A CONTRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA O ... · O exame do ordenamento jurídico eleitoral...

22
A CONTRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA O APERFEIÇOAMENTO DA DEMOCRACIA JOSÉ AUGUSTO DELGADO* Juiz do TRF-5ª R, Prof. Dir. Administrativo e Processual Civil, Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário Sumário 1. Evolução histórica da Justiça Eleitoral. Síntese. 2. Características institucionais da Justiça Eleitoral no final do século XX. 3. A entrega da prestação jurisdicional eleitoral de acordo com a reforma defendida pelo Tribunal Superior Eleitoral. 4. Conclusões. 1. Evolução histórica da Justiça Eleitoral. Síntese O exame do ordenamento jurídico eleitoral brasileiro revela que sua formação foi iniciada, na época do Império, com a Lei n8 3.029, de 9.1.1881, à época, cognominada de Lei Saraiva, e operacionalizada por meio de instruções. Com a vigência da Constituição Imperial (25.3.1824), o Ministro dos Negócios do Império recebeu competência para expedir decretos reguladores do procedimento a ser adotado nas eleições gerais no Pais, oportunidade em que foram eleitos os deputados e senadores e os membros dos conselhos gerais das províncias, conselhos esses que, em 1834, se transformaram em assembléias. A12 * Ministro do Superior Tribunal de Justiça desde 1995 e aposentado em 05/06/2008.

Transcript of A CONTRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA O ... · O exame do ordenamento jurídico eleitoral...

A CONTRIBUIÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA O APERFEIÇOAMENTO DA DEMOCRACIA

JOSÉ AUGUSTO DELGADO* Juiz do TRF-5ª R, Prof. Dir. Administrativo e

Processual Civil, Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário

Sumário

1. Evolução histórica da Justiça Eleitoral.

Síntese. 2. Características institucionais da

Justiça Eleitoral no final do século XX. 3. A

entrega da prestação jurisdicional eleitoral

de acordo com a reforma defendida pelo

Tribunal Superior Eleitoral. 4. Conclusões.

1. Evolução histórica da Justiça Eleitoral. Síntese

O exame do ordenamento jurídico eleitoral brasileiro revela

que sua formação foi iniciada, na época do Império, com a Lei n8 3.029,

de 9.1.1881, à época, cognominada de Lei Saraiva, e operacionalizada por

meio de instruções.

Com a vigência da Constituição Imperial (25.3.1824), o

Ministro dos Negócios do Império recebeu competência para expedir

decretos reguladores do procedimento a ser adotado nas eleições gerais

no Pais, oportunidade em que foram eleitos os deputados e senadores e

os membros dos conselhos gerais das províncias, conselhos esses que, em

1834, se transformaram em assembléias.

A12 * Ministro do Superior Tribunal de Justiça desde 1995 e aposentado em 05/06/2008.

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

Anota Roberto Rosas, em trabalho intitulado "Estrutura

Constitucional da Justiça Eleitoral", (in Arq. Minist. Just, Brasília, 45

(179:5-21), jan./jun.1992), que as referidas eleições obedeciam a um

ritual que, conforme descreve, era compatível com a carga imperialista

vivida pela Nação, simbolizada pela autoridade estatal e pela ausência de

qualquer respeito à manifestação popular.

Registra o eminente professor que no dia marcado para as

eleições, uma assembléia eleitoral era constituída em cada freguesia

imperial, assembléia essa que era presidida pelo Juiz de fora ou ordinário

da cidade ou vila a que a freguesia pertencesse, sem se dispensar a

assistência do pároco. O povo era convocado a comparecer às eleições e

se obedecia ao ritual que assim descreve:

No dia marcado para a eleição, o povo na igreja matriz ouviria missa, e a seguir era colocada uma mesa no corpo da igreja, ocupada pelo presidente e o pároco, juntamente com dois secretários e dois escrutinadores. O presidente perguntaria sobre a existência de denúncia de suborno ou conluio, e provado o fato, o acusado perderia o direito ativo e passivo do voto. Entregues todos os votos, estes seriam lidos, e proclamando o resultado em voz alta, eram resolvidas as dúvidas surgidas. Aos eleitos, o Secretário da Mesa faria aviso por carta, e extrairia cópia do livro que serviria de diploma.

Palhares Moreira Reis complementa o registro de Roberto

Rosas, explicando que:

Desde o Império que a verificação dos resultados eleitorais e o reconhecimento dos eleitos eram atividades próprias das respectivas Câmaras Na verdade, não existiam senão essas eleições, posto que os chefes executivos não saíam de eleição popular: o municipal era o intendente, ou seja, o vereador mais votado; o provincial, um presidente nomeado pela Coroa, e a nível nacional, o imperador, vitalício e hereditário e, mais tarde, o presidente do Conselho de Ministros nomeado pelo Imperante (in "Justiça Eleitoral Cinqüentenária". art. publicado no Diário de Pernambuco de 7.6.95).

2

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

A mencionada forma de apuração, rápida e simples, como se

observa, só se aplicava às eleições dos conselheiros-gerais das províncias,

mais tarde, em 1934, deputados locais.

A eleição dos deputados era apurada pela Câmara da capital,

conforme observa Roberto Rosas, no trabalho acima referido, p. 5.

Uma análise conjuntural do procedimento adotado para as

eleições, na época do Império, não obstante desvinculado, integralmente,

de qualquer fluido de liberdade de escolha, por existir a coerção social em

benefício de determinado candidato, revela, porém, dois aspectos de

profunda aceitabilidade: o primeiro era a preocupação em se combater a

corrupção existente na época e caracterizada pela prática de suborno ou

conluio para viciar as eleições; o segundo era o modo desburocratizado e

rápido como se procedia à tomada de votos e à apuração A constatação

desses dois fatores com caracteres de positividade conduz o analista de

tais fatos a considerar como sendo eles as fontes essenciais do princípio

da moralidade que, hoje, a sua obediência, se constitui, fim maior a ser

alcançado pela Justiça Eleitoral.

Proclamada a República, em 1889, nova ordem jurídica

eleitoral foi implantada no País. Ressalte-se, no referido período, como

documento mais importante, a denominada Lei Rosa e Silva, a de n°

1.269, de 15.11.1904, que se apresentou com a estrutura de um

verdadeiro Código Eleitoral, sem, contudo, avançar para entregar todo o

processo de preparação e realização das eleições ao Poder Judiciário A

filosofia adotada na época do exercício da força estatal, combinada com os

interesses políticos dos representantes dos Poderes Executivo e

Legislativo, continuou a se fazer presente nas eleições do País, com a

produção de episódios que enlutam o referido passado, conforme

registram as páginas da nossa história.

3

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

Entre os ideais inspiradores da Revolução de 30, localiza-se o

da instituição da Justiça Eleitoral, cujo objetivo determinador foi o de

purificar o procedimento eleitoral, evitando as fraudes identificadas no

período antecedente, contribuidoras para a deformação dos mecanismos

de assunção do poder e provocadoras de verticalizadas instabilidades na

estrutura organizacional política da Nação. Foi a partir de tal quadra de

nossa história republicana que se começou o culto à instituição do direito

do sufrágio feminino, da diminuição da idade eleitoral, da valorização do

voto secreto como expressão do atuar da vontade da cidadania e de ser

entregue à Justiça Eleitoral, integrada por juízes com garantias

constitucionais de independência, todas as tarefas relativas ao

procedimento eleitoral, a se iniciar com o alistamento dos eleitores até a

diplomação dos eleitos.

É do referido período, conforme se considera, o nosso primeiro

Código Eleitoral Ele foi resultado da publicação do Decreto n° 21.076, de

24 de fevereiro de 1932.

O sistema adotado pela Revolução de 30 foi ratificado pela

Constituição de 1934, quando, pela primeira vez, se colocou, a nível

constitucional, a Justiça Eleitoral entre os órgãos integrantes do Poder

Judiciário, conforme revela o art. 63, letra d, e arts. 82 e ss. da referida

Carta Magna Merece registro, pelos aspectos históricos e identificadores

dos primeiros movimentos determinadores da contribuição da Justiça

Eleitoral para o aperfeiçoamento das instituições políticas democráticas, o

que a respeito escreveu Mário Guimarães, em sua conhecida obra O Juiz e

a Função Jurisdicional (Forense, Rio, 1958):

"A Justiça Eleitoral, entre nós, teve nascimento com o Código

de 1932. Antes os juízes tomavam parte em vários atos eleitorais, sem

que houvesse, porém, organização especial."

Mais adiante, completou:

4

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

"E foi então que se recorreu à magistratura para conseguir o

que, na época, parecia sonho – a verdade das urnas Criou-se a Justiça

Eleitoral" (pp. 420 a 421 da obra citada).

Os impactos do Estado Novo, com a sua saga ditatorial,

determinaram, por força da Constituição de 1937, a extinção da Justiça

Eleitoral, que só foi soerguida em 1945, com o Decreto n° 7.586, de

28.5.1945. Tais transformações ocorreram pela influência da evolução dos

princípios democráticos que, no referido momento, se desenvolviam na

Europa, que, mesmo em estado de guerra, se encontrava influenciada

pelas idéias dos pregadores do respeito aos direitos dos cidadãos e da

utilização de um regime de governo com participação mais ativa do

administrado.

Há, também, de se considerar que a Lei Constitucional n° 9,

de 28 de fevereiro de 1945, que determinou a realização de eleições

diretas para Presidente da República, representa o marco originário

definidor do restabelecimento da Justiça Eleitoral no País, haja vista que,

em seu art. 49, se afirmava que seriam considerados "eleitos e

habilitados, independentemente de outro reconhecimento, os cidadãos

diplomados pelos órgãos incumbidos de apurar a eleição" (Palhares

Moreira Reis, in artigo já citado)

Instituída, assim, de forma definitiva, em 28.5.1945, pelo

Decreto n° 7.586, foi a Justiça Eleitoral consagrada pela Constituição de

1946, como integrante do Poder Judiciário, conforme registra o art. 94,

VI, da referida Carta. A partir desse momento, a Justiça Eleitoral tem sido

homenageada pelas Cartas Magnas posteriores. A Constituição de 1967 a

consagrou, como Poder, em seu artigo 107, VI, e a atual Constituição

prestigiou a sua posição no arcabouço organizacional diretivo da Nação,

como se observa no art. 92, V, estabelecendo que a sua estruturação

compreende: "o Tribunal Superior Eleitoral, os Tribunais Regionais

Eleitorais, os juízes eleitorais e as Juntas Eleitorais" (art. 118).

5

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

As dificuldades enfrentadas pela Justiça Eleitoral para se

afirmar como uma das formas do Poder Judiciário atuar, em patamar de

independência e ao mesmo tempo preservando a harmonia com os

demais Poderes, o Executivo e o Legislativo, têm merecido, ao lado dos

processos científicos, jurídicos e investigatórios das razões de tais

acontecimentos, a atenção da literatura brasileira. Suficiente lembrar que

em Vila dos Confins, Mário Palmério realça a figura do Juiz Eleitoral,

explorando as aventuras do Dr Braga, quando, em decorrência do

exercício da função do cargo, presidindo uma eleição concorridíssima, ter

sido obrigado a enfrentar violências praticadas pelos candidatos e pelos

eleitores, a resistir pressões e a se posicionar em face de determinados

desafios que surgiam com o fito de impossibilitar o exercício da sua

autoridade.

É conhecido, também, o descrito na obra Coronel, Coronéis,

da autoria de Marcos Vilaça e Roberto C de Albuquerque, a respeito do

drama vivido pelo Juiz António Correia de Araújo para poder se afirmar

como juiz, em Serrita (PE)

A evocação dos fatos históricos da Justiça Eleitoral e a sua

abordagem pela literatura, esta narrando fatos verídicos e fictícios,

mostram a contribuição que os seus juízes têm dado para o

aperfeiçoamento das instituições políticas democráticas e para o aumento

do respeito ao direito da dignidade humana no exercício da liberdade

exercida pelo eleitor, através do voto, quando da escolha dos dirigentes

da Nação, tudo feito com o mais potencializado sacrifício pessoal e familiar

e testemunhado, apenas, pelo trabalho frutificado do silêncio das suas

meditações e da coragem patriótica com que se revestem para o exercício

da função.

6

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

2. As características institucionais da Justiça Eleitoral no final do século XX

Tem se pregado, de mãos unidas e por uma só voz, que a

"essência do Direito está na sua realização prática". Esta máxima,

produzida por Ihering, está insculpida no pensamento e nas ações de

todos os operadores da Ciência Jurídica. Tornando-a efetiva e eficaz,

busca-se, no final deste século, que sejam atuantes todas as entidades

jurídicas e que se voltem para atender às necessidades buscadas pelo

cidadão contemporâneo, que são, em um elenco não exaustivo,

primeiramente, o respeito aos seus direitos de liberdade, de harmonia, de

paz, de preservação de sua saúde, da sua dignidade como pessoa

humana, dos valores sociais, do trabalho e da família cultivados e, em

segundo lugar, o de poder se expressar, politicamente, de acordo com a

sua vontade livre e soberana.

A Justiça Eleitoral, por se encontrar imbuída dos princípios

acima relacionados, busca se aperfeiçoar como instituição constitucional

neste final de século, para que possa, no cumprimento de sua missão,

alcançar o desejo contido no âmago de cada cidadão, o de que possa

merecer a dignidade dela exigida porque a tanto ela alcançou através dos

juízes que a constroem.

Ocorre que a busca desse aperfeiçoamento, e o da

contribuição para o fortalecimento do regime democrático, não se faz de

modo facilitado. Por isso, a Justiça Eleitoral, ao atravessar as quadras

temporais já percorridas, tem enfrentado e há de enfrentar uma série de

dificuldades, até atingir o clímax de sua missão.

Entre os obstáculos existentes, identifico o enfrentado pelo

Estado Contemporâneo e, conseqüentemente, pela Justiça Eleitoral, como

Poder, relacionada com a crise das instituições, no momento em que

várias delas apresentam e desenvolvem as suas atribuições em

desconformidade com os anseios do homem do final do século XX e que

7

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

se prepara para enfrentar os desafios que lhe serão apresentados pelo

século XXI. Destaco, entre tantos, o determinado pelo temor que se tem

com o presságio de um movimento mudo existente nas ruas, pregando o

fim de um ciclo democrático em países onde a pobreza não conseguiu ser

erradicada ou onde tal índice é crescente e assustador, por ser sentida,

pelos analistas e estudiosos dos temperamentos sociais, a tendência do

povo em aceitar a substituição da liberdade gerada em um Estado

democrático por um pouco de pão e circo, mesmo que sejam ofertados

por um Estado de regime especial, quiçá autoritário.

A Justiça Eleitoral brasileira não deixa de lançar olhos sobre a

conduta dos homens que constroem o Estado e que aperfeiçoam ou

destroem as suas instituições. Os processos de degradação da democracia

em países onde se busca, apenas, saciar a fome dos que a têm e de se

ofertar um diminuto leque de trabalho a quem o procura, em troca do

sacrifício da liberdade individual e dos direitos da cidadania, são

fenômenos que merecem ser visualizados com atenção desdobrada pelos

responsáveis por qualquer parcela de poder, a fim de que eles possam

ditar mecanismos capazes de fazer com que o Estado, ao buscar a maior

eficácia e efetividade de suas ações em relação ao homem, supere ou

diminua as crises de tais espectros que tentam dominá-lo.

No contexto em que situo as minhas idéias, merece destacar a

mensagem pregada pelo Ministro Carlos Mário Velloso, em trabalho

intitulado A Reforma Eleitoral e os Rumos da Democracia no Brasil,

apresentado no Simpósio realizado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª

Região, em homenagem ao Ministro Djaci Falcão, do teor seguinte:

Meus senhores, a democracia é o melhor dos regimes políticos. E tanto é o melhor dos regimes políticos que todos os povos se dizem democráticos Reparem que não há um povo, não há um Estado, que não se qualifique como democrático; não obstante muita vez ajuntar ao substantivo, um adjetivo.

8

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

Hoje, então, parece-me que está comprovado, porque muitas das democracias adjetivadas ruíram. Isto comprova que a democracia é, na verdade, o melhor dos regimes políticos ou, para ficarmos com a frase de Winston Churchill, no Parlamento britânico: 'Vamos admitir que a democracia seja o pior dos regimes políticos, com exceção de todos os outros que já foram praticados'. Mas a democracia, mesmo assim, é um regime político difícil de ser praticado. Rousseau escreve, e neste escrito ressai um grande pessimismo. Escreveu Rosseau que 'se houvesse um povo de deuses, esse povo certamente que se governaria democraticamente'. Na linha do pessimismo rousseauniano, Maurice Duverger acrescentou, nos nossos dias, que 'nunca se viu e nunca se verá um povo governado por si mesmo.

Mais adiante, dando curso às suas idéias, o eminente Ministro

afirma que:

A democracia, além dos pressupostos, tem condições. É condição da democracia, do regime democrático, a existência, em primeiro lugar, de um mecanismo que possa captar e transmitir com fidelidade a vontade popular. Porque, vejam, a democracia é o governo do povo; povo que vai mandar por intermédio de representante, porque a democracia possível é a democracia indireta. Então, é condição da democracia que haja, que exista, um mecanismo impermeável à corrupção, que faça a captação da vontade popular e a transmita, e a torne efetiva. E é também condição da democracia, a existência de um processo eleitoral, impermeável, também, à corrupção. Um processo eleitoral que possa conduzir aos postos de mando aqueles que realmente o povo quis, quer que lá estejam mandado por ele, povo.

Concluindo o referido pensamento, diz o Ministro Carlos

Velloso:

De sorte que à Justiça Eleitoral, no Brasil, incumbe tomar verdade a verdade das urnas, a verdade eleitoral e ainda estabelecer um processo eleitoral racional, base da operação a ser desenvolvida por esse órgão, condições da democracia representativa, indireta, possível. O Brasil já optou por um órgão judicial para fazer a verdade das urnas. A Justiça Eleitoral foi criada pelo Código Eleitoral de 1932, que se inspirou no famoso Tribunal Tcheco de 1920, que surgiu sob a inspiração luminosa de Hans Kelsen.

9

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

A Justiça Eleitoral da atualidade e a que será exercida no próximo século

XXI há de criar raios de atuação que não abalem a contabilidade do

jurisdicionado nos seus propósitos institucionais, para que possa cada vez

mais afirmar-se como instituição e cumprir a finalidade a que se destina.

Ela, por ser instituição permanente e que se envolve com o direito da

cidadania de eleger aqueles que representam a vontade do povo nos atos

dirigentes da Nação, não pode ficar indiferente à inquietude das massas e

às dificuldades que se opõem à eficiência estatal, tudo a detonar uma

distância muito acentuada entre o poder e o destinatário de suas ações - o

cidadão.

O encontro de solução destinada a vencer crises institucionais passa, com certeza, pela atuação dos agentes que as integram e se vinculam, em linha reta, com o bom atuar dos valores dominantes pregados e cumpridos. É uma missão difícil e complexa a ser desempenhada por todos aqueles que têm a incumbência de gerir qualquer fatia do Estado, por aumentada se apresentar, cada vez mais, a sua responsabilidade perante a sociedade, no torvelhinho dos dias atuais.(“Perspectivas do Direito Administrativo para o Século XXI”, de minha autoria, in Perspectivas do Direito Público, obra coletiva coordenada por Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ed. Del Rey, 1995, p. 57).

Essa preocupação que manifesto é compartilhada, com o

mesmo grau de ação e profundidade, pelo Exmo Sr. Ministro Francisco

Rezek, conforme denunciou ao saudar o Exmo. Sr. Ministro Octávio

Gallotti, quando este assumia a Presidência do Colendo Supremo Tribunal

Federal, em abril de 1993. Em tal oportunidade, Sua Excelência destacou

que:

A imprensa recolhia uma semana atrás vossas idéias a respeito da crise e do aparente descrédito das instituições públicas Na interpretação, que vos foi pedida, do fato de ser o Judiciário o mais preservado entre os poderes, dissestes da singularidade do nosso ofício, mas também do vosso repúdio pela idéia preconceituosa de que certos seres humanos possam ser melhores que os demais tão-só porque juízes, ou soldados, ou sacerdotes. Sabeis, como vossos pares, que o momento induz à reflexão e à autocrítica.

10

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

E, na pregação feita, o ilustre ensaísta prega a adoção de técnica que

resolva, de uma vez por todas, a sobrecarga de responsabilidades

enfrentadas no momento vivido pelo Poder Judiciário, especialmente a de

se adotar um limite para o absolutismo do juízo natural.

O propósito contido nas mensagens acabadas de ser

destacadas é o de se fazer despertar o surgimento de novos métodos que,

se aplicados, tornem mais eficiente a atuação do Poder Judiciário e façam

crescer a credibilidade que nele há de, necessariamente, ter o homem

comum, por ser, ele, o Judiciário, instrumento eficaz e potencializador do

aperfeiçoamento do regime democrático.

A complexidade presente no funcionamento da Justiça Eleitoral

não constitui, ao meu pensar, embaraço para a implantação das

transformações que se apresentam como necessárias para que o

cumprimento de sua missão institucional se concretize. Ela, por ser ente

organizado de forma hierárquica e por atuar de forma sistêmica, rege-se

por um complexo de normas da mesma natureza e finalidade, com um

raio de ação muito mais amplo do que imaginado pelos seus operadores,

pois todas elas contêm diretrizes conduzentes para o cumprimento de

missões institucionais com caracteres mais duradouros e com

responsabilidade engrandecida, sempre voltadas para ser instrumento de

servir ao cidadão, expressão maior dentro do Estado.

A Justiça Eleitoral, muito embora regida por um ordenamento

jurídico já cristalizado por características de essencialidade, produtividade,

aceitabilidade e de alcance de suas finalidades constitucionais, não pode

deixar de examinar, de modo constante, os problemas dele emergentes,

em razão da pluralidade das normas que o compõem e da necessidade de

se apresentar e se desenvolver sempre com vistas a manter a sua

unidade, sem perder a coerência que o sistema nele contido deve

preservar, além de se completar com o encontro de soluções

preenchedoras das lacunas que se retratem em seu curso.

11

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

É fundamental que a Justiça Eleitoral detecte a carência do

direito legislado em se adaptar e de acompanhar as mutabilidades

enfrentadas pelos agentes políticos em suas relações com o poder e com a

sociedade, suprindo, pela evolução de sua jurisprudência e pela

competência normativa, embora limitada, que o sistema lhe outorga, tais

necessidades fortalecedoras do direito de ser bem exercido pelo indivíduo

agasalhado pela garantia da cidadania.

É oportuno, no particular, lembrar e cumprir a observação de

Tércio Sampaio Ferraz, ao apresentar a obra de Noberto Bobbio, Teoria do

Ordenamento Jurídico, quando, após destacar realidades do mesmo nível

como as acima enfocadas, disse:

A Ciência do Direito precisa estabelecer novos e chegados contatos com as Ciências Sociais, superando-se a formação jurídica departamentalizada, com sua organização sobre uma base corporativo-disciplinar, de compartimentos-estanques (p. 18, da obra referida).

É certo, ao meu entender, que o impacto provocado pela

atuação do ordenamento jurídico-eleitoral não tem merecido

preocupações constantes da maioria dos nossos doutrinadores. A atestar

essa afirmativa basta se apurar o resultado de qualquer pesquisa a

respeito de literatura jurídica sobre a Justiça Eleitoral e suas leis, quando

se verifica que é, ainda, limitada a produção a respeito.

Tomo, por exemplo, a inexistência de um culto a determinados

princípios de cunho absolutamente voltado para a eficácia e efetividade

das normas eleitorais, bem como não haver uma sistematização científica

a respeito da função normativa que é exercida constantemente pela

Justiça Eleitoral.

A respeito dessa importante e autorizada constitucionalmente

função normativa da Justiça Eleitoral, merece se destacar, na literatura

jurídica brasileira, o esforço de Roberto Rosas em traçar o seu perfil, no

12

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

trabalho já mencionado (Estrutura Constitucional da Justiça Eleitoral, in

Arq. Minist. Just. Brasília, 45 (179); 5-21, (jan/jun. 1992).

Do referido texto, extraio as características e delimitação do

exercício de tais funções:

a) a do Tribunal Superior Eleitoral de "responder, sobre

matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade

com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político", conforme

competência que lhe é outorgada pelo Código Eleitoral, art. 23, n° XII;

b) a dos Tribunais Regionais Eleitorais, em igual sentido, e

com as limitações postas pelo art. 30, nº VIII, do Código Eleitoral;

c) a de que as respostas a tais consultas possuírem caráter

normativo na Justiça Eleitoral e serem irrecorríveis, salvo se, em se

tratando de matéria constitucional, ser possível o controle do Supremo

Tribunal Federal;

d) a do Tribunal Superior Eleitoral expedir instruções que

julgar convenientes à execução do Código Eleitoral (art. 23, nº IX, do Cód.

Eleitoral), instruções essas que têm força de lei e ensejando, quando

violadas por decisões dos tribunais regionais, a interposição do recurso

especial;

e) a da adoção do precedente com força vinculativa,

especialmente para o mesmo pleito, que o Código Eleitoral chama de

prejulgado, conforme expresso no art. 263;

f) a normatividade das decisões da Justiça Eleitoral tem

caráter político; por essa razão é que se denota uma certa flexibilidade em

suas conclusões, adequando a decisão ao momento eleitoral vivenciado.

Ao lado da função normativa da Justiça Eleitoral há de se

destacar a sua competência regulamentar, que é exercida com base em

13

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

uma estrutura mais alargada do que a do regulamento comum emanado

do Poder Executivo. Ela tem um vulto mais acentuado, em razão da escala

hierárquica em que se situa. A construção de sua configuração jurídica

pela doutrina contribuirá para tornar o regulamento cada vez mais eficaz e

servir como instrumento apto a facilitar a execução dos atos eleitorais, em

regra envolvidos por situações complexas.

No exame do tema a primeira dificuldade encontrada é a

apreciação da sua dinâmica funcional no ordenamento jurídico-eleitoral, a

fim de que possam valer condições aceitas pela ciência jurídica dentro de

um sistema de coexistência e de articulação do regulamento com a lei.

Isso decorre da tendência sempre crescente dos operadores da Lei

Eleitoral, quando da expedição do regulamento, em assentar regras que

extrapolam os condutos hierárquicos postos no dispositivo normativo.

Identifica-se, no particular, uma inclinação do poder

regulamentador de monopolizar a criação do Direito, tornando mais

rigorosa do que os da lei, os ditames expedidos, esquecendo-se aquele de

que há de se homenagear o primado de que a lei sempre se apresenta

superior ao regulamento.

Certo é que, não obstante tais crises de compatibilidade da lei

com o regulamento, este cresce de importância no âmbito de atuação da

Justiça Eleitoral, pelo que há necessidade de se fixar uma teoria a seu

respeito, tornando-se emprestado, para tanto, alguns princípios já fixados

sobre ele pelo Direito Administrativo.

O nosso apego às idéias tradicionais leva-nos ao cultivo do

princípio de que o objetivo primordial do regulamento é o de

complementar a lei, explicando, unicamente, o seu raio de ação. Ocorre

que, por ter avançado em seu prestígio como norma reguladora, concebe-

se, hoje, o de ter recebido uma característica de cunho supletivo e

14

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

criador, desde que não resulte, a sua aplicação, em se tornar incompatível

com a norma positivada.

A respeito, merece destacar a lição de Luci Benévolo de

Andrade, contida em seu Curso Moderno de Direito Administrativo,

Saraiva, 1975, p. 166, quando, na linha do que está sendo exposto,

afirmou:

De início, entendia-se que o poder regulamentar tinha sentido meramente complementador da lei. Hoje, todavia, admite-se uma função muito mais ampla, conferindo-se-lhe um caráter supletivo e criador É que, apesar da vedação constitucional de delegação de atribuições, as realidades vivenciais são mais poderosas do que os esquemas abstratos. Exata a advertência de Hely Lopes Meirelles de que 'os juristas devem, hoje, abandonar certos preconceitos, e, conservando-se, embora guardas fiéis da lei, considerar que a Administração Pública desempenha certa atividade legislativa, que é justamente a chamada faculdade regulamentadora – observação que tem o abono de eminentes publicistas.

Não há dúvida de que a expedição do regulamento é um comportamento

cultivado pela Justiça Eleitoral peia necessidade que tem de firmar regras

abstraias exigidas pela conjuntura complexa com que se apresentam o

executar de suas atividades administrativas e judiciais.

Uma adequação do que já se escreveu, em sede de Direito

Administrativo, sobre o regulamento, bem ajuda a se conceber o poder

regulamentar da Justiça Eleitoral. Ouso apresentar as principais regras a

que o regulamento eleitoral deve se subordinar, para que se apresente, no

curso do ordenamento jurídico que ele integra, com grau de pureza e sem

máscara de autoritarismo.

Ei-las:

a) o regulamento tem sua base jurídica na extensão da função

normativa da Justiça Eleitoral, constituindo-se uma forma menos

qualificada de tal função ser exercida;

15

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

b) esse poder regulamentar é inerente à peculiaridade da

tarefa administrativa e judicial exercida pela Justiça Eleitoral, por lhe ser

impossível se manifestar, para poder exercer o controle, em todos os

casos concretos;

c) a possibilidade do regulamento dispor de modo abstrato,

para o futuro, só tendo efeito retroativo em situações excepcionais, como

no caso do reconhecimento da prática de atos atentatórios à dignidade da

Constituição que, por possuírem tal vício, são nulos, facilita a execução

dos variados procedimentos eleitorais existentes e serve como veiculo

educativo para todos os agentes envolvidos com O fenômeno eleitoral;

d) é aceitável que em se tratando de Direito Eleitoral, a ação

do regulamento não se limite, apenas, a interpretar a lei e a ditar regras

ligadas à sua execução, pelo que deve-se-lhe permitir, com caráter

normativo, impor a obrigatoriedade de determinadas condutas aos

sujeitos ativos e passivos do processo eleitoral;

e) há de se valorizar a á simples expedição do regulamento

por ele expelir a sua pujança hierárquica, tornando obrigatório o seu

cumprimento por parte dos subordinados à autoridade eleitoral e por esta,

em face de sua integração regular ao ordenamento jurídico-eleitoral;

f) a hierarquização no ordenamento jurídico-eleitoral torna-se

útil, de modo específico, ao prestigiar a esfera da eficácia e da efetividade

do regulamento, tendo em vista que o expedido por uma autoridade

superior prevalece sobre outro, embora já existente, mas que tenha se

originado de ato de autoridade subordinada àquela;

g) os conceitos estatuídos pela Ciência Jurídica a respeito da

força normativa, no final deste século, foge do apoio a que sejam

instituídas leis que pretendam esgotar, por inteiro, todos os fatos que

pretende alcançar, tendo em vista a impossibilidade prática de tal patamar

16

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

ser atingido com êxito, pelo que se defende um maior prestígio para os

decretos, portarias, circulares, provimentos, instruções etc;

h) o regulamento eleitoral, quando expedido, deve se

submeter às limitações legais que sobre ele, normalmente, recaem, pelo

que não deve, em nenhuma hipótese, alcançar a integridade de qualquer

direito ou garantia fundamental do cidadão, nem diminuir ou aumentar os

limites dos direitos subjetivos constituídos pela lei eleitoral;

i) o objetivo fundamental do regulamento em Direito Eleitoral

deve ser o de disciplinar as situações em que cabe atuação discricionária

da Justiça Eleitoral para fazer cumprir a legislação que rege os atos por

ela produzidos, quer administrativos, quer judiciais;

j) não devem ter força de criar direitos nem obrigações que

não se encontrem, de modo implícito ou explícito, contidos na lei;

l) não deve revogar, nem contrariar a letra nem o espírito da

lei, limitando-se, apenas, a desenvolver os princípios e a completar a sua

dedução, facilitando o seu cumprimento.

Outras entidades jurídicas que compõem o ordenamento

jurídico-eleitoral merecem análise detalhada. O limite de espaço imposto a

este trabalho não me permite desenvolver o referido estudo.

Resta, em fechamento às idéias expostas, afirmar que as

características da Justiça Eleitoral no final deste século contêm subsídios

de grande valia para se aproximar dos direitos do cidadão no sentido de

fazer valer a verdade das urnas. É evidente que elas, no patamar em que

se encontram, não são absolutamente suficientes para enfrentar as

exigências dos jurisdicionados no próximo século XXI. É conveniente, em

face do que foi desenvolvido, se estabelecer propostas visando colaborar

com a Justiça Eleitoral na busca de se aperfeiçoar na contribuição de

consolidação do regime democrático a ser vivenciado no próximo século,

17

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

iniciativa já tomada pelo Superior Tribunal Eleitoral, sob o comando do

Ministro Carlos Mário Velloso.

3. A entrega da prestação jurisdicional eleitoral de acordo com a reforma defendida pelo Tribunal Superior Eleitoral

A pureza da entrega da prestação jurisdicional eleitoral só será

alcançada quando a Nação extirpar, de uma vez por todas, qualquer

forma de fraude no sistema de preparar as eleições, do cidadão votar e no

de se apurar a vontade manifestada por cada eleitor nas urnas.

A conscientização dessa realidade é que incentiva o esforço

desenvolvido pelo atual Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro

Carlos Mário Velloso, devidamente autorizado por seus ilustres pares, a

propor reformas na forma do atuar da Justiça Eleitoral e a sugerir

modificações no sistema eleitoral posto na Constituição atual.

Os trabalhos para o alcance de tais objetivos estão em fase

avançada. De forma sintética, tomando por base depoimento do próprio

Ministro Carlos Mário Velloso, em conferência pronunciada no Tribunal

Regional Federal da 5ª Região, conforme já anunciado, os pontos vitais

reformistas são os seguintes:

a) ser realizado um estudo aprofundado para que as eleições,

em todo o País, sejam informatizadas, eliminando-se, assim, as urnas, as

cédulas eleitorais, os mapas de urnas, o trabalho com a apuração e,

conseqüentemente, a possibilidade de fraudes nas eleições;

b) o Poder Legislativo aprovar, com a contribuição do Poder

Executivo e da Justiça Eleitoral, bem como de todos os demais segmentos

da sociedade, uma lei permanente para reger e disciplinar todas as

eleições, tendo em vista que, conforme comprovado das experiências

18

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

hodiernamente vividas, uma lei para cada eleição não presta bom serviço

à democracia;

c) em decorrência dessa lei permanente, se estabelecer uma

jurisprudência estável, após decisões trabalhadas pelos tribunais que

buscarão, com certeza, o aperfeiçoamento da lei, dando, ainda, lugar a

uma doutrina com princípios definidos;

d) o estabelecimento de regras jurídicas que resultem no

fortalecimento dos partidos políticos, pois eles são os agentes

propulsionadores da vivência de uma democracia representativa e tendo

em vista que a pulverização dos mesmos os enfraquecem, porque torna-

os presos de aventureiros políticos;

e) ser prestada homenagem à fidelidade partidária, causa

determinante, entre outras, do fortalecimento dos partidos políticos;

f) modificar o sistema eleitoral, isto é, o sistema pelo qual os

candidatos são eleitos, por se considerar que o sistema proporcional hoje

adotado está comprometido com "os abusos do poder econômico, com os

abusos do poder político, que falseiam a vontade do titular do poder,

porque rompem o equilíbrio entre os candidatos;

g) a adoção do sistema distrital, quer o puro, hoje adotado na

Grã-Bretanha, na Inglaterra, no Pais de Gales, na Escócia, na Irlanda do

Norte, quer o misto existente na Alemanha, tudo a de pender das

manifestações dos vários segmentos sociais e do que for melhor para o

Brasil:

h) instituir uma nova sistemática para as campanhas

eleitorais, com a participação do poder público, quer fiscalizando, quer

financiando com a concessão de estímulos fiscais para aqueles que

contribuírem para os partidos políticos, com a proibição de doação a

qualquer candidato.

19

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

As propostas acabadas de ser registradas recebem, por parte

do Ministro Carlos Mário Velloso, na conferência acima anotada ("A

reforma eleitoral e os rumos da democracia no Brasil") detalhada análise e

discriminação dos aspectos específicos e genéricos abrangentes Saliente-

se que, para aperfeiçoar as idéias reformistas anunciadas, o Colendo

Tribunal Superior Eleitoral, na atual gestão do Ministro Carlos Mário

Velloso, como seu Presidente, criou a Comissão Central de Notáveis,

integradas por juristas e representantes de outros escalões da sociedade,

para estudá-las e, após concluídos os trabalhos, preparar e encaminhar os

anteprojetos de lei aos Poderes Executivo e Legislativo. Conta ainda a

Comissão Central, com a colaboração de subcomissões. Estas

subcomissões apreciam, cada uma, temas específicos. Temos, assim, a

Comissão de Informatização, a de Temas de Lei Eleitoral, a de estudar o

fortalecimento dos partidos políticos, a de estudar as modificações no

sistema eleitoral e a de firmar propostas para a reformulação da

propaganda política.

4. Conclusões

Democracia, representação política e Justiça Eleitoral são

entidades jurídicas que sustentam a estabilidade de um governo voltado

para a realização dos ideais de seu povo. No referente à Justiça Eleitoral,

mesmo com as dificuldades de estruturação e de funcionamento que

enfrenta, ela vem contribuindo para o fortalecimento do regime

democrático, desejo contido no íntimo de cada cidadão brasileiro e que se

constitui em sua mais legítima aspiração. Vale aqui repetir a afirmação de

Fernando Andrade de Oliveira, na conclusão do seu trabalho intitulado

"Democracia, representação política e Justiça Eleitoral" (Rev. Inf. Legisl.,

Brasília, a. 26, n. 104, out./dez. 1989) que:

A grande e incontestável verdade é que no curso deste período histórico, com momentos de amargura e

20

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

frustrações, mas passageiros, vivemos dias gloriosos de vitalidade democrática. Dias de fé, de alegria cívica, que devemos à Justiça Eleitoral, projetados no futuro que esperamos ainda melhor, pela dignidade dos seus juízes, pela confiança na instituição.

Ao se aproximar o final do século XX e se estabelecer a espera do

desconhecido que nos será imposto pelo século XXI, era que será voltada,

inteiramente, para a valorização dos direitos do cidadão, há de a Justiça

Eleitoral acompanhar essa evolução e de se apresentar como entidade

jurídica de poder, com capacidade de impor regras de atuação que

contribuam para o atendimento da pretensão universalizada no interior de

cada um dos seus jurisdicionados – o de uma democracia participativa e

com absoluto respeito à dignidade humana e de prestígio ao direito de

exercer, livremente, o direito do voto.

Há, assim, a Justiça Eleitoral de transformar-se

substancialmente para o cumprimento de sua missão, pela

conscientização dos seus integrantes, certa de que está servindo aos

valores maiores buscados pelo sentimento nacional, que é o da

convivência com um regime que não só se proponha como faça

efetivamente o estabelecimento de uma paz social, com reverência

integral aos direitos do homem. Só alcançará, porém, tais metas se olhar

para a pessoa do Juiz como o instrumento único capaz de executar os

seus propósitos, embora dele tenha de exigir mais, pois o seu papel, como

destacado por Cármen Lúcia Antunes Rocha, em "O Juiz na Nova Ordem

Estatal", in As Perspectivas do Direito Público, ob. já citada, é o de

"possibilitar a concretude dos direitos, a sua afirmação libertadora dos

métodos anteriormente adotados e superados pela experiência política da

sociedade".

Complementa a ilustre autora:

21

A partilha dos bens da terra por todos os homens talvez esteja mais próxima do que nunca visto, porque a consciência dos direitos atingiu pelo progresso das

A12

A Contribuição da Justiça Eleitoral para o Aperfeiçoamento da Democracia

A12

22

coisas e da tecnologia, uma possibilidade inédita. O homem – afirmava Paulo Mendes Campos – é um gesto que se faz ou não se faz. A Justiça, hoje, é o gesto feito.