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A C Ó R D Ã O (Ac. 3ª Turma) GMALB/mjsr/scm/AB/np I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. VÍNCULO DE EMPREGO. Quando o acolhimento das arguições da parte depender, antes, do revolvimento de fatos e provas - iniciativa infensa ao recurso de revista (Súmula 126/TST) -, impossível se faz o processamento do apelo. Agravo de instrumento conhecido e desprovido. II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DO CONTRATO NA CTPS.O quadro descrito no acórdão regional permite concluir pela existência de dano moral, em face da inobservância, pelo empregador, do direito primordial do trabalhador de ter o seu contrato de emprego anotado em carteira de trabalho e previdência social, que lhe possibilita o acesso aos benefícios assegurados somente àqueles formalmente registrados. Recurso de revista conhecido e provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista com Agravo n° TST-ARR-125300- 74.2009.5.15.0046, em que é Agravante e Recorrida ÁPIA COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA.e Agravado e Recorrente FRANCISCO PERES. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, pelo acórdão de fls. 226/228v, negou provimento ao apelo patronal e deu provimento ao recurso da reclamante. Opostos embargos de declaração pela reclamada, foram rejeitados a fls. 237/237v. Inconformadas, as partes interpuseram recurso de revista, pelas razões de fls. 499/503-PE e 505/525-PE, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do art. 896 da CLT. Apenas o apelo do reclamante foi admitido pelo despacho de fls. 533/535-PE.

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A C Ó R D Ã O

(Ac. 3ª Turma)

GMALB/mjsr/scm/AB/np

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. VÍNCULO DE EMPREGO. Quando o acolhimento das arguições da parte depender, antes, do revolvimento de fatos e provas - iniciativa infensa ao recurso de revista (Súmula 126/TST) -, impossível se faz o processamento do apelo. Agravo de instrumento conhecido e desprovido. II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DO CONTRATO NA CTPS.O quadro descrito no acórdão regional permite concluir pela existência de dano moral, em face da inobservância, pelo empregador, do direito primordial do trabalhador de ter o seu contrato de emprego anotado em carteira de trabalho e previdência social, que lhe possibilita o acesso aos benefícios assegurados somente àqueles formalmente registrados. Recurso de revista conhecido e provido.

                     Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista com Agravo n° TST-ARR-125300-74.2009.5.15.0046, em que é Agravante e Recorrida ÁPIA COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA.e Agravado e Recorrente FRANCISCO PERES.

                     O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, pelo acórdão de fls. 226/228v, negou provimento ao apelo patronal e deu provimento ao recurso da reclamante.

                     Opostos embargos de declaração pela reclamada, foram rejeitados a fls. 237/237v.

                     Inconformadas, as partes interpuseram recurso de revista, pelas razões de fls. 499/503-PE e 505/525-PE, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do art. 896 da CLT.

                     Apenas o apelo do reclamante foi admitido pelo despacho de fls. 533/535-PE.

                     A reclamada interpôs agravo de instrumento (fls. 551/563-PE).

                     Contraminuta e contrarrazões, em peça única, a fls. 572/576-PE, pelo reclamante, e contrarrazões a fls. 539/549-PE, pela reclamada.

                     Os autos não foram encaminhados ao d. Ministério Público do Trabalho (RI/TST, art. 83).

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                     É o relatório.

                     V O T O

                     I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA.

                     ADMISSIBILIDADE.

                     Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.

                     MÉRITO.

                     A análise do processamento do recurso de revista fica restrita aos temas focalizados nas razões do agravo de instrumento, espectro de devolutividade fixado pela parte.

                     VÍNCULO DE EMPREGO.

                     O Eg. TRT deu provimento ao recurso ordinário do reclamante, nos seguintes termos (fls. 168/168v):

    "O reclamante aponta incorreta valoração da prova dos autos, insistindo no reconhecimento do vínculo empregatício e consectários, ao argumento de que não houve trabalho autônomo, tampouco avulso (como alegado em defesa), tendo se ativado na atividade-fim da empresa, com subordinação.

    Em que pesem os fundamentos esposados na origem, prospera a insurgência obreira.

    Quanto à distribuição do ônus da prova, tendo a reclamada apresentado fato modificativo do direito vindicado pelo autor (qual seja, a prestação de serviços de 'modo autônomo e eventual'), atraiu para si o ônus de comprová-lo, a teor dos artigos 333, inciso II, do CPC e 818 da CLT.

    A distinção entre o autônomo e o empregado é sempre de difícil abordagem, uma vez que vários são os pontos comuns entre ambas as modalidades de contratação.

    No caso, as testemunhas obreiras ouvidas às fls. 124/125 pouco souberam informar acerca da natureza da existência de efetiva subordinação na relação havida entre as partes, já que não sabiam se o autor poderia se recusar a realizar as viagens solicitadas, assim como se poderia sair antecipadamente quando não havia mais viagens a realizar ou faltar sem justificar a ausência.

    E, ainda que o próprio reclamante tenha afirmado que '... se não fosse trabalhar determinado dia precisava justificar no dia seguinte; que não existia punição quando deixava de comparecer; que 'propriamente' não poderia faltar sem justificar...'; que não era exigência da empresa que justificasse as faltas, mas fazia isto porque queria;

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que poderia ir para sua casa, se não tivesse nenhuma viagem após as 15 h.' (fls. 123), sinalizando para certa 'autonomia', não se pode olvidar as peculiaridades do caso em estudo.

    Ora, as funções desempenhadas pelo reclamante (motorista) eram essenciais à atividade econômica da empresa (compra e venda de automóveis - fls. 143), sendo certo que ele realizava o deslocamento dos veículos entre as diversas lojas da mesma rede.

    Também não há falar-se em 'eventualidade', uma vez que todas testemunhas confirmaram que tais viagens eram cotidianas, assim como o comparecimento do autor. A onerosidade é inconteste, sendo que o trabalhador recebia conforme as viagens realizadas.

    Desse modo, é forçoso concluir que os traços de autonomia confirmados pelo reclamante, por si sós, não têm o condão de afastar o reconhecimento do vínculo empregatício.

    Com respeito à sentença recorrida, tenho que a prova produzida nos autos ampara a pretensão obreira, havendo que ser reconhecido o liame empregatício no período de 20/03/2007 a 10/11/2009.

    Tendo em vista o reconhecimento do vínculo empregatício, determino o retorno dos autos à Origem, para a apreciação dos demais pedidos formulados na inicial e no respectivo aditamento.

    Dou provimento".

                     A reclamada indica violação dos arts. 2º e 3º da CLT. Colaciona um aresto.

                     Com base nos elementos de prova dos autos, o Regional detectou a presença dos requisitos necessários à configuração da relação de emprego.

                     Assim, diante do contexto fático descrito no acórdão, não se faz potencial a alegada afronta aos preceitos evocados no apelo.

                     Por outro lado, eventual reforma do acórdão demandaria o reexame de fatos e provas, intento vedado pela diretriz da Súmula 126/TST.

                     Inespecífico o aresto ofertado a cotejo, porque trata de decisão prolatada à luz da realidade fática dos respectivos autos (Súmula 296 do TST).

                     Mantenho o r. despacho agravado.

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                     Em síntese e pelo exposto, conheço do agravo de instrumento e, no mérito, nego-lhe provimento.

                     II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE.

                     Tempestivo o recurso (fls. 230 e 499-PE) e regular a representação (fl. 10), estão preenchidos os pressupostos genéricos de admissibilidade.

                     1 - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DO CONTRATO NA CTPS.

- CONHECIMENTO.

                     O Regional deu provimento ao apelo patronal, sob os seguintes fundamentos (fl. 228):

    "Insurge-se a ré contra o deferimento de indenização por danos morais decorrentes da ausência de registro em CTPS, porquanto não demonstrado prejuízo de ordem moral, sendo controvertida a existência da relação empregatícia e o suposto ilícito trabalhista.

    Tem razão.

    Para a configuração do dano previsto no artigo 186 do Código Civil, é necessário o preenchimento de quatro requisitos essenciais: ação ou omissão, culpa ou dolo, dano e nexo de causalidade, sendo que este último refere-se a elementos objetivos, constantes na ação ou omissão do sujeito, atentatório ao direito alheio, que produza dano moral ou material.

    Diante do reconhecimento do vínculo empregatício, emerge a ilicitude da conduta patronal.

    Todavia, com respeito ao posicionamento esposado na origem, não é cabível reparação civil apenas em face da ausência do registro do contrato na CTPS do trabalhador.

    É certo que o fato pode ter causado dissabores ao trabalhador que não podia comprovar perante terceiros a existência do vínculo de emprego, todavia, a irregularidade em tela, por si só, não justifica indenização por dano moral ou material. A ofensa moral não decorre dos atos ordinários do cotidiano, mas sim, das condutas excepcionais que revestidas de má-fé impliquem sofrimento moral.

    Por não restar evidenciada a exposição do autor a situação vexatória que lhe ocasionasse o desrespeito necessário para a configuração do dano moral, não há falar-se em pagamento de indenização sob tal título.

    Reformo".

                     Insurge-se o reclamante, indicando ofensa aos arts. 5º, V e X, da Constituição Federal, 47 da CLT, 186 e 927 do CCB e 297, § 4º, do CPC. Colaciona arestos.

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                     O paradigma de fl. 501-PE, do TRT da 6ª Região, autoriza o conhecimento da revista, porque sufraga tese oposta à do Regional, no sentido de que é devida a indenização por dano moral em decorrência da falta de anotação do contrato de trabalho na CTPS do empregado.

                     Conheço, por divergência jurisprudencial.

                     1.2 - MÉRITO.

                     Discute-se, nos presentes autos, a configuração ou não de dano moral, pela inobservância do dever patronal de registrar o empregado.

                     Nos termos do art. 13 da CLT, "a Carteira de Trabalho e Previdência Social é obrigatória para o exercício de qualquer emprego, inclusive de natureza rural, ainda que em caráter temporário, e para o exercício por conta própria de atividade profissional remunerada".

                     Preceitua o art. 29 do mesmo Diploma que "a Carteira de Trabalho e Previdência Social será obrigatoriamente apresentada, contra recibo pelo trabalhador ao empregador que o admitir, o qual terá o prazo de quarenta e oito horas para nela anotar, especificamente, a data de admissão, a remuneração e as condições especiais, se houver, sendo facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho".

                     Dúvidas não pairam sobre a conduta ilegal da ré. Resta saber se tal atitude enseja o pagamento de indenização por dano moral.

                     A expressão "dano" denota prejuízo, destruição, subtração, ofensa, lesão a bem juridicamente tutelado, assim compreendido o conjunto de atributos patrimoniais ou morais de uma pessoa, sendo passível de materialização econômica.

                     O art. 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos dispõe que "todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos", devendo "agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade".

                     Desbravar o princípio da dignidade da pessoa humana, em face dos contornos jurídicos que envolvem a responsabilidade pela reparação, configura atividade essencial para que se compreenda o perfeito alcance do conceito de dano juridicamente relevante.

                     A dignidade consiste na percepção intrínseca de cada ser humano a respeito dos direitos e obrigações inerentes à convivência em sociedade, sempre sob o foco das

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condições existenciais mínimas para uma participação saudável e ativa nos destinos escolhidos. É indispensável atribuir à pessoa humana o direito de desenhar os contornos de sua participação na humanidade, desde que respeitadas as regras soberanas da democracia e das liberdades individuais.

                     "A dignidade tem inegavelmente a função de limite, tanto nas relações intersubjetivas, quanto nas relações públicas e coletiva. E tem uma função de alicerçar os direitos fundamentais. Mas não tem apenas esta função. Tem também a função de instrumentalizar o indivíduo para que tenha e exerça poder de fazer, de criar, de transformar. A dignidade, como os direitos humanos em geral, tem um componente utópico, voltado à transformação da realidade. Tem características de princípio fundante, porque informa todo o ordenamento e deve ser observada pelo legislador e pelo intérprete do Direito. Mas é também um direito e comporta pretensões que podem ser judicialmente perseguidas, na perspectiva da garantia, ou do dever, encontrando expressa previsão no Direito Positivo" (Thereza Cristina Gosdal, Dignidade do trabalhador: um conceito construído sob o paradigma do trabalho decente e da honra, São Paulo: LTR, 2007, p. 49).

                     A realização dessas escolhas atrai outro pilar da dignidade da pessoa humana: a liberdade.

                     É mediante a liberdade que o homem promove suas escolhas, adota posturas, sonha, persegue projetos e concretiza opiniões. Contudo, o espectro de abrangência das liberdades individuais encontra limitação em outros direitos fundamentais, tais como a honra, a vida privada, a intimidade, a imagem.

                     Em uma sociedade que se pretende livre, justa e solidária (CF, art. 3º, I), incumbe ao empregador diligente, sob a premissa da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), promover o meio ambiente do trabalho saudável, para que o trabalhador possa executar as suas atividades com liberdade, sob a gerência da responsabilidade social.

                     Sobreleva notar que essas garantias, erigidas à categoria de direitos fundamentais, subsistem, no ordenamento jurídico brasileiro, como conquista da humanidade, razão pela qual auferiram proteção especial, consistente em indenização por dano moral decorrente de sua violação.

                     Assim dispõe o inciso V do art. 5º da Carta Magna:

    "Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do

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direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

    [...]

    V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;"

                     Traduz-se, portanto, em lesão a atributos íntimos da pessoa, sobre os quais a personalidade é moldada, de modo a atingir valores juridicamente tutelados, cuja mensuração econômica envolve critérios com embasamento objetivo, em conjunto com os subjetivos, sobretudo quando não for possível aferir a extensão do dano, como, por exemplo, nos casos de dano moral a pessoas privadas de capacidade de auto compreensão.

                     Carlos Alberto Bittar conceitua danos morais como sendo aqueles que "se traduzem em turbações de ânimo, em reações desagradáveis, desconfortáveis, ou constrangedoras, ou outras desse nível, produzidas na esfera do lesado" (Reparação Civil por Danos Morais, 2ª Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p.31).

                     Mauro Vasni Paroski, em Dano Moral e sua Reparação no Direito do Trabalho, 2ª Ed., 2008, Curitiba: Juruá, p. 49, diz que "dano moral, em sentido amplo, é a lesão provocada por ato antijurídico de outrem, sem a concordância do lesado, a interesses ou bens imateriais deste, tutelados pelo Direito, ensejando compensação pecuniária".

                     Alexandre Agra Belmonte, por sua vez, assevera que "são danos morais as ofensas aos atributos físicos, valorativos e psíquicos ou intelectuais da pessoa, suscetíveis de gerar padecimentos sentimentais..." (Danos Morais no Direito do Trabalho, 3ª Ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 94).

                     Assim, são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado-se o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (CF, art. 5º, X). Aquele que viola direito e causa dano a outrem é obrigado a repará-lo (arts. 186, 187 e 927 do Código Civil).

                     Thereza Cristina Gosdal, em Dignidade do Trabalhador: um conceito construído sob o paradigma do trabalho decente e da honra, São Paulo: LTR, 2007, p. 150, afirma que "é preciso recolocar-se o trabalhador no centro do Direito do Trabalho, atribuindo a suas normas sentido e finalidade voltados para a proteção e serviço da pessoa humana. É indispensável atribuir-se ao trabalhador o direito a ser

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reconhecido como proprietário de sua força de trabalho e detentor de direitos fundamentais, próprios de seu pertencimento à humanidade, de sua honra".

                     Nesse contexto, incumbe ao empregador respeitar a consciência do trabalhador, zelando pela sua saúde mental e liberdade de trabalho, sua intimidade e vida privada, sua honra e imagem, abstendo-se de práticas que importem exposição do empregado a situações humilhantes, constrangedoras, ridículas, degradantes e vexatórias.

                     Este, o comando do art. 1º, III, da Carta Magna, que estampa o princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil.

                     A ausência de anotação do contrato de trabalho, além de impedir o acesso do trabalhador aos benefícios previdenciários, FGTS e a outros programas governamentais, constitui obstáculo, ainda, para abertura de conta, crediário, referências e etc. Impõe sentimento de abandono, clandestinidade e marginalização, atingindo o reclamante, sua família e a sociedade.

                     Com efeito, a atitude patronal de ocultar a relação de emprego implica ilícito trabalhista, previdenciário, e até mesmo penal, produzindo lesões de natureza patrimonial (satisfeitas em razão da condenação) e não-patrimonial, diante da perturbação da saúde mental, intimidade e vida privada, honra e imagem do trabalhador.

                     Na presente hipótese, ao contrário do que entendeu o Regional, não há necessidade de comprovação dos danos sofridos, porquanto esses decorrem da própria natureza da conduta patronal, restando presumíveis.

                     Nesse sentido, cito o seguinte precedente desta Corte:

    "RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO (alegação de violação dos artigos 1º, III e 5º, V e X da CF/88 e divergência jurisprudencial). O dano moral pode ser definido como lesão à -esfera personalíssima da pessoa- ou, para citar o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, pode ser conceituado como -violação do direito à dignidade humana-. Há possibilidade de que ele se evidencie no -desprestígio-, -na desconsideração social-, -no descrédito à reputação- e -na humilhação pública- do indivíduo. Mas a existência do dano moral fica configurada quando ele é presumível, ou seja, quando, em face da ocorrência de determinado fato ofensivo, o sofrimento íntimo (dano/prejuízo moral) é esperado, provável, razoavelmente deduzido. Sendo assim, sua existência decorre de uma presunção hominis, é fruto da intuição de qualquer um que, exercitando a capacidade de empatia e munido de certa imaginação, tenta colocar-se no lugar daquele que foi ofendido em sua dignidade, para assim concluir pela possibilidade de sofrimento psíquico. Essa

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presunção acerca da existência (ou não) do dano moral, em razão de algum acontecimento danoso, somente é possível, porque os indivíduos, a par de todas as suas particularidades e idiossincrasias (que é o que os tornam indivíduos), partilham da mesma condição humana e, em última análise, quase sempre sofrem (em maior ou menor grau) pelos mesmos motivos. A 'prova' do dano moral, portanto, é a existência do próprio fato danoso - a partir do qual se presume sua existência. Recurso de revista conhecido e provido." (RR-21400-53.2005.5.05.0027, 2ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT de 13.4.2012).

                     Dessa forma, diante da presença dos requisitos ensejadores do dever de indenizar, dou provimento ao recurso de revista, para, restabelecendo a sentença, condenar a reclamada ao pagamento de indenização por dano moral.

                     ISTO POSTO

                     ACORDAM   os Ministros   da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho,   por unanimidade, conhecer do agravo de instrumento da reclamada e, no mérito, negar-lhe provimento. Por unanimidade, conhecer do recurso de revista do reclamante, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, dar-lhe provimento, para, restabelecendo a sentença, condenar a reclamada ao pagamento de indenização por dano moral .

                     Brasília, 29 de outubro de 2012.

Firmado por assinatura digital (Lei nº 11.419/2006)

Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira

Ministro Relator

fls.

PROCESSO Nº TST-ARR-125300-74.2009.5.15.0046

Firmado por assinatura digital em 30/10/2012 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, nos termos da Lei nº 11.419/2006, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira.

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 DANOS MORAIS EM RAZÃO DA FALTA DE REGISTRO A anotação do contrato de trabalho é direito do trabalhador e obrigação da empregadora, por expresso comando do art.29 da CLT. A relação jurídica de emprego tem repercussão muito mais ampla que a mera relação bilateral entre empregado e empregador: para o empregado trata-se de inserção social, notadamente porque é o registro de emprego que lhe prova a renda lícita, que lhe permite ter crédito regular e que lhe autoriza o uso dos benefícios sociais e previdenciários decorrentes dessa vinculação. A ausência de contrato anotado permite, por seu turno, a subtração de direitos do empregado e das demais entidades estatais interessadas nesse contrato, permitindo ao empregador sonegar impostos, não contribuir com a previdência social e impedir o empregado de ter acesso a estrutura de proteção social. Determina, ainda, que, após o contrato, o trabalhador tenha que provocar a máquina judicial para ter sua relação de emprego reconhecida. Mais significativo para a determinação de lesão moral do empregado é a constatação de que um empregado sem contrato registrado precisa, para as coisas cotidianas da vida, ter que dar explicações que, de outra forma não teria que as fazer: terá que explicar para o gerente do banco, para o locador de seu imóvel, e até para a autoridade policial que, eventualmente, lhe peça esclarecimentos. Cada explicação é um constrangimento, acrescentada pelo fato de que a causa da ausência de registro é em razão de conduta de terceiro, no caso, o empregador. A situação de constrangimento moral não requer prova de lesão, pois é a partir da natureza desse fato incontroverso que o Juiz pode incidir as regras da experiência comum, permitidas pelo sistema legal e verificar, por alteridade, a concretização da lesão. Eventuais provas adicionais podem ter o condão de aumentar a gravidade da lesão, examinado caso a caso. Registro que as alegações de ausência de registro de contrato de trabalho por culpa do empregado, fundado em justificativa como a nã apresentação do documento, ou pelo desejo de não ser registrado por salário inferior ao emprego anterior, não são considerados por não serem efetivamente poderosos para impedir o empregador de conceder o registro. Considerando ainda que a legislação trabalhista, por incorreção histórica, não absorve integralmente os conceitos de fraternidade, é irrelevante a eventual condescendência do empregador com o empregado, militando contra a própria empresa. A realidade de lesão moral é mais nítida para os trabalhadores assalariados de

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menor poder de resistência, que geralmente percebem menores salários, que sofrem mais, portanto, dos efeitos maléficos da hipossuficiência econômica e cultural. É necessário sempre reafirmar que o modelo constitucional vigente, exemplo para os mais diversos países inclusive mais desenvolvidos economicamente, determina como pressuposto o respeito à dignidade humana como direito fundamental, na qual se insere a dignidade do trabalhador. O trabalhador é, antes de tudo, cidadão. E a ausência de registro representa a ausência de cidadania em relação ao empregador. Dessa forma, toda forma de lesão à dignidade deve ser objeto de reprimenda para transformação da realidade social, mesmo que de forma paulatina, como geralmente é a ação do Poder Judiciário, à falta de comandos legislativos mais eficazes e de aparelhamento administrativo mais eficaz. O pedido de pagamento de danos morais por ausência de contrato de trabalho registrado em CTPS, por lesão ao art.5º,X, da CRFB/1988, deve ter seu valor estabelecido de forma moderada e, principalmente, pedagógica. Entendo que a fixação de entre dois e dez salários últimos do empregado deve atender esse objetivo, sempre levando em consideração as circunstâncias do caso concreto e as posições do empregado e empregador, podendo ainda, por óbvio, ser aumentado ou diminuído. Registro que a fixação de danos morais considerando o salário do empregado tem implicação unicamente com o objetivo pedagógico destinado ao ex-empregador, de forma a desestimular essa conduta. Ainda com relação ao valor da condenação, entendo que para empresas pequenas, o pagamento de dois a dez salários base a título de danos morais pode ser um bom fator desestimulante da conduta. Já empresas grandes, mais bem estruturadas, não possuem justificativa plausível para a ausência de registro, podendo receber, no plano individual, punições pecuniárias maiores e, no plano administrativo, encaminhamento do caso para o Ministério Público do Trabalho para apuração de outras responsabilidades que incluem até crime contra a organização do trabalho. Registro que meu entendimento sobre o tema tem amadurecido e impõe-se, de rigor, o reconhecimento desse direito aos trabalhadores que não possuem seus contratos de trabalho registrados sem qualquer justificativa plausível por parte dos seus empregadores, tendo sido alterado a partir da sentença proferida no processo No.0018049420115020241. Para efeito de prática de sentença:Fundamentação:

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O valor da indenização por danos morais em razão da falta de anotação do contrato de trabalho da parte autora, é ora fixado, de forma ponderada, em  R$.Dispositivo:-Indenização por danos morais em razão da falta de anotação do contrato de trabalho da parte autora, é ora fixado, de forma ponderada, em  R$.

A C Ó R D Ã O

1ª Turma

PE

GMHCS/gtg/rqr

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. NULIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.Hipótese em que a pretensão do autor, relativa à nulidade do acórdão regional, por negativa de prestação jurisdicional, encontra óbice nas Súmulas 184 e 297, II, desta Corte, porquanto não opostos embargos de declaração buscando a manifestação do Tribunal Regional sobre as questões que entendia não terem sido apreciadas.

Agravo de instrumento conhecido e não provido.

                     Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-334-73.2011.5.05.0005, em que é Agravante ANTÔNIO MARCOS BOAVENTURA DE JESUS e Agravada LASER ELETROMAGAZINE LTDA..

                     O reclamante interpõe agravo de instrumento contra o despacho negativo de admissibilidade das fls. 745-8, da Presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, com vista à liberação do recurso de revista que interpôs.

                     Com contraminuta e contrarrazões (fls. 777-81), vêm os autos a este Tribunal para julgamento.

                     Feito não submetido ao Ministério Público do Trabalho (art. 83 do RITST).

                     É o relatório.

                     V O T O

                     Preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento e passo ao exame do mérito.

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                     O recurso de revista do reclamante teve seu seguimento denegado pelo juízo primeiro de admissibilidade, aos seguintes fundamentos (fls. 745-8):

    "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / ATOS PROCESSUAIS / NULIDADE / NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.

    Alegação(ões):

    - violação do(s) art(s). 93, IX da CF.

    Sustenta que na inicial elencou 20 pedidos e tanto o juízo a quo quanto o Colegiado não enfrentaram as questões relacionadas aos pedidos.

    Ao enfrentar preliminar de nulidade proposta pela recorrente sob a alegação de negativa de prestação jurisdicional, o Colegiado destacou que restando o julgador a quo convicto da inexistência de relação de emprego entre as partes, não haveria necessidade de discorrer acerca dos demais pleitos, em homenagem ao caráter de prejudicialidade de que se reveste a questão. Consta do v. acórdão:

    'Em verdade, em torno da alegação apenas se extrai a irresignação do recorrente com a decisão que lhe foi desfavorável. Ao contrário do que tenta fazer crer, não se constata qualquer omissão no julgado ou a alegada fundamentação parca que autorize o acolhimento da preliminar, por ausência de prestação jurisdicional.

    Com efeito, verifica-se da simples leitura da sentença recorrida que acolheu o juízo a tese de defesa de inexistência de vínculo de emprego entre as partes, contra a qual, inclusive, se insurge o recorrente no mérito do apelo, sendo simples decorrência lógica e evidente o indeferimento dos pedidos que o teria como lastro.

    Nota-se, em verdade, relação de prejudicialidade entre os pedidos formulados e a análise da existência de relação de emprego, sendo certo que afastada esta, fadados ao indeferimento estão os demais pedidos, ainda que sobre cada um em específico não tenha se manifestado o juízo.

    Por outro lado, é de se observar não ter o reclamante utilizado do remédio processual adequado para suprir o suposto vício de julgamento - embargos de declaração - restando precluso o direito de apresentar em sede de recurso qualquer argüição neste sentido.

    Destaque-se, ainda, não estar o juízo obrigado a se manifestar sobre todos os argumentos trazidos pelas partes para que a prestação jurisdicional seja entregue de forma completa. Necessária a indicação na sentença dos motivos que lhe serviram de fundamentação - artigo 131 do CPC - como verificado nos autos.'

    No mérito, o Colegiado, com respaldo nas provas dos autos, registrou a ausência de subordinação, de pessoalidade e onerosidade, o que afasta a aplicação do art. 3º da CLT. Assim consignou:

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    'O traço mais relevante para diferenciar a relação de emprego e o trabalho autônomo é a subordinação, repita-se. E, sem dúvida não existe quando o trabalhador, proprietário do veículo utilizado, arca com todos os riscos da atividade desenvolvida.

    O pagamento de fretes, por si só, não afastaria o contrato de trabalho, desde quando também houvesse encargo oneroso para o suposto empregador, e, se demonstrado os demais requisitos exigidos no art. 3º da CLT.

    Sequer a não eventualidade - assim entendido serviços não inerentes à atividade fim do empreendimento e não vinculada à constância, habitualidade - estaria caracterizada, considerando o trabalho como fretista, quando a entrega da mercadoria constitui apenas uma das vantagens asseguradas aos clientes, mas dispensável à atividade fim desenvolvida pela empresa.

    O sentido conferido à expressão, considerado o contexto do art. 3º, da CLT, equivale a serviços não atrelados à atividade fim da empresa. Aqueles não necessários ao seu desenvolvimento, não implicando na impossibilidade da execução da atividade se apenas ocasionalmente utilizados.

    Precisa a definição conferida pelo Juiz Antonio Carlos de Oliveira, que já integrou esta Casa, citada por Rodrigues Pinto:

    -Nesse sentido, lembra Antônio Carlos de Oliveira que o "empregado comum é aquele que presta serviços de natureza não-eventual. Não se pode confundir `serviços de natureza não-eventual- com `serviços de natureza contínua-. Serviços de natureza não-eventual ou são contínuos ou são descontínuos, e nem por isso deixa de o seu prestador ser considerado empregado comum. O essencial é que sejam permanentes na empresa, ainda que o obreiro os preste sem continuidade. É o caso de um garçom que trabalha em certo restaurante aos sábados e domingos. Para o restaurante seus serviços não são eventuais, pois atendem à finalidade do estabelecimento, embora prestados intermitentemente, descontinuamente".

    Portanto, o fato de haver prestado serviços por longo período não supre o requisito da não eventualidade; ao contrário, quando realmente firmado contrato de trabalho, pode se apresentar por prazo determinado ou restar executado por curto período. Não há que se confundir, portanto, não eventualidade e continuidade.

    Entretanto, considerada a inexistência de subordinação e os riscos da atividade impostos ao reclamante, bem como ausentes a pessoalidade e onerosidade, resta impossibilitado o reconhecimento do vínculo de emprego apontado na vestibular, ainda que houvesse o autor indicado execução de serviços não eventuais.'

    O apelo não merece trânsito.

    Ao contrário do alegado, a prestação jurisdicional foi entregue plenamente.

    As questões essenciais ao julgamento da controvérsia foram devidamente enfrentadas por este Tribunal, que adotou tese explícita a respeito, embora com resultado diverso do pretendido pela parte recorrente. O pronunciamento do Juízo encontra-se íntegro, sob o

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ponto de vista formal, não sendo possível identificar ali qualquer vício que afronte os dispositivos invocados.

    Ademais, a Turma firmou seu entendimento com base no livre convencimento motivado, nos termos do art. 131 do CPC, não sendo necessário rebater todos os pontos arguidos pelas partes.

    Por conseguinte, sob a ótica da restrição imposta pela OJ 115/SDI-I/TST, não se vislumbram as violações apontadas.

    Desatendidos, nestas circunstâncias, os requisitos de admissibilidade do recurso, entendo desaparelhada a revista, nos termos do art. 896 da CLT."

                     No agravo de instrumento (fls. 753-67), o reclamante argui a nulidade do acórdão regional, por negativa de prestação jurisdicional e por julgamento citra petita. Aponta violação dos arts. 5°, XXXV e LIV, e 93, IX, da Constituição Federal, 832 e 897-A da CLT, 126, 128, 131, 458 e 535, I e II, do CPC.

                     O agravo de instrumento não merece ser provido.

                     Registro, de plano, que as alegações relativas á nulidade da decisão regional por julgamento extra petita e a acenada ofensa aos arts. 5º, XXXV e LIV, da Carta Magna, 832 e 897-A da CLT, 126, 128, 458 e 535, I e II, do CPC são inovatórias em relação ao recurso de revista e, portanto, serão desconsideradas.

                     No tocante à suposta nulidade do acórdão regional, por negativa de prestação jurisdicional, o conhecimento do recurso de revista - e, consequentemente, o provimento do agravo de instrumento - encontra óbice nas Súmulas 184 e 297, II, desta Corte, porquanto não foram opostos embargos de declaração buscando a manifestação do Tribunal Regional sobre as questões que entendia não terem sido apreciadas.

                     Nego provimento.

                     ISTO POSTO

                     ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao agravo de instrumento.

                     Brasília, 20 de fevereiro de 2013.

Firmado por assinatura digital (Lei nº 11.419/2006)

HUGO CARLOS SCHEUERMANN

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Ministro Relator

fls.

PROCESSO Nº TST-AIRR-334-73.2011.5.05.0005

A C Ó R D Ã O

6ª Turma

ACV/rod/l 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. GARÇOM. VÍNCULO DE EMPREGO RECONHECIDO. FUNÇÃO RELACIONADA A ATIVIDADE-FIM DA RECLAMADA. DESPROVIMENTO. Diante do óbice das Súmulas 126, 296 e 337 do C. TST, e porque não demonstradas as violações dos dispositivos legais apontados, não há como se admitir o recurso de revista. Agravo de instrumento desprovido.

                     Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-48600-55.2008.5.04.0351, em que é Agravante PERINI HOTÉIS E TURISMO LTDA. e Agravado ADEMIR NUNES ALVES.

                     Inconformada com o r. despacho de fls.1033/1035 (autos eletrônicos), que denegou seguimento ao recurso de revista, agrava de instrumento a reclamada.

                     Com as razões de fls. 1041/1053 (autos eletrônicos), alega ser plenamente cabível o recurso de revista.

                     Não foi apresentada contraminuta, conforme certidão de fl.1066(autos eletrônicos).

                     Não houve manifestação do D. Ministério Público do Trabalho.

                     É o relatório.

                     V O T O

                     I - CONHECIMENTO

                     Conheço do agravo de instrumento, uma vez que se encontra regular e tempestivo.

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                     II - MÉRITO

                     VÍNCULO DE EMPREGO. GARÇOM.

                     Eis o entendimento do Eg. TRT:

    "Trata-se de espécie em que, a despeito de o reclamado negar a existência de relação jurídica de natureza empregatícia entre as partes, afirmando ter havido trabalho autônomo e eventual, o contexto probatório dos autos conduz à formação do convencimento no sentido de que a atividade desempenhada pelo reclamante (garçom) estava inserida no giro econômico da empresa (hotel), sendo necessária ao desempenho de suas funções. Isto porque o demandante trabalhava nos eventos realizados demandado, os quais incluíam a hospedagem dos participantes - principal atividade econômica deste.

    Dessa forma, resta caracterizada a subordinação estrutural - "que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento" (Delgado, Maurício Godinho. Direitos Fundamentais na Relação de Trabalho. In Revista do Ministério Público do Trabalho. Brasília, ano XVI, n. 31, março de 2006, fls. 45/46). O conceito de subordinação estrutural "atenua o enfoque sobre o comando empresarial direto, acentuando, como ponto de destaque, a inserção estrutural do obreiro na dinâmica do tomador de seus serviços" (in op. cit.).

    De outra parte, a atuação dos garçons nos eventos realizados no hotel é essencial ao desenvolvimento da atividade econômica a que este se destina, porquanto os eventos estavam associados à hospedagem.

    Assim sendo, e considerando-se que o reclamante prestava serviços de forma pessoal e mediante contraprestação, resta evidenciada, na espécie, a existência de relação jurídica de natureza empregatícia.

    Observe-se que o preposto do demandado afirma que "como todos hotéis, o Serra Azul sempre teve uma área destinada a eventos, para fins de locação; se o interessado em locar quiser, o Hotel faz todos os contatos com os serviços necessários ao propósito do evento; até 2003, dependendo da dimensão do evento, o Hotel fazia contato com Altamir, pessoa física em Porto Alegre, encarregado de recrutar garçons para o Hotel; por volta de 2003, o Hotel, tendo por prioridade a hospedagem, decidiu terceirizar o setor da alimentação e bebida; de modo que o interessado no evento, loca o espaço no Hotel, mas a organização do próprio evento não mais ficou por conta do Hotel, mas sim, por uma terceirizada; (...) antes da terceirização, o Hotel obtia mão-de-obra para atender aos eventos através de Altamir; (...) ao final de cada evento o Hotel fazia o pagamento a Altamir que redistribuía os valores aos garçons; (...) o depoente acredita que Altamir seja chamado pelo Hotel para atender a eventos desde 1990; (...). (fl. 143/144);

    Segundo a testemunha arrolada pelo demandante, ainda, ao término do evento, se deslocavam à tesouraria e individualmente, recebiam os pagamentos; (...) o último serviço prestado por este grupo ocorreu em 31 de dezembro de 2007; naquela oportunidade, já estavam decididos a conversar com o Hotel, pois se preocupavam em perder todo o tempo de serviço prestado, uma vez que o economato que assumira não

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chamava o depoente e os colegas com a mesma freqüência; os garçons reportaram essa preocupação a Altamir que, ao seu turno, foi conversar com o Hotel; tendo recebido a resposta, segundo ele, de que deveriam procurar seus direitos; (...)(fls. 145/146).

    Ademais, a primeira testemunha arrolada pela demandada afirma que (...) o evento faz parte da rotina do Hotel mas o número pode variar conforme a demanda do mercado; o depoente conhece Altamir; Altamir era o chefe da equipe de garçons de Porto Alegre; (...) até 2005, Tadeu, o responsável pela parte operacional do Hotel, fazia o contato com Altamir que, por sua vez, recrutava os garçons em Porto Alegre; (...) o depoente somente fazia eventos com os garçons de Porto Alegre quando eram maiores, com número superior a cento e vinte pessoas; (...) Tadeu sempre foi responsável por conversar com Altamir; o depoente era apenas consultado sobre o número de garçons que necessitaria; (...). (fl. 147).

    A segunda testemunha arrolada pelo reclamado, de outra parte, afirma que (...) o Hotel terceirizou o setor de alimentação há cerca de cinco anos; antes, todo o serviço de organização dos eventos, incluindo o recrutamento de garçons, era feito pelo próprio Hotel; até 2005, normalmente, Tadeu falava com Altamir informando o número de garçons que precisava para o evento; (...) depois da terceirização, entrou muita concorrência mas ainda ocorrem esses contatos com Altamir; também ocorriam eventos em que a organizadora levava a própria alimentação; o evento envolve, necessariamente, hospedagem (fl. 148).

    Por fim, oportuno destacar que, em face do exposto, resta evidente a ocorrência de intermediação de mão-de-obra procedida ilegalmente (porquanto não configurada a hipótese de que trata a Lei nº 6.019/74) - já que Altamir, a pedido do demandado, arregimentava a equipe de garçons da qual participava o demandante - o que autoriza, por si só, o reconhecimento de vínculo empregatício com o reclamado, em face do disposto no artigo 9º consolidado.

    Nega-se provimento."

                     Nas razões de recurso de revista, renovadas em agravo de instrumento, a reclamada alega que não há que se falar em reconhecimento de vínculo de emprego entre as partes, na medida em que não estão presentes os requisitos autorizadores dessa relação. Afirma que o recorrido prestava serviços de garçom no hotel da reclamada quando da ocorrência de grandes eventos. Aduz que a atividade-fim da reclamada é no ramo de hotelaria, não no de gastronomia ou de eventos. Alega que quando eram realizados os grandes eventos era chamada uma equipe de garçons, não garçons específicos. Aponta violação dos artigos 2º e 3º da CLT. Traz arestos ao cotejo de teses.

                     Infere-se do v. acórdão recorrido que restou configurada a relação de emprego com a reclamada considerando-se que o reclamante prestava serviços de maneira pessoal e mediante contraprestação. Consignou, também, que restou caracterizada a subordinação estrutural,

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que se dá em razão da inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de serviços. Por fim, entendeu o Eg. TRT que ocorreu no presente caso a intermediação ilegal de mão-de-obra o que, por si só, autoriza o reconhecimento do vínculo de emprego, face o disposto no artigo 9º da CLT.

                     Diante do entendimento do Eg. TRT de que estão presentes os requisitos ensejadores do reconhecimento do vínculo de emprego, não se percebe qualquer afronta aos artigos 2º e 3º da CLT.

                     Ressalte-se que para se chegar à conclusão diversa do v. acórdão regional, seria necessário o reexame de fatos e prova, bem como a sua valoração, procedimento vedado nesta instância extraordinária, na esteira da previsão contida na Súmula nº 126 do c. TST.

                     Os arestos colacionados às fls.1004/1011 não servem para demonstrar dissenso pretoriano, pois não trazem a fonte de publicação ou repositório autorizado em que foram publicados, a incidir o óbice da Súmula 337 do C. TST.

                     O aresto de fl.1011, proveniente do Eg. TRT da 24ª região traz tese no sentido de que a prestação de serviço de garçom estava condicionada as necessidades flutuantes do empreendimento, o que não caracteriza o vínculo de emprego, enquanto o v. acórdão recorrido consigna que a atuação dos garçons, no caso dos autos, estava ligada ao desenvolvimento da atividade econômica a que a reclamada se destina, na medida em que os eventos estavam associados à hospedagem. Incidência da Súmula 296 do C. TST.

                     Ressalte-se que arestos provenientes do mesmo Eg. TRT prolator da v. decisão recorrida não enseja o processamento do recurso de revista, pois, esta hipótese não se encontra prevista no artigo 896 da CLT.

                     Nego provimento.

                     ISTO POSTO

                     ACORDAM   os Ministros   da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho,   por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.

                     Brasília, 19 de Outubro de 2011.

Firmado por Assinatura Eletrônica (Lei nº 11.419/2006)

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Aloysio Corrêa da Veiga

Ministro Relator

fls.

PROCESSO Nº TST-AIRR-48600-55.2008.5.04.0351

Firmado por assinatura eletrônica em 20/10/2011 pelo Sistema de Informações Judiciárias do Tribunal Superior do Trabalho, nos termos da Lei nº 11.419/2006.