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55 Revista TCEMG|jan.|fev.|mar. 2012| DOUTRINA A aposentadoria especial do servidor público federal na Constituição da República João Batista Ribeiro Juiz Federal Titular da 5ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais. Resumo: Este artigo aborda os requisitos necessários para a concessão do benefício da aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo público efetivo resultante do exercício de atividades que prejudiquem a saúde ou a integridade física, bem assim aos servidores portadores de deficiência. Mora estatal quanto à edição da Lei Complementar prevista no art. 40, § 4º, da Constituição Federal, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. Aplicação supletiva da Lei n. 8.213/91, enquanto não editada lei complementar específica. Regime jurídico dos policiais civis e professores. Palavras-chave: Aposentadoria especial. Servidor público. Aplicabilidade da Lei n. 8.213/91. Direito previsto no art. 40, § 4º, III, da Constituição Federal. Mora legislativa reconhecida pelo STF. Regime jurídico dos policiais civis e professores. Abstract: is paper addresses the necessary requirements for the concession of special retirement to civil servants, holders of effective public office, resulting from the activities which may endanger their health or their physical integrity, as well as to disabled civil servants. State delay as to the edition of the Complementary Law as provided in the Article 40, § 4°, of the Federal Constitution, recognized by the Supreme Court. Residual application of Law n. 8.213, of 1991, until specific complementary law is edited. Judicial regime of civil policemen and teachers. Keywords: Special retirement to civil servants. Applicability of Law n. 8.213/91. Public right guaranteed in Art. 40, § 4°, III, of the Federal Constitution. State delay decreed. Judicial regime of civil policemen and teachers.

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A aposentadoria especial do servidor público federal na Constituição da República

João Batista Ribeiro

Juiz Federal Titular da 5ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais.

Resumo: Este artigo aborda os requisitos necessários para a concessão do benefício da aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo público efetivo resultante do exercício de atividades que prejudiquem a saúde ou a integridade física, bem assim aos servidores portadores de deficiência. Mora estatal quanto à edição da Lei Complementar prevista no art. 40, § 4º, da Constituição Federal, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. Aplicação supletiva da Lei n. 8.213/91, enquanto não editada lei complementar específica. Regime jurídico dos policiais civis e professores.

Palavras-chave: Aposentadoria especial. Servidor público. Aplicabilidade da Lei n. 8.213/91. Direito previsto no art. 40, § 4º, III, da Constituição Federal. Mora legislativa reconhecida pelo STF. Regime jurídico dos policiais civis e professores.

Abstract: This paper addresses the necessary requirements for the concession of special retirement to civil servants, holders of effective public office, resulting from the activities which may endanger their health or their physical integrity, as well as to disabled civil servants. State delay as to the edition of the Complementary Law as provided in the Article 40, § 4°, of the Federal Constitution, recognized by the Supreme Court. Residual application of Law n. 8.213, of 1991, until specific complementary law is edited. Judicial regime of civil policemen and teachers.

Keywords: Special retirement to civil servants. Applicability of Law n. 8.213/91. Public right guaranteed in Art. 40, § 4°, III, of the Federal Constitution. State delay decreed. Judicial regime of civil policemen and teachers.

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A APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

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O direito à contagem especial de tempo de serviço é conferido aos servidores públicos titulares de cargos efetivos (CF, art. 37, II) que laboram em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, conforme estabelece o art. 40, § 4º, III, da Constituição Federal, cuja redação é a seguinte:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União,dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo (redação dada pela Emenda Constitucional n. 41, 19/12/2003)

[...]

§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (redação dada pela Emenda Constitucional n. 47, de 2005)

[...]

III — cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (incluído pela Emenda Constitucional n. 47, de 2005)

Neste ponto, impõe-se traçar algumas linhas acerca da competência legiferante para disciplinar a matéria (contagem de tempo de serviço para aposentadoria especial).

De fato, o inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição Federal, com a redação determinada pela EC n. 47/05, estabelece regras gerais e especiais pertinentes ao regime de aposentadoria dos servidores ocupantes de cargos efetivos. Essas regras aplicam-se de modo uniforme aos servidores públicos, sejam eles vinculados à União, aos Estados ou aos Municípios.

A natureza geral dos temas que envolvem a previdência social foi reconhecida pelo próprio constituinte originário ao outorgar à União, aos Estados e ao Distrito Federal competência concorrente para legislar sobre a matéria e ao Município competência para suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, art. 24, XII, e art. 30, II, c/c art. 149, § 1º, da Carta da República, respectivamente.

O Prof. Marcelo Barroso Lima Brito de Campos ( 2009, p. 179), com muita propriedade, ensina que

[...] caberá às leis complementares federais dispor sobre normas gerais (CF, art. 24, XII e § 1º) e às leis estaduais dispor sobre normas suplementares (CF, art. 24, XII e § 2º) acerca da aposentadoria especial dos servidores. Porém, cabe às leis complementares dos Estados disporem plenamente sobre esta espécie de aposentadoria diante da inexistência de lei complementar federal (CF, art. 24, XII e § 3º), neste caso, a superveniência de lei complementar federal sobre normas gerais acerca da matéria suspenderá a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (CF, art. 24, XII e § 4º).

No caso dos Municípios, a questão se resolve pelo princípio da autonomia federativa, já que a despeito de não se integrarem ao sistema de repartição constitucional de competências concorrentes, têm competência suplementar (CF, art. 30, II e a ele compete legislar sobre assuntos de interesse local (CF, art. 30, I). Logo, os Municípios também têm competência para tratar da aposentadoria especial dos seus respectivos servidores públicos nos mesmos limites que os Estados os têm, conforme indicado no parágrafo anterior.

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Ousamos discordar do entendimento esposado pelo jurista no ponto em que afirma que os Municípios têm competência para tratar de aposentadoria especial dos seus servidores públicos nos mesmos limites que os Estados os têm.

Deveras, na esteira de consolidado entendimento firmado no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), o Município não detém competência legislativa para instituir sistema previdenciário de seus servidores em desconformidade com o modelo nacional por ser competência privativa da União legislar sobre previdência,1 de forma que a questão sob análise somente pode ser disciplinada por norma geral, editada pela União, sem prejuízo da legislação estadual, suplementar ou plena, na ausência de lei federal (Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.024).

Vale ressaltar, neste ponto, que o Plenário do STF, no julgamento da ADI n. 3.106/MG, DJe de 24/09/10, deixou consignado, no voto proferido pelo eminente relator Min. Eros Grau, as seguintes observações, inteiramente aplicáveis à hipótese em comentário:

[...] A previdência social, consoante o disposto no art. 24, XII, da Constituição do Brasil, é matéria de competência legislativa concorrente da União, dos Estados-membros e do Distrito Federal.

A legislação concorrente pode ser “cumulativa” — quando inexistirem limites prévios para o exercício da competência — ou “não cumulativa”, hipótese na qual, dentro de um campo material (concorrência material da competência), reserva-se um nível superior ao ente federativo da União, que fixa as normas gerais, deixando-se ao Estado-membro a complementação da matéria.

Essa orientação, que encontra raízes na Constituição de Weimar (art.10), consiste em atribuir-se à União a fixação das normas gerais, sem descer a pormenores, cabendo aos Estados-membros a adequação da legislação às peculiaridades locais.

De outra parte, a “competência suplementar” dos Estados-membros e do Distrito Federal pode ser classificada em duas espécies: “competência complementar” e “competência supletiva”. A primeira dependerá de prévia existência de lei federal a ser pormenorizada pelos Estados-membros e pelo Distrito Federal. A segunda surgirá em virtude da inércia da União em editar a lei federal, quando, então, os Estados-membros e o Distrito Federal, temporariamente, gozarão de “competência plena” tanto para a edição de normas de caráter geral, quanto para a edição de normas específicas (CR, art. 24, §§ 3º e 4º).

Isso significa, portanto, que “a competência legislativa concorrente não afasta a necessidade de tratamento uniforme do tema, em especial por se tratar de norma que excepciona as regras gerais de aposentadoria, a exigir a edição de norma regulamentadora de caráter nacional e, portanto, a atuação normativa da União” (MI n. 1.620 AgR-AgR-segundo/DF).

Registre-se, ainda, que o Plenário do STF firmou entendimento de que qualifica ato de transgressão constitucional a violação de normas gerais editadas em matéria de competência concorrente:

A Constituição da República, nas hipóteses de competência concorrente (CF, art. 24), estabeleceu verdadeira situação de condomínio legislativo entre a União Federal, os Estados-membros e o Distrito Federal (RAUL MACHADO HORTA, “Estudos de Direito Constitucional”, p. 366, item n. 2, 1995, Del Rey), daí resultando clara repartição vertical de competências normativas entre essas pessoas estatais, cabendo, à União, estabelecer normas gerais (CF, art. 24, § 1º), e, aos Estados-membros e ao Distrito Federal, exercer competência suplementar (CF, art. 24, § 2º). — A Carta Política, por sua vez, ao instituir

1 Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 205.194/RS; Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 395.666/MG; Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 495.684/PA).

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um sistema de condomínio legislativo nas matérias taxativamente indicadas no seu art. 24 — dentre as quais avulta, por sua importância, aquela concernente ao ensino (art. 24, IX) —, deferiu ao Estado-membro e ao Distrito Federal, em “inexistindo lei federal sobre normas gerais”, a possibilidade de exercer a competência legislativa plena, desde que “para atender a suas peculiaridades” (art. 24, § 3º). — Os Estados-membros e o Distrito Federal não podem, mediante legislação autônoma, agindo ultra vires, transgredir a legislação fundamental ou de princípios que a União Federal fez editar no desempenho legítimo de sua competência constitucional e de cujo exercício deriva o poder de fixar, validamente, diretrizes e bases gerais pertinentes a determinada matéria (educação e ensino, na espécie). (Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.667/DF)

Na hipótese sob exame, consoante se vê, a Carta da República exige a edição de lei complementar a fim de estabelecer normas gerais para a concessão da aposentadoria especial, matéria de natureza previdenciária, cuja iniciativa é privativa do Presidente da República (art. 40, § 4º, III, c/c art. 61, § 1º, II, c, e art. 24, XII, § 1º, da Constituição Federal).

Assim, inexistente, para a espécie, a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor público, caberá a cada interessado, estando na mesma situação jurídica, postular a supressão da omissão legislativa, mediante pronunciamento jurisdicional, por intermédio de mandado de injunção, a fim de lhe assegurar o direito à concessão da aposentadoria especial, devendo a administração verificar se estão preenchidos os requisitos previstos no art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/91.

A doutrina de Wladimir Novaes Martinez (2011, p. 24) é no sentido de:

Enquanto não for regulamentado o art. 40, § 4º, da Carta Magna, mediante lei complementar e o direito individual ou de uma categoria for assegurado por ação intentada no STF, somente os servidores beneficiados por esse remédio jurídico fazem jus à aposentadoria especial.

Na mesma vertente interpretativa também se manifestaram os Procuradores Federais Eduardo Rocha Dias e José Leandro Monteiro de Macedo (2010, p. 149):

O § 4º, do art. 40 da Constituição com a redação da Emenda Constitucional 20/1998, vedou a adoção de critérios diferenciados para a concessão da aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata o mencionado artigo, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física definidos em lei complementar. A demora na edição da lei complementar levou o pleno do STF a declarar a mora legislativa do Poder Público no Mandado de Injunção 721 (Relator Ministro Marco Aurélio), facultando a uma servidora pública o direito à aposentadoria especial nos termos do art. 57, da Lei 8.213, de 1991, até que venha ser editada a citada lei.

[...]

Entretanto, à falta de regulamentação desse direito, cabe ao Supremo autorizar de forma temporária, até a vinda da lei complementar, o exercício do direito assegurado constitucionalmente [...] (grifo nosso).

Impõe-se destacar que, na espécie vertente, o fato de o Plenário do STF ter concedido a ordem injuncional para, declarando a mora legislativa na regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal — com a finalidade de assegurar aos servidores públicos ou à determinada categoria profissional o direito de ter os seus pedidos administrativos de aposentadoria especial concretamente analisados pela autoridade competente, mediante a aplicação integrativa do art. 57 da Lei Federal

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n. 8.213/91 — em sucessivas decisões2 garantir em consequência, aos servidores públicos que se enquadrem nas hipóteses previstas no § 4º do art. 40 da Constituição, o direito à aposentadoria especial, não autoriza a sua extensão ao servidor público sem a necessidade de submetê-la ao STF por intermédio de mandado de injunção.

Desta forma, para que o servidor público possa efetuar a contagem especial do tempo de serviço trabalhado em atividades penosas, insalubres ou perigosas no ente público a que se encontra vinculado, a fim de lhe assegurar o direito à aposentadoria especial aplicando-se os mesmos critérios da legislação que rege os empregados celetistas, ele deverá postular e obter a concessão de mandado de injunção para essa específica finalidade.

Isto porque o mandado de injunção traduz processo subjetivo, de sorte que a decisão nele prolatada possui eficácia entre as quais foi dada não prejudicando ou beneficiando terceiros.

Efetivamente, o Plenário do STF, por ocasião do julgamento do Mandado de Injunção n. 1.083/DF, já deixou assentado que descabe confundir o mandado de injunção (processo subjetivo) com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (processo objetivo), de sorte que, tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada, conforme se depreende do voto do ministro relator:

[...] Não há de se confundir a atuação do julgamento do mandado de injunção com atividade do Legislativo. Em síntese, ao agir, o Judiciário não lança, na ordem jurídica, preceito abstrato. Não, o que se tem, em termos de prestação jurisdicional, é a viabilização, no caso concreto, do exercício do direito, do exercício da liberdade constitucional, das prerrogativas ligadas a nacionalidade, soberania e cidadania. O pronunciamento judicial faz lei entre as partes, como qualquer pronunciamento em processo subjetivo, ficando, até mesmo, sujeito a uma condição resolutiva, ou seja, ao suprimento da lacuna regulamentadora por quem de direito, Poder Legislativo.

Diante deste contexto, não há que se falar na possibilidade de concessão de efeitos erga omnes às sucessivas decisões do Plenário do STF que concederam a ordem injuncional para, reconhecido o estado de mora legislativa, garantir à parte impetrante o direito de ter seu pedido de aposentadoria especial analisado pela autoridade competente, mediante a aplicação integrativa do art. 57, da Lei n. 8.213/91, ao fundamento de que tais decisões deram concretude à aposentadoria especial, com a aplicação da Lei n. 8.213/91, até que sobrevenha lei complementar disciplinando a matéria, ao argumento de que a decisão proferida em mandado de injunção não se difere, em substância, daquela prolatada no exercício do controle abstrato de omissões legislativas.

Cabe observar que não se aplica à concessão da aposentadoria especial o quanto decidido pelo Excelso Pretório nos autos dos Mandados de Injunção n. 670/ES, 708/DF e 712/PA, em que o Plenário manifestou o entendimento no sentido da eficácia imediata do direito constitucional de greve dos servidores públicos, a ser exercido por meio da aplicação das Leis n. 7.701/88 e 7.783/89, até que sobrevenha lei específica para regulamentar a questão, em que se emprestou eficácia erga omnes às tais decisões, já que todos os votos proferidos partiram da premissa de se tratar de caso específico que configura uma situação peculiar.

É o que está expresso no voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes, por ocasião do julgamento do MI n. 712/PA, em que se analisava a possibilidade do exercício do direito de greve pelo servidor 2 Mandado de Injunção n. 721/DF; Mandado de Injunção n. 758/DF; Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 1.169/DF;

Embargos de Declaração no Mandado de Injunção n. 1.194/DF; Mandado de Injunção n. 1.083/DF.

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público, ao explicar o único ponto de divergência existente com o voto prolatado pelo Ministro Ricardo Lewandowski, que relutava em conferir efeito erga omnes a uma decisão que, no mandado de injunção, é prolatada caso a caso. São suas palavras:

Em relação ao aspecto suscitado pelo Ministro Lewandowski, no meu voto, referindo-me quando ao aspecto da eficácia erga omnes, ressaltei que, a rigor, os casos de omissão inconstitucional, quando resolvidos — isso é pacífica numa parte da doutrina no Direito Comparado, pelo menos quando imaginamos esse tipo de regra geral —, acabam por ser decididos, na verdade, com eficácia erga omnes, seja no âmbito da ação direta por omissão, seja no âmbito do próprio mandado de injunção. Estamos aqui a dizer, neste mandado de injunção, que isso vai se aplicar aos demais casos. Tanto que não vamos, espero, nos pronunciar sobre outros casos idênticos; não ficaremos a fazer regulações específicas, porque essa decisão valerá, a meu ver, com eficácia erga omnes. No caso, na verdade, a chamada “proteção subjetiva” se transmuda também num tipo de proteção objetiva. Pelo menos foi essa a posição por mim assumida.

Além disso, impõe-se observar que o Plenário do STF, em diversos precedentes firmados sobre a questão em estudo, decidiu que o mandado de injunção somente se afigura viável se o servidor público interessado demonstrar que dispõe dos requisitos para a obtenção de sua aposentadoria e que não pode usufruí-la em razão da ausência de norma regulamentadora do art. 40, § 4º, III, da Carta da República, ou seja, há de ser comprovada, de plano, a titularidade do direito à aposentadoria especial e a sua inviabilidade resultante da falta da norma regulamentadora do direito constitucional (MI n. 2195 AgR/DF; MI n. 1194 ED/DF).

Assim, enquanto não for editada a lei complementar, servidor público que desejar a obtenção de aposentadoria especial há de impetrar mandado de injunção perante o STF, nos termos do art. 102, I, da Carta da República.

Diante desse panorama, tratando-se de norma constitucional de eficácia limitada, dependente da edição de lei complementar regulamentadora para surtir seus efeitos no mundo jurídico, enquanto não for editado o referido diploma legal, somente os servidores ou a categoria profissional aos quais forem assegurados, por intermédio de mandado de injunção (CF, art. 5º, LXXI) ajuizado perante o STF (CF, 102, I, q), fazem jus à concessão da aposentadoria especial.

Não nos parece, portanto, se afinar com o entendimento esposado pelo STF, acerca dos limites e do alcance da decisão concessiva do mandado de injunção, o posicionamento adotado pelo STJ3 de determinar a aplicação, por analogia, dos parâmetros estabelecidos no art. 57, da Lei n. 8.213/91, ao fundamento de que se encontra consolidado no âmbito do STF entendimento de que a concessão de aposentadoria especial aos servidores públicos deve seguir os parâmetros do art. 57 da Lei n. 8.213⁄91 enquanto não editada a lei complementar a que se reporta o art. 40, § 4º, da Constituição Federal.

Na espécie sob exame, com a devida vênia do contrário entendimento, descabe ao STJ ou a qualquer outro Tribunal Estadual ou Federal, na estreita via do mandado de segurança ou por intermédio de qualquer outra medida judicial, reconhecer o estado de mora legislativa na regulamentação do disposto no § 4º, III, do art. 40 da Constituição Federal, garantindo, ao servidor público efetivo de quaisquer dos entes políticos, o direito de ter seu pedido administrativo de aposentadoria especial concretamente analisado pela autoridade competente, observado, para tanto, o art. 57, da Lei n.

3 Agravo Regimental no Recurso em Mandado de Segurança n. 24.208/ES; Recurso Especial n. 938.202/CE.

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8.213/91, sob pena de usurpação da competência constitucionalmente reservada ao STF (CF, art. 102, I, q), expondo o julgado à anulação por intermédio do veículo da Reclamação (CF, art. 102, I, i). A propósito do tema em discussão, a Orientação Normativa SRH/MP n. 10, de 05/11/10, que estabelece orientação aos órgãos e entidades integrantes do Sipec quanto à concessão de aposentadoria especial de que trata o art. 57, da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991 (Regime Geral de Previdência Social), aos servidores públicos federais, em seu art. 1°, §§ 1°-2°, assim dispõe:

Art. 1º Esta Orientação Normativa uniformiza, no âmbito do Sistema de Pessoal Civil da União — SIPEC, os procedimentos relacionados à concessão de aposentadoria especial prevista no art. 57 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, de que trata o Regime Geral de Previdência Social — RGPS, ao servidor público federal amparado por decisão em Mandado de Injunção julgado pelo Supremo Tribunal Federal.

§1º Farão jus à aposentadoria especial de que trata o caput deste artigo os servidores públicos federais alcançados por decisões em Mandados de Injunção, individualmente, ou substituídos em ações coletivas, enquanto houver omissão legislativa.

§2º As decisões a que se referem os parágrafos anteriores, exaradas pelo Supremo Tribunal Federal nos autos de Mandados de Injunção, tratam da concessão de aposentadoria especial e da conversão de tempo de serviço aos servidores públicos federais com base na legislação previdenciária.

Disso tudo, infere-se que concedida a ordem injuncional para, reconhecido o estado de mora legislativa, garantir ao servidor público o direito de ter seu pedido de aposentadoria especial apreciado pelo órgão de origem, mediante a aplicação integrativa do art. 57 da Lei n. 8.213/91, o direito à aposentação há de ser concretamente analisado pela autoridade administrativa competente, observado, para tanto, o que dispõe o referido art. 57 do citado diploma legal, de forma que, indeferida a pretensão pela Administração, resta ao servidor deduzi-la perante o Poder Judiciário de primeiro grau.

Permitimo-nos, neste aspecto específico, discordar parcialmente da inteligência em que se fundamenta o eminente jurista Wladimir Novaes Martinez (2011, p. 24) quando afirma que as exceções, omissões ou descumprimento da decisão concessiva do mandado de injunção devem ser alvo de reclamação perante o STF.

De fato, se de acordo com pacífico entendimento firmado no âmbito do STF, a ordem injuncional é deferida tão somente para, reconhecido o estado de mora legislativa, garantir ao servidor o direito de ter seu pedido administrativo de aposentadoria especial concretamente analisado pela autoridade administrativa competente, observado, para tanto, o disposto no art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/91, ou, em outras palavras, para impedir que a Administração se furte a examinar o pedido de aposentadoria especial sob o fundamento de inexistência de regulamentação legal do art. 40, § 4º, da Carta Federal, não há que se falar, à toda evidência, em descumprimento da ordem, de sorte que eventuais discordâncias com os fundamentos da decisão administrativa tomada em desfavor do servidor público não enseja a interposição de reclamação perante o STF e, portanto, deverão ser dirigidas, se for o caso, às instâncias administrativas ou judiciais competentes. (Reclamações n. 11.599/PE e n. 10.766/DF).

Confira-se, a propósito do tema examinado, a diretriz firmada pelo Plenário do STF, por ocasião do julgamento dos embargos de declaração opostos no MI n. 1.286 ED/DF:

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO MANDADO DE INJUNÇÃO. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. APLICAÇÃO DO ART. 57 DA LEI N. 8.213/1991. COMPETÊNCIA DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.

1. A autoridade administrativa responsável pelo exame do pedido de aposentadoria é competente para aferir, no caso concreto, o preenchimento de todos os requisitos para a aposentação previstos no ordenamento jurídico vigente. 2. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

Verifica-se, dessa forma, a impossibilidade de ampliar o alcance da reclamação a fim de que o STF analise, diretamente e como meio de saltar graus jurisdicionais (Agravos Regimentais nas Reclamações n. 5.926/SC e n. 5.684/PE), todas as questões surgidas na apreciação da concessão da aposentadoria especial em inúmeros processos administrativos em curso no País, pois isso certamente inviabilizaria o regular funcionamento da Corte.

A Constituição Federal, em seu art. 201, § 1º, estabelece o seguinte:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (redação dada pela Emenda Constitucional n. 20, de 1998)

[...]

§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 47, de 2005).

Por outro lado, em virtude da omissão legislativa em não providenciar a edição da lei complementar exigida pelo art. 201, § 1º, da Carta da República, a EC n. 20/98, em seu art. 15, expressamente estendeu o prazo de vigência dos arts. 57-58 da Lei n. 8.213/91, nos seguintes termos:

Art. 15. Até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, permanece em vigor o disposto nos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, na redação vigente à data da publicação desta Emenda.

Além disso, o art. 40, § 12, da Constituição Federal, assim dispõe:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo (redação dada pela Emenda Constitucional n. 41, 19/12/03)

[...]

§ 12. Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social (incluído pela Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/98).

A Lei n. 8.213/91, em seu art. 57, § 3º, ao disciplinar a concessão da aposentadoria especial, assim dispõe:

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Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei n. 9.032, de 1995

[...]

§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei n. 9.032, de 1995).

Vale aqui trazer, a propósito, comentário do jurista Fábio Zambitte Ibrahim (2011, p. 608-609), para quem a concessão da aposentadoria especial resulta do exercício de atividades profissionais sujeitas às condições que prejudiquem a saúde e a integridade física do trabalhador. São suas palavras:

A referência a benefícios em condições especiais, no direito previdenciário, é equívoca. Na acepção estrita (e mais correta), significa o benefício conhecido como aposentadoria especial, previsto no artigo 57 da Lei n. 8.213/1991, concedido a segurados expostos permanentemente a agentes agressivos, de ordem física, química ou biológica, em ambiente de trabalho insalubre. É benefício concedido em razão das condições particulares em que é executado [...].

Mesmo para aqueles que não são submetidos a condições efetivamente insalubres, forma-se consenso no sentido da jubilação antecipada ser verdadeiro legitimador da violência frente à saúde do trabalhador, o que não condiz com um ordenamento jurídico centrado na dignidade da pessoa humana. Ademais, em um contexto de ampliação da expectativa de vida, a necessidade de manutenção da capacidade laborativa, com o provável diferimento do retiro do trabalho, demanda ações em saúde ocupacional, eliminando tais atividades nocivas, que seriam, no máximo, admitidas em raríssimas hipóteses.

A propósito do tema sob apreciação, explica Sérgio Renato De Mello (2010, p. 419) que o pressuposto para a concessão da aposentadoria especial é o desgaste ocorrido na saúde do trabalhador em virtude de serviços prestados em ambiente insalubre, ao afirmar o seguinte:

Nesta espécie, o favor legal é justo na medida em que há presunção de prejudicialidade comparativamente a outras atividades. Em princípio, todo trabalho, por mais simples ou menos desgastante que seja, naturalmente acarretará, além do desgaste, uma série de riscos à saúde. Em particular nas atividades sujeitas a condições especiais, o tempo de contribuição é reduzido pelas peculiares condições de trabalho, mais gravosas à saúde ou integridade física do trabalhador.

Na mesma vertente interpretativa, também se pronunciaram os Juízes Federais Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior (2009, p. 257):

Na essência, é uma modalidade de aposentadoria por tempo de serviço, com redução deste, em função das peculiares condições sob as quais o trabalho é prestado, presumindo a lei que o seu desempenho não poderia ser efetivado pelo mesmo período das demais atividades profissionais.

É importante acentuar que o STF, por ocasião do julgamento dos Embargos Declaratórios no Mandado de Injunção n. 758 ED/DF, cujo acórdão foi publicado no DJe de 14/05/10, deixou consignado, no voto proferido pelo relator, Ministro Marco Aurélio, as seguintes observações sobre a finalidade da aposentadoria especial:

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[...] O móvel da aposentadoria especial é o desgaste ocorrido na saúde do trabalhador em virtude de serviços prestados em ambiente insalubre. Pois bem, exigir-se a idade é desprezar tal razão de ser, olvidando-se, até mesmo, que a Constituição Federal, ao cogitar de lei visando à disciplina da matéria, até hoje inexistente, versa a adoção de requisitos e critérios diferenciados para concessão de aposentadoria nos casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Em resumo, seria um despropósito brutal ter-se a diminuição substancial do tempo de serviço e manter-se a idade mínima para aposentadoria em 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.

Fixadas essas premissas, é preciso esclarecer se a circunstância de a Constituição Federal de 1988, no § 3º, do seu art. 39 (com a redação dada pela EC n. 19/88), não mais incluir, na órbita dos servidores públicos, a obrigatoriedade do pagamento de vantagem remuneratória para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (CF, art. 7º, XXIII), impede ou não a concessão da aposentadoria especial ao servidor público.

Efetivamente, o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, possui a seguinte redação:

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

[...]

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir (incluído pela Emenda Constitucional n. 19/98).

Já o art. 7º, inciso XXIII, da Constituição da República, tem a seguinte dicção:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXIII — adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;

Deveras, o fato de a Constituição Federal não ter incluído o pagamento adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas exercidas pelos servidores públicos, à toda evidência, não traduz proibição de que essa vantagem seja concedida a esses servidores por intermédio de norma de caráter infraconstitucional.

Aliás, a instituição desse benefício tem fundamento na previsão do inciso III do § 1º do art. 39 da Constituição Federal, porque o sistema remuneratório dos servidores públicos deverá observar “as peculiaridades dos cargos”, nos seguintes termos:

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

§ 1º A fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observará: (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998)

[...]

III — as peculiaridades dos cargos. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998).

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O STF já se pronunciou que, malgrado a Constituição da República não tenha estabelecido nenhum critério ou regra para o pagamento de adicional de insalubridade aos servidores públicos civis — tanto que o art. 39, § 3º, não inclui no rol de direitos aplicáveis aos servidores públicos civis o art. 7º, XXIII, da Constituição Federal —, o art. 39, § 1º, III, da referida Carta da República permite o pagamento de adicional aos servidores públicos civis de acordo com as peculiaridades dos cargos e, da mesma forma, ainda que ausente disposição expressa, o constituinte determinou, no art. 42, § 1º, da Constituição, a aplicação aos militares do disposto no art. 142, § 3º, X, dispondo que a remuneração será fixada consideradas as peculiaridades de suas atividades (Recurdo Extraordinário n. 565.714/SP).

Assim, a percepção ou não do adicional de penosidade, insalubridade ou periculosidade, não impede ou tampouco gera automaticamente para o servidor público a certeza do direito à obtenção da aposentadoria especial, devendo a autoridade administrativa competente aferir a existência do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, durante a sua jornada de trabalho, observado, para tanto, o que dispõe o art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/91.

A propósito do tema sob análise, Sérgio Pinto Martins (2009, p. 359) explica que o segurado “só fará jus a aposentadoria especial se comprovar o trabalho em atividade prejudicial a sua saúde por 15, 20 ou 25 anos, sem que haja conversão do tempo de serviço.” (grifo nosso)

A respeito da carência mínima exigida para a concessão da aposentadoria especial ao servidor público, a Orientação Normativa SRH/MPOG n. 10, de 05/11/10, em seu art. 2º, parágrafo único, alude apenas aos 25 anos, nos seguintes termos:

Art. 2º A aposentadoria especial será concedida ao servidor que exerceu atividades no serviço público federal, em condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, exposto a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período de 25 anos de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente.

Parágrafo único. Para efeito das disposições do caput deste artigo, considera-se trabalho permanente aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do servidor ao agente nocivo seja indissociável da prestação do serviço público.

O que se tem, neste cenário, ainda não totalmente mapeado, é que o exercício de atividades laborativas, em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do servidor público, autoriza a deflagração da concessão do benefício da aposentadoria especial, após o cumprimento da carência mínima exigida (25 anos), em razão do risco a que se submete o segurado, independentemente da satisfação do requisito etário.

Bem é de ver que o Plenário do STF, atento à circunstância de que a finalidade da concessão da aposentadoria especial é o desgaste ocorrido na saúde do trabalhador em virtude de serviços prestados em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, tem entendido tratar-se de rematado absurdo ter-se a diminuição do tempo de carência mínima exigida para a aposentação e, de outra parte, exigir-se a implementação da idade mínima para aposentadoria, fazendo-o em acórdão que está assim ementado:

[...] APOSENTADORIA ESPECIAL — SERVIDOR PÚBLICO — TRABALHO EM AMBIENTE INSALUBRE — PARÂMETROS.

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Os parâmetros alusivos à aposentadoria especial, enquanto não editada a lei exigida pelo texto constitucional, são aqueles contidos na Lei n. 8.213/1991, não cabendo mesclar sistemas para, com isso, cogitar-se de idade mínima (Mandado de Injunção n. 1.083/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJe 03/09/2010).

O que importa perceber é que, na hipótese sob exame, não se afigura possível assegurar ao servidor público o direito à contagem especial do tempo de labor sujeito aos agentes insalubres, a partir da edição da Lei n. 8.112/90, quando passou a viger o regime estatutário, com a contagem diferenciada do tempo de serviço, ou seja, com o acréscimo de 40%, se homem, ou 20%, se mulher.

Efetivamente, de acordo com a legislação previdenciária, o servidor público não pode converter o tempo de trabalho exclusivamente especial em tempo comum de acordo com o fator multiplicador aplicável por falta de pressuposto lógico, qual seja, o exercício pelo segurado de uma ou mais atividades sujeitas a condições prejudiciais à saúde sem que tenha complementado o prazo mínimo para aposentadoria especial.

Daí a advertência fundada na doutrina de Wladimir Novaes Martinez (2011, p. 29), para quem não se revela possível a utilização do fator multiplicador para conversão de tempo de serviço exclusivamente especial com o objetivo de majorar o tempo de serviço:

Tem-se assente que a conversão somente é possível (porque, assim, quis o legislador) quando o trabalhador dispuser de dois tempos de serviço: cronologicamente, especial e comum ou comum e especial.

Exclusivamente com 25 anos de serviço especial, um servidor não poderia operar a conversão 25 X 1,4 = 35 anos, mas bastaria exercer atividade comum por um mês o direito a conversão emergiria.

Em outras palavras, somente se afigura possível a concessão de aposentadoria especial com tempo de serviço exercido exclusivamente em atividades especiais, iguais ou diferentes.

Neste tópico, urge anotar a existência de precedentes que, fixados pelo Plenário do STF, afastaram a pretensão deduzida por servidor público objetivando a contagem diferenciada de tempo de serviço para fins de futuro requerimento de concessão de aposentadoria, em sede de mandado de injunção (MI n. 3.712 AgR/DF) em acórdão cuja ementa sintetiza:

AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE INJUNÇÃO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO. CONTAGEM DE PRAZO DIFERENCIADO. IMPOSSIBILIDADE.

1. O art. 40, § 4º, da Constituição da República não assegura a contagem de prazo diferenciado ao servidor público, mas a aposentadoria especial dos servidores: I) portadores de deficiência; II) que exerçam atividades de risco; e III) cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, nos termos a serem definidos por leis complementares. Precedentes. 2. A inexistência do direito constitucional pleiteado evidencia o não cabimento do mandado de injunção. 3. Agravo regimental ao qual se nega provimen

É forçoso concluir, com respaldo na jurisprudência dominante no seio do Supremo Tribunal Federal, que a Constituição vigente não dispõe sobre o suposto direito à contagem diferenciada do tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. O inciso III do § 4º do art. 40 da Carta da República assegura tão somente o direito à aposentadoria especial para os servidores que tenham exercido suas atividades em tais condições.

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Isto porque a jurisprudência pacificada no âmbito do STF é de que, “em questões previdenciárias, aplicam-se as normas vigentes ao tempo da reunião dos requisitos de passagem para a inatividade”. (ADI 3104/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 09/11/2007).

Assim, a conversão do tempo especial em comum permite a ampliação do tempo de serviço mediante a aplicação do fator multiplicador de 40%, se homem, e 20%, se mulher, sem, no entanto, modificar a natureza do benefício, que continua sendo formalmente aposentadoria por tempo de contribuição que não se confunde, pois, com a aposentadoria especial.

É imperioso recorrer novamente ao magistério doutrinário de Wladimir Novaes Martinez (2006, p. 394), que, de forma bastante didática, explica:

A conversão tem cabimento quando o segurado computa o tempo especial para fins de aposentadoria proporcional ou integral por tempo de contribuição (e, é claro, nos casos de aposentadoria especial exclusivamente com tempos especiais convertidos entre si).

[...]

Daí afirmar-se não haver conversão de tempo exclusivamente especial ou exclusivamente comum. Exemplificativamente, homem com vinte anos de insalubridade, não pode fazer a multiplicação 20 X 1,40 = 28 anos e solicitar o benefício.

Assim, a conversão do tempo de serviço trabalhado em condições especiais em tempo comum, mediante a aplicação de fator multiplicador, autorizada pelo art. 9º, parágrafo único c/c art. 10, da Orientação Normativa SRH/MPOG n. 10, de 05/11/10, deve ser interpretada para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral ou, ainda, para o segurado que houver exercido duas ou mais atividades sujeitas às condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, sem completar em nenhuma delas o prazo mínimo exigido para a aposentadoria especial:

Art. 9º O tempo de serviço exercido em condições especiais será convertido em tempo comum, utilizando-se os fatores de conversão de 1,2 para a mulher e de 1,4 para o homem.

Parágrafo único. O tempo convertido na forma do caput poderá ser utilizado para a aposentadoria prevista no art. 40 da Constituição Federal, na Emenda Constitucional n. 41, de 19 de dezembro de 2003, e na Emenda Constitucional n. 47, de 5 de junho de 2005, exceto nos casos da aposentadoria especial de professor de que trata o § 5º do art. 40 da Constituição Federal.

Art. 10. O tempo de serviço especial convertido em tempo comum poderá ser utilizado para revisão de abono de permanência e de aposentadoria, quando for o caso.

No que tange aos meios de prova a fim de promover a demonstração do cumprimento integral do prazo de carência mínima exigido com a submissão aos agentes nocivos à saúde ou à integridade física do servidor, a Orientação Normativa SRH/MPOG n. 10/2010, em seu art. 12, assim dispôs:

Art. 12. Para a concessão do benefício da aposentadoria especial e para a conversão de tempo especial em tempo comum, no caso em que o servidor esteja amparado por decisão em Mandado de Injunção julgado pelo Supremo Tribunal Federal, é obrigatória a instrução do procedimento administrativo de reconhecimento do tempo de serviço público exercido sob condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, nos moldes disciplinados pela Instrução Normativa n. 1, de 22 de julho de 2010, publicada no DOU de 27 de julho de 2010, da Secretaria de Políticas de Previdência Social (SPS), inclusive com a juntada dos seguintes documentos:

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I — cópia da decisão do Mandado de Injunção, na qual conste o nome do substituído ou da categoria profissional, quando for o caso; e

II — declaração ou contracheque comprovando vínculo com o substituto na ação, quando for o caso.

A propósito do tema sob exame, impõe-se destacar, a título meramente ilustrativo, que a 2ª Turma do STF decidiu que o direito à contagem especial do tempo de serviço prestado sob condições insalubres é regido pela legislação vigente à época da prestação laboral (Recurso Extraordinário n. 392.559/RS):

Recurso Extraordinário. 2. Serviço prestado antes do advento da Lei n. 9.032, de 1995. Caracterização como especial. Atividade insalubre prevista nos Decretos nos 53.831, de 1964 e 83.080, de 1979. Desnecessidade do laudo exigido pela citada lei. 3. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

É pertinente observar que, a exemplo do que ocorre no âmbito do RGPS (art. 65, parágrafo único, do Decreto n. 3.048/99), consideram-se trabalho permanente, para efeito de concessão de aposentadoria especial ao servidor público, os períodos de descanso determinados pela legislação, inclusive, férias, bem como os períodos de afastamento autorizados pela Lei n. 8.112/90, conforme se lê no art. 11 da Orientação Normativa SRH/MPOG n. 10/10, cujo teor é o seguinte:

Art. 11. São considerados como tempo de serviço especial, desde que, à data do afastamento ou licença, o servidor estivesse exercendo atividades em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, os seguintes registros:

I — férias;

II — casamento, doação de sangue, alistamento como eleitor, participação em júri;

III — luto;

IV — licenças:

a)para tratamento da própria saúde;

b)à gestante, à adotante e à paternidade; e

c)em decorrência de acidente em serviço.

Quanto à possibilidade de percepção do abono de permanência em serviço, a Constituição Federal, em seu art. 40, § 19, estabelece o seguinte:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo (redação dada pela Emenda Constitucional n. 41, 19/12/03).

[...]

§ 19. O servidor de que trata este artigo que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no § 1º, III, a, e que opte por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no § 1º, II (incluído pela Emenda Constitucional n. 41, 19/12/03).

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A propósito do intitulado abono de permanência em serviço, previsto no art. 40, § 19º, da Constituição Federal, o jurista Wladimir Novaes Martinez (2011, p. 94) assim se pronuncia:

O artigo 40, § 19, da Lei Maior facultou ao servidor deixar de contribuir quando ele fizer jus a uma aposentadoria e se manifestar nesse sentido.

Assim, aquele que exerce atividades especiais há mais de vinte cinco anos e puder fazer a prova acolhida do direito à aposentadoria especial no RPPS fica dispensado da contribuição de 11% dos seus vencimentos. Tal instituto técnico não é automático, depende da solicitação do interessado.

O pedido de dispensa da contribuição do ativo equivale ao requerimento da aposentadoria especial. O servidor terá de fazer o convencimento da exposição aos agentes nocivos, obter o PPP e o LTCAT como se estivesse solicitando o benefício. Caso sua pretensão seja rejeitada ele poderá contestar essa decisão.

Caso alcançasse esse benefício, mais tarde, quando requerer a aposentadoria especial, a sua instrução será bastante simplificada em termos de persuasão.

Uma vez reconhecido o direito, ab initio ou posteriormente, devem ser devolvidas as contribuições que verteu desde a DER.

Parece-nos que a inteligência em que se fundamenta para justificar o direito à percepção do abono de permanência — pelo menos enquanto não for editada a lei complementar de que trata o art. 40, § 4º, III, da Constituição Federal, e a concessão da aposentadoria especial for deferida aos servidores públicos pela autoridade competente, em cumprimento à decisão concessiva de mandado de injunção, em que o STF determinar a aplicação integrativa das disposições contidas nos arts. 57-58 da Lei n. 8.213/91 — não se sustenta.

É que, sendo a aposentadoria especial uma modalidade de aposentadoria por tempo de serviço, com redução deste, tendo por móvel o desgaste na saúde do trabalhador em virtude de serviços prestados em ambientes insalubres, ela se afigura manifestamente incompatível com a pretensão de percepção de abono de permanência, por força do art. 57, § 8º, c/c art. 46, ambos da Lei n. 8.213/91, os quais dispõem que será automaticamente cancelada a aposentadoria do segurado que continuar no exercício da atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos à saúde.

Deveras, a Lei n. 8.213/91, em seu art. 57, § 8º, estabelece o seguinte:

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (redação dada pela Lei n. 9.032, de 1995)

[...]

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei (incluído pela Lei n. 9.732, de 11/12/98).

De outra parte, o art. 46, da Lei n. 8.213/91, assim prescreve: “O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno”.

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Isto porque, consoante já repisado alhures, a aposentadoria especial tem por objetivo proteger a saúde e a integridade física do trabalhador, de sorte que a permanência do servidor no ambiente de trabalho insalubre afigura-se de todo incompatível com a finalidade da norma protetiva, dando azo à aplicação da sanção do cancelamento automático da aposentadoria (Lei n. 8.213/91, art. 46).

Entretanto, a Orientação Normativa SRH/MPOG n. 10/10 admite a concessão do abono de permanência em serviço, nos seguintes termos:

Art. 8º Os servidores que atenderem aos requisitos para a aposentadoria especial de que trata esta Orientação Normativa farão jus ao pagamento do abono de permanência, desde que atendidas as seguintes condições:

I — § 19 do art. 40 da Constituição Federal de 1988, incluído pela Emenda Constitucional n. 41/2003:

a) tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria;

b) sessenta anos de idade e trinta e cinco anos de tempo de contribuição, se homem, e cinquenta e cinco anos de idade e trinta anos de contribuição, se mulher.

II — § 5º do art. 2º da Emenda Constitucional n. 41/2003:

a) cinquenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher;

b) cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria;

c) tempo de contribuição mínima de trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e

d) período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data de publicação da Emenda Constitucional n. 20, de 1998, que faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea a deste inciso.

III — § 1º do art. 3º da Emenda Constitucional n. 41/2003:

a) atendimento aos requisitos para a aposentadoria com base nos critérios da legislação vigente até 31 de dezembro de 2003, data da publicação da Emenda Constitucional n. 41, de 2003; e

b) tempo de contribuição mínima de vinte e cinco anos, se mulher, ou trinta anos, se homem.

Assim, se a própria Administração Pública, por intermédio da edição de ato administrativo normativo, reconhece o direito dos servidores que atenderem aos requisitos para a aposentadoria especial ao pagamento do abono de permanência, desde que atendidas as condicionantes enumeradas no art. 8º e incisos da Orientação Normativa SRH/MPOG n. 10/10, impõe-se ao intérprete adotar a interpretação que seja mais favorável ao servidor, tendo em vista a natureza alimentar do benefício pretendido, aplicando-se, ainda, o princípio do in dubio pro misero.

Verifica-se que, entre as condicionantes estabelecidas pelo ato normativo administrativo examinado (art. 8º, inciso I, b), para a concessão da aposentadoria especial, figura o requisito da idade mínima que, consoante se procurou demonstrar, não pode ser exigido nessa modalidade de aposentação cujo objetivo é a proteção da saúde do servidor exposto durante a sua jornada de trabalho aos agentes nocivos previstos na legislação.

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Impõe-se registrar, por pertinente, que também o STF — ao apreciar a situação prevista no § 4º do art. 40 da Constituição Federal, cujo inciso I trata da aposentadoria especial reconhecida aos servidores públicos que sejam portadores de deficiência e que sofram, igualmente, à semelhança dos servidores públicos que exercem atividades consideradas insalubres ou perigosas, as mesmas consequências lesivas da omissão normativa — concedeu a ordem injuncional para, reconhecido o estado de mora legislativa, garantir, ao servidor interessado, o direito de ter seu pedido administrativo de aposentadoria especial concretamente analisado pela autoridade administrativa competente, observado, para tanto, o art. 57, da Lei n. 8.213/91. 4

Nem se argumente que a ausência de fonte de custeio (CF, art. 195, § 5º) inviabilizaria o exercício do direito à aposentadoria especial em comentário aos servidores públicos titulares de cargos efetivos.

Efetivamente, não se pode afirmar, na espécie vertente, que as decisões judiciais em comentário criaram o direito à aposentadoria especial, já que expressamente previsto na Constituição Federal (CF, art. 40, § 4º) para os servidores públicos, mas apenas estabeleceram parâmetros para o seu exercício, até que sobrevenha lei complementar disciplinando a matéria, de sorte que o custeio já estava previsto na própria contribuição imposta mensalmente aos servidores e à Administração destinada à aposentadoria, inclusive a especial.

Além disso, conforme foi assinalado, com muita propriedade no voto condutor do RE n. 207.282/RS:

A norma do art. 195, § 5º, da Constituição da República, tem nítido caráter prospectivo, ou seja, direciona-se ao campo das leis ordinárias posteriores à sua vigência, não se aplicando aos benefícios constitucionalmente previstos.

No tocante à aposentadoria especial do policial civil, pelo exercício de atividade de risco, as circunstâncias específicas às quais ele se submete já foram objeto de regulamentação por intermédio do art. 1º da Lei Complementar n. 51/85, cuja redação é a seguinte:

Art.1º O funcionário policial será aposentado:

I — voluntariamente, com proveitos integrais, após 30 (trinta) anos de serviço, desde que conte, pelo menos 20 (vinte) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial;

II — compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, aos 65 anos (sessenta e cinco) anos de idade, qualquer que seja a natureza dos serviços prestados.

Desta forma, a lei complementar necessária à integração legislativa reclamada no art. 40, § 4º, II, da Constituição da República, viabilizadora do direito à aposentadoria especial pelo exercício de atividade de risco por policial, não apenas existe, como também teve a sua recepção reconhecida, de forma incidental, pelo STF, por ocasião do julgamento da ADI n. 3.817/DF, conforme exemplifica a ementa do seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. POLÍCIAL CIVIL. ADICIONAL DE PERMANÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR 51/85. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL 24/06 E 55/92. NORMA INFRACONSTITUCIONAL LOCAL. SÚMULA 280 DO STF.

4 Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 1.967/DF.

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1. A aposentadoria especial dos servidores públicos que “exerçam atividades de risco” e “cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física” (art. 40, § 4º, II, III, da CF), como é o caso dos policiais civis, está devidamente regulamentada pela Lei Complementar 51/85, que foi recepcionada pela Constituição Federal, conforme entendimento pacífico desta Suprema Corte. Precedentes: ADI 3.817, da relatoria da Min. Cármen Lúcia, DJe de 03/04/2009; RE 567.110-RG, Tribunal Pleno, relatoria da Min Cármen Lúcia, DJe de 11/04/2011; AI 820.495-AgR, 1ª Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, Dje de 24/03/2011.

[...]

3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AI n. 838.744 AgR/SC)

Impõe-se destacar, ainda, que o Plenário do STF, no julgamento da repercussão geral do Recurso Extraordinário n. 567.110/AC, reiterou a recepção desse diploma legal, em acórdão assim ementado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. RECEPÇÃO CONSTITUCIONAL DO ART. 1º, INCISO I, DA LEI COMPLEMENTAR N. 51/1985. ADOÇÃO DE REQUISITOS E CRITÉRIOS DIFERENCIADOS PARA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA A SERVIDORES CUJAS ATIVIDADES NÃO SÃO EXERCIDAS EXCLUSIVAMENTE SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS QUE PREJUDIQUEM A SAÚDE OU A INTEGRIDADE FÍSICA.

1. Reiteração do posicionamento assentado no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.817, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, da recepção do inciso I do art. 1° da Lei Complementar n. 51/1985 pela Constituição. 2. O Tribunal a quo reconheceu, corretamente, o direito do Recorrido de se aposentar na forma especial prevista na Lei Complementar 51/1985, por terem sido cumpridos todos os requisitos exigidos pela lei. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento.

Também o Plenário do STF, relativamente à aposentadoria especial do policial, deixou assentado que descabe mesclar os dois sistemas — o do art. 57 da Lei n. 8.213/91 e o do art. 1º da Lei Complementar n. 57/85 — para, com isso, cogitar-se de idade mínima para aposentação, bem assim pela inadequação do mandado de injunção, na espécie, por ter como pressuposto de admissibilidade a omissão legislativa que obste o exercício de direito constitucionalmente assegurado, em acórdão cuja ementa registra:

AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO POLICIAL. ATIVIDADE DE RISCO. ART. 40, § 4º, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEI COMPLEMENTAR N. 51/1985. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO LEGISLATIVA.

1. A Lei Complementar n. 51/1985, que trata da aposentadoria especial dos servidores públicos policiais, foi recepcionada pela Constituição da República de 1988 (ADI 3.817/DF). 2. O reconhecimento da existência e da aplicabilidade de norma infraconstitucional regulamentadora do direito constitucional pleiteado evidencia o não cabimento do mandado de injunção, por inexistir omissão legislativa inviabilizadora do exercício de direito constitucionalmente assegurado. 3. Impossibilidade de conjugação do sistema da Lei Complementar n. 51/1985 com o do art. 57 da Lei n. 8.213/91, para com isso, cogitar-se de idade mínima para aposentação. Precedentes. 4. Agravo regimental ao qual se nega provimento (MI n. 2.518 AgR/DF).

Destarte, a carência mínima exigida para a concessão da aposentadoria especial ao policial civil, nos casos de desempenho de atividades de risco (CF, art. 40, § 4º, II), é aquela prevista na LC n. 51/85 (30 anos) e não aquela outra prevista no art. 57 da Lei n. 8.213, de 91 (25 anos).

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A Constituição Federal de 1967, a partir do advento da referida EC n. 18/1981, dispensou tratamento previdenciário diferenciado à atividade de magistério deixando, portanto, de considerá-la modalidade de aposentadoria especial, tal qual prevista no subitem 2.1.4 do Decreto n. 53.831/64 e classificada como serviço penoso, de forma que o professor somente tem direito à aposentadoria especial aos 25 anos de serviço até a promulgação da EC n. 18/81, que estabeleceu o tempo de 30 anos de efetivo serviço em funções de magistério para o homem e 25 para a mulher, ou seja, possui direito à aposentadoria com tempo de serviço com prazo reduzido e desde que integralmente na atividade de magistério.

Não possui idêntica compreensão sobre o tema, sob apreciação, a publicista Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2011, p. 165-166), que, ao discorrer sobre a aposentadoria dos servidores públicos efetivos, acaba por arrolar a função de magistério entre as modalidades de aposentadoria especial:

As hipóteses de aposentadoria especial mantidas pelas Emendas Constitucionais n. 20/1998, 41/2003 e 47/2005 referem-se apenas aos casos de servidores: “I — portadores de deficiência; II — que exerçam atividades de risco; III — cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física” (art. 40, § 4º); bem como às funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, em que os requisitos de idade e tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos (art. 40, § 5º).

Com razão, pois, a meu sentir, o Prof. Marcelo Barroso Lima Brito de Campos (2009, p. 177), quando afirma:

Ao contrário do que foi sustentado pelo Ministério Público Federal na inicial da ADI 3772, a aposentadoria de professor não constitui aposentadoria especial, eis que esse benefício é de outra natureza. A aposentadoria do professor é voluntária, com redução nos requisitos de idade e tempo de contribuição, cuja finalidade, a meu sentir, reside no incentivo do exercício desta atividade de magistério cuja definição deve enfeixar, além da atividade de lecionar, também as atividades de dirigir, coordenar e assessorar pedagogicamente, desde que exercidas por professores, também como forma de incentivo aos profissionais desta área tão carente.

A vigente Constituição Federal, em seu art. 40, § 5º, c/c art. 201, § 8º, a respeito da aposentadoria voluntária do professor, com critérios diferenciados, assim dispõe:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo (redação dada pela Emenda Constitucional n. 41, 19/12/03)

[...]

§ 5º Os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos, em relação ao disposto no § 1º, III, a, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio (redação dada pela Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/98)

[...]

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio

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financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (redação dada pela Emenda Constitucional n. 20, de 1998)

[...]

§ 8º Os requisitos a que se refere o inciso I do parágrafo anterior serão reduzidos em cinco anos, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio (redação dada pela Emenda Constitucional n. 20, de 1998).

De outra parte, o art. 67, § 2º, da Lei n. 9.394/96, estabelece o seguinte:

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:

[...]

§ 2° Para os efeitos do disposto no § 5° do art. 40 e no § 8° do art. 201 da Constituição Federal, são consideradas funções de magistério as exercidas por professores e especialistas em educação no desempenho de atividades educativas, quando exercidas em estabelecimento de educação básica em seus diversos níveis e modalidades, incluídas, além do exercício da docência, as de direção de unidade escolar e as de coordenação e assessoramento pedagógico (incluído pela Lei n. 11.301, de 2006).

Efetivamente, após a edição do art. 40, § 5º, c/c art. 201, § 8º, da Carta da República, regulamentado pelo art. 67, § 2º, da Lei n. 9.394/96, só fazem jus à aposentadoria com tempo de serviço reduzido os professores que se mantiverem na atividade docente durante todo o período constitucionalmente exigido, o que abrange, também, segundo o entendimento STF fixado no julgamento da ADI n. 3.772,

as funções de direção, coordenação e assessoramento pedagógico integram a carreira do magistério, desde que exercidos, em estabelecimentos de ensino básico, por professores de carreira, excluídos os especialistas em educação, fazendo jus aqueles que as desempenham ao regime especial de aposentadoria estabelecido nos arts. 40, § 5º, e 201, § 8º, da Constituição Federal.

Diante deste contexto, não se pode conceder a extensão da aposentadoria aos professores que não estejam lecionando nas salas de aula ou exercendo as funções de direção, coordenação e assessoramento pedagógico, desde que exercidos em estabelecimento de ensino básico, por professores de carreira, excluídos os especialistas em educação, cujo exercício, por exigir maior vigor físico, comporta a concessão da aposentadoria precoce por tempo de serviço.

Nessa mesma vertente interpretativa já se pronunciou o STF (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 528.343/DF) por intermédio de acórdão assim ementado:

1. Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Cômputo do tempo de serviço prestado como telefonista, para fins de aposentadoria especial de professor com proventos integrais, prevista no art. 40, III, b, da CF/88. Impossibilidade. 3. A expressão “efetivo exercício em funções de magistério” contém a exigência de que o direito à aposentadoria especial dos professores só se aperfeiçoa quando cumprido totalmente este especial requisito temporal no exercício das específicas funções de magistério, excluída qualquer outra. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”

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Pode-se concluir que a concessão da aposentadoria especial ao servidor público, nos casos de desempenho de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física — desde que o STF começou a acolher os mandados de injunção em que se pretendia a supressão da omissão legislativa existente na regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal, mediante a edição da lei complementar — ainda não foi examinada, em todas as suas nuances, pelos profissionais que se dedicam tanto ao ramo do Direito Administrativo quanto ao do Direito Previdenciário.

A doutrina existente sobre o tema é escassa e a jurisprudência que vem se formando a respeito do tema em estudo ainda é incipiente.

No caso em estudo, consoante procuramos demonstrar no curso do presente artigo, há inúmeras dúvidas pairando sobre o tema sob análise, notadamente, a possibilidade de extensão da eficácia da decisão proferida pelo STF aos demais servidores públicos pelos diversos órgãos integrantes do Poder Judiciário, tendo em conta que o mandado de injunção é processo de natureza subjetiva, ou seja, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nela revelada não beneficiando nem prejudicando terceiros (CPC, art. 473), ou se a circunstância de a Constituição Federal de 1988, no § 3º, do seu art. 39, com a redação dada pela EC n. 19/88, não mais incluir, para a órbita dos servidores públicos, a obrigatoriedade do pagamento de vantagem remuneratória para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (CF, art. 7º, XXIII), impede ou não a concessão da aposentadoria especial ao servidor público, bem assim a possibilidade de concessão do abono de permanência enquanto não for editada a lei complementar a que se reporta o § 4º, do art. 40, da Carta da República, à vista do disposto na legislação previdenciária (Lei n. 8.213/91, art. 57, § 8º), cuja observância deve ser fielmente obedecida pela autoridade competente por ocasião da análise do pedido de concessão de aposentadoria especial.

O artigo ora alinhavado, até mesmo pela superficialidade de sua abordagem, não tem a pretensão de esgotar o assunto. As observações aqui expostas resultam de nossa análise com base no que ocorre ordinariamente, especialmente em sede de sucessivos mandados de segurança que começaram a ser impetrados, no âmbito da Justiça Federal, a partir dos questionamentos surgidos na Administração Pública por ocasião do cumprimento das decisões concessivas dos mandados de injunção deferidos pelo STF.

Isto porque, de acordo com pacífico entendimento firmado no âmbito do STF, a ordem injuncional é deferida tão somente para, reconhecido o estado de mora legislativa, garantir ao servidor o direito de ter seu pedido administrativo de aposentadoria especial concretamente analisado pela autoridade administrativa competente, observado, para tanto, o disposto no art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/91, ou, em outras palavras, para impedir que a Administração se furte a examinar o pedido de aposentadoria especial sob o fundamento de inexistência de regulamentação legal do art. 40, § 4º, da Carta Federal.

As ponderações que acabamos de tecer têm por objetivo unicamente despertar a atenção dos doutos sobre o relevante assunto da aposentadoria especial do servidor público, pelo exercício de atividades que prejudiquem a saúde ou a integridade física, a fim de que novas luzes venham sobre o tema.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em:<www.planalto.gov.br>. Acesso em 20 jan. 2012.

__________. Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998. Estende prazo de vigência dos arts. 57-58 da Lei n. 8.213/1991. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em 20 jan. 2012.

BRASIL. Decreto Federal n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Decreto Federal n. 53.831, de 1964. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Lei Complementar Federal n. 51, de 20 de dezembro de1985. Disciplina a aposentadoria especial do policial civil, pelo exercício de atividade de risco. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Lei Federal n. 7.701, de 21 de dezembro de 1988. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Lei Federal n. 7.783, de 28 de junho de 1989. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Lei Federal n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Lei Federal n. 9.394, de 1996. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Recursos Humanos. Orientação Normativa MPOG/SRH n. 10, de 5 de novembro de 2010. DOU, 8 nov. 2010. Disponível em: <http://www010.dataprev.gov.br/sislex/paginas/56/MPOG-RH/2010/10.htm>. Acesso em: 20 jan. 2012.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quinta Turma. Recurso Especial n. 983.202/CE. Relatora: Min. Laurita Vaz. DJe, de 20 set. 2010. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Sexta Turma. Agravo Regimental em Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n. 24.208/ES. Relatora: Min. Maria Thereza de Assis Moura. DJe, de 9 mar. 2011. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 1.169/DF, Relatora: Min. Cármen Lúcia. DJe, de 22 ago. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 2.518/DF. Relatora: Min. Cármen Lúcia. DJe, de 13 maio 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 3.712/DF. Relatora: Min. Cármen Lúcia. DJe, de 3 ago. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Embargos de Declaração no Mandado de Injunção n. 1.194/DF. Relator: Min. Celso de Mello. DJe, de 25 maio 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

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__________. Embargos de Declaração no Mandado de Injunção n. 758/DF. DJe, de 14 maio 2010. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Mandado de Injunção n. 1.083/DF. Relator: Min. Marco Aurélio. DJe, de 3 set. 2010. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Mandado de Injunção n. 721/DF. Relator: Min. Marco Aurélio. DJe, de 30 nov. 2007. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Mandado de Injunção n. 758/DF. Relator: Min. Marco Aurélio. DJe, de 26 set. 2008. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.667/DF. Relator: Min. Celso de Mello. DJU, 12 mar. 2004, p. 36. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Reclamação n. 10.766/DF. Relator: Min. Celso de Mello. DJe, de 24 fev. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Reclamação n. 11.599/PE. Relatora: Min. Ellen Gracie. DJe, de 12 ago. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Primeira Turma. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 205.194. Relator: Min. Sidney Sanches. DJU, de 11 out. 2001, p. 9.

__________. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 395.666/MG. Relator: Min. Eros Grau. DJU, de 2 dez. 2005, p. 8. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

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__________. Recurso Extraordinário n. 207.282/RS. Relator: Min. Cezar Peluzo. DJe, de 19 mar. 2010. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Recurso Extraordinário n. 392.559/RS. Relator: Min. Gilmar Mendes. DJ, de 3 mar. 2006, p. 91. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tribunal Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.024. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. DJe, de 22 jun. 2007. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.106/MG. DJe, de 24 set. 2010. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental na Reclamação n. 5.684/PE. Relator: Min. Ricardo Lewandowski. DJe, de 15 ago. 2008. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Agravo Regimental na Reclamação n. 5.926/SC. Relator: Min. Celso de Mello. DJe, de 13 nov. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Agravo Regimental no Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 1.620. Relatora: Min. Cármen Lúcia. DJe, de 30 maio 2011. Disponível em:<www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

__________. Agravo Regimental no Mandado de Injunção n. 1.967/DF, Relator: Min. Celso de Mello. DJe, de 28 out. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 jan. 2012.

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