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7/29/2019 76608057 Suzanne Enoch Griffin 04 O Escandalo Da Princesa CH 421 http://slidepdf.com/reader/full/76608057-suzanne-enoch-griffin-04-o-escandalo-da-princesa-ch-421 1/144 4º livro da série "Família Griffin” Inglaterra, 1813. Pecados de um duque... Sebastian Griffin, o Duque de Melbourne, criou os irmãos mais novos, educou-os muito bem e cuidou para que os três fizessem um bom casamento. Considerado o homem mais poderoso da Inglaterra, Sebastian tem uma reputação impecável, de homem íntegro, que nunca se envolveu em escândalos. Até agora. Josefina Katarina Embry é uma jovem belíssima, que afirma ser a princesa de um país longínquo. Enquanto ela deslumbra a alta sociedade com sua graça e encantos, Sebastian desconfia de que ela está tramando alguma coisa e decide desmascará-la... sem imaginar que iria se sentir irresistivelmente atraído pela sensualidade de Josefina e por seus beijos apaixonados. Ele sabe que um caso amoroso entre ambos provocará um escândalo, mas o homem mais poderoso da Inglaterra arriscará sua reputação por uma suposta princesa, ou permitirá que o mais pecaminoso desejo governe seu coração?

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4º livro da série "Família Griffin”Inglaterra, 1813.Pecados de um duque...

Sebastian Griffin, o Duque de Melbourne, criou os irmãos mais novos, educou-osmuito bem e cuidou para que os três fizessem um bom casamento. Considerado ohomem mais poderoso da Inglaterra, Sebastian tem uma reputação impecável, de

homem íntegro, que nunca se envolveu em escândalos. Até agora.Josefina Katarina Embry é uma jovem belíssima, que afirma ser a princesa de um paíslongínquo. Enquanto ela deslumbra a alta sociedade com sua graça e encantos, Sebastiandesconfia de que ela está tramando alguma coisa e decide desmascará-la... sem imaginarque iria se sentir irresistivelmente atraído pela sensualidade de Josefina e por seusbeijos apaixonados. Ele sabe que um caso amoroso entre ambos provocará um escândalo,mas o homem mais poderoso da Inglaterra arriscará sua reputação por uma supostaprincesa, ou permitirá que o mais pecaminoso desejo governe seu coração?

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Querida leitora,

O quarto livro da Família Griffin encerra com chave de ouro esta fabulosa série de romances de Suzanne Enoch. Como eu sempre gosto de frisar, os romances publicados em séries podem sempre ser lidos separadamente uns dos outros, pois as histórias são completas e independentes, embora relacionadas entre si por meio de alguns personagens. Se você não leu os livros anteriores, entre em contato com a Central de Atendimento ao Leitor e solicite as edições 395, 400 e 411 de Clássicos Históricos (respectivamente, Marido por Encomenda, Como Fisgar um Marido e APrincesa Indiana). Nesta última história, Sebastian, que evita a todo custo escândalos e mulheres escandalosas, está decidido a descobrir a verdade sobre Josefina, que com certeza está envolvida em algum tipo de intriga Mas a sensualidade e o encanto 

dessa mulher o deixam enfeitiçado, tentando-o a esquecer o dever... porque o amor é uma força incontrolável que vence homem, mulher e toda e qualquer intriga...Leonice Pomponio Editora

TÍTULO ORIGINAL: SINS OF A DUKE

Copyright © 2007 by Suzanne EnochOriginalmente publicado em 2005 pela HarperCollins Publishers

PUBLICADO SOB ACORDO COM HARPERCOLLINS PUBLISHERS.NY,NY-USA Todos os direitos reservados.Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas

vivas ou mortas terá sido mera coincidência.EDITORA Leonice PomponioASSISTENTE EDITORIAL

Patrícia ChavesPaula Rotta

Vânia Canto Buchala

EDIÇÃO/TEXTO Tradução: Silvia Maria PomantiARTE Mônica MaldonadoMARKETING/COMERCIAL Andréa Riccelli

PRODUÇÃO GRÁFICA Sônia SassiPAGINAÇÃO Ana Beatriz Pádua

© 2009 Editora Nova Cultural Ltda.Rua Paes Leme, 524 — 10 andar — CEP 05424-010 — São Paulo - SP

www.novacultultural.com.br

Impressão e acabamento: RR Donnelley

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Capítulo ICapítulo I

Junho de 1813.

A julgar pelo semblante dos soldados da Guarda Montada, alguém planejavaalgum banho de sangue... Após praguejar baixinho, Sebastian Griffin, duque deMelbourne, incitou o cavalo e, deixando o pelotão para trás, foi chegar a seu destino

meio quilômetro à frente dos militares. O tempo urgia, e tempo era algo que ele nãotinha para desperdiçar.Alheio aos irmãos e ao cunhado que vinham no seu encalço, Sebastian saltou

para o chão assim que o cavalo estacou para ir bradar diante da alvoroçada multidão:— Quem está no comando aqui?— Eu. — O sujeito atarracado em vestes surradas, como a maioria dos

lavradores e demais trabalhadores reunidos ali, abriu espaço por entre oscompanheiros para puxar Sebastian de lado. — O que deseja, rapaz?

Rapaz. Ninguém falava assim com ele havia dezessete anos, ocasião em que

herdara o ducado.— Quero saber por que acham que pôr abaixo os portões de Carlton House irátrazer comida ou simpatia à causa de vocês. — Sebastian virou-se para seu secretário.— Compre tudo o que houver de alimentos no mercado da Piccadilly e mande entregarna Abadia de Westminster.

— Pois não, Vossa Graça. — Com isso, Rivers fez o cavalo dar meia-volta.— Vá com ele, Jennings. Também quero cobertores e roupas para quem estiver

precisando.— Sim, Vossa Graça.

— Então acha que bastam um pedaço de pão e uma camisa para nos mandarembora daqui? — o líder da revolta interpelou Sebastian. — Ora, isso não...— Vocês são em quantos, uns trezentos? — Sem esperar pela resposta, passou

os olhos pelos rostos sujos e famintos da aglomeração às costas do grandalhão. — Vápara Westminster; vou encontrá-lo lá, e então discutiremos formas de manter suagente em condições decentes até o replantio das lavouras e a melhora do sistema deirrigação.

— Mas nós...— Insistir na ameaça à residência do príncipe regente só irá fazer com que ele

se veja obrigado a chamar soldados para defendê-lo. De mais a mais, há crianças poraqui; não é justo colocá-las em perigo.

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— Ainda não sei qual é o seu nome, sr... Vossa Graça. Nem se devo confiar numaristocrata.

— Sou o duque de Melbourne; se já ouviu falar de mim, você sabe que não volto

atrás no que digo.O camarada se adiantou um passo no momento em que Charlemagne e Zacharyse acercavam, porém Sebastian conteve os irmãos com um movimento do braço.Aquelas pessoas estavam desesperadas, era natural que buscassem alguém em quemdescarregar suas decepções.

— Sou Nathan Brown, Vossa Graça. — O lavrador estendeu a mão, que ele seapressou a apertar. — E já ouvi falar do senhor, sim.

— Ótimo. Vá me procurar na abadia dentro de duas horas, sr. Brown.— Estarei lá. — Sem mais, o parrudo homem foi passar novas instruções aos

companheiros.Assim que os agricultores começaram a se afastar dos portões da CarltonHouse, vários deles de braços dados, Sebastian deixou escapar um profundo suspiro.

— Muito bem, Seb — comentou o irmão caçula dele,  Zachary Griffin. — Aindamais se levarmos em conta que tenho uma só pistola comigo.

— Hã-hã. Shay, vá dizer ao prior da St. Margaret que a Abadia terá hóspedespor um dia ou dois. — Enquanto o irmão partia rumo à igreja, ele saltou à garupa deMerlin. — Até mais. Tenho um compromisso daqui a duas horas.

— O que faz pelas manhãs quando não está acudindo a monarquia ou alimentando

os desvalidos? — gracejou o cunhado dele, Valentine Corbett, lorde Deverill.— Por que não vão retomar o que estavam fazendo? Green, você vem comigo. —O cavalariço anuiu, o grupo se dispersou, e Sebastian acenou para o apavoradosecretário do príncipe, que surgia no outro lado do portão, seguido de perto por meiadúzia de guardas tão nervosos quanto ele. Em seu modo de ver, não fazia nem maisnem menos do que suas obrigações para com a Coroa ou para com o povo da Inglaterra.Era assim que passava as manhãs. E as tardes. E as noites.

Assim que deixou Carlton House, passando pela Guarda Montada a menos de umaquadra de distância da residência do príncipe regente, imprimiu ao trotar do cavalo

uma marcha mais condizente com as ruas de Mayfair. Três quarteirões adiante, ele eGreen entraram na Praça Grosvenor, de onde tomaram o passeio de pedriscos logoatrás dos portões que guardavam a Mansão Griffin. Escorregando da sela, Sebastianlançou as rédeas a Green e galgou os degraus da fachada da imponente residência,enquanto o cavalariço levava Merlin à estrebaria nos fundos do casarão.

A porta se abriu antes que ele a alcançasse.— Espero que tenha sido bem-sucedido, Vossa Graça. — O mordomo deu um

passo para o lado para que Sebastian pudesse passar.— Felizmente, Stanton. Minha filha já acordou?

— Presumo que sim, Vossa Graça. Devo mandar chamá-la?

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— Sim; quero vê-la antes de ir para o Parlamento. — Entregou-lhe o chapéu, asluvas e o sobretudo. — Quando Rivers chegar, diga a ele que teremos de adiar oalmoço de amanhã, sim? Vou ter de passar boa parte do dia na Abadia de

Westminster. —Seguiu então para a sala do desjejum, onde, sobre o aparador,generosas porções de pão, frutas e carne fatiada aguardavam por ele e, devidamentealisado, o exemplar do dia do London Times  já se achava à cabeceira da mesa.

Depois de se servir, largou-se sobre sua cadeira para ler a matéria acerca doúltimo acordo tarifário entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos, que visava evitarqualquer recrudescimento das hostilidades entre os dois países. Segundo os jornalistas, tudo fazia crer que Sua Graça, o duque de Melbourne, havia pressionado ogoverno até forçá-lo a recuperar o bom senso.

— Por enquanto — murmurou para si, estendendo a mão para o bule de café; de

pronto, um dos dois criados de libre correu a servir a aromática bebida na xícara dele.— Eu já estava acordada, papai — anunciou uma voz fininha à entrada da sala, efoi para lá que ele olhou, sorrindo.

— Bom dia, Peep. Você está muito bonita hoje.Com quase oito anos de idade, Penélope Griffin já começara a despertar para os

modismos e, naquela manhã, usava um alegre vestido de musselina amarelo comdiminutas flores brancas, que combinava com um chapéu amarelo enfeitados demargaridas também brancas.

— Estou encantadora, não? — Após se curvar numa mesura, foi oferecer o rosto

ao pai para um beijo e, tão logo o recebeu, tratou de ajeitar o chapéu.— Estou vendo que você e a sra. Beacham vão à festa de aniversário de MaryHaley.

— Sim; vou dar um chapéu branco com flores amarelas de presente para Mary.— Penélope foi pegar um pêssego e duas torradas das bandejas sobre o aparadorantes de se acomodar à mesa. — Posso convidá-la para vir tomar chá comigo amanhã?

— Pensei que você fosse almoçar com suas tias.— Oh, é verdade. Como fui esquecer? Deve ser porque tenho andado muito

ocupada com meus compromissos nesses últimos dias.

Fitando a graciosa menina de cabelos castanhos e olhos acinzentados, Sebastiansentiu uma pontada no peito ao imaginar que dali a dez anos os tais “compromissos”incluiriam passeios com os pretendentes e noites em saraus, onde ela se veria cercadade jovenzinhos afoitos.

— Um grupo de acrobatas vai se apresentar em Vauxhall amanhã; você não querconvidar Mary e também lorde e lady Bernard para irem conosco?

— Acrobatas? — Penélope se alvoroçou toda. — Ilusionistas também?— É bem provável.— Sim, sim! — Após uma mordida no pêssego, olhou de soslaio para o pai. — Mas

a tia de Mary, que veio visitá-los, vai querer ir conosco e depois vai querer casar comvocê.

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— Ah. Bem, nesse caso poderíamos... — A porta da sala se escancarou.— Bom dia a todos — saudou Zachary, antes de partir numa linha reta rumo ao

aparador. — Caroline vai começar o retrato do duque de York esta manhã e disse que,

se me visse por lá, ele iria se lembrar de você e, conseqüentemente, de que não ébenquisto na Câmara dos Lordes.— É porque ele obteve favores daquela moça, que depois o obrigou a promover

todos aqueles soldados?— Onde você ouviu isso, Peep? — quis saber Sebastian, olhando feio para

Zachary quando ele se sentou ao lado da garotinha.— Tio Shay disse que, se o duque de York aprendesse a manter as calças

abotoadas, não deveria nada a mulher nenhuma. A moça cerziu as calças dele?— Isso mesmo — afirmou Zachary, rindo. — Seja como for, o importante é que

vim à Mansão Griffin para fazer o desjejum na companhia da minha sobrinha predileta.— Você não devia dizer uma coisa dessas, tio Zach. E se tia Nell e tio Valentineouvissem? Iriam pensar que você não gosta de Rose como gosta de mim.

— Ora, é claro que adoro Rose. Mas ela só tem cinco meses, e bebês dessa idadenão costumam ter uma conversa muito animada, não é mesmo?

— Vai ver é porque ela ainda não tem dentes. — Penélope pousou delicadamentea mão sobre o braço do tio. — Não se preocupe, não vou contar a tio Valentine sobrenosso assunto. Não quero que ele te dê um soco.

— Nem eu. Grato pela sua discrição.

Os dois continuaram a tagarelar por mais alguns instantes, até que Sebastian seerguesse e afastasse a cadeira da mesa.— Tem um minuto, Zach?— Claro. — Zachary também se levantou. — Peep, vou lhe dar um xelim se você

espalhar geléia de laranja nessa fatia de pão para mim.— Dois xelins — retrucou ela, já estendendo a mão para o pote com o doce.— Combinado.No corredor, Sebastian esperou o irmão deixar a sala do café da manhã e

encostou a porta.

— Peep quer levar Mary Haley a Vauxhall amanhã à noite, e a tia da menina,Margaret Trent, provavelmente irá conosco.

— Pensei que fosse me pedir para ajudá-lo com o sr. Brown. — Zachary trocou ofalso ar de indignação por um sorriso. — E claro que Carol e eu iremos com vocês aVauxhall.

Suspirando de alívio, Sebastian bateu de leve no ombro dele.— O sr. Brown é um problema simples de resolver. Agora, de Margaret eu quero

distância.— Até parece que algum de nós iria querer aquela entojada na família. —

Zachary fechou a porta por completo. — Você está bem, Seb? Digo, agora que estãosó você e Peep nesta casa, talvez...

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— Não vou discutir esse assunto. E, como o combinado, passarei para apanharvocê e Carol para o sarau dos Elkins esta noite. Às oito. — Zachary fez menção defalar, porém ele se antecipou: — Estou bem, sim. Habituando-me a uma família menor.

De novo.— Olhe, não pense que Nell ou Shay ou eu o abandonamos só porque nosmudamos daqui, afinal... Ainda me lembro perfeitamente bem de como você ficou,quatro anos atrás, quando Charlotte morreu. O fato de...

— Por Deus, Zachary, não sou nenhum inválido. Pelo contrário, tenho sido ocabeça desta família pelos últimos dezessete anos e creio poder dizer, sem nenhumavaidade, que sempre me incumbi bastante bem das minhas responsabilidades. Por isso,não vejo por que você ou qualquer outra pessoa teria de se preocupar comigo. Agora,se me der licença, tenho de ir ao Parlamento antes de almoçar com três centenas de

lavradores irados e suas famílias. — Tratando de colocar um sorriso no rosto,retornou à sala de desjejum para ir se colocar de cócoras diante da filha. — Peep,querida, prometa que irá me contar da festa quando eu voltar.

— Prometo. — Penélope se levantou, envolvendo-o num abraço. — Você vai àquelebaile esta noite?

— Tenho de ir, querida. Não posso voltar atrás depois de assumir umcompromisso, não é mesmo?

— É, sim — concordou ela com um suspiro. — Amo você, papai.— Eu também te amo, minha pequena. Comporte-se.

— Vou tentar.

Maldito unha-de-fome sem visão de...— Melbourne!Cuidando de refrear o arroubo colérico, Sebastian diminuiu o passo acelerado

com que havia cruzado o saguão à entrada da Câmara dos Lordes. Em todos os seusvários anos de sessões parlamentares, podia contar nos dedos às vezes em queconseguira deixar o edifício sem que um ou outro vigarista viesse no seu encalço. Mas,depois do almoço que tivera, estava até ansioso por aquele tête-à-tête.

— Você me chamou, Kesling?Com uma corridinha, o visconde foi parar bem diante dele recendendo a uma

colônia francesa que mal disfarçava o cheiro de suor que o envolvia.— Melbourne, pensei que suas idéias fossem mais progressistas. Vive dizendo

que se preocupa com o bem-estar do povaréu, mas sempre que o príncipe solicitarecursos para alguma das extravagâncias que inventa, você vota a favor dele.

Outra vez aquela conversa.— Não quer aproveitar para me explicar, Kesling, por que é que, todas as vezes

em que se propõe um imposto sobre a propriedade, cuja arrecadação será utilizada em

prol do povo, você  vota contra? Isso sem falar da insensibilidade com que trata aspessoas que vivem nas suas terras.

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— Por que esses fardos têm de ser colocados sobre nossos ombros? Só porquetemos berço? Não me parece que...

— Ah, então é esse o problema. Pois bem, vou lhe explicar meu ponto de vista de

uma vez por todas. Para que o Reino Unido continue a ser uma potência num mundo emdesenvolvimento precisamos estar aptos a progredir. Para isso, precisamos decidadãos bem instruídos e satisfeitos; e para que o restante do mundo nos veja comouma potência, nosso sistema político tem de se mostrar sólido e benevolente, portantoeste governo deve estar do lado do seu monarca e do seu povo. E assim será, pelomenos enquanto houver um Griffin na Câmara dos Lordes. — Girou sobre oscalcanhares. — Tenha um bom dia, Kesling.

A porta da frente da Mansão Griffin se abriu assim que a carruagem deteve-se

no passeio de pedriscos.— Lady Peep já voltou, Stanton? — quis saber Sebastian.— Ainda não, Vossa Graça. Mas chegou mensagem de Carlton House.A entrada da residência, ele apanhou a mensagem da salva de prata que o

mordomo lhe estendia para passar os olhos pelo comunicado.— Faz tempo que isto chegou?— Cerca de vinte minutos, Vossa Graça.— Vamos sair novamente, Tollins. — Guardou o bilhete no bolso para ajeitar o

chapéu e as luvas. — Diga à minha filha aonde fui e também que voltarei assim que

possível, Stanton.— Certamente, Vossa Graça.De volta às ruas de Mayfair, Sebastian suspirou, contrariado. Não era difícil

deduzir o que o príncipe queria; apesar dos transtornos ocorridos naquela manhã e dofato de ter os cofres vazios, o regente continuava obcecado com a idéia de concluirseu pavilhão em Brighton.

Por Deus. Em algum instante da vida, havia deixado de ser um leal partidário damonarquia para se tornar confidente e conselheiro do príncipe George, tambémconhecido por Prinny. O que lhe conferia um poder suplementar sobre os rumos do

país, além de tê-lo introduzido no que parecia ser uma espécie de segredo: quemfizesse vista grossa aos esporádicos acessos de ira e freqüentes assomos teatrais doregente iria descobrir que Prinny era um sujeito muito sagaz e de apurado bom gosto.

Assim que chegou a Carlton House e um dos criados o conduziu até o solenesalão branco, pôs-se de sobreaviso; aquele aposento se destinava a convidados e haviamuito, tais formalismos não se aplicavam mais a ele. Ainda assim, agradeceu ao rapaze, em silêncio, foi se colocar junto à janela com vista para o jardim.

Cinco minutos depois, a porta tornou a se abrir.— Melbourne! — Soou a conhecida voz de Prinny. — Eu não sabia que iria

encontrá-lo por aqui. Pelo visto, há questões urgentes que você gostaria de tratarcomigo.

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Ao se virar para o regente e ver que ele vinha acompanhado por uma dúzia depessoas, Sebastian tratou de dissimular a surpresa com um sorriso. Acaso tinha setornado um adorno a ser oferecido a turistas?

— De fato, Vossa Alteza — aquiesceu, curvando-se de leve antes de se acercardos recém-chegados.— Já, já cuidaremos disso. Antes, quero lhe apresentar Sua Majestade Stephen

Embry, Rey de Costa Habichuela, e a esposa dele, a rainha Maria. Vossas Majestades,Sua Graça, o duque de Melbourne, um dos meus mais íntimos conselheiros.

Adiantando-se, o homem à frente da comitiva estendeu a mão.— É um prazer, Vossa Graça — declarou, num sotaque típico da região da

Cornualha.Hum. Até onde ele sabia, a Cornualha não havia se separado da Inglaterra.

Tampouco mudara de nome.— Vossa Majestade. — Sebastian apertou a mão do desconhecido.Afora o sotaque, o Rey , apesar do título hispânico, era loiro e espigado, com um

bem modelado bigode dourado e feições nitidamente inglesas. Seu vistoso uniformenegro, de corte assemelhado a um traje militar, era o mesmo dos quatro outroshomens que rodeavam o grupo, dos quais se diferenciava por uma estreita faixa brancaapoiada sobre o ombro esquerdo que se cruzava numa borla sobre o quadril direito. Afaixa continha várias condecorações, evidentemente militares, dentre as quaissobressaía uma singela cruz verde no meio do peito. Ao contrário do rey, a dama com a

mão no braço dele tinha traços inegavelmente espanhóis: cabelos negros, peletrigueira e olhos castanhos.— Posso indagar onde se situa Costa Habichuela? — Sebastian tornara a fixar o

olhar no rey.— Ah, alegra-me que tenha perguntado — observou Embry com um sorriso. —

Estamos na costa leste da América Central. Um lugar magnífico. Não tenho comoexpressar a satisfação que senti quando o rei Qental o outorgou a mim e meusherdeiros.

Nesse caso, aquele era o terceiro país a se formar nas Américas do Sul ou

Central nos últimos dezoito meses.— Então sua nação fica na Costa de Mosquitos.— Muito bem, Vossa Graça. Vejo que conhece bastante sobre Geografia.— O que é bem menos sabido — assinalou uma voz suave à esquerda do rey — é

que aquela região recebeu esse nome devido a um grupo de ilhotas conhecidas comoMosquitos, e não por causa do inseto.

Ao virar o rosto, Sebastian viu-se fitando um lindo par de olhos de um castanholuminoso e denso como o solo recém-arado na primavera, plantados num rosto, cuja tezclara e viçosa, fazia lembrar creme fresco. Longos, espessos e soltos, os cabelos dela

eram negros e luzidios tais quais as asas de um corvo.

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— Vossa Graça — interpôs o rey —, minha filha, a princesa Josefina KatarinaEmbry.

Com a sensação de que estivera muito longe dali, Sebastian pestanejou antes de

se curvar.— Vossa Alteza.— Vossa Graça. — Ela devolveu o cumprimento com uma mesura, os olhos

reluzentes como pedras preciosas.— O rey e família estão aqui para levantar alguns empréstimos. — Prinny uniu as

palmas das mãos rechonchudas. — Parece-me que você, Melbourne, seria o contatoperfeito nessa transação, portanto vou nomeá-lo intermediador britânico para osassuntos de Costa Habichuela. O que me diz?

E o que poderia dizer? 

— É uma honra, Vossa Alteza. Não sei se sou a pessoa mais indicada para isso,mas de qualquer modo, terei muita satisfação em recomendá-los.— Esplêndido. Você vai ao sarau dos Elkins esta noite, não?— Pretendia ir.— Então irá acompanhar nossos amigos até lá. Infelizmente, tenho um

compromisso agendado previamente, caso contrário eu mesmo iria.Sebastian quase chegou a se indagar se o príncipe não estaria exagerando ao

conceder legitimidade ao novo país, encarregando um assistente como o duque deMelbourne de apresentar o rey à alta sociedade londrina, mas então se deu conta de

que o regente estava era interessado em usar da ocasião para impressionar umpunhado de estrangeiros com o poder de sua generosidade e de sua influência.— É uma pena que a rainha Maria e eu também já tenhamos outro compromisso

— declarou o rey com ar de quem se desculpava.Graças a Deus.— Mas a princesa Josefina certamente irá representar Costa Habichuela

perfeitamente bem no nosso lugar.Ignorando o arrepio que sentira ao longo da espinha, Sebastian afirmou:— Então me diga onde estão hospedados, e eu estarei lá às oito horas.

— Cuide disso, sim, Josefina? — Sem mais, o rey se virou para Prinny a fim deinquiri-lo sobre uma das várias estátuas de mármore que adornavam o salão.

— Vamos nos hospedar na residência do coronel Winston Branbury atéencontrarmos um local onde instalar o consulado. — Sem mais, a princesa pousou a mãono braço dele.

— Sei onde fica.— Que bom. Como não conheço Londres, — prosseguiu ela comum sorriso — não

saberia lhe explicar como chegar lá.— Não se preocupe com isso. — Obrigou-se a tirar os olhos daquela boca

carnuda que parecia a ponto de fazer biquinho. — Minha carruagem estará naresidência dos Branbury às oito em ponto.

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— Gosto muito de cavalheiros solícitos. — O sorriso insinuante se alargou. —Dizem que perpetrou atos de heroísmo esta manhã, Vossa Graça.

— Fiz minha obrigação, nada mais.

— Elegante e modesto.— Minha elegância ainda tem de ser posta à prova.Ah, aqueles olhos... Com muito jeito, recolheu o braço em que a princesa se

apoiava e se voltou para a porta.— Até a noite.Tão logo chegou ao corredor, Sebastian, com a impressão de que acabara de

correr a maratona, encostou-se à parede a fim de recuperar o fôlego. Que diaboestava se passando com ele? Primeiro: não havia desculpa para não recusar aquela dorde cabeça que Prinny lhe arranjara. Segundo: não era mais nenhum moleque. Por Deus,

tinha trinta e quatro anos! De mais a mais, já havia pousado os olhos em inúmeras jovens lindas. Aliás, fora casado com uma delas. E, desde então, nunca mais se sentiratão... sem chão.

Meneando a cabeça, endireitou-se e rumou para a entrada principal da CarltonHouse. Apesar de o príncipe tê-lo colocado numa situação que ele preferiria evitar aqualquer custo, iria lidar com esse contratempo do mesmo modo como lidava com tudoo mais na vida: com presteza e eficiência. Quanto à princesa... Bem, colocar JosefinaKatarina Embry de lado não seria nenhum problema. Ou melhor, não iria se permitirque fosse de outra maneira.

Sebastian se acomodou no coxim diante do irmão e da cunhada.— Vamos?Zachary deu duas pancadinhas no teto da carruagem e, nem bem o veículo se pôs

em movimento, foi logo indagando:— Por que estamos usando meu coche esta noite? Peep não fugiu no seu, não é?— Mandei-o ir buscar uma pessoa a quem devo servir de cicerone no sarau.— Quem?— Estou fazendo um favor a Prinny. Ele me pediu que acompanhasse uma alta

figura estrangeira ao sarau.— Nesse caso, o que está fazendo na minha carruagem?— Não seria de bom-tom eu estar na minha.— Ah, a figura é uma dama. Essa moça não tem uma aia ou coisa que o valha?

Assim não seria tão...— Preferi vir com vocês. Embora esteja começando a pensar que tanto eu

quanto sua esposa poderíamos passar muito bem sem a sua companhia.— Só perguntei por perguntar, oras.— Não, você estava metendo seu nariz em assuntos que não lhe dizem respeito.

— observou Caroline, batendo de leve no joelho dele.

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— Como não me dizem respeito, se envolvem minha família? — Ajeitou-semelhor no assento de couro. — Essa moça deve ser feia de matar.

— Zachary!

— É isso, não é? — insistiu ele. — Uma autoridade estrangeira mais feia do queum saco de batatas estragadas que Prinny empurrou para cima de você. Não vai ter dedançar com ela, vai? Será que a infeliz sofre de gota? É provável. O...

— Como está o retrato que está fazendo do duque de York, Caroline? —Sebastian fixou os olhos na cunhada.

— Está quase pronto, obrigada por perguntar.— Não sei por que evitar o assunto, Seb, já que vamos vê-la na festa — teimou

Zachary. — E eu não sairei dos seus calcanhares até você apresentá-la a mim.— Faça como quiser, mas saiba que Willits e Fennerton também estarão atrás

de mim, o que significa que você terá de aturá-los também.— Fennerton? — Zachary torceu o nariz.— O próprio.Assim que desceram da carruagem, Sebastian tratou de tirar a imagem da

princesa de olhos castanhos dos pensamentos. Esperava que servir como intermediáriodo chefe de governo de Costa Habichuela não fosse muito além de apresentar o rey asir Henry Sparks, do Banco da Inglaterra. Quanto àquela noite, por uma questão deboas maneiras, iria providenciar um meio de transporte e um braço como apoio. Nadamais. E a desconhecida sensação que lhe esfriava as entranhas decerto se devia ao

fricandó de vitela que a cozinheira tinha servido no jantar.— Shay e Sarala já chegaram — avisou Zachary, indicando o irmão do meio e aesposa dele, que se aproximavam.

— Vocês estão sabendo — indagou Charlemagne sem preâmbulos — que Prinnyfoi designado Cavaleiro Honorário da Cruz Verde? Parece que ele está felicíssimo porcausa de uma família real de um novo país da América do Sul... Costa qualquer coisa.Tanto que até indicou um dos subordinados para atuar como intérprete ou uma toliceque o valha para os visitantes.

Maldição! 

— Intermediário — corrigiu Sebastian por entre os dentes. — Para os assuntosde Costa Habichuela.

— Você? — Zachary quase se engasgou.— Sim, eu. Um pedido do príncipe, que por certo não acarretará grandes

responsabilidades.— Indicar o duque de Melbourne para contato de um país do qual ninguém ouviu

falar? — Charlemagne baixou a voz para indagar: — Prinny se zangou com você porconta do incidente desta manhã?

Normalmente Sebastian jamais permitiria especulações sobre suas atribuições,

no entanto era provável que seu irmão estivesse ecoando o que seus pares andavam ouiriam dizer quando se inteirassem da novidade.

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— Não, Prinny não está bravo comigo — retrucou calmamente. — Um governo aoque tudo indica estável nas Américas ao sul do Equador é uma raridade, ainda mais sepró-britânico. Embora não esteja a par de certos detalhes a respeito desse novo país,

o que sei com certeza é que, se a Inglaterra não lhes der o que eles vieram buscar, osrepresentantes de Costa Habichuela podem ir procurá-lo noutro lugar qualquer... AFrança, por exemplo. Além do quê, há chances potenciais de lucro comercial caso o rey consiga por aqui os empréstimos em que está interessado.

— Lucro? — repetiu Charlemagne, perplexo. Ao lado dele, Sarala corrigiu comum sorriso:

— Chances potenciais de lucro. O que, suponho, significa esperar para ver, não émesmo, Sebastian?

— Exatamente. Fico contente com que vocês dois tenham se casado com

mulheres inteligentes, já que nem um nem outro têm muito senso. — Com a atençãoatraída para a movimentação junto às portas do salão de baile, Sebastian viu derelance uma luzidia cabeleira negra. — Com licença.

Na companhia de uma aia e de um daqueles guardas de uniforme todo preto,Josefina Embry o encarou ao perceber que ele se aproximava. Deus, aquela mulher eramesmo um espetáculo. Naquela noite ela usava um vistoso traje amarelo, cujo decoteevidenciava a curva de seios alvos que pareciam palpitar ao ritmo da respiraçãocaden...

A princesa lhe deu um sonoro tabefe.

Cerrando os punhos à reação instintiva de devolver o tapa, Sebastianpestanejou um par de vezes. O ardor da bofetada não era nada se comparado àsrisadas e aos cochichos que se espalhavam pelo salão dos Elkins.

— Jamais volte a fazer isso — advertiu-a em voz baixa, antes de curvar oslábios num arremedo de sorriso.

— Meu pai e o príncipe regente lhe pediram um favor dos mais triviais —redargüiu Josefina, a voz e a expressão destituídas de quaisquer resquícios daamabilidade daquela tarde. — Se você não é capaz de se incumbir de uma tarefa tãobanal, providenciarei para que seja afastado imediatamente dos seus compromissos

para com Costa Habichuela, antes que possa nos prejudicar com a sua incompetência.Sebastian precisou juntar todas as forças para manter o controle e permanecer

ali, imóvel. Ninguém, ninguém,  jamais se atrevera a falar com ele daquela maneira. Equanto à bofetada... Cerrou os dentes.

— Se fizer o favor de me acompanhar até o espaço reservado à dança, tentareiesclarecer seu equívoco.

— Meu  equívoco? Eu sou uma princesa; você é só um duque. Oh, estouprofundamente descontente!

O círculo de curiosos que se formara à volta deles só fazia crescer.

— Venha comigo, sim? Assim solucionaremos este impasse de um modocivilizado.

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— Antes de qualquer coisa, peça desculpas. — Sebastian respirou fundo. Tudo oque precisava fazer era virar-se e ir embora dali; as pessoas iriam comentar, osmexericos se espalhariam como folhas ao vento, mas no final das contas sua reputação

e seu poder venceriam o confronto a seu favor. No entanto, queria vencê-la naqueleinstante, ali mesmo. Queria que ela  se desculpasse, que ela  se rendesse. Queria aboca, o corpo daquela mulher.

— Desculpe-me pelo transtorno, Vossa Alteza. Por favor, venha comigo até abiblioteca para que possamos conversar. — Tentou segurar no pulso dela.

A princesa se esquivou.— Não lhe dei permissão para tocar em mim.— Então estamos num impasse, — replicou Sebastian, a voz ainda baixa e

contida — porque não vou dar prosseguimento a esta conversa à entrada de um salão

de baile.Josefina fitou-o nos olhos, e ele sentiu um estremecimento. Eram poucas aspessoas que o enfrentavam com tanta altivez.

— Acho que prefiro dançar em vez de conversar.Dançar. Ele queria estrangulá-la, e a atrevida queria dançar. Bem, era melhor do

que ficarem parados ali, chamando a atenção de todos... Ao virar o rosto e depararcom lorde Elkins, Sebastian não perdeu tempo:

— Poderia providenciar uma valsa, Thomas? A princesa Josefina gostaria dedançar.

— Claro, Vossa Graça. — O visconde acenou para os membros da orquestra, quehaviam se debruçado sobre o balaústre do balcão para melhor apreciar a cena láembaixo. — Toquem uma valsa!

Tropeçando uns nos outros, os músicos retomaram seus assentos e, depois deuma escorregadela nos acordes iniciais, a valsa deslanchou. Ao menos a música altadaria fim ao falatório.

— Permite-me? — Sebastian estendeu a mão.Após um instante de deliberada hesitação, Josefina colocou os dedos

protegidos pela luva sobre os dele. Contendo o ímpeto de mostrar a ela quem estava no

comando, Sebastian enlaçou-a pela cintura e, depois de lançar rápido olhar na direçãode Charlemagne, conduziu-a ao espaço destinado à dança.

Tão logo seus passos se harmonizaram, a princesa indagou:— Não vai me explicar por que mandou uma carruagem ir me buscar em vez de

fazê-lo pessoalmente?— Seu inglês é bastante bom para uma estrangeira. Mas, como natural deste

país, permita-me avisá-la de que, independentemente de quem você é em outro lugarqualquer, — intensificou a força com que a segurava ao senti-la tentar se afastar —aqui na Inglaterra não se estapeia um nobre em público.

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— Para sua informação — retrucou ela no mesmo tom —, meu inglês é perfeitoporque, até dois anos atrás, eu era inglesa, criada a maior parte do tempo na Jamaica.E vou esbofetear quem quer que me ofenda.

— Você é maluca. Só isso explica o fato de falar comigo dessa maneira.Ela ergueu elegantemente uma sobrancelha.— O fato de eu ser a única pessoa que o confronta com a verdade não faz de

mim uma maluca, e sim covardes de todos os que o rodeiam.— Eu deveria...— Deveria o quê, Melbourne? — Baixou os olhos aos lábios dele. — Discutir

comigo excita você, não é? E você não consegue evitar isso, não é mesmo? — Voltandoa fitá-lo nos olhos, largou-se com certa sensualidade entre os braços que asustentavam.

Sebastian cerrou os dentes com tanta força que chegava a doer. A princesasentia a atração que havia entre ambos tão intensamente quanto ele... Tal constataçãotalvez devesse tornar aquela valsa, aquela conversa, o simples fato de olharem-se nosolhos mais fácil, no entanto não era isso o que acontecia. Ao rodopiar com ela pelosalão, percebeu que só conseguia imaginar Josefina nua, largada sob seu corpo,implorando por ele, rogando por piedade, suplicando alívio para o desejo que osconsumia.

E, naquele instante, teve certeza de que jamais havia chegado tão perto doslimites do seu notório autocontrole.

— E então duque, não tem nada a dizer?— Prefiro atitudes a palavras.— É mesmo? Que espécie de atitude? — Josefina quase chegou a umedecer os

lábios com a ponta da língua, porém a suspeita de que Melbourne estava a ponto de selançar sobre ela ali mesmo, no meio do salão, impediu-a de fazê-lo. O corpete de seuvestido parecia tão apertado que mal conseguia respirar. Esperara a tarde inteira porele. Pelo calor da mão que a alçaria ao coche dele, pelas observações espirituosas queiriam trocar a caminho do baile. E então a carruagem chegara... sem ele dentro.

— Não quero ofender ainda mais Vossa Alteza com a descrição do tipo de

atitude que tenho nos pensamentos — respondeu Sebastian num murmúrio carregadode volúpia.

Josefina se sentiu estremecer. Acaso aquele homem fazia idéia do quanto asimples presença dele mexia com uma mulher? Os cabelos castanho-escuros queondulavam de encontro ao colarinho, o físico alto e esguio, as maçãs do rosto dearistocrata romano, o nariz e o maxilar cinzelados e, sobretudo, aqueles reluzentesolhos cinzentos como uma tormenta... Como era possível que ele não soubesse?

— Você já me ofendeu — afirmou, tentando manter a voz firme. — Responder àpergunta que lhe fiz não irá piorar ainda mais a situação.

Sebastian aproximou o rosto de modo a deixar os lábios a poucos centímetrosdos dela, então indagou num sussurro:

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— Está louca por me ouvir dizer, não está, princesa? — A música foi se avivandonum crescendo e, de súbito, chegou ao fim. Os convidados se puseram a aplaudir.

— Pois vai ter de imaginar. — Depois de roçar os lábios na orelha dela enquanto

falava, mostrou com um gesto o canto do salão onde Conchita e o tenente May aaguardavam.Que mil raios o partissem, o miserável.— Você é meu acompanhante esta noite, Melbourne — Josefina apressou-se em

dizer antes que ele sumisse dali. — Faça o favor de não se esquecer disso.Com uma mesura protocolar, que deixava bem claro que ele não fazia nem mais

nem menos do que era de se esperar, Sebastian afirmou:— Evidentemente. — Acenou com a cabeça para alguém às costas dela. —

Permita-me apresentá-la aos nossos anfitriões, lorde e lady Elkins. Thomas, Mary,

esta é a princesa Josefina de Costa Habichuela.— Sua presença muito nos honra, Vossa Alteza — declarou efusivamente aviscondessa antes de se curvar numa mesura reverente.

— É um prazer — afirmou Josefina, colocando na voz toda a doçura que havianegado ao seu acompanhante.

— Oh, preciso apresentá-la ao restante dos convidados. — Assim que a seguroupelo braço, lady Elkins emendou:

— Se quiser me dar essa satisfação, Vossa Alteza.— Sim, é claro. — Josefina se virou para Sebastian.

— Não vá muito longe, duque.— Eu nem sonharia com isso, princesa — retrucou ele com um sorriso gélido.Ótimo. Mais tarde ela cuidaria de mostrar ao duque de Melbourne quem iria

pedir permissão para tocar em quem.Enquanto lady Elkins guiava a princesa Josefina ao encontro da deslumbrada

multidão, Sebastian partiu em direção à porta mais próxima que se abria para os jardins e, uma vez no terraço, foi agarrar o balaústre de pedra com ambas as mãos.Trêmulo de raiva, nem se deu conta de que tinha os nós dos dedos descorados detanta força que fazia.

— Seb?— Deixe-me sozinho. — Fechando os olhos por um instante, inspirou

profundamente na tentativa de acalmar as batidas do coração.Mas o ruído das botas sobre o piso de pedras indicava que Charlemagne, em vez

de ir embora, tinha se aproximado.— Os comentários ainda não cessaram, e eu não consigo pensar numa boa

explicação quanto ao motivo que a princesa teria para esbofetear você. Algumasugestão?

— Deixe estar.

— Tem certeza? Do modo como a olhava enquanto vocês dançavam...Virando-se de supetão, Sebastian encarou o irmão.

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— Que modo?— Ah, Melbourne. Esqueça o que eu disse.— De que modo, Shay?

— Com volúpia. Você a fitava como se quisesse deitá-la no chão e... Sei que issonão é do seu feitio, mas meia centena de pessoas poderia pensar que...— Volúpia — cismou Sebastian em voz alta. Fazia sentido. Sua carne parecia

arder em brasas. — As pessoas que pensem e digam o que bem entenderem.— Você é humano, Seb. Sei que às vezes gostaria que esquecêssemos isso, mas a

verdade é que você é humano como todos nós.— Bem, seja lá o que isso significa, não quero pautar minhas atitudes pelo que as

pessoas estejam comentando. Por isso, volte para o salão comigo... rindo.— Rindo?

— Sim. As excentricidades da princesa Josefina nos deixaram às gargalhadas.— Voltando a se dar o ar sereno que todos conheciam, colocou um braço ao redor dosombros de Charlemagne e o empurrou em direção ao salão de baile. — Ria, diabos. —Fosse qual fosse o demônio que Josefina quisesse instigar por meio de agressões ouprovocações, iria mostrar àquela sirigaita que ela havia comprado briga com ummestre. Se tivesse um pingo de juízo, a temperamental princesinha se renderia semdemora.

Contudo, por mais forte que fosse a determinação de Sebastian em se manterindiferente ao contratempo à entrada do salão, o restante do clã Griffin não lhe daria

trégua tão facilmente. Tanto que, assim que ele convenceu Charlemagne a deixá-losozinho, Zachary e Caroline não perderam tempo a se acercarem.— Está quente como o inferno aqui — comentou Zachary, tentando afrouxar a

elegante gravata branca no estilo plastrão.— Está, sim — concordou Sebastian, com o cuidado de se manter de costas para

o espaço destinado à dança e a quem porventura estivesse bailando com a princesa. —Lady Elkins tem horror a correntes de ar, por isso não contem com portas ou janelasescancaradas.

— Ao menos você podia nos fazer a gentileza de suar, Seb.

— Sou um duque; não suo. — Na verdade, era o calor que vinha do âmago do seucorpo o que realmente o incomodava. — Por que não vai dançar com sua esposa?

— Estou lhe fazendo companhia. — Antes que Sebastian pudesse reclamar, umavoz suave e melíflua arrulhou às costas dele:

— Vossa Graça, decerto irá se apiedar de uma pobre moça sem par para aquadrilha.

— Lady Frederica. — Ele se virou com um de seus sorrisos próprios paraocasiões como aquela. — Está encantadora esta noite.

Com um traje todo bordo e os cabelos loiros repletos de cachinhos, a jovem

dama fez uma mesura antes de bater as longuíssimas pestanas.— Obrigada, Vossa Graça. É muito gentil de sua parte.

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— Terei muito prazer em acompanhá-la até a mesa de petiscos, minha dama,porém não me sinto disposto a voltar a dançar esta noite. — Como conhecesse asregras, e soubesse como usá-las a seu favor, tinha certeza de que, ao recusar aquele

convite, estaria deixando bem claro que queria que o deixassem em paz. Não que nãosoubesse por que moças como Frederica viviam a persegui-lo, mas, pelo amor de Deus,após quatro anos já era hora de perceberem que ele não tinha intenções de voltar a secasar. A única forma de tornar sua decisão ainda mais explícita seria pendurar umatabuleta no pescoço, só que isso iria estragar sua gravata.

— Certamente, Vossa Graça — aquiesceu Frederica, toda enrubescida. — Suacompanhia já é mais do que bem-vinda.

Muito bem, agora só precisaria trocar umas palavrinhas com mais um punhadodas insistentes mocinhas casadoiras que perambulavam pelo salão naquela noite. O que

era bem melhor do que ter de dançar com elas.Ao erguer o rosto, deparou com Josefina a observá-lo. Seus olhares secruzaram, mas então ela se virou noutra direção. Ótimo. Se soubesse o que era bompara ela, a princesa não iria reclamar quando a mandasse de volta para casa sozinha.Pois se por fora parecia a calma em pessoa, por dentro se sentia um animal predador.

— Como foi sua noite, filha?Depois de entregar o manto para Conchita, sua aia, Josefina entrou na sala que

o pai havia transformado num gabinete para uso dele.

— Terrível. — Foi se largar na poltrona diante da escrivaninha. — Não sei deonde tirou a idéia de que o duque de Melbourne poderia ajudá-lo com o progresso deCosta Habichuela. Aquele homem é arredio, grosseiro e arrogante.

— O auxílio dele pode vir a ser a diferença entre êxito e fracasso — retrucou orey. — Além disso, duvido de que iríamos encontrar um marido mais apropriado paravocê em qualquer outro lugar da Inglaterra.

— Talvez não devêssemos contar com isso. Ele me deixa... pouco à vontade.— É bom, assim você se mantém alerta. — Erguendo os olhos do mapa que cobria

a escrivaninha, sorriu para a filha. — Tenha em mente que, ainda que nossa ascensão à

realeza seja recente, temos prerrogativas reais. E por mais arrogante que o duqueseja ou do quanto você se sinta incomodada, seu sangue é mais azul do que o dele.

— Acho que Melbourne deve ter gelo nas veias, não sangue... Mas, sim, vou melembrar disso.

— E só o que lhe peço. Agora vá se deitar, amanhã teremos um dia cheio.Erguendo-se, Josefina deu a volta à mesa para ir beijar o rosto do pai. Após

três semanas num navio vindo da Jamaica, dois dias num coche que chacoalhara deBrighton a Londres e um dia interminável na capital, bem que merecia longas ereparadoras horas de sono. Talvez os planos de seu pai para o dia seguinte incluíssem

Melbourne... Podiam não simpatizar um com o outro, mas nem por isso lhe passava pelacabeça dar a ele o gostinho de vê-la admitir-se derrotada.

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— Não, não vou pagar um pêni além dos quatro xelins por saca. — Sebastianapanhou o documento que deixara ao alcance da mão.

— Estão dizendo que a safra é de primeiríssima qualidade. — Charlemagne fezuma anotação no livro contábil. — Pagamos três ponto oito xelins no ano passado.— São grãos de café, Shay, não ouro em pó. Quatro xelins. Quer apostar como

eles não vão conseguir preço melhor?— Bem, é só o que temos por ora. — Charlemagne fechou o livro-caixa. — E

então, vamos ou não vamos falar do que houve ontem?Sebastian limpou a garganta.— Não, não vamos. Vi-me forçado, em virtude de minhas atribuições, a dançar

com uma lunática, e foi isso o que aconteceu. Ponto final.

— Mas você se sentiu terrivelmente atraído por ela. Era evidente.— Ela é bonita. — Levantando-se, contornou a escrivaninha para praticamenteempurrar Charlemagne para fora da poltrona e, em seguida, rumo ao corredor. — Emaluca. De relance, achei a mistura intrigante; olhando de perto, achei um horror.

— Mesmo assim, Seb, é uma...— Não continue. Eu amava Charlotte. Ainda amo. — Fez uma pausa. — Com você,

Zachary e Eleanor casados e com filhos, e com Peep prestes a fazer oito anos, alinhagem dos Griffin está assegurada. Preservá-la seria o único motivo que me levariaa pensar num segundo casamento, no entanto vocês três me pouparam dessa dor de

cabeça.— Ainda que não pense em se casar novamente, você não pode negar que sexo émuito bom. — Charlemagne repuxou um canto da boca. — Não com uma lunática,logicamente, mas há inúmeras...

— Alguma vez na vida dei a impressão de que apreciaria seus conselhos no quediz respeito às mulheres? — Por Deus, bastara um tapa daquela... doidivanas paratodos deduzirem que ele havia perdido a capacidade de raciocinar. E se era assim comsua própria família, o que seus pares não estariam pensando?

— Claro que não. Mas o fato é que você não tem demonstrado o menor interesse

no assunto desde a morte de Charlotte.— Ao que me consta, isso é problema meu. Agora, não posso deixar de admitir

que a princesa Josefina tenha me surpreendido ontem. De agora em diante, vou tratarde me colocar fora do alcance das bofetadas dela. — Obrigou-se a sorrir.

— É bom saber. — Charlemagne se encaminhou para o hall. — Seja como for,você não pode nos culpar por querermos a sua felicidade.

— Estou bem. — Sebastian seguia ao lado do irmão em direção à porta. — Elevar uma mulher insana para a cama decerto não iria contribuir para a minha paz deespírito.

— Bem, vou enviar nossa oferta a Prask por escrito. É bem provável que eleaceite, caso você tiver razão quanto ao preço.

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— Eu sempre tenho razão.Ao sair para a varandinha diante da residência com o irmão do meio, Sebastian

teve a sensação de ser acompanhado pelo relativo vazio da Mansão Griffin. Apesar da

presença de Peep e do batalhão de criados, aquele casarão era grande como o diabo sópara ele e sua filha.— Melbourne?— Sim?... Perdão, Shay; o que você ia dizendo?— Perguntei se ainda tenciona ir ao Almack's esta noite.— Vou, sim; Prinny me mandou um bilhete, pedindo que eu levasse os visitantes

de Costa Habichuela lá, por isso precisei cancelar o passeio a Vauxhall com Peep.Lorde e lady Bernard irão levá-la.

— Aposto que a escolha não foi nada fácil: Margaret Trent ou a princesa

Josefina. — Charlemagne deu uma risadinha. — Talvez fosse melhor você usar aarmadura do bisavô Harold esta noite.— Não é má idéia.Ainda sorrindo, Charlemagne deu um tapinha no ombro dele antes de descer os

degraus e saltar à garupa do seu cavalo. Sebastian esperou até vê-lo tomar a ruatransversal e, ao retornar ao interior da mansão, indagou ao mordomo junto à porta:

— Correspondência, Stanton?— Sim, Vossa Graça. — Após fechar a porta, o criado foi tomar na mão a salva

que estava sobre a mesinha do vestíbulo.

Sebastian recolheu da bandeja de prata a pilha de cartas entregues em mãos,convites e cartões de visita. Como Rivers, seu secretário, já havia se encarregado dasmissivas comerciais, toda aquela correspondência só podia ser de cunho social.

— Obrigado, Stanton.— Não há de quê. Oh, sim... Lady Penélope pediu-me que não me esquecesse de

lhe dizer que fosse ao encontro dela assim que possível.— E onde ela está?— Na sala de música com a sra. Beacham... e uma amiga, cujo nome não posso

declinar.

— Não pode?— A pedido de lady Penélope, Vossa Graça.Depois de deixar a correspondência em seu gabinete, Sebastian subiu a

escadaria a caminho da sala de música, que ficava na ala dos fundos da mansão, ondealguém executava inspirada melodia ao piano. Ou Peep havia melhoradoconsideravelmente seus dotes musicais desde o dia anterior ou a tal amiga sem nometocava excepcionalmente bem.

— Por Deus, que não seja Margaret Trent — murmurou antes de abrir a porta.— Você queria falar comigo, Pe... — E mais não pôde dizer, pois a voz lhe morreu na

garganta.

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Toda risonha, sua filha saltitava pela sala como se dançando uma alegre jiga,porém não era isso o que o deixava de queixo caído, e sim o fato de que ao piano, comum sorriso faceiro e os dedos a deslizar pelo teclado, estava ela. A doidivanas. Pior

ainda: só de vê-la, já sentia um ardor na virilha.— Olhe, papai! — Penélope fez um gesto largo para indicar o piano. — Ela é umaprincesa!

— Sim, eu sei. Já nos conhecemos. — Recompondo-se do susto, esboçou umamesura. — Vossa Alteza.

— Melbourne. — Sem deixar de tocar, ela inclinou a cabeça.— Se me permite a curiosidade, — Sebastian enviou breve e contrariado olhar à

sra. Beacham — o que faz na minha sala de música?— Na verdade, vim conversar com você.

— Eu estava lá fora quando ela chegou, papai, então expliquei que você havia setrancado no gabinete com tio Shay para tratar de negócios. Aí ela falou que era aprincesa Josefina, e eu a convidei para ouvir enquanto eu fazia minha aula de piano. Elacresceu na Jamaica e sabe música de pirata.

— Isso não é música de pirata, é uma melodia popular que os marinheiros gostamde entoar. — Sebastian pousou o olhar em Josefina. — Aliás, posso perguntar ondeuma princesa aprendeu a tocar jiga?

— Nem sempre fui princesa. — Deu fim à melodia com exagerado floreio. — Meupai recebeu Costa Habichuela e foi proclamado rey há dois anos.

Ele se aproximou ao vê-la pôr-se em pé. Josefina Embry trajava um graciosovestido de musselina branca ornada com multicoloridas florzinhas primaveris e umacruz verde bordada na manga esquerda.

— E o que costumava ser antes de se tornar princesa?— Filha de um muito benquisto e condecorado coronel do Exército e neta de um

vice-rei venezuelano. — Empinou o queixo. — E você, o que costumava ser antes detornar-se duque?

— Filho de um duque. — E marquês de Halpern, porém isso não vinha ao caso nomomento, afinal já tinha retrucado à altura o que ela quisera implicar.

— Hum. Então meu pai conquistou a realeza por aclamação, e você herdou seutítulo.

— E você, diga-me o que fez para se tornar membro da realeza, Vossa Alteza. —Josefina se fez de ofendida.

— E pensar que vim aqui com a idéia de pedir que haja paz entre nós... Mas vocêcontinua a me insultar.

— Você a insultou, papai? — Penélope assistia à discussão ao lado da sra.Beacham, as duas de olhos arregalados.

— Não antes de ela ter me estapeado.

— Você bateu no meu pai? — Os olhos acinzentados da menina se estreitaram.— Ele é o duque de Melbourne, o homem mais poderoso da Inglaterra!

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— A Inglaterra é um país muito pequeno, querida — retrucou Josefina semdeixar de encará-lo.

— Sra. Beacham, leve Penélope para dar uma volta, por favor.

— Pois não, Vossa Graça. — Após uma mesura feita às pressas, a governantacorreu a deixar a sala, levando a garotinha. Enquanto a porta se fechava, Sebastianouviu-a indagar: — Não falei que não se deve trazer estranhos para dentro de casa,mocinha?

— Mas ela disse que era prince... — A porta cerrou-se de vez com um estalo.Ele respirou fundo.— Permita-me acompanhá-la até a rua, Vossa Alteza. Vou pedir ao meu cocheiro

que a leve até sua casa, depois mandarei um bilhete a Prinny, explicando que, pormotivos pessoais, devo declinar do cargo de assessor do governo do seu país.

Tendo em vista que o cabeça da família Griffin provavelmente poderia comprare vender seu diminuto país, era evidente que o duque esperava por um pedido dedesculpas e uma apressada batida em retirada. Ah, mas ele estava redondamenteenganado.

— Ótimo! — Mãos nos quadris, ela caminhou até ele. — Estou certa de que seupríncipe regente irá encontrar alguém mais qualificado do que você para o cargo nobordel mais próximo da residencial real.

— Basta! — Sebastian agarrou-a pelos ombros, deu-lhe um belo de umchacoalhão e, trazendo-a para junto do peito, beijou-a ardorosamente.

Após dissimular um arquejo, Josefina hesitou um instante antes de enlaçá-lopelo pescoço e mergulhar as mãos por entre os ondulados cabelos castanhos dele. Porpouco Sebastian não suspirou ante a abrasadora onda de excitação que se espiralavapor sua espinha e a perturbadora constatação de que, tenros e cálidos, os lábios delapareciam feitos para os seus. Estreitando-a entre os braços, instigou a irresistívelboca da doidivanas com a língua e, ao senti-la entreabrir-se, invadiu-a sem maisrodeios a fim de degustar o sabor e os mistérios ali encerrados.

Com outro arquejo, que fez o membro viril dele saltar à vida, a princesaJosefina deu fim ao beijo e o empurrou para longe. Com tanta força que Sebastian

chegou a se desequilibrar.— Maldito seja! — Apesar da explosão, ela não conseguia tirar os olhos da boca

que a beijara tão sofregamente. — Que diabos pensa estar fazendo?Santo Deus, o que dera nele? — Pareceu... Pareceu-me que seria a única maneira de fazer você se calar.— Seu... Em consideração a meu pai, não contarei a ele o que houve nesta sala. —

Alisando a parte dianteira do vestido, ela se afastou mais um passo. — Mas você medeve uma reparação!

— Como assim?

— Você me atacou!— Não, eu não...

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— Ora! — Josefina ajeitou os cabelos. — Meu pai vai se reunir com sir HenrySparks hoje e me pediu que fosse ao encontro deles no Banco da Inglaterra às trêshoras. Não quero ter de contar ao rey por que você resolveu renunciar ao posto de

intermediário para os assuntos de Costa Habichuela, por isso espero que esteja lánesse horário. — Foi apanhar a carteira que havia deixado sobre a banqueta do piano.— Fui clara, duque?

Sebastian fazia das tripas coração para calar o atordoante desejo queameaçava cegá-lo. Se a tomasse nos braços de novo, não iria se contentar com ummero beijo.

— Perfeitamente clara. Só espero que, quando eu chegar lá, você esteja emalgum outro lugar qualquer.

Ela estacou a meio caminho da porta.

— Vou aonde bem entender. E nenhum duque ou beijo... amadorístico irá meconvencer do contrário.— Amadorístico? — Sebastian aproximou-se. — Você sabia que isso acabaria

acontecendo, tanto que veio pessoalmente à minha casa, em vez de enviar um recado.Afinal, está tentando me seduzir desde o instante em que nos conhecemos.

— Mentiroso! — Josefina olhou para a porta que ele acabava de abrir. —Mentiroso!

— Você queria que eu a beijasse — sussurrou no ouvido dela antes de bloquear ovão da porta com o corpo. — E quer que eu a beije de novo.

— Não posso ser responsabilizada pelos seus arroubos de imaginação,Melbourne. Agora me deixe passar, sim?Sebastian deu um passo para o lado e, olhos fixos no meneio que ela fazia com

os quadris ao descer a escada, instruiu o mordomo lá embaixo:— Stanton, providencie um coche de aluguel para Sua Alteza. — Ao que tudo

indicava, Josefina pretendia usar o intempestivo beijo como forma de pressioná-lo,portanto era preciso minimizar as conseqüências do seu gesto impensado.

— Agora mesmo, Vossa Graça.No pé da escada, a princesa se virou para fitá-lo por um momento, então deixou

a mansão pisando duro no rastro do mordomo.

Baixando a lente de aumento, Josefina olhou para o pai.— Tem certeza de que o sr. Halloway não passou a vida toda fazendo isso? —

Então sorriu para o funcionário. — Meu pai sempre disse que o senhor era umexcelente oficial da burocracia do Exército, mas me parece que o seu forte são osdocumentos jurídicos.

— Obrigado, Vossa Alteza — agradeceu o escriturário, corando. — Há temposvenho estudando o direito de propriedade inglês.

— Está se vendo.

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— Vamos ter quase uma centena de títulos para a reunião desta tarde —observou o rey.

O oficial fez um cálculo rápido num pedaço de papel.

— Cento e trinta e sete, Vossa Majestade.— Ótimo.Josefina enlaçou o braço ao do pai, e os dois deixaram a ala dos fundos da

mansão do coronel Branbury.— Quem diria que criar um país iria demandar tanta tinta?— Eu certamente não — Stephen Embry riu-se — caso não tivesse assistido a

tantos outros movimentos se erguerem e fracassarem. Não custa nada declarar aindependência da Espanha e constituir um governo fundamentado em princípiossólidos, consistentes; só que a Espanha também tem princípios e, o que é mais

importante, um exército constituído.— Um exército que o senhor combateu várias vezes.— Sob Rivera e Simón Bolívar... que malograram com nada além de princípios e

convicções a respaldá-los. Agora este grande projeto é meu. E no momento tenhoapenas uma guarda pessoal e um punhado de voluntários mal armados, portanto é lógicoque tentemos levantar recursos, mas não se aflija; estou confiante de que o Banco daInglaterra vá se encarregar disso. Tão logo sir Henry Sparks aceite nossa proposta, opessoal dele irá se incumbir da impressão dos títulos, assim o nosso pessoal poderá seocupar de despertar o interesse pela compra dos papéis.

— E se a Espanha intervier antes que o senhor consiga o capital? Ou se aInglaterra se recusar a investir no negócio?— Você se preocupa demais, menina. O rei Qental me outorgou as terras, a

Espanha no momento está muito mais incomodada com Bonaparte do que com CostaHabichuela, e eu fiz uma boa pesquisa antes de solicitar que fôssemos apresentadosao duque de Melbourne; ele sabe perfeitamente bem que, se não formos bem-sucedidos por aqui, iremos recorrer à Prússia ou à França. A Inglaterra não quer sómais outra base na América Central, quer também que a França não tenha um postoavançado por lá. Somos um projeto de baixíssimo risco, Josefina, com grande chance

de lucro e compensações.— O senhor é brilhante, papai. — De fato, seu pai era astuto estrategista e,

mesmo que ele não contasse com a sagacidade e o encanto que possuía, sir Henry, oBanco da Inglaterra, Melbourne e qualquer pessoa com umas boas libras para investirnão seriam tolos de deixar passar uma oportunidade como aquela.

— Obrigado, querida. Mas é claro que muito serviria à causa de CostaHabichuela se a filha do rey estivesse para se casar com o chefe de uma das maisantigas, mais respeitadas e mais abastadas famílias da Inglaterra.

E esse mesmo homem a tinha beijado fazia pouco mais de uma hora... Josefina

sentiu o pulso disparar ante a lembrança. Céus, Melbourne beijava como o diabo:tomado de paixão e sem um pingo de clemência. Ele praticamente a devorara.

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— Perfeito para os nossos projetos ou não, Melbourne não é nenhum tolo, papai.Uma hora ele irá perceber que o romance entre nós dois tinha sido planejado. Se é que já não percebeu.

— E que mal há nisso? Ele é duque, você é princesa.— Eu não era princesa até dois anos atrás. E um Griffin é duque praticamentedesde os tempos de César.

— Ainda assim ele é homem e você, minha querida, é uma linda e atraentedonzela de vinte e dois anos de idade.

— Vinte e cinco.— Pelo bem de Costa Habichuela, você pode perder três. Segundo minhas

pesquisas, duques preferem noivas jovens e inocentes. — Stephen sorriu para a filha.— Mesmo quando fui o capitão Embry do exército de George III, ou o coronel Embry

sob o comando do general Bolívar, você já era uma princesa. Ou acha que sua mãe e eu,onde quer que estivéssemos, providenciávamos os melhores preceptores para educá-laa fim de casá-la com um lavrador ou um comerciante? Sempre que digo que tudo navida acontece...

— Por alguma razão — completou Josefina, devolvendo o sorriso que ele lheenviara. — O senhor estava fadado a ser o rey de Costa Habichuela.

— Foi a melhor coisa que me aconteceu depois de você. — Beijou a testa dela. —E você está fadada a se casar com um homem tão importante que eu, quando jovem, jamais me atreveria a encarar olhos nos olhos.

Josefina sentiu um calafrio, no entanto não sabia dizer se seria de expectativaou temor. Caso Melbourne se percebesse guiado para um caminho que não desejavatrilhar, as conseqüências seriam imprevisíveis.

— A esposa dele teve uma filha antes de falecer.— Eu sei. E você irá lhe dar um filho. Além de um país para governar. — Stephen

tirou o relógio do bolso ao ver o capitão Milton apontar junto ao pé da escada. — Ah,está na hora. Vamos à reunião com o banqueiro.

A impressão que iriam causar a sir Henry Sparks naquela tarde seria um dosmomentos mais importantes da viagem à Inglaterra. Ciente de que o pai tinha ensaiado

semanas a fio os argumentos que iria apresentar, Josefina tratara de assumir suapose mais regia e confiante.

Assim que a carruagem deteve-se aos pés dos amplos degraus que levavam aoedifício do Banco da Inglaterra, ela se debruçou sobre o sr. Orrin, conselheirocomercial de seu pai, para espiar pela janela do veículo. Ao lado do rotundo senhor seelevava a figura esguia e altiva do duque de Melbourne.

— No horário combinado. — Após saltar para o chão, o rei Stephen ofereceu amão à filha. — Isso é bom sinal.

Rezando para que o pai estivesse certo, Josefina teve a impressão de sentir na

pele o olhar que Melbourne deitava sobre ela, como se aqueles ardentes olhosacinzentados pudessem penetrar o elegante vestido cor de esmeralda que usava. De

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesasúbito, percebeu que, num gesto reflexo, havia reprimido o impulso de levar a mão àtiara de prata presa aos seus cabelos, um enfeite que usara uma única vezanteriormente e talvez um tanto exagerado para a ocasião. Mas, como seu pai havia

dito, aquela reunião iria ditar o rumo do futuro deles.— Vossa Majestade, Vossa Alteza. — O duque inclinou a cabeça. — Permitam-meapresentar-lhes sir Henry Sparks, diretor do Banco da Inglaterra. Sir Henry, este éStephen, rey de Costa Habichuela, e a filha dele, princesa Josefina.

O diretor da instituição bancária fez reverente mesura, bem mais respeitosa doque o aceno com que Melbourne os saudara.

— É um prazer conhecê-los, Vossa Majestade, Vossa Alteza. Sua Graça medisse que vocês gostariam de tratar de negócios conosco.

— É verdade — confirmou Stephen com um sorriso afável.

— Então vamos ao meu gabinete.Enquanto acompanhavam Henry pelas dependências do edifício, empregados eclientes detinham-se para olhar para eles. Decerto porque reconhecessem Melbourne,mas seguramente ela, seu pai, o conselheiro do rey e os dois guarda-costas não deviamestar fazendo feio.

Sentaram-se diante de uma grande escrivaninha de mogno disposta no centro deuma sala de dimensões modesta, porém organizada. Henry ofereceu a poltrona atrásda mesa a Melbourne, mas o duque recusou, preferindo apoiar-se à beirada de umaparador. Orrin permaneceu em pé, atrás do pai dela.

— Bem, Vossa Majestade — começou o banqueiro —, em que eu e o Banco daInglaterra podemos ajudá-los?— Antes de responder à sua pergunta, — retrucou Stephen — gostaria de

fornecer algumas informações acerca de mim e de Costa Habichuela.— Certamente.— Nasci na Cornualha e, graças ao prestígio da minha família, adquiri uma

patente de tenente no Exército quando fiz dezessete anos. Após dez anos detrabalho, quando já era capitão, percebi que começava a me impacientar com meuofício, por isso vendi a patente e resolvi viajar pelo mundo.

— Admirável — comentou Henry.— Obrigado. No entanto, foi quando cheguei à costa nordeste da América do

Sul que minha aventura de fato começou. — Sorriu, o que lhe curvou o cerrado bigodeloiro. — Não fazia muito que eu estava por lá quando comecei a ouvir protestos arespeito do opressivo governo espanhol e comentários sobre um crescente movimentocom vistas a fazer com que a Espanha renunciasse a seus territórios americanos.Nessa mesma época, vim a conhecer o general Simón Bolívar, notório defensor do povonatural da região. Aparentemente o general ficou tão bem impressionado comigo comoeu fiquei com ele, visto ter me oferecido um posto de major sob seu comando.

Henry fez um aceno assertivo com a cabeça.

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— Combatemos juntos por anos, expulsando a Espanha de cidade após cidade,vale após vale. Foi quando, além de ser promovido a coronel, conheci e desposei minhahoje rainha, Maria Costanza-y-Veneza, que me deu nossa filha, Josefina.

— É uma história deveras fascinante, Vossa Majestade, mas...— Permita-me concluir, por favor. Garanto que tudo o que estou lhe contando érelevante, sir Henry.

— Prossiga — Melbourne o incentivou.Aos olhos de Josefina, parecia que o duque avaliava as palavras do rey bem mais

atentamente do que o banqueiro. O que não era de estranhar, afinal em partedependia dele a aprovação para que a instituição financeira emitisse os títulos queteriam por fim incrementar o progresso de Costa Habichuela. Até mesmo na Jamaicase falava da família Griffin, da reputação impecável que possuíam, do poder e da

influência de que dispunham. Sim, o investimento era de baixíssimo risco, porém erapreciso convencer Melbourne, tanto quando sir Henry, disso.— Eu e meus homens estávamos de passagem pela costa leste da América

Central, a caminho do sul, para nos reunirmos ao corpo principal do Exército —Stephen ia dizendo. — Então nos deparamos com um grupo de soldados espanhóisatacando uma pequena e aprazível cidade situada entre uma cordilheira de montanhasde pequena altitude e uma baía meio oculta, protegida pelo relevo. Expulsamos osespanhóis de lá, e a população local nos agradeceu com festejos que duraram quasetrês dias. Finda a celebração, quando nos preparávamos para partir ao encontro das

nossas forças, Qental, o rei da Costa dos Mosquitos, chegou ao vilarejo. Ao ver que euera inglês, ele me disse que, sem ajuda externa, até mesmo as regiões isoladas comoaquela da Costa dos Mosquitos cairiam em mãos dos espanhóis. E, com isso, entregou-apara mim.

Embora já tivesse ouvido aquela história uma centena de vezes, Josefina aindase encantava com o desembaraço do pai. Atenta à narrativa, resvalou o olhar sobreMelbourne e viu que o duque olhava descaradamente para ela.

— Naquela mesma noite, a população de São Saturus, é esse o nome da cidadeque libertamos, declarou-me seu governante, seu rey, como eles dizem. E o bem-estar

e a segurança dessas pessoas tornaram-se a mais importante das minhaspreocupações. — Enfim Stephen Embry fazia uma pausa para respirar. — CostaHabichuela guarda um imenso potencial de expansão e desenvolvimento, e é para fazerdesse potencial uma realidade que preciso do auxílio de vocês.

— Uma base segura, além de Belize, nas Américas Central e do Sul me pareceboa idéia — afirmou Henry, quase para si. — Os cidadãos de Costa Habichuela sãoespanhóis? Quando a fase de gratidão por terem sido salvos dos saqueadores passar,é possível que eles queiram retornar ao controle da Espanha.

— Essa é a beleza de Costa Habichuela. — O rey  levou o corpo à beirada da

poltrona. — Seus cidadãos nunca foram espanhóis; a população, constituídapredominantemente por nativos, uniu-se por intermédio de casamentos aos ingleses e

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaescoceses que emigraram para lá a partir de outros territórios dominados pelaEspanha e está muito contente em ver-se cada vez mais distante do controle ibérico.E, para ser bem sincero, com as montanhas à nossa retaguarda e uma baía de fácil

defesa à nossa frente, desfrutamos de uma localização ideal para instituir um regimeestável e duradouro.— Que extensão de terras o rei Mosquito lhe concedeu? — indagou Henry, a

ponto de esfregar as mãos.— Cerca de quatro mil quilômetros quadrados. Eu trouxe um mapa. — Stephen

se virou para o conselheiro.— Orrin?Ao ver o outrora sargento tirar da pasta um grande mapa que mostrava a

localização de Costa Habichuela na costa nordeste da América Central, Sebastian

endireitou-se e se aproximou da escrivaninha enquanto indagava:— Você disse que seguia com seus homens ao encontro do corpo principal doexército rebelde; o que houve com eles?

— Coloquei-os sob o comando do oficial de patente imediatamente inferior àminha, em seguida assinei meu desligamento... No que fui seguido pela maior parte doshomens leais a mim, que haviam servido comigo por anos a fio, como Orrin aqui. Muitosdeles agora são parte da minha guarda pessoal ou ocupam cargos no gabinete dosministros.

— Então dispõe de um governo sólido, de uma população fiel e de uma cidade

pujante que serve de capital a um país que dispõe de uma localização privilegiada? —perguntou Sebastian, examinando o mapa que o conselheiro estendera sobre aescrivaninha.

— Exatamente.— Nesse caso, para que precisa de um empréstimo? — No entanto, foi Josefina

quem respondeu:— Nem mesmo o Éden poderia se manter sem progresso e perspectiva de

futuro. Costa Habichuela precisa se desenvolver. Necessitamos de meios paragovernar com eficiência e para a nossa defesa. Se a Inglaterra não tem condições de

nos ajudar, procuraremos quem possa fazê-lo. Não nos resta outra opção.— Que quantia vocês têm em mente? — perguntou Henry. — Um empréstimo a

um país que acaba de ser constituído é um projeto arriscado, na melhor das hipóteses.— Na verdade, o investimento não apresenta risco algum, tanto que eu gostaria

de aproveitar a oportunidade para selar uma amizade duradoura entre nossos países.— retrucou o rey. — Tomei a liberdade de providenciar a confecção de títulos, demodo que qualquer empréstimo feito ao meu governo venha a se tornar umaoportunidade de investimento para todos os ingleses de mente progressista.

— Hum... — Henry pinçou o queixo com o polegar e o indicador. — Devo dizer

que, dada a natureza exuberante de Costa Habichuela, comprar títulos de você ou demim, melhor dizendo, certamente soa mais promissor do que qualquer outro

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesainvestimento na Europa no momento. — Olhou para o duque. — Qual é a sua opinião,Vossa Graça?

Ao ver Sebastian tornar a esquadrinhar o mapa sobre a mesa, Josefina prendeu

a respiração.— Costa Habichuela pode, sim, vir a ser um investimento mais seguro do quequalquer outra aplicação de recursos em negócios estrangeiros que me vêm à menteneste instante, porém não se deve esquecer de que se trata de um país recém fundadoe muito distante — declarou ele. — Acho que, se pretendem suscitar interesses queresultem num empréstimo de vulto, vocês terão de oferecer alguma espécie deincentivo.

— Um desconto no valor dos títulos da dívida, talvez. — sugeriu Henry. — Issofuncionou muito bem para estimular o auxílio monetário ao Chile alguns anos atrás.

Cofiando o bigode, o rey voltou a apoiar as costas no espaldar da poltrona.— Essa idéia me parece bastante boa, cavalheiros. A venda de títulos de cemlibras por noventa, suponhamos, seria uma espécie de garantia da nossa confiança nofuturo e uma forma de afiançar uma razoável cota de lucro aos investidores.

— Com títulos de cem libras vendidos por noventa, a taxa de juros não pode sermaior do que três por cento num prazo de... vamos dizer, dez anos.

— Parece-me justo. — Stephen deu um sorriso pesaroso. — Bem, ainda restauma questão a ser discutida.

— O valor do empréstimo — concluiu Sebastian.

— Presumo que tenha uma cifra em mente, Vossa Majestade.— Com efeito. Para promover importações e exportações, e também aimigração, vou ter de alugar navios, adquirir mercadorias e, naturalmente, constituirum consulado permanente aqui em Londres. Creio que cem mil libras cobririam essasdespesas.

Por pouco Henry não se engasgou.— Cem... cem mil libras? Céus, pensei que fosse pedir cerca de vinte mil... ou

menos.— Vinte mil mal dariam para que conversássemos como futuros parceiros em pé

de igualdade — replicou o rey  com inabalável tranqüilidade. — Como Sua Graçaobservou, somos um país muito jovem; precisamos demonstrar nossa força ou então jamais ocuparemos um lugar de destaque no mundo. — Pestanejou, como se acabassede se lembrar de alguma coisa. — Que descuidado... Orrin, o livreto, por favor.

Sebastian ergueu uma sobrancelha.— Vocês têm material de divulgação?— Pedi a um pesquisador que produzisse uma brochura no ano passado enquanto

preparávamos a viagem para cá.— Tomando o encorpado manuscrito que o assistente lhe estendia, colocou-o

sobre a escrivaninha. — Está tudo em detalhes: agricultura, clima, relevo, rotas detransporte de mercadorias, dados relativos à população e ao crescimento... E com

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesailustrações. — Com isso, abriu a capa de couro para revelar o croqui de um navio comtrês mastros numa enseada sombreada pelas montanhas ao longe e uma pitorescamistura de casas, cabanas e ruas pavimentadas nos arredores de um pequenino cais

que se erguia entre águas mansas e platinadas.— São Saturus, suponho — comentou Sebastian.— Sim — confirmou Stephen. — E a imagem é bastante fiel, se me permite

observar.— Muito bonito — afirmou o banqueiro, trazendo o livreto para si a fim de

folheá-lo. — Regime das chuvas, épocas de plantio... Até mesmo dados dos cortes demadeira.

— Como eu disse, sir Henry, estamos no firme propósito de colocar CostaHabichuela definitivamente no mapa. E eu gostaria de vê-la figurando entre os aliados

da Inglaterra.Pondo-se em pé, Henry Sparks estendeu a mão.— Cem mil libras.O rey se ergueu e apertou a mão dele.— Meus mais humildes e sinceros agradecimentos, senhor.

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Capítulo IICapítulo II

— Por que é mesmo que está me arrastando para o Almack's? — resmungouValentine Corbett, enquanto tentava equilibrar meio cálice de uísque em meio aossacolejos da carruagem.

— Porque você se casou com a minha irmã e agora faz parte da família. —Arrancando o cálice da mão dele, Sebastian sorveu um gole da bebida. — E porque é

um cínico incurável.— Um traço da minha personalidade do qual sempre me orgulhei. — Ao tomar ouísque de volta, por pouco Valentine não o derrubou; irritado, abriu a porta do coche eatirou o restante da bebida na rua.

Na calçada, alguém praguejou em voz alta.— Não esqueça de que é o meu brasão que está na porta deste coche, Valentine.— Este paletó é novo; eu não queria vê-lo todo manchado. — Tornou a se ajeitar,

largando o cálice vazio sobre o coxim. — Bem, de volta ao nosso assunto: o que voufazer no Almack's?

— Quero sua opinião.— Muito bem. E com relação a quê?— Não estou bem certo. Apenas mantenha os olhos e os ouvidos atentos.— Esta conversa tem a ver com seus novos amigos da realeza, não tem? — E

como seu interlocutor não respondesse, Valentine aquiesceu: — Pois não.Sebastian exalou longo suspiro. Tudo seria bem mais fácil se soubesse o que

estava a incomodá-lo... Para um ex-soldado, Stephen Embry entendia um bocado definanças; Bem que, com um período de tempo de dois anos para elaborar um projeto depaís, era de se esperar que qualquer pessoa entendesse do assunto.

— O que sabe a respeito da política nas Américas Central e do Sul, Valentine?— Apenas o básico. A Espanha governa a maior parte da região, mas omovimento pela independência parece estar se espalhando das Colônias para o sul. Háresultados aqui e ali, e a Espanha não está nem um pouco contente com isso. Só que,com Bonaparte no território natal deles, os espanhóis não têm como manter o foco emnações pouco desenvolvidas do outro lado do oceano.

— Às vezes esqueço que você é um homem atento ao que vai à sua volta. —Sebastian deu um sorriso fugaz.

— Hoje em dia sou marido e pai; descobri que isso tanto estreita quanto alarga

as perspectivas de uma pessoa. — Bateu com o bico do sapato na perna do cunhado. —Se quer mesmo que eu fique de olho em alguém para você, preciso de detalhes. O queestá se passando?

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— Presumo que tenha ouvido falar do que houve ontem à noite.— Que uma sirigaita lhe deu um tabefe na cara e depois você dançou com ela?

Não, não ouvi nenhum comentário a esse respeito.

— Que bom.— Shay é muito mais hábil do que eu. Por que ele não veio no meu lugar?— Quero um ponto de vista, não diplomacia.— Você está sendo obtuso, e eu acho que é de propósito. Mas já que vai me

arrastar até lá, darei o melhor de mim para me incumbir da missão, seja lá o que essamissão for.

— É tudo o que lhe peço.Dez minutos depois o mordomo do coronel Branbury abria a porta da mansão

para eles.

— Vossa Graça, Sua Majestade o aguarda na sala de estar. Por aqui, por favor.— Obrigado.Com Valentine em seus calcanhares, Sebastian seguiu o mordomo por um lance

de escada. A residência era bem cuidada, apesar de pequena para os seus padrões, eele se indagou se Branbury teria sido companheiro de Embry no período em que o rey servira o exército britânico.

— Seria indelicadeza perguntar onde o coronel se encontra?— Foi chamado de volta à Península, mas acomodou a delegação de Costa

Habichuela antes de seguir para lá. Ele espera retornar antes do fim da Temporada. —

Detendo-se diante de um par de portas duplas, o mordomo bateu de leve antes deabrir uma delas. — O duque de Melbourne, e um acompanhante, Vossa Majestade.Ao vislumbrar a princesa Josefina sentada numa das poltronas junto à lareira,

Sebastian tentou dar-se ares de desinteresse, porém o esforço foi tolhido pelocutucão que Valentine lhe deu nas costas antes de sussurrar:

— Acompanhante? Desde quando passei a ser um simples acompanhante?Ignorando o comentário, o duque fez comedida mesura e tratou de manter o

olhar fixo no rey, sentado ao lado da filha.— Vossa Majestade, Vossa Alteza, permitam-me apresentar meu cunhado, o

marquês de Deverill. Valentine, estes são Stephen Embry, rey de Costa Habichuela, ea filha dele, princesa Josefina.

Ambos permaneceram sentados. Recém-coroados ou não, nem o monarca nem aprincesa pareciam necessitar de lições de hierarquia aristocrática.

— É uma satisfação conhecê-lo, lorde Deverill.— Digo o mesmo, Vossa Majestade — respondeu Valentine com um sorriso

cortês.Impaciente, Sebastian perguntou do conhaque.— Um instante, por favor. — O rey afinal se levantou, em seguida acenou para o

criado de libre perfilado ao lado da cristaleira. — Três conhaques e uma taça de vinhotinto, por favor.

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Enquanto Valentine ia buscar seu cálice, Sebastian enfim voltou o olhar àprincesa. Naquela noite o traje dela era violeta, salpicado de prata para aludir aobrilho das estrelas.

— Sente-se, Melbourne. — Josefina indicou a poltrona que o pai acabara dedesocupar.— Obrigado. — Ao se acomodar na cadeira, sentiu-se envolvido por um perfume

de lilases. E receou que aquela fragrância lhe produzisse o mesmo efeito mortal dabeladona.

— Diga-me, Vossa Graça — prosseguiu a princesa num tom mais baixo, enquantoValentine e o rey  falavam sobre botas — finalmente se decidiu por acatar as boasmaneiras?

— Na verdade estou buscando uma forma amável de lhe dar um conselho. —

Quase sem querer, voltou o olhar às esmeraldas pendentes das orelhas dela, quereluziam à sombra do negrume dos cabelos suavemente ondulados.— Como não espero amabilidades de você, diga o que tem a dizer.Decidido a não deixar que ela desse início a mais um bate-boca, Sebastian

anunciou:— Eu só queria avisá-la de que aqui as jovens que vão pela primeira vez ao

Almack's têm por costume usar branco para a apresentação às patronesses.— Você não gosta do meu vestido?— É muito bonito. — Engoliu em seco ao sentir o membro viril em comichões. —

Mas a questão não é essa.— O que essas patronesses iriam dizer a uma jovem dama que não se curva aoque elas prescrevem?

Ele escolheu ser sincero:— Já as vi pedirem a moças que fossem embora. Sei que é absurdo, mas não sou

eu quem fez tais regras.— Elas não se atreveriam a expulsar uma princesa.— Sinceramente, Josefina, acho que você deveria usar branco. Seu pai está

tentando encontrar investidores, e alguns deles estarão no Almack's esta noite.

Ela se pôs em pé, e a fragrância de lilases ficou mais forte.— Há algo mais que preciso saber a respeito dessa droga de clube?— Se quiser dançar uma valsa, terá de ser apresentada às patronesses e obter

a permissão delas.— Muito bem. Usarei branco, e você irá me apresentar às megeras. — Com isso,

partiu em direção à porta, pisando duro.— Você tem de ser apresentada por uma dama — avisou Sebastian antes que ela

deixasse a sala.Um cálice de conhaque surgiu logo acima do ombro dele.

— Por todos os santos que perambulam pelo céu... — murmurou Valentine. —Essa moça não é nada delicada.

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— Ela é maluca. E enervante. — Sebastian ergueu o olhar ao rey, que seaproximava. — Lembrou-se de separar uma cópia daquela brochura para mim?

— Lembrei, sim. — Apanhando o livreto que estava sobre a mesinha de canto,

Embry passou-o às mãos do duque. — E deixe-me dizer novamente o quanto respeitoseu tino para negócios e quão grato estou pelo príncipe tê-lo indicado para nos ajudar.Sebastian agradeceu com um meneio de cabeça, então perguntou:— A rainha Maria nos fará companhia esta noite?— Oh, sim. A única verdade absoluta sobre as mulheres é que elas demoram uma

eternidade para se vestir... Ah, aí está ela. Maria, você já conhece Melbourne; este é ocunhado dele, o marquês de Deverill.

Uma versão mais madura da filha, a rainha Maria deteve-se adiante da soleirada porta para fazer uma mesura. Enquanto o marido exalava simpatia, a bonita morena

se encaixava num tipo mais tradicional de realeza: além de discreta e elegante,parecia um tanto arredia.— Boa noite, cavalheiros. — Acercou-se. — E obrigada, Vossa Graça, por avisar

Josefina do costume que impera no clube. Não estávamos a par dessa regra.Mais uma vez, ele deu um aceno afirmativo.Conversaram sobre o tempo è outras amenidades por cerca de dez minutos,

quando Sebastian ouviu-a entrar novamente na sala enquanto os demais continuavam aprosear. Então respirou fundo antes de encará-la. Ela não estava de branco: usava umvestido marfim de decote pronunciado, solto, as camadas de tecido sobrepostas como

uma cascata de águas cintilantes; com aquela pele alva, os cabelos negros e seusgrandes olhos castanhos, parecia uma boneca de porcelana. Uma boneca de porcelanaextremamente sensual, que lhe indagava com um sorriso:

— Melhor assim?— Bem mais apropriado — ele conseguiu responder, a garganta arranhando de

tão seca.— Ah, eis você, querida... Vamos, Vossa Graça? — Grato pela intervenção,

Sebastian virou-se de costas para ela.— Como quiser, Vossa Majestade. — Pelo canto do olho, viu Valentine oferecer

o braço à princesa. Agora até Deverill era mais delicado do que ele... Paciência. Pois, averdade era que se encostasse em Josefina antes que pudesse conter a confusão emque ela o deixava, iria beijá-la de novo. Ou coisa pior.

— Fale-me a respeito de Costa Habichuela — sugeriu Deverill enquanto aassistia a subir na carruagem.

— Infelizmente, não conheço Costa Habichuela muito bem — respondeuJosefina com um sorriso.

— Não?— Bem, minha mãe e eu passamos dois dias com meu pai em São Saturus. —

Suspirou ao perceber que, do outro lado, Melbourne parecia feito de granito. —

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaQuando nosso navio ancorou no porto para apanhar o rey antes de seguirmos para aInglaterra.

— Onde vocês moravam, então?

— Mais recentemente em Morant Bay, na Jamaica. Como lutava contra aEspanha nas Américas, meu pai queria que minha mãe e eu vivêssemos num lugar maiscalmo, a salvo dos confrontos. E quando recebeu o governo de Costa Habichuela ficoutão atarefado com a elaboração de um sistema de administração que preferiu quecontinuássemos na Jamaica, de onde o ajudávamos como podíamos.

— Contar com Josefina foi uma bênção — interpôs o pai dela. — A princesa éafiada como a ponta de uma adaga.

— Papai!— Mas é verdade. E Maria também tem sido uma companheira formidável —

prosseguiu o monarca. — Ela é filha de um vice-rei, sabiam?Sebastian afinal se manifestou:— Sua Alteza havia mencionado. — Então se dirigiu à rainha: — Quando se casou

com um inglês apátrida, Vossa Majestade, imaginava que tudo isso estaria poracontecer?

— Em se tratando de Stephen, nada me surpreende. — Maria endereçou umolhar extremoso ao marido.

No intuito de dar tempo aos pais para se preparem para a maior aparição públicaque já haviam feito como governantes de um país, Josefina indagou:

— Quantas valsas haverá esta noite, Melbourne?— Provavelmente duas: uma no início do evento, outra no fim. Decerto vamosperder a primeira, mas você poderá dançar todas as demais músicas. É só a valsa querequer a permissão das patronesses.

— Que bobagem... Quem são essas mulheres?— Desocupadas de meia-idade, em sua maioria. — Deverill fez um muxoxo. —

Esquisitas e mal-humoradas. 0 passatempo delas é olhar as pessoas de cima, e a únicamaneira que encontraram para fazer isso foi se arranjarem como anfitriãs de um dosmais enfadonhos saraus de Londres.

Chegaram ao clube e, mais uma vez, foi Deverill quem ofereceu a mão paraajudá-la a descer do coche. Cansada de ser tratada com tanta indiferença, Josefinaagradeceu a gentileza e, soltando a mão da dele, dirigiu-se ao ponto da calçada ondeSebastian trocava algumas palavras com seu pai.

— Permite-me? — E colocou a mão sobre o braço dele.— Claro.— É bom, caso contrário vou pensar que você está me desprezando. E isso seria

uma afronta indesculpável.— Afronta ou não, saiba que, se me esbofetear esta noite, vai levar o troco.

— Se quer me intimidar, por que não ameaça me beijar novamente?— Porque você quer que eu a beije outra vez?

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— Não quero — redargüiu ela.— Então pare de contestar tudo que eu digo.— Não contesto tudo o que você diz. — Ao vê-lo sorrir com ironia, emendou: —

Acha que sabe como sou, é? Pois você nem imagina.— Por que não aclara minhas idéias, princesa?— Depois que você me apresentar àquelas senhoras ranzinzas.— Diga isso um tom mais alto e será convidada a se retirar antes mesmo que

cheguemos ao salão.— Muito bem — murmurou ela. — Vamos logo com isso, então.— Como quiser, só que não sou eu quem irá apresentá-la. — A entrada do salão,

Sebastian acenou para alguém do outro lado do recinto. — Por dois motivos: primeiro,porque não quero contrariar as regras do jogo; segundo, porque se eu apresentá-la,

choverão boatos insinuando que estou lhe fazendo a corte e, portanto, querendoforçar a alta sociedade a aceitá-la. E nem você nem eu queremos isso.— Bem, faz sentido.— Princesa Josefina, esta é minha tia, lady Gladys Tremaine. Titia, permita-me

lhe apresentar a princesa Josefina Embry.Ela virou-se para a roliça senhora que portava um matronal vestido de seda azul

e um sorriso natural, contagiante.— Boa noite, Vossa Alteza. — Após se curvar numa mesura, a simpática senhora

segurou no braço livre do sobrinho a fim de se aprumar novamente.

— Lady Gladys. — Josefina inclinou a cabeça para ela.— Então é você a mocinha de quem meia Londres está falando — comentou aidosa dama.

— De fato — afirmou Sebastian, soltando-se das duas. — Com licença.Ao vê-lo se misturar à multidão que não parava de crescer, Josefina não se

conteve:— Que homem exasperante.— Ah, ele é, mesmo. — concordou Gladys — Venha, acho que boa parte das

pessoas que estão apinhando este lugar veio para ver você e seus pais.

Josefina deu uma olhadinha pelo salão. O recinto parecia tomado até as vigas doteto, e a parte da aglomeração que não circundava seus pais começava a se juntar àsua volta.

— Quando for a sua vez, — Gladys ia dizendo em voz baixa — vão lhe fazerumas perguntinhas tolas, depois todas lhe darão as boas-vindas ao clube. Como foi oduque quem a trouxe, ninguém irá cismar de implicar com você. E se por acaso alguémlhe perguntar se você valsou no sarau dos Elkins, querida, diga que não se recorda.

— Então não posso valsar com ninguém sem a permissão delas?— É de praxe. Creia-me, se alguém as tirasse para dançar uma valsa, nenhuma

delas iria se importar com o que as mocinhas andam fazendo.

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Josefina suspirou. Era um costume estranho, sem dúvida, no entanto o quecontava era que estivesse apta para valsar com Melbourne.

A multidão se apartou e Gladys, de súbito muito mais empertigada do que estava

um segundo antes, dirigiu-se às patronesses:— Damas, eu gostaria de lhes apresentar a princesa Josefina de CostaHabichuela. Os pais dela, como já devem saber, são o rei e a rainha daquele país.

Josefina apenas inclinou a cabeça para o grupo de damas que ocupava umaposição inferior à dela na hierarquia aristocrática.

— Que idade tem, Vossa Alteza? — uma das senhoras indagou num tom entrefrio e condescendente.

—Vinte e dois — Josefina afirmou, lembrando-se do conselho do pai.— E quanto tempo pretende ficar em Londres?

— Isso depende do meu pai, o rey.Uma delas olhou rapidamente por cima do ombro de Josefina, então deu umsorriso teso.

— É com grande satisfação que lhe damos as boas-vindas ao Almack's, VossaAlteza. Esperamos que se divirta no nosso clube esta noite.

— Balance a cabeça e agradeça, assim nos vamos daqui — soprou Gladys.Josefina fez o que a simpática senhora dissera e, na companhia dela, tornou a

se misturar à multidão. Pronto. Livrara-se daquele aborrecimento.— Muito bem, princesa Josefina — observou uma voz grave.

Ela se virou.— Obrigada, Melbourne. Há algum lugar por aqui onde eu possa tomar um poucode ar fresco?

— Certamente. — Sebastian ofereceu-lhe o braço. — Não me diga que se deixouimpressionar por aquilo.

— Não estou impressionada. — Pousando a mão sobre o braço dele, permitiu queele a conduzisse em direção a uma porta. — Estou sufocando neste ar abafadiço.

— Está abafado aqui dentro, sim.Um homenzarrão se colocou diante deles.

— Melbourne, o...— Logo mais irei falar com você, Shipley. — Com isso, Sebastian desviou do

camarada.— Negócios? — indagou Josefina, deixando que a curiosidade falasse mais alto

do que a antipatia que tinha por ele.— Sempre negócios. Espero que seu pai saiba no que está sé metendo.Passaram pelo vão da porta, onde várias pessoas se aglomeravam, percorreram

um pequeno corredor e, após dobrar à direita, seguiram por mais um par de metrosantes de cruzarem uma passagem em forma de arco que levava à área externa do

edifício. Ali fora, num local que fazia lembrar uma entrada de serviço, havia apenas um

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesamuro que delimitava uma espécie de viela e a estreita nesga de um céu sombrio comum punhado de estrelas meio apagadas.

— Não se pode dizer que a vista é encantadora — observou Josefina com ironia.

— Não, mas ar fresco é o que não falta.— Ao menos é silencioso. E isolado da confusão. — Fitou os olhos cinzentos que,à penumbra, pareciam negros. — Não entendo você. Primeiro me dá conselhos, emseguida praticamente me larga por aí, depois faz com que me aceitem no Almack's, eentão procura um lugar sossegado para eu respirar um pouco de ar puro...

— Ao contrário de você que está sempre me atacando. Um golpe aqui, um sorrisomordaz ali, uma punhalada no meu amor-próprio, um dardo na minha sensibilidade...

— O que tudo isso quer dizer?— Que você me irrita.

— Ora, não é bom saber que...Erguendo o rosto dela com a ponta dos dedos, Sebastian a beijou.De imediato, Josefina teve a impressão de ser tragada por uma esfera de fogo.

O duque beijava com uma intensidade de roubar o fôlego, um ardor quasedesesperado, uma paixão que ela jamais havia encontrado em alguém. Austero ereservado no falar, ele tinha um modo de abraçar que transbordava descomedimento,emoção e... Ao sentir o baque seco de suas costas contra a parede e os pensamentosemaranhados darem lugar às sensações mais primitivas, agarrou as lapelas do fraquede Melbourne para trazê-lo para junto do seu corpo. No entanto, o desejo que

transpirava daquele beijo despertou uma reação desconhecida em sua pele, em seusnervos e em seus músculos, uma urgência tão enérgica quanto repentina, uma volúpiapara a qual não estava preparada, e isso a deixou morta de medo.

— Pare. — murmurou de encontro aos lábios dele.Sem pressa, Sebastian afastou o rosto e ergueu a cabeça, desvelando um

semblante que era uma combinação de lascívia, carência e excitação. Essa misturaincendiou as entranhas de Josefina, porém a instigante expressão se foi num piscar deolhos, prontamente substituída pela máscara de sereno autodomínio de que ele tantogostava.

— Perdão — murmurou ele. E, girando sobre os calcanhares, partiu a largaspassadas pelo corredor banhado em trevas.

Ela sentiu-se desolada. Injuriada.— Você me deve uma valsa — cobrou, apesar de não conseguir enxergá-lo.— Você a terá — retrucou a voz dele sem nenhuma inflexão.Envolta pelos ruídos da noite de Londres, Josefina permaneceu ali por mais

alguns instantes antes de retornar sozinha ao salão de baile.

— Como assim, esquisito? — Protegendo os olhos com uma das mãos para olhar

para o marido, Eleanor, lady Deverill, espantava com a mão a borboleta que a filhinhade cinco meses, Rose, ameaçava engolir.

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— Não sei ao certo — admitiu Valentine, que caminhava de lá para cá junto aocanteiro de narcisos. — Ele me pareceu... confuso.

— Sente-se aqui antes que esse sol acabe me cegando. — Eleanor bateu de leve

na manta estendida sobre a relva, onde Rose se esparramava. — E me diga por queacha que meu irmão parecia confuso ontem à noite no Almack's.Tão logo se largou sobre o cobertor, Valentine colocou Rose no colo e pôs-se a

brincar com os dedos diante do rostinho dela.— Como já contei, ele me pediu que o acompanhasse a fim de “observar” não sei

muito bem o quê. Mas o pessoal de Costa Habichuela foi amável, sobretudo o rey, ávidopor causar uma boa impressão como qualquer outra pessoa que viesse a Londres embusca de recursos e apoio. Agora, aquela abusada...

— A princesa Josefina? A tal que esbofeteou meu irmão em público, não é?

— Guarde seus punhais, querida. Melbourne não tira os olhos da princesa quandoela não está vendo; já cara a cara, ou discute com a moça ou a trata com tantaformalidade que chega a ser rude.

— Seb gosta dela. — Eleanor suspirou. — Meu Deus.— Foi o que pensei, ainda mais depois que seu irmão me disse que ela mexe com

os nervos dele. — Ergueu a filhinha a fim de fitá-la nos olhos. — Fique longe doshomens, meu torrão de açúcar, esses seres maliciosos e sorrateiros. Sei disso porquesou um deles.

Rose riu enquanto tentava agarrar o nariz do pai.

— Ah, agora você acha graça, mas quero ver quando crescer.— Valentine, você está mudando de assunto. — Pondo-se em pé, ele ajeitou apequenina num dos braços e esticou o outro para ajudar a esposa a se levantar.

— Acho que você deveria conversar com Melbourne, Nell. Irmãos são irmãos; énatural que ele se abra com você e lhe conte coisas que prefere não revelar a mim.

— Veja só você: preocupado com as outras pessoas. — Apoiando-se nele, beijou-o no rosto. — E com um bebê nos braços.

— Sim, estou perdido. — Sorriu para ela. — Vá. Rose e eu vamos discutir osméritos do celibato.

Após endereçar um olhar de puro carinho ao marido e à filha, Eleanor entrou naMansão Corbett a fim de trocar de roupa e chamar uma carruagem. Era poucoprovável que seu irmão mais velho fosse lhe confiar algum segredo; mas se ocomportamento de Sebastian preocupava um descrente das convenções sociais comoValentine, então era preciso ao menos tentar descobrir o que estava se passando.

— Aceita mais um biscoitinho, Vossa Graça? — Erguendo o olhar do livretosobre Costa Habichuela, Sebastian descruzou e tornou a cruzar os tornozelos nointuito de aliviar a dor nas pernas. Sentar numa das cadeirinhas da sala de recreaçãode Peep devia ser muito gostoso para uma garotinha de sete anos; já ele tinha um

metro e oitenta e cinco de altura.— Com satisfação, lady Penélope.

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— Sabe? acho que vou ser acrobata. — Colocou o petisco no prato de porcelanado pai. — Ou ilusionista.

— Ilusionismo combinaria com seu ofício de pirata.

— Foi o que pensei. — Serviu-se de outra xícara de limonada do bule sobre amesinha. — Eu queria muito ter conversado um pouco mais com aquela princesa.Sebastian sentiu um calafrio.— Você gostou dela?— Josefina toca piano muito bem e contou uma história engraçada sobre fazer

compras na Jamaica, mas também ofendeu você. Se eu soubesse que você não gostavadela, não teria sido tão gentil.

— Ah, não é que eu não goste dela... — Diabos, por que se punha a defendê-la? —É que... Não se deve convidar alguém que não conhecemos a entrar em nossa casa.

— Eu sei. Mas você vê o príncipe regente e outros membros da realeza o tempotodo e eu, não.— Queira me desculpar. Eu não...A porta da sala de brinquedos se abriu.— Boa tarde. — Zachary reforçou o cumprimento curvando-se exageradamente.

— Ouvi dizer que lady Penélope está oferecendo um chá íntimo. Será que possoparticipar?

— Evidentemente, lorde Zachary. — Erguendo-se, Peep fez uma reverência tãoexuberante quanto a do tio.

— Por gentileza, sente-se.Ao ver o irmão se dirigir a uma das poltronas junto à janela, Sebastian afirmouantes de virar a página da brochura:

— À mesa.— Eu ia só tirar meu paletó. — Depois de despir o casaco cinza, largá-lo sobre

uma poltrona e ajeitar o colete negro, Zachary retornou ao centro da sala para ir seequilibrar numa das quatro cadeiras infantis ao redor da mesinha.

— Você faz qualquer coisa por um biscoito, não? — observou Sebastian.Enquanto Penélope servia mais limonada e petiscos, ele se encarregou de fazer

um breve apanhado do que havia lido na brochura. A riqueza de detalhes, entre osquais meticulosos dados das oscilações na temperatura em função da vegetação e daaltitude, deixara-o bastante impressionado.

Zachary, que mal atentava às observações, interrompeu o irmão para comentar:— Eu soube que você foi ao Almack's ontem. — Tirando os olhos do livreto,

Sebastian tomou um gole de limonada.— Prinny apareceu por lá? — emendou Zachary.— Ficou uns vinte minutos. Por que pergunta?— Estou só puxando assunto. — Enfiou um biscoito na boca. — Você escoltou o

pessoal de Costa Habiba de novo, não?— Costa Habichuela — corrigiu Penélope. — Fica na América Central.

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— Sim, fui com eles — confirmou Sebastian. — Está fazendo uma sindicância naminha vida?

— Não. — Zachary riu. — Claro que não.

— Pena que você não trouxe Harold hoje — interpôs Penélope com um suspiro. —Ele adora biscoito.Sebastian pôs a brochura de lado.— Aquele cão não é bem-vindo nesta casa.— Só porque dei a ele o nome do nosso bisavô? Ora, isso é...— Você deu a ele o meu  nome, Zach. Ou por acaso não me chamo Sebastian

Harold Griffin?— Mas Harold é um amor de cãozinho — tentou argumentar a menina.— Não seria diferente se o nome dele fosse Manchinha ou Polenta ou coisa que

o valha.— Você realmente se irrita com que eu tenha dado seu nome a ele, não é? —Dessa vez, o sorriso de Zachary era natural. — Que bom. Era isso mesmo o que euqueria.

— Por favor, cavalheiros — Peep levou as mãos aos ombros dos dois — sejamoscivilizados.

Zachary ia perguntar onde ela aprendia aquelas coisas quando a porta tornou ase abrir.

— Com relação a que não estamos sendo civilizados? — indagou Shay enquanto

caminhava até a mesinha.— Lorde Charlemagne, que satisfação! — Penélope voltou a se levantar. — Porque não faz um lanchinho conosco?

Não sem antes lançar um olhar cobiçoso para as poltronas junto à janela,Charlemagne se ajeitou como pôde numa das cadeirinhas infantis.

— Não me lembro das cadeiras serem tão pequenas quando fazíamos isto comNell.

— Isso foi há mais de quinze anos, Shay — lembrou Zachary. — Nós  éramospequenos.

— O que o traz aqui? — Sebastian perguntou a Charlemagne, o irmão maisparecido com ele em termos de temperamento.

— Só uma visitinha. Eu não sabia que iria ter chá — tomou um gole da pequeninaxícara que a sobrinha havia lhe entregado e fez uma careta — digo, limonada ebiscoitos.

— Vai conosco ao recital na casa dos Beardsley esta noite, Shay?— Não, os pais de Sarala nos convidaram para jantar. Acho que eles estão à

espera de ouvir... — limpou a garganta — novidades.— Tia Sarala vai ter um bebê? — Fazendo-se de contrariada, Penélope cruzou

os braços. — Você pode falar dessas coisas na minha frente, viu? Não tenho mais seisanos.

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Ruborizado, Charlemagne segurou na mãozinha dela.— Ainda é cedo para afirmar, mas assim que tivermos certeza, dentro de uns

dez dias, você será a primeira a saber.

Sebastian baixou os olhos à xícara de limonada. Tinha tomado todas asprovidências para que Penélope tivesse tudo o que quisesse ou de que necessitassepelo resto da vida; quanto ao seu título de nobreza, porém, não havia o que fazer. Semum filho varão a quem legá-lo, o título iria para seu parente mais próximo: Shay. SeSarala estivesse mesmo grávida, e se o bebê fosse um menino, o nome Griffincontinuaria com o título Melbourne por pelo menos mais uma geração. Graças a Deus.

— Seb?Voltando à realidade, ele ergueu o olhar.— Como foi no Almack's ontem? — Ao receber um chute de Zachary por sob a

mesinha, Charlemagne tentou encolher as pernas. O móvel em miniatura sacudiu-setodo. — Muito sutil, seu pateta.— O que vocês dois andaram ouvindo? — quis saber Sebastian.— Nada — Shay correu a responder. — Mas como foi a primeira grande aparição

pública do rey e comitiva, eu queria saber se tudo correu bem.— Correu, sim. Um evento absolutamente rotinei...A porta voltou a se abrir, dessa vez para que Eleanor entrasse no aposento.— Olá a todos — cumprimentou-os com um sorriso que traía certa irritação. —

Por acaso perdi algum convite para uma reunião de família?

— Não, é um chá — corrigiu Penélope. — Você vai ter outro bebê também?— Outro? — Branca como cera, Eleanor olhou para o irmão. — Sebastian, aprincesa Josefina está gravi...

— Como? — Ele se ergueu de um pulo, e a cadeirinha em que estava sentadotombou para trás.

Zachary e Charlemagne levantaram-se com o mesmo ímpeto.— Está dizendo que Melbourne e a princesa andam...— Não! — exclamou Sebastian antes que Zach pudesse terminar. — Então é

esse o motivo desta invasão? Por Deus, se esse é o tipo de boato que está correndo

por aí, como que é ninguém ainda teve o bom senso de me avisar de uma...— Não, não é nada disso. — Eleanor apressou-se a ir colocar a mão sobre o

braço dele. — De modo algum. Mas quando Peep perguntou...— Ela estava se referindo a Sarala.— Oh... Oh! — Virando-se, Eleanor abraçou Charlemagne. — Parabéns, Shay.— Ainda não temos certeza. Mas por que você acha que Melbourne e a...— Chega! — trovejou Sebastian. — Vocês dois, sentem-se e tomem chá com sua

sobrinha. E você, Nell, faça o favor de vir comigo. — Com isso, agarrou-a pelo braço.— Posso dar uma olhadinha na brochura? — indagou Charlemagne, ao vê-los

partirem em direção à porta.— Fique à vontade. Mas não saia daí.

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Ignorando o falatório dos irmãos, Sebastian praticamente arrastou Eleanorpara fora da sala de recreação e, a seguir, escadaria abaixo. No piso inferior, puxou-apela mão até seu gabinete e, tão logo entraram, tratou de fechar a porta.

— Se acha que vai me dar algum sermão por fazer mexericos ou qualquer coisado tipo, saiba que está redondamente enganado. — Dando a volta à escrivaninha,Eleanor foi se sentar na poltrona dele. — Além de casada, sou mãe. Há muito deixei deser criança, e você não tem mais o direito de...

— Por que chegou à conclusão de que tenho, ou tinha, um caso com a princesaJosefina, uma pessoa que conheço há quatro dias?

— Você há de convir comigo que ouvir Peep me perguntar se eu também iria teroutro bebê foi um susto e tanto.

— Muito bem, vou tomar isso como verdadeiro. — Caminhou lentamente até a

 janela. — Zach e Shay queriam saber como foi ontem no Almack's. Por quê?— Por que não pergunta a eles? Cada vez mais impaciente, Sebastian foi sesentar numa das duas poltronas diante da escrivaninha, de frente para a irmã.

— O que Valentine lhe contou para que você também viesse aqui hoje? E não memande ir perguntar a ele.

— Pois bem, meu marido achou você um tanto estranho ontem à noite. E quetalvez isso se devesse ao fato de estar interessado na princesa Josefina.

— Aquele traidor... Pedi a ele que ficasse de olho neles, não em mim.— Então é verdade?

Apesar do desassossego que o assunto lhe provocava, ele confessou:— Francamente, não sei. Faz quatro anos que estou sozinho e, sim, achoJosefina uma mulher interessante. Agora, se é por ela própria ou por conta dos quatroanos de solidão, não sei dizer.

— Mas foi ela quem despertou esse entusiasmo, não outra mulher qualquer.Sendo assim, você deveria tratar de conhecê-la melhor.

Sebastian ergueu uma sobrancelha.— Obrigado. Nada como receber conselhos de uma desmiolada doze anos mais

nova do que eu.

— Ah, agora você está falando como Melbourne de novo.— Essa é a questão, Nell: eu sou  Melbourne. Não posso sair por aí correndo

atrás da filha de um rei de uma nação exótica. Se aquele país perdurar no tempo, umdia Josefina irá se tornar rainha e, no caso de o título se estender ao cônjuge dela,isso fará de mim o rei de Costa Habichuela. — Obrigou-se a sorrir. — Prefirocontinuar inglês. E jamais abriria mão do meu título por algum outro.

— Mas se você gosta dela, então...— Então o quê? Primeiro: eu disse que a achava interessante; ainda não me

decidi se gosto dela ou se quero torcer o pescoço daquela atrevida. Segundo: até

quatro dias atrás, eu nem sabia que Josefina Embry existia. Terceiro: não quero ter

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaum caso. Não sou o tipo conquistador, e menos ainda quando se trata de um romancesem futuro.

Eleanor se levantou.

— Já que você analisou o assunto por todos os ângulos, ponderou todos osaspectos envolvidos e concluiu que não valia a pena, creio que não há mais nada a dizer.— Concordo. — Sebastian também se pôs em pé para ir abrir a porta para ela. —

Diga àqueles mentecaptos, por gentileza, que parem de me importunar. Mas faça issolonge dos ouvidos de Peep, sim? Ela não precisa saber de nada disso.

— Como quiser. — E, em meio a um ciciar de musselina, Eleanor deixou oaposento.

Sebastian esperou vê-la subindo a escadaria, então fechou a porta e foi sesentar na poltrona atrás da escrivaninha. Se tivesse sorte, aquela tolice ficaria entre

os membros da sua família. Mas, para que isso acontecesse, precisava evitar a princesaJosefina a qualquer custo... por mais que ansiasse por discutir com ela, e beijá-la,novamente.

Suspirando, abriu a gaveta e apanhou uma folha de papel a fim de escrever umbilhete para Prinny.

— Preparada? — indagou o tenente May ao colocar a cabeça para dentro dacarruagem de novo.

— Céus... — Josefina tornou a espiar pela fresta que abrira na cortina da janela.

— Nunca pensei que a iniciativa fosse fazer tanto sucesso.— Está pronta, Vossa Alteza? — Conchita afofou a manga do vestido dela.— Mesmo que não estivesse, já que mamãe e papai foram para a Escócia a fim

de conversar com o ministro das finanças de lá, acho que não tenho escapatória. —Respirou fundo. — Sim, estou pronta.

Saltando para o chão, o tenente May baixou os degraus à porta da carruagem,em seguida ajudou-a a descer do veículo. Assim que pôs os pés na calçada, Josefinalevou um susto com as reais dimensões da multidão: mais de duzentas pessoas sealinhavam diante do Banco da Inglaterra, cujas portas ainda nem tinham sido abertas.

Não fazia nem vinte e quatro horas que o anúncio da venda das apólices fora publicadono jornal, no entanto a fila de endinheirados dava volta ao edifício antes de seembrenhar numa ruela.

Assim que eles se aproximaram, Henry Sparks se destacou do grupo defuncionários à entrada do prédio.

— Bom dia, Vossa Alteza — cumprimentou-a, radiante. — Belo comparecimento,não?

— Surpreendente. Acha que eles iriam se importar se eu dissesse umaspalavrinhas?

— Pelo contrário, iriam adorar.

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O tenente May virou um caixote de lado e ajudou-a a subir no improvisadopalanque.

— Bom dia. — Após o breve cumprimento, ela viu o ruído à sua volta esvaecer. —

Sou a princesa Josefina e quero ser a primeira a dar as boas-vindas na parceria quevocês estão prestes a fazer com Costa Habichuela.A multidão explodiu em saudações. Ao sinal de Henry, os funcionários bancários

abriram as portas do edifício e entraram, levando a fila de investidores noscalcanhares deles. Costa Habichuela descerrava-se oficialmente aos negócios.

Descendo do engradado, Josefina se juntou às pessoas que tinham ido rodeá-la,e, por mais de uma hora, sorriu sem parar, apertou um sem-número de mãos erespondeu às perguntas que lhe faziam. O combinado era que Melbourne estivesse alicom ela, no entanto só o que seu pai dissera naquela manhã era que tinha havido um

rearranjo nos planos. De certo modo, a mudança não viera para mal: o objetivo naqueledia era vender títulos, e não ficar pensando em beijar Melbourne.Quando sentiu as pernas doloridas, Josefina agradeceu a Henry uma vez mais

antes de fazer um aceno com a cabeça para May. Sem perda de tempo, o tenente pôs-se a abrir caminho por entre a multidão para lhe dar passagem. E os aplausos aacompanharam até que ela ir se acomodar no interior da carruagem.

Ao chegarem à residência emprestada pelo coronel, encontraram um cabriolé àentrada da mansão.

— Imagino que sua manhã tenha sido muito proveitosa, Vossa Alteza — entoou

Grimm, o mordomo, ao abrir a porta.— Foi, sim. Quem veio nos visitar?— Charles Stenway, duque de Harek, Vossa Alteza. Ele a aguarda na sala de

visitas.— Harek? Nunca, ouvi falar dele. — Com um suspiro, tirou as luvas. — Conchita?As duas se dirigiram à sala, onde depararam com um cavalheiro loiro de

compleição robusta e altura mediana junto à lareira. Ao vê-la, ele se curvou numamesura reverente, cumprimentando em voz baixa:

— Vossa Alteza.

— Vossa Graça. — Josefina inclinou a cabeça. — É um prazer conhecê-lo, porémdevo confessar minha surpresa com a sua presença. Está ciente de que meu paiencontra-se a caminho da Escócia?

— Sim, o mordomo me disse. Posso me sentar? — Ele indicou o sofá.— Certamente. — Foi se acomodar numa das poltronas que ladeavam a lareira, e

Conchita se colocou atrás dela. — Em que posso lhe ser útil?— O príncipe regente solicitou-me que atuasse como contato britânico para

Costa Habichuela e, muito honrado, aceitei a incumbência. Assim, vim pessoalmentepara...

— O que houve com Melbourne?

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— Sua Alteza disse que os negócios exigiram a atenção dele em outro lugar. —Moveu os dedos num gesto de desdém. — A bem da verdade, Melbourne está sempremetido num ou noutro empreendimento. Ele daria um excelente negociante.

Josefina reavaliou o juízo que tinha feito de Harek. Ele parecia ambicioso eávido por ser agradável e, ao que tudo indicava, ou era muito conservador ou tinhamuita inveja de Melbourne.

— Acha que um nobre não devia se envolver em assuntos empresariais efinanceiros?

— Não é conveniente. É para isso que existem procuradores, advogados,contadores e banqueiros. — Ele sorriu. — Mas não vamos falar desse tipo de coisa.Imagino que tenciona ir ao baile de Allendale esta noite, não? Seria um prazeracompanhá-la.

Josefina também sorriu.— Se me permite indagar, você é casado, Vossa Graça?— Sou infelizmente solteiro. Passei os últimos anos no Canadá e só

recentemente retornei à Inglaterra.— Posso perguntar o que fazia no Canadá, uma vez que não se envolve

pessoalmente com negócios?— Caçava. Um lugar extraordinário, o Canadá. Há uma variedade riquíssima de

animais selvagens.— E todos tão solícitos a ponto de se reunirem num único lugar só para você se

divertir com eles. — Ao vê-lo dar uma risadinha, Josefina acrescentou: — E agora vocêestá de volta à sua terra natal.— De fato. — Os olhos verdes de Harek cintilavam ao fitar os dela. — Um fato

que, espero, venha a ser muito auspicioso para nós dois.Bem, ele colocara todas as cartas na mesa.— Veremos. — Com um aceno para Conchita, pôs-se em pé. — Se me der licença,

preciso cuidar da correspondência. Posso esperá-lo às oito horas?Ele também se levantou.— Estarei aqui. E se necessitar de algo até lá, mande me avisar, por favor. Já

dei meu endereço ao seu mordomo e estou à sua disposição.— Obrigada, Vossa Graça. Até a noite.

— Já não tivemos esta conversa, Wilits? — indagou Sebastian em meio àalgazarra no salão de baile de Allendale.

— Ainda não estou convencido de que reduzir a força de trabalho é bom para aeconomia — retrucou o visconde.

— Então vote contra a medida. De minha parte, acredito que estimular asfamílias a mandarem seus filhos para a escola em vez de forçá-los a fazer tijolos

trará grandes benefícios à Inglaterra no futuro. Uma população de ignorantesnecessita de maior auxílio financeiro do governo, não o contrário.

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— Mas...— Esse é meu ponto de vista, quer você concorde, quer não. Não vou prosseguir

com esta discussão. Boa noite. — Inclinando a cabeça, afastou-se.

— Você foi um tanto rude — observou Zachary, que se aproximava, trazendo aesposa apoiada em seu braço.— Descobri que há certo tipo de idiotia que não consigo tolerar — afirmou o

duque, tentando se acalmar.— Então se anime, pois tenho novidades que farão você sorrir... Conte você,

Carol. Não quero ser responsabilizado pela notícia.Caroline limpou a garganta com delicadeza antes de anunciar:— Minha mãe escreveu, dizendo que ela e meu pai virão a Londres. Não sei ao

certo quem mais virá com eles.

— Que bom — afirmou Sebastian em voz alta. — Sei que você sente muitasaudade deles.— Em vez de sorrir, acho que ele está com vontade de chorar — observou

Zachary, rindo.— Não acha cruel, meu irmão, ostentar a família da sua esposa como

instrumento de tortura?— Não foi isso o que eu quis dizer. Você sabe que gosto deles. — Zachary virou-

se para a esposa. — Vou pegar um drinque — dito isso, ele se afastou.— Ah, eu o amo. Demais. — Caroline suspirou. — Ele nunca toma alguém pelas

aparências; sempre procura ver o que as pessoas realmente são.— É por isso que tanta gente gosta dele. — Sebastian beijou a cunhada no rosto.O sorriso dela se alargou.— Dança comigo?— Com prazer. — Ele estendeu a mão, que Caroline tomou na dela.— Oh, eu devia saber — resmungou Zachary, com três taças nas mãos, ao vê-los

se perfilarem junto aos casais que se preparavam para a dança campestre.A música principiou, e as duas fileiras de bailarinos curvaram-se uma para a

outra. Sebastian girou ao redor de Caroline, depois à volta da moça à direita dela, deu

um passo para o lado e bateu de leve as mãos nas mãos da jovem seguinte. Foi como seuma descarga elétrica o atravessasse das pontas dos dedos às unhas dos pés. SantoCristo!

— Boa noite, Melbourne — cumprimentou Josefina, antes de retomar seu lugarna fileira das damas.

Sebastian precisou de todo o controle para não esfregar os dedos, que pareciamchamuscados. Que diabo ela fazia ali? A comitiva de Costa Habichuela tinha ido para aEscócia em busca de novos empréstimos... Ou pelo menos era isso o que haviam lhedito. Ao se virar, lançou um olhar pela fileira. Josefina se adiantara para dar a volta ao

cavalheiro diante dela e agora voltava ao seu lugar. O duque de Harek.

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Pelos dez minutos seguintes, Sebastian tratou de manter o semblante sereno.Por dentro, porém, sentia-se um vulcão prestes a entrar em erupção. Uma coisa eraencontrar com ela quando não esperava, quando imaginava que teria alguns dias para

resolver a confusão que tanto o incomodava antes de vê-la novamente; outra, bemdiferente, era topar com a atrevida na companhia de outro homem.Trocaram de lugar, então tornaram a rodear um ao outro.— Pensei que estivesse ocupado demais para ir a uma festa.— Eram os deveres de acompanhante que me mantinham ocupado. Não os saraus.— Ah! Cheguei a imaginar que estivesse com medo de mim.Antes que ele pudesse responder, os passos da dança obrigaram-na a se afastar

de novo. Maldição! Como era possível que a mera presença dela ali fizesse seu mundodesandar? A música chegou ao fim e, trazendo-se de volta à realidade, ele se uniu aos

demais nos aplausos antes de ir levar Caroline até Zachary.— Seb? — Zach entregou-lhe um cálice de vinho do Porto.— Estou bem — resmungou ele, sorvendo um gole da bebida.— Não, eu queria lhe dizer que ela vem vin...— Será que pode me dar alguns dos seus preciosos minutos? — Soou a voz

melíflua às costas dele.Empertigando-se, Sebastian se virou.— Evidentemente, Vossa Alteza — afirmou num tom ácido. — Harek.— Melbourne — devolveu Charles Stenway. — Fiz questão de vir lhe agradecer.

Quando você se demitiu, Prinny me indicou para o cargo de intermediário para osassuntos de Costa Habichuela e, desde então, nunca senti tanta satisfação em servirao meu país. — Sorriu para Josefina.

Ela tomou a palavra:— Sua Graça é um cavalheiro adorável. Amanhã à noite ele irá me levar ao

teatro; eu sempre quis assistir a um espetáculo em Londres.— Quem sabe não conseguimos convencer os atores a se apresentarem em Costa

Habichuela? — sugeriu Harek.— “Conseguimos”? — Sebastian o interpelou. — Está pensando em emigrar,

Harek?— Nunca se sabe — respondeu o duque com um sorriso.Sebastian teve ganas de estapeá-lo até arrancar aquele sorrisinho idiota do

rosto dele, mas de súbito Zachary se colocou entre os dois para dizer:— Posso trocar uma palavrinha com você, Seb? — Indicou o vão da porta, em

seguida olhou de relance para Harek e a princesa. — Dêem-nos licença por uminstante, sim? É assunto de família.

— Claro — respondeu Josefina sem tirar os olhos do irmão mais velho.Ao sentir o caçula cutucar seu ombro, Sebastian pôs-se a caminhar e só foi

parar quando chegou à biblioteca de Allendale. Nos calcanhares dele, Zachary esperouque Caroline entrasse no aposento para então fechar a porta.

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— Perdão, mas eu queria evitar uma cena. Aquele símio. Como se Harekestivesse à altura de substituir você... Vamos embora? Vou pedir que tragam acarruagem.

— De modo algum. Não vou abandonar um sarau por causa de um paspalho e deuma desaforada.— Pensei que estivesse tentando se manter longe dela. Foi por isso que se

demitiu do cargo para o qual Prinny havia lhe indicado, não foi?— Não preciso da sua proteção, Zachary. Tenho plena consciência de quem sou e

do que está em jogo todas as vezes em que abro minha boca ou levo a pena ao papel.Essa responsabilidade é minha, não sua.

— Ótimo. A culpa é minha, evidentemente, por imaginar que esse seu coração depedra tivesse se abrandado. Boa noite, Melbourne. — Com isso, deixou o aposento.

Um pouco mais solidária, Caroline lançou um terno olhar ao cunhado antes de iratrás do marido.Após exalar longo suspiro, Sebastian foi até a parede dos fundos da sala, onde

Allendale mantinha os livros que certamente nem havia folheado. Alguns instantesdepois, um dos volumes na estante atraiu sua atenção e ele, de pronto, empurrou obanquinho para junto do móvel a fim de apanhar o tomo na penúltima prateleira.História das Américas ao Sul. Ainda que a edição já tivesse mais de seis anos, nãocustava nada dar uma olhadinha.

Sentando-se diante da lareira, constatou que o capítulo dedicado à Costa dos

Mosquitos era relativamente pequeno. Embora tivessem conquistado a maior parte daAmérica Central e do Sul, apoderando-se de todas as riquezas que encontravam pelafrente, os espanhóis haviam ostensivamente evitado a Costa dos Mosquitos. O motivode tal cuidado, segundo o autor, um tal John Rice-Able, era o fato de a região já tersido avaliada como uma área sem nenhum valor ou serventia, uma fedentina de aluviõespantanosos tomados pela malária e selvas impenetráveis, isso sem contar o calor e aumidade insuportáveis em todas as estações do ano.

O contraste com as descrições contidas no livreto de Embry não poderia sermais gritante. No trabalho de Rice-Able não havia menção a refrescantes brisas

vindas do mar, terras praticamente prontas para a lavoura ou uma cidade prósperarepleta de promessas. Bem, era preciso admitir que se tratava de duas páginas degeneralizações contra as quatrocentas e vinte de explanações detalhadas dabrochura... O que, por outro lado, não deixava de suscitar uma série de interrogações.

Com efeito, havia algo sobre Costa Habichuela e sua realeza que parecia bomdemais para ser verdade. Fosse como fosse, só havia um meio de obter maioresinformações: procurar o sr. John Rice-Able, que, com um pouco de sorte, haveria demorar em algum lugar naquele continente.

Sebastian devolveu o livro ao lugar de onde o tirara e, nem bem havia descido do

banquinho, a porta da biblioteca, antes entreaberta, escancarou-se.

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— Logo imaginei que iria encontrá-lo enfurnado aqui. — Ele se virou para encararJosefina.

— Cansou do novo contato para o seu país? Decerto Stenway ainda não teve

tempo para lhe contar todas as histórias das caçadas dele. Ou será que o nossoadorável duque fugiu de medo de você?— Ora, o duque de Harek é um homem sensato, cordato, amabilíssimo. E é

provável que eu me case com ele.Sebastian teve de fazer das tripas coração para não avançar sobre ela e

agarrá-la.— Eu não havia percebido quão pobres são seus critérios, Vossa Alteza. Seja

como for, Harek deve compartilhar da sua queda por asneiras.Josefina se adiantou, o vestido cor de mostarda ciciando a cada passo que ela

dava. — Posso saber de que raios está falando, Melbourne?— Desse ridículo ar de superioridade que você se dá, pelo fato de não fazer a

menor idéia de como a realeza se comporta.— Eu devia mandar enforcá-lo por isso.— Por que não tenta?Para surpresa de Sebastian, ela tirou os sapatos com os próprios pés.— Antes de me tornar princesa, eu era filha de um soldado. — Aproximando-se

da lareira, apanhou um dos dois sabres no estojo sobre a moldura da fornalha. —

Defenda-se.— Você realmente é maluca.— E você vai parar de me ofender de uma vez por todas.Ele ficou a observá-la. Insana ou não, Josefina Embry era impressionantemente

bela.— Talvez tenha esquecido sua posição social, Vossa Alteza, mas eu não esqueci a

minha. Não tenho a menor intenção de ser pego duelando na biblioteca de um amigo.Ainda mais com uma jovenzinha atrevida doze anos mais nova do que eu.

O sabre foi ao chão, e Josefina se largou sobre a poltrona em que ele havia se

sentado.— Eu me rendo.— Como? — Seria ele o maluco e ainda não se dera conta de que estava em

algum manicômio, falando sozinho?Ela voltou o olhar às chamas que crepitavam na lareira.— Pensei que brigar com você fosse a única maneira de arrancá-lo dessa sua

altivez arrogante. Mas nada, nem mesmo ameaçá-lo com um sabre, é capaz de lheprovocar algo mais do que um instante de irritação. Assim sendo, eu me rendo.

— Está tentando me dizer que isso... que tudo isso era parte de alguma

estratégia de sedução?

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— Meu pai leu tudo o que pôde a respeito de você e da sua família. Ele o admiramuito, tanto que, sonhando com a nossa união, pediu-me que fingisse ser três anosmais nova, já que se comenta por aí que os cavalheiros que se casam pela segunda vez

preferem mulheres mais jovens. Mas desde que me beijou pela segunda vez, você sótem feito me evitar.Pasmo, Sebastian pestanejou enquanto tentava assimilar o que acabara de ouvir.— Então você tem vinte e cinco anos? — Nas circunstâncias, fazer cálculos

parecia o mais fácil dos seus problemas.— Sim, vinte e cinco. Desculpe-me por ter mentido para você. — Com um

suspiro, Josefina levantou-se e colocou o sabre de volta ao estojo antes de ir calçaros sapatos. — E melhor eu ir, Harek deve estar à minha procura.

— Seu pai. Agora quer que você se case com ele? — Sebastian se aproximou

dela. — Evidentemente. Papai quer me ver casada e, como princesa ainda que nãoconsiga ter em mente minha posição social, não posso me unir a alguém com um títuloinferior ao de duque.

Ele não conseguiu se conter:— Você gosta de Harek?Levando a mão à maçaneta da porta, Josefina olhou-o por cima do ombro.— Eu gosto de você. Boa noite, Vossa Graça.

Com todos os demônios.— Por que você e Harek não vão ao meu camarote no teatro amanhã à noite? —convidou.

Ela se virou.— Por quê?Porque gosto de você também.— Porque uma manifestação de cooperação entre o antigo e o atual

intermediário para os assuntos de Costa Habichuela seria mais producente do que umademonstração de hostilidade.

— Está bem — concordou Josefina. — Vou dizer isso a Harek.Ao vê-la deixar o recinto, Sebastian ficou com a estranha sensação de que ao

beijá-la, ao discutir com ela, não se sentia, pela primeira vez em quatro anos... sozinho.

— Papai, eu queria ir ao teatro.Sebastian deu a volta à mesa de bilhar para fazer uma tacada propositadamente

ruim.— Sei disso, mas a peça desta noite é Hamlet, e eu acho que você não iria gostar

nem um pouco do final.

— É uma tragédia?

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— É, sim. Uma grande tragédia. — Ele afastou-se para que ela pudesse jogar, ea tacada não foi das piores. Mais uns dois ou três anos, Peep estaria em condições deenfrentar de igual para igual os cálculos precisos de Shay. — Vamos fazer uma troca?

A próxima peça a estrear no Drury Lane será Sonho de uma Noite de Verão; se vocêabrir mão de Hamlet, vou levá-la para assistir ao novo espetáculo. O que me diz?— Só você e eu?— Só nós dois.— Então eu aceito a troca. — O sorriso de Penélope parecia resplandecer mais

do que o sol. — Você tem andado ocupado, eu tenho tido vários compromissos, por issoserá muito bom passarmos um tempinho na companhia um do outro.

— Perdoe-me se não tenho lhe dado a devida atenção, Peep.— Uma grande festa de aniversário com acrobatas iria compensar o seu deslize.

— Vou me lembrar disso. — Fazendo força para não rir, Sebastian foi para juntoda filha e se agachou diante dela para lhe dar um beijo. — O que acha de fazermosuma pausa para o almoço?

Penélope beijou-o na testa.— Você é um pai muito bom, sabia?— Eu tento. De coração.Erguendo-se, Sebastian esperou que ela deixasse o taco sobre a mesa e os dois

então desceram para a sala de refeições. Peep precisava de uma mãe. O que eranatural; decerto tinha agora uma vaga lembrança de Charlotte e, apesar de ambos

falarem dela com certa freqüência, era evidente que aquelas conversas ultimamentesoavam quase como contos de fadas.Mas e ele, queria se casar novamente? Um ano atrás, iria rejeitar a idéia de

plano. Agora, porém, não sabia o que pensar.Ou melhor, sabia, sim, que Margaret Trent seria uma companheira mais

adequada do que Josefina Embry. Primeiro, porque Margaret não era herdeira de umamonarquia centro-americana; segundo, ela não virava seu mundo de ponta-cabeça, comoJosefina parecia ter o dom de fazer. Não queria seu mundo de pernas para o ar. Ah,maldita sirigaita... Sem notar, bufou ruidosamente.

— Algum problema, papai?— Não foi nada, querida. Vá tomar seu lugar à mesa, sim? Preciso fazer uma

anotação antes que me esqueça.Penélope seguiu sozinha para a sala, enquanto ele subia os degraus que acabara

de descer.No alto da escada, Sebastian rumou para a biblioteca, onde, acima da lareira,

ficava o retrato da tão querida Charlotte. Mesmo na superfície plana da tela, os olhosazuis de sua finada esposa davam a impressão de cintilar, e os sedosos cabelos ruivos,presos no alto da cabeça com algumas mechas soltas sobre os ombros, pareciam

tocados pela aragem enquanto ela, no jardim, detinha-se para lhe endereçar umsorriso.

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Ainda se lembrava perfeitamente bem da voz, do riso, dos carinhos deCharlotte... Assim como também se recordava dos últimos dias dela, da pele esmaecidae ressequida, dos olhos sem vida, do sorriso que era apenas uma máscara com o

propósito de alentá-lo. O que não conseguia trazer à memória era a última vez em queCharlotte estivera em seus sonhos. Por meses a fio, sonhara com ela noite após noitee, se não fosse por Peep ou pelos irmãos, teria preferido nunca mais despertar. Depoisela começara a visitá-lo com menos regularidade, porém ainda amiúde. E então...Quando fora que os sonhos haviam se interrompido? E por que, nas últimas cinconoites, sonhara com outra pessoa?

Recompondo-se, foi para seu gabinete e ali escreveu uma breve mensagem alorde Beltram, um dos secretários para os arquivos públicos. Se havia alguém capaz dedescobrir o atual paradeiro de John Rice-Able, esse alguém era Beltram. Antes que

permitisse ao seu coração se enredar nos meandros da paixão, precisava entender porque o que era um paraíso para uma pessoa não passava de um charco infestado deinsetos para outra.

— Não estou entendendo. — Conchita travou o fecho do colar de pérolas aoredor do pescoço de Josefina. — Então agora há dois duques a cortejá-la?

— Não. — Após uma última olhadela no espelho, ela se levantou. — Oficialmente,ninguém está me cortejando.

— E não oficialmente?

— Extra-oficialmente, acho que um deles quer se casar comigo e o outro querme levar para a cama. — Ao ver a criada fazer um ar horrorizado, indagou: — Você éou não é minha confidente?

Conchita se curvou numa mesura antes de afirmar:— Claro que sou.— Então, conto tudo isso para que você saiba o que está acontecendo. E também

porque tenho certeza de que não irá dizer nada disso a ninguém.— Eu jamais faria isso, Vossa Alteza.Após acenar com a cabeça num gesto aquiescente, Josefina desceu para o hall

de entrada do casarão, onde o duque de Harek esperava por ela.— Você está mais linda do que qualquer outra criatura existente na face da

Terra. — Dito isso, Harek curvou reverentemente.— Obrigada, Vossa Graça. Vamos indo? Não vejo a hora de conhecer o teatro.Harek ajudou-a a entrar na carruagem, em seguida fez o mesmo com Conchita e,

por fim, acomodou-se no veículo ao lado delas. O coche partiu tão logo a porta sefechou.

— Você costumava ir ao teatro na Jamaica?— Sempre que possível — respondeu Josefina. — Se bem que, nos dois últimos

anos, estivemos todos muito atarefados.— Eu também tenho andado sedento por cultura.

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— Nesse caso, imagino que nós dois iremos nos divertir muito.— Diga-me: quando seu pai volta da Escócia, Vossa Alteza? Confesso que estou

ansioso por conhecer o rey e dar início aos meus trabalhos como intercessor para os

assuntos de Costa Habichuela.— Você já está trabalhando a nosso favor só em fazer com que eu seja vista.Quanto ao rey, deve estar de volta a Londres no final da semana que vem. Temos deprovidenciar a compra de provisões para a viagem de regresso à América Central.

— Espero que haja espaço no navio para passageiros extras — afirmou Harekcom um sorriso. — Tenho certeza de que vários bretões estão interessados emcomeçar vida nova do outro lado do oceano, na companhia de... bem, da pessoaadequada.

— Isso é meu pai quem irá resolver. — Josefina tornou a suspirar. Se ele

quisesse deixar suas intenções ainda mais claras, iria ter de tirar um padre do bolsodo paletó.— Certamente. — E, mudando de assunto, ele pôs-se a falar da caça a raposa na

Inglaterra.Enfim a carruagem parou, e Harek foi o primeiro a saltar para o chão.Uma infinidade de veículos tomava a rua no quarteirão em que ficava o teatro.

Assim que entraram, havia tantas pessoas no saguão e galgando a escadaria central,que parecia impossível encontrar um lugar onde pôr os pés. Princesa, duques,cavaleiros, comerciantes abastados, ninguém ali parecia ter espaço nem para respirar

normalmente. Porém de súbito se abriu um caminho diante dela.— Por aqui, Vossa Alteza — anunciou o duque de Melbourne, oferecendo-lhe obraço.

Ao aceitá-lo, Josefina percebeu de rabo de olho que o irmão do duque,Charlemagne, se achava junto dele. Naquela noite Sebastian estava todo de preto, anão ser pela gravata em estilo plastrão imaculadamente branca, e o resultado era...hipnótico. Que o dissessem as damas que pareciam devorá-lo com os olhos.

— É sempre assim tão cheio, Melbourne? — Enquanto subia os degraus ao ladodele, Josefina reparou que multidão se afastava para lhes dar passagem e, pela

primeira vez desde que aquilo tudo começara, sentiu-se uma princesa de verdade.— Você é o assunto do momento na alta sociedade. Todos querem conhecer os

Embry que estão trazendo tanta prosperidade a Londres. E pode me chamar deSebastian, se preferir.

— Vamos ver — retrucou, toda arrepiada.Lá em cima a aglomeração não era tão compacta, tanto que dava até para

reconhecer pessoas que ela já conhecia de outros eventos. Enquanto avançavam por umcorredor bem menos apinhado de gente, Josefina deu uma espiadela por cima doombro e constatou que Harek e Charlemagne vinham logo atrás, com Conchita a poucos

metros de distância dos dois.

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— Sempre tive alguém por companhia — comentou, olhando Sebastian de soslaio.— É por isso que seu irmão está aqui hoje? Para proteger você?

Os lábios dele se curvaram num sorriso de parar o coração.

— Meu irmão está aqui para manter Harek ocupado caso você queira que eu lhemostre um espaço reservado.— E se eu não quiser?— É você quem sabe.— Você é sempre tão seguro de si, não?— Isso você terá de descobrir. — Aprumou-se. — Chegamos. Você primeiro, por

favor. — Afastando a majestosa cortina vermelha, esperou que ela entrasse no seucamarote privativo.

Josefina teve a sensação de penetrar num outro mundo. Aquele teatro era no

mínimo três vezes maior do que o que havia freqüentado em Morant Bay, e as fileirasque compunham a platéia lá embaixo mais pareciam um reluzente e multicoloridooceano.

— Vossa Alteza e Harek ficam com as poltronas dianteiras — Sebastian iadizendo. — Shay e eu nos curvamos à sua popularidade.

Havia três poltronas na parte da frente do camarote voltada para o palco eoutras quatro atrás, sendo que Conchita já havia se instalado na que proporcionava apior visão do palco, num dos cantos da primeira fileira.

— Venha. — Sebastian ajeitou a poltrona para ela, em seguida lhe soprou no

ouvido: — Vai ter de me imaginar sentado às suas costas, admirando-a, contemplando odelicado contorno da sua orelha.Josefina, que queria sentar-se junto dele, girou o pescoço para encará-lo.— Decerto mal me lembrarei de que você está aqui.— Mentirosa.Ela sentiu os pelos da nuca se eriçarem. Fossem quais fossem as diferenças que

tinha com Melbourne, Harek obviamente estava satisfeito como um gato com uma bolade lã por ser visto ao lado dela na primeira fileira do melhor camarote do teatro.Atrás dos dois, Sebastian e Charlemagne falavam em voz baixa de uma festa de

aniversário com acrobatas.— Deixe-me avisá-la: além dessa peça ser um inferno de longa, o intervalo deve

ocorrer duas horas após o início da apresentação — sussurrou Harek. — Por isso,pegar no sono não é nenhum pecado... desde que não caia da cadeira.

— Isso não me preocupa, mas de qualquer modo, obrigada pelo aviso.Enquanto ele se debruçava sobre a mureta do camarote para cumprimentar

alguém na platéia, Josefina se inquietou ao ouvir o irmão do duque de Melbourneresmungar a palavra “palhaço”. Não que também não achasse Harek um palerma,opinião provavelmente compartilhada por toda a alta sociedade londrina; só não queria

que aquele tipo de comentário chegasse aos ouvidos da sua família.

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Em poucos instantes, as cortinas se ergueram, a peça teve início e ela serecostou ao espaldar da poltrona.

Vinte minutos depois, ao escutar um ronco, Josefina virou-se para deparar com

Harek afundado na poltrona, os braços cruzados sobre o peito e a cabeça tombadapara trás. Bem, agora era rezar para que ele não cometesse o pecado de escorregarpara o chão... A ironia, porém, não parecia boa companhia no momento, especialmentequando Melbourne por certo se achava com todos os sentidos mais do que alertas.Droga, não tinha a menor vontade de ficar sentada ao lado de um palhaço roncador porquatro horas a fio... sobretudo se pudesse passar alguns instantes desse espaço detempo sendo beijada por um homem que fazia seu sangue arder de desejo. Levantou-se.

— Dêem-me licença por uns minutinhos, sim? — sussurrou, seguindo para os

fundos do camarote enquanto Conchita se punha em pé.— Vou lhe mostrar o caminho. — Sebastian também se ergueu. — Quer umcálice de vinho do Porto, Shay?

— Sim, obrigado. — Após se erguer à passagem da princesa, Charlemagne tornoua se sentar. — Vou ficar de olho no nosso convidado, assim se evita que ele venha aperder o equilíbrio e acabe escarrapachado no carpete.

Josefina pestanejou um par de vezes ao deixar o camarote, pois o corredoriluminado pela luz de velas parecia muito mais claro em comparação com a penumbraque imperava no interior da sala de espetáculos.

— Por aqui. — Sebastian guiou-a até um dos cubículos reservados, porém sedeteve diante do cortinado para indagar à criada: — Como você se chama?— Conchita, Vossa Graça.— Conchita, você vai ficar esperando ali. — Mostrou um ponto junto à parede a

um metro e meio de distância. — Está bem assim?Ela olhou para Josefina.— Faça como ele pediu, Conchita.Depois de fazer uma mesura, a moça foi se colocar no lugar indicado. Sebastian

então deu uma olhadinha pelo corredor, em seguida abriu uma fresta na cortina rubra

como sangue.— Você primeiro, por favor.Mesmo se quisesse opor-se à vontade dele, Josefina não resistiu àquele tom de

voz. Sem nada dizer, entrou na pequena câmara e, logo em seguida, ouviu o cortinadocarmim voltar a se fechar. Ali dentro, a voz dos atores no palco vinha filtrada pelasparedes e tapeçarias do teatro: Ultimamente, milorde, ele tem me dado muitas demonstrações de ternura.

— Tenho de dizer, — sussurrou Josefina, fitando-o à claridade da única vela queiluminava a minúscula alcova — que isto é muito atrevimento da sua parte.

Após sustentar por alguns instantes o olhar que o sondava, Sebastian seaproximou um passo, e a desconcertante sensação que havia se apoderado dela por

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesapouco não se transformou numa vertigem. Por Deus, crescera rodeada de soldados edas estúpidas tentativas que eles faziam para seduzi-la; então por que o modo como oduque de Melbourne a encarava fazia seus joelhos amolecerem?

Poderia dizer a si que era porque precisava contar com a colaboração e ainfluência dele, só que em nenhuma outra das aventuras em que se engajara havia sesentido daquela maneira.

— Você sabe quem é John Rice-Able? — Sebastian a interpelou.— Como? Ora, não estou aqui para ser questionada. — Correu um dedo pela

lapela do paletó aveludado. — Beije-me... Ou então vá embora, para que eu possaretornar ao camarote.

— Isso é um “sim”?Ele estava tão perto, que Josefina tinha de levantar o rosto para poder olhá-lo

nos olhos. As mechas castanhas sobre o colarinho, a boca bem feita... Se ao menosaqueles olhos tão intensos não atormentassem seu íntimo do mesmo modo comoprovocavam seu corpo.

— Não, não conheço nenhum John Rice-Able. Por quê? Ele faz investimentos?— Escreve livros. Pensei que vocês se conhecessem.— Não. — Incapaz de se conter, ela passou os dedos pela manga do paletó dele.

Era tão difícil não tocá-lo...— Está com ciúme desse indivíduo?— Não, já que vocês não se conhecem. — Segurando no queixo altivo, Sebastian

baixou o rosto em direção ao rosto dela e, quando suas bocas estavam prestes a setocarem, deteve-se. — Diga o meu nome.— Melbourne.— Não. O meu nome de batismo.— Sebastian — ela murmurou num sopro de voz.Ele a beijou. Enlaçando-o pelo pescoço, Josefina sentiu-o empurrá-la de

encontro à parede para então agarrá-la pelos quadris e apertá-la contra o corpo comose disso dependesse para continuar vivo.

— Quero mais — ela sussurrou, pela primeira vez não se importando em fingir

sinceridade ou premência na voz. — Quero você, Sebastian.Sem nada dizer, ele levou uma das mãos até o ombro dela para, num movimento

ansioso, empurrar a alça do vestido bordo para o braço todo trêmulo. E, ainda emsilêncio, refez com os lábios o percurso afogueado que antes executara com a pontados dedos.

Baixando a alça do vestido até o cotovelo, ele expôs um seio alvo e roliço e, poralguns instantes, ficou a admirar o colo que palpitava de desejo. Por fim, comentoucom a voz embargada:

— Faz muito tempo que eu não... — Mas não soube como terminar.

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A solidão e a urgência contidas naquela confissão calaram fundo no coração deJosefina. Era isso o que tanto temia: que o duque fosse querer mais do que ela tinhapara dar. No entanto, já havia pulado no fogo, e sua pele estava em brasa.

— Para mim, faz uma vida inteira — murmurou.Ele tornou a beijá-la, e Josefina suspirou. Aqueles dedos ágeis, que faziamlembrar o toque de plumas, começaram a desenhar círculos cada vez menores ao redordo seu mamilo, até irem pousar sobre o bico rijo para afagá-lo em carícias lancinantes.Carícias que pareciam se refletir na região entre suas pernas. Ela estremeceu ante aexcitação que a assaltava.

— Diga-me onde irá morar em São Saturus — ordenou Sebastian, antes dedeslizar a boca pelo ombro dela e ir mordiscar o mamilo túmido.

— Oh... Deus... — Enfiou os dedos por entre os cabelos dele. — Por quê?

— Porque quero ouvi-la falar disso.— Estive lá só... oh, uma vez. — Suas pernas ameaçavam dobrar-se enquanto ele,após afastar a alça do seu ombro esquerdo, punha-se a acariciar seu outro seiotambém.

— De que cor é a casa?— Branca... Pedras brancas, com janelas... humm, janelas altas que... que deixam

entrar a brisa do mar.— Quantos cômodos?Por acaso ele estava pensando em se mudar para lá? Oh, tomara que sim,

especialmente se quisesse afagá-la daquela maneira noite após noite.— Quantos? Mais de uma centena... Para alojar a guarda real... e o gabinete deministros.

Sebastian se aprumou e, sem deixar de afagar um seio sequioso de carícias,murmurou de encontro aos lábios que ansiavam por outro beijo:

— Quer saber de uma coisa?— Diga — pediu Josefina no mesmo tom, pressionando o colo contra a mão dele.— Acho que você está mentindo. — E, depois de um beijo quase bruto, levou as

tiras do vestido de volta ao lugar delas antes de se afastar.

Tomada de um misto de surpresa, desejo e frustração, Josefina indagou:— Como? Do que está falando?— Ainda não sei muito bem o quê, mas algo de muito estranho está acontecendo.— O que está acontecendo, seu canalha — ela ajeitou o vestido —, é que você

acaba de provar que não vale nada. — Passando por ele, estendeu o braço para acortina.

Dura e pesada como se feita de chumbo, a mão de Sebastian desabou sobre oombro dela.

— Ainda não terminamos. — Obrigou-a a se virar.

— Como faz isso?— Faço o quê? — Josefina soltou-se com um repelão. — Não sei do que...

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— Como faz com que eu deseje você como louco? É seu perfume? Alguma poçãoque passa na pele? O que...

— Então acha que precisa ser dopado para se sentir atraído por mim? Nossa

conversa termina por aqui, senhor. — Tornando a se virar, abriu o cortinado com umpuxão e saiu para o corredor.— Vossa Alteza? — Conchita correu ao encontro dela.— Está...Josefina passou pela criada como um raio. Queria fugir dali, de Londres, do

próprio corpo, ainda sensível e ardente por causa dos carinhos dele. Oh, naqueleinstante odiava Melbourne com todas as forças e ainda assim o desejava como nunca.Maldição! Maldição dos infernos!

Sebastian tornou a fechar a cortina. Em nome da decência, precisava ficar mais

alguns minutinhos ali. Deus, ela o deixava loucamente excitado, e ainda que seu ladológico e prático estivesse pronto para dar um fim àquele tête-à-tête antes que algumestrago de maiores proporções se consumasse, tudo o que seu corpo queria era levaraquele contato íntimo às últimas conseqüências.

A princípio, bem que pretendia seguir adiante, ir até onde fosse preciso paradescobrir o que havia na princesa e a respeito de Costa Habichuela que tanto ointrigava. Mas então, antes mesmo do que supunha, ela fizera uma afirmação que soavaabsolutamente falsa. Por que São Saturus, uma cidadezinha pitoresca com umapopulação basicamente de nativos e apátridas ingleses, segundo observações da

própria Josefina e do pai dela, haveria de ostentar um monumental palácio de pedrasbrancas com mais de uma centena de cômodos? O rei Mosquito não residia lá, casocontrário não teria dado tamanho tesouro de mão beijada. E se tivessem conhecimentode uma propriedade de tais dimensões debruçada sobre uma resguardada enseadaoceânica, os espanhóis por certo teriam enviado suas tropas para conquistá-la.

Ou talvez ela tivesse exagerado só para impressioná-lo. Possivelmente osuntuoso palácio não passava de uma pequena villa com um décimo dos aposentos queJosefina mencionara. Provavelmente a brisa marinha era aprazível e relaxante comoela e o livreto afirmavam. E decerto ele era um idiota procurando motivos para

desconfiar da mulher por quem sentia profunda atração.Após murmurar uma praga, abriu a cortina e, de pronto, um brilho cor de creme

no carpete chamou sua atenção: o colar de pérolas que Josefina evidentementedeixara cair. Abaixando-se, enfiou a jóia no bolso antes de ir procurar um lacaio ealguns cálices de Porto.

Quando ele retornou ao camarote, Josefina tinha se acomodado novamente aolado do ainda adormecido Harek. Com um suspiro, entregou um dos cálices ao irmão ese sentou.

— Por que demorou tanto? — Charlemagne se apressou em perguntar.

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— Pedi que providenciassem uma garrafa de outra safra, pois me recuso a tomaraquela beberagem aguada que é servida aqui. — Antes que o irmão insistisse noassunto, tirou o colar do bolso para examiná-lo por um instante.

— O que...— Shh. — Inclinando-se, Sebastian roçou os lábios na orelha esquerda daprincesa. — Acho que isto é seu. — Então passou o braço por entre as poltronas paralhe entregar a jóia. — Guarde-o na carteira. Não ficaria bem se alguém a vissearrumando-se em público.

— Obrigada, Vossa Graça. — Mas à firmeza da voz se contrapunha o tremor damão dela.

Ao perceber que Charlemagne continuava olhando para ele, Sebastian,recostando-se ao espaldar da poltrona, explicou:

— Ela o deixou cair.— Sei.Durante o intervalo, Josefina sorriu a torto e a direito e trocou palavras com

enlevados conhecidos como se o duque de Melbourne não tivesse lhe arrancadogemidos e parte da roupa no decorrer da primeira parte da apresentação. E semprecom o cuidado de manter Harek ou Charlemagne, quando não os dois, entre ambos.Estaria mais irritada por não ter sido plenamente seduzida ou por que fora pega numamentira? Bem, isso era algo que, mais cedo ou mais tarde, ele iria descobrir.

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Capítulo IIICapítulo III

Ao tomar seu assento na Câmara dos Lordes na manhã seguinte, Sebastian tevede dissimular um bocejo. E, com as energias minadas pelas quatro horas de tragédiadinamarquesa seguidas por outras seis de insônia, nem esperou o término dasdiscussões acerca da nova rodada de gastos do príncipe regente para bater de leve noombro do cavalheiro sentado logo abaixo dele. O nobre se virou.

— Melbourne.— Lorde Beltram. Por acaso recebeu minha requisição?— Recebi, sim. E já localizei a pessoa que está procurando. — Tirou um pedaço

de papel dobrado em quatro do bolso interno do paletó. — Aqui está. Ele mora emEton. Na verdade, leciona lá.

— Muito obrigado. — Tomando o papel, Sebastian o desdobrou para conferir oendereço. — Você me poupou de uma série de diligências.

— Então talvez não vá se incomodar em me apresentar àquela comitiva realcentro-americana quando eles regressarem a Londres. A noventa libras por apólice,

vou resgatar empréstimos que fiz na Itália para adquirir títulos públicos de CostaHabichuela. Que quantidade você já comprou? Meio país, aposto, visto quepraticamente tem o rei na palma da mão.

— Irei apresentá-los a eles, William — respondeu Sebastian com cautela. Sesuas suspeitas fossem infundadas, não podia correr o risco de afugentar osinvestidores de que o recém-fundado país tanto necessitava. — Mas você está sabendoque Harek assumiu o posto de intermediário para os assuntos daquela nação, não? Maltenho tido tempo para cuidar dos meus próprios assuntos.

— Ah, certamente. — O olhar de Beltram deslocou-se para alguém às costas

dele. — Lorde Deverill.— Beltram, Melbourne — cumprimentou o marquês com um tapa no ombro docunhado.

— Valentine. — Virando-se, Sebastian olhou-o de cima a baixo. — Não é umpouco cedo demais para você?

— Ah, você nem imagina... — Largou-se sobre sua cadeira. — Os dentinhos deRose estão nascendo, e Eleanor cismou que banhos em água de lavanda irão acalmar apequenina, o que me levou a decidir que no momento a Mansão Corbett é o lugar maisbarulhento de toda a Grã-Bretanha.

Rindo, Sebastian lembrou:— Você foi avisado de que a vida em família tem seus perigos.

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesa

— Sim, eu sei. E a verdade é que adoro tudo isso na maior parte do tempo. Mas,por falar em idiotas, parece que Harek vai levar a princesa ao Tattersall hoje.

— Estávamos falando de idiotas?

— No fundo, idiota devo ser eu, que ainda não entendi por que um monarca àprocura de contatos e investidores deixou o intermediário para seus negócios,cuidando da filha dele e foi para a Escócia.

— Porque a melhor maneira de legitimar um governo recém-instituído é casá-locom um fundado há muito tempo já consagrado e muito respeitado.

— Você já sabia, não é? Desde o início já tinha percebido que tentavammanobrá-lo em direção ao altar.

— A estratégia não foi o que se poderia chamar de sutil.— Mas então por que continua a valsar com a atrevida? Por que teve de levá-la

ao teatro?— Independentemente de certas reservas, não tenho por que dissuadirinvestidores dispostos a comprar títulos de Costa Habichuela. Se eu cortar todos osvínculos com a comitiva real, é o que vai acontecer.

— É bom ouvir isso. Assim que sair daqui, vou enviar meu contador ao banco paracomprar cem apólices. Agora que tenho família, quero um investimento seguro, delongo prazo.

Com mil demônios.— Valentine, espere mais um pouco, sim?

— Ah! Eu sabia. Que raios está acontecendo?— Talvez nada, mas o fato é que já conduzi negócios o suficiente para saber quequase nada no mundo não têm suas desvantagens ou inconveniências. Ainda estoutentando descobrir quais são os pontos fracos de Costa Habichuela.

Sentada no banco que Harek havia escolhido a vários metros de distância docercado onde se realizava o principal leilão de cavalos de raça em Tattersalls,Josefina, que dava atenção a todos os que vinham cumprimentá-la, obrigou-se a sorrirpara o rapaz muito bem vestido que só faltava se ajoelhar a seus pés.

— Comprei duas apólices ontem — dizia ele, completamente alheio ao duque empé junto ao banco e ao tenente May, um ostensivo guarda-costas todo trajado depreto. — Vocês tencionam vender lotes de terras? Li o livreto e devo confessar queprefiro me arriscar a ser um proprietário rural em Costa Habichuela a contar com acaridade do meu pai e do meu irmão mais velho.

— Esse é o filho caçula do marquês de Bronshire — cochichou Harek, curvando-se sobre ela. — Tem cinco irmãos mais velhos.

— O rey não planejou esse tipo de empreendimento para esta visita à Inglaterra— retrucou Josefina, ainda sorrindo —, mas vou dizer a ele que temos um interessado

em nossas terras.

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— Fale de mim também, Vossa Alteza! — gritou alguém no meio da aglomeraçãoque a cercava.

— E de mim!

— Também estou interessado! Um dia destes ainda troco esse maldito empregode ficar limpando sujeira de cavalo por um bom lote de terras e brisas vindas do mar!Todos caíram na risada. Deus do céu! Como era possível que alguém estivesse

disposto, ávido até, a trocar uma vida em família por um cantinho qualquer num lugarindômito e desconhecido? Mas antes que encontrasse uma boa resposta para suasindagações, Josefina se levantou ao ver o trio de damas que se aproximava.

— Lady Caroline, lady Sarala — cumprimentou-as, inclinando a cabeça. — E essadeve ser a cunhada de vocês, lady Deverill.

A marquesa de cabelos castanhos fez uma mesura, um gesto discreto, porém

respeitoso, que de pronto fez Josefina lembrar-se do irmão mais velho dela.— Estou muito contente por enfim conhecê-la, Vossa Alteza. Acho que sou aúltima pessoa em Londres a fazê-lo. — Lady Deverill colocou-se ao lado das cunhadas.— Não gostaria de descansar um pouco e almoçar conosco?

— Não é má idéia — respondeu Josefina, tentando não parecer ansiosa porescapar dali. — Vossa Graça, vou deixá-lo à vontade para examinar aqueles dois boisque está pensando em adquirir.

Harek fez uma reverência.— Minha carruagem está à disposição, damas.

— Obrigada — agradeceu a marquesa com um sorriso que não se expressava emseus olhos —, mas temos nosso próprio meio de transporte. Vossa Alteza, por aqui, porfavor.

Enquanto abriam caminho por entre a multidão, Conchita e o tenente Maycolocaram-se nos calcanhares delas. A escolta de uma criada e de um guarda-costas nomomento parecia excessiva, assim Josefina fez um sinal para que Conchita seaproximasse.

— Você e o tenente May podem retornar à residência dos Branbury. — Ergueu avoz. — Certamente uma dessas damas tão amáveis cuidará para que eu chegue bem em

casa.— É claro, Vossa Alteza.Ao ver a criada ir ao encontro do tenente May, Josefina voltou sua atenção às

 jovens damas que agora a acompanhavam.— Melbourne pediu para vocês virem até aqui? — Odiava aquele homem e odiava

ainda mais ter sonhado a noite inteira com as mãos e os lábios dele a acariciarem.— Por Deus, não. — A marquesa se deteve junto a uma luxuosa carruagem com o

brasão amarelo dos Deverill pintado no painel da porta. — Carol e Sarala não paravamde falar de você, e eu queria conhecê-la.

Josefina deixou que o cavalariço a ajudasse a subir no veículo enquantoafirmava:

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— Embora meu país se beneficie do alvoroço que minha presença possa causar,preciso admitir que ter tantas pessoas à minha volta às vezes é... desconcertante.

— Todos adoram você, não é mesmo? — comentou Sarala com um sorriso.

Detectando um sotaque estrangeiro no falar da dama, ela indagou:— Se me permite a curiosidade, você não é daqui, é? Digo, de Londres?— Cresci na índia e, devo confessar, não enfrentei a alta sociedade de Londres

com tanta bravura como você — explicou a esposa de Charlemagne. — Shay me contouque você tinha um mar de admiradores no teatro ontem.

Um deles com a boca em seus seios... Josefina se obrigou a retornar àrealidade. Aquelas damas eram Griffin ou de nascença ou por intermédio docasamento, e Melbourne a chamara de mentirosa; seria muita infantilidade presumirque tivesse sido convidada para almoçar na companhia delas por mera questão de

delicadeza.— Todos têm sido muito gentis comigo — assinalou.— Pretende morar em Costa Habichuela? — quis saber Caroline, sentando-se ao

lado dela enquanto as cunhadas se acomodavam no coxim voltado para o assento dasduas.

— É meu lar; é natural que eu queira morar lá. — A carruagem se punha emmovimento.

— Tenho de lhe contar que Shay ficou fascinado com a brochura que vocêsderam a Melbourne — comentou Sarala.

— Fico contente que ele tenha gostado do livreto. Costa Habichuela é um lugarextraordinário.— A julgar pelo que ouvi minutos atrás, inúmeros bretões estão muito

interessados em ir para lá. — Lady Deverill a mirava com olhos da mesma cor do que osdo irmão, porém muito mais calorosos do que os dele. — Vocês já pensaram em abrirCosta Habichuela à imigração?

— Creio que o rey quer avaliar o impacto de um incremento de cidadãos e terrascultivadas antes de tomar uma decisão.

— Uma abordagem muito sensata — condescendeu Sarala. — Economia é um dos

meus passatempos.Que maravilha.Só lhe faltava ter de responder a perguntas para as quais não se sentia

preparada. — Não posso deixar de indagar — interveio a marquesa, como se sóesperando pela oportunidade. — por que foi que você esbofeteou meu irmão. Ou muitome engano ou ninguém nunca teve coragem para fazer uma coisa dessas.

— Melbourne mandou uma carruagem ir me apanhar quando havia secomprometido a ir me buscar pessoalmente, o que poderia denegrir a primeiraimpressão que as pessoas teriam de mim e do meu país. — A verdade não faria mal a

ninguém. — De mais a mais, acho que qualquer mulher se magoaria ao saber que o belohomem que havia se oferecido para acompanhá-la, simplesmente não se deu ao

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesatrabalho de aparecer. E, perdoem-me a sinceridade, ele continua sendo um tantoarrogante e muito rude comigo. Não sei por quê, ainda mais tendo em vista que o duquefaz questão de se mostrar extremamente gentil com todas as pessoas que cruzam o

caminho dele.Já pronta para contar que elas três também já tinham sofrido com as oscilaçõesde humor de Sebastian, Eleanor mudou de idéia e afirmou:

— Melbourne é tido como um homem inescrutável.— Inescrutável? — A princesa sorriu. — Tendo em vista que ele é seu irmão, não

vou acrescentar outros adjetivos à descrição.— Você é mesmo uma autêntica diplomata — observou Caroline, e as quatro

deram risada.Um veículo emparelhou à carruagem e, ao examiná-lo de rabo do olho, Eleanor

reconheceu a imponente carruagem negra com o brasão escarlate dos Griffin na porta.Era só o que faltava. Erguendo o olhar à janela que tinha o cortinado aberto, deparoucom Sebastian a encará-la, o semblante quase sempre inescrutável com um ar deprofunda irritação.

— Oh, céus — murmurou Caroline. — Ele não parece nem um pouco satisfeito.Ainda que com a respiração presa, Eleanor tratou de sorrir.— Problema dele. O duque de Melbourne não vai nos enxotar das ruas. — E

acenou para o irmão mais velho.— Nell, não o deixe ainda mais irritado — advertiu Sarala num sussurro.

Após seguir alguns metros ao lado delas, Sebastian bateu de leve no teto dacarruagem e, de imediato, o veículo entrou na rua transversal à em que estavam.Eleanor exalou o ar dos pulmões. Graças a Deus.

— Peço desculpas se minha presença aqui com vocês lhes causou algumtranstorno — afirmou Josefina. — Sei que Melbourne não simpatiza comigo.

— Tolice, ele antipatiza com quase todo mundo. Não leve isso a sério.— Obrigada, lady Deverill. —A princesa sorriu.— Trate-me por Eleanor, sim?Embora desse a entender que fosse fazer algum outro comentário sobre o

ocorrido, a princesa pôs-se a falar do tempo.Aproveitando para perscrutar a fisionomia dela, Eleanor concluiu que, se

Sebastian já era difícil de decifrar, aquela jovem não parecia muito mais fácil. Mas, amenos que estivesse redondamente enganada, Josefina Embry achava seu irmão nomínimo atraente.

Desistindo pela quarta vez de tentar terminar de ler aquele parágrafo,Sebastian tirou os olhos do jornal para indagar:

— O que está fazendo?

— Veja. — Sentada ao lado dele, Penélope tentou lançar um cubo de açúcar naxícara de chá usando uma colher como catapulta.

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O torrão foi se chocar contra o jornal dele.Diabos.— Não ponha tanta pressão no cabo da colher — sugeriu ele antes de retomar a

leitura.Segundo o London Times, a princesa Josefina Embry, de Costa Habichuela,havia agraciado Carlton House com sua presença na véspera, onde almoçara com Prinnye o duque de Harek. Um dia antes ela fora a Greenwich para um passeio num dosnavios da Esquadra Real. Londrinos de todas as camadas sociais estavam encantadoscom ela; as moças atiravam pétalas de rosas a seus pés, os homens lhe entregavamcartas com propostas de casamento.

Todo cidadão com um xelim de reserva parecia ávido por investir no “Condadoda Inglaterra”, como o povo começara a se referir a Costa Habichuela.

— Quanta besteira.— Como, papai?— Nada, querida. Eu estava lendo uma notícia a respeito da princesa Josefina.— As titias a levaram para almoçar há alguns dias. — Outro projétil atingiu o

 jornal. — Mas não me convidaram.— Quem sabe suas tias não levam você junto da próxima vez, não é? —

Sebastian baixou o periódico. — Além do quê, a família de sua tia Caroline chega aLondres amanhã, e você por certo irá querer visitá-los.

— Sim, só que eles não são príncipes.

— Lamento, Penélope, mas quanto a isso não posso fazer nada.— Mary Haley disse que você  pediu a princesa em casamento e que ela disse“não” porque você é só um duque e que foi por isso que você se demitiu do posto deintermediário.

Dobrando o jornal, ele o deixou de lado.— Estou começando a suspeitar de que Mary Haley seja uma fofoqueira e que

você passa tempo demais na companhia de...A porta da sala do desjejum se escancarou.— Eu estava rezando para encontrá-lo em casa. — Charlemagne entrou com um

punhado de livros nos braços.Penélope se levantou.— Mary Haley não é fofoqueira; é minha amiga, e é por isso que me conta tudo o

que tenho de saber. Agora, com a sua licença, vou dar de comer aos marrecos doparque. — Sem mais, deixou a sala estalando os sapatinhos no chão.

Ora essa. Não lhe faltava mais nada.— Interrompi alguma coisa? — Charlemagne largou os livros sobre a mesa.— Só uma divergência de opiniões. — Fez sinal para um dos criados ao lado do

aparador. — Tom, vá se certificar de que a sra. Beacham irá acompanhar lady Penélope

ao parque.— Pois não, Vossa Graça. — O moço se foi como se tivesse rodinhas nos pés.

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— Muito bem, Shay, o que houve?Sem perguntar se ele já tinha terminado o café da manhã, Charlemagne

empurrou todos os pratos para a outra ponta da mesa e foi se sentar na cadeira em

frente à que Penélope havia se sentado. Em seguida, puxou cerca de meia dúzia delivros para perto, a fim de deixá-los ao alcance da mão.— Dê uma olhada nisto, Seb.— É o livreto sobre Costa Habichuela.— Sim e não.— Como assim?Abrindo um dos livros, Charlemagne folheou algumas páginas até encontrar o

que queria.— Leia esse trecho da brochura em voz alta, Seb. — Então ajeitou o outro livro

à sua frente.— “Embora se imagine que a proximidade com a linha do Equador possa deixar o clima insuportavelmente quente abafadiço o ano inteiro, Costa Habichuela é abençoada com uma larga extensão de...” 

— “... de terras litorâneas que, tarde após tarde, acolhem a aragem aprazível e refrescante vinda do Oceano Atlântico. Essa brisa tem o efeito de tanto reanimar como rejuvenescer a população, além de propiciar a entrada e distribuição dos ventos alísios procedentes de praias remotas, um assunto que será tratado em profundidade no final deste capítulo ”. — Charlemagne fechou o livro, empurrando-o para o irmão.

Perplexo, Sebastian ficou olhando para o título impresso na capa de couro doexemplar por alguns instantes antes de afirmar:— Isso... — Limpou a garganta, que sentia subitamente ressequida. — Isso é um

estudo sobre a Jamaica.— Encomendado pelo rei George II, com data de setenta e cinco anos atrás. —

Charlemagne tornou a apanhar o livreto sobre Costa Habichuela para folheá-lo com umar irônico. — Eu tinha certeza de que já havia lido isto em algum outro lugar.

— Talvez o rey não tenha o dom de colocar idéias no papel. — Sebastian ouviu-se dizer. — Tomar emprestado alguns...

— São capítulos inteirinhos, Seb. Tudo o que era oeste virou leste, o nome dorio e das cidadezinhas foram trocados, porém o mais é idêntico. Os alísios até sopramna direção errada só para se adaptarem à localização do país. — Pegou outro livro. —Quer ler a respeito da população? Está tudo neste aqui, Um Exame Cultural das índias Ocidentais. E o...

— Já basta, Shay. Entendi o que está querendo me dizer. Não há uma só palavraoriginal na brochura.

— O que me leva a indagar como Costa Habichuela é na realidade.— Acho que vou ter de perguntar. — Sebastian se pôs em pé. — Com licença.

— O rey ainda não voltou da Escócia. — Também se levantando, Charlemagne juntou os livros numa pilha.

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— Mas a princesa está aqui. — Ao ver que o irmão fazia menção de acompanhá-lo, Sebastian declarou:

— Vou sozinho.

— Você vai é perder a sessão no Parlamento se não for para lá agora mesmo.Antes de deixar a sala, Sebastian disparou por sobre o ombro:— Ao diabo com o Parlamento.Josefina fez sinal para o mordomo do coronel Branbury, afirmando assim que

ele se acercou:— Grimm, dispense quem mais chegar, por favor. Diga-lhes que volte amanhã.— Pois não, Vossa Alteza. Devo pedir à cozinha que providencie mais chá e bolo?— Sim, obrigada. — Ao menos enquanto comia, a horda de visitantes não falava,

e o ar na sala de visitas talvez se tornasse um pouco mais respirável.

— Vossa Alteza — lorde Ausbey se curvou com tamanha reverência que o altode sua cabeça coberta por caracóis loiros quase chegou a tocar o carpete. — Nãotenho palavras para lhe expressar minha gratidão por me receber nesta manhã. Souum dos seus mais ardentes admiradores. A bem da verdade, até escrevi um poemapara declarar a profundidade dos meus sentimentos. — Tirou um pedaço de papel dobolso interno do paletó verde-musgo.

— Adoraria ouvi-lo, lorde Ausbey. — Josefina correu a colocar a mão sobre obraço dele a fim de impedi-lo de desdobrar o papel. — Mas tenho de...

— Por favor, Vossa Alteza, trate-me por Adam. Há muito espero ouvir meu

nome em seus lábios.Com um sorriso chocho, ela soltou o braço do aristocrata.— Assim você me envaidece, lorde Ausbey. Agora peço que me dê licença, por

favor. Preciso dar atenção aos demais. — Sem mais, deu-lhe as costas para abrircaminho em meio ao mar de admiradores e desocupados.

Interceptando-a, Conchita pôs-se a afofar disfarçadamente as mangas dovestido cor de creme que ela usava enquanto lhe cochichava:

— Seu pai iria adorar ver todo esse interesse.— Bem que eu queria que papai estivesse aqui para lidar com isso. Recebê-los

com amabilidade não é problema, mas como se faz para eles irem embora?— Por que não pergunta ao duque? — Ao ver lady Holliwell se aproximando com

uma brochura na mão, Conchita tornou a se misturar à aglomeração de gente espalhadapelo recinto.

A impressão dos livretos vinha se dando a toque de caixa, o que ensejava umadespesa considerável, porém Josefina era da opinião de que gastar um punhado dexelins como forma de incentivar um investimento de milhares de libras seria umatroca mais do que justa.

— Ah, eis Vossa Alteza. — Saltando à frente da condessa de Holliwell, o duque

de Harek foi oferecer o braço à anfitriã.

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— Minha cabeça está rodando. — Pousando a mão no braço dele, Josefinaobrigou-se a mais um sorriso. — Na verdade, estou me sentindo exausta.

— Acho que posso cuidar dos nossos convidados caso você queira ir se

refrescar.— Nossos convidados?— Modo de falar — retrucou Harek com um dos seus sorrisos encantadores.Após dar mais uma olhadela pela sala apinhada de gente, Josefina aquiesceu:— Nesse caso, faça às vezes de anfitrião. Só vou lá em cima arrumar o cabelo.— Não se preocupe. — O sorriso dele se alargou. — É de se esperar que uma

princesa queira manter a aparência impecável.O mais rápido que pôde, Josefina seguiu para o corredor, agora tomado por um

sem-número de pessoas, e dali subiu para seus aposentos no segundo piso da mansão.

— Vossa Alteza — bufou Conchita atrás dela —, está tudo bem?— Preciso de alguns minutos para me recuperar dessa balbúrdia. Fique de olhoem Harek, sim? Não quero que ele se declare rey enquanto ajeito meu cabelo.

A criada deu meia-volta, e Josefina, tão logo entrou em seu quarto, fechou aporta e deitou a testa de encontro ao carvalho fresco. Não lhe passara pela cabeçaque ser simpática e acolhedora pudesse ser tão cansativo.

— Não me diga que seu estoque de lindas histórias se acabou.Grave e penetrante, a voz que conhecia tão bem a fez gelar. Correndo a se

virar, deparou com ele apoiado à escrivaninha e os papéis que ali deixara espalhados

por sobre o tampo do móvel.— Que diabos está fazendo aqui?— Vim lhe fazer uma pergunta.— Saia já do meu quarto! — Quase sem pensar, aproximou-se da cama e da

pistola que guardava na mesinha-de-cabeceira. — Se veio me visitar, então vá para junto dos demais lá embaixo.

Sebastian se aprumou, o que deu a Josefina a impressão de que ele preenchiatodo o aposento.

— Acha que sou mais um de seu circulo de bajuladores?

— É o que parece, já que não consegue ficar longe de mim.— Não consigo, não é mesmo? — Caminhando até a porta, ele trancou a

fechadura.Ao ouvir o giro da chave no mecanismo, Josefina sentiu um arrepio ao longo da

espinha. Ainda assim, tentou manter a calma.— Que pergunta é essa que veio me fazer?— Quem escreveu o livreto sobre Costa Habichuela?— Então é isso o que queria me perguntar? Pensei que quisesse seu posto de

intercessor de volta.

— Quem o escreveu?

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— Está procurando alguém para ajudá-lo a redigir sua biografia? Posso sugerir otítulo: Memórias de um Homem Extremamente Desagradável ou A História da Vida de Alguém que Você Não Quer Conhecer.

— Você não tem medo de nada?— Por certo não tenho medo de você, Sebastian... Você me deu permissão paratratá-lo por Sebastian, não foi?

— Dei, sim. E você me deu a liberdade de arrancar esse vestido e deixá-la nua.A temperatura da pele dela se elevou.— Não, aquele era um outro vestido. Este fica onde está, pois você me chamou

de mentirosa.— Você é  mentirosa! — Aproximou-se dela. — Quem escreveu aquela maldita

brochura?

Deus, ele sabia. De algum modo, havia descoberto.— Quero a verdade, Josefina.— A verdade... — Ela respirou fundo. — Muito bem. Quem escreveu o livreto fui

eu.— Ah. — Os olhos dele faiscaram. — Você tem conhecimentos profundos acerca

de um lugar em que esteve por dois dias.— Elaborei aquele livreto antes de ir até lá. Meu pai me escrevia carta atrás de

carta, descrevendo Costa Habichuela, e não havia tempo para encomendarmos umlevantamento completo, feito com todas as formalidades, ainda mais com a Espanha

tentando forçar os rebeldes a recuarem. Assim, estudei outras obras a que tiveacesso e adaptei-as de forma a fazer com que se ajustassem às descrições de meupai.

— Então os nativos de Costa Habichuela se parecem com os das índiasOcidentais?

— Vejo que andou pesquisando. — Josefina deu de ombros. — Ninguém seimporta com a história dos nativos. Eles estão lá, e a maioria fala um pouco de inglês.

— E São Saturus?— Um pouco menor do que descrita na brochura, mesmo assim é muito bonita. E

realmente se debruça sobre uma baía de fácil defesa.—Você fez os ventos alísios soprarem da direção errada.Josefina sentiu-se corar. Mentir era uma coisa, porém odiava cometer

equívocos tolos.— Só fui me dar conta disso depois que as cópias já estavam impressas.— O que você fez, além de furtar o produto das pesquisas de outra pessoa, foi...

— ao perceber que fitava os lábios dela, Sebastian correu a olhá-la nos olhos — de umatrevimento ímpar. Por acaso achou que ninguém iria perceber?

— Que mal há no que fiz? — Ela se aproximou para deslizar os dedos pelo

contorno do maxilar dele, suavemente sombreado pela barba que começava a crescer.Sebastian sentiu-se estremecer.

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— Provocar-me decerto irá me distrair, Josefina, mas não vai fazer com que euesqueça o que sei.

Com efeito, porém lhe daria tempo para avisar a seu pai que Melbourne sabia

sobre a brochura e também para tentar descobrir se ele pretendia revelar a verdadea sir Henry Sparks ou qualquer outra pessoa, colocando em perigo o empréstimo que seachava em vias de ir parar nas contas de Costa Habichuela.

— Pesando suas opções, princesa?Diabos, ele não podia ler pensamentos. Ninguém era capaz de tal façanha.— Estou me lembrando de quando, algumas noites atrás, você colocou suas mãos

em mim e depois me ignorou.— E?... — Ele se acercou ainda mais; achavam-se a meio caminho entre a porta e

a cama, a centímetros um do outro.

— E eu acho que você deveria ir embora daqui. — Josefina se afastou. — Sejamquais forem as ofensas que pretende dirigir a mim, nada será pior do que você aquelanoite no teatro.

— Volte aqui.— Não. — Aproximando-se da mesinha-de-cabeceira, Josefina se virou para

levar a mão à superfície encerada do móvel.— Não gosto que me dêem as costas.— Nem eu. — Mas nem bem ela abrira a gaveta do criado-mudo, as mãos dele já

estavam em seus ombros.

— Vou calar essa sua boca desaforada. — E, trazendo-a de encontro ao peito,Sebastian a beijou.Oh, Deus. Josefina sentiu uma intensa onda da mais pura excitação percorrê-la

de cima a baixo, intensa e nem um pouco sutil. No entanto, assim que abriu a boca parareceber a língua que instigava seus lábios, ele se afastou. Com a respiraçãoentrecortada e faíscas nos olhos acinzentados, Sebastian olhou dela para a gaveta umpar de vezes antes de tomar o revólver na mão.

— É isso o que está pretendendo? Você quer me matar, Josefina?— Não. — Tirando a arma da frente, segurou-o pelos cabelos para trazer os

lábios que antes ameaçavam devorá-la para junto dos seus; a pistola foi ao chão, oduque gemeu baixinho enquanto a agarrava pelos quadris, e ela pôs-se a brigar com onó da gravata.

Após um instante de hesitação, Sebastian a levou para a cama e se deitou sobreela, beijando-a em todos os lugares que ia desnudando. Com a sensação de quedescargas elétricas percorriam suas veias, Josefina enfim o livrou da gravata.

— Quero tocar você — murmurou, passando a desabotoar o colete de seda dele.Sem nada dizer, Sebastian empurrou para baixo a parte dianteira do vestido

que ela usava para, com o mesmo ímpeto, tomar um mamilo na boca e afagá-lo com a

ponta da língua. Josefina arquejou de prazer. Era evidente que Melbourne não iria sedeter, como fizera das outras vezes. Oh, que assim fosse... Apesar do tremor nas

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesamãos, fez o paletó e o colete escorregarem para fora dos ombros largos, e ele seencarregou de despi-los sem nem ao menos deixar de beijar seus seios e seu colo.

Ainda assim, Sebastian teve de interromper as carícias por um instante para

arrancar a camisa de linho branco pela cabeça. Igualmente afoita, Josefina não perdeutempo a correr os dedos pela pele tépida do torso recém desnudo, deslizando-os porentre os pelos acastanhados até encontrar o cós das calças que ele vestia. Suave aotato, a pele sob sua mão recobria músculos firmes... Músculos que se contraíam ao seucarinho.

Após tomar as saias do vestido nas mãos, Sebastian pôs-se de joelhos paraalçar as camadas de tecido até ir juntá-las ao redor da cintura dela, e por algunsinstantes, respirando com dificuldade, ficou a contemplá-la em silêncio.

— Sente-se. — Assim que ela o fez, voltou a beijá-la enquanto abria os fechos

do traje azul-celeste.Josefina sentiu o vestido afrouxar ao redor do seu peito, e então a delicadamusselina foi cair mansamente sobre seu colo.

— Levante os braços.— Pare de me dar ordens. — Apesar do protesto, fez o que ele determinara. —

Não sou criança.— Eu sei. — Despiu-a do traje, passando-o pela cabeça dela. — Você é Josefina

Embry, princesa de Costa Habichuela, que tanto pode ter como não o clima igual ao daJamaica.

— Já lhe disse que...— Desabotoe as minhas calças.Ao baixar os olhos à saliência que inchava a parte dianteira da indumentária

masculina, ela sentiu novo assomo de concupiscente volúpia tomar seu baixo ventre ese espalhar por todo o seu corpo.

— Você me deseja...— Desejo você desde o instante em que a vi. — Tomando as mãos dela, levou-as

à sua braguilha. — Desabotoe. — Então soltou as mãos hesitantes para afagar osmamilos já prontos para receber suas carícias.

Após arfar ante as sensações que aquele carinho lhe provocava, ela afirmou:— Um dia irei lhe dar uma ordem, e você há de acatá-la. — Mas sua voz trêmula

irresoluta e seus arquejos de prazer não soavam muito convincentes.— Duvido. — Com um gemido, ele curvou-se para trocar os dedos pela boca,

sugando e mordiscando os bicos rijos que pareciam se oferecer aos seus carinhos.Incapaz de resistir aos apelos do sedento querer que crescia em seu ventre,

Josefina torceu e retorceu o primeiro botão até conseguir tirá-lo da casa e, quandolevou os dedos ao botão seguinte, ouviu Sebastian gemer.

Ah, então o duque gostava de sentir suas mãos ali, não? Com gestos intencionais,

e atenta ao fato de que estava completamente nua e ele, não, pôs-se a mover a mão

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesapara cima e para baixo ao longo do tecido que recobria a virilidade túrgida de paixão. Eagora, quem estava no comando?

Em questão de segundos, porém, uma das mãos dele deslizou por todo o seu

abdômen e, após acarinhar o manto encaracolado no alto de suas coxas, foi afagar oponto mais sensível do seu corpo. Tomada por uma excitação lancinante, Josefinadeixou escapar um gemido antes de agarrá-lo pelos ombros.

— Sei que é uma delícia — murmurou Sebastian, penetrando-a com um dedoenquanto deslizava a língua pelo contorno da orelha dela.

— Oh, céus... — Na ânsia do que ainda estava por vir, terminou de desabotoar ascalças de casimira e empurrou-as para baixo, suspirando ao deparar com o membroviril pleno de energia e apetite. — Meu Deus...

— Deus não tem nada a ver com isso, princesa. — Num só movimento, fez com

que ela se deitasse novamente.Josefina nem ao menos imaginava do que uma boca era capaz até ele descrever,com lábios afoitos e língua cálida, um percurso sinuoso que, após deixar um rastro defogo em seu pescoço, desenhou estimulante trilha no vale entre seus seios antes deavançar em tortuosa vereda rumo ao seu púbis. Ali, os lábios e a língua excruciantes sedetiveram para produzir a mais aflitiva e mais prazerosa de todas as sensações queela já havia experimentado na vida.

Com a impressão de que iria explodir, Josefina se contorceu ante a intensidadeda tensão sensual que fluía do seu âmago de mulher e lhe alcançava a extremidade dos

braços e das pernas em contínuas e abrasadas ondas. E quando o sentiu instigá-laainda mais intimamente com a língua e o dedo, ouviu-se implorar:— Pare... Pare, não agüento mais. — Sebastian ergueu a cabeça para fitá-la.— Se quiser que eu pare, pararei — murmurou com a voz rouca, inflamada de

paixão, depois deu um daqueles seus sorrisos que a deixava meio zonza. — Mas aí iráperder o que vem depois.

— Oh... — Ela fechou os olhos por um segundo, tentando manter um mínimo decontrole sobre as emoções que a assaltavam. — Não... Não pare...

Ele voltou a baixar a cabeça, e pouco depois Josefina sentia uma deliciosa

rigidez se formando na base de sua espinha. Quando percebeu, ouviu-se gemerbaixinho, gemer e arfar e suspirar, e tudo o que conseguiu fazer foi enfiar as unhas nacoberta da cama. A tensão foi se avolumando, concentrando-se, entorpecendo... e desúbito a envolveu numa sensação avassaladora, um extático arroubo de espasmosefervescentes e esplendorosos que pareciam não ter nem começo nem fim.

— Deus... Oh, meu bom Deus... — Deitando-se, Sebastian afagou-lhe o rostosuado.

— Só ele sabe por que estou lhe dando esta última chance de escapar de mim,princesa.

Buscando forças nem sabia onde, Josefina o encarou.— Não quero nem vou escapar. Continue.

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesa

— Com todo prazer. — Acomodou-se sobre ela e, encaixando os quadris entre aspernas ainda meio bambas, penetrou-a num movimento firme e incisivo. — Se a dor formuito intensa, diga.

Josefina aquiesceu com um aceno. Não era dor o que lhe roubava a fala, e sim aestonteante e indescritível emoção de sabê-lo dentro dela.Incentivado pela anuência, Sebastian começou a mover-se calma e

cautelosamente; pouco a pouco, porém, os movimentos ganharam novo ímpeto, adquirindocadência e vigor. Ao vê-lo fechar os olhos, Josefina conteve os arquejos para sussurrar:

— Não quero que pense em outra pessoa quanto estiver comigo.— É em você que estou pensando. — E mordiscou a orelha dela antes de

preenchê-la completamente numa só investida.Ahh... A deliciosa rigidez começava a se formar novamente em suas entranhas.

— Então diga o meu nome, Sebastian.O ritmo dele se intensificou, os movimentos mais rápidos e mais profundos, aponto de fazerem a cama ranger.

— Josefina... Jo-se-fi-na...Abraçando o físico bem feito e todo teso que a preenchia em todos os sentidos,

ela se sentiu estilhaçar novamente em mil pedaços. Um instante depois, ao estremecerdos pés à cabeça, Sebastian puxou o quadril de lado e, mergulhando o rosto na cascatade cabelos negros, deixou escapar um gemido rouco enquanto atingia o clímax com ela.Quando enfim sé deu conta do que havia acontecido, Josefina percebeu que estava...

decepcionada. Sim, ele tomara o cuidado de evitar que ficasse grávida; só que, setivessem um filho, Sebastian teria de se casar com ela. E a verdade era que queriaSebastian Griffin, queria que seu duque só tivesse olhos para ela, que passasse todasas noites e todos os dias a seu lado, cego e indiferente a qualquer outra mulher nomundo.

Por alguns instantes, ele permaneceu com Josefina entre os braços enquantotentava recobrar o fôlego e a sanidade. Por Deus, como fora perder a cabeça daquelamaneira?

No momento em que entregaram aquele livreto a Prinny afirmando tratar-se de

um autêntico retrato de Costa Habichuela, ela e o pai haviam cometido uma tramóiadolosa contra a Inglaterra. E mesmo que a tal brochura correspondesse ou não àverdade, algo de que agora tinha sérias dúvidas, de sua parte não tinha nada que seenvolver, literal e metaforicamente, com essa mulher. Fora loucura.

Que diabos Josefina tinha feito com ele? E por que, mesmo depois de tê-lalevado para a cama e desafogado o desejo insano de sentir-se dentro dela, já tinhaganas de possuí-la novamente?

Trate de pôr a cabeça no lugar, Melbourne.Soltou-a, embora de má vontade, para se sentar.

— É melhor você voltar para junto dos seus convidados. — Com isso, escorregoupara fora da cama e começou a se vestir.

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— É tudo o que tem para me dizer? — Josefina o interpelou enquanto se punhasentada. — “Volte para junto dos seus convidados”? O que há? Você não gosta de mim,é isso?

— Gosto muito de você, Josefina. E não sou nenhum bicho, que acasala quandochega a temporada do cio.— Então o que foi? Porque eu também gosto muito de você.Decidindo-se pela verdade, pois ela a merecia, Sebastian admitiu: — Não confio

em você.— Hum. — Erguendo-se, ela também cuidou de recolocar suas roupas. — Isso é

algo bastante arriscado de se dizer, tendo em vista que só preciso abrir essa porta edesatar a gritar para que, até domingo, estejamos casados. E ainda que toda a suaonipotência o livrasse de ver-se obrigado a me desposar, você não teria como se safar

de um belo de um escândalo. — Deu-lhe as costas. — Feche o meu vestido. Não alcançoos colchetes.— Vou tomar isso como um indício de que você não pretende desatar a gritar. —

Aproximando-se, fechou as presilhas ao longo da parte posterior do traje azul e, aoterminar, depositou um beijo na nuca tão convidativa. Era evidente que fazer amorcom Josefina não surtira efeito; o desejo que tinha por ela estava mais vivo do quenunca em seu corpo.

Ouviu-a suspirar e, de pronto, sentiu sua masculinidade se contrair. Sem pensarem mais nada, rodeou-a para ir erguer o rosto dela e beijá-la. Josefina enroscou os

dedos em seus cabelos, pressionando o corpo esguio contra o seu. Fisicamente, apesardo tapa e outras bravatas, ela não estava à sua altura; já mental e emocionalmente, adiferença não era tão gritante. A princesa o questionava e o desafiava como ninguém jamais o fizera.

— Sem gritos — Josefina murmurou de encontro aos lábios dele — se você se juntar ao nosso grupo em Vauxhall depois de amanhã.

— Não. — Afastou-a de si. — Eu a desejo, sim. Só que, como já disse, você nãome inspira confiança. Até que se digne a esclarecer todas as dúvidas que tenho sobreCosta Habichuela, não vou endossar seus esforços para arrecadar recursos entre os

cidadãos deste país.— Você é um cavalheiro muito íntegro, não? Exceto quando se trata de deitar-

se com uma mulher só porque sente desejo por ela. Se me permite, acho tudo isso umahipocrisia, Melbourne. — Virando-se, foi até a penteadeira para se olhar no espelho.

Sebastian bufou. Por que raios esperava que a atrevida fosse se derreter, fosseabaixar a crista e se comportar com meiguice e recato só porque fizera amor com ela?

— É possível que eu vá a um outro lugar qualquer menos freqüentado, Josefina.Talvez. Não me rebaixarei a ser seu mico amestrado.

— Diga o bem entender, Sebastian, pois sempre consigo o que quero.

— É o que veremos, mas numa outra oportunidade. — Se houvesse outraoportunidade, já que algo lhe dizia que, quando tivesse todas as respostas que queria e

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesadecidisse quais medidas precisava tomar, a princesa Josefina não iria ter nenhummotivo para querer sua companhia novamente.

— Imagino que vá sair daqui pela janela, não? — Após se certificar de que tinha

as roupas e os cabelos em ordem, ela se encaminhou para a porta. — Cuidado para nãocair sobre as rosas. Meu pai não se cansa de dizer que o coronel Branbury cuidapessoalmente daquele canteiro.

— Grato pela consideração.— Mande um bilhete nos convidando para seu camarote em Vauxhall. Por certo

você tem um lugar melhor do que o de Harek.— Não, e não vou tornar a repetir.Josefina mostrou a língua para ele e, sem esperar pela resposta, deixou o

aposento e fechou a porta.

Ao chegar em casa, Sebastian entregou as rédeas de Merlin para Green e subiuos degraus à entrada da mansão. No vestíbulo, respondeu ao cumprimento de Stantoncom um grunhido e, apanhando a correspondência, seguiu pisando duro para seugabinete. Aquela petulante conseguira dar um nó em sua estratégia com espantosafacilidade. Também, quem lhe mandara perder o controle quando estava junto dela?

— Stanton!A porta do gabinete não demorou a se abrir.— Pois não, Vossa Graça?— Vou fazer uma pequena reunião em Vauxhall depois de amanhã, à noite —

afirmou com azedume. — Providencie os preparativos e tudo o mais, sim?— Certamente, Vossa Graça.Assim que a porta tornou a se fechar, ele recostou-se ao espaldar da poltrona

para examinar a pilha de cartas, bilhetes e cartões de visitas. O de sempre, mais orelatório semanal de Whitlock, o encarregado da administração da EstânciaMelbourne, e notícias de outras três de suas propriedades... Já prestes a pôr acorrespondência de lado, levou um susto ao pousar os olhos sobre o nome doremetente da carta que vinha de Eton e, com o coração acelerado, tratou então deromper o lacre de cera da mensagem.

Nem bem terminou de ler a missiva, Sebastian pôs-se em pé de um pulo.— Stanton!O mordomo reapareceu no vão da porta.— Sim, Vos...— Quando esta carta chegou?— Com o serviço postal, Vossa Graça, há cerca de... quarenta minutos. Algum

problema?— Não. Mande avisar a Charlemagne que ele e eu iremos a Eton dentro de uma

hora. — Até que enfim iria obter algumas respostas esclarecedoras a respeito do

reinado de Costa Habichuela.

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— Sei que já me disse que ficasse calado e o deixasse pensar — observouCharlemagne quando o coche se deteve e ambos saltaram para o chão —, mas é quevocê parece um tanto... preocupado com tudo isso.

Partindo em direção ao edifício onde ficavam os alojamentos dos professores,Sebastian olhou de relance para o ponto onde, ao sul, os contornos do Castelo deWindsor assomavam sobre eles.

— E por que não haveria de estar? — Após conferir o nome do edifício, avançoupelo pátio diante da edificação. — Ou esqueceu que entrou feito um vendaval na minhacasa esta manhã com aquela história de plágio?

— Mas não falei que deveríamos deixar Londres às pressas para vir atrás de umprofessor que certamente riria à toa se fosse convidado a ir visitar você na MansãoGriffin.

— Não quero que esse mestre seja visto em Londres por ora.— Por que não? — devolveu Charlemagne. — O que acha que esse Rice-Able podeestar sabendo?

Após lançar um olhar de esguelha ao irmão, Sebastian conferiu o número doapartamento.

— É o que vamos descobrir. — E bateu de leve à porta de carvalho.— Quem é?— Melbourne. Escrevi-lhe um bilhete, e você... — A porta se abriu com um

rangido.

— Vossa Graça. — O sujeito bem apanhado, dois ou três anos mais jovem do queele, mirou-o por cima dos óculos de leitura. — É uma honra. Eu não esperava que...— Eu sei. Podemos entrar?— Sim, é claro. — O mestre se afastou e Sebastian, depois de arquear um pouco

o pescoço para passar sob o batente bastante baixo, fez um aceno com a cabeça paradizer a Charlemagne que os acompanhasse.

Minúscula, a habitação se acharia mergulhada na penumbra não fosse pelo clarãodo fogo na pequena lareira e pelo par de velas de sebo sobre uma mesa em completadesordem.

Recolhendo os livros empilhados sobre uma cadeira, John Rice-Able foi largá-lossobre a cama estreita.

— Vocês receberam meu bilhete? — Cuidou de desocupar mais uma cadeira. —Fiquei surpreso ao saber que mais alguém, além dos meus alunos, tinha lido a minhahistória.

— Recebi sua mensagem, sim, professor. Esta tarde. E peço desculpas por nãoter mandado avisar que viríamos para cá. — Ao perceber que Shay continuava junto àporta, Sebastian tratou de apresentá-lo: — Esse é meu irmão, Charlemagne.

— Charlemagne? — O mestre tirou os óculos. — Como o grande rei que...

— Sim — confirmou ele com um sorriso, habituado ao estranhamento que seunome provocava. — Mas por que um explorador veio lecionar em Eton?

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— Os salários no magistério são mais compensadores. Agora me dedico àsexplorações nos intervalos entre os semestres letivos. — Deu um suspiro. — VossaGraça, milorde, sentem-se, por favor. Não faz nem cinco minutos que preparei um bule

de chá.— Obrigado. Uma xícara de chá não cairia nada mal. — Sebastian se acomodounuma das cadeiras recém desocupadas. Ciente de que a arte de fazer alianças e seutraquejo com os assuntos políticos e sociais o tinham ensinado a avaliar o caráter deuma pessoa num piscar de olhos, concluiu que gostava de John Rice-Able, um homemcuja naturalidade falava por mais de mil palavras.

— Se me permitem a curiosidade — o professor retirava xícaras e pires dofundo de um armário —, por que a urgência em virem me procurar?

— Gostaríamos de esclarecer algumas dúvidas geográficas — explicou

Sebastian. — Se não estou enganado, você conhece bastante bem a Costa dosMosquitos, não?— Tão bem quanto uma pessoa que não nasceu lá possa conhecer, imagino, porém

faz cerca de três anos que não coloco os pés naquela região.Três anos. Antes que o rei Mosquito outorgasse Costa Habichuela à Stephen

Embry, porém recentemente o bastante para uma opinião abalizada acerca datopografia e do clima.

— Imagino que tenha visitado algumas das cidadezinhas e vilarejos ao longo dacosta.

— De fato. — Depois de dispor numa bandeja pires e xícaras que nãocombinavam, Rice-Able cuidou de servir o chá do bule sobre as brasas na lareira. — Seme disser exatamente o que gostaria de saber, acho que posso lhe dar informaçõesmais precisas.

Tomando uma das xícaras da bandeja, Sebastian esperou que ele se sentasse àmesa para deixar bem claro:

— O problema é que não quero conduzir suas respostas nem quero que me diga oque supõe que eu gostaria de ouvir.

— Sei. — O professor tomou um gole da infusão. — Muito bem, faça as suas

perguntas; garanto que as minhas respostas serão francas e diretas e, no caso de euvir a fazer uma suposição, vou avisá-lo de que se trata de uma conjectura.

— Obrigado. Mas antes poderia me dizer se tem o hábito de ler os jornais deLondres?

— Só quando não há opção e, ainda assim, sob protestos. E já faz algumassemanas que não os leio, se era essa a próxima pergunta que pretendia me fazer.

— Acho que estamos nos entendendo. — Sebastian sorriu antes de levar axícara aos lábios. — Há quem exerça algum tipo de governo sobre a Costa do Mosquito,no geral?

— Uns poucos líderes tribais. A Espanha se refere a um sujeito chamadoQental, em particular, mas imagino que seja para simplificar. Trata-se de uma região

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesarelativamente grande, aberta, sinuosa. As fronteiras se modificam a cada novaestação chuvosa, época em que os pântanos transbordam e o curso dos rios sofrealterações.

— Há muitas áreas habitáveis?— Certamente. Os nativos conseguem levar uma vida com muitos percalços,alimentando-se de frutas, peixes e um ou outro porco selvagem.

— Há comércio por lá?— Praticamente nenhum. Além de desconfiarem dos estrangeiros, os grupos

nativos preferem evitar uns aos outros. Se eu não tivesse conseguido um guia quefalava vários dos dialetos locais, duvido de que estivesse vivo a uma hora desta,conversando aqui com vocês.

— Algumas dessas... tribos falam espanhol? Ou inglês?

— Embora a Espanha não tenha empregado grandes esforços para controlar aregião, algumas têm conhecimento superficial do espanhol.— E inglês?— Belize tem maioria inglesa, mas fica a várias centenas de quilômetros da

região da Costa dos Mosquitos. Não digo que não se possam encontrar uns poucos eminúsculos assentamentos de caçadores e mineiros, porém tais lugares são tudo menoshospitaleiros.

— Por que diz isso? — Ao se dar conta de que cerrava os punhos com tantaforça que começava a ficar com as mãos adormecidas, Sebastian pôs-se a flexionar os

dedos por sob o tampo da mesa.— Bem, agora vou expressar uma opinião, não um dado factual. — Rice-Ableemborcou quase meia xícara de chá. — Os ingleses são mestres em fundar lugares atodo custo parecidos com a Inglaterra. Enormes quantidades de água limpa e corrente,áreas descampadas, clima ameno... Enquanto a maioria das pessoas é capaz de seadaptar a quase todas as circunstâncias, parece que boa parte dos ingleses espera queas circunstâncias se adaptem a eles. Recusar-se a reconhecer que determinado lugar éúmido e infestado de insetos, no meu modo de ver, é a maneira mais rápida de adoecere, no limite, vir a morrer.

— Você se adaptou — observou Charlemagne.— Prefiro continuar vivo para contar minhas histórias a morrer por orgulho.

Quando os nativos recomendam cobrir a pele com seiva de plantas de odor fétido paraevitar picadas de insetos, eu cubro.

— Já ouviu falar de uma cidade chamada São Saturus naquela região?— São Saturus... Não. Na verdade, não me lembro de nenhum vilarejo grande o

bastante para ser chamado de cidade. Mas fiz alguns mapas que... — Levantou-se. —Vou pegá-los.

Enquanto o mestre ia remexer numa estante abarrotada de papéis, Sebastian

tomou outro gole do chá. No momento, tudo o que queria era um sinal, um mero indíciode que Josefina não havia mentido.

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— Ah, como sou desatento! — exclamou Rice-Able, o olhar pregado num dospergaminhos que acabara de desenrolar. — Aqui está... São Saturus.

Graças a Deus! 

— Por acaso fica no litoral, entre os rios Wawa e Grande de Matagalpa?— Essa área é muito extensa — o professor retomou seu assento —, mas, sim,fica por ali.

Sebastian e Charlemagne afastaram a bagunça para acomodar o mapa sobre otampo da mesa, depois usaram xícaras e pires como pesos para mantê-lo aberto. Muitomais rica em detalhes do que qualquer outro documento relativo àquela região queambos já tinham visto, a carta geográfica era excelente, digna de nota.

— Você devia ser cartógrafo — comentou Sebastian, correndo os olhos pelalinha litorânea à procura dos contornos descritos no livreto sobre Costa Habichuela.

— Denotar a fauna e a flora de cada área, assim como as variações do relevo,foi a melhor parte da expedição. — Rice-Able pousou um dedo sujo de tinta num pontodo mapa. — Aqui está São Saturus. Não sei como fui me esquecer de lá, afinal fiqueiimpressionado com aquele lugar.

— Por quê? — interpelou-o Sebastian, já contando em ouvir elogiosos relatossobre edifícios de pedras brancas e enseadas secretas.

— Por causa dos corpos. Três. Jaziam na mata como se fossem vivos; camisas,calças, botas, chapéus, tudo no seu devido lugar e, no entanto, dentro dos trajes nãohavia nada além de ossos brancos como neve. Suponho que os três infelizes tenham

perdido os sentidos devido à insolação ou por causa do gás dos pântanos, o que é maisprovável, antes de serem devorados pelas formigas. Foi lá que cheguei a ver asdanadinhas reduzirem um javali adulto ao esqueleto em vinte e quatro horas. É claroque se tratava de uma colônia bastante grande.

— O que faz pensar que os três homens mortos tinham alguma relação com umacidade chamada São Saturus?

— Os corpos se achavam perto de barracas e apetrechos de mineração, dentreos quais havia uma tábua com a inscrição “São Saturus” gravada a fogo na madeira.Este provavelmente é o único mapa onde consta essa localidade. — Tomou mais um gole

de chá. — Lembro-me de ter pensado na ironia de tal denominação, uma vez que SãoSaturus é o santo que deveria nos proteger da pobreza.

Com o coração e a cabeça latejando, Sebastian pôs-se em pé. Ela tinha dito quevira o palácio, que passara dois dias lá.

— Há algum outro vilarejo de dimensões medianas naquela região?— Não ao longo da costa. Aquela parte do território sofre inundações todos os

anos e, como pode ver aqui, São Saturus fica a mais ou menos dois quilômetros dolitoral.

— Você tinha razão, Seb — assinalou Charlemagne em voz baixa.

Mas ele não queria que fosse assim. Não agora. Não depois daquela manhã,quando tivera Josefina nua em seus braços.

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— Professor, estaria disposto a ir Londres e narrar tudo o que nos contou sepreciso for?

— Sim, é claro. Mas do que exatamente estamos falando?

— De uma mentira. Uma grande mentira.Josefina disparou escada abaixo enquanto o par de carruagens enlameadas se

detinha diante da mansão. Seus pais não poderiam ter chegado em melhor hora.A mãe dela foi a primeira a entrar em casa e, ao vê-la, abriu um sorriso largo.— Josefina, mi vida! — E estendeu os braços para a filha.— Seja bem-vinda, mamãe. — Era tão bom sentir-se tomada num abraço que

nada lhe cobrava em troca. Ainda lhe custava crer em tudo o que havia acontecidonaqueles últimos dez dias. — Senti muito a sua falta.

— Também sentimos saudade, Josefina — anunciou Stephen, indo abraçar asduas ao mesmo tempo. — Você nem imagina os progressos que fizemos. Mais cinqüentamil libras para Costa Habichuela!

— Que maravilha! Recebeu a minha carta? — indagou Josefina enquanto a rainhaia conferir as arcas que eram descarregadas da segunda carruagem.

— Recebi, sim, e a congratulo pelo excelente trabalho. Quando deixamosEdimburgo, os títulos estavam ainda mais disputados do que por aqui. Os escocesessabem farejar um bom investimento. — Após pedir a uma criada que providenciassecafé recém-passado, seguiu para o gabinete.

Atrás dele, Josefina se odiava por ter de estragar a alegria que ele irradiava.Mas seu pai precisava saber que Melbourne havia descoberto as origens do livreto.— Já cuidei para que meia dúzia de navios fique à nossa disposição em

Edimburgo — prosseguiu o rey, acomodando-se à escrivaninha. — As embarcaçõesestarão abastecidas de provisões e prontas para zarpar daqui a um mês.

— Meia dúzia de navios? Mas para que...— Os colonos vão precisar de mantimentos quando chegarem. — Tirando um

charuto do bolso do casaco, acendeu-o na chama da lamparina sobre a mesa. — Queroconhecer o duque de Harek. Já mandou chamá-lo?

— Ele deve chegar dentro de uma hora. — Com uma sensação desagradável, foise sentar na poltrona em frente à do pai. — Que colonos?

— Na sua carta você dizia que as pessoas estavam praticamente implorandopara emigrar para Costa Habichuela, e o mesmo se passa na Escócia. Tanto é assim queaté já mandei Halloway imprimir alguns contratos de venda de terras. Afinal, com maisde quatro mil quilômetros quadrados de solo fértil, por que não darmos aos ingleses aoportunidade de possuírem um bom lote, a um xelim por metro quadrado? Em caráterperpétuo, exatamente como os nobres daqui.

— Como? Mas...

— E como os navios já estão fretados, poderemos oferecer passagens a umpreço razoável, com um pequeno adicional por quilo da bagagem. — Franziu o cenho,

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesapensativo. — Vou mandar Orrin preparar uma lista de despesas individuais para anexaraos contratos de aquisição de terreno. Ah, e estamos vendendo lotes de quatrocentosmetros quadrados, caso alguém perguntar. Agora, se houver muita procura, nosso

cartório de registro de imóveis poderá dividir o valor do terreno em dez prestações.Com a impressão de que estava a ponto de ter uma vertigem, Josefina indagou:— Que cartório de registro de imóveis?— Abri um em Edimburgo; o que vai funcionar aqui abrirá amanhã. Orrin alugou o

escritório de um advogado para cuidar disso enquanto estivemos lá no norte. — Enfimencarou a filha. — Por que essa expressão preocupada?

— Papai... há assuntos de que não devemos falar, nem mesmo em particular,mas...

— Então não fale. Também estou elaborando uma lista de profissionais de que

precisamos urgentemente para tocar o governo e um distrito municipal em rápidaexpansão: banqueiros, ferreiros, médicos, procuradores, cartógrafos, professores... —Empurrou uma folha de papel para ela. — Você entende disso melhor do que eu. Vejase consegue terminá-la o quanto antes, assim mandaremos publicá-la no London Times e no cartório de registros.

Josefina olhou do longo rol de ofícios para o pai.— Se isso tudo é uma brincadeira, não estou achando a menor graça.— É óbvio que não se trata de uma brincadeira. — Após dar uma baforada no

charuto, ele inclinou-se sobre a escrivaninha. — Ou acha que seria justo virmos pedir

dinheiro e depois nos recusar a permitir que os interessados juntem-se a nós em nossorenovado paraíso?Ela engoliu em seco antes de lembrá-lo:— Colonos não estavam nos planos.— Agora estão. Vá colocar sua tiara antes que Harek chegue; somos membros

da realeza e temos de nos portar como tais em todas as ocasiões. — Levantando-se,Stephen Embry apoiou as mãos no tampo da mesa. — Em todas as ocasiões.

— Sem dúvida, Vossa Majestade. — Josefina ergueu-se e deixou a sala com umamesura.

O mal-estar se fora, porém havia deixado um nó na garganta. Por que jamaispensara naquela possibilidade? Era evidente que, ao se inteirarem da existência de umlugar paradisíaco, inúmeras pessoas iriam querer conhecê-lo ou mesmo morar lá. Assimcomo era óbvio que ninguém poderia impedi-los de tomar tal atitude.

Em seu quarto, apanhou a tiara do estojo em que Conchita costumava guardá-lae foi se sentar à penteadeira. Mas nem bem a levou acima da cabeça, a porta doaposento se abriu.

— Deixe-me ajudá-la. — Tornando a fechar a porta, a mãe dela se aproximoupara tomar o ornato das mãos de Josefina.

— Papai lhe contou que abriu um cartório de registro de imóveis na Escócia eque vai abrir outro aqui amanhã?

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— Contou, sim. — Com muito cuidado, Maria Constanza-y-Veneza Embry ajeitoua tiara sobre os cabelos da filha e, com o pente de marfim, alisou as longas melenasnegras.

— E você não fez nada para demovê-lo dessa insensatez?— E ele me daria ouvidos? Você sabe como seu pai é.— Mas ele quer enviar uma multidão para Costa Habichuela.— Com vários tipos de suprimentos. Mesmo que São Saturus não seja o que eles

imaginavam, esses ingleses terão como transformá-la numa linda cidade.— Dinheiro é uma coisa, mas por que brincar com a sorte? — Josefina, que

falava a meia-voz, concluiu num sussurro: — Nunca estivemos em Costa Habichuela,mamãe.

— Você e seu pai têm trabalhado sem parar nesse projeto nos últimos dois anos.

Confie nele, assim como ele confia em você. Se seu pai diz que tudo dará certo, éporque dará. — Beijou o rosto da filha. — Agora me fale do duque de Harek. Ele ébonito como lorde Melbourne?

— É bastante bem-apanhado.Nenhum outro homem que conhecia era bonito como Melbourne. Mas no

momento o que a preocupava era o fato de ainda não ter conseguido dizer a ninguémque Sebastian Griffin estava ciente de que o livreto era uma fraude e suspeitava deque outros engodos estivessem a caminho.

Sentindo-se meio grogue, Sebastian se sentou e, ao mirar o relógio sobre a

moldura da lareira em seu quarto, demorou alguns instantes a assimilar o horárioregistrado pelo dispositivo. Cinco e vinte e um? Não era possível. Se tinha ido deitar-se depois das três e ainda levara um bom tempinho para pegar no sono... A menos quepassasse das cinco da tarde.

— Bailey!A porta se abriu, e o camareiro entrou aos tropeços no aposento.— Pois não, Vossa Graça.— Por que raios não me acordou? — Empurrando as cobertas para longe, saltou

da cama.

— Lorde Charlemagne, disse-me que o deixasse dormir. — Bailey correu até oguarda-roupa, de onde retornou com uma camisa e um par de calças.

— Esta casa é minha, não de Shay. — Bateram de leve à porta.— Está vestido, papai?Sebastian terminou de abotoar as calças antes de vestir a camisa pela cabeça.— Pode entrar, Peep.Num alegre vestido amarelo de seda, a garotinha entrou saltitando no aposento.— Dormiu bem?— Até demais — respondeu ele antes de tornar a olhar feio para o camareiro. —

E você, o que andou fazendo, meu anjo?

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— Estudei francês, mas não fiz aula de piano porque você estava dormindo, e asra. Beacham me levou até o parque, e Stanton me perguntou se eu sabia o cardápio do jantar já que você estava dormindo, mas eu não sabia, então disse a ele que gostaria

de sopa fria de ervilha e fricassê de coelho, porque gosto muito desses pratos e tioZachary também.— Tio Zachary gosta até de guisado de pedra — comentou Sebastian, deixando

que Bailey o ajudasse com o colete e a gravata. — Ele vai jantar conosco?— Todo mundo vai. Esqueceu? Você disse que era porque a família de tia

Caroline está aqui e, se os recebesse para um jantar, talvez eles o deixassem em paz.— Não é para você repetir isso diante de ninguém, Peep.— Eu sei. Pode confiar em mim — afirmou Penélope com convicção. — Vou ver se

a cozinheira fez algum doce com chocolate para a sobremesa.

— Ótima idéia. — Sentou-se ao toucador para fazer a barba. — Você me faria ofavor de pedir a Stanton que venha até aqui?— Claro.Enquanto Bailey preparava a tigela com a espuma, Sebastian pegou-se pensando

que dormir demais o tinha privado de uma boa oportunidade para confrontar Josefinae verificar o que ela andava tramando.

Após bater de leve na porta, Stanton entrou no aposento.— Vossa Graça?— Mande selar Merlin. Vou sair assim que tiver feito a barba.

— Seus convidados decerto não irão se atrasar.— Não me demorarei.O mordomo fez uma mesura, voltando a fechar a porta ao sair do quarto.Tão logo terminou de se barbear, Sebastian, ignorando a fome, desceu para o

hall e avisou ao mordomo:— Vou até a casa do coronel Branbury. Peça a Shay para entreter os convidados

caso eles cheguem antes de mim.— Pois não, Vossa Graça.Vinte minutos depois ele entregava as rédeas de Merlin ao cavalariço postado à

entrada da mansão do coronel.— Deixe-o aqui. Não vou me demorar.Assim que ele terminou de subir os degraus diante do casarão, a porta se abriu.— Boa tarde, Vossa Graça — cumprimentou o mordomo.— Eu gostaria de trocar algumas palavras com a princesa Josefina — anunciou

Sebastian sem mais formalidades enquanto tirava as luvas.— Sua Alteza saiu. Se quiser deixar seu cartão, irei avisá-la da sua visita

quando ela voltar.— O rey e a rainha Maria regressaram da Escócia?

— Chegaram esta manhã, Vossa Graça, porém foram todos fazer um lanche nacompanhia de Sua Graça, o duque de Harek.

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— Onde posso encontrá-los?— Não sei informar.— E aonde eles irão após esse lanche?

— Não estou autorizado a falar dos compromissos da família real, Vossa Graça.Sebastian olhou bem para o mordomo. Poderia agarrar aquele insolente pelocolarinho e conseguir todas as informações que bem entendesse num piscar de olhos,no entanto as conseqüências desse arroubo por certo seriam mais danosas do que obom uso que talvez fosse fazer com as informações.

— Muito bem — condescendeu —, diga a Sua Alteza que estive aqui e queconversarei com ela amanhã à noite, em Vauxhall. — Sem mais, deu meia-volta e para irse acomodar à garupa de Merlin, afinal precisava de provas antes de cometer algumgesto extremado.

Provas. Provas de quê? De que um país supostamente rico e fértil não passavade um charco? De que Costa Habichuela inteirinha provavelmente não valia as cem millibras do maldito empréstimo? Perto dos delitos que havia pelo mundo, o logro poderiaparecer uma ousadia até modesta, entretanto era preciso levar em conta o semnúmero de ingleses que compravam títulos dessa dívida pública. Um investimento quetinham por seguro, e que ele ajudara a promover, mas que certamente iria fazê-losperderem todo o dinheiro que haviam colocado no negócio.

Perdido em suas divagações, Sebastian quase levou um susto ao chegar em casae deparar com a claridade que se despejava de todas as janelas, com a profusão de

coches e cavalos espalhados pelo acesso para veículos e pelo espaço diante dacocheira, e com o modo como seus cavalariços gritavam uns com os outros na tentativade colocar um pouco de ordem no caos. Suspirando, desmontou e arremessou as rédeaspara Green. E pensar que o que mais queria naquela noite era um pouco de paz e umagarrafa de conhaque...

— Vossa Graça — um dos criados abria a porta para ele —, seus convidados oaguardam na sala de visitas.

— Obrigado, Tom. Retome o que estava fazendo, sim? — Valentine foi aoencontro dele no hall.

— Até que enfim você chegou... Diabos.— Que foi? Não está contente por me ver?— Sinceramente, não. Se você está aqui, não tenho como escapulir para ir

procurá-lo.Antes que pudesse responder, Sebastian, sentindo uma mão pousar em seu

ombro, virou-se e encontrou uma sorridente Eleanor.Por todos os santos... Não bastasse sua numerosa família, Caroline tinha seis

irmãs mais novas do que ela; três eram casadas e uma, salvo engano, estava noiva. Oque significava que havia pelo menos uma dúzia de membros do clã Witfeld na sua sala

de visitas. Isso sem contar os frutos dos mais recentes matrimônios. Mas já que não

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesatinha como evitá-los, iria aproveitar o alvoroço que faziam para se distrair e tentarnão pensar onde Josefina teria se metido naquela noite.

— ... para almoçar amanhã — Eleanor ia dizendo. — Acho que ela irá gostar, já

que está sempre falando em tornar-se pirata e viajar pelo mundo.Sua irmã só podia estar falando de Penélope.— Claro — concordou ele. — Vou passar boa parte do dia no Parlamento.Eleanor o fitou por um instante antes de afirmar:— Eu sabia que você tinha bom coração.Sim, tinha. E no que dizia respeito à princesa Josefina, precisava deixar de ter.

O mais depressa possível.

No alto dos degraus à entrada da Residência Branbury, Josefina acenou para

Harek até a carruagem desaparecer na noite, então exalou profundo suspiro. Por maisagradável que tivesse sido o passeio, não via a hora de trancar-se em seu quarto parapoder refletir com a calma de que necessitava.

Ao se virar, viu que seu pai continuava no hall do casarão.— Acho que Melbourne nos fez um favor ao demitir-se do cargo para o qual o

príncipe regente o indicara — comentou o rey, entregando a Grimm as luvas queacabara de tirar. — Charles é muito agradável.

— É, sim.— E quer se casar com você.

Ela estacou a meio caminho da escadaria.— Ainda não dei uma resposta em definitivo — prosseguiu Stephen —, afinal decontas o conheci esta manhã e preciso escolher o momento oportuno para expressarformalmente o meu consentimento.

— Pensei que fosse me perguntar se gosto dele.— Eu e sua mãe já tivemos essa conversa, e ela me disse que você gosta. O mais

importante, agora, é que ele compreenda perfeitamente bem nossos objetivos.— Acho que você é capaz de convencer qualquer pessoa de qualquer coisa. — Ou 

melhor, quase qualquer pessoa. — Boa noite, papai; estou muito cansada.

— Sim, vá se deitar. — O rey sorriu. — Nossos amigos vão querer vê-la radianteamanhã.

Depois que Conchita a ajudou com o traje de dormir e se foi, Josefinapermaneceu um longo espaço de tempo sentada na beirada da cama, até ter certeza deque toda a casa mergulhara no mais absoluto silêncio, então tornou a acender a velasobre a mesinha de cabeceira. A brochura que havia escrito se achava em cima daescrivaninha; o outro livro, o que emprestara naquela manhã da biblioteca de lordeAllendale, estava nos fundos do seu guarda-roupa, atrás de uma pilha de chapeleiras.

Entre as poucas pessoas que tinham visto Costa Habichuela, como seu pai e os

militares que o acompanhavam, estava John Rice-Able, autor do livro que ela viraMelbourne folhear na biblioteca do visconde; portanto, era bem provável que Rice-

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaAble tivesse respostas para certas dúvidas que só recentemente tinham começado aincomodá-la. Com o cuidado de não fazer nenhum barulho, resgatou a obra dopesquisador do esconderijo e, sentando-se à escrivaninha, abriu-a no capítulo dedicado

à América Central.Uma hora depois, da vela restava apenas um toco e ela havia lido o extensocapítulo duas vezes de cabo a rabo. Cansada, recostou-se ao espaldar da poltrona paraesfregar os olhos. Nunca acreditara que seu pai tivesse recebido um verdadeiroparaíso de mão beijada, no entanto a descrição que Rice-Able fazia de CostaHabichuela era um retrato do inferno na Terra.

Murmurando para si que aquela obra talvez fosse uma grande mentira, devolveu-aao esconderijo no fundo do armário. O fato de nunca ter colocado os pés em CostaHabichuela não significava que tudo o que havia escrito não correspondesse à verdade.

As cartas de seu pai enfatizavam o que ele queria que constasse da brochura,logicamente, e fora isso o que bastara para que conseguissem o empréstimo. Por outrolado... Talvez tivesse feito seu trabalho bem demais, e o resultado era que aquelahistória toda deixara de ser uma simples tramóia junto a um banco, uma vez que ou seupai estava vendendo lotes de terras que poderiam vir a serem muito lucrativos ouludibriava as pessoas sem dó nem piedade, levando-as a comprarem a própria sepultura.

O que deveria fazer? Contar tudo às autoridades? A Sebastian? Atirar-se noTâmisa? Ou manter a boca fechada e não fazer nada, que era a atitude mais simples emais segura entre todas as opções? Mas, e se o pior acontecesse? Sua família, ela

inclusive, poderia ser presa ou mesmo deportada. Poderiam ser todos executados.Precisava falar com alguém. Precisava contar a seu pai a respeito de Sebastian.Quem sabe ele pudesse lhe garantir que Costa Habichuela era mesmo um paraíso e porisso não tinham o que temer. Ou talvez ele tivesse um plano para poupá-los... Pena eranão existir nenhum plano capaz de poupar seu coração.

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Capítulo IV Capítulo IV 

— Bom dia. — Forçando-se a sorrir, Josefina foi até o aparador onde ficavam astravessas com o desjejum, embora só de olhar para todos aqueles pratos já sentisse oestômago se retorcer.

Tanto o rei quanto a rainha retribuíram o cumprimento com um bom humor que afilha estava longe de partilhar.

Após esperar que Grimm afastasse a cadeira, ela sentou-se e agradeceu aomordomo com um aceno da cabeça antes de pedir:— Por favor, deixe-nos a sós, sim?— Certamente, Vossa Alteza. — Grimm estalou os dedos, esperou que outros

dois criados deixassem a sala e partiu atrás deles, fechando a porta ao sair.— Por que isso? — Embry a interpelou. — Charles estará aqui dentro de uma

hora; temos um compromisso muito importante esta manhã.— Eu sei. — Josefina respirou fundo. — Estou incomodada com este novo passo

que estamos dando. Acho que precisamos discuti-lo.

O rei ergueu uma sobrancelha, e ela resolveu ir direto ao ponto:— Para onde irá mandar aqueles colonos?— Está fazendo troça?— De modo algum. Eu gostaria de saber quais são seus planos.— Não permitirei que me interrogue. — Stephen largou os talheres sobre o

prato. — Este projeto tem sido nossa única preocupação nos últimos dois anos; por queresolveu questioná-lo justamente agora?

— Porque acho que deixou de fora alguns detalhes muito importantes. Penseique seus objetivos fossem levantar um vultoso empréstimo bancário e talvez me casar

com um nobre. Se esse era o plano original, por que alterá-lo?— Você imaginava que iríamos conseguir cento e cinqüenta mil libras umaquinzena após chegar a Londres? E ainda temos a chance de duplicar essa soma.Triplicá-la, talvez. Jamais teremos de nos preocupar com dinheiro novamente.Teremos meios para viver como membros da realeza pelo resto da vida. — Riu. — Oque estou dizendo? Somos membros da realeza.

— Até agora — retrucou ela —, estamos só lesando bancos, que terão dedevolver aqueles recursos dos títulos para os investidores senão quiserem enfrentarrevoltas ou qualquer outro tipo de distúrbios; as pessoas não perderão nada ou, no

melhor dos casos, perderão a ingenuidade. Mas tudo mudará a partir do momento quecomeçarmos a vender terras. As pessoas estarão comprando um sonho, uma esperançano futuro. O que elas irão encontrar quando chegarem a Costa Habichuela?

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— Um paraíso.— O que há de verdade nisso?— Sua obrigação não é me interpelar, Josefina. Você vai fazer sua parte com

um sorriso no rosto porque, se não fizer, nossa sorte pode virar. Compreendeu?— Sim. Só me diga se haverá transtornos quando os navios e os colonoschegarem à Costa Habichuela.

— Suponho que sim. Mas estaremos muito longe da Inglaterra quando issoacontecer. — Inclinando-se sobre a mesa, segurou na mão dela. — Josefina, esta é aúltima vez que tocaremos neste assunto. — E a soltou.

Oh, Deus. Ela estava certa. Melbourne tinha razão e, quando se inteirasse davenda dos terrenos... Era melhor nem pensar.

— Só mais uma coisa, pai.

— Seja breve. Não podemos levantar suspeitas entre a criadagem.— Eu sei, mas é que Melbourne tem feito perguntas contundentes sobre ascondições da natureza em Costa Habichuela. Tenho a impressão de que ele nãoacreditou nos dados da brochura. Ou melhor, tenho certeza. Ele descobriu quetiramos aquelas informações de outros livros.

Stephen Embry se levantou.— Você contou isso a ele?— Não! É claro que não. Mas nem imagino o que Melbourne fará quando souber

que estamos... incentivando as pessoas a se mudarem para lá.

— Maldição. — Mordendo o bigode, o rei pôs a andar de um lado para outro. —Eu nunca devia ter sugerido o nome dele como nosso intermediário. Levei em conta asvantagens de ter o nome Griffin vinculado ao nosso, no entanto não me passou pelacabeça que aquele arrogante metido a santo fosse investigar nossos negócios. A culpafoi minha.

— Talvez fosse melhor cancelarmos o compromisso em Vauxhall.— Provavelmente seria pior — retrucou o pai dela. — Não, cumpriremos

combinado, e eu cuidarei desse assunto.— Como?

— Não se preocupe com isso. Apenas trate de evitá-lo até esta noite.— Vou almoçar com a irmã, as cunhadas e a filha dele.— Melbourne confia nelas?— Imagino que sim— Então vá a esse almoço. Encontrarei você e sua mãe no hall dentro de

quarenta minutos. Preciso falar com o capitão Milton; um homem como Melboume deveter inimigos. Inúmeros.

— Obrigado por me receber, almirante. — Sebastian estendeu a mão para o

oficial uniformizado que se levantara atrás da ampla escrivaninha de mogno.

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— É um prazer, Vossa Graça. — O almirante Mattingly tinha um aperto de mãoforte e seguro, assim como sua reputação. — Em que posso ajudá-lo?

— Sei que pode soar estranho, mas estou procurando alguém que porventura

tenha navegado ao longo da costa leste da América Central. Ofereceram-me umcarregamento de madeira, e eu gostaria de ouvir uma opinião abalizada antes defechar negócio.

— A maior parte da nossa frota está no Mediterrâneo ou no litoral da Espanhano momento, mas... — Mattingly esfregou o queixo, depois tirou um pedaço de papel deuma gaveta e ali rabiscou alguma coisa. — Tenente Calder!

O rapaz que acompanhara Sebastian até o gabinete do almirante abriu a porta,entrou na sala e bateu os calcanhares na saudação militar.

— Pois não, senhor.

— Leve isto ao Endeavor e entregue ao capitão Jerrod.— Pois não, senhor. — O tenente apanhou o recado, fez uma continência e se foi.— É um bom rapaz, muito eficiente, só que não consegue pôr os pés num navio

sem colocar tudo o que tem no estômago para fora — comentou o almirante. — Tomeuma xícara de chá, Vossa Graça. Teremos uma resposta dentro de uns vinte minutos.

— Obrigado, almirante.— Jerrod zarpa amanhã; talvez ele não tenha como ajudá-lo, mas não custa nada

arriscar. A Inglaterra precisa de madeira.Sebastian sorriu. Se conseguisse encontrar alguém que conhecia a região da

Costa dos Mosquitos e se essa pessoa corroborasse ou não as histórias de Rice-Able, oresultado poderia ter impacto por toda a nação.Menos de vinte minutos depois o tenente Calder retornava ao gabinete para

anunciar:— Almirante, o capitão Jerrod manda dizer que infelizmente não tem como

ajudá-lo, mas colocou um dos tenentes dele à sua disposição.— Então peça a ele que entre, Calder.— Pois não, senhor. — O rapaz tornou a sair.Pouco depois surgia no vão da porta um jovem alto, com cabelos pretos e alegres

olhos verdes.— Tenente Bradshaw Carroway ao seu dispor, almirante. — Com isso, fez uma

continência e se aproximou.— Carroway, este é Sua Graça, o duque de Melbourne. Ajude-o da melhor

maneira que puder.Levantando-se, Sebastian perguntou:— Poderíamos dar uma volta?O tenente anuiu com um aceno de cabeça, e os dois deixaram o aposento e em

seguida o edifício, rumando para perto dos canhões alinhados no porto. Após se

desculpar pelo incômodo, Sebastian afirmou:— O almirante Mattingly comentou que seu navio zarpa amanhã.

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— Não foi incômodo algum; eu estava contando sacas de laranja, Vossa Graça,portanto só tenho a agradecer. — O jovem que parecia recém saído da adolescênciasorriu. — Mas em que posso ajudá-lo, Vossa Graça? O capitão Jerrod mencionou uma

questão atinente à América do Sul.— América Central, na verdade. Costa dos Mosquitos. Você conhece?— Estive no Triumph no ano passado; perseguimos uma fragata americana por

toda a costa da região durante dois meses antes que a embarcação declarasse o fimdas hostilidades.

Ano passado. Sebastian tentou dissimular a súbita onda de euforia.— Por acaso ouviu falar do rei Qental quando esteve por lá?— Um espertalhão. Ele nos vendeu os serviços de dois guias que iriam nos

orientar ao longo da costa, e os camaradas quase nos fizeram encalhar num banco de

areia três dias depois.— Aquela região é habitável?— Em determinados lugares. Quanto mais alto o terreno, maior é a

probabilidade de que permaneça intacto na próxima estação chuvosa. Só que hápouquíssimas áreas com terrenos elevados ao longo do litoral.

— Você conhece um lugar chamado São Saturus?— Não. Há uns poucos acampamentos de garimpeiros e caçadores; talvez um

deles tenha recebido esse nome, mas, sinceramente, não me recordo.— O nome Stephen Embry lhe soa familiar?

— Embry... Um sujeito alto, com farto bigode loiro?— Isso mesmo.Deus seja louvado.— Como o conheceu?— Rebocamos um grupo de ingleses de lá para a Jamaica a pedido do governador

de Belize. Soldados a soldo dos rebeldes espanhóis, na maioria; outros estavamdesistindo do posto para ir morar na Jamaica. Lembro-me bem de Embry porque ele sedizia coronel do Exército Nacional,  amigo íntimo de Bolívar; a julgar pelas históriasque contava, estava liderando a rebelião sozinho, e todos que o acompanhavam usavam

um uniforme preto de doer na vista com cruzes verdes no peito. Lembro-me de terpensado que eles deviam ter assado de calor dentro daqueles trajes de lã em plenaselva... Se bem que na Costa dos Mosquitos quase não houve ação contra os soldadosde linha espanhóis.

— Tenente, você repetiria tudo isso perante um tribunal de justiça?— São apenas pontos de vista, mas repetiria, sim; não vejo que mal há em dizer

o que penso. Só que...— Sim, você vai zarpar no Endeavor amanhã. Droga.— Posso fazer uma declaração por escrito, se isso ajudar.

— Ajudaria muito. Obrigado. — Era exatamente o que ele queria. E precisava.Mesmo assim, não pôde deixar de pensar que seria o mais feliz dos homens se o rapaz

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesativesse se hospedado em suntuosos aposentos no magnífico palácio do rey de CostaHabichuela. — Uma última pergunta: você conhece algum país naquela área chamadoCosta Habichuela?

— Costa Habichuela? Não. Se tivéssemos ouvido falar desse lugar, aportaríamospor lá para reabastecer nossos estoques de provisões em vez de ter de navegar atéBelize.

— Obrigado pelas informações, tenente Carroway.

O mundaréu de gente ao redor do acanhado edifício, denominado às pressasCartório de Registro de Terras de Costa Habichuela, ergueu-se em vivas quandoJosefina e seus pais desceram da carruagem.

— Magnífico, não? — comentou o rei, acenando. — Olá, amigos; sejam bem-

vindos!— Como essas pessoas ficaram sabendo do cartório? — indagou Josefina numsussurro, tocando o braço do pai.

— Assim que cheguei, pedi aos jornais que publicassem anúncios — respondeuele enquanto partia atrás do capitão Milton, que abria caminho rumo às portas aindafechadas do prédio. — Ah, sr. Halloway, sr. Orrin. Vamos abrir ao público, sim? —Virou-se para a multidão. — Obrigado a todos pelo apoio e entusiasmo. Quero ser oprimeiro a lhes dar as boas-vindas como novos cidadãos de Costa Habichuela!

O povaréu aclamou estrepitosamente. Uma quantidade imensa de pessoas, a

maioria vinda dos estratos menos favorecidos da sociedade: funcionários públicos elavradores, adeleiros, criados, varredores de rua, mineiros, padeiros; queriam umanova vida no paraíso e despenderiam cada pêni que haviam poupado para obtê-la.Josefina baixou a cabeça. Em um mês, se tanto, todos estariam odiando CostaHabichuela e qualquer pessoa que tivesse alguma relação com aquele lugar. Iriam odiá-la. E ela bem que mereceria.

O duque de Harek se aproximou.— Vá para junto do rei, Vossa Majestade — sugeriu à rainha Maria com um

sorriso. — Cuidarei para que a nossa princesa não seja carregada daqui nos ombros

agradecidos da multidão.Ao ver que sua mãe já ia se afastando, Josefina observou em voz baixa:— Para que ser tão melodramático?— Ora, eles a adoram. Eu a adoro.— É mesmo? — Encarou-o, desejando que ele fosse Melbourne.— Sim. Tanto que já conversei com Sua Majestade e, apesar de não haver nada

formalizado, quero que saiba que pretendo pedi-la em casamento. — Os olhos verde-claros avaliaram a expressão dela. — Meu único medo é que você recuse a minhaoferta na esperança de receber uma proposta equivalente do duque de Melbourne.

— Melbourne? Não suporto aquele homem.

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— Não precisa fingir, Vossa Alteza. Não há termo de comparação para a fortunae o poder de Sebastian Griffin, porém todos sabemos que ele não se casará se comisso tiver de deixar a Inglaterra... Claro, se porventura Melbourne resolver se casar

novamente.— Você é perito em assuntos que dizem respeito a ele, não?— De certo modo, sim. — Harek baixara ainda mais o tom de voz. — Por

exemplo: estou sabendo que vocês dois foram para a cama.— Como? — A cor se foi do rosto dela. — O que...— Não me importo. Sinceramente. Criar uma criança com sangue Griffin, ainda

mais se ela se parecesse bastante com o pai, iria nos trazer muitas vantagens. Emtermos de benefícios financeiros, para ser mais claro. Portanto, não se sinta inibida.

Por um instante, Josefina se recusou a acreditar no que acabara de ouvir.

— Eu... Não sei do que está falando. E mesmo que soubesse, não...— Não sou nenhum monstro, Vossa Alteza. Não disse o que disse no intuito deofendê-la ou ameaçá-la. Aprecio a sua companhia e acho que faríamos um belo casal.Fazem-se muitos casamentos unicamente por motivos políticos ou financeiros... O quenão seria nosso caso, já que gostamos um do outro. De qualquer modo, enquantoestivermos em Londres, sinta-se à vontade para incentivar Melbourne, por favor. Nãovejo no que isso poderia nos prejudicar.

Tentando organizar os pensamentos, Josefina limpou a garganta.— Bem, devo admitir que agora você realmente me surpreendeu.

— Você é princesa e eu sou duque. — Inclinou a cabeça. — Estamos acima damaioria das bobagens com que as pessoas se preocupam.Antes que ela pudesse retrucar, o tenente May foi abordá-los, curvando-se com

a mão sobre o peito:— Vossa Alteza, Sua Majestade pede que vá para junto dele e da rainha.— Obrigada, tenente.Então era essa a vida que esperava por ela... Com efeito, o duque de Harek era

um par bem mais conveniente do que Melbourne, uma vez que não fazia perguntas eparecia disposto a guardar para si o que sabia. Só que havia um lado seu que era

simplesmente Josefina Embry, sem intrigas nem complicações, que não desejava ummarido que fosse indiferente ao fato de ela ter casos com outros homens ou porquenão se importava com isso ou porque poderia se beneficiar da situação.

— Você realmente conhece piratas?— Bem — Josefina sorriu para a filha de Melbourne, que passava manteiga numa

grossa fatia de pão —, havia um sujeito que usava tapa-olho e vivia com um papagaio noombro. Tenho quase certeza de que se tratava de um pirata.

— Como ele se chamava? — indagou a garotinha, os olhos arregalados. — Fiz uma

lista com o nome de vários piratas famosos.— Ele dizia chamar-se Ned Terrível.

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— Oh, desse eu nunca ouvi falar... Ele tinha os dois braços e as duas pernas?— Peep — Eleanor escondia o sorriso atrás do guardanapo —, deixe a princesa

Josefina comer, sim? Ou vai querer que ela morra de fome?

— Deixe-a à vontade, por favor — interveio Josefina. — A bem da verdade, émuito bom falar de outro assunto que não Costa Habichuela.Penélope se ajeitou melhor na cadeira do restaurante ao ar livre onde elas se

achavam, depois se debruçou sobre o braço direito de Josefina, a quem confidenciouantes de dar uma mordida no pão:

— Que bom que pudemos almoçar juntas hoje. Gosto muito de você, princesa.Céus.Um gesto tão singelo, mas que tanto significava: crédito, confiança... Era de

enternecer o coração.

— Eu também gosto muito de você, lady Penélope.E me chame de Josefina, por favor.— Então me trate por Peep. Será que se importaria de descrever Ned Terrível

em detalhes para que eu possa fazer um desenho dele?— De modo algum, Peep. Farei tudo o que estiver ao meu alcance para ajudá-la

com a sua pesquisa.Por um instante Josefina permitiu-se pensar que ela e a encantadora garotinha

poderiam ser grandes amigas, mas então se lembrou do compromisso em Vauxhallnaquela noite. A culpa seria sua se algo acontecesse a Sebastian. Peep iria odiá-la... e

ela iria odiar a si própria. Cinco horas. Tinha cinco horas para pensar em algo quepudesse proteger o duque de Melbourne, ela e Peep de um mal maior.

— Onde diabos você se meteu?Tirando o olhar do espelho, Sebastian foi pousá-lo sobre Charlemagne e

Valentine, que entravam como dois furacões nos seus aposentos.— Estive cuidando de negócios. — Levantou-se, e o camareiro ajudou-o a colocar

o colete cinza-chumbo. — Obrigado, Bailey. Terminarei de me vestir sozinho.Após fazer uma mesura, o criado deixou o quarto e fechou a porta.

— Na verdade, fui até Dover — prosseguiu Sebastian. — Achei que...— Dover? Sem avisar a ninguém?— Faz tempo que não preciso dos cuidados de uma ama-seca, Shay. Agora, se me

deixar terminar, fui procurar o almirante Mattingly, pois achei que ele poderia meindicar alguém que tivesse navegado pela Costa dos Mosquitos.

— O que Rice-Able nos contou já não era o bastante?— Eu queria ouvir a opinião de outra pessoa.— E conseguiu encontrar alguém? — indagou Valentine, que, assim como Eleanor,

 já havia se inteirado do plágio do livreto sobre Costa Habichuela por intermédio de

Charlemagne.

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— Sim. — Sebastian foi pegar a declaração de Carroway, que havia deixadosobre a cômoda e o entregou a Charlemagne. — Ao que tudo indica, você quebrou suapromessa e contou a Valentine o problema concernente a Costa Habichuela, não? —

Ajeitando o relógio no bolso, ele dirigiu-se para a porta. — Alguém mais sabe?— A estas horas, toda a família. Exceto Peep e os Witfeld, é claro. — Ao vê-lolevar a mão à maçaneta, Charlemagne pediu: — Espere, Melbourne.

— Tenho um compromisso. E me devolva essa declaração; é provável que eu váprecisar dela.

— Se esteve fora o dia todo, então você não está sabendo da novidade.Aprumando-se, Sebastian o encarou.— Do que se trata?— Esta manhã, em Piccadilly, os Embry participaram da inauguração de um

cartório de registro de imóveis de Costa Habichuela. Eles estão vendendo lotes dosmais variados tamanhos por um xelim o metro quadrado. A fila que se formou diantedo prédio dava volta ao quarteirão.

— Estão à procura de colonos para aquele lugar esquecido por Deus? — Asurpresa fez Sebastian perder a firmeza que até então vinha imprimindo a voz.

— E, salvo engano, o rei abriu outro cartório desses na Escócia. — Charlemagnepigarreou. — Lamento muito, Seb.

Ele fuzilou o irmão com os olhos.— Que raios você lamenta, Shay? É lógico que prefiro saber o que está se

passando a permanecer na ignorância.— Aonde você vai? — perguntou Valentine.— Vou receber convidados no meu camarote em Vauxhall. O rey e família. — E

antes que os atônitos parentes fizessem algum comentário, ele despediu-se: — Atéamanhã.

Na sala de estar do piso térreo da mansão do coronel Branbury, Sebastian faziadas tripas coração para não se pôr a andar de um lado para outro. Só Deus sabia avontade que tinha de ir procurar Josefina e chacoalhá-la até fazê-la confessar toda averdade. Agora se dava conta de que tudo o que acontecera entre ambos era parte de

algum tipo de plano, um artifício para mantê-lo calado enquanto ela e o rey surrupiavam recursos da Inglaterra. Era mesmo uma pena que fosse o duque deMelbourne, já que isso o impedia de esmurrar Embry sem jogar seu nome e o de suafamília na...

A porta se abriu.— Vossa Graça. — O rei  se acercou para oferecer um aperto de mãos. —

Obrigado pelo convite para esta noite e pelo ininterrupto apoio.Tratando de colocar um sorriso nos lábios, Sebastian aceitou o cumprimento.— Fiquei contente em saber que conseguiu um novo assistente prontamente.

— Ah, Charles tem sido uma bênção. Ele está para chegar. — Stephen foi até acristaleira, de onde tirou dois cálices. — Toma um Porto enquanto esperamos?

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— Certamente. — Lembrando a si que a paciência lhe seria mais útil do que aviolência, tomou na mão a bebida que Embry lhe estendia.

— Sabia que resolvemos vender lotes de terra?

— Papai, não poderíamos, só por uma noite, não limitar a conversa a eventossociais? — Corada e meio ofegante, Josefina entrou na sala.Ao perceber que a encarava, Sebastian, com os pelos do braço arrepiados,

esboçou uma mesura antes de tomar na sua a mão que ela lhe estendia.— Vossa Alteza. — Beijando os dedos dela, concluiu que, se tivesse algum

instinto de autopreservação, aquela sirigaita deveria mais era que correr para longe dopai e se atirar nos braços do duque mais próximo, ele, implorando por perdão eproteção. — Você está muito bonita.

Realmente, Josefina estava linda num vestido de seda azul com decote

pronunciado e mangas rendadas, fitas azuis entremeadas nos cabelos, a tiara de pratacultuando à luz das velas. Se pudesse confiar na vigarista, certamente não resistiriaao assomo de desejo que o instigava a esquecer, só por alguns instantes, o perigo queela representava ao seu equilíbrio, ao seu coração, ao seu...

— Desculpem-me pela demora. — O duque de Harek se achava no vão da porta.Pestanejando, Sebastian obrigou-se a tirar os olhos de Josefina para encarar o

recém-chegado.— Boa noite, Harek.— Melbourne. Vossa Majestade, Vossa Alteza. — Charles Stenway se curvou. —

Tenho uma boa explicação para o meu atraso: acabo de adquirir dois lotes deoitocentos metros quadrados das primorosas terras pastoris de Costa Habichuela.— É mesmo? — O rei bateu palmas. — Esplêndido!— Eu queria mostrar que o meu apoio à sua causa não é apenas da boca para

fora.Enquanto Sebastian se surpreendia com a expressão contrariada de Josefina,

Harek foi até ela para lhe tomar a mão estendida. — Você é a flor mais encantadorado seu país, Vossa Alteza.

— Obrigada, Charles — respondeu ela com um sorriso.

Sebastian tentou ocultar o ciúme atrás do cálice de vinho. A flor mais encantadora, essa é boa. O mais provável era que ela fosse a única  flor de CostaHabichuela.

— E você, Melbourne. — Harek enfim soltava a mão de Josefina. — Quanto jápossui em terras de Habichuela?

— Nada, ainda. Passei o dia em Dover e só menos de uma hora atrás fiqueisabendo que o rei tinha aberto um cartório de registro de imóveis.

— Dover? — ecoou Josefina. — O que o levou até lá? — Antes que elerespondesse, a rainha Maria surgiu à entrada da sala.

— Boa noite, lorde Melbourne, lorde Harek.

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Sebastian indagou se ela, apesar da distinção que faltava ao marido e queJosefina herdara, estaria a par do que quer que fosse que Embry andava tramando.Pelo sim, pelo não, assumiria que todos eram culpados até prova em contrário.

— Vamos? — perguntou, deixando o cálice de lado. — Minha carruagem éespaçosa, porém ainda não sei quantos membros da sua comitiva irão nos acompanhar.— Só o capitão Milton e o tenente May, que farão nossa escolta e nos seguirão a

cavalo.— Muito bem; vamos andando, então.Quando a carruagem parou nos Jardins Vauxhall, Green pulou do lugar que

ocupava na boleia ao lado de Tollins para ir baixar os degraus e abrir a porta. O duquefoi o primeiro a saltar e ofereceu a mão à princesa. Apertando os dedos dele com umaforça desnecessária, ela indagou enquanto descia do veículo:

— É verdade que qualquer um entra em Vauxhall, pois não há cobrança deingressos?— Vem daí a profusão de gatunos, meretrizes e delinqüentes que circulam por

aqui.— Essa classificação de certo modo não engloba toda e qualquer pessoa em

algum momento da vida? — Ela sorriu. — Às vezes você fala como um ingênuo,Melbourne.

— Devo ser, afinal ainda desejo você. — Sem mais, virou-se para assistir MariaEmbry a descer do coche e, oferecendo-lhe o braço, seguiu com a rainha à frente dos

demais para abrir caminho em meio à aglomeração de gente.Inconfundíveis em seus uniformes negros, os dois oficiais do rei  seposicionaram um de cada lado do pequeno grupo, o que acabou fazendo com que amultidão se apartasse para lhes dar passagem. De pronto Sebastian se indagou o que amassa que tanto admirava a família real de Costa Habichuela iria dizer se soubesseque os Embry não passavam de larápios trapaceiros.

— Olhe, mamãe — veio a voz de Josefina às costas dele —, aquele homem estácuspindo fogo!

— E lá, se não se me engano, está o camarote de Melbourne — assinalou Harek

—, de onde teremos uma vista privilegiada caso esse sujeito engula as chamas poracidente.

— Oh, não diga isso — ela o repreendeu. Sebastian a olhou por cima do ombro.— Goste-se ou não, quando se embarca numa aventura perigosa é preciso contar

com resultados catastróficos. — Com isso, guiou-os até o espaçoso retângulo demadeira erguido a uns três ou quatro palmos do chão, onde um punhado de criados deVauxhall vigiava travessas de alimentos sobre um aparador, diante do qual uma dúziade cadeiras perfilava-se na parte fronteiriça do tablado. Um número considerável decuriosos já se aglomerava ao redor do camarote.

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— Excelente localização, Melbourne — elogiou o rei  enquanto acomodava aesposa numa das cadeiras. — Daqui se avista o pavilhão de Prinny. Acha que ele viráesta noite?

— Creio que não.— Eu queria dar uma volta pelos jardins — anunciou Josefina. E ainda que Harekcorresse a se acercar, foi para Sebastian que ela indagou: — Não me levaria para umpasseio?

— Certamente, Vossa Alteza. Mas vamos precisar de alguém que a acompanhe.— Melbourne tem razão, querida — anuiu Embry. — Tenente, acompanhe a minha

filha, por favor.O rapaz fez uma continência.— Pois não, Vossa Majestade.

Sebastian ofereceu o braço a ela, Josefina o aceitou, e os dois desceram docamarote com May em seus calcanhares.— Gostaria de ver o lago?— É uma boa idéia.Passaram por outros dois camarotes antes que os ocupantes do terceiro

chamassem a atenção de Sebastian. Empertigando-se, ele estacou para indagar no tommais moderado de que era capaz:

— O que estão fazendo aqui?— Você sabe que Eleanor adora acrobacias — respondeu Valentine, saudando-o

com uma taça de vinho.Era bem feito para ele. Quem lhe mandara dizer aonde iria?— Sarala, Nell, Shay — cumprimentou os demais com frieza. — Onde estão Zach

e Caroline?— Com os Witfeld; achamos melhor não expor a saúde da sra. Witfeld ao sereno

— respondeu Charlemagne, o olhar preso em Josefina e no guarda-costas todo denegro.

— Boa noite, Vossa Alteza.— Lorde Charlemagne, lorde Deverill. — Ela sorriu com um olhar luminoso. —

Olá, Eleanor, Sarala, e obrigada mais vez pelo convite para o almoço. Sinto falta deamigas com que conversar.

Sebastian achou melhor intervir antes que a irmã ou a cunhada tivessem tempopara retrucar.

— Com licença, sim? Estamos dando uma volta.— Quer que...— Não, obrigado — ele interrompeu Charlemagne.— Bom jantar.Enquanto se afastavam, Josefina comentou:

— Sua família parece muito unida.— Somos amigos além de sermos parentes.

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— E você gosta muito disso. Está nos seus olhos.— É verdade. Embora confie em pouquíssimas pessoas, sei que posso contar com

eles. Sob quaisquer circunstâncias, mesmo quando não consigo admitir que preciso de

ajuda. — Deve ser — Josefina limpou a garganta — reconfortante saber que há semprealguém a quem você pode recorrer quando precisa de um ombro amigo ou apenasconversar.

Sebastian respirou fundo. Seria algum outro truque? Ou ela sugeria que tinhaalgo a lhe dizer?

— Tenho um par de ouvidos — afirmou, — Prontos para ouvi-la.— Mas não na companhia de outras pessoas. Quando estivermos a sós, quem

sabe...

— Se estiver tramando alguma coisa, Josefina, juro que vou torcer o seupescoço. Estou farto de joguinhos.— Eu também — murmurou ela, acenando para alguém. — Preciso falar com você.

Só nós dois.— Então temos de fazer com que pareça involuntário... Está vendo aquele arco

ali adiante, à sua direita?— Sim. Mas antes posso assinalar que tudo seria muito mais simples se você não

tivesse insistido num acompanhante?— Não, não pode. — Tendo em vista a desconfiança que tinha dela, Josefina

devia era se dar por muito da satisfeita com que ele tivesse escolhido umacompanhante no lugar de uma pistola. — Encontre-me do outro lado daquele arco. —Enquanto falava, soltara o relógio da corrente para trocá-lo de bolso. — Ora, seu...! —bradou para ninguém em especial. — Pare, ladrão!

Ao vê-lo ir ao encontro do tenente May para repreendê-lo pela desatenção,Josefina se misturou à multidão que já começava a se formar, de onde reparou queSebastian, após mostrar a corrente do relógio para o oficial, mandava-o numa direçãopara em seguida tomar o rumo oposto. Cuidando de demonstrar que também eracompetente, ela colocou-se entre um bando de turistas antes de partir em direção ao

arco que Sebastian havia apontado, e foi se destacar do grupo tão logo passaram pelapérgula recoberta de roseiras.

Ali, tratou de se proteger sob os ramos pendentes de uma imensa glicínia,tentando ignorar que o lado mais sensato e egoísta de sua mente berrava para quevoltasse para o camarote e mantivesse a boca bem fechada. Com só mais uma quinzenapara permanecer em Londres, ela e sua família tinham boas chances de escapar ilesose impunes. Mas não, não podia deixar que...

Um homenzarrão em trajes de cavalheiro surgiu à entrada de uma das veredasatrás do arco, trazendo pela mão uma ruiva esquálida que correu a passar os braços e

as pernas ao redor dele. Os dois então se beijaram ruidosamente, e o camaradaabaixou o corpete do vestido da dama até lhe desnudar os seios descarnados.

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— Lorde Castleton e sua mais recente aquisição. — Soprou uma voz no ouvido deJosefina.

Antes que ela esboçasse uma reação, Sebastian virou-a de supetão para fazê-la

encará-lo.— Então, Sebas...Ele a calou com um beijo ávido, ardente, recendendo a vinho do Porto. Tomada

por uma onda de desejo tão intensa que chegava a lhe bambear as pernas, Josefinaenlaçou-o pelo pescoço com o cuidado de reprimir o gemido que assomara à suagarganta.

Quando enfim afastou os lábios dos dela, Sebastian a interpelou num sussurro:— Você é feiticeira, não é? Isto só pode ser algum encantamento que se

apodera do meu corpo. — Voltou a beijá-la, instigando-a com a língua até quase perder

o fôlego enquanto lhe tomava um dos seios na mão.— P-pare. — Ela o empurrou, tão de leve que mais parecia uma carícia.— Tem razão. Não há tempo a perder. — Após fitá-la por um instante, indicou

com a cabeça um espaço entre a glicínia e um carvalho. — Venha.Mal conseguindo enxergar o vulto dele em meio às sombras e a densa folhagem,

Josefina o seguiu até chegarem a uma minúscula clareira que a lua crescente banhavaem tons de prata. Ali, o apaixonado e provocante Sebastian deu lugar ao frio eimplacável duque de Melbourne.

— Você disse que queria conversar comigo, não? — Embora ressentida com a

súbita transformação,Josefina afirmou:— Há duas coisas que eu quero que você saiba. — Mantinha o queixo erguido

para poder fitá-lo olhos nos olhos. — E ambas são a mais pura verdade.— Por que não diz o que tem a dizer e deixa que eu decida se acredito ou não?— Muito bem. Eu... Eu nem imaginava que meu pai tivesse intenções de vender

lotes de terra a alguém.— Por que esse tipo de tramóia seria pior do que tomar dinheiro de um banco e

promover a venda de títulos para financiar o furto?

Deus, ele estava a par de tudo.— Porque só o banco é prejudicado, uma vez que terá de comprar os títulos de

volta. Já a venda de terras é outra questão, é mais do que uma... fraude. —Surpreendeu-se ao ver que conseguia pronunciar aquela palavra que seu pai haviaproibido. — As pessoas que forem para lá podem vir a morrer, Sebastian. Famíliasinteiras que...

— O que você realmente sabe a respeito de Costa Habichuela?— Eu sabia que não era nenhum paraíso, porém nunca me interessei em tirar a

limpo as informações a respeito do clima ou da topografia. Mas agora é diferente.

— Está dizendo que não tem a menor responsabilidade pelos prejuízos causadosa tantas pessoas e que só fez o que fez porque foi iludida pelo seu querido paizinho?

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O sarcasmo contido na acusação velada doeu mais do que uma bofetada.— Está claro que você pouco se importa com o que eu saiba ou não, e eu não

pretendo usar minhas próprias palavras contra mim. Tudo o que vou lhe dizer é que

ninguém pode ir para Costa Habichuela imaginando que aquilo é um pedaço do Éden.Sebastian perscrutou o semblante dela por alguns instantes antes de indagar:— Qual era a segunda verdade que tinha para me dizer, Vossa Alteza?— Contei ao meu pai que você havia descoberto que o livreto não passava de

ficção, e ele...— Ah! E que senso de honradez levou-a a fazer isso?— Fiquei morta de medo! — replicou ela. — Quando começamos tudo isso, Costa

Habichuela não tinha a menor importância, mas com a venda dos terrenos... Pegueiemprestado aquele livro que você estava folheando na biblioteca de Allendale, na

esperança de que meu pai pudesse ter dito a verdade sobre São Saturus e da Enseadado Diamante Negro.— Sei. — Ele balançou a cabeça. — Bem, agora que já me contou tudo e que sua

pretensa consciência está limpa, é melhor voltarmos para junto dos demais antes quealguém venha nos procurar.

Ao pousar a mão no ombro dele para impedi-lo de se afastar, Josefina sentiu umfeixe de músculos se enrijecer sob seus dedos. O que provava que ela ainda mexia comele. Do mesmo modo como ele lhe causava as emoções mais conflituosas que já sentira.

— Quando falei a meu pai sobre você, ele disse que iria se encarregar de

resolver esse problema. E que os Jardins de Vauxhall eram freqüentado porverdadeiras multidões.— Muito bem, agora que já me avisou e já ameaçou, sugiro que...— Não estou ameaçando você, Sebastian. Estou preocupada.— Então não devia ter se envolvido em toda essa história. — Ele respirou fundo.

— Vou colocar um ponto final em tudo isso, Josefina. As penas serão severas e, sequiser evitar o cadafalso, aconselho-a a me contar tudo o que sabe e rezar para que eutenha como protegê-la.

— É você quem precisa de proteção, seu tolo! O fato de ser duque não o torna

imune a ferimentos. E não estou dizendo isso porque resolvi trair meu pai, e sim poruma questão de consciência... Ainda que você ache que não tenho um pingo de senso demoral.

Ela fez menção de se afastar, porém Sebastian a agarrou pelo braço.— Mais cedo ou mais tarde, minha cara, você irá se dar conta de que não tem

como se manter neutra. E vai ter de escolher um lado.— Não espere que eu vá escolher o seu. — Soltando o braço com um safanão, ela

concluiu que Melbourne ou não acreditava que corria perigo ou pensava que ser umGriffin era o bastante para salvaguardá-lo de todo mal. Fosse como fosse, viu-o deixar

a clareira e, sem outra opção, partiu atrás dele.Assim que se viu sob a arcada da pérgula, Sebastian se deteve.

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— Você e eu... acabou — afirmou sem se voltar para ela, e Josefina teve asensação de que um punhal lhe transpassara o coração. — Agradeço por ter me ditoque reprova as atitudes do seu pai, porém suas informações nada acrescentaram ao

que eu já sabia.— Ora, que homem perspicaz.— Não tão perspicaz assim, é evidente. Independentemente disso, após esta

noite não espere voltar a me ver a não ser num tribunal de justiça. Basta dos seus joguinhos, seja lá quem você for. — Fez um gesto para lhe dizer que seguisse à suafrente.

Passando por ele como uma lufada de vento, Josefina correu a ir a se misturaràs pessoas que passeavam pelo parque. Oh, era mesmo uma estúpida. Sebastian nãoprecisava do seu auxílio, tampouco o queria. Pelo visto, já tinha conseguido tudo o que

queria dela e agora queria vê-la na prisão, ou enforcada, porque havia cometido umafalcatrua e seu pai a transformara num delito ainda mais grave. Oh, pelo menos ele iriaimpedir um êxodo a Costa Habichuela...

— Vossa Alteza — chamou o tenente May, que vinha ofegante ao encontro dela.— Não consegui encontrar o gatuno. E peço desculpas por tê-la deixadodesacompanhada, mas Sua Graça me mandou...

— Está tudo bem. Meu pai não precisa saber de nada disso e, se o duque tiversorte e recuperar o relógio, nem mencionaremos o ocorrido.

— Recuperei, sim. — Como se surgido do nada, Sebastian foi se colocar ao lado

dela com o relógio na palma da mão. — O malandro certamente o jogou num canteiroperto daqui quando percebeu que estávamos no encalço dele.— Só espero que esse vagabundo não guarde rancor, Vossa Graça — comentou

May com um esboço de sorriso.Josefina sentiu um arrepio ao constatar que ele acabava de inventar uma boa

 justificativa para que alguém apunhalasse Melbourne pelas costas. Soldadosexperientes que haviam servido junto de seu pai em dezenas de campanhas, May eMilton decerto tinham tirado a vida de inúmeras pessoas e não hesitariam em matarnovamente para cumprir ordens. E mais: a sorte dos dois dependia do êxito do rei.

Apreensiva como estava, foi só ao chegarem ao camarote que ela ergueu acabeça ao ouvir o pai indagar:

— Como foi a volta pelo parque, filha? — Com um sorriso plácido, Embry fezsinal para que ela se aproximasse.

— Muito interessante. — Quando olhou para trás a fim de agradecer aMelbourne pelo passeio, ela viu Milton se acercando com algo que parecia um objetometálico na mão. Oh, Senhor.

Sem pensar duas vezes, Josefina se atirou sobre Sebastian e, agarrando-opelas lapelas do sobretudo, deu meia-volta levando-o com ela a fim de colocá-lo de

costas para o camarote, antes de lhe dar um arrebatado beijo. E, quando enfim olargou, anunciou a plenos pulmões para que o pai e Milton ouvissem:

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— Melbourne me pediu em casamento, e eu aceitei!Embora meio atordoado com o beijo, Sebastian segurou-a pelos ombros para

afastá-la de si... e foi então que viu, por sobre o ombro dela, um dos guarda-costas de

Embry, Milton, esconder um punhal nas dobras do uniforme antes de se afastar dali apassos rápidos, todo encolhido, buscando se infiltrar por entre a multidão. Naqueleinstante, seu mundo virou de pernas para o ar: Embry tentara matá-lo, e Josefinaacabava de salvar sua vida... Engolindo em seco, tornou a trazê-la para perto dele.

— Eu pretendia pedir sua permissão antes de mais nada — afirmou em voz alta—, mas fui vencido pelos meus sentimentos.

— Seus sentimentos venceram a nós dois — juntou Josefina, a voz trêmula, orosto sem cor.

Por mais estranho que fosse, ele se acalmou. Precisava assumir o comando da

situação, uma vez que Milton estava por ali com um punhal. Mais tarde cuidaria dasconseqüências das afirmações que ele e Josefina haviam feito.— Espero que perdoe nossa afoiteza e nos dê sua bênção — prosseguiu,

conduzindo-a para o camarote.Embry, que se pusera em pé de um pulo ante o anúncio da filha, estava mais

pálido do que ela, o que indicava que também fora pego de surpresa. E, àquela alturados acontecimentos, todas as pessoas que tinham ido ao parque naquela noite jádeviam estar sabendo da novidade: o duque de Melbourne havia anunciado seucasamento com a princesa Josefina de Costa Habichuela.

— Seja bem-vindo à família, Melbourne! — bradou o rei. — Ou melhor, a partirde agora creio que devo tratá-lo por Sebastian.Antes que ele pudesse responder, o duque de Harek empurrou uma cadeira de

lado com tanta força que o balaústre do camarote rangeu.— Esperem um momento — rosnou Charles Stenway. — Nós dois temos um

acordo, Vossa Majestade. Não vou...— Apenas trocamos idéias, Charles; não fizemos acordo algum. Mas depois

conversaremos sobre esse assunto, sim?— Sem sombra de dúvida. — Com um olhar furioso na direção de Sebastian,

Harek passou por todos eles e, descendo os três degraus que davam acesso aotablado, desapareceu em meio aos curiosos.

— Acho melhor irmos andando também — sugeriu a rainha Maria. — Criamos umtumulto, e com apenas dois guardar para nos...

— Como sempre, você tem razão, minha querida. Tenente, leve-nos de volta àcarruagem.

Sebastian preferiu não lembrar à rainha que no momento havia um só guarda azelar pela segurança deles. Afinal de contas, de que lhe valia...

— Melbourne!

Sobressaltado pelo tom estarrecido da voz de Charlemagne, ele se virou para oirmão.

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— Falaremos sobre isso mais tarde, Shay. Agora preciso acompanhar minhanoiva e a família dela até minha carruagem.

— Como foi que conseguiu, Josefina? Você não disse que ele estava desconfiadode nós? — Levando a mão ao peito, Stephen caiu na risada. — Oh, meu Deus... E porpouco não acabo com ele!

Encolhida num canto da carruagem, Josefina parou de esfregar o local em seubraço onde os dedos de Sebastian haviam deixado uma marca avermelhada para faltarà verdade com muita naturalidade:

— Acho que, quando se deu conta de que Harek estava prestes a me proporcasamento, Melbourne percebeu que estava deixando passar uma excelenteoportunidade.

— Ótimo, ótimo, ótimo. Sempre digo que a ambição é algo que absolutamentetodos os homens trazem no coração. Aliás, é nesse princípio que se encontra o êxitodos nossos esforços.

— Está feliz com esse casamento, mi nina? — quis saber Maria Embry.O noivo não estava. Pelo contrário, Sebastian parecia a ponto de...— É claro que ela está, meu amor — intrometeu-se o pai dela. — Vencemos.

Ainda faltam algumas arestas a aparar, mas com Melbourne sob controle, tudo serámuito mais simples. Aliás, foi muito bom termos até amanhã para pensar em tudo issocom calma. Precisamos preparar alguns papéis, algo que nos garanta que ele irá guardar

para si o que sabe se não quiser se incriminar. Ah, e eu tenho de homenageá-lo com umtítulo.— Ele já é duque, papai.— Não pode ser uma distinção tão eminente quanto a que demos ao príncipe

regente — prosseguiu Stephen, como se ela não tivesse dito nada. — Deixe-me ver... eque acha de Cavaleiro da Cruz Verde? E não podemos esquecer que, com o duque deMelbourne na família, vamos precisar de um nome mais imponente da próxima

Costa dei Oro , talvez. É claro que para isso vamos ter de alterar a brochura, ostítulos, os contratos de venda de terras, mas isso não será problema, já que teremos

recursos de sobra para as despesas.Josefina fez o que pôde para não se mostrar pasma enquanto seu pai, feliz da

vida, punha-se a arquitetar a instituição de um novo país na Costa dos Mosquitos. Elerealmente não se importava com o que pudesse vir a ser dos colonos que, aodesembarcarem dos navios, não iriam ver nem sinal de uma cidade resplandecente,nenhum porto efervescente, nada de Costa Habichuela... Deus, quando Sebastiandescobrisse que a filha de um soldado não lhe deixara outra opção a não ser desposá-la, era bem provável que ela fosse dar graças aos céus por não poder ser enforcadamais do que uma vez.

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Filha de um soldado... Que o esbofeteara em público. Que dera a ele aimpressão de não estar à altura de lhe dirigir a palavra. Que o levara para a cama.Não, Sebastian jamais a perdoaria.

— O senhor voltou cedo, Vossa Graça — comentou Stanton ao abrir a porta. —Espero que...

— Onde está minha filha? — Sem esperar pela resposta, Sebastian partiu rumoa escadaria sem se dar ao trabalho de tirar as luvas ou o sobretudo.

— Imagino que ela esteja na sala de bilhar com a sra. Beacham, Vossa Graça.Algum problema?

Subindo os degraus de dois em dois, ele avisou por sobre o ombro:— Minha família não deve demorar a chegar; acomode-os na sala de estar, e

peça para a cozinheira preparar sanduíches ou coisa que o valha para eles.— Pois não, Vossa Graça.Na sala de bilhar, Sebastian, com uma calma que estava longe de sentir, pediu à

sra. Beacham que deixasse Penélope e ele a sós.Assim que a porta se fechou, Sebastian olhou para a filha que, com um taco de

bilhar grande demais para ela entre as mãozinhas, fitava-o com curiosidade.— Você deu um tiro em alguém? — Imitando o gesto que vira os tios fazerem,

Penélope se apoiou no taco.— Não. — Por mais esperta que fosse, Peep era ainda uma criança. Sua

meninota, que por ora não precisava saber de certas artimanhas que havia no mundo. —Venha cá. — Sentou-se numa das poltronas junto à janela. — Precisamos conversar.Largando o taco sobre a mesa, ela foi se acomodar no braço da poltrona antes

de indagar:— Estão todos bem, não estão?— Estão, sim. Estão todos ótimos. Mas acontece que... Bem, esta noite

aconteceu algo totalmente fora do previsto e que ainda não é nada definitivo... Mesmoassim, eu queria que você soubesse de tudo por mim.

— Está bem.

Ele limpou a garganta. Por onde começar?— Beijei a princesa Josefina.Olhos arregalados, Penélope quis saber:— Mas você não abusou dela como tio Shay fez com tia Sarala, abusou?— Como raios você sabe disso?— Francamente, papai. Eu sempre sei de tudo o que acontece. — Suspirou. —

Você fez mal a ela?— Não, mas agora ela e eu... — Fechou os olhos por um átimo. — Nós dissemos

às pessoas que vamos nos casar.

— Casar?! — Penélope parecia tão aturdida quanto ele. — E você contou docasamento a outras pessoas antes de contar para mim?

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— Foi sem querer, meu coração. Um imprevisto, digamos assim. Mas, assim queaconteceu, vim correndo para cá para contar tudo a você.

— Onde está Josefina? Quero falar com ela.

— Foi para casa. Vou vê-la amanhã.— Isso vai me tornar uma princesa?— Infelizmente, não. — Pela primeira vez naquela noite, sentiu o coração um

pouco mais leve. — Mas você sempre foi e sempre será a minha  princesa, se isso forum consolo.

Ajeitando-se sobre o braço do móvel, Penélope o abraçou, colando o rosto aodele.

— Gosto de Josefina; ela conhece piratas e soldados. Mas você devia ter mecontado que estava se apaixonando por ela. Dei bons conselhos a tio Shay quando ele

namorava tia Sarala.Apaixonar. Apaixonado por Josefina? No momento nem ao menos sabia se queriabeijá-la ou esganá-la. O que sabia com certeza, isso sim, era o que gostaria de fazercom o pai dela.

— Como eu disse, Peep, ainda não está nada decidido em definitivo. Tomamosessa decisão por causa de... assuntos de negócios, e é possível que esse casamentonunca venha a se concretizar.

Penélope aprumou-se para fitá-lo com os olhos bastante sérios.— Você é um duque muito rico, papai. Não precisa se casar com ninguém.

— Obrigado por me lembrar disso. — Lá embaixo, uma carruagem entrou nopasseio de pedriscos diante da mansão. — Mas se eu a amasse, você se incomodariacaso eu viesse a me casar com ela?

— Por causa da mamãe?— Sim. Por causa da mamãe.Pensativa, Penélope franziu os lábios.— Você continuaria a amar a mamãe?— Para sempre.— Bem, eu amo Buttercup e amo você, amo tia Nell e tio Valentine, amo tio Shay

e tia Sar...— O que significa que... — Ele enrolou o dedo num dos cachinhos negros dela.— Significa que, se nós dois amamos várias pessoas, não acho que há mal algum

em colocarmos mais alguém nas nossas listas.— Você é uma garotinha muito sensata, sabia? — Tomando a mão dela, levantou-

se ao ouvir um alvoroço à entrada da mansão.— Sabia, sim. Quem veio nos ver? Tem certeza de que não é Josefina?— Não, são seus tios e suas tias. Mas como é possível que haja sérias discussões

a respeito do assunto sobre o qual acabamos de conversar, eu gostaria que você fosse

para a cama.

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— Certo. Nossa conversa me deixou bastante cansada, mesmo. — Puxou-o pelamanga para lhe dar um beijo no rosto. — Não grite muito com eles.

— Vou tentar. — Na verdade, o mais provável era que todos gritassem a plenos

pulmões com ele... e com toda a razão.Embora devorando o terceiro sanduíche de pepino, Zachary arrumou um jeito deindagar:

— Um punhal? Tem certeza?— Pela terceira vez: sim, tenho certeza. — Sebastian continuava andando de lá

para cá. — Por quê, acha que podia ser uma colher?— Não, só estou tentando entender como...— Ela realmente salvou a sua vida — interrompeu Eleanor. — Eu já tinha me

preparado para odiá-la, mas, Sebastian, se fosse por...

— Se não fosse por ela tomar parte nessas trapaças, ninguém teria tentadomatar nosso irmão. — Já fazia quarenta minutos que Charlemagne mantinha os punhoscerrados e o semblante mais sombrio que seu irmão mais velho tinha visto desde aúltima tragédia na família.

— Não se pode afirmar isso taxativamente — ponderou Valentine, enroscando edesenroscando os dedos nos dedos de Eleanor. — Com ou sem Melbourne envolvidonessa história, o rei ainda estaria por aqui tramando fraude atrás de fraude.

— Não foi isso o que eu quis dizer — contra-atacou Charlemagne.— Seja como for, o fato foi que ela tentou me avisar de que eu corria perigo. E

eu não quis escutar. — Sebastian só se convenceu de acabara de dizer aquilo ao vertodos os demais a encará-lo.— Parece-me oportuno lembrar — afirmou Sarala — que, com o pouco tempo que

resta para que Sebastian vá se encontrar com os Embry, talvez fosse melhorexaminarmos em que pé as coisas estão agora, em vez de tentar entender como foique a situação chegou ao ponto em que se encontra.

— Concordo. — Sebastian respirou fundo. — Bem, já que Josefina contou ao paique eu estava desconfiado, Embry deve estar pensando que não só conseguiu me calarcomo também arrumou um aliado. E provavelmente também já está contando com os

recursos que poderá conseguir junto a mim.— Dar dinheiro a ele seria um incentivo — observou Zachary, trazendo para

mais perto dele a bandeja de sanduíches de que Valentine havia se servido.— De que lado a princesa Josefina está? — Aquela era a primeira vez que

Caroline se manifestava desde que entrara naquela sala.— Do pai, é evidente.— Acho que não, Zach — retrucou Eleanor. — Ela forneceu informações

altamente confidenciais a Sebastian.— Por mais que vocês se regozijem com os erros que cometi, o que importa no

momento não é o que houve entre mim e Josefina, mas sim o que tenho de fazer pararetificar o meu vínculo... o vínculo da nossa família com Stephen Embry.

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— Você está sendo injusto — replicou Charlemagne, muito sério. —Independentemente do que possamos ter dito sobre sua interferência em nossasvidas, ninguém aqui quer vê-lo sofrer.

— Muito bem — anuiu Sebastian, reconfortado pelos olhares solidários querecebia. — A fim de ganharmos um pouco mais de tempo, amanhã farei o papel defuturo genro; Embry pode pensar que me incluir nos planos dele o favorece, mastambém favorece a mim. Ainda tenho várias perguntas sem resposta.

— Por que não...— Shay, vá buscar Rice-Able em Eton, depois o esconda em algum lugar

qualquer; quero que ele esteja por perto quando precisarmos de alguém para refutar oque Embry vem dizendo. Quanto ao resto... Bem, creio que teremos de esperar paraver qual será o próximo passo daquele vigarista. — Pensou por um instante. — Por que

vocês não vão para casa descansar? Vamos nos reunir aqui amanhã, para o jantar, estábem?Assim que seus parentes se foram, Sebastian percebeu que tinha a cabeça

latejando. Inferno. Que raios iria fazer até a manhã seguinte? Dormir estava fora decogitação. Como iria pegar no sono se tinha um torvelinho no peito que mal o deixavarespirar?

— Stanton! — O mordomo não demorou mais do que instantes a aparecer no vãoda porta.

— Sim, Vossa Graça?

— Peça a Green que sele Merlin. E vá se deitar depois que eu sair.Rodeada de cartas na espaçosa cama em que dormia na mansão do coronelBranbury, Josefina meneou a cabeça num gesto desalentado. Agora que tinha relidotoda a correspondência que seu pai lhe enviara, ficara ainda mais claro que o que haviafeito era errado. Muito errado. Por que se deixara levar tão facilmente peloentusiasmo e pela autoconfiança de seu pai? Sua mãe, que sempre o chamara desonhador, era quem tinha razão. Enfrentando campanha após campanha e uma guerraatrás da outra, Stephen Embry vivia de buscar a fama ou a glória, mal dissimulando ainveja que sentia, primeiro de Wesley, depois de Bolívar e Rivera. Ou até mesmo do pai

da esposa, que desfrutara de um alto cargo no governo colonial espanhol.O que o levava a ser como era? Seria realmente inveja? Ou arrogância? Na

verdade, isso pouco importava. O que quisera, ao reler todas aquelas cartas, eraencontrar algum indício de consciência, de escrúpulo, de senso de moral, depreocupação e consideração por mais alguém além dele próprio. Mas não o encontrara.E considerando as várias maquinações que o ajudara a formular por anos a fio,tampouco ela tinha consciência. Ou não tivera, até então.

Porém algo havia mudado. Por dois motivos: porque se antes seu pai só visava aoescopo financeiro, ele agora queria colocar a vida de outras pessoas em perigo; e

porque Sebastian Harold Griffin surgira na sua vida.

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Devia odiá-lo, pensou. Além de arrogante e seguro de si até a medula, ele davauma importância absurda às convenções sociais e à forma como seus pares o viam. Mastambém era um homem admirável e encantador, que perdia as estribeiras ao se

deparar com mentiras.Josefina suspirou. Agora se dava conta de que não salvara a vida de Sebastiannaquela noite para proteger os planos de seu pai, mas por ela mesma. Ainda nãoentendia muito bem por quê, embora suspeitasse que...

A janela meio aberta se escancarou e ela, com um arquejo provocado pelosobressalto, pulou para o outro lado da cama no afã de apanhar a pistola na gaveta docriado-mudo.

— Vou lhe dar duas alternativas — a voz grave de Sebastian se espalhou peloquarto. — Ou você atira em mim ou deixa essa arma na gaveta.

Atônita, Josefina o viu passar sobre peitoril da janela e saltar para dentro dodormitório com uma elegância de dar raiva. E só depois de limpar o sobretudo e fechara vidraça foi que ele a encarou.

— Nunca o imaginei como alguém que trepa em treliças.— É a segunda vez... e a última, espero, que faço isso na vida. E como você se

deu ao trabalho de salvar minha vida, conto com que não vá fazer uso disso. — Indicoua arma na gaveta aberta.

— Depende do motivo que o trouxe aqui.— Vim conversar com você. — Resvalou o olhar pelas cartas espalhadas sobre a

cama, detendo-o por um instante nas pernas e nos braços dela, que a camisoladesnudava. — Preciso esclarecer algumas dúvidas antes do encontro com seu paiamanhã.

— A situação ficou um tanto complicada, não é? — Engolindo em seco, Josefinafechou a gaveta.

— Ficou, sim. — Inalou uma golfada de ar. — Venha cá.Josefina não respondeu. O olhar fixo de Sebastian fazia um ardor profundo se

espalhar por todo o seu corpo, roubando-lhe o fôlego e fazendo seu coração batermais forte. Num breve momento de insanidade, imaginou como seria ser casada com

aquele homem pelo restante da vida, como seria receber todos os dias aquele olharcom que ele a devorava... e estremeceu.

— Eu gostaria de saber — afirmou enfim Sebastian — de que lado você está.— Entre você e meu pai? Sinceramente, Melbourne, não sei se há como escolher:

ou trair a confiança dele ou ser usada e abandonada por você.— Tenho como protegê-la, Josefina.— Não, não tem. Quando as pessoas que dançaram comigo ou me receberam na

casa delas souberem o que houve e quem realmente sou, essas pessoas jamais voltarãoa me dirigir a palavra ou a olhar na minha cara. Ao seu lado ou do lado do meu pai,

estarei em pedaços. E não, não estou culpando você. Fui eu quem ajudou a criar tudoisso.

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Após dar volta ao leito todo desarrumado, Sebastian foi se deter bem diantedela para lhe erguer o rosto e fazê-la fitá-lo nos olhos.

— Vai me ajudar a dar um fim a todas essas mentiras?

— Não irei ajudá-lo mandar meu pai para a forca. — Limpou com a mão a lágrimaque lhe escapara. — Não posso fazer isso.Curvando-se, ele a beijou. Dissera a si que iria lá para obter respostas; a

verdade era que a desejava ainda mais do que antes. Ela o enfeitiçava, deixava-ozonzo, roubava-lhe todo o senso de...

— Isto não irá mudar nada — sussurrou Josefina enquanto empurrava osobretudo para longe dos ombros dele.

— Já mudou tudo. — Enfiando os dedos sob as tiras da camisola de cetim,trouxe-as para os braços que lhe pareciam meio trêmulos. Até mesmo a pele dela o

entorpecia: viçosa, suave, cálida, tão relembrada e misteriosa ao mesmo tempo.Voltou a beijá-la, deslizando as mãos pelas costas nuas até os quadris dela antesde puxá-la para junto de si. Fora só nas últimas horas que tinha se dado conta de que,mesmo sendo uma trapaceira, Josefina tinha consciência, tinha coração, casocontrário não colocaria tanta coisa em risco ao lhe revelar o que havia revelado. Nãopodia perdê-la. Jamais conseguiria manter sua promessa de manter-se longe dela.

— Sebastian... — Com um gemido, ela afastou-o de si o suficiente para levar asmãos entre seus corpos e desabotoar o colete cinza-chumbo; a peça não demorou atombar no chão, seguida de perto pela gravata.

Quando deslizou os dedos pelos seios túmidos de paixão e sentiu os mamilos seeriçarem, Sebastian se curvou para substituir os dedos pela língua; embora ardendo àcarícia, Josefina encontrou forças para puxar a camisa de linho branco para fora docós da calça, e ele interrompeu os afagos por um momento para tirar a peça de roupapela cabeça.

Após aproveitar a breve interrupção para terminar de se despir, Sebastianvoltou a abocanhar um mamilo intumescido pelo desejo para mordiscá-lo de leve antesde tornar a afagá-lo com os lábios. Ao ouvi-la gemer baixinho, sentiu um impiedosoassomo de paixão percorrê-lo de cima a baixo, no entanto resistiu ao ímpeto de

derrubá-la na cama e possuí-la até esquecer quem era. Se tudo o quisesse fosseapenas sexo, havia uma miríade de mulheres que não hesitariam em se atirar nos seusbraços.

Assim, usou de movimentos lentos e lânguidos para ajudá-la a deitar-se e, com amesma calma, estirou-se ao lado dela para deslizar a palma da mão pelo ombro bemfeito, pelas costas esguias, pela curva da anca firme e ao mesmo tempo tenra, pelaperna longa e torneada, pela sola do pé tão mimoso. Fosse o que fosse o que tanto oatraía nela, gostava daquela atração que não tinha forças para rechaçar. Gostava de sesentir um homem como outro qualquer, não um duque com uma infinidade de deveres e

responsabilidades.

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Enquanto refazia com a boca o trajeto antes percorrido pela sua mão, ouviu-asuspirar e gemer de mansinho.

— Sebastian... Pare...

— Não está gostando?— Estou... Muito.— Então por que parar?— Mas eu queria...— Levante os quadris.— C-como?Tomando um dos travesseiros dispostos à cabeceira da cama, Sebastian repetiu:— Erga os quadris. — Quando Josefina o fez, colocou o travesseiro entre a

cama e o corpo que o deixava teso como pedra, depois se deitou sobre ela, apoiando as

mãos no colchão enquanto usava do joelho para lhe afastar as pernas. — Diga que mequer — murmurou.— Quero você — afirmou Josefina num arquejo. — Quero você dentro de mim.

— E pressionou o corpo de encontro ao membro túrgido que palpitava junto às suasnádegas.

Com um gemido rouco e o coração acelerado, Sebastian a penetrou de um sómovimento. Ah... Quente, úmida, deliciosa, ela era só sua. Nenhum outro homem apossuíra nem jamais haveria de possuir.

— Gosta assim?

— Oh, sim... — arfou Josefina enquanto ele começava a mover o quadril. — Sim,sim...Só então ele pôde se indagar que diabos fazia na casa e na cama daquela mulher,

 já que naquele instante isso era a última coisa com que preocupava na vida. Nomomento, tudo o que importava era o ardor dos gemidos ritmados que ela não malconseguia abafar e a indescritível emoção provocada pela sensação de que seus corposeram um só. Se o restante de suas vidas fora daquele aposento se traduzisse em ummilésimo do prazer produzido por essa sensação, nunca mais iria ao menos pensar emse afastar dela.

Enquanto beijava o gracioso e elegante ombro de Josefina, sentiu-aestremecer, contrair-se e atingir o clímax. Então foi diminuindo o ímpeto dosmovimentos que fazia e, juntando toda a força de vontade que tinha, retirou-se dasentranhas afogueadas que o agasalhavam.

— Quer tentar algo diferente? — soprou no ouvido dela.Josefina fez que sim, os dedos ainda enterrados na roupa de cama.Deitando-se de costas, Sebastian puxou-a para cima de seu corpo. Após um

instante de hesitação, Josefina, entendendo o que ele propunha, apoiou-se nos joelhospara se encaixar sobre o membro viril ainda túmido e latejante... e se largou, arfando

de satisfação e desejo ao ouvi-lo gemer como se a ponto a perder o controle.

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Com as mãos nas ancas dela, Sebastian mostrou-lhe como se mover e, instantesdepois, ao vê-la repetir com razoável desenvoltura os movimentos de vai-vem que haviasugerido, largou o quadril que agora o seduzia inapelavelmente para afagar os seios

que pareciam pedir para serem acarinhados.— Quero vê-lo se entregar como eu me entreguei. — Ofegante, Josefina obeijou enquanto imprimia mais vigor à sua cavalgada.

— Não posso... — gemeu ele. — Isso provavelmente... iria lhe causar... novostranstornos.

— Sebastian, nem sempre você precisa controlar tudo. Deixe acontecer.Ele tornou a gemer. Ainda chegou a pensar em perguntar se realmente havia

entendido o que ela queria dizer, no entanto não teve tempo: em questão de segundos,sentia-a tomado da cabeça aos pés pelas contrações e pelos espasmos do prazer.

— Por Deus, Josefina... — murmurou, quando conseguiu recuperar a fala. — Seráque não percebe o que pode ter acontecido?Largando-se de vez, Josefina se aninhou sobre o tórax largo, seus cabelos se

misturando aos pelos que recobriam o peito dele.— Por que ficar grávida de você seria alguma desgraça? Depois, custa-me crer

que a minha situação possa ficar ainda pior do que já está. Sebastian respirou fundo.— Se confiar em mim, prometo que farei todo o possível para que nada de mal

lhe aconteça.Ela ergueu a cabeça para fitá-lo.

— Você sequer sabe das coisas eu que fiz. E não só na Inglaterra.— Quando subi pela treliça até a janela deste quarto, eu não esperava encontrá-la com uma auréola sobre a cabeça e asinhas de anjo nas costas, Josefina. O que euqueria era saber se você estaria disposta a remediar o que está feito.

— Não tenho escapatória.— Por que não me conta tudo o que sabe?

Quando Conchita abriu as cortinas, Josefina afirmou num lamurio:— Feche isso agora mesmo. — E puxou as cobertas até o pescoço.

— Sua Majestade mandou dizer que era para você ir lá para baixo. O duque deMelbourne já chegou.

Mas ele acabara de ir embora.— Melbourne está aqui? — Josefina se sentou.— Vai ver, ele está ansioso por se casar com você, Vossa Alteza — retrucou a

criada com um sorriso.Deus do céu. Estavam noivos. Nos delírios das vertigens da noite anterior e

daquele amanhecer, havia se esquecido disso.— Afinal, que horas são? — Fingindo nem perceber que estava nua, apanhou o

vestido azul que Conchita estendia para ela.— Dez e meia. Devia estar muito cansada; nunca a vi dormir até tão tarde.

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— Tive um sono agitado. — Terminou de ajeitar o vestido no corpo e foi sesentar à penteadeira.

— Seu pai também mal deve ter pregado os olhos.

Já pronta para começar a escovar os cabelos, Josefina descansou a escovasobre o colo.— Por que acha que Sua Majestade também dormiu pouco?— Ele mandou acordar o camareiro antes do amanhecer, depois ficou quase três

horas trancado no gabinete com Halloway e Orrin.Então seu pai havia traçado novos planos e estratégias com os asseclas enquanto

ela dormia. Dadas as circunstâncias, devia dar graças aos céus por ele não termandado chamá-la para participar da reunião... Na verdade, não havia contadoabsolutamente tudo a Sebastian, mas pelo menos dissera o suficiente para que ele

tivesse como deter seu pai ou trancafiá-los a todos numa prisão.Tão logo terminou de se arrumar, Josefina desceu ao piso térreo do casarão eestacou à entrada da sala de visitas ao se deparar com Sebastian junto à lareira, umaxícara de chá entre as mãos, os olhos fixos no pai dela, sentado sob a janela. Naquelamanhã o duque usava marrom e cinza e, ainda que não o conhecesse, ela não teriadúvida de que aquele cavalheiro alto e esguio, com penetrantes olhos acinzentados euma boca voluptuosa, era alguém de quem uma mulher jamais se esqueceria.

Como se pressentindo a presença dela, Sebastian virou-se e a encarou. Josefinasentiu o coração disparar de novo. Ele era magnífico. E o desejo e a possessividade

contidos nos olhos cinzentos eram só para ela.— Bom dia, Vossa Alteza. — Sebastian deixou a xícara e o pires sobre a moldurada lareira para fazer uma mesura. — Espero que tenha dormido bem.

— Bom dia, Melbourne. — Estendeu a mão para que ele a beijasse, rezando paraque seu pai não percebesse que tremia. — Dormi bastante bem, sim. Obrigada.

— Agora que os cumprimentos foram feitos — interveio o rey —, vamos falardos nossos assuntos, sim?

Com a voz um tanto mais fria, Sebastian observou:— Antes de levar a pena a algum documento, há uma série de questões que eu

gostaria de aclarar.— Enquanto você não assinar um acordo de casamento com a princesa Josefina,

meu rapaz, não me sentirei à vontade para discutir o que quer que seja. — Stephen selevantou. — Uma prerrogativa de monarca e de pai.

— Não assumirei nenhum compromisso às cegas; é a prerrogativa que me cabe.O benefício que posso conferir à sua... missão, são a minha respeitabilidade e a minhaposição social. Colocar-me numa situação em que uma coisa ou outra sejacomprometida iria anular seja lá o que você espera obter trazendo-me para o seio dasua família.

— O que espero obter são recursos para assegurar o progresso do meu país edos colonos que lá pretendem se instalar. Foi assim que viemos para a Inglaterra e é

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaassim que iremos partir. — Stephen estreitou os olhos azuis. — O que porventuracontrariar as minhas declarações não passa de especulação e boatos invejosos.

— Se espera fazer de mim um aliado, é melhor fazer bem mais do que meros

pronunciamentos.— Ou muito me engano, Vossa Graça, ou você está supondo que eu estejaperpetrando alguma espécie de trapaça. — O rey se empertigou. — Embora reconheçaque o nosso livreto tem informações parcialmente... emprestadas de outras fontes,afirmo que isso só foi feito no intuito de poupar um tempo que evidentemente seriamais bem empregado na instituição e organização do governo.

— Sei — replicou Sebastian com brandura. — Talvez eu tenha tirado conclusõesprecipitadas, porém isso não impede que você me fale do documento que devo assinar.

— Tudo o que quero é que declare por escrito que irá se casar com a minha

filha, tornando-a sua esposa e duquesa, e que irá contribuir para o progresso de CostaHabichuela, não só com palavras, mas também nos concedendo recursos da ordem de,digamos, vinte e cinco mil libras por ano.

— Vinte e cinco mil? — repetiu Josefina, atônita. — Papai, isso é absurdo! Édinheiro demais!

— Não vou discutir o quanto sua filha vale, apenas garanto que lançarei mão dequantias tão ou ainda mais altas para assegurar o bem-estar dela — Sebastian afirmousem pestanejar. — Cinco mil anuais.

— Vinte.

— Dez, ou então acabarei achando que vale mais a pena comprar meu própriopaís.O maxilar do rey tremelicou.— Muito bem, dez.— E a sua filha não será duquesa. — Sebastian roçou os dedos nos dela enquanto

falava. — Ela possui um título mais elevado, portanto deve mantê-lo.— O... — Pela primeira vez desde que aquela conversa se iniciara, Stephen

Embry viu-se sem palavras.Era claro que ele iria querer um título de nobreza autêntico para Josefina em

vez de outro mais elevado, porém inventado. Sebastian era brilhante, no entanto nãotitubeara a respeito do casamento... Decerto porque sabia que não podia se casar coma filha de um militar que vivia de ludibriar as pessoas com vistas a se apoderar dodinheiro delas.

— Somente eu fui declarado governante. — Estalando os dedos, algo que semprefazia quando se dava às suas maquinações, Stephen se pôs a caminhar diante da janela.— Os títulos de Maria e Josefina são honoríficos. Assim sendo, não há por que minhafilha não assumir o título de duquesa de Melbourne quando se casar com você.

— Nesse caso, os filhos de Josefina seriam nobres, e não membros da realeza.

— Correto.— E quem iria herdar o seu reino?

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Ao contrário do que Josefina esperava, o pai dela sorriu.— Você, que passará a ser Sebastian Griffin, rey de Costa Habichuela. Além de

duque de Melbourne, naturalmente.

— Naturalmente. — Sebastian olhou bem para ele. — Creio que o abismo entreas nossas diferenças está se reduzindo.— Ficou feliz em ouvir isso, já que esta é uma situação que pode trazer

benefícios a todos, desde que tomemos atitudes sensatas.— Sensatez é a minha palavra de ordem, tanto que não me vinculo a empreitadas

que não me tragam vantagens financeiras, sobretudo porque me preocupo com odestino dos cidadãos britânicos. Se quiser me contentar, você terá de dar tanto umadeclaração por escrito de que serei feito rey após a sua morte como a garantia de queisso será mais lucrativo do que o empréstimo, que irei assumir no seu nome.

— Não tenho como garantir isso.— Eu tenho, se me permitir cuidar dos seus investimentos.— Por que eu iria lhe conferir a condução dos meus negócios?Sebastian sorriu, ao mesmo tempo frio e encantador.— Porque serei um membro da sua família, Vossa Majestade. O que diz respeito

a você diz respeito a mim, e vive-versa.Stephen o olhou como se só naquele momento entendesse por que muitas

pessoas temiam cruzar o caminho dele.— Você é conhecido por ser um honrado homem de princípios, Vossa Graça. —

Voltou a se sentar. — Muito bem, aceito. Sem reservas.Sebastian foi apertar a mão do rey.— Acho que vou tirar um peso dos seus ombros.— O que vai tirar um peso dos meus ombros é vê-lo no altar, ao lado da minha

filha.— Solicito um mês para providenciar os preparativos; um duque e uma princesa

não podem se casar sem uma grande cerimônia. Não vejo problemas em evitar a leiturados proclamas, mas vamos ter de oferecer um baile de noivado. E como a celebraçãose dará na catedral de St. Paul, há um número limitado de datas a escolher.

— St. Paul? Por que não Westminster?— Porque meu primeiro casamento foi celebrado em Westminster. — Aquela era

a primeira vez em toda a manhã que Josefina sentia uma emoção verdadeira na vozdele. — Este será em St. Paul, ou não haverá enlace algum. Esse ponto é inegociável.

— St. Paul é um templo magnífico — assinalou ela —, e um mês entre o noivado eo casamento me parece um tempo adequado. Não quero dar a impressão de queestamos correndo contra o relógio.

— Sim, você tem razão — concordou o rey, meio relutante. — Acho que possoretardar a partida do nosso pessoal por duas ou três semanas.

— Pois bem, temos um acordo. Vou pedir a meus procuradores que redijam osdocumentos, assim poderemos assiná-los esta tarde.

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— Como preferir.Após fitar Josefina por um instante, Sebastian anunciou que retornaria às

quatro horas e, dizendo-se muito atarefado, deixou pai e filha a sós.

Assim que ouviu a porta da rua se abrir e tornar a se fechar, Stephenresmungou:— Um mês é tempo demais para ele.— Diz isso porque acha que ele pode mudar de idéia? — Josefina tentou não

demonstrar que o comentário a deixava apreensiva. — Melbourne jamais descumpririaum contrato assinado.

— Não é isso o que me preocupa, mas sim a sensação de que ele está tramandoalguma coisa. Mas se imagina que vou lhe entregar os recursos do empréstimo para queele os administre, Melbourne terá uma grande-surpresa. Daquele dinheiro ele não vai

ver um pêni.Oh, santo Deus.— Com licença, querida. Tenho que refletir a respeito de algumas questões. — E

deixou a sala cofiando o bigode.Josefina se largou sobre uma poltrona. Um desastre. Era tudo um enorme

desastre e ela se achava bem no meio dessa catástrofe. Sebastian suspeitava de seupai, seu pai desconfiava de Sebastian, e tanto um quanto o outro presumiam que atinham do lado dele.

— Maldição — murmurou para si.

Após muito refletir, ergueu-se de um pulo e correu para seus aposentos, ondese sentou à escrivaninha para separar pena, papel e tinta. Prezada Caroline, escreveu,murmurando as palavras enquanto as redigia.

Obrigada uma vez mais pelo convite para almoçar. Tendo em vista a correria desta manhã, uma horinha ou duas de calma e sossego serão realmente bem-vindas. Só peço que você venha me apanhar ao meio-dia e não à uma hora, já que terei compromissos inadiáveis esta tarde. Não vejo a hora de conversar novamente com você.

Grata pela atenção,

Josefina.Dobrando o papel, colocou-o num envelope e o subscreveu a lady Caroline, em

seguida chamou Grimm e lhe pediu que providenciasse para que o recado fosseentregue à esposa do irmão caçula do duque de Melbourne, assinalando:

— E diga a quem quer que vá levá-lo que espere pela resposta.— Pois não, Vossa Alteza.Tornando a fechar a porta, ela se encostou à sólida barreira de carvalho. Agora

só lhe restava esperar para ver se receberia alguma outra resposta que não umarecusa ou mais confusão. E rezar para que não estivesse cometendo o último e maior

erro de sua vida ao confiar em Sebastian.

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Capítulo VCapítulo V

— Dez mil libras, Vossa Graça? — admirou-se o administrador de finanças. — Éclaro que o senhor tem essa quantia ao seu dispor, mas é meu dever lembrá-lo de que émuito perigoso transportar essa soma em dinheiro pelas ruas de Londres.

Sebastian terminou as instruções a Henry Sparks, dobrando e selando odocumento antes de entregá-lo ao assistente.

— Preciso desse dinheiro em mãos, Rivers. Leve Tom e Green com você;armados, se preferir.Pondo-se em pé, Rivers guardou o papel no bolso alto do paletó.— Vou cuidar disso imediatamente, Vossa Graça.— Obrigado.Assim que o encarregado de seus assuntos financeiros se foi, Sebastian

apanhou outra folha de papel da gaveta da escrivaninha e, ciente de que seusadvogados estavam para chegar, pôs-se a redigir o que julgava a parte mais difícil detudo aquilo: algo que incriminasse Embry sem deixar transparecer que o fazia,

mantivesse Josefina fora de quaisquer complicações legais e permitisse a ele levar seuplano adiante sem se implicar em algum delito.Ao escrever o nome dela, deteve-se um instante para simplesmente admirá-lo.

Aquela cabeça dura de sangue quente, aquela contadora de lorotas que o deixava tontode desejo a ponto de não distinguir o direito do avesso...

Decerto era por isso que a amava.Prendeu a respiração.Santo Deus.Levantou-se. “Amor” era uma palavra que não usava com muita facilidade, mas o

fato era que ela era seu par perfeito. Josefina o enfrentava. Desafiava-o. E mesmocom o caos que trazia com ela, ou talvez por causa disso, fazia com que ele sesentisse... vivo. Meio demente, mas vivo.

Bateram de leve à porta.— Entre.Mas não foi um dos seus procuradores, e sim uma das suas cunhadas, Caroline,

quem adentrou o gabinete.— Preciso falar com você, Sebastian. — E lhe estendeu um pedaço de papel.Após passar os olhos pelo bilhete, ele não dissimulou a surpresa:

— Você a convidou para o almoço hoje?

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— Não. Na verdade, eu tinha combinado de fazer compras com minhas irmãsAnne e Joanna; estávamos de saída quando esse bilhete chegou, trazido por um criadocom instruções de levar uma resposta.

— Sei. — Então Josefina queria se encontrar com um membro da sua famíliaantes da reunião daquela tarde... E, junto de uma dama casada, não iria precisar dacompanhia da criada. — O que foi que você respondeu?

— Disse que passaria lá ao meio-dia, junto com as minhas irmãs, como ela pediu.— Suas irmãs...— Nós três já estávamos na porta da rua quando o criado chegou, e eu não quis

dar a Joanna um motivo para armar um escarcéu. Minha irmã anda brava comigoporque conheço uma princesa e ainda não a apresentei a ela. — A esposa de Zacharyergueu uma sobrancelha. — Quer que eu a traga aqui?

— Seria... Não, é melhor levá-la para a sua casa. — Olhou no relógio de bolso.Era quase meio-dia. — Zach está por lá?— Sim; ele quer examinar alguns relatórios da criação de gado com meu pai.— Ótimo, assim tenho a desculpa de ter ido procurá-lo. Você pode fazer com

que eu converse alguns minutinhos a sós com Josefina sem que ninguém perceba?— Acho que sim. — Caroline se encaminhou para a porta. — Você confia nela,

Sebastian?— Boa pergunta. — Sorriu. — Obrigado por vir me avisar, Carol.Ela retribuiu o sorriso.

— Nunca se sabe aonde o coração irá nos guiar, não é? — Acercando-se, ele abeijou na testa.Caroline se foi, e Sebastian, que ainda se indagava o que teria acontecido para

Josefina arquitetar aquele estratagema, não teve tempo para formular uma respostaao enigma, pois Stanton não demorou a ir se colocar à soleira da porta para anunciar achegada dos srs. Harkley, Swenk e Challington.

Maldição.— Cavalheiros — disse ele aos advogados —, tenho duas tarefas para vocês, e

ambas têm de estar prontas antes das quatro horas da tarde. A segunda iremos

discutir quando eu retornar; até lá, peço que redijam um acordo entre mim e StephenEmbry, rey de Costa Habichuela, no qual me comprometo a fazer pagamentos anuais aele no valor de dez mil libras.

Harkley, o mais velho dos três, assentiu com a cabeça.— Começaremos agora mesmo, Vossa Graça. Mas posso perguntar em troca de

que serão feitos tais pagamentos?— Da filha de Embry. Minha futura esposa, Josefina Katarina Embry.Enquanto os três senhores trocavam olhares atônitos e sorrisos frouxos,

Sebastian foi para o hall, onde tomou seu chapéu e suas luvas de um plácido Stanton.

Se seu casamento era um choque para aqueles três, era bom nem pensar no queestaria se passando pelas cabeças dos residentes de Mayfair. Ou no que a alta

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesasociedade iria dizer quando soubessem que o pai de Josefina era um larápio e que oduque de Melbourne iria desposar uma mulher que, começava a se convencer, não tinhauma gota de sangue nobre nas veias...

A carruagem chegara à sua porta ao meio-dia em ponto e, mais estranho ainda,Caroline não dera nenhum sinal de que o convite não tinha partido dela. Mas, após dezminutos na casa da cunhada de Sebastian, Josefina começava a se perguntar serealmente teria escolhido o membro correto da família Griffin a quem pedir ajuda.

— Vossa Alteza — ia dizendo Joanna, se era esse mesmo o nome dela, uma dascinqüenta ou sessenta irmãs da dona da casa —, você precisa nos contar como SuaGraça a pediu em casamento. Foi muito romântico?

— Foi tudo tão depressa... Acho que mais inesperado do que romântico.— E qual é o seu segredo? — quis saber Anne. — Sim, porque todos pensavam

que ele jamais fosse se casar de novo após a morte da esposa.— Joanna, Anne, já basta! — Caroline ralhou com elas ao retornar à sala. —Vossa Alteza, não gostaria de dar uma olhadinha naqueles livros de que falamos?

De tão depressa que se levantou, Josefina por pouco não deixou cair limonadano vestido. Depois de endereçar um olhar reprovador às irmãs, Caroline a guiou aolongo de um corredor até um amplo aposento que se abria para o jardim, atulhado delivros e com uma mobília que parecia muito confortável.

— Obrigada por ter ido me buscar na residência dos Branbury, Caroline —agradeceu Josefina em voz baixa assim que ficaram sozinhas. — Tenho notícias

urgentes para dar a Sebastian. Se eu lhe disser do que se trata, você contaria tudo aele?— Creio que não será preciso. — E, depois de levar o olhar a um ponto às costas

da sua convidada, deixou a biblioteca e fechou a porta.Toda arrepiada, Josefina deu meia-volta.— Sebastian?— Caroline foi me contar do seu bilhete — afirmou ele de onde se apoiava à

parede entre duas janelas altas —, pois logo deduziu que você queria conversarcomigo.

— Oh, graças a Deus. — Indo até ele, Josefina enfiou os dedos por entre oscabelos ondulados antes de beijá-lo apaixonadamente.

Com o mesmo arrebatamento, Sebastian enlaçou-a pela cintura, correspondendoao beijo com um ardor que a fez arfar de desejo.

— Você está correndo algum perigo?— Não. Meu pai jamais faria algo contra mim. Mas ele está desconfiado de que

você não vai devolver o dinheiro que se ofereceu para administrar, tanto que comentoucomigo que não pretende entregá-lo aos seus cuidados.

— Diabos... Eu sabia que estava sendo um tanto óbvio, no entanto há

pouquíssimas formas de detê-lo sem incriminar você.— Eu sei. Por isso, se for preciso me...

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— Não.— Sebastian, não adianta tentar moldar a realidade de forma a ajustá-la ao seu

modo de pensar. De mais a mais, reli todas as cartas que meu pai me enviou e cheguei à

conclusão de que... — Respirou fundo. — Ele sempre quis ser uma pessoa importante.Primeiro como algum membro valoroso da assessoria de Wellington e depois, como issonão desse certo, como um valoroso combatente nas campanhas de Bolívar contra osespanhóis. Só que, além de ser um estrangeiro na América do Sul, meu pai nunca foirealmente acolhido por Bolívar e os generais dele. As pequenas trapaças que fazíamoso entorpeceram, mas não lhe conferiram poder algum. E então ele apareceu com aquelahistória de Costa Habichuela, um lugar onde poderia ser rei...

— Entendo o raciocínio dele. E compreendo também por que você o ajudounesses delírios, afinal, ele é seu pai.

— Não, não entende. Você nasceu para ser o duque de Melbourne; jamais tevede se encolher num canto da sala, com inveja do poder e das regalias de alguém.Mesmo quando se despe dos seus sonhos, você continua a ser Melbourne. Sem ossonhos dele, meu pai é um militar fracassado que não quis servir no exército do paísnatal porque não conseguiu fazer as coisas à sua maneira. E eu sou filha dele. —Pronto. Colocara da forma mais clara possível: Stephen Embry era plebeu, e ela eraplebéia.

Sebastian, contudo, não parecia nem um pouco impressionado com aquilo.— Josefina, sei o que quero, e é isso o que vou fazer. Se for injusto ou errado,

paciência; descobri que não vou morrer se passar por cima da reputação imaculada dosmeus antepassados uma vez na vida.— Você não pode deixar que meu pai autorize aqueles navios a zarpar!— Não era a isso que eu estava me referindo, mas você tem razão.— Então do que você estava falando? Não fique dando voltas se...— Quero me casar com você.Ela ficou a mirá-lo com olhos pasmos.— Você ouviu o que eu disse, não? — Sebastian quis se certificar.— Ouvi, sim. É que não sei o que dizer.

— Ah! — Largando as mãos dela, foi até a janela. Sem pensar duas vezes,Josefina partiu atrás dele e deu-lhe um belo chute na canela.

— Não vim aqui para ser pedida em casamento.— Por que raios ficou brava comigo? — Esfregou a perna. — Ainda que não goste

de mim, a proposta que fiz salvaria a sua vida.— Demorei muito a decidir enfrentar meu pai, é verdade, mas me recuso a ser

recompensada por isso.Recompensada. No lugar dela, talvez fosse pensar o mesmo.— Você é realmente uma mulher fora do comum, Josefina, e eu devia ter me

limitado ao cerne da questão. Retiro o pedido pela sua mão.Ela fez um aceno aquiescente com a cabeça.

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— Com efeito, no momento temos de impedir que seu pai autorize a partidadaqueles navios. Mas como dificilmente irei colocar as mãos no dinheiro que ele furtoupara fazê-lo mudar de idéia, não será nada fácil persuadi-lo.

— A menos que você altere o rumo dos ventos para fazer com que os naviosretornem à Inglaterra depois de zarparem, não vejo outra saída senão nos mandarpara a prisão.

Alterar o rumo dos ventos. Ela fizera isso na brochura. Seria possível que...— Preciso retornar à sala — afirmou Josefina. — O que vamos fazer?— Esta tarde vou assinar os contratos, e então expressarei profunda decepção

quando seu pai se recusar a me entregar os recursos dos empréstimos.— Mas os contratos o obrigam a se casar comigo. E a dar dez mil libras a ele por

ano.

— Sei que você recusou minha proposta, querida, mas...— Não recusei sua proposta; apenas não quero falar disso enquanto tivermosassuntos mais prementes a resolver.

— Vou me lembrar disso. — Ela queria ser sua esposa. Aproximando-se, enlaçou-a pela cintura para beijá-la com suavidade, depois a levou até a porta. — Vou pedi-laem casamento de novo, Josefina. E, da próxima vez, é melhor você não me rejeitar.

— Deixei de fazer promessas. Pelo menos as que não posso cumprir.

— Você fez o quê? — Charlemagne o interpelou.

— Assinei os contratos. — Terminando de servir-se de mais uma dose de vinhodo Porto, Sebastian foi se sentar novamente junto à lareira da sala de estar daMansão Griffin. — Se fizer com que eu repita cada palavra que disse, esta noite nãoterá fim. E o sr. Rice-Able me parece um tanto cansado.

O professor e explorador na verdade parecia mais atordoado do que fatigado.— Perdão pela insistência — interpôs Eleanor —, mas pensei que a questão fosse

dissociá-lo dos Embry, não fazer com que você se enredasse ainda mais com eles.— Tenho de concordar, Melbourne — observou Valentine, colocando um braço ao

redor dos ombros da esposa com receio de que ela pudesse saltar sobre o irmão mais

velho para lhe torcer o pescoço.— Que carta você está guardando na manga, Seb? — quis saber Zachary.— Minha própria trapaça. E agradeceria imensamente se vocês me ajudassem.

Todos vocês.— Conte comigo — afirmou Valentine prontamente. Os demais, porém, não

pareciam nem um pouco receptivos.— Você? — resmungou Charlemagne. — Não pode fazer uma coisa dessas. Você

é Melbourne.— Tenho de fazer isso porque sou Melbourne. Por outros motivos também, que

não vêm ao caso no momento. — Limpou a garganta. — Agora, por favor, eu gostaria desaber se posso ou não contar com vocês.

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— Talvez seja melhor eu aguardar no corredor — murmurou John Rice-Able,erguendo-se.

— Não, por favor. — Sebastian fez um gesto para lhe pedir que voltasse a se

sentar. — Já que estou pedindo o seu auxílio também, quero mantê-lo a par de tudo.— Por que não nos conta que trapaça é essa? — Valentine servia mais vinho emsua taça e na do professor.

— Foi uma idéia que me ocorreu ainda hoje e... Bem, Josefina está disposta afazer o que for preciso para impedir que os colonos deixem a Inglaterra, mesmo queisso signifique acabar na prisão junto do pai, só que essa é uma opção que já descartei.Isso posto, o fato é que temos de nos concentrar em três objetivos: suspender acolonização de Costa Habichuela, recuperar os recursos dos investidores, e evitar queJosefina se veja em maus lençóis.

— Sem recorrer a Prinny ou aos policiais da rua Bow. — emendou Charlemagne.— E com uma ajudazinha do nosso prezado John aqui.— Anunciar que Costa Habichuela não existe está fora de cogitação — lembrou

Sarala —, pois isso acarretaria prisões... e uma mácula indelével à reputação deJosefina.

— Você vai inundar Costa Habichuela de soldados espanhóis, é isso? — supôsValentine. — É um plano bastante ambicioso, mas nada tem de fraudulento.

— Você chegou bem perto, Deverill. Vou inundar Costa Habichuela, sim, mas nãode soldados; com água mesmo. Um desses dilúvios que ocorrem de séculos em séculos,

que varra São Saturus do mapa e faça com que os sobreviventes fujam para Belize embusca de abrigo. Não restará nem um metro quadrado das férteis terras paraagricultura ou pastagem; o porto intacto e paradisíaco será engolido pelo OceanoAtlântico.

— Você é realmente brilhante, Melbourne. — Valentine deu uma gostosa risada.— Mas não há um só palmo de solo fértil naquele lugar — comentou Rice-Able

entre goles de clarete.— Mesmo acreditando plenamente na sua descrição da Costa dos Mosquitos,

professor, vou ter de lhe pedir que diga que os pastos e as futuras lavouras se foram.

O que não é de todo mentira, correto? E impedirá uma catástrofe.— De fato. Para alguém como eu, que esteve na região, é fácil compreender

porque é tão importante obstar a afluência de pessoas que chegariam lá com aesperança de encontrar um paraíso. Deus, seria uma tragédia. Mas inventar umahistória que...

— Se Prinny, digo, o príncipe George souber que Stephen Embry aproveitou-seda amizade dele e fez fazer papel de bobo... Vou ser mais claro: com a guerra queestamos travando na Península, a Inglaterra não pode correr o risco de que seusoberano seja visto como um tolo. Além do mais, quando estiver na cadeia Embry não

terá por que revelar onde escondeu o dinheiro que adquiriu desonestamente.

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— Você estaria nos ajudando a colocar uma série de coisas nos seus devidoslugares — intercedeu Caroline.

Após pensar por um momento, Rice-Able argumentou:

— Como vão acreditar no que digo, se sou autor de um livro muito mal recebido eesse Embry se faz passar por soberano de uma nação?— Você irá receber uma carta de um amigo que testemunhou a calamidade —

declarou Sebastian —, um amigo que também escreverá ao London Times. Cuidareipara que essa carta seja publicada.

— Depois de tantas aventuras, não pensei que teria mais uma para viver emLondres, na companhia da celebrada família Griffin. — O professor deu uma risadinha,mas logo se recompôs. — Sua causa é muito justa, Vossa Graça. Estou ao seu dispor.

— Excelente. — Visivelmente aliviado, Sebastian uniu as palmas das mãos. —

Shay, Sarala, será que poderia redigir essa carta?— Os anjos irão temer pisar o solo de Costa Habichuela quando a tivermosterminado — retrucou Charlemagne sem muito entusiasmo, antes de erguer-se e dar amão para a esposa.

Rice-Able também se levantou.— Acho que posso ajudá-los a escrevê-la.— Shay, venha tomar o desjejum comigo quando estiver mais animado.Assim que os três se foram, Sebastian se dirigiu à irmã: — Nell, eu gostaria que

você e Carol providenciassem convites para o baile de noivado que darei aqui dentro de

três dias.— Três dias? Mas isso...— Preciso desta casa cheia para quando descobrirmos o que se passou em Costa

Habichuela.Eleanor não respondeu.— Acha que pode impedir de me casar? — insistiu ele.— Não, só quero que o faça pelos motivos justos.Irritado com a observação, Sebastian mudou de assunto:— Zachary, Carol, será que vocês convenceriam Anne a fingir que está sendo

cortejada por John Rice-Able?— Sim — respondeu Caroline sem titubear.— Ótimo; assim ele terá um bom motivo para ir ao sarau dos Tuffley depois de

amanhã. — Virou-se para a irmã. — Assim está bom para você?— Então não haverá baile de noivado? — quis saber ela.— Haverá, assim que eu persuadir Josefina a se casar comigo.— Ela disse “não” para você? — admirou-se Zachary. Antes que ele pudesse

responder, Eleanor comentou com um ar satisfeito:— Gosto muito de Josefina; ela sabe como me deixar feliz.

— A mim também — admitiu Sebastian. Eleanor se curvou para beijá-lo no rosto.— Então é melhor fazermos com que a sua trapaça dê certo.

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— Não sei como detê-lo sem destruí-lo — comentou Maria Embry num sussurro,olhando de relance para a porta entreaberta. — Não é que eu não tenha pena desses

pobres desgraciados  que se deixam enganar; só que tenho mais pena ainda do meumarido.— Oh, mamãe... — Josefina pôs o bordado de lado. — Começo a pensar que ele

de fato acredita em todas essas histórias que inventa.— Seu pai é um nobre aprisionado no corpo de um plebeu.Cada vez mais desalentada com aquela conversa tão deprimente, Josefina

desejou boa-noite à mãe e rumou para o seu quarto. Lá chegando, tocou a sineta parachamar Conchita e, antes que a criada aparecesse, foi espiar pela janela. Não queriaque Sebastian trepasse em treliças para invadir seus aposentos no meio da noite e ir-

se embora antes que o dia raiasse; queria que ele fizesse parte da sua vida, queestivesse ao seu lado para sempre. Não por quem alegava ser, mas por quem era defato e porque, junto dele, aprendera a gostar do que realmente era.

Só mais alguns dias... Só mais alguns dias e iria saber se alcançaria a vida a quealmejava com Sebastian ou se precisaria fugir na calada da noite. Sozinha.

— Veja! — Com um sorriso largo, Stephen Embry empurrou o prato com odesjejum da filha para substituí-lo pelo exemplar do jornal. — Página três.

Resvalando os olhos pelas matérias que falavam de taxas, do número de mortosno último confronto na Península, de tumultos por causa de sementes em York, ela

chegou à página mencionada pelo pai... e sentiu o coração dar um pulo.— Oh!...— “Oh”? Isso é tudo o que tem a dizer? Por favor, leia em voz alta.Josefina limpou a garganta.— “A família Griffin de Devonshire tem o imenso prazer de anunciar o noivado 

de seu patriarca, Sebastian, duque de Melbourne, com Josefina Embry, princesa real de Costa Habichuela. A encantadora Josefina é filha única e herdeira de Stephen e Maria Embry, rei e rainha de Costa Habichuela. O baile de noivado do casal será anunciado em breve” .

— Ah, esplêndido! — Tomando o jornal de volta, o rey releu a nota. — Eu teceriaalguns comentários acerca de Costa Habichuela, agora que estamos vendendo lotes deterras, mas não posso negar que esteja bom. A moldura e o brasão do Griffin ficarambonitos. Imponentes, eu diria.

— Não foi você quem mandou publicar esse anúncio? — Deus, estava no jornal.Para todo o mundo ver.

— Eu o faria, caso não tivesse saído hoje. — Stephen alisou o bigode. —Realmente, estou impressionado. Melbourne vai dar um bom aliado. E um ótimo genro.

Sebastian havia encomendado o anúncio. O que podia ser um sinal de que queria

que toda a Londres soubesse de que o compromisso não era apenas uma aliançabaseada em motivos meramente políticos ou econômicos.

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Josefina mal conseguia respirar. Por pouco ele não tirara a vida de Sebastiancom medo de que o logro viesse à tona...

Oh, Santo Deus.

— Josefina?Ela respirou fundo.— Você não é um assassino.— Se tiver de escolher entre Melbourne e minha família, meu dever é proteger

minha família.— Não. — Ela começou a se afastar da mesa. — Sou muito grata por tudo o que

fez por mim, mas, assim que eu me casar com Sebastian, vamos parar com toda essaloucura. Não quero mais me envolver em fraude alguma.

Com o semblante carregado e os punhos cerrados, Embry se ergueu lentamente.

— Você é uma Embry, minha cara. Quando as pessoas descobrirem o que é CostaHabichuela, acha que o fato de ser a duquesa de Melbourne irá protegê-la? Que podese sentar numa das suntuosas salas daquela mansão e safar-se do diz-que-diz e dasacusações? Você será parte disto até eu afirmar o contrário. E Melbourne também,pelo tempo que eu quiser. — De súbito, a expressão dele se suavizou, e o sorrisosimpático que o tornava tão agradável lhe aflorou aos lábios. — Vá vestir algoapropriado a um passeio; vamos dar uma volta pelo Hyde Park na carruagem deBranbury. Quero que todos vejam a noiva.

Josefina correu a deixar a sala e, disparando escada acima, foi se trancar em

seu quarto.— O que fui fazer? — Desatando a chorar, largou-se sentada no chão.Se não tivesse se encantado com Sebastian, decerto estaria noiva de Charles

Stenway, e o duque de Harek com certeza não se oporia aos planos de seu pai.Mas não era mais aquela mulher disposta a unir-se a um homem imbecil só por

interesse. Na verdade, nunca nutrira grandes simpatias por aquela mulher. Gostavaera da pessoa que havia se transformado desde que beijara Sebastian, desde queconhecera alguém que a valorizava pelo que era, e não pelas vantagens que porventurapudesse lhe conceder.

Oh, Senhor... Abraçando os joelhos, pôs-se a soluçar. Fizesse o que fizesse, iriaprejudicar Sebastian, talvez até contribuir para a morte dele. Se desistisse docasamento iria provocar um escândalo, e seu pai não teria mais por que pensar queSebastian fosse manter silêncio acerca de tudo o que sabia. Se casasse com ele, iriaobrigá-lo a uma vida de blefes e trapaças, que acabaria por destruí-lo. Isso se seu painão o matasse porque ele se recusava a cooperar.

Oh, como queria sumir, desaparecer num estalar de dedos, como se nunca...Sumir. Desaparecer. Sim, talvez desse certo. Tinha de dar certo. Iria passear com seupai, como ele queria, e na manhã seguinte sumiria sem deixar rastos. Iria se tornar a

mais infeliz das criaturas, sim, porém era isso o que fizera por merecer. E Sebastian

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesairia se ver livre para fazer o que bem entendesse no propósito de dar um fim aodescalabro que seu pai, com sua ajuda, havia engendrado.

O mordomo da Mansão Corbett abriu a porta da rua enquanto Valentine, aindareclamando de ter sido obrigado a pular da cama tão cedo, colocava o sobretudo e asluvas.

— Acaso você faz idéia de que horas são? — indagou o marquês.— Sete. — De braços cruzados, Sebastian tentava dissimular a euforia que o

acometia. Quando fora a última vez em que sentira tanta expectativa, tanta...esperança? Não por sua filha ou por sua família, mas por ele próprio?

Green esperava por eles no passeio diante da casa, segurando as rédeas de suamontaria e também as de Merlin e lago.

— O dia está propício para um passeio a cavalo, meu lorde — comentou o moçocom um aceno de cabeça para Valentine.— Miserável — resmungou o marquês. — Ao menos posso saber aonde vamos?— Dar uma volta — respondeu Sebastian.— O ar da manhã me ajuda a clarear as

idéias.— E a acabar comigo. — Ainda fazendo cara feia, Valentine saltou à garupa do

seu alazão. — Não temos de ir acudir nenhum lavrador disposto a colocar CarltonHouse abaixo, temos?

— Não está na minha agenda, mas não posso prometer nada.

Deixando o caminho de pedriscos diante da mansão, rumaram na direção doHyde Park. Sebastian encheu os pulmões com uma boa golfada de ar. Àquela hora damanhã, em que as ruas já começavam a ser disputadas por carroças de leite ecarrinhos de mão, uma certa jovem provavelmente ainda dormia, os longos cabelosespalhados sobre os travesseiros.

— O que há com você? — quis saber Valentine. — Está sorrindo como umlunático.

— Já disse, gosto de passear de manhã.— Não, não é isso. — O marquês olhou bem para ele. — Você está feliz, não

está?Ao perceber que devia estar sendo óbvio demais, Sebastian tentou

desconversar:— Oh, sim. Com um território para inundar, uma falcatrua para solucionar e um

casamento que nunca imaginei fazer, por que eu não haveria de estar morrendo defelicidade?

— Você está nas nuvens, Seb. Depois de ser flechado pelo Cupido, seireconhecer os sintomas perfeitamente bem. E estou feliz por você. De verdade.

Meio encabulado, ele admitiu:

— Eu... Eu não contava com isso.

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— Eu sei. E acho que temos de louvar a mocinha levada que despertou o duquede Melbourne para o amor outra vez. — Valentine, que sempre mantinha um olho nogato e outro no peixe, atentou às redondezas. — Falando nela... É impressão minha ou

estamos seguindo para a residência do coronel Branbury?Com todos os diabos. Por que não convidara Zachary para aquele passeiomatinal? Bastaria falar de gado ou de biscoitos, e poderiam ir até Brighton sem queZach se desse conta do que estava se passando.

— Pensei em dar uma passadinha por lá para ver se está tudo em ordem.— Ah!Assim que dobraram a esquina, Sebastian, surpreso, deteve Merlin ao ver a

 jovem num modesto vestido verde atravessar a rua correndo para entrar num cochede aluguel. E o que o deixou ainda mais aturdido foi a valise aparentemente abarrotada

que ela carregava.— Àquela não era...— Era — confirmou ele antes de levar o olhar à mansão do coronel.O único movimento que se via na janela do segundo piso do casarão era o adejar

das cortinas instigadas pela brisa. Josefina havia deixado a janela aberta... Teria sidona expectativa de que ele subisse pela treliça na noite passada? Ou para ela própriaescapulir naquela manhã? Bem diante dos seus olhos, o coche de aluguel virou à direitana próxima rua... Na direção oposta à Mansão Griffin, o que significava que ela nãopretendia ir vê-lo.

— Green — chamou seu cavalariço, virando-se na sela para encará-lo —, fiqueaqui e vigie a casa do coronel.Se vir algo fora do comum, avise a lorde Deverill; ele vai voltar para a Mansão

Corbett.— E aonde você vai? — indagou Valentine.— Atrás daquele coche.— Seb, não seria melhor Green fazer isso?— Não. E você, trate de cuidar para que esteja tudo pronto para o sarau dos

Tuffley esta noite.

— Você está armado?— Sim. Não se preocupe.Com os calcanhares, Sebastian incitou Merlin a disparar rua abaixo. Talvez não

fosse nada; talvez ela tivesse ido comprar alguma peça para o enxoval. Ou talvez não, já vez que Josefina era mestra em fazer o que menos se esperava.

O pior veículo com sistema de molas em que Josefina já viajara desde que setornara princesa finalmente parou, e o condutor saltou da boleia para ir abrir a porta.

— Pronto, senhorita: a estalagem Buli and Mouth, ponto de parada da carruagemdos correios. São três xelins.

Ela apeou arrastando a pesada valise, depois apanhou o dinheiro na carteira e oentregou ao rapaz que, sem nem ao menos um aceno de agradecimento, tornou a subir

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesano coche. A carruagem do serviço postal já se achava no apinhado pátio diante da Buliand Mouth. Depois de puxar a aba do chapéu para o rosto, Josefina endireitou osombros e rumou para a porta da estalagem, tentando ignorar os olhares cobiçosos que

recebia de dois sujeitos mal encarados.— Em que posso ajudá-la, senhorita? — indagou a mocinha à entrada doestabelecimento

— Onde posso comprar um lugar na diligência do correio?— Com aquele homem de lenço vermelho no pescoço ali, junto ao balcão da

taberna.Após respirar fundo, Josefina foi falar com o homem que usava um paletó azul e

o tal lenço vermelho que parecia já ter visto melhores dias. Ele a examinou da cabeçaaos pés antes de declarar:

— Não há mais lugar. — E tornou a olhá-la de cima a baixo antes de retomar oque ia dizendo a outro camarada.— Tem certeza? — insistiu Josefina. — Minha tia está muito doente, e eu tenho

de chegar a York o mais depressa possível.— Lamento, senhorita, mas o único lugar que restou é na cobertura do veículo, e

só homens viajam lá. Você está sem sorte.— Vou ficar com esse assento. — Largou a valise no chão para abrir a carteira.

— Quanto devo pagar para ir até York?— Três libras. Mas são dois dias de viagem sem ter como se abrigar.

— Não faz mal. — Começando a se indagar se não deveria ter pegado maisdinheiro das reservas do pai, Josefina pagou a passagem.Depois de fazer uma anotação num livro, o varapau tirou um pedaço de papel do

bolso, rabiscou alguma coisa no bilhete e entregou-o a ela.— A carruagem vai partir do pátio, dentro de dez minutos.— Obrigada.Dez minutos. Parecia tão pouco e, ao mesmo, uma eternidade. Conchita recebera

ordens para não acordá-la antes das dez, de modo que ainda teria cerca de duas horaspara deixar Londres antes que alguém desse pela sua falta. Quando descobrisse que

ela se fora, seu pai inventaria uma desculpa qualquer a fim de evitar um escândaloenquanto punha os homens do capitão Martin no seu encalço. Já Sebastian certamenteficaria aliviado, afinal não precisaria mais ter de desposá-la para...

Pare. Depois você se lamenta o quanto quiser. Tornando a proteger o rosto coma aba do chapéu, reprimiu a vontade de chorar, apanhou a valise do chão e deixou aestalagem.

— Passagens! — gritava o homem de lenço vermelho no pescoço em cima de umcaixote de madeira em frente à porta aberta da diligência postal. — Passagens, porfavor!

Josefina se juntou à fila que se formara diante do veículo. Quando chegou suavez, o homem a quem ela ouvira alguém chamar por Red Jim disse a um outro sujeito:

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— Ajude-a a subir, Samuel; ela vai na capota. — Enquanto um outro cavalariçolhe tomava a valise da mão para colocá-la junto das demais malas que seriamacomodadas na parte traseira da imensa carruagem, Samuel tomou-a pela cintura a

fim de erguê-la até as mãos do cocheiro que, no alto do veículo, agarrou-a pelos braçospara então ir acomodá-la num dos dois coxins duplos de estofamento ralo, voltados umpara o outro. Num piscar de olhos, um homem esquelético sem um dos dentes incisivosfoi se largar ao lado dela.

— Bom dia, belezinha.Nem bem Josefina se ajeitara sobre o banco, os dois mal encarados que a

tinham encarado à entrada da estalagem foram se sentar no coxim em frente ao dela.Que alegria.— Não vamos ter motivos para nos queixar da vista, hein, Johnny? — comentou

o mais encorpado.— Nem me fale, Tim — retrucou o outro.E a viagem ainda nem começara... Mas, pensando bem, já que iam dividir aquele

acanhado espaço por todo o percurso até York, talvez fosse melhor tê-los por aliados.Não lhe custava nada contar algumas lorotas; em troca, era provável que eles lhesfornecessem informações importantes sobre como levar uma vida sem regalias ouprivilégios.

— Por acaso conhece aquele camarada com jeito de ministro de Estado, srta.

Grimm? — perguntou Tim. — Parece que ele está nos seguindo.Josefina sentiu-se gelar. Sim, não era nenhum absurdo que tivesse sidoreconhecida por algum dos ministros de Prinny. Mas como iria explicar a ele o quefazia no topo de uma diligência do correio rumando para o norte? Respirando fundo,olhou de relance por cima do ombro... e por pouco seu coração não parou. O cavalheiromoreno e esguio que vinha a uns cinqüenta metros de distância do pesado veículo queseguia para York não era um ministro de Estado, mas sim o duque de Melbourne.

— Oh, meu Deus. — O que fizera de errado? Como fora deixar quedescobrissem seu plano tão depressa?

— Quando vamos parar? — indagou a seus três “amigos” num fio de voz.— Em Biggleswade — respondeu o pastor de ovelhas.— Daqui a uma hora, mais ou menos.— Acha que ele irá nos seguir até lá? — Johnny tornou a olhar para trás.Conhecendo Sebastian como conhecia, ela admitiu:— É possível.Ao vê-la tão agoniada, Tim quis saber:— Esse camarada está pensando em prejudicá-la de alguma maneira, srta.

Grimm?

— Não, creio que não... Oh, é uma história muito complicada. Ele diz que quer secasar comigo.

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— Ele lhe faz mal, é isso? — perguntou Johnny. Josefina hesitou por uminstante e, antes que pudesse responder, Tim se levantou para ir cutucar o cocheiro.

— Willie, detenha esta diligência.

— Não posso ficar parando aqui e ali para você se aliviar.— Não se trata disso; tenho de ter uma conversinha muito séria com aquelecamarada que está vindo atrás de nós.

— Ah, bom. Essa eu não quero perder. — Willie riu baixinho, depois olhourapidamente para o cavaleiro no rastro da diligência. — Parando, meninos... Parando...

Oh, não.— Conheço bem esse tipo de pilantra — afirmou Tini. — Esses almofadinhas que

não conseguem controlar as mãos... Deixe comigo; depois do murro que vou lhe dar, elevai embora daqui com o rabo entre as pernas.

A diligência estacou, e Sebastian não demorou a se acercar.— Olá — cumprimentou, olhando para Josefina.— Olá coisa nenhuma — retrucou Tim. — Eu e Mabel vamos nos casar, por isso é

melhor você voltar para Londres, velhaco.Cruzando os pulsos sobre a maçaneta da sela, ele afirmou com muita calma:— Mabel não pode se casar com você porque vai se casar comigo.— Sebastian, vá — Josefina afinal se manifestou. — Sei o que estou fazendo.— Casar com... Qual é o seu nome, meu bom homem?— Tim. Timothy Boots.

— Casar com o sr. Boots é a solução que você encontrou para o nosso problema?— É isso mesmo, seu sacripanta. Eu e Mabel Grimm. E não me faça descer daquipara lhe dar uma sova.

— Bem, sr. Boots, acho que vai ter de descer daí para me dar uma sova, sim;caso contrário, a srta... Mabel Grimm irá embora comigo.

— Sebastian, por favor. Isso é absurdo!Todos os ocupantes da diligência tinham a cabeça para fora das janelas.

Surpreso, Sebastian percebeu que não se importava nem um pouco com isso.— Por que não me explica o que faz sentada na cobertura de uma diligência a

caminho de York?— Estou me retirando da questão, assim ninguém precisará me proteger de

nada.Enquanto Tim se erguia a fim de saltar para o chão, Sebastian apeou e foi

colocar as rédeas de Merlin sobre o raio de uma das rodas da diligência.— Eu disse que cuidaria de tudo, não disse? — Tirando o paletó, jogou-o em cima

da sela. — Tenho um plano; venha aqui, para que eu possa lhe contar do que se trata.— Fique aí, Mabel. Já, já vou dar um jeito nesse dândi.— Será que não entende que assim será melhor para todos? — replicou

Josefina, dirigindo-se a Sebastian. — Vou procurar um lugar para mim no mundo, umlugar onde eu possa...

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesa

— Muito bem. — Sebastian apanhou outra cédula. — E mais cinco libras pelavalise da srta. Grimm.

Correndo a embolsar o dinheiro, Tim Boots foi tirar a valise do bagageiro da

diligência em meio aos comentários de aprovação e de censura que vinham do veículo.Assim que a carruagem do correio se foi, Josefina, suspirando, indagou aSebastian:

— Como descobriu que eu estava naquela diligência?— Bem, Mabel Grimm, quatro anos atrás eu amaldiçoei Deus e lhe pedi que me

deixasse em paz; esta manhã, Ele me deu uma última chance para mudar de idéia. —Beijou os lábios dela e foi vestir novamente o paletó. — Fui dar uma volta e, ao passarpela residência dos Branbury, vi você entrando naquele coche de aluguel.

— Você amava muito sua esposa — Josefina comentou, ressabiada.

— E, de certo modo, ainda amo. — Apanhou as rédeas de Merlin, que Tim largarano chão. — Vamos até aquele riacho? Quero lhe dizer uma coisa.De mãos dadas, caminharam até um agrupamento de olmos à beira da estrada,

atrás do qual se abria uma campina recoberta de flores silvestres cortada por umcórrego. Após deixar o cavalo junto ao curso d’água, o duque voltou a segurar na mãodela.

— Você me ajudou a descobrir algo sobre mim mesmo, Josefina. Eu pensava quenunca mais fosse querer saber de amor, de casamento... Você sabe o quero dizer.Charlotte me preenchia e, quando ela se foi, meu coração... se fechou. Tudo em mim se

fechou. Então conheci você e me senti enternecer novamente. Foi como se meucoração voltasse a bater, de verdade, cheio de vida. Mas não acho que Charlotte tenhade deixar o lugar que ocupa nele para que você o ocupe plenamente. Isso faz sentidopara você?

— Faz, sim. — Beijou-o com imensa ternura. Mal podia acreditar que ele vierabuscá-la. E que a quisesse.

— Sebastian, diga que tudo ficará bem. Não faz mal que seja mentira.— Jamais mentirei para você. E sim, vai dar tudo certo.— Conchita ficou de me acordar depois das dez; há estas horas, eles deram pela

minha falta.— Você deixou algum bilhete? Uma carta?— Não.— Então vamos ter de inventar uma desculpa para esse seu sumiço temporário.

Pois, lamento informar, vou precisar de que você volte para casa.— Tenho medo de que meu pai mate você depois do casamento, Sebastian. Ele

está disposto a liquidá-lo se você não cooperar com...— Stephen Embry não fará nada contra mim nem contra ninguém. Tenho uma

surpresa para ele esta noite, no sarau dos Tuffley. Deixei Valentine no comando das

minhas tropas, e ele está se encarregando de coordenar os trabalhos para a

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaconsecução e o êxito do plano que arquitetei. Agora, se você não aparecer, duvido queseu pai vá ao sarau.

Josefina ficou pensativa, então anunciou:

— Vou dizer a ele que fui procurar Harek. Tenho certeza de que meu paiacredita que eu me sentiria mais à vontade casando com alguém menos... preocupadocom a verdade.

— Não. Não quero Harek em nossas vidas de novo. Já basta o que tive de engolirao saber que ele a cortejava.

— Nesse caso, talvez seja melhor não nos afastarmos demais da verdade. — Aovê-lo fazer que não tinha entendido, ela explicou: — Vou dizer a meu pai que tudo oque aconteceu foi demais para mim e que, por conta disso, quase fugi para a Jamaica.E que depois, ao perceber que não teria coragem de desapontá-lo, acabei voltando

para casa.— Perfeito. — Sebastian a beijou, demorada e ardorosamente. — Vamosandando; no caminho explicarei meu plano para você. Mas me prometa, Josefina... ouMabel ou seja lá quem cisme de ser, que, aconteça o que acontecer, você nunca maisirá nem ao menos pensar em fugir.

— Você acredita em mim?— Plenamente.— Então eu prometo.

— Talvez fosse melhor ficarmos em casa hoje — Maria Embry comentouenquanto ajeitava o laço na manga do vestido da filha.— A não ser a criadagem desta casa, ninguém mais está sabendo do que houve

esta manhã — Josefina a tranqüilizou. — De mais a mais, como iríamos faltar se o meunoivado será oficializado lá?

— De fato — concordou o pai dela com severidade, endireitando a faixa sobre oombro esquerdo. — Não sei se sou mais grato por você ter retornado ou porMelbourne não ter se inteirado do que aconteceu. Ora, Josefina, como pôde ser tãoegoísta?

— Não vamos mais falar disso. — Maria fez um gesto para indicar a porta. —Vamos? Você está linda, chica.

— Gracias, mama. — Realmente, sentia-se bela, mas não por causa do magníficovestido lilás e da tiara de prata que usava, e sim porque sabia que Sebastian a amava.

— Se Melbourne tivesse vindo nos buscar, vocês dois chegariam juntos ao sarau— observou Embry diante da carruagem que os aguardava.

— Talvez ele ainda esteja aborrecido porque não recebeu os recursos dosempréstimos para administrar — sugeriu Josefina.

— É bom, assim ele aprende que jamais irá me levar na conversa.

O coche se deteve, e dois criados uniformizados foram ajudá-los a descer.Apesar da ansiedade por ver a carruagem de Sebastian, Josefina se conteve; de mais

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaa mais, seria impossível localizar um veículo com a insígnia Griffin em meio à infinidadede veículos enfileirados defronte à residência e pelas ruas das cercanias.

Assim que o mordomo anunciou a comitiva de Costa Habichuela à entrada do

salão de baile no segundo andar da mansão, lorde e lady Tuffley os receberam comuma mesura.— Boa noite, Vossas Majestades, Vossa Alteza. Somos muito gratos por terem

nos honrado com a sua presença.— O prazer é nosso — respondeu Stephen, dando a impressão de crescer ante a

reverência de pessoas que desfrutavam de uma posição social superior à sua. — Suacasa é muito bonita, Tuffley.

— Obrigado, mesmo assim reservarei o elogio à minha esposa. — O visconde seaproximou. — Prinny estará conosco esta noite, sabia? Mais uma grande honra para

nós. — Com efeito. Faço questão de erguer um brinde a ele. Sem o generoso auxíliodo príncipe regente, meus sonhos para Costa Habichuela jamais se realizariam.

Sem fazer a menor idéia quanto ao sucesso dos planos de Sebastian para aquelanoite, enquanto a filha da anfitriã se encarregava de levá-los até a mesa com osrefrescos, Josefina percebeu que mal conseguia respirar com naturalidade. E, paradeixá-la ainda mais apreensiva, um murmurinho tomou conta do recinto...

Os Griffin tinham chegado todos juntos, e Sebastian tomava a iniciativa decumprimentar lorde e lady Tuffley e as demais pessoas ao redor dos anfitriões. Logo

atrás deles vinha a família de Caroline, com boa parte dos Witfeld e agregadosfazendo o possível para não se mostrarem intimidados pela suntuosidade que pairavapelo recinto.

Naquela noite o duque estava todo de preto novamente, e o corte perfeito dascalças e da casaca enfatizava sua compleição perfeita. No instante em que o olhar delee o de Josefina se cruzaram, todos os presentes simplesmente se afastaram. Nemmesmo o sempre tão altivo e seguro de si, Stephen Embry, atreveu-se a se colocar nocaminho dos dois.

Tão logo a alcançou, Sebastian tomou as mãos dela para levá-las aos lábios.

— Boa noite, Vossa Alteza.— Vossa Graça. — Reprimindo a vontade de se atirar nos braços dele e beijá-lo

diante de toda aquela multidão, Josefina perguntou num sussurro: — Você sabia quePrinny virá ao sarau?

— Não, mas imagino que ele vá querer dançar com você para celebrar o nossonoivado.

Ela entendeu o recado. Sebastian lhe dizia para continuar com a farsa junto aopríncipe.

— Desde que Sua Alteza esteja ciente de que a primeira valsa da noite já está

prometida.— A mim, suponho.

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Os convidados à volta de ambos sorriram, e os demais Griffin não demoraram ase acercar, cumprimentando Josefina e os Embry com elogios e votos de felicidades.Ela se sentiu mais forte e mais corajosa. Aquelas pessoas iriam ser a sua família e

faziam questão de demonstrar que a apoiavam. Por isso e tudo o mais, iria mostrar aeles que era digna da confiança que lhe empenhavam.Finda a valsa, Sebastian olhou rapidamente no relógio antes de ir levar Josefina

para junto dos pais. Com a mão dela em seu braço e os Embry ao lado de ambos, fezdiscreto aceno com a cabeça para Caroline, então viu sua cunhada ir ao encontro damãe e das duas irmãs solteiras para indagar:

— Anne, quando é que vai contar à mamãe a respeito de John?— John? — repetiu Joanna, enrubescendo. — Mas quem é esse John?— Um professor de Eton. — Anne começou a se abanar. — Eu o conheci no

Museu Britânico.— Mamãe, isso não é justo. — Joanna bateu o pé. — Agora até Anne tem umpretendente?

Enquanto Sally Witfeld unia as palmas das mãos como a agradecer aos céus pelabênção, Anne explicou:

— John foi explorador antes de aceitar o cargo de professor. Pedi a ele queviesse ao sarau, assim a senhora e o papai poderão conhecê-lo.

— Eu sabia que devia ter ido ao museu... — Joanna resmungou.— Ah, nada como ser jovem — comentou o rey com uma risadinha.

Ótimo. Ele prestava atenção à conversa.— Conheço esse moço — comentou Sebastian. — Parece ser boa pessoa. Umpouco sério em demasia, mas isso será um bom contraponto ao temperamentodispersivo de Anne. — O que não era nenhuma mentira.

— Senhoras e cavalheiros — anunciou o mordomo dos Tuffley —, Sua Alteza, opríncipe regente.

A multidão se curvou numa mesura que se estendeu até a entrada do salão, e opríncipe George adentrou o recinto, felizmente sem nenhuma das onipresentesamantes, mas trajado de azul-safira e rotundo como sempre, acompanhado por uma

dúzia de criados e camareiros. Embry certamente se roia de inveja.— Melbourne — cumprimentou o regente, com um sinal para que ele se

aproximasse.Sebastian o fez, levando Josefina junto.— Vossa Alteza, se pretende chamar minha atenção por não ter ido lhe contar a

novidade, faça-o sem delongas, assim poderemos tomar uma taça de champanhe emhomenagem à minha futura esposa.

— Que graça haveria em repreender os contritos, meu rapaz? — Prinny deu-lheum tapinha no ombro.

— Tuffley, mande servir o champanhe!— Imediatamente, Vossa Alteza.

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesaanos atrás, vi que o solo era muito produtivo, mas também constatei essa fertilidadese devia ao fato de que boa parte do país se assentava numa antiqüíssima embocadurade rio. Uma planície de aluvião. E com as chuvas torrenciais e as tempestades que

assolaram a costa, a...— Espere um pouco — interpôs Embry. — Que diabos acha que está...— Ouça isto, Vossa Majestade — apartou Sebastian.— John, sabendo do seu vínculo com as famílias Witfeld e Griffin, não  posso

deixar de lhe transmitir notícias desalentadoras. A caminho do Ocidente, o Barnaby teve de atravessar o mais terrível temporal de que tenho lembrança. Nosso mastro partiu-se em dois, e por um triz não perdemos tudo, inclusive nossas vidas. No entanto, saiba que só lhe digo isso como forma de prepará-lo para o pior.

A música cessou abruptamente, e Prinny, trazendo Josefina com a mão em seu

braço, acercou-se deles.— O que houve, Melbourne?— Estamos tentando descobrir, Vossa Alteza. — Mostrou a carta. — Permite-

me?— Sim, por favor.Após um olhar furtivo para Josefina, Sebastian retomou a leitura:— Os poucos sobreviventes que encontramos só haviam permanecido ali para 

procurar por parentes e pertences. Nós lhes demos o pouco de água e comida que tínhamos para dispor, e eles nos contaram os momentos de terror por que toda aquela 

área havia passado em decorrência de uma quinzena de tempestades inclementes e vendavais devastadores. Uma calamidade, meu amigo. E como se isso fosse pouco, as tormentas deixaram o mar tão encapelado que, por horas a fio, ondas gigantescas açoitaram o desafortunado país, do litoral até o sopé das montanhas a oeste. Não restou nada; segundo o relato dos sobreviventes, as águas levaram até mesmo a cidade onde esses pobres coitados viviam.

— Oh, não! — E, com o grito estrangulado, Josefina cobriu a boca com a mão.— Construções, vegetação, até mesmo o solo foi varrido para o oceano,

deixando em seu lugar nada além de um lodaçal sombrio e mal-cheiroso e inúmeros 

animais mortos. Dadas as dimensões da catástrofe, não seria demais supor que aquela área em breve se transforme em foco das mais variadas enfermidades.

— Stephen — disse Prinny com o semblante anuviado pelo pesar —, conte com amais sincera solidariedade da Inglaterra.

— Nem tudo são notícias tristes — Sebastian observou, examinando o verso dacarta. — Parece que Belize abriu os braços para os sobreviventes.

— Deus é misericordioso — afirmou Charlemagne num tom solene, juntando-seao grupo que não parava de crescer.

— Precisamos fazer alguma coisa. — Sebastian entregou a carta a Embry.

— Temos de aceitar a realidade — retrucou Josefina, a voz embargada. — CostaHabichuela se foi.

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Branco de raiva, o pai dela a encarou.— Como pôde...— Sim, temos de aceitar que nosso lar agora é Belize — interveio a rainha

Maria, tomando a mão do marido.— E agradecer a Deus pelas pessoas que compraram terras em CostaHabichuela e ainda não foram para lá.

— Sim, as pessoas em primeiro lugar — enfatizou Josefina. — Elas precisam terseus recursos de volta, já que, sem território, não há onde investir.

— Podemos reconstruir os...— Sobre o quê, papai? Você ouviu o que o amigo do professor escreveu. Não há

como erguer coisa alguma num pantanal.John Rice-Able limpou a garganta.

— Mayhew comentou que enviou uma cópia da carta a um amigo que temos emcomum, Robert Lumley, redator do London Times, como forma de garantir que ninguémembarcasse para Costa Habichuela sem saber o que houve por lá.

— Esse moço merece uma medalha — Prinny declarou, um comentário endossadopelo aceno afirmativo de boa parte dos presentes.

Enquanto anotava mentalmente de tomar as providências necessárias, uma vezque tal “moço” não existia, Sebastian cuidou de consolar Josefina com um abraço.

— Lamento muito, querida.— Bem, creio que não há mais nada a fazer por aqui — rosnou Embry, os

músculos ainda rígidos da fúria que o acometia. — Partiremos para Costa Habichuelaamanhã mesmo. Venham, Maria, Josefina. Temos de preparar a bagagem.Por pouco o coração de Sebastian não parou. Recompondo-se, ele afirmou:— Sei que é lá que se encontram as suas responsabilidades, Vossa Majestade, e

entendo a urgência de sua partida, mas também sei onde se encontra meu coração. SeJosefina ficar, não haveria por que postergar o casamento. Como já foi dito, nãoexiste mais um país a ser reerguido; já sua filha tem uma nova vida para começar.

Embry se surpreendeu ao perceber que, embora o plano inicial fosse fisgar oduque num matrimônio que lhes traria inúmeras vantagens, parecia haver sentimentos

verdadeiros entre sua filha e o noivo.— O que diz, Josefina?Porém ela não se dirigiu ao pai, e sim a Sebastian, para lembrá-lo num sopro de

voz:— Você disse que faria o pedido novamente.Ele não titubeou: apoiando-se num joelho, tomou-lhe a mão.— Josefina, pouco me importa que você seja a princesa de um paraíso ou a filha

de um soldado, cujo lar foi engolido pelo mar. Além de me provocar e me surpreender,você me mostrou que um sentimento que eu julgava perdido para sempre estava apenas

adormecido. Você me ajudou a redescobri-lo. — A voz lhe faltou, e ele limpou a

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Suzanne EnochClássicos Históricos n. 421 O Escândalo daPrincesagarganta. — Amo você, Josefina, com todo o ímpeto do sentimento recém-desperto nomeu coração. Quer se casar comigo? — Apesar das lágrimas, ela sorria.

— Também amo você, Sebastian. Muito. E quero ser sua esposa.

Retirando o anel de sinete com o timbre Melbourne do dedo, Sebastian ocolocou no dedo dela. Ficou grande demais, porém todos compreenderam o significadodo gesto, e o salão irrompeu em aplausos.

— Então nada mais importa. — Aprumou-se e a tomou nos braços. — Nada mais.

Quando chegou à residência dos Branbury na manhã seguinte, Sebastianencontrou os criados zanzando de lá para cá como formigas, carregando obscenaquantidade de bagagem para várias carruagens de aluguel. Quanto dos fundos daInglaterra Embry já não teria gastado?

Guardando o pensamento para si, beijou a mão de Josefina, que vinha recebê-lo.— Pensei em tentar persuadi-los a ficar — disse ela —, pelo menos até ocasamento, mas então me dei conta de que seria impossível. Houve uma catástrofe;eles têm de retornar o mais depressa a Costa Habichuela ou enfrentar umquestionamento interminável.

— Sinto muito. — Sebastian cumprimentou com um aceno o mordomo queempurrava uma pilha de caixas para que eles pudessem entrar. — Se fosse possível, eugostaria que eles ficassem. Por você.

— Quanta generosidade.

Sebastian ergueu a cabeça. Embry os olhava do alto da escadaria.— Vossa Majestade. — Contendo o sarcasmo, inclinou a cabeça por causa doscriados. — Espero que meus procuradores tenham sido úteis.

— Oh, sim. Tudo o que precisei fazer foi entregar o dinheiro e assinar uns cemdocumentos. — Afastou-se do balaústre. — Venham até meu gabinete.

Assim que entraram no escritório, Sebastian fechou a porta. E Embry nãoperdeu tempo a disparar:

— Você me deu um belo de um tombo, seu maldito arrogante. Parabéns! Noentanto, não foi só a mim que arruinou; duas dezenas de pessoas dependem dos meus

recursos para sobreviver. — Encarou a filha. — Por acaso pensou nelas, Josefina?Mas foi Sebastian quem respondeu:— Com dez mil libras por ano você terá condições não só de viver com conforto

onde quiser, mas também de garantir o bem-estar de todos os que o auxiliam no dia adia.

Um músculo tremeu sob um dos olhos de Embry. — Não gostaria de me dar ummomento a sós com a minha filha, Vossa Graça?

— Não.— Por favor. Eu queria me despedir.

— Muito bem, estarei no corredor. Mas depois disso ela irá comigo para a casada minha irmã, onde ficará até o casamento.

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Ao ouvir a porta se fechar com um suave clique às suas costas, Josefina foi logodizendo:

— Não quero brigar, papai; quero o seu bem. — Como passara a noite e a manhã 

inteira trancada no quarto, arriscou indagar: — Não vai me contar para onde pretendeir com mamãe?— Prússia, talvez; decerto eles irão gostar de ter uma colônia amiga na América

Central. — Ao vê-la arregalar os olhos, emendou com um meio sorriso: — Quase deucerto, não foi? Mas, desta vez, vou parar no empréstimo e nos títulos.

— Você podia ter sido preso, papai. E enforcado. Por que se arriscar nessaaventura de novo? Além do mais, Sebastian não cancelou as dez mil libras anuais quehavia lhe prometido; com esse dinheiro você poderia comprar terras ou fundar umaempresa de comércio.

— Não quero ficar sentando numa poltrona contando moedas. Dez mil libras éum bom começo, mas posso fazer melhor do que isso. — Fez um muxoxo. — Já que nãovai comigo para me ajudar, venha me dar um abraço. Temos de seguir para Brightonantes do anoitecer.

Josefina foi colocar os braços sobre os ombros dele.— Prometa que irá escrever, como fazia quando eu era menina. — Não que fosse

acreditar naquelas cartas, mas não queria ficar sem notícias.— Escreverei. — Esquivou-se dela. — Agora eu gostaria de ficar sozinho.Despedir-se de sua mãe foi ainda mais penoso, e não demorou muito para que as

duas estivessem em lágrimas.— Acho que seu pai ainda não se deu conta da sorte que tem — comentou Mariaao olhar pela janela e ver Sebastian caminhando pelo jardim. — Outra pessoa que não oduque de Melbourne não pensaria duas vezes antes de mandá-lo para a prisão.

— Já tentei dizer isso a papai de todas as maneiras possíveis, só que ele nuncame deu ouvidos.

— Deu, sim; o que ele não consegue é admitir que você está certa.Josefina tornou a abraçá-la.— Escreva para me dizer onde vocês estão, assim terei como escrever de volta.

— Certamente. Também viremos visitá-la sempre que possível. Quero que meusnetos conheçam a abuela.

— Eu também. — Endireitando-se, Josefina limpou a garganta. — Já vou indo,assim você termina de fazer as malas.

— Antes disso, diga a Melbourne que venha falar comigo, sim?Josefina fez que sim.Sebastian ergueu a cabeça ao perceber que ela se aproximava.— Você está bem?— Sim; um pouco triste, mas também esperançosa. — Josefina meneou a cabeça.

— É uma sensação estranha.— Que vai passar. — Sebastian tomou a mão dela para beijá-la. — Vamos?

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— Minha mãe quer vê-lo. Ela o aguarda na sala de estar.Dissimulando uma contração involuntária dos músculos, ele fez um aceno

afirmativo e foi levá-la até a carruagem antes de tornar a entrar no casarão.

Maria Embry o esperava junto à pequena escrivaninha.— A senhora deseja falar comigo?— Sim. Tenho algo para lhe dar. — E estendeu um papel para ele.Sebastian foi apanhá-lo com o cenho franzido.— Do que se trata?— Leia.Com parte da atenção voltada à mãe de Josefina, ele passou os olhos pelo

documento. Em seguida o leu com calma. Por fim, tornou a relê-lo compenetradamentee, com o coração aos saltos, voltou o olhar a Maria.

— Isto aqui é válido?— Sim. — Ela sorriu, um sorriso cativante que fazia lembrar sua filha. — Hásomente duas vias desse documento. Uma delas é sua.

— Josefina sabe disso?— Sempre soube, porém nunca acreditou. — Maria beijou-o no rosto. — Não é

nenhum segredo, mas ela certamente irá gostar de ouvi-lo dos seus lábios.— Obrigado.— Sou eu quem agradece, pois você está dando à minha filha a vida que eu

sempre quis que ela tivesse.

Meio atordoado, Sebastian despediu-se e voltou para a carruagem.— Vamos para a Mansão Corbett — disse a Tollins, então fechou a porta doveículo e se acomodou sobre o coxim, ignorando Conchita, encolhida num canto, parafitar sua amada. — O que acha de fazermos o baile de noivado daqui a uma quinzena eo casamento uma semana após o baile?

— Não é tão cedo quanto eu gostaria, mas posso esperar até lá. — Josefinaafagou o rosto dele. — Você está bem? Minha não o estapeou, não é?

— Não fisicamente. — Bateu de leve no bolso do peito, onde guardara odocumento que iria para o cofre na primeira oportunidade. — Tudo indica que seu pai

realmente conheceu Qental, o rei da Costa dos Mosquitos, que de fato deu a elequatro mil quilômetros quadrados de terras naquela região, concedendo-lhe o título derey da área outorgada.

Ela ficou branca.— Portanto, meu amor, você é  princesa. — Segurando o rosto dela, beijou-a

apaixonadamente. Deus, mal podia crer que iria passar o resto de seus dias cobrindo-ade beijos.

— O que foi que você disse?— O documento que sua mãe me deu foi conferido e validado pelo governador de

Belize. Conheço o timbre dele, que está impresso na outorga em meu bolso.

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— Santo Deus... E eu que pensei que fosse ser mera e simples duquesa. — Foi avez de Josefina beijá-lo, acariciando-lhe os cabelos como se quisesse se perderdentro dele. — Sua família não precisa saber disso, precisa?

Sebastian riu.— Não. Você será duquesa. A minha duquesa. E quanto ao “mera e simples”... Nãocreio que você fosse conseguir.

— Então nem vou tentar.

FimFim