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A CONSTRUÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA SOB A PERSPECTIVA DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO 1 LIMA, Daniely Sandra de GUEDES, Gilmar Barbosa 2 RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo discutir o processo de construção da gestão escolar democrática no Brasil. Considerando o cenário das políticas educacionais brasileiras, a gestão democrática vem norteando a organização do trabalho nas instituições escolares e não-escolares. O trabalho em tela discute a conjuntura política, econômica e social, fazendo uma relação com o surgimento das concepções de gestão neoliberal e democrático-participativa. Analisa os paradigmas de participação e autonomia no contexto da reforma do Estado na década de 1990. Apresenta a legislação educacional direcionada a implantação da gestão democrática nas escolas pública brasileiras, notadamente, a Lei 9.394/96 (Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB/96), estamento legal criado sob os auspícios da Constituição Federal de 1988. Analisa quais são os desafios enfrentados pelo processo de implementação da diretriz de gestão democrática da escola pública. Defende a formação de sujeitos reflexivos na conjuntura da sociedade capitalista e globalizada. Adota a dimensão pedagógica da gestão escolar democrática, em especial, a construção e os delineamentos assumidos pela consecução do projeto político pedagógico (PPP) e sua interferência nos níveis de participação e da autonomia dos atores escolares. Metodologicamente faz uso de levantamentos (documental e bibliográfico) e de um relato de experiência que trata da atuação em um estabelecimento de ensino público estadual na Escola Estadual Cônego Monte, no município de natal, realizando o acompanhamento do trabalho da equipe gestora. Concluindo, apresentando como pode se desenvolver a práxis da gestão escolar em uma instituição na qual o PPP, trabalho já desenvolvido na disciplina de Estágio Supervisionado III, prevendo assim que a instituição faça uso da participação democrática e da autonomia nas deliberações do trabalho administrativo-pedagógico cotidiano. Diante dessa experiência vivenciada concluo que o processo de democratização da escola pública é contínuo e infindável, pautado na construção e na desconstrução de saberes, de conceitos e de práticas. PALAVRAS-CHAVE: Gestão Democrática; Participação Escolar; Autonomia da gestão. 1 Artigo de conclusão apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciatura em Pedagogia. 2 Professor Orientador.

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A CONSTRUÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA SOB A

PERSPECTIVA DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO1

LIMA, Daniely Sandra de

GUEDES, Gilmar Barbosa2

RESUMO:

O presente trabalho tem como objetivo discutir o processo de construção da gestão escolar democrática no Brasil. Considerando o cenário das políticas educacionais brasileiras, a gestão democrática vem norteando a organização do trabalho nas instituições escolares e não-escolares. O trabalho em tela discute a conjuntura política, econômica e social, fazendo uma relação com o surgimento das concepções de gestão – neoliberal e democrático-participativa. Analisa os paradigmas de participação e autonomia no contexto da reforma do Estado na década de 1990. Apresenta a legislação educacional direcionada a implantação da gestão democrática nas escolas pública brasileiras, notadamente, a Lei 9.394/96 (Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96), estamento legal criado sob os auspícios da Constituição Federal de 1988. Analisa quais são os desafios enfrentados pelo processo de implementação da diretriz de gestão democrática da escola pública. Defende a formação de sujeitos reflexivos na conjuntura da sociedade capitalista e globalizada. Adota a dimensão pedagógica da gestão escolar democrática, em especial, a construção e os delineamentos assumidos pela consecução do projeto político pedagógico (PPP) e sua interferência nos níveis de participação e da autonomia dos atores escolares. Metodologicamente faz uso de levantamentos (documental e bibliográfico) e de um relato de experiência que trata da atuação em um estabelecimento de ensino público estadual na Escola Estadual Cônego Monte, no município de natal, realizando o acompanhamento do trabalho da equipe gestora. Concluindo, apresentando como pode se desenvolver a práxis da gestão escolar em uma instituição na qual o PPP, trabalho já desenvolvido na disciplina de Estágio Supervisionado III, prevendo assim que a instituição faça uso da participação democrática e da autonomia nas deliberações do trabalho administrativo-pedagógico cotidiano. Diante dessa experiência vivenciada concluo que o processo de democratização da escola pública é contínuo e infindável, pautado na construção e na desconstrução de saberes, de conceitos e de práticas.

PALAVRAS-CHAVE: Gestão Democrática; Participação Escolar; Autonomia da

gestão.

1 Artigo de conclusão apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciatura em Pedagogia. 2 Professor Orientador.

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1 INTRODUÇÃO: ELEMENTOS CONJUNTURAIS – HISTÓRICOS, ECONÔMICOS,

POLÍTICOS E LEGAIS – QUE DELINEIAM O SURGIMENTO DA GESTÃO DA

DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA NA DÉCADA DE 1990:

O processo de democratização da gestão escolar pública, que se inicia

nos idos dos anos 1980, conforme Domingos Sobrinho e Barbosa Jr. (2014, p. 233,

grifo dos autores):

[...] será com o „carro em movimento‟ [...] para dizer que teremos de consolidar e aprofundar as conquistas obtidas” até o presente momento da história, e que a democratização não depende apenas da ação de um único indivíduo, mas do trabalho em conjunto de todos os envolvidos para criar uma cultura de gestão democrática educacional.

Tal processo vem sendo construído historicamente, de uma forma não

linear, considerando os aspectos políticos, econômicos e sociais concernentes a

sociedade capitalista.

Dessa forma, a construção e consolidação da gestão democrática no

Brasil está intimamente ligada a conjuntura de desenvolvimento da sociedade

capitalista e a conformação de distribuição de poder entres as forças econômicas e

políticas que compõem sociedade nacional. Por essa lógica, na década de 1980,

durante o processo de redemocratização acarretado pelo fim do regime civil-militar

instaurado em 1964, desponta um primeiro movimento que defende a

democratização da gestão escolar pública, esse grupo foi gestado dentre os

intelectuais, os sindicatos e as entidades de classe que defendem a gestão

democrática numa lógica da transferência de poder para os atores envolvidos na

sociedade e na escola, a luz da corrente neoliberal, a gestão democrática deve

materializar-se por meio da eleição de diretores, criação dos fóruns e conselhos de

deliberação e fiscalização coletivas (conselhos de escola, conselho de fundos,

conselhos estaduais e municipais de educação, dentre outras formas), construção

coletiva do projeto político-pedagógico da escola, dentre outras formas de gestão do

poder compartilhado.

Em contrapartida ao primeiro movimento de introdução à gestão e numa

diretriz ideológica contrária, em meados dos anos 1990, de forma mais orgânica

durante o Governo de Presidentes Fernando Henrique Cardoso, começam a ser

implementas as reformas do Estado de diretriz neoliberal, essa nova versão, por sua

vez, também, defende a democratização das ações na escola, embora utilize outros

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meios, notadamente, administrativos e financeiros. Ocorre a transferência da

responsabilidade pela gestão escolar para o âmbito dos sistemas municipais e as

escolas, no entanto, numa diretriz de responsabilização dos atores sociais

localizados na ponta do sistema educacional, um exemplo dessa diretriz é a criação

das unidades executoras, entidades públicas de direito privado que passam a

receber os para recursos financeiros carreados para manutenção e custeio das

ações nas escolas públicas.

A crítica comum entre as duas correntes que defendem a democratização

da gestão da escola pública nacional, é que a gestão escolar pública historicamente,

de forma especial a partir das primeiras décadas do século XX, quando da criação

dos sistemas municipais, estaduais e nacionais de educação, percebe-se que a

gestão escolar brasileira é permeada por práticas políticas burocráticas e

patrimonialistas, observamos esse fato quando analisamos todo o período

republicano recente, em que as práticas estiveram atreladas exclusivamente aos

interesses do estado capitalista burguês.

Um contraponto a essa condição em que o Estado assume,

exclusivamente, uma diretriz autoritária e patrimonialista, inicia-se com o período de

redemocratização, conforme havíamos nos referido, acarretado pelo fim do regime

civil-militar de 1964, processo que acarretou o advento de imersão de novas ideias

democráticas originárias da promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF-88) e

da Lei 9.394/96 (Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96).

A primeira vertente referida que defende a democratização da gestão

escolar enquanto um processo de responsabilidades transferência de poder para os

atores sociais envolvidos na escola, parte do fundamento de que a escola pública

deve exercer uma função de emancipadora do homem ante a exploração exclusiva

pelo capital, essa gestão partiria de fundamento de democrática-participativa e

fundar-se na autonomia deliberativa dos indivíduos para gerir a escola pública.

No entanto, a crise de acumulação capitalismo iniciada nos anos 1970,

acarretada pela elevação do preço do petróleo e o consequente endividamento dos

países em desenvolvimento, como também, a imersão do processo de

reestruturação produtiva acarretado pela substituição parcial da diretriz taylorista-

fordista pela forma organização produtiva flexível, todo esse cenário de mudanças,

passa a instigar os teóricos neoconservadores e neoliberais a defenderem um

surgimento de uma nova ordem, a ordem do mercado como guia para a

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reestruturação do aparato estatal, inclusive, pela consecução de novas diretrizes de

gestão escolar pública, que passam a ser fundadas na perfomatividade3, eficiência e

eficácia na entrada e saída do produto final que seria a clientela (alunos) (sic) e na

accountability vista como a prestação de contas ao consumidor pela prestação do

serviço escolar (sic).

Essa nova ordem neoliberal, sob a justificativa de que estaria protegendo

os direitos individuais, segundo (CABRAL NETO; SOUZA, apud PETRAS, p. 57),

advoga que: “está alicerçada na defesa de que o mercado, é um eixo modulador da

vida social e, ainda, é a dinâmica na qual (e tão somente ela) pode ser a garantia

das regras sociais”. E que ordem seria essa? Uma ordem de emancipação dos

direitos a sociedade, ou emancipação do capital, apenas?

Patinando entre essas duas formas de gestão referidas anteriormente,

uma primeira que defende a democratização do poder por meio gestão democrático-

participativa4 na escola, e uma segunda de diretriz neoliberal, que apregoa a

performativa das práticas de gestão, esses dois encaminhamentos vão refletir nas

reformas da gestão pública, educacional e escolar, que iniciam-se, de forma mais

acentuada, nas primeiras décadas dos anos 2000, nesse momento os gestores, das

diferentes instâncias federativas, implementam as políticas educacionais no Brasil

no sentido de democratizar a gestão.

Para implementar essas reformas na gestão os administradores do

Estado chegam ao diagnóstico de que ocorreu, praticamente, a universalização do

atendimento no nível do Ensino Fundamental, e, embora procurem equacionar as

defasagens de acesso na Educação Infantil e no Ensino Médio, os demais níveis da

Educação Básica, ainda assim, de forma concomitante buscam melhorar a

qualidade da educação básica pública, que em grande escala é buscada via

melhoria da performatividade.

Nesse intento de melhorar a qualidade da educação pública o Governo

Federal, na gestão do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ordena o conjunto de

3 Segundo Oliveira (2009, p. 201): “A performatividade proporciona sistemas de signos

que representam a educação de maneira codificada e autorreferenciada para o consumo. Algumas tecnologias específicas desenhadas para obter a performatividade em educação, tais como a gestão da Qualidade Total e as inovações em matéria educativa, passam a ser tomadas como propostas de governos para a melhoria da educação”.

4 De acordo com Libâneo (2013, p. 106), a concepção democrático-participativa:

“Advoga, pois, que a gestão participativa é a forma de exercício democrático da gestão e um direito de cidadania, mas implica, também, deveres e responsabilidades, portanto, a gestão da participação e a gestão eficaz”.

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programas federais desenvolvidos pelo Ministério da Educação, até então, e cria

outros novos e os intitula de PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação). E, no

intuito de para dar organicidade a esse Plano, a União edita o Decreto 6.094/2007,

de 24 de abril de 2007 – que dispõe sobre a implementação do Plano de Metas

Compromisso Todos pela Educação, pela União Federal, em regime de colaboração

com Municípios, Distrito Federal e Estados, e a participação das famílias e da

comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira,

visando a mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica

(BRASIL, 2007).

O Compromisso Todos pela Educação prevê ações que visam a melhoria

da qualidade da educação básica em patamares semelhantes aos países

desenvolvidos, para avaliar essa potencial melhoria da qualidade da educação é

criado o IDEB5 (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e o PAR (Plano de

Ações Articuladas), esse último Plano é fundados na diretriz federalista de gestão

educacional e seus objetivo é apoiar técnico e financeiramente os entes federados

para que os Estados e Municípios possam atingir os indicadores propugnados nas

metas de elevação do IDEB.

O IDEB incorpora a lógica de avaliação feita pela prova do PISA

(Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), que avalia a proficiência dos

estudantes que estão no oitavo ano de escolarização e na faixa etária dos quinze

anos de idade, nas áreas de leitura, matemática e ciências. O exame e aplicado em

países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento, situados em todos os

continentes do mundo, o organismo multilateral responsável é a Organização para

Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

O objetivo alegado pelos últimos governos para utilizar um indicador

estandardizado de avaliação seria melhorar a performatividada da educação básica

brasileira, para tanto, os gestores do Estado apregoam ser uma diretriz essencial

para impulsionar o desenvolvimento econômico, pelo fato desse tipo de avaliação

mensurar a qualidade da educação pública oferecida pelas redes, diagnóstico que

5 O IDEB foi instituído pela Decreto 6.094, de 24 de abril de 2007, que regulamentou o

Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, conforme o art. 3, do decreto supracitado: “A qualidade da educação básica será aferida, objetivamente, com base no IDEB, calculado e divulgado periodicamente pelo INEP, a partir dos dados sobre rendimento escolar, combinados com o desempenho dos alunos, constantes do censo escolar e do Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB, composto pela Avaliação Nacional da Educação Básica - ANEB e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Prova Brasil)” (BRASIL, 2007).

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identifica se houve melhoria da qualidade e o atendimento as demandas recorrentes

de escolarização e qualificação da força de trabalho, condição que faça jus a

elevada competividade internacional do mercado de trabalho capitalista.

Desponta dessa forma uma lógica em que a educação é considerada,

unicamente, uma forma de adquirir capital humano, por essa diretriz a educação

pública assume uma nuança de qualificação da força de trabalho para o mercado,

encaminhamento que vislumbra, prioritariamente, a ampliação e acumulação do

capital pelo setor produtivo burguês. Redimensiona-se, assim, o papel do Estado no

que diz respeito a visão minimalista no atendimento as demandas de melhoria das

questões sociais (desigualdade e pobreza), condição que apresenta reflexos nos

governo brasileiro a partir década de 1990, de acordo com Cabral Neto e Souza

(2008 p. 58), “[...] mais precisamente no governo do Presidente Fernando Collor de

Mello, e de forma mais rebuscada, ao longo das duas gestões de governo do

presidente Fernando Henrique Cardoso (1995 – 1998 e 1999 – 2002)”.

Seguindo essa nova ordem neoliberal os Governos citados anteriormente

caracterizam-se pela acentuação da privatização, da desregulamentação e da

terceirização dos serviços públicos estatais, tendo como consequência a elevação

da concentração de renda nas mãos da classe empresarial e dos grupos

coorporativos particulares, embora, em contrapartida, ocorra, também, a mobilização

de parte dos segmentos sociais ligados a classe trabalhadora, que minoram as

reformas (trabalhista e da previdência) e o desmonte do aparato estatal.

Os burocratas orgânicos que implementam a reforma neoliberal passam a

advogar a necessidade da implementação de medidas que tornem o “Estado

Moderno”, conforme Cabral Neto e Souza, (2008, p. 59), esses arautos da Reforma

defendiam que:

[...] era necessária a redução dos gastos com as políticas públicas e sociais, a transferência de atividades da esfera pública para a esfera privada e um reordenamento do aparelho estatal com medidas desburocratizantes e descentralizadoras, introduzindo-se novas formas de gestão nos serviços e novas formas de relações de trabalho, incluindo as que se estabelecem entre o Estado e os trabalhadores da administração pública.

Seguindo essa diretriz de reduzir os gastos com as políticas públicas e

sociais, configurando-se então uma ideologia de gestão do Estado que assume uma

feição puramente econômica e fundada na meritocracia, por esse encaminhamento

busca-se descentralizar o poder do Estado, atingindo diretamente as camadas

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populares pobres da sociedade que dependem das políticas públicas sociais para

sobrevivência. Enfraquecendo, assim, a democratização do acesso aos bens sociais

coletivos, focalizam-se as políticas sociais em uma pequena parcela da sociedade,

apenas os mais pobres e vulneráveis, os miseráveis mesmo. No âmbito das políticas

sociais, em especial, no matiz educacional: “Ocorre o que muitos analistas apontam

como o fenômeno da desresponsabilização do Estado para com a educação e a

escola pública” (CABRAL NETO; SOUZA, 2008, p. 59).

No bojo dessa mesma diretriz de desresponsabilização neoliberal referida

por Cabral Neto e Souza (2008, p. 59), no que diz respeito a prerrogativa da

autonomia no âmbito da gestão escolar pública: “A educação passou a ser vista

como instância na qual era preciso ajustar a gestão ao modelo gerencial [...]”, vemos

por essa diretriz anunciada que a primeira preocupação era melhorar os índices

educacionais, tem em vista o controle da gestão escolar por parte do Estado, numa

lógica estrita de contemplar a performatividade. Como resultado desse processo a

educação oferecida pelas redes públicas torna-se cada vez mais excludente, nessa

condição os gestores públicos estão mais preocupados com o desempenho

apresentado pelos dados estandardizados, que lhes credenciam a receber os

recursos dos programas oferecidos pelas redes, municipal e estadual,

principalmente, federal. A essa dinâmica de gestão escolar atribui-se o nome de

“descentralização”, que, na verdade, é muito mais uma desconcentração de

responsabilidades. Essa tentativa de controle por parte do Estado da gestão pública,

de acordo com Silva (1995, p. 8), funda-se numa diretriz em que:

[...] a proposta de reforma do Estado brasileiro privilegia o controle do mercado através da competitividade e o controle do Estado através de adoção da administração gerencial. Em último lugar aparece o controle social e mesmo assim este será através da participação nos conselhos administrativos das organizações sociais. [...] visto que o neoliberalismo necessita de uma forte intervenção estatal e concentração de poder [...].

Nesse sentido, apresentado esse cenário econômicos e político-

ideológico que permeou a realidade brasileira, a partir de meados da década de

1990, caracterizado pelo movimento hegemônico de origem neoliberal e contra-

hegemônico de cunho popular-democrático oriundo na classe trabalhadora, é nesse

contexto dicotômico, em que ocorreram retrocessos e avanços na concepção e nas

práticas que buscam consolidar a democratização educação pública estatal como

qualidade social para todos no Brasil, é a luz dessas circunstâncias que

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discutiremos, a seguir, os marcos legais que orientam as políticas educacionais até

a contemporaneidade, dentro os quais destacaremos a Constituição Federal de

1988 (CF 88) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB/96).

2 A LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL BRASILEIRA COMO INSTRUMENTO DE

DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO ESCOLAR PÚBLICA

O primeiro marco institucional que definiu acena a democratização da

gestão educacional, no que diz período histórico que estudamos, foi o art. 208 da

CF-88, que institui os princípios de: “VI - gestão democrática do ensino público, na

forma da lei; [...] VII - garantia de padrão de qualidade” (BRASIL, 1988), esses

fundamentos referidos nos incisos VI e VII da CF-88 devem nortear a

democratização da gestão nas escolas públicas e buscar a melhoria da qualidade da

educação do Brasil, conforme define o segundo inciso. Essa condição estatuída na

CF-88, não se deu circunstancialmente, exclusivamente por uma decisão política

dos cidadãos nacionais, isso porque, paralelamente, no contexto mundial os

organismos multilaterais e governos internacionais, também, buscavam ampliar as

reformas educacionais, quanto a este fato Cabral Neto e Souza (2008, p.61),

afirmam que:

Algumas análises foram feitas pelos governos sobre os sistemas educacionais, as quais avaliaram os sistemas educativos nacionais como improdutivos e ineficientes, haja vista o sistema capitalista da sociedade e as exigências na ordem da competitividade, e ainda como respaldo de tais exigências externas que caracterizou com o monitoramento externo dessas políticas, efetuado por organismos multilaterais, notadamente o Banco Mundial e a CEPAL [...].

Um dos princípios norteadores da LDB/96 é promover a gestão

democrática, tendo como objetivo a autonomia e a participação da comunidade

escolar (pais, alunos, professores e demais funcionários públicos) na deliberação

dos aspectos administrativo-financeiros, políticos e pedagógicas relativos a gestão

escolar. A saber, de acordo com a LDB/96 em seu artigo 14:

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I – participação dos profissionais na elaboração do projeto político pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes (BRASIL, 1996).

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Tendo por base as diretrizes previstas no Art. 14, referido acima, e,

observando o disposto no art. 3º, inciso VIII da LDB/96, que institui o princípio

fundante da: “Gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da

legislação dos sistemas de ensino” (BRASIL, 1996), com essa definição referida no

artigo citado supracitado, o legislador aponta que o ensino público oferecido pelos

entes federados deve preservar o princípio da gestão democrática e por meio de sua

legislação complementar regulamentar em suas respectivas redes de ensinos os

fundamento da gestão democrática, embora seja importante considerar que a Lei

atribui autonomia aos estados e municípios para definir os critérios e os graus de

implementação dessa gestão democrática, num detalhamento realizado por meio de

leis ordinárias próprias.

Um outro movimento que influenciou no ordenamento jurídico nacional no

sentido de sistematizar a gestão democrática, foram as conferências municipais e

estaduais de educação realizadas em 2009, essas reuniões foram preparatórias

para a Conferência Nacional de Educação (CONAE/2010), nessas reuniões

abordou-se a necessidade de construir um sistema nacional articulado de educação

que tivesse como objetivo principal ampliar o acesso a escolarização, em todos os

níveis e modalidade; melhorar a qualidade da educação pública; assegurar

permanência na escola; o respeito das diversidades – raça, credo, gênero, dentre

outras – e democratizar a gestão pública. O documento final da CONAE/2010,

realizada em Brasília,DF, no período de 28 de março a 1º de abriu, definiu as ações

a serem desenvolvidas no EIXO II como: Qualidade da Educação, Gestão

Democrática e Avaliação.

Como resultado da CONAE/2010, o governo envia para o Congresso

Nacional um Projeto de Lei 8.035/2010, propondo a elaboração e discussão do novo

plano nacional de educação, esse PL (Projeto de Lei) vai transformar-se na Lei

13.005/2014, que institucionaliza o PNE 2014/2024. Esse PNE (Plano Nacional de

Educação) constituir-se numa política de planejamento educacional para o decênio,

que busca construir e consolidar o sistema nacional de educação e melhor a

qualidade da educação pública nacional. Suas metas visam melhorar o atendimento

e qualidade dos níveis educacionais (Educação Básica e Superior) e das

modalidades de ensino (Educação Especial, EJA - Educação de Jovens e Adultos,

Educação Profissional e Tecnológica, Educação Escolar Indígena, a Educação

Básico do Campo, dentre outras), prevendo, ainda, metas que melhorem, o

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processo de formação inicial e continuada e a carreira/remuneração dos

profissionais da educação. No referente a ampliação do financiamento pública

nacional da educação, PNE prevê:

Ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto (PIB) do país no 5º (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio (PNE, Meta 20).

Sendo o PNE o planejamento educacional nacional, é preciso que haja

articulação entre a União, os estados e os municípios de modo a garantir que cada

ente federado possa trabalhar de acordo com sua realidade e com os recursos

necessários para atender suas demandas e responsabilidades de financiamento

Educacional. A criação do Sistema Nacional de Educação (SNE) e da Lei de

Responsabilidade Educacional (LER), são medidas que caso fossem

instrumentalizadas legalmente poderiam disponibilizar recursos extras para viabilizar

o percentual de financiamento do PIB previsto no PNE. Para que aconteça o

Governos federal, os governos estaduais e municipais, devem trabalhar

conjuntamente, abandonado as práticas políticas patrimonialistas e adotando uma

lógica da política de Estado, pois a descentralização de poderes poderia fazer com

que os entes federados tivessem autonomia para elaborar planos educacionais de

acordo com sua realidade e com recursos que garantissem sua manutenção. Para

Lima (2012, p. 13): “Então, PNE deve demarcar a unidade do sistema, definir as

competências dos entes federados, as formas administrativas e a vinculação de

recursos”.

Além dos aspectos já elencados, o PNE prevê na meta 19, que deve-se:

Garantir, mediante lei específica aprovada no âmbito dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, a nomeação comissionada de diretores de escola vinculada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à participação da comunidade escolar (BRASIL, 2013, grifo meu).

Portanto, a meta 19 antever a possibilidade de nomear diretores

escolares utilizando como parâmetro a avaliação de desempenho, logo, percebemos

de forma subliminar a lógica da gestão pública delineada a luz dos conceitos da

performatividade. Por isso, devemos lutar nos fóruns adequados que essa

nomeação ocorra diretamente pela participação da comunidade por meio da escolha

direta.

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Logo, a implantação e implementação do processo de gestão democrática

na escola pública, prevista na legislação educacional referida, pode assumir

diretrizes ideológica e pragmáticas do neoliberalismo, ou da concepção democrático-

participativa, ambos os encaminhamentos, fazem um discurso que defende a

adoção dos princípios da autonomia, da participação e da descentralização na

instauração das reformas educacionais entre os idos dos anos 1980/90 e 2000,

mesmo que, no processo de materialização esses fundamentos de democratização

vão adaptar-se as intenções e as mediações diferenciadas dos dois modelos

(neoliberal e democrático-participativo). Face a esse contexto inicia-se o processo

de criação e desenvolvimento dos conselhos escolares e de classe; das unidades

executoras de recursos (caixas escolares); dos grêmios estudantis e dos projetos

político-pedagógicos nas instituições escolares públicas.

3 AS CATEGORIAS DE AUTONOMIA, PARTICIPAÇÃO E DA

DESCENTRALIZAÇÃO FAZENDO A MEDIAÇÃO ENTRE A LEGISLAÇÃO E

DEMOCRATIZAÇÃO DA ESCOLA PÚBLICA

Diante da caracterização legal realizada no item anterior, que apresenta a

necessidade de institucionalização política e legal da gestão democrática, e suas

implicações na conjuntura da sociedade capitalista contemporânea, torna-se

importante discutir as categorias constituintes dessa gestão democrática. Para que

se concretize as premissas previstas na legislação referida, isto é, para que ocorra a

democratização da gestão escolar pública, em consonância com as diretrizes a que

tece a organização escolar, nos termos legais da CF/88 e da LDB/96, é necessário

que se advogue a necessidade de desenvolver, na instituição escolar pública, os

princípios da autonomia e da participação, que passam a ser guias de atuação

democrática quando do processo de atuação dos sujeitos envolvidos na dinâmica

educativa, seja direta ou indiretamente. Cabe, também, nesse guia político de

atuação na escola democrática o uso de práticas descentralizadas de decisão,

nesse contexto, o diretor deixa de ser o único responsável pela gestão e entra em

ação a equipe gestora, que deveria ser eleita diretamente pela comunidade, como

forma ativa de participação política, fortalecendo assim, o exercício da democracia

na escola.

Conferindo dessa forma uma autonomia que, “significa conferir poder e

condições concretas para que ela alcance objetivos educacionais articulados com os

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interesses da comunidade” (PARO, 2011 apud NEGRINI). Nessa condição que

transfere poder a comunidade, a instituição escolar é composta por indivíduos, cujos

interesses são coletivos, faz-se necessário, então, que os atores sociais possam

partir de suas próprias individualidades, para assim compor um quadro de pessoas

com posições democráticas que executam e decidem as atividades escolares,

inclusive, tendo como ponto de partida a liberdade para deliberar, ou seja, construir

um espaço propicio para desempenhar as ações administrativas e pedagógicas

livremente, num contexto escolar de democratização da gestão.

Portanto, a autonomia requer ainda mais a necessidade de uma política

de gestão que possa desenvolver-se no âmbito local, em que os sujeitos envolvidos

na escola e em sua realidade possam demandar quaisquer funções do coletivo,

esses mesmos sujeitos constroem e descontroem a trajetória dentro da escola. Isso

não quer dizer que a gestão da escola deva estar totalmente desvinculada dos

órgãos estatais, que são responsáveis por assegurar o funcionamento das escolas,

por meio da ação supletiva, no que diz respeito ao suporte técnico, financeiro e de

funcionamento legal de cada instituição.

Referimo-nos aqui a um aspecto necessário, que nem sempre existe, ou

quase nunca ocorre, a autonomia na escola do ponto de vista de desenvolvimento e

gestão das atividades educativas. Essa autonomia é uma prática que resulta na

construção da identidade da instituição e resulta no discernimento de quais decisões

tomar frente a uma dada realidade, que, geralmente, apresenta particularidades e

demandas especificas, que devem ser incorporadas ou não. A respeito desse fato,

Cabral Neto e Souza (2008, p. 70) assinalam que: “A autonomia da escola é um

suporte necessário para que possa ocorrer uma efetiva democratização da gestão

da educação e da escola”.

Logo, embora o princípio de autonomia da escola seja discutido desde a

década de 1930, pelos intelectuais que criaram o Movimento dos Educadores da

Escola, foi apenas no: “[...] contexto da Reforma do Estado [1990] que a autonomia

da escola foi assumida como uma diretriz de política educacional” (CABRAL NETO;

SOUZA, p. 61).

Discutindo, ainda, como deve-se caracterizar o funcionamento de uma

gestão mais participativa, que possa, na medida do possível, se aproximar do

formato democrático, é um preceito necessário que a participação fique conectada a

autonomia. E aqui se entende a participação como uma atuação prática que envolve

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a relação entre a unidade e o sistema de ensino, isto é, o custeio do Estado, ao qual

depende a autonomia da escola e o seu funcionamento. Para que a participação não

perca seu significado e a conexão com a proposta da autonomia na escola, a

participação que gera a autonomia dentro da escola não deve ser confundida com a

independência, ou até mesmo, a soberania absoluta por parte do sistema.

Portanto, Santos (2011, p. 47-48), ao discutir a gestão democrática na

escola, a luz da preservação dos princípios da participação e da autonomia,

inclusive, discorrendo quais seriam os rebatimentos desses fundamentos no

processo de organização pedagógica, o Autor afirma que:

A gestão da escola, para se constituir a partir do fundamento democrático, deve ter como princípios básicos: participação e autonomia, Pedagogicamente, esse processo exige que a escola se arme de instrumentos que visem garantir esses princípios e se voltem para a especificidade dos objetivos da escola: garantir o processo de formação cidadã, que envolve não apenas o conhecimento e a aprendizagem de conteúdos pré-determinados, e está pautado numa determinada concepção de homem que se quer formar.

Nesse sentido, Santos (2011) propõe que a gestão participativa, inclua

nos processos decisórios da escola os representantes de todos os atores sociais

presentes no processo educativo. Devendo assegurar a participação de pais, alunos,

funcionários e toda a comunidade escolar, por meio do conselho escolar, do grêmio

estudantil, do projeto político-pedagógico e o desenvolvimento de relações de

trabalho coletivo com a equipe gestora.

Tal concepção de gestão participativa, deve ser efetivada na escola

pública, de modo a garantir uma educação de qualidade, por meio de ações mais

integradas num processo compartilhado de gestão, em que a escola atua em

consonância com as diretrizes dos entes federados – União, estados e municípios –

de forma a garantir o direito à educação na faixa etária adequada ao estudante.

A escola, por sua vez, tem o papel de formar cidadãos políticos e

reflexivos, principalmente, nessa conjuntura de uma sociedade capitalista e

globalizada, que visa na maioria das vezes os interesses políticos e econômicos de

uma minoria centralizadora. Assim, o papel da escola não deve ser apenas o de

ensinar, de transmitir conteúdos, voltada, exclusivamente, para sistematização da

produção técnico-cientifica do conhecimento. Nesse sentido, a gestão assume a

função primordial de propiciar a participação dos atores educacionais e democratizar

a escola pública, tornando-se num espaço de participação coletiva dos entes sociais

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e de autonomia, administrativa e pedagógica, na deliberação das decisões. Um

ambiente em que toda a comunidade escolar, não somente os indivíduos envolvidos

na gestão, possam desenvolver uma formação política cidadã, voltada para os

interesses de todos os sujeitos envolvidos na consecução de uma educação pública,

gratuita e de qualidade social.

Tendo realizado a análise sobre a importância e a influência da autonomia

e da participação na construção da gestão escolar democrática, havia necessidade

de focar as discussões finais em uma das dimensões contempladas na reforma

educacional da década de 1990, a dimensão escolhida foi a pedagógica, de forma

especial, discorrermos sobre a contribuição do projeto político-pedagógico para

democratização das decisões de cunho pedagógico na escola pública

contemporânea.

4 A DIMENSÃO DA PARTICIPAÇÃO E DA AUTONOMIA PEDAGÓGICA DA

GESTÃO DEMOCRÁTICA: O PROJETO-POLÍTICO PEDAGÓGICO

Em se tratando de uma política de democratização da gestão escolar, e

mais especificamente, no âmbito da escola pública, destaca-se o importante papel

do Projeto Político Pedagógico, como instrumento construído coletivamente,

contando com a participação do corpo docente da escola, representação dos alunos,

pais e equipe escolar como um todo. Para a sua construção, faz-se necessário que

Cada escola deva ter autonomia para elaborar seu próprio projeto institucional e pedagógico, visando a melhoria da qualidade com equidade. O papel das instancias centrais deve ser o de estabelecer diretrizes mínimas, flexíveis e alternativas, de avaliar os resultados e de desregulamentar as exigências formais (VIEIRA apud GOMES; AMARAL DOMINGOS SOBRINHO, 2001 p. 136).

No contexto mais atual da educação no Brasil, o processo de gestão na

maioria das escolas, apontam também o distanciamento das pessoas em relação à

participação das atividades nas escolas, bem como a dificuldade imposta pelos

gestores no acesso as informações da escola por meio do Projeto Político

Pedagógico que por vezes não está na escola ou que não existe e na maioria dos

casos “está em construção” ou “sendo digitado”, isso é apresentado como um dos

fatores para o afastamento da comunidade nas decisões da escola, ainda que seja

necessário que tal documento e marco educacional da escola, esteja

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constantemente em construção e reconstrução. Assim, de acordo com Santos

(2011, p. 52):

Tal contexto está marcado por visões de mundo, de homem, de história, ou seja, por um referencial normativo que ampara e conduz as ações humanas e que estão balizados nos valores, costumes e ideias. Tais valores e ideias vão iluminar as práticas, as decisões, e, a nosso ver, devem se amparar numa perspectiva comprometida com o bem comum da humanidade.

Caracterizando então a legitimidade e eficácia de tal diretriz a que o PPP

se destina, em consonância com as leis e diretrizes nacionais, em especial, a

individualidade e o contexto em que cada instituição escolar encontra-se inserida e

contextualizada, compondo então características próprias dos sujeitos envolvidos

naquele contexto educacional, tais como: que tipo de sociedade se encontra ali e

qual o foco do ensino, currículo e objetivos a serem alcançados naquela realidade

estudada e delimitada no documento base de toda e qualquer escola, seu projeto

político pedagógico.

Tal documento norteador de toda e qualquer prática pedagógica, e

instrumento importante para que se construa a autonomia e a participação na escola

nas dimensões pedagógica, financeira e administrativa. No PPP estão expostos,

pensados e descritos o jeito de ensinar, suas bases teóricas da realidade

contextualizado como uma forma de conceber o ensino naquele contexto, devendo

sempre abrir-se a novas adaptações e adequações que são oriundas de uma

realidade de escola, em que as transformações e os sujeitos envolvidos no processo

de ensino aprendizagem são passíveis de mudanças e novas formas de pensar e

agir.

Para complementar a sua importância e funcionalidade, afirma Cavagnari

apud Melo e Souza (2008, p. 56) que “é esse projeto o elemento balizador da

autonomia administrativa, pedagógica, financeira e jurídica; é o instrumento que

orienta e possibilita operacionalizar a autonomia da escola”, justificando assim a

relevância a que se dá anteriormente a construção da autonomia no contexto

educacional escolar, em todos os seus aspectos, já mencionados anteriormente.

Mesmo que “dependa” do sistema nacional, o PPP continua a ser um marco dentro

do processo de democratização da gestão, dentro e fora da sala de aula, na escola

ou no contexto mais amplo da educação, compreendendo então como ferramenta

que está intimamente associada aos aspectos constitutivos da gestão democrática,

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a participação e autonomia e como resultado a descentralização do poder

centralizador de uma única instância.

Embora esteja em processo constante de construção, adaptação e

elaboração, até o ponto em que se chegou, como é sabido que ocorre na maior

parte das escolas e realidades já observadas, ainda assim, o PPP “sinaliza que

foram dados passos em direção à conquista da autonomia escolar, uma vez que

traduz um assumir de responsabilidades por parte dos atores que atuam na escola”

(VEIGA apud MELO; SOUZA, p. 78).

5 A PRÁXIS DE DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO PEDAGÓGICA NA ESCOLA

PÚBLICA: ALGUNS APONTAMENTOS PARA DISCUSSÃO

Dando continuidade as relações já feitas anteriormente em relação a

discussão histórica e a constituição da gestão democrática, e em consonância com

as bases legais que orientam tal forma de sistematizar e gerir o ensino na escola

pública, é que abordaremos a seguir o relato de uma experiência dentro de uma

unidade escolar, notadamente, em uma experiência na área de gestão e

coordenação pedagógica. Nessa atividade tive condições de analisar, à luz da

observação e diálogo, a rotina de uma equipe gestora escola da rede estadual, em

que o PPP é apresentado como um instrumento de gestão democrática.

A experiência trata de um trabalho realizado durante o estágio realizado

na área de gestão e coordenação pedagógica numa escola pública, nos turnos

matutino e vespertino, em função das possibilidades temporais da equipe

administrativo-pedagógica da escola. A orientação e supervisão do estágio na

escola foi de responsabilidade da coordenadora da instituição, na pessoa da Sra.

Dalva Maria de Queiroz, o campo da pesquisa foi a Escola Estadual Cônego Monte,

que dispõe, de acordo com o Projeto Político Pedagógico da referida escola, uma

gestão democrática.

O PPP da Escola E.E Cônego Monte, no item dos princípios reguladores,

afirme que a escola desenvolve uma gestão democrática: “[...] ampla e que conta

com a participação dos diferentes segmentos da escola, nas decisões, dando-nos a

liberdade para aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o saber sistematizado,

fazendo parte das decisões a valorização do magistério e formação continuada dos

professores ” (PPP da Escola E.E Cônego Monte).

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Na experiência a ser relatada o enfoque estava na análise da gestão e no

andamento das atividades administrativas e pedagógicas realizadas na escola,

nesse intento, percebermos que a falta de planejamento estava sendo um fator de

risco para que fossem tomadas medidas corretivas em relação a organização e

estruturação do trabalho da equipe gestora, e mais ainda, no processo de trabalho

em toda a escola.

Caracterizando, a Escola Estadual Cônego Monte tem sua origem no

Centro Social Cônego Monte desde o ano de 1946. É um prédio de construção

antiga, pertence à Arquidiocese de Natal, sob a administração das Irmãs da

Congregação das Filhas do Amor Divino.

Situada na Avenida Bernardo Vieira, n° 130, bairro de Lagoa Nova,

Natal/RN. O referido bairro tem alta densidade demográfica e vem passando por

grandes transformações no seu aspecto urbano. Atualmente prevalecem as

atividades comerciais, muitos edifícios e a população mais carente mora nas

mediações da escola.

Durante alguns anos de sua existência, tinha como objetivo o trabalho

social, pois àquela comunidade era muito pobre. Com as mudanças sociais e

demográficas do bairro, o centro social passou a funcionar como escola do Ensino

Infantil e Fundamental I.

Em 1976, o Centro Social Cônego Monte, como era denominado, através

do Decreto nº 472/76 e autorizado pela portaria nº 472/80 / SECD/GS de

22/08/1980, passou a funcionar como Escola do Ensino Fundamental.

Após esse período, a escola funcionou como conveniada ao Estado.

Passando por várias dificuldades, principalmente com relação ao convênio, foi que

em 1998, por meio de uma assembleia com os funcionários da escola, que decidiu-

se optar pela estadualização da escola. O Decreto que aprovou a Estadualização é

o Decreto de n° 14.456 de 22/06/1999, conforme publicação feita no Diário oficial n°

9.531 de 23 de junho do mesmo ano.

Atualmente a escola conta com um número de 238 alunos, distribuídos

nos turnos matutino e vespertino do ensino fundamental I, organizado do 1° ao 5°

ano. Para atender a necessidade de inclusão na escola, algumas salas de aulas

contam com um número de 16 a 20 alunos por sala. Nos dois turnos, em todas as

salas de aulas há de um a dois alunos com necessidades especiais (DA -

Deficiência Auditiva, DV - Deficiência Visual e DM - Deficiência Mental). Em seu

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espaço físico, a escola conta com 05 salas de aula, uma direção, recepção, sala de

professores, sala de multimídia, sala de som, 01pátio aberto, 01 pátio coberto, 01

quadra pequena e aberta, banheiros masculino e feminino (para os alunos), 01

banheiro para professores, 01 cozinha, 01 secretaria, 01 sala de coordenação, 01

depósito.

Partindo do pressuposto de que a escola pública vem nos últimos anos,

tornando-se uma instituição em que o nível de qualidade necessita de um avanço

maior, isso ocorre pelo fato da escola já ter sido uma referência de qualidade na

comunidade, em especial, por ter sido administrada pelas Irmãs Filhas do Amor

Divino, uma instituição de reconhecida idoneidade que já tentava combater esse

grau de descrédito em relação ao trabalho desenvolvido. Esse fato do descredito

pode ter ocorrido após o processo de estadualização, pois a escola ficou por um

longo período sem receber assistência por parte da Secretaria de Educação,

condição que causou desconforto para os pais, em função do potencial decréscimo

da qualidade do ensino, contudo, esse fato foi logo sanado.

Hoje, o Cônego Monte continua sendo uma escola mesmo estadual, mais

procurada pelos pais do próprio bairro e de outros da cidade do Natal. A clientela

escolar é predominante do bairro, no qual a escola se situa (Alecrim, Zona Sul), mas

há alunos também da Zona Norte. Alguns pais afirmam que não podem colocar seu

filho numa escola particular e optaram por esta escola, por ter uma boa qualidade no

ensino-aprendizagem, como também em relação à disciplina.

Na busca de novas ações e reformulações da educação dos dias atuais,

esta Escola quer oferecer um ensino de qualidade, garantindo o acesso e a

permanência do aluno na escola, como ser participativo e consciente dos seus

direitos e responsabilidades, em um ambiente propício as inovações do contexto das

novas contribuições da ciência e da tecnologia, fortalecendo um ensino de qualidade

que brote da vida e da justiça social.

A equipe administrativa e pedagógica da escola é composta das

seguintes funções com seus respectivos responsáveis: Diretora: Maria Alves

Saraiva;

Vice-diretora: Maria Aparecida Diniz; Coordenadoras Pedagógicas: Turno

matutino: Jacqueline Gurgel de Araújo; Turno vespertino: Dalva Maria de Queiroz e

Coordenadora Administrativo-Financeiro: Vanja Barros Pereira.

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Os recursos financeiros são provenientes do FNDE, por meio do Caixa

Escolar, que foi eleito recentemente para o biênio 2015/2016. Temos o PENAE –

Programa Nacional de Merenda na Escola, o PAGUE – Programa de

Autogerenciamento da Escola, o PPDE – Programa Dinheiro Direto na Escola e o

PDE – Programa de Desenvolvimento da Escola. Todos estes recursos são

repassados para a escola uma vez por ano através do Caixa Escolar. Portanto se

faz necessário que a escola saiba administrar bem estes recursos, para que durante

todo o ano não venha faltar material.

A Equipe Técnico-Administrativa-Pedagógica da escola é composta por

04 profissionais. São elas: Maria Alves Saraiva (Diretora da Escola), graduada em

Pedagogia, com especificidade em Administração e supervisão; Maria Aparecida

Diniz (Vice-Diretora), com Curso Lato Sensu em Educação Especial; Jacqueline

Gurgel de Araújo (Coordenadora Pedagógica), com Curso Lato Sensu em

Psicopedagogia; Dalva Maria de Queiroz (Coordenadora Pedagógica), com Curso

Stricto Sensu em Ciências da educação e Vanja Barros Pereira (Coordenadora

Administrativo-Financeiro), com Curso Superior de Gerência Empresarial. Como se

pode perceber existem cargos de direção, vice-direção, coordenação pedagógica e

administrativa.

Com relação às metodologias adotadas na escola é possível identificar

que a mesma aborda os conteúdos dos diferentes componentes curriculares numa

diretriz didático-pedagógica interdisciplinar, no qual a leitura e a escrita assumem a

responsabilidade de capitanear as ações de todas as áreas de conhecimento, essa

condição, inclusive, reflete na definição das regras e normas previstas no estágio

supervisionado, desde que, esteja em consonância com a legislação vigente.

Nesse sentido, a Escola Estadual Cônego Monte descreve a exploração

de diferentes modalidades organizativas para abordagem dos conteúdos (como

projetos, atividades sequenciadas, permanentes e ocasionais) que vão se

articulando ao longo do ano letivo, conforme a necessidade de organização da

rotina, buscando informar quando e como é realizado o planejamento das aulas, dos

projetos e de todas as ações que fazem parte da prática educativa. E para que haja

a organização curricular, programas e projetos desenvolvidos na escola, bem como

a descrição de objetivos, carga horária, tempo, espaços, atividades, materiais

didáticos e pedagógicos.

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Além do que está proposto no Projeto Político Pedagógico da escola, é

possível destacar que as metodologias utilizadas no desempenho das atividades da

coordenação, esta baseia-se em acompanhar, auxiliar e intervir nos planejamentos

dos professores, procurando resoluções e elaboração do desempenho escolar do

aluno, dentro e fora da sala de aula. O que nos indica Domingues (2014, p. 68),

quando relata a importância do papel do coordenador pedagógico pela,

[...] difícil tarefa de auxiliar o professor no desenvolvimento do trabalho pedagógico de modo a contribuir com a melhoria da qualidade do ensino, construindo e administração situações de aprendizagem adequadas às necessidades educacionais dos alunos, por meio da reflexão e da investigação.

Os referenciais teóricos-metodológicos presentes na atuação da

coordenadora, baseado na gestão democrática, toma ainda como referência os

documentos oficiais dos órgãos educacionais e diretrizes gerais da educação,

direcionando assim, um caminho para uma coordenação em que propicie direitos de

aprendizagem e qualidade. Nesse sentido, destaca a coordenação da escola que

mantém uma boa comunicação com os professores.

Durante a realização do diagnóstico foi possível perceber várias

necessidades de formação de professores e gestão, como a necessidade de uma

gestão democrática, pois, apesar da escola ser pertencente a uma rede ensino

estadual pública, é gestada por uma líder religiosa, (podendo ser perceptível a falta

de prática democrática), que se encontra na gestão da escola há mais de uma

década.

Esse recorte da realidade escolar vivida nessa comunidade nos faz

refletir que mesmo utilizando de algumas ferramentas, documentos e

institucionalizando órgãos ditos democráticos, como conselho escolar, o processo de

democratização da escola ainda está longe de se consolidar, de se tornar algo

cultural, e deixar de ser realizados certos atos ditos democráticos para cumprimento

legal, utilizado apenas para preencher requisitos necessários na aquisição e

andamento de projetos, verbas e materiais, o que não os tornam democráticos.

Essa realidade vai contra todos os documentos de leis direcionados à

educação, os quais são fundamentados pelo princípio basilar democrático os quais

defendem a autonomia, participação de todos e construção de decisões

compartilhadas e críticas.

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A falta de prática verdadeiramente democrática e com tantos outros

problemas enfrentados pela escola, o que é condizente e próprio do “chão escolar”,

pois é uma instituição viva, inserida e constituída por todos os problemas vividos

pela sociedade, não está isolada, porém, cabe aos devidos responsáveis,

profissionais e órgãos educacionais públicos, tomar providencias, procurar

solucionar os problemas para que seja alcançado um dos objetivos da escola, que é

proporcionar uma educação de qualidade para todos a partir de uma formação

crítica de cidadãos.

Mesmo com tudo isso, escolhemos o planejamento, pois entendemos que

é o princípio para uma educação de qualidade, é pensar em solucionar esses

problemas, ao nosso entendimento o ato de planejar vai além de escrever em um

papel a lista de conteúdos que serão dados durante um semestre ou ano, para isso,

nos apoiamos no seguinte entendimento de Vasconcelos sobre planejamento:

[...] quando falamos em processo de ensino e aprendizagem, estamos falando de algo muito sério, que precisa ser planejado, com qualidade e intencionalidade. Planejar é antecipar ações para atingir certos objetivos, que vêm de necessidades criadas por uma determinada realidade, e, sobretudo, agir de acordo com essas ideias antecipadas (VASCONCELOS, 2009, p. 26).

Os profissionais da educação, por sua vez, precisam compreender e

praticar o planejamento como algo fundamental ao ensino, como algo fundamental

para o sucesso da escola, praticar o planejamento como que ele é realmente, se não

se tem objetivos traçados como vamos esperar qualidade ou um bom sucesso de

aprendizagem dos alunos e desenvolvimento da escola como um todo ou avaliar e

readequar as ações para melhorias.

O ato de planejar está totalmente ligado à educação/formação

continuada, pois parte de aprendizados e estudos contínuos, que está totalmente

contrário ao comodismo do cotidiano. Por meio de observações conseguimos

perceber que os profissionais estão imersos em um cotidiano em que acreditam não

precisar mais planejar, pois já estão fazendo o “mesmo” trabalho há bastante tempo,

já “sabem o que fazer”, acreditam que ser usar o tempo para planejamento, por

terem o planejamento apenas como uma tarefa de transcrever o que já faz para um

papel ou utilizam um que já tenham pronto há bastante tempo.

O ato de planejar é visto pelos professores como uma atividade técnica e

desnecessária, isso se dá pela maneira a qual esse planejamento é direcionado e

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realizado por esses profissionais. A falta da ação, movimento, envolvimento e

transformações dos resultados somados aos outros fatores aqui citados, é que

fazem com que os levem a deixar essa prática de lado, e não a deem a devida

importância.

Diante de toda essa realidade sobre como é tratado o planejar na Escola

Cônego Monte, resolvemos desenvolver um trabalho de intervenção o qual os

professores e demais profissionais da educação na escola tivessem uma nova visão

sobre o ato de planejar e servisse de estímulo para que desenvolvessem estudos e

novas práticas, como também, para lembrá-los dos seus direitos adquiridos em por

meio da Lei do Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do magistério

público da educação básica (PSPN), a qual designa que “[...] o limite máximo de 2/3

(dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com

os educandos.” (BRASIL, 2008), ou seja, 1/3 (um terço) seria para a chamada

“atividades extraclasse”, que é utilizada em sua maioria para o planejamento das

aulas, os professores têm direitos e devem lutar para que eles não sejam violados.

Assim, todo o planejamento foi desenvolvido para que em uma palestrada

ministrada por nós, alunas de estágio do curso de pedagogia, a qual seria passado

para os professores como texto base “Por que planejar? Como Planejar? Currículo,

área, aula”, de Menegolla e Sant‟Ana, seria feita uma leitura compartilhada, pois se

trata de um texto curto, mas que situaria bem os professores à importância de

planejar, em seguida passaríamos os slides produzidos juntamente com parte dos

vídeos “O planejamento na prática pedagógica – Educação” e “Planejamento: níveis,

tipos e funções”, destacaríamos as partes as quais consideramos mais eficazes com

o que se está sendo discutido durante a palestra. Objetivando que com isso fosse

alcançado um olhar crítico desses professores ao ato de planejar, como influenciar

em suas práticas futuras, havendo uma valorização e mudança.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da elaboração do presente trabalho, foi possível por meio da

pesquisa e análise de dados relacionados a gestão de cunho democrático, e mais

especificamente, a gestão democrática na escola pública, que muitos são os

desafios a serem vencidos para que realmente ocorra a prática democrática na

gestão escolar. Estudar tal dimensão da educação é lançar um olhar para as

próprias estruturas da escola como um todo e analisar que em todos os seus

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aspectos, a instituição escolar necessita de uma prática mais consciente e coerente

no que diz respeito em como gerir, organizar, ou até mesmo administrar a escola, e

em nosso contexto de análise, pública. Analisando a conjuntura político, econômica

e social onde surge a necessidade de haver uma melhor organização e

sistematização da estrutura gestora, não apenas a escola, mas também a

sociedade, demanda um olhar crítico da realidade para que se possa enxergar a

necessidade de uma autonomia mais consolidada e necessária dentro de qualquer

que seja a estrutura na sociedade, a participação de todos os sujeitos envolvidos em

tal processo, e ainda, a descentralização do poder, de forma que este seja conferido

aos indivíduos que sejam capazes de não apenas gerir apenas uma instituição ou

órgão, mas dá condições para que, nesse caso, (a escola) possa gerar em sua

natureza condições necessárias a uma qualidade de educação e emancipação de

sua estrutura e sujeitos nela envolvidos.

Tomando por base a estrutura de sociedade e porque não dizer a

estrutura na qual o sistema educacional se encontra vinculado, o Estado,

caracterizado aqui como a União e seus entes federados (os estados), nota-se uma

certa interdependência política e econômica da instância maior. Com isso é notória

uma certa dificuldade e até mesmo empecilho para que haja uma verdadeira forma

de gerir democraticamente, pelo fato de que há formas diferentes em que cada

instituição se encontra e mais ainda, necessidades e demandas diferenciadas

embora estas sejam em alguns momentos muito parecidas ou até mesmo idênticas

– do ponto de vista de suas demandas. E é justamente nesse cenário que surge

também o forte aspecto da participação, como uma forma em que todos os sujeitos

envolvidos em tal processo democrático ou ainda não, que possam pensar, planejar

e articular a organização da escola de modo a levar em consideração a coletividade,

tendo em vista a realidade escolar como tal. Daí desdobra-se então um outro fator

essencial dentro da gestão e fora dela, nos demais ambientes escolares, uma

demanda de que os profissionais possam fazer com que os processos educacionais

e administrativos possam ser integrados a participação e consciência de que sua

atuação pode e deve promover a organização em prol da coletividade e atuação de

todos os sujeitos envolvidos no processo educacional, não penas a equipe gestora,

pois quando isso acontece, os resultados fogem e muito do ponto de partida

democrático para a condição centralizadora de gestão e organização.

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O presente trabalho ainda é revelador de questões que ultrapassam os

“limites” da gestão, propriamente dita, que extrapolam o papel do gestor, mas que

ainda assim, estão imersos no contexto escolar como um todo: a falta de

planejamento escolar e até mesmo as péssimas condições para que esta ferramenta

possa acontecer de fato e que seja uma política de organização e estruturação por

parte da gestão.

Estudar, analisar e aprofundar a respeito de uma gestão, é entender os

desdobramentos de uma sociedade desigual, em que se sobrepõe os interesses de

uma sociedade capitalista e centralizadora, capaz de reduzir o papel da escola ao

seu papel elementar: “ensinar a ler, escrever e contar”. O papel da escola por sua

vez, não se restringe apenas a isso, pelo simples fato de que é na escola que se

aprende a pensar socialmente, entender sobre a construção política e econômica de

uma sociedade, repensando o modo de agir e de viver de cada sujeito, fazendo com

que o aluno a partir da organização social e da própria organização escolar e seus

desdobramentos possam almejar ou sentirem sujeitos emancipados, estimulados a

serem sujeitos de sua própria realidade. A gestão democrática do ensino é por

assim dizer, uma forma de pensar a sociedade, o sujeito e os fatores que envolvem

a ambos, de forma a transformar e conscientizar partindo de uma política própria de

cada instituição escolar, configurada no PPP, como uma forma de resinificar ao

longo do processo não apenas a forma de aprender, mas de agir e pensar

socialmente, culturalmente e economicamente.

E no contexto atual, o mais recente possível, aprofundar os

conhecimentos sobre como gerir democraticamente a escola e o ensino de uma

forma geral, é pensar em favorecer, ou ao menos entender como deve de fato

ocorrer esse processo emancipador e tão necessário no momento presente como

nação. Pensar democraticamente o contexto escolar, é permitir que alunos,

professores, equipe gestora possam a partir da realidade local da escola, pensar

democraticamente seu próprio espaço e ensino-aprendizagem, a própria sociedade

e a si mesmo, gerando assim condições de mudança e transformação social, frutos

de um trabalho efetivamente coletivo, participativo que não se resume apenas a uma

equipe que tem a responsabilidade de gerir uma instituição de ensino, mas de todo e

qualquer sujeito envolvido e vinculado nesse processo caracterizado por constantes

mudanças, rupturas e transformações; construção e desconstrução.

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AGRADECIMENTOS

“Nenhuma alegria sem um obrigado a Deus” (Madre Francisca Lechner)

Meu desejo de gratidão constante Àquele que sempre esteve ao meu lado

desejando o melhor pra mim: Deus! Obrigada Senhor, por todos os momentos

vividos ao longo desse tempo na Universidade, por ter me amado

incondicionalmente e me feito refletir que em todos os momentos estevas ao meu,

“Tudo posso em Ti, que me fortalece” (Fl 4,13).

Neste momento de ação de graças, todo meu reconhecimento e amor por

meus familiares, pois sem vocês nada disso seria possível! Foram muitos os

momentos vividos juntos, desde o desejo de entrar na universidade até o momento

presente. Com um imenso carinho e muitas saudades, agradeço a vocês, meus

primeiros mestres: Carmelita Júlia de Lima (mãe e vó), Ângela Maria de Lima (mãe)

e João Bosco de Lima (Pai e tio), todos (in memorian), porém por meio das

lembranças e momentos inesquecíveis, guardados no mais profundo do meu ser,

em meu coração.

A todas as minhas irmãs FILHAS DO AMOR DIVINO, em especial,

àquelas que me acolheram, incentivarem e me acompanharam com palavras de

incentivo e orações ao longo dessa caminhada, e ainda porque com elas partilho

minha vida, minha história e meu desejo de servir a Deus neste carisma tão

profundo e especial para mim.

Aos caros, poucos e inesquecíveis amigos, aqueles que também

estiveram ao meu lado, incentivando-me a ser quem sou e até melhor a cada nova

etapa de minha vida. Aos colegas que em tantos momentos de trabalhos, grupos,

provas, confraternizações, eu pude conhecer e socializar a minha vida, com risos,

alegrias e inquietações. Levo um pouco de cada um e vocês comigo.

Aos mestres que a Universidade me proporcionou conhecer e aprender

tantas lições, contextos, disciplinas, saberes que me ajudam e ajudarão a exercer

minha profissão com um olhar crítico-reflexivo de cada realidade. Aqui de um modo

muito especial, agradeço ao meu professor orientador, o professor Gilmar Barbosa

Guedes, que me apresentou de uma forma diferenciada a importância de se estudar

política e que me ajudou com seu empenho e profissionalismo na idealização,

orientação e conclusão desse trabalho.

Àqueles que acreditaram em mim, muito obrigada!

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Artigo de Conclusão de Curso Apresentado e Aprovado no dia 03 de julho de 2017, pela Banca Examinadora:

Prof. Dr. Gilmar Barbosa Guedes (Presidente) – UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Profa. Dra. Rute Regis de Oliveira da Silva (Examinadora) – UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Prof. Ms. Marcos Torres Carneiro (Examinador) – UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte