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1 A GRANDE MINA DE OURO DE CRIXÁS/GO E A COMUNIDADE LOCAL TEIXEIRA, Nilo da Silva - Centro de Tecnologia Mineral [email protected] FERNANDES, Francisco Rego Chaves - Centro de Tecnologia Mineral [email protected] LIMA, Maria Helena Rocha - Centro de Tecnologia Mineral [email protected] Resumo Serão apresentados na primeira parte do trabalho algumas considerações iniciais sobre as Grandes Minas e a Comunidade local e sobre o estado da arte da responsabilidade socioambiental, nas suas obrigações legais e principalmente no que tange ao "ir além do que se está legalmente obrigado". Constata-se que existe uma necessidade premente de se enfrentar desde já os desafios do futuro, nos quais tem bastante peso o passivo dos efeitos adversos da mineração e surge como indispensável uma tríplice licença: Título Minerário, Licença Ambiental e Licença Social, construída por processos de consulta, participação e de um sólido diálogo local. Também se faz uma breve revisão e uma nova leitura do conceito de desenvolvimento sustentável, da sua aplicabilidade e sobretudo das suas limitantes e condicionantes quando transposto para a indústria extrativa mineral. Hoje vários autores questionam fortemente se vale a pena o poder público concessionar a operação de uma Grande Mina, que necessariamente irá exaurir o capital natural formado pela jazida mineral, sem que previamente se estipule que parte da receita obtida com a venda dos minerais reverterá em outras formas de capital (humano, social ou de fomento em outras novas atividades visando a exaustão) para a Comunidade local. Na segunda parte do trabalho, um estudo de caso, após seleção entre as 200 Grandes Minas do Brasil, de uma única, a Grande Mina de Ouro de Crixás localizada no Município do mesmo nome, no Estado de Goiás, em operação há cerca de 20 anos, vai-se verificar se esta gerou benefícios sustentáveis líquidos para a Comunidade local, ou seja, para um conjunto seleto de indicadores de Desenvolvimento Humano, de excelência internacional e nacional, o que distingue o Município-sede de Crixás dos municípios vizinhos do seu Entorno (em número de nove), do Estado da Federação ao qual esse município pertence, do Brasil.

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A GRANDE MINA DE OURO DE CRIXÁS/GO E A COMUNIDADE LOCAL TEIXEIRA, Nilo da Silva - Centro de Tecnologia Mineral [email protected] FERNANDES, Francisco Rego Chaves - Centro de Tecnologia Mineral [email protected] LIMA, Maria Helena Rocha - Centro de Tecnologia Mineral [email protected] Resumo Serão apresentados na primeira parte do trabalho algumas considerações iniciais sobre as Grandes Minas e a Comunidade local e sobre o estado da arte da responsabilidade socioambiental, nas suas obrigações legais e principalmente no que tange ao "ir além do que se está legalmente obrigado". Constata-se que existe uma necessidade premente de se enfrentar desde já os desafios do futuro, nos quais tem bastante peso o passivo dos efeitos adversos da mineração e surge como indispensável uma tríplice licença: Título Minerário, Licença Ambiental e Licença Social, construída por processos de consulta, participação e de um sólido diálogo local. Também se faz uma breve revisão e uma nova leitura do conceito de desenvolvimento sustentável, da sua aplicabilidade e sobretudo das suas limitantes e condicionantes quando transposto para a indústria extrativa mineral. Hoje vários autores questionam fortemente se vale a pena o poder público concessionar a operação de uma Grande Mina, que necessariamente irá exaurir o capital natural formado pela jazida mineral, sem que previamente se estipule que parte da receita obtida com a venda dos minerais reverterá em outras formas de capital (humano, social ou de fomento em outras novas atividades visando a exaustão) para a Comunidade local. Na segunda parte do trabalho, um estudo de caso, após seleção entre as 200 Grandes Minas do Brasil, de uma única, a Grande Mina de Ouro de Crixás localizada no Município do mesmo nome, no Estado de Goiás, em operação há cerca de 20 anos, vai-se verificar se esta gerou benefícios sustentáveis líquidos para a Comunidade local, ou seja, para um conjunto seleto de indicadores de Desenvolvimento Humano, de excelência internacional e nacional, o que distingue o Município-sede de Crixás dos municípios vizinhos do seu Entorno (em número de nove), do Estado da Federação ao qual esse município pertence, do Brasil.

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A GRANDE MINA DE OURO DE CRIXÁS/GO E A COMUNIDADE LOCAL

1. Introdução As Minas não se apresentam homogêneas, ao contrário tem grandes

diferenciações entre si, decorrentes: do tamanho (grande, média ou pequena), do

tipo de lavra (a céu aberto ou subterrânea), do tipo de ocorrência mineral, da

tecnologia mineral em uso (na extração do minério, no beneficiamento primário e na

metalurgia extrativa), do porte empresarial do empreendimento (megaprojeto,

pequena ou média empresa, garimpo, ou cooperativa), da localização geográfica e

das práticas exercidas sobre o meio ambiente.

A Comunidade é também única, individualizada e heterogênea em sua

caracterização: singular quanto à sua história, se possui ou não uma tradição

mineira, na sua inserção geográfica e cultural, no país, no estado e na região a que

pertence e quais as outras atividades econômicas nela existentes. Ainda, nela se

posicionam os diferentes atores sociais, altamente organizados, que gravitam na sua

esfera de influência, tais como, autoridades públicas (locais, estaduais e federais),

diretores das associações de empresários e dos trabalhadores, educadores,

médicos, participantes das ONGs e, ainda, os cidadãos da comunidade.

No mundo globalizado o proprietário de uma Grande Mina - um grupo

minerador - qualificada como de porte e excelência mundial, precisa estar cada vez

mais atento às inúmeras questões de cunho socioambiental, nas suas obrigações

legais e sociais, principalmente nas questões relacionadas com os direitos humanos,

do trabalho, da atitude de terceiros, seus fornecedores ou fornecedores de seus

fornecedores, ao longo de cada elo da sua cadeia produtiva mínero-metalúrgica e,

nas relações com o local (Fernandes, 2006). Por exemplo, quanto ao trabalho

infantil, embora na grande empresa mineradora no Brasil não há utilização de

trabalho infantil, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que, em

2004, no Brasil, 150 mil crianças ainda trabalhavam na indústria extrativa e

metalúrgica mineral e nas cadeias industriais de base em recursos minerais, como a

persistência do trabalho infantil junto de trabalho escravo, na cadeia produtiva da

siderurgia, principalmente no carvão vegetal do Norte do país e na cadeia da

construção civil junto das grandes cidades (Lima e Teixeira, 2006; Lima, 2007).

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No Brasil, a mineração faz parte da ocupação territorial e da história do país,

mas foi um dos setores da economia escolhidos como estratégicos e alavancados

pelo crescimento não-sustentável a partir dos anos 70. Os seus efeitos adversos

perduram e um amplo trabalho é necessário, com base nos conceitos e diretrizes da

sustentabilidade definidos na Agenda 21 e referendados na Conferência de

Joanesburgo, para reconhecer e enfrentar os efeitos adversos da mineração. Seus

impactos e a competição pelo uso e ocupação do solo têm causado sérios conflitos

socioambientais (Scliar, 2004).

Entretanto, se a mera gestão ambiental dos recursos minerais tem obtido

alguns avanços no Brasil, tal é devido principalmente à introdução de legislação

rigorosa, com severas penas para os infratores, pesando esta muito mais, do que a

contribuição representada pelas forças de mercado ou de iniciativas voluntárias das

empresas (Sánchez, 2007).

O objetivo central do presente artigo é pesquisar se a grande mineração

gerou benefícios sustentáveis líquidos para a Comunidade local onde se situa a

Grande Mina, através de um estudo de caso. Será selecionada uma Grande Mina do

Brasil e conseqüentemente fica bem determinado o Município-sede onde a mesma

se localiza, o Estado da Federação ao qual esse município pertence e também um

conjunto de municípios limítrofes ao Município-sede (o Entorno) além do Brasil. Para

estes espaços bem definidos será estruturada uma bateria de indicadores de

desenvolvimento humano e escolhido um período temporal de análise que abranja o

início da operação da Grande Mina até o ano mais recente disponível.

2. Desenvolvimento sustentável

No conceito de desenvolvimento sustentável, uma palavra inicial é

transmitida: o consumo da geração atual, não pode comprometer as gerações

futuras, significando um sinônimo de durabilidade, permanência e continuidade. Mas

um recurso mineral apresenta duas importantes e específicas características: a sua

rigidez locacional, a extração mineral só pode ser desenvolvida no local da sua

ocorrência mineral e a sua natureza finita, costumando-se assim dizer que o minério

só dá uma safra.

Quando o conceito de desenvolvimento sustentável é transposto para a

indústria extrativa mineral, há uma certa impugnação por parte de alguns autores,

havendo ainda quem no limite pugne pela inaplicabilidade deste conceito para os

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recursos minerais, baseado que cada mina, considerada de per si, é por definição,

finita, e inevitavelmente será fechada e abandonada, decorrido um lapso de tempo

da sua operação extrativa.

Cientes deste hiato, Silva e Drummond (2005), em trabalho sobre a indústria

extrativa mineral na Amazônia, apresentam uma gradação para a sustentabilidade,

adjetivada como de sustentabilidade "fraca" e de sustentabilidade "sensata ou

prudente" e postulam uma obrigatória substitutibilidade entre os diferentes capitais:

"O esgotamento, ao longo do tempo, de uma jazida mineral (capital natural), só se justifica se a receita obtida com a venda dos minerais se converter em outras formas de capital (humano, social ou produzido pelo homem)." (Silva e Drummond, 2005, p. 4).

Portanto, contribuir para o desenvolvimento sustentável da mineração

significa que cada empresa da indústria extrativa mineral deveria obrigatoriamente

estar a por em prática, em cooperação ou em parcerias, a formação do capital social

nas comunidades onde se localiza a sua operação de extração mineral, engajando-

se em programas interligados com as prefeituras, as autoridades estaduais e

federais, bem como com as associações locais.

Paralelamente, são vinculados argumentos contrários a esta visão,

encontrados ainda em alguns textos de associações patronais, de que a empresa ao

atuar em cooperação com a comunidade se substituiria ao Estado omisso ou

ineficiente, tentando-se justificar o predador minerador, o insustentável enclave

mineiro, o modelo da empresa acionária fechada em si mesma e nos interesses

exclusivos dos seus acionistas, geralmente localizados a dezenas de milhares de

quilômetros.

Na atualidade, se estipulam internacionalmente para as atividades de

recursos minerais exigências legais obrigatórias entre as partes, em contratos de

financiamentos com instituições financeiras internacionais e grandes bancos para

uma Tríplice Licença: Título Minerário, Licença Ambiental e Licença Social, como

absolutamente indispensáveis ao funcionamento das atividades econômicas

extrativas minerais. Conforme estudo do Banco Mundial:

"A conclusão final dos estudos que desenvolvemos, é de que a concessão ou licença minerária não é mais suficiente. As empresas devem obter uma licença social, da qual depende de processos de consulta, participação local e - cada vez mais - de um sólido diálogo tripartido" (Banco Mundial, 2003).

Também tem sido proposto no âmbito da Agenda 21 do setor mineral criar

fóruns e estabelecer compromissos entre governos, empresas, trabalhadores e

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comunidades para o desenvolvimento de ações visando a mineração sustentável

articuladas com a Agenda 21 local (Scliar, 2004).

Entretanto, um longo caminho no Brasil está ainda por percorrer, para que

estas e outras assertivas sejam uma prática corrente na atividade de recursos

minerais.

3. Licença mineral e ambiental, licença social, comunidade local e empresa No Brasil, os recursos minerais têm um balizamento jurídico muito peculiar, o

subsolo tem um regime jurídico totalmente distinto da propriedade privada do solo.

Para o subsolo, a Constituição de 1988 estabelece que todos os bens minerais que

nele ocorram são bens da União e, portanto, só poderá o mesmo ser pesquisado e

explorado após autorização, através de ato jurídico individualizado e específico, a

obtenção de Título Minerário, que é uma concessão da União outorgada pelo

Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), em nome do governo federal

a uma empresa. Além deste Título Minerário, a Constituição de 1988, exige uma

Licença Ambiental.

No presente, se começa a pugnar por uma Licença Social, para que as

empresas mineradoras possam realizar novos projetos e prosseguir com aqueles em

operação, em que seja ouvida a comunidade local onde a Grande Mina se encontra

inserida, buscando consensos para realizar ou não a extração mineral numa

determinada região, cujo ordenamento territorial tem de estar conforme com o

desenvolvimento desta atividade, em concorrência com outros possíveis usos para

atendimento às necessidades da comunidade (Scliar, 2004).

A comunidade local, num sentido amplo, é aquela envolvida em

transformações ambientais, econômicas, sociais, históricas, de infraestrutura, de

movimentos populacionais ou de tráfego comercial, geradas pela atividade da Mina

no seu intra e extramuros (Pasco-Font et al, 2003), e tem como localização espacial

na divisão política-administrativa do território o Município-sede e, como padrão de

comparação, os municípios que confinam com o Município-sede, os do seu Entorno.

Quanto à empresa que opera uma Grande Mina deve-se destacar o

ambiente interno da empresa - o intramuros - e o ambiente externo à empresa - o

extramuros - que se caracteriza por ser muito heterogêneo porque lida com a

comunidade em geral, com várias políticas públicas e correspondentes autoridades

(poder público municipal, estadual e federal), como também com outros atores

sociais e diferentes organizações da sociedade civil, além da presença de cada

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cidadão pertencente à população. Nele existirão sempre diversos pontos de contato

e também potenciais conflitos entre a comunidade, as autoridades e a empresa

mineradora, desde a etapa inicial do projeto mineiro até à fase final, o abandono e o

fechamento da mina.

4. Inter-relações entre os atores

As diferentes maneiras como a comunidade se relaciona com a empresa,

depende em primeiro lugar dos cidadãos dessa comunidade e das organizações

sociais nela existentes. No caso específico de Grandes Minas no Chile, em estudo

de campo realizado pelo Banco Mundial afirma-se:

"Tradicionalmente, la cultura de explotación minera no se ha caracterizado por establecer buenas relaciones con la comunidad. Por su parte, la comunidad local, típicamente, visualiza las actividades de la minería como aislada, orientadas por un fin de carácter netamente económico. Frente a esto, la comunidad es aprensiva respecto a ser marginada de los beneficios que puede reportar el desarrollo del proyecto. (...) Para la industria minera las relaciones con la comunidad, tradicionalmente, no han tenido la primera prioridad." (Banco Mundial, 2003, p. 81).

No Brasil, embora não exista evidência suficiente, através do necessário

trabalho de campo junto das principais Grandes Minas e Comunidades brasileiras,

mas a percepção do Prof. Claúdio Scliar (2004) em trabalho realizado sobre a

Agenda 21 é semelhante:

"A mineração é freqüentemente citada como atividade agressora do meio ambiente, que não pode contribuir para o desenvolvimento sustentável das regiões onde se localiza. Essa visão retrata a reação ao aproveitamento destrutivo dos recursos ambientais pela sociedade moderna que degradou e poluiu em nome do progresso."

Quanto às inter-relações entre os diferentes atores buscar-se-á

primeiramente saber, se há diálogo tripartido entre empresa-governo-comunidade ou

se há compartimentação dos diálogos: empresa-governo municipal, empresa-

governo estadual, empresa-governo federal, empresa-comunidade, governo-

comunidade? Com a população vizinha e adjacente à Mina ou do Entorno? Com as

associações da sociedade civil? Com os membros da Comunidade com os quais a

empresa compra terras, bens e serviços? Ainda, entre os diferentes atores, como

são tratadas questões como as da educação, da saúde, do desenvolvimento local e

do impacto ambiental? O modelo de comportamento seguido pela empresa

influencia diretamente o seu comportamento, por exemplo, se ela for pró-ativa tal

comportamento facilitará o entendimento?

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Entretanto há necessidade de informações detalhadas sobre estas inter-

relações e é necessário também documentar a evolução dos indicadores sociais,

desde a fase de projeto mineral em implantação e ao longo de todo o funcionamento

da mina. Muitas vezes, a cobertura estatística existente, nas instituições públicas,

federais e estaduais não são adequadas e será necessário produzir indicadores.

Quanto ao sucesso da sustentabilidade está muito ligado à participação do

governo municipal em todo este processo, é uma das pré-condições para um

processo bem sucedido, em que ele fortaleça a governabilidade e a capacidade da

comunidade em realizar projetos. Tal pode acarretar muitos anos de esforços e

vários anos de tentativas, porque à partida a prefeitura está em grande

desvantagem. É necessário que a prefeitura quebre a barreira de inacessibilidade

junto do governo central e estadual, que este não abdique das suas

responsabilidades junto das comunidades locais, como seus aliados, inclusive

porque uma quota-parte dos tributos vai para o poder federal e estadual, seja da

Contribuição Financeira da Exploração Mineral (CFEM), do Imposto de Renda de

Pessoa Jurídica (IRPJ), do Imposto de CircuIação de Mercadorias e Serviços (ICMS)

e outros impostos ou tributos.

5. Sucesso e insucesso, para um balanço das "boas práticas" e das "omissões" dos empreendimentos minerais

Trata-se de sistematizar questões relacionadas com o impacto da atividade

de mineração na qualidade de vida das pessoas, da capacidade da atividade mineral

em impulsionar o desenvolvimento econômico nacional e regional e principalmente o

desenvolvimento social local das comunidades onde estão localizadas (Lima, 2007).

Atualmente existe uma pauta mínima de obrigações legais para as empresas

de mineração, como a eliminação de efeitos prejudiciais aos ecossistemas frágeis e

dos efeitos sociais negativos sobre as comunidades locais. Pressupõem-se,

portanto, estratégias de ação de curto e médio prazo, estratégias que existem

somente no período em que a mineração atua na comunidade, mas também

estratégias de longo prazo, que perduram além do tempo de vida da mineração.

Conforme observa criticamente Sánchez (2007):

"Questões como: se a mineração contribui para reduzir a pobreza ou se favorece a concentração de renda, se promove a capacitação de recursos humanos e melhora a qualidade de vida das regiões mineiras não têm uma resposta inequívoca".

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Mas para um determinado e específico estudo de caso de uma única Grande

Mina e Comunidade, quais são, um a um listados, os impactos positivos, "as boas

práticas" da empresa mineradora, que derivam das "ações estudadas" e quais são

também, um a um, os impactos negativos, as "omissões", nesta interação, tanto na

fase inicial do projeto mineral, como na operação e na última fase a do fechamento e

descomissionamento da mina? Quais as estratégias para impulsionar o bem estar

social e minimizar os danos gerados pela empresa, intramuros e extramuros? A

empresa tem ido além do que a lei estipula e convertido uma parte da receita obtida

com a venda da sua produção, o capital natural localizado na comunidade, em

outras formas de capital (humano, social ou uma outra atividade econômica criada)

interiorizados na Comunidade?

Em segundo lugar, qual o interesse da União em autorizar a operação de

uma jazida que a ela lhe pertence? Há claras vantagens, para o País, para o Estado

e para o Município, advindas da produção mineral gerada pela Grande Mina? Quais

são, um a um, cada um desses benefícios e quais são os malefícios?

Embora não se tenha pretensão de obter respostas para tudo e sobre tudo,

ao menos se espera que um dos principais resultados obtidos, no nosso estudo de

caso da Grande Mina versus Comunidade, seja um elenco de impactos organizados

e quantificados (positivos e negativos), classificados por cinco diferentes conjuntos

de variáveis: - econômicas; sociais; culturais; espaciais e ambientais. Vai-se levar

em conta, também, outras variáveis não tangíveis, tais como, a cultura local, o

comportamento da sociedade civil, a organização institucional e produtiva, na

explicação do desenvolvimento regional ou local (Diniz, 2000).

Na literatura, não existe uma tipologia consolidada sobre os benefícios que

uma exploração mineral pode trazer para uma comunidade, mas com uma grande

dose de simplificação pode-se adiantar que a população age em primeiro lugar

segundo os seus interesses imediatos e, a partir das percepções e expectativas

próprias que terão, em relação à permanência da mina na região, construirão as

suas demandas sem as limitar às reais oportunidades existentes que estão mal

definidas.

A população requererá em primeiro lugar emprego, seja diretamente na

mina, seja indiretamente, como resultado imediato da implantação permanente da

atividade extrativa mineral na localidade. Indiretamente desejará ter oportunidades

de negócios criadas pela empresa, novas empresas locais fornecedoras de bens e

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serviços para a mina ou mesmo, novas oportunidades em serviços da mais variada

ordem, para atender à injeção monetária dos salários dos empregados da mina na

economia local. Desejam a melhoria substancial das escolas, hospitais e postos

médicos, criando mais empregos como educadores, profissionais de saúde e

funcionários públicos. Desejam também a realização de obras, principalmente de

infraestrutura, como por exemplo, asfalto nas vias principais da sua cidade e não só

nas estradas de acesso à mina e o saneamento básico, a água potável e a

eletricidade, acesso à televisão, internet e ao telefone celular.

Estas são algumas expectativas da população, ou melhor, muito

simplesmente percepções da comunidade, do que a empresa, caso quisesse fazê-lo,

poderia realizar em prol do local, sem se entrar neste momento em nenhum tipo de

valoração, sobre a razoabilidade deste elenco de pleitos.

5. Metodologia da pesquisa

Quanto à escolha da Grande Mina de Ouro de Crixás, localizada no

Município de Crixás, no interior do Brasil, na região Centro-Oeste, a noroeste do

Estado de Goiás, entre as demais do Brasil tem, naturalmente, uma dose de

aleatoriedade. Mas avulta o de se tratar de uma Grande Mina inserida numa

comunidade do interior, que não apresenta nenhuma outra atividade econômica de

grande ou médio porte, apenas a criação de gado extensivo sendo, segundo a

Revista Minérios, uma das 200 Maiores Grandes Minas do Brasil onde a substância

produtiva é muito relevante, o metal precioso ouro.

Comparando o porte econômico, a comunidade representada pelo

Município-sede de Crixás tem cerca de 15 mil habitantes e as suas receitas

municipais são de R$12 milhões ano. Já a Grande Mina produz 6 toneladas de

ouro/ano e tem uma receita de R$202 milhões.

A operadora da Grande Mina de Ouro de Crixás é o grupo sul-africano Anglo

American, um grupo empresarial com dimensão mundial, o primeiro maior grupo

produtor de ouro do mundo, com ações em todas as principais bolsas do mundo e

ainda com diferentes certificações socioambientais. Disponibiliza amplo material de

divulgação e informação na internet em diferentes portais e se afirma em seu

discurso, de forma inequívoca e repetida, como muito pró-ativo, dentro de um

modelo empresarial de trato desenvolvimentista sustentável com a comunidade onde

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se localiza a Mina (Anglo American, 2007; Anglo American-Brasil, 2007; AngloGold

Ashanti, 2007.

Entretanto conhecemos poucas pesquisas realizadas sobre o tema:

Comunidade e Grandes Empreendimentos, aplicadas ao setor mineral. Há

primeiramente a realizada pelo Banco Mundial, em 2001, sete estudos de Grandes

Minas e Comunidade na América Latina (Bolívia, Chile e Peru), e ainda quatro

estudos na Espanha e Canadá.

Existem no Brasil estudos recentes, a partir de 2005, realizados no Centro

de Tecnologia Mineral (CETEM), do Ministério da Ciência e da Tecnologia (MCT),

pelos pesquisadores Maria Helena Lima, Francisco Fernandes e Nilo Teixeira,

mapeando algumas questões relevantes socioeconômicas da mineração. Em

Brasília, no Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Universidade

Nacional de Brasília (UNB), a pesquisa dos Profs. Maria Amélia Silva e Dr. José

Augusto Drummond, com teorização sobre o assunto e estudos de caso de Grandes

Minas e Comunidades (Enriquez, 2006; Enriquez e Drummond, 2007),

principalmente, mas não somente, da Amazônia, no Estado do Pará, onde estão

localizados os Grandes Empreendimentos. Na USP, no Departamento de

Engenharia de Minas da EPUSP, as importantes reflexões do Prof. Dr. Luiz Henrique

Sánchez, com ampla bibliografia publicada, destacando-se um trabalho recente de

avaliação do Brasil tendo como horizonte 2015 (Sánchez, 2007). No âmbito do

governo federal, o Prof. Cláudio Scliar da UFMG, atualmente Secretário de Geologia,

Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia produziu um

documento sobre "A Agenda 21 e Setor Mineral" para o MMA-Ministério do Meio

Ambiente (Scliar, 2004).

6. A indústria extrativa mineral

A economia internacional tem tido um excelente desempenho desde 2003 e

o Brasil vem acumulando bons resultados econômicos: crescimento positivo do PIB,

inflação muito baixa, saldo do comércio exterior muito alto com grande aumento das

exportações, principalmente nas commodities, um índice de risco-país baixo e as

taxas de juros em queda acentuada. Estudos prospectivos indicam a continuação

deste clima econômico favorável para os próximos anos.

A indústria extrativa mineral mundial, atravessa também um período de alto

crescimento, onde o Brasil é um dos 10 maiores países produtores, exportando 70%

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da sua produção total. O ouro tem tido as mais expressivas altas nas cotações

internacionais, mais de 100% nos últimos cinco anos e também um conjunto

expressivo de commodities, tais como o minério de ferro, o zinco e o cobre, entre

outros, traduzindo-se em generalizada valorização dos ativos dos grandes grupos

mineradores e em lucros extraordinários, significando novas aquisições, expansões,

investimentos em novos projetos e em pesquisas geológicas, bem como a

intensificação da produção das Grandes Minas em operação (Koppe, 2007).

No Brasil o Estado de Goiás é o terceiro entre os estados mineradores e

nele estão localizadas algumas das Grandes Minas de categoria mundial, todas

exploradas por grandes grupos mineradores estrangeiros, exceto o grupo brasileiro

Votorantin em Niquelândia. A produção mineral goiana é diversificada, mas com

valor significativo concentrado em apenas seis produtos (níquel, fosfato, ouro,

amianto, nióbio e cobalto) e com atividade relevante em apenas 8 dos seus 241

Municípios (Niquelândia, Catalão, Barro Alto, Ouvidor, Minaçu, Crixás, Faina e

Fazenda Nova).

7. O Município-Sede e a Grande Mina de Ouro

O Município de Crixás está situado no interior do Brasil, na região Centro-

Oeste, a noroeste do Estado de Goiás. Ligado à Belém-Brasília (BR-153), através da

GO-336, distante 354 km de Brasília e 320 km de Goiânia, com uma área territorial

grande, de 4.678 km2, sendo habitado por aproximadamente 15 mil habitantes. A

densidade demográfica (habitantes por quilômetro quadrado) é muito baixa,

3,1/hab/km2, mais baixa ainda que a densidade de 7 dos 9 municípios do Entorno.

O início da mineração de ouro, mas também das pedras preciosas

(esmeraldas, diamantes e cristais) no Estado de Goiás, remonta ao tempo colonial,

com os bandeirantes paulistas, encabeçados por Bartolomeu Bueno da Silva, filho

de Anhanguera, cuja bandeira saiu de São Paulo em 1722 e descobriu córregos

auríferos nos sertões goianos. Durante os séculos XIX e XX, a economia de Crixás

tentou diversificar-se para as atividades do rebanho bovino, mas as idas e vindas de

novos ciclos de ouro e conseqüente recrudescimento das atividades garimpeiras e

até de empresas de mineração do ouro, fez com que existissem diversos períodos

de grande ascensão e também de grande decadência, sendo grande a influência

econômica da extração do ouro ao longo da sua história.

A principal atividade no Município de Crixás é uma industria extrativa

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mineral, uma Grande Mina de Ouro, localizada apenas a 3 km da sede do Município,

a cidade de Crixás. A empresa Mineração Serra Grande S/A responsável pela mina

é uma joint-venture, entre o grupo sul-africano Anglo-American, o operador da mina,

o terceiro maior grupo minerador do mundo e o primeiro de ouro e o grupo

canadense Kinross Gold Group, participando cada um dos dois grupos mineradores

com 50% do capital. Em 2006, a Mineração Serra Grande S/A produziu 6 toneladas

de ouro, tendo o ouro sido totalmente comercializado através de exportações, para

os EUA e a Inglaterra.

Desde o seu início de operação, em 1989, mais de 81 toneladas de ouro

foram extraídas, atingindo um valor de produção acumulado à cotação de 2006, de

1,2 bilhão de dólares, é de lavra subterrânea e emprega diretamente 626 pessoas.

Em 2007, a Grande Mina de Ouro de Crixás/GO, completa 17 anos em operação,

mas possui reservas de ouro suficientes apenas para mais 4 anos de

funcionamento, segundo dados oficiais do DNPM, ou, até 7 anos, segundo as

informações da empresa, até, no máximo, o ano de 2013.

Conforme levantamento da revista Exame para as Melhores Empresas do

Centro-Oeste, por setor de atividade, a Mineração Serra Grande S/A foi em 2005 a

primeira colocada em rentabilidade, com retorno do investimento de 45% ao ano, um

lucro de R$63,8 milhões (US$ 29 milhões) e tendo exportado toda a sua produção

de ouro por R$182,3 milhões, equivalentes a US$ 82,9 milhões (Brasil Mineral,

2006). Em relação à rentabilidade da mina, os resultados são inigualáveis, segundo

o acionista da empresa, o grupo canadense Kinross, os valores do custo da

produção, é duas vezes menor do que a grande maioria das minas de ouro do

mundo, explicando-se assim o porquê dos grupos internacionais referenciarem a

Grande Mina de Ouro de Crixás como uma das mais rentáveis (Kinross, 2003).

A Mineração Serra Grande S/A, opera atualmente em quatro frentes de

lavra, sendo três subterrâneas: Mina III, Mina Nova e Ore Body IV/Forquilha e, uma

quarta, a céu aberto, a Open Pit. O elevado volume de ROM, 800.000 t por ano, a

classifica entre as 200 Grandes Minas do Brasil. São lavrados minérios do

Greenstone Belt Crixás (Crixás, Faina, Goiás, Guarinos e Pilar de Goiás), ricos em

arsenopirita, característica mineralógica comum aos minérios auríferos dos

greenstones belts do Rio Itapicuru (BA), Paracatu (MG) e ainda o arsênio se faz

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presente, no Quadrilátero Ferrífero, nos depósitos de carvão em Santa Catarina e

Rio Grande do Sul.

8. O Município de Crixás e o seu Entorno, o Estado de Goiás e o Brasil

Em seguida vamos apresentar um perfil do Município-Sede de Crixás e do

Entorno (o conjunto dos nove Municípios limítrofes), identificados no Mapa 1 a

seguir. Mapa 1: O Município-Sede de Crixás e o seu Entorno

Fonte: IBGE (2007).

O PIB-Produto Interno Bruto por setores de atividade, agricultura, indústria e

serviços, é um bom indicador para detectar os grandes setores de atividades

produtivas existentes em cada unidade territorial, Município-sede de Crixás e nos

municípios do Entorno. A tabela abaixo mostra que dos 10 municípios do Noroeste

goiano, apenas em quatro, Mozarlândia (61%, importante frigorífico de carne), Crixás

(32%, ouro), Rubiataba (21%, indústria de cana) e Itapaci (20%, indústria de cana)

existe uma atividade industrial assinalável, sendo a estrutura do PIB nos seis

municípios restantes do Entorno preponderantemente agrícola, rebanho bovino, com

um pequeno setor de serviços, onde são inexistentes atividades industriais

relevantes. Comparativamente ao Estado de Goiás e ao Brasil, a agricultura em

Crixás tem um peso no seu PIB três vezes mais relevante que para o PIB do Brasil e

duas vezes maior do que o peso da agricultura em Goiás.

Tabela 1 - O Produto Interno Bruto - PIB por setores de atividade - em 2004 (%) Agricultura Indústria Serviços

Brasil 10 38 57

14

Goiás 21 35 44

Crixás 34 32 33

Entorno 39 28 33

-- Mozarlândia 14 61 23

-- Outros (oito municípios) 50 12 38 Fonte: IBGE (2006).

Comparando-se agora na tabela abaixo, o número de empregos no

Município-sede de Crixás com os municípios do Entorno, vemos em primeiro lugar

que cerca de 25% de todos os empregos de Crixás, cerca de 600, se originam da

indústria extrativa mineral, o que vale dizer da Grande Mina de Ouro, sendo a

segunda maior empregadora depois da administração pública e logo em seguida

vem o setor de serviços, totalizando estas atividades cerca de 75% do número de

empregos e a agropecuária vem em quarto lugar com apenas 16%.

No Entorno, não existem empregos gerados por atividade extrativa mineral,

mas os empregos na indústria de transformação, mais de 3.000, ocupam o primeiro

lugar com um terço do total dos empregos, somando-se o empreendimento industrial

de um grande frigorífico de beneficiamento de carne, o Frigorífico Bertin, um dos

principais exportadores de carne do Brasil a uma usina de cana-de-açúcar.

Tabela 2 - O emprego por tipos de atividade no Município de Crixás e no Entorno Crixás Entorno

Tipo de Atividade (em 31/12/2005) Nº de Empregos

% dos Empregos

Nº de Empregos

% dos Empregos

Extrativa Mineral 581 23,9 23 0,2Indústria de Transformação 59 2,4 3.366 33,7Serviços Industriais de Util. Pública 4 0,2 39 0,4Construção Civil 31 1,3 8 0,1Comércio 180 7,4 889 9,0Serviços 519 21,3 622 6,2Administração Pública 668 27,5 2.816 28,3Agropecuária 390 16,0 2.205 22,1Total 2.432 100,0 9.968 100,0

Fonte: MTE (2007). Na Mineração Serra Grande S/A, em janeiro de 2007, o emprego total

totaliza 835 empregados, sendo considerado como emprego direto, os funcionários

com vínculo contratual, 626 empregados e empregos indiretos 209, subcontratados

(Mineração Serra Grande, 2007). Os operários representam 82% do emprego total,

15

distribuindo-se predominantemente na lavra subterrânea. A seguir vem os

administrativos e os supervisores cada um com 8%, e finalmente os administradores

e gerentes são 1 %. As mulheres representam apenas 2% do número total de

funcionários.

Do total de funcionários que emprega em 2007, segundo informações da

empresa, apenas 43% são pessoas do município de Crixás, tendo 46% do total de

empregados a naturalidade fora do Estado de Goiás, incluindo-se neste número

todos os funcionários graduados da empresa e muitos dos quadros especializados.

Os salários pagos pela empresa variam de R$10.969 a R$942 mensais, cerca de 11

vezes entre o maior salário, um administrador/gerente, 1% do número total de

empregados e um operário/operacional, com 82% do número total de empregados.

O salário intermédio, é do setor administrativo, com R$ 1.315 mensais. Os

supervisores são em número de 48 e recebem um salário de R$4.300 mensais.

Quanto às Contas Municipais, Crixás teve um orçamento anual em 2005 de

R$13 milhões, parte substancial destinado ao pagamento do seu elevado número de

funcionários, R$7 milhões, ou seja 70% do total. Entretanto recebe como CFEM-

Compensação Financeira pela Exploração Mineral, uma espécie de royalty, apenas

R$ 1,2 milhão,ou seja 9% do total. A Grande Mina obtém em receitas anuais quinze

vezes mais do que o Município. Comparativamente têm-se os seguintes parâmetros

entre a Grande Mina de Ouro e a Prefeitura de Crixás na tabela seguinte.

Tabela 3 - Comparação entre as Receitas Totais Orçamentárias e da Exploração Mineral da Prefeitura de Crixás com as da Grande Mina

Em milhões de R$ Rubrica Prefeitura Grande Mina

Receitas anuais 13,2 182,3 CFEM/Lucro 1,2 63,8 Fonte: STN (2007).

9. Evolução do desenvolvimento do Município de Crixás de 1991 a 2000

Em seguida vamos analisar o município de Crixás de 1991 a 2000 - o início

do funcionamento da Grande Mina de Ouro de Crixás e dez anos decorridos em

operação contínua - utilizando-se uma bateria de indicadores estatísticos que

retratem as questões de desenvolvimento humano, nas facetas econômicas, sociais,

de saúde, de educação e de dinamismo populacional conforme o Quadro seguinte.

16

Quadro 1 - Bateria de indicadores de desenvolvimento humano Tema Indicadores

Dinâmica populacional População total, Rural e Urbana IDH-Índices de Desenvolvimento Humano IDH-Municipal, IDH-Renda, IDH-

Longevidade e IDH-Educação Riqueza, Desigualdade, Pobreza, Mortalidade e Sobrevivência

PIB, Índice de Gini, Número de Pobres, Mortalidade até um ano de idade e Probabilidade de sobrevivência até 60 anos de idade

Como referencial comparativo, serão utilizados quatro diferentes espaços

político-administrativos: o Município-sede da Grande Mina de Ouro de Crixás, o

Entorno formado pelo conjunto dos nove municípios limítrofes, o Estado de Goiás e

o Brasil.

9.1. Dinâmica Populacional

O Brasil a partir da década de 1950 passa por um processo de grande

mudança na sua característica populacional, quando a população que era

aproximadamente 50% rural e urbana, se vai tornando cada vez mais

predominantemente urbana, devido ao avanço tecnológico nas técnicas de cultivo,

conforme a Tabela seguinte.

Tabela 4 - Dinâmica da População

População (n.o de habitantes) Localidade

Total 1991 Total 2000 Urbana 1991 Urbana 2000 Rural 1991 Rural 2000Brasil 146.825.475 169.799.170 110.990.990 137.953.959 35.834.485 31.845.211Goiás 4.018.903 5.003.228 3.247.676 4.396.645 771.227 606.583

Entorno 83.514 81.662 55.000 61.849 28.509 19.813 Crixás 18.850 14.673 10.122 11.035 8.728 3.638

Fonte: PNUD (2003).

Assim como no Brasil, Crixás e os municípios do seu Entorno apresentaram

diminuição muito significativa da população rural e aumento da população urbana.

Entretanto Crixás, em maior grau, e o Entorno, registraram decréscimo da população

total numa tendência de repulsão populacional.

9.2. IDH-Índices de Desenvolvimento Humano

A Tabela a seguir consolida os resultados estatísticos do IDH-Municipal e

seus subíndices escolhidos para retratar a evolução entre 1991 a 2000.

17

Tabela 5 - Bateria de Indicadores de Desenvolvimento Humano IDH-Municipal IDH-Renda

Localidade 1991 2000

Ranking GO 1991

Ranking GO 2000 1991 2000

Ranking GO 1991

Ranking GO 2000

Brasil 0,696 0,766 - - 0,681 0,723 - - Goiás 0,700 0,776 8/27 8/27 0,704 0,758 9/27 10/27 Entorno 0,629 0,717 178/242 178/242 0,594 0,642 113/242 133/242 Crixás 0,648 0,717 129/242 178/242 0,641 0,631 33/242 159/242

IDH-Longevidade IDH-Educação

Localidade 1991 2000

Ranking GO 1991

Ranking GO 2000 1991 2000

Ranking GO 1991

Ranking GO 2000

Brasil 0,662 0,727 - - 0,745 0,849 - - Goiás 0,668 0,745 9/27 8/27 0,765 0,866 8/27 8/27 Entorno 0,600 0,701 206/242 201/242 0,700 0,820 140/242 141/242 Crixás 0,624 0,686 168/242 210/242 0,680 0,835 167/242 103/242 Fonte: PNUD (2003).

Em termos absolutos o Brasil, o Estado de Goiás, o Município de Crixás e os

municípios do seu Entorno apresentaram todos eles (exceto para o IDH-Renda de

Crixás), melhoras no IDH-Municipal e em todos os seus subíndices. Entretanto, o

Município-sede e os do Entorno de Crixás apresentam sempre valores absolutos

bem piores do que os da média do Estado de Goiás e do Brasil, tanto para 1991

como para 2000. Os valores do IDH do Município-sede da Grande Mina de Ouro de

Crixás, tanto para 1990 como 2000, são equiparáveis a um conjunto de países entre

os mais pobres do Mundo como a Bolívia, Guatemala, Guiné Equatorial e Mongólia.

Já em termos relativos, os resultados do IDH-Municipal no Município de

Crixás, comparando-se com os outros municípios do Estado de Goiás, que são um

universo de 242, houve uma piora acentuada, pois a posição do Município de Crixás

caiu significativamente da posição 129, em 1991, para a posição 178, em 2000,

situando-se no último terço da cauda do ranking. Com relação ao IDH-Municipal dos

municípios do Entorno, estes em 10 anos tiveram uma evolução positiva bem mais

significativa do que Crixás, embora estejam também no ranking de Goiás em

posição relativa mais baixa que a média.

Quanto ao indicador IDH-Renda os resultados para o Município de Crixás

apresentaram pioras significativas entre 1991 a 2000: absoluta apresentando queda

nos valores de 2000 em relação aos de 1991; relativa porque colocou o município na

cauda do ranking goiano dos de menor renda per capita, no 159o lugar, quando dez

18

anos antes era destaque no Estado de Goiás, porque ocupava a posição 33. O

Entorno também piora, embora não tão drasticamente.

No indicador IDH-Longevidade, Crixás que em 1991 ocupa uma posição já

muito desfavorável piora ainda mais, passando da posição 168, em 1991, para 210,

em 2000, uma posição abaixo da média do Entorno.

O único indicador a demonstrar uma melhoria relativa bem significativa é o

IDH-Educação para Crixás, galgando 64 posições no ranking dos municípios

goianos e os municípios do Entorno se mantiveram em 2000 na mesma posição

relativa de 91.

9.3 Riqueza, Desigualdade, Pobreza, Mortalidade e Sobrevivência

Em relação o PIB-Produto Interno Bruto, o indicador por excelência da

medida da Produção (riqueza gerada), no Brasil, no Estado de Goiás e no Entorno,

os dados obtidos mostram que de 1985 a 2000 (só existem dados municipais

disponíveis para 1985 e não para 1990), Goiás cresce um pouco mais de 50% e o

Brasil um pouco menos de 50%. Já o PIB do Entorno diminui em 20%, enquanto o

PIB de Crixás aumentou mais 20%, embora bem abaixo do ritmo do Brasil e de

Goiás. Dados recentes para 2003 levam o PIB ao patamar de 77,6 milhões de reais

de 2000, refletindo a grande subida das cotações do ouro no mercado internacional.

Tabela 6 - O PIB-Produto Interno Bruto

PIB (a preços de mil R$ de 2000) Localidade

1985 2000 Brasil 766.850.348 1.101.254.907Goiás 13.837.115 21.665.356Crixás 42.317 50.187Entorno 414.365 346.790

Fonte: IPEAdata (2007).

Com relação à concentração de renda, o índice de Gini em Crixás mostra

pequeníssima melhoria absoluta, de 0,58 para 0,56, tendência contrária ao ocorrido

no Brasil, em Goiás e no Entorno, que registraram entre 1991 e 2000 piora neste

índice, melhorando Crixás da posição 205 goiana em 1991, para a posição 121 em

2000.

19

Tabela 7 - Concentração de Renda

Índice de Gini Localidade

1991 2000 Ranking GO 1991

Ranking GO 2000

Brasil 0,63 0,65 - - Goiás 0,59 0,61 4/27 6/27

Entorno 0,53 0,63 114/242 214/242 Crixás 0,58 0,56 205/242 121/242

Fonte: PNUD (2003).

Entretanto, apesar da concentração de renda ter melhorado em Crixás entre

1991 e 2000, o percentual de pobres em relação à população total teve uma grande

piora relativa, não acompanhando a grande queda absoluta brasileira e goiana. O

número de pobres em Crixás atinge, em 2000, mais do que 40% do total de seus

habitantes, valor esse muito maior do que o do Brasil e do Estado de Goiás, que

ainda melhoraram muito de 1991 para 2000.

Tabela 8 - Pobres em relação à população total(%)

Pobres (%) Localidade

1991 2000 Ranking GO 1991

Ranking GO 2000

Brasil 40,08 26,65 - - Goiás 35,05 26,65 7/27 7/27

Entorno Crixás 41,14 41,49 68/242 168/242

Nota: proporção dos indivíduos com renda familiar per capita inferior a 50% do salário mínimo. Fonte: PNUD (2003).

Quanto à mortalidade infantil até um ano de idade houve grande melhora em

termos absolutos tanto para o Brasil como para Goiás, este último com um índice

muito melhor, mortalidade bem inferior à média brasileira. Já quanto a Crixás e ao

Entorno o índice acusa desempenho bem inferior a Goiás. Em relação à sua posição

no ranking do Estado de Goiás o município sede da Grande Mina de Ouro

apresentou sensível queda em dez anos, passando da posição 167 para a posição

210.

20

Tabela 9 - Mortalidade Infantil por mil habitantes (até um ano de idade)

Mortalidade infantil mil hab. (até um ano de idade) Localidade 1991 2000 Ranking GO

1991 Ranking GO

2000 Brasil 44,68 30,57 - - Goiás 29,53 22,45 5/27 6/27 Entorno 41,87 29,45 211 201 Crixás 36,34 31,85 167 210

Fonte: PNUD (2003).

Quanto à probabilidade de sobrevivência da população até aos 60 anos, a

percentagem aumentou tanto para o Brasil, como para o Estado de Goiás, o Entorno

e o Município-sede de Crixás.

Tabela 10 - Probabilidade de Sobrevivência (até os 60 anos)

Probabilidade de sobrevivência até 60 anos (%) Localidade 1991 2000 Ranking GO

1991 Ranking GO

2000 Brasil 70,92 77,63 - - Goiás 70,03 79,66 10/27 8/27 Entorno 61,71 74,76 210 201 Crixás 64,95 73,05 168 210

Fonte: PNUD (2003).

Mas, entretanto, a mesma piora relativa, já constatada em quase todos os

outros indicadores é também observada neste indicador, em que Crixás e o Entorno,

se posicionam bem na cauda do ranking dos municípios goianos, abaixo da posição

200 em 242 municípios do universo de Goiás. Ainda, para Crixás, o resultado de

2000 aponta a queda de 42 posições no ranking goiano, enquanto o Estado de

Goiás melhorou a sua posição no ranking nacional para 8o melhor Estado da

Federação.

10. Conclusões

A expectativa inicial do trabalho era no sentido de encontrar - como

conseqüência direta da implantação da Grande Mina de Ouro de Crixás,

estabelecida em 1989 e desde então em plena operação, para uma escala anual de

6 toneladas de ouro - no Município-sede do empreendimento, um vigoroso

crescimento econômico, aliado a uma forte dinâmica populacional, afluindo

migrantes para o seu território, que até pudesse vir a diluir parcialmente as

vantagens da geração de riqueza de um PIB municipal em franca expansão.

21

Acresce ainda, uma redobrada expectativa, pelo fato de a literatura referir

efeitos econômicos positivos esperados decorrentes diretamente do novo

empreendimento, tanto maiores quanto a posição de partida do Município-sede

fosse de menor desenvolvimento, o que era o caso do Município de Crixás em 1989.

Neste ano, à época da implantação da Grande Mina de Ouro, o Município se

constituía, inequivocamente num dos mais pobres do Estado de Goiás, aliás

homogeneamente pobre era também toda a região formada pelo seu Entorno. Dez

anos decorridos, nenhum dos efeitos esperados se verificou na evolução de Crixás,

que não se distingue fundamentalmente dos Municípios do seu Entorno, vivenciando

ainda ritmos de crescimento, dinâmica populacional e desenvolvimento humano,

para uma bateria ampla de indicadores econômicos e sociais, muito mais lentos do

que o Estado de Goiás e do Brasil.

22

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