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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS CEJURPS CURSO DE DIREITO A APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPADA EM SEDE DE REVISÃO CRIMINAL FERNANDA MORALES JUSTINO Itajaí (SC), junho de 2010.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

A APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPADA EM SEDE DE REVISÃO CRIMINAL

FERNANDA MORALES JUSTINO

Itajaí (SC), junho de 2010.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

A APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA TUTELA ANTECIPADA EM SEDE DE REVISÃO CRIMINAL

FERNANDA MORALES JUSTINO

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientador: Professor Fabiano Oldoni

Itajaí (SC), junho de 2010.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus, por ter me dado

força para vencer os obstáculos que me foram

apresentados durante essa jornada e por ter me

dado saúde para aproveitar todos os bons

momentos até então vividos.

Agradeço à minha família e aos meus amigos que,

de diferentes formas, me auxiliaram e me apoiaram

em toda essa trajetória. Sou eternamente grata a

Deus por tê-los em minha vida e por poder

compartilhar conquistas como essa com pessoas tão

especiais.

Agradeço, especialmente, à minha mãe, que sempre

empreende todos os esforços para que eu alcance

meus objetivos, sejam eles universitários ou não.

Agradeço também ao meu orientador que, ao sugerir

o tema do presente trabalho, acreditou em minha

capacidade e me auxiliou no que foi preciso.

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DEDICATÓRIA

Além de merecer agradecimento especial, a

dedicatória do presente trabalho não poderia ser à

outra pessoa que não fosse minha mãe, a maior

responsável por minha formação e, além de tudo,

minha amiga, companheira e meu espelho, cuja

participação, nos mais diversos e importantes

momentos da minha vida, sempre foi determinante.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade sobre ele.

Itajaí (SC), junho de 2010.

Fernanda Morales Justino Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Fernanda Morales Justino, sob o título

“A Aplicação do Instituto da Tutela Antecipada em Sede de Revisão Criminal”, foi

submetida em 8 de junho de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: Fabiano Oldoni (orientador e presidente da banca) e Rogério Ristow

(examinador), e aprovada com a nota .

Itajaí, junho de 2010.

Professor Fabiano Oldoni Orientador e Presidente da Banca

Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF Constituição Federal

CPC Código de Processo Civil

CP Código Penal

CPP Código de Processo Penal

LICC Lei de Introdução ao Código Civil

TJPR Tribunal de Justiça do Paraná

TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais:

Analogia: “É interpretação que foge à lógica restritiva e gramatical do dispositivo

legal, e é promovida em face de outros dispositivos, que regulam casos idênticos ao

da controvérsia. [...] A analogia mostra sempre a utilização subsidiária de outro

dispositivo, para interpretar-se outro ou ser usado em relação jurídica, semelhante a

ela, quando não tem dispositivo próprio que a regule1”.

Cautelar: Instituto com “função predominantemente conservativa, uma vez que não

adianta ao requerente a possibilidade de usufruir do bem da vida pretendido no

processo principal. Garante, fundamentalmente, que o bem pretendido não venha a

desaparecer e, com isso, comprometer a utilidade da prestação jurisdicional”2.

Dano irreparável ou de difícil reparação: consiste no “risco concreto (e não o

hipotético ou eventual), atual (= o que se apresenta iminente no curso do processo)

e grave (= o potencialmente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado

pela parte)”3.

Fungibilidade: “no processo civil refere-se sempre a duas ou mais coisas que

constituam uma pretensão. Em tese, por força do princípio da adstrição do pedido,

postulada uma, o juiz não poderia conceder a outra, sob pena de sua decisão ser

„extra petita‟. Mas, quando elas são fungíveis entre si, a lei permite que, postulada

uma, o juiz conceda outra, sem risco de nulidade ou vício da decisão”4.

Interpretação Extensiva: Espécie de interpretação utilizada quando “o significado

das palavras utilizadas não corresponde, por menos amplo, ao que a norma

pretende”5.

1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 26. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2005. p. 106.

2 DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo CIivl. Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. São Paulo : Saraiva, 2006. v. 1.p. 314.

3 ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 5. ed. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 77.

4 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. 4. ed. São Paulo : Saraiva, 2007.v. 1. p. 309.

5 TELES, Ney Moura. Direito penal – parte geral. São Paulo : Atlas, 2004. v. 1. p. 142.

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Liminar: providência acautelatória concedida em ações cautelares, quando há “risco

de dano imediato que afeta o interesse litigioso da parte e que compromete a

eventual eficácia da tutela definitiva a ser alcançada no processo de mérito”6.

Prova Inequívoca: Prova robusta, que, embora no âmbito de cognição sumária,

aproxime, em segura medida, o juízo de probabilidade do juízo de verdade7.

Revisão Criminal: É o meio de que se vale o condenado para desfazer injustiças e

erros judiciários, relativamente consolidados por decisão transitada em julgado, ou

então, é um remédio jurídico-processual-último que dispõe o condenado para que

seja reexaminada, a seu favor, a sentença condenatória definitiva e injusta8.

Tutela Antecipada: Consiste na “antecipação da própria pretensão material

traduzida no pedido, tendo conteúdo substancial, havendo, no todo ou em parte,

coincidência entre o conteúdo do provimento liminar (decisão) e o provimento

definidor da lide (sentença)9.

Verossimilhança: É um juízo emitido não sobre o fato, e sim sobre a afirmação do

fato, ou seja, acerca da alegação (positio) do fato proveniente da parte que pede

para ser admitida a prova e que o afirma como historicamente já ocorrido10.

6 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutelas de urgência. 41. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2007. v. II.

7 ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 5. ed. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 80.

8 CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. São Paulo : Juarez de Oliveira, 2005. p. 12.

9 CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada: Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. 4. ed. Curitiba : Juruá, 2006.

10 CALAMANDREI, Piero. Instituições de Direito Processual Civil. Traduzido por Douglas Dias Ferreira. 2. ed. Campinas : Bookseller, 2003. p. 283.

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SUMÁRIO

RESUMO.......................................................................................... XII

INTRODUÇÃO .................................................................................. 13

CAPÍTULO 1 ..................................................................................... 15

DA TUTELA ANTECIPADA .............................................................. 15

1.1 BREVE HISTÓRICO ...................................................................................... 15

1.2 CONCEITO .................................................................................................... 16

1.3 REQUISITOS PARA A SUA CONCESSÃO .................................................. 17

1.3.1 Requerimento da Parte ............................................................................. 17

1.3.2 Prova Inequívoca ....................................................................................... 18

1.3.3 Verossimilhança da Alegação .................................................................. 19

1.3.4 Dano Irreparável ou de Difícil Reparação ................................................ 20

1.3.5 Abuso de Direito de Defesa e Manifesto Propósito Protelatório do Réu ............................................................................................................................. 22

1.3.6 Do Pedido Incontroverso .......................................................................... 24

1.4 DA REVERSIBILIDADE DO PEDIDO............................................................ 26

1.5 EFETIVAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA ................................................... 27

1.6 MOMENTO DA CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA ......................... 28

1.7 ANTECIPAÇÃO DA TUTELA E EFEITOS DA APELAÇÃO ......................... 30

1.8 TUTELA ANTECIPADA X TUTELA CAUTELAR .......................................... 32

1.9 FUNGIBILIDADE ENTRE TUTELA ANTECIPADA E TUTELA CAUTELAR 33

CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 37

DA REVISÃO CRIMINAL .................................................................. 37

2.1 A REVISÃO CRIMINAL NO BRASIL............................................................. 37

2.2 NATUREZA JURÍDICA .................................................................................. 38

2.3 CONDIÇÕES DE PROCEDIBILIDADE.......................................................... 40

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2.3.1 Legitimidade .............................................................................................. 40

2.3.1.1 Legitimidade Ativa .............................................................................................40 2.3.1.2 Legitimidade Passiva .........................................................................................42

2.3.2 Interesse de Agir ....................................................................................... 44

2.3.3 Possibilidade Jurídica do Pedido ............................................................ 44

2.4 PRAZO ........................................................................................................... 45

2.5 HIPÓTESES DE ADMISSIBILIDADE ............................................................ 46

2.5.1 Sentença Condenatória Contrária ao Texto Expresso da Lei Penal ou à Evidência dos Autos .......................................................................................... 47

2.5.2 Sentença Condenatória Fundada em Depoimentos, Exames ou Documentos Comprovadamente Falsos .......................................................... 49

2.5.3 Novas Provas da Inocência do Condenado ou de Circunstância que Determine ou Autorize Diminuição Especial da Pena, Descobertas Após a Sentença ............................................................................................................. 50

2.6 COMPETÊNCIA ............................................................................................. 51

2.7 PROCESSAMENTO ...................................................................................... 51

2.8 A REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA......................................................... 55

2.9 A REVISÃO E A DECISÃO DO JÚRI ............................................................ 56

2.10 A REVISÃO PRO SOCIETATE ................................................................... 58

2.11 A INDENIZAÇÃO POR ERRO JUDICIÁRIO ............................................... 59

CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 62

APLICAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA NA REVISÃO CRIMINAL62

3.1 RELAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL PENAL COM O DIREITO PROCESSUAL CIVIL .......................................................................................... 62

3.2 DA APLICAÇÃO ANALÓGICA ..................................................................... 63

3.3 DA INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA ............................................................. 65

3.4 DAS DIFERENÇAS ENTRE ANALOGIA E INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA ............................................................................................................................. 66

3.5 IMPORTÂNCIA DA APLICAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA NA REVISÃO CRIMINAL ............................................................................................................ 67

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3.6 APLICAÇÃO PRÁTICA DA TUTELA ANTECIPADA NA REVISÃO CRIMINAL ............................................................................................................ 69

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 76

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 78

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RESUMO

O presente trabalho tem como tema a aplicação da tutela

antecipatória em sede de revisão criminal. Inicialmente, discorrer-se-á sobre o

instituto da tutela antecipada, previsto no Código de Processo Civil, cujo objetivo é

antecipar os efeitos da pretensão principal de um processo. Posteriormente, será

abordada a ação revisional, a qual é o instrumento hábil para obter a revisão de uma

sentença penal condenatória, já transitada em julgado, que seja injusta. Por fim, será

analisada a possibilidade, de acordo com entendimentos jurisprudenciais e

doutrinários, da aplicação da tutela antecipatória na revisão criminal, por meio da

analogia, tendo em vista a ausência de previsão legal específica acerca do tema.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a análise da aplicação

da tutela antecipada em sede de revisão criminal.

O seu objetivo é verificar se a tutela antecipatória, embora se

trate de instituto de direito processual civil, pode ser aplicada na ação revisional. A

importância do tema decorre do fato de que, caso tal possibilidade seja possível,

aqueles injustamente condenados poderão reaver sua liberdade e/ou dignidade sem

necessitar esperar o trânsito em julgado da sentença da revisão criminal.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, discorrendo sobre a

tutela antecipada, explanando acerca de seu histórico, conceito, requisitos e

pressupostos, assim como do momento para sua concessão, do efeito que gera em

caso de interposição do recurso de apelação, além de suas diferenças em relação

às cautelares, também consideradas tutelas de urgência, e da fungibilidade existente

entre ambas as medidas.

O Capítulo 2 trata da revisão criminal, trazendo seu breve

histórico no Brasil, sua natureza jurídica, suas condições de procedibilidade, seu

prazo, suas hipóteses de admissibilidade, a competência para processá-la e julgá-la,

seu processamento, a vedação da reformatio in pejus indireta, seu cabimento no

caso de decisão proferida pelo Tribunal do Júri, abordando também a revisão pro

societate e a indenização por erro judiciário.

No Capítulo 3, aborda-se a aplicação da tutela antecipada na

revisão criminal, recordando o caso dos irmãos Naves, vítimas de um dos maiores

erros judiciários brasileiros, e explicando sobre a relação dos direitos processuais

civil e penal, a aplicação analógica e a interpretação extensiva, assim como suas

diferenças, e o entendimento dos tribunais e da doutrina acerca da possibilidade, ou

não, da aplicação da tutela antecipatória em sede de ação revisional.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados os pontos conclusivos

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destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre a aplicação do instituto da tutela antecipada na revisão criminal.

Para a presente monografia, foi levantada a seguinte hipótese:

É possível a aplicação da antecipação da tutela na revisão

criminal.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação11, foi utilizado o Método Indutivo12, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano13, e o Relatório dos Resultados, expresso na presente

Monografia, é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente14, da Categoria15, do Conceito Operacional16 e da Pesquisa

Bibliográfica17.

11

“[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

12 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.

13 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

14 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.

15 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.

16 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.

17 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.

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CAPÍTULO 1

DA TUTELA ANTECIPADA

1.1 BREVE HISTÓRICO

O instituto da tutela antecipada, atualmente previsto no artigo

273 do Código de Processo Civil (CPC), foi surgindo paulatinamente no

ordenamento jurídico brasileiro.

Primeiramente, sua concessão era permitida somente a

hipóteses específicas, de procedimento especial, cuja lei correspondente a previsse

expressamente, como é o caso da ação de alimentos e das possessórias de força

nova.

Posteriormente, o Código de Defesa do Consumidor também

passou a prever a possibilidade de antecipação da tutela, mas somente nos casos

de obrigações de fazer e de não fazer.

Apenas no ano de 1994, a Lei 8.952, que alterou o artigo 273

do CPC, passou a admitir a possibilidade da concessão de antecipação da tutela em

todos os processos de conhecimento, estando tal instituto, atualmente, previsto nos

seguintes termos:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

§ 1º Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.

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§ 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

§ 3º A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A.

§ 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. § 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.

§ 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.

§ 6º A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.

§ 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.

Impende frisar que o parágrafo 3º do referido artigo teve sua

redação modificada pela Lei 10.444/02, bem como os parágrafos 6º e 7º foram

acrescentados por dito instrumento legal.

1.2 CONCEITO

A tutela antecipada pode ser entendida, conforme leciona

Gonçalves18, como a “possibilidade de antecipação, total ou parcial, dos efeitos da

própria sentença. Com isso, satisfaz-se provisoriamente a pretensão posta em

juízo”.

Complementando referido ensinamento, Marinoni19 ensina que

a antecipação da tutela “produz o efeito que somente poderia ser produzido ao final”,

permitindo “que sejam realizadas antecipadamente as consequências concretas da

sentença de mérito”.

18

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. 4. ed. São Paulo : Saraiva, 2007. v.1. p. 297.

19MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. 9. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 50.

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17

O instituto em estudo somente é cabível nos processos de

conhecimento, independente do procedimento adotado, visto que no processo de

execução, de acordo com Gonçalves20, “o titular do direito já tem os meios

suficientes para torná-lo concreto”.

Ainda é importante salientar, a respeito da tutela antecipatória,

que esta é dotada das características da temporariedade e da precariedade, tendo,

portanto, eficácia limitada no tempo e podendo, a qualquer momento, ser

modificada.

1.3 REQUISITOS PARA A SUA CONCESSÃO

1.3.1 Do Requerimento da Parte

Extrai-se do caput do artigo 273 do Código de Processo Civil

que, presentes os requisitos, “o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar,

total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial [...]” (grifou-

se).

Dessa forma, não poderá o magistrado conceder a antecipação

da tutela de ofício.

Para postular o pedido, considera-se parte, em consonância

com o que explica Zavascki21, “quem está postulando a tutela definitiva cujos efeitos

se busca antecipar”.

Contudo, nesse conceito há certa divergência entre

doutrinadores, acerca da possibilidade ou não de o réu, como parte passiva do

processo, requerer tutela antecipatória.

Alguns doutrinadores, como Humberto Theodoro Júnior, Teori

Albino Zavascki e Luiz Rodrigues Zambier et al., entendem que só é possível nas

hipóteses de reconvenção ou de resposta em ação de natureza dúplice, como é o

caso das ações possessórias, divisórias etc.

20

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. p. 298-299.

21ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 5. ed. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 116.

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18

Porém, parafraseando Theodoro Júnior22, nesses casos, o réu

deixa de ser apenas réu e assume também a posição de autor, pois, caso contrário,

somente resistiria passivamente ao pedido por este formulado.

Por outro lado, Marinoni23 defende a ideia de que é possível o

pedido de tutela antecipatória por parte do réu, pois este, “ao solicitar a rejeição do

pedido formulado pelo autor, requer tutela jurisdicional”.

Dessa forma,

o réu também poderá, em tese, solicitar a tutela antecipatória na ação declaratória de ilegitimidade de ato se, em face do caso concreto, estiverem presentes circunstâncias que façam crer que o autor praticará atos que impedirão o réu de praticar o ato que supõe legítimo.

Por fim, no que se refere ao pedido, esclarece-se que este é

formulado no âmbito da própria ação, na qual se objetiva antecipar os efeitos da

tutela jurisdicional pretendida.

1.3.2 Da Prova Inequívoca

Um dos requisitos de maior importância para a concessão da

tutela antecipada é a prova inequívoca. Tal conceito deve ser analisado

conjuntamente a outro requisito, que é a convicção da verossimilhança da alegação,

que o magistrado deve ter na hora de analisar o pedido.

Logicamente, o que se exige não é uma prova de verdade

absoluta, mas, de acordo com Zavascki24, “uma prova robusta, que, embora no

âmbito de cognição sumária, aproxime, em segura medida, o juízo de probabilidade

do juízo de verdade”.

Nas palavras de Theodoro Júnior25, tal expressão deve ser

entendida como a prova que, “por sua clareza e precisão, autorizaria, desde logo,

22

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 41. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2007. p. 419.

23MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 183.

24ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 80.

25THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil; Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. p. 420.

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um julgamento de acolhida formulado pelo autor (mérito), se o litígio,

hipoteticamente, devesse ser julgado naquele instante”.

Todavia, Marinoni26 discorda do aludido entendimento,

defendendo a tese de que exigir a mesma convicção que a decisão definitiva seria

um equívoco, inclusive contrariando o texto legal, que exige a mera convicção de

verossimilhança.

Sustentando o acima exposto, Carreira Alvim27 esclarece que:

A expressão prova inequívoca deve ser entendida em termos, porquanto, se “inequívoco” traduz aquilo que não é equívoco, ou o que é claro, ou o que é evidente, semelhante qualidade nenhuma prova, absolutamente nenhuma, possui, pois, toda ela, qualquer que seja sua natureza, deve passar pelo crivo do julgador. E se assim é, a conclusão que se impõe é a de que a prova pode ingressar no processo como “inequívoca”, e ser tida, depois de encerrada a instrução, como a mais equívoca e imprestável delas.

Portanto, basta uma prova que demonstre ser provável o fato

alegado pelo autor para que se torne possível a concessão da antecipação da tutela.

1.3.3 Da Verossimilhança da Alegação

Por fim, o caput do artigo 273 do CPC dispõe o outro requisito

indispensável para a concessão da tutela antecipada, que é a convicção da

verossimilhança da alegação, consistente na possibilidade de o juiz proferir uma

decisão com fundamento em uma cognição não exauriente dos fatos.

De forma mais detalhada, o doutrinador espanhol Piero

Calamandrei28 ensina que a verossimilhança “é um juízo emitido não sobre o fato, e

sim sobre a afirmação do fato, ou seja, acerca da alegação (positio) do fato

proveniente da parte que pede para ser admitida a prova e que o afirma como

historicamente já ocorrido”.

26

MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 214.

27CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada – Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. 4. ed. Curitiba : Juruá, 2006. p. 29.

28CALAMANDREI, Piero. Instituições de Direito Processual Civil. Traduzido por Douglas Dias Ferreira. 2. ed. Campinas : Bookseller, 2003. p. 283.

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Ainda sobre o tema, Zavascki29 explica que:

Diferentemente do que ocorre no processo cautelar (onde há juízo de plausibilidade quanto ao direito e de probabilidade quanto aos fatos alegados), a antecipação da tutela de mérito supõe verossimilhança quanto ao fundamento de direito, que decorre de (relativa) certeza quanto à verdade dos fatos.

Por seu turno, novamente defende Marinoni que, para que seja

possível a concessão da tutela antecipatória, basta a verossimilhança

preponderante, o que significa dizer que ao juiz é permitido:

sacrificar o improvável em benefício do provável. E nem poderia ser diferente, mesmo que não houvesse tal expressa autorização, pois não há racionalidade em negar tutela a um direito que corre o risco de ser lesado sob o argumento de que não há convicção de verdade.

Assim, diante da prova apresentada, o magistrado formará seu

convencimento acerca da verossimilhança da alegação do autor do pedido,

concedendo ou não, a tutela requerida.

1.3.4 Do Dano Irreparável ou de Difícil Reparação

Além dos requisitos já elencados, o dano irreparável ou de

difícil reparação é um dos pressupostos para a concessão da antecipação da tutela,

conforme prevê o inciso I do artigo 273 do CPC.

Novamente, Carreira Alvim30 ensina que:

O receio aludido na lei traduz a apreensão de um dano ainda não ocorrido, mas prestes a ocorrer, pelo que deve, para ser fundado, vir acompanhado de circunstâncias fáticas objetivas, a demonstrar que a falta da tutela dará ensejo à ocorrência do dano, e que este será irreparável ou, pelo menos, de difícil reparação.

Conforme explica Marinoni31, também serão danos de difícil

reparação se “as condições econômicas do réu não autorizam supor que o dano

29

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 79.

30CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada. Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. p. 96.

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será efetivamente reparado” ou “se dificilmente poderá ser individualizado ou

quantificado com precisão”.

Ainda segundo o autor, o dano pode se referir a direitos de

ordem não patrimonial (como o direito à imagem), patrimonial com função não

patrimonial (soma em dinheiro necessária para aliviar um estado de necessidade

causado por um ilícito, por exemplo) e, ainda, meramente patrimonial, desde que

não possa ser efetivamente tutelado através da reparação em pecúnia.

Insta salientar ainda, consoante Marinoni, que, tratando-se de

tutela de soma, esta somente será admissível:

para impedir prática de dano que não ocorreria se o demandado não houvesse cometido o ato que se pretende ver como corrigido pela tutela final. Ou melhor: se o dano temido não tem relação com o ato praticado pelo demandado, a antecipação da tutela não pode ser concedida.

Sendo a tutela antecipada fundamentada no inciso I do art. 273

do CPC, diz-se que se trata, de acordo com Destefenni32, de “antecipação-remédio”

ou de “antecipação assecuratória”, nas palavras de Zavascki33, segundo o qual

“adianta-se provisoriamente a tutela pretendida pelos autos como meio de evitar

que, no curso do processo, ocorra o perecimento ou a danificação do direito

afirmado”.

Para que se configure o risco de dano irreparável ou de difícil

reparação, deve haver, como explica novamente Zavascki:34

risco concreto (e não o hipotético ou eventual), atual (= o que se apresenta iminente no curso do processo) e grave (= o potencialmente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco, mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela. É conseqüência lógica do princípio da necessidade.

31

MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 195.

32DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil. Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. São Paulo : Saraiva, 2006. v. 1. p. 318.

33ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 77.

34ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 80.

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Em se tratando de receio de índole subjetiva, Carreira Alvim35

defende que este deve ser analisado, no caso de pessoa física, “em função da

idade, do sexo, da instrução e da condição social de quem o experimenta, [...] não

podendo tais circunstâncias ser desconsideradas, sob pena de se negar a tutela a

quem esteja em condições de merecê-la”.

Portanto, verifica-se que o artigo 273, I, do CPC, serve para

evitar que situações de dano, seja ele irreparável ou de difícil reparação, coloquem

em risco a eficácia e finalidade do processo e prejudiquem o direito pleiteado pelo

autor.

1.3.5 Do Abuso de Direito de Defesa e Manifesto Propósito Protelatório do Réu

Presente no inciso II do artigo 273, o abuso do direito de

defesa por parte do réu, ou seu manifesto propósito protelatório, é outro motivo pelo

qual se permite requerer a antecipação da tutela.

Entende-se, como abuso do direito de defesa, a defesa

inconsistente, ou seja, aquela que não torna o fato controvertido, enquanto o

manifesto propósito protelatório pode ser visto como a intenção do réu de tão-

somente retardar o andamento do processo, ao solicitar, por exemplo, a produção

de provas impertinentes ou ao suscitar incidentes processuais descabidos. E é

justamente por isso que o autor, ao deparar-se diante dessa situação, pode recorrer

à antecipação da tutela.

Nestes casos, inverte-se o ônus do tempo do processo e, em

decorrência disso, de acordo com Destefenni, tais situações podem se denominar

“antecipação-sanção”, ou, como diz Zavascki36, “antecipação punitiva”, pois,

segundo este:

Embora não se trate propriamente de uma punição, dado que sua finalidade tem o sentido positivo de prestar jurisdição sem protelações indevidas, a medida guarda semelhança, no que diz com as respectivas causas determinantes, com as penalidades impostas

35

CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada. Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. p. 96-97.

36ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 78.

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a quem põe obstáculos à seriedade e à celeridade da função jurisdicional, previstas no Código de Processo Civil.

De outra banda, Wambier37 entende não se trata de uma

punição e, por essa razão, não há que se analisar o dolo do réu, mas somente o

exame objetivo de sua defesa.

Independente dessa divergência, certo é que, conforme lembra

Carreira Alvim38:

Até a reforma do Código, esse ônus vinha pesando sobremaneira sobre o autor, embora o percurso que a lei lhe impunha percorrer, pela via do procedimento ordinário, resultasse, na verdade, em benefício exclusivo do réu. O status quo era quase sempre mantido em proveito deste, salvas as hipóteses legais de cabimento de medida cautelar initio litis. Essa técnica permite distribuir esse peso, proporcionando ao réu maiores oportunidades de defesa, no processo de conhecimento, mas garantindo ao autor a faculdade de pedir a antecipação da tutela, com o que neutraliza o prejuízo que para ele pudesse resultar do “tempo” no processo.

Novamente, Wambier esclarece que o inciso II foi criado para

ser aplicado nas situações em que “a probabilidade de que o autor tenha razão no

que pede é tão mais alta [...], que se constata ser um gravame desproporcional ao

autor ter de arcar com o peso da demora do processo”, visto que, consoante

Marinoni39, a defesa só é direito “nos limites em que é exercida de forma racional e

justa ou nos limites em que não retarda, indevidamente, a realização do direito do

autor”.

Ainda sobre o tema, há que ser salientado que não se pode

confundir a conduta descrita no artigo 273, § 6º, com a litigância de má-fé, não

bastando, segundo Marinoni40, “que o comportamento do réu configure hipótese

descrita no inciso IV ou no inciso VI do art. 17 do Código de Processo Civil. Não é a

indevida retenção dos autos, por exemplo, que autoriza a antecipação”, pois a

37

WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. 9. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2007. p. 323.

38CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada. Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. p. 99.

39MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 343.

40MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 347.

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conduta, para justificar a tutela antecipada, deve ter “relação com a evidência do

direito do autor e com a fragilidade da resistência do réu”.

Dessa forma, o magistrado, ao verificar que o réu, por meio de

seus atos, não demonstra qualquer interesse no andamento do processo e utiliza

instrumentos infundados com a finalidade de retardá-lo, poderá conceder ao autor a

tutela antecipatória.

1.3.6 Do Pedido Incontroverso

Outro caso em que se permite a antecipação da tutela é

quando o pedido formulado pelo autor for incontroverso. Prevê o artigo 273, § 6º,

que “a tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos

pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso”.

Por “incontroverso”, entende-se, de acordo com Wambier41,

aquele pedido que não foi impugnado ou que já foi suficientemente comprovado,

coincidindo com as situações que permitem o julgamento antecipado da lide.

Contudo, explica, sua peculiaridade decorre do fato de que, em relação à outra parte

do objeto do processo, ainda deve ocorrer a instrução probatória, enquanto o objeto

do pedido de tutela antecipada já deve ter sido conhecido de forma exauriente.

Complementado o ensinamento supracitado, Dinamarco42

explica que “quando essa incontrovérsia abranger todos os fatos relevantes para

julgar o meritum causae¸ daí decorre a total desnecessidade de provar e o juiz

estará autorizado a antecipar o próprio julgamento da causa, mediante sentença”.

Fácil é perceber o porquê da possibilidade da concessão da

antecipação da tutela nos casos do § 6º do artigo 273: inexiste motivo que justifique

a espera do autor de alcançar um pedido pretendido que não foi, sequer, contestado

pelo réu.

41

WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. p. 323.

42DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da reforma. 6. ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2003. p. 94.

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É de suma importância trazer à baila os ensinamentos de

Dinamarco43, referentes às situações abarcadas pelo § 6º, visto que:

A redação desse dispositivo poderia dar a falsa impressão de que ele se aplicaria exclusivamente quando no processo houvesse dois ou mais pedidos cumulados pelo autor; ou seja, a falsa idéia de não ser possível antecipar a tutela com fundamento na incontrovérsia, quando o pedido for único ou quando também o réu houver formulado uma demanda a ser decidida conjuntamente (reconvenção, pedido contraposto). A leitura do § 6º deve no entanto ser mais rica, de modo a otimizar os benefícios que ele pode gerar, em coerência com os pilares sistemáticos do processo civil de resultados.

Assim, explana Destefenni44 que são duas as situações

admitidas pela lei: “a) quando houver cumulação de pedidos e um dos pedidos se

tornar incontroverso; b) quando houver um único pedido, mas parte desse pedido

tornar-se incontroversa”.

Apesar de inovador, Dinamarco45 lamenta o fato de o legislador

não querer ousar mais e permitir um parcial julgamento antecipado do mérito, como

ocorre no direito processual italiano. Defende o doutrinador que “a rigidez do

procedimento brasileiro, no qual o mérito deve ser julgado em sentença e a sentença

será sempre uma só no processo [...] é somente um dogma estabelecido no direito

positivo, que bem valia a pena desmitificar”.

Pelo exposto, havendo requerimentos cuja produção de provas

já se exauriu, enquanto outros permanecem com a dilação probatória inacabada, o

magistrado poderá conceder a antecipação da tutela em relação àqueles, por meio

de decisão interlocutória, e continuar, em relação a estes, seguindo com o

andamento do processo.

43

DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da reforma. p. 94.

44DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil. Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. p. 319.

45DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da reforma. p. 96.

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26

1.4 DA REVERSIBILIDADE DO PEDIDO

Previsto no § 2º do artigo 273 do CPC, a reversibilidade é outro

elemento indispensável para que se efetive a antecipação da tutela.

Contudo, a questão em análise não é pacífica, apesar de a

maioria dos autores assim o entender.

O doutrinador Marinoni, por exemplo, entende que a

irreversibilidade do provimento não pode servir como um obstáculo para um

magistrado conceder a antecipação da tutela. Alega o autor que:

Em determinados casos, não só a concessão, como também a negação de uma liminar pode causar prejuízos irreversíveis. Admitir que o juiz não pode antecipar a tutela, quando a antecipação é imprescindível para evitar um prejuízo irreversível ao direito do autor, é o mesmo que afirmar que o legislador obrigou o juiz a correr o risco de provocar um dano irreversível ao direito que justamente lhe parece mais provável.

Da mesma forma entende Dinamarco46, dando como exemplo

o caso em que a antecipação é concedida com fundamento no pedido incontroverso.

Nessa conjuntura:

A probabilidade de acerto é superlativamente grande, em face da presunção de veracidade dos fatos alegados e consequente dispensa de prova [...] – e, como a possibilidade de revogação da medida antecipatória é muito reduzida nesses casos, na mesma proporção reduzem-se os riscos inerentes à irreversibilidade.

Já entre aqueles que defendem a ideia de que a tutela

antecipada deve ser reversível, encontra-se o doutrinador Wambier47, que explica,

de forma mais minuciosa, tal característica. Diz o doutrinador que “essa

reversibilidade que exige a lei pode ser in natura, o que é sempre preferível. O que

se deseja é que seja possível a volta ao statu quo ante, que haja reposição do

estado das coisas tal qual estas existiam antes da providência”.

46

DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da reforma. p. 97.

47WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil.Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. p. 329.

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27

Esclarece ainda Wambier que, por outro lado, também se

considera reversível “o provimento (reversíveis os seus efeitos), toda vez que puder

haver indenização e que esta seja capaz de efetivamente compensar o dano

sofrido”.

Isso porque, de acordo com esse pensamento, por se tratar de

medida provisória, concedida antes da sentença definitiva, é de suma importância

que, no caso de revogação, a situação volte ao estado em que se encontrava antes

da decisão que concedeu a tutela antecipada.

1.5 EFETIVAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

Está previsto, no art. 273, § 3º, do CPC, que “a efetivação da

tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas

previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A”.

Para que a antecipação da tutela se materialize, não é

necessário que se constitua nova relação processual. A decisão que a concede,

segundo Destefenni48, “comporta realização imediata. Isto é, a decisão interlocutória

que antecipa a tutela jurisdicional não é sentença e, não obstante, pode dar ensejo à

execução, mais especificamente, execução provisória”.

Extrai-se do § 3º do art. 273 que a natureza do objeto da tutela

antecipada concedida determinará quais as normas que deverão ser observadas.

Sobre a questão, Zavascki49 explica que:

Considerando a natureza da providência a ser atendida, se ela consistir em prestação de fazer ou de não fazer, o seu cumprimento observará o que estabelecem os §§ 4º e 5º do art. 461. O mesmo procedimento será adotado em se tratando de prestação de entregar coisa, conforme prevê o § 3º do art. 461-A. Já em se tratando de prestação de pagar quantia, a medida antecipatória será cumprida observando, “no que couber”, as normas que disciplinam a execução provisória da sentença, anteriormente previstas no art. 588 e, a partir da Lei n. 11.232, de 2005, no art. 475-O do Código de Processo Civil.

48

DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. p. 333-334.

49ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 91.

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28

De suma importância para a efetivação da tutela antecipada, as

medidas de apoio que se encontram no art. 461, §§ 4º e 5º, poderão ser utilizadas

pelo magistrado sempre que o réu não cumprir voluntariamente com sua obrigação.

Trata-se de rol meramente exemplificativo, podendo tais

medidas, nas palavras de Destefenni50, ser classificadas como: “a) atípicas: as

medidas que o juiz entender como oportunas e necessárias à efetivação da tutela

jurisdicional; b) típicas: são aquelas previstas no § 5º do art. 461 do CPC”.

Dispondo dessas medidas, o magistrado poderá optar por

aquela que se apresente mais adequada ao caso em tela, sem sacrificar

excessivamente o réu, mas, ao mesmo tempo, garantindo o direito do autor e

assegurando o cumprimento efetivo da tutela antecipada concedida.

1.6 MOMENTO DA CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA

Não há um momento específico para se requerer a antecipação

da tutela. Dependendo do caso e da necessidade, o juiz pode, inclusive, concedê-la

antes da oitiva do réu. Isso porque há casos em que a audiência para sua ouvida

pode causar lesões ao direito do autor.

Explica Marinoni51 que a lei “não pode vedar a concessão da

tutela antes da ouvida do réu, pois nenhuma norma tem o condão de controlar as

situações de perigo. A necessidade da ouvida do réu pode comprometer a

efetividade da tutela antecipatória”.

Ademais, ressalta o autor, que outro motivo que justifica o fato

de a tutela ser concedida antes da contestação, é que “o direito à tutela antecipatória

é corolário do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva”, não podendo ser

vedado sob a alegação de que fere o princípio do contraditório, mormente porque,

como já afirmado anteriormente, uma das principais características da medida é a

sua precariedade.

50

DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil. Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. p. 335.

51MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 198.

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O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina já se

manifestou a respeito, posicionando-se da seguinte maneira:

Ação de revisão contratual c/c pedido de tutela antecipada. Código de Defesa do Consumidor. Aplicação às instituições financeiras. Inversão do ônus da prova. Possibilidade. Tutela antecipatória. Desnecessidade de prévia oitiva do réu. Requisitos preenchidos. Viabilidade. [...] Se a citação do réu puder tornar ineficaz a medida, ou quando a urgência indicar a necessidade de concessão imediata da tutela, o juiz poderá fazê-lo inaudita altera pars, que não constitui ofensa, mas limitação imanente do contraditório, que fica diferido para momento posterior do procedimento (Nelson Nery Jr. et Rosa Maria Andrade Nery). (grifou-se) (Agravo de Instrumento nº 2003.002506-5. Rel. Pedro Manoel Abreu. Segunda Câmara de Direito Comercial. Julgado em 28.08.2003).

Insta lembrar, conforme defende Gonçalves52, que somente é

possível conceder a tutela antecipada antes da oitiva do réu no caso de pedido

fundado em receio de dano irreparável ou de difícil reparação, haja vista que, nos

demais casos, é necessário seu comparecimento em juízo, a fim de que o juiz

verifique se, efetivamente, há abuso do direito de defesa, manifesto intuito

protelatório por parte do réu, ou se se trata de pedido incontroverso.

Marinoni53 defende ainda que a tutela antecipada deve ser

passível de ser concedida após a fase instrutória do processo, sendo falha a lei que,

em seu artigo 520, VII, do CPC, dispõe que a apelação não será recebida no efeito

suspensivo somente se confirmar a antecipação da tutela. Para o autor:

O correto seria estabelecer, no art. 520, que a sentença pode ser executada na pendência da apelação quando conceder a tutela, pouco importando se esta foi ou não concedida antecipadamente, e, assim, se a sentença está ou não a confirmando.

Sobre o tema, Gonçalves54, da mesma forma, diz que existe a

possibilidade de antecipação da tutela, ainda que o processo já se encontre em fase

de sentença, pois contra esta cabe recurso de apelação, dotado, geralmente, de

efeito suspensivo.

52

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. p. 306.

53MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 199-200.

54GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. p. 306-307

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Contudo, explica ainda Gonçalves, o juiz:

Não deve apreciar o pedido de antecipação no bojo da própria sentença, mas por meio de decisão em separado. A razão é que, se ele o fizer, por força do princípio da unirrecorribilidade das decisões judiciais, trará graves dificuldades para a impugnação da decisão concessiva da medida. Como ela foi proferida no bojo da sentença, caberá apenas apelação, e esta não tem o condão de suspender o cumprimento da tutela antecipada. A apelação suspende o cumprimento da sentença, mas não o da antecipação, de forma que daí poderão advir graves prejuízos para o réu.

Por outro lado, Carreira Alvim55 entende que, estando o

processo pronto para julgamento, não pode o magistrado proferir uma decisão,

concedendo tutela antecipada, quando já está apto a prolatar uma sentença de

mérito acerca de todo o processo. Nas palavras do autor:

Se, por ocasião da sentença, surgir algum obstáculo que impeça a prolação da sentença – por exemplo, verificou o juiz a necessidade de uma diligência indispensável –, tem o autor o direito à antecipação da tutela, presentes os pressupostos que a justifiquem. Não, porém, se, não tendo sido anteriormente deferida a antecipação, chegou-se ao clímax do processo de conhecimento, quando deve o juiz outorgar a tutela de mérito, compondo o conflito.

Ademais, resta afirmar que, surgindo receio de dano irreparável

ou de difícil reparação no segundo grau de jurisdição, é possível a concessão da

medida, cujo trâmite se dará perante o Tribunal, cabendo sua decisão ao relator do

recurso.

1.7 ANTECIPAÇÃO DA TUTELA E EFEITOS DA APELAÇÃO

Como é sabido, um dos princípios consagrados no

ordenamento jurídico brasileiro é o do duplo grau de jurisdição, que assegura às

partes o direito de recorrer das decisões, caso haja sucumbência.

Tal garantia faz com que, na maioria dos casos, o recurso seja

recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo, fazendo com que a parte vencedora

tenha que aguardar o julgamento do recurso interposto pela parte contrária para,

assim, executar a sentença que reconheceu seu direito.

55

CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada – Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. p. 70-71.

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Ocorre que, como alerta Marinoni56:

Se o réu tende a abusar do seu direito de defesa, igual ou maior é o seu interesse em abusar do direito ao recurso [...]. Um sistema como o nosso, em que a sentença do juiz de primeiro grau não pode ser executada – na maioria das hipóteses – na pendência do recurso, deve estar muito atento à questão – que não é nova – do abuso do direito de recorrer.

O artigo do CPC que trata da apelação (art. 520), dispõe que “a

apelação será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo”. Tal afirmação é a

regra, ou seja, na maior parcela das situações, os efeitos da sentença de primeiro

grau serão suspensos até o julgamento do recurso.

Já as exceções são aquelas anunciadas pelo art. 520, caput, in

fine, e elencadas em seus incisos seguintes, nos quais se encontram casos em que

a apelação somente será recebida no efeito devolutivo.

Dentre essas hipóteses, está a apelação interposta contra

sentença que confirmar a antecipação dos efeitos da tutela (inciso VII). Essa norma,

em consonância com Carreira Alvim57:

Corrige a anomalia do nosso ordenamento jurídico, em permitir a efetivação do provimento antecipatório, fundado apenas na probabilidade da existência do direito, e não admitir a execução, mesmo provisória, da sentença, fundada na certeza.

Também leciona o doutrinador que não só as sentenças

condenatórias são alcançadas pelo art. 520, VII, do CPC, abrangendo, dito

dispositivo, todas as sentenças, inclusive as declaratórias e constitutivas,

dependendo da natureza da relação jurídica material em lide.

Em vista disso, naqueles processos em que houver uma

decisão de tutela antecipada confirmada na sentença, a interposição do recurso de

apelação não obstará o cumprimento da obrigação do réu em favor do autor.

56

MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 371-372.

57CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada – Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. p.177.

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32

1.8 TUTELA ANTECIPADA X TUTELA CAUTELAR

Muito já foi discutido acerca das semelhanças e diferenças

entre tutela antecipada e tutela cautelar, porém, atualmente, este tema se encontra

pacificado na doutrina.

De acordo com Carreira Alvim58, a semelhança entre esses

dois institutos reside no fato de que ambas “são espécies do gênero provimento

antecipado, apresentando a característica comum de serem concedidas fora

daquele momento normalmente adequado ao reconhecimento do direito, que é a

sentença”.

Já a divergência básica entre esses dois institutos consiste em

que a tutela antecipatória tem cunho satisfativo, enquanto a medida cautelar não o

tem. Explica Marinoni59 que “a tutela cautelar tem por fim assegurar a viabilidade da

realização de um direito, não podendo realizá-lo”.

No mesmo liame, Destefenni60 complementa, argumentando

que:

A tutela cautelar exerce função predominantemente conservativa, uma vez que não adianta ao requerente a possibilidade de usufruir do bem da vida pretendido no processo principal. Garante, fundamentalmente, que o bem pretendido não venha a desaparecer e, com isso, comprometer a utilidade da prestação jurisdicional.

Por sua vez, a tutela antecipada visa, como o próprio nome já

alude, a antecipação dos resultados pretendidos ao final do processo. Nas palavras

de Gonçalves61, a antecipação da tutela “consiste na possibilidade de antecipação,

total ou parcial, dos efeitos da própria sentença. [...] Por seu intermédio, o juiz

concede, antecipadamente, aquilo que está sendo pedido, embora ainda em caráter

provisório”.

58

CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada – Com as reformas das Leis 10.352/01, 10.358/01 e 10.444/02. p. 29.

59MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. p. 131.

60DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil. Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. p. 314.

61GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. p. 297.

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Finalmente, oportuno destacar a conclusão feita por Zavascki62,

o qual alega que:

Em suma: há casos em que apenas a certificação do direito está em perigo, sem que sua satisfação seja urgente ou que sua execução esteja em risco; há casos em que o perigo ronda a execução do direito certificado, sem que a sua certificação esteja ameaçada ou que sua satisfação seja urgente. Em qualquer de tais hipóteses, garante-se o direito, sem satisfazê-lo. Mas há casos em que, embora nem a certificação nem a execução estejam em perigo, a satisfação do direito é, todavia, urgente, dado que a demora na fruição constitui, por si, elemento desencadeante de dano grave. Essa última é a situação de urgência legitimadora da medida antecipatória.

Portanto, levando-se em conta o ora exposto, percebe-se que,

embora a tutela antecipada e a tutela cautelar sejam ambas medidas provisórias de

urgência, não há razões para confundir, teoricamente, o conceito de cada uma,

porquanto aquela satisfaz o direito almejado na ação, enquanto esta serve somente

para assegurá-lo.

1.9 FUNGIBILIDADE ENTRE TUTELA ANTECIPADA E TUTELA CAUTELAR

Não obstante a clareza conceitual ora apresentada, há casos

em que se torna árdua a tarefa de diferenciar, na prática, tutela antecipatória de

tutela cautelar.

Diante desse cenário, o legislador, por meio da Lei 10.444, de

7 de maio de 2002, incluiu o parágrafo 7º no artigo 273 do CPC, o qual prevê que

“se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza

cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a

medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado”.

Assim, caso se trate de matéria controvertida e haja um

equívoco por parte do autor, que requer uma tutelar cautelar, em vez de tutela

antecipada, o juiz pode aplicar o princípio da fungibilidade e deferir o pedido

apresentado erroneamente.

62

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 49.

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Obviamente, o dispositivo do § 7º não se refere somente ao

erro de denominação por parte do autor, como explica Gonçalves63:

Não havia necessidade de o legislador acrescentar um dispositivo para dizer que o juiz não deve importar-se com o nome que se dá aos requerimentos formulados pelas partes, mas sim com aquilo que se está postulando. O juiz conhece o direito, e o erro na designação das pretensões é, e sempre foi, irrelevante.

Trata-se, na realidade, da possibilidade de o juiz analisar qual

dos remédios jurídicos é o mais apropriado para o caso concreto, sem que sua

decisão seja considerada extra petita.

Este tema concernente à fungibilidade, a qual permite que o

magistrado conceda tutela cautelar quando houver pedido de antecipação, é matéria

pacífica na doutrina.

Todavia, nas situações em que ocorra o contrário, ou seja,

caso o autor requeira uma medida antecipatória a título de tutela cautelar, a doutrina

mostra-se divergente.

Para autores como Dinamarco64, Destefenni65 e Gonçalves66,

ainda que não haja previsão legal expressa, o contrário também é permitido. Isso

porque, nas palavras deste, “não existe fungibilidade de mão única, sendo de sua

natureza que dois institutos fungíveis possam ser trocados, um pelo outro, sem

distinção”. Acrescenta Dinamarco que, “em direito, se os bens são fungíveis, isso

significa que tanto se pode substituir um por outro, como outro por um”.

No entanto, para outros doutrinadores, a citar, Theodoro

Júnior67 e Zavascki68, a fungibilidade tem, sim, mão única, sendo inadmissível

transmudar tutela antecipatória em tutela cautelar.

63

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. p. 310.

64DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da reforma. p. 92.

65DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil. Processo de Conhecimento e Cumprimento da Sentença. p. 316.

66GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. p. 310.

67THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Teoria geral do direito

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Zavascki explica que o dispositivo constante no art. 273, § 7º,

do CPC:

Diz respeito à medida cautelar, que pode ser deferida em caráter incidental. Não autoriza, todavia, o contrário, ou seja, que a medida antecipatória possa ser requerida, como a cautelar, por ação autônoma. Se assim fosse entendido, estar-se-ia atentando contra a lógica do sistema atual, um dos principais avanços trazidos pelo movimento reformador do sistema, que é a de concentrar em uma única relação processual, tanto quanto possível, toda a atividade jurisdicional.

Acerca da polêmica, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa

Catarina69 já se manifestou a respeito, entendendo que é possível a aplicação

inversa do princípio da fungibilidade, conforme se verificará a seguir:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CAUTELAR INOMINADA INCIDENTAL À DEMANDA DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - SENTENÇA EXTINGUINDO O PROCESSO, SEM ANÁLISE DO MÉRITO, POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. IRRESIGNAÇÃO DA AUTORA - PLEITO ASSECURATÓRIO REVESTIDO DE NÍTIDO CARÁTER ANTECIPATÓRIO - EXAME DA POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO, IN REVERSO, DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DAS TUTELAS DE URGÊNCIA (ART. 273, § 7º, DO CPC) - CABIMENTO - A PROPOSITURA DE AÇÃO CUJO PLEITO CARACTERIZA-SE COMO ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NÃO CULMINA NA AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR DO ACIONANTE, DEVENDO O JULGADOR APRECIAR O PEDIDO, TOMANDO POR BASE, PARA A AFERIÇÃO DA SUA PROCEDÊNCIA, OS REQUISITOS GENÉRICOS PREVISTOS NO ART. 273 DO CPC - PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ - CAUSA EXTINTIVA AFASTADA - INVIABILIDADE DE A CORTE PROSSEGUIR NO EXAME DO MERITUM CAUSAE, NOS TERMOS DO ART. 515, § 3º DO CPC - NECESSIDADE DE CITAÇÃO DE TODOS OS RÉUS, PREVIAMENTE À ENTREGA DA TUTELA JURISDICIONAL - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, PARA CASSAR A SENTENÇA E DETERMINAR O REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO NO JUÍZO DE ORIGEM. (Ap. Cível 2009.011753-9. Rel. Des. Marco Aurélio Gastaldi Buzzi. Julgada em 14.12.2009) (grifou-se).

processual civil e processo de conhecimento. p. 421.

68ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. p. 47.

69SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Apelação Cível nº 2009.011753-9, da 3ª Câmara de Direito Comercial, 14 de dezembro de 2009. Disponível em: <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/acpesquisa.action>. Acesso em: 4 fev. 2010.

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Como se pôde extrair desse acórdão, o Superior Tribunal de

Justiça70 também já possui precedentes que admitem a apreciação de pleitos de

caráter antecipatório em sede de processo cautelar. Tal posicionamento se encontra

ilustrado pelo seguinte julgado:

PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - TUTELAS DE URGÊNCIA - FUNGIBILIDADE - INTELIGÊNCIA DO ART. 273, § 7º, CPC – MEDIDA CAUTELAR PREPARATÓRIA - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA COMO MEIO ADEQUADO - INTERESSE DE AGIR - RECONHECIMENTO.

1. "O art. 273, § 7º, do CPC, abarca o princípio da fungibilidade entre as medidas cautelares e as antecipatórias da tutela e reconhece o interesse processual para se postular providência de caráter cautelar, a título de antecipação de tutela. Precedentes do STJ". (REsp 1011061 / BA, Relator(a) Ministra ELIANA CALMON, DJe 23/04/2009)

2. A interpretação da Corte de origem, de que carece interesse de agir a parte que apresenta pleito cautelar quando o correto é antecipatório, distancia-se da interpretação que o STJ confere à matéria.

3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1013299/BA. Rel. Ministro Mauro Campbell Marques. Julgado em 01.10.2009) (grifou-se).

Tendo em vista todo o exposto, constata-se que, ainda que não

se trate de matéria pacífica, a tese de que é possível apreciar um pedido feito como

medida cautelar, quando na verdade se trata de tutela antecipada, vem

predominando, mormente no Estado de Santa Catarina.

No capítulo segundo, será estudado a revisão criminal, já que o

capítulo terceiro terá por objeto de pesquisa a possibilidade de se aplicar, por

analogia, a antecipação de tutela na revisão criminal.

70

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1013299, da 2ª Turma, 1 de outubro de 2009. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/ jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=1013299&b=ACOR>. Acesso em: 4 fev. 2010.

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37

CAPÍTULO 2

DA REVISÃO CRIMINAL

2.1 A REVISÃO CRIMINAL NO BRASIL

O início do processo de surgimento da revisão criminal no

Brasil, de acordo com o renomado doutrinador Capez71, remonta ao ano de 1828,

quando foi promulgada a Lei de 18 de setembro de 1828, que admitia o recurso de

revista, sempre que houvesse manifesta nulidade ou injustiça notória nas sentenças

de última instância.

Em 1832, consoante ensina Ceroni72, referido recurso foi

introduzido no Código de Processo Criminal, em seu art. 306, que previa que “das

decisões da relação poder-se-á recorrer, por meio de revista, para o tribunal

competente”.

Ainda leciona o autor que, no ano de 1890, foi inserida no

ordenamento jurídico brasileiro a revisão criminal, a qual substituiria o recurso de

revista, por meio do Decreto nº 848, de 11 de outubro de 1890.

Por seu turno, Tourinho Filho73 explica que “poucos meses

depois, em 24-2-1891, era a revisão introduzida no texto da primeira Constituição

Republicana, como verdadeiro remédio constitucional”. Já a Constituição de 1934,

afirma dito doutrinador,

manteve o mesmo princípio. Embora a de 1937 silenciasse, sob a sua égide surgiu o atual CPP, consagrando-a, apenas, em benefício dos réus. A Constituição de 1946, ao tratar da competência do STF, em outras palavras repetiu os dizeres das anteriores (1891 e 1934). A EC n. 1, de 1969, embora dissesse, simplesmente, no art.119, I, m,

71

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 12. ed. São Paulo : Saraiva, 2009. p. 750.

72CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. São Paulo : Juarez de Oliveira, 2005.

73TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 4. p. 608.

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caber ao STF a revisão criminal de seus julgados, deixou, contudo, à própria Suprema Corte a faculdade de, no seu Regimento Interno, estabelecer o processo e julgamento dos feitos da sua competência originária e recursal.

Atualmente, a revisão criminal não se encontra expressamente

prevista na Carta Magna. Contudo, doutrinadores como Ceroni e Tourinho Filho

entendem que tal ação está nela embutida, em seu art. 5º, § 2º.

O Código de Processo Penal, de 3 de outubro de 1941 e que

está atualmente em vigor, dispõe sobre a revisão criminal no Título II, Capítulo VII,

art. 621 a 631.

2.2 NATUREZA JURÍDICA

Muito já se discutiu acerca da natureza jurídica da revisão

criminal. Uns entendem que se trata de um recurso, enquanto outros entendem que,

apesar de estar inclusa no Título dos recursos do Código de Processo Penal, trata-

se de uma ação penal de natureza constitutiva. Ceroni74 explica que:

Alguns entendem que a revisão é revestida da forma de um recurso (especial, peculiar, misto ou sui generis) pelos seguintes motivos: a) destina-se a desfazer os efeitos produzidos pela sentença transitada em julgado; b) é freqüentemente submetida à apreciação do mesmo órgão judiciário, de que emana a decisão cujo reexame se solicita, numa verdadeira reabertura do processo [...]; c) ela tolhe a possibilidade de exasperar a situação do réu, ou seja, como somente a defesa pode requerer a revisão, o tribunal não pode aumentar a pena que lhe pareça insuficiente, ficando, por conseguinte, na situação de apenas solucionar a questão no sentido do benefício da parte que lhe submete o caso, vendo-se na contingência de manter uma decisão errada e injusta; d) ela se volta contra a coisa julgada no crime; e, e) é recurso por imposição legal.

De acordo com o autor, são defensores dessa ideia De Plácido

e Silva, Eduardo Espínola Filho, E. Magalhães Noronha e João Cláudio de Oliveira e

Cruz.

74

CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 17.

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Contudo, a maioria dos doutrinadores entende a revisão

criminal como uma típica ação penal. Para Mirabete75, a revisão “deve ser

considerada como ação penal já que ela instaura uma relação jurídico-processual

contra a sentença transitada em julgado”.

No mesmo liame, Nucci76 considera a revisão como uma “ação

penal de natureza constitutiva e sui generis, de competência originária dos tribunais,

destinada a rever decisão condenatória, com trânsito em julgado, quando ocorreu

erro judiciário”.

Outros doutrinadores, a citar José Frederico Marques, Ada

Pellegrini Grinover, Pedro Henrique Demercian, Jorge Assaf Maluly, Fernando

Capez, Carlos Roberto Barros Ceroni e Tourinho Filho partilham a opinião de que a

revisão criminal é uma ação autônoma. Para este doutrinador77:

Enquanto o recurso, pelo menos entre nós, tem por finalidade precípua substituir uma decisão por outra, ainda que proferida pelo mesmo órgão, a revisão visa, exclusivamente, invalidar a entrega da prestação jurisdicional. No Direito brasileiro, só pode haver recurso dentro do processo, e ele tem o condão de estender a relação processual. [...] Uma vez esgotadas as vias recursais, ou preclusas as vias impugnativas, a decisão, certa ou errada, justa ou injusta, adquire a qualidade de inimpugnabilidade e imutabilidade.

Para Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho

e Antonio Scarance Fernandes78, a revisão trata-se, na verdade, de uma ação com

dúplice pedido, porquanto visa “desconstituir a sentença (juízo rescindente ou

revidente) e a substituí-la por outra (juízo rescisório ou revisório)”.

Afirmam ainda tais autores que:

O reconhecimento, à revisão, de natureza jurídica de ação leva a importantes consequências práticas: nova revisão criminal, por outro fundamento, sempre será possível, pois nesse caso não haverá identidade de ações, que se distinguirão pela causa de pedir. A

75

MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 18. ed. São Paulo : Atlas, 2006. p. 701.

76NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. 8. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008. p. 983.

77TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. p. 609-610.

78GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal – Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. 4. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005. p. 311.

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interpretação do parágrafo único do art. 622 do CPP [...] significa que: a) o impedimento à reiteração do pedido opera só quando houver a tríplice identidade (partes, pedido e causa de pedir); b) mesmo no caso de tríplice identidade e, consequentemente de verdadeira reiteração do pedido, a revisão caberá, se fundada em novas provas79.

Em suma, aqueles que consideram a revisão criminal uma

ação penal, alegam que, por ter como objetivo invalidar uma sentença já transitada

em julgado e, principalmente pelo fato de o ordenamento jurídico brasileiro respeitar

a coisa julgada, não poderia, de forma alguma, ser considerada recurso.

2.3 CONDIÇÕES DE PROCEDIBILIDADE

Para este tópico, considerar-se-á a corrente majoritária, que

percebe a revisão criminal como uma ação penal, a qual deve, portanto, observar as

condições de procedibilidade inerentes a qualquer ação, quais sejam, a legitimidade,

o interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido.

2.3.1 Legitimidade

2.3.1.1 Legitimidade Ativa

O artigo 623 do CPP prevê que “a revisão poderá ser requerida

pelo próprio réu ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do

réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão”.

Com base nesse dispositivo legal, Pedro Henrique Demercian

e Jorge Assaf Maluly80 concluem que:

O autor (réu) não precisa constituir um advogado para formular o pedido de revisão, tal como o habeas corpus. Se assim o desejar e for pobre, o Juiz de Direito nomeará um advogado para o réu, nos termos do art. 32 do CPP. O réu menos de 21 anos não necessita de curador para o ajuizamento do pedido. Aliás, a nomeação de advogado para a apresentação das razões do pedido é uma garantia da defesa técnica que não pode, a nosso ver, ser postergada.

79

GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal – Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 313.

80DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. 5. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2009. p. 658.

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41

Sustentando o anteriormente exposto, Antonio Sydnei de

Oliveira Junior81 explica que o art. 623 do CPP encontra-se completamente vigente,

tendo sido recepcionado pela Constituição Federal, ainda que a Carta Magna

considere o advogado indispensável à administração da justiça e ainda que o

Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil preveja, em seu art. 1º, I, que a

postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário é atividade privativa da advocacia.

Tais assertivas se encontram pacíficas na doutrina. Contudo,

quanto à possibilidade de o Ministério Público requerer a revisão criminal a favor do

réu, há duas correntes doutrinárias.

A minoritária, defendida, entre outros, por Ada Pellegrini

Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes e Denilson

Feitoza, entende que o Ministério Público, ainda que não haja previsão legal

expressa a respeito, é legitimado a requerer a revisão.

Isso porque, conforme explica Denilson Feitoza82:

O Ministério Público tem funções constitucionais a cumprir, que lhes são não apenas outorgadas mas impostas, dentre elas a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, caput, CR). Afronta a ordem jurídica e os interesses sociais e individuais indisponíveis à manutenção, por exemplo, de uma condenação injusta, que viole o direito fundamental à liberdade do condenado. A Constituição Federal não criaria o Ministério Público e lhe imporia suas funções se, implicitamente, conferir-lhe a legitimidade e os instrumentos para realizar suas destinações. Portanto, a legitimação do Ministério Público para propor revisão criminal em benefício do condenado, em nosso entendimento, tem fundamento constitucional.

Ademais, Grinover, Gomes Filho e Fernandes83 alegam que “a

omissão da lei explica-se pelo fato de o Código rotular a revisão entre os recursos,

tendo o Ministério Público ampla legitimidade para recorrer”.

81

OLIVEIRA JUNIOR, Antonio Sydnei de. Revisão criminal. Novas reflexões. Curitiba : Juruá, 2009. p. 65.

82FEITOZA, Denilson. Direito processual penal. Teoria, Crítica e Práxis. 6. ed. Niterói : Impetus, 2009. p. 1117.

83GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal – Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 315.

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42

Tourinho Filho, apesar de lamentar tal fato, entende pela falta

de legitimidade ao Ministério Público para requerer a revisão criminal.

Da mesma forma, doutrinadores como Capez, Ceroni, Oliveira

Junior e Nucci, também defendem que o rol previsto no art. 623 do CPP é taxativo e,

por não incluir o Ministério Público, este não é legitimado a requerer a revisão

criminal.

Para embasar sua tese, Capez84 argumenta que:

O Ministério Público tem legitimidade para a propositura da ação penal pública, com o objetivo de obter a satisfação jus puniendi, ou seja, visa justamente o contrário da revisão. Daí não se admitir tenha legitimidade ou interesse para promover a ação rescisória em favor do condenado.

Ademais, Oliveira Junior85 sustenta que o réu poderia sofrer

grave prejuízo caso o Ministério Público requeresse a revisão criminal à sua revelia,

de forma precipitada, pois nesse caso, impossibilitaria o condenado de reiterar o

pedido, baseado na mesma causa de pedir.

Por fim, argumenta Nucci86 que:

Em casos extremados, quando o condenado não quiser ingressar com a ação revisional, mas houver flagrante demonstração de erro judiciário, entendemos cabível a nomeação de defensor, pelo juiz, para tutelar os interesses do sentenciado, a quem caberá, então, a propositura da ação.

Para o autor, caso fosse possível o requerimento de revisão

criminal pelo órgão ministerial, este figuraria nos pólos ativo e passivo da ação, o

que não lhe parece razoável.

2.3.1.2 Legitimidade Passiva

Também no que concerne à parte passiva, há dois

entendimentos. Sérgio de Oliveira Médici87 considera que:

84

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p. 751.

85OLIVEIRA JUNIOR, Antonio Sydnei de. Revisão criminal. Novas reflexões. p. 85-86.

86NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. p. 995.

87 Apud NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. p. 984-985.

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O Ministério Público, chamado a opinar na revisão criminal, não representa o Estado ou a União. Manifesta-se livremente, a favor ou contra o pedido, não intervindo na revisão como parte contrária ao condenado. Conforme dispõe o art. 625, § 5º, do Código de Processo Penal, se o requerimento não for indeferido in limine, abrir-se-á vista dos autos ao procurador-geral, que dará parecer no prazo de dez dias. Esta regra indica, claramente, que a função ministerial será de custos legis [...]. Quisesse a lei situar o Ministério Público como parte, na revisão criminal teria empregado a palavra adequada para expressar tal posicionamento, como resposta, contra-razões, oposição. Jamais parecer [...].

Acrescenta Nucci88 que, caso fosse parte, o Ministério Público

de primeiro grau é que deveria ser chamado para integrar o processo, porquanto foi

ele quem objetivou, desde o princípio, a condenação do réu. Assim, se o promotor

de primeiro grau não é chamado, “não tem que se adaptar o procurador de justiça –

que nunca, até então, atuou como tal – como parte na ação penal”.

De outra banda, há outros, como Ceroni, Grinover, Gomes

Filho e Fernandes, que entendem que o Estado, representado pelo Ministério

Público, figura como pólo passivo na revisão criminal. Isso porque, conforme alega

Ceroni89:

O Ministério Público – órgão fiscalizador do exato cumprimento das leis – não é, no processo penal, parte na relação jurídico-material, mas é parte na relação jurídico-processual, ou seja, é um dos sujeitos desta relação, que se faz presente através de seus órgãos. [...] a manifestação ministerial em apreço, apesar de poder ser favorável ao peticionário [...], não deixa de representar verdadeira resposta ao pedido, visto que formulada pelo demandado, representante do sujeito passivo (o Estado).

Apesar das divergências ora suscitadas, pode-se afirmar que

há unanimidade quanto ao papel exercido pelo Ministério Público durante o

andamento da revisão criminal, assim como quanto à relevância de seus pareceres,

pouco importando, na prática, se tal órgão figura, ou não, como parte passiva no

processo.

88NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. p. 985.

89CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 118.

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2.3.2 Interesse de Agir

O interesse de agir por parte do réu surge com a ocorrência do

trânsito em julgado da sentença, conforme se depreende do art. 621, caput, do CPP,

que reza acerca da admissibilidade da revisão em processos findos, devendo tal

expressão, nas palavras de Grinover, Gomes Filho e Fernandes90, ser entendida

“como equivalente a processos com sentença transitada em julgado”.

Ainda seguindo os ensinamentos dos referidos doutrinadores,

tem-se que:

Ocorre, por vezes, que o requerente tem interesse de agir (a utilidade de cassar a sentença para obter resultado mais favorável, mas o pedido esbarra na impossibilidade jurídica (exemplos: revisão contra sentença absolutória, para mudar sua fundamentação; revisão da sentença que declara extinta a punibilidade antes da sentença).

Por isso, o interesse de agir não pode ser considerado

isoladamente, mas conjuntamente à possibilidade jurídica do pedido, já que a mera

existência de coisa julgada não tem o condão de permitir a admissibilidade da

revisão criminal.

2.3.3 Possibilidade Jurídica do Pedido

Entendido como outro elemento de procedibilidade da ação, a

possibilidade jurídica do pedido existe, segundo Ceroni91, quando “há sentença

penal condenatória, insuscetível de modificação (por não caber mais recurso)”.

Salienta-se que é o caráter condenatório da sentença que

possibilita sua revisão criminal. Alertam, porém, Grinover, Gomes Filho e

Fernandes92 que, ainda que não expressamente prevista em lei como possibilidade

de se requerer a revisão criminal, a sentença absolutória imprópria, ou seja, aquela

90

GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal – Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 316-317.

91CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 102.

92GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal. Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 317.

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prevista no art. 386, parágrafo único, do CPP, que aplica medida de segurança ao

inimputável, também é capaz de ser revista.

Ademais, os doutrinadores acima referidos aduzem que:

Além da possibilidade jurídica do pedido revisional, deve ser examinada a possibilidade jurídica de sua causa de pedir: e esta é dada pela caracterização de uma das hipóteses legais de cabimento do instituto. O requerente deve pelo menos afirmar que a sentença ou o processo contém um dos vícios arrolados nos incisos do art. 621 [...], tornando possível o exercício da ação com vista à causa de pedir invocada.

Esclarece, por seu turno, Tourinho Filho93 que, caso da decisão

condenatória for interposto recurso extraordinário ou especial, ainda que esses

recursos não tenham efeito suspensivo, não caberá revisão criminal, “mesmo

porque, como todo e qualquer recurso do nosso ordenamento, pressupõe decisão

não transitada em julgado”.

Assim, havendo, concomitantemente, uma sentença

condenatória (ou absolutória imprópria) transitada em julgado e uma das causas

previstas no art. 621 do CPP, poderá o réu requerer a revisão criminal.

2.4 PRAZO

Prescreve o art. 622 do CPP que “a revisão poderá ser

requerida em qualquer tempo, antes da extinção da pena ou após”. Percebe-se, a

partir da leitura desse dispositivo legal, que não há um prazo para se requerer a

revisão criminal.

Mirabete94 explica que, por essa ação visar a correção de um

erro judiciário, não está sujeita a prazo, podendo, portanto, ser requerida a qualquer

tempo após o trânsito em julgado da sentença.

Alerta, por seu turno, Feitoza95, que, no caso de extinção da

punibilidade reconhecida antes do trânsito em julgado da sentença condenatória,

93

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. p. 612-613.

94MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 704.

95FEITOZA, Denilson. Direito processual penal. Teoria, Crítica e Práxis. p. 1118.

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não poderá ser requerida a revisão, por lhe faltar pressuposto básico, qual seja, a

sentença transitada em julgado.

Ainda sobre o tema, Demercian e Maluly96 ensinam que não

importa, sequer, se o réu tenha, ou não, cumprido a pena. Isso porque:

A revisão não pretende somente a desconstituição de uma sentença, mas também corrigir um erro judiciário, restituir ao condenado e aos familiares a respeitabilidade social, o status dignitatis, e a recomposição do prejuízo daí decorrente por meio de uma indenização. Com base nesse fundamento, é cabível a revisão criminal mesmo após a concessão da graça ou indulto, porque, em ambos os casos, o status dignitatis do réu foi ofendido anteriormente à concessão do benefício e tais causas extintivas da punibilidade têm aplicabilidade já durante a fase de execução da pena.

Portanto, para requerer a revisão, não importa quanto tempo

leve o réu para atender aos requisitos necessários, visto que seu direito irá perdurar,

inclusive, após seu óbito.

2.5 HIPÓTESES DE ADMISSIBILIDADE

As hipóteses em que a revisão criminal é admitida se

encontram previstas no art. 621 do CPP, que prevê, ipsis litteris:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

Tendo em vista que o artigo supracitado se refere a três

situações profundamente distintas entre si (sentença contrária à lei ou à evidência

dos autos, sentença fundada em elementos de convicção falsos e descoberta de

96

DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. p. 659.

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novas provas que inocentem o condenado ou diminuam sua pena), analisar-se-á

cada uma delas separadamente.

2.5.1 Sentença Condenatória Contrária ao Texto Expresso da Lei Penal ou à Evidência dos Autos

O art. 621, I, do CPP, prevê duas situações distintas em que se

admite a revisão criminal, quais sejam, quando a sentença for contrária à lei ou

quando for contrária à evidência dos autos.

Sentença contrária ao texto expresso de lei, de acordo com o

que ensinam Demercian e Maluly97, é “aquela que nega a sua vigência ou não aplica

o que ela dispõe”. Como exemplo, Mirabete98 cita casos em que se condena o réu

por fato que não constitui crime ou que estabelece uma pena superior ao limite

máximo permitido em lei.

Porém, é de suma importância salientar que, no caso de haver

uma lei mais benigna que tenha entrado em vigor posteriormente ao trânsito em

julgado da sentença, não caberá revisão criminal, pois a aplicação de tal dispositivo

caberá ao juiz da execução, conforme se extrai da Súmula 611 do STF, que prevê

que, “transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo das

execuções a aplicação da lei mais benigna”.

O objetivo do legislador, ao prever como possibilidade o inciso I

do art. 621 do CPP foi, segundo Oliveira Junior99:

Direcionar as funções do Juízo da revisão, impondo-lhe um arbítrio regrado, sem podar-lhe, entretanto, a liberdade exegética. É que, para a exata verificação da manifesta contrariedade à lei penal, o Julgador haverá de fazer um juízo dialético-valorativo dos fatos imputados ao requerente da revisional e verificar seu perfeito enquadrando aos elementos típicos da lei incriminadora que fundamentaram e permitiram o desfecho judicial condenatório. Noutros termos, em havendo insolúvel defasagem entre a decisão revista e os marcos balizadores do direito repressivo imposto, fixado estará o julgamento em confronto com específica lei punitiva.

97

DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. p. 661.

98MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 705.

99OLIVEIRA JUNIOR, Antonio Sydnei de. Revisão criminal. Novas reflexões. p. 103.

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Cumpre ressaltar os ensinamentos de Nucci100, segundo o qual

se deve ampliar o sentido de “lei penal”, incluindo nesse termo tanto as normas

referentes ao direito penal propriamente dito, quanto as de direito processual penal,

o que permite ao réu, portanto, requerer a revisão criminal caso alguma norma do

Código de Processo Penal tenha sido infringida.

Ademais, leciona referido doutrinador que, tratando-se de

interpretação controversa de texto de lei, não cabe revisão criminal. Por outro lado,

explica, “é certo que, havendo a jurisprudência firmado entendimento de que a lei

deve ser interpretada num determinado prisma [...], cabe revisão criminal, com base

na afronta à lei, quando o magistrado adotar posicionamento oposto ao majoritário”

Já a parte final do I do art. 621 do CPP dispõe sobre a

possibilidade de se requerer a revisão criminal, quando a sentença for contrária à

evidência dos autos.

Em consonância com José Frederico Marques101, o inciso I, in

fine, fica caracterizado quando a sentença de condenação “desatende à real

configuração dos fatos, por isso que se fundou em atos, ou eventos não

suficientemente demonstrados, ou que, se fossem aglutinados com adequação,

imporiam sentença absolutória, ou, pelo menos, mais branda”.

Importante trazer à baila as palavras de Ceroni102, que explica

que “a contrariedade deve ser frontal e inequívoca, não devendo, portanto, a revisão

ser utilizada para reexaminar a prova, a exemplo do que ocorre na apelação”.

Ainda explica o autor que:

Havendo um mínimo ou um único elemento de prova a embasar a condenação, ainda que seja discutível se é ou não suficiente a fundamentar o decreto condenatório, ou mesmo que existam elementos probatórios, pró e contra a procedência da ação penal, deve ser mantida a decisão revidenda, visto que não se pode afirmar, neste caso, ser ela contrária à evidência dos autos. Em caso de

100

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. p. 989.

101MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2. ed. Campinas : Millenium, 2000. v. IV. p. 410.

102CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. características, conseqüências e abrangências. p. 50-51.

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dúvida, a regra é de se manter a condenação, eis que, em sede de revisional, a incerteza sobre a realidade de um fato ou verdade deve prevalecer em favor da res judicata em prejuízo do réu. (grifou-se)

Por fim, insta acrescentar que a revisão criminal baseada em

sentença contrária à evidência dos autos não deve servir como uma “terceira

instância” e reavaliar todo o conjunto probatório, e sim para corrigir um erro

judiciário, decorrente da contrariedade grotesca da sentença frente às provas

colacionadas durante a instrução processual.

2.5.2 Sentença Condenatória Fundada em Depoimentos, Exames ou Documentos Comprovadamente Falsos

Quanto à falsidade de depoimentos, exames ou documentos

nos quais a sentença condenatória haja se fundado, Tourinho Filho103 observa que:

Não basta a existência de um depoimento mendaz, de um exame ou documento falso. É preciso, isto sim, que o Juiz, ao proferir a decisão condenatória, tenha-se arrimado no depoimento, nos exames ou documentos comprovadamente falsos.

Complementando o acima exposto, Grinover, Gomes Filho e

Fernandes104 esclarecem que, no caso de sentença fundamentada somente com

base na prova, no documento ou no exame falso, cabe, indubitavelmente, revisão

criminal. No entanto, se foi prolatada levando-se em conta elementos falsos e

verídicos, simultaneamente, o tribunal deve analisar se, excluída a prova falsa (o

documento ou o exame falsos), a decisão permaneceria igual. Sendo a resposta a

tal indagação afirmativa, a revisão criminal será improcedente.

A única questão controvertida é a que se refere ao momento de

demonstração da falsidade. Doutrinadores como Grinover, Gomes Filho, Fernandes

e Oliveira Junior entendem que o reconhecimento da falsidade pode ocorrer tanto

em processos apartados, como no seio da própria revisão criminal. Já Tourinho Filho

e Ceroni defendem que a falsidade não será apurada no juízo revidendo, devendo o

103

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. p. 624.

104GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal – Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 323.

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requerente simplesmente levar ao conhecimento do tribunal a prova de dita

falsidade, para que esta seja simplesmente por ele constatada.

2.5.3 Novas Provas da Inocência do Condenado ou de Circunstância que Determine ou Autorize Diminuição Especial da Pena, Descobertas Após a Sentença

Para servir como base para a revisão criminal, o conceito de

“prova nova” deve ser entendido, consoante Capez105, como a que for “produzida

sob o crivo do contraditório, não se admitindo, por exemplo, depoimentos

extrajudiciais. É também aquela que já existia à época da sentença, mas cuja

existência não foi cogitada”.

No mesmo liame, Marques106 acrescenta que não importa se

os elementos probatórios já existiam ou poderiam ter sido produzidos à época da

instrução processual. Para fundamentar a revisão criminal, basta que as provas

sejam diferentes daquelas colhidas no processo em que o réu foi condenado.

Ainda sobre seu conceito, Grinover, Gomes Filho e

Fernandes107 esclarecem que a prova nova pode ser atinente ou não a fato já

alegado, podendo, inclusive, referir-se a fato novo, que não foi, sequer, suscitado no

primeiro processo. Ademais, sustentam tais doutrinadores que a prova nova poderá

ser produzida em justificação prévia ou na própria revisão criminal, caso este em

que o autor deverá demonstrar o que realmente visa provar já no pedido inicial, sob

pena de carência da ação.

Finalmente, cumpre elucidar que as provas novas trazidas à

apreciação do tribunal devem ter, conforme instrui Mirabete108, “poder conclusivo e

demonstrar cabalmente a inocência do condenado ou a circunstância que o

favoreça, não bastando aquelas que apenas debilitam a prova dos autos ou causam

105

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.752.

106MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. p. 413.

107GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal – Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 325.

108MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 707.

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dúvidas no espírito dos julgadores”, visto que, nesse caso, conforme já afirmado,

prevalecerá a coisa julgada.

Assim, havendo novas provas, o réu poderá apresentá-las para

que seja absolvido ou, não sendo isso possível, para que sua pena seja diminuída.

2.6 COMPETÊNCIA

A competência para processar e julgar a revisão criminal se

encontra no art. 624 do CPP, o qual é explicado, detalhadamente, por Nucci109, da

seguinte forma:

Se a decisão condenatória definitiva provier de magistrado de primeiro grau, julgará a revisão criminal o tribunal que seria competente para conhecer do recurso ordinário. Caso a decisão provenha de câmara ou turma de tribunal de segundo grau, cabe ao próprio tribunal o julgamento da revisão, embora, nessa hipótese, não pela mesma câmara, mas pelo grupo reunido de câmaras criminais. Tratando-se de decisão proferida pelo Órgão Especial ou Pleno do tribunal, cabe ao mesmo colegiado o julgamento da revisão. Quanto aos tribunais superiores, dá-se o mesmo. Ao Supremo Tribunal Federal compete o julgamento de revisão criminal de seus julgados e ao Superior Tribunal de Justiça, o julgamento dos seus.

Do ensinamento doutrinário e do dispositivo de lei acima

mencionados, é possível chegar à constatação de que não há, portanto, revisão

criminal em juízo singular, ou no Tribunal do Júri, sendo a competência originária

dos tribunais.

2.7 PROCESSAMENTO

A revisão criminal tem seu processamento previsto a partir do

art. 625, que dispõe que “o requerimento será distribuído a um relator e a um revisor,

devendo funcionar como relator um desembargador que não tenha pronunciado

decisão em qualquer fase do processo”.

Sobre tal afirmação, observa-se a lição de Oliveira Junior110, no

sentido de que o que a lei veda é a parcialidade do relator, o qual não poderá haver

109

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5.ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008. p. 941.

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se pronunciado em qualquer fase processual, seja no juízo de primeiro grau, seja no

juízo de segundo. Por outro lado, afirma que a mesma situação:

[...] não se estende aos demais julgadores (revisor e vogais). Estes estarão aptos a integrar o colegiado, votando sobre o mérito da pretensão, ainda que todos tenham, no passado, pronunciado decisão no feito sob re-exame. Assim, diante da indiscutível especialidade da norma processual – e mesmo de sua clareza solar –, o juiz, que prolatou a sentença no processo, o desembargador que funcionou na apelação, o ministro que conheceu do recurso extraordinário ou especial, nenhum deles deterá prévia inaptidão para servir como vogal, exceto se sua particular condição enquadrar-se em algum daqueles outros casos insertos nos incs. I, II e IV do art. 252 do Código de Processo Penal, que os impediriam de funcionar até no procedimento condenatório anterior.

O que tal vedação legal objetiva, segundo Nucci111, é que a

revisão criminal seja analisada por um juiz imparcial, visto que, “sendo uma ação

rescisória de julgado anteriormente proferido, merece ser avaliada por um relator

desvinculado, completamente, do primeiro julgamento”. Busca-se, assim, a

imparcialidade do magistrado, para que este analise o caso sem vínculos à anterior

interpretação por ele já dada.

Dando seguimento ao processamento, o Código de Processo

Penal (art. 625, § 1º) regula que a revisão criminal deverá ser instruída com o

comprovante do trânsito em julgado da sentença, bem como com as peças

necessárias à comprovação do que está sendo alegado.

A seguir, poderá o relator determinar o apensamento dos autos

originais, desde que não advenha dificuldade à execução da sentença (art. 625, §

2º).

Porém, pode o relator entender inconveniente ao interesse da

justiça tal apensamento, ou ainda julgar insuficientemente instruído o pedido, casos

em que indeferirá liminarmente, dando recurso para as câmaras reunidas ou para o

tribunal, conforme o caso (art. 625, § 3º).

110

OLIVEIRA JUNIOR, Antonio Sydnei de. Revisão criminal – novas reflexões. p. 174.

111NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. p. 997.

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Acerca do indeferimento in limine, Ceroni112 explana que

poderá ocorrer nos seguintes casos:

a) for inepto o pedido, por não estar convenientemente instruído (com provas do fato novo, por exemplo) e ser inconveniente ao interesse da justiça que se apensem os autos originais; b) o pedido não se encaixar nas hipóteses previstas nas hipóteses legais (arts. 621 ou 626 do CPP); c) a decisão condenatória não estiver transitada em julgado; d) tratar-se de reiteração de outros pedidos onde a situação pessoal do réu foi amplamente examinada em 1ª e/ou 2ª instâncias; e) faltar reconhecimento da firma de outorgante da procuração; ou, ainda, f) faltar qualquer outro requisito essencial.

Não sendo o requerimento indeferido liminarmente, será aberta

a vista dos autos ao Ministério Público, ocasião em que o Procurador Geral de

Justiça, na área estadual, ou o Procurador Geral da República, na área federal, dará

parecer no prazo de dez dias. Em seguida, os autos serão examinados,

sucessivamente e em igual prazo, pelo relator e revisor, quando então será julgado o

pedido na sessão que o presidente designar (art. 625, § 5º).

Embora a lei não preveja a sustentação oral pelas partes

durante o julgamento, os regimentos internos dos tribunais – por serem normas

complementares para o processamento e julgamento das revisões criminais,

conforme prevê o art. 628 do CPP –, podem permiti-la.

O julgamento da revisão criminal, em conformidade com o que

esclarece novamente Ceroni113, “engloba os juízos rescindente (verificação da

admissibilidade e desconstituição da decisão revidenda) e rescisório (julgamento do

mérito e emissão de nova decisão), ou seja: juízo revisório = juízo rescindente +

juízo rescisório”.

A exceção à essa afirmação é na hipótese de anulação do

processo, com sua consequente devolução à origem para nova instrução e/ou

decisão, quando então o juízo revisório se trata apenas de juízo rescindente.

112

CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 129-130.

113CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 132.

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Sendo julgada improcedente a revisão criminal e atendidos os

pressupostos legais (alíneas a, b e c, do inciso III, dos arts. 102 e 105 da Carta

Magna), Tourinho Filho114 ensina que poderá o réu interpor recurso especial ou

extraordinário.

Se se tratar de decisão não unânime, há dois entendimentos.

Na visão de Tourinho Filho, não é possível a interposição de embargos infringentes

ou de nulidade. Isso porque o parágrafo único do art. 609 do CPP, ainda que se

refira à decisão não unânime de segunda instância, está inserido no Capítulo V, que

trata do processo e julgamento dos recursos em sentido estrito e das apelações.

Contudo, Ceroni115 defende a possibilidade dos embargos das

decisões de improcedência, não unânimes, proferidas em revisões criminais, já que

“o rigorismo exagerado na interpretação de uma lei pode levar a sérios equívocos e

incontornáveis injustiças”.

Caso a revisão seja julgada procedente, prescreve o art. 626,

do CPP, que o tribunal poderá alterar a classificação da infração, absolver o réu,

modificar a pena ou anular o processo.

Quanto às hipóteses de procedência da ação, Ceroni116, mais

uma vez, faz as seguintes ponderações: a alteração da classificação da infração

consiste na mudança da adequação típica (enquadramento do fato à norma) que,

jamais em sede de revisão criminal, poderá agravar a pena imposta anteriormente.

A absolvição é considerada a mais ampla das consequências

da revisão criminal, pois a sentença condenatória fica sem nenhum efeito,

restabelecendo, conforme prevê o art. 627 do CPP, todos os direitos do réu perdidos

em virtude da condenação.

114

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. p. 635.

115CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 132.

116CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 136-139.

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Já a modificação da pena só ocorrerá se ela puder ser

mitigada, visto que a revisão criminal só pode beneficiar o condenado, jamais

prejudicá-lo.

Por fim, a anulação do processo, explica o autor, reconhecida

por meio de sentença de natureza desconstitutiva, rescinde a sentença anterior e

remete os autos ao juízo competente para nova instrução ou decisão.

2.8 A REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA

Conforme explanado anteriormente, uma vez julgada

procedente a revisão criminal, o tribunal poderá alterar a classificação da infração,

absolver o réu, modificar a pena ou anular o processo (art. 626, caput, CPP).

Também já foi explicado que, caso o tribunal se restrinja a

anular a sentença ou o processo (juízo exclusivamente rescindente), os autos serão

remetidos ao juízo competente para que seja novamente instruído ou julgado, o que,

por lógica, submeterá o réu a uma nova decisão.

Por ser a revisão criminal um instrumento para corrigir

injustiças cometidas contra o réu, é que o parágrafo único do art. 626 do CPP prevê

o que a doutrina denomina de reformatio in pejus, consistente na proibição, de

qualquer maneira, do agravamento da pena imposta pela decisão revista.

Assim, diante dessas hipóteses de anulação, consoante ensina

Feitoza117,

a jurisprudência se firmou no sentido de que a pena anteriormente imposta serve de limite máximo a ser imposto em nova sentença, pois, do contrário, haveria reformatio in pejus indireta. Indiretamente, com a anulação da sentença ou do processo, o condenado acabaria tendo sua pena agravada, o que não seria permitido pelo art. 626, parágrafo único, do CPP, que estabeleceu que, de qualquer maneira, não poderá ser agravada a pena imposta pela decisão revista.

A respeito do tema, Grinover, Gomes Filho e Fernandes118

defendem que o instituto da reformatio in pejus indireta não abrange “a sentença

117

FEITOZA, Denilson. Direito processual penal. Teoria, Crítica e Práxis. p. 1123.

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juridicamente inexistente (como é a do juiz constitucionalmente incompetente), que,

por ser um não ato, uma não sentença, não pode produzir qualquer efeito”, não

podendo, dessa forma, servir como limite ao juiz constitucionalmente competente.

Feitoza119 discorda de tal posicionamento, sustentando que “o

juiz constitucionalmente incompetente é juiz e, portanto, está investido de jurisdição,

apenas não tendo competência. A sentença seria inexistente se tivesse sido

proferida por um não-juiz, alguém que não estivesse investido de jurisdição”. Assim,

em seu entendimento, a sentença proferida por juiz constitucionalmente

incompetente é nula, aplicando-se a ela a reformatio in pejus indireta.

2.9 A REVISÃO E A DECISÃO DO JÚRI

A questão do cabimento de revisão criminal da sentença

proferida pelo Tribunal do Júri é passível de dúvidas, por se tratar de duas garantias

constitucionais – soberania dos veredictos e devido processo legal.

Atualmente, já se encontra pacífico o entendimento de que a

sentença do júri poderá ser revista. Para embasar tal entendimento, Nucci120 expõe

os seguintes motivos:

a) a revisão é uma garantia individual mais importante, podendo superar outra, que é a soberania dos veredictos do Tribunal Popular, porque preserva o direito à liberdade; b) a soberania não pode afrontar os direitos de defesa do réu, devendo prevalecer sempre a ampla defesa; c) a soberania do júri não pode sustentar-se na condenação de um inocente, pois o direito à liberdade, como se disse, é superior; d) a soberania dos veredictos cinge-se apenas ao processo, até que a relação jurídico-processual seja decidida em definitivo; e) a soberania dos veredictos e o júri constituem garantias do direito de liberdade do réu, razão pela qual a absolvição pela revisão criminal estaria de acordo com tais finalidades; f) já existem outras possibilidades legais de revisão da decisão do júri, como a apelação.

118

GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal. Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p.335.

119FEITOZA, Denilson. Direito processual penal. Teoria, Crítica e Práxis. p. 1123.

120NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p. 933.

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No mesmo raciocínio, Demercian e Maluly121 afirmam, de forma

sucinta, que “seria contraproducente manter essa intangibilidade se a decisão dos

jurados fosse manifestamente incorreta, ofendendo o direito individual do condenado

e, assim, a própria garantia de sua liberdade”.

A doutrina se encontra pacífica quanto à aplicabilidade da

revisão criminal contra sentença do Tribunal do Júri. Todavia, é controvertida a

questão relativa à natureza da sentença (se é meramente rescindente ou, se além

de rescindente, é também rescisória).

Entre os que defendem que, sendo julgada procedente a

revisão criminal, devem os autos ser remetidos a novo julgamento pelo Tribunal do

Júri, estão Mirabete e Nucci122. Este afirma que:

A revisão criminal jamais poderia rever, quanto ao mérito, a decisão final do Tribunal do Júri, pois isso significa, em verdade, ofender o preceito constitucional da soberania dos veredictos. A harmonia dos dispositivos constitucionais é o melhor caminho e, como sustentamos, deve-se realizar o juízo rescindente, quando for o caso, pelo tribunal togado (revisão criminal) para, depois, encaminhar o feito ao juízo rescisório a ser feito pelo Tribunal do Júri (soberania dos veredictos).

Por outro lado, há aqueles que entendem que, no caso de

procedência da revisão criminal, o próprio tribunal deve proferir nova decisão, exceto

nos casos em que for declarada a nulidade da sentença revista, ocasião na qual os

autos devem ser remetidos ao Tribunal do Júri para um novo julgamento.

Compartem dessa ideia doutrinadores como Oliveira Junior,

Ceroni, Capez, Grinover, Gomes Filho, Fernandes e Tourinho Filho123, o qual explica

que:

No Direito brasileiro não há aquela separação dos dois juízos: juízo rescindente e juízo rescisório, isto é, um órgão limitando-se a anular o julgamento e possibilitando a outro a reabertura da causa para novo julgamento de meritis. Os dois juízos se amalgamam e se fundem, salvo o caso especialíssimo de nulidade. [...] Entre nós, o juízo rescindente e o rescisório, seja qual for a sua causa, cabem no

121

DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. p. 660.

122NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p. 934.

123TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. p. 619-620.

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mesmo órgão. No mesmo julgamento, apreciam-se admissibilidade e mérito.

Ademais, Capez124 acrescenta que “de nada adiantaria

simplesmente anular o júri e remeter o acusado a novo julgamento porque, mantida

a condenação pelos novos jurados, o problema persistiria sem que a revisão

pudesse solucioná-lo”.

Portanto, apesar de existirem tais divergências, certo é que a

decisão proferida pelo Tribunal do Júri poderá ser objeto da revisão criminal.

2.10 A REVISÃO PRO SOCIETATE

O ordenamento jurídico brasileiro somente admite a revisão pro

reo, sendo, portanto, proibida a revisão pro societate. Explicam Demercian e

Maluly125 que “assim o é porque a coisa julgada vem para garantir a ordem pública,

a segurança do indivíduo contra o Estado, que seria abalada se a qualquer momento

pudesse a acusação reiniciar um processo contra o suspeito de uma infração penal”.

Sobre o tema, Marques126 esclarece que “melhor atende aos

interesses do bem comum, a manutenção da sentença errada proferida em prol do

réu, do que a instabilidade e insegurança a que iria ficar sujeito o réu absolvido, se o

pronunciamento absolutório pudesse ser objeto de revisão”.

Assim, a legislação brasileira abre uma exceção, permitindo ao

réu, atingido por uma sentença condenatória injusta, requerer a revisão criminal,

posto que sua liberdade tem maior valor que a coisa julgada.

Tal situação não ocorre, porém, no caso de sentença

absolutória prolatada erroneamente, já que, nesse caso, a segurança jurídica deve

se sobrepor à necessidade de correção da prestação jurisdicional, não sendo,

portanto, permitida a revisão pro societate.

124

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p. 753.

125DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. p. 660.

126MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. p. 386.

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2.11 A INDENIZAÇÃO POR ERRO JUDICIÁRIO

Havendo erro judiciário, o condenado será indenizado pelo

Estado. Tal preceito encontra fundamento no art. 5º, LXXV, da Constituição Federal

e, de forma mais específica, no art. 630 e seguintes do CPP, que prevê que “o

tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa

indenização pelos prejuízos sofridos”.

Essa responsabilidade do Estado, de acordo com o que ensina

Oliveira Junior127, deve ser norteada pelo art. 37, § 6º, da Carta Magna, que reza

que:

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Assim, à luz desse dispositivo legal, o autor conclui que “a

responsabilidade estatal, por erro judiciário, é objetiva, não demandando prova

alguma da culpabilidade do agente estatal. Afinal, isso não é da exigência do

dispositivo constitucional”.

Para que seja reconhecido o direito à indenização, deve haver

requerimento por parte do autor, conforme se extrai do art. 630, caput, do CPP.

Nucci128 explica que, caso tal pedido não seja feito nessa oportunidade, o tribunal

não concederá a indenização. Contudo, o direito subsiste, podendo o interessado

pleiteá-lo posteriormente, em outro processo, em que se reconheça o erro judiciário

e se estabeleça o montante da indenização.

Essa indenização será liquidada no juízo cível e, tendo sido

proferida pela justiça do Distrito Federal ou de Território, responderá a União. Já o

Estado responderá caso a condenação tenha sido proferida por sua respectiva

justiça (art. 630, § 1º, CPP).

O art. 630 do CPP, em seu § 2º, dispõe sobre os casos em que

não será devida a indenização. Em sua alínea a, prevê que “se o erro ou a injustiça 127

OLIVEIRA JUNIOR, Antonio Sydnei de. Revisão criminal – novas reflexões. p. 192.

128NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p. 945.

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da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a

confissão ou a ocultação de prova em seu poder”, o réu não terá direito à

indenização.

Trata esse artigo da situação em que o erro judiciário ocorreu

em virtude da conduta do agente. Tourinho Filho129 alerta sobre as peculiaridades

dessa hipótese legal, explicando que:

Se a confissão foi conseguida mediante coação (o caso dos Irmãos Naves ainda está na lembrança), ou o réu deixou de comparecer em juízo para se defender, com receio de ser preso, e, após a condenação, apura-se o erro judiciário, que culpa se lhe pode atribuir? Devia ele suportar as torturas e não confessar? Devia ele apresentar-se à justiça, mesmo sabendo-se inocente, e permanecer preso, até que um dia surgisse um raio de luz para clarear as sombras do processo? Seria demais, Entre nós, a despeito da proibição do art. 630, § 2, a, do estatuto processual penal, os Tribunais têm atentado para essas situações irregulares.

Assim, somente nos casos em que a condenação decorrer

exclusivamente da culpa ou dolo da vítima é que a indenização não será devida.

Da mesma forma, a alínea b do § 2º do art. 630 do CPP

merece ser analisada. Grande parte dos doutrinadores, inclusive, entende que tal

dispositivo legal perdeu sua eficácia. Isso porque, em consonância com Grinover,

Gomes Filho e Fernandes130:

Essa posição do Código, bastante esdrúxula – pois mesmo na queixa-crime é o Estado que a recebe e, condenando comete o erro judiciário, pouco importando a titularidade da ação –, não pode prevalecer perante as regras constitucionais sobre a responsabilidade objetiva do Estado, que é obrigado a indenizar por erro judiciário, independentemente da titularidade da ação penal.

Por fim, resta esclarecer, conforme se verifica no art. 631 do

CPP, que se no curso da revisão falecer a pessoa cuja condenação tiver de ser

revista, será nomeado um curador pelo presidente do tribunal.

129

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. p. 642-643.

130GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal. Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p. 339.

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No capítulo seguinte, será analisada a possibilidade de se

aplicar o instituto da antecipação de tutela na revisão criminal.

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CAPÍTULO 3

DA APLICAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA NA REVISÃO CRIMINAL

3.1 DA RELAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL PENAL COM O DIREITO

PROCESSUAL CIVIL

O Direito Processual Penal brasileiro, sendo um dos ramos que

fazem parte do sistema jurídico do país como um todo, mantém relação com outras

diversas áreas das ciências jurídicas, como por exemplo, Direito Constitucional,

Direito Administrativo e Direito Comercial.

Com o Direito Processual Civil não é diferente. Atualmente,

fala-se em Teoria Geral do Processo, sem distinção entre penal e civil. Isso se deve

ao fato, nas palavras de Mirabete131, de que “os institutos processuais só diferem em

relação ao conteúdo do processo, seja ele a pretensão punitiva (processo penal),

seja ele a pretensão extra-penal (processo civil)”. Para ilustrar, o autor lembra que “é

efeito da condenação a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime (art. 91, I,

do CP), tornando-se a sentença condenatória título para a execução civil”.

Em outras inúmeras situações, poder-se-ia estabelecer uma

relação entre tais ramos jurídicos. Uma das principais previsões legais que

demonstram a integração entre processos civil e penal é a LICC que, em seu art. 4º,

dispõe que, “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a

analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.

Assim, verifica-se que, em decorrência dessa integração, é

possível, inclusive, a aplicação subsidiária do direito processual civil, no âmbito do

processo penal, quando da falta de norma regulamentadora deste.

131

MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 12.

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3.2 DA APLICAÇÃO ANALÓGICA

O Código de Processo Penal, em seu art. 3º, prevê que “a lei

processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como

o suplemento dos princípios gerais de direito”.

Esse dispositivo legal existe tendo em vista que, por mais que

se busque abranger, por meio do Direito, todas as situações cotidianas possíveis de

proibição ou de permissão, sempre haverá lacunas, mormente porque se trata de

uma ciência humana em constante evolução, já que acompanha o desenvolvimento

da sociedade.

Por isso, a aplicação analógica é uma opção que o legislador

considera como válida para ser utilizada frente à ausência de norma

regulamentadora. Segundo José Frederico Marques132, a analogia pode ser

entendida como “uma forma de auto-integração da lei para cobrir lacunas

existentes”.

Quanto à classificação da analogia, a doutrina reconhece

quatro modalidades. São elas: legal, jurídica, in malam partem e in bonam partem.

A analogia legal (ou analogia legis), de acordo com R. Limongi

França133, “é aquela que extrai a igualdade de tratamento para certo caso de uma

norma legislativa existente para outro similar”. Já a analogia jurídica (ou analogia

iuris), explica o autor, “implica a ausência total de norma legal a respeito do objeto.

O preceito, entretanto, que lhe servirá como ponto de partida, deverá estar já

formulado em meio às outras formas de expressão do direito, que não a lei”.

Em outras palavras, Norberto Bobbio134 explica que “por

analogia iuris entende-se o procedimento através do qual se tira uma nova regra

para um caso imprevisto não mais da regra que se refere a um caso singular, como

acontece na analogia legis, mas de todo o sistema ou parte dele”.

132

MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. Campinas : Millenium, 2002. v. 1. p. 194.

133FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. 6. ed. São Paulo : Saraiva, 1997. p. 44-45.

134BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Traduzido por Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. 10. ed. Brasília : Universidade de Brasília, 1999. p. 134.

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Já a denominada analogia in malam partem é aquela aplicada

em prejuízo do agente e, não pode, de forma alguma, ser aplicada no direito penal.

Isso porque, conforme explica Ney Moura Teles135, rege essa ciência o princípio da

legalidade, segundo o qual não haverá crime sem lei anterior que o defina. Assim:

O uso da analogia para suprir omissões ou lacunas do sistema de normas penais incriminadoras é terminantemente proibido, porque viola o Princípio da Reserva Legal. Definir crimes, cominar penas, é matéria reservada à lei ordinária federal e só ela pode fazer. O juiz, não.

Por seu turno, a analogia in bonam partem é aquela

empregada em benefício do agente e que, como ensina Teles136, deve ser sempre

aplicada no Direito Penal.

Como exemplo típico desse tipo de analogia, Fernando

Capez137 citou o caso (anterior à Lei 12.015/09, que revogou o artigo referente ao

atentado violento ao pudor) do art. 128, II, do CP, que dispõe que o aborto praticado

por médico não é punível quando a “gravidez resulta de estupro e o aborto é

precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante

legal”.

No caso em que a gravidez da vítima resultasse de atentado

violento ao pudor (crime previsto no revogado art. 214 do CP), poder-se-ia estender,

por analogia, a abrangência do art. 128, II, do CP, tornando lícita a conduta do

médico também nesse caso.

Salienta-se o entendimento de Maurizio Marchetti138, segundo

o qual a analogia não é determinada apenas por aspecto de lógica formal, sendo de

fundamental importância as finalidades da lei e os valores por ela tutelados,

notadamente a igualdade.

135

TELES, Ney Moura. Direito penal. Parte geral. São Paulo : Atlas, 2004. v. 1. p. 146.

136 TELES, Ney Moura. Direito penal. Parte geral. p. 146.

137CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Parte geral. 9. ed.. São Paulo : Saraiva, 2005. v. 1. p. 34.

138 MARCHETTI, Maurizio. Analogia e criação judicial. São Paulo : Juarez de Oliveira, 2002. p. 62.

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Portanto, havendo lacunas involuntárias na legislação e

hipóteses em que a lei não tenha caráter inflexível, com rol taxativo, o uso da

analogia em benefício do réu é permitido e, mais que isso, deve ser aplicado.

3.3 DA INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA

Também prevista no art. 3º do Código de Processo Penal como

uma das alternativas a ser utilizada quando da ausência de dispositivo legal, está a

interpretação extensiva, que se diferencia da aplicação analógica da lei.

Nas situações em que há texto legal acerca de um assunto,

porém, com menor abrangência, pode-se aplicar a interpretação extensiva. Nas

palavras de Teles139, esta é aplicada quando “o significado das palavras utilizadas

não corresponde, por menos amplo, ao que a norma pretende”. Alerta ainda o autor

que:

Tratando-se de normas penais incriminadoras, aquelas que definem o crime e cominam as penas, em face do princípio da legalidade, que exige que a lei penal seja exata, precisa, certa, clara, é preciso muito cuidado com a interpretação que estenda o sentido, o alcance, o conteúdo das palavras, conferindo à norma, de conseqüência, maior alcance. Em se tratando de normas definidoras de crime, o intérprete deve atentar para, conferindo maior alcance às palavras, não violar o princípio da reserva legal.

Os casos nos quais é possível aplicar a interpretação extensiva

são raros. Contudo, aduz Marques140 que “rejeitar a interpretação extensiva dentro

do Direito Penal seria escravizá-lo ao empírico sistema da exegese literal”.

Utiliza Marques também as palavras de Esmeraldino Bandeira

que, ao prefaciar a obra “Direito Penal”, de Galdino Siqueira, defende que “por amor

à literalidade ou literalismo do texto, não é justo deixar sem disciplina jurídica um

caso perfeitamente equiparável aos de que a lei cogita”.

Um exemplo de interpretação extensiva, de acordo com

Hungria141, e que não se refere, propriamente, a uma norma penal incriminadora,

139

TELES, Ney Moura. Direito penal. Parte geral. p. 142.

140 MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. p. 185.

141 Apud TELES, Ney Moura. Direito penal. Parte geral. p. 143.

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mas ao seu nome, é a bigamia. Segundo o doutrinador, ao prever tal conduta no

Código Penal, o legislador não objetivou proibir somente o segundo casamento,

mas, de igual forma, o terceiro, o quarto etc., desejando a lei, portanto, definir como

crime não só a bigamia, mas também a poligamia.

No âmbito do processo penal, pode-se citar como exemplo

típico de interpretação extensiva, o art. 185, § 2º, do CPP, que prevê que, atendidos

os requisitos e por decisão fundamentada, o juiz “poderá realizar o interrogatório do

réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de

transmissão de sons e imagens em tempo real”.

Assim, o intérprete, ao admitir, no caso concreto, a utilização

de outro recurso que não seja o sistema de videoconferência, estará fazendo uso da

interpretação extensiva, pois aumentará a abrangência da norma, que não prevê,

expressamente, quais os outros recursos que podem ser admitidos.

3.4 DAS DIFERENÇAS ENTRE ANALOGIA E INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA

Cumpre ressaltar, de igual forma, as diferenças existentes

entre a interpretação extensiva e a analogia. Para isso, explica Francesco Ferrara142

que:

Basta ponderar que a interpretação extensiva não faz senão reconstruir a vontade legislativa existente para a relação jurídica que só por inexata formulação parece à primeira vista excluída, enquanto, ao invés, a analogia se encontra em presença de uma lacuna, de um caso não previsto, e procura superá-la através de casos afins.

Já no entendimento de Marchetti143, diferenciar esses dois

institutos pode parecer muito fácil na teoria, porém, a prática tem revelado inúmeras

dificuldades em fazê-lo. Para o autor, essa distinção teria sentido somente no caso

em que fosse adotada a interpretação subjetiva, pela qual se procura “o sentido

histórico que o legislador quis imprimir ao texto legal, de forma que a interpretação

extensiva teria por base o sentido da época da promulgação da lei, enquanto a

analogia, o sentido da época da aplicação da lei”.

142

Apud FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. p. 44.

143MARCHETTI, Maurizio. Analogia e criação judicial. p. 78.

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67

No entanto, ainda defende o autor que, no sistema de

interpretação objetiva, em que se considera a vontade da lei, quando de sua

aplicação, não há que se diferenciar a analogia da interpretação extensiva,

consistindo ambas em autêntica criação do Direito, pois o que se faz, tanto em uma,

quanto em outra, é atribuir um sentido que não corresponde ao texto legal.

Sobre o tema, Bobbio144 esclarece que o critério segundo o

qual se deve diferenciar analogia de interpretação extensiva é o efeito que cada uma

gera, sendo o efeito daquela a criação de uma nova norma jurídica, enquanto o

desta consiste na extensão de uma norma para casos por ela não previstos.

3.5 DA IMPORTÂNCIA DA APLICAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA NA REVISÃO

CRIMINAL

Com o fito de melhor compreensão acerca do objeto do

presente trabalho, utilizar-se-á como exemplo o caso dos Irmãos Naves, resumido

por Ilza Barbalho145, considerado um dos maiores – se não o maior – erros

judiciários no Brasil.

A história se iniciou em 1937, na cidade de Araguari-MG, onde

viviam Joaquim Naves Rosa e Sebastião José Naves, os quais eram primos e sócios

de Benedito Pereira Caetano.

Em novembro daquele ano, Benedito sumiu da cidade, sem

comunicar qualquer pessoa, por ter vendido, com prejuízo, uma safra de arroz que

havia comprado com dinheiro emprestado por seus familiares.

Em decorrência disso, foi aberto um inquérito policial para

investigar seu desaparecimento, porém, nada se apurou.

Já em dezembro, houve a substituição do delegado civil que

comandava as investigações, por um militar, o tenente da Força Pública, Francisco

144

BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. p. 135.

145BARBALHO, Ilza. O caso dos irmãos Naves. Disponível em: <http://ser.oab-rj.org.br/index.jsp?conteudo=605>. Acesso em: 21 abr. 2010.

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Vieira dos Santos, o qual estava determinado a imputar a alguém a prática do crime

que, supostamente, havia ocorrido.

Pelo fato de os irmãos Naves terem comparecido à delegacia,

informando que um sujeito havia visto Benedito saindo da cidade e, além disso, por

serem sócios da suposta vítima, o tenente passou a suspeitar que eles poderiam ser

os responsáveis pelo suposto homicídio.

A partir de então, o novo delegado passou a torturar inúmeras

pessoas, a fim de sustentar sua suspeita contra os irmãos Naves, fazendo

perguntas, mediante intensa tortura, quantas vezes fossem necessárias até que a

pessoa dissesse o que ele queria ouvir.

Além de suas esposas, de sua genitora e de outras pessoas

terem sido vítimas de torturas e ameaças, os próprios acusados passaram a ser

torturados de todas as formas, até confessarem a prática delituosa, o que,

efetivamente, ocorreu.

Em audiência, as testemunhas e os irmãos Naves depuseram

de acordo com o que o tenente os havia instruído. Pronunciados, os acusados foram

submetidos ao Tribunal do Júri, ocasião em que Joaquim e Sebastião alegaram que

a confissão tinha se dado em decorrência das torturas por eles sofridas e que, na

realidade, não haviam cometido crime algum.

Os acusados, nessa oportunidade, foram absolvidos, porém, a

Promotoria interpôs recurso de apelação, obtendo a anulação do processo por falta

de votação dos quesitos referentes à coautoria.

Submetidos a outro julgamento, os irmãos Naves foram,

novamente, absolvidos, porém, não por unanimidade. O Ministério Público, então,

interpôs outro recurso de apelação, o qual foi julgado procedente e que acarretou a

ocorrência do terceiro julgamento pelo Tribunal do Júri.

Nessa ocasião, os irmãos Naves foram condenados a 25 (vinte

e cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão, fato esse ocorrido em julho de 1939.

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Em 1946, Joaquim e Sebastião fizeram jus ao benefício da

liberdade condicional. Dois anos mais tarde, Joaquim morreu devido a uma longa

enfermidade.

Por fim, já em 1952, a suposta vítima, Benedito Pereira

Caetano, reapareceu na fazenda de seu pai, comprovando nunca ter ocorrido

qualquer crime de homicídio contra sua pessoa.

Esse caso, em que se verifica tamanho erro judiciário, é um

exemplo ideal para demonstrar a importância do tema do presente trabalho. Isso

porque, em situações como essa, em que surge uma prova inequívoca sobre a

inocência do réu, a concessão da tutela antecipada na revisão criminal amenizaria o

sofrimento de quem se encontra cumprindo uma pena imposta, erroneamente, pelo

Estado.

Sabe-se que casos de flagrante erro judiciário ocorrem no dia-

a-dia, já que a prestação jurisdicional é passível de falibilidade humana. Contudo, o

que não se pode permitir é que a um inocente seja imposta uma reprimenda por um

crime que não cometeu.

Assim, a tutela antecipada, se aplicada também em sede de

revisão criminal, diminuirá os prejuízos causados pela sentença injusta, proferida

pelo Estado-juiz, antecipando a liberdade do indivíduo, dele retirada por um erro.

3.6 DA APLICAÇÃO PRÁTICA DA TUTELA ANTECIPADA NA REVISÃO

CRIMINAL

Inicialmente, é imperioso ressaltar que, para o presente

trabalho, somente foi considerada a hipótese de tutela antecipada como medida de

urgência a ser aplicada na revisão criminal, embora se tenha conhecimento de que

tanto o habeas corpus, como a cautelar poderiam, de igual forma, ser utilizados para

antecipar a liberdade do réu que tenha, contra si, uma sentença condenatória

injusta, transitada em julgado.

Essa escolha decorreu de dois motivos: em relação ao habeas

corpus, por questão de economia e celeridade processuais, porquanto esse

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70

instrumento é uma ação própria, que seria utilizada, exclusivamente, para libertar o

condenado, devendo este, posteriormente, requerer a revisão criminal em ação

distinta.

Já em relação à cautelar, porque o dispositivo que trata sobre a

tutela antecipada admite, de forma uníssona na doutrina e na jurisprudência, a

fungibilidade entre os dois institutos, prevista no art. 273, § 7º, do CPC, caso o

magistrado entenda que o autor, a título de tutela antecipada, requereu providência

de natureza cautelar (já o contrário, ou seja, em situações em que se requer, a título

de cautelar, providência que deveria ser objeto de tutela antecipada, possui

entendimento controvertido, como já se explanou no item 1.9).

Em vista disso, cumpre, de igual forma, esclarecer que a

aplicação do instituto da tutela antecipada, em sede de revisão criminal, por não

possuir previsão legal expressa, é um tema praticamente inexistente na doutrina e,

ademais, bastante controverso na jurisprudência pátria.

Para confirmar o acima afirmado, serão expostos alguns

julgados, em diversos tribunais do país, a iniciar pelo Tribunal de Justiça de Santa

Catarina, o qual entende não caber concessão de liminar na revisão criminal, como

se verificará a seguir:

REVISÃO CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. SEGUNDO JULGAMENTO. REQUERENTE CONDENADO POR HOMICÍDIO QUALIFICADO E TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO DUPLAMENTE AGRAVADO, EM CONCURSO MATERIAL (ART. 121, § 2º, V E ART. 155, § 4º, I, II E IV, C/C ART. 14, II, AMBOS NA FORMA DO ART. 69, TODOS DO CP).

CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA PARA OBSTAR O CUMPRIMENTO DO MANDADO DE PRISÃO. DESCABIMENTO. INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO DA LEI PROCESSUAL CIVIL E INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO DE EFEITO SUSPENSIVO ÀS REVISÕES CRIMINAIS [...] (Rev. Crim. n. 2009.058935-2. Rel. Marli Mosimann Vargas. Seção Criminal. J. em 18.12.09) 146.

Compulsando o inteiro teor do julgado acima, pôde-se

constatar que, pelo fato de não existir norma que preveja a possibilidade de

146

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Revisão Criminal nº 2009.058935-2, da Seção Criminal, 18 de dezembro de 2009. Disponível em: <http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/index.action>. Acesso em: 2 abr. 2010.

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concessão da antecipação da tutela em revisão criminal, esta foi considerada

descabida. Nas palavras da relatora, o indeferimento do pedido de tutela antecipada

decorreu da “inaplicabilidade do instituto da Lei Processual Civil e a inexistência de

previsão de efeito suspensivo às revisões criminais”.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, da mesma forma,

na Revisão Criminal nº 70021944350, decidiu pelo descabimento da tutela

antecipada, porém, por entenderem os eméritos julgadores que a coisa julgada, via

de regra, não deve ser alterada. Para sustentar sua argumentação, utilizaram as

lições de Mirabete, constantes em um julgado do Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo:

REVISÃO – Pedido fundado na suposta existência de controvérsia sobre a graduação das provas aferidas na instância ordinária – Insuficiência para permitir o provimento da demanda revisional, cujo fim não é o princípio do in dúbio pro reo, mas sim o do in dúbio pro re judicata (...) (in CÓDIGO DE PROCESSO PENAL INTERPRETADO, Julio Fabbrini Mirabete, 11ª edição, 2004, pág.1620.) (grifou-se)147.

Entretanto, na Revisão Criminal nº 70008934911, o Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul, embora tenha julgado pela improcedência da liminar,

fez a ressalva de que, nos casos em que se constatar erro judiciário grosseiro ou

nulidade flagrante, poderia ser possível sua concessão, como se verifica a seguir:

REVISÃO CRIMINAL. LIMINAR. REEXAME DE PROVA. IMPROCEDÊNCIA. Não cabe liminar em Revisão Criminal, em face da coisa julgada, salvo a constatação de grosseiro erro judiciário ou de nulidade flagrante. Improcede a Revisão Criminal quando o fundamento legal invocado importa em reexame de prova, sem nada de novo que a altere. (Rev. Crim. n. 70008934911. Rel. Carlos Rafael Santos de Oliveira. Segundo Grupo Criminal. J. em 10.09.04) (grifou-se) 148.

Luiz Toneti149 entende que a falta de previsão legal sobre a

concessão de uma tutela de urgência nas ações de revisão criminal não pode

147

RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Revisão Criminal nº 70021944350, do Segundo Grupo Criminal, 14 de dezembro de 2007. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris>. Acesso em: 2 abr. 2010.

148RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Revisão Criminal nº 70008934911, do Segundo Grupo Criminal, 10 de setembro de 2004. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris>. Acesso em: 2 abr. 2010.

149 TONETI, Luiz. Medida liminar em revisão criminal. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.10, n.120, p. 11-13, nov. 2002.

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justificar o seu descabimento, pois por meio dela se evita “o prosseguimento de uma

coação, uma vez que ao Judiciário, poder instituído pelo Estado, cabe proporcionar

ordem e harmonia à sociedade”.

Além dele, outros doutrinadores vêm reconhecendo a

possibilidade de se aplicar a tutela antecipada na revisão criminal. Grinover, Gomes

Filho e Fernandes150 explicam que, na maior parte dos casos, a credibilidade da

coisa julgada prevalecerá frente aos argumentos apresentados na ação revisional.

Contudo:

Em determinadas hipóteses, a seriedade dos argumentos trazidos pelo réu, e até mesmo um começo de prova, poderão ser, num juízo sumário e provisório, tão convincentes que afetem substancialmente a certeza do direito estabelecida pela coisa julgada. Para esses casos, outros ordenamentos prevêem a suspensão da sentença condenatória, com liberação do condenado e aplicação de medidas coercitivas equivalentes às relacionadas à liberdade provisória.

Corroborando com o acima exposto, Ceroni151 entende que, em

casos excepcionais, é possível o deferimento da liminar na própria ação revisional:

[...] a fim de que o relator suspenda a execução da reprimenda em casos de evidente e colossal erro judiciário, pois presentes os requisitos autorizadores do fumus boni iuris e periculum in mora, reveladores do desrespeito aos princípios da dignidade, do status libertatis e da razoabilidade que, efetiva e substancialmente, afetam a certeza do direito firmado pela res judicata.

Ademais, imperioso frisar que alguns doutrinadores veem a

revisão criminal como “irmã gêmea” da ação rescisória, utilizada na esfera cível, na

qual é admitida a concessão de tutela antecipada.

Tal diferença de tratamento, na realidade, segundo João Daniel

Jacobina Brandão de Carvalho152, somente evidencia “o descompasso em que anda

a evolução do Código de Processo Penal”, havendo grande desproporcionalidade,

150

GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal. Teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação e reclamação aos Tribunais. p.333.

151CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 209.

152CARVALHO, João Daniel Jacobina B. de. A tutela de emergência na revisão criminal em face da Lei 11.280/2006. Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 15, n. 182, p.16, jan. 2008.

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mormente quando se analisa os bens jurídicos que a ação rescisória e a revisional

tutelam: “enquanto naquela cuida-se, via de regra, de bens patrimoniais e

disponíveis, no processo penal quase sempre o direito de liberdade está em pauta”.

Para ilustrar o que, na teoria, lecionam tais doutrinadores, há o

parecer elaborado pelo Procurador Regional da República da 5ª Região, nos autos

da ação de revisão criminal nº 2007.05.00.076774-5, por meio do qual opinou pelo

deferimento do pedido formulado pelo autor, referente à tutela antecipada, como se

verá a seguir:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. CONCESSÃO DE LIMINAR PARA SUSPENDER O INÍCIO DA EXECUÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO DA 1ª. TURMA DO TRF5 (FLS. 55/63). INTIMAÇÃO PESSOAL DE DEFENSOR DATIVO/PÚBLICO PARA A SESSÃO DE JULGAMENTO. AUSÊNCIA. POSTERIOR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA PRÓPRIA DECISÃO COLEGIADA. NULIDADE ABSOLUTA. OPINATIVO PELA CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR REQUESTADA E, NO MÉRITO, PELA PROCEDÊNCIA DA AÇÃO REVISIONAL.

1 – Não tendo havido intimação do defensor público ou dativo para a sessão de julgamento da Apelação Criminal nº 4743-CE (processo nº 2005.81.00.004787-3), nem muito menos do teor do acórdão proferido pela 1ª. Turma do TRF5, não há que se falar em regular trânsito em julgado da decisão colegiada de fls. 55/63, sendo de rigor a concessão de medida liminar para sobrestar o início da execução da pena no juízo de origem, já que presentes, assim, os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora [...] (grifou-se)153.

Salienta-se que, no acórdão proferido nos autos do processo

acima mencionado, o relator deixou de analisar o pedido liminar de suspensão da

pena, posto que o juiz monocrático já o havia deferido.

Como se verificou, é possível, ainda que excepcionalmente, a

concessão da tutela antecipada na revisão criminal. Ceroni154 novamente esclarece

que:

153

PERNAMBUCO. Procuradoria Regional da República da 5ª Região. Revisão Criminal nº 2007.05.00.076774-5, 11 de outubro de 2007. Disponível em http://www.prr5.mpf.gov.br/ nucrim/boletim/2007_05/pecas/rvcr54.pdf. Acesso em: 13 abr. 2010.

154CERONI, Carlos Roberto Barros. Revisão criminal. Características, conseqüências e abrangências. p. 209-210.

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Assim, extraordinariamente, quando houver, desde o início do pedido, prova inequívoca que conduz ao convencimento de que a alegação é verossímil, poder-se-á aplicar, por analogia, em favor do réu, os arts. 273, I (antecipação dos efeitos da tutela pretendida) e 798 (medida provisória para evitar fundado receio de lesão grave ao direito do réu e de difícil reparação), ambos do Código de Processo Civil, liberando-se o peticionário, mas com providência de contra-cautela, em razão da excepcionalidade da medida.

Dessa forma, explica Toneti155 que, “evidenciado que a

condenação não foi acertada e os documentos que instruírem a inicial comprovarem,

de plano, a ilegalidade da coação, não há porque o tribunal não ordenar que cesse

imediatamente o constrangimento”.

No que tange ao assunto, o Tribunal de Justiça do Estado do

Paraná156 já se manifestou a respeito, nos autos do processo nº 651762-6,

concedendo uma liminar em sede de revisão criminal. O relator Macedo Pacheco,

primeiramente em seu voto, alegou que:

Embora não esteja prevista a concessão de efeito suspensivo na revisão criminal, o direito deve ser interpretado de forma dinâmica. O art. 3º, do CPP permite a integração da norma, e àquele, analisado em conjunto com o art. 4º, da LICC, possibilita a integração da lei processual penal com a lei processual civil.

Destarte, afirma o relator, deve ser reconhecida a possibilidade

de concessão, na revisão criminal, de antecipação de tutela ou liminar, já que, tanto

a ação rescisória (juízo cível) quanto a ação revisional têm o mesmo objetivo, qual

seja, o de desconstituir uma sentença transitada em julgado. Portanto, sendo

possível, desde que preenchidos os requisitos, a suspensão de execução da

sentença rescindenda na esfera cível, também o deve ser na esfera criminal, em

sede revisional.

Outro argumento utilizado por Macedo Pacheco foi o fato de

que:

Se no âmbito cível, que de regra disputam-se interesses disponíveis, é possível a concessão de efeito suspensivo à execução da

155

TONETI, Luiz. Medida liminar em revisão criminal. p. 11-13.

156PARANÁ. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Revisão Criminal nº 651762-6, 29 de janeiro de 2010. Disponível em http://www.tj.pr.gov.br/portal/consultas/consultajurisprudencia. asp?consulta=. Acesso em: 14 abr. 2010.

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sentença, é evidente que tal medida se aplica no campo penal eis que os efeitos atingem diretamente o status libertatis do réu.

Dessa forma, entende o desembargador, se é possível a

aplicação do instituto nas ações rescisórias, “forçoso concluir a conveniência de sua

utilização em sua irmã gêmea – a ação revisional criminal”.

Cumpre salientar ainda as palavras de Toneti157, que expõe:

Decisão contrária à lei ou à prova ofende a regra constitucional do devido processo legal (art. 5º, LIV) e se a sentença se fundamenta em prova falsa, certamente esta foi obtida por meio ilícito, vedado por citado dispositivo constitucional. Demonstrado o vício da injusta condenação, nada impede a concessão de liminar em pedido revisional já na inicial, não podendo, a alegada inexistência de previsão legal, criar obstáculos para garantir a supremacia da liberdade.

Num Estado Democrático de Direito, não pode o juiz se apegar a certos formalismos, máxime quando, ao contrário do juízo cível, na revisão criminal é admissível qualquer meio de prova e não somente a documental.

Assim, infere-se que a aplicação da tutela antecipatória em

sede de revisão criminal ainda se trata de tema divergente e que depende,

principalmente, das formas de interpretação utilizadas por quem analisa o caso

concreto, pois, se se trata de um intérprete que entende que, no Direito Processual

Penal, só deve ser aplicada a interpretação literal da lei, a medida não será deferida.

Já se for um intérprete que entende que, em se tratando de

analogia in bonam partem, é possível sua aplicação no Direito Processual Penal, a

tutela antecipada poderá ser deferida na revisão criminal, ainda que não haja

previsão legal a respeito no CPP.

Por todo o exposto, justifica-se a aplicação do instituto da tutela

antecipada em sede de revisão criminal, em casos como o dos Irmãos Naves e em

tantos outros que, certamente, ocorrem com a atuação do judiciário.

157

TONETI, Luiz. Medida liminar em revisão criminal. p. 11-13.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho, discorreu-se a possibilidade da aplicação

da tutela antecipada em sede de revisão criminal, tratando-se, primeiramente,

acerca da tutela antecipatória, prevista no art. 273 do Código de Processo Civil, bem

como de seus pressupostos e características, de forma que todo o dispositivo legal

atinente a esse instituto foi abrangido.

Logo, explanou-se sobre a ação de revisão criminal, prevista

no art. 621 e seguintes do Código de Processo Penal e, de igual forma, seus

requisitos, características e peculiaridades, apontando os temas controvertidos e

salientando outros pontos relevantes.

Por fim, foi exposta a possibilidade, de acordo com

entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, de aplicação do instituto da tutela

antecipada na revisão criminal.

No que tange às jurisprudências colhidas para a elaboração

deste trabalho, constatou-se que os Tribunais de Justiça de Santa Catarina, do Rio

Grande do Sul e do Paraná, muito embora estejam localizados na mesma região do

país, possuem entendimentos discrepantes acerca do tema.

Isso porque o TJSC, em julgados pretéritos, indeferiu o pedido

de tutela de urgência em sede revisional, utilizando como argumento a mera

ausência de norma regulamentadora específica. O TJRS também o indeferiu, porém,

por entenderem os desembargadores que a res judicata deve prevalecer. Por outro

lado, fizeram a ressalva de que, em casos de grosseiro erro judiciário ou flagrante

nulidade, poderia ser possível sua concessão. Já o TJPR se manifestou acerca da

possibilidade de concessão de tutelas de urgência em ação de revisão criminal,

baseando-se, principalmente, na analogia.

Apesar da divergência acima exposta, a hipótese inicialmente

levantada foi confirmada, tendo em vista que, apesar da ausência de lei específica, a

aplicação da tutela antecipatória em sede de ação revisional é possível em

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determinados casos, nos quais o erro judiciário ou a nulidade tenham sido flagrantes

e se constate isso desde o início do processo.

Nesses casos, seria incabível admitir que uma pessoa,

equivocadamente condenada, continuasse a cumprir uma pena que se sabe injusta,

apenas por não haver previsão legal expressa, que permita a aplicação do instituto

da tutela antecipada na revisão criminal.

Outro argumento levantado no trabalho, utilizado para

sustentar seu cabimento, é o fato de que se, na ação rescisória, considerada como a

ação revisional do processo cível e que tem por objeto, geralmente, direitos

patrimoniais, é cabível a tutela antecipatória, na revisão criminal, cujo objeto é a

liberdade da pessoa, indiscutível deveria ser a sua admissibilidade.

Assim, por meio da aplicação do instituto da tutela antecipada

na ação revisional, o erro judiciário e, principalmente, os prejuízos advindos dele

ficam, de sobremaneira, amenizados, já que não é necessária a espera pelo término

do processo para que a liberdade e a dignidade sejam restituídas ao injustamente

condenado.

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