6 - O Estado do Maranhão - São Luís, 16 de outubro de 2011...

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S ÃO PAULO - "O carbona- ra não espera. Tem de fa- zer e comer logo em segui- da", sentencia o chef Sergio Ar- no sobre um dos mais conheci- dos molhos da cozinha italiana. E por que a pressa? "O ovo de- ve cozinhar com o calor da mas- sa, recém-tirada do fogo. Esse é o segredo", responde o chef, proprietário do restaurante La Vecchia Cucina, em São Paulo, e de outras casas italianas pelo Brasil. Segundo Arno, os ovos devem ser acrescentados ime- diatamente à massa quente criando um creme amarelo en- volvente e brilhante. Mais: para que não formem grumos, as gemas devem ser batidas previamente em tem- peratura ambiente. Algumas ca- sas mais tradicionais de Roma sequer batem o ovo, conta Jus- celino Pereira, restauranteur e proprietário do italiano Piselli. "O prato é levado à mesa com a gema crua inteira sobre a mas- sa para que o próprio comensal a misture na hora de comer". De tão popular, a receita do carbonara ganhou inúmeras versões. "Quase todo mundo tem um jeito particular de fazer, mas o preparo original leva, além das gemas, queijo pecori- no [feito a partir do leite de ca- bra], pimenta-do-reino e guan- ciale, que é a bochecha de por- co defumada, com sabor mais delicado do que a pancetta ou o toucinho", descreve Arno. Mesmo sendo uma prática acintosa aos olhos dos cozinhei- ros mais puristas, há quem use creme de leite. Antônio Araújo, chef do paulistano La Grassa, é um deles. "Um pouco de creme de leite suaviza o gosto da gema caipira e dá mais cremosidade ao molho", diz Araújo, que ofe- rece também ao cliente a opção de acrescentar cheiro verde. Arno também acha que não é pecado adaptar a receita ao próprio gosto, adicionando temperos como cebola e alho. Pereira, que serve em seu Pisel- li uma versão do carbonara bem próxima à original, concorda com substituições mais acessí- veis. "O guanciale, apesar de muito saboroso, é um corte pouco aproveitado e conhecido no Brasil. A pancetta, ou até mesmo o bacon, são mais fáceis de serem encontrados", indica. Velho de guerra - Tão diversas quanto as receitas são as histó- rias sobre a origem do carbona- ra. A mais difundida conta que ele foi criado no fim da Segun- da Guerra Mundial. Os soldados americanos que libertaram Ro- ma teriam trazido a "ração mi- litar", que consistia na mistura de ovo e bacon. "Eles [os solda- dos] tinham feito amizade com famílias locais levando-lhes ovos e bacon pedindo que lhes preparassem um molho para macarrão", discorre a escritora italiana Marcella Hazan, no li- vro Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica [Editora Mar- tins Fontes]. Os romanos dão de ombros à versão dos americanos e pre- ferem dizer que o carbonara sempre existiu na região do Lás- cio-Roma. O chef Arno também aposta nessa teoria. "Era um prato familiar, de pouca rele- vância. Uma mistura de ingre- dientes comuns naquele peda- ço da Itália e que somente a par- tir de 1930 teria ganhado fama e repercussão", argumenta. Ou- tra hipótese diz que os carbinai, produtores de carvão que vi- viam nas montanhas italianas, consumiam a receita com fre- quência, o que explica o nome do prato. Há ainda uma lenda que cre- dita a receita a uma sociedade secreta política italiana do sé- culo XIX chamada Carboneria. Mas não há registros de que preparassem o espaguete. Em Culinária Itália: Especialidades Italianas, de Claudia Piras [Edi- tora Könemann], descreve o molho ao lado dos igualmente clássicos all'amatriciana e put- tanesca como as mais famosas criações romanas. GASTRONOMIA 6 Receita da semana Espaguete à carbonara Ingredientes 1 colher (sopa) de gordura de por- co 120g de guanciale defumada (ou pancetta) em tiras 3 gemas frescas em temperatura ambiente 6 colheres (sopa) de queijo peco- rino ralado 400g de massa tipo espaguete Sal e pimenta a gosto Modo de fazer Bata as gemas até obter uma mis- tura cremosa. Frite o guanciale (ou a pancetta) na gordura e reserve. Cozinhe a massa em água ferven- te, mas não coloque muito sal - tanto o queijo quanto a carne já são salgados. Retire a massa al dente da água e transfira para a frigideira com a pancetta. Misture e acrescente o queijo. Por último, tire a frigideira do fogo e acrescen- te as gemas batidas. Misture tudo cuidadosamente até ficar cremo- so. Finalize com a pimenta. DOMINGO - O Estado do Maranhão - São Luís, 16 de outubro de 2011 Um dos molhos mais tradicionais deve ser preparado pouco antes de ir à mesa, pois as gemas da receita cozinham apenas com o calor da massa; depois, é servir e comer na hora; aprenda o passo a passo para preparar o clássico italiano Molho carbonara deve sair da panela direto para a mesa Carbonara é um dos molhos mais tradicionais para servir com massas Receita do molho ganhou muitas versões diferentes ao longo do tempo Fotos/Divulgação

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SÃO PAULO - "O carbona-ra não espera. Tem de fa-zer e comer logo em segui-

da", sentencia o chef Sergio Ar-no sobre um dos mais conheci-dos molhos da cozinha italiana.E por que a pressa? "O ovo de-ve cozinhar com o calor da mas-sa, recém-tirada do fogo. Esse éo segredo", responde o chef,proprietário do restaurante LaVecchia Cucina, em São Paulo,e de outras casas italianas peloBrasil. Segundo Arno, os ovosdevem ser acrescentados ime-diatamente à massa quentecriando um creme amarelo en-volvente e brilhante.

Mais: para que não formemgrumos, as gemas devem serbatidas previamente em tem-peratura ambiente. Algumas ca-sas mais tradicionais de Romasequer batem o ovo, conta Jus-celino Pereira, restauranteur eproprietário do italiano Piselli."O prato é levado à mesa com agema crua inteira sobre a mas-sa para que o próprio comensala misture na hora de comer".

De tão popular, a receita docarbonara ganhou inúmerasversões. "Quase todo mundotem um jeito particular de fazer,mas o preparo original leva,além das gemas, queijo pecori-no [feito a partir do leite de ca-bra], pimenta-do-reino e guan-ciale, que é a bochecha de por-co defumada, com sabor maisdelicado do que a pancetta ouo toucinho", descreve Arno.

Mesmo sendo uma práticaacintosa aos olhos dos cozinhei-

ros mais puristas, há quem usecreme de leite. Antônio Araújo,chef do paulistano La Grassa, éum deles. "Um pouco de cremede leite suaviza o gosto da gemacaipira e dá mais cremosidadeao molho", diz Araújo, que ofe-rece também ao cliente a opçãode acrescentar cheiro verde.

Arno também acha que nãoé pecado adaptar a receita aopróprio gosto, adicionandotemperos como cebola e alho.Pereira, que serve em seu Pisel-li uma versão do carbonara bempróxima à original, concorda

com substituições mais acessí-veis. "O guanciale, apesar demuito saboroso, é um cortepouco aproveitado e conhecidono Brasil. A pancetta, ou atémesmo o bacon, são mais fáceisde serem encontrados", indica.

Velho de guerra - Tão diversasquanto as receitas são as histó-rias sobre a origem do carbona-ra. A mais difundida conta queele foi criado no fim da Segun-da Guerra Mundial. Os soldadosamericanos que libertaram Ro-ma teriam trazido a "ração mi-

litar", que consistia na misturade ovo e bacon. "Eles [os solda-dos] tinham feito amizade comfamílias locais levando-lhesovos e bacon pedindo que lhespreparassem um molho paramacarrão", discorre a escritoraitaliana Marcella Hazan, no li-vro Fundamentos da CozinhaItaliana Clássica [Editora Mar-tins Fontes].

Os romanos dão de ombrosà versão dos americanos e pre-ferem dizer que o carbonarasempre existiu na região do Lás-cio-Roma. O chef Arno também

aposta nessa teoria. "Era umprato familiar, de pouca rele-vância. Uma mistura de ingre-dientes comuns naquele peda-ço da Itália e que somente a par-tir de 1930 teria ganhado famae repercussão", argumenta. Ou-tra hipótese diz que os carbinai,produtores de carvão que vi-viam nas montanhas italianas,consumiam a receita com fre-quência, o que explica o nomedo prato.

Há ainda uma lenda que cre-dita a receita a uma sociedadesecreta política italiana do sé-

culo XIX chamada Carboneria.Mas não há registros de quepreparassem o espaguete. EmCulinária Itália: EspecialidadesItalianas, de Claudia Piras [Edi-tora Könemann], descreve omolho ao lado dos igualmenteclássicos all'amatriciana e put-tanesca como as mais famosascriações romanas.

GASTRONOMIA

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Receita da semana

Espaguete à carbonara

Ingredientes1 colher (sopa) de gordura de por-co 120g de guanciale defumada (oupancetta) em tiras3 gemas frescas em temperaturaambiente6 colheres (sopa) de queijo peco-rino ralado400g de massa tipo espagueteSal e pimenta a gosto

Modo de fazerBata as gemas até obter uma mis-tura cremosa. Frite o guanciale (oua pancetta) na gordura e reserve.Cozinhe a massa em água ferven-te, mas não coloque muito sal -tanto o queijo quanto a carne jásão salgados. Retire a massa aldente da água e transfira para afrigideira com a pancetta. Misturee acrescente o queijo. Por último,tire a frigideira do fogo e acrescen-te as gemas batidas. Misture tudocuidadosamente até ficar cremo-so. Finalize com a pimenta.

DOMINGO - O Estado do Maranhão - São Luís, 16 de outubro de 2011

Um dos molhos mais tradicionais deve ser preparado pouco antes de ir à mesa, pois as gemas da receita cozinhamapenas com o calor da massa; depois, é servir e comer na hora; aprenda o passo a passo para preparar o clássico italiano

Molho carbonara deve sairda panela direto para a mesa

Carbonara é um dos molhos mais tradicionais para servir com massas Receita do molho ganhou muitas versões diferentes ao longo do tempo

Fotos/Divulgação