borracha original da banda de rodagem e da lateral do pneu é removida, ou
seja, o pneu remold é reformado em toda extensão do pneu, e não apenas na banda, como
ocorre no processo de recapagem comumente usado nas borracharias. Isso garante
durabilidade superior à dos pneus recauchutados convencionais. No caso da fábrica em
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questão, a nova camada de borracha com a qual o pneu é recoberto não apresenta o desenho
ou os sulcos característicos da banda de rodagem do pneu, sendo este feito por um molde ou
prensa em um método a quente. Este processo é chamado de vulcanização e é voltado para
carros de passeio.
O processo produtivo da empresa pode ser resumido em quatro macro-etapas: separação,
raspagem, cobertura e vulcanização e está organizada com as seguintes etapas:
Figura 1 – Processo produtivo da empresa
2.2. A demanda por certificação
O mercado globalizado atual fez com que houvesse aumento da competitividade a nível
mundial. Dentro desse contexto, a qualidade de produtos e serviços torna-se essencial, pois
além das barreiras tarifárias passam a existir as técnicas. Assim, a crescente demanda por
normas internacionais ou regionais teve como conseqüência o aumento da importância por
Programas de Avaliação da Conformidade.
Dentre os diversos mecanismos de Avaliação da Conformidade, a certificação é o mais
conhecido, principalmente por proporcionar confiança ao consumidor utilizando a menor
quantidade possível de recursos. Por definição, a certificação de produtos, processos e
serviços é realizada por terceira parte, isto é, por uma organização independente, credenciada
para executar uma ou mais destas modalidades de Avaliação da Conformidade.
O Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) é o órgão
no Brasil que visa garantir a qualidade dos produtos das empresas através de um padrão
nacional. Ele é o organismo credenciador oficial no Brasil.
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Descarre-gamento
Exame Inicial
Separa-ção
Escarea-ção
Limpeza de Talão
Inflagem
Raspa-gem
Cola
Cobertu-ra do Piso
Cobertura da Lateral
Vulcani-zação
Limpeza
Exame Final
S E P A R A Ç Ã O
R A S P A
C O B E R T U R A
V U L C A N I Z A Ç Ã O
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A certificação oferece uma série de vantagens:
− Estimula a melhoria contínua da qualidade;
− Informa e protege o consumidor;
− Propicia a concorrência justa;
− Facilita o comércio exterior;
− Protege o mercado interno;
− Agrega valor a marca.
2.3. Etapas da certificação
A primeira etapa do processo de certificação na empresa em questão teve início com o
levantamento e estudo dos documentos que compõe o RAC (Regulamento de Avaliação da
Conformidade), documento oficial de suporte a certificação. A partir daí, foi feito um exame
sistemático do grau de atendimento por parte do pneu reformado e seus processos.
Após a verificação de processo produtivo e geração de um relatório, foi feito um estudo para
levantar os requisitos que já eram atendidos no processo vigente e avaliar a viabilidade de
implantação daquilo que ainda não era atendido.
A adequação aos regulamentos foi iniciada paralelamente ao estudo. Para a emissão do
certificado, o projeto de certificação tem como próximas etapas: envio de produtos para o
OACC (Organismo de Avaliação da Conformidade Credenciado) e auditoria de certificação.
Como ilustração, segue abaixo um fluxograma de um típico processo de certificação:
Figura 2 – Metodologia do Processo de Certificação
Análise da documentação
Diagnóstico inicial da fábrica
Estudo de viabilidade
Adequação aos regulamentos
Auditoria
Emissão do certificado
Manutenção da certificação
Preparação e ensaios dos produtos
Levantamento dos documentos
Análise da documentação
Diagnóstico inicial da fábrica
Estudo de viabilidade
Adequação aos regulamentos
Auditoria
Emissão do certificado
Manutenção da certificação
Preparação e ensaios dos produtos
Levantamento dos documentos
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2.4. Análise de um dos requisitos da certificação: o setor de Atendimento de garantias
O primeiro requisito estudado com a finalidade de atender as normas foi o setor de
Atendimento de Garantias. A fábrica em questão possui uma garantida do produto de 3 anos
ou até o limite mínimo de profundidade dos sulcos de 1,6 mm. O procedimento do setor é o
seguinte: o usuário do pneu, após perceber alguma irregularidade no mesmo, vai até a loja e,
juntamente com a nota fiscal, faz a reclamação. O pneu então é encaminhado para a fábrica e
examinado, sendo a reclamação classificada através de uma ficha. Esta ficha fica sob
responsabilidade do Departamento de Vendas e caso a queixa seja procedente, o cliente é
atendido. Caso a reclamação não seja procedente, o pneu é devolvido.
A diferença do processo real e do estabelecido pelo Inmetro é que esse é voltado
exclusivamente para o setor comercial, ou seja, para o Atendimento de Garantias, não
abrangendo um tratamento dessas reclamações para inferência no processo produtivo. Desse
modo, as falhas são apenas contabilizadas e nenhuma informação é gerada para os
departamentos envolvidos nas mesmas. O necessário para a melhoria sucessiva do produto é
uma sistemática de investigação das causas no processo produtivo que originaram os defeitos
percebidos pelo cliente.
As informações contidas na ficha preenchida possuem dados que podem auxiliar a tomada de
decisão no chão de fábrica do Setor de Produção. Tendo em vista as necessidades desse setor
em se utilizar destas informações para atuar corretivamente sobre o processo produtivo, foi
iniciada uma reestruturação do setor de Atendimento de Garantia, de forma que este possa
voltar a atender às duas demandas: a do Setor de Produção e a do Setor comercial.
A proposta de reestruturação do setor é de que haja um controle das não-conformidades,
através da atuação sobre processo para eliminar as causas dos defeitos a partir das
reclamações dos clientes. Como há um desconhecimento por parte dos funcionários de
metodologias de análise e solução de problemas na fábrica, o método idealizado foi o “Ciclo
PDCA de solução de problemas”. Este é composto por quatro fases básicas: planejamento (P),
execução (D), verificação (C) e atuação corretiva (A), conforme esquema a seguir.
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Figura 3: Método PDCA de solução de problemas (Fonte: Campos, 1998).
O resultado esperado desse novo sistema é não somente o cumprimento de normas, mas
também uma participação dos funcionários no controle e melhoria da qualidade dos
processos.
A proposta de adequação foi feita não apenas tendo em vista as normas, mas também a
criação de um Sistema de controle de falhas, conforme mostrado abaixo:
Figura 4: Proposta do novo setor de Atendimento de Garantias
Cliente
Departamento de Vendas
Controle de qualidade Departamentos envolvidos nas falhas
P
D C
A
DEFINA AS METAS
DEFINA OS MÉTODOS PARA ALCANÇAR AS
METAS
EDUQUE E TREINE
EXECUTE O TRABALHO
VERIFIQUE OS EFEITOS DO TRABALHO
EXECUTADO
ATUE NO PROCESSO EM FUNÇÃO DOS RESULTADOS
PLAN
DO CHECK
ACTION
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2.5. A demanda por um programa de qualidade
Com o início da adequação à certificação compulsória do Inmetro, foi identificada uma falta
de cultura e motivação da empresa em relação à qualidade. A falta de conscientização, tanto
da alta gerência como dos funcionários em geral, dificultou o processo de certificação, já que
esta era vista apenas como uma obrigatoriedade e não como uma oportunidade de melhoria
contínua ou um diferencial. Tornou-se necessário, então, a implantação de um programa de
Qualidade Total na fábrica. Portanto, o passo inicial planejado para sua implantação foi o
Programa 5S, já que este é um programa de simples conceitos, servindo como base para a
preparação do ambiente e das pessoas para Qualidade Total.
O Programa 5S é um programa de qualidade total japonês nascido na década de 50 que visa,
principalmente, a criação de condições dignas de trabalho por toda a empresa. Sua
concretização exige, e ao mesmo tempo facilita, a participação de todos os empregados,
constituindo um alicerce ideal para a implantação do Processo de Melhoria da Qualidade.
O termo 5S é derivado de cinco palavras japonesas, todas iniciadas com a letra S:
− Senso de seleção (Seiri): o objetivo da seleção é eliminar o desperdício de recursos, de
espaço, de tempo, de energia, etc.
− Senso de organização (Seiton): o objetivo da organização é facilitar a localização e o
acesso às coisas necessárias.
− Senso de limpeza (Seiso): o objetivo da limpeza é amplo, visando o bem estar e a
integridade das pessoas, objetos, equipamentos, instalações e meio-ambiente.
− Senso de conservação (Seiketsu): o objetivo do senso de conservação é difundir e manter
as conquistas obtidas com a implantação da seleção, organização e limpeza.
− Senso de disciplina (Shitsuke): o objetivo deste senso é consolidar a seleção, organização e
limpeza e ter todos os colaboradores motivados, trabalhando em equipe e buscando
oportunidades de melhoria.
Os benefícios da consolidação do 5S são atingidos após algum tempo de implantado o
programa. Como exemplo de melhorias, pode-se citar:
− Melhora o ambiente de trabalho;
− Otimiza o tempo das pessoas;
− Aumenta a produtividade
− Reduz desperdícios e custos;
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− Reduz riscos de acidentes;
− Aumenta a participação, qualidade de vida e satisfação das pessoas;
− Contribui para preservação do meio ambiente;
− Melhora a imagem da organização perante os clientes;
− Melhora o aproveitamento de recursos (pessoas, espaço, tempo, materiais, equipamentos,
etc.).
A metodologia usada para a prática do ciclo de qualidade do 5S inclui preparação de material
de apoio, treinamentos de conscientização e de auditores, registro e diagnóstico da situação do
local através de uma lista de verificação, auditorias e elaboração de planos de ações. Apesar
de ser um programa de fáceis conceitos, a implantação do programa de 5S não é simples.
2.6. Etapas do 5S
A primeira etapa prevista e realizada foi a preparação do material didático de apoio ao
treinamento realizado, onde foi desenvolvida e produzida uma cartilha. Além disso, foi
elaborada uma lista de verificação de 5S. Esta foi desenvolvida para padronizar o critério de
avaliação e permitir identificar a evolução das áreas em cada um dos cincos sensos: seleção,
organização, limpeza, conservação e disciplina.
Inicialmente, apenas alguns funcionários foram treinados nos conceitos do 5S, lista de
verificação, dicas de auditoria e elaboração de planos de ação. Estes funcionários são os
facilitadores do programa dentro da fábrica e têm a incumbência de perpetuar o 5S na
empresa. A empresa foi dividida em sete grandes áreas onde foram selecionados facilitadores,
que são os líderes do 5S em cada área.
Anteriormente à qualificação de todos os empregados em 5S, foi realizada uma pré-auditoria
com o duplo objetivo de diagnosticar a situação atual dos cinco sensos na empresa e treinar os
facilitadores como auditores. Antes e durante a auditoria foram tiradas fotos de situações que
precisavam ser melhoradas.
Após a compilação da pré-auditoria de 5S, foi feita a divulgação dos resultados de cada área
através de montagem e colocação dos quadros do 5S por área, incluindo: resultado da pré-
auditoria, observações dos auditores, registro, fotos, pontuação, classificação, avisos e dicas
do programa 5S na fábrica.
Na etapa seguinte todos os funcionários da empresa foram treinados nos conceitos gerais de
Qualidade total e os específicos do programa 5S, além do papel de cada um como colaborador
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da implantação do projeto. Durante o treinamento, foi feito um levantamento de algumas
sugestões e todos receberam cartilhas. No total, quase 200 pessoas foram treinadas e em cada
treinamento houve a presença de pelo menos um facilitador. Houve uma grande resistência e
muitas reclamações. De modo geral, os empregados tinham bastante clareza de seus direitos,
porém seus deveres sequer eram mencionados na relação empresa/empregado.
Em seguida, foi preparado o Plano de ação por área para, posteriormente, iniciar a
implantação de melhorias.
O Plano de ação consiste na definição dos seguintes itens (SILVA, 2003):
− “O que?”: devem-se identificar quais as mudanças necessárias para a implementação do
5S;
− “Quem?”: devem-se especificar quais são os envolvidos, quemsão as pessoas com quem se
deve estabelecer contatos para efetuar as mudanças objetivadas;
− “Quando?”: estabelecer o prazo previsto para a implementação da melhoria;
− “Como?”: devem-se discriminar quais são as tecnologias e/ou recursos necessários para
atender tal melhoria;
− “Por que?”: deve-se explicar o motivo pelo qual está propondo esta melhoria, de maneira
clara e objetiva;
− “Onde?”: deve-se discriminar onde deverão ser feitas as mudanças previstas, isto é, definir
quais os setores que estarão sendo envolvidos no processo de melhoria.
Os facilitadores de cada área, consultando os colaboradores, prepararam os Planos de ação por
área e estes foram aprovados com a gerência e a diretoria. Esta etapa é de fundamental
importância para o planejamento da implantação dos 5S. Os Planos de ações por área foram
divulgados nos murais a fim de auxiliar na verificação do cumprimento dos mesmos.
Foi detectada como dificuldade para implantação do programa 5S a pouca disposição para a
melhoria contínua, tais como acomodação e resistência à mudança. Aparentemente, existiu
uma diferença entre as expectativas de retorno do programa e aquilo que ele poderia propiciar.
O interesse principal da maioria era em receber aumento ou gratificação financeira pela
participação no programa.
3. Conclusão
O presente trabalho teve como objetivo o estudo das dificuldades e dos impactos da
implantação de programas referentes à qualidade em uma média empresa do ramo industrial.
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Um dos pontos problemáticos enfrentados foi a visão inicialmente restrita da empresa em
relação à qualidade, nascida pela iminência da certificação compulsória, não considerando os
benefícios que a implantação da gestão pela qualidade total traria para a competitividade da
empresa, tais como redução de reclamação de produtos, de custos, aumento da produtividade,
etc. Ainda nesse sentido, a meta de produção era prioritária em relação a certificação ou ao
Programa 5S. Isso dificultou algumas atividades, já que apesar da vontade de mudança de
filosofia da alta gerência da fábrica, havia uma contradição quando era preciso conceder os
funcionários para a realização das mesmas. O apoio dos níveis hierárquicos mais altos é
fundamental para uma mudança de cultura de funcionários.
Dentro desses projetos citados, o Programa 5S, ou outro de Qualidade Total que incentive a
participação do funcionário, já que o empregado tem satisfação em informar os problemas e
ele conhece melhor as condições de seu serviço e de seu equipamento do que a supervisão e a
administração. Assim, o empregado se sente parte do sistema e mais motivado, contribuindo
mais para a empresa em curto e médio prazo.
4. Links
www.inmetro.gov.br
www.competitiva.com.br/5.html
5. Bibliografia
CAMPOS, V.F., Gerenciamento da rotina do trabalho do dia-a-dia. Belo Horizonte, MG. Editora
Desenvolvimento gerencial, 1998. CONFERIR
Cartilha de Avaliação da Conformidade, Diretoria da Qualidade, INMETRO, 2002.
SILVA, C.E.: Implantação de um programa “5S”. XXIII Encontro Nacional de Engenharia de Produção, Ouro
Preto, 2003.