A Ética Na Pesquisa Agropecuária
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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A ÉTICA NA PESQUISA AGROPECUÁRIA:
PERCEPÇÃO DOS PESQUISADORES DA EMBRAPA
Regina Lucia Ramos Lourenço
Orientador: Marcel Bursztyn
Dissertação de Mestrado
Brasília-DF: Fevereiro/2006
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A ÉTICA NA PESQUISA AGROPECUÁRIA:
PERCEPÇÃO DOS PESQUISADORES DA EMBRAPA
Regina Lucia Ramos Lourenço
Dissertação de Mestrado submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Grau de Mestre em Desenvolvimento Sustentável, área de concentração em Política e Gestão de C&T, opção Profissionalizante.
Aprovado por:
___________________________________________________ Marcel Bursztyn, Doutor (CDS/UnB) (Orientador) ____________________________________________________ Magda Eva Soares de Faria Wehrmann, Doutora (CDS/UnB) (Examinadora Interna) ____________________________________________________ Cyro Mascarenhas Rodrigues, Doutor (Embrapa) (Examinador Externo) Brasília-DF, 23 de fevereiro de 2006
LOURENÇO, REGINA LUCIA RAMOS
A Ética na Pesquisa Agropecuária: Percepção dos Pesquisadores da Embrapa, 213p. (UnB-CDS, Mestre, Política e Gestão de C&T, 2006).
Dissertação de Mestrado – Universidade de Brasília. Centro de Desenvolvimento Sustentável.
1. Ética na pesquisa 2. Integridade científica
3. Pesquisa agropecuária 4. Ética institucional
5. Gestão da ética
É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta dissertação e emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. O autor reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta dissertação de mestrado pode ser reproduzida sem a autorização por escrito da autora.
REGINA LUCIA RAMOS LOURENÇO
DEDICATÓRIA
A minha mãe, Professora Maria Ramos Silva (in memorian), a quem devo o prazer de me lançar em vôos mais altos.
A Romualdo, meu marido, meu grande incentivador em todos os empreendimentos em que me
aventuro e que merece toda a minha admiração e amor.
Aos meus filhos Karen Roberta e Rhaicon, como prova de que esforço e determinação nos levam a realizar sonhos.
Ao meu pai, Waldemar Bispo da Silva (in memorian), por meio de quem fui apresentada à
simples e ao mesmo tempo complexa contemplação da vida.
AGRADECIMENTOS
A Deus, que me proporciona, a cada dia, oportunidades de crescimento pessoal e profissional.
À Embrapa, empresa séria e à frente de seu tempo, que compreende a necessidade de se capacitar pessoas como forma de desenvolvimento do país, na pessoa de seus gerentes,
pesquisadores e demais empregados, pela viabilização desse curso e pela disposição em contribuir para as pesquisas, objeto deste trabalho.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Marcel Bursztyn, pessoa com a qual tive o privilégio de estudar e conviver. Profissional competentíssimo e pessoa humana admirável. A ele, cuja paciência e
tranqüilidade, tiveram o poder de tirar todas as minhas dúvidas e de transformar grandes problemas em simples soluções.
À Magali dos Santos Machado, minha conselheira acadêmica, que me acompanhou nessa
jornada com boa vontade, disposição e eficiência.
A todos os Professores do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, pessoas competentes e comprometidas com a causa do desenvolvimento da
humanidade com maior justiça social, em especial ao Prof. Dr. Arthur Oscar Guimarães, que me apresentou o desenvolvimento sustentável e por meio de quem pude me tornar uma
militante.
Durante nossa vida, adotamos vários ídolos, que são pessoas que admiramos e a quem tributamos respeito e afeto. Às vezes eles participam ativamente da nossa vida como é o caso
de Tércia Zavaglia Torres Ribeiro, amiga de todas as horas, de todas as situações. Às vezes são pessoas que passam por nossa vida e que deixam importantes lições (mesmo que não
tenham tido essa intenção). É o caso do Prof. Dr. Mário César Ferreira, da UnB, pelo incentivo recebido nesse empreendimento.
Aos doutores Levon Yeganiantz, Diva Dusi, Julio Lhamby e Paulo Fresneda, pela
contribuição durante diferentes etapas desse projeto.
Aos meus irmãos, que contribuíram com a minha educação e em especial a Margareth Ramos pelo apoio à concretização desse ideal.
Aos amigos que compreenderam (ou não), meu retiro progressivo para a realização desse
curso.
Ao pessoal da SNT pelo apoio imaterial.
Àqueles que acompanharam passo a passo o desenvolvimento desse trabalho, incentivando-me e contribuindo para o meu equilíbrio espiritual e emocional: Romualdo, Karen Roberta,
Rhaicon, Míriam Galante, Márcia Cardoso, José Viégas e Cristina Menezes. Ao Pedro Mendes agradeço o apoio logístico.
Enfim, a conclusão de um mestrado é produto de uma soma de realizações e da ajuda
de muitas pessoas. A todos que colaboraram direta ou indiretamente com a realização desse curso,
o meu
Muito Obrigada!!!
RESUMO
O presente trabalho analisa a percepção dos pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) a respeito da ética na pesquisa agropecuária. O estudo é exploratório e adotou abordagens qualitativa e quantitativa, sendo as pesquisas realizadas no período de julho a setembro de 2005. A pesquisa qualitativa utilizou entrevistas individuais semi-estruturadas com 21 formadores de opinião (dirigentes atuais, ex-dirigentes e ocupantes ou ex-ocupantes de cargos estratégicos) e serviu de base para construção de um questionário objeto da pesquisa quantitativa. Este continha 16 questões, sendo oito sobre o tema “ética na pesquisa” e oito sobre variáveis demográficas. Da população estudada (1.846 pesquisadores), houve um retorno de 492 questionários, totalizando 26,65%. As respostas das entrevistas foram analisadas com base em técnicas de análise de conteúdo e as respostas dos questionários foram analisadas por meio de tratamento estatístico (análises descritivas). Os resultados das pesquisas foram apresentados a partir dos temas abordados no questionário, seguidos das análises das entrevistas, com recortes das falas dos sujeitos. Estes permitem afirmar a existência de um grande interesse entre os pesquisadores ouvidos pelo tema objeto do estudo e ao mesmo tempo uma falta de clareza de uma grande parte das pessoas sobre o que seria ética na pesquisa agropecuária. A grande maioria acredita que a ética, a ciência e a pesquisa devem se complementar (63%); que a ética deve ser levada em consideração em todo o processo de pesquisa (94,51%); e que a pesquisa agropecuária deve estar incluída entre as discussões sobre bioética (85%). Entretanto, por meio de ambas as pesquisas, nota-se falta de priorização da empresa com relação ao assunto e falta de conhecimento dos pesquisadores a respeito do Código de Ética da Embrapa (41%), estabelecido por meio da Deliberação nº 16, de 17.12.2004, único documento onde podem ser encontradas algumas normas específicas sobre a ética na pesquisa na empresa. O estudo recomenda uma ampla discussão na empresa sobre o tema, culminando na implantação de uma “gestão da ética” na pesquisa. Apresenta ainda elementos em que a Embrapa poderá se basear para propor políticas e diretrizes com relação ao assunto. PALAVRAS-CHAVE: Ética na pesquisa; Integridade científica; Pesquisa agropecuária; Ética institucional; Gestão da ética.
ABSTRACT
The present study analyses the perception of researchers from Brazilian Agricultural Research Corporation (Embrapa) concerning the ethics in the agricultural research. The study was exploratory and used qualitative and quantitative approaches. The data collection was performed from July to September of 2005. In the qualitative survey was a used semi-structured individual interview with 21 opinion makers including current and former directors and strategic officers of the corporation, and served as a basis for construction of the quantitative survey questionnaire. This questionnaire enclosed 16 questions, eight referring to “ethics in research” and eight concerning to demographic variables. From the total population included (1.846 researchers), 492 returned the questionnaire, representing 26,65%. The information obtained during the personal interviews was analyzed using technical analysis of contents and the answers of the questionnaires through some statistical procedures (descriptive analyses). The results were presented according to the topics of the questionnaire, followed by the analysis of interviews, using parts of the recorded statements. It is possible to assert that there exists an enormous interest among the researchers who were interviewed about the subject and, at the same time, a lack of clarification for part of people about the significance of ethics in agricultural research. The great majority believes that ethics, science and research must be complementary to each other (63%); that ethics must be considered in all research procedures (94,51%); and that agricultural research must be included in all bio-ethics discussions (85%). Meanwhile, it was noted that there is a lack of prioritization from Embrapa concerning the subject and the lack of awareness among researchers regarding Embrapa’s Ethical Code (41%), established through Deliberation number 16 from 12.17.2004, the sole official document were it can be found some specific information about ethics in research in the corporation. The study recommends an ample discussion within Embrapa concerning the matter, and concludes with a suggestion for the implementation of an “ethical management” attitude in agricultural research. Also, some elements are being proposed to Embrapa as approaches for the establishment of effective policies and basic lines regarding the subject. Key words: Ethics in research; Scientific integrity; Agricultural research; Institutional ethics; Ethical management.
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS LISTA DE QUADROS LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14 PARTE I – MARCO TEÓRICO E INSTITUCIONAL ..................................... 22 1. C&T E ÉTICA .......................................................................................... 23 1.1. O QUE É CIÊNCIA? .................................................................................. 23 1.1.1. A COMUNIDADE CIENTÍFICA .............................................................. 24 1.1.2 RELAÇÃO ENTRE CIÊNCIA E SOCIEDADE ....................................... 26 1.1.3 ETHOS DA CIÊNCIA ............................................................................... 29 1.2. TECNOLOGIA .......................................................................................... 36 1.3. JULGAMENTO DA C&T ......................................................................... 38 1.4. ÉTICA NA CIÊNCIA ................................................................................ 44 1.4.1. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E ÉTICA DA
SUSTENTABILIDADE ............................................................................. 49
2 ÉTICA E PESQUISA AGROPECUÁRIA ............................................. 52 2.1. ÉTICA NA PESQUISA AGROPECUÁRIA ............................................. 52 2.1.1 CONCEITOS DE ÉTICA .......................................................................... 52 2.1.2 ÉTICA NA PESQUISA ............................................................................. 61 2.1.3. BIOÉTICA ................................................................................................. 63 2.1.4. ELEMENTOS PARA UM CONCEITO DE ÉTICA NA PESQUISA
AGROPECUÁRIA ..................................................................................... 65
2.2. A ÉTICA NA EMBRAPA, A PARTIR DE SUAS NORMAS E DEMAIS DOCUMENTOS ........................................................................
74
2.2.1. IMPORTÂNCIA DA ÉTICA NA EMBRAPA .......................................... 74 2.2.2. COMO A ÉTICA ESTÁ INSERIDA FORMALMENTE NOS
DOCUMENTOS DA EMPRESA .............................................................. 76
2.2.3. “GESTÃO DA ÉTICA” NA EMBRAPA .................................................. 79 2.2.4. NORMAS ESPECÍFICAS SOBRE “ÉTICA NA PESQUISA” NA
EMBRAPA ................................................................................................. 80
PARTE II – MARCO EMPÍRICO 85 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................................... 86 3.1. CARACTERIZAÇÃO DA EMPRESA ................................................................ 86 3.2. CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA ............................................................... 90 3.2.1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PRIMEIRA FASE DA
PESQUISA ................................................................................................. 93
3.2.2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA SEGUNDA FASE DA PESQUISA .................................................................................................
98
3.3. LIMITAÇÕES DO MÉTODO ................................................................... 106
4. DADOS DEMOGRÁFICOS E RECEPTIVIDADE DA PESQUISA 107 4.1. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS DEMOGRÁFICOS
DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA QUALITATIVA ..................... 107
4.2. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS DEMOGRÁFICOS DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA QUANTITATIVA ..................
111
4.3. RECEPTIVIDADE DA PESQUISA .......................................................... 121 5. OPINIÃO DOS ATORES SOBRE ÉTICA NA PESQUISA 123 5.1. RELAÇÃO ENTRE CIÊNCIA, PESQUISA E ÉTICA ............................. 124 5.1.1. CONCEITOS DE ÉTICA FORMULADOS PELOS ATORES ................ 128 5.1.2. EM QUE MOMENTO A ÉTICA DEVE SER LEVADA EM
CONSIDERAÇÃO NA PESQUISA .......................................................... 131
5.2 RELAÇÃO ENTRE PESQUISA AGROPECUÁRIA E BIOÉTICA ........ 132 5.3. CRENÇAS DOS PESQUISADORES QUANTO A ÉTICA NA
PESQUISA NA EMBRAPA ...................................................................... 138
5.4. CONDUTA ÉTICA DOS NOVOS PESQUISADORES EM RELAÇÃO AOS MAIS ANTIGOS ..............................................................................
146
5.5. INFLUÊNCIA OU INTERFERÊNCIA POLÍTICA NA ATIVIDADE DE PESQUISA NA EMBRAPA ...............................................................
151
6. OPINIÃO DOS ATORES SOBRE AS NORMAS DE ÉTICA NA PESQUISA NA EMBRAPA ....................................................................
156
6.1 PRINCÍPIOS ÉTICOS EM QUE OS PESQUISADORES SE BASEIAM NA EXECUÇÃO DA PESQUISA. ............................................................
156
6.2. CONFLITOS ENTRE PRINCÍPIOS PESSOAIS E ATIVIDADE DE PESQUISA NA EMBRAPA ......................................................................
169
6.3. INTERFACE DOS SISTEMAS DE AVALIAÇÃO COM A QUESTÃO DA ÉTICA .................................................................................................
173
6.4. PRINCÍPIOS OU QUESTÕES ÉTICAS NA PESQUISA AGROPECUÁRIA .....................................................................................
179
6.5. CUMPRIMENTO PELOS PESQUISADORES DOS PRINCÍPIOS ÉTICOS DA PESQUISA ...........................................................................
184
6.6. COMO O GRUPO DE FORMADORES DE OPINIÃO PERCEBE A ÉTICA NA PESQUISA E AS NORMAS DE ÉTICA NA PESQUISA NA EMBRAPA ..........................................................................................
188
6.7. NORMAS DE ÉTICA COMO ELEMENTO QUE INFLUENCIA A ATIVIDADE DOS PESQUISADORES DA EMBRAPA .........................
193
6.8. NORMAS SOBRE RESTITUIÇÃO DE RESULTADOS DE PESQUISA OU DIREITO DE PROPRIEDADE ÀS COMUNIDADES OBJETO DA PESQUISA...........................................................................
197
6.9. TEMAS SOLIDÁRIOS .............................................................................. 200 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ............................................................ 203 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 208 APÊNDICES
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Classificação da ética. Fonte: Caiñas-Queiroz (1998) .................. 58 FIGURA 2 – Exemplificação de interfaces na classificação da ética ................ 59 FIGURA 3 – Número de entrevistados de acordo com a forma da entrevista ... 96 FIGURA 4 – Distribuição percentual da idade dos respondentes, por faixa
etária ............................................................................................. 115
FIGURA 5 – Distribuição percentual do tempo de serviço na Embrapa, por faixas .............................................................................................
116
FIGURA 6 – Distribuição dos respondentes em relação ao gênero, em percentual ......................................................................................
117
FIGURA 7 – Função atual dos respondentes, em percentual ............................. 120 FIGURA 8 – Função exercida por maior período de tempo durante a vida
profissional, em percentual ........................................................... 121
FIGURA 9 – Relação existente entre ciência, pesquisa e ética, na visão dos pesquisadores, em percentual .......................................................
125
FIGURA 10 – Momento em que a ética deve ser levada em consideração na pesquisa, segundo a percepção dos pesquisadores, em número de respostas ...................................................................................
131
FIGURA 11 – Relação entre pesquisa agropecuária e bioética, em percentual ... 133 FIGURA 12 – Afirmativas dos respondentes sobre o tema “ética na pesquisa”,
em número de respostas ................................................................ 139
FIGURA 13 – Esquema sobre “modos inter-relacionados de abordagem da ética no âmbito das empresas” ......................................................
141
FIGURA 14 – Princípios éticos em que os pesquisadores se baseiam na execução da pesquisa, em número de respostas ...........................
157
FIGURA 15 – Pesquisadores que conhecem o Código de Ética da Embrapa, em percentual ......................................................................................
160
FIGURA 16 – Conflitos entre princípios pessoais e atividade de pesquisa na Embrapa, em percentual ...............................................................
170
FIGURA 17 – Percepção dos respondentes sobre cumprimento dos princípios éticos da pesquisa pelos pesquisadores da Embrapa, em percentual ......................................................................................
184
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Informações sobre a população pesquisada .................................. 102 TABELA 2 – Número de sujeitos convidados e que efetivamente participaram
da primeira fase da pesquisa, por cargo ........................................ 108
TABELA 3 – Informações sobre os sujeitos participantes da pesquisa qualitativa .....................................................................................
110
TABELA 4 – População pesquisada e total de questionários respondidos, com o percentual, por unidade ..............................................................
112
TABELA 5 – Número e percentual da população pesquisada em relação aos respondentes, por cargo ................................................................
114
TABELA 6 – Informações sobre a população pesquisada e o total de pesquisadores que respondeu ao questionário (respondentes) .....
118
TABELA 7 – Distribuição dos respondentes em relação a área de pesquisa ...... 119
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Princípios éticos ou morais do trabalho de pesquisa, segundo Valls (2001) ................................................................................
70
QUADRO 2 – Questões éticas da área de ciência, segundo Maffia e Mizubuti (2004) ..........................................................................................
71
QUADRO 3 – “Preceitos específicos” de ética na pesquisa constantes no Código de Ética da Embrapa ......................................................
81
QUADRO 4 – Estrutura ocupacional de cargos de provimento efetivo da Embrapa ......................................................................................
89
QUADRO 5 – Conceitos de ética formulados pelos atores ................................ 129 QUADRO 6 – Questões de ética na pesquisa apresentadas pelos
pesquisadores da Embrapa .......................................................... 180
QUADRO 7 – Questões que surgiram no decorrer do trabalho e que não se referiam diretamente ao objeto das pesquisas realizadas ...........
200
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
A&A Acompanhamento e Avaliação BCA Boletim de Comunicações Administrativas da Embrapa C&T Ciência e Tecnologia CIRAD Centre de Coopération Internationale en Recherche Agronomique pour le
Développement CLT Consolidação das Leis Trabalhistas Cobea Colégio Brasileiro de Experimentação Animal CT&I Ciência, Tecnologia e Inovação DE Diretoria Executiva da Embrapa DGP Departamento de Gestão de Pessoas da Embrapa Embrapa Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EUA Estados Unidos da América FAO Food and Agriculture Organization of the United Nations MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento OGM Organismos Geneticamente Modificados P&D Pesquisa e Desenvolvimento PA Pesquisa Agropecuária PCS Plano de Cargos e Salários da Embrapa PD&I Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação PDE Plano Diretor da Embrapa PPA Plano Plurianual SAAD Sistema de Planejamento, Acompanhamento e Avaliação de Resultados do
Trabalho Individual SAU Sistema de Avaliação de Unidades SNPA Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária TNS Técnico de Nível Superior (cargo existente na Embrapa) UC Unidade Central da Embrapa UD Unidade Descentralizada da Embrapa
INTRODUÇÃO
A ciência e a tecnologia estão na base do padrão de desenvolvimento da modernidade.
O Século XX iniciou-se como promessa esperada pelos horizontes que se descortinavam
diante das potencialidades aportadas pelo progresso.
O conhecimento científico, sem dúvida, foi fundamental para o modo de vida que se
enraizou no último século, sendo responsável pela cura de doenças, aumento da expectativa
de vida, tendo impactado todos os aspectos da vida e se fazendo presente no nosso dia-a-dia.
Entretanto, a ciência resolve inúmeros problemas, mas também tem gerado outros. Ao mesmo
tempo em que há avanços no campo da economia, há também retrocessos na esfera da justiça
social, com um crescente fosso separando ricos de pobres.
Contrariamente ao que se pensava, a ciência e a tecnologia, ao mesmo tempo em que
podem ser “libertadoras” de necessidades, são também portadoras de riscos. Em diferentes
esferas da sociedade ocorrem discussões sobre os avanços da ciência e suas implicações.
Essas discussões vão desde questões, cujas implicações seriam muito pequenas, até reflexões
que envolvem o futuro da humanidade. A falta de barreiras na pesquisa e o conhecimento
científico, como forma de dominação e cessação das conquistas com relação aos direitos
humanos, são preocupações com as quais o mundo se depara.
A partir do uso de bombas para destruição em massa, são questionados o poder que um
só homem, ou um grupo, ou mesmo uma nação terá com a posse de conhecimentos
científicos, sem uma base ética que impeça seu uso de maneira inapropriada, mesmo que os
pesquisadores responsáveis pelas descobertas científicas tenham tido boas intenções. Isso fica
bem evidente na obra de Bronowski (1979).
Por outro lado, observa-se atualmente que, em alguns assuntos polêmicos, os cientistas
não chegam a um consenso, seja porque não há estudos suficientes, ou porque não há tempo
suficiente de aplicação de técnicas para avaliar as implicações da adoção de produtos da
ciência. Com relação a esse assunto, têm-se vários exemplos, como: a transgenia, a clonagem
e a propriedade intelectual de conhecimentos tradicionais. Questionamentos como: até onde
devemos dispor do poder do homem de criar a vida? A liberdade de decisão do homem de
utilizar alimentos resultantes de técnicas que interferem na natureza e outros assuntos
15
polêmicos são outras preocupações recorrentes na sociedade. Algumas dessas questões
impactam a humanidade atual e as gerações futuras.
Enfim, são muitos os questionamentos sobre a ciência e sua atuação. Com todas essas
considerações, surge a pergunta: são necessárias as discussões sobre ética na ciência? A
ciência pode estar dissociada de seus resultados? Os cientistas devem considerar os impactos
político e social de suas pesquisas? Os cientistas estão isentos da responsabilidade sobre o uso
dos conhecimentos que ajudaram a produzir?
A saída para todas essas questões passa necessariamente pelo diálogo entre os atores
envolvidos. A sociedade sabe que todos sofrerão, caso sejam implementadas soluções
inadequadas. Os desastres causados pelo homem podem ter implicações para esta geração e
para as gerações futuras.
Nesse ponto, a ética em C&T aparece como um fórum adequado para o debate e para a
tomada de decisão sobre essas questões.
A junção da ética com a pesquisa, sendo a ética uma disciplina da filosofia e a pesquisa
uma forma de expressão da C&T, é muito importante e desejável. Pertencentes a dois
mundos, a ética e a pesquisa, embora não estando sempre juntas, não devem andar separadas.
Essas questões, que vêm sendo pontuadas neste trabalho, são cruciais para a Embrapa, uma
vez que esta lida com vida e deve trabalhar no sentido de poder oferecer respostas para a
sociedade quando em situações, muitas vezes desafiantes, sobre assuntos que lhe são afetos.
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) é uma empresa pública, de
C&T, cuja missão, segundo o seu plano diretor, é:
Viabilizar soluções para o desenvolvimento sustentável do espaço rural1, com
foco no agronegócio, por meio da geração, adaptação e transferência de
conhecimentos e tecnologias, em benefício dos diversos segmentos da
sociedade brasileira. A missão será cumprida em consonância com as políticas
governamentais, enfatizando a inclusão social, a segurança alimentar e as
expectativas de mercado e a qualidade do meio ambiente.
16
Desde a sua criação, a Embrapa sempre buscou uma conduta ética compatível com a sua
missão, sendo os seus valores bastante difundidos entre os seus empregados em geral. A sua
própria missão já oferece parâmetros que podem medir essa conduta ética. Além disso, a
Embrapa conseguiu consubstanciar esses valores em um documento, que é o Código de Ética
da Embrapa, aprovado pela Deliberação nº 16, de 17.12.2004.
Entretanto, não basta apenas a empresa ser ética em sua conduta. É preciso mostrar que
além de sua conduta ser pautada na ética, a empresa conta com uma “política de ética”
descrita claramente e acessível a todos os atores envolvidos (empregados, governo e
sociedade em geral), mostrando o seu comprometimento com essa política para os seus
clientes, para os seus empregados e para a sociedade em geral.
Essa conduta ética é um diferencial importante, na medida em que a sociedade começa a
cobrar ações no sentido de mudar o paradigma de desenvolvimento vigente, em sintonia com
os princípios da sustentabilidade. Dessa forma, a sociedade tem valorizado empresas, que
além de cumprirem com competência sua missão, têm também realizado isso de forma ética,
preservando o meio ambiente e contribuindo de alguma forma para a justiça social.
Para todas as empresas, e principalmente para uma empresa que trabalha com C&T, a
necessidade de ser e se mostrar uma empresa ética, torna-se cada vez mais evidente, uma vez
que a sociedade exige cada vez mais segurança no desenvolvimento e na aplicação da ciência.
Observa-se que estão sendo questionados os limites éticos da pesquisa e da ciência. Dessa
forma, os padrões de conduta devem estar bem explicitados pela comunidade científica e
pelas organizações, visando assegurar à sociedade o padrão ético perseguido. A sociedade é
quem financia a C&T, sendo sua cliente e ainda potencial vítima de condutas não éticas de
instituições e de má utilização de resultados de pesquisa por pessoas, grupos ou países mal
intencionados.
Focando na Embrapa, empresa onde foi realizado o presente trabalho, tem-se alguns
questionamentos, como: quais os princípios éticos que a Embrapa persegue na execução da
pesquisa? Em que princípios os pesquisadores se baseiam para realizar a pesquisa? O que os
pesquisadores pensam sobre ética na pesquisa agropecuária? Como é a realizada a “gestão da
1 Espaço Rural é caracterizado no IV Plano Diretor da Embrapa (2004, p. 20) pela “baixa densidade populacional, relação intensa com os recursos naturais e a biodiversidade, e dinâmica socioeconômica subsidiária à dos espaços urbanos“.
17
ética” na Embrapa? Como imprimir princípios éticos na pesquisa sem emperrar a ciência?
Esses questionamentos surgem no momento em que se expressa na sociedade, por um
lado o distanciamento do homem em relação aos princípios éticos elementares e, por outro, a
exigência, a expectativa e a busca determinada por esses princípios, fundamentais para a
manutenção da vida e a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
O interesse da autora pelo tema ética de uma forma geral não é novo. Entretanto, o
interesse pelo tema da ética na pesquisa surgiu naturalmente pelo fato de ela trabalhar em uma
empresa de pesquisa desde 1977. Também ganhou forma quando, no ano de 1998, a autora foi
designada, juntamente com outros colegas, para compor o “Comitê de Ética em Pesquisa”,
nos termos da Resolução nº 196/96, do Ministério da Saúde, apesar desse comitê não ter sido
atuante. Em 2003 também a autora foi designada e participou do Grupo de Trabalho que
elaborou o Código de Ética da Embrapa. A oportunidade de realizar um estudo como esse foi
desafiadora e interessante, na medida em que este pode colaborar com o desenvolvimento
humano e sustentável, introduzindo o tema ética na pesquisa agropecuária na empresa.
O tema ética pode ser enfocado segundo diferentes ângulos. Esse trabalho envolve
reflexões sobre, no mínimo, quatro dimensões, que são: ética geral; ética em C&T e na
pesquisa; ética profissional, que se refere mais a profissão; e ética organizacional ou
institucional, que se refere a ética defendida pela instituição a qual o profissional serve.
O tema é bastante atual e importante, na medida em que a ética em C&T e a ética
institucional, abordadas nesse trabalho, fazem parte das preocupações, reivindicações e
anseios da sociedade.
A ética institucional também está sendo o foco de várias empresas. Não só é importante
ser uma empresa ética como também demonstrar isso para a sociedade, com condutas éticas,
disseminando os valores da empresa entre os empregados e entre a comunidade em geral.
Nesse sentido, este estudo mostrou-se oportuno, tendo em vista o momento em que se
buscam opções para o crescimento baseado apenas na economia, uma vez que este não vem
trazendo resultados satisfatórios para o desenvolvimento pleno de todos os seres humanos e
nem da sua grande maioria. É importante também num momento em que a sociedade e o
governo se encontram no dilema de estabelecer ou não limites para a pesquisa. Questões
como sustentabilidade, justiça social, certificação ambiental (avaliação de impactos
18
ambientais), coerência entre o discurso e a prática, educação ambiental fazem parte de uma
das preocupações atuais do nosso tempo.
Acredita-se que o estudo da ética em C&T, orientado dentro dos princípios
metodológicos da ciência, proporcionará à Embrapa ampliar sua vantagem competitiva para
enfrentar desafios atuais e futuros. Não restam dúvidas de que, cada vez mais, a sociedade
cobra das empresas políticas e procedimentos éticos, sendo que ao fazê-lo, as organizações
estarão impulsionando o seu progresso institucional e promovendo o desenvolvimento do país
sem, contudo, prejudicar a sustentabilidade.
Não se pode esquecer também que a Embrapa, como empresa pública, tem uma
responsabilidade diferenciada, uma vez que estas têm como objetivo maior contribuir para o
bem comum da sociedade a que pertencem. Nesse sentido, a Embrapa tem tido uma postura
bastante pro-ativa, mostrando sua preocupação com ações, que podem ser comprovadas por
meio dos Balanços Sociais que a empresa publica há alguns anos. Nesses documentos
encontra-se uma série de ações que mostram o compromisso ético da Embrapa para com a
nossa sociedade.
O presente estudo proporciona uma oportunidade de a Embrapa rever suas políticas e
práticas sobre o assunto, deixando claro para a sociedade e para os seus empregados qual é a
conduta ética que a empresa persegue. O estudo poderá oferecer contribuições à instituição,
na medida em que visa a contribuir para subsidiar a elaboração de documento corporativo
sobre ética na pesquisa agropecuária; servir como referencial para a realização de concursos
públicos para o cargo de Pesquisador; e subsidiar estudos sobre políticas de gestão de C&T e
sobre gestão de recursos humanos.
Ao nível dos pesquisadores e do conhecimento em geral, a dissertação poderá contribuir
como ponto de partida para maiores reflexões sobre o tema "ética na pesquisa agropecuária" e
para que haja uma maior internalização da ética em C&T na cultura das instituições de
pesquisa e na prática dos pesquisadores. Poderá contribuir ainda como referencial para
definição de procedimentos éticos na pesquisa.
O objetivo geral deste trabalho é entender e analisar a percepção que os pesquisadores
da Embrapa têm com relação a ética na pesquisa agropecuária.
19
Para atingir esse objetivo geral, têm-se como objetivos específicos: identificar os
princípios éticos que norteiam a atividade de pesquisa; identificar como os pesquisadores
percebem a questão da ética na pesquisa; e verificar se os princípios éticos estão contidos nas
normas e demais documentos da Empresa.
Para atingir esses objetivos foi realizado um estudo exploratório, adotando abordagens
qualitativa e quantitativa. As pesquisas foram realizadas no período de julho a setembro de
2005. A pesquisa qualitativa utilizou entrevistas individuais semi-estruturadas com 21
formadores de opinião (dirigentes atuais, ex-dirigentes e ocupantes ou ex-ocupantes de cargos
estratégicos) e serviu de base para construção de um questionário, objeto da pesquisa
quantitativa. A população estudada pela pesquisa quantitativa compunha-se de 1.846
pesquisadores da Embrapa, lotados na sede e nas unidades descentralizadas localizadas no
território nacional. Houve um retorno de 492 questionários, correspondendo a um percentual
de 26,65%, em relação a população. As respostas das entrevistas foram analisadas com base
em técnicas de análise de conteúdo e as respostas dos questionários foram analisadas por meio
de tratamento estatístico (análises descritivas). Os resultados das pesquisas foram
apresentados a partir dos temas abordados no questionário, seguidos das análises das
entrevistas, com recortes das falas dos entrevistados.
Procurando dar uma construção lógica, para melhor entendimento do tema abordado,
este trabalho está organizado em duas partes e em seis capítulos. A primeira parte contém dois
capítulos e trata do marco teórico e institucional. A segunda parte contém quatro capítulos e
trata do marco empírico.
Apresentar um referencial teórico sobre C&T e ética foi o ponto de partida para a
reflexão sobre o tema e se constituiu em seu primeiro capítulo. Inicia fazendo uma explanação
sobre o que é ciência, comunidade científica e ethos da ciência. Oferece uma reflexão sobre o
julgamento da ciência, isto é, sobre a imagem da ciência na atualidade. Esses temas são
enfocados buscando chegar ao tema objeto deste trabalho que é a ética, evolvendo para o
conceito de desenvolvimento sustentável e ética da sustentabilidade, como uma opção ao
paradigma de desenvolvimento baseado apenas em aspectos econômicos.
O segundo capítulo trata de dois temas, sendo o primeiro referente ao termo "ética"
como é entendido na literatura, passando pela bioética, evoluindo para a apresentação de
elementos para se construir um conceito de ética na pesquisa agropecuária. O segundo tema
20
abordado por esse capítulo é a ética na Embrapa, do ponto de vista de suas normas e demais
documentos, procurando oferecer um panorama da ética no modo como foi institucionalizada
na empresa.
Apresentar os procedimentos metodológicos da pesquisa se constituiu no foco do
terceiro capítulo. Inicialmente foi narrado o contexto organizacional onde a pesquisa foi
realizada, oferecendo ao leitor dados mínimos sobre a empresa, para melhor entendimento da
pesquisa, como sua estrutura e modus operandi, bem como sobre o cargo de Pesquisador,
objeto da pesquisa. Também apresenta a caracterização da pesquisa, onde são descritos os
procedimentos metodológicos propriamente ditos. Nesse capítulo, encontram-se dados que
permitem conhecer a população pesquisada. Ao final, encontram-se expostas as limitações da
pesquisa, que foram identificadas no decorrer da mesma.
O quarto capítulo apresenta os dados demográficos das pesquisas qualitativa e
quantitativa, oferecendo análises sobre os mesmos. Explana também sobre a receptividade das
pesquisas, onde por meio de dados é analisado o interesse no tema objeto deste trabalho
demonstrado pelos atores em todas as etapas de desenvolvimento do mesmo.
A percepção dos atores sobre ética na pesquisa é o foco do quinto capítulo, que oferece
dados sobre o que pensam os participantes das pesquisas realizadas, com apresentação de
resultados colhidos sobre vários sub-temas que permitem compreender como os
pesquisadores percebem esse tema dentro da empresa e em geral. Permite chegar a algumas
conclusões, que vão sendo clarificadas no decorrer da explanação de cada sub-tema.
O sexto capítulo trata da percepção dos atores sobre as normas de ética na pesquisa na
Embrapa, mostrando como os atores se sentem em relação às normas da empresa. Permite
ainda compreender como o tema "ética" está internalizado na Embrapa, a partir de suas
normas e documentos, do ponto de vista dos atores ouvidos. Contém ainda reflexões sobre os
códigos de ética aos quais o pesquisador está submetido e sobre princípios éticos da pesquisa.
Finaliza abordando questões que não se referiam ao tema estudado, mas que surgiram no
decorrer do trabalho, com um item intitulado “Temas Solidários”.
Ao final, encontram-se as conclusões, que sintetizam os resultados e servem de base
para recomendações, que no decorrer do trabalho foram surgindo, como forma de contribuir
para o tema estudado. Ao final, dentro do espírito de que um mestrado profissionalizante deve
21
expressar o compromisso de apontar aplicações práticas, sugere-se uma agenda de pesquisa,
com o objetivo de aprofundar o estudo que esta dissertação deu início.
22
PARTE I
MARCO TEÓRICO E INSTITUCIONAL
23
1. C&T E ÉTICA
Esse capítulo oferece um panorama sobre a C&T e a ética em C&T, apresentando
reflexões acerca das finalidades do conhecimento científico e da necessidade de se considerar
a ética na ciência. Explora ainda alternativas para o atual paradigma de desenvolvimento
(baseado no crescimento econômico), como, por exemplo, o desenvolvimento sustentável.
1.1. O QUE É CIÊNCIA
A palavra “ciência” tem diversos significados, conforme assinala Merton (1979, p. 38 e
39):
1) um conjunto de métodos característicos por meio dos quais os
conhecimentos são comprovados;
2) um acervo de conhecimentos acumulados, provenientes da
aplicação desses métodos;
3) um conjunto de valores e costumes culturais que governam as
atividades chamadas científicas; ou
4) qualquer combinação dos itens anteriores.
Ciência é um “Conjunto organizado de conhecimentos relativos a um determinado
objeto, especialmente os obtidos mediante a observação, a experiência dos fatos e um método
próprio” (GUIMARÃES, 1997, p. 25). Sáenz e Capote (2002, p. 6) definem ciência como
“um corpo de conhecimentos sobre os fenômenos naturais, obtidos por meio do uso
sistemático de métodos objetivos”.
24
Caracteriza-se como ciência as “reconstruções racionais do funcionamento da natureza e
das coisas, apoiadas na investigação das relações fenomenológicas e no diálogo do cientista
com a realidade” (ROCHA, 1996, p. 122).
A meta institucional da ciência é o “alargamento dos conhecimentos certificados”
(MERTON, 1979, p. 40). Nesse caso, fora dos métodos e valores científicos, o produto da
investigação não é considerado como ciência.
Assim, pode-se concluir que ciência é o conhecimento devidamente organizado,
adquirido com base em um método, que permite compreender uma determinada realidade.
A grande maioria do conhecimento científico é produto europeu e data dos últimos
quatro séculos. “Nenhuma outra civilização ou época manteve essas comunidades muito
especiais das quais provêm a produtividade científica” (KUHN, 1975, p. 210). Portanto, o
grande poder da ciência e sua importância em todos os aspectos da vida são muito recentes. O
mundo antes era influenciado fortemente por forças divinas, demoníacas e mágicas. O
progresso cumulativo de conhecimentos que a ciência produzia funcionava como arma contra
a ignorância e a superstição e traziam inúmeras invenções que melhoravam a qualidade de
vida das pessoas (RAVETZ, 1982, p. 366).
São inegáveis as contribuições da ciência para a humanidade. Estas foram responsáveis
pela cura de doenças, aumento da expectativa de vida, bem como impactaram todos os
aspectos da vida.
1.1.1. A comunidade científica
A comunidade científica é uma comunidade à parte, que possui características próprias,
regida por normas próprias. A seguir são apresentadas algumas dessas características.
Comunidade científica, no sentido lato, pode ser entendida como (SCHWARTZMAN,
2001, p. 16):
Um grupo de indivíduos que compartilham valores e atitudes científicas e que
se inter-relacionam por meio das instituições científicas a que pertencem. Diz-
se que uma comunidade científica é formada por indivíduos que têm em
25
comum habilitações, conhecimento e premissas tácitas sobre algum campo
específico do saber. Nessa comunidade, cada indivíduo conhece seu campo
específico e algo das áreas adjacentes. Há uma certa sobreposição do trabalho
e das especialidades, e ninguém possui uma compreensão exaustiva e
sistemática de todo o campo.
Schwartzman (2001, p. 15), ao se referir ao desenvolvimento da comunidade científica,
discorda que a ciência deva ser organizada de acordo com um modelo idealizado, como
propôs Merton. Para ele, comunidade científica “deve ser entendido como ‘um tipo ideal’, no
sentido weberiano: é uma construção intelectual que explicita os valores e as ações sociais
existentes e nos ajuda a compreender as suas conseqüências, implicações e tensões com outras
formas de ação social”.
Existe outro elemento que caracteriza a ciência como um sistema social, que é:
Existência de um sistema de autoridade que defende os critérios de probidade,
plausibilidade e aceitabilidade dos resultados – critérios que de modo geral não
constituem um traço explícito do método científico, mas que de qualquer
maneira são uma parte integral e fundamental do seu funcionamento
(SCHWARTZMAN, 2001, p. 16).
A comunidade científica se destaca ainda pela hierarquia que há, “baseada na
experiência, em títulos acadêmicos, trabalhos publicados e, em alguns casos, cargos
ocupados” (YEGANIANTZ, 1987, p. 104). Dessa forma, não se baseia na igualdade e sim em
uma “confederação meritocrática, dirigida por uma epistemocracia” (MARCOVITCH, 1985,
citado por YEGANIANTZ, 1987, p. 104).
Kuhn (1975, p. 204 e 205), discorrendo sobre os paradigmas da ciência, cita como uma
das características da ciência normal, o fato de o progresso ser mais fácil de ser observado,
uma vez que na comunidade científica não há uma competição acirrada. Em outras áreas, os
profissionais perdem tempo em disputas entre si, sempre uma querendo contradizer a outra e
assim demoram a caminhar. A comunidade científica normal, como não há escolas
competidoras, não fica o tempo todo reexaminando seus fundamentos e questionando seus
objetivos e critérios. Esta aceita um paradigma comum, de forma que aumenta a competência
e a eficácia da comunidade. Sua energia não é gasta em discussões e competições
26
intermináveis com seus pares; ao contrário, a idéia é partir de conhecimentos já consagrados
para evoluir no campo científico.
1.1.2. Relação entre ciência e sociedade
A literatura (KUHN, 1975, p. 206; MERTON, 1979, p. 38) aponta o fato de a
comunidade científica amadurecida viver num certo isolamento da sociedade em geral. São
apresentadas a seguir opiniões de alguns autores.
O conhecimento científico, sua descoberta e avaliação, está nas mãos da comunidade
científica. Os cientistas trabalham, tendo como seus “clientes”, os seus pares, já que a
comunidade em geral não compreende o método científico e não foi preparada para utilizar
esse conhecimento puro.
Outras áreas de conhecimento trabalham para a sociedade e dependem da aprovação
desta. Assim, preocupados com opinião da sociedade, têm que buscar uma interação com esta,
procurando se fazer entender. O cientista, no caso da ciência normal, não tem de se preocupar
com o que a sociedade ou com o que as outras escolas vão pensar, de forma que não perde
tempo entre uma descoberta e outra. Eles não têm de se justificar perante seu público, uma
vez que este é constituído de pessoas esclarecidas, com valores e conhecimentos semelhantes
(KUHN, 1975, p. 206).
Assim, tendo como “avaliadores” pessoas que compreendem o método científico, o
autor assinala que é mais fácil para os cientistas do que para outros profissionais trabalharem
na base da cooperação, o que permite um desenvolvimento mais rápido, observável.
Entretanto, a interação com a sociedade ou a falta dela, gera uma série de questões, como as
citadas a seguir.
A ciência está sujeita a questionamentos e a intempéries. Os privilégios que os cientistas
gozavam como seres autônomos, separados, que visavam o bem comum, apesar de não
estarem totalmente integrados à sociedade em que viviam, de tempos em tempos são
questionados. A ciência, que vivia em segurança, hoje precisa se justificar perante a sociedade
onde está inserida (MERTON, 1979, p. 37 e 38).
27
Há autores que atribuem o distanciamento entre ciência e sociedade à questão da
comunicação. Martins & Coutinho (1999), por exemplo, advertem:
Essa dificuldade em se perceber o valor da ciência é resultado do fato de os
cientistas, em todos os tempos, terem criado uma linguagem hermética que
impede ao público leigo o acesso ao conhecimento que geram.
Conseqüentemente, o conhecimento fica entrincheirado nos domínios das
universidades e institutos de pesquisas, distante do público ao qual deveria
servir... Apenas a democratização do conhecimento científico o torna acessível
e é capaz de barrar o avanço da superstição e da pseudociência.
Vários autores (MERTON, 1979, p. 37-38; RAVETZ, 1982, p. 366; SCHWARTZMAN
2002) escreveram sobre a mudança ocorrida na interação entre a ciência e a sociedade, no
sentido desta última questionar a ciência e da perda do status da ciência como sendo uma
atividade própria dos cientistas para se tornar questionável pelo público leigo.
Merton (1979, p. 37-38), discorrendo sobre ciência e sociedade, afirma que os “ataques
insipientes e reais à integridade da ciência têm levado os cientistas a reconhecerem sua
dependência de certos tipos de estrutura social”. Como “as crises convidam à autocrítica”, os
cientistas foram obrigados a “examinar de novo seus fundamentos, revisar seus objetivos,
buscar sua explicação racional”, levando-os a se reconhecerem como parte da sociedade, com
suas obrigações e interesses e, portanto, a repensar a interação ciência e sociedade.
Observa-se, pelo exposto, que a relação entre ciência e sociedade precisa ser melhorada,
no sentido de uma maior interação entre ambas, uma vez que a sociedade é a “consumidora”
dos resultados da ciência e da tecnologia e sua potencial vítima, no caso de condutas
equivocadas ou mal intencionadas dos cientistas ou de segmentos da sociedade.
Mudança de paradigmas na ciência
Thomas Kuhn, que é importante referência na história da ciência, escreveu sobre os
paradigmas da ciência, que seriam “um conjunto de crenças, visões de mundo e de formas de
28
trabalhar, reconhecidos pela comunidade científica”, que há nos “diversos momentos
históricos e nos diferentes ramos da ciência” (MINAYO, 1994, p. 17).
Para Kuhn (1975), o conhecimento científico não cresce de modo acumulativo e
contínuo. De tempos em tempos, ocorreria o que ele chamou de revoluções, provocadas por
descobertas que põe em dúvida o conhecimento até então consagrado na comunidade
científica. Sua teoria faz uma distinção entre a ciência normal e a “extraordinária”. Este
entende que ciência normal seria aquela onde são aceitos os mesmos paradigmas (princípios,
teorias) por um período de tempo. Sobre esse aspecto, o autor citado assinala que
“Normalmente, os membros de uma comunidade científica amadurecida trabalham a partir de
um único paradigma ou conjunto de paradigmas estreitamente relacionados. Raramente
comunidades científicas diferentes investigam os mesmos problemas” (p. 204 e 205).
A ciência extraordinária traria mudança de paradigmas, que se constituiria num
processo que inicia com um período de crise, onde são redefinidos alguns problemas, não se
encaixando mais em paradigmas antes aceitos. Dessa forma, há uma crise na comunidade
científica entre os proponentes e os conservadores, podendo se encaminhar para a mudança de
paradigmas. Para que ocorra essa mudança proposta por um novo possível paradigma e sua
respectiva aceitação pela comunidade científica são necessárias duas condições que são:
Em primeiro lugar, o novo candidato deve parecer capaz de solucionar algum
problema extraordinário, reconhecido como tal pela comunidade e que não
possa ser analisado de nenhuma outra maneira. Em segundo, o novo
paradigma deve garantir a preservação de uma parte relativamente grande da
capacidade objetiva de resolver problemas, conquistada pela ciência com o
auxílio dos paradigmas anteriores (KUHN, 1975, p. 212).
Esse mesmo autor alerta que essa escolha de paradigmas, além dos aspectos científicos,
fundamenta-se ainda em aspectos alheios aos mesmos. A esse processo, ele chamou de
revoluções científicas, que podem levar ao progresso científico.
Discorrendo ainda sobre as revoluções científicas, Kuhn (1975, p. 207 e 209) afirma que
já na educação da comunidade científica, o efeito da insulação da sociedade em geral fica
patente. Enquanto nas outras disciplinas a leitura de livros e o conhecimento sobre outros
29
autores servem de base para a construção do conhecimento, na comunidade científica, nas
“ciências da natureza contemporânea”, bastam os manuais, pois o que o neófito precisa saber
encontra-se nos manuais atualizados. “Nessas áreas, o estudante fia-se principalmente nos
manuais, até iniciar sua própria pesquisa... Até os últimos estágios da educação de um
cientista, os manuais substituem sistematicamente a leitura científica da qual derivam”. Este
autor acrescenta que a educação do cientista é “rígida e estreita”. A educação científica
quando repudia um antigo paradigma, não usa mais os livros e artigos que o tomavam como
base. No mundo científico não tem museu de arte ou biblioteca dos clássicos. Eles vêem o
passado como caminho para o futuro, orientado para o progresso.
1.1.3. Ethos da ciência
Ethos é uma palavra que vem do grego éthos, que tem os seguintes significados2:
a) costume, uso, característica;
b) modo de ser, temperamento ou disposição interior, de natureza
emocional ou moral;
c) o espírito que anima uma coletividade, instituição, etc.; e
d) aquilo que é característico e predominante nas atitudes e
sentimentos dos indivíduos de um povo, grupo ou comunidade, e
que marca suas realizações ou manifestações culturais.
Partindo desses significados, ethos da ciência seria o que caracteriza a comunidade
científica, o elemento estável da conduta da comunidade científica, ou seja, aquilo que a
distingue de outros grupamentos humanos.
Merton (1979, p. 39) considera o ethos da ciência como valores e normas que
constituem em obrigação moral dos cientistas. Explica:
2 Dicionário Aurélio – Século XXI.
30
As normas são expressas em forma de prescrições, proscrições, preferências e
permissões, que se legitimam em relação com valores institucionais. Esses
imperativos, transmitidos pelo preceito e pelo exemplo e reforçados por
sanções, são assimilados em graus variáveis pelo cientista, formando assim
sua consciência científica ou se preferirmos usar a palavra moderna, seu
superego.
Vários autores falam sobre o ethos da ciência. Entretanto, para refletir sobre esse
assunto, não se pode deixar de analisar o ethos da ciência, segundo a visão de Merton (1979).
Esta compreenderia quatro passos, que chamou de “imperativos institucionais”:
universalismo, comunismo ou socialização, desinteresse e ceticismo organizado, cuja
descrição será apresentada a seguir.
Os “os imperativos institucionais (mores) derivam da meta em vista e dos métodos.
Toda a estrutura de normas técnicas e morais leva à consecução do objetivo final.” Os mores
da ciência se referem a prescrições morais e técnicas e “têm uma explicação racional
metodológica, mas são moralmente obrigatórios, não somente porque são eficazes do ponto
de vista do procedimento, mas também porque são considerados justos e bons” (MERTON,
1979, p. 41).
Universalismo
Esse imperativo vincula obrigatoriamente a investigação com a observação e
conhecimentos previamente confirmados. As verdades científicas, sua aceitação ou rejeição,
não podem depender de “atributos pessoais ou sociais do requerente”. Dessa forma, aspectos
como raça, nacionalidade, religião ou mesmo regime político de um país não devem ser
considerados. A objetividade deve ser sempre preservada em detrimento do particularismo
(MERTON, 1979, p. 41 e 42).
Entretanto, esse mesmo autor adianta que o etnocentrismo não é compatível com o
universalismo e questões como o nacionalismo, como o nazismo ou mesmo o patriotismo
associado a guerras podem levar à assimilação de normas segregacionistas. O patriotismo é
31
perfeitamente legítimo quando se trata de valores; entretanto, quando julgado de acordo com
o universalismo, revela-se vergonhoso (MERTON, 1979, p. 42 e 43).
Esse mesmo autor (p. 42 e 43) adverte ainda sobre as tensões que o cientista e a ciência
são submetidos, em decorrência de incompatibilidades (etnocentrismo, por exemplo). Cita
casos de guerra, onde já houve posicionamentos diferentes dos cientistas, porém cientistas de
todas as nacionalidades solidarizaram-se com o padrão universalista, reafirmando “o caráter
internacional e impessoal, virtualmente anônimo, da ciência”. De acordo com esse imperativo,
não cabem hierarquias ou vetos, com relação às descobertas científicas.
Cabe aqui refletir sobre a dificuldade de operacionalização desse imperativo num
mundo com as mais diversas segregações, onde há interesses claros e velados nas relações
entre países e entre grupos. E como a atividade científica faz parte desse contexto, torna-se
difícil se manter alheio a essas disputas de interesses. O próprio Merton (1979, p. 45)
reconhece essa dificuldade, quando assinala que o “universalismo é tortuosamente louvado
em teoria, mas suprimido na prática”.
No caso de preconceito, por exemplo, este se constitui numa forma comum de proteção
de verdades individuais e culturais, constituindo-se numa defesa do ser humano, contra o que
lhe é estranho e que provoca medo.
“Communality” ou "Comunismo”3
No “comunismo”, as descobertas são produtos da colaboração social e estão destinadas
à comunidade, constituindo-se patrimônio comum, que devem ser compartilhadas. Assim, os
direitos de propriedade na ciência “são reduzidos ao mínimo pelas razões e princípios da ética
científica”. Nesse caso, os cientistas receberiam como recompensa pelas suas descobertas e
contribuições para a ciência, a gratidão e a estima, que “se a instituição funciona com um
3 O termo “communality” foi traduzido para o português como “comunismo”, que por evocar conceitos político-econômicos, não reflete a idéia que Merton quer repassar com o termo. Alguns autores utilizam o termo “socialização”, referindo-se ao conhecimento. Artigos escritos em língua espanhola utilizam o termo “comunitarismo” que parece mais adequado, uma vez que dá idéia de comunidade. Entretanto, esse vocábulo não existe na língua portuguesa.
32
mínimo de eficácia, são mais ou menos proporcionais aos aumentos trazidos ao fundo de
conhecimento” (MERTON, 1979, p. 45 e 46).
Os cientistas são reconhecidos e “recompensados”, por meio de prêmios4 ou ainda
podem ter seu nome atribuído a uma descoberta ou a uma teoria (YEGANIANTZ, 1987, p.
105). Estes também se sentem recompensados quando alcançam o respeito e apoio dos pares.
É fundamental para a ciência a comunicação dos resultados, na forma de publicidade
das descobertas e desenvolvimento científicos, entendida esta como obrigação moral.
Exemplificando a importância desse imperativo para a herança cultural da ciência, Newton
afirmou que “se enxerguei mais longe foi porque estava sobre os ombros de gigantes”. Esta
declaração “exprime ao mesmo tempo o sentimento de estar em dívida com a herança comum
e a confissão do caráter essencialmente cooperativo e acumulativo das realizações científicas”
(MERTON, 1979, p. 48). Também confirma que o progresso científico depende de gerações
passadas e presentes.
Merton (1979, p. 48) afirma que “o comunismo do ethos científico é incompatível com
a definição de tecnologia como ‘propriedade privada’ numa economia capitalista”. Essa
questão parece realmente se constituir em um conflito, uma vez as patentes “registram direitos
exclusivos de uso e, muitas vezes, de não-uso”. Dessa forma, têm-se no mínimo duas
propostas: “as que pedem remuneração econômica para os descobrimentos científicos e as que
pedem uma mudança do sistema social para deixar que a ciência prossiga em sua tarefa”.
Tentativas de dar a essa questão um desfecho que agrade a maioria têm sido muitas.
Ainda há muito a avançar sobre o tema propriedade intelectual, comum no sistema capitalista.
Entretanto, parecem compreensíveis casos em que patentes são precedidas de real
investimento em CT&I. Sem essa proteção, os investimentos seriam inviáveis.
4 Existem alguns prêmios internacionais e nacionais, que consideram as contribuições dos cientistas para o avanço da ciência, sendo o mais famoso deles, o Prêmio Nobel. Na Embrapa, há o Prêmio Frederico Menezes Veiga, um dos mais tradicionais prêmios científicos do Brasil. Este foi instituído em 1974, com periodicidade anual e é concedido “àqueles que, no campo da pesquisa agropecuária, tenham se destacado pela realização de obra científica ou tecnológica de reconhecido valor ou trabalho que signifique marcante contribuição ao desenvolvimento agrícola nacional”, conforme o site http://www21.sede.embrapa.br/noticias/banco_de_noticias/ 1999/abril/bn.2004-11-25.2074677779/mostra_noticia, acessado em 22.11.2005.
33
Desinteresse
O desinteresse se refere à busca do conhecimento científico por motivações outras que
não aquelas fruto de recompensas econômicas, emocionais ou sociais. Nesse caso, o cientista
seria movido pelo amor à humanidade e pela preocupação com a melhoria da sua qualidade de
vida ou mesmo o amor à verdade, ao conhecimento.
São muitas as motivações atribuídas aos cientistas, na medida em que “a instituição
impõe uma atividade desinteressada”. Assim, “é do interesse do cientista conformar-se, sob
pena de sanções e, na medida em que a norma foi assimilada, sob pena de conflito
psicológico” (MERTON, 1979, p. 49).
Esse autor considera que o fato de não haver fraudes nos anais da ciência, o que parece
excepcional quando comparada a outras esferas de atividade, foi atribuído às qualidades
pessoais dos cientistas. As explicações para esse fato poderiam ser, além da citada no
parágrafo anterior referente a instituição já impor uma atividade desinteressada, outros fatores
como: a pesquisa científica implica a verificabilidade dos resultados e nisso eles têm em seus
pares, avaliadores vigilantes e exigentes; o cientista não lida com uma clientela leiga, como
outros profissionais, o que faz com que a fraude seja menos provável na comunidade
científica. “É provável que a reputação da ciência e sua elevada posição ética na estima dos
leigos sejam devidas, em grande parte, às realizações tecnológicas. Toda nova tecnologia
atesta a integridade do cientista” (MERTON, 1979, p. 49-51).
É fácil compreender esse imperativo na teoria. Entretanto, quando se vai para o campo
da prática, há outros fatores que interferem, como ressalta Haguette (1997, p. 156), em um
discurso sobre pressupostos epistemológicos da pesquisa participante:
A ciência é social, isto é, ela é um produto do intelecto humano que responde
a necessidades concretas de determinado momento histórico, necessidades
estas definidas pelos grupos no poder. Logo, ela é também histórica, situada.
Seus métodos – regras e técnicas de produção de conhecimento – são
avaliados por homens que formam a comunidade científica. Enquanto homens,
os cientistas são possuidores de interesses, motivações, emoções e
superstições; enquanto membros de determinada classe – a dominante, ou a
34
serviço dela – os cientistas definem o campo ‘do científico’ a partir dos
interesses objetivos daquela classe. Conseqüentemente, nem a ciência é
neutra, nem a forma de produzi-la – processo de geração de conhecimento.
Kneller (1980, citado por CENCI, 2005, p. 87) também concorda com essa visão de que
a ciência não pode ser e nunca deve ter sido neutra, quando afirma que esta, “na seleção de
tópicos a investigar, é influenciada pelos seus financiadores; e, na escolha dos pressupostos
para as suas tradições de pesquisa, é influenciada por visões de mundo e ideologias”.
Assim como estes, são muitos os autores que de forma direta ou indireta contestam a
existência desse imperativo na prática, como se poderá observar no item 1.3. (Julgamento da
ciência).
Fazendo ainda uma analogia com as teorias de motivação de Maslow e de Herzberg5,
esse imperativo “desinteresse” deveria compor, no caso do primeiro, a escala mais alta das
necessidades humanas, ou seja, necessidade de estima ou ainda necessidade de auto-
realização. No caso da teoria de Herzberg, os aspectos motivacionais intrínsecos. Entretanto,
para que as necessidades citadas se constituam na busca de uma pessoa, é necessário que
outras menos elevadas (como as necessidades fisiológicas, de segurança, no caso da teoria de
Maslow e os fatores higiênicos, no caso da teoria de Herzberg) tenham sido atingidas total ou
parcialmente. Dessa forma, o desinteresse absoluto do cientista na escolha do seu objeto de
pesquisa, do método e da forma como produzir e divulgar o resultado final, torna-se muito
difícil.
5 Maslow hierarquizou as necessidades humanas em uma pirâmide, baseado na importância e na influência sobre o comportamento humano. Essas necessidades seriam, indo do nível mais baixo para o mais alto: necessidades fisiológicas; de segurança; sociais; estima e de auto-realização. Nesta última estariam as necessidades mais elevadas, ligadas a pela realização do potencial de cada pessoa. Entretanto, esse processo de satisfação de necessidades não é estático, estando sujeito a variações. Herzberg criou a teoria dos dois fatores para explicar o comportamento das pessoas. Os primeiros fatores seriam os fatores higiênicos ou extrínsecos. Estes seriam fatores localizados no ambiente, fora do controle da pessoa, como: salário, benefícios sociais, condições de trabalho etc. Os segundos seriam os fatores motivacionais ou intrínsecos, que englobariam sentimentos de crescimento individual, de reconhecimento profissional e necessidades de auto-realização (CHIAVENATO, 1994, p. 168-170 e 176-177).
35
Ceticismo Organizado
O imperativo mertoniano “ceticismo organizado” refere-se à obrigatoriedade de se
submeter os enunciados científicos à prova. Esse é “um mandato ao mesmo tempo
metodológico e institucional”. Refere-se à “supressão do julgamento, até que ‘os fatos estejam
à mão’, e o exame imparcial das crenças, de acordo com critérios empíricos e lógicos”
(MERTON, 1979, p. 51).
A questão da prova remete a Popper (1975, p. 49 e 50), que afirma que para se certificar
da objetividade dos enunciados científicos, estes têm de ser submetidos à prova e a repetições
para que não sejam confundidos com simples coincidência. Declara que só reconhecerá “um
sistema como empírico ou científico se ele for passível de comprovação pela experiência”.
Não que se exija que todo enunciado científico tenha sido submetido a testes infinitos antes de
merecer aceitação, mas que ele se mostre capaz de ser submetido a testes. Sugere como
“critério de demarcação, não a verificabilidade, mas a falseabilidade de um sistema”. Para
este autor, em ciência, não pode haver enunciados que devam ser aceitos “resignadamente”
como verdadeiros “simplesmente pela circunstância de não parecer possível, devido a razões
lógicas, submetê-los a teste”.
Voltando ao imperativo “ceticismo organizado”, Merton (1979, p. 51-52) considera que
este tem colocado a ciência em conflito com outras instituições, uma vez que “o pesquisador
científico não respeita a separação entre o sagrado e o profano, entre o que exige respeito sem
crítica e o que pode ser objetivamente analisado”. Esse fato traz problemas com a Igreja, com
a Economia ou com o Estado, como se esse imperativo ameaçasse a distribuição do poder
vigente. “O conflito acentua-se sempre que a ciência leva sua pesquisa a zonas novas, nas
quais já existem atitudes institucionalizadas, ou sempre que outras instituições ampliam sua
área de controle”.
Os imperativos mertonianos são tentativas de educar para evitar a conduta imprópria na
ciência, constituindo-se em uma base, um ponto de partida para que se possa chegar ao ethos
da ciência. Eles funcionam como premissas básicas, uma vez que cada um em si traz
problemas de operacionalização e que estes não esgotam valores e normas que devem se
constituir em obrigação moral dos cientistas.
36
1.2. TECNOLOGIA
A palavra tecnologia, segundo Cattani (1997, p. 254) vem do grego tecknologia, cujo
significado é “tratamento ou descrição sistemática de uma ou mais ‘teknai’ (artes plásticas,
ofícios)”. A tecnologia é o domínio pelo homem de um conjunto de conhecimentos, que se
aplicam para gerar bens e serviços.
Também foi conceituada como sendo um “conjunto de conhecimentos científicos e
empíricos, de habilidades, experiências e organização requeridos para produzir, distribuir,
comercializar – nos casos em que se aplique - e utilizar bens e serviços”. Nesse conceito,
encontram-se incluídas variáveis como: conhecimentos teóricos, práticos, meios físicos,
know-how, métodos e procedimentos produtivos, gerenciais e organizacionais (SÁENZ E
PAULA, 2001, p. 43).
A tecnologia, como a ciência, pode ser vista de dois diferentes pontos de vista: como
um conjunto de conhecimentos (científicos e empíricos requeridos para produzir, distribuir,
comercializar bens e serviços) ou como uma atividade (aplicação para conhecimentos já
existentes), alertam Sáenz e Capote (2002, p. 47).
A ciência e a tecnologia estão na maioria das vezes interligadas, apesar de ser possível
distinguí-las conceitualmente. De acordo com as novas tendências, a distinção entre C&T é
possível, mas começa a perder sua relevância, na prática (WEBSTER, 1991, p. 4).
Sobre essa diferença, Merton (1979, p. 48) assinala que a ciência prevê divulgação,
enquanto a tecnologia é definida como “propriedade privada”, fato que reflete um conflito.
Entretanto, essa parece ser a característica que mais distingue a ciência da tecnologia.
O binômio C&T foi formado a partir da Revolução Industrial e contribuiu para o
desenvolvimento do capitalismo (CATTANI, 1997, p. 254).
A relação entre C&T é clara. Tanto a ciência pode ser utilizada para criação de novas
tecnologias como o contrário. Sáenz e Paula (2001, p. 44) chamam a atenção para o fato de as
novas tecnologias também suscitarem a demanda de pesquisas científicas para melhor
compreensão destas e para seu aperfeiçoamento.
37
Fourez (1995, p. 203 e 204) assegura que a distinção entre ciência e tecnologia
encontra-se nos lugares sociais onde os conhecimentos são aplicados, conforme expressa:
Os saberes científicos se aplicam em um lugar restrito, os laboratórios, e se
ligam a uma instituição particular: a comunidade científica. Pelo contrário, os
saberes tecnológicos ou as ciências aplicadas são utilizados na realidade social
tomada globalmente, no mundo exterior. Os dois tipos de saber destinam-se
sempre a ser aplicados, portanto, mas em lugares diferentes.
Alguns autores, Freeman e Soete (1997, p. 15); Sáenz & Paula (2001, p. 44) referem-se
aos termos “tecnologias avançadas” e “alta tecnologia” para distinguir setores da economia
que precisam mais de técnicas científicas do que os setores tradicionais.
Pelo que foi visto, conclui-se que a C&T possuem uma relação inquestionável entre si,
conformando a área cinzenta, onde esses dois conceitos se imbricam.
É importante acrescentar que à sigla C&T foi incorporada a palavra inovação,
transformando-a em CT&I. Esse acréscimo, como explicam Sáenz e Paula (2001, p. 48),
longe de ser apenas uma questão semântica, envolve uma idéia básica quando se refere ao
desafio da globalização. A falta de compreensão dessa idéia gera problemas nos níveis macro
e micro, como explicam:
- Em primeiro lugar, o desenvolvimento de uma tecnologia deve ser visto
como parte de um processo de inovação, ou seja, não é suficiente gerar
tecnologias, é necessário inovar;
- A tecnologia é um bem perecível e, como tal, deve ser transformada em
inovação antes de alcançar a obsolescência; de outra forma todos os recursos
investidos em sua geração se perderão;
- O locus, o centro de gravidade da inovação está radicado nas empresas e/ou
instituições onde são introduzidas as novas tecnologias – empresas do setor
produtivo ou naquelas instituições não necessariamente comerciais, como
hospitais, escolas etc. Nesse sentido, essas instituições inovadoras devem
receber uma atenção especial nos mecanismos que se estabeleçam para
impulsionar a inovação tecnológica.
38
Pesquisa e desenvolvimento (P&D) também aparecem envolvendo um novo conceito. O
Manual Frascati traz a seguinte definição: é o “trabalho criativo realizado sistematicamente
com o fim de aumentar o conhecimento, incluindo o conhecimento do homem, da cultura e da
sociedade, e a utilização dessa bagagem de conhecimentos para idear novas aplicações”
(SÁENZ e CAPOTE, 2002).
1.3. JULGAMENTO DA C&T
O conhecimento científico, através dos anos, passou por algumas sentenças, por meio
do julgamento da sociedade. A ciência alternou de status de uma atividade inquestionável,
com resultados sempre benéficos, para uma atividade realizada por homens e como tal, sujeita
a incorreções. Considerando a responsabilidade que envolve a ciência e a posição dos
cientistas, apontam-se questões que remetem a desmitificação do conhecimento, suscitadas na
literatura, sem contudo ter a pretensão de esgotá-las.
Ravetz (1982, p. 366) assinala que:
Até recentemente, a história da ciência era uma estória de sucessos. Os
triunfos da ciência representavam um processo cumulativo de conhecimento
crescente e uma seqüência de vitórias sobre a ignorância e a superstição; a
ciência era uma fonte de invenções para a melhoria da vida humana. A recente
tomada de consciência da existência de profundos problemas morais dentro da
ciência, da limitação ou condicionamento de seu desenvolvimento por forças
externas, assim como dos perigos de mudanças tecnológicas sem controle,
desafiaram os historiadores a realizarem uma reavaliação crítica dessa sua
antiga e singela fé na ciência.6
Esse mesmo autor cita a influência de técnicas, de instituições, de políticas de estado, de
movimentos políticos, de nações e ideologias e também de guerras na evolução da ciência.
O conhecimento científico, uma vez que estava baseado na razão e na observação
controlada da realidade, “era apresentado e defendido como um conhecimento iluminado,
6 Tradução extraída do Esquema de Aula 01, História da Ciência, de E. B. Viotti (2004).
39
produtor de verdades superiores àquelas reveladas pela religião ou pelo sentido comum”. Esse
conhecimento, juntamente com o conhecimento técnico “prometia riqueza e saúde, resultados
práticos que outras formas de conhecimento não poderiam proporcionar.” Dessa forma, os
cientistas acreditavam que o público deveria apreciar o seu trabalho, dar todo o apoio, bem
como os recursos que eles necessitassem, “mas deixando que eles resolvessem o que era
melhor para todos”. Isso ocorreu durante séculos, em países ocidentais mais desenvolvidos e
“permitiu que a ciência e a tecnologia se desenvolvessem a níveis extremamente elevados”
(SCHWARTZMAN, 20027).
Entretanto, a sociedade começou a questionar os benefícios proporcionados pela
ciência, como explica Yeganiantz (1987, p. 106):
No início deste século predominava a crença de que os cientistas eram capazes
de, mais cedo ou mais tarde, implantar a felicidade na face da Terra, com a
solução de todos os problemas existentes, uma vez que possuíam sua
autonomia e auto-regulação... Nos anos 70, acabou a fé cega na ciência e nos
cientistas. Mais realista, a sociedade dos anos 70 parou para pensar nos
benefícios proporcionados pela ciência e pela tecnologia. Descobria-se afinal
que a ciência tem os seus limites, e às vezes produz alguns mau efeitos
colaterais. Ao mesmo tempo o conhecimento científico destituiu-se de seu
caráter de ‘Verdade Absoluta’ e passou a ser entendido como um conjunto de
soluções provisórias.
Visando apresentar uma informação atual sobre esse assunto - ciência e sociedade - em
2002 e 2003 foi realizada uma pesquisa de percepção pública da ciência8 (VOGT e POLINO,
2003) em quatro países (Argentina, Brasil, Espanha e Uruguai), onde foram pesquisadas
7 Nesse artigo Schwartzman (2002), faz uma analogia entre a rede de relação entre os produtores de conhecimento e a sociedade, com a relação de outra rede, que é a dos jogadores e de técnicos de futebol e a população. Ambas são atividades especializadas e devem conviver com a sociedade, mostrando sua atividade, já que a mesma interfere na vida das pessoas, porém sem deixar essa atividade e seus resultados serem influenciadas por leigos.
8 Essa pesquisa foi realizada dentro do Projeto Ibero-Americano de Indicadores de Percepção Pública, Cultura Científica e Participação dos Cidadãos, de responsabilidade da Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI) e da Rede Ibero-Americana de Indicadores de Ciência e Tecnologia (RICYT/CYTED). Na Argentina, a pesquisa foi realizada em dezembro de 2002 e nos outros países foram realizadas em fevereiro de março de 2003, envolvendo ao todo 762 pessoas, sendo 300 da Argentina, 162 do Brasil, 150 da Espanha e 150 do Uruguai.
40
algumas variáveis. Apesar de ser um estudo de proporções pequenas, em relação ao número
de países existentes, é interessante observar alguns resultados. No quesito “utilidade da
ciência” (p. 20-21), a maioria dos entrevistados dos quatro países, 72%, concordou que “o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia é o principal motivo de melhoria da qualidade de
vida da sociedade”. Entretanto, a grande maioria, 85,9% “nega que a ciência e a tecnologia
possam solucionar todos os problemas”.
A literatura nos lembra de problemas de pequenas e de grandes proporções ocorridos
decorrentes da C&T ou do seu mau uso. Ravetz (1982) lembra as bombas atômicas que
caíram sobre os civis de Hiroshima e Nagasaki. Webster (1991, p. 2) cita os casos da usina
atômica de Chernobyl; do reator nuclear “Three Mile Island”9, no estado da Pensilvânia, nos
EUA. Valls (2001, p. 73) lembra também Bophal.
Bronowski (1979), um cientista que participou do projeto que desenvolveu a bomba
atômica, relata sua visita a Nagasaqui, em novembro de 1945, após a explosão da bomba
atômica. Naquele momento ficou claro o poder da ciência usado como meio de destruição.
Esse depoimento vindo desse cientista é importante, pois remete a um questionamento: será
que todos os participantes do projeto que levou a construção da bomba atômica, se
questionados, concordariam com o seu uso em guerras, para exterminar civis? Bursztyn
(2002, p. 161) lembra que esse cientista foi um dos primeiros a chamar a atenção para o fato
de a humanidade poder interferir no seu próprio futuro, com poder mesmo de auto-extinção.
A imagem da ciência vem sofrendo abalos e a sociedade começa a exigir
responsabilidade frente a algumas conseqüências do desenvolvimento científico e
tecnológico.
Por outro lado, a ciência trouxe conhecimentos que a humanidade não esperava. A
teoria de Darwin, por exemplo, chocou porque sugeria que o homem, os animais e as plantas
não foram parte de um projeto, de um objetivo, e sim chegaram a essa forma pela seleção
natural e dirigindo-se a nenhum objetivo: “a seleção natural, resultando de simples
competição entre organismos que lutam pela sobrevivência, teria produzido homem com
animais e plantas superiores”. Dessa forma, o autor faz uma provocação com a incômoda
pergunta: “O que poderiam significar ‘evolução’, ‘desenvolvimento’ e ‘progresso’ na
9 Segundo Webster (1991, p. 2), até o momento em que havia escrito, o processo de descontaminação dos resíduos radioativos continuava e já tinha custado um bilhão de dólares, que era três vezes o custo da construção daquela usina.
41
ausência de um objetivo especificado?”. Uma analogia entre a teoria evolucionista de Darwin
e a evolução das idéias científicas, leva a considerar que estas podem ter mudado, sem ter um
objetivo bem definido, por meio da seleção pelo conflito decorrente das revoluções, sem uma
“verdade científica permanentemente fixada, da qual cada estágio do desenvolvimento
científico seria um exemplar mais aprimorado” (KUHN, 1975, p. 214-215 e 216).
Alguns autores questionam o fato de a ciência ser totalmente impessoal. Merton (1979,
p. 40) questiona qual das diversas estruturas sociais favoreceria mais o desenvolvimento da
ciência. Esse questionamento não encontra amparo no imperativo institucional
“universalismo”.
Considerando a questão da meritocracia, há autores que contestam o fato de a ciência
ser regida por uma simples meritocracia. Webster (1991, p. 8) acredita que grupos melhor
posicionados no estabelecimento científico devem provavelmente contar com maior apoio
para seus trabalhos. Bourdieu (1975, citado por WEBSTER, 1991, p. 8) argumenta que “o
mercado de bens científicos tem suas leis próprias e elas não têm nada a ver com ética ou
normas... Reivindicações de legitimidade [de idéias] derivam da força relativa do grupo cujos
interesses elas expressam”. Isso significa que “alguns cientistas e suas áreas de pesquisa
podem gozar de uma posição favorável em termos de reconhecimento, independente da
‘qualidade’ do trabalho que produzem.” (WEBSTER, 1991, p. 9).
Observa-se ainda que em alguns assuntos polêmicos, os cientistas não chegam a um
consenso, seja porque não há estudos suficientes, ou porque não há tempo suficiente de
aplicação, para avaliar as implicações da adoção de produtos da ciência. Dessa forma, quando
se apresentam assuntos polêmicos, como clonagem e transgenia, ocorre em parte da sociedade
desinformada muita desconfiança sobre os reais objetivos dessas técnicas. Nesses casos, a
atuação da comunidade científica, com seus debates, que em casos normais seriam muito bem
vistos, concorre para a geração de insegurança na sociedade em geral.
Concorrendo ainda para o tema da falta de consenso sobre alguns assuntos e para o fato
do imperativo mertoniano “desinteresse” ser altamente questionável, Schwmartzman (2002)
considera que algumas questões científicas são realmente complexas e de natureza
especializada e nem sempre os cientistas e tecnólogos têm respostas a essas questões. Cita
como exemplos, os alimentos transgênicos, as novas tecnologias de clonagem, os problemas
de poluição ambiental, dentre outros. Argumenta que:
42
As controvérsias e perplexidades existem dentro do próprio mundo da ciência,
que não é, como os cientistas às vezes pretendem, uma república de sábios em
busca das grandes verdades, mas uma arena altamente competitiva, aonde se
disputa recursos, projetos, financiamentos, carreiras e reputações10.
Enfim, são muitos os questionamentos sobre a ciência e sua atuação. A realidade hoje é
que tem-se um bloco pequeno de países considerados desenvolvidos e um grande número de
países no bloco dos “em desenvolvimento”. As teorias do desenvolvimento procuram fazer
um diagnóstico da natureza e causas da pobreza das nações, para buscar estratégias de
superação dos problemas de subdesenvolvimento (VIOTTI, 1997, p. 13).
Alguns autores (SUNKEL, 1975, p. 3; VIOTTI, 1998, p. 2) consideram, com base em
dados (por exemplo, de renda per capita), que antes da Revolução Industrial, não havia muita
diferença entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos ou que, a partir desse evento,
essa diferença aumentou rapidamente (FREEMAN, 2002, p. 206). A verdade é que depois
desse fato histórico, as economias se dividiram, com crescimento geométrico em alguns
países hoje considerados desenvolvidos.
Aqui aparece a questão da competitividade econômica, permeando todas essas fases de
desenvolvimento no qual são “classificados” os países. O conceito de competitividade traz
embutidas as razões atribuídas por cada autor à mesma.
Uma economia é competitiva quando consegue pelo menos igualar sua produção com
os padrões de eficiência do resto do mundo (ARAÚJO JR., 1996, p. 85). Para esse autor,
competitividade internacional é a “capacidade adquirida pelos agentes econômicos para
acompanhar o ritmo do progresso técnico e utilizar eficientemente o acervo de conhecimentos
disponível pela sociedade contemporânea”.
Viotti (1997, p. 14), também atribui a divisão das economias ao progresso técnico. Este
autor cita ainda a teoria da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL),
da Organização das Nações Unidas (ONU), que assegura que o surgimento de nações
desenvolvidas e subdesenvolvidas é atribuído “a diferentes processos de apropriação de
ganhos de produtividade, resultantes do progresso técnico”.
10 Com relação a esse assunto, Schwmartzman (2002) cita LEWONTIN, R. (2002); GREENBERG, D. S. (2002) e LATOUR, B. (1993).
43
Observa-se que competitividade é um conceito dinâmico e que para a manutenção de
posições competitivas, há a necessidade de investimento em desenvolvimento tecnológico
(STAUB, 2001, p. 5) e de renovação contínua de processos tecnológicos (SÁENZ e PAULA,
2001, p. 42). Enfim, pode-se concluir que a C&T desempenha papel determinante para o
crescimento econômico dos países em economias capitalistas.
CT&I “são elementos-chave para o crescimento, a competitividade e o desenvolvimento
de empresas, indústrias, regiões e países”, na medida em que estas perpassam todos os
segmentos da vida. “Também têm importância fundamental na determinação do estilo de
desenvolvimento de regiões ou nações e na forma como este afeta no presente e afetará no
futuro a qualidade de vida da população em geral e de seus diversos segmentos” (VIOTTI e
MACEDO, 2003, p. xxi).
Com a compreensão da importância da C&T para o desenvolvimento dos países, entre
as novas tendências que marcam a evolução das relações entre C&T e sociedade, a C&T é
hoje uma preocupação dos Estados, estando dentro da arena política. Assim, os governos
estão envolvidos com o financiamento, administração e regulação da C&T (WEBSTER,
1991, p. 5).
Nota-se que é cada vez mais difícil sustentar a idéia de que a ciência é “neutra” e
impessoal. A literatura não deixa dúvidas quanto a relação entre a inovação tecnológica e a
competitividade.
Nicolsky (2001, p. 104)11 considera que:
A pesquisa tecnológica não está localmente acoplada à pesquisa científica,
mas à demanda real do mercado, que deve então ser atendida para que a
propriedade intelectual da inovação, ou patente, tenha valor econômico. A
pesquisa tecnológica não se alimenta da pesquisa científica local diretamente,
mas do acervo de conhecimentos existentes, tanto científicos quanto
tecnológicos e, até, de conhecimentos culturais. Enfim, de tudo o que for
necessário mobilizar para proporcionar satisfação ao consumidor, usuário ou
cliente.
11 Nesse caso, Nicolski (2001) está discorrendo sobre o modelo dinâmico de inovação no Brasil.
44
É interessante observar que, a inovação é fundamental tanto para os que estão
interessados em acelerar ou manter a taxa de crescimento em seus países, quanto para aqueles
que discordam dessa preocupação ser limitada à questão da quantidade de bens. Em outras
palavras, para se modificar a direção do crescimento baseado apenas no avanço da economia,
concentrando esforços na melhoria da qualidade de vida, também é necessária a inovação. O
avanço tecnológico pode servir para proteger os recursos naturais e o meio ambiente. Como
exemplo dessa possibilidade tem-se a prevenção e a resolução de problemas de poluição; a
reciclagem de rejeitos, de forma economicamente viável (FREEMAN e SOETE, 1997, p.
107).
Inovação implica “dar um destino econômico para uma nova idéia, que pode ser ou não,
resultado de um invento genuíno”. Inovar, portanto, é “realizar na vida econômica uma nova
combinação de fatores de produção para produzir um novo produto ou para aplicar um novo
processo de produção, sempre visando transacionar produtos no mercado”. Dessa forma,
invenção é diferente de inovação (VERMULM, 2001, p. 1).
Com isso, observa-se que a C&T, na pessoa de seus atores, tem que se esforçar para
sustentar o status de neutralidade e impessoalidade, buscando e se baseando em princípios
universais lícitos.
1.4. ÉTICA NA CIÊNCIA
Na sociedade hoje ocorrem várias discussões sobre os avanços da ciência e de suas
implicações. Essas discussões vão desde questões, cujas implicações seriam muito pequenas,
até discussões que envolvem o futuro da humanidade.
Após o uso do conhecimento científico para construir bombas de destruição em massa,
a sociedade tomou consciência do poder que, em tese, um só homem tem para destruir o
planeta. Dessa forma, são temidos tanto a falta de barreiras da pesquisa, entrando num campo
perigoso de dominação e cessação das conquistas com relação aos direitos humanos, como no
“poder de fogo” que um só homem12 ou um grupo ou mesmo uma nação terá com os
12 O filme Dr. Strangelove (Dr. Fantástico) dirigido por Stanley Kubrick retrata bem essa situação. Ele tinha o poder e usou esse poder.
45
conhecimentos científicos à disposição (mesmo que os criadores sejam éticos e que tenham
tido boas intenções).
Buarque (1990, p. 14) assinala que a partir de 1945, depois das reações provocadas pela
explosão das bombas atômicas, surgiu uma preocupação básica dos físicos, biólogos e
químicos com a “ética do comportamento técnico/científico, nas suas pesquisas e nas
produções decorrentes dela”.
Webster (1991, p. 5-6) também crê que a visão tradicional de que a C&T são “neutras”,
não sendo influenciadas por processos sociais mais amplos, "não pode mais ser sustentada”,
ficando cada vez mais difícil os cientistas se apresentarem como especialistas independentes
em assuntos de interesse social.
Entretanto, a sociedade sabe que todos sofrerão caso sejam implementadas soluções
inadequadas, tanto as nações ricas como as pobres. Os desastres causados pelo homem podem
ter implicações para esta geração e para as gerações futuras.
Com todas essas incertezas, há que se buscar princípios que abriguem essas
preocupações, como o princípio da precaução, o princípio da responsabilidade. Goldim (2002)
lembra o Princípio da Precaução, conforme definido na Conferência RIO 1992:
O Princípio da Precaução é a garantia contra os riscos potenciais que, de
acordo com o estado atual do conhecimento, não podem ser ainda
identificados. Este Princípio afirma que a ausência da certeza científica
formal, a existência de um risco de um dano sério ou irreversível requer a
implementação de medidas que possam prever este dano.
O Princípio da Responsabilidade, conforme evoca Hans Jonas, adverte: “O homem nos
é o único ser conhecido que pode ter responsabilidade. Na medida em que ele a pode ter, ele a
tem. A capacidade de responsabilidade significa já a colocação sob seu imperativo: o próprio
poder leva consigo o dever” (BARTHOLO JR. E BURSZTYN, 2002, p. 173).
Observa-se que sobre a questão de estabelecer limites para a ciência, não existe
consenso na literatura. Há autores que defendem a total liberdade da ciência. Diniz (2004)
considera que “cientistas são pessoas que questionam constantemente a maneira como vemos
o mundo. Sem a liberdade para esse questionamento, a ciência perde seu sentido”. Denuncia
haver um “grau de cerceamento da liberdade de expressão científica ao redor do mundo.
46
Cientistas são demitidos, presos, exilados e torturados simplesmente porque seu trabalho
científico vai de encontro a interesses econômicos, políticos e religiosos”. Advoga que a
ciência precisa ser livre “para ser um dos motores do desenvolvimento de um país”,
advertindo que:
Fora de um ambiente livre é impossível saber se os resultados apresentados
pelos cientistas correspondem a um trabalho que é o mais rigoroso e imparcial
possível, ou se são simplesmente uma justificativa para interesses específicos
disfarçada sob a autoridade do discurso científico.
Garrafa (2000, p. 175) cita Jonas (1990), que analisa “a liberdade da pesquisa apóia-se
exatamente no fato de que a atividade de investigar, juntamente com o conhecimento, deve
estar separada da esfera da ação”. Sobre esse assunto, Garrafa (Ibidem) declara que “se a
ciência como tal, não pode ser ética ou moralmente qualificada, pode sê-la, no entanto, a
utilização que dela se faça, os interesses a que serve e as conseqüências sociais de sua
aplicação”.
Há autores que acreditam que deve haver certa combinação entre qualidades morais e
capacidade de investigação, que testemunham a competência profissional do pesquisador
(YEGANIANTZ, 1987, p. 105).
Foi realizada uma pesquisa13 nos EUA, com cientistas da área médica dos Institutos
Nacionais de Saúde (NIH), com 3.247 questionários respondidos, onde um terço afirmou ter
cometido “alguma improbidade em seus estudos nos últimos três anos”. O questionário
continha 16 perguntas a respeito de má-conduta científica, com diferentes graus de gravidade,
desde “você manteve registros inadequados de suas pesquisas?”, até “você falsificou ou
‘fabricou’ dados de pesquisa?” Questionava ainda sobre a mudança do projeto, da
metodologia ou dos resultados de estudos, por pressões de fontes de financiamento. Nessa
questão, 15,5% responderam afirmativamente, o que remete à questão do ambiente atuando na
integridade da pesquisa. Apesar do estudo se restringir à área médica nos EUA, os dados são
preocupantes. Como o estudo evidencia, as “pequenas” infrações no mundo científico podem
fazer mais mal à integridade da comunidade científica do que os grandes escândalos que de
vez em quando são noticiados pela imprensa (NOGUEIRA, 2005). Realmente, grandes
13 Essa pesquisa foi conduzida por Brian C. Martinson, Melissa Anderson e Raymond de Vries.
47
escândalos têm destaque garantido na mídia, de forma a oferecer a oportunidade dos atores
interferirem para a redução dos danos ou para a inibição de incidentes futuros. Entretanto,
casos de fraude e adulteração de resultados, podem causar danos não calculados, com
impactos negativos à imagem da ciência.
Azevedo (2005) escrevendo sobre integridade científica no Brasil, relata que o
Escritório de Integridade Científica (Office of Research Integrity – ORI) dos EUA, informou
que no período de 1994 a 2003, houve 133 casos de “má condução científica, 53% por
falsificação de dados, 29% por fabricação de resultados, 36% por ações conjuntas de
fabricação/falsificação, entre outras desonestidades ocorridas com menores freqüências”.
Diante disso, essa autora aponta um inquietante questionamento: “Será ingenuidade admitir
que em um país tão maculado por corrupções, nos mais diversos níveis, tenha conseguido o
milagre de somente os honestos tenham se dedicado à pesquisa científica”. Apesar de o
questionamento ter sido feito para o Brasil, pode-se generalizar para a comunidade científica
em geral, uma vez que a corrupção não é um problema que ocorre apenas no Brasil. Nesse
artigo, a autora questiona ainda se “não teria chegado o momento para maiores reflexões e
respostas como anda a integridade científica no Brasil”. Mais uma vez pode-se também
aumentar o universo, estendendo esse questionamento em nível mundial.
Coutinho e Gurgel (2004) afirmam que por algum tempo “cientistas e políticos viam os
preceitos éticos como um estorvo que impediam ações mais ousadas, mais futuristas e, até
mesmo, mais necessárias à humanidade”. Esse fato resultou em “práticas científicas e
políticas afastadas completamente dos princípios morais: uma ruptura entre moral e política
(Maquiavel, por exemplo), e uma ruptura entre moral e ciência (Comte, por exemplo)”.
Outros autores, como Schwartzman (2002) e Yeganiantz (1987), vão mais longe:
“Já não há tanta certeza sobre a bondade das tecnologias, nem a convicção de
que a ciência conduza a um conhecimento eticamente superior, apesar da crise
das demais interpretações normativas da realidade, inclusive as religiosas. O
mundo da ciência e da tecnologia, que antes se mantinha protegido e isolado, é
hoje invadido por todo tipo de interesses e motivações, e já não comparte uma
cultura implícita, como antes parecia ser. Paradoxalmente, isto se dá ao mesmo
tempo em que a importância da tecnologia para a geração de riqueza e de poder
é maior do que nunca (SCHWARTZMAN, 2002)”.
48
“Se não existir uma firme convicção de levar-se a sério o problema social, a
pesquisa pode servir apenas para satisfazer a curiosidade científica e, em casos
relacionados com problemas sociais, para reivindicar, alertar e denunciar, e não
para solucionar estes problemas (YEGANIANTZ, 1987, p. 105)”.
Como se vê, a ciência tem uma série de desafios. Essa tem que considerar seu impacto
político e social e ambiental. Dessa forma, entende-se que a sociedade deve participar da
ciência e da pesquisa, de alguma forma. Também a comunidade científica deve participar da
formulação de políticas, não cabendo nessa idéia, o insulamento existente na comunidade
científica.
Ao resumir essa questão, Garrafa (2000, p. 176) lembra que:
A ética sobrevive sem a ciência e a técnica; isto é, sua existência não depende
delas. A ciência e a técnica, no entanto, não podem prescindir da ética, sob
pena de transformarem-se em armas desastrosas para o futuro da humanidade
nas mãos de minorias poderosas e/ou mal-intencionadas.
Com todas as reflexões apresentadas neste capítulo, observa-se que há questionamentos
sobre o fato de a ciência ser impessoal e moralmente inatacável.
Hans Jonas propõe “fundamentar uma modernidade ética apta a restringir a capacidade
humana de agir como um destruidor da auto-afirmação do ser, expressa na perenização da
vida” (BURSZTYN, 2002, p. 167).
A ciência “pode apresentar elementos parciais (pontuais) podendo testar a coerência de
uma certa visão e afinar certas análises. Entretanto, a ciência não pode jamais responder à
questão ética: Queremos nós assumir tal decisão?” (FOUREZ, 1995, p. 306).
Encontram-se também autores que acreditam que à ciência cabe explorar o
conhecimento e oferecer resultados e que a decisão se estes resultados serão ou não utilizados,
cabe à sociedade. Essa visão retira da ciência a responsabilidade ética, ou seja, de certa forma,
a ética é colocada fora da ciência, e é repassada à sociedade. Cabe saber se a sociedade detém
os conhecimentos necessários e dispõe de fóruns para avaliar o custo/benefício da tomada de
49
decisão sobre assuntos polêmicos. Além disso, num regime democrático, a tomada de
decisões sobre aplicações da ciência pela sociedade leiga, poderia ser alvo de manobra de
grupos mais favorecidos e de maior peso na mídia, como também estar sujeita à cultura de
cada povo.
Observa-se que a C&T vive um momento delicado em que tem que repensar suas bases,
trazendo para si questionamentos, visando incluir em seu bojo, avaliações não só referentes à
produção de conhecimentos como a questões maiores como a aplicabilidade dos
conhecimentos, impactos de suas descobertas sobre a questão da desigualdade social e
pobreza das nações, bem como sobre seus impactos na qualidade de vida das gerações atuais e
das gerações futuras. Isso requer uma maior reflexão, com olhar diferenciado, em relação ao
processo e resultados da C&T, o que leva a considerações sobre a mudança de foco,
priorizando a questão da ética na ciência.
1.4.1. Desenvolvimento sustentável e ética da sustentabilidade
A palavra “desenvolvimento” hoje não encontra uma uniformidade de conceitos e
expectativas. Bartholo Jr. e Bursztyn (2002, p. 163) reconhecem, a partir de interpretações da
Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), da ONU, uma
diferenciação entre conceitos como “crescimento”, que estaria relacionado com a expansão
qualitativa da economia e a palavra “desenvolvimento”, que envolveria elementos
qualitativos, como distribuição de renda e avanços sociais.
Assim surge uma opção ao estilo de desenvolvimento atual, baseado no crescimento
apenas econômico, que é o desenvolvimento sustentável.
A definição de desenvolvimento sustentável mais conhecida é a adotada pela Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em Brundtland, em 1987 (GUIMARÃES,
2001, p. 55), que entende desenvolvimento sustentável como “aquele que satisfaz as
necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das gerações futuras de
satisfazer suas próprias necessidades”.
Bartholo Jr. (2001, p. 20), propõe como “fundamento para uma ética da
sustentabilidade” a formulação de Jonas (1979), que conceitua desenvolvimento sustentável
50
como “a incorporação ao horizonte da intervenção transformadora do mundo da necessidade,
o compromisso com a perenização da vida”.
Esse desenvolvimento, segundo Guimarães (2001, p. 56) seria um desenvolvimento
medido com réguas diferentes das econômicas atuais (acumulação de bens e serviços, cultura
do consumismo). Sugere um desenvolvimento onde “haja mudanças qualitativas na qualidade
de vida e felicidade das pessoas”. Esses aspectos mais que as dimensões mercantis
transacionais no mercado, “incluem dimensões sociais, culturais, estéticas e de satisfação de
necessidades materiais e espirituais”. Desenvolvimento onde se priorize o bem estar do ser
humano e a “integridade ecossistêmica do planeta”.
Guimarães (2001, p. 65), conclui que:
A realidade empírica demonstra que a acumulação de riqueza, isto é, o
crescimento econômico, não é e não será jamais um requisito ou uma
precondição para o desenvolvimento do ser humano, pois o que determina tal
desenvolvimento é o uso feito por uma coletividade de sua riqueza, e não a
riqueza em si mesma.
Complementa dizendo que:
O afã do crescimento ilimitado baseado na crença do desenvolvimento
tecnológico, igualmente ilimitado, só é capaz de produzir a alienação dos seres
humanos, transformando-os em robôs que buscam incessantemente a
satisfação de necessidades que têm sempre menos relação com as
necessidades de sobrevivência e de crescimento espiritual (p. 67).
Assim, termos como desenvolvimento sustentável e ética do desenvolvimento, remetem
a um outro paradigma de desenvolvimento.
Guimarães (2001, p. 55 e 48) fala sobre ética do desenvolvimento, “na qual os objetivos
econômicos do progresso estão subordinados às leis de funcionamento dos sistemas naturais e
aos critérios de respeito à dignidade humana e de melhoria da qualidade de vida das pessoas”.
Esse autor sugere um novo paradigma de desenvolvimento:
Apto a inserir o ser humano no centro do processo de desenvolvimento,
considerar o crescimento como um meio, e não um fim, proteger as
51
oportunidades de vida das gerações atuais e futuras e, por conseguinte,
respeitar a integridade dos sistemas naturais que permitem a existência de vida
no planeta.
Bartholo Jr. e Bursztyn (2002, p. 172 e 176) lembram da necessidade de conscientização
sobre a “responsabilidade pela perenização da vida”, para que se possa entender o conceito de
sustentabilidade, visto que “as gerações futuras são vulneráveis a nossos atos, mas a recíproca
não é verdadeira”. Na atualidade, ao mesmo tempo em que o homem adquire conhecimento
sobre as forças da natureza, mais é temido o poder de intervenção do homem sobre a própria
natureza.
Fica claro em Bursztyn (2001, p. 64) que o conceito de sustentabilidade deve combinar
dois momentos. O primeiro seria a consideração dos direitos das gerações futuras. O segundo
seria a solidariedade com o “outro”, no presente.
Há ainda outras questões que dificultam a visão do meio ambiente como um bem a ser
protegido, como o desenvolvimento sustentável requer, que é a visão mercadológica do
parâmetro econômico vigente e uma questão mais complicada e que envolve outras reflexões
que é o antropocentrismo. Alguns autores opinam que somente o ecocentrismo aponta uma
perspectiva para a sobrevivência do ecossistema.
Como se pode observar essa questão ética ainda requer muita discussão e
posicionamento, uma vez que a responsabilidade dos cientistas é muito grande e determinante
para essa mudança de paradigma no desenvolvimento.
Em Bartholo Jr. e Bursztyn (2002, p. 183), encontra-se um desfecho para essa questão:
Decisões em consonância com o princípio ‘sustentabilidade’ são decisões
éticas, que contribuem para a manutenção e aperfeiçoamento de sistemas de
sustentação da vida. O fortalecimento de códigos de conduta e diretrizes para a
comunidade científica e tecnológica contribui decisivamente para a
consciência ambiental e o desenvolvimento sustentável.
52
2. ÉTICA E PESQUISA AGROPECUÁRIA
Este capítulo está dividido em dois itens. O primeiro apresenta reflexões acerca da ética,
da ética na pesquisa, da bioética, evoluindo para a apresentação de elementos para um
conceito de ética na pesquisa agropecuária. São apresentados também alguns princípios éticos
ou questões éticas referentes à pesquisa, segundo alguns autores, buscando compreender
melhor o tema.
A segunda parte do capítulo apresenta o tema ética na Embrapa, procurando mostrar a
sua importância para a empresa e como esse tema está inserido formalmente nas normas e
demais documentos da empresa. Apresenta ainda um diagnóstico sobre a “gestão da ética” na
Embrapa e analisa os preceitos éticos da pesquisa constantes no Código de Ética da Embrapa.
2.1. ÉTICA NA PESQUISA AGROPECUÁRIA
Este item contém os seguintes tópicos: conceitos de ética; ética na pesquisa; bioética; e
elementos para um conceito de ética na pesquisa agropecuária. Também encontram-se citados
alguns princípios éticos na pesquisa agropecuária, encontrados na literatura.
2.1.1. Conceitos de Ética
Regular a relação entre os homens é uma necessidade antiga, objeto de várias
disciplinas e conteúdos dentro destas. A ética faz parte da filosofia, uma disciplina cuja
origem remonta a mais de 2.500 anos. É um termo muito rico de reflexões e de significados
na literatura.
A palavra ética vem do grego “ethos”, que tem dois significados: a) a palavra escrita
com “e” minúsculo (com “eta”), significa morada do ser, no sentido de casa; e b) a palavra
escrita com “E” maiúsculo (com “epsílon”), significa costumes, ou “conjunto de valores e de
hábitos consagrados pela tradição cultural de um povo” (BOFF, 2003, p. 28 e 29).
53
Gardner (1965, p. 21) assinala que a discussão sobre ética tradicional levanta dois
conceitos distintos que é o direito (que seria o certo) e o bem. Acrescenta que:
O conceito de direito envolve as noções de dever, de lei moral e de
imperativos; o conceito de bem envolve a idéia dos bens ou fins almejados.
No primeiro caso, a vida ideal é apreciada em termos de obediência à lei; no
segundo, como satisfação de desejos e realização de fins... Alguns pensadores
éticos – Immanuel Kant, por exemplo – têm sustentado que a questão
concernente ao direito, ao certo, é primária; outros – Aristóteles, por exemplo,
consideraram o bem como a mais importante.
Entretanto, esse autor concorda com o fato de que uma e outra são importantes e de
certa forma dependentes. Enquanto Kant introduziu o conceito de dever, como uma obrigação
humana, Aristóteles fundamentou a ética na noção do bem ou alvo (Ibidem, p. 22).
Abbagnano (1982, p. 360), também trata de duas concepções fundamentais da ética:
1) a que a considera como ciência do fim a que a conduta dos homens se deve
dirigir e dos meios para atingir tal fim; e deduz tanto o fim quanto os meios da
natureza do homem; 2) a que a considera como ciência do móvel da conduta
humana e procura determinar tal móvel com vistas a dirigir ou disciplinar a
mesma conduta. Essas duas concepções, que se entrelaçaram variadamente na
Antiguidade e no mundo moderno, são profundamente diferentes e falam duas
linguagens diversas. A primeira, com efeito, fala a linguagem do ideal a que o
homem está dirigido pela sua natureza, e por conseguinte, da ‘natureza’ ou
‘essência’ ou ‘substância’ do homem. Já a Segunda fala dos ‘motivos’ ou das
‘causas’ da conduta humana ou das ‘forças’ que a determinam e pretende ater-
se ao conhecimento dos fatos.
Acrescenta ainda que:
A confusão entre ambos os pontos de vista heterogêneos foi possibilitada pelo
fato de ambas se apresentarem habitualmente na forma aparentemente idêntica
54
de uma definição do bem. Mas a análise da noção do bem mostra logo a
ambigüidade que ela oculta: já que bem pode significar ou o que é (pelo fato
de que é) ou o que é objeto de desejo, de aspiração etc.: e estes dois
significados correspondem exatamente às duas concepções de ética.
A ética é o estudo crítico da moralidade e esse estudo pressupõe que o homem é livre e
responsável. “A não ser que ele seja livre em sentido bem real, não pode ser considerado
responsável pelos seus atos; e se não é responsável por esses atos, não há sentido em falar
deles como tendo significação ética”. (Gardner, 1965, p. 19). Apesar de existirem concepções
diferentes, ética, em geral, é a ciência da conduta (ABBAGNANO, 1982, p. 360). Entretanto,
este estudo não pretende oferecer uma extensa discussão etimológica do termo e nem acerca
dos autores clássicos que são referências sobre o assunto. Os conceitos de ética são aqui
apresentados para servir de base para construção de outros conceitos.
Há uma relação estreita entre os conceitos de ética e moral. Em geral, no dia a dia,
usam-se essas expressões como sinônimas. Entretanto, há diferenças.
Moral é uma palavra que vem do latim “mos-mores”, que significa “os costumes e
valores de uma determinada cultura” (BOFF, 2003, p. 29). Em geral seu significado diz
respeito ao conjunto de normas ou regras de conduta de uma pessoa, de grupos, ou mesmo de
uma época, considerados válidos.
De acordo com Abbagnano (1982, p. 652), a palavra moral pode ser vista com dois
significados, que são: o mesmo que ética; e “o objeto da ética, a conduta enquanto dirigida ou
disciplinada por normas, o conjunto dos mores. Neste significado, a palavra é usada nas
seguintes expressões: ‘a moral dos primitivos’, ‘a moral contemporânea’ etc.”. Nesse caso
estaria sujeita a avaliação, principalmente positiva.
Hengel (apud ABBAGNANO, 1982, p. 387) distingue eticidade de moralidade. A
moralidade é conceituada como “a vontade subjetiva, isto é, individual ou privada, do bem”.
A eticidade é “a realização do mesmo bem em realidades históricas ou institucionais, que são
a família, a sociedade civil e o Estado”.
Apesar de se encontrar muito a palavra ética como sinônimo de moral, Boff (2003, p.
27-28) considera:
55
Todas as morais, por mais diversas, nascem de um transfundo comum, que é a
ética. Ética somente existe no singular, pois pertence à natureza humana,
presente em cada pessoa, enquanto a moral está sempre no plural, porque são
as distintas formas de expressão cultural da ética.
Boff (Ibidem, p. 30) utiliza duas formulações práticas que visam explicar bem essa
diferença. Quando se diz que a pessoa não tem ética, significa dizer que:
Essa pessoa não possui princípios, age oportunisticamente, consoante as
vantagens que possa auferir; dela não se poderá esperar nenhum
comportamento coerente e previsível, porque não possui uma opção
fundamental de vida. Não tem ética, por exemplo, um jornalista que trai seus
princípios para fazer, por bom dinheiro, a campanha de um político
notoriamente corrupto. A alegação de que faz um ‘trabalho profissional’ não
justifica a traição ética do jornalista ou de qualquer outro profissional.
Quando se diz que a pessoa não tem moral, significa dizer que:
Essa pessoa não possui virtudes, mente, engana clientes, rouba dinheiro
público, explora trabalhadores, faz violência em casa. Essa pessoa pode até ter
ética (princípios e valores fundamentais), mas age em contradição com os seus
princípios.
Pode acontecer de uma pessoa não possuir ética e nem moral. Nesse caso, ela “age
aleatoriamente, consoante seus interesses mais imediatos” (Ibidem).
Dentro de um contexto prático, a ética estuda os juízos de apreciação referentes à
conduta humana, sob a ótima do bem e do mal, do justo e do injusto.
Romano (2001) lembra o conceito de ética relativa a determinado povo:
56
A ética é o conjunto de hábitos, de atitudes, de pensamentos, de formas
culturais de um povo, adquiridas ao longo do tempo, durante longo tempo.
Uma ética não surge de repente, brotando do nada. A ética, deste modo, vai se
sedimentando na memória e na inteligência das pessoas, irradiando-se em atos
que são feitos sem muitos esforços de reflexão ou crítica. A ética é o que se
tornou quase uma segunda natureza das pessoas, de modo que seus valores são
assumidos, digamos, automaticamente ou sem crítica.
Yeganiantz (1987, p. 104) lembra que apesar da ética ser um conceito que varia no
tempo, guarda uma essência:
A ética estuda os princípios normativos do comportamento humano e os
valores morais que dirigem a vida dos homens... Por mais que esses valores
sejam variáveis, ou inconstantes, há um fato imutável, o de ser o homem um
animal moral, isto é, que se conduz segundo valores e que se vê julgado,
punido ou gratificado, ainda segundo esses valores dominantes na sociedade.
Singer (1998, p. 20), acredita que “A ética exige que extrapolemos o ‘eu’ e o ‘você’ e
cheguemos à lei universal, ao juízo universalizável, ao ponto de vista do espectador imparcial,
ao observador ideal, ou qualquer outro nome que lhe dermos”. Esse mesmo autor (p. 9) cita a
ética prática, que considera “a aplicação da ética ou moralidade (usarei indiferentemente essas
duas palavras) à abordagem de questões práticas, como... o uso de animais em pesquisas e
para a fabricação de alimentos, a preservação do meio ambiente”, dentre outros.
Valenti e Silva (1995, p. 27), discorrendo sobre ética no trabalho, ressaltam que “a
filosofia moral ou, simplesmente, a ética surge no contexto social de repente, quando a
convivência torna-se difícil, em função de situações que demandam consenso no
entendimento humano e diferenças entre escalas de valores”. Cada classe profissional se
organiza e define condutas aceitáveis ou não, para conhecimento e cumprimento por todos.
Para Teixeira (2005, p. 131 e 133), ética “é um conjunto de normas de conduta que
devem ser postas em prática no exercício de qualquer profissão. É, por assim dizer, a ação
‘reguladora’ do desempenho das profissões, que exige que o profissional respeite seu
57
semelhante quando no exercício da sua profissão”. Mais adiante, resume: “O homem não
deve construir seu bem à custa da destruição de outros. Isso é ética”.
Esse mesmo autor enumera princípios que parecem comuns no exercício de toda
profissão: honestidade, sigilo, competência, prudência, coragem, perseverança, compreensão
(afinidade interpessoal), humildade, imparcialidade e otimismo (p. 135 a 138).
A ética é um “quadro de princípios, preceitos e regras de comportamentos implícitos nas
leis ou vindos da tradição e de usos e costumes correntes a que pessoas devem-se submeter,
sendo julgadas pelo seu cumprimento” (YEGANIANTZ, 1987, p. 103).
O Código de Ética da Embrapa oferece o seguinte conceito de ética “Ética é a promoção
dos costumes e atos considerados como sendo os melhores e mais justos, sem distinção ou
discriminação de qualquer natureza”.
Cañas-Quirós (1998) apresenta um esquema didático (Figura 1) que permite visualizar
melhor o conceito e uso do termo ética. Explica que ao se falar em ética como ciência
normativa, referente à retidão dos atos humanos, com base em princípios racionais, trata-se de
“ética geral”, que remete a metafísica e a antropologia filosófica e busca explicar questões
como liberdade, natureza do bem e do mal, felicidade e outros. Chama de “ética especial” ou
“ética aplicada”, aquela que busca levar para a prática os fundamentos gerais da ética. Os
princípios básicos seriam sedimentados no plano individual, familiar e social. O nível social
se subdivide em outros ramos, como ética internacional, ética econômica, ética profissional.
Já esta última se subdividiria em ética das diversas profissões, cujo exemplo apresentado foi
ética médica, ética do jornalismo e ética da educação.
58
Ética
Figura 1: Classificação da ética. Fonte: Cañas-Quirós (1998).
O esquema apresentado facilita a visualização da abrangência da questão. Entretanto,
não retrata a interface que cada aspecto desses tem com o outro. Buscando atender a essa
necessidade, partindo do raciocínio do autor citado, utilizou-se a Figura 2. Por meio dela,
pretende-se mostrar a interdependência de cada uma dessas abordagens. Entende-se que a
ética institucional e a ética profissional utilizam-se de conceitos e princípios provenientes da
ética pessoal (pontos de interseção A e B). A ética institucional por sua vez também se utiliza
da ética profissional e vice-versa (ponto de interseção C), sendo praticamente impossível
separar totalmente umas das outras ou medir o quanto uma está contida na outra. O ponto de
interseção D retrata o ponto comum entre as várias dimensões da ética, ou seja, os princípios
lá contidos podem ser requisitados para qualquer atividade do indivíduo, independente do
local e do papel desempenhado. Entretanto, todas essas abordagens, ética pessoal, profissional
e institucional estariam contidas na ética geral.
Ética Geral
Ética Geral
Ética Aplicada
Ética Individual
Ética Familiar
Ética Social
Ética Internacional
Ética Econômica
Ética Profissional
Ética Médica
Ética do Jornalista
Ética do Educador
59
Figura 2: Exemplificação de interfaces na classificação da ética.
A ética é um tema amplamente discutido e canaliza uma série de artigos e sub-temas.
No decorrer desse trabalho, encontrou-se vários olhares e várias conceituações, como: ética
pessoal, ética protestante, ética profissional, ética organizacional ou institucional, ética
empresarial, ética planetária, ética mundial, ética periférica, ética prática, ética aplicada, ética
das virtudes, ética da convicção, ética da responsabilidade, ética do discurso, ética agrícola,
ética holística.
Ainda na visão aplicada, Weil (1993, 19-23) caracterizada a ética em duas formas, que
chamou de ética moralista e ética espontânea ou essencial. A ética moralista seria aquela
adquirida de forma artificial, por pressão de fora e se confunde muito com moral. Já a ética
espontânea seria aquela despertada dentro do próprio indivíduo, conforme explica:
Ética moralista é por conseguinte uma ética forjada, artificialmente criada pela
pressão social, contrariando os supostos instintos egoístas, e posteriormente
racionalizada pela inteligência sob a forma de máximas moralizantes
elaboradas por filósofos religiosos ou materialistas, mas todos racionalistas.
60
O que caracteriza a ética espontânea ou essencial é:
O homem visto como um organismo vivo que contém os princípios do
universo... Os valores da Ética têm que ser despertados. A Ética e os seus
valores são endógenos, isto é, vêm de dentro. Uma vez despertados a
sabedoria e o verdadeiro amor altruísta dentro do ser humano, a regras morais
são dispensáveis.
Esse mesmo autor adverte que a ética moralista e a espontânea se complementam e que
a primeira é necessária para aqueles que ainda não conseguiram despertar a segunda.
Deontologia é uma palavra que vem do grego “déon, déontos” e que significa dever.
Juntamente com o sufixo “logia”, compõem a palavra deontologia, que significa “conjunto de
deveres, princípios e normas adaptadas por um determinado grupo profissional”. De acordo
com a página da web “Psicologia.com.pt”, considerando que “a deontologia é uma disciplina
da ética especial adaptada ao exercício de uma profissão”, existem muitos códigos
deontológicos referentes a determinadas profissões. Estes, regra geral, “têm por base as
grandes declarações universais e esforçam-se por traduzir o sentimento ético expresso nestas,
adaptando-o, no entanto, às particularidades de cada país e de cada grupo profissional”.
Ética organizacional, segundo a visão de Humberg (2002, p. 25) é:
Um comportamento regido por padrões claros, explícitos, que correspondem à
postura real dos dirigentes... Ou seja, a ética é parte daquilo que se define
como cultura ou filosofia organizacional: são padrões de comportamento que
correspondem a valores reais, aceitos e assumidos pelos componentes da
organização, a partir de sua cúpula.
Para esse autor (p. 56) “a ética é como a água: corre de cima para baixo”, no sentido de
que a empresa se parece com o seu dono. Nesse caso, os dirigentes têm de ter e mostrar uma
conduta ética adequada, pois caso não o façam, darão aos seus colaboradores o direito de
fazer o mesmo. Argumenta: “As empresas se parecem muito com o dono. Se ele é corrupto, a
61
tendência é que o diretor seja corrupto e o faxineiro não veja nenhum problema em levar
detergente para casa...”. No caso de empresa pública, o “dono”, que é a sociedade brasileira,
se faz representar pelos seus dirigentes. Dessa forma, as instituições devem investir no padrão
ético dos seus dirigentes em todos os níveis.
Singer (1998, p. 21), discorrendo sobre a tomada de decisões, cita duas possibilidades,
que é o vazio ético absoluto, onde ele considera que há um desconhecimento total de
considerações de natureza ética e um estágio pré-ético de pensamento, onde a consciência
ética não está ainda totalmente desenvolvida. Essas duas possibilidades podem existir na
empresa e esta pode atuar no sentido do desenvolvimento da consciência ética, com
estratégias semelhantes às da educação.
Para efeito deste trabalho, considerar-se-á o conceito de ética aplicada ao mundo do
trabalho e da pesquisa, ou seja, considerando que a ética envolve reflexão, seria um conjunto
de princípios morais assumidos por uma classe de profissionais ou pelos integrantes de uma
organização, que guiará a conduta dos integrantes daquela classe. Dessa forma, a ação de cada
indivíduo deverá refletir esse conjunto de princípios, que já estarão devidamente
internalizados pelos mesmos.
2.1.2. Ética na pesquisa
Pesquisa é a investigação sistemática, baseada em um método, para se chegar à
compreensão de uma determinada realidade.
Minayo (1994, p. 17 e 18), discorrendo sobre o conceito de metodologia de pesquisa,
conceitua pesquisa como:
A atividade básica da Ciência na sua indagação e construção da realidade. É a
pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza frente à realidade do
mundo. Portanto, embora seja uma prática teórica, a pesquisa vincula
pensamento e ação. Ou seja, nada pode ser intelectualmente um problema se
não tiver sido, em primeiro lugar, um problema da vida prática. As questões
62
de investigação estão, portanto, relacionadas a interesses e circunstâncias
socialmente condicionadas. São frutos de determinada inserção no real, nele
encontrando suas razões e seus objetivos. Toda investigação se inicia por um
problema com uma questão, com uma dúvida ou com uma pergunta,
articuladas a conhecimentos anteriores, mas que também podem demandar a
criação de novos referenciais.
A Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde
(CNS/MS)14 define pesquisa como:
Classe de atividades cujo objetivo é desenvolver ou contribuir para o
conhecimento generalizável. O conhecimento generalizável consiste em
teorias, relações ou princípios ou no acúmulo de informações sobre as quais
estão baseados, que possam ser corroborados por métodos científicos aceitos
de observação e inferência.
Essa resolução define ainda: pesquisa envolvendo seres humanos, como uma “pesquisa
que, individual ou coletivamente, envolva o ser humano de forma direta ou indireta, em sua
totalidade ou partes dele, incluindo o manejo de informações ou materiais”; risco da pesquisa,
que seria a “possibilidade de danos à dimensão física, psíquica, moral, intelectual, social,
cultural ou espiritual do ser humano, em qualquer fase de uma pesquisa e dela decorrente” e
dano associado ou decorrente da pesquisa, que seria o “agravo imediato ou tardio, ao
indivíduo ou à coletividade, com nexo causal comprovado, direto ou indireto, decorrente do
estudo científico”.
Buscou-se na literatura um conceito de ética na pesquisa, que atendesse ao presente
estudo. Entretanto, a maioria dos conceitos encontrados, não tinha a ver com a idéia aqui
tratada, referindo-se mais ao comprometimento do pesquisador com o objeto da pesquisa e
Esta é uma resolução do Conselho Nacional de Saúde, órgão pertencente ao Ministério da Saúde e estabelece as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Institui os Comitês de Ética em Pesquisa (CEP), a quem devem ser submetidas as pesquisas envolvendo seres humanos, e versa sobre suas atribuições. Estabelece ainda a composição e atribuições da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP/MS), “instância colegiada, de natureza consultiva, deliberativa, normativa, independente, vinculada ao Conselho Nacional de Saúde”. Informações sobre a Resolução 196/96 foram extraídas do site http://www.ensp.fiocruz.br/etica/resolucoes.cfm#pre, acessado em 14.05.2005.
63
não com princípios na execução da pesquisa ou com o comprometimento do pesquisador com
o uso dos resultados da pesquisa.
Para elaboração de um conceito de ética na pesquisa seria necessário combinar
qualidades morais com capacidade de investigação (YEGANIANTZ, 1987, p. 105), visando a
busca do conhecimento tendo como foco o bem da humanidade.
2.1.3. Bioética
A bioética tem sua origem na ética médica e o termo foi utilizado pela primeira vez em
1971, pelo oncologista Van Rensselder Potter, que a propunha como uma nova disciplina
(SCHOLZE, 2002, p. 192-193). Segundo a autora, citando Warren T. Reich, bioética é: “O
estudo sistemático da conduta humana na área das ciências da vida e da saúde, examinada à
luz dos valores e dos princípios morais”. Dissecando a definição acima, são identificados três
elementos:
Trata-se do estudo sistemático da conduta humana, vale dizer o estudo
científico e orgânico, uma construção lógica guiada pelo pensamento racional,
com vínculo de coerência interna para alcançar um resultado científico em
determinada área de pesquisa. A bioética seria, então, sistemática no sentido
de que pensa seu campo de estudo segundo uma configuração lógica interna
que o domínio da ética ou o biológico não chegariam, isolados, a configurar
adequadamente. Quanto ao segundo elemento, a área das ciências da vida é
um campo que compreende, em uma visão global e interdisciplinar, o estudo
da promoção da qualidade de vida do homem e dos ecossistemas, conjugando
reflexões ecológicas, antropológicas e éticas. Por fim, a definição de Reich
destaca que na bioética a conduta humana é examinada à luz de valores e
princípios morais (Ibidem, p. 197-198).
Bioética “é um ramo da ética aplicada que reúne um conjunto de conceitos, princípios e
teorias, com a função de dar legitimidade às ações humanas que podem ter efeito sobre os
fenômenos vitais e a vida em geral”, conceitua Yeganiantz (2001, p. 140).
64
Observa-se que algumas profissões que lidam diretamente com o corpo humano, como a
medicina, a odontologia e a enfermagem, encontram-se preocupadas com a questão da ética
na pesquisa, que pode ser comprovada devido ao número de publicações sobre o assunto.
Esses estudos são motivados por abusos ocorridos na experimentação com o ser humano já
vivenciados no mundo e estes advogam a favor da proteção das pessoas e de grupos mais
vulneráveis, buscando o respeito ao ser humano.
Os princípios da bioética são encontrados na literatura facilmente. Apesar de não haver
uma uniformidade dos princípios encontrados, observa-se que o foco, em geral, é o respeito
ao indivíduo.
A Resolução 196/1996 do CNS/MS, que regulamenta aspectos éticos da pesquisa
envolvendo seres humanos, já cita anteriormente, explicita algumas exigências éticas e
científicas fundamentais para pesquisa:
a) consentimento livre e esclarecido dos indivíduos-alvo e a proteção a grupos
vulneráveis e aos legalmente incapazes (autonomia). Neste sentido, a pesquisa
envolvendo seres humanos deverá sempre tratá-lo em sua dignidade, respeitá-
lo em sua autonomia e defendê-lo em sua vulnerabilidade; b) ponderação entre
riscos e benefícios, tanto atuais como potenciais, individuais ou coletivos
(beneficência), comprometendo-se com o máximo de benefícios e o mínimo
de danos e riscos; c) garantia de que danos previsíveis serão evitados (não
maleficência); d) relevância social da pesquisa com vantagens significativas
para os sujeitos da pesquisa e minimização do ônus para os sujeitos
vulneráveis, o que garante a igual consideração dos interesses envolvidos, não
perdendo o sentido de sua destinação sócio-humanitária (justiça e eqüidade).
Em um artigo sobre ética na pesquisa envolvendo seres humanos, Azevedo (2004)
enumera certas preocupações referentes a esse assunto, como: evitar que a população seja
utilizada de forma abusiva como sujeito de investigação; conflito de interesses dos
“pesquisadores que também atuam nas empresas – ou, em alguns casos, até mesmo são sócios
delas – que colocarão no mercado o produto desenvolvido com seu conhecimento”. Advoga a
importância de o pesquisador colocar “sua postura de independência de julgamento e de
moralidade científica acima dos interesses comerciais”.
65
A Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos15, em seu
Artigo 13, fala sobre as responsabilidades inerentes às atividades dos pesquisadores:
As responsabilidades inerentes às atividades dos pesquisadores, incluindo
rigor, cautela, honestidade intelectual e integridade no desempenho de suas
pesquisas, bem como aquelas relacionadas à divulgação e utilização de suas
descobertas, devem ser alvo de atenção especial no âmbito da pesquisa sobre o
genoma humano, em função de suas implicações éticas e sociais.
Formuladores de políticas públicas e privadas de desenvolvimento científico
também possuem responsabilidades específicas nesse aspecto.
2.1.4. Elementos para um conceito de ética na pesquisa agropecuária
Quatro pesquisadores estão sentados à mesa do restaurante da
empresa, conversando sobre a questão da política no Brasil. A conversa
gira em torno da corrupção, lavagem de dinheiro, caixa 2, contratação
de parentes, falta de compromisso com as promessas feitas nas
campanhas, enfim, sobre a falta de ética na política. Demonstram
repulsa pelo comportamento dos políticos e condenam sua falta de
compromisso com a função pública. Depois dois deles saem e os que
ficam mudam a conversa e um propõe que o outro o coloque como co-
autor de um trabalho que este está fazendo sozinho e vice-versa, para
conseguirem mais pontuação no sistema de avaliação de desempenho
da empresa.
Esse comportamento trai a moral e a ética, no mínimo, pelos motivos: a) se a pessoa
não ajudou a escrever o artigo e é citado como co-autor, isso não corresponde à verdade; b) o
comportamento apesar de parecer inocente, não reflete uma preocupação com os outros
indivíduos, uma vez que com uma mentira, esses conseguiriam ser melhor avaliados,
prejudicando outros.
15 Essa declaração foi adotada pela Conferência Geral da UNESCO, em sua 29ª sessão, em 1997 e encontra-se disponível no site: http://www.dhnet.org.br/direitos/direitosglobais/paradigmas_textos/genomahum.html, da
66
Esse é um exemplo hipotético16, mas reflete bem um problema comum quando se fala
em ética, que é a condenação do ato dos outros e a falta de crítica sobre nossas próprias ações
e, conseqüentemente, a não ligação das mesmas com um comportamento errado ou antiético.
Essa é uma tendência do ser humano, de julgar os outros com um rigor maior do que julga a si
próprio. Procurou-se um exemplo que ferisse a ética na pesquisa, mas poderia ser outro
qualquer. A todo o momento, em atos cotidianos, o ser humano pode estar cometendo deslizes
éticos, sem a devida crítica de seus próprios atos, que nos outros não só seriam notados como
também condenados. Janine (2004) denuncia esse procedimento: “Faz parte do nosso discurso
social, da nossa fala com o outro, afirmar: eu sou ético, num mundo em que o resto não o é.
Eu sou do bem. O mundo está de pernas para o ar, tudo está errado, mas eu não”. Romano
(2001) explica: “A idéia de se monopolizar o bem, jogando o mal para os nossos adversários,
para os que agem e pensam diferente de nós, acompanha a idéia de monopolizar a verdade...”
Depois dessa ilustração, retorna-se à questão da ética na pesquisa agropecuária. Na
literatura, não foram encontrados muitos títulos enfocando especificamente a ética na
pesquisa agropecuária, do ponto de vista da comunidade científica. Entretanto, encontra-se
muito a discussão e expressão de preocupações com a ética em assuntos afetos a pesquisa
agropecuária na literatura e na mídia eletrônica, digital e escrita, por parte de estudiosos e da
sociedade em geral. Cita-se, dentre outras, pesquisas biotecnológicas e utilização de animais
em pesquisas.
No caso da biotecnologia, há leis no Brasil que regulam sua utilização (Lei de
Biossegurança17), inclusive com a criação de órgãos reguladores.
No caso da utilização de animais em pesquisa, tem-se atualmente no Brasil projeto de
lei que dispõe sobre esse assunto. O Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (Cobea)18,
UNESCO, acessado em 04.10.2005.
16 Esse exemplo foi criado a partir de um caso hipotético semelhante, citado no artigo de Cláudio Thomas, intitulado “A Ética do Jornalista: o outro lado da questão”, disponível no site: http://www.hottopos.com/mirand4/suplem4/aticado.htm, acessado em 03.04.2005.
17 A Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005) estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados; cria o Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS); reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança (PNB).
18 O Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (Cobea) é um órgão da sociedade civil, sem fins lucrativos e de caráter científico-cultural, com sede em São Paulo. É formada por pesquisadores e técnicos interessados em experimentação animal. Esses princípios éticos estão disponíveis na página da web: http://www.biotecnicas.hpg.ig.com.br/etica.htm, acessado em 03.11.2005.
67
em Junho de 1991 editou os “princípios éticos na experimentação animal”, com nove artigos
sobre o assunto, reconhecendo que:
O progresso dos conhecimentos humanos, notadamente os referentes à
biologia, à medicina humana e dos animais, é necessário. O homem precisa
utilizar animais em busca de conhecimento, para se nutrir, se vestir e trabalhar.
Assim, ele deve respeitar o animal, seu auxiliar, como um ser vivente como
ele.
Quando se fala em animais, lembra-se logo de Peter Singer, que é um veemente
defensor de sua causa. Este autor não concorda com a discriminação dos animais com base na
espécie. Defende a igualdade para os animais, pelo fato dos mesmos terem direitos por
possuírem a capacidade de sofrer. A sua obra oferece detalhes de experiências científicas com
animais, tentando provar que a grande maioria delas é irrelevante para o desenvolvimento
científico e que poderia ser evitada.
Tem-se ainda no Brasil leis sobre a questão da propriedade intelectual e outras que
regulamentam segmentos da atividade agropecuária. Vale ressaltar que essas leis não versam
diretamente sobre ética. Entretanto, têm uma interface com a ética, na medida em que
regulamentam questões que podem estar localizadas naquela zona cinzenta, onde não se tem
um limite claro entre o correto e o questionável.
Yeganiantz & Macedo (2000, p. 127 e 143) propõem a introdução da ética agrícola,
“como um meio de encontrar sinergias e ligações entre a economia agrícola, a sociologia rural
e a filosofia moral, por meio de um processo educacional e de reformulação da política
agrícola”.
A ética agrícola nega que a agricultura, enquanto uma atividade estritamente
econômica, seja aética. O fundamental é superar o direito econômico e
consagrar o direito do desenvolvimento sustentado que pressupõe a
prevalência da ética nas relações individuais e sociais, relacionadas com a
produção agrícola, segurança alimentar, erradicação da forme e proteção do
meio ambiente.
68
Esses autores sugerem ainda que a ética agrícola seja incorporada como um
“componente obrigatório dos novos cursos relacionados com as ciências naturais e agrárias”.
No Código de Ética da Embrapa, publicado em 10.01.2005, encontram-se alguns
princípios de ética na pesquisa, que serão analisados mais detidamente no próximo item.
Algumas questões atuais, que refletem a preocupação da sociedade com os rumos e com
os resultados da ciência e a opinião de alguns cientistas, merecem referência.
Sobre os organismos geneticamente modificados, os transgênicos, é grande a discussão.
Os que se posicionam contra, alertam para além dos problemas que podem ocorrer no meio
ambiente e sobre a saúde humana. Também citam as implicações econômicas, sociais e
políticas dessa técnica, em nível mundial.
Entretanto, é comum encontrar opiniões contrárias na comunidade científica e na
sociedade em geral. No caso exemplificado, alguns acreditam que a transgenia é uma
segurança para a população, na medida em que é uma técnica nova e como tal passará por
testes, além dos pesquisadores conhecerem o gene que foi alterado, de forma que, em tese,
facilitaria ainda mais controlar seus possíveis efeitos na alimentação.
Outros profissionais citam a questão de que há outras técnicas também questionáveis
como mutagênese19, ou mesmo o uso de fertilizantes (agroquímicos) que não despertou tanto
o interesse e questionamentos da sociedade. Cita-se também a questão dos alimentos
“orgânicos”, cujo monitoramento da qualidade da água utilizada é uma questão fundamental,
uma vez que caso a água esteja contaminada, o alimento pode ser prejudicial à saúde. Outros
ainda vão mais longe, lembrando que tudo tem um risco e que hoje é muito difícil imaginar
um alimento que não tenha passado por um processo de melhoramento.
Há quem alegue que a própria agricultura já agride de certa forma o meio ambiente,
trazendo impactos para o mesmo. Sabe-se que a projeção da população do planeta para 2050 é
de nove bilhões, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a
Alimentação (FAO, 2001). Essa previsão é certamente um grande desafio para a agricultura,
uma vez que esta terá que atender a um número crescente de pessoas, com praticamente a
mesma quantidade de terra agricultável.
19 Mutagênese é um processo que consiste na modificação na informação genética, que resulta em células ou indivíduos com características diferentes.
69
Mais do que nunca é necessária uma reflexão sobre alternativas para se obter técnicas
que possibilitem alimentar as pessoas, porém que gerem menos impactos negativos sobre o
meio ambiente e com menos riscos para a população.
Princípios éticos na pesquisa agropecuária
O setor agropecuário inclui uma ampla gama de atividades. Busca-se, nesse item,
encontrar princípios que se apliquem pelo menos à maioria das funções, classificadas como
“agropecuária”.
Não foram encontrados na literatura os princípios éticos da pesquisa agropecuária,
descritos claramente, sob esse título. Entretanto, foram encontrados alguns princípios da
pesquisa, que podem fazer parte de uma discussão sobre sua aplicabilidade ou não para a
pesquisa agropecuária. No Quadro 1, são citados os princípios que Valls (2001, p. 70-73)
chamou de éticos ou morais do trabalho de pesquisa.
70
Quadro 1: Princípios éticos ou morais do trabalho de pesquisa, segundo Valls (2001)
PRINCÍPIOS DETALHAMENTO
Finalidades últimas “Levar em conta finalidades últimas, e não apenas refletir de maneira imediata sobre os meios e os objetivos de curtíssimo prazo”
Prudência “Voltar a recorrer à reflexão, buscando uma certa prudência, que já foi definida, como regra do agir”
Universalização ou “universalizabili-dade”
Princípio da universalização, ou seja, “antes de me decidir por uma ação, deveria refletir sobre essa máxima que pretendo seguir é digna de ser universalizada”. Essa Lei é o contrário daquela que orienta que se deve levar vantagem em tudo
Respeito “Respeito pela dignidade do ser humano”. Valls lembra Kant, que formula esse princípio “dizendo que sempre é preciso tratar a humanidade, em nós mesmo ou nos outros, também como um fim em si e jamais apenas como um meio”
Princípios da área médica
Sugere ainda buscar os princípios éticos da área médica: Beneficência; Não-maleficência; da Justiça e outros, buscando também estudar o juramento de Hipócrates
Ação do duplo efeito
Ação do duplo efeito, “onde se busca um bem maior precisando aceitar uma conseqüência menos boa que acompanha o resultado”. Segundo o autor este e os próximos princípios seriam salvaguardando o da universalização
Mal menor Princípio do mal menor, “quando somos obrigados a agir escolhendo entre dois resultados negativos”
Bem maior Ligado ao “princípio chamado ‘regra de ouro’ do fazer aos outros o que se quer que façam em nosso proveito”
Custo e Benefício Custo e benefício, que é um “princípio nascido na economia e transplantado principalmente para os setores administrativos”
Separação das decisões macro e micro
Princípio da separação das decisões macro e micro. “A direção geral se responsabiliza pelos investimentos básicos e as instâncias inferiores agem da melhor maneira possível, administrando os meios e os recursos que foram deixados à sua disposição”
71
Maffia e Mizubuti (2004) citam algumas questões éticas comuns às várias áreas da
ciência, que foram organizadas no Quadro 2, contendo detalhamento, no caso do tema
requerer. Esses autores, diferente de Valls (2001), na maioria das vezes, caracterizam as
questões, na forma de má conduta científica. Explicam que há dois tipos de má conduta
cientifica, aquela caracterizada como “negligência” (quando o cientista não tem intenção de
fraudar) e a “desonestidade deliberada” (quando inclui ações de má fé, premeditadas).
Entretanto, o julgamento das intenções não é uma tarefa fácil.
Quadro 2: Questões éticas da área de ciência, segundo Maffia e Mizubuti (2004)
QUESTÕES ÉTICAS DETALHAMENTO
Atitudes opostas às normas
mertonianas
Particularismo (ao invés do universalismo);
Individualismo (ao invés de comunitarismo);
Tendenciosidade (ao invés de desinteresse); e
Dogmatismo organizado (ao invés de ceticismo
organizado)
Divulgação de informações erradas Por negligência
Invenção, modificação ou deleção
de dados
Por desonestidade deliberada
Plágio Cópia de idéias ou trabalhos de outras pessoas,
sem consentimento. Traduções ou cópias
textuais de material publicado sem o devido
crédito ao autor
Pirataria Roubo de idéias ou de materiais ocorridos na
academia ou na indústria. Biopirataria refere-se
a coleta e transporte de amostras
72
Quadro 2: Questões éticas da área de ciência, segundo Maffia e Mizubuti (Continuação)
QUESTÕES ÉTICAS DETALHAMENTO
Propriedade intelectual/
Conflito de interesse
Configuração de conflito de interesse. Para melhor entendimento são feitos os questionamentos “A quem pertencem os dados e os produtos obtidos em pesquisas financiadas com recursos públicos?” E os “resultados obtidos por cientistas de instituições públicas, em pesquisas financiadas com recursos de empresas privadas?”
Originalidade da idéia Refere-se a certeza da não influência de outros projetos e envolve ainda o respeito ao trabalho dos colegas e o não uso de informações confidenciais obtidas sob sigilo. Pode ocorrer a apropriação indevida de idéias e execução de trabalhos similares, que pode se constituir em conflitos de interesse quando pesquisadores atuam como consultores para avaliar projetos de pesquisa
Análise, julgamento e comunicação dos resultados
Os autores, revisores e editores devem se pautar na ética, no caso de artigos submetidos para publicações
Falsificação de dados preliminares Essa má conduta objetiva enganar agências financiadores de projetos
Análise, interpretação de resultados e redação de artigos científicos
Refere-se à corrida pela prioridade da publicação, incorrendo em erros que podem comprometer os resultados e a sua interpretação
Submissão de um mesmo artigo para mais de uma revista
Usando idiomas diferentes
73
Quadro 2: Questões éticas da área de ciência, segundo Maffia e Mizubuti (Continuação)
QUESTÕES ÉTICAS DETALHAMENTO
Consultoria x atividades de pesquisa
Autoria/co-autoria de artigos científicos
Conflito entre o público e o privado
Maffia e Mizubuti (2004, p. 2) atribuem a má conduta científica a vários fatores como:
Premência de gerar informações em curto período de tempo, necessidade de
ajustar os dados a uma hipótese preconcebida, pressão de resultados
satisfatórios pelas agências de fomento, pressão pela necessidade de satisfazer
os critérios de produtividade (publicar ou perecer), em geral induzidos pelo
desejo de reconhecimento e, ou, fama e pela necessidade de apoio financeiro.
Entretanto esses fatores ou desculpas devem ser inaceitáveis pelos pares, pela
academia e pelas agências financiadoras. Vale refletir no que poderia
acontecer à ciência e à tecnologia se a má conduta científica fosse atividade
corriqueira. Felizmente, não o é, mas tem-se que cerceá-la.
Estes autores registram que o Professor Sydney Brenner (2003), do The Salk Institute –
La Jolla, EUA, ao ser questionado sobre qual o padrão ético que os pesquisadores deveriam
adotar na área das ciências da vida, respondeu que seriam dois: “o primeiro, válido para todos
os cientistas, é dizer a verdade. O segundo é representar os interesses de toda a humanidade”.
Observa-se que os princípios citados por Valls (2001) são bem diferentes das “questões
éticas” citadas por Maffia e Mizubuti (2004). Essa diferença pode ser atribuída pelo fato de o
primeiro ser filósofo e dos segundos serem doutores na área de ciências agrárias. Essa
diferença pode ser observada, uma vez que o primeiro cita princípios bastante amplos, que
podem ser utilizados em várias atividades. Já os segundos autores, citam questões com maior
especificidade, ligadas ao dia a dia da pesquisa.
74
Azevedo (2005) escrevendo sobre integridade científica no Brasil, destaca ainda a
importância da manutenção dos diários na pesquisa.
Goldim (2002) destaca a autoria de projetos, artigos e livros como uma das questões
éticas que mais têm gerado preocupações. Cita problemas como: a omissão de autores,
inclusão indevida e também o uso indevido de material de pesquisa. Argumenta que a
inclusão de todos os autores e a não omissão de qualquer pessoa que preencha requisitos de
autoria, como um dever moral.
Esses são apenas princípios ou questões que devem servir de base para discussão. Cada
categoria de profissionais deve, por meio de reflexões e discussões, chegar aos princípios
éticos de sua profissão. Com a reflexão e discussão pela categoria, pode-se também obter um
maior comprometimento, assim como uma melhor internalização desses princípios. É de suma
importância a discussão e a definição de normas gerais de conduta para todas as atividades,
principalmente para aquelas que podem interferir diretamente ou indiretamente no futuro da
humanidade.
2.2. A ÉTICA NA EMBRAPA, A PARTIR DE SUAS NORMAS E DEMAIS
DOCUMENTOS
Esse item contém os seguintes tópicos: importância da ética na Embrapa; como a ética
está inserida formalmente nos documentos da empresa, onde é apresentado o Código de Ética
da Embrapa; “gestão da ética” nas Embrapa; e normas específicas sobre “ética na pesquisa”,
onde são citados os “preceitos específicos” de ética na pesquisa, juntamente com uma
avaliação dos mesmos.
2.2.1. Importância da ética na Embrapa
O panorama do início do Século XXI mostra que o mundo vive em profundas
transformações, que estão cada vez mais rápidas e que abrangem aspectos sociais, políticos e
75
econômicos, como globalização da economia, avanços tecnológicos, mercado cada vez mais
competitivo, clientes distantes e exigentes, dentre outros. As empresas passam a se preocupar
não só com seus produtos, processos e serviços, mas também com a sua imagem junto à
sociedade, o que passa também pelo seu compromisso ambiental.
A sociedade adquire maior consciência e, cada vez mais, exige ética em todas as esferas
da vida humana. Esses princípios éticos devem ser respeitados no relacionamento da empresa
com os clientes, fornecedores, concorrentes, empregados, sócios e acionistas, autoridades,
candidatos e governos e com o público em geral (MOREIRA, 1999).
Nas empresas existe uma preocupação institucional tanto com as questões éticas como
com a responsabilidade social e a disseminação de valores. Muitas instituições estão
preocupadas em saber se podem ser chamadas de empresas éticas. Nesse caso, indicadores do
nível de ética de uma organização se fazem necessários (ARRUDA E NAVRAN, 2000, p. 26-
27). Esses indicadores de responsabilidades éticas são importantes na medida em que dão à
empresa um retrato da qualidade do cumprimento de sua missão na sociedade, com critérios
voltados para os anseios atuais da sociedade, como desenvolvimento sustentável,
cumprimento do papel social, certificação ambiental, educação ambiental, coerência entre
discurso e prática, avaliação de impactos ambientais e outros.
Não basta apenas a empresa ser ética em sua conduta. É preciso mostrar que além de
sua conduta ser pautada na ética, esta conta com uma “política de ética” descrita claramente e
disponível, mostrando seu comprometimento com essa política para seus clientes, para seus
empregados e para a sociedade em geral.
A Embrapa deve contar com uma política atuante de “gestão da ética” em geral, em
todos os segmentos da empresa, visto que é uma exigência do próprio governo. Além disso,
deve contar com uma gestão igualmente atuante da ética na pesquisa. Por ser uma empresa
que trabalha com C&T, os padrões de conduta adotados pela comunidade científica e pela
empresa, devem estar bem explicitados, visando assegurar à sociedade o padrão ético
perseguido pela empresa. Além disso, no caso de empresa pública é a sociedade quem
financia a C&T, de forma que a empresa deve explicações à mesma sobre seu procedimento.
Não foram realizadas pesquisas exaustivas sobre o tema em empresas semelhantes à
Embrapa. Nas pesquisas disponíveis não se encontrou muita coisa a respeito de ética na
pesquisa. Percebem-se, por enquanto, apenas interesses e intenções. Apenas para
76
exemplificar, foi realizada uma entrevista com o Dr. Philippe Petithuguenin, Diretor Regional
do Centre de Coopération Internationale en Recherche Agronomique pour le Développement
no Brasil. O CIRAD20 não possui ainda código de ética e seu diretor assinala que esse assunto
“ética na pesquisa” é novo e considera que essa preocupação data de uns 10 anos. Atualmente,
dispõe de um comitê de ética cujos membros não são funcionários do órgão. São autoridades
reconhecidas na sociedade, que tiveram ou que têm responsabilidades em nível de governo ou
de centros de pesquisa e que detêm conhecimentos científicos. Suas atividades são proativas
(estudos, visitas) e sob demanda (dificuldades com alguma metodologia, algum assunto
novo); eles se reúnem duas vezes por ano, em março e setembro, e apresentam apenas
recomendações.
2.2.2. Como a ética na pesquisa está inserida formalmente nos documentos da empresa
A Embrapa é uma empresa que explicita em seus documentos a preocupação com a
ética, que é um dos valores que sempre estiveram inseridos nos seus planos diretores.
No IV Plano Diretor (PDE), em vigor para o período de 2004 a 2007, a “ética e
transparência” são declaradas como valores da instituição, ao lado de outros como:
aprendizagem organizacional; perspectiva global e interdisciplinaridade; pluralidade e
respeito à diversidade intelectual; responsabilidade social; rigor científico e valorização do
conhecimento e autodesenvolvimento.
A “ética e transparência”, são definidos no IV PDE como o comprometimento com a
“conduta ética e transparente, valorizando o ser humano e todos os grupos da sociedade”. O
PDE, como documento orientador para as ações da Embrapa, na medida em que contém a
missão, os valores e objetivos da Embrapa, é uma referência aos empregados, determinando
alguns padrões de comportamento.
20 O CIRAD é uma instituição pública da França, com missão semelhante a da Embrapa. Possui aproximadamente 1.800 funcionários, sendo por volta de 1.200 na França e os demais distribuídos em outros países. No Brasil, tem-se 28 pesquisadores. A atividade-fim da empresa é pesquisa aplicada, sempre para um resultado, na área de agricultura, florestal e pecuária. Pesquisas mais fundamentais são realizadas pelo IRD (Inst. Pesquisa Desenvolvimento) e pelo CNRS (Centro Nacional de Pesquisa Científica). O CIRAD não é um órgão internacional, mas de cooperação internacional. Ele não faz pesquisa em outros países sozinhos, mas em parceria. A entrevista foi realizada dia 03.05.2005.
77
A Embrapa instituiu, em dezembro de 2004, uma norma específica que regulamenta a
conduta ética dos seus empregados, o Código de Ética da Embrapa. Mesmo antes de haver
uma norma específica sobre ética, a Embrapa já obedecia a normas de procedimentos
funcionais e de conduta, estabelecidas no artigo 37 da Constituição Federal (como por
exemplo, os princípios básicos da administração pública: legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade); na Consolidação da Lei do Trabalho; no Código de Ética
Profissional do Servidor Público do Poder Executivo Federal (aprovado pelo Decreto nº
1.171, de 22.06.1994); e no Código de Conduta da Alta Administração Federal21. Os
profissionais também têm à sua disposição, os códigos de ética de sua profissão.
O estatuto da Embrapa, aprovado pelo Decreto nº 2.291, de 04.08.1997, contém os
objetivos sociais e cita as competências da alta administração da Empresa e do pessoal em
geral. Desse estatuto constam algumas normas de conduta.
Código de Ética da Embrapa
O Código de Ética da Embrapa22 foi elaborado por um grupo de trabalho instituído pela
Diretoria Executiva da Embrapa (DE) e foi baseado no Código de Ética Profissional do
Servidor Público Civil do Poder Executivo, ao qual os empregados da Embrapa devem
cumprimento. A decisão da DE pela criação de um código de ética originou-se de uma
demanda do Governo Federal.
O grupo de trabalho contou com integrantes da Sede da Embrapa e das unidades
descentralizadas localizadas no Distrito Federal, dada a facilidade geográfica. Antes e durante
a elaboração desse código, buscou-se a participação de todos os empregados, por meio de
solicitações, na intranet da empresa (memorandos e meio eletrônico).
21 O título “Código da Alta Administração Federal”, escrito em 2005 pela Comissão de Ética Pública da Presidência da República, reúne normas sobre ética. Oferece um capítulo com perguntas e respostas sobre o assunto. Dispõe ainda de um quadro intitulado “regulação da conduta”, contendo matérias reguladas, com informações sobre suas respectivas normas e supervisão, classificados por assunto.
22 O Código de Ética da Embrapa foi instituído por meio da Deliberação n◦ 16, de 17.12.2004 e publicado no Boletim de Comunicações Administrativas (BCA), n◦ 02/2005, de 10.01.2005.
78
Após sua elaboração, o código foi apresentado a toda a empresa, como proposta,
solicitando sugestões. Várias unidades ou empregados individualmente, apresentaram
contribuições, que foram analisadas pelo grupo e suas contribuições inseridas ou não. Após
essa fase, o documento foi enviado à DE, que também enviou contribuições, que foram
igualmente analisadas. Após todas essas etapas, partindo-se da premissa de que o código era
de conhecimento e aprovação de todos os empregados, o mesmo foi aprovado e publicado no
Boletim de Comunicações Administrativas (BCA)23, para conhecimento de todos.
O código da Embrapa “se constitui em instrumento orientador e educativo do
comportamento ético desejado pelos integrantes da organização”24. Dessa forma, não estão
inseridas penalidades em seu bojo, com o argumento de que a aplicação dessas e seus graus
encontram-se disponíveis em outras normas da Empresa e na CLT.
Todos os empregados da Embrapa estão sujeitos ao Código de Ética. Essa
obrigatoriedade fica bem clara no Capítulo I, por meio do Art. 5º, que estabelece “O exercício
de cargo ou função na Embrapa exige conduta compatível com os preceitos da lei, do Código
de Ética e das normas da Empresa”.
Esse código possui seis capítulos, envolvendo os seguintes itens: Princípios e Valores
Fundamentais; Do Relacionamento da Embrapa com seus Empregados; Do Relacionamento
dos Empregados com a Embrapa; Ética na Pesquisa; Comissão de Ética; e Disposições
Gerais.
O comportamento ético está contido em dois grupos de recomendações, conforme
estabelece a “Nota sobre o Código de Ética da Embrapa”. O primeiro é “voltado para o
relacionamento com a Empresa, seus integrantes e público externo (Valores, Normas e
Relações Interpessoais), e o segundo (Capítulo IV), relacionado com as atividades de
pesquisa”. Essa divisão foi estabelecida “em face da complexidade e importância estratégica
das atividades realizadas na Embrapa”.
23 O Boletim de Comunicações Administrativas (BCA) é o instrumento oficial de comunicação administrativa da Embrapa.
24 Conforme Nota sobre o Código de Ética da Embrapa, assinado pelo Grupo de Trabalho que elaborou a proposta de Código de Ética da Embrapa.
79
2.2.3. “Gestão da ética” na Embrapa
A Embrapa tem muitas normas internas e externas que dispõem direta ou indiretamente
sobre a conduta e os valores éticos, como se pode observar nos itens anteriores.
A Empresa dispõe de dois modelos de contrato de trabalho: um para o pessoal de nível
médio e outro para o pessoal de nível superior. No segundo caso, a cláusula oitava determina
que o empregado “obriga-se a cumprir, rigorosamente, as normas regulamentares, as ordens
de serviço e todos os demais atos reguladores das relações de trabalho, emanadas da alta
administração da Embrapa”. Além disso, a cláusula décima primeira reza que vigoram para o
empregado que está sendo contratado, “O Plano de Cargos e Salários da Embrapa e as normas
internas de pessoal”. A expressão “normas internas de pessoal” é bem abrangente,
englobando, em sentido lato, todas as normas. O contrato de trabalho constitui um acordo
entre as duas partes interessadas – empresa e empregado – estabelecendo para ambos direitos
e obrigações.
Entretanto, “gestão da ética” pressupõe primeiramente a elaboração e implantação de
uma “política de ética”. A partir dessa política, são estabelecidas as estratégias, que
subsidiarão o planejamento. Esse planejamento deverá incluir os objetivos a serem
alcançados, as linhas de ação e os programas detalhados para seu alcance, bem como os
recursos que serão necessários. O ciclo do planejamento também deverá prever como será
executado o que foi planejado, bem como prever a correção do plano, à luz dos resultados por
ele gerados.
Fazendo uma avaliação com os dados aqui apresentados, conclui-se que o Código de
Ética da Embrapa pode até ser considerado uma “política de ética”, segundo alguns autores25.
Quanto à estratégia que é decorrente da política, podem-se captar intenções. Porém,
considerando que estratégia é um processo e não um evento isolado, e que essas se constituem
processos de planejamento e ação, não se encontrou declarações que pudessem computar
como estratégia para a “política de ética”. Com certeza, isso se deve à novidade do assunto e à
necessidade de tempo para se internalizar tanto o conceito quanto a importância de se mostrar
à sociedade uma intenção e a certeza de um comportamento ético da Empresa. Pode-se
80
também inferir a baixa priorização que tem sido dada ao assunto pela Empresa, apesar de se
notar sensibilização e conscientização.
Dessa forma, conclui-se que a Embrapa atualmente está na fase da promoção da ética,
ou seja, promover a discussão, a participação, o conhecimento e a observância do padrão
ético. Demonstra também intenções de implantar uma “gestão da ética”.
2.2.4. Normas específicas sobre “Ética na pesquisa” na Embrapa
Com referência a normas ou outros documentos específicos sobre ética na pesquisa,
tem-se o disposto no Capítulo IV, “Ética na Pesquisa”, do Código de Ética da Embrapa. Este
capítulo é constituído de um único artigo, que estabelece que “o empregado da Embrapa
observará, em sua conduta, os seguintes preceitos específicos”, em número de sete. Dessa
forma, todos os empregados devem conhecê-los e não só aqueles que ocupam o cargo de
Pesquisador. No Quadro 3 são descritos os “preceitos éticos” da ética na pesquisa, seguidos
de uma avaliação ou de considerações sobre os mesmos.
25 Segundo Whitaker & Arruda (1999), “o conteúdo do código de ética é formado de um conjunto de políticas e práticas específicas, abrangendo os campos mais vulneráveis”.
81
Quadro 3: “Preceitos específicos” de ética na pesquisa constantes no Código de Ética da
Embrapa
PRECEITOS ESPECÍFICOS AVALIAÇÃO/COMENTÁRIOS
I – Atuar com iniciativa, criatividade e
espírito inovador na busca de soluções,
incentivando e facilitando a expressão
dessas mesmas características nos seus
pares
Esse primeiro item se refere à ética geral
da instituição e se aplica a todos os
cargos e funções e não somente à função
de pesquisa. Considerando que esse
capítulo é específico sobre ética na
pesquisa, esse inciso poderia estar
contido em outro capítulo, como, por
exemplo, nos “Princípios e Valores
Fundamentais”
II – Empenhar-se para desenvolver uma
visão integrada do processo de inovação
tecnológica, certificando-se de que as
soluções viabilizadas estejam em
consonância com as metas institucionais
da Embrapa e com o benefício social aos
quais suas atividades são pertinentes
Compreende-se esse inciso como uma
estratégia de inserção da idéia e do
conceito de inovação nos trabalhos
desenvolvidos pela empresa, dada a sua
importância para o desenvolvimento do
país.
O benefício social tem a ver com a missão
pública da Embrapa
III – Não utilizar meios ilícitos ou
contrários às normas e orientações da
Empresa na busca de notoriedade para si,
para sua equipe, para sua Unidade ou
para terceiros
Esse inciso lembra o imperativo
mertoniano “desinteresse”, que deve ser
um dos princípios básicos da atividade
científica em geral
82
Quadro 3: “Preceitos específicos” de ética na pesquisa constantes no Código de Ética da
Embrapa (Continuação)
PRECEITOS ESPECÍFICOS AVALIAÇÃO/COMENTÁRIOS
IV - Atentar para o rigor técnico-científico
das informações transmitidas e esclarecer
quando se tratar de opinião pessoal,
sempre que se manifestar sobre as
atividades da Embrapa perante os meios
de comunicação e a opinião pública
Essa questão se deve ao fato de que a
empresa tem uma missão pública e como
tal, deve se precaver contra declarações
claramente pessoais, precipitadas ou
equivocadas, que possam trazer prejuízos
à imagem da empresa ou até mesmo do
país
V – Zelar pelos direitos de propriedade
intelectual das informações técnico-
científicas a que tenha acesso
A Embrapa conta com legislação interna e
externa de propriedade intelectual.
A Lei de Inovação Tecnológica
certamente vai contribuir para a
resolução de alguns conflitos de interesse
VI – Priorizar, no processo de
planejamento, execução e validação de
pesquisa, a preocupação com o meio
ambiente, a biodiversidade, o ser humano
e o bem-estar dos animais de pesquisa,
especificando eventuais efeitos negativos
no uso da tecnologia, produto ou
processo gerado
A incorporação da preocupação com o
meio ambiente, com a diversidade e com o
ser humano são demandas atuais e estão
contidas no conceito de desenvolvimento
sustentável.
O bem estar dos animais de pesquisa
começa a tomar consistência com autores e
entidades que o defende, como Peter Singer
e o Cobea.
A especificação dos “efeitos negativos no
uso da tecnologia, produto ou processo
gerado” tem a ver com a responsabilidade
do pesquisador e da empresa
83
Quadro 3: “Preceitos específicos” de ética na pesquisa constantes no Código de Ética da
Embrapa (Continuação)
PRECEITOS ESPECÍFICOS AVALIAÇÃO/COMENTÁRIOS
VII - Não prestar serviços de consultoria
ou assistência técnico-administrativa em
atividades concorrentes com as exercidas
na Embrapa
Esse assunto tem interface com a questão
contratual. Na Embrapa não há adicional
por dedicação exclusiva. Nesse caso, em
tese, os pesquisadores poderiam prestar
consultoria em horário diferenciado
daquele praticado na empresa.
Entretanto, tem-se aí uma questão
controversa, pois não está definido no
código o que seria “atividade
concorrente”.
Também esse caso, a Lei de Inovação
Tecnológica deverá contribuir para a
resolução de alguns conflitos referentes a
esse tema.
Podem ocorrer situações onde, apesar da
atividade ser concorrente com a da
Embrapa, seja interesse dessa última a
consultoria. Nesses casos, essa
consultoria poderia ser prestada, se
devidamente autorizada pela Empresa
Os itens abordados no código não abarcam a totalidade de princípios citados nesse
trabalho. Entretanto, esse fato é compreensível, uma vez que o código é uma norma geral, não
cabendo esgotar os princípios da atividade de pesquisa. O importante é saber se esse código
ou outros documentos sobre esse assunto contém o que a direção da empresa, o que os
84
pesquisadores e demais empregados acreditam que deva se constituir em princípios da ética
na pesquisa na empresa.
85
PARTE II
MARCO EMPÍRICO
86
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este capítulo ocupa-se dos procedimentos metodológicos que foram aplicados à
presente investigação, explicitando a forma como o trabalho foi realizado, seus materiais,
métodos e procedimentos, de forma a possibilitar a construção de critérios de validade
científica.
Os procedimentos metodológicos estão descritos em três subitens. A “caracterização da
empresa” apresenta a Embrapa, sua estrutura e modus operandi e a caracterização do cargo de
Pesquisador na estrutura da empresa, visando permitir melhor entendimento do próximo item
que é a “caracterização da pesquisa”. Por último, apresentam-se as “limitações do método”.
3.1. CARACTERIZAÇÃO DA EMPRESA
A Embrapa é uma empresa pública, criada pela Lei 5.851, de 07.12.72, e instalada em
26.04.73, com personalidade jurídica de direito privado, patrimônio próprio, autonomia
administrativa e financeira. Está sediada em Brasília-DF e é vinculada ao Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
À Embrapa compete, além de cumprir a missão para a qual foi criada, coordenar o
Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA). Este é constituído por organizações
estaduais de pesquisa agropecuária, por universidades e organizações do setor privado.
A administração da Embrapa é composta por: a) Conselho de Administração,
constituído por seis membros, inclusive com a participação do setor privado; b) Diretoria
Executiva, constituída por quatro membros e presidida por um diretor-presidente; c) Unidades
Centrais (UC), que são órgãos de caráter administrativo-normatizador, que compõem a Sede
da Empresa, em número de 15; e d) Unidades Descentralizadas (UD), distribuídas pelo
território nacional, em número de 40.
As Unidades Descentralizadas estão divididas em 37 centros de pesquisa, que são
responsáveis pela pesquisa e pelo desenvolvimento tecnológico; e três centros de serviços,
87
que servem de apoio ao desenvolvimento da pesquisa e também promovem a interação entre
as unidades.
Os centros de pesquisa estão classificados em: centros de pesquisa de temas básicos, em
número de 11; centros de pesquisa de produtos, em número de 14; e centros de pesquisa
ecorregionais, em número de 12. Essas unidades, juntamente com os centros de serviço
trabalham de forma integrada.
A Embrapa, em 21.08.2005, contava com 8.601 empregados, sendo 2.246 na carreira de
P&D, no cargo de Pesquisador.
A Embrapa orienta suas ações por um instrumento denominado Plano Diretor da
Embrapa (PDE), que estabelece as grandes linhas que orientam suas ações durante um
período de tempo. O PDE é a base de todo o planejamento da empresa, sendo um importante
instrumento de gestão estratégica, na medida em que estabelece e comunica as grandes linhas
que orientarão a Empresa nos próximos quatro anos, permitindo o realinhamento das ações de
pesquisa e desenvolvimento (P&D) e de transferência de tecnologia. Esse documento é
definido com base em estudos dos cenários e se baseia em tendências e eventos potenciais e
de determinantes e condicionantes externos.
Para estabelecer o IV Plano Diretor para o período de 2004 a 2007, foram considerados
aspectos da visão de futuro para a pesquisa e o desenvolvimento do espaço rural e do
agronegócio brasileiros, como a importância estratégica do agronegócio; as tendências
mundiais e suas implicações para o desenvolvimento do espaço rural e do agronegócio; as
tendências a longo prazo no desenvolvimento do espaço rural e do agronegócio brasileiros; e
as implicações para a CT&I (Ciência, Tecnologia e Inovação).
O IV PDE foi definido, tendo por finalidade “contribuir para tornar realidade as
diretrizes definidas pelo governo brasileiro com vistas a criar empregos, desconcentrar a renda
e reduzir as desigualdades regionais, promovendo o crescimento sustentável e servindo ao
compromisso de inclusão social”26.
Além da missão da Empresa, citada na introdução deste trabalho, O PDE, ainda contém
a visão, os valores, o foco de atuação, os objetivos estratégicos, as diretrizes estratégicas e os
projetos estruturantes e integrativos da empresa.
88
Para atingir a missão institucional e ser uma empresa de referência no Brasil e no
exterior, a Embrapa enfatiza os seguintes valores: aprendizagem organizacional; ética e
transparência; perspectiva global e interdisciplinaridade; pluralidade e respeito à diversidade
intelectual; responsabilidade social; rigor científico e valorização do conhecimento e
autodesenvolvimento.
É importante ressaltar que “Apesar do grande surto do progresso industrial, a agricultura
brasileira continua sendo um dos mais importantes setores da economia nacional, participando
com uma parcela significativa, senão a maior, do crescimento geral do País”27 (CABRAL,
2005, p. 285).
A Embrapa é uma empresa de pesquisa reconhecida internacionalmente e que contribui
de forma muito atuante para o desenvolvimento do espaço rural e para o agronegócio
brasileiro, sendo uma das grandes responsáveis pelo seu desenvolvimento.
Para administrar seus recursos humanos, a Embrapa “incorpora ao seu enfoque
empresarial o princípio de gestão por resultados, destaca a importância da parceria e
contempla a visão prospectiva de atendimento às necessidades de seus clientes”, conforme
estabelece seu Plano de Cargos e Salários (1998, p. 24).
Visando compreender melhor a pesquisa, apresentam-se no próximo item informações
sobre a estrutura de cargos da empresa, que permitirá melhor entendimento do cargo objeto
dessa pesquisa.
Caracterização do cargo de Pesquisador na estrutura da empresa
A Embrapa utiliza o Plano de Cargos e Salários (PCS) como instrumento gerencial de
administração de seus recursos humanos. Nesse documento encontram-se explicitados a
estrutura de cargos e salários, o valor interno de cada cargo, segundo a complexidade de seus
26 EMBRAPA. Secretaria de Administração e Estratégia. IV Plano Diretor da Embrapa: 2004-2007. Embrapa: Brasília, DF, 2004, página 3. 27 Essa frase, apesar de parecer atual, foi escrita em 1972, fazendo parte da introdução do Relatório do Grupo de Trabalho que propôs a criação da Embrapa. Este relatório, intitulado “Sugestões para a Formação de um Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária”, ficou conhecido como “Livro Preto”.
89
processos e funções, bem como outras políticas e diretrizes de administração de recursos
humanos da Embrapa.
A estrutura ocupacional da Embrapa compõe-se de duas carreiras funcionais, que são:
a) Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), onde se encontra o cargo de Pesquisador, que se
desmembra em três níveis funcionais, que são: Pesquisador I, Pesquisador II e Pesquisador
III; b) Suporte à Pesquisa e Desenvolvimento, onde se encontram os demais cargos, que são:
Técnico de Nível Superior (contendo também três níveis), Assistente de Operações (em dois
níveis) e Auxiliar de Operações (com três níveis), como se pode observar no Quadro 4.
Quadro 4: Estrutura ocupacional de cargos de provimento efetivo da Embrapa. Fonte: Plano
de Cargos e Salários da Embrapa (1998, p. 21)
CARREIRAS
FUNCIONAIS
CARGO EFETIVO NÍVEL REQUISITO DE
ESCOLARIDADE
Pesquisa e
Desenvolvimento
(P&D)
Pesquisador I
II
III
Curso Superior Completo
Título de Mestre
Título de Doutor
Técnico de Nível
Superior
I
II
III
Superior Completo
Assistente de Operações I
II
2º. Grau Completo
Suporte à P&D
Auxiliar de Operações I
II
III
1ª. Série do 1º. Grau
4ª. Série do 1º. Grau
1º. Grau Completo
A descrição sumária do cargo de Pesquisador, constante no PCS, é: “Elaborar, executar,
coordenar e avaliar programas, projetos e subprojetos de pesquisa e desenvolvimento,
relacionados com a atividade fim da empresa”. O cargo envolve responsabilidades técnicas e
administrativas, que são: a) técnicas: elaborar, executar, coordenar e avaliar programas,
projetos e subprojetos de pesquisa; orientar tecnicamente as pessoas envolvidas nos
90
processos, projetos e subprojetos sob sua responsabilidade; coletar, sistematizar, analisar
dados e disseminar informações resultantes de projetos e subprojetos de pesquisa; b)
administrativas: gerenciar processos, projetos, programas e equipes de pesquisa.
Os principais resultados ou produtos esperados dos profissionais enquadrados no cargo
de Pesquisador são, conforme o PCS: conhecimentos gerados e disponibilizados para uso;
tecnologias e processos desenvolvidos, patenteados e disponibilizados para uso; metodologias
geradas e disponibilizadas para uso; trabalhos técnico-científicos publicados; livros
publicados ou capítulos de livros publicados; programas, projetos e subprojetos de pesquisa
avaliados; docência e instrutorias em programas de capacitação internos realizadas;
consultorias técnicas realizadas; extensionistas e produtores rurais treinados e orientados;
variedades agrícolas mais produtivas geradas; plantas melhoradas geneticamente; raças de
animais melhoradas geneticamente; sementes e mudas melhoradas; recomendações sobre
sistemas de produção geradas e disponibilizadas; contratos, convênios e acordos negociados;
recursos financeiros e/ou materiais captados.
Considerando que a Embrapa é uma empresa de pesquisa, a carreira de P&D é
responsável pela atividade-fim da empresa, ocupando o cargo de Pesquisador o ápice da
estrutura de cargos e salários da empresa.
3.2. CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
O presente estudo pode ser caracterizado como exploratório. Esses estudos permitem
“aumentar o conhecimento do pesquisador acerca de fenômenos que deseja investigar;
esclarecimento de conceitos; estabelecimento de prioridades para futuras pesquisas”
(MACEDO, 2005, p. 52).
A decisão pela pesquisa exploratória foi tomada tendo em vista o volume reduzido de
publicações específicas sobre ética na pesquisa agropecuária e dado o interesse em obter
maiores informações sobre o assunto. Com esse estudo, buscou-se analisar os princípios
éticos na pesquisa agropecuária, em nível de percepção dos pesquisadores, visando
compreender como os pesquisadores percebem a questão da ética na pesquisa e como esta
interfere na sua atuação profissional.
91
Optou-se por realizar a pesquisa em duas fases, sendo uma, utilizando pesquisa
qualitativa e outra, utilizando pesquisa quantitativa. A pesquisa qualitativa trata de realidades
que não podem ser quantificadas, trabalhando com “um universo de significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo de
relações, dos processos e dos fenômenos, que não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis” (MINAYO, 1994, p. 21-22).
A pesquisa qualitativa parte da indução para a generalização. Esta, em relação à
pesquisa quantitativa, caracteriza-se por buscar investigar um assunto em profundidade,
utilizando entrevistas individuais ou em grupos, preocupando-se mais com a profundidade da
análise do que com a representatividade. O volume de informações é maior e a análise
subjetiva.
A pesquisa qualitativa se constituiu na primeira parte do presente estudo e foi realizada
por meio de entrevistas semi-estruturadas. Foram entrevistados altos gestores da Embrapa e
pessoas que haviam ocupado altos postos de gerência e que, por essa razão, detinham uma
visão estratégica e de conjunto da empresa, na medida em que atuavam ou já haviam atuado
na época em um nível estratégico. Essas pessoas se constituíam em formadores de opinião na
empresa. Essas entrevistas, a partir deste item, para efeito desse trabalho, serão identificadas
como “entrevistas com o grupo de formadores de opinião”.
Foi realizada uma análise dos dados dessa pesquisa qualitativa, procurando estabelecer
comparações com a literatura, visando primeiramente formular as questões que comporiam a
pesquisa quantitativa, visto que o objetivo do trabalho era colher a percepção do conjunto de
pesquisadores da Embrapa sobre o tema.
A pesquisa quantitativa constitui a segunda parte deste estudo e foi realizada por meio
de um questionário, aplicado aos pesquisadores da Embrapa.
Para a realização deste estudo, de um modo geral, foram utilizadas as seguintes
técnicas: levantamento bibliográfico, levantamento documental na empresa e coleta de dados
por meio de entrevistas preliminares e entrevistas semi-estruturadas (pesquisa qualitativa) e
por meio de um questionário (pesquisa quantitativa).
Para identificar os princípios éticos que norteiam as atividades de pesquisa, foram
utilizadas as seguintes técnicas: levantamento bibliográfico sobre o tema C&T e ética em
92
C&T e pesquisa documental sobre o tema na empresa, com relação ao que existia à época da
pesquisa sobre o tema, buscando identificar políticas corporativas e normas éticas que os
pesquisadores seguiam no exercício da atividade de pesquisa.
Com o objetivo de identificar como os pesquisadores da Embrapa percebem a questão
da ética na pesquisa, utilizaram-se como técnicas: o levantamento bibliográfico, a pesquisa
documental, as entrevistas preliminares e semi-estruturadas com formadores de opinião e os
questionários para a população pesquisada.
Para verificar se os princípios éticos da pesquisa estavam contidos nas normas ou
documentos da empresa, utilizaram-se as seguintes técnicas: análise documental, entrevistas
semi-estruturadas com formadores de opinião e questionário a ser aplicado aos pesquisadores,
visto que o estudo em questão, buscava identificar a percepção dos mesmos.
A pesquisa documental visava identificar o que existia na Embrapa à época da pesquisa
com relação a políticas corporativas sobre ética em C&T ou ética em pesquisa, buscando
normas éticas que os pesquisadores seguiam no exercício da atividade de pesquisa. Analisou-
se ainda os códigos de ética a que estão submetidos os pesquisadores e outros documentos
que transmitiam direta ou indiretamente valores éticos da instituição.
Além de buscar normas escritas, por meio das entrevistas iniciais e das entrevistas semi-
estruturadas, buscou-se identificar também normas tácitas utilizadas na pesquisa.
Os resultados da pesquisa são apresentados a partir da pesquisa quantitativa, seguidos
de explicações complementares e observações colhidas na pesquisa qualitativa, buscando
deixar à disposição do leitor os diversos olhares sobre os assuntos tratados. Os dados de
ambas não se opõem, mas se complementam. Segundo Minayo (1994, p.22) “a realidade
abrangida por eles interage dinamicamente excluindo qualquer dicotomia”.
A diferença entre as questões pesquisadas nas entrevistas com os formadores de
opinião, objeto da pesquisa qualitativa e as do questionário, objeto da pesquisa quantitativa
ocorreu por terem as primeiras se constituído em um dos insumos para elaboração do
questionário (pesquisa quantitativa).
A seguir, encontra-se uma descrição dos procedimentos metodológicos utilizados em
cada uma das fases da pesquisa.
93
3.2.1. Procedimentos metodológicos da primeira fase da pesquisa
Neste item encontra-se descrito como foi realizada a pesquisa qualitativa, visando
compreender os procedimentos metodológicos utilizados. Nesse item serão explicitados: a)
instrumento utilizado na pesquisa; b) escolha e seleção dos sujeitos; c) coleta de dados, com
os procedimentos para entrada no campo e forma de condução da entrevista; d) tratamento e
análise dos dados.
Instrumento utilizado
Para a coleta de dados, foi utilizada entrevista semi-estruturada, que é uma técnica
utilizada em pesquisa qualitativa. Entrevista semi-estruturada caracteriza-se por ter um roteiro
(Apêndice A). Esse roteiro foi elaborado, com base no levantamento bibliográfico, na análise
documental da empresa e em entrevistas iniciais com pessoas que tinham visão estratégica da
empresa e formadores de opinião. Nessa fase, foram ouvidos vários empregados da empresa,
sendo nove pesquisadores (três chefes de UDs, dois pesquisadores de UD, sendo um
presidente de um comitê de ética e quatro pesquisadores da Sede) e três Técnicos de Nível
Superior, sendo que um deles foi o coordenador da elaboração do Código de Ética da
Embrapa. Essas entrevistas foram abertas, sem obedecer a roteiros e foram anotadas, de forma
a permitir enumeração de dados importantes sobre o assunto, visando a elaboração do roteiro
da entrevista.
Após a elaboração do roteiro da entrevista, o mesmo passou por uma etapa de validação,
visando sua adequação e melhoria aos propósitos da pesquisa e ainda testar a compreensão e
aplicabilidade das questões (avaliação de conteúdo). Foram convidadas a participar dessa fase
sete pessoas. Destas, cinco efetivamente participaram, sendo que três eram pesquisadores da
Embrapa (dois dominavam o assunto, sendo um estudioso do tema e outro presidente de um
comitê de ética); uma era pesquisadora da Universidade de Brasília e dois eram ocupantes do
cargo TNS (formadores de opinião).
94
Nessa fase, foram acrescentadas duas questões que não tinham relação direta com a
questão da ética, para verificar o nível de interface com o tema. Foram retiradas algumas
questões que não tinham relação direta com o tema e outra que era redundante.
O roteiro da entrevista foi dividido em três grupos de questões, que eram: a) questões
referentes à opinião do pesquisador sobre si mesmo; b) questões relacionadas à percepção do
pesquisador com relação ao grupo de pesquisadores, ou seja, aos seus pares; c) questões
relacionadas à percepção do pesquisador com relação às normas da Embrapa sobre o tema.
Foi realizado ainda um teste piloto, que serviu para adequar a forma de condução da
entrevista. Com isso, as entrevistas seguintes foram ajustadas, principalmente explicando
melhor aos participantes a divisão em grupos de questões citada no parágrafo anterior, para
que o entrevistado se situasse melhor dentro do contexto da entrevista. Também, a partir dessa
entrevista, mudou-se a forma de realização, no sentido de entregar para o entrevistado, antes
do início da entrevista, uma cópia do roteiro, contendo as questões que seriam perguntadas.
Observou-se que essa medida pode dar a alguns entrevistados maior segurança com relação
aos assuntos que seriam abordados. A primeira entrevista, apesar de ter sido realizada como
teste piloto, foi considerada no estudo, por ter atingido os objetivos propostos.
Escolha e seleção dos sujeitos
Como esse projeto se propunha a realizar um estudo sobre a percepção que os
pesquisadores da Embrapa têm com relação à ética na pesquisa agropecuária, nessa primeira
parte da pesquisa foram utilizadas entrevistas individuais, semi-estruturadas, com
pesquisadores cujo perfil incorporava a visão de conjunto da atividade de pesquisa e que
tinham uma visão estruturada da Embrapa, visando colher os diversos olhares sobre o tema.
Assim, participaram da pesquisa, pesquisadores e Técnicos de Nível Superior que
ocupavam, em julho e agosto de 2005, época em que foram realizadas as entrevistas, cargos
de direção da empresa (Diretoria Executiva, Chefes de Unidades Centrais e Chefes de
Unidades Descentralizadas) e pessoas que já haviam ocupado cargos de direção (ex-
presidentes, ex-diretores, ex-chefes de UCs e de UDs), divididos nas seguintes categorias: a)
95
Diretoria Executiva; b) Ex-presidentes; c) Ex-diretores; d) Chefes e ex-chefes de Unidades
Centrais; e) Chefes e ex-chefes de Unidades Descentralizadas.
Coleta de dados
As entrevistas foram realizadas individualmente, durante os meses de julho e agosto de
2005, de forma interativa28 ou por meio de e-mail.
Primeiramente foi estabelecido um contato com as pessoas, pessoalmente ou por
telefone, onde estas eram convidadas a participar da entrevista, oportunidade em que era
marcado dia e horário para a entrevista. Nessa oportunidade eram fornecidas informações
sobre o estudo (tema, objetivo) e os critérios pelos quais o sujeito foi convidado a participar.
No dia e horário marcados para a entrevista, eram informados novamente os objetivos
da pesquisa e um breve resumo da metodologia a ser utilizada, para permitir ao entrevistado
entender melhor a pesquisa. Após uma conversa inicial que tinha como objetivo deixar o
entrevistado à vontade, era entregue uma cópia do roteiro da entrevista para que o
entrevistado também tivesse acesso à pergunta por escrito. Após esse procedimento, eram
feitas as perguntas, na forma de uma conversa, tendo como base o roteiro, evitando-se
interrupções, a não ser aquelas necessárias ao melhor esclarecimento de alguma questão ou
perguntas que surgiam no decorrer das entrevistas ou ainda visando voltar ao tema em
questão, no caso de eventual desvio do assunto. Ao final de cada entrevista, verificava-se se
foram respondidas todas as questões listadas no roteiro.
Na oportunidade, era solicitada ao entrevistado autorização para gravação da entrevista.
Todos os entrevistados concordaram em ter sua entrevista gravada. Também foram
questionados quanto à sua preferência com relação à divulgação da entrevista: a) divulgação
de suas opiniões sem restrições, citando fontes; b) divulgação, citando o cargo, de forma
genérica; c) divulgação dos dados sem citar nomes ou cargos, apenas de forma agregada.
28 Interativa, segundo o Dicionário Aurélio – Século XXI, versão eletrônica, é um “meio de comunicação que permite ao destinatário interagir, de forma dinâmica, com a fonte ou o emissor”.
96
Durante as entrevistas surgiu uma quarta forma, criada pela maioria dos respondentes, que foi
a divulgação ser feita da forma que a pesquisa exigisse ou da forma que autora preferisse.
Algumas pessoas, em número de seis, foram ouvidas utilizando-se os recursos da
internet, por meio de correio eletrônico (e-mail), conforme pode ser observado na Figura 3.
Encontram-se nesse caso as pessoas que não estavam em Brasília (quatro casos), por questão
de limitação geográfica e outras duas que por, algum motivo, não foi possível realizar
entrevista de forma interativa.
Forma da Entrevista (Total 21)
15
6
InterativaPor e-mail
Figura 3: Número de entrevistados de acordo com a forma da entrevista.
Para cada entrevista foram preenchidas fichas de apontamento de campo, sendo uma
contendo a parte descritiva (características físicas do entrevistado; reconstrução do diálogo;
comportamento do entrevistado e comportamento do entrevistador) e outra contendo a parte
reflexiva (reflexões sobre a análise; sobre o método; sobre conflitos e dilemas éticos em
responder as questões; e sobre a fala do entrevistado). Essas fichas eram preenchidas logo
após a entrevista, registrando as primeiras impressões, com o objetivo de auxiliar as análises
dos discursos dos sujeitos.
97
Tratamento e análise dos dados
Os dados colhidos nas entrevistas foram transcritos e analisados, com base no
referencial teórico sobre o assunto. Também foram analisados à luz dos documentos e normas
da empresa sobre o assunto.
Para a análise dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo, que se configura em um
conjunto de técnicas cuja aplicação Gomes (1994, p. 74) destaca duas funções:
Uma se refere à verificação de hipóteses e/ou questões. Ou seja, através da
análise de conteúdo, podemos encontrar respostas para as questões formuladas
e também podemos confirmar ou não as afirmações estabelecidas antes do
trabalho de investigação (hipóteses). A outra função diz respeito à descoberta
do que está por trás dos conteúdos manifestos, indo além das aparências do
que está sendo comunicado. As duas funções podem, na prática, se
complementar e podem ser aplicadas a partir de princípios da pesquisa
quantitativa ou da qualitativa.
Os dados foram interpretados, estabelecendo dimensões e categorias de análises.
Optou-se por apresentar os resultados da pesquisa qualitativa, estabelecendo
comparações, a partir dos resultados da pesquisa quantitativa e em itens separados, no caso de
questões que não foram abordadas na pesquisa quantitativa.
3.2.2. Procedimentos metodológicos da segunda fase da pesquisa
98
Este item se ocupa da forma como foi realizada a pesquisa quantitativa, visando
compreender os procedimentos metodológicos propriamente ditos, abordando os seguintes
itens: a) instrumento de medida, descrevendo a construção, validação do questionário e sua
descrição; b) população pesquisada, incluindo sua caracterização; c) coleta de dados,
incluindo explicações sobre o sistema PHP Surveyor29; e d) tratamento e análise dos dados.
Instrumento de medida
A partir do levantamento bibliográfico, da análise documental e da análise das
informações colhidas na pesquisa qualitativa (entrevistas iniciais e entrevistas semi-
estruturadas), foi elaborado um instrumento de coleta de dados, o questionário. Este visava
colher a percepção dos pesquisadores sobre o tema objeto da pesquisa. A seguir, encontra-se
explicitada a forma como foi validado o questionário e a sua descrição.
Validação do questionário
O questionário foi validado em três fases, durante o período de 8 a 22 de agosto de
2005. Na primeira fase, foram convidados a participar seis Pesquisadores e cinco Técnicos de
Nível Superior, formadores de opinião na empresa. Destes, apenas um Pesquisador não pôde
participar em tempo hábil. Essa validação tinha por objetivo verificar se as questões tinham
relação com os objetivos da pesquisa (avaliação de conteúdo) e também visando uma
avaliação semântica. Nessa fase, foi acrescentada uma questão, houve pequenos ajustes no
enunciado de outras e uma mudança de ordem de uma questão para ser a última, visto que era
uma espécie de conclusão.
Na segunda fase, participaram pessoas leigas, que não pertenciam aos quadros da
Embrapa, em número de quatro, e sua participação tinha o objetivo tanto de marcar tempo de
29 O PHP Surveyor é um sistema criado para a realização de pesquisas. Maiores informações sobre esse sistema poderão ser obtidas por meio do site: http://phpsurveyor. sourceforge.net/, acessado em 18.09.2005.
99
respostas como de verificar a compreensão das questões. Nesse exercício, verificou-se que
dez minutos eram suficientes para responder ao questionário. Dessa forma, no e-mail que
encaminhava o questionário e no próprio questionário, foi solicitado aos pesquisadores dez
minutos do seu tempo para responderem ao mesmo.
Os participantes da primeira e da segunda fase da etapa de validação foram convidados
a participar por meio de uma carta (Apêndice B), onde encontravam explicitados os objetivos
da pesquisa e um breve resumo da metodologia utilizada.
Após essas fases, o questionário foi transportado para o sistema PHP Surveyor, numa
versão que estava sendo adaptada e testada para uso pela Embrapa. A terceira fase de
validação foi realizada, solicitando a alguns pesquisadores que respondessem ao questionário
por intranet e o enviasse da forma que o sistema orientava, para detectar possíveis falhas no
mesmo e em seu envio. O sistema funcionou perfeitamente e essas respostas, após atingirem
seu objetivo, foram desconsiderados. Nessa fase, participaram seis pessoas, sendo quatro
Pesquisadores e dois Técnicos de Nível Superior.
Descrição do questionário
O questionário continha oito questões referentes ao tema “ética na pesquisa
agropecuária”; oito referentes a variáveis demográficas, visando estabelecer um perfil dos
respondentes e uma questão aberta ao final, totalizando 17 questões.
As variáveis demográficas pesquisadas foram: unidade de lotação, nível do cargo (uma
vez que todos ocupavam o cargo de Pesquisador), idade, sexo, tempo de trabalho na Embrapa,
área de pesquisa, função atual e função que o pesquisador exerceu maior período de tempo.
A última questão tinha como objetivo oferecer um campo para que os respondentes
acrescentassem algo sobre o tema, caso quisessem. Seu enunciado era “Você gostaria de
acrescentar mais alguma coisa sobre o tema ética na pesquisa?” Do total de 492 respondentes,
174 preencheram esse campo com declarações, totalizando 35,36% do total de respondentes.
Os entrevistados utilizaram ainda outros campos destinados a outros assuntos para
100
apresentarem suas opiniões gerais sobre o tema, contabilizando-se mais 20 declarações,
totalizando, dessa forma, 196 casos (39,84%) de opiniões/definições/sugestões sobre o tema.
O questionário foi acompanhado de um e-mail (Apêndice C) contendo informações
sobre a pesquisa, como, título, objetivos e um breve resumo da metodologia. Esse e-mail
solicitava a colaboração do pesquisador, no sentido de dedicar dez minutos do seu tempo para
responder ao questionário.
O corpo do questionário continha as mesmas informações do e-mail, de forma mais
resumida, como pode ser observado nos Apêndice D.
População pesquisada
Para atender ao objetivo proposto pelo estudo, que era realizar um estudo sobre a
percepção que os pesquisadores da Embrapa têm com relação a ética na pesquisa
agropecuária, optou-se por trabalhar com a população e não com uma amostra.
Em 21.08.2005 havia na Embrapa um total de 2.246 pessoas na carreira de P&D, no
cargo de Pesquisador. Este cargo é seriado e tem três níveis, sendo: Pesquisador I, onde
estavam enquadrados 44 pesquisadores que detêm o nível de graduação; Pesquisador II, onde
estavam enquadrados 820 pesquisadores, que detêm o nível de mestrado; e Pesquisador III,
onde se encontravam 1.382, que detêm o nível de doutorado.
Para se chegar à população pesquisada, partiu-se do número total de pesquisadores, ou
seja, 2.246, de onde foram subtraídos os que se encontravam nas categorias: licença sem
vencimento e licença médica por longo período. Considerando que o questionário foi enviado
pela intranet da empresa, ou seja, enviado a todos os que têm e-mail da empresa em pleno
funcionamento, foram subtraídos ainda os que por algum motivo não tinham e-mail; os que se
encontravam realizando cursos de pós-graduação e os que se encontravam à disposição de
outros órgãos. Dessa forma, a população pesquisada se constituiu de 1.846 pesquisadores.
Caracterização da população
101
Sobre a população pesquisada, têm-se as informações descritas a seguir, considerando a
posição de 21.08.2005.
Do total de 1.846, havia 24 ocupantes do cargo de Pesquisador I, 567 ocupantes do
cargo de Pesquisador II e 1.255 ocupantes do cargo de Pesquisador III.
No caso do Pesquisador I, o tempo de serviço mínimo era de 11 anos. Isso ocorre
porque, por razões de política interna de recursos humanos, há sete anos a Embrapa não
contrata pessoas no cargo de Pesquisador I, ou seja, com apenas graduação. O tempo de
serviço médio é de 22 anos e o tempo de serviço máximo é de 31 anos.
Já no caso dos cargos de Pesquisador II e III, ocorre uma situação mais ou menos
semelhante, ou seja, o tempo de serviço mínimo é zero, uma vez que a Embrapa tem efetuado
contratações recentemente e por esse motivo, o tempo de serviço médio é de 16,68 e 17,63
anos, respectivamente e o tempo de serviço máximo é de 31 e 34 anos, respectivamente.
Englobando os três níveis do cargo, tem-se a seguinte situação: o tempo de serviço
mínimo é de zero ano e o tempo máximo, de 34 anos, sendo que a média é de 17,39 anos.
Essa realidade, comparada com o total de empregados da Embrapa, ou seja, com 8.601, se
difere um pouco, tendo em vista as recentes contratações para o cargo de pesquisa. No caso, o
tempo de serviço mínimo de todos os empregados é zero, o tempo máximo 58 e o tempo
médio de serviço é de 23 anos.
Com relação à idade, ocorre o mesmo fenômeno: no cargo de Pesquisador I, a idade
mínima é de 37 anos; a idade média é de 53,64 (média alta, compreensível pelo mesmo
motivo anterior, ou seja, não contratação de pesquisadores em nível inicial, de graduação) e a
idade máxima é de 66 anos.
Já nos cargos de Pesquisador II e III, as informações se aproximam, sendo a idade
mínima 27 anos para os dois cargos; a idade média 47,73 e 48,27, respectivamente e a idade
máxima 72 e 78 anos, respectivamente.
Englobando os três níveis do cargo de Pesquisador, tem-se que a idade mínima do cargo
de Pesquisador é de 27 anos e a máxima de 78 anos. A média de idade é de 48,17 anos. Em
102
relação ao total de empregados da empresa, esses números se diferem. Nesse caso, a idade
mínima é de 20 anos; a máxima de 82; e a idade média é de 46 anos.
Em relação ao gênero, a maioria é do sexo masculino, ou seja, 1.367 pesquisadores,
correspondendo a 74,05% e 479 do sexo feminino, correspondendo a 25,95%. Esse dado,
quando comparado ao total dos empregados da empresa, 8.601, guarda uma correlação, uma
vez que na empresa 76% eram do sexo masculino e 24% eram do sexo feminino.
Para efeito de melhor compreensão, apresenta-se a seguir uma tabela, contendo
informações sobre a população pesquisada.
Tabela 1: Informações sobre a população pesquisada.
Nível
Cargo
PESQ. I PESQ. II PESQ. III Variáveis
Resultados Nº % Nº % Nº %
TOTAL
Tempo de
Serviço
Mínimo
Máximo
Médio
11
31
22
-
0
31
16,67
-
0
34
17,63
-
0
34
17,39
Idade Mínimo
Máximo
Média
37
66
53,64
-
27
72
47,72
-
27
78
48,27
-
27
78
48,17
Gênero Masculino
Feminino
18
6
0,97
0,32
423
144
22,92
7,8
926
329
50,16
17,83
74,05%
25,95%
TOTAL 24 1,3 567 30,71 1.255 67,99 1.846
A formação básica dos pesquisadores à época da pesquisa estava distribuída em 54
cursos, sendo: a) Agronomia, com 66,03%; b) Ciências Biológicas, com 7,58%; c) Medicina
Veterinária, com 6,44%; d) Engenharia Florestal, com 4,33%; e) Zootecnia, com 2,38%; e f)
Engenharia Rural/Agrária/Agrícola, com 2,22%. Os 11,02% restantes, estavam distribuídos
por outros cursos, onde havia menos de 2% de pesquisadores em cada um.
103
Quanto a função, os pesquisadores estavam distribuídos em 243 funções de pesquisa.
Apesar de a Empresa ser uma empresa de grande porte (8.601 empregados à época da
pesquisa), com 40 unidades e muitas linhas de pesquisa; o grande número de funções é
explicado pelo fato de não haver padronização dessa variável “função de pesquisa” na
Empresa, razão pela qual cada um dos pesquisadores se descreve na função na qual ele
considera que se encontra. Esse fato resulta em muitas funções, em graus de especificação das
funções muito diferenciados. Apenas para exemplificar, sem estabelecimento de juízo de
valor, cita-se uma seqüência de oito funções, especificadas da seguinte forma: “química;
química analítica; química de interfaces; química de macromoléculas; química do solo;
química dos produtos naturais; química orgânica; e química, física, fis-quím., bioq.,
alimentos”.
Coleta de dados
A coleta de dados foi realizada no período de 22.08.2005 a 23.09.2005, por meio de
uma lista contendo o e-mail dos pesquisadores, criada especialmente para esse fim. O
primeiro e-mail contendo o questionário foi enviado em 22.08.2005 e o segundo (Apêndice
C), com o objetivo de lembrar aos respondentes a data estabelecida, foi dia 05.09.2005. Os
questionários foram acompanhados de e-mail que explicitavam os objetivos da pesquisa e
convidavam os pesquisadores a participar da pesquisa. A última carta estabelecia um prazo
para devolução dos mesmos.
Alguns pesquisadores não conseguiam acesso ao questionário por motivos diversos: o
sistema da unidade não permitia acesso a programas desconhecidos (a versão do PHP
Surveyor utilizada estava em fase de testes na Embrapa); o microcomputador do pesquisador
não estava equipado para acessar ao programa; falta de interação entre o homem e a máquina,
que é um dos problemas limitantes das novas tecnologias. Alguns, em número de 54,
solicitaram o envio do questionário de outra forma. Nesses casos, o questionário foi enviado
em word e eles devolveram preenchidos, por e-mail. Após isso, os dados foram transportados
para o sistema PHP Surveyor.
104
PHP Suveyor
O PHP Surveyor é um sistema que tem por objetivo realizar pesquisas. Ele é totalmente
on-line e tem as funções de realização da pesquisa, recolhimento dos dados, tabulação destes
e ainda fornece análises estatísticas básicas dos resultados das questões. Por ele é possível
dispor as questões em um único bloco ou agrupá-las em grupos de questões.
O questionário, contendo 17 questões, que formavam um só bloco, foi transportado para
esse sistema e enviado, por meio da rede interna da Embrapa (intranet), a uma lista, contendo
o e-mail dos pesquisadores.
Esse sistema permite um controle da qualidade da pesquisa, possibilitando ainda o
controle de problemas com referência a campos não preenchidos. Antes de ser enviado, o
sistema faz uma crítica, avisando aos respondentes quando não houve preenchimento total das
questões e só permite o envio do questionário quando este está totalmente preenchido.
O PHP Surveyor foi criado para fazer pesquisas para jornais e depois foi
disponibilizado na web, para realização de pesquisas, aberto ao público. Este sistema reduz o
tempo de realização de pesquisas, o tempo de preenchimento do questionário e apresenta uma
excelente interface com os usuários, além de reduzir em muito a carga administrativa de
trabalho do pesquisador.
A versão do PHP Surveyor utilizada nesta pesquisa foi uma versão que estava em fase
de testes pelo Departamento de Informática, para uso da Embrapa e só era acessada na rede
interna da Empresa.
Em 22.08.2005, por meio de um e-mail, foi enviada uma carta, convidando os
pesquisadores a participar da pesquisa e informando um link para o questionário, disponível
no sistema.
Como essa versão do sistema estava em teste, houve alguns problemas em algumas
unidades, que, por motivos técnicos, não receberam o questionário. Também alguns
pesquisadores de algumas unidades não conseguiam acessar o sistema por meio do link
fornecido no e-mail. Foram recebidos nessa fase 26 e-mail de pessoas que não conseguiram
acessar o link.
105
Dessa forma, em 05.09.2005, quando foi enviada uma nova carta lembrando os
pesquisadores e solicitando aos mesmos responderem ao questionário, foi disponibilizada
uma outra forma de acesso ao questionário, com um outro link. Também foi dada a opção de
os pesquisadores terem acesso ao questionário em word, por intermédio de um diretório da
empresa. Notou-se que o questionário chegou a unidades onde não havia chegado
anteriormente. Entretanto, mesmo com essas duas formas de envio disponíveis, foram
recebidos 110 e-mails relatando problemas ou solicitando o envio do questionário de outra
forma, uma vez que as pessoas não haviam conseguido acessar o questionário em nenhuma
das formas disponibilizadas. A todos que solicitaram, foi enviado o questionário em word,
para o e-mail dos solicitantes.
Outra dificuldade encontrada foi que a versão do PHP Surveyor disponível pela
Embrapa, só era acessada nos computadores da Empresa. Entretanto, com todos os
contratempos, conclui-se que o PHP Surveyor é um sólido sistema de pesquisa, que facilita
muito o trabalho do pesquisador.
Tratamento e análise dos dados
Os pesquisadores respondiam ao questionário e o enviavam para um link do sistema
PHP Surveyor, que dispunha de um banco de dados, onde as questões iam sendo
contabilizadas, à medida que as pessoas respondiam. Foram realizadas análises por meio de
tratamento estatístico (análises descritivas). Para isso utilizou-se o PHP Surveyor e o pacote
estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences).
Foram ainda considerados na análise, os questionários em que havia comentários, como
auxiliar na interpretação dos dados.
3.3. LIMITAÇÕES DO MÉTODO
106
Foram identificadas algumas limitações metodológicas na realização da pesquisa, que
serão enumeradas, procurando esclarecer as razões.
No caso da primeira parte do trabalho, ou seja, na pesquisa qualitativa, considerou-se
que nas entrevistas por e-mail obteve-se índice menor de respostas. Além disso, na entrevista
interativa, existe o contato face a face, onde, Macedo (2005, p. 78) vê vantagens de
fidedignidade.
Na segunda parte do trabalho, ou seja, na pesquisa quantitativa, considerou-se que a
utilização do sistema PHP Surveyor foi ao mesmo tempo um facilitador e em alguns casos um
obstáculo. Primeiro, porque o sistema não funcionava igual em todas as unidades, sendo que
em algumas, os questionários foram recebidos bem mais tarde ou foram recebidos de forma
desigual. Segundo, porque o fato do envio do questionário por e-mail, por meio da internet,
para ser acessado e respondido por meio de um endereço eletrônico, constitui uma excelente
ferramenta quando não há nenhuma dificuldade com relação à interação homem-máquina.
Entretanto, transforma-se em um problema quando o acesso não é possível. Nesses casos,
podem-se obter respostas contrárias, como, gerar na pessoa consultada um comportamento de
aceitação de desafios, que o impulsionará a buscar recursos para atender à solicitação ou a
renúncia, no sentido da desistência de se atender à solicitação.
Outra questão que pode se constituir em uma limitação do método identificado na
segunda parte do trabalho, ou seja, na pesquisa quantitativa, é a distância entre o discurso e a
prática. Ou seja, entre o que é dito e o que e praticado. Outra questão é a da “desejabilidade
social”, que é um termo utilizado na psicologia que se refere à tendência que algumas pessoas
têm de, na hora de responder a pesquisas por meio de questionários, darem a resposta que elas
acreditam ser a mais socialmente aceita. Porém, os problemas citados não são exclusivos
desta pesquisa, sendo comuns em coletas de dados por meio de questionários.
107
4. DADOS DEMOGRÁFICOS E RECEPTIVIDADE DA PESQUISA
Esse capítulo apresenta e analisa os dados demográficos dos participantes das pesquisas
qualitativa e quantitativa e explana sobre a receptividade da pesquisa pelos atores.
4.1. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS DEMOGRÁFICOS DOS
PARTICIPANTES DA PESQUISA QUALITATIVA
Participaram da pesquisa qualitativa 21 pessoas, divididas nas seguintes categorias:
diretoria atual; ex-presidentes; ex-diretores; chefes e ex-chefes de UCs; e chefes e ex-chefes
de UDs.
Na categoria “Diretoria Atual” da Embrapa, foram convidados a participar os quatro
diretores, sendo um diretor-presidente.
Dos seis ex-presidentes convidados a participar, somente quatro puderam efetivamente
participar. Destes, dois ainda trabalham na empresa.
Sete ex-diretores foram convidados e apenas um não pôde participar. Dos que
participaram, quatro continuam trabalhando na Embrapa e dois encontram-se à disposição de
outro órgão.
Dos chefes de Unidades Centrais convidados, em número de cinco, dois não puderam
participar. Dos que participaram, dois eram ex-chefes de unidade e um era chefe do
departamento que gerencia pessoas e que é responsável pela gestão da ética na empresa.
Foram convidados a participar da entrevista, por e-mail, onze Chefes de Unidades
Descentralizadas. Destes, somente cinco participaram. Dos outros, dois prometeram enviar a
entrevista depois e não enviaram; um se recusou a participar por causa da sua agenda, que
estava muito cheia naquele período e três não se justificaram. Também a época em que foram
realizadas as entrevistas, foi uma fase de muita atividade na empresa (tendo havido até uma
reunião de chefes de todas as unidades da Embrapa em Brasília). Dos seis que participaram,
108
três eram chefes na época; dois eram ex-chefes e um era gerente de nível logo abaixo de
Chefe de UD. Este foi ouvido devido a interface que o trabalho desenvolvido pela área
(propriedade intelectual) tem com o assunto tratado nesta dissertação. Esses dados podem ser
melhor visualizados por meio da Tabela 2.
Participaram efetivamente da primeira parte da pesquisa (entrevista), 21 sujeitos.
Gaskell (2002, p. 71) considera esse número dentro do limite máximo (entre 15 e 25
entrevistas), por duas razões: primeiro por haver sempre “um número limitado de
interpelações, ou versões da realidade” e segundo pelo tamanho do corpus que deverá ser
analisado, entendendo corpus como o “conjunto limitado de materiais determinados de
antemão pelo analista, com certa arbitrariedade, e sobre o qual o trabalho é feito”.
Tabela 2: Número de sujeitos convidados e que efetivamente participaram da primeira fase da
pesquisa, por cargo.
NÚMERO DE ENTREVISTADOS CATEGORIA TOTAL DE
CONVIDA-
DOS
PESQUISA-
DORES
TNS/OUTROS
CARGOS
TOTAL
Diretoria Atual 4 3 1 4
Ex-presidentes 6 2 0 2
Ex-diretores 7 4 2 6
Chefes e ex-chefes de
UCs
6 1 2 3
Chefes e ex-chefes de
UDs
11 5 1 6
TOTAL 34 15 6 21
Quanto à forma de divulgação da entrevista, dos 21 entrevistados, três optaram pela
primeira opção dada, isto é, “divulgação das suas opiniões, sem restrições, citando fontes”.
Outros três optaram pela segunda forma de divulgação dos dados, que era a “divulgação
citando cargo, de forma genérica”. Nove outras, a grande maioria, optaram por deixar a
divulgação das entrevistas serem feitas da forma como a pesquisa exigisse.
109
Entretanto, considerando que seis outros entrevistados optaram pela “divulgação
apenas de forma agregada”, decidiu-se por fazer as citações de forma agregada, sem
identificar os respondentes.
De uma forma geral, o assunto foi bem recebido e os convidados demonstraram muito
interesse em participar da entrevista, fazendo isso com aparente boa vontade.
Caracterização dos sujeitos
Dos 21 entrevistados na pesquisa qualitativa, 15 eram da carreira funcional P&D e
ocupavam o cargo de Pesquisador (sendo três Pesquisadores II e 12 Pesquisadores III); cinco
eram da carreira funcional Suporte à P&D e ocupavam o cargo de Técnicos de Nível Superior
(sendo um TNS II e quatro TNS III) e um era ocupante de cargo comissionado30.
Quanto à escolaridade, dois tinham nível superior, seis detinham o grau de mestre; dez
detinham o grau de doutor e três eram pós-doutores.
A média de idade era de 54 anos e o tempo médio de serviço na Embrapa é de 24,66
anos.
A grande maioria dos sujeitos (18 pessoas) estava lotada na Embrapa e três, apesar de
serem empregados da Embrapa, estavam lotados em outros órgãos.
Dos entrevistados, 17 eram do sexo masculino e quatro do sexo feminino.
Quanto à formação básica, a maioria havia cursado Agronomia (12); seguido de
Administração (2); Direito (2); Engenharia Química (1); Química (1); Física (1); Ciências
Econômicas (1) e Ciências Sociais (1), conforme pode ser melhor visualizado na Tabela 3.
30 Cargo comissionado pode ser ocupado por profissionais pertencentes ou não ao quadro efetivo da Empresa e “compreendem as atividades e responsabilidades pela gestão técnico-administrativa da Empresa e pelo assessoramento técnico e jurídico à Diretoria Executiva e às unidades organizacionais da Embrapa”, conforme explicitado na página 9 do Plano de Cargos e Salários da Embrapa (1998).
110
Tabela 3: Informações sobre os sujeitos participantes da pesquisa qualitativa.
VARIÁVEIS DADOS VALORES TOTAL
Cargo Pesquisador II:
Pesquisador III:
TNS I:
TNS III:
Cargo Comissionado:
3
12
1
4
1
21
Lotação Embrapa:
Outros órgãos:
18
3
21
Tempo de Serviço na Embrapa Mínimo:
Máximo:
Média:
Moda:
Mediana:
Desvio padrão:
Variância:
2
32
24,66
30
27
8,54
73,03
Idade Mínimo:
Máximo:
Média:
Moda:
Mediana:
Desvio Padrão:
Variância:
33
74
54,48
52
54
8,23
67,66
Gênero Masculino:
Feminino:
Masculino: 17
Feminino: 4
21
Escolaridade Graduação:
Mestrado:
Doutorado:
Pós-doutorado:
2
6
10
3
21
Formação Básica Agronomia:
Administração:
Direito:
Outros:
12
2
2
5
21
4.2. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS DEMOGRÁFICOS DOS
PARTICIPANTES DA PESQUISA QUANTITATIVA
111
Na pesquisa quantitativa buscou-se a participação da população, em número de 1.846
pesquisadores. Destes, houve retorno de 492 questionários, correspondendo a 26,65% desta
população. Esse item objetiva oferecer informações sobre os respondentes, visando formar um
perfil dos mesmos.
Em relação ao alcance da pesquisa por unidade de lotação, o questionário foi enviado
para todas as unidades da Embrapa e para a Sede da empresa. A Tabela 4 mostra o número de
pessoas, por unidade, que teoricamente receberam o questionário; o número de respostas e o
percentual de respostas em relação à população pesquisada.
A unidade onde houve maior percentual de respostas, em relação ao número de
questionários enviados foi a Embrapa Monitoramento por Satélite, com 68,75%, seguida pelas
unidades: Embrapa Roraima, com 52,38% e Embrapa Informação Tecnológica, com 50% de
respostas.
Outras unidades que ficaram com um percentual na casa dos 40%, foram: Embrapa
Informática Agropecuária, com 46,15%; Embrapa Suínos e Aves, com 44,44%; Embrapa
Clima Temperado, com 40,27% e Embrapa Rondônia, Embrapa Hortaliças e Embrapa
Instrumentação Agropecuária, com 40%. Na casa dos 30%, ficaram seis unidades.
As unidades onde houve menor percentual de respostas foram: Embrapa Transferência
de Tecnologia, com zero%. Uma possível explicação para esse fato, é que essa unidade é a
única que tem vários pequenos escritórios distribuídos em diversas cidades, onde estavam
lotados dez pesquisadores, integrantes da população pesquisada. Nesses escritórios não se
pode afirmar que os e-mails que foram encaminhados realmente chegaram aos destinatários.
Entretanto, ainda assim ficaria sem explicação a falta de respostas dos oito pesquisadores
integrantes da população pesquisada, lotados na sede desta unidade.
Nas outras unidades não citadas, o percentual de respostas foi superior a 11%.
112
Tabela 4: População pesquisada e total de questionários respondidos, com o percentual, por
unidade
UNIDADES DA EMBRAPA POPULAÇÃO
PESQUISADA
NÚMERO DE
RESPOSTAS
PERCENTUAL
DE
RESPONDENTES
Monitoramento por Satélite 16 11 68,75
Roraima 21 11 52,38
Informação Tecnológica 6 3 50
Informática Agropecuária 26 12 46,15
Suínos e Aves 36 16 44,44
Clima Temperado 72 29 40,27
Hortaliças 45 18 40
Instrumentação Agropecuária 15 6 40
Rondônia 20 8 40
Caprinos 30 11 36,67
Pantanal 25 9 36
Café 17 6 35,29
Trigo 56 19 33,92
Pecuária Sudeste 30 10 33,33
Agroindústria de Alimentos 40 13 32,50
Cerrados 85 27 31,76
Mandioca e Fruticultura 74 22 29,72
Sede 73 21 28,76
Florestas 53 15 28,30
Algodão 46 13 28,26
Amapá 15 4 26,67
Amazônia Ocidental 47 12 25,53
Gado de Corte 51 13 25,49
113
Tabela 4: População pesquisada e total de questionários respondidos, com o percentual, por
unidade (Continuação)
UNIDADES DA EMBRAPA POPULAÇÃO
PESQUISADA
NÚMERO DE
RESPOSTAS
PERCENTUAL
DE
RESPONDENTES
Semi-árido 53 13 24,53
Arroz e Feijão 54 13 24,07
Meio Norte 50 12 24
Tabuleiros Costeiros 47 11 23,4
Agropecuária Oeste 31 7 22,58
Gado de Leite 62 14 22,58
Milho e Sorgo 62 13 20,96
Agroindústria Tropical 55 11 20
Soja 70 14 20
Meio Ambiente 58 11 18,96
Agrobiologia 32 6 18,75
Recursos Genéticos e Biotecnologia 111 20 18,01
Solos 46 8 17,39
Amazônia Oriental 105 18 17,14
Acre 29 4 13,79
Uva e Vinho 39 5 12,82
Pecuária Sul 25 3 12
Transferência de Tecnologia 18 0 0
TOTAL 1.846 492 -
Dos respondentes, dois ocupavam o cargo de Pesquisador I, 149 ocupavam o cargo de
Pesquisador II e 341 ocupavam o cargo de Pesquisador III, representando respectivamente
8,33%, 26,28% e 27,17% da população pesquisada, conforme pode ser melhor visualizado na
Tabela 5.
114
Tabela 5: Número e percentual da população pesquisada em relação aos respondentes, por
cargo.
CARGO Nº POPULAÇÃO
PESQUISADA
Nº RESPOSTAS PERCENTUAL
POPULAÇÃO
PESQUISADA
Pesquisador I 24 2 8,33
Pesquisador II 567 149 26,28
Pesquisador III 1.255 341 27,17
TOTAL 1.846 492 26,65
A média de idade dos respondentes é de 46,34 anos, sendo a idade mínima 27 anos e a
máxima 70 anos. A mediana é 47,09 e a moda , 54. O primeiro quartil é 37, o segundo 47 e o
terceiro 54. O desvio padrão é 9,5.
Observa-se que a média de idade dos respondentes (46,34 anos) ficou abaixo da média
de idade da população pesquisada, que era de 48,17 anos, o que leva a dedução de que houve
um número maior de respostas dos pesquisadores mais novos, conforme pode ser melhor
visualizado na Tabela 6.
Para fins de melhor análise, optou-se por criar categorias de idade, que ficaram
distribuídas da seguinte forma: a) 27 a 35 anos; b) 36 a 43 anos; c) 44 a 51 anos; d) 52 a 69
anos e e) 60 acima31. O intervalo entre as categorias de idade são oito na primeira e sete nas
subseqüentes, conforme pode ser visualizado na Figura 4.
31 A partir dos 60 anos, o empregado da Embrapa contratado a partir de janeiro de 1995, pode se aposentar integralmente pela Ceres, que é a empresa de seguridade, que atende aos empregados da Embrapa. Essa participação na Ceres é voluntária.
115
Percentual
30,0%
25,0%
20,0%
15,0%
10,0%
5,0%
Faixa etária60+52 - 5944 - 5136 - 43
0,0%<= 35
Idade dos respondentes, por faixa etária
Figura 4: Distribuição percentual da idade dos respondentes, por faixa etária.
O tempo de serviço médio na Embrapa era 16,49 anos, sendo o mínimo de zero e o
máximo 56 anos. A mediana ficou em 16 e a moda, 3. O primeiro quartil é 3, o segundo 16 e
o terceiro 28. O desvio padrão é 11,23.
Observa-se que a média de tempo de serviço dos respondentes (16,49 anos) ficou um
pouco abaixo da população pesquisada, que foi de 17,39 anos, o que leva a deduzir que houve
um maior número de respostas dos novos contratados, conforme pode ser melhor observado
na Tabela 6.
Também na variável “tempo de serviço na Embrapa”, foram criadas categorias para fins
de análise com outras variáveis. Nesse caso, as categorias ficaram dessa forma: a) zero a
116
cinco anos; b) seis a 10 anos; c) 11 a 15 anos; d) 16 a 20 anos; e) 21 a 25 anos; f) 26 a 3032
anos e g) 31 anos acima, conforme pode ser verificado na Figura 5. O intervalo entre essas
categorias de tempo de serviço é de 5 anos. Pe
rcen
tual
30,0%
25,0%
20,0%
15,0%
10,0%
5,0%
Faixas de tempo de serviço na Embrapa (emanos)
31+26 - 3021 - 2516 - 2011 - 156 - 100,0%
<= 5
Tempo de serviço na Embrapa, por faixa
Figura 5: Distribuição percentual do tempo de serviço na Embrapa, por faixas.
Dos respondentes, 340 eram do sexo masculino, representando 69% e 152 do sexo
feminino, representando 31% conforme Figura 6.
32 O tempo de serviço mínimo para aposentadoria, segundo a lei é de 30 anos de contribuição para o INSS. A aposentadoria integral pode ser requerida após 30 anos de serviço para mulheres e 35 anos de serviço para homens.
117
Gênero
69%
31%
Maculino Feminino
Figura 6: Distribuição dos respondentes em relação ao gênero, em percentual
A população pesquisada contava com 25,95% representantes do sexo feminino, o que
leva a concluir que houve um número maior de resposta das pesquisadoras ao questionário.
Para melhor visualização da relação entre os dados da população pesquisada e os dados dos
respondentes, apresenta-se a seguir a Tabela 6.
118
Tabela 6: Informações sobre a população pesquisada e o total de pesquisadores que respondeu
ao questionário (respondentes)
VARIÁVEIS VALORES POPULAÇÃO
PESQUISADA
RESPONDENTES
Tempo de
Serviço
Mínimo:
Máximo:
Média:
Mediana:
Moda:
Desvio
Padrão:
Variância:
0
34
17,39
-
-
-
-
0
34
16,45
16
3
11,10
123,42
Idade Mínimo:
Máximo:
Média:
Mediana:
Moda:
Desvio
Padrão:
Variância:
27
78
48,17
-
-
-
-
27
70
46,34
47.09
54
9,5
90,34
Gênero Sexo Número Porcentagem Número Porcentagem
Masculino
Feminino
1.367
479
74,05%
25,95%
340
152
69%
31%
Com relação à área de pesquisa, utilizou-se uma categorização utilizada em um trabalho
da empresa (Anexo C da Instrução de Serviço DGP Nº 1, de 14 de junho de 2005), onde estas
estão divididas em 14 áreas. As áreas de pesquisa com maior densidade demográfica foram:
Sistema de Produção Vegetal, com 12,40%; Melhoramento Genético Vegetal, com 11,38%; e
Recursos Genéticos e Biotecnologia, com 8,33%, conforme pode ser observado na Tabela 7.
119
Entretanto, essa divisão não se mostrou adequada, uma vez que 31,91% marcaram
“Outros”, especificando 78 diferentes áreas. Outras 11 pessoas se descreveram em duas áreas
e nove se descreveram em três áreas ou mais. Para essa diversidade de áreas encontra-se uma
explicação no item “Caracterização da População”, no Capítulo 3. Dessa forma, optou-se por
não utilizar essa variável para fins de análises em relação a outras.
Tabela 7: Distribuição dos respondentes em relação a área de pesquisa.
ÁREA DE PESQUISA FREQÜÊNCIA PERCENTUAL
Sistema de produção vegetal 61 12,4
Melhoramento genético vegetal 56 11,38
Recursos genéticos e biotecnologia 41 8,33
Caracterização de recursos naturais 29 5,89
Fertilidade de solos e nutrição de plantas 26 5,28
Socioeconomia 25 5,08
Manejo e conservação de solos e água 22 4,47
Sistema de produção animal 20 4,07
Nutrição animal 14 2,85
Sistema de produção de forrageiras 11 2,24
Gestão ambiental 10 2,03
Melhoramento genético animal 8 1,63
Processos administrativos 8 1,63
Desenvolvimento regional 4 0,81
Outra área 157 31,91
Com relação à função exercida à época da pesquisa (agosto e setembro de 2005), a
grande maioria, 330 pessoas, respondeu que estava desenvolvendo atividades de pesquisa
(68%), seguido de atividades de pesquisa e gerenciais (123 pessoas, totalizando 25%),
conforme pode ser observado na Figura 7.
120
Como se pode inferir pelos resultados, houve uma boa participação do segmento
gerencial da empresa nessa pesquisa (29%).
Função atual dos respondentes, em percentual
68%4%
25%
1% 2% Atividades de pesquisa
Atividades gerenciais
Atividades de pesquisa egerenciaisAtividadesadministrativas
Outras atividades
Figura 7: Função atual dos respondentes, em percentual
A pesquisa questionava também sobre a função que o pesquisador exerceu maior
período de tempo na sua vida profissional. Novamente nessa questão, a maior freqüência foi
em atividades de pesquisa (421 pessoas, representando 85% dos respondentes), seguida de
atividades de pesquisa e gerenciais (49 pessoas, representando 10%), como pode ser melhor
avaliado na Figura 8.
121
Função exercida por maior período durante a vida profissional, em percentual
85%
3%10% 1% 1%
Atividades de pesquisa
Atividades gerenciais
Atividades de pesquisa egerenciaisAtividades administrativas
Outras atividades
Figura 8: Função exercida por maior período de tempo durante a vida profissional, em
percentual
4.3. RECEPTIVIDADE DA PESQUISA
Esta pesquisa, desde o início, foi muito bem recebida pelos pesquisadores, desde as
entrevistas preliminares, passando pela Diretoria Executiva e pelos demais integrantes do
grupo de formadores de opinião, entrevistado na primeira fase da pesquisa e também pelos
pesquisadores em geral, ouvidos por meio do questionário, na segunda fase.
O questionário foi muito bem recebido, tendo um percentual de respostas de 26,65%, o
que é considerado um bom percentual em pesquisa social. Pode-se inferir com isso e pelas
declarações dos sujeitos participantes da pesquisa, que o tema desperta ou traduz o interesse
dos pesquisados. Confirmando esse interesse, a seguir são apresentados alguns outros
indicativos dessa constatação.
122
Nas entrevistas semi-estruturadas, 100% dos entrevistados consideraram o assunto
muito importante, a pesquisa atual e estratégica para a Embrapa e demonstraram muito
interesse em discutir o tema na empresa.
Na última questão do questionário, questão aberta cujo enunciado era: “Você gostaria
de acrescentar mais alguma coisa sobre o tema ética na pesquisa?”, do total de respondentes
(492), houve 196 (39,84%) declarações contendo opiniões/definições/sugestões/elogios. Estas
foram de 175 pessoas (35,57% do total de respondentes) e outras 20 declarações, sendo que
algumas dessas foram de pessoas que já haviam se pronunciado anteriormente. Alguns, além
de sua opinião, deram também os parabéns pela escolha do tema, por o considerarem
importante, estratégico e oportuno.
O questionário foi enviado dia 22.08.2005, por volta de 11h20. Nesse mesmo dia de
disponibilização do questionário na intranet, houve 123 respostas por meio do sistema PHP
Surveyor, ou seja, 25% dos respondentes.
Quando foi enviado novamente o questionário, como forma de lembrar aos
respondentes, dessa vez com uma outra forma de acesso, já que se notou que no primeiro
envio não havia chegado a algumas unidades, ocorreu fenômeno semelhante. O questionário
foi enviado por volta das 11h30 do dia 05.09.2005 e nesse mesmo dia foram recebidos 132
questionários, ou seja, 26,83%. Dessa forma, constata-se que mais da metade dos
questionários foram respondidos no mesmo dia em que foram recebidos.
Outro fato que comprova o interesse pelo tema é que, como já foi dito nos
procedimentos metodológicos, muitos pesquisadores não conseguiam acesso ao questionário
por motivos diversos. Alguns, em número de 54, entraram em contato com a autora deste
trabalho, solicitando o envio do questionário de outra forma. Destes, grande parte declarava
que fazia questão de participar da pesquisa por considerarem o tema muito importante e
oportuno para a empresa. Nesses casos, o questionário foi enviado em word e eles devolveram
preenchidos, por e-mail.
Computou-se ainda 110 e-mails recebidos de pesquisadores nessa fase do trabalho,
solicitando o envio do questionário por e-mail ou emitindo opiniões gerais sobre a pesquisa e
sobre o tema.
123
5. OPINIÃO DOS ATORES SOBRE ÉTICA NA PESQUISA
Apesar do imenso conhecimento que a humanidade dispõe hoje sobre si mesma, o agir
do homem e suas motivações estão longe de serem totalmente compreensíveis ao próprio
homem. A questão principal parece residir no fato de os seres humanos serem diferentes entre
si.
Essa é uma pesquisa de percepção. Robbins (1999, p. 62 e 63) define percepção como
“um processo pelo qual indivíduos se organizam e interpretam suas impressões sensoriais a
fim de dar sentido ao seu ambiente”. A percepção está condicionada a características de quem
percebe: atitudes, motivações, interesses, experiências e expectativas, dentre outras; a fatores
da situação: tempo, local de trabalho, situação social; e a fatores no alvo observado: novidade,
movimento, som, tamanho, fundo e proximidade. Dessa forma, a percepção não corresponde
necessariamente a realidade em si, mas à visão de cada um.
Apesar da dificuldade de se compreender totalmente o processo da percepção e mesmo
o fato de ela não constituir a realidade objetiva, é importante estudá-la, uma vez que “o
comportamento das pessoas, é baseado em suas percepções do que a realidade é, e não na
realidade em si. O mundo como ele é percebido é o mundo que é comportamentalmente
importante” (Robbins, 1999, p. 62).
Os próximos capítulos apresentam a opinião dos atores sobre o tema objeto desse
trabalho. Os atores foram os dirigentes e ex-dirigentes da Embrapa e os pesquisadores em
geral. Estes foram ouvidos em duas etapas. A primeira, por ocasião da pesquisa qualitativa,
por meio de entrevistas iniciais e entrevistas semi-estruturadas. Esse grupo de pessoas
doravante será caracterizado como “grupo de formadores de opinião”. A segunda etapa foi
por ocasião da pesquisa quantitativa, quando foram ouvidos os pesquisadores da Embrapa,
por meio de um questionário.
Os resultados das pesquisas serão apresentados, organizados de acordo com os
resultados da pesquisa quantitativa realizada com os pesquisadores, por meio do questionário.
Em seguida, caso haja correspondência das questões do questionário com as das entrevistas,
serão oferecidas análises das entrevistas, com declarações dos sujeitos, colhidas na primeira
fase do trabalho, isto é, na pesquisa qualitativa. Quando for o caso, seguirão algumas citações
124
dos respondentes da questão aberta do questionário utilizado na pesquisa quantitativa. Serão
apresentadas ainda análises de questões que foram abordadas somente nas entrevistas. Todos
esses olhares contribuirão para melhor entendimento dos temas tratados.
Para melhor entendimento do texto, as citações de autores serão apresentadas da mesma
forma em que o texto é escrito, entre aspas, assim como as declarações dos sujeitos da
pesquisa qualitativa e os comentários constantes no questionário da pesquisa quantitativa. As
citações que ultrapassarem três linhas serão apresentadas com um deslocamento e em letra
menor. As declarações dos sujeitos da pesquisa qualitativa estarão formatadas na mesma letra
utilizada no texto, em itálico. Os comentários dos questionários estarão em letra diferente,
Book Antiqua. As declarações dos sujeitos das entrevistas preliminares serão apresentadas
também em Book Antiqua, em itálico.
As declarações feitas pelos sujeitos participantes da pesquisa qualitativa (entrevistas)
serão acompanhadas do número correspondente a sua codificação, precedido da palavra
“Sujeito”. As declarações feitas pelos participantes da pesquisa quantitativa (questionário)
serão acompanhadas do número do questionário, precedido pela letra “Q”.
Este capítulo apresenta resultados sobre os seguintes temas: relação entre ciência,
pesquisa e ética; relação entre pesquisa agropecuária e bioética; crenças dos pesquisadores
quanto a ética na pesquisa na Embrapa; conduta ética dos novos pesquisadores em relação aos
mais antigos; influência ou interferência política na atividade de pesquisa na Embrapa.
5.1. RELAÇÃO ENTRE CIÊNCIA, PESQUISA E ÉTICA
Perguntados sobre a relação entre ciência, pesquisa e ética, a maioria dos pesquisadores,
63% (305 pessoas) acreditam que “A ética, a ciência e a pesquisa devem se complementar”;
34% (169 pessoas) acreditam que “A ética deve estar acima da ciência e da pesquisa”.
Apenas 11 pessoas têm opiniões diferentes, sendo que destas, 2% (nove pessoas)
acreditam que “Às vezes, a ciência e a pesquisa devem ficar acima da ética” e 0,20% (uma
pessoa) acredita que “A ciência e a pesquisa devem estar acima da ética” e 0,20% (uma
125
pessoa) não vê relação entre ciência, pesquisa e ética, conforme pode ser melhor visualizado
na Figura 9.
Relação entre ciência, pesquisa e ética
63%
34%
1% 0%2% 0%
A ética, a ciência e apesquisa devem secomplementar A ética deve estar acimada ciência e da pesquisa
Às vezes, a ciência e apesquisa devem ficaracima da ética Outras opiniões
A ciência e a pesquisadevem estar acima daética Não há relação entreciência, pesquisa e ética
Figura 9: Relação existente entre ciência, pesquisa e ética, na visão dos pesquisadores, em
percentual
Com relação à pesquisa qualitativa, dos 20 sujeitos que foram questionados sobre se a
ciência deveria estar acima da ética, 11 responderam com convicção que não. Um deles
explica: “Não, porque a ética é parte integrante das relações humanas. Se a ciência é uma
produção humana, a ética tem que reger a ciência” (Sujeito 12). Outro pesquisador, apesar de
não querer amarras para a ciência, considera a ética fundamental para a prestação de contas à
sociedade, conforme declara a seguir:
A ciência deve observar a ética, mas ela não deve estar acima da ética. Eu
acho que, apesar da ciência não poder ter nenhum tipo de amarras, mas a
ética, ela é fundamental para você prestar contas à sociedade, ver o que você
126
está fazendo... Porque existem diferentes tipos de interpretação daquilo que
você está fazendo (Sujeito 5).
Um entrevistado assinala que a ética vai além, quando afirma que “a ética é uma
questão que transcende a ciência e perpassa todos os segmentos” (Sujeito 3).
Dentro da fala de três pessoas, há uma observação de que a ciência deve obedecer ao
momento, o contexto da sociedade, no sentido de a ética acompanhar a sua evolução. Esse
tipo de argumentação em relação à ciência, observando pela ótica do imperativo institucional
“universalismo”, de Merton (1979), só é possível compreender quando se pensa em um
conceito lato de sociedade, uma vez que sua visão segmentada embute fatores como religião,
raça, regime político do país e outros.
Uma pessoa acredita que na ciência já há ou deve haver um comportamento moral
incluído, tendo em vista que “a ciência já é montada dentro de uma ética” (Sujeito 6). Outro
acredita que se deve “desenvolver a ética como um valor de pesquisa, considerar os
relacionamentos que o avanço do conhecimento, que a tecnologia, que a inovação pode ter no
contexto da sociedade” (Sujeito 10).
Outras cinco pessoas, dentro das suas declarações, lembram situações que remetem a
Kuhn (1975) sobre o que este chamou de “ciência extraordinária”, quando ocorreria a
mudança de paradigmas, decorrente de transformações sociais e ruptura da ética vigente.
Essas declarações podem guardar relação com as nove pessoas que responderam no
questionário que “Às vezes, a ciência e a pesquisa devem ficar acima da ética”. Como
ilustração, apresentam-se declarações que expressam essa idéia.
“É importante comentar que o próprio avanço da ciência leva a
transformações sociais – decorrentes da interação da sociedade com os novas
descobertas – e que podem também levar a mudanças de valores e costumes,
revolucionando assim os próprios princípios éticos da sociedade em questão”
(Sujeito 18).
“Historicamente esta questão vem a discussão quando as descobertas da
ciência (em benefício da sociedade) estão a proporcionar uma grande ruptura
127
na ética vigente, como no momento em que ela se coloca acima da ética”
(Sujeito 20).
“Como a ética é relativa ao grupo social que a desenvolve e a estabelece,
muitas vezes em função de novos avanços da ciência, as questões éticas
precisam ser rediscutidas e reformuladas pelos grupos sociais envolvidos. Ex.
célula-tronco” (Sujeito 21).
Por fim, tem-se a declaração de uma pessoa, que acha difícil separar a ética da ciência e
justifica.
Esse tipo de informação padece no meu modo de entender de um vício de
origem enorme, como se existisse uma separação nítida entre ciência e ética.
Ciência é uma atividade humana, ética é outra atividade humana, é muito
difícil você separar no cérebro do cientista... Aonde começa a ética e aonde
começa a ciência. De forma que essas coisas são inter-relacionadas... Quer
dizer, os procedimentos científicos não são independentes da ética do
pesquisador e de certa forma também a ética do pesquisador não é
independente da formação científica que ele tem. O pesquisador, por exemplo,
que tem uma formação científica do tipo positivista, ele tem uma ética que é
inerente à visão positivista a respeito da vida. E quando ele começa a
trabalhar dentro da ciência, está usando de certa forma o positivismo como
paradigma. Nesse caso, para um cientista positivista não tem como separar os
critérios da ciência dos critérios do positivismo... Agora quando vem questões
muito delicadas, ligadas com a vida, ligada com a possibilidade de você fazer
um invento... que tem um poder destruidor da humanidade, eu acho que aí o
cientista, quem sabe, pode colocar de lado um pouco as ideologias que tem e
começar a pensar na humanidade, no direito que a humanidade tem à vida.
Mas isso é só para as questões muito complicadas, a questão mais simples, no
meu modo de entender, não tem como separar a ciência e ética (Sujeito 4).
A seguir, apresenta-se um comentário anotado em um questionário que expressa a
opinião da maioria e que, de certa forma, lembra a ética da sustentabilidade:
128
Sem ética não pode haver ciência alguma que contribua de fato para o
desenvolvimento, do ponto de vista individual, do ente humano e
coletivamente da humanidade. (Q. 1)
Pode-se concluir que a maioria dos pesquisadores e do grupo de formadores de opinião
concorda que a ciência e a ética devem ter uma relação estreita ou a ética deve estar acima da
ciência, representando 96,34% da pesquisa quantitativa e 14 pessoas da pesquisa qualitativa.
Esses números não deixam dúvidas quanto a essa questão.
5.1.1. Conceitos de ética formulados pelos atores
Os conceitos de ética na pesquisa não se constituiu em uma pergunta direta feita nas
entrevistas ou no questionário. Entretanto, houve uma reivindicação em todas as etapas desse
trabalho, no sentido da apresentação na pesquisa de conceitos de ética e de ética na pesquisa.
Porém, como a pesquisa era de caráter exploratório e o estudo pioneiro na empresa, não se
considerou estratégico oferecer um conceito formado.
Apesar disso, surgiram alguns conceitos de ética, de ética na pesquisa e de ética na
pesquisa agropecuária (PA) nos vários momentos do trabalho (Quadro 5). Estes são citados a
seguir, contendo a instância (meio) onde foi citado, seguido do número do sujeito, que o
expressou.
129
Quadro 5: Conceitos de ética formulados pelos atores
TEMA CONCEITOS MEIO
A ética está mais acima da ciência e da pesquisa ou de qualquer
outra instituição humana... É a base fundamental da vida...
Pertence ao campo da espiritualidade... É a inclinação natural e
intuitiva para o “certo e justo”.
Q. 1
Ética por definição é dinâmica (opõe-se à moral, que é definida).
Ela não deve contemplar a mim ou a meu grupo, tem que ser
definida na dinâmica da relação com o outro.
Q. 25
A ética é sempre pessoal, ou melhor, impessoal do ponto de
vista espiritual, universal, mas “acessada” somente por meio da
nossa consciência pessoal.
Q. 144
A ética trata dos nossos valores, nossos fins e objetivos, e dos
meios lícitos para atingi-los. É auspicioso que o discurso ético
seja difundido, questionando certos valores, contestando
determinados fins e determinadas aplicações do conhecimento.
Q. 418
Ética em
geral
A ética cuida do uso da liberdade. Sendo assim, a liberdade
científica deve ser eticamente orientada.
Q. 291
130
Quadro 5: Conceitos de ética formulados pelos atores (Continuação)
TEMA CONCEITOS MEIO
A ética na pesquisa é componente da ética profissional.
Portanto, norteadora da elaboração de projetos, acesso a
recursos naturais, comunidades tradicionais, administração e
utilização do dinheiro público, execução de atividades...
Q. 154
Na grande maioria quem tem "ética na pesquisa" diria também
"Ética geral" são pessoas que tem um elevado nível educação (de
comportamento, de caráter) de berço.
Q. 157
A ética na pesquisa é reflexo do código de conduta pessoal. Se
um pesquisador costuma mentir para diversos propósitos, quem
me garante que seus resultados de pesquisa não foram forjados?
A ética na pesquisa, não pode ser dissociada da ética pessoa.
Q. 180
Ética na
pesquisa
Quem não tem ética pessoal, não tem ética na pesquisa, e isso
tem acontecido muito na Embrapa. Ética norteia a vida de cada
pessoa e no mundo atual, são poucos que tem mostrado isso.
Outros fatores estão acima da ética, principalmente na pesquisa.
Q. 472
Ética na
PA
Ética na pesquisa agropecuária é ser fiel à verdade dos eventos
observados, analisando-os com imparcialidade, sem forjar
resultados.
Q. 1
Muitas pessoas confessaram não saber o que significa realmente a palavra ética, tanto
nas entrevistas semi-estruturadas como no questionário. Nestes, encontram-se pelo menos
quatro pessoas que declararam que o tema não era bem claro para ele, outro gostaria de saber
o que se entende por ética na pesquisa, outro disse não ter conhecimento do tema e outro
declarou seu desconhecimento total do tema ética na pesquisa.
131
5.1.2. Em que momento a ética deve ser levada em consideração na pesquisa
Perguntados sobre esse tema, dos pesquisados que responderam ao questionário,
94,51% (465 pessoas) responderam que a ética deve ser levada em consideração em todo o
processo de pesquisa.
Como a questão permitia a marcação de mais de uma alternativa, nas etapas do processo
de pesquisa, houve uma distribuição mais ou menos semelhante, cuja percentagem variou de
16,46% (81 pessoas), na seleção dos projetos a 19,11% (94 pessoas) na elaboração das
propostas, conforme pode ser visualizado na Figura 10.
465
94 93 92 85 81
10
100
200
300
400
500
1
Momento em que a ética deve ser levada em consideração na pesquisa
Em todo o processo depesquisa
Elaboração das propostas
Definição de propostas
Análise do projeto
Avaliação dos resultados
Seleção de projetos
Não deve ser levada emconsideração na pesquisa
Figura 10: Momento em que a ética deve ser levada em consideração na pesquisa, segundo a
percepção dos pesquisadores, em número de respostas
Esse resultado vem ao encontro do obtido no item anterior, “Relação entre ciência,
pesquisa e ética”, onde, somados, 97% reconhecem na ética um componente importante para
ser aliado à pesquisa, na medida em que responderam que “a ética, a ciência e a pesquisa
devem se complementar” (63%) e que “a ética deve estar acima da ciência e da pesquisa”
(34%).
132
A grande maioria dos pesquisadores da Embrapa que responderam ao questionário,
além de reconhecerem a importância do componente ético na ciência e na pesquisa (97%),
também acreditam que a ética deve ser levada em consideração na pesquisa em todas as suas
etapas (94,51%). Dessa forma, pela opinião dos atores ouvidos, fica claro que não só a
avaliação técnica da pesquisa deve ser considerada, como também a avaliação ética, em todo
o processo da pesquisa.
Maffia e Mizubuti (2004) reforçam esse resultado, quando afirmam que os
questionamentos éticos devem estar presentes desde a concepção da idéia, ou seja, na
elaboração do projeto, até os “impactos da publicação do trabalho científico ou do uso da
tecnologia ou produto gerado”.
5.2. RELAÇÃO ENTRE PESQUISA AGROPECUÁRIA E BIOÉTICA
Quando perguntados sobre “Qual a relação entre a pesquisa agropecuária e bioética?”,
com quatro sugestões de respostas, 85% (417 pessoas) responderam que a “Pesquisa
agropecuária deve ser incluída nas discussões sobre bioética”. Outros 13% (64 pessoas)
acreditam que “Somente uma parte da pesquisa agropecuária deve estar incluída nas
discussões sobre bioética”. Já a resposta “Pesquisa agropecuária não deve estar incluída nas
discussões sobre bioética”, é a opinião de 1% (sete pessoas), conforme Figura 11.
133
Relação entre pesquisa agropecuária (PA) e bioética
85%
13%
1%1%
PA deve estar incluída nasdiscussões sobre bioética
Somente uma parte da PAdeve estar incluída nasdiscussões sobre bioética
PA não deve estar incluídanas discussões sobrebioética
Outra opinião
Figura 11: Relação entre pesquisa agropecuária e bioética, em percentual.
Esse resultado guarda relação com as opiniões dos entrevistados na primeira fase desse
trabalho, a pesquisa qualitativa, onde, dos 21 sujeitos ouvidos, a imensa maioria, 20
reconhece que há algum tipo de relação entre a pesquisa agropecuária e bioética, apesar de
dois deles confessarem não ter certeza do conceito de bioética. Desse total, 11 profissionais
responderam com certeza que acreditavam que a pesquisa agropecuária faz parte da bioética.
Nove responderam com frases que reconhecem algum tipo de relação, como: dois sujeitos
responderam que “a bioética está relacionada à pesquisa agropecuária”. Outros responderam
que a bioética influencia ou permeia a pesquisa agropecuária. Outros ainda acreditam que “a
bioética é o campo de ação da pesquisa agropecuária”; “a pesquisa agropecuária deve estar
condicionada à bioética”; “a bioética é fundamental para a pesquisa agropecuária”.
Das pessoas ouvidas, apenas um respondeu textualmente que não sabia o que é bioética,
abstendo-se dessa forma de dar sua opinião.
Dentre os que têm plena convicção de que a pesquisa agropecuária faz parte da bioética,
apresenta-se, para efeito de melhor compreensão de suas opiniões, as seguintes declarações:
134
“Eu acho que sim. A pesquisa agropecuária está tratando sempre com vida. A
Embrapa é uma empresa que trata objetivamente com a vida, em seus
diversos momentos. Então a bioética é parte integrante da nossa atividade. A
ética, a bioética tem que ser sempre um pano de fundo da atividade de
pesquisa da empresa. Não tem como ela ficar afastada das atividades da
empresa” (Sujeito 12).
“Faz, porque nós temos áreas como a transgenia, como a clonagem, como a
genômica, como a biologia molecular, como a manipulação de DNA, que
obrigatoriamente você está... inserindo-se naquilo que se chama o cerne, a
parte mais refinada dos sistemas biológicos. Então, portanto, a pesquisa
agropecuária, ela também é influenciada, faz parte da questão bioética”
(Sujeito 13).
Entre as declarações dos sujeitos que reconhecem algum tipo de relação entre pesquisa
agropecuária e bioética, destacam-se:
“Eu acho que a pesquisa agropecuária está intrinsecamente relacionada à
bioética porque a pesquisa agropecuária permeia em várias sessões a questão
biológica, quer dizer, nós estamos no, limiar de decisões, de como utilizar
recursos biológicos, como modificá-los, como difundi-los, então ela é
indissociável da bioética... O animal é biológico, então nesse caso você tem
toda a questão da bioética. Se eu trabalho, por exemplo, com animais e
vegetais, com microorganismos, que é o nosso caso, eu tenho campo somente
trabalhando com a modificação, com a prospecção, modificação,
disseminação de elementos vivos, do "bio", eu tenho interferência e faço parte
dessa questão. Somos uma empresa que tem relação com a bioética” (Sujeito
3).
“A bioética, ela permeia a pesquisa agropecuária porque assim como a gente
falou que a ética... está presente nos contornos metodológicos, nos
fundamentos metodológicos, a bioética está mais ligada à forma, quer dizer, a
maneira, a valorização que eu faço da vida ou das coisas que têm vida. Eu
posso pensar em bioética na parte humana, posso pensar na natureza a
135
utilizar a bioética, então sim, eu acho que as ciências agronômicas de uma
maneira geral. Aqui eu estou falando agronômica não só no aspecto vegetal,
da parte vegetal, o agronômico grandão que envolve também a parte de
pecuária, lidar com animai. Eu acho que necessariamente tem uma cobertura
ética essa coisa, tem fundamentos éticos” (Sujeito 6).
“A pesquisa agropecuária está, tem que estar condicionada à bioética, uma
vez que a pesquisa agropecuária trabalha com seres vivos” (Sujeito 7).
“A bioética é fundamental para a pesquisa agropecuária contemporânea.
Com a evolução das sociedades humanas muitas práticas e métodos de
pesquisa do passado começam a ser questionados. Além disso, surgem novas
questões com implicações muito maiores em termos de bioética. Dando
alguns exemplos: no passado, fazer pesquisas com camundongos e mesmo
grandes animais eram inquestionáveis pelos fins ou resultados visados. Hoje,
questiona-se principalmente os métodos que submetem quaisquer animais ao
sofrimento ou aos comportamentos não-naturais. Inclusive, este critério
passou a ser importante na seleção de propostas por algumas instituições de
apoio a pesquisa científica. Outro exemplo: com a chegada da técnica de
engenheiramento, e a possibilidade de troca de genes mesmo entre o reino
animal e vegetal, crescentemente questiona-se essa interferência “brutal” (tal
é a grandeza da mudança) do homem no meio ambiente. Todas essas
discussões levam à bioética que se relaciona ao direito do homem interferir
na ordem estabelecida no Universo. E que leva a uma outra grande
discussão: antropocentrismo ou ecocentrismo do mundo?” (Sujeito 18).
Quando questionados sobre o fato de não se ver a pesquisa agropecuária muito ativa nas
discussões sobre bioética, ou mesmo encabeçando-as, ouvem-se declarações como:
“A questão médica é muito maior porque nós estamos em um mundo que é
antropocêntrico. Quem é o ser pensante aqui? Na realidade a saúde humana
transcende... Se você manipula outros animais não têm o mesmo aspecto... do
que uma manipulação no homem. A grande questão é a clonagem humana
que não é permitida, entre aspas, mas a clonagem animal já está e vegetal
136
então nem se fala. Então isso está levando que a questão bioética seja mais
ligada a questão humana. Mas se você olhar pela ótica da semântica e do
objetivo, nós deveríamos estar bem mais entrosados... Nós estamos num
processo... Essa legislação mais recente, tanto em nível nacional quanto
internacional, questões ligadas a... barreiras não-tarifárias, estão levando a
questão da produção agrícola, rastreabilidade, as origens dos produtos, como
eles foram produzidos do ponto de vista ambiental, bioético e social. Isso vai
crescendo e exigindo uma tomada de posição nesse sentido. Antigamente, o
pessoal comprava e não interessava aonde, agora tem toda uma questão de
como está, a origem, quanto que a gente está devastando... se tem trabalho
escravo, se é OGM... Então está entrando na pauta não apenas legislação,
mas do que é palpável, quer dizer de exportação. A tendência é, quer queira
quer não queira, entrar” (Sujeito 3).
“Isso tem uma razão muito simples, porque a medicina, a enfermagem, elas
estão ligadas diretamente com o ser humano. Agora se nós considerarmos que
o ser humano é apenas parte de uma grande arquitetura do universo chamado
vida, então... E veja que os genes hoje de uma drosófila, ou, por exemplo, os
genes de qualquer animal, de um símio, de um macaco... O número de genes
compatíveis com o ser humano, são altos, altíssimos, então significa que a
origem da vida foi uma única... A medicina trata da questão humana, mas tem
N outras profissões que trata da vida com um todo. Então, portanto, não há
como você... ter uma vida humana e uma vida dos outros animais, dos outros
seres” (Sujeito 13).
“Isso é um mal de início, eu acho... A bioética nasceu muito ligada à parte
humana, da medicina. Então você vê a bioética muito ligada a isso daí. Eu
acho que é um viés... mas a bioética... ela está ligada à vida, está ligada à
planta, ela está ligada aos pequenos animais, aos animais microscópicos, ela
está ligada aos grandes animais, quer dizer você não pode ser tão rigoroso
em bioética. Você não é ético, se você valoriza só a parte humana. Essa ética,
ela está pela metade ou menos da metade, quer dizer, eu não posso maltratar
você, mas eu maltrato o meu animal doméstico... ou eu admito que a carne
que eu estou comendo, que os procedimentos de criação... de abatimento
daquele animal até chegar à mesa onde eu consumo, possa ser feito de
137
qualquer forma. Isso não é ético. A ética está dentro de uma área maior
chamada de moral. A ciência moral, ela comporta as discussões éticas... A
filosofia moral se interessa por esse tipo de problema, não só na parte
humana. Então quem é ético em termos de comportamento humano apenas, é
meio ético ou menos de meio ético porque você tem que ser ético com a vida,
você tem que ser ético com o ambiente... no meio ambiente no qual você vive...
Se ela (a bioética) não está relacionada à vida total, abrangendo os outros
animais, eu acho que tem algum defeito, deve ser defeito de início” (Sujeito
6).
“Na verdade, hoje o grande foco que eles estão dando para bioética é a
questão dos organismos geneticamente modificados. Isso é parte da pesquisa
agropecuária. Eles não consideram, a própria mídia não coloca essa questão
como parte da pesquisa agropecuária, mas é. OMG para a questão agrícola
é. O que eles estão colocando como foco na bioética são as questões do
genoma humano, inseminação artificial, essas coisas diretamente focadas nas
questões do genoma humano. Mas não é só isso. Principalmente porque todas
as mudanças na genética dos alimentos têm, de qualquer modo, alguma
influência na nossa vida, e a gente tem que saber disso” (Sujeito 12).
Assim, não restam dúvidas sobre a posição dos atores quanto a essa questão. É opinião
da quase totalidade das pessoas ouvidas que a pesquisa agropecuária deve estar incluída nas
discussões sobre bioética.
As definições sobre bioética encontradas e a Resolução 196/1996, do Comitê de Ética
em Pesquisa da Fiocruz/MS, dá abrigo a essa convicção. Essa Resolução define pesquisas
envolvendo seres humanos, como “pesquisa que, individual ou coletivamente, envolva o ser
humano de forma direta ou indireta, em sua totalidade ou partes dele, incluindo o manejo de
informações ou materiais”. Atendo-se a essa definição, a pesquisa agropecuária envolve seres
humanos, de forma indireta. Assim, entende-se perfeitamente legítima e desejável que a
pesquisa agropecuária como um todo se aproxime da bioética, participando de suas
discussões, o que permitiria que aquela usufruísse dos constructos teóricos da bioética,
contribuindo assim para maior amplitude da bioética em termos de visão das ciências da vida.
138
5.3. CRENÇAS DOS PESQUISADORES QUANTO A ÉTICA NA PESQUISA NA
EMBRAPA
No questionário havia uma questão, com várias afirmativas, cujo enunciado era:
“Quanto ao tema ética na pesquisa na Embrapa, você acredita que”. Nessa questão, poderia
ser assinalada mais de uma alternativa. As cinco primeiras afirmativas mais assinaladas foram
extraídas do discurso dos entrevistados por ocasião da pesquisa qualitativa. Dessas
afirmativas, 52,03% (256 pessoas) assinalaram que a ética na pesquisa “Deve obedecer a
princípios éticos gerais, sem, contudo, limitar avanço do conhecimento”.
A segunda questão mais assinalada foi “Necessita ser melhor discutido na Embrapa
pelos pesquisadores e pela direção da empresa”, com 49,19% (242 pessoas). A afirmativa “É
preciso criar instâncias institucionais que permitam a interação entre a sociedade e a C&T” foi
assinalada por 44,72% (220 pessoas).
Pela ordem, outra questão que os pesquisadores mais assinalaram foi a afirmativa de
que a ética na pesquisa “Não deve ser a única questão a definir se uma pesquisa vai avançar
ou não”, com 22,36% (110 pessoas). A afirmativa que a ética na pesquisa “Não deve servir a
outros objetivos, como por exemplo, limitar a ação dos países em desenvolvimento”, foi
assinalada por 16,87% (83 pessoas).
Dos respondentes, somente 1,22% (seis pessoas) acreditam que o tema “Está
devidamente tratado na Embrapa, não necessitando de outras ações”. Outros 1,22% (seis
pessoas) expressaram outras opiniões, como pode ser observado na Figura 12.
139
256 242220
11083
6 60
50
100
150
200
250
300
1
Crenças sobre ética na pesquisa na Embrapa Deve obedecer a princípioséticos gerais
Necessita ser melhor discutidona Embrapa
Criação de instânciasinstitucionais visando interaçãoentre a sociedade e a C&T Não deve ser a única questão adefinir se uma pesquisa vaiavançar ou nãoNão deve servir a outrosobjetivos
Está devidamente tratado naEmbrapa
Outras opiniões
Figura 12: Afirmativas dos respondentes sobre o tema “ética na pesquisa”, em número de
respostas.
Encontram-se, a seguir, as afirmativas oferecidas no questionário, seguidas do
percentual de respostas e de maiores dados ou de análises sobre as mesmas.
A ética na pesquisa deve obedecer a princípios éticos gerais (52,03%)
Essa preocupação com a limitação do avanço do conhecimento é recorrente no
questionário e nas entrevistas. Nota-se no pesquisador uma preocupação com o não
engessamento da ciência e da pesquisa.
Entende-se como perfeitamente genuína e lícita essa preocupação, na medida em que a
ética na pesquisa, por envolver vários interesses nacionais e internacionais, deve se apoiar em
questões objetivas e universais, buscando sempre legitimação em acordos reconhecidos e
consagrados internacionalmente como a Declaração de Direitos Humanos, da ONU e outros.
140
O tema ética na pesquisa necessita ser melhor discutido na Embrapa (49,19%)
Essa é outra reivindicação recorrente em todos os momentos da pesquisa, que o tema
deve ser mais discutido pelos pesquisadores e pela direção da empresa. Esse assunto
despertou o interesse de todas as pessoas contactadas e ouvidas. Estas frisaram o interesse,
discorreram sobre sua importância ou sobre a necessidade de se inserir o assunto em pauta na
empresa.
No “Portal Academus”, numa apresentação da “Evolução do conceito de ética nos
negócios e nas empresas33”, encontra-se um esquema que explica a “existência de três modos
inter-relacionados de abordagem da ética no âmbito das empresas”. Esse esquema (Figura 13)
permite compreender a importância da discussão em geral nas empresas, na medida em que o
processo que permite atuar de forma ética envolve fases como: pensar sobre ética, que
envolve a parte teórica; falar sobre ética, envolvendo a parte semântica (significado das
palavras); e atuar eticamente, envolvendo a parte prática. Apesar de esse ser um esquema
simplista se comparado à complexidade do comportamento humano, ele oferece uma visão
didática do tema.
33 O site esclarece que o texto citado foi baseado no livro "Fundamentos de Ética Empresarial e Econômica" de Maria Cecília Coutinho de Arruda e outros. São Paulo, Atlas, 2001. Encontra-se disponível no site: http://www.eticaempresarial.com.br/conteudo_eticanegocios.asp, acessado em 12.05.2005.
141
Figura 13: Esquema sobre “modos inter-relacionados de abordagem da ética no âmbito das
empresas”. Fonte: Portal Academus.
A possibilidade de se oferecer fóruns para discussão é importante e possibilita ainda ao
profissional se inteirar da política geral da sua área. Valls (2001, p. 69) argumenta que:
Opiniões são convicções ainda não demonstradas cientificamente, e portanto
não devem ser defendidas com fanatismo, isto é, excesso de certeza ...
Portanto, o profissional da área deve dispor-se a opinativamente pesar e
sopesar os prós e os contras dos métodos, dos procedimentos e das tecnologias
que têm de utilizar.
Complementa, dizendo que “Opinião é exatamente isso, um saber que talvez esteja
certo, mas que pode a qualquer momento ser corrigido por outra opinião melhor”. Como
exemplo de reflexão, cita um dilema atual: “quais são os prós e os contras do uso de produtos
transgênicos, e quais são, por outro lado, os prós e os contras do não uso deles?”.
142
É verdade que o uso indiscriminado de novas técnicas deve ser visto com cautela e é
verdade também o contrário. Igualmente deve ser visto com cautela o não uso de técnicas que
permitirão resolver problemas de alimentação da população sem evidências ou estudos que
demonstrem ser essas técnicas prejudiciais ao homem e ao meio ambiente. Para se chegar a
respostas desse tema e de vários outros, não há como fugir à discussão com os atores
envolvidos, facilitando a troca de informações técnicas.
Nos comentários apostos nos questionários, 40 pessoas (8,13% do total) assinalaram a
necessidade de se discutir sobre o assunto na empresa, visando (serão citadas as palavras
utilizadas pelos respondentes): definição; internalização; divulgação; reflexão; ser objeto de
debate entre pesquisadores; priorização pela DE; ser objeto de discussões permanentes; ser
objeto de campanhas; constituir-se em fórum amplo de discussão; esclarecimentos;
estabelecimento de diretrizes claras; discussão em maior profundidade do tema.
É emblemática a opinião de um pesquisador, onde ele enfatiza a necessidade de se
discutir a questão ética, com a argumentação de que “Um pesquisador não pode estar focado
apenas nos aspectos técnicos da pesquisa” (Q. 448).
Criação de instâncias institucionais que permitam a interação entre a sociedade e a C&T
(44,72%)
Essa é uma questão onde fica clara a preocupação dos pesquisadores em melhorar a
comunicação entre a C&T e a sociedade. Essa também é uma reivindicação atual da
sociedade, que cada vez mais quer se inteirar dos resultados da C&T, para poder também
participar de alguma forma da tomada de decisão sobre alguns assuntos, principalmente sobre
temas polêmicos. Como declarou um pesquisador nos comentários do questionário, “A
sociedade decide, muitas vezes de forma intuitiva, se as descobertas da ciência devem ser
incluídas em seus princípios de convívio” (Q. 1).
Dessa forma, há a necessidade das organizações que trabalham com C&T de
disponibilizar informação e conhecimento dirigidos a vários segmentos da sociedade,
buscando se fazer entender, para evitar que a mídia (impressa e televisiva) promovam
determinados assuntos em demasia, em detrimento de outros.
143
Houve uma discussão muito grande na sociedade, cujo ápice no Brasil se deu em
2003/2004, sobre alimentos transgênicos. Sabe-se que há ainda poucos estudos sobre os
impactos dos alimentos transgênicos no organismo humano, talvez pelo pouco tempo também
do uso dessa técnica, o que não habilita resultados conclusivos. Entretanto, sem entrar em
juízo de valor sobre esse tema, sabe-se que há técnicas que também poderiam ser igualmente
questionadas e que não despertaram na mídia tanto ou nenhum interesse. O próprio trabalho
de biotecnologia, com o melhoramento de cultivares, modifica de certa forma, as propriedades
naturais dos alimentos. Entretanto, hoje não se imagina alimentar a humanidade, com um
número crescente tanto de nascimentos como de expectativa de vida, sem esse
desenvolvimento da agricultura e pecuária.
Valls (2001, p. 68), discorrendo sobre a questão da interação entre a ciência e a ética,
entre a ciência e a filosofia, aponta duas saídas, que são:
A formação de pesquisadores anfíbios, treinados para se movimentar nos dois
âmbitos, e a criação de comitês interdisciplinares, em que gente de várias
especialidades, até mesmo movidos pela lei da simpatia que se desenvolve em
grupos específicos, acaba aprendendo a dialogar de mesmo modo objetivo,
senão fraterno.
Um fato que pode provocar mudanças nessa interação ciência e sociedade é a inserção
de empresas públicas ou privadas atuando como intermediários entre essas duas instituições,
desenvolvendo competências técnicas e de relacionamento com a sociedade, configurando-se
como verdadeiras “tradutoras entre os mundos da ciência e da tecnologia e a sociedade mais
ampla”. Dessa forma, “com essa dupla competência, elas podem angariar o respeito e a
legitimidade tanto da área científica e técnica quanto dos movimentos e organizações sociais”
(SCHWARTZMAN, 2002).
A Embrapa tem investido em formas de comunicação à sociedade dos resultados das
pesquisas realizadas, tendo uma atuação bastante ativa em ações de transferência de
tecnologia e de comunicação com a sociedade. Além disso, trabalha no sentido de reduzir o
tempo entre a produção do conhecimento e das tecnologias e sua disponibilização para os
usuários e para a sociedade em geral. Todas as unidades atuam na área de transferência de
144
tecnologia e existe uma unidade que possui essa missão, que é a Embrapa Transferência de
Tecnologia, com sede em Brasília/DF. Conforme informa sua página na web34, esta unidade:
Promove a articulação intra e interinstitucional para o estabelecimento de
redes de transferência de tecnologia. A partir das redes, novos arranjos
institucionais são formados entre a Embrapa e instituições dos setores público
e privado e do terceiro setor, acelerando o processo de disponibilização dos
resultados da pesquisa junto aos diversos setores produtivos brasileiros.
Exemplos desses mecanismos são as Vitrines Tecnológicas, Unidades
Demonstrativas, Dias de Campo, Cursos de formação de Agentes
Multiplicadores, participação em exposições, dentre outras ações de
transferência de tecnologia. Na busca da promoção de novos arranjos
institucionais, a Embrapa Transferência de Tecnologia vem avançando em
programas com alto potencial catalisador do processo de transferência de
tecnologias inovadoras para o agronegócio. Exemplos dessas iniciativas são o
Programa Alimentos Seguros - PAS Campo, com foco nas boas práticas
agrícolas e agropecuárias e o Programa de Apoio ao Desenvolvimento de
Novas Empresas de Base Tecnológica Agropecuária e à Transferência de
Tecnologia - PROETA, que enfoca a incubação de empresas.
Entretanto, percebe-se ainda a necessidade de a Embrapa investir na formação de
profissionais que possam fazer a ponte entre o pesquisador e a sociedade, que possa atuar no
sentido de compreender e se inteirar das pesquisas que estão sendo realizadas e de transmitir,
comunicar estrategicamente essas pesquisas e seus resultados à sociedade e vice-versa. Dessa
forma, poderiam ser minimizados problemas enfrentados pela empresa em épocas em que são
questionadas as novas técnicas como os enfrentados, por exemplo, por ocasião do foco nos
transgênicos.
Além disso, outro passo importante seria atuar no sentido de aumentar as oportunidades
de participação da sociedade ou de segmentos da mesma, nas atividades da empresa.
34 Site da Embrapa Transferência de Tecnologia: http://www22.sede.embrapa.br/snt/aunidade.htm, acessado em 21.10.2005.
145
A ética não deve ser a única questão a definir se uma pesquisa vai avançar ou não (22,36%)
Essa é uma outra preocupação recorrente nesse trabalho e que pode novamente ser
explicada pela questão da quebra de paradigmas (KUHN, 1975), já explanada no item 1.1.2.
(Relação entre ciência e sociedade).
A idéia aqui defendida pode consistir no fato de a sociedade estar em constante
mudança. Por exemplo, as vacinas, quando foram descobertas, provocaram na sociedade da
época, uma reação contrária muito forte. Entretanto hoje as vacinas são consideradas
fundamentais para se evitar várias doenças, como também para a erradicação total das
mesmas. No mundo atual, deixar de vacinar crianças é que é considerado como uma atitude
contrária a princípios éticos.
A ética na pesquisa não deve servir a outros objetivos (16,87%)
Essa preocupação dos pesquisadores, com o fato de a ética na pesquisa não servir a
outros objetivos, como por exemplo, limitar a ação dos países em desenvolvimento, parece ser
compartilhada em todo o mundo. O século XXI começou com discussões sobre clonagem
humana, e dessa vez não com base hipotética e sim real. Podem-se observar as preocupações
inclusive dos países desenvolvidos não só com relação à proibição ou não da clonagem
humana no seu país, como pela possibilidade de perder o bonde da história ou o “status
científico” do país, caso em outros países seja liberada a clonagem e no seu não. Isso remete à
competição existente entre os países, que segundo o contexto apresentado no Capítulo 1, tem
relação com a inovação (que pressupõe investimentos em P&D) e com investimentos
cumulativos em C&T, conforme explanado no item 1.3 (Julgamento da Ciência).
Além disso, durante o trabalho observou-se preocupação de alguns atores com a
utilização do termo ética como discurso social, sem nenhuma correlação com a prática ou
como desculpa para ações não amparadas tecnicamente.
146
O tema ética na pesquisa está devidamente tratado na Embrapa (1,22%)
O número de pessoas que acredita que não há necessidade de outras ações na Embrapa
com relação ao tema “ética na pesquisa” é muito pequeno (seis pessoas, correspondentes a
1,22%). Em geral, a grande maioria dos profissionais ouvidos tanto na pesquisa qualitativa
quanto na quantitativa, pelas suas respostas ou declarações, contradizem essa afirmativa.
5.4. CONDUTA ÉTICA DOS NOVOS PESQUISADORES EM RELAÇÃO AOS MAIS
ANTIGOS
Na entrevista semi-estruturada havia a seguinte questão: “Você considera que há
diferenças entre os novos pesquisadores e os mais antigos, em relação a conduta ética na
pesquisa?”
A grande maioria considera que há diferenças entre os pesquisadores novos e os antigos.
Acreditam que essas diferenças podem ser observadas em vários aspectos, mas não têm
certeza que teria alguma relação com a ética e nem com a ética na pesquisa. Inferências sobre
essas diferenças há muitas, como por exemplo: maior comprometimento dos antigos para com
a empresa; diferenças na educação (os pesquisadores mais novos são educados em uma outra
realidade, tiveram educação mais liberal); os novos são mais individualistas; os novos estão
mais comprometidos com suas carreiras; os novos teriam mais essa percepção da ética por
que têm mais acesso à informação devido à tecnologia. Essa pessoa afirma que isso se deve à
internet e não a sua formação na universidade.
Apesar disso, um pesquisador que entrou na Embrapa na época de sua criação35,
afirmou que quando ele foi admitido, em 1973, já encontrou essa conversa de que eles, que na
época eram novatos, não tinham o mesmo comprometimento que os outros.
35 A Embrapa foi criada a partir do Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária (DNPEA), do Ministério da Agricultura, tendo absorvido os recursos humanos deste departamento.
147
Sobre o fato de o novo pesquisador ter mais compromisso com a sua carreira,
Yeganiantz (1987, p. 103), discursa sobre a questão da diminuição da lealdade institucional e
da ascensão da profissional, que levaria a um maior envolvimento com a comunidade
profissional do que com a organizacional, conforme será explanado no próximo capítulo.
Uma pessoa argumenta, reconhecendo a diferença com base em valores: “Existe
(diferença), em relação à conduta eu não diria, mas em relação aos valores talvez. Porque isso
faz parte do nível da diferença de gerações, diferença de padrões sociais, não tanto da
Embrapa em si, mas da sociedade mesmo” (Sujeito 7).
Outra pessoa afirma que, apesar de reconhecer diferenças na administração da carreira,
não se pode afirmar nada sobre esse assunto por falta de estudos, conforme explica:
Nós conhecemos muito pouco das diferenças dos novos pesquisadores e dos
antigos, sob qualquer aspecto... Questão de produtividade, questão de
relacionamento, questão de valores, questão de comprometimento com a
empresa, de visão de carreira. Nós não conhecemos. Devíamos estudar essas
diferenças, até porque esses novos vão ser daqui a pouco 50% novos, 50%
antigos. Hoje talvez tenha aí uns 8% de novos, 10%, mas a tendência que
tenha cada vez mais novos, mas a Embrapa não conhece nada dos novos
pesquisadores. Qualquer pessoa que faz uma afirmação entre novos e antigos
é uma percepção limitadíssima. É de um novo pesquisador, talvez,
comparado, ou dois novos, ou três novos que eu conheço, comparados com
2000... Então eu acho que é difícil dar essa resposta, não acredito que
ninguém possa... porque a visão que cada um tem é muito pequena... Se a
Embrapa agregar os 500, estudar os valores, os comportamentos, as relações
desses 500 e dos outros 2000, aí você pode fazer um comparativo e dizer:
“Oh, eles são substancialmente diferentes nisso e nisso e nisso”. A gente sabe
que algumas diferenças existem entre os novos e os antigos; os novos têm uma
menor identificação com a empresa, eles estão muito mais centrados nas suas
próprias carreiras. Essas coisas a gente sabe, a percepção pelo contato e não
é só na Embrapa, é a característica da nova carreira. As carreiras são
pessoais e as carreiras dos antigos são da empresa. Acho que isso faz uma
grande diferença hoje e aí eu não estou falando de pesquisador, eu estou
falando de qualquer profissional que está em qualquer organização. Carreira
hoje é algo pessoal e as carreiras que nós fizemos eram as carreiras que as
148
empresas nos davam. Hoje o conceito de carreira é outro, cada um tem a sua
própria carreira. Eu tiro a camisa da Embrapa e visto a camisa do Banco
Central, eu tiro a do Banco Central e visto a camisa de outro lugar. A relação
de carreira dos antigos é diferente, entre aspas casou com a empresa e num
casamento até que muito mais sólido, às vezes, do que os outros casamentos
lá fora, que não rompe de jeito nenhum (Sujeito 2).
Somente duas pessoas responderam afirmativamente a essa questão, ou seja, acreditam
que há diferenças em relação à conduta ética dos novos contratados. Um deles reconhece a
questão da carreira da qual o anterior falou, entretanto acredita que esse fator influencia a
conduta ética. O outro cita um fato ocorrido que ele computou como indicador de mudanças
nesse aspecto, conforme declarações a seguir.
“Eu acho que sim... Os pesquisadores, principalmente da Embrapa e os
empregados em geral que estão há mais tempo... eles tem um espírito
corporativo muito mais forte do que os profissionais que... entraram nesse
último concurso. A gente tem notado isso. Não têm espírito mais de corpo, de
acreditar na Embrapa, de acreditar que tem uma carreira a fazer na Empresa
e que é aí que ele vai construir a vida dele... o conceito profissional, o
currículo dele. Nós temos constatado inclusive com certa taxa três vezes
maior que a média histórica da empresa, de perda de profissionais do último
concurso. Isso mostra um pouco e também há manifestações comportamentais
que nos indica que não há esse compromisso tão grande com a Empresa. Há
um compromisso com a carreira individual e se, em algum momento, se
oferecer uma coisa melhor... Muitas vezes nós que somos da Embrapa há
mais tempo, nós recebemos propostas melhores e não saímos porque a gente
acreditava e acredita em valores, acredita em uma carreira... A gente acredita
que podemos evoluir, que se pode fazer um mestrado, um doutorado. Não
temos percebido muito isso. Há uma visão mais individualista, no sentido de
que, não estou generalizando, mas percebe-se uma tendência e é importante a
gente pegar esse sinal logo no início, que estão procurando melhorar a
carreira, fazer um pouco da carreira na Embrapa, melhorar o currículo e não
perder tempo, mas já pensando em sair, muitas vezes. Por que isso tem
influência com a ética? Claro que tem, porque se eu falo: “Olha, eu quero
ficar nessa empresa e eu quero apostar nela por 20 anos”, o outro fala “Não,
149
eu quero apostar nela por dois anos”, aí ele pode rifar coisas que seriam de
interesse da corporação, numa perspectiva individual, enquanto que o outro
“Eu não vou botar meu individual à frente, porque a médio e a longo prazo eu
perco”. Tem diferença importante” (Sujeito 15).
“Há diferenças entre os novos e os pesquisadores mais antigos. Os antigos
têm uma profunda visão de que fazem parte da história da Embrapa e lutam
para manter o seu desempenho institucional, a sua imagem etc. Por quê?
Creio que a visão de uma empresa pública é diferente, o contexto
contemporâneo é diferente, refletindo num mercado de trabalho que valoriza
muito o individualismo e a competição. Um indicador dessa mudança: em
uma das campanhas salariais recentes foi proposto (pelos empregados mais
novos) até sabotar experimentos e projetos de pesquisa como forma de
mostrar insatisfação e a disposição no embate empregado x empregador. Esse
tipo de proposta era inimaginável em épocas passadas, tal era o orgulho que
os empregados tinham da instituição. Além disso, vale lembrar que enquanto
os empregados do passado tinham a idéia de pertencimento em relação à
Embrapa, os novos empregados já não possuem esse sentimento: podem ir
embora a qualquer momento, sem nenhum sentimento de perda” (Sujeito 18).
Acredita-se que essas afirmações são graves e que a Embrapa poderá investigar melhor
essa variável, uma vez que a empresa está em processo de renovação do quadro de pessoal.
Estudos sobre esse assunto poderão subsidiar políticas de recursos humanos.
No estudo realizado na área médica, com pesquisadores dos Institutos Nacionais de
Saúde (NIH) dos EUA, sobre má-fé na ciência, já citado anteriormente (NOGUEIRA, 2005),
os pesquisadores foram divididos em dois grupos: os que estavam em início de carreira e os
que se posicionavam no meio da carreira. Observou-se neste estudo que “os pesquisadores
experientes (média etária de 44 anos) se mostraram menos éticos que seus colegas
principiantes (com, em média, 35 anos)”. Apontam como possíveis razões “o fato de que os
cientistas mais experientes já conhecem melhor o sistema e têm menos medo de serem pegos,
ou o fato de que cientistas mais jovens se delataram menos nos formulários, com medo de
serem expostos”. O estudo citado, pela sua amplitude (3.247 sujeitos), mostrou que a idade e,
150
por inferência, tempo de trabalho, não necessariamente é indutora de procedimentos éticos,
pelo menos na área médica dos EUA, em relação àquela população estudada.
Uma afirmação de Kuhn, um filósofo da ciência, traduzida por Dutra (1999), mostra a
importância da interação entre os cientistas jovens e os membros mais antigos:
Kuhn procura mostrar de que modo, nas ciências naturais maduras, a educação
científica leva o candidato a cientista a se incorporar a uma comunidade de
investigadores. Essa comunidade possui determinados padrões de
comportamento em face do saber e de sua prática investigativa. O jovem
cientista estará formado no momento em que for capaz de se comportar do
mesmo modo que os membros mais antigos daquela comunidade.
Essa afirmação outorga aos pesquisadores antigos uma grande responsabilidade, na
medida em que estes são responsáveis pelo início de uma formação profissional dos novos
pesquisadores, constituindo-se em modelos. Também atribui à empresa responsabilidade, na
medida em que essa fase é fundamental, para realinhamento da cultura da empresa e para
incorporação de novos valores. Exige ainda dos novos pesquisadores uma postura de
aprendiz.
Ainda em relação à diferença entre os novos e os pesquisadores mais antigos, a título de
conclusão desse assunto, segue uma declaração:
Acho que com relação à ética na pesquisa não. Há com relação a valores
novos, são valores morais, valores sociais, que são novos, mas que fazem
parte da própria evolução humana. Mas quando você parte para questão da
ética, usando... conceitos... “não fazer nada para outro que não quero que
faça para mim”... Eu acho que nesse extremo os novos, ao se relacionarem
com os mais antigos, eles percebem a importância dos valores que são éticos,
pertinentes àquele grupo. É extremamente importante que os novos
pesquisadores se aproximem dos mais velhos, porque os mais velhos
passaram às vezes por muitas situações em que eles ainda irão passar, que
são desses conflitos éticos, que são dos conflitos do conhecimento, que em
muitas ocasiões eles tiveram que romper para poder avançar no
151
conhecimento. Essa aproximação é extremamente salutar e desejável que
aconteça, para que a empresa continue evoluindo e tendo um corpo técnico
profissional competente e responsável (Sujeito 12).
Nos comentários da pesquisa quantitativa, há duas afirmações sobre a importância de se
divulgar a conduta ética da empresa para os novos contratados. Há também um sentimento
expresso por um pesquisador sobre a falta de respeito demonstrada por pesquisadores mais
novos pela bagagem de conhecimento e experiência dos mais antigos.
A ética de cada pessoa é reflexo da moral de conduta. O respeito ao
conhecimento e experiência dos pesquisadores mais antigos nem
sempre é levado em conta pelos mais novos. Falta ética no
desenvolvimento das pesquisas (Q. 379).
O sistema de “gestão de conhecimentos” prevê atuação no sentido da troca de
conhecimentos entre os novos e mais antigos pesquisadores.
5.5. INFLUÊNCIA OU INTERFERÊNCIA POLÍTICA NA ATIVIDADE DE
PESQUISA NA EMBRAPA
Na entrevista semi-estruturada, quando perguntados sobre se o entrevistado já havia
sentido influência ou interferência política na sua atividade de pesquisa na Embrapa, dos 18
que responderam a essa questão, sete deles disseram não ter sentido, porém onze respondentes
disseram que sim.
Entretanto, percebeu-se que essa pergunta foi entendida de diferentes formas pelos
entrevistados. Em geral, entendem influência política como natural, uma vez que a Embrapa é
uma empresa pública e como tal deve respeitar as diretrizes do governo federal. Com relação
a interferência política, consideraram-na como negativa. As declarações a seguir, comprovam
essa avaliação.
152
“Se a interferência ou influência política é de política governamental, isso é
normal que aconteça. Cada governo tem uma estratégia, uma proposta, e a
Embrapa tem que se adequar às grandes linhas políticas. Em diversos
momentos da nossa história nós tivemos essa adequação. Num primeiro
momento da Embrapa, tinha toda uma política de governo que era voltada
para substituição de importação. Então o foco de pesquisa estava em cima de
produtos que eram importados e que deveriam ser substituídos no mercado
nacional. Então tem toda uma trajetória nisso. Mais recentemente, com a
orientação política de atender as populações mais carentes, com os
programas de agricultura familiar, fome zero, esses programas bem focados
no governo, evidentemente que a empresa também volta, por orientação
política, para esses grandes programas. Agora, quando a gente fala na
política partidária ou na pressão de políticos no resultado de pesquisa ou
atividade de pesquisa, eu particularmente nunca senti. Senti sim essas
grandes políticas nacionais, que eu acho que são legítimas” (Sujeito 12).
“Se o contexto é das políticas que a empresa estabelece, sim, você tem
interferência porque nem sempre todas as decisões que a empresa estabelece,
que a empresa define, são decisões que você esteja inteiramente à vontade.
Então há uma interferência, uma influência sim. Uma série de ações que você
implementa, talvez não fossem as ações que você acharia que são as mais
adequadas. São corretas dentro do poder que a empresa tem de determinar a
sua política, mas não é aquela questão que eu considero a mais adequada.
Então há influência sim, claro que há, entendida a influencia sobre essa
ótica” (Sujeito 2).
Apesar de reconhecer que a condição de empresa pública sujeita a Embrapa às diretrizes
governamentais, esse entrevistado exterioriza seu sentimento em relação às mudanças de
orientação governamental e às mudanças “ideológicas”.
“Eu acho que política partidária, política específica não. Sofre influência em
função de mudanças de orientação governamental. Isso sofremos
recentemente. Leva para um foco muito forte, para um tipo de público e que
houve uma pressão ideológica ‘A Embrapa não trabalha com o pequeno
153
produtor’. Sempre trabalhou, agora não ficou levantando a bandeira de que
era só isso. O grande problema na política são as questões de natureza
ideológica. Num determinado momento focar apenas num aspecto que aquela
ideologia dominante, por questões de natureza política, está querendo
favorecer, e que nem sempre ela representa uma realidade. Ela representa, às
vezes, um viés ideológico de um grupo que desconhece uma realidade, ou que
tem uma visão totalmente distorcida da realidade, e que acha que aquela é a
solução do mundo. Então, só fazer isso para aquele foco. Isso não é verdade,
Às vezes, nesse ponto, a empresa como um todo é pressionada. E ela tem
conseguido nesses anos todos superar essas questões. Não que ela não seja
pressionada ou que não haja esse tipo de tentativa, até mesmo de cerceamento
das opções da empresa. Mas ela tem conseguido superar essas questões,
mostrando que atua em diferentes frentes... O grande problema, e isso já
aconteceu na Embrapa, é quando a discussão sai do campo científico e passa
só para o campo ideológico. Aí a empresa morre. Mas ela já passou por essas
situações, onde houve essa discussão apenas ideológica, mas ela conseguiu
avançar. O problema é ela ficar estagnada nas discussões meramente
ideológicas e a ciência e a pesquisa acabam sendo influenciados
negativamente. Ela passou por essas situações, mas conseguiu avançar e está
se mantendo ainda extremamente produtiva para a sociedade de um modo
geral” (Sujeito 12).
Entre os que disseram não a essa pergunta, que não sentiram interferência ou influência
política na sua atividade de pesquisa, em número de sete, declaram da seguinte forma: “Não,
não senti. Eu senti tentativas de influência, mas que não foram, não chegaram ao ponto de me
colocarem contra a parede. Eu jamais fui colocado contra a parede” (Sujeito 4) e “Como todos
os demais também. Você nunca está livre disso. Agora, de política rasteira, essa política
partidária, isso não” (Sujeito 6).
Alguns entrevistados acreditam que a Embrapa nesse ponto é até privilegiada por sofrer
muito pouca influência política, como pode ser confirmado nas falas a seguir.
“A gente percebe que a Embrapa até certo ponto é um pouco protegida contra
influências políticas. Quando eu digo influência, é influência político-
partidária. Nós temos influência de política de governo. Eu acho que isso aí é
154
importante para Embrapa. É uma empresa do governo e precisa estar
vinculada e atender esses anseios de uma política maior” (Sujeito 10).
“A Embrapa dá muita liberdade e nós somos privilegiados porque tem
mudanças e mais mudanças de governo e a Embrapa sempre teve um respeito
muito grande de quem faz política nesse país” (Sujeito 5).
“A gente pode dizer que a Embrapa é uma instituição que, de uma forma
agregada, tem pouca influência, tem sofrido pouca influência política... Mas
não que isso venha afetar diretamente os projetos de pesquisa, ou andamentos
da execução dos projetos de pesquisa” (Sujeito 7).
“Olha, dizer que não há influência ou interferência política também seria
outro exagero. Porque nós não vivemos em um mundo à parte, nós vivemos
em um mundo real. Então, não deixa de haver algumas interferências. Agora,
cabe a direção da instituição, aos gestores desta instituição, separar ou tentar
separar, ou proteger, da melhor forma possível, para que a influência seja a
menor possível. Isso daí eu acho que a Embrapa tem feito com competência.
Tem havido uma compreensão por partes dos políticos e de modo geral a
interferência política não tem sido realmente algo que agente possa dizer que
tenha prejudicado as ações da Embrapa ao longo dos anos” (Sujeito 13).
Outro entrevistado sentiu interferência no atual governo, tendo relatado dessa maneira:
Eu trabalhei na Embrapa desde 1977, portanto desde a época da ditadura
militar. E de 1977 até 2002 eu nunca havia sentido nenhuma interferência
política na minha atividade na Embrapa... Tanto que colegas meus, de direita
ou de esquerda eram contemplados e integravam equipes em igualdade de
condição com outros colegas e nunca lhes foi perguntado a qual partido ou a
qual religião pertenciam. E no atual governo isso ocorreu. E, no meu ponto
de vista, foi um retrocesso muito grande, porque eu acho que uma instituição
de pesquisa, ela não pode ter como limitante um problema... ideológico ou
político. Ela tem que fazer o que é preciso fazer para o avanço da ciência e da
155
tecnologia, atendendo seu objetivo social, vamos dizer assim. Infelizmente no
último governo houve sim a partidarização da Embrapa (Sujeito 14).
Outro entrevistado acredita que há uma interferência com relação à política interna da
Empresa, quando afirma: “Há um certo tipo de cerceamento que se traduz numa classificação
informal de classes de pesquisadores” (Sujeito 17).
A importância das normas na minimização de problemas dessa natureza é assinalada por
um entrevistado:
Como qualquer instituição pública, a Embrapa sofre pressões de ordem
política que podem interferir na sua atividade de pesquisa. Todavia, isso vem
sendo minimizado pelo estabelecimento de normas internas de funcionamento,
que possam ser extensão da legislação vigente. Um exemplo: toda a
contratação de pesquisadores e do quadro de empregados em geral é por
concurso público. O mesmo acontece na escolha dos dirigentes; é um
concurso de escolha de um misto de competência científica com gerencial
(Sujeito 18).
Foi perguntado também com referência ao corpo de pesquisadores em geral, se o
entrevistado acreditava que o pesquisador da Embrapa sofre influência ou interferência
política na sua atividade de pesquisa. Os resultados se mostram semelhantes, ou seja, quem
diz que não sentiu influência ou interferência política acha que os outros também não
sofreram, com exceção de três entrevistados que, apesar de não terem sentido, acreditam que
os outros sofreram influência ou interferência política. Em geral, as opiniões coincidem com
as da questão anterior.
Dado esse resultado na pesquisa qualitativa, esse tema não se mostrou suficientemente
consubstanciado para fazer parte dos assuntos que seriam pesquisados no questionário.
Entretanto, nos comentários, surgiram preocupações com os seguintes temas: “Partidarização
política que se acentuou no Governo Lula, plágio das idéias, dificuldade de discutir ‘temas
sensíveis’, coação moral etc.” (Q. 183); “Separar ética de convicções políticas” (Q. 188) e
“Não misturar ideologia política com ética de pesquisa” (Q. 249).
156
6. OPINIÃO DOS ATORES SOBRE AS NORMAS DE ÉTICA NA
PESQUISA NA EMBRAPA
Esse capítulo discorre sobre a percepção dos pesquisadores e do grupo de formadores de
opinião com relação as normas de ética na pesquisa na Embrapa.
Aborda-se os seguintes itens: em que os pesquisadores se baseiam em relação aos
princípios éticos na execução da pesquisa; conflitos entre princípios pessoais e atividade de
pesquisa na Embrapa; interface dos sistemas de avaliação com a questão da ética; princípios
ou questões éticas na pesquisa agropecuária; cumprimento pelos pesquisadores dos princípios
éticos na pesquisa; como o grupo de formadores de opinião percebe a ética na pesquisa e as
normas de ética na pesquisa na Embrapa; normas de ética como elemento que influencia a
atividade dos pesquisadores da Embrapa; normas sobre restituição de resultados de pesquisa
ou direito de propriedade às comunidades objeto da pesquisa; e temas solidários. Este último
item aborda questões que não se referiam diretamente ao tema proposto por esse trabalho, mas
que surgiram no decorrer do mesmo.
6.1. PRINCÍPIOS ÉTICOS EM QUE OS PESQUISADORES SE BASEIAM NA
EXECUÇÃO DA PESQUISA
Questionados sobre “Com relação aos princípios éticos na execução da pesquisa, você
se baseia em:”, a grande maioria 85,16% (419 pessoas) respondeu que se baseia em seu
código de ética pessoal (princípios pessoais). Como essa questão permitia assinalar mais de
uma resposta, 55,49% (273 pessoas), responderam se basear no código de ética de sua
profissão, seguidos do Código de Ética da Embrapa, com 46,95% (231 pessoas); Código de
Ética do Servidor Público, com 16,26% (80 pessoas); e “na ética da sua religião”, com
14,84% (73 pessoas). Acreditam que no trabalho de pesquisa não há necessidade de se
considerar princípios éticos, 0,6% (três pessoas), conforme pode ser visualizado na Figura 14.
157
Outras 4,27% (21 pessoas) deram outros tipos de respostas, as mais diversas, das quais
se destaca: “Faço sempre uma reflexão sobre os resultados previsíveis da minha atitude ou da
minha pesquisa no todo social, tento sempre ser ético. Ter liberdade, mas com
responsabilidade e consciência.” (Q. 370).
419
273231
80 7321 3
050
100150200250300350400450
1
Princípios Éticos Código de ética pessoal
Código de ética daprofissão
Código de Ética daEmbrapa
Código de Ética doServidor Público
Ética da religião
Outros
Não há necessidade de seconsiderar princípios éticosno trabalho de pesquisa
Figura 14: Princípios éticos em que os pesquisadores se baseiam na execução da pesquisa, em
número de respostas
Encontram-se, a seguir, as afirmativas oferecidas no questionário, seguidas do
percentual de respostas e de maiores dados ou de análises sobre as mesmas.
Código de ética pessoal - princípios pessoais (85,16%)
A conduta das pessoas é baseada em princípios em que esta acredita e que defende. Um
código de ética pessoal se constitui em uma série de princípios e valores nos quais seu
comportamento é baseado. Suas ações são julgadas por esse código individual, conduzindo-as
ao que se considere justo e correto e a deixa “com a consciência tranqüila”. Dessa forma, em
158
tese, o comportamento individual de cada pessoa manifestaria os seus valores e princípios.
Nem sempre, porém, os atos das pessoas são resultados de grandes reflexões, pois a maioria
dos seus princípios já estão internalizados e são manifestados naturalmente em suas ações.
O código de ética pessoal é formado ao longo da vida, podendo haver mudanças em
alguns aspectos a qualquer tempo, decorrentes de novas reflexões sobre algum tema. Esse
código reflete o sistema de valores da pessoa. Como é formado o nosso sistema de valores?
Robbins (1999, p. 87) afirma que “uma porção significativa é determinada geneticamente. O
resto é atribuído a fatores como cultura nacional, imposição familiar, professores, amigos e
influências ambientais semelhantes”. Acrescenta que “Esse sistema é identificado pela
importância relativa que destinamos a esses valores como liberdade, prazer, amor-próprio,
honestidade, obediência e igualdade”.
Esse código é importante para que se possa buscar a integridade da conduta ética, visto
que no dia a dia a pessoa está exposta a fragmentações como: conduta familiar, conduta
profissional, conduta institucional, conduta religiosa e outras.
Quando uma pessoa se depara com um outro código de conduta, como por exemplo, um
código institucional ou com um sistema de valores institucional, estes são comparados com a
sua ética pessoal e se inicia um processo de adaptação ou acomodação. Caso os valores
embutidos no código ou na cultura da instituição sejam muito diferentes daqueles em que a
pessoa acredita, e caso haja muitos conflitos de valores e não seja possível a interferência do
indivíduo para mudança desses valores, pode haver uma não adaptação da pessoa ao trabalho
ou a instituição.
O alto índice de respostas a essa alternativa, 85,16%, é perfeitamente compreensível, na
medida em que até em nossas pequenas ações recorre-se a esse sistema de valores individuais.
É também desejável, uma vez que para que se viva bem, é necessário estar em paz consigo
mesmo. Entretanto, o Código de Ética Pessoal, sendo individual, não necessariamente tem
que ter firme compromisso com o bem comum (ética geral) ou com a missão da instituição
(ética institucional) ou com qualquer outra dimensão relacionada ao outro ou à instituição.
Ainda mais evocando a questão do “livre arbítrio”, que parece um atributo do ser humano,
que o deixa muito à vontade para tomar decisões no plano individual.
Na tentativa de explicar esse resultado, pode acontecer de, por falta de conhecimento do
Código de Ética da Embrapa, que é uma norma institucionalizada, os pesquisadores tenham
159
que recorrer à instância pessoal, para balizar suas ações na condução da pesquisa. Nesse caso,
torna-se necessária a intervenção da empresa nesse assunto, para oferecer ou divulgar melhor
seu sistema de valores, que certamente foi resultado de um envolvimento maior de
empregados, visando objetivos gerais, que um sistema de valores individual pode não
contemplar. Além disso, esse procedimento poderia contribuir para a redução de conflitos de
interesses entre o pessoal e o institucional, entre o público e o privado.
Código de Ética Profissional (55,49%)
Toda profissão possui um código de ética, que regula a ação dos profissionais
pertencentes àquela classe.
Yeganiantz (1987, p. 103), em um artigo sobre a ética na administração da pesquisa,
discursa sobre a ascensão da ética profissional:
Como a necessidade de coerção decresce com a maturidade da civilização, as
novas formas de organização, que substituirão as burocracias tradicionais,
terão que levar em conta a diminuição da ética de lealdade institucional e a
ascensão de ética profissional. Haverá maior envolvimento do profissional na
comunidade profissional, do que seu envolvimento na organização que o
emprega... Como resultado, o estímulo do trabalho e a convivência com as
oportunidades de construir através da pesquisa devem ser baseados não só no
método científico, mas também na ética profissional.
Caso essa previsão se configure, há a necessidade das empresas buscarem meios de
atuar não só na ética institucional como também na ética profissional, incentivando a
interação dos profissionais com sua classe.
160
Código de Ética da Embrapa (46,95%)
Nessa questão, 46,95% (231 pessoas) responderam que baseiam seus princípios éticos
na execução da pesquisa nesse código. Esse resultado é muito reconfortante para a empresa,
uma vez que esse documento foi publicado no início do ano de 2005 e que o tema não passou
por um processo de divulgação maciça e nem foram implementadas estratégias para sua
internalização e acompanhamento.
Houve também uma outra questão destinada a identificar o conhecimento ou não desse
código pelos pesquisadores. Eles foram questionados quanto ao conhecimento do Código de
Ética da Embrapa, objeto da Deliberação nº 16, de 17.12.2004, publicado no BCA nº 02/2005,
de 10.01.2005. Dos respondentes, a grande maioria, 41% (201 pessoas) respondeu
desconhecer o código. Já 38% (188 pessoas) afirmaram que o conhecem superficialmente.
Outros 8% (37 pessoas) afirmaram que conhecem somente os itens que se referem a pesquisa.
Quem declarou que conhece todo o seu conteúdo foi apenas 13% dos respondentes (66
pessoas), conforme Figura 15.
Conhecimento do Código de Ética da Embrapa
41%
38%
13%
8% Não conhece
Conhecesuperficialmente
Conhece todo oseu conteúdo
Conhece somenteos itens que sereferem a pesquisa
Figura 15: Pesquisadores que conhecem o Código de Ética da Embrapa, em percentual
161
Por meio de análises realizadas, nota-se que dos 231 pesquisadores que responderam
que se baseiam no Código de Ética da Embrapa, 41 (17,71%), afirmam não conhecê-lo na
questão posterior, que questionava sobre o conhecimento ou não do referido código. Dessa
forma, refazendo os cálculos, tem-se que 38,62%, ou 190 pesquisadores baseiam seus
princípios éticos na execução da pesquisa no Código de Ética da Embrapa.
Como explicação para esse fato, pode-se recorrer à questão da “desejabilidade social”,
que é um termo utilizado na psicologia que explica a tendência que algumas pessoas têm de,
na hora de responder a pesquisas por meio de questionários, darem a resposta que elas
acreditam ser a mais socialmente aceita. Isso pode ocorrer por várias razões, dentre elas, o
fato de a pessoa querer repassar uma imagem melhor de si mesma ou da instituição em que
trabalha. Há temas, entretanto, onde a ocorrência desse fenômeno é maior. Dentre eles, pode-
se inferir o tema da ética, uma vez que este está relacionado com valores considerados nobres
pela maioria dos seres humanos. Esse fenômeno pode ter ocorrido em outros resultados
apresentados nesta pesquisa.
Fazendo uma avaliação desses números, conclui-se que 87% dos respondentes (426
pessoas) não conhecem o Código de Ética da Embrapa em sua totalidade (41% que o
desconhecem; 38% que o conhecem superficialmente e 8% que conhecem apenas os itens
referentes a ética na pesquisa).
Na pesquisa qualitativa não se encontrou resultado muito diferente. Dos 21
entrevistados, apenas quatro pessoas declararam conhecer o Código de Ética da Embrapa,
apesar de 17 estarem trabalhando na Embrapa normalmente. Outro resultado surpreendente é
que mesmo o código sendo novidade, dos onze chefes participantes das entrevistas, apenas
dois declararam conhecê-lo, ou seja, os chefes como representantes da empresa, desconhecem
uma norma da empresa sobre ética. Especulando sobre esse resultado, tem-se tanto o fato de
não se dar ao assunto a importância devida, como também o fato das pessoas já terem a
segurança da sua ética.
Com relação aos quatro que conheciam, três emitiram opiniões, como: o código não está
internalizado ainda; é bastante genérico; é bastante geral, precisa ser mais específico com
relação à pesquisa; foi pouco divulgado e não está implementado efetivamente.
162
Um dos entrevistados sugere a necessidade de uma consolidação dos códigos a que o
pesquisador da Embrapa está sujeito, conforme declaração a seguir.
Eu acho que precisa ter alguma coisa, um código de ética estabelecido pela
Embrapa, de uma maneira mais clara, entende? Com isso, eu não quero dizer
que a Embrapa não tem que código de ética, não. Eu acho que ela tem vários
códigos de ética. Tem código de ética dos empregados, tem código de ética do
relacionamento dos empregados com a sociedade etc. Esses códigos não
estão bem feitos e não estão bem divulgados. Você é funcionário da Embrapa
você sabe que se você fizer certas coisas você vai embora. Então tem leis
gerais do país, e tem coisas específicas da Embrapa. Agora, essas coisas, no
meu modo de entender, não estão primeiro devidamente formuladas. Não
estão devidamente divulgadas e são de muitas naturezas. Eu acho que nós
precisamos de um uma coisa parecida com uma consolidação desses vários
códigos de ética da Embrapa, de modo que seja mais fácil para o pesquisador
saber o rio que ele está navegando (Sujeito 4).
Essa reivindicação é legítima e desejável, na medida em que permitiria ao pesquisador e
aos outros profissionais saber claramente o que a empresa e o país esperam dele como
servidor público. Também para a empresa seria um importante instrumento facilitador da
gestão de seus recursos humanos.
Outras opiniões surgiram também nos comentários dos questionários, considerando o
código muito vago (Q. 83); aborda apenas superficialmente a questão da ética na pesquisa (Q.
435).
Sobre esse mesmo código, há sugestões como: “Fazer ampla divulgação” (Q. 267);
“Maior divulgação entre os pesquisadores” (Q. 136); “A Embrapa deve exercitar seu próprio
código de ética” (Q. 354); “Internalizar a proposta aprovada e aperfeiçoar” (Q. 492); “O
código de ética da Embrapa, em vigor, precisa ser exercitado/implementado para depois
melhorar. Não há experiência sobre o assunto na Embrapa” (Q. 492).
Outro pesquisador lembrou uma questão interessante: “O Código da Embrapa não foi
discutido pela sociedade. Sugiro o envolvimento dos CAEs de cada unidade na construção de
códigos descentralizados, que subsidiarão um nacional participativo” (Q. 83).
163
Interessante que duas pessoas declararam não conhecer o código, mas se interessaram
por conhecê-lo após tomarem conhecimento desta pesquisa, conforme as declarações:
“Desconhecia o BCA 02/2005. Faltou divulgação do documento e/ou atenção da minha parte
quando ocorreu a divulgação. Contudo, após leitura deste questionário, procurei rapidamente
a Deliberação 16/2004 no site da Embrapa...” (Q. 108) e “Gostaria apenas de informar que
vou buscar o BCA 02/05 para me inteirar do conteúdo do Código de Ética da Embrapa. Sei da
sua existência, admito sua importância, mas ainda não dediquei o tempo devido ao assunto”
(Q. 489).
Código de Ética do Servidor Público (16,26%)
Afirmam basear seus princípios éticos na execução da pesquisa no “Código de Ética
Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal” 16,26% dos respondentes
(80 pessoas). Esse código foi aprovado pelo Decreto 1.171, de 22.06.94 e é destinado ao
Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal. Dessa forma, estende-se aos empregados
da Embrapa, uma vez que essa é uma empresa pública.
Esse código é dividido em dois capítulos, sendo o primeiro constituído de: a) das regras
deontológicas; b) dos principais deveres do servidor público; e c) das vedações ao servidor
público. A parte que trata das regras deontológicas, no Capítulo I, Seção 1, §II, estabelece
que:
O servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de sua
conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e
o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas
principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante as regras contidas no
art. 37, caput e § 4º, da Constituição Federal.
O referido código faz uma distinção entre conduta ética, que se refere a honestidade e
conduta legal, justa, conveniente e oportuna. O § III, desse mesmo capítulo, estabelece que:
164
A moralidade da Administração Pública não se limita à distinção entre o bem
e o mal, devendo ser acrescida da idéia de que o fim é sempre o bem comum.
O equilíbrio entre a legalidade e a finalidade, na conduta do servidor público,
é que poderá consolidar a moralidade do ato administrativo.
O segundo capítulo trata das comissões de ética, enfocando sua criação e
funcionamento.
Analisando o Código de Ética do Servidor Público, observa-se que ele é constituído de
orientações gerais com relação à conduta do servidor público e não se refere diretamente à
atividade de pesquisa e apesar disso, conta-se com tantos pesquisadores que o conhecem e se
baseiam nele.
Outro aspecto a se surpreender positivamente é que na Embrapa não se tem registro da
distribuição desse documento para os empregados ou para as unidades. Apesar disso, esses 80
pesquisadores afirmam conhecê-lo e segui-lo no exercício de seu trabalho de pesquisa.
Esse resultado lembra novamente a questão da “desejabilidade social”, já explanado no
item anterior (Código de Ética da Embrapa).
Ética da Religião (14,84%)
Quando se fala em ética da religião, 14,84% (73 pessoas) afirmam que se baseiam nessa
ética. Esse resultado parece reconfortante, à luz da opinião de Mondin (1980, p. 79), que
afirma:
A religião, com efeito, é um fenômeno real, típico do homem, porém é
também um fenômeno muito problemático e – ousarei dizer – o mais
problemático de todos. Isso por um motivo bastante claro: enquanto todas as
outras atividades humanas (embora sejam problemáticas) referem-se a objetos
cuja existência está fora de discussão, a atividade religiosa, ao contrário,
dirige-se a um objeto do qual até sua existência é colocada em questão.
165
Entretanto, esse resultado é inferior, em termos percentuais, às respostas a questões
similares da pesquisa qualitativa (entrevistas com o grupo de formadores de opinião). Estes,
quando perguntados sobre “Sua vinculação religiosa influencia a sua atividade de pesquisa?”,
12 entrevistados responderam que não, sendo destes, três responderam que não tinham
religião e três declararam não ter forte vinculação religiosa. Outros seis responderam que sim,
que a sua vinculação religiosa inflencia a sua atividade de pesquisa. Uma pessoa respondeu
que não sabe porque nunca ficou exposto a uma situação limite.
Havia outra pergunta na entrevista que questionava sobre o mesmo assunto, referindo-se
ao que o pesquisador pensava sobre seus pares. A questão era “Você acha que diferentes
vinculações religiosas influenciam a atividade de pesquisa do pesquisador da Embrapa?”.
O resultado desse questionamento foi que oito pesquisadores responderam que não;
quatro acham que pode sim influenciar, seis acham que influencia, um acha que não deveria
influenciar e um respondeu que não sabe. Interessante que nessa questão não necessariamente
se encontra correlação entre o que o pesquisador responde sobre si e o que ele responde sobre
seus pares. Dos respondentes, apenas a metade deu respostas semelhantes a essas duas
perguntas, sobre o que ele pensa e sobre o que ele pensa dos outros.
Dessa forma, obtêm-se um resultado diferente daquele obtido no questionário. Nas
entrevistas, a questão da religião teve um peso bem mais alto.
Quanto aos que disseram não, que a vinculação religiosa não influencia a atividade de
pesquisa, alguns justificaram o fato de o Brasil não ter fanatismos religiosos como se vê em
outros países e que na Embrapa também não há radicalismos religiosos, ou que o tipo de
pesquisa que a empresa realiza não vai de encontro a padrões religiosos, ou ainda que “Com
planta você não tem tanto problema, mas com o ser humano isso fica muito mais forte”
(Sujeito 11).
Há uma pessoa que acredita que hoje não influencia, mas prevê um conflito religioso no
futuro:
É possível que na mudança que nós estamos vivendo de hoje para frente,
possamos vir a ter algum conflito religioso, na medida em que certamente
166
avançaremos nessas áreas que têm um conflito religioso mais complexo, que é
o desenvolvimento de conhecimentos de biologia molecular, de genética mais
avançada, de biotécnicas. Quando nós entramos nesse campo de biologia
avançada, nós certamente começamos a até certo ponto ter um conflito com
dogmas e com conceitos de religião. É possível que passe a ter algo daqui
para frente” (Sujeito 10).
Dos que acreditam que a vinculação religiosa influencia a atividade de pesquisa, alguns
justificam o fato de o homem ser um todo, não sendo possível separá-lo em partes, conforme
declaração a seguir.
Eu acho que influencia... Não existe isso, a hipótese de você pegar e separar o
gerente daquele que tem convicções religiosas, o trabalho de casa do trabalho
daqui, a relação de casa da relação do trabalho. Essas coisas formam um
todo, então a minha vinculação influencia sim, com toda certeza (Sujeito 2).
Outro pesquisador discursa sobre o tipo de influência que a sua religião exerce e
exerceu na sua vida:
Minha vinculação religiosa influencia a minha vida toda... Agora não
influencia a escolha do projeto de pesquisa. Influencia o tipo de trabalho que
eu escolho... As religiões ao contrário do que se imaginam, elas raramente
dizem que você não deva fazer uma coisa. Elas são muito flexíveis em relação
às coisas que a gente deve fazer aqui no mundo... A religião católica, por
exemplo, ela diz que eu tenho que amar os outros, agora como amar os outros
é uma escolha minha, eu tenho que saber fazer essa escolha. Então ela tem
uma influência muito grande porque afinal de contas eu vivo a minha religião
e as coisas que eu procuro falar e fazer e as atitudes que eu tomo em relação
a outras pessoas são muito influenciadas pelo tipo de espiritualismo que eu
estou ligado. Portanto, isso tem uma influência grande... porque eu decidi
trabalhar na extensão rural, porque eu decidi trabalhar aqui na Embrapa,
nessas coisas todas, a minha religião pesou. Agora o que eu faço aqui dentro
da Embrapa e o que eu fiz dentro da extensão rural, a religião apenas foi um
167
guia de caráter geral, não foi um guia específico. Quando as coisas
específicas surgiram, eu tive que decidir por mim mesmo e cada religião diz
uma coisa, eu não devo tomar decisão para prejudicar os outros (Sujeito 4).
Outro acredita que não há incompatibilidade em ser cientista e ter princípios religiosos,
conforme argumenta:
Para mim não há incompatibilidade entre você ser um cidadão com princípios
religiosos e ser um ótimo cientista. A questão de Deus dentro dessa discussão,
independe da religião. Eu nunca achei impeditivo, muito pelo contrário. Eu
acho que a medida que a ciência avança provavelmente ela, mais claramente,
traz ao homem a presença de Deus (Sujeito 13).
Ainda dos pesquisadores que acreditam que a religião influencia a atividade de
pesquisa, há um que cita a quebra de paradigmas (o que lembra Kuhn e sua teoria) e discursa
sobre como seria hoje a humanidade caso tivesse ficado parada em dogmas da religião de
outros tempos. Argumenta sobre a necessidade de se colocar as questões religiosas de um
ponto de vista atemporal, para evitar equívocos. Continua seu raciocínio:
O ser humano não é impermeável às suas influências religiosas... Cabe a
cada um, e aí tem o livre arbítrio, decidir, no momento em que ele está
trabalhando na pesquisa, quais são os limites que ele tem que respeitar. O
fato de você ter que respeitar limites não quer dizer que você seja impedido de
fazer coisas, por que senão não há avanços na ciência... Se ela ficar restrita
a um conjunto de valores, ela não quebra paradigmas. A quebra dos
paradigmas se dá quando os valores estão em ebulição, em conflito, se
tornando insustentáveis. Aí se estabelece um novo paradigma. Esse é um
momento de crise, de sofrimento, pessoal até para os pesquisadores. Ás vezes,
as pessoas pensam que eles são de euforia, não, às vezes é um momento de
crise pessoal, porque algumas das coisas que ele acreditava, naquele
momento, ele tem que romper e passar a acreditar em coisas novas, referentes
a novas evidências. E a religião ela não é impeditiva disso. A religião é do
ponto de vista dos conceitos e não só dos dogmas religiosos. Dos conceitos
168
novos que as religiões também têm que experimentar. Se ficássemos nos
dogmas da religião passada, a gente não teria descoberto o mundo. O mundo
não girava, depois era uma mesa plana. Então, essas questões religiosas têm
que ser colocadas de um ponto de vista atemporal... Se a gente for analisar a
historia da religião a gente pode ver que ela foi equivocada e continua
equivocada em muitas coisas. Esse é o ponto que acho extremamente
importante do pesquisador, quando ele está diante de evidências e que ele tem
que confrontar os seus valores morais, religiosos, e esse é um momento
dolorido. Porque ele está em choque profundo com suas crenças, com seus
valores e que tem evidências científicas que mostram o contrário. Se ele parar
ele não avançou, ele não rompeu, e aí ele deixou de contribuir socialmente. E
aí ele deixou de ser ético. A ética estaria indo oferecer aquela oportunidade
de novo conhecimento para ser discutido pela sociedade, incluindo nesse
momento, a própria crítica a ele. Porque se as evidências que ele tem
mostram que aqueles valores são equivocados naquele momento, que devem
ser ultrapassados, ele tem o dever, como cientista, de disponibilizar esse
conhecimento e ser objeto da crítica. Pode ser que aquele conhecimento não
seja totalmente correto, mas é assim que se processa a evolução. Esse é um
tema até pouco explorado. Deveria ser mais explorado (Sujeito 12).
Já outro entrevistado externou preocupação quanto à religião impondo restrições para o
avanço da ciência (Sujeito 14).
Outra pessoa acha que não deveria influenciar, entretanto acredita que a motivação do
pesquisador pode ser de ordem pessoal, inclusive religiosa. Argumenta:
A vinculação religiosa, eu acho que essa é uma decisão de foro íntimo e que
não deveria influenciar. Agora a gente sabe bem que muita gente... Então
essa é a motivação da ciência e do pesquisador, da pesquisa, que pode estar
motivada por uma razão pessoal, vamos dizer religiosa inclusive, da
curiosidade, ou porque ele acredita na teoria evolucionista. Então ele quer
realmente mostrar e provar que há evolução no processo e que isso é que é
preponderante, ou quem é criacionista, vai imaginar que tem um criador e
que em algum momento começou com esse criador e quer mostrar e provar
isso fazendo ciência. Há várias motivações... Eu respeito os valores
169
individuais, as crenças, mas em ciência, em princípio, você não deve ter
crenças, não deve ter conceitos pré, seria pré-conceito, ou juízo anterior que
seria pré-juizo. Toda vez que eu tenho já um juízo ou que eu tenho um
conceito eu não estou fazendo uma boa ciência, porque, em principio, eu já
tenho uma resposta para aquilo... O cientista, o método científico, a mente
aberta, as condições abertas... para encontrar resultados que eu mesmo não
sabia, que era desconhecido. É a busca do desconhecido, de dar respostas a
coisas não respondidas ainda. Se eu já tiver uma resposta, que muitas vezes a
religião faz com quê ou mesmo a ideologia, a gente está fazendo pouca
ciência. É estar aberto para o novo, para coisa que a gente não pode nem
imaginar e que elas vão acontecer, ou podem acontecer. Então, se eu já tiver
uma resposta eu não estou fazendo muita pesquisa (Sujeito 15).
Outro pesquisador afirma que as convicções científicas é que mexeram nos seus
fundamentos religiosos (Sujeito 6).
Enfim, com o resultado da pesquisa quantitativa e com essas afirmações referentes a
pesquisa qualitativa, nota-se que essa questão merece ser explorada em outros fóruns, para
melhor compreensão do assunto.
6.2. CONFLITOS ENTRE PRINCÍPIOS PESSOAIS E ATIVIDADE DE PESQUISA
NA EMBRAPA
Foi feita a seguinte pergunta no questionário: “Você já vivenciou conflitos entre seus
princípios pessoais e sua atividade de pesquisa na Embrapa?” A maioria, ou seja, 52% (257
pessoas) responderam que não; 38% (185 pessoas) responderam que sim e 10% (50 pessoas)
responderam não se lembrar, conforme Figura 16.
170
Conflitos
38%
52%
10%
Sim
Não
Não me lembro
Figura 16: Conflitos entre princípios pessoais e atividade de pesquisa na Embrapa, em
percentual
Na pesquisa qualitativa, quando questionados sobre “Você já vivenciou conflitos entre
seus princípios pessoais e sua atividade de pesquisa na Embrapa?”, a grande maioria, 14
entrevistados, não vivenciou esses conflitos. Alguns se justificaram, atribuindo esse fato às
seguintes causas: “A atividade de pesquisa na Embrapa é muito aberta”; “A Embrapa dá
liberdade de ação para os pesquisadores”; “Só os radicais têm conflitos”. Essa “liberdade”
está bem explicada na seguinte declaração:
A Embrapa sempre permitiu que os conflitos pessoais, que são de crenças,
valores, dos indivíduos quando no exercício de sua atividade, que a gente
pudesse questionar esses princípios frente às determinações da empresa.
Então, se aconteceu conflito... esses conflitos sempre foram produtivos,
porque o avanço do conhecimento gera conflitos pessoais. Aquelas crenças
que a gente tem quando a gente é adolescente e que são muito influenciadas
pela cultura vigente, à medida que a gente vai tomando conhecimento dos
avanços sociais, dos avanços econômicos, dos avanços científicos, dos
171
avanços tecnológicos, elas começam a ser revistos. Então não
necessariamente o conflito é negativo. Na maioria das vezes é positivo,
porque permite você rever seus conceitos, rever seus valores e adotar novos
valores... Então se houve conflito... sempre tiveram resultado positivo, nunca
negativo, nunca no sentido de eu ter sido ou restringido na minha atividade
ou inibido por acreditar em certas coisas que a Embrapa em determinado
momento não acreditava. Ao contrario, em todos os momentos da minha
carreira profissional, quando tinha algum conhecimento ou conceito novo, e
que eu propus à empresa, estes conhecimentos e conceitos novos, embora às
vezes conflitantes com a cultura da empresa, foram aceitos e gradativamente
foram até absorvidos. Do mesmo modo aconteceu comigo: quando eu tinha
alguns conceitos arraigados, e nas discussões dentro da empresa, esses
conceitos foram modificados. Porque aquele conceito que existia dentro da
Embrapa, ou ele era mais adequado que o meu, quando nos momentos que eu
modifiquei os meus conceitos, ou ele era menos adequado do que os meus no
momento que eu propus conceitos e a comunidade aceitou. Acho que isso é
parte da dinâmica, que acho muito salutar, da própria Embrapa (Sujeito 12).
Alguns atribuíram também ao tipo de trabalho “genética animal, melhoramento de
plantas” que desenvolvem que não dá margem a conflitos dessa natureza.
Dos sete que declararam ter passado por conflitos, dois citaram a atividade de
gerenciamento, que, segundo eles, pode trazer ou não conseqüências para a atividade fim da
empresa, que é a atividade de pesquisa.
Um entrevistado citou um conflito pessoal, onde foi obrigado a trabalhar num programa
que discordava politicamente e eticamente. Nesse caso, o pesquisador, após considerar até
pedir demissão, resolveu trabalhar efetivamente no programa, por entender seu papel como
sendo uma missão no sentido de mitigar os efeitos negativos do programa (Sujeito 3).
Outro pesquisador acredita que a atividade de pesquisa é muito polêmica, envolvendo
vários aspectos e às vezes resolvendo problemas e criando outros para a sociedade, conforme
explica:
172
Se tem coisa polêmica é atividade de pesquisa... Porque você tem que olhar a
questão do meio ambiente, como estou agredindo? Questão da equidade
social, a quem está servindo isso? A questão da competitividade econômica, a
questão da sanidade, se isso faz bem para as pessoas. Agora qual a
tecnologia que consegue, ao mesmo tempo, ter o devido equilíbrio para
atender a todas essas características? É muito difícil. Às vezes é uma
excelente tecnologia que aumenta a competitividade das empresas, mas vai
criar um problema ambiental de tal ordem que vai criar uma externalidade e
o Estado é quem vai acabar pagando por isso... Então, essas são questões que
vão avançando ao longo da historia dos homens. A gente enxerga isso.
Quando se iniciou as máquinas a vapor e as primeiras máquinas a entrar na
agricultura que retiravam as cascas dos cereais, do trigo, do arroz etc.,
centenas de milhares de pessoas que trabalhavam foram dispensadas, houve
movimentos até de quebra dessas máquinas. Naquela época, essas máquinas
tinham a união com o diabo, não é verdade? Então, era ético destruir
centenas de lares? Se assim não fosse, nós estaríamos até hoje lá (Sujeito 8).
Três pesquisadores, sendo dois por meio da entrevista e um por meio do questionário,
destacam a importância da normatização na redução dos conflitos:
“Se você implantar uma política com princípios claros e você estabelecer
normas que possam implantar ou operacionalizar essa política ... você então
cria mecanismos exatamente para eximir, para não haver conflitos, porque as
relações passam a ser institucionais e não interpessoais... Você vai sempre
manter um diálogo institucional e nunca pessoal... Por isso que é importante
ter normas. (Sujeito 14)”
“O fato da Embrapa possuir normas rígidas (e detalhadas) que não permitem
desvios facilita de forma decisiva a minimização desses conflitos na medida
em que muitos dos limites já estão previamente estabelecidos” (Sujeito 18).
“Ciência e pesquisa devem ser feitas sempre com ética. Mas, em casos como
pesquisas com transgênicos e células tronco, em que não há ainda legislação
definida, fica difícil apontar o que é ou não antiético” (Q. 5).
173
Observa-se que o número de pessoas que enfrentam ou enfrentaram conflitos é
relevante, tanto na pesquisa quantitativa como na qualitativa. Observa-se ainda que quanto
mais definições e conhecimento há na empresa dos seus valores e procedimentos éticos,
menor a possibilidade de conflitos.
6.3. INTERFACE DOS SISTEMAS DE AVALIAÇÃO COM A QUESTÃO DA ÉTICA
Essa questão foi abordada na entrevista com o grupo de formadores de opinião, com a
seguinte pergunta: “Em que medida os sistemas de avaliação da Embrapa têm interface com a
questão da ética"?
A Embrapa conta com sistemas de avaliação em diversos níveis: institucional (Sistema
de Avaliação de Unidades, SAU), de projetos e de pessoas (Sistema de Acompanhamento e
Avaliação dos Resultados Individuais, SAAD).
Quanto se fala em avaliação, cada entrevistado entendeu de uma forma essa questão, de
forma que não se pode computá-la em número de respostas. Uns acham que sim, outros
acham que não, sendo que cada um viu a questão de um ângulo próprio.
Sobre esse tema, apresentam-se algumas declarações que se destacaram por algum
motivo. Alguns focaram a pergunta na forma de operacionalização dos sistemas. Assim
responderam que estes sistemas são operacionalizados por pessoas e dessa forma têm
interface com a ética, uma vez que ao se avaliar uma pessoa implicitamente está se avaliando
seu comportamento ou que essa avaliação embute a ética ou a falta desta, no proceder do
avaliador.
Dois entrevistados reconhecem que os sistemas de avaliação não avaliam o componente
ético, a não ser a parte subjetiva do SAAD, conforme declaram:
“É um tema novo e nós não temos ainda normatizado e conseqüentemente
isso não é avaliado dentro da empresa. A não ser, quando você, aí foge um
pouco da ética na parte de pesquisa em si, mas na parte comportamental.
174
Nosso sistema de avaliação de desempenho de pessoas, o SAAD, quando você
faz uma avaliação subjetiva... onde o chefe imediato vai avaliar o seu
funcionário... ele leva em consideração o comportamento, a ética da pessoa.
Mas isso é uma coisa também intuitiva, de cada um, sem estar isso explícito
no sistema de avaliação” (Sujeito 5).
“O sistema de avaliação da Embrapa é um sistema muito eficiente... do ponto
de vista técnico em si. Do ponto de vista de questões relacionadas a ética nós
trabalhamos muito pouco... Existe uma parte subjetiva muito pequena que
seria aquela questão da análise dos seus superiores, dos seus chefes. Aí
poderia haver realmente uma questão mais relacionada a ética e a moral,
mas de modo geral, em nosso sistema, realmente não leva em consideração
muito este quesito... seja o SAAD, seja o SAU” (Sujeito 13).
A grande maioria reclama da questão desses sistemas, na sua operacionalização, gerar
uma competição maléfica entre unidades e entre pesquisadores, na medida em que estes são
utilizados para premiação, promoção e para destinação de recursos para unidades e projetos.
“Sinceramente, eu acho que o sistema de avaliação da Embrapa precisa ser
mais revisto... O sistema põe a gente para competir por besteiras e não está
trazendo melhoria para empresa. Só não vê quem não quer” (Sujeito 11).
“Os sistemas de avaliação traduziram da melhor forma possível o que os
preceitos da sociedade moderna atual (e com base no neoliberalismo
econômico) colocam para os indivíduos: uma competitividade sem
cooperação. Precisamos estimular o contrário, mais cooperação, como forma
de resolução de conflitos” (Sujeito 17).
Há pessoas que consideram os sistemas de avaliação da empresa adequados, como se
pode comprovar na declaração a seguir.
175
“A avaliação dos projetos de pesquisa é bem focada. Você também tem
avaliação de desempenho dos empregados... onde são aferidas várias coisas.
Além do desempenho profissional é aferido também o grau que o seu
relacionamento na empresa com seus companheiros de trabalho se verifica.
Tem varias instâncias de avaliação em que permite a empresa externar para
cada um de seus funcionários as grandes linhas, os seus princípios éticos.
Tem valores na empresa, que podem traduzir como princípios éticos da
empresa, são valores que são expressos nos processos de avaliação, tanto dos
projetos de pesquisa, quanto no desempenho individual do pesquisador ou do
empregado da empresa” (Sujeito 12).
A declaração a seguir, lembra a função pública da empresa:
Tudo que tem respeito a gente, tem interface com a questão ética. Você está...
julgando pessoas. Pode prejudicar, pode estimular e pode derrotar uma
pessoa, um determinado pesquisador. Portanto, tem muito a ver com a
questão ética. Por isso, que tem que ter um sistema justo, e tem que ter um
sistema o mais impessoal possível, para poder atender a princípios éticos da
impessoalidade, da justiça, que são coisas fundamentais na ética... As pessoas
dizem que avaliação de desempenho é duro, de fato é... mas... desperdiçar
recursos públicos também é um pecado grave. Então você tem que pesar uma
coisa contra a outra. Você pode estar prejudicando um pesquisador, mas o
que você está procurando é tornar essa empresa mais eficiente, portanto,
economizar recursos públicos e deixar sobrar mais dinheiro para outras
atividades que também são importantes (Sujeito 4).
Um provoca, levantando a questão da quantidade x qualidade e questionando o foco da
avaliação:
Taí algo importante... que merece ser profundamente discutido: avaliação e
ética. O que eu avalio: eficiência, eficácia ou efetividade? Eu avalio o quê? O
paper? Eu avalio o lançamento de uma variedade e dou o crédito. Mas e se
essa variedade não prestar, de que valeu o crédito que eu tenho? E se essa
variedade a despeito de prestar não for adotada pelo conjunto? De que
176
adiantou aquele esforço? Portanto, a avaliação da Embrapa teria que ter
muita ligação com estas questões que eu coloquei. De que vale o paper? Ele é
importante para o avanço da ciência para dar conhecimentos a todos. Mas
não deveria valer mais do que a tecnologia efetivamente adotada pelo
agronegócio ou pela agricultura familiar, ou qualquer setor que seja o alvo
ou cliente da Embrapa... Então, além da avaliação da Embrapa, sob o ponto
de vista da questão ética, precisaria haver uma avaliação dos pesquisadores,
pelas direções da Embrapa, o quanto eles estão... comprometidos, com foco
no cliente, com rapidez na elaboração de respostas, com a transparência
administrativa (Sujeito 8).
Na declaração seguinte, um entrevistado tenta estabelecer uma ligação entre avaliação e
atitude ética:
O sistema de avaliação da Embrapa, ele acaba tendo muitos defeitos. Ele é
um sistema que tem que ser aperfeiçoado... O sistema de avaliação pode
gerar uma frustração no pesquisador, que isso vá colocar em cheque a ética...
Às vezes, a pessoa frustrada acaba tendo atitudes que teoricamente não
seriam as mais éticas... Quer dizer ela está com uma frustração com a
empresa... Então isso pode acabar de certa forma influenciando sim nas
decisões éticas de cada pesquisador (Sujeito 9)...
Outro entrevistado faz uma avaliação mais ampla dos sistemas de avaliação:
O principal foco em que se dá a avaliação de convergência em relação aos
valores e costumes recomendados pela Embrapa se da na avaliação do
projeto de pesquisa, o principal instrumento, meio que leva aos fins da
Empresa: os resultados que irá oferecer à sociedade brasileira. E nesse
contexto, a Embrapa está introduzindo na avaliação questões relacionadas
aos princípios da ética, da bioética, de responsabilidade social em relação ao
meio ambiente, conforme já fizeram algumas instituições de fomento à
pesquisa (Sujeito 18).
177
Notou-se que, em geral, as respostas a essa questão se encheram de passionalidade não
observada em nenhuma outra, mostrando que pode se observar aí uma fragilidade que poderia
ser melhor analisada.
Nos questionários, essa questão não foi investigada. Apesar disso, nos comentários das
questões surgiram reclamações com referência aos sistemas de avaliação da empresa. As
declarações giram em torno da questão da competitividade entre unidades e pesquisadores.
Também levantam a questão dos pesquisadores, na ânsia de serem bem avaliados ou de terem
suas unidades bem avaliadas, lançarem mão de artifícios que estariam no limiar da ética ou
que se configuram mesmo como atitudes antiéticas, como as citadas a seguir.
“Considero importante discutir dentro da empresa como os sistemas
de avaliação vigentes (SAAD, PAT, SAU) tem induzido indivíduos e
unidades a comportamentos não éticos” (Q. 93).
“Ética tem conceitos muito individuais. Certamente há muita coisa por
aí que eu acho eticamente incorreto, mas que a própria empresa
estimula com o sistema competitivo entre pesquisadores e Unidades”
(Q. 111).
“Necessitamos de voltar a olhar o colega pesquisador como um
parceiro, amigo, companheiro e não como um competidor capaz de
usurpar suas idéias e/ou dados para se promover” (Q. 131).
“Acredito que as exigências burocráticas quanto à comprovação de
atividades estão forçando à quebra da barreira da ética. Hoje, a
preocupação maior é produzir ‘papel’ e não atender às demandas da
sociedade” (Q. 171).
178
“O SAAD fomenta o tipo de comportamento competitivo negativo
onde alguns pesquisadores deixam de colocar co-autorias de trabalhos
laboratoriais da pesquisa” (Q. 191)...
“Acredito que o panorama da ‘ética na pesquisa da Embrapa’ mudou
drasticamente nos últimos anos, principalmente como efeito colateral
do sistema de avaliação individual e de unidades (SAAD e SAU)” (Q.
262).
“No sistema de avaliação da Embrapa, que premia a produção (quanti
e qualitativa) não é incomum casos de autoria de trabalhos técnico-
científicos onde, por falta de ética, alguns colegas são listados como
autores, mesmo não tendo ou com pífia participação” (Q. 322).
“O SAAD está levando o mesmo trabalho a ser publicado várias vezes
ou um trabalho ser desdobrado em três ou mais trabalhos para fazer
currículo. Os Editais na Embrapa estão levando a elaboração de
projetos fora da área do pesquisador na busca por recursos” (Q. 326).
“Os sistemas de avaliação da Embrapa incentivam a competição, e,
muitas vezes, levam a atitudes antiéticas durante relacionamentos
internos” (Q. 414).
“O que nós temos presenciado, hoje, com o advento do SAU e do
SAAD, uma verdadeira guerra entre Unidades e entre pesquisadores,
aonde vale tudo, inclusive os meios antiéticos para conseguirem seus
objetivos” (Q. 418).
“O SAAD provoca disputa entre as equipes sendo um instrumento
para evidenciar atitudes antiéticas” (Q. 467).
179
Essa cultura de concorrência e de competição observada na Embrapa se repete em um
contexto mais amplo, que é a sociedade. Entretanto, confirmando o que já foi dito, há a
necessidade da Embrapa realizar levantamentos que possam esclarecer melhor essa questão
ou de se fazer auditorias no SAU e no SAAD para verificar onde estão ocorrendo os
problemas para que possam ser tomadas as providências devidas.
6.4. PRINCÍPIOS OU QUESTÕES ÉTICAS NA PESQUISA AGROPECUÁRIA
Durante a realização desse trabalho houve várias instâncias onde se pode colher
sugestões de princípios ou questões éticas que poderiam ser analisadas, visando sua utilização
na pesquisa agropecuária. Essas instâncias foram: as entrevistas iniciais, as entrevistas semi-
estruturadas e os comentários apostos nos questionários.
A seguir, apresenta-se uma série de questões que poderão servir de base para um
trabalho de discussão entre os pesquisadores visando sua utilização ou não. No Quadro 6,
encontram-se os temas, juntamente com a descrição (caso necessário para o entendimento) e a
instância (meio) onde foram citados, seguidos da identificação dos sujeitos, quando for o
caso. Também, na última coluna encontra-se o número do inciso do Capítulo IV (Ética na
Pesquisa) do Código de Ética da Embrapa, com o qual o tema tem relação, quando for o caso,
ainda que essa relação seja indireta.
180
Quadro 6: Questões de ética na pesquisa apresentadas pelos pesquisadores da Embrapa
TEMA DESCRIÇÃO/COMENTÁRIOS MEIO INC.
Manipulação de dados Produção de resultados que não existem EP III
Divulgação
precipitada de
informações
EP IV
Roubo de idéias e de
materiais
- Roubo de idéias e materiais
- Pirataria de idéias
EP e
Q. 301
III
Apropriação de
informações
Uso/apropriação das informações das pesquisas,
sem o devido crédito/reconhecimento do
verdadeiro obtentor/gerador da informação
Q. 16
Q. 179
III
Parcerias Oportunidades iguais para as empresas EP III
Competição Competição a serviço da falta de ética entre
unidades e dentro das unidades, entre
pesquisadores
EP
Q. 30
III
Utilização de posição
hierárquica
- Utilizar de uma posição para exigir autoria ou co-
autoria de trabalho
- Tirar vantagem de um contexto
EP III
Busca de notoriedade - Trabalhar estrategicamente visando o resultado
geral mais para ganhar prestígio para si ou para a
unidade
- Fazer o planejamento pensando nos resultados
individuais
EP III
Responsabilidade pela
função pública
Usar o dinheiro público com responsabilidade EP
Responsabilidade do
pesquisador
O pesquisador também deve ser responsável pelo
uso que é dado ao seu trabalho, ou seja, pela
finalidade da pesquisa
Q. 229 VI
181
Quadro 6: Questões de ética na pesquisa apresentadas pelos pesquisadores da Embrapa
(Continuação)
TEMA DESCRIÇÃO/COMENTÁRIOS MEIO INC.
Adoção de diários de
pesquisa
- Adoção de cadernetas de campo para anotação
pelo responsável técnico dos avanços e resultados
da pesquisa
- Adoção de livros de laboratório, para diariamente
serem anotados os avanços de cada experimento
ou projeto de pesquisa
- Esses procedimentos são utilizados em outros
países e resguardam o pesquisador e a empresa
administrativamente e judicialmente
S. 14
Avaliação do impacto
estratégico
Realizar avaliações de cada projeto da empresa,
envolvendo os aspectos políticos, econômicos,
sociais e jurídicos
EP
Autoria e Co-autoria - Colocar o nome de pessoas em trabalhos que eles
não atuaram efetivamente
- Pessoas figurando como autoras sem terem sido
EP e
Q. 322
V
Publicações - Fazer publicações desnecessárias para ganhar
“pontos”, visando benefícios pessoais (promoção
etc.)
- Duas ou mais publicações iguais. Dividir assuntos
mínimos num artigo para computar mais trabalhos
- Desdobramento de trabalhos, com diferenças
mínimas entre pesquisas para aumentar o número
de publicações
EP
Q. 64
Q. 326
V
182
Quadro 6: Questões de ética na pesquisa apresentadas pelos pesquisadores da Embrapa
(Continuação)
TEMA DESCRIÇÃO/COMENTÁRIOS MEIO INC.
Conflitos de interesse - É necessário definir a atuação de empregados
em empresas privadas, em consultorias e em
atividades docentes
- A Embrapa como empresa pública de direito
privado precisa tomar muito cuidado para
não se converter em mão-de-obra pública a
serviço exclusivo de multinacionais. O
exemplo da soja transgênica desenvolvida
pela Embrapa patrocinada pela Monsanto...
Q. 72
Q. 370
Avaliação de
questões ambientais,
sociais e outras
- A pesquisa deve ser desenvolvimento
observando esses aspectos
- Há demanda crescente pela produção e
rastreamento de produtos oriundos de sistemas
que respeitem esses fatores
Q. 113 VI
Descarte de resíduos
de laboratório
Q. 237
Meritocracia Buscar a meritocracia como princípio na Embrapa Q. 349
Biopirataria Quando as propostas de pesquisa saem da
Embrapa para serem analisadas por consultores
externos nos tornam a empresa e os pesquisadores
vulneráveis a biopirataria. Como o sistema
Embrapa (MPs) é muito lento corre-se o risco de
perder o ineditismo
Q. 434
Tratamento
dispensado aos
animais
Castração e outras formas de violência a sua
integridade física, condições de fome e
subalimentação, exposição aos medicamentos etc.
S. 18 VI
183
Quadro 6: Questões de ética na pesquisa apresentadas pelos pesquisadores da Embrapa
(Continuação)
TEMA DESCRIÇÃO/COMENTÁRIOS MEIO INC.
Relação entre os
pesquisadores
A ética também deve ser levada em conta na
relação entre os pesquisadores, assim como na
atividade de pesquisa
Q. 246 Ética
Geral
Relação entre
pesquisadores e
outros empregados
Há necessidade de discussão sobre a ética nas
relações entre pesquisadores e entre os
funcionários de modo geral
Q. 248 Ética
Geral
Assédio Moral Apesar desse item não fazer parte diretamente da
ética na pesquisa, surgiu como uma questão que
deve ser discutida
Q. 110 Ética
Geral
Legenda:
EP – Entrevistas Preliminares
INC. – Inciso do Capítulo IV (Ética na Pesquisa) do Código de Ética da Embrapa
Embora alguns desses temas encontrem correspondência direta ou indireta no Código de
Ética da Embrapa, a maioria das preocupações externadas pelos pesquisadores não está em
nível de especificação citadas no código. Isso ocorre porque sobre essa questão da ética, para
regulação da conduta ética, notam-se, no mínimo, duas instâncias, que são: a) os princípios;
b) as matérias reguladas36. Os princípios corresponderiam às intenções maiores, às premissas
básicas. Já a matéria regulada compreenderia o detalhamento das questões éticas.
Para se chegar a um documento como esse, é necessário o envolvimento de todos os
atores, em amplas discussões, visando chegar a definições nesse nível.
36 As expressões “regulação da conduta” e “matéria regulada” são utilizadas no Código de Conduta da Alta Administração (2005), constante nas referências bibliográficas. Este documento, além de reunir em um único documento as normas sobre essa matéria, ainda oferece um quadro intitulado “regulação da conduta”, que cita situações específicas, em nível alto de especificação acompanhadas da informação sobre as normas que a regulam.
184
6.5. CUMPRIMENTO PELOS PESQUISADORES DOS PRINCÍPIOS ÉTICOS DA
PESQUISA
Perguntados se “Os pesquisadores da Embrapa, no exercício de suas atividades, estão
cumprindo os princípios éticos da pesquisa”, 38% (188 pessoas) responderam que “quase
sempre”. Responderam não saber 34% (166 pessoas). Já 17% (84 pessoas) responderam
positivamente.
Responderam negativamente 5% (23 pessoas). Outros 6% (31 pessoas) optaram por
especificar sua opinião sobre o tema, conforme Figura 17.
Cumprimento dos princípios éticos da pesquisa
38%
34%
17%
6% 5%
Quase sempre
Não sei
Sim
Outra opinião
Não
Figura 17: Percepção dos respondentes sobre cumprimento dos princípios éticos da pesquisa
pelos pesquisadores da Embrapa, em percentual.
Nota-se que a certeza de que os pesquisadores estão cumprindo os princípios éticos da
pesquisa é muito baixa (17%), em relação aos que declararam não saber (34%) e em relação
aos que afirmaram que “quase sempre” (38%). Esse resultado pode ter ocorrido por diversos
185
motivos. Na tentativa de explicá-lo, tem-se: a) falta de conhecimento maior sobre o que seria
ética na pesquisa; b) falta de conhecimento sobre um documento específico de ética na
pesquisa, na medida em que 41% responderam não conhecer o Código de Ética da Embrapa,
que contém um capítulo sobre o assunto; c) dificuldade de se avaliar todos os pesquisadores,
devido a falta de dados; d) dificuldade em se situar na posição de avaliador pos-facto; e) falta
inserção na cultura da empresa do conceito de ética e de ética na pesquisa.
Outra questão é que, se levarmos em consideração que esta é uma pergunta sobre a
percepção que os pesquisadores têm dos seus pares, ainda temos outros complicadores que
são os “erros” de percepção no julgamento dos outros. Cita-se, por exemplo, o efeito de halo,
que é o fato de julgarmos uma pessoa por apenas uma de suas características. Trazendo para
esse estudo, esse efeito poderia ser emprestado para tentar explicar esses resultados. É difícil
para os pesquisadores responderem sobre a atitude dos outros 2.246 pesquisadores que
compunham em 21.08.2005 o universo de pesquisadores da empresa, ainda mais que estes
estão lotados na Sede ou em 40 unidades distribuídas pelos vários estados do país. Nesse
caso, as respostas categóricas podem ter origem tanto na imagem que têm da instituição,
quanto na imagem que têm da sua própria unidade, bem como na imagem de um grupo de
pesquisadores.
Sobre esse efeito de halo, Robbins (1999, p. 66) cientifica que:
A propensão para o efeito de halo operar não é aleatória. Pesquisas sugerem
que é provável que ela seja mais extrema quando os traços a serem percebidos
são ambíguos em termos de comportamentais, quando os traços têm tons
morais e quando quem percebe está julgando traços sobre os quais tem
experiência limitada.
Outro “erro” de percepção seria a questão da projeção, que consiste na tendência que o
ser humano tem de atribuir a outros características que são suas. Trazendo para esse estudo, o
resultado que mostra que 34% (166 pessoas) responderam não saber se “os pesquisadores da
Embrapa, no exercício de suas atividades, estão cumprindo os princípios éticos da pesquisa”,
poderia ser decorrente do fato de não terem claro um conceito de ética na pesquisa; dessa
forma, também não se sentiram à vontade para julgar os colegas.
186
Ainda com relação à pesquisa quantitativa, na categoria “outra opinião”, com 6%, as
respostas foram as mais diversas. Interessante como houve respostas aparentemente
semelhantes às do questionário, mas que não satisfizeram o respondente, tanto que ele
respondeu, especificando sua resposta. Um exemplo desse fato ocorreu quando três pessoas
responderam “acredito que sim” e uma “penso que sim”, quando havia uma resposta “sim”, à
sua disposição e a pesquisa era de percepção. Nesse caso, o respondente considerou “sim”
diferente de “acredito que sim” e de “penso que sim”.
Outro caso é o de duas pessoas, que responderam “nem sempre”, quando havia uma
resposta “quase sempre”. Nesse caso, as pessoas viram diferenças entre “nem sempre” e
“quase sempre”.
A título de ilustração, cita-se a opinião dos respondentes dessa categoria “outra
opinião”, registrada nos questionários. Há alguns que demonstram certo descontentamento
com a questão da ética na sua unidade: “Não há ética nessa unidade da Embrapa” (Q. 283).
Outra declaração nesse sentido:
“Na Embrapa onde trabalho vejo os que se preocupam... com ideais de
equidade, justiça social e, portanto, ética, fazem parte de uma minoria. Os
demais estão preocupados em pesquisar qualquer coisa (desde que seja
pesquisa) independente de "o quê" ou "para quem" seja. Para os que se
preocupam com ética na pesquisa, o mais importante em pesquisa é um
resultado que concretize em equidade e transformação concreta da sociedade
e que produza justiça social. Para os demais o importante é estar sempre
pesquisando temas da moda e ter uma enorme quantidade de artigos
publicados” (Q. 14).
Outro discorre sobre os sistemas de avaliação da empresa, que para ele gera competição
negativa. Afirma que apenas uma minoria cumpre os princípios éticos e explica o por quê:
“Em função da política de competição entre unidades (ranqueamento) e
internas para premiação, instituiu-se o "salve-se quem puder" entre os
pesquisadores. Não existe mais equipe e todo mundo quer (precisa ser) líder
de projeto a qualquer preço” (Q. 25).
187
Ainda nos comentários dos questionários, há declarações, como “Infelizmente esse tema
tem sido ignorado por muitos e se passa a régua de acordo com panelas ou interesses
próprios” Q. 294; “As chefias não tem ética” (Q. 285); “A influência dos valores éticos
pessoais na definição das hipóteses de das pesquisas pode direcionar os resultados para fins
unicamente pessoais do cientista” (Q. 297).
Pelos outros resultados e pelas entrevistas, nota-se que as pessoas ouvidas têm a
convicção de que a Embrapa é uma empresa ética. Nas declarações a seguir, encontra-se essa
constatação.
“A Embrapa é uma empresa ética, mas daí a responder por todos os
pesquisadores já é mais difícil. Acredito que alguns infringiram a ética, mas a
maioria não” (Q. 10).
“Acredito que os resultados da empresa demonstram que a ética vem fazendo
parte do nosso dia a dia. Casos isolados estão fora da média e devem ser
desconsiderados” (Q. 200).
Outro pesquisador filosofa:
O próprio modelo de desenvolvimento econômico, social, político e científico
nos quais se assentam a nossa civilização carecem de uma maior percepção da
verdade subjacente a realidade óbvia do mundo fenomênico. É natural da
humanidade a iniqüidade. Portanto seria uma pretensão muito grande
acharmos que sempre estamos agindo estritamente de forma ética, no sentido
que eu atribuo o termo (Sujeito 144).
Acredita-se que essa seja uma questão básica para uma empresa de pesquisa, ou seja, o
cumprimento dos princípios éticos. Apesar de ser um estudo de percepção, que carrega todas
as características já citadas, entende-se como fundamental a imagem que a empresa tem não
só na sociedade como também com os seus empregados, pois esta pode se refletir no
188
desempenho dos mesmos e em última análise, da empresa. Entretanto, para se chegar a uma
análise mais apurada sobre esse tema, são necessários estudos mais aprofundados sobre esse
tema.
6.6. COMO O GRUPO DE FORMADORES DE OPINIÃO PERCEBE A ÉTICA NA
PESQUISA E AS NORMAS DE ÉTICA NA PESQUISA NA EMBRAPA
Com relação à questão da ética na pesquisa, nota-se nas entrevistas preliminares, nas
entrevistas com o grupo de formadores de opinião uma falta de clareza ou de segurança com
relação ao que seria ética ou ética na pesquisa.
Uma pessoa participante da entrevista semi-estruturada, explicando o fato de que na
pesquisa agropecuária não se vê muitas discussões sobre a questão ética, afirma:
Historicamente a questão da agricultura tem sido muito isolada. As
universidades agrícolas, as faculdades, as escolas agrícolas, grandes parte
delas surgiram e se mantém como escolas ou universidades isoladas, mesmo
na época que a história filosófica era parte dos currículos, ela estava à parte.
Então a agricultura sempre foi um segmento que não permeou muito com esse
lado... Se você imaginar a medicina, ela teve outro caminho, fora o fato do
homem estar acima de tudo. Então eu acho que a gente deve olhar para o tipo
de atividade, os atores que estão evolvidos e o histórico, os campos de
interesse que na realidade dominaram o processo... A percepção da finitude
dos recursos naturais também é recente, a finitude dos recursos tanto
genéticos, florestais, como água, tudo. Diz-se que o olhar começou quando
Gagarin foi e viu tudo da Terra e percebeu como um todo, enfim (Sujeito3).
Entretanto, todos acham importante a discussão e a maioria aceita um passivo nesse
assunto ou acredita que é um assunto novo e como tal deve estar na pauta de discussões tanto
dos altos gestores como dos pesquisadores em geral.
189
Com relação à questão das normas de ética na pesquisa na Embrapa, obteve-se um
resultado que vem ao encontro dos que já foram apresentados.
Na entrevista semi-estruturada com o grupo de formadores de opinião, perguntados se
“Você considera que a Embrapa tem normas específicas quanto a ética na pesquisa?”, dos 21
respondentes, nove afirmam que não. Dentre estes, dois acreditam que deveria ter e três
acham que há os valores do PDE, há diretrizes gerais e um cita também as regras gerias de
procedimento.
Entre os que acreditam que a Embrapa não dispõe de normas específicas, um explica:
A Embrapa tem várias recomendações sobre diversos temas, sobre forma de
se portar, sobre forma de conduzir, forma tratar os temas abordados, mas
esta questão relacionada a ética, como ciência e parte da filosofia... Talvez,
pela própria formação nossa, cartesiana, grande parte de nossos
pesquisadores, dos nossos cursos de pós-graduação foram em ciência pura, a
gente não tenha dado a atenção que deveria. Existe recomendação, mas eu
acredito que agente pode avançar mais ainda sobre isto (Sujeito 13).
Quatro pessoas ficaram em dúvida, sendo duas pessoas que responderam não conhecer,
um não tem certeza, outro não sabe.
Oito pessoas responderam com certeza que sim. Dessas uma não se lembra; três citam o
Código de Ética da Embrapa (e um conjunto de normas que regem o funcionamento da
Embrapa); outro acredita que “tem instrumentos e conhecimento bastante claros” e que tem
procedimentos; outro acha que há várias normas que podem ser qualificadas como de ética;
outro ainda cita “os documentos referenciais orientadores da formulação de pesquisa
existentes nos macroprogramas contemplam os princípios gerais que norteiam a ética na
empresa” (Sujeito 16).
Entre os que acreditam que a Embrapa tem normas específicas, destaca-se a seguinte
declaração:
190
A Embrapa tem um processo de avaliação da programação e dos projetos de
pesquisa que passa por diferentes instâncias de avaliação em que as questões
de natureza ética sempre são percebidas e são evidenciadas quando alguma
proposta fuja a estas questões. Mais recentemente, há grupos que são
formalmente constituídos, particularmente na questão da bioética, da questão
dos recursos genéticos, das questões mais avançadas da genética, que tratam
desta questão, sempre tendo em vista a sustentabilidade, os impactos, os
efeitos. Então, por trás desses conceitos, a questão ética é sempre vigente.
Acho que a Embrapa tem instrumentos e tem conhecimentos bastante claros
com relação à pesquisa (Sujeito 12).
Nota-se que não há um consenso nessa questão, sendo que uns acham que sim, que as
várias normas existentes na empresa podem ser consideradas normas específicas de ética e
outros não. Dos onze chefes ouvidos, seis acreditam na há normas específicas e cinco acham
que não.
É oportuno lembrar que a percepção sobre a existência das normas é igualmente
importante à própria existência das mesmas, uma vez que na percepção podem estar incluídos
o conhecimento e a internalização das normas.
Quando perguntados sobre “Você acredita que as normas da Embrapa quanto à ética na
pesquisa são suficientes e adequadas para resguardar a ética na empresa (com relação aos
pesquisadores, gestores e sociedade em geral)?”, dos 18 que deram sua opinião, onze
acreditam que não e seis acreditam que sim. Um entrevistado tem críticas quanto a forma
como foi elaborado o código e faz algumas recomendações de como deve ser tratado o
assunto daqui para a frente:
O processo de estabelecimento do código de ética foi um processo de pouco
envolvimento da comunidade ou dos pesquisadores ou do próprio corpo
técnico com uma discussão da ética... Foi muito mais o cumprimento de uma
exigência, digamos de governo... do que efetivamente uma discussão do que é
a ética de uma instituição pública, do que é a ética numa instituição de
pesquisa... quer dizer... o que significa a ética dentro de uma instituição de
ciência e tecnologia? Como é que isso funciona? O que precisa ser feito? Eu
acho que precisa de discutir essa questão da ética e a direção da empresa
191
principalmente. Eu não gosto muito de atribuir responsabilidades à diretoria
não, porque eu acho que a diretoria assume aquilo que se propõe a ela... O
DGP tem uma responsabilidade nisso, de... fazer uma discussão mais ampla,
com uma estratégia... que se transforme numa preocupação da agenda da
empresa, do discurso da diretoria, do discurso dos chefes da unidade...
Discutindo a questão da ética na cúpula da empresa você tem condição de
induzir a discussão para baixo da empresa. Eu não acredito que seja possível
discutir a questão da base para cima porque ela vai se esgotar no segundo ou
terceiro escalão, porque ela não faz parte da agenda da empresa... A direção
da empresa precisa colocar na agenda... de diretoria como preocupação
institucional e provocar a discussão nos diferentes níveis da empresa, aí... a
gente estará fazendo alguma coisa em termo de ética que tenha consistência,
que tenha principalmente durabilidade, que tenha sustentabilidade para não
ficar uma discussão da ética porque está na moda discutir a ética ou porque o
país está mergulhado numa crise ética. Então agora virou moda discutir ética
(Sujeito 2).
Dois outros entrevistados discorrem sobre a importância dos canais de discussão. Um
deles considera que a Embrapa deveria investir mais na discussão de temas na empresa.
O que falta na Embrapa, hoje, são canais para discutir qualquer coisa. Nós nos
tornamos burocratas, nós não criamos seminários para discussão de temas.
Dificilmente você vê alguém com tempo para discutir, para se propor a discutir temas
específicos. E eu acho que a direção geral devia se preocupar em forçar a discussão
de temas como, por exemplo, a ética na pesquisa para ver qual é a opinião geral dos
pesquisadores, o que eles pensam disso. E, em função da estratégia da empresa, da
estratégia colocada pelas instituições maiores sobre pesquisa agropecuária, se criar
as normas internas. Porque as normas têm que estar a serviço de uma estratégia... As
normas e a estrutura de uma organização estão sempre a serviço de uma estratégia
(Sujeito 8).
... Vimos ao longo do tempo colocando ética como um valor da empresa, mas
eu acho que frente às transformações e as mudanças que nós estamos
vivendo... certamente deverá haver na empresa um debate mais aprofundado
das implicações da ética na condução de nossos trabalhos, de colocação
192
desse valor frente a essas mudanças que estamos vivendo e que certamente
viveremos daqui para frente. Então é algo que deve ser retomado com um
peso maior na empresa (Sujeito 10).
Um entrevistado opina sobre a necessidade de documentos específicos sobre o tema e
de grupos ou instâncias responsáveis pela gestão da ética na empresa:
... Se você olhar o plano diretor da Embrapa... Tem os seus valores, a ética e
tem definições, tem expectativas, tem orientações nesse sentido. Mas é muito
diferente você ter um plano diretor, uma coisa genética, ampla, ela é
balizadora, geral. É como se a gente falasse assim: “Bom, porque eu tenho
um plano diretor da Embrapa ou mesmo de uma unidade, o resto já está
resolvido”. Então eu não precisaria ter programação de pesquisa, eu não
precisaria ter agenda institucional, eu não precisaria ter uma agenda na área
de Recursos Humanos... Então o detalhamento disso é necessário... Acho
fundamental, nós precisamos ter. E não somente normas, mas nós precisamos
ter um grupo que faça gestão. Há questões que são polêmicas, há questões
que não são respondidas a priori. Na medida em que você tem, por exemplo,
na área administrativa uma legislação, você tem o Tribunal de Contas, você
tem auditoria, então você pode fechar isso perfeitamente, no sentido das
decisões. Na medida em que nós não temos os equivalentes à ética, resolvidos,
não temos um tribunal de contas da ética. Nós não temos uma legislação com
especificidades. A ética, no caso da pesquisa agropecuária, não existe.
Podemos ter uma comissão nacional, mas são gerais... Então nós não
especificamos, nós não detalhamos. Precisaria, além dessa especificação, a
gente estabelecer pelo menos algumas regras gerais, de procedimento, até de
relacionamento com os atores. A gente precisaria ter também um colegiado,
um comitê gestor, alguém, um grupo, que no caso a caso também
respondesse. Porque aí tem vários componentes, desde a jurídica até a
componente mais técnica, se fazer um experimento de uma determinada coisa
é correto ou não. Mas tecnicamente eu vou justificar que eu preciso desse
resultado, mas é correto fazer isso? Como é que nós julgamos? (Sujeito 15).
193
Outros lembram a questão da educação que é de fundamental importância, tanto a
questão da educação básica que o empregado já dispõe quanto a importância da empresa atuar
nesse sentido no caso da ética.
Enfim, como se pode observar pelas respostas acima, a maioria do grupo de formadores
de opinião acredita que a Embrapa não dispõe de normas específicas quanto a ética na
pesquisa que sejam adequadas e suficientes. A grande maioria também acredita que as normas
de ética na pesquisa existentes não resguardam a empresa, com relação aos pesquisadores, aos
gestores e à sociedade em geral.
6.7. NORMAS DE ÉTICA COMO ELEMENTO QUE INFLUENCIA A ATIVIDADE
DOS PESQUISADORES DA EMBRAPA
Na entrevista semi-estruturada, questionados sobre “Em que medida as normas relativas
a ética influencia a atividade dos pesquisadores”, o grupo de formadores de opinião, em sua
grande maioria acredita que influencia.
Alguns acham que não influenciam porque não existem, mas vêem vantagens na criação
delas, como se pode observar nas declarações a seguir:
Eu acho que elas não influenciam hoje... nós não temos normas relativas à
ética... Então não há o que se falar em que a ação do pesquisador esteja
limitada por qualquer norma ética da empresa, diferentemente de algumas
organizações, está lá para padrões de comportamento, você não pode fazer
isso, você está limitado a isso. Eu vou dar um exemplo, não há nenhuma
norma na Embrapa que diga que o pesquisador que está trabalhando com o
melhoramento de uma determinada variedade, que ele por uma questão da
norma ética da empresa, não deva aceitar o convite de uma viagem de uma
empresa que concorre com a Embrapa. A Embrapa desenvolve uma variedade
suponhamos de milho. Um código de ética e uma norma ética deveriam deixar
claro para o pesquisador qual é o limite do relacionamento dele. Eu posso
aceitar uma viagem paga por uma empresa “A” que também está fazendo
melhoramento genético de milho, que vai lançar uma variedade que a
194
Embrapa também está pesquisando? Eu posso receber uma viagem dessa
empresa para os Estados Unidos paga todas as despesas? É ética esse tipo de
relação com alguém que é concorrente com a Embrapa? Quer dizer isso não
está explicitado nas normas claramente, está dito às vezes verbalizado: ‘Olha,
ressalvado os interesses de concorrência com a Embrapa. A relação com os
parceiros deve respeitar os interesses da empresa’, mas onde é que está o
limite desse interesse? Onde é que está o conflito de interesses, quando é que
está explicitado isso?”(Sujeito 2).
“Se a Embrapa tivesse um conjunto de normas relativamente claras, se esse
conjunto de normas éticas fossem suficientemente amplas para ajudar cada
pesquisador tomar sua decisão” (Sujeito 4).
“Se você tem uma norma, em princípio naturalmente ela vai determinar sob a
forma que aquele pesquisador vai proceder ou não. Você veja: essa nova lei
de inovação, antes eu vi pesquisadores sendo processados, demitidos, e
execrados, por que... servia a alguns setores do setor privado e servia a
Embrapa também. Mas como... esse setor privado se apossou de certa forma...
dos resultados dessa pesquisa, esse pesquisador foi processado como se
tivesse fazendo algo dirigido... Hoje as normas que exigem inovação
tecnologia vendem exatamente isso. Aquele pesquisador era aético antes?
Claro que não. Hoje isso é legal. Então, as normas vêm para legalizar os
valores que nós pensamos a respeito” (Sujeito 8).
Outro entrevistado lembra da importância redobrada para a Embrapa como um todo,
dado o tamanho de sua estrutura:
A Embrapa são 36 centros de pesquisa, não sei quantas outras unidades
descentralizadas, além da sede. É um universo muito grande espalhado no
Brasil inteiro. Então, a vantagem de você estabelecer uma norma é porque ela
tenta padronizar os procedimentos de uma forma global, de uma forma geral
na Embrapa como um todo (Sujeito 14).
195
Porém esse mesmo entrevistado destaca a importância do acompanhamento de normas:
Não adianta nada ter uma norma, se não houver uma fiscalização para
acompanhar o seu cumprimento e penalização... no caso dela não vir a ser
cumprida por alguém ou por quem ela alcança. Então, se for implantado um
código de ética na Embrapa, tem que ser levado em consideração esses
pressupostos (Sujeito 14).
Um entrevistado lembra a importância da participação dos pesquisadores na elaboração
de normas sobre ética na pesquisa:
Sem a participação deles, se isso é feito, a influência tende ser a zero, a
desconhecer a coisa. É tanto que quando você perguntou pra mim, eu falei no
geral, eu não disse o documento qual era, porque eu não ando com ele, eu
não preciso dele para essa coisa grosseira... Mas agora é interessante a gente
discutir isso no dia a dia, em reunião que se faz com os outros pesquisadores,
discutir essa interferência. Aí sim, isso é bonito, é educativo, a gente gosta. Se
tiver um documento aí eu deixo ao meu lado porque eu vejo a minha
participação naquela coisa também. Uma coisa vinda de cima para baixo,
dizendo ponto um, ponto dois, ponto três, o que é certo, aí eu mando para
aquele lugar, não fica na minha mesa, eu não preciso de ninguém para me
dizer isso, para me impor isso. Mas eu preciso de muita gente para estar
sempre discutindo isso para gente não dar errada, aí eu preciso, mas de
norma, de fiscalização policialesca eu não preciso (Sujeito 6).
Outro entrevistado explica em detalhes a forma de avaliação dos projetos praticada na
Embrapa e a sua interface com a ética:
Há um grande número de projetos que são compostos por esse processo de
aprovação, ou que são reprovados, porque não contemplam, não só questões
de natureza técnica, mas às vezes questões de natureza também que implicam
em ética. Quando eu falo em ética, é porque ou eles não são adequados
àquele momento, ou eles não são devidamente avaliados em termos dos
196
impactos que podem causar na sociedade, no ambiente. Então esses projetos,
naquele momento, pelo conhecimento daquele grupo, ele são ou reprovados
ou encaminhados para reformulação. Ele passa por três grandes instancias,
pela análise dos pares. São pesquisadores que normalmente a Embrapa
coloca como consultores ad-hoc para fazer a avaliação do projeto e emitir um
parecer sobre a sua pertinência técnica, econômica, social, sustentabilidade,
impacto ambiental. Então, esse grupo faz essa primeira avaliação. Esse
conjunto de relatórios ou de pareceres é submetido a um comitê técnico que
também avalia, aprova ou não aquelas recomendações, reformulam ou não
aquelas reformulações. Depois se faz um novo encaminhamento, um novo
conjunto de pareceres consolidado e encaminha a um grupo gestor de
programação, que é a última instancia aonde esses projetos são avaliados,
podendo nessa trajetória... serem rejeitados, reprovados, pedidos para
reformular e quando são reformulados, voltam para esse processo novamente.
É um processo que estabelece crivos em diversas instâncias, no sentido de
você ter no final um projeto que seja não só consistente tecnicamente, mas
que atenda a esses grandes princípios da empresa. Na verdade o que acontece
com os projetos de pesquisa, quando eles passam por este processo todo é que
eles têm não só que atender a uma necessidade da sociedade, mas também as
essas referências da empresa. A questão ética é considerada, a
responsabilidade social da empresa é considerada, a visão estratégica da
empresa com relação àquela determinada área é considerada. Todos estes
elementos são colocados como filtros para julgamento desses projetos de
pesquisa. Uma idéia do pesquisador, ela não sai simplesmente e vai para
aplicação pratica, ela passa por um crivo até chegar ser aprovada
institucionalmente pela empresa, receber recursos de natureza humana,
financeira, de infra-estrutura para poder ser realizada, senão ela não é feita”
(Sujeito 12).
Um entrevistado se manifesta, emitindo uma espécie de conclusão para esse item: “É
difícil avaliar a influência da ética nas atividades dos pesquisadores. Para tanto, é necessário
uma pesquisa direta com os pesquisadores, no formato de entrevista ou outro tipo de coleta de
informações” (Sujeito 18).
197
6.8. NORMAS SOBRE RESTITUIÇÃO DE RESULTADOS DE PESQUISA OU
DIREITO DE PROPRIEDADE ÀS COMUNIDADES OBJETO DA PESQUISA
Nas entrevistas com o grupo formador de opinião, havia a seguinte pergunta: “Você
considera que as normas que regem a pesquisa na Embrapa asseguram algum tipo de
restituição de resultados de pesquisa ou de direitos de propriedade às comunidades objeto de
pesquisa (apropriação de conhecimento)?”.
Pelas respostas, percebe-se que esse parece ser um assunto novo e nem todos os
entrevistados tinham conhecimento do assunto. No geral, as respostas foram uniformes nessa
questão. Os entrevistados consideram que, quanto a restituição às comunidades objeto da
pesquisa, a Embrapa devolve à sociedade e que isso já é suficiente, na medida em que ela é
uma empresa pública e trabalha para a sociedade. Além disso, participam que raramente a
Embrapa trabalha com alguma comunidade em especial e quando trabalha há um contrato
onde são estipulados os direitos e obrigações. Consideram ainda que por já haver uma lei
maior versando sobre esse assunto, à qual a Embrapa deve obediência, esta poderá ou não
criar uma norma interna. Dessa forma, apesar da Embrapa não dispor de normas sobre esse
assunto, está subordinada a normas maiores37.
Esse assunto ainda é bastante polêmico, na medida em que não se tem ainda
devidamente definido o que é patrimônio genético, bem como outras expressões utilizadas na
lei.
Citam-se aqui as opiniões diferentes ou alguma declaração que retrate bem o que está
ocorrendo. Uma declaração retrata a novidade do assunto:
“Atualmente, sim. Muito pouco tempo pra cá: 2,3 anos, esta... passou a ser
uma preocupação, porque até pouco tempo... não havia essa preocupação e a
legislação brasileira também não se preocupava com isso. Agora, a partir da
37 A Medida Provisória nº 2.186-16, de 23.08.2001, “Regulamenta o inciso II do § 1o e o § 4o do art. 225 da Constituição, os arts. 1o, 8o, alínea "j", 10, alínea "c", 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção sobre Diversidade Biológica, dispõem sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e utilização, e dá outras providências”. Disponível no site: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2186-16.htm, acessado em 20.10.2005.
198
lei de acesso que é a medida provisória 2186 de 2001 é que esse direito ficou
garantido em lei e, portanto, a Embrapa também passou a se preocupar com
isso” (Sujeito 7).
“Isso na realidade passa a ser um objeto de discussão e de reestruturação das
normas de modo geral. A norma de relação internacional começa a discutir
isso. Nós teremos que fazer essa discussão interna. Hoje não tem um
arcabouço claro com relação a isso, mas eu acho que certamente é algo que
deverá ser parte das nossas discussões. Que você trabalhe de forma integrada
e que os benefícios sejam distribuídos. Aliás, é esse o discurso nosso para que
a gente consiga fazer estruturação de cadeias produtivas envolvendo todos os
segmentos, inclusive o conhecimento de geração de ciência e tecnologia como
parte da cadeia produtiva. É importante que se discutam essas participações
diferenciadas e que cada um tenha direito a recuperar parte do seu esforço
afinal desse trabalho. Eu acho que é um assunto que merece mais discussão”
(Sujeito 10).
“A Embrapa mais recentemente tem trabalhado como objeto de pesquisa
comunidades, comunidades indígenas, quilombolas... Porque até então ela
trabalhava mais produtos e serviços indistintos para as comunidades. Nesses
casos... a apropriação de conhecimentos está sendo feita diretamente na
comunidade. Está havendo esta consciência na Embrapa. Nós temos um
programa de agricultura familiar em que os princípios desse programa são de
apropriação de conhecimento pela comunidade. A demanda tem que sair da
comunidade. Não há mais nesses casos uma torre de marfim em que o
pesquisador é endeusado e que ele não tem responsabilidade junto àquelas
comunidades. Estes projetos eles não são aprovados se não tiverem um forte
apelo da comunidade e uma forte interação e os resultados serem
apropriados pela comunidade. Isso é parte integrante do processo de
avaliação desse projeto. Então, é impossível hoje, com a consciência que a
Embrapa tem do seu papel com relação a essas comunidades, um projeto que
seja feito não nascer das relações intrínsecas que o pesquisador tem com
aquela comunidade e que aquele conhecimento tem que ser apropriado na
comunidade. Nos últimos projetos, a título de exemplo, nós percebemos
199
alguns projetos que tinham a intenção, mas que não tinham o compromisso.
Nenhum deles foi aprovado” (Sujeito 12).
Outra pessoa teme que esse assunto possa dificultar as atividades científicas, como
declara:
Nós temos uma legislação nacional que ela trata disso. Às vezes, até de forma
exagerada. Porque o fato de você fazer uma coleta em qualquer comunidade
não significa que obrigatoriamente você tem que retornar alguma coisa. Hoje
nós temos inclusive um conselho a nível nacional, que é o Cegem, que trata
dessa questão, dos recursos genéticos. Nós acreditamos que se você realmente
utiliza de algum conhecimento que foi trabalhado por alguma comunidade,
isso deve obrigatoriamente retornar como benefícios. Mas o exagero também
de chegar isso ao extremo e até dificultar as atividades científicas, forçando a
negociações nem sempre as mais, sei lá, claras, isso pode ser um impeditivo.
Isso pode ser um impeditivo para o desenvolvimento científico do país (Sujeito
13).
Esse assunto parece trazer outras implicações para a empresa. Uma pessoa questiona o
nome de uma das unidades da Embrapa, que é Transferência de Tecnologia, argumentando
que esse termo “É muito questionado externamente porque a transferência é unilateral e na
realidade a gente, numa construção, devemos considerar o saber tácito dessa outra rede”
(Sujeito 3).
Como se pode depreender do que foi exposto, esse assunto ainda requer muita discussão
dentro da empresa, até mesmo para compreender suas implicações.
200
6.9. TEMAS SOLIDÁRIOS
Em pesquisas desse tipo, é comum surgirem temas que não foram objeto da pesquisa,
mas que são levantados, quando a pesquisa é reconhecida como um instrumento ou como um
fórum para apresentar questionamentos.
Esse fenômeno também pode ocorrer por inexistência ou desconhecimento pelo sujeito
dos canais institucionais adequados. Pode ocorrer ainda pela oportunidade proporcionada pelo
instrumento ou pelo levantamento de assuntos que remetem a preocupações vivenciadas pelos
respondentes.
Essas questões serão citadas para serem objeto de estudo pelos canais competentes,
quando for o caso.
Nessa pesquisa, foram levantadas as questões citadas no Quadro 7.
Quadro 7: Questões que surgiram no decorrer do trabalho e que não se referiam diretamente
ao objeto das pesquisas realizadas
MEIO TEMA DECLARAÇÕES (transcrições literais)
Entrevistas
Preliminares
Avaliação de
projetos
Os pesquisadores precisam de suporte para avaliação
do impacto estratégico, envolvendo os aspectos
políticos, econômicos, sociais e jurídicos de cada
projeto da Embrapa, até mesmo por proteção, o
impacto jurídico.
Q. 452 Conduta na
política
Se consideramos deputados como servidores públicos,
não existe código de ética do servidor público...
Q. 485 Conduta na
política
Com tanta falta de ética escancarada a toda a nação
brasileira, com nossos parlamentares, líderes do povo
dando os piores exemplos, fica até difícil falar de
ética...
201
Quadro 7: Questões que surgiram no decorrer do trabalho e que não se referiam diretamente
ao objeto das pesquisas realizadas (Continuação)
MEIO TEMA DECLARAÇÕES (transcrições literais)
Q. 405 Sobrecarga de
trabalho
Existe sobrecarga dos pesquisadores na busca por
recursos financeiros, na divulgação de seu trabalho na
mídia, na busca de parcerias contínuas... entre outros.
Perde-se mais tempo elaborando propostas de
captação de recursos externos e projetos em rede que
na atenção que devia estar sendo dada a resultados
atingidos (não falo cronograma atingido, mas
conteúdo oferecido a sociedade).
Q. 405 Conflito de
papéis
Pessoas em cargos gerenciais não querem perder
contato com a pesquisa, o que é impossível. Ou se é
administrador ou pesquisador. Como resultado, a
estrutura administrativa passa a ser usada de forma
inapropriada...
Q. 405 Resgate de
valores
Essa pesquisa está de parabéns porque esse tipo de
trabalho deve ser coordenado diretamente por quem é
de fora da Unidade; por quem é isento quanto a
resposta obtida na pesquisa. É hora de parar para
pensar o que estamos fazendo com e na nossa
Embrapa e agir enquanto há tempo de resgatar seus
valores.
Q. 434 Ineditismo de
propostas de
pesquisas
Quando as nossas propostas de pesquisa saem da
Embrapa para serem analisadas por consultores
externos nos tornamos vulneráveis a biopirataria.
Como o sistema Embrapa (MPs) é muito lento
corremos o risco de perder o ineditismo.
202
Quadro 7: Questões que surgiram no decorrer do trabalho e que não se referiam diretamente
ao objeto das pesquisas realizadas (Continuação)
MEIO TEMA DECLARAÇÕES (transcrições literais)
Entrevistas
Preliminares
Leis externas à
Embrapa que
regulamentam
a atividade de
pesquisa
As leis no Brasil são frágeis (em excesso, detalhistas e
complicadas). Elas privilegiam quem não está dentro da lei.
Para a Embrapa trabalhar numa simples coleta, existem
tantas leis, tantos formulários; é necessário o preenchimento
de tanto documento. Entretanto, se for só passear, ninguém
incomoda. A pessoa pode colher material a vontade. O
pesquisador de outro país, quando mal intencionado, colhe
a vontade e ninguém o incomoda porque ele não falou que
ia fazer pesquisa. Para o mal intencionado não há punição,
ele fica na cadeia dois dias, depois sai e fica por isso
mesmo. O Brasil (Ibama, Ministério da Saúde) faz leis que
de certa forma atrapalha o trabalho da Embrapa, que é uma
empresa pública séria. Não fiscaliza os outros.
203
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
O estudo sobre a ética na pesquisa agropecuária é pioneiro no Brasil. Não foram
encontrados estudos sobre esse tema específico.
O objetivo geral desta dissertação, que era realizar um estudo sobre a percepção que os
pesquisadores da Embrapa têm com relação à ética na pesquisa agropecuária, foi atingido. O
trabalho apresentou um panorama da percepção dos pesquisadores sobre o tema e ofereceu
um diagnóstico de como a questão da ética está sendo tratada na Embrapa. Deu início também
a uma identificação dos princípios éticos que norteiam a atividade de pesquisa.
Esta dissertação, pela própria organização e apresentação, já expôs algumas conclusões
ao longo das análises. Assim, neste tópico, serão enfatizadas algumas que merecem destaque.
Os princípios e valores fundamentais, objeto do estudo da ética, perpassam os conceitos
da filosofia e das religiões desde as mais antigas até as atuais. O homem sempre buscou
códigos básicos escritos ou tácitos para orientar e organizar a vida em sociedade, até mesmo
como forma de preservação da espécie.
Com relação a ética em C&T, conclui-se que há muito que refletir sobre os limites
éticos da pesquisa, explicitando princípios básicos e padrões de conduta que deverão ser
praticados pela comunidade científica. Eles contribuiriam para coibir práticas erradas ou
configuradas como má-fé, buscando sempre a integridade da ciência, que é seu maior
patrimônio junto à sociedade.
Por tudo o que foi levantado por meio desse estudo, da pesquisa qualitativa, da pesquisa
quantitativa e pelo contexto regulatório, pode-se concluir que:
⇒ Há certo desconhecimento por parte de alguns gerentes e de alguns
pesquisadores da Embrapa sobre o que seria especificamente “ética na
pesquisa agropecuária”;
⇒ O tema desperta ou traduz o interesse de todos os atores ouvidos, o que mostra
que o ambiente da Embrapa está favorável à atuação da empresa em políticas
204
nessa área. Apenas para exemplificar, em uma das questões do questionário,
49,19% dos pesquisadores acredita que o tema ética na pesquisa “necessita ser
melhor discutido na Embrapa pelos pesquisadores e pela direção da empresa”.
Em outras questões o interesse dos atores pelo tema se torna também muito
evidente;
⇒ O Código de Ética da Embrapa pode ser um ponto de partida para que se
introduza o assunto na empresa, mas como fundamento norteador da conduta
ética dos pesquisadores da empresa ainda carece de ajustes e aprofundamentos.
O estudo também mostrou que:
⇒ Dos pesquisadores que responderam à pesquisa quantitativa, 39,84% opinaram
na questão aberta e em outros campos do questionário, com declarações
contendo opiniões, definições, sugestões ou elogios sobre o tema e sobre a
pesquisa. Além disso, foram recebidos 110 e-mails de pesquisadores,
solicitando o questionário em word ou emitindo opiniões, o que confirma mais
uma vez o interesse dos atores no assunto estudado;
⇒ A grande maioria dos atores ouvidos, isto é, 97% dos pesquisadores
reconhecem a estreita relação entre a ciência, a pesquisa e a ética. Destes, 63%
acreditam que “a ética, a ciência e a pesquisa devem se complementar” e 34%
acreditam que “a ética deve estar acima da ciência e da pesquisa”. Na pesquisa
qualitativa também a grande maioria reconhece a relação da ética com a
ciência e a pesquisa. Em outro questionamento, 94,51% acreditam que a ética
deve ser levada em consideração em todo o processo de pesquisa. Dessa forma,
fica muito clara a importância da ética na pesquisa, na opinião dos atores;
⇒ Dos pesquisadores que responderam à pesquisa quantitativa, 85% acreditam
que a pesquisa agropecuária, como um todo, deve estar incluída nas discussões
sobre bioética. Nesse caso, é necessário que a Embrapa se adiante, correndo
205
atrás do “passivo”, uma vez que as discussões sobre bioética já contabilizam
alguns anos;
⇒ Dos respondentes do questionário, 41% declaram desconhecer o Código de
Ética da Embrapa. Analisando as respostas, conclui-se ainda que 87% dos
respondentes não conheciam o código em sua totalidade;
⇒ Quando perguntados se os pesquisadores estão cumprindo os princípios éticos
da pesquisa, as respostas afirmativas totalizaram 17%. Os que não sabiam 34%
e os que responderam “quase sempre”, 38%. Acredita-se que em uma empresa
de pesquisa, a certeza do cumprimento dos princípios éticos pelos pares
deveria ser em maior número. Entretanto, como essa pesquisa não investigou
os motivos desse fenômeno, conclui-se que essa questão merece um estudo
mais aprofundado, visando compreender suas razões, para que sejam tomadas
medidas para resolução dos problemas encontrados.
Durante a realização das pesquisas, observou-se um número considerável de
pesquisadores que teceram considerações com relação aos sistemas de avaliação da empresa,
tanto o de avaliação de unidades (SAU), como o de avaliação de desempenho de pessoas
(SAAD). Apesar de esse assunto não ter se constituído no foco dessa pesquisa, nota-se que as
reclamações giram principalmente na percepção de que esses sistemas fomentam a
competição negativa entre empregados e unidades. Considerando que esse fato não é bom
para a empresa, tornam-se necessárias medidas, visando conhecer essa realidade e intervir, se
for o caso, visto que esses sistemas interferem no dia a dia dos profissionais, podendo, em
última análise, interferir na motivação dos mesmos.
Enfim, pensar em ética não é uma tarefa fácil. As pessoas em geral não gostam de se
envolver com o assunto, dada a complexidade do tema. Entretanto, o fato de ser complexo
não inviabiliza sua melhor compreensão.
Outra questão que merece ser destacada aqui é que quando se fala em ética, os
pesquisadores consultados afirmam que é uma “questão de berço”. Essa dissertação não
procurou refutar a visão de que a ética é algo que se traz do “berço”. Seria, contudo,
impossível supor que todas as novas e complexas questões que circunscrevem o debate já
206
estivessem equacionadas e incutidas nas mentalidades de todos como atributo
comportamental a priori. Nesse sentido, é lícito considerar que, caso não se disponha dessa
bagagem de princípios e conhecimentos, há sempre a possibilidade de se adquirir, pois o
crescimento do ser humano em todas as dimensões acontece, em tese, durante toda a sua vida,
de forma que é perfeitamente possível apreender e internalizar princípios, sejam eles no
campo pessoal, profissional ou outros. Assim, a empresa pode e deve atuar, investindo na
educação para a ética.
O estudo mostrou que cabe à Embrapa:
⇒ Investir em uma “política de ética” na empresa. Esse investimento se refletirá
na ética na pesquisa, lembrando que os pesquisadores representavam em
agosto de 2005, 26% do seu quadro funcional. Como parte dessa política
deverão ser disponibilidados canais de orientação sobre conduta funcional e
sobre procedimentos éticos nas unidades da empresa, com pessoas treinadas,
fomentando um ambiente de aprendizado, no qual as pessoas reflitam sobre
seus atos e mudem de atitude, caso estes não estejam condizentes com os
princípios éticos que a organização persegue;
⇒ Investir na discussão e definição de princípios norteadores da conduta ética na
pesquisa, buscando o envolvimento maciço do pessoal da carreira de P&D,
como compartes no processo. Esse procedimento poderá contribuir como
forma de proteger a empresa de atuações dentro de um “vazio ético” ou em
estágio “pré-ético” de pensamento, conforme tão bem caracteriza Singer (1998,
p. 21). A participação, além de contribuir para um produto representativo,
favorece a internalização e a conscientização, gerando co-responsabilidade;
⇒ Oferecer canais para os pesquisadores que fomentem a discussão de temas que
tangenciam ou que interferem na atividade de pesquisa, como, por exemplo, a
ética;
⇒ Investir no padrão ético dos seus dirigentes em todos os níveis. A
disseminação da ética pelo exemplo e comprometimento do corpo gerencial da
207
empresa é uma ferramenta muito eficiente de internalização de conceitos,
conforme adverte Humberg (2002, p. 56). Lembrando ainda que uma das
responsabilidades do segmento gerencial é atuar como peças centrais na
questão da educação, orientando o pessoal sob sua supervisão;
⇒ Disponibilizar para os pesquisadores e para os demais empregados um
documento orientador que reúna as diversas normas sobre ética a que estes
estão submetidas;
⇒ Oferecer ou divulgar melhor os canais que poderão ser utilizados pelos
empregados para denúncias de atitudes antiéticas ou de desvios de conduta.
Estas deverão ser devidamente apuradas, tomando as medidas cabíveis
(orientação, treinamento, investimento na formação, punição etc.), visando
proteger a imagem da empresa e demonstrar a determinação da instituição em
se buscar uma conduta correta. Esses canais deverão ser confiáveis, com
mecanismos de proteção e garantia de sigilo aos denunciantes.
Entende-se que a presente dissertação, que trata no meio acadêmico de um desafio
inerente a uma instituição de pesquisa, tem caráter exploratório. Ainda há muito que descobrir
e compreender sobre o tema. Este trabalho, mais que pretender ser conclusivo e definitivo,
busca servir de base para estudos mais aprofundados do tema. Entende-se que o assunto aqui
tratado é da maior relevância e como tal merece priorização e maiores reflexões tanto na
empresa como em outros segmentos.
208
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