A Constituição do Senhorio e a Relação do Dominium

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A Constituição do Senhorio e a Relação do Dominium Uma vez que a vassalidade, restrita aos grupos dominantes, concerne apenas a uma ínfima proporção dos homens (e menos ainda das mulheres), ela não poderia constitui a principal relação no seio do sistema feudal. Serão seguidas, aqui, análises de Alain Guerreau, que dá a esta relação entre senhores e dependentes o nome de dominium (ou dominação feudal), pois ela enganja - segundo os temos da época -, de um lado, um dominus (mestre, senhor) e, do outro, produtores postos em posição de dependência. Estes últimos são qualificados de homines propii (homens do senhor) ou de "vilãos" (villani, quer dizer, os habitante do lugar, originalmente a villa). O termo "vilão", que de início não é pejorativo, é sem dúvida o mais adequado, em primeiro lugar porque a noção moderna de "camponês" não tem equivalente nas concepções medievais. Nelas, os homens rurais não eram definidos por suas atividades (o trabalho da terra), mas pelo termo "vilão", que abrange todos os aldeãos, seja qual for sua atividade (aí incluídos os artesãos), e que indica essencialmente residência local. Ele também não designa um estatuto jurídico (livre/não- livre), questão que parece relativamente secundária. A base fundamental dessa relação social é antes de ordem espacial: ela reina todos os habitantes de um senhoria, os vilãos (ou, se quisermos, aldeãos) que sofrem a dominação do senhor do lugar. Além disso, assim como o laço vassálico, essa relação enuncia-se nos mesmos termos que a relação do fiel com Deus (homo/dominus). Perante o senhor feudal, os vilãos estão, então,. na mesma posição que os homens diante de Deus, de modo que as duas relações se reforçam mutuamente, como em um jogo de espelhos. O nascimento da aldeia e o encelulamento dos homens (...) o habitat natural do fim da Alta Média é disperso e instável. Ele consiste de construções leves (...). Fora alguns edifícios mais importantes, que exercem o papel de pontos fixos, estes frágeis moradias são periodicamente abandonadas.

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A Constituição do Senhorio e a Relação do Dominium

Uma vez que a vassalidade, restrita aos grupos dominantes, concerne apenas a uma ínfima proporção dos homens (e menos ainda das mulheres), ela não poderia constitui a principal relação no seio do sistema feudal.

Serão seguidas, aqui, análises de Alain Guerreau, que dá a esta relação entre senhores e dependentes o nome de dominium (ou dominação feudal), pois ela enganja - segundo os temos da época -, de um lado, um dominus (mestre, senhor) e, do outro, produtores postos em posição de dependência. Estes últimos são qualificados de homines propii (homens do senhor) ou de "vilãos" (villani, quer dizer, os habitante do lugar, originalmente a villa). O termo "vilão", que de início não é pejorativo, é sem dúvida o mais adequado, em primeiro lugar porque a noção moderna de "camponês" não tem equivalente nas concepções medievais. Nelas, os homens rurais não eram definidos por suas atividades (o trabalho da terra), mas pelo termo "vilão", que abrange todos os aldeãos, seja qual for sua atividade (aí incluídos os artesãos), e que indica essencialmente residência local. Ele também não designa um estatuto jurídico (livre/não-livre), questão que parece relativamente secundária. A base fundamental dessa relação social é antes de ordem espacial: ela reina todos os habitantes de um senhoria, os vilãos (ou, se quisermos, aldeãos) que sofrem a dominação do senhor do lugar. Além disso, assim como o laço vassálico, essa relação enuncia-se nos mesmos termos que a relação do fiel com Deus (homo/dominus). Perante o senhor feudal, os vilãos estão, então,. na mesma posição que os homens diante de Deus, de modo que as duas relações se reforçam mutuamente, como em um jogo de espelhos.

O nascimento da aldeia e o encelulamento dos homens

(...) o habitat natural do fim da Alta Média é disperso e instável. Ele consiste de construções leves (...). Fora alguns edifícios mais importantes, que exercem o papel de pontos fixos, estes frágeis moradias são periodicamente abandonadas.