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1 A CONTRIBUIÇÃO DO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO PARA A EFICIÊNCIA ECONÔMICA E EFICÁCIA SOCIAL Cristiane Mesquita Franz Prof° Orientador Fábio Melo de Azambuja 1 RESUMO Neste trabalho buscamos, além de definir o cooperativismo, demonstrar suas origens, princípios e natureza jurídica, classificando-o nos seus diversos ramos de atividades, dentre eles, o crédito, objeto principal do presente estudo. Nesse tocante, abordamos o histórico do cooperativismo de crédito, sua evolução normativa e a diferenciação quanto às demais instituições financeiras e por fim, o reflexo deste na sociedade onde atua. Palavras-Chave: Direito Cooperativo. Cooperativismo. Cooperativa de crédito. SUMÁRIO 1 Introdução; 2 Origem do Cooperativismo; 2.1 Princípios do Cooperativismo; 2.2 Definição do Cooperativismo; 2.3 Classificação das Cooperativas; 2.3.1 Classificação quanto ao Objeto; 2.4 Natureza Jurídica das Cooperativas; 2.5 Responsabilidade dos Associados; 3 Origem do Cooperativismo de Crédito; 3.1 Cooperativismo de Crédito no Brasil; 3.2 Definição do Cooperativismo de Crédito; 3.3 Evolução Normativa; 3.4 Diferenciação entre Cooperativas de Crédito e Bancos; 3.5 Sistemas de Crédito Cooperativo; 3.5.1 SICREDI; 3.5.2 SICOOB; 3.5.3 UNICRED; 3.5.4 Sistema de Crédito Cooperativo Solidário; 5 Considerações Finais e Referências. 1 INTRODUÇÃO Tendo como tema a contribuição das cooperativas de crédito para a eficiência econômica e eficácia social, desenvolveremos o estudo com a pretensão de analisar a definição do cooperativismo, abordando sua evolução histórica, sua natureza jurídica e sua diferenciação perante as demais instituições financeiras. A partir de então, teremos a base para desenvolvermos a problemática enfrentada pelo nosso estudo, qual seja, a dificuldade interpretativa do cooperativismo - principalmente do cooperativismo de crédito - em evidenciar a aplicabilidade do mesmo como instrumento para promover o desenvolvimento econômico e social. Apesar de o tema não ser de conhecimento geral, o cooperativismo de crédito vem assumindo um lugar de destaque no Sistema Financeiro Nacional, em função do seu significativo crescimento nos últimos anos. Fato esse, que nos leva ao aprofundamento do estudo, a fim de que se torne possível uma melhor compreensão e análise dos seus diferenciais. 1 Composição da banca: Fábio Melo de Azambuja (orientador), João Paulo Veiga Sanhudo (argüidor) e Marcelo Vicentini (argüidor).

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A CONTRIBUIÇÃO DO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO PARA

A EFICIÊNCIA ECONÔMICA E EFICÁCIA SOCIAL

Cristiane Mesquita Franz

Prof° Orientador Fábio Melo de Azambuja1

RESUMO Neste trabalho buscamos, além de definir o cooperativismo,

demonstrar suas origens, princípios e natureza jurídica, classificando-o nos seus diversos ramos de atividades, dentre eles, o crédito, objeto principal do presente estudo. Nesse tocante, abordamos o histórico do cooperativismo de crédito, sua evolução normativa e a diferenciação quanto às demais instituições financeiras e por fim, o reflexo deste na sociedade onde atua. Palavras-Chave: Direito Cooperativo. Cooperativismo. Cooperativa de crédito.

SUMÁRIO 1 Introdução; 2 Origem do Cooperativismo; 2.1 Princípios do Cooperativismo; 2.2 Definição do Cooperativismo; 2.3 Classificação das Cooperativas; 2.3.1 Classificação quanto ao Objeto; 2.4 Natureza Jurídica das Cooperativas; 2.5 Responsabilidade dos Associados; 3 Origem do Cooperativismo de Crédito; 3.1 Cooperativismo de Crédito no Brasil; 3.2 Definição do Cooperativismo de Crédito; 3.3 Evolução Normativa; 3.4 Diferenciação entre Cooperativas de Crédito e Bancos; 3.5 Sistemas de Crédito Cooperativo; 3.5.1 SICREDI; 3.5.2 SICOOB; 3.5.3 UNICRED; 3.5.4 Sistema de Crédito Cooperativo Solidário; 5 Considerações Finais e Referências. 1 INTRODUÇÃO

Tendo como tema a contribuição das cooperativas de crédito para a eficiência econômica e eficácia social, desenvolveremos o estudo com a pretensão de analisar a definição do cooperativismo, abordando sua evolução histórica, sua natureza jurídica e sua diferenciação perante as demais instituições financeiras. A partir de então, teremos a base para desenvolvermos a problemática enfrentada pelo nosso estudo, qual seja, a dificuldade interpretativa do cooperativismo - principalmente do cooperativismo de crédito - em evidenciar a aplicabilidade do mesmo como instrumento para promover o desenvolvimento econômico e social.

Apesar de o tema não ser de conhecimento geral, o cooperativismo de crédito vem assumindo um lugar de destaque no Sistema Financeiro Nacional, em função do seu significativo crescimento nos últimos anos. Fato esse, que nos leva ao aprofundamento do estudo, a fim de que se torne possível uma melhor compreensão e análise dos seus diferenciais.

1 Composição da banca: Fábio Melo de Azambuja (orientador), João Paulo Veiga Sanhudo (argüidor) e Marcelo Vicentini (argüidor).

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Assim, o estudo será desenvolvido a partir da técnica de pesquisa bibliográfica e documental, baseada na Constituição Federal, Lei Cooperativista, doutrina, além de normativos do Banco Central do Brasil e do Conselho Monetário Nacional.

Para tanto, no primeiro capítulo relataremos a origem do cooperativismo, juntamente com seus princípios, que são primordiais para a compreensão do cooperativismo de crédito. Trataremos da classificação das cooperativas, onde o crédito é classificado como um de seus ramos e também abordaremos a natureza jurídica das cooperativas, a responsabilidade dos associados e algumas entidades que representam as sociedades cooperativas.

A partir do segundo capítulo, analisaremos a origem do cooperativismo de crédito no Brasil, a evolução normativa de forma cronológica, a distinção entre cooperativas de crédito e bancos, bem como os sistemas de crédito mais representativos no Brasil e a importância destes para o desenvolvimento da sociedade onde atuam.

2 ORIGEM DO COOPERATIVISMO

A cooperação2 sempre esteve presente na história do homem. Desde seu primitivismo, utilizavam-se da cooperação para alcançar seus objetivos. Entretanto, a partir da evolução do homem, sua natureza acabou sendo modificada, dando evasão do sentimento coletivo, tomando conta a ganância, que estabelece a figura do intermediário, do explorador de patrimônio e de força de trabalho alheio.

Desde os primórdios, a cooperação tem se mostrado presente. Entretanto, o modelo de cooperativa3, na forma como hoje são conhecidas as sociedades cooperativas, surgiu em 28 de outubro de 1844, na cidade inglesa de Rochdale, época em que o Estado passava por uma séria crise social, agravada pelas repercussões da Revolução Industrial.

Diante da crise, 28 tecelões de Rochdale, movidos pelo espírito de ajuda mútua, constituíram uma cooperativa (primeira cooperativa organizada formalmente) de consumo para viabilizar a aquisição ao menor custo, de bens e suprimentos diretamente dos produtores, de forma a eliminar o intermediador da relação comercial.

Cabe ressaltar, que o ingresso na sociedade acontecia pelo pagamento da subscrição, dando direito a compartilhar o estoque.

Estes tecelões submeteram-se a alguns princípios, tais como: suprir necessidades deixadas pelo desemprego, possuir neutralidade política e religiosa, controlar a diretoria eleita pelos membros, efetuar negócios em dinheiro, restituir os dividendos de acordo com o capital rendido 4.

Diante do sistema econômico da época, o cooperativismo foi considerado o “caminho do meio”, sendo a intermediação entre o capitalismo5 e

2 Ato ou efeito de cooperar para um fim comum. HOLANDA, Aurélio Buarque. Novo dicionário Aurélio. Rio de Janeiro. Editora Nova Fronteira, 1997. 3 Sociedade ou empresa constituída por membros de determinado grupo econômico ou social, e que objetiva desempenhar, em benefício comum, determinada atividade econômica. HOLANDA, op. cit. 4 BULGARELLI, Waldirio. O regime jurídico das sociedades cooperativas. São Paulo: Pioneira, 1965. 5 O capitalismo é um sistema gerador e propulsor de riqueza onde o fator determinante de seu apogeu é a remuneração efetiva do capital. Busca-se o lucro como primeiro e único conceito de

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socialismo6, valendo-se do capitalismo como base de sustentação, e do socialismo como base de equilíbrio harmonioso de distribuição de riqueza. O cooperativismo trouxe uma sociedade mais justa, mais humana e mais comprometida consigo mesma, sendo que, através do ato dos tecelões de Rochdale, denominado marco do cooperativismo, outras cooperativas foram surgindo, como por exemplo, na França, onde iniciou o movimento com a fundação de uma cooperativa de produção.

2.1 PRINCÍPIOS DO COOPERATIVISMO Os princípios do cooperativismo expressam o sentimento social do

sistema cooperativo através de uma inspiração democrática, onde os associados são os dirigentes, recebem os excedentes da cooperativa de forma proporcional às suas operações, mantém a neutralidade político-religiosa, visam o capital como mero instrumento e não como fator determinante, não perseguem lucros e acima de tudo visam o desenvolvimento e aperfeiçoamento do ser humano7.

Os princípios cooperativos, apresentados a seguir, são as linhas orientadoras através das quais as cooperativas levam os seus valores à prática. 8

a) 1° princípio - adesão voluntária e livre: as cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades como membros, sem discriminação de sexo, idade, raça, preferências políticas e religiosas;

b) 2° princípio - gestão democrática e livre: as cooperativas são organizações democráticas, controladas pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das suas políticas e na tomada de decisões. A Diretoria eleita agirá por delegação e com responsabilidade para com os associados. Os membros têm igual direito de voto (um membro, um voto). Segundo Bulgarelli9 “todo associado tem direito a um voto, seja qual for o valor de suas quotas de capital, todo associado pode desta forma votar e ser votado, participando da gestão da sociedade”;

c) 3° princípio - participação econômica dos sócios: os sócios contribuem eqüitativamente para o capital das suas cooperativas e controlam-no democraticamente. Parte desse capital é, normalmente, propriedade comum da cooperativa. Os sócios

riqueza. Para se conseguir o lucro, não se considera obstáculos, não se restringe a barreiras, não recua diante das dificuldades. 6 O socialismo propõe a estatização dos meios de produção, o que implica a distribuição mais justa e eqüitativa da renda nacional e a eliminação do caráter antagônico das contradições entre as classes sociais e, num estágio superior, apropria eliminação das classes sociais. No Sistema Socialista, o Estado ordena e comanda as ações do povo e, este, através dos tributos, dá ao Estado o suporte financeiro. 7 BULGARELLI, Waldirio. As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 12. 8 Norteiam as cooperativas, os princípios aprovados no Congresso de Manchester, em 1995, pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI). 9 BULGARELLI, op. cit., p. 13.

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recebem, habitualmente, se houver, uma remuneração limitada ao capital integralizado, como condição de sua adesão. O destino dos excedentes visa sempre o desenvolvimento da cooperativa, seja por meio da criação de reservas legais, em benefício dos sócios nas transações com a sociedade ou, através de apoio a outras atividades, sendo imprescindível a aprovação via assembléia;

d) 4° princípio - autonomia e independência - as cooperativas são organizações autônomas, de ajuda mútua, sob controle de seus membros. As relações das cooperativas com outras organizações, sejam públicas ou privadas, devem ser exercidas de modo a preservar seu controle democrático e autônomo;

e) 5° princípio - educação, formação e informação: as cooperativas promovem a educação e a formação dos seus membros, dos representantes eleitos e dos colaboradores, de forma que estes possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento das suas cooperativas. Informam o público em geral, particularmente os jovens e os líderes de opinião, sobre a natureza e as vantagens da cooperação. É dever das cooperativas prestar assistência técnica, educacional e social para os seus associados, devendo, constituir um fundo, previsto em estatuto, para garantir a realização desse princípio;

f) 6° princípio – intercooperação: além de suas atividades específicas de atendimento aos associados, as cooperativas trabalham juntas, regidas por estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais, que permitam manter o desenvolvimento, o fortalecimento e a sustentação do movimento cooperativo.

g) 7° princípio - interesse pela comunidade – as cooperativas buscam o conhecimento além do mercado onde atuam, conhecendo a comunidade onde se inserem, trabalham para o desenvolvimento sustentado das suas comunidades através de políticas aprovadas pelos membros.

Esses são os Princípios Cooperativistas que dão grandioso sentido social e democrático a esse tipo de organização, visando o capital como instrumento para realização de seus objetivos e não elemento determinante de sua constituição.

2.2 DEFINIÇÃO DO COOPERATIVISMO Diante das peculiaridades da sociedade cooperativa, os doutrinadores

têm mostrado dificuldades em defini-la com precisão, sendo assim, poucos autores brasileiros escrevem sobre o tema. Waldirio Bulgarelli assim adverte:

As dificuldades iniciais dessa conceituação decorrem, em grande parte, de terem sido as definições formuladas por economistas e com o sentido de realçar a supressão do intermediário e o aspecto não lucrativo da atividade cooperativa, elementos que por si só não eram capazes de conferir originalidade à cooperativa, deixando margem de confusão com outras sociedades. [. . .] Por outro lado, essas dificuldades eram agravadas pelo fato de as cooperativas, atuando nos mais variados setores da atividade humana, se dividirem e subdividirem em inúmeros tipos e categorias.10

10 BULGARELLI, Waldirio. Elaboração do direito cooperativo. São Paulo: Atlas, 1967. p. 30.

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A definição e o modus operandi da sociedade cooperativa, subordinam-se à regência da legislação de cada país.

No Brasil, sociedades cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica própria, constituída para prestar serviços aos associados, cujo regime jurídico, atualmente, é instituído pela Lei 5764, de 16 de dezembro de 1971.

Já na Alemanha, “As Cooperativas são sociedades com número de sócios variável, que pretendem fomento das economias de seus sócios através de um negócio administrado em comum”.

Na definição da Lei Argentina “As cooperativas prestam serviços a seus associados e aos não associados sob certas circunstâncias”.11

Mesmo havendo dificuldades para defini-la, certeiro é seu objetivo, no que tange a proporcionar vantagens econômicas a seus membros através da racionalização de gastos comuns; do reforço ao poder de barganha com o mercado; da eliminação de intermediários, etc.

De forma mais abrangente, Walmor Franke assim define: A palavra “cooperativismo” pode ser tomada em duas acepções. Por um lado designa o sistema de organização econômica que visa a eliminar os desajustamentos sociais oriundos dos excessos da intermediação capitalista; por outro, significa a doutrina corporificada no conjunto de princípios que devem reger o comportamento do homem integrado naquele sistema.12

Deste modo, a sociedade cooperativa vem ser a intermediária entre os associados e suas relações com o mercado. 13

Além das peculiaridades que a distingue das demais sociedades, as cooperativas são caracterizadas, conforme expresso em Lei, pelas seguintes propriedades:14

a) adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviços;

b) variabilidade do capital social representado por quotas-partes; c) limitação do número de quotas-partes do capital para cada

associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais;

d) inacessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade;

e) singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção das

11 LUZ FILHO, Fábio. Apud IRION, João Eduardo. Cooperativismo e economia social. São Paulo: STS, 1997. p. 182. 12 FRANKE, Walmor. Direito das sociedades cooperativas. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 1. 13 Nas palavras de Walmor Franke, op. cit. p. 11, “O contato que o sujeito econômico cooperativado estabelece com o mercado mediante a organização empresarial cooperativa dá lugar, por isso mesmo, ao afastamento de um “tertius”, que será conforme o caso, o comerciante atacadista ou varejista, o industrial, adquirente da matéria-prima, o banqueiro, prestador de crédito, o patrão, empregador de mão-de-obra, com os quais o cooperado necessariamente entraria em relação jurídica negocial se não existisse a sociedade cooperativa”. 14 Art. 4° da Lei 5.764/71, que define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências.

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que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade;

f) quorum para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no número de associados e não no capital;

g) retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral;

h) indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social;

i) neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social; j) prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos

estatutos, aos empregados da cooperativa; k) área de admissão de associados limitada às possibilidades de

reunião, controle, operações e prestação de serviços. Nota-se que as características principais do cooperativismo, fixadas

pelo legislador brasileiro, refletem as normas estabelecidas pelos pioneiros de Rochdale.

2.3 CLASSIFICAÇÃO DAS COOPERATIVAS As sociedades cooperativas são classificadas como: a) Cooperativas singulares, ou de 1° grau: destinadas a prestar

serviços diretamente aos associados; b) Cooperativas centrais e federações de cooperativas, ou de 2° grau:

constituídas por cooperativas singulares e que objetivam organizar, em comum e em maior escala, os serviços econômicos e assistenciais de interesse das filiadas, integrando e orientando suas atividades, bem como facilitando a utilização recíproca dos serviços;

c) Confederação de cooperativas, ou de 3° grau: constituídas por centrais e federações de cooperativas e que têm por objetivo orientar e coordenar as atividades das filiadas, nos casos em que o vulto dos empreendimentos transcenderem o âmbito de capacidade ou conveniência de atuação das centrais ou federações.

2.3.1 Classificação quanto ao objeto

As cooperativas poderão adotar qualquer ramo de conhecimento

negocial humano, desde que lícitos, morais e possíveis, respeitando o disposto no art. 5° da Lei 5764/71.

Existem diferentes formas de classificação das cooperativas. A OCB (Organização das Cooperativas do Brasil), considera a divisão das cooperativas por ramos: agropecuário, consumo, crédito, educacional, especial, infra-estrutura, habitacional, mineral, produção, saúde, trabalho, turismo e lazer, transporte (cargas e passageiros). São treze ramos que, na visão de alguns autores confundem-se, como por exemplo, a cooperativa de saúde e trabalho médico, por isso, grande parte dos autores as classificam em três tipos: recebimento, fornecimento e produção, que não as confundem.

Abaixo, podemos perceber a representatividade no Brasil, de cada um dos ramos citados, principalmente quanto ao número de empregos diretos

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gerados na economia e o número de cooperados. Importante destacar, que em países como o Canadá15, por exemplo, o percentual de cooperados em relação à população adulta é de aproximadamente 80%, infinitamente superior em relação à realidade brasileira.

Quadro 1 - Composição do Sistema Cooperativo Brasileiro16 ����� ����������� ������� ��� ������� ���

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Diante da classificação apresentada, aprofundaremos nosso estudo no

ramo do cooperativismo de crédito, também enquadrado no tipo recebimento, uma vez que, recebe valores para administrar.

2.4 NATUREZA JURÍDICA DAS COOPERATIVAS A lei 5764/71, em seu art. 3°, prevê que “celebram contrato de

sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro”.

Uma vez que a lei fala em “contrato de sociedade cooperativa”, cuja finalidade é o “exercício de atividade econômica”, deixa claro de que se trata de sociedade e não de associação, vez que esta não admite fins econômicos (art. 53 do CC). 17

As cooperativas adotaram como fundamento a cooperação, tendo como finalidade a melhoria das condições econômicas através da criação de uma sociedade de interesse comum, destinada a prestar serviços aos seus associados18 afastando os intermediários.

15 ACI. Disponível em: <http://www.ica.coop/icfo/index.html>. Acesso em: 4 set. 2005. 16 COAMO AGROINDUSTRIAL. Cooperativismo no Brasil. Disponível em <http://www.coamo.com.br/coopbrasil.html>. Acesso em 04 de outubro de 2006. 17 ALMEIDA, Marcos Elidius; ALMEIDA, Michelli de (org). Cooperativas à luz do código civil. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2006. p. 20. 18 Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa, define associado como aquele “1 que se associou [. . .] 3 integrante de uma coligação; coligado [. . .] 4 integrante de uma sociedade empresarial ou de um clube; sócio 5 que ou o que colabora com outrem; parceiro [. . .]”18. Já cooperado, é definido como “aquele sujeito que é membro de uma cooperativa; cooperativado”18, ou seja, o associado colabora, auxilia ou trabalha junto com os outros, tendo por objetivo um mesmo fim. Entende-se que cooperado é espécie do gênero associado.

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Conforme expressa disposição legal, constante no art. 982, parágrafo único do CC, as sociedades cooperativas são consideradas sempre simples19, isto é, não-empresárias, independentemente de seu objeto. Assim, não estão sujeitas à falência, a teor do que dispõe o art. 4° da Lei 5764/71 e art. 94 da Lei de Falências20.

Não obstante sua natureza não-empresária, os atos constitutivos e demais documentos societários estão sujeitos a registro nas juntas comerciais, por força do art. 18, parágrafo 6°, da Lei 5764/71, que, por ser norma especial, deverá prevalecer sobre a regra geral estabelecida no art. 1150 do novo Código Civil.21

Nota-se a singularidade e o hibridismo das cooperativas, pois são sociedades (exercem atividade econômica), mas não visam o lucro; são não-empresariais, mas registram-se nas juntas comerciais. Diante da existência de normas e princípios próprios, verifica-se que as cooperativas não se enquadram em nenhum dos ramos tradicionais do direito (direito civil, direito comercial ou empresarial, direito administrativo, direito do trabalho, etc), tornando-se possível falar-se de um novo ramo, o direito cooperativo.

Assim se manifesta Waldirio Bulgarelli sobre o direito cooperativo: Baseados na idéia de que o cooperativismo, como um sistema econômico característico, com filosofia e técnica própria, criou seu próprio direito, passaram os autores cooperativistas à não se conformarem com o enquadramento das cooperativas ao Direito Civil ou ao Direito Comercial, ou a ambos, apontando as falhas desse falso enquadramento e as conseqüências danosas, na ordem prática que ele implica. Da mesma forma como outros ramos do Direito vêm aspirando a dignidade de ciência autônoma, tais como o direito social, o Direito Agrário, o Direito Tributário, - o Direito Cooperativo quer encontrar e ver reconhecida a sua verdadeira posição no quadro da ciência do direito. As alegações fundamentais que levaram aos autores a pretender a autonomia do Direito Cooperativo podem ser assim resumidas: - não se enquadra no sistema do Direito Civil nem no sistema do Direito Comercial; possui princípios, extensão e métodos próprios; - já ter sido reconhecido por quase todos os direitos positivos, (com leis distintas do Direito Civil e do Direito Comercial); pela necessidade de ser dotado de regime jurídico apto a propiciar-lhe o desenvolvimento de acordo com as suas verdadeiras características. 22

Todavia, apesar de serem definidas como sociedades simples, as cooperativas têm forma própria, segundo o art. 4° da Lei 5764/71 e por ressalva no parágrafo único do art. 983 do Código Civil, não se enquadrarão em nenhum dos tipos societários previstos no Código Civil, obedecendo às normas que lhe são próprias.

19 O novo código civil emprega o termo “simples” com dois significados diversos: a) para designar as sociedades não empresariais (art. 982), e b) para designar um tipo de sociedade (art. 997 e seguintes), causando confusões e enganos por parte dos operadores do Direito. Ver, a propósito: MACHIONI, Jarbas Andrade. Novos Fundamentos do Direito Comercial sob o Código Civil de 2002. In: SIMÔES FILHO, Adalberto; LUCCA, Newton (coord.). Direito Empresarial Contemporâneo. São Paulo: Juares de Oliveira, 2004. p. 360. 20 Lei n.° 11.101 de 09 de fevereiro de 2005 que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. 21 ALMEIDA, Marcos Elidiu set al. Cooperativas à luz do Código Civil. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2006. p. 21. 22 BULGARELLI, Waldírio. As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 105.

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Não obstante, conforme dispõe o art. 1096 do Código Civil, serão aplicadas às Cooperativas as regras da sociedade simples, nos casos omissos, quando compatíveis com as características previstas no art. 1094. 23

Para BULGARELLI24, este dispositivo não tem maiores implicações, porque a aplicação da legislação especial cooperativista tornará bastante difícil a configuração de omissão na regulamentação das sociedades cooperativas.

2.5 RESPONSABILIDADE DOS ASSOCIADOS A responsabilidade do associado poderá ser de forma limitada, quando

responder pelos compromissos da sociedade até o valor do capital subscrito por ele, ou ilimitada, quando responder pelos compromissos da sociedade de forma pessoal, solidária e sem limites.

Essa matéria está regulamentada nos arts. 11 e 12 da Lei 5764/71 e também no art. 1095 do Código Civil. Independentemente da escolha, ela deverá constar no estatuto social da cooperativa.

Importante ressalvar que a redação do art. 1094, I trazida pelo novo Código Civil, possibilita à cooperativa a dispensa do capital social, sendo assim, caso a sociedade cooperativa opte por não ter capital social, necessariamente a responsabilidade dos sócios será ilimitada.

Diante do princípio da igualdade entre os associados, parece não ser possível a previsão estatutária de categorias diferentes de sócios, ou seja, alguns com responsabilidades limitadas e outros com responsabilidade ilimitada, pois, tal duplicidade causaria insegurança as relações jurídicas com terceiros25.

Entretanto, conforme dispõe o art. 13 da Lei 5764/71, a responsabilidade dos associados será sempre subsidiária em relação à própria cooperativa.

No caso de desligamento do associado, independentemente da forma como ocorreu (demissão, eliminação ou exclusão), sua responsabilidade perante terceiros, em decorrência de compromissos assumidos pela sociedade, perdura até a data de aprovação das contas do exercício que tenha ocorrido o desligamento, previsto no art. 36 da Lei 5764/71.

A legislação passada chegou a prever em até cinco anos o tempo em que perdurava a responsabilidade dos associados retirantes (Decreto n° 1637 de 05.01.1907, art. 20), sendo reduzida para dois anos esse limite (Decreto-lei n° 5893 de 19.10.1943) e, finalmente até a data da aprovação das contas do exercício em que ocorreu o desligamento, conforme redação do art. 36 da Lei 5764/71. 26

3 ORIGEM DO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO

23 ALMEIDA, Marcos Elidius et al. Cooperativas à luz do Código Civil. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2006. p. 22. 24 BULGARELLI, Waldírio. As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 88. 25 ALMEIDA, Marcos Elidius Michelli de Almeida (Org). Cooperativas à luz do código civil. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2006. p. 35. 26 POLONIO, Wilson Alves. Manual das sociedades cooperativas. São Paulo: Atlas, 1998. p. 43.

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Através do ato dos tecelões de Rochdale, denominado marco do cooperativismo, outras cooperativas foram surgindo. A primeira cooperativa de crédito, entretanto, veio a surgir 03 anos depois, em 1847 na Alemanha, fundada por Friedrich Wilhelm Raiffesen27. Natural da Remânia, criou no povoado de WeyerbuschWesterwald a primeira associação de apoio a população rural, embora não fosse ainda uma cooperativa, serviria de modelo para futura atividade cooperativista de Raiffeisen.

As cooperativas fundadas por Raiffesen, eram vinculadas às comunidades rurais, tinham como principais características a responsabilidade ilimitada e solidária dos associados, a singularidade de votos dos sócios, independentemente do número de quotas-partes, a área de atuação restrita, a ausência de capital social e a não distribuição de sobras, excedentes ou dividendos.

O pioneirismo dos alemães permanece com o surgimento das cooperativas de crédito urbanas, fundadas por Herman Schulze, em 1850. Schulze foi o responsável pela constituição de uma cooperativa de crédito na cidade de Delitzch. Os bancos populares, como ficaram conhecidos, diferenciavam-se do modelo Raiffeisen por apresentar uma área de ação não-restrita, remunerar os dirigentes e prever o retorno das sobras líquidas proporcionalmente ao capital.

Inspirado nos modelos alemães, em 1865, na cidade de Milão, o italiano Luigi Luzzatti, organiza a constituição da primeira cooperativa, cujo modelo herdaria seu nome, passando a ser conhecida como cooperativa do tipo Luzzatti, cujo capital era dividido em cotas-partes de pequeno valor, responsabilidade limitada ao valor da cota-parte e área de atuação circunscrita ao município da sede da cooperativa.

Nas Américas, o jornalista Alphonso Desjardins idealizou a constituição de uma cooperativa com características distintas, embora inspirada nos modelos preconizados por Raiffeinsen, Schulze e Luzzati. A primeira cooperativa criada por Dejardins foi a da província canadense de Quebec, em 06 de dezembro de 1900.

Esse tipo de cooperativa, que no Brasil hoje é conhecida como cooperativa de crédito mútuo, tinha como principal característica a existência de alguma espécie de vínculo entre os sócios, reunindo grupos homogêneos como os de clubes, trabalhadores de uma mesma categoria, funcionários públicos, etc.

3.1 COOPERATIVISMO DE CRÉDITO NO BRASIL O cooperativismo de crédito chegou ao Brasil em 1902, trazido pelo

Padre Theodor Amstad, desenvolvendo-se na localidade de Linha Imperial, município de Nova Petrópolis, no Rio Grande do Sul.28

Theodor Amstad, ordenado sacerdote na Inglaterra e posteriormente enviado para o Brasil, precisamente para o interior do Rio Grande do Sul,

27 PINHEIRO. Marcos Antonio Henriques Pinheiro. Cooperativas de crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006. p. 25. 28 SANTOS. João Carlos de Los. Os 25 anos da retomada do Cooperativismo de Crédito Brasileiro. Porto Alegre: Imprensa Livre, 2005. p.13.

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trabalhava como missionário, desenvolvendo trabalhos sociais nas colônias alemãs.

O pároco foi responsável pela difusão do cooperativismo, fundando em Linha Imperial a primeira cooperativa de crédito do Brasil, denominada Caixa de Economia e Empréstimos Amstad, posteriormente batizada de Caixa Rural de Nova Petrópolis. Essa cooperativa continua em atividade até hoje, sob a denominação de Cooperativa de Crédito Rural de Nova Petrópolis.

O cooperativismo de crédito se tornou viável, diante da situação econômica e social que se encontravam os imigrantes.

Com o desemprego que assombrou a Europa, os imigrantes chegaram ao Brasil com muito entusiasmo e disposição para trabalhar, entretanto, encontraram no território brasileiro situação diversa daquela prometida, pois as terras ofertadas localizavam-se longe dos centros urbanos, os terrenos localizavam-se em pequenos vales, dificultando o plantio agrícola, não havia incentivo estatal na concessão de crédito, tanto no estímulo para investir nas terras, adquirindo insumos, quanto na estruturação, para construção de estradas, pontes, etc. 29

A dificuldade também se estendia na busca de incentivos nos bancos privados, que viam a concessão de crédito como risco de investimento, sendo assim, como última instância, os colonos recorriam aos financistas mais abastardos da região, que acrescentavam juros exorbitantes sobre valor emprestado, fazendo com que os colonos vendessem suas terras para honrar com as dívidas.

Após conquistar a confiança dos colonos e implementar a primeira cooperativa, Amstad permaneceu difundindo o cooperativismo, ajudando a fundar mais cooperativas. Além disso, fortaleceu o espírito de cooperação pelo desenvolvimento sustentado, harmônico e democrático.

Em 1906, foi constituída no município de Lajeado, no Rio Grande do Sul, a primeira cooperativa de crédito do tipo Luzzatti, denominada Caixa Econômica de Empréstimos de Lajeado, como tal inspirada no modelo do italiano Luigi Luzzatti, tendo como principal característica a não exigência de vínculo para associação, ou seja, qualquer pessoa, mesmo sem vínculo ao ramo rural poderia associar-se a cooperativa. Essa cooperativa permanece em atividade, sob a denominação de Cooperativa de Crédito de Lajeado – SICREDI VALE DO TAQUARI RS, integrada ao Sistema SICREDI.

Entre 1902 e 1964, surgiram 66 cooperativas de crédito no Rio Grande do Sul, baseadas pelo modelo Raiffeisen.

3.2 DEFINIÇÃO DO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO As Cooperativas de Crédito têm como objetivo eliminar o intermediário

na captação de recursos, nos investimentos e na concessão de empréstimos, fazendo do tomador e do investidor uma só pessoa.

De forma mais satisfatória, Alcenor Pagnussatt assim define: Cooperativas de crédito são sociedades de pessoas, constituídas com o objetivo de prestar serviços financeiros aos seus associados, na forma de ajuda mútua, baseada em valores como igualdade,

29 SANTOS. João Carlos de Los. Os 25 anos da retomada do Cooperativismo de Crédito Brasileiro. Porto Alegre: Imprensa Livre, 2005. p. 14.

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eqüidade, solidariedade, democracia e responsabilidade social. Além de prestação de serviços comuns, visam diminuir desigualdades sociais, facilitar o acesso aos serviços financeiros, difundir o espírito de cooperação e estimular a união de todos em prol do bem-estar comum. 30

John T. Croteau afirma que “a cooperativa de crédito é um instrumental econômico que diligencia em desenvolver entre os seus participantes uma abordagem de eficiência empresarial na operação de suas respectivas realizações”.31

Por ser considerada uma instituição financeira por equiparação32, essas sociedades são controladas e fiscalizadas pelo Banco Central do Brasil, conforme dispõe o art. 92, I da Lei 5764/71.

O Cooperativismo de crédito, se aplicado em escala nacional, como acontece em países como a Alemanha, Canadá, Holanda, França e Estados Unidos, por exemplo, traz consigo a possibilidade de maximizar um conjunto de fenômenos de natureza sócio-econômica úteis para o desenvolvimento sustentável de um país. 33

O cooperativismo de crédito desempenha um importante papel que lhe caracteriza como propulsor do desenvolvimento econômico-social, pois:

a) O cooperativismo de crédito, como os demais ramos do cooperativismo, proporciona ao associado vivenciar um processo democrático, onde boas decisões alavancam as finanças individuais e de toda comunidade envolvida. Por exemplo: A poupança de um determinado segmento da sociedade, que se organiza em torno de uma cooperativa de crédito, é revertida em forma de crédito para o desenvolvimento da própria comunidade, aspecto fundamental, principalmente no que se refere aos pequenos empreendimentos urbanos e rurais;

b) As decisões sobre as operações de crédito a serem realizadas nessas entidades são tomadas por representantes da própria entidade local, uma vez que, as diretorias das cooperativas são formadas pelo seu quadro de associados;

c) Outra característica importante, própria de cooperativas de crédito, é a humanização do crédito, decorrente do conhecimento pessoal existente entre o tomador e o doador do crédito. Soma-se a isso, o fato de que, inúmeras cooperativas prevêem no próprio estatuto social a responsabilidade destes associados no cumprimento da suas obrigações junto à cooperativa, fazendo com que os índices de inadimplência sejam bastante reduzidos;

d) Um dos principais motivos observados na mobilização de pessoas

em torno de uma cooperativa de crédito é a possibilidade de obtenção de linhas de crédito mais adaptadas às suas demandas,

30 PAGNUSSATT, Alcenor. Guia do cooperativismo de crédito. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2004. p. 13. 31 CROTEAU, John T. A economia das cooperativas de crédito. São Paulo: Atlas, 1968. 32 As cooperativas de crédito equiparam-se a instituições financeiras, conforme dispõe a Lei 4595/64. 33 PINHO. Diva Benevides. O Cooperativismo de Crédito no Brasil. São Paulo. Confebrás, 2004. p. 106

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principalmente no que se refere às taxas de juros, tarifas, prazos e garantias;

e) Por sua natureza, as cooperativas de crédito não visam lucro, no entanto têm a necessidade de gerar sobras como elemento de sustentabilidade econômica. Por ser uma organização de pessoas, e não de capital, as sobras são distribuídas com base na movimentação financeira dos associados e não no aporte de capital;

f) Devido ao compromisso das cooperativas com seus associados, esforços sistemáticos são feitos no sentido de levar às comunidades desassistidas linhas de crédito governamentais, não repassadas em larga escala pela iniciativa bancária convencional, uma vez que esta alega baixa relação entre o custo e benefício na realização desses repasses, sobretudo os de pequeno valor. À medida que as cooperativas de crédito assumem esta atribuição, o poder público em suas três esferas, passa a contar com um novo canal de distribuição de crédito cujas características tendem a conferir alta eficiência às políticas públicas.

g) Outra forma de dar retorno ao investimento feito pelos seus associados é através do Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social, que conforme previsto em Lei34, é destinado a prestação de assistência aos associados, seus familiares e, quando previstos nos estatutos, aos empregados da cooperativa, constituídos de 5% das sobras líquidas apuradas no exercício.

Essas são algumas características das cooperativas de crédito, que já possibilitam analisar o importante papel que estas desempenham nas sociedades onde atuam.

Além disso, o cooperativismo de crédito passou por diversos aperfeiçoamentos regulamentares que influenciaram no seu crescimento, conforme trataremos no próximo item.

3.3. EVOLUÇÃO NORMATIVA Segundo Ênio Meinen et al.35. “A legislação deverá sempre buscar a

satisfação da necessidade societária, nenhuma norma sobrevive sozinha, sua dinâmica evolução é condição máxima, para que não ocorra engessamento do instituto que regula”.

Para entendermos melhor como ocorreu esse desenvolvimento no ramo das cooperativas de crédito no Brasil, vejamos de forma cronológica:

1891 – Decreto datado de 1891, segundo Carvalho de Mendonça36 foi o marco regulatório que permitiu a constituição das cooperativas de crédito. Esse decreto regulava as sociedades anônimas, o qual concedeu a autorização para ser organizada uma “Sociedade Cooperativa”, sob a forma anônima.

1903 – O Decreto do Poder Legislativo n.° 979, de 06 de janeiro de 1903, também norteou o cooperativismo de crédito. Facultou aos profissionais 34 Art. 28, II da Lei 5764/71. 35 MEINEN, Ênio et al . Aspectos jurídicos do cooperativismo. Porto Alegre: Sagra Luzatto, 2002. p. 51. 36 MENDONÇA, Carvalho de. Tratado de direito comercial brasileiro. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1957, v. 7. p. 243.

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da agricultura e industriais rurais a organizarem sindicatos para o estudo, custeio e defesa dos seus interesses. Baseado na organização livre, sem qualquer restrição ou ônus, teve seus atos constitutivos levados ao cartório de registros.

1907 – A primeira norma que permitiu o funcionamento de sociedades cooperativas foi o Decreto do Poder Legislativo n.° 1637, de 05 de janeiro de 1907, baseado na Lei Belga de 1873. Esse Decreto permitiu às cooperativas a organizarem-se sob a forma de sociedade anônima, sociedade em nome coletivo ou em comandita, sendo regidas pelas leis específicas. Permitia-se, ainda, às cooperativas, receberem dinheiro a juros não só dos associados, como de pessoas estranhas à sociedade37.

1907 – O Decreto n.° 6532, de 20 de junho de 1907, deu ampla liberdade de funcionamento às cooperativas, bastando o depósito dos atos constitutivos na Junta Comercial, tendo como obrigação, a prestação semestral da lista de sócios e as alterações estatutárias promovidas.

Segundo Waldírio Bulgarelli38, “a liberdade operacional de que gozavam as cooperativas que podiam entre outras, emprestar sob hipoteca de imóveis, penhor agrícola e “warrant” estabelecendo para este fim armazéns gerais na forma das leis em vigor. Podiam estabelecer em depósito dinheiro a juros, não só dos sócios como de pessoas estranhas à sociedade”.

1925 – Nesse ano, foi publicada a Lei n.° 4984 que eliminou as cooperativas de crédito do tipo Raiffeisen e Luzzatti da exigência de expedição de carta patente e de pagamento de quotas de fiscalização, atribuindo ao Ministério da Agricultura a incumbência da fiscalização, ao contrário dos Bancos, que eram fiscalizados pelo Ministério da Fazenda.39

Diante da fiscalização do Ministério da Agricultura, despreparado para inspecionar matéria do sistema financeiro, acabou por permitir a ocorrência de irregularidades na gestão das cooperativas de crédito. Por haver facilidade, abriam-se cooperativas para conseguir a carta bancária e, posteriormente montavam um banco mercantil ou vendiam a um banco já existente, pois para conseguir essa liberação como banco, havia mais controle, visto que as “cartas patentes” ou “cartas bancárias” eram concedidas pelo Ministério da Fazenda.

Um fato como esse ocorreu, por exemplo, com a “Sociedade Cooperativa de Crédito de Responsabilidade Limitada – Banco Popular e Agrícola Norte do Paraná”, constituída em 17 de janeiro de 1929, no município de Tomazina, que posteriormente transformou-se em Banco Bamerindus, um dos bancos mercantis privados de bastante expressão no mercado financeiro brasileiro, que nos anos 90 foi vendido para o grupo multinacional The Hongkong and Shanghai Banking Corporations, mais conhecido como HSBC40.

1926 – Diante desse processo distorcido, as cooperativas do tipo Luzzatti quase desapareceram. Então, em 02 de junho de 1926, o governo expediu o Decreto n.° 17.339, o qual determinou a obrigatoriedade de fiscalização por parte do Ministério da Agricultura nas Cooperativas de Crédito 37 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 22 38 BULGARELLI, Waldírio. As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 64. 39 PINHEIRO, Marcos Antônio Henrique. Cooperativas de crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006. p. 53. 40 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p. 46.

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do tipo Raiffeisen e Luzzatti. 41 Coube ao Serviço de Inspetoria e Fomento Agrícola a tarefa de fiscalizar as cooperativas de crédito, dando maior credibilidade às mesmas, pois estas deviam remeter à Diretoria da Inspetoria, diversos documentos, tais como o balanço anual, lista nominativa de sócios e cópia do estatuto.

1932 – Dois anos após assumir o poder, o então presidente Getúlio Vargas baixou o Decreto n° 22.239, que estabeleceu o cooperativismo Rochdaleano no País, o que se deve ao fato do Presidente Getúlio ter sido governador do Rio Grande do Sul, Estado que apresentava um cooperativismo bem desenvolvido naquela época42.

Segundo Fábio Luz Filho43, o Decreto n° 22.239, foi a terceira lei na América Latina a dar uma caracterização jurídico-doutrinária da sociedade cooperativa.

O Decreto n° 22.239 reformou as disposições do Decreto 1637, na parte referente às sociedades cooperativas.

Esta nova norma trouxe como referência o art. 30, onde as cooperativas de crédito foram definidas como aquelas que têm por objetivo principal proporcionar aos seus associados, crédito e moeda, por meio de mutualidade e da economia, mediante uma taxa módica de juros, auxiliando, de modo particular, o pequeno trabalho em qualquer ordem de atividade em que se manifeste, seja agrícola, comercial ou profissional e, acessoriamente, podendo fazer, com pessoas estranhas à sociedade, operações de crédito passivo e outros serviços conexos ou auxiliares ao crédito.

1934 – Em 10 de julho de 1934, o Decreto 24.647 revoga o Decreto 22.239, com isso todas as cooperativas de crédito passam a necessitar de autorização do governo para funcionar. O normativo ainda estabelece que as cooperativas devem ser formadas por pessoas de mesmo profissão ou de profissões afins, exceto nos casos de cooperativas de crédito formadas por industriais, comerciantes ou capitalistas que poderiam ser formadas por pessoas de profissões distintas.44

1938 – Em regime de exceção, o governo promulgou o Decreto-Lei n.° 581 que revoga o Decreto 24.647 e revigora o Decreto 22.239 de 1932.

Finalmente a democracia cooperativista foi implantada, pela força da lei da espada, acabando com a idéia de transformação de cooperativas em sociedades anônimas45.

Outra alteração relevante trazida por este Decreto foi a transferência da incumbência de fiscalização das cooperativas de crédito urbanas para o Ministério da Fazenda, mantendo as cooperativas rurais sob a fiscalização do Ministério da Agricultura.

1941 - Nesta época as cooperativas de crédito passavam por um período conturbado, devido aos desvios de valores e também as atitudes viciadas dos dirigentes das cooperativas. Esta situação vinha ocorrendo há tempos, mas piorou no período dos anos 40 e 50.

41 PINHO, op. cit., p. 46. 42 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p. 49. 43 LUZ FILHO, Fábio. O direito cooperativo. Rio de Janeiro: Irmãos Pongetti, 1962. p. 46. 44 PINHEIRO, Marcos Antônio Henrique. Cooperativas de crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006. p. 54. 45 LUZ FILHO, Fábio. O direito cooperativo. Rio de Janeiro: Irmãos Pongetti, 1962. p. 46.

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Em resposta aos acontecimentos, o governou federal determinou, através do Decreto n.° 6980, de 19 de março de 1941, que o Ministério da Fazenda fiscalizasse as cooperativas de crédito46.

1943 – Ao entrarmos nos anos 40 do século XX, notamos a presença do Estado Novo sobre o cooperativismo. Com essa influência houve a promulgação do Decreto-Lei n° 5893, de 10 de outubro de 1943, dispondo sobre a organização, funcionamento e fiscalização das cooperativas. Cria a Caixa de Crédito Cooperativo, destinada ao financiamento e fomento do cooperativismo. Este Decreto revogou novamente o Decreto 22.239, assim como o Decreto-Lei 581.

1944 – O Decreto-lei de 14 de fevereiro de 1944, alterações disposições do Decreto-Lei 5893.

1945 – Através do Decreto-Lei n° 7293, de 02 de fevereiro de 1945, criou-se a Superintendência da Moeda e do Crédito – SUMOC, como sendo órgão do Ministério da Fazenda, com a atribuição de fiscalizar bancos, casas bancárias, sociedades de crédito, financiamento e investimento e cooperativas de crédito, processando os pedidos de autorização de funcionamento, reforma de estatutos, aumento de capital, e abertura de agências, etc. Porém, as medidas legais não conseguiram estabelecer uma fiscalização efetiva e saneadora no seguimento de crédito47.

1945 – Em 19 de dezembro de 1945, o Decreto-Lei 8401, revoga os Decretos-Leis 5893 e 6274, e revigora mais uma vez, o Decreto 22.239, juntamente com o Decreto-Lei 581, mantendo a fiscalização das cooperativas sob incumbência do Ministério da Agricultura.

1951 – A Lei 1412, de 13 de agosto de 1954, transformou a Caixa de Crédito Cooperativo no Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC), com objetivo de assistência e amparo às cooperativas.

1957 – O Decreto 41.872, de 16 de julho de 1957, esclarece que as cooperativas de crédito sujeitam-se à fiscalização da SUMOC, no que relacionar com as normas gerais reguladoras da moeda e do crédito, baixadas pelo governo48.

1961 – A Portaria 1098 de 11 de dezembro de 1961, expedida pelo Ministério da Agricultura, reafirma que as cooperativas de crédito estavam sujeitas à prévia autorização do Governo para se constituírem, exceto as caixas rurais raiffeisen, as cooperativas de crédito agrícolas, as cooperativas mistas com seção de crédito agrícola, as centrais de crédito agrícola e as cooperativas de crédito mútuo.

As cooperativas do tipo Luzzatti vinham passando por séria crise, devido aos indivíduos fraudulentos que fundavam cooperativas de crédito e fugiam com o dinheiro dos associados. Diante dessa triste realidade, o presidente João Goulart baixou normas que restringiam ainda mais a abertura de cooperativas de crédito, principalmente do tipo Luzzatti. Iniciou-se então um controle mais rígido por parte do governo49. 46 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária. São Paulo: Saraiva, 2004.p. 30. 47 PINHEIRO, Marcos Antônio Henrique. Cooperativas de crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006. p. 55. 48 PINHEIRO, op. cit., p. 56. 49 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p. 53.

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A situação ficou ainda pior com o golpe militar de março de 1964 e a grande pressão dos banqueiros sobre o novo regime autoritário, o governo começou a exterminar as cooperativas de crédito.

Este foi o período de profunda crise para sistema cooperativo

brasileiro50. Todas as cooperativas de crédito caíram em descrédito. 1964 – As cooperativas já vinham sofrendo mudanças, mas a mais

significativa foi com a Lei n° 4595 de 1964, mais conhecida como Lei da Reforma Bancária, que reformou o sistema bancário e estabeleceu normas da política financeira do Governo Federal, acabando quase totalmente com as cooperativas de crédito no país – raiffeiseanas, luzzattianas, de crédito urbano e rural51. Esta lei equiparou as cooperativas de crédito às demais instituições financeiras, passando a ser fiscalizadas pelo Banco Central do Brasil – BACEN.

O Banco Central do Brasil – BACEN, foi constituído em 1964 em substituição à Superintendência da Moeda e do Crédito – SUMOC. Passou a tratar as cooperativas de crédito como instituições financeiras, atendendo ao disposto na Lei 4595/6452. Assim, as cooperativas de crédito saíram definitivamente do controle do Ministério da Agricultura e passaram a ser controladas pelo Ministério da Fazenda.

1965 – Sob a nova fiscalização, surgiram com a Resolução 11 do Conselho Monetário Nacional – CMN, de 20 de dezembro de 1965, as primeiras restrições às cooperativas de crédito, determinando a extinção das atividades creditícias exercidas por sucursais, agências, filiais, departamentos, escritórios ou qualquer outra espécie de dependência existente em cooperativas de crédito e cria diversas vedações, conforme apresentado a seguir:

IV - É vedado às cooperativas de crédito: a) usar em sua denominação a palavra "Banco"; b) realizar operações de crédito com pessoas jurídicas (ressalvando-se, em relação às cooperativas que efetuem operações de crédito agrícola, associados admitidos em conformidade com o § 2º do Art. 7º do Decreto nº 22.239: "pessoas jurídicas cuja existência tenha por fim a prática da agricultura ou da pecuária"); c) conceder empréstimos ou adiantamentos sem observância do prazo de carência de 90 dias de inscrição do associado; d) negociar, ou receber em garantia de empréstimos, títulos que não sejam emitidos diretamente a seu favor pelo associado, exceto conhecimentos de embarque, "warrants" e os respectivos conhecimentos de depósito, e promissórias rurais representativas do transporte, armazenamento ou venda de produção rural própria do cooperado; e) adquirir imóveis não destinados ao próprio uso, salvo os recebidos em liquidação de empréstimos de difícil ou duvidosa solução, caso em que deverão vendê-los dentro do prazo de um ano, a contar do recebimento;

50 BULGARELLI, Waldírio. Regime jurídico das sociedades cooperativas. Rio de Janeiro: Pioneira, 1965. p. 68. 51 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 34. 52 BANCO CENTRAL DO BRASIL. História do Banco Central. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/?HISTORIABC>. Acesso em: 11 set. 2006.

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f) manter aplicações em imóveis de uso próprio que, somadas ao seu ativo em instalações e móveis e utensílios, excedam o valor do capital realizado e reservas livres; g) outorgar aceites, avais, fianças ou outras garantias com a finalidade de facilitar o levantamento de empréstimos ou obtenção de recursos junto a terceiros, exceto em estabelecimentos oficiais de crédito; h) admitir saques a descoberto em contas de depósitos ou de empréstimos, e nestas, ainda, além do limite contratual; i) participar do capital de sociedades outras que não o do Banco Nacional de Crédito Cooperativo e o de cooperativas centrais V - As cooperativas de crédito não poderão concentrar em um só devedor mais de 5% do total dos empréstimos, nem importância superior a 20% do capital realizado da sociedade, norma que se aplica inclusive aos eventuais empréstimos a administradores, membros do Conselho Fiscal e seus parentes.53

A Resolução torna a autorizar a constituição e funcionamento de

cooperativas de crédito, sob as modalidades de cooperativas de crédito de produção rural com o objetivo de operar em crédito e cooperativas de crédito com o quadro social formado unicamente de empregados de determinada empresa ou entidade pública54.

1966 – Após um mês da publicação da Resolução n° 11, o Conselho Monetário Nacional – CMN volta a restringir a atuação das cooperativas de crédito, através da Resolução n° 15, de 20 de janeiro de 1966, que estabelece que as cooperativas de crédito e as seções de crédito das cooperativas mistas devem receber depósitos à vista exclusivamente de seus associados. Estabelece, ainda, a vedação de distribuição de eventuais sobras apuradas entre seus associados.

Após 06 meses, a Resolução n° 27 do Conselho Monetário Nacional – CMN estabelece que as cooperativas de crédito e as seções de crédito das cooperativas mistas devam receber depósitos à vista exclusivamente dos seus associados pessoas físicas, funcionários da própria cooperativa e instituições de caridade, religiosas, científicas, educacionais e culturais, beneficentes ou recreativas.

1966 – Em 21 de dezembro de 1966, com a edição do Decreto-Lei 59, determinou-se que as atividades creditórias das cooperativas somente pudessem ser exercidas em entidades constituídas exclusivamente com esta finalidade. Estabelece que as seções de crédito existentes podem passar a constituir cooperativas de crédito autônomas, cujo restrito estava assegurado, desde que cumpridas as exigências do Banco Central, ou limitar-se a fazer adiantamentos aos associados, através de títulos de crédito acompanhados de documentos que assegurasse a entrega da respectiva produção, vedando o recebimento de depósitos até mesmo de seus associados. 55

53 Lei 5764/71. Define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências. 54 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p 34. 55 PINHEIRO, Marcos Antônio Henrique. Cooperativas de Crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006. p. 58.

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Este Decreto-Lei criou o Conselho Nacional do Cooperativismo (CNC), criando um exagerado controle estatal56.

O Decreto definia a política cooperativista entendendo-a como: [. . .] as atividades decorrentes de todas as iniciativas ligadas ao sistema cooperativo, sejam originárias do setor privado ou público, isoladas ou coordenadas entre si”, e incumbindo o Governo Federal de orientar esta política, “coordenando as iniciativas que se propusessem a dinamizá-la para adaptá-las às reais necessidades de economia nacional e seu processo de desenvolvimento.57

O Decreto-Lei n° 59 sobreveio definindo a política nacional de cooperativismo e modificando a respectiva legislação. Os requisitos tipificadores da sociedade cooperativa foram mantidos nesse diploma, de conformidade com a ortodoxia doutrinária, mediante a consagração das regras de adesão voluntária, variabilidade do capital social, da inacessibilidade das quotas-partes, da singularidade do voto, do retorno das sobras líquidas na proporção das operações realizadas pelo sócio, da indivisibilidade dos fundos de reserva e da indiscriminação religiosa racial 58.

1967 – Com a promulgação do Decreto n° 60.597, de 19 de abril de 1967, que regulamentava o Decreto-Lei n° 59, o regime jurídico das cooperativas de crédito ficou completo.

Segundo Bulgarelli59 Talvez a única parte positiva do Decreto-lei 59 e seu regulamento residia no fato atentado pela primeira vez, para a parte operacional das cooperativas. Em conseqüência, vários foram os dispositivos que esclareceram as características operacionais das cooperativas, até então confundidas em grande parte com a atividade dos outros tipos de empresa não cooperativas.

1971 – O presidente Emílio Garratazu Médice assinou a Lei n.° 5764. Esta lei, denominada a Lei Cooperativista, revogou o Decreto n.° 59, instituindo o regime jurídico vigente das sociedades. Definiu as cooperativas como sociedade de pessoas, de natureza civil, mantendo a fiscalização e o controle das cooperativas de crédito e das seções de crédito das agrícolas mistas com o Banco Central do Brasil. 60

As mudanças econômicas da época eram vistas como “milagre econômico”61.

O governo conseguia dinheiro fácil no exterior e endividava a Nação. Parte dos recursos financeiros subsidiava, inclusive, os agricultores. Dessa forma, o governo conseguiu desviar a atenção dos agricultores na fundação de cooperativas de crédito, o que levou ao esvaziamento do movimento. Ocorreu uma destruição maciça, tanto de cooperativas do tipo Raiffeisen, quanto às do tipo Luzzatti, sendo que, em relação à primeira, o esmagamento foi total com a retirada das seções de crédito nas cooperativas mistas.

56 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil: da vertente pioneira à vertente solidária. São Paulo: Saraiva , 2004. p.37. 57 BULGARELLI, Waldírio. As sociedades cooperativas e a sua disciplina jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 69-70. 58 FRANKE, Walmor. Direito das sociedades cooperativas. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 141. 59 BULGARELLI, Waldírio. Regime jurídico das sociedades cooperativas. Rio de Janeiro: Pioneira, 1965. p.70. 60 PINHEIRO, Marcos Antônio Henrique. Cooperativas de crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006. 61 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p. 54.

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Durante este período, o interesse do governo estava voltado para a exportação. Com isso, entravam dólares no país e injetavam dinheiro na área rural através dos bancos, esgotando ainda mais as cooperativas de crédito.

Ao final dos anos 70, quando acabou o “milagre econômico”, as cooperativas de crédito da área rural estavam praticamente extintas e o setor agropecuário do país passou a sentir dificuldades em virtude da falta de financiamentos adequados ao desenvolvimento rural.

1982 – Diante da caótica situação em que se encontravam as cooperativas de crédito pós-ditadura militar, um cooperativista brasileiro, chamado Mário Kruel Guimarães62 iniciou a reorganização do sistema cooperativo rural.

Foram constituídas 13 cooperativas e a Cooperativa de Crédito do Rio Grande do Sul – COCECRER. O modelo institucional da COCECRER foi a base para implantação ou reestruturação das federações de crédito de outras regiões do país63. Ainda hoje está em funcionamento, sob a denominação Cooperativa Central de Crédito do Rio Grande do Sul – CENTRAL SICREDI RS.

Esta Central começou a organizar-se e expandir, servindo de exemplo para que fossem organizadas centrais em outros Estados. Porém, somente em 1984, esta Central obteve a autorização para funcionamento pelo BACEN.

A evolução das cooperativas acompanhou o movimento político de cada época, sendo que a década de 80 foi a descompressão política do Brasil, havendo uma abertura política lenta e gradual.

1988 – A matéria jurídica sobre as cooperativas surgiu com a Carta Magna de 1988, pois até então, nenhuma Constituição havia feito referência ao assunto.

Os dispositivos que aludem o cooperativismo são abordados de forma a incentivar a atividade e estão expostas na seguinte ordem.

Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [. . .] XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.64

Ficou evidente o apoio à livre iniciativa, onde a sociedade poderia livremente organizar-se, sem intervenção do governo, podendo este, no máximo atuar como agente normativo e regulador da atividade econômica, conforme podemos ver a seguir:

Art. 174 Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. [. . .]

62 Mário Kruel Guimarães, como membro da Federação de Cooperativas Agrícolas do Rio Grande do Sul (FECOTRIGO), liderou o movimento de renascimento do Cooperativismo de Crédito Rural. Segundo PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p. 67. 63 PINHO, op. cit., p. 68. 64 BRASIL. Constituição Federal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 5.

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§ 2° A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo; § 3° O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros; § 4° As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpais. [. . .] Art. 187. A política agrícola será planejada e executada, na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transporte, levando em conta, especialmente: [. . .] VI – o cooperativismo. [. . .] “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir os interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: [. . .] VIII – o funcionamento das cooperativas de crédito e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação próprias das instituições financeiras. 65

A Constituição Federal também manteve a tutela das cooperativas de

crédito submetidas ao Banco Central do Brasil – BACEN, o qual juntamente com o Conselho Monetário nacional – CMN, mantém o controle sobre as cooperativas de crédito, autorizando sua abertura e funcionamento e fazendo intervenções e liquidações quando necessárias.

Diante da evolução econômica e social, o Banco Central do Brasil edita resoluções que vão lentamente, dando maior abertura às cooperativas de crédito.

Art. 146. Cabe à lei complementar: [. . .] III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: [. . .] c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. 66

A promulgação da Constituição Federal de 1988 fortalece e incorpora valores aos dispositivos da Lei 5764/71, uma vez que, a Constituição Federal de 1969 não trazia qualquer referência a associação.

Segundo Ênio Meinen67 A República Federativa do Brasil, com a noção democrática, pluralista e solidária (arts 1º, 3º e 170, IV da Lei Suprema), baseia-se em fundamentos como cidadania, dignidade da pessoa humana, valor social do trabalho, livre iniciativa e pluralismo político, bem assim objetivos como liberdade, justiça social, solidariedade, desenvolvimento, redução de desigualdades, promoção do bem comum ou coletivo e não discriminação. Tais postulados compõe

65 BRASIL, op cit., p. 132-138. 66BRASIL. Constituição Federal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 111-112. 67 MEINEN, Ênio et al. O adequado tratamento tributário das sociedades cooperativas. Porto Alegre: Sagra Luzzato, 2003. p. 12.

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exatamente o rol de valores e princípios do cooperativismo, assim secularmente consagrados.

Entre os dispositivos, o constituinte ofertou tratamento diferenciado às cooperativas, impondo ao Estado a obrigatoriedade de privilegiar tal tipo associativo.

Celso Bastos 68 comenta o § 2° do art. 174 da Constituição Federal de 1988, dizendo:

O estímulo ao cooperativismo encontra inspiração muito visível nas Constituições portuguesa e espanhola. Tal como na nossa, o que ali se procura é fomentar essa modalidade associativa, que apresenta, sem dúvida nenhuma, um grande alcance social, quando levada a efeito, debaixo de um autêntico espírito cooperativo. No entanto, o Estado não pode impor essa modalidade de organização.

1990 – em 21 de março de 1990 o Decreto 99.192 extingue o BNCC. 1992 – Ainda neste lento caminhar, em 1992 o Conselho Monetário

Nacional - CMN aprovou a Resolução n° 1914, que regulamentou a constituição e o funcionamento das cooperativas de crédito. Vedando a constituição de cooperativas de crédito do tipo “luzzatti” e estabelecendo como tipos básicos as cooperativas de economia e crédito mútuo e as cooperativas rurais.

1995 – Diante das pressões das Centrais de cooperativas de crédito, o Banco Central do Brasil – BACEN editou a Resolução n° 2193 permitindo as cooperativas centrais constituírem bancos privados. Este fato se deu, em função da extinção do Banco Nacional do Cooperativismo de Crédito – BNCC e por determinação legal as cooperativas de crédito eram obrigadas a ser clientes exclusivas do Banco Central do Brasil, o que gerou uma relação cartorial pela obrigação de estarem submissas a um determinado banco.

Neste vínculo de dependência, o Banco do Brasil cobrava muito caro pelos seus serviços, o que inviabilizava as cooperativas de crédito. As cooperativas se organizaram de modo a pressionar o governo e conseguiram que o então presidente Fernando Henrique Cardoso, em conjunto com então presidente do BACEN, expedissem a Resolução n° 2393, de 31 de agosto de 1995, a qual permitiu que as centrais das cooperativas de crédito fundassem seus bancos cooperativos privados.

A partir daí nasce o primeiro banco cooperativo, o Banco Cooperativo SICREDI S.A., em 16 de outubro de 1995, ligado às cooperativas filiadas ao Sistema de Crédito Cooperativo – SICREDI, com operação em seis estados brasileiros (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo).

Segundo Schardong: [.. .] os bancos cooperativos eram peças indispensáveis às Cooperativas de Crédito para que estas pudessem acessar os mecanismos operacionais próprios dos bancos comerciais, sem perderem a condição societária particular de ser cooperativa.69” (Grifo nosso)

Os bancos cooperativos oferecem às cooperativas de crédito, além da centralização financeira, diversas operações de crédito, por meio de

68 BASTOS, Celso. Comentários à Constituição do Brasil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, v. 7. p. 101-103. 69 SCHARDONG, Ademar. Cooperativa de crédito: instrumento de organização econômica da sociedade. Porto Alegre: Rigel, 2002.

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financiamentos, linhas de repasse, bem como transferência de recursos, cobrança, cartão de crédito e outros serviços. Oferecem, ainda, por intermédio, uma gama de produtos e serviços financeiros: conta corrente, cobrança, home-banking, recebimento de contas, depósitos, investimentos (CDB e RDB) e linhas de crédito (cheque especial, empréstimos, desconto de duplicatas, capital de giro, crédito rural, repasse).

Outras resoluções foram sendo baixadas em virtude do crescimento das cooperativas de crédito. Assim o BACEN e o CMN aumentam a fiscalização sobre as cooperativas.

1998 – O BACEN baixou a Resolução n° 2554 tornando obrigatória a aplicação do Acordo da Basiléia 70 em cooperativas de crédito, tal como ocorre com os bancos.

1999 – Foi emitida a Resolução 2608, que estabeleceu auditoria obrigatória nas cooperativas de crédito singulares, sendo aplicada pelas centrais. A referida Resolução estipulou um prazo de dois anos para que se extinguissem as poucas cooperativas Luzzatti que restavam no país. Esta determinação gerou um descontentamento geral representado pela Confederação Brasileira das Cooperativas de Crédito – CONFEBRÁS, primeira confederação das cooperativas de crédito, criada em 1986.

2000 - No embate, o CMN e o BACEN recuaram, baixando no ano de 2000 a Resolução n° 2771, em substituição a Resolução n° 2608/99. Com isso, permaneceram em funcionamento as cooperativas Luzzatti remanescentes, sendo vedada a abertura de novas cooperativas Luzzatti.

2002 – Com as alterações trazidas pelo novo Código Civil, os artigos 1093 a 1096 passaram a estabelecer sobre a sociedade cooperativa, remetendo a regulamentação do tipo jurídico das cooperativas à lei especifica (5764/71).

2002 – Com a Resolução n° 3058 de dezembro de 2002, o BACEN possibilitou a formação de cooperativas de pequenos empresários, microempresários e microempreendedores, responsáveis por negócio de natureza industrial, comercial ou prestação de serviços, incluídas as atividades da área rural, cuja receita bruta anual, por ocasião da associação, seja igual ou inferior ao limite estabelecido na legislação vigente para pequenas e microempresas71.

2003 – De grande importância para o fortalecimento e crescimento das cooperativas de crédito no país, foi editada a Resolução 3106, em 25 de junho de 2003. A resolução aprimora dispositivos regulamentares, aplicáveis às cooperativas de crédito, fortalece o papel das cooperativas de crédito centrais e permite a criação de cooperativas de livre admissão de associados. A medida foi precedida de ampla consulta ao setor cooperativo de crédito e representante de vários órgãos do Poder Executivo, reunidos em Grupos de trabalho coordenados pelo Ministério da Fazenda.

70 ACORDO DA BASILÉIA: Acordo firmado em 1988 no âmbito do BIS (Bank for International Settlements – Banco Internacional de Compensação ou Banco para Pagamentos Internacionais) que contém resoluções para o requerimento de capital próprio das instituições financeiras (associadas) em função do risco apresentado em suas operações financeiras. Disponível em: <http://www.ajudabancaria.com/termos_mercado_a.html>. Acesso em: 14 set. 2006. 71 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Editora Confebrás, 2004. p. 60.

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Segundo Ênio Meinen72, a edição da Resolução n° 3.106/03, não desmerecidos outros possíveis balizadores, assenta-se em quatro importantes pressupostos: o cumprimento do Art. 5o., XVII, c/c com Art. 174, § 2o., de nossa Constituição Federal (dispositivos que, sob o manto do incentivo ao cooperativismo, ordenam a livre admissão de associados); a efetividade do discurso do atual Governo, que evidencia apoio ao desenvolvimento das cooperativas de crédito; o atendimento de antigo (o mais importante) apelo do setor e, finalmente, o reconhecimento (pela autoridade controladora e reguladora) da maturidade das cooperativas de crédito, especialmente quando reunidas em sistemas integrados.

2003 – A Resolução 3140 permite a constituição de cooperativas de crédito de empresários participantes de empresas vinculadas diretamente a um mesmo sindicato patronal. Permite que as cooperativas de livre admissão instalem postos sem necessidade de atendimento aos novos requisitos estabelecidos na Resolução 3106.

2003 – Ainda, em 17 de dezembro do mesmo ano, a Resolução n° 3156 autorizou as cooperativas a contratarem correspondentes no País, nas mesmas condições das demais instituições financeiras.

2004 – Em 29 de março de 2004, a Resolução n° 3188, autorizou aos bancos cooperativos o recebimento de poupança rural, ficando a contratação de correspondente no país, para esse fim, limitadas às cooperativas de crédito rural e as de livre admissão de associados.

2005 – A Resolução 3309 dispõe sobre a certificação de empregados das cooperativas de crédito, assim como autoriza as cooperativas de crédito a atuarem na distribuição de cotas de fundos de investimento abertos.

2005 – Em 30 de setembro de 2005, a Resolução 3321, revogou a

Resolução 3106 e a 3140, reproduzindo, em linhas gerais, as diretrizes dos normativos revogados. Possibilitou a constituição de cooperativas de livre admissão de associados em regiões com até 300 mil habitantes, permitiu novas possibilidades de constituição de cooperativas com quadro social segmentado, ampliou o limite de diversificação de risco, tanto para cooperativas singulares, quanto para centrais, possibilitou a instalação de postos de atendimento eletrônico, assim como revogou a proibição de instalação de postos de atendimento por parte de cooperativas luzzattis, além de outras alterações de menor impacto. 73

A regulamentação das cooperativas de crédito deverá estar voltada para facilitar seu acesso na participação de organização populacional. Atualmente, as cooperativas de crédito já conseguem atuar dessa forma em localidades de difícil acesso a serviços financeiros, locais às vezes, distantes dos grandes centros. Isso ocorre através da mobilização de associados e a conseqüente aplicação de recursos na localidade, estimulando pequenos empreendimentos rurais e urbanos geradores de emprego e renda.

72 MEINEN, Ênio. A Resolução n° 3.106/03: razões e efeitos da livre admissão. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/SeMicro2/Trabalhos/05_2T_Enio.doc>. Acesso em: 13 set. 2006. 73 PINHEIRO, Marcos Antônio Henrique. Cooperativas de Crédito. Brasília: Banco Central do Brasil, 2006.

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Ao tratarmos da evolução normativa, verificamos o quanto essas instituição eram limitadas e suas operações restritas. Hoje, dentro das operações que estão autorizadas, as cooperativas de crédito podem74:

Na ponta da captação: a) Captar depósitos, somente de associados, sem emissão de

certificado; b) Obter empréstimo ou repasses de instituições financeiras nacionais

ou estrangeiras; c) Receber recursos oriundos de fundos oficiais, e recursos, em

caráter eventual, isentos de remuneração, ou a taxas favorecidas, de qualquer entidade na forma de doações, empréstimos ou repasses.

Na ponta de empréstimos: a) Conceder créditos e prestar garantias, inclusive em operações

realizadas ao amparo da regulamentação do crédito rural em favor de produtos rurais, somente a associados;

b) Aplicar recursos no mercado financeiro, inclusive em depósitos a vista e a prazo com ou sem emissão de certificado, observadas eventuais restrições legais e regulamentares específicas de cada aplicação.

Na ponte de serviços: a) Prestar serviços de cobrança, de custódia, de recebimentos e

pagamentos por conta de terceiros sob convênio com instituições públicas e privadas,

b) Prestar serviços de correspondente no País, nos termos da regulamentação em vigor.

Conforme vimos, a partir de 2002, a quantidade de normativos de incentivo, fomento e apoio ao cooperativismo, aumentaram consideravelmente. Se compararmos o crescimento e a representatividade do cooperativismo de crédito no Brasil, conforme tabela abaixo, percebemos que, coincidentemente, o período de maior crescimento na participação de ativos ocorreu justamente a partir de 2002, o que evidencia a grande influência destes normativos no crescimento do cooperativismo que, apesar de ocupar ainda um pequeno espaço no Sistema Financeiro Nacional, vem apresentando um expressivo crescimento no percentual de participação destes ativos.

Comparando essa participação com a Alemanha75, por exemplo, onde o cooperativismo de crédito representa cerca de 16% dos ativos daquele poderoso mercado financeiro, percebe-se que o cooperativismo de crédito no Brasil ainda tem um grande espaço e potencial para crescimento.

74 FORTUNA, Eduardo. Mercado financeiro. Rio de Janeiro: Ed. Qualitymark, 2005.p. 31 75 PAGNUSSAT. Alcenor. Guia do cooperativismo de crédito. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2004 p. 46.

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Participação percentual das instituições do segmento bancário nos ativos deste segmento (em percentual)76

Quadro 2 - Participação das instituições bancárias nos ativos do segmento

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Instituição do segmento bancário Dez Dez Dez Dez Dez Dez Dez Dez Dez

Bcos Públicos

(+ Caixas Estaduais) 21,9 19,1 11,4 10,2 5,6 4,3 5,9 5,8 5,5

Banco do Brasil 12,5 14,4 17,4 15,8 15,6 16,8 17,1 18,4 17,4

Caixa Econômica Federal 16,5 16,6 17,0 17,1 15,4 11,0 11,7 13,0 11,5

Bcos Privados Nacionais 38,3 36,8 35,3 33,1 35,2 37,2 36,9 40,8 41,7

Bcos com Controle Estrangeiro 10,5 12,8 18,4 23,2 27,4 29,9 27,4 20,7 22,4

Cooperativas de Crédito 0,3 0,4 0,5 0,7 0,8 0,9 1,0 1,3 1,4

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: Banco Central do Brasil - Cosif - transação PCOS200 (doc. 4016)

3.4 DIFERENCIAÇÃO ENTRE COOPERATIVAS DE CRÉDITO E BANCOS O principal diferencial das cooperativas de crédito em relação aos

bancos é a ausência de lucro. As cooperativas de crédito têm como finalidade prestar serviços financeiros aos seus associados, trazendo por conseqüência uma melhor qualidade de vida devido ao acréscimo de renda.

Este tipo sui generis77 de sociedade, entretanto, subordina-se aos vários ramos do direito, não só em relação a sua estrutura orgânica, mas também, em relação às atividades que realiza.

Com o advento da Lei da Reforma Bancária as cooperativas de crédito foram equiparadas às instituições financeiras. Passaram a ser reguladas pelo Banco Central. Porém, há apenas uma equiparação entre cooperativa e as instituições financeiras em geral, porque as diferenças são muitas.

Ênio Meinen et al.78 bem destacam as diferenças: a) Quanto ao tipo de sociedade: os bancos são sociedades de capital,

onde o poder é exercido na proporção do número de ações, enquanto que as cooperativas de crédito são sociedades de

76 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Participação percentual das instituições de segmento bancário nos ativos deste segmento. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/htms/Deorf/r200412/quadro15.asp?idpai=REVSFN200412>. Acesso em: 03 out. 2006. 77 LUZ FILHO, op. cit., p. 64. 78 MEINEN, Ênio et al. Cooperativas de Crédito no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sagra

Luzzato, 2002a, p. 16-17.

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pessoas, onde o voto tem peso igual para todos (uma pessoa, um voto);

b) quanto às deliberações: nos bancos as deliberações são concentradas, já nas cooperativas de crédito as decisões são compartilhadas entre muitos;

c) administração: nos bancos, o administrador é um terceiro (homem do mercado), já nas cooperativas de crédito o administrador é do meio (cooperativado);

d) quanto ao usuário: nos bancos, o usuário das operações é mero cliente e não exerce qualquer influência na definição do preço dos produtos; enquanto que nas cooperativas de crédito o usuário é o próprio dono (cooperativado) e, toda a política operacional é decidida pelos próprios usuários/donos (cooperativados);

e) quanto à distinção: os bancos podem tratar distintamente cada usuário, beneficiando grandes correntistas e investidores, oferecendo taxas de juros e prestação de serviços mais barata; já nas cooperativas de crédito os associados não podem ser distinguidos: o que vale para um, vale para todos (Art. 37 da Lei nº 5.764/71);

f) propósitos: os bancos têm propósitos mercantis, já nas cooperativas de crédito a mercancia não é cogitada (Art. 79, parágrafo único, da Lei nº 5.764/71);

g) atendimento: os bancos atendem em massa, priorizando ademais, o auto-serviço/a automação; já as cooperativas de crédito visam o atendimento personalizado/individual, com o apoio da informática;

h) resultados: os bancos visam o lucro por excelência, o resultado é de poucos (acionistas), enquanto que nas cooperativas o lucro está fora do seu objeto social (Art. 3 da Lei nº 5.764/71) e o excedente (sobras) é distribuído entre todos (usuários), na proporção das operações individuais, reduzindo ainda mais o preço final pago pelos cooperativados;

i) no plano societário: os bancos são regulados pela Lei nº 6.404/76 – Lei das Sociedades Anônimas, enquanto que as cooperativas de crédito são reguladas pela Lei nº 5.764/71 - Lei Cooperativista.

Pontes de Miranda79, ao particularizar a identidade cooperativa, preleciona que “[. . .] é sociedade em que a pessoa do sócio passa à frente do elemento econômico e as conseqüências da pessoalidade da participação são profundos, a ponto de torná-las espécie de sociedade”.

Este assunto é inesgotável e está de longe de ser concluído. O importante é demonstrar que a cooperativa de crédito é uma sociedade distinta das outras, pois é uma sociedade de pessoas na qual o associado é o dono do empreendimento cooperativo e não cliente. 80

3.5 SISTEMAS DE CRÉDITO COOPERATIVO

De acordo com o que já mostramos no capítulo anterior, na medida em que

as cooperativas vão se desenvolvendo, na busca de redução de custos, 79 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Bardoi, 1964, Tomo 49. p. 429. 80 FRANKE, Walmor. Direito das sociedades cooperatives. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 141.

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melhoria da qualidade, disponibilidade e acesso aos produtos, vão adequando suas estruturas e se organizando de forma sistêmica, através da constituição de entidades de segundo e terceiro graus (centrais e confederação) e empresas com abrangência estadual e nacional.

No Brasil, atualmente, o Sistema Pioneiro de Crédito Cooperativo é composto de três macrosistemas – SICREDI, SICOOB e UNICRED. Um quarto sistema emergente está se concentrando especialmente no cooperativismo de crédito solidário (CRESOL, ECOSOL, CREHNOR e outras)81.

Vejamos os Sistemas de Cooperativas de Crédito mais representativos, com suas respectivas características. 3.5.1 SICREDI

SICREDI (Sistema de Crédito Cooperativo) – É um conjunto harmônico de cooperativas de crédito que funcionam com regras administrativas, operacionais e jurídicas uniformes. Este sistema se destacou na retomada de 1980, fase da reorganização e do crescimento do cooperativismo de crédito no Brasil. Seu foco inicial estava voltado para o atendimento dos produtores rurais.

A partir de 1995, com a constituição do Banco Cooperativo SICREDI, o sistema passou a operar com todos os produtos e serviços permitidos aos bancos convencionais. Esta nova realidade permitiu manter a competência principal no atendimento aos produtores rurais, ao mesmo tempo em que passou a atender o público em geral (em nome das cooperativas ou do seu banco). 82

Nos grandes centros destaca-se no desenvolvimento das cooperativas segmentadas nas categorias profissionais.

O sistema está estruturado em três níveis, no primeiro as cooperativas singulares, no segundo, as centrais estaduais e no terceiro a Confederação e o Banco Cooperativo. Além disso, possui vinculado ao sistema empresa de informática, administradora de cartões, corretora de seguros, empresa de consórcio e uma fundação.

A missão principal do SICREDI concentra-se, especialmente, na oferta de soluções financeiras com objetivo de agregar renda e contribuir para a melhoria da qualidade de vida de seus associados. 83

A história do SICREDI é a própria história do cooperativismo de crédito brasileiro, pois a primeira caixa rural Raiffeisen, na localidade de Linha Imperial (Município de Nova Petrópolis), é o ponto de partida e também a base do SICREDI. Essa primeira cooperativa existe até hoje, sob a denominação de Cooperativa de Crédito Rural de Nova Petrópolis – SICREDI Pioneira, marco do SICREDI. 3.5.2 SICOOB

SICOOB (Sistema das Cooperativas de Crédito do Brasil) – É um sistema integrado de cooperativas e está presente em quase todos os estados brasileiros. As cooperativas integrantes deste sistema possuem grande

81 PINHO. Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Confebrás, 2004. p. 20. 82 PAGNUSSAT. Alcenor. Guia do cooperativismo de crédito. Sagra Luzzatto: Porto Alegre, 2004. p. 27. 83 PINHO. Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Confebrás, 2004. p. 20.

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diversidade de público-alvo (associados) e de operacionalidade (estrutura administrativa, produtos, serviços, etc).

Todas as cooperativas do sistema SICOOB são complementares, embora tenham gestão independente e responsabilidades próprias 84.

O SICOOB também se encontra estruturado em três níveis, apresentando em primeiro nível as cooperativas singulares, em segundo, as centrais estaduais e em terceiro a Confederação e o Banco Cooperativo – BANCOOB. Salienta-se que nesse sistema as cooperativas singulares apresentam maior autonomia quanto à escolha de seu público alvo, área de ação, estruturação administrativa, etc. As centrais estaduais também possuem algumas peculiaridades, como características diferentes entre os estados, sendo que em alguns lugares uma central comporta as cooperativas rurais e urbanas e em outros, existem duas centrais, sendo uma composta por cooperativas rurais e outra pelas urbanas.

Estão vinculadas a este sistema uma empresa de informática, a administradora de cartões de crédito e a corretora de seguros. 3.5.3 UNICRED

Este sistema é constituído por cooperativas de Economia e Crédito Mútuo dos Médicos, mas com abrangência para os demais profissionais da área da saúde. Surgiu no município de Casca, interior do Rio Grande do Sul, como a primeira cooperativa de profissionais liberais (médicos).

Pelo pioneirismo desta categoria, teve dificuldades para obter a autorização de funcionamento do Banco Central do Brasil.

Foi significativa a vitória da persistente luta que, durante alguns anos, enfrentaram os médicos da Unimed do Brasil, com o apoio das centrais de cooperativas de crédito mútuo e do cooperativismo brasileiro em geral 85.

Atualmente possui cooperativas espalhadas em quase todas as capitais dos estados brasileiros. Possuem um forte relacionamento com as UNIMEDs (Cooperativa de Trabalho Médico).

O sistema comporta três graus, no primeiro as cooperativas singulares,

no segundo grau as centrais estaduais (únicas por estado ou região) e em terceiro grau a confederação.

Observa-se que este sistema não possui banco cooperativo, sendo assim, utiliza-se de bancos públicos e privados para executar as operações específicas desta instituição. 3.5.4 Sistema de Crédito Cooperativo Solidário

O sistema de crédito cooperativo solidário é constituído por diversos

tipos de ações que priorizam a população de baixa renda, urbana e rural. Contam com apoio particular (inclusive grupos religiosos) e apoio oficial (especialmente do governo FHC e Lula). 86

84 PINHO. Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Confebrás, 2004. p. 22. 85 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Confebrás, 2004. p. 22. 86 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Confebrás, 2004. p. 28.

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Entre os principais exemplos de cooperativas de crédito solidário destaca-se a CRESOL e a ECOSOL.

A CRESOL é um sistema integrado que se articula com movimentos e organizações populares para captar recursos em municípios e neles reaplicá-los. O sistema conta também com recursos estaduais, nacionais e internacionais para a promoção do desenvolvimento local sustentável.

Este sistema é constituído por pequenas cooperativas de crédito rural com atuação nos estados do sul do Brasil. Tem como principal objetivo, atender as necessidades de crédito rural, embora realize também outras operações bancárias em convênio com banco público.

O sistema está estruturado em dois graus, sendo em primeiro grau as cooperativas singulares, com área de atuação municipal e em segundo grau, contam com uma central estadual. Não possuem entidade de terceiro grau, nem banco cooperativo, mantendo suas operações com bancos públicos.

A ECOSOL é constituída por pequenas cooperativas de crédito rural e urbano, com atuação em vários estados brasileiros. Além de seu objetivo principal de ser instrumento de acesso ao crédito, realiza as demais operações bancárias em convênio com banco público. Recebem apoio institucional da Central Única dos Trabalhadores – CUT, da Agência de Desenvolvimento Solidário – ADS e de outras entidades não-governamentais.

O sistema está estruturado em dois graus, em primeiro grau, encontra-

se as cooperativas singulares com atuação regional. Para apoiar as atividades desenvolvidas pelas singulares, o sistema utiliza-se de Bases de Apoio, o qual se encarrega de assessorar a gestão das cooperativas e capacitar associados e dirigentes. Em segundo grau contam com uma central estadual.

Também não possuem entidade de terceiro grau (confederação), nem banco cooperativo, mantendo suas operações com banco público.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o término do desenvolvimento do presente estudo, verificamos que o cooperativismo de um modo geral está presente no nosso dia-a-dia, ainda que de forma imperceptível para a grande maioria das pessoas, pois a liberdade, a livre iniciativa, a redução de desigualdades, a solidariedade, a promoção do bem comum ou coletivo e a não discriminação, integram alguns dos valores e princípios do cooperativismo que, por sinal, estão presentes na nossa Constituição Federal.

Isso mostra que, para apoiarmos ou praticarmos alguns destes valores do cooperativismo, não precisamos necessariamente ser vinculados ou cooperados a alguma cooperativa. Basta entendermos que tudo isso demonstra a soma de valores individuais e coletivos perpetuados ao longo de inúmeros séculos, e que foram considerados fundamentais para a melhoria da convivência e, consequentemente para o crescimento da coletividade.

Importante ressaltar o papel que a educação, repassada de geração para geração, teve para a solidificação desses conceitos junto à sociedade. Caso essa educação tivesse sido feita de forma mais estruturada, ou com foco voltado ao cooperativismo, certamente a sociedade estaria preparada assim como em alguns países mais desenvolvidos, onde o cooperativismo é

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percebido efetivamente como um instrumento de organização e desenvolvimento da sociedade.

Nesse sentido, há inúmeras iniciativas no meio cooperativo, que incluem metodologias cooperativas no currículo escolar, com o objetivo dos alunos vivenciarem a cooperação em sala de aula e dentro do ambiente da escola, levando para suas famílias e comunidade ações cooperativas baseadas em ética, cidadania, resgate de valores e cuidados com o meio ambiente, como exemplo.

Além de atuar de forma pró-ativa na formação de indivíduos conscientes e solidários, visam contribuir também na formação de futuros líderes que possam influenciar a comunidade na busca de soluções para seus problemas locais, incentivando o empreendedorismo através da cooperação.

O cumprimento da missão cultural, educacional, social e econômico-financeira do cooperativismo de crédito (principalmente), passa pela intensificação das iniciativas de educação junto à sociedade, porém para que os resultados obtidos sejam realmente satisfatórios, é necessário também que cada indivíduo entenda seu papel nesse contexto, qual seja, o de compreender, aceitar, aplicar e transmitir esses valores e princípios às pessoas do seu convívio social.

Vale lembrar que, segundo alguns especialistas em desenvolvimento econômico, a educação é fundamental para que ocorra a efetiva promoção do desenvolvimento econômico e social.

Da mesma forma, entende Diva Benevides, que: “A importância da educação cooperativa é ainda maior, atualmente, porque o cooperativismo de crédito vem sendo supervalorizado como instrumento de inclusão econômica e social, tanto por autoridades governamentais e financeiras, como por empresários, acadêmicos, educadores, universitários, líderes políticos e populares, e pela população em geral, desejosa de melhorar seu padrão de vida”. 87

Soma-se a isso, a importância de que todos entendam que, para que o cooperativismo consiga cumprir sua missão social, terá que inicialmente alcançar a viabilidade econômico-financeira do empreendimento cooperativo, pois do contrário, a missão social, cultural e educacional não serão possíveis ou não se perpetuarão.

Para que fosse possível às cooperativas obterem essa viabilidade econômico-financeira, foram necessárias inúmeras iniciativas ao longo dos anos. Dentre elas, destaca-se a estruturação das cooperativas em Sistemas Cooperativos, com entidades de primeiro, segundo e terceiro graus, por exemplo, com o objetivo de obtenção de escala, padronização de marca e políticas, e redução substancial dos custos operacionais, além de possibilitarem às entidades de primeiro grau, um foco totalmente voltado às necessidades dos seus associados, ou seja, aos donos do negócio. Além dessa iniciativa, contribuíram também para o crescimento do cooperativismo nos últimos anos, a profissionalização dos dirigentes e do quadro funcional e o constante investimento em tecnologia da informação, visto que os usuários destes serviços financeiros (sejam eles, associados de cooperativas de crédito ou clientes de bancos) possuem um altíssimo nível de exigência quanto à 87 PINHO, Diva Benevides. O cooperativismo de crédito no Brasil. São Paulo: Confebrás, 2004. p. 12.

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qualidade, confiabilidade, disponibilidade e acesso aos produtos e serviços, bem como ao atendimento disponibilizados por estas instituições.

Além dos esforços das próprias cooperativas na busca da viabilidade-econômica, é imprescindível que o Estado como detentor do poder promova o incentivo, fomento e apoio constante ao cooperativismo.

Nesse contexto, um grande marco da evolução normativa pelo qual passaram as cooperativas de crédito, foi a promulgação da Constituição Federal de 1988, justamente pelo fato de possibilitar o funcionamento destas sem interferência governamental.

Conforme constatamos no estudo da evolução normativa, alguns passos já foram dados, pois a flexibilização dos regulamentos, possibilitou um significativo crescimento das cooperativas de crédito no mercado financeiro, mesmo que a representatividade ainda seja singela.

Ocorre que, a legislação específica do cooperativismo (lei 5764/71) não conseguiu acompanhar inúmeras mudanças ocorridas no Brasil nos últimos 35 anos. Nesse período, a evolução normativa foi fundamentada somente em regulamentos do Banco Central do Brasil – deixando o cooperativismo baseado quase que, de forma integral à legislação financeira - que, por sinal, possibilitou às cooperativas de crédito atuar no mercado financeiro respeitando suas peculiaridades e autonomia em relação aos bancos.

Quem sabe a falta de vontade governamental na demora da alteração e atualização da lei não seja decorrente dos interesses escusos dos grandes bancos, por visualizarem nas cooperativas um efetivo instrumento de organização da sociedade capaz de contribuir para a eficiência econômica e eficácia social desta?

Será que a agregação de renda aos associados e sociedade ao qual as cooperativas de crédito se propõem – através de menores taxas de juros nos empréstimos, na aplicação dos investimentos na própria região onde atua, na distribuição das sobras para os seus associados (donos) – não é efetivamente uma ameaça a ser combatida ou postergada?

Qual a certeza que fica? Independentemente do que pensam os Bancos e o próprio governo a respeito, particularmente acredito que efetivamente o cooperativismo de crédito contribui para eficiência econômica e a eficácia social. Precisamos entender, porém, que para que essas funções sociais possam ser exercidas, há necessidade de haver uma gestão especializada e economicamente eficiente, pois se não existir a eficiência econômica também não existirá a geração de renda e, portanto, não haverá eficácia social.

Para demonstrar alguns exemplos da eficiência econômica e a eficácia social das cooperativas de crédito, vejamos os seguintes dados:

a) de acordo com o Banco Central, entre junho de 2003 e dezembro 2004, a carteira de crédito das cooperativas passou de R$5,524 bilhões para R$ 8,285 bilhões, um crescimento de 50%;

b) no país, conforme dados da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), 84 cooperativas entraram em processo de constituição em 2004. Atualmente, operam no país 988 cooperativas de crédito urbano. Juntas emprestam R$7,4 bilhões em 2004, três vezes mais do que em 2.000, quando o total de empréstimos alcançou 2,4 bilhões;

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c) em dezembro de 2004 o sistema cooperativo de crédito representava mais de 2,30% das operações de crédito do país.

Um confronto com a realidade das cooperativas de outros países também demonstra o caminho a seguir. Na Alemanha, as cooperativas de crédito possuem cerca de 15 milhões de associados e respondem por cerca de 20% de todo o movimento financeiro-bancário do país. Na Holanda, o banco cooperativo Rabobank atende a mais de 90% das demandas financeiras rurais. Nos EUA há mais de 12 mil unidades de atendimento cooperativo no País.

O dinheiro é o sangue que irriga a economia. Atualmente o crédito sustenta em torno de 32% da economia, um salto em relação aos 20% que vigoravam na década passada. O Sistema Financeiro passa por mudanças importantes e o cooperativismo de crédito mostra vitalidade sem precedentes59.

Hoje as maiores dificuldades ao acesso ao crédito é o alto custo das taxas de juros praticadas no mercado. Desta forma, a cooperativa de crédito surge como uma alternativa, oferecendo menor custo financeiro, porque o tomador será dono de um banco, ou seja, sua própria cooperativa de crédito.

Esses dados demonstram o potencial de crescimento do cooperativismo de crédito no País, seguimento considerado ainda extremamente modesto se comparado ao de outros países mais desenvolvidos.

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