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O BRASIL ENDIVIDADO Como nossa dívida externa aumentou mais de 100 bilhões de dólares nos anos 90 Uma herança que vem dos tempos da Colônia A ditadura militar e a ditadura da dívida Anos 90: mais pagamento, menos crescimento Propostas para enfrentar a dívida externa Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar O BRASIL ENDIVIDADO Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar Como nossa dívida externa aumentou mais de 100 bilhões de dólares nos anos 90

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O BRASIL ENDIVIDADOComo nossa dívida externa aumentou mais

de 100 bilhões de dólares nos anos 90

Uma herança que vem dos tempos da ColôniaA ditadura militar e a ditadura da dívida

Anos 90: mais pagamento, menos crescimentoPropostas para enfrentar a dívida externa

A HISTÓRIA DA DÍVIDA externa brasileira,suas causas estruturais e seus efeitos sociaissão analisados em O Brasil endividado.Relacionando a dívida externa, a dívida públicainterna e a dívida social, Reinaldo Gonçalves eValter Pomar demonstram que o Brasil sóconseguirá combinar crescimento econômicocom justiça social se enfrentar com coragem esoberania a dívida externa, a “ordem” capitalistamundial e as elites que dela se beneficiam.

Entenda como e por que os governos Collore FHC aumentaram em mais de 100 bilhõesde dólares a nossa dívida externa, e descubrade onde sai o dinheiro para pagá-la.

Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar

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O BRASIL ENDIVIDADOReinaldo Gonçalves e Valter Pomar

Como nossa dívida externa aumentou maisde 100 bilhões de dólares nos anos 90

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O BRASIL ENDIVIDADOComo nossa dívida externa aumentou mais

de 100 bilhões de dólares nos anos 90

Uma herança que vem dos tempos da ColôniaA ditadura militar e a ditadura da dívida

Anos 90: mais pagamento, menos crescimentoPropostas para enfrentar a dívida externa

A HISTÓRIA DA DÍVIDA externa brasileira,suas causas estruturais e seus efeitos sociaissão analisados em O Brasil endividado.Relacionando a dívida externa, a dívida públicainterna e a dívida social, Reinaldo Gonçalves eValter Pomar demonstram que o Brasil sóconseguirá combinar crescimento econômicocom justiça social se enfrentar com coragem esoberania a dívida externa, a “ordem” capitalistamundial e as elites que dela se beneficiam.

Entenda como e por que os governos Collore FHC aumentaram em mais de 100 bilhõesde dólares a nossa dívida externa, e descubrade onde sai o dinheiro para pagá-la.

Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar

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Como nossa dívida externa aumentou maisde 100 bilhões de dólares nos anos 90

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O Brasil endividadoComo nossa dívida externa aumentou

mais de 100 bilhões de dólares nos anos 90

2ª reimpressão

Reinaldo GonçalvesValter Pomar

EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO

COLEÇÃO BRASIL URGENTE

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Fundação Perseu AbramoInstituída pelo Diretório Nacional

do Partido dos Trabalhadoresem maio de 1996

DiretoriaLuiz Dulci – presidente

Zilah Abramo – vice-presidenteHamilton Pereira – diretor

Ricardo de Azevedo – diretor

Editora Fundação Perseu Abramo

Coordenação EditorialFlamarion Maués

RevisãoMaria Vianna

Maurício Balthazar Leal

Capa e Projeto GráficoGilberto Maringoni

Editoração Eletrônica Augusto Gomes

Impressão Gráfica OESP

1a edição: junho de 20001ª reimpressão: agosto de 20002ª reimpressão: março de 2001

Tiragem da 2ª reimpressão: 2 mil exemplares

Todos os direitos reservados àEditora Fundação Perseu Abramo

Rua Francisco Cruz, 23404117-091 – São Paulo – SP – Brasil

Telefone: (11) 5571-4299Fax: (11) 5573-3338

Na Internet: http://www.fpabramo.org.brCorreio eletrônico: [email protected]

Copyright © 2000 by Reinaldo Gonçalves e Valter PomarISBN 85-86469-24-6

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Sumário

APRESENTAÇÃO............................................................................5

ORIGENS E CRESCIMENTO DA DÍVIDA.............................................7Herança colonial...............................................................................7Novas por velhas..............................................................................8Ianques, go home............................................................................10Dólar verde-oliva............................................................................10Quando a esmola é demais........................................................11

A SERVIÇO DA DÍVIDA...............................................................15A década perdida............................................................................15O retorno dos capitais.....................................................................18Ela é e(x)terna?...............................................................................21Um modelo torto............................................................................22Juro campeão..................................................................................23Uma economia vulnerável..............................................................26

POR UM MILÊNIO SEM DÍVIDAS...................................................28Quem deve para quem?..................................................................28A volta do cipó de aroeira..............................................................29Teria sido possível..........................................................................32A campanha contra a dívida.......................................................33

NOTAS E REFERÊNCIAS..........................................................36BIBLIOGRAFIA.............................................................................37PÁGINAS PARA PESQUISA NA INTERNET...........................................38ANEXOS - QUADROS E TABELAS.................................................39ÍNDICE DE BOXES......................................................................47

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4O BRASIL ENDIVIDADO

Reinaldo GonçalvesNasceu em 1951, no Rio de Janeiro. É economista, professor titular de Economia Inter-nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); foi membro da Divisão deQuestões Monetárias e Financeiras Internacionais, UNCTAD, Genebra (1983-87).

Valter PomarNasceu em 1966, em São Paulo. É historiador e 3º vice-presidente nacional do Partidodos Trabalhadores.

AgradecimentosGostaríamos de agradecer aos companheiros da Campanha Jubileu 2000,por um milênio sem dívidas, que nos encarregaram de escrever este livro;

bem como à Fundação Perseu Abramo, que acolheu a iniciativa.

NotaAs opiniões expressas neste livro são de inteira responsabilidade dos autores e não

representam, portanto, posições oficiais de partidos ou correntes políticas.

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5 GONÇALVES & POMAR

O Brasil é um país endividado.As pessoas e as empresas devem ao sis-

tema financeiro mais de 237 bilhões dereais. Em dezembro de 1999, o valor totalde atrasos no pagamento dos empréstimospassou de 24 bilhões de reais.

O setor público brasileiro deve mais de516 bilhões de reais – este valor inclui adívida do governo (esferas municipal, es-tadual, federal e do Banco Central), bemcomo a dívida das empresas estatais. Issoequivale a 47% do Produto Interno Bruto(PIB). Desse total, mais de 432 bilhões dereais são dívidas do governo federal.

A dívida externa brasileira, pública eprivada, atingiu 241 bilhões de dólares emdezembro de 1999 (ver Quadro 1 e tabe-las 1 a 3, nas p. 39 e 40).

A maior prova de que esse endivida-mento todo não resultou numa vida me-lhor para a maioria da população brasi-leira são os sem-emprego, os sem-terra,os sem-teto, os sem-escola, os sem-saú-de... encarnação viva de nossa enormedívida social.

“Todo ano o sistema financeiro internacional mata mais pessoas do que aSegunda Guerra. Mas, pelo menos, Hitler era louco.”

Ken Livingstone (Ken, o vermelho), prefeito de Londres

Dívida social, dívida pública, dívida pri-vada... O governo diz que só poderemospagá-las se houver crescimento econômi-co, o que dependeria, por sua vez, de in-vestimento estrangeiro. Que só virá parao país se formos pontuais no pagamentode nossa dívida externa e interna.

Trata-se de uma nova versão da fábulade “fazer o bolo crescer, para depois divi-di-lo”, utilizada pelo regime militar na épo-ca do “milagre brasileiro”. Primeiro pa-gamos os grandes capitalistas, credores denossa dívida externa e interna. Depois,pagamos a dívida social com a maioria dopovo.

Como todos sabem, o dia de dividir obolo nunca chega. Enquanto isso, as dívi-das só crescem, indicando que uma (nova)pane geral pode estar próxima.

Este livro trata principalmente da dívi-da externa brasileira, a ponta do iceberg,o nó das várias tramas que devem ser de-satadas para que possamos pagar a dívidarealmente importante: a dívida social. Epara que possamos mudar nossa política

Apresentação

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6O BRASIL ENDIVIDADO

econômica, que tem entre seus pilares adependência externa e a especulação fi-nanceira.

Buscamos sistematizar e atualizar as in-formações sobre a dívida externa brasilei-ra, contribuindo assim para o debate desteassunto e para a campanha contra a dívi-

da, que terá no ano de 2000 um momentomuito importante, com a realização de umgrande Plebiscito Nacional, no qual o povobrasileiro poderá dizer o que acha do acor-do com o Fundo Monetário Internacionale o que deve ser feito com as dívidas ex-terna e interna.

Um relatório produzido por cerca de duas milentidades brasileiras foi entregue, em abril de2000, à Organização das Nações Unidas (ONU),denunciando que o Brasil não está cumprindo oPacto Internacional de Direitos Econômicos, So-ciais e Culturais (PIDESC), do qual é signatáriodesde 1992. O “Relatório da sociedade civil bra-sileira sobre o cumprimento, pelo Brasil, doPIDESC” analisa o grau de implementação dos

direitos contemplados no Pacto (relacionados aospovos indígenas e outras minorias étnicas, meioambiente, desenvolvimento sustentável, discrimi-nação e desigualdades, questões de gênero, si-tuação agrária, desenvolvimento econômico pró-prio, trabalho e sindicalização, previdência social,descanso e lazer, família, saúde, alimentação enutrição, criança e adolescente, educação, cul-tura e moradia).

Direitos econômicos, sociais e culturais

Uma dívida pode ser privada ou pública, inter-na ou externa. Quando falamos que uma dívidaé pública ou privada, estamos nos referindo aquem contraiu o empréstimo: se foi uma pessoafísica ou uma empresa privada, a dívida é priva-da; se foi um órgão público, a dívida é pública.

Já quando falamos que uma dívida é internaou externa, nos referimos ao tipo de moeda emque essa dívida terá que ser paga: se a dívidapode ser paga em reais, trata-se de dívida inter-na; se a dívida tem que ser paga em moeda es-

trangeira, trata-se de dívida externa. Portanto,existem: dívida pública interna, dívida públicaexterna, dívida privada externa, dívida privada in-terna. Na perspectiva do desenvolvimento eco-nômico e social, as dívidas mais importantes sãoa dívida interna (pública) e a dívida externa (pú-blica mais privada). A primeira impõe constrangi-mentos ao orçamento público, enquanto a últimaaumenta a restrição das contas externas e pro-voca políticas e estratégias de ajuste com efeitosprofundos e amplos sobre a sociedade.

Os tipos de dívida

Fonte: Comissão Pastoral da Terra.

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Herança colonial

Quando veio para o Brasil em 1808, fu-gindo da invasão napoleônica, D. Joãotrouxe junto a dívida contraída pela CasaReal portuguesa na Inglaterra.

Em 1822, como parte dos acordos deIndependência, herdamos a dívida portu-guesa, da ordem de 1,3 milhão de librasesterlinas, correspondente a cerca de 30%do valor de nossas exportações.

Para liquidar essa e outras dívidas, o Im-pério nascente contraiu, em 1824, nosso pri-meiro empréstimo externo, no valor de 3,7milhões de libras. Foi o começo de umasérie de 17, contraídos pelo Império brasi-leiro no mercado financeiro de Londres, novalor total de 68,2 milhões de libras ester-linas. O Império conseguiu resgatar partedesse valor e transmitiu à nascente Repú-blica, proclamada em 1889, uma dívidaexterna de 30,4 milhões de libras.

Vale dizer que grande parte da dívidacontraída pelo Império nunca chegou ao

“Política valia tudo. Que também houvesse política lá fora, sim; mas quetinha ele com ela? Teófilo não sabia nada do que ia por fora, exceto a nossa

dívida em Londres, e meia dúzia de economistas.”Quincas Borba, romance de Machado de Assis

lançado em 1891 e ambientado no início dos anos 1870.

Brasil, tendo ficado em Londres mesmo,para pagar dívidas velhas, bem como paracobrir as comissões de credores e inter-mediários. De acordo com Frank GriffithDawson,

“apenas 60% da renda dos empréstimoschegaram à América Latina, grande par-te em bens e não em dinheiro [...] Dasquantias líquidas realmente colocadas àdisposição dos tomadores de emprésti-mos [...] cerca de dois terços foram en-viadas em mercadorias – equipamentomilitar, provisões navais, produtos têx-teis e ferragens”.

Na maioria das vezes, os empréstimosforam intermediados pela casa bancáriaRothschild & Sons.

Assim, as indústrias e o comércio ex-portador britânicos receberam durante oséculo XIX um enorme estímulo: as ex-portações para a América Latina subiramde 2,8 milhões de libras (1818) para 6,4milhões de libras anuais (1825), sendo que

Origens ecrescimento dadívida

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8O BRASIL ENDIVIDADO

o Brasil respondia por um terço ou atémetade desse total.

Novas por velhas

A prática de pagar dívidas velhas comdívidas novas prosseguiu na República.Quando terminou o governo WashingtonLuís, em 1930, o Brasil devia o equiva-lente a 237,3 milhões de libras esterlinas.

Uma novidade ocorrida durante a Repú-blica Velha (1889-1930) é a entrada emcena dos Estados Unidos. Entre 1915 e1930, os empréstimos públicos brasileiroscontratados em Nova York superaram emvalor os contratados em Londres. Mesmoassim, a Inglaterra continuou a ser, pormuito tempo ainda, nossa maior credora:em 1930, 64,5% do total da dívida públi-ca externa brasileira correspondiam a em-préstimos britânicos, contra 30,3% de em-préstimos norte-americanos.

O endividamento externo realizado noperíodo do Império e da República Velhaserviu, em última análise, para financiarimportações de bens manufaturados e ex-portações de bens primários. Portanto, nasduas pontas o endividamento não serviacomo estímulo para a industrialização,

pelo contrário. A crise de 1929, a Revolu-ção de 30 e a Segunda Guerra Mundialinterromperam este processo e empurra-ram o Brasil para a industrialização.

No final da República Velha, o Brasil jáestava gastando 25% de suas receitas deexportação com o serviço da dívida1. Em1931, o governo de Getúlio Vargas, resul-tante da revolução ocorrida no ano ante-rior, suspendeu os pagamentos.

Não foi a solução ideal para Vargas, quedizia: “Não pagar não é, nem pode ser, umprograma. É uma contingência infeliz, quese pode prever, mas que não é lícito pre-parar. A esta contingência chegamos numahora trágica para o Universo”, menção àcrise econômica iniciada em 1929, queprejudicou as exportações brasileiras eimpediu o país de obter as divisas neces-sárias ao pagamento da dívida.

Segundo o ministro da Fazenda deVargas, José Maria Whitaker,

“o Governo se tinha submetido e tinhasubmetido a Nação aos mais penosossacrifícios, a fim de que lhe não faltas-

A dívida externa bruta do Brasil já chega a 241bilhões de dólares, o que corresponde à médiade 6 mil dólares para cada chefe de família. Istoé, cada família brasileira já deve ao mundo qua-se 11 mil reais.

No entanto, como a dívida externa do governocorresponde a 41% da dívida externa total, a dí-vida externa média de cada família é de aproxi-madamente 5 mil reais, o restante é dívida dasempresas privadas.

A dívida pública externa vai ser paga por meioda tributação. Entretanto, não basta ao chefe defamília fazer uma aplicação na caderneta de pou-

pança agora, no valor de 5 mil reais, para arcarcom os custos futuros da dívida pública externa.Talvez seja necessário um depósito da ordem de10 mil reais, isto porque o custo da dívida exter-na (na forma, por exemplo, de títulos do governobrasileiro, os global bonds) será pago com jurosequivalentes a quase o dobro (em dólar) da ren-tabilidade (em dólar) da poupança no Brasil.Como é muito provável que, ao longo dos anos,a correção monetária da caderneta de poupançaseja inferior à variação cambial, quando a dívidafor “resgatada” você ainda vai ter que colocar maisdinheiro.

Quanto você deve ao mundo

1. Servir à dívida = amortizar o principal + pagaros juros. Serviço da dívida é o nome que se dá aovalor gasto no pagamento das amortizações ejuros.

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sem os recursos para a satisfação inte-gral de todos os compromissos; graçasa esta conduta severa, estava em con-dições de realizar plenamente o servi-ço de todos os empréstimos brasileiros,com o produto das rendas que arreca-dava; essas rendas, porém, eram arre-cadadas em papel e não em ouro, e emouro não podiam ser transformadas porfalta absoluta de cambiais [papéis re-presentativos de valor em moeda es-trangeira] de exportação; [não havia]no mercado cambial letras em quanti-dade suficiente para satisfazer ao ser-viço da dívida externa”.

Coube a Osvaldo Aranha, nomeado mi-nistro da Fazenda em novembro de 1931,auditar o endividamento externo do Bra-sil. Não havia nos arquivos cópia senãode 40% dos contratos de empréstimos fe-derais: “Os valores reais das remessas tam-bém eram ignorados. Não havia contabili-dade regular da dívida externa federal. Asituação na parte relativa aos estados emunicípios era semelhante ou mesmopior”, informa Valentim Bouças, em seulivro História da dívida externa.

A equipe responsável pelo estudo da dí-vida concluiu que

“as condições dos empréstimosefetuados eram onerosíssimas [conten-do] cláusulas vexatórias. Uma cláusulade um destes contratos dava ao banquei-ro o direito de, no caso de falta de paga-mento dos juros, cobrar, por suas pró-prias mãos, os impostos, e para esse fimera a administração obrigada a entregartodos os seus livros de lançamentos; emoutro, um Estado se obrigou a entregara determinada firma, escolhida pelo ban-queiro, parte do produto do empréstimodestinada a certos trabalhos. E era tãoidônea aquela firma que faliu e o Esta-

do, apesar de ter despendido elevadaimportância, não pode ver realizadosaqueles trabalhos”.

Em 1934, Osvaldo Aranha afirmou que

“o Brasil nunca pagou seus empréstimoscom seus próprios recursos. Fez sem-pre novos empréstimos para manter osantigos. Os saldos de sua balança de co-mércio não lhe permitiram nunca cobrira balança de contas [...] pagando dívi-das com novas dívidas, a nossa políticao que fez foi aumentar essas dívidas, aoinvés de diminuí-las”.

Para isso contribuíram também os “arti-fícios usados para postergar pagamentos,com emissão de títulos, que passam a cons-tituir praticamente novos empréstimos”.

A suspensão e a renegociação reduziramo serviço da dívida de 40 milhões de li-bras esterlinas no biênio 1930-31 para 44milhões de libras esterlinas nos seis anosseguintes, ou seja, no período 1932-37.

A essa altura, o mundo já estava às vés-peras da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A interrupção da entrada de capi-tais estrangeiros, somada à queda de nos-sas exportações, levou à nova suspensãodos pagamentos – em 20 de novembro de1937, dez dias depois do golpe que deuorigem ao Estado Novo.

Em março de 1940, o governo retomaos pagamentos, mas só em novembro de1943 é acertado um acordo “definitivo”com os credores.

Ao cabo, o estoque total de nossa dívidacaiu de 237 milhões de libras esterlinas(em 1939) para 169 milhões de libras es-terlinas (em 1945). E sobraram mais re-cursos para nossa industrialização. Nãopor acaso, a taxa média anual de cresci-mento real do PIB brasileiro subiu de 4,4%nos anos 30 para 5,9% nos anos 40.

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10O BRASIL ENDIVIDADO

Ianques, go homeApós a Segunda Guerra Mundial, os Es-

tados Unidos financiaram a reconstruçãoda Europa, por meio do Plano Marshall:uma “doação” de 14 bilhões de dólares (emvalores de 1948, o equivalente hoje a maisde 70 bilhões de dólares).

Já a América Latina, no período 1945-55, remeteu ao exterior o equivalente a10,5% de suas receitas de exportação, pormeio do pagamento do serviço da dívida eda remessa de lucros e dividendos dasmultinacionais instaladas em nosso conti-nente.

Entre 1950 e 1969, a América Latinaremeteu 28 bilhões de dólares para o ex-terior, contra 20 bilhões de dólares de in-vestimentos e empréstimos. O mecanis-mo principal da sangria foi a remessa delucros, que chegava a 16% na AméricaLatina.

No período 1947-56, o Brasil recebeu41 milhões de dólares a título de emprés-timos e investimentos. E remeteu, sob aforma de juros e dividendos, 754 milhõesde dólares: uma sangria de 713 milhõesde dólares.

Isso ajuda a entender por que, naqueleperíodo, tanto no Brasil como nos demais

países latino-americanos, grandes lutaspolíticas e sociais tinham como motivo adefesa da economia nacional, contra o im-perialismo e as “perdas internacionais”(ver tabelas 4, 5 e 6, na p. 41).

A mesma situação continuou após esseperíodo. Com exceção de Cuba (que op-tou por um desenvolvimento econômiconão-capitalista) e de curtos períodos nahistória de alguns países latino-america-nos (como o governo de Salvador Allende,no Chile, entre 1970 e 1973), a batalha foivencida pelos grandes capitalistas e lati-fundiários locais, que optaram pela con-dição de sócios menores do grande capi-tal internacional.

Essa vitória foi conseguida a ferro efogo: a começar pela Guatemala, em 1954,os golpes militares patrocinados pelos Es-tados Unidos tornaram-se lugar-comum nahistória latino-americana, abrindo cami-nho para grandes lucros e para o grandeendividamento dos anos 70 (ver tabelas 7a 10, nas p. 42 e 43).

Dólar verde-oliva

Quando aconteceu o golpe de 1964 noBrasil, a dívida era de cerca de 2,5 bilhõesde dólares. Quando o último presidente-

Endividamento e ditaduras militares andaramjuntos na América Latina. Em 1962, o governonorte-americano criou um programa de treinamen-to para as forças armadas do subcontinente. Nomesmo ano, o presidente argentino Arturo Frondizié deposto, dando início a um ciclo de golpes quedurou até 1984 e resultou no assassinato e/ou “de-saparecimento” de cerca de 30 mil pessoas.

Em 1963, outro golpe depõe o presidenteequatoriano. No mesmo ano, os militares depõemo presidente dominicano Juan Bosch; como não

Dívida e ditadurasfoi suficiente, em 1965 os marines invadem o paíscom o apoio de seis países latino-americanos,para esmagar uma insurreição popular. Em 1964é a vez do Brasil e da Bolívia. Em 1968, os milita-res depõem o presidente peruano Belaúnde Terry.Em 1973, é derrubado o presidente chileno Sal-vador Allende. No mesmo ano, os militares to-mam o poder no Uruguai. A contra-revolução pre-ventiva impediu que os países latino-americanosenfrentassem a crise dos anos 70 como fizeramdurante a crise dos anos 30.

Fonte: KUCINSKI, Bernardo e BRANFORD, Sue. A ditadura da dívida: causas e conseqüências da dívidalatino-americana. São Paulo, Brasiliense, 1987.

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11 GONÇALVES & POMAR

general saiu do Palácio, em 1985, a dívidatinha passado dos 100 bilhões de dólares.

Os primeiros ditadores, que governaramaté 1969 (Castelo Branco, Costa e Silva ea Junta Militar), endividaram-se relativa-mente pouco. Mas prepararam o terreno,principalmente por meio da reforma dosistema financeiro e do “aperfeiçoamen-to” da legislação relativa à entrada de ca-pitais estrangeiros.

No governo Médici (1969-74), ocorreuo chamado “milagre econômico”: a taxamédia anual de crescimento foi de 10,7%.Nesse período, a dívida externa já cresceumais rápido que nosso Produto InternoBruto: 211% contra 208%, respectivamen-te. Em termos de valor, a dívida externapassou de 11% do PIB, em 1969, para16,6% do PIB, em 1973. O Brasil passa areceber mais empréstimos em moeda doque “capital de risco”.

Entretanto, será no governo Geisel(1974-79) que a dívida externa experimen-tará seu grande crescimento. Num contex-to de crise econômica internacional – quetrataremos a seguir –, o governo optou porendividar-se para financiar o II Plano Na-cional de Desenvolvimento.

No período Geisel, a dívida passou de13,8 bilhões de dólares (fins de 1973) para52,8 bilhões de dólares (em 1978), umaumento de 283%. A dívida passou a re-presentar 26% de nosso PIB.

No governo Figueiredo (1979-85), omodelo chega ao limite: a partir dos anos80, o Brasil torna-se exportador líquido decapitais. Em 1984, a dívida correspondiaa 48,2% do PIB. Nesses seis anos, o Bra-sil transferiu para o exterior 21 bilhões dedólares a mais do que havia recebido. Oque só foi possível porque o governo esti-mulou a recessão interna e patrocinou umenorme esforço exportador, para gerar asdivisas necessárias ao serviço da dívida(ver tabela, 11, na p. 43).

Quando a esmolaé demais...

Depois da Segunda Guerra Mundial eaté 1973, o capitalismo viveu seu “perío-do de ouro”: crescimento econômico compleno emprego e ampliação do bem-estarsocial de amplos setores da população,

O II Plano Nacional de Desenvolvimento, apro-vado em 1974, tinha como objetivo concluir a in-dustrialização brasileira. Para isso, foi facilitadaa captação de capitais estrangeiros, para inves-timento em áreas como energia, siderurgia etransporte. Foi o caso da Eletrobrás, das Cen-trais Elétricas de São Paulo (CESP), daNuclebrás, da Itaipu Binacional, da Light Servi-ços de Eletricidade S/A, da Açominas, da Acesita,da Siderúrgica Tubarão, da Companhia Siderúr-gica Nacional, da Siderbrás, da Rede FerroviáriaFederal, particularmente a Ferrovia do Aço, daCompanhia do Metrô do Rio de Janeiro, da Su-perintendência da Marinha Mercante, da Transa-mazônica, da Ponte Rio-Niterói etc. As empre-

Os investimentos do II PNDsas privadas também se endividaram, mas amaior parte dos empréstimos, nesse período, foicaptada por governos e empresas públicas.

A oposição denunciou o caráter faraônico e acorrupção envolvida nos projetos do II PND, as-sim como os perigos do endividamento externo.No final do governo Geisel, as empresas públi-cas estavam superendividadas, servindo aindade captadoras de novos empréstimos, apenaspara garantir que o país pudesse honrar o servi-ço da dívida. Apesar disso, alguns especialistassustentam que, não fosse o choque do petróleoe a alta dos juros, os investimentos possibilita-dos pelos empréstimos gerariam os recursosnecessários ao pagamento da dívida.

Fonte: CRUZ, Paulo D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo, Brasiliense, 1984.

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pelo menos nos países centrais (ver tabe-las 12 e 13, nas p. 43 e 44). Na periferiado sistema, vários países alcançavam a in-dependência política e buscavam cami-nhos para a independência econômica.

No final dos anos 60, entretanto, o de-senvolvimento econômico dos países ca-pitalistas centrais começa a desacelerar. Enos anos 70 veio a crise.

Foi nesse contexto que o Brasil e outrospaíses contraíram grandes empréstimos,que só foram possíveis porque havia umaenorme massa de capitais disponíveis, atémesmo com juros reais negativos.

Esses capitais foram, principalmente,produto do crescimento que o capitalismoexperimentou após a Segunda GuerraMundial. O crescimento foi tamanho, queparte dos lucros não podia ser reinvestidana produção, sob pena de reduzir aindamais a taxa de lucro.

Um montante cada vez maior dos lu-cros começou, então, a ser desviado paraaplicações no sistema financeiro interna-cional, constituindo num primeiro mo-mento o que ficou conhecido como “eu-romercado”.

Além desse processo estrutural, é preci-so lembrar o fim da conversão automáticado dólar em ouro, as flutuações cambiais eo aumento no preço do barril de petróleo,que elevou o custo de produção (e os gas-tos em importação) da maioria dos paísesdo mundo, gerando mais recessão e prote-

cionismo nos países centrais e liberandoainda mais capitais para a especulação.

Esses vários fenômenos estão na origemdos empréstimos concedidos pelo sistemafinanceiro internacional para os paísespobres e em desenvolvimento.

No início, parecia ser um ótimo negóciopara os dois lados. Com os empréstimos,os países pobres e em desenvolvimentocompravam produtos das economias de-senvolvidas, azeitando economias que es-tavam em recessão e contribuindo para queelas suportassem melhor a crise. Por ou-tro lado, os empréstimos eram feitos a ta-xas de juros muito baixas: descontada ainflação, os juros chegavam a ser negati-vos. Mas uma parte cada vez mais expres-siva era emprestada a taxas de juros flu-tuantes – isto é, podiam variar de acordocom a evolução de taxas internacionaiscomo a Libor e a Prime2.

No final dos anos 70, quando o estoqueda dívida já era significativo, ou seja, ovalor da dívida era muito alto, houve novamudança na situação internacional, afetan-do profundamente os países endividados:outro aumento dos preços do petróleo, alta

O capitalismo alterna ciclos de expansão (porexemplo: 1870-1913 e 1950-1973) com períodosde crise.

A primeira crise do século XX durou de 1929 a1939 e só foi superada com os investimentos (ecom a destruição maciça) provocados pela Se-gunda Guerra Mundial. A segunda crise teve iní-cio em 1973, e vem sendo enfrentada com umcoquetel de remédios: enormes déficits públicos

(principalmente nos Estados Unidos), inovaçõestecnológicas, superexploração da força de traba-lho, aumento do comércio (inclusive do comércioespeculativo, ou seja, compra e venda de moe-da) e doses variáveis de guerra (Guerra Fria,guerras de baixa intensidade, conflitos localiza-dos como os do Vietnã, do Iraque e do Golfo).Mas até o momento as taxas do crescimento ca-pitalista continuam baixas.

Expansão e crise

2. Libor (London interbank offered rate) e primerate são duas taxas utilizadas como referêncianos contratos a juros flutuantes. A prime rate éuma taxa de juros utilizada para empréstimos nomercado bancário norte-americano; a Libor,utilizada para empréstimos no mercado bancáriolondrino, foi criada pelo próprio mercado deeurodólares.

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dos juros norte-americanos e aprofunda-mento da recessão.

O preço do barril de petróleo subiu de12,4 dólares para 34,4 dólares, acarretan-do um adicional de despesas na balançacomercial brasileira de 37,3 bilhões dedólares entre 1979 e 1983.

A recessão mundial dificultava, cadavez mais, nossas exportações. A balançacomercial foi pressionada, também, peladeterioração nas relações de troca do Bra-sil com os países capitalistas centrais:para importar uma mesma quantidade debens, tínhamos que exportar cada vezmais. Este fenômeno é comum à maioriados países “atrasados” ou “em desenvol-vimento”: a maior parte dos produtos queestes países vendem para o exterior (ma-térias-primas e produtos agrícolas) têmseus preços constantemente reduzidos,enquanto a maioria dos produtos que es-tes países importam (manufaturados emáquinas) sobe de valor.

Mas o golpe maior veio com o aumentoda taxa de juros nos Estados Unidos: ataxa básica de empréstimos bancários su-biu de 5,7% para 18,8%, entre 1975 e1984, acarretando para o Brasil despesasextras de 26,6 bilhões de dólares apenasnesse período.

Como resultado, aumentaram o estoquee o serviço da dívida, reduzindo-se a ca-

pacidade de o Brasil obter divisas paraviabilizar o seu pagamento. O país, de re-cebedor líquido de capitais, torna-se umexportador de capitais.

O aumento da taxa de juros norte-ame-ricanos fecha o ciclo: os capitais que vie-ram como generosos empréstimos voltamengordados a seus países de origem. A san-gria das riquezas da periferia, feita antessob a forma principal da remessa de lu-cros, passou a ser feita sob a forma princi-pal de pagamento da dívida.

Durante os anos 80, o Brasil conseguiu umsuperávit (exportações - importações = saldocomercial positivo) de 99,5 bilhões de dóla-res na sua balança comercial. Mas acumulouum déficit de US$ 141, 9 bilhões na balançade serviços. Desse déficit, 97,3 bilhões de dó-lares eram referentes a juros e 9,1 bilhão dedólares a remessa de lucros e dividendos.Noutras palavras, o Brasil enviou para o ex-terior, durante a década de 80, a quantia lí-quida de 42,3 bilhões de dólares. Tornara-seum “exportador” de capitais.

Exportando capitais

A conversão automática do dólar em ouro (1dólar para 0,888 gramas de ouro) foi estabelecidapelo acordo de Bretton Woods. Assinado no dia22 de julho de 1944, em New Hampshire, Esta-dos Unidos, pelos representantes dos países Alia-dos, o acordo tratou de três assuntos: sistemamonetário, regras comerciais e planos de recons-trução para as economias destruídas pela guer-ra. O acordo sobre o funcionamento do sistemamonetário internacional privilegiou os interessesdos Estados Unidos, mas a conversibilidade au-tomática tentava impor algum tipo de controle

sobre o dólar americano. Ocorre que a expansãoda economia norte-americana no pós-guerra ge-rou uma situação insustentável: o Tesouro ame-ricano detinha 13,5 mil toneladas de ouro, o equi-valente a 12 bilhões de dólares; nesse mesmomomento, os estrangeiros possuíam 75 bilhõesde dólares. Diante desse quadro, em 15 de agostode 1971, o presidente norte-americano Nixondecretou unilateralmente o fim da convertibilidadedo dólar em ouro, o que também significava o fimda paridade fixa entre dólar e ouro e entre o dólare as outras moedas.

O acordo de Bretton Woods

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Os Estados Unidos são o país mais endivida-do do mundo. Segundo o economista EduardoGiannetti, “o estoque da dívida das empresas efamílias nos EUA passou de cerca de 120% para132% do PIB americano. As famílias americanastêm dívidas que equivalem hoje a 103% de suarenda disponível e os juros absorvem em média13,4% de seus rendimentos anuais”. O consumoprivado, que explica parte da pujança econômicanorte-americana, está ancorado por sua vez nomercado financeiro e acionário: 57% da riquezaprivada (de pessoas físicas) consiste de ativosfinanceiros e 43% da população adulta têm in-vestimentos no mercado de ações. As ações re-presentaram 28% da riqueza financeira dos do-micílios em 1997. Ainda segundo Giannetti, “osamericanos passaram a depender de doses cres-centes de poupança externa para cobrir seusgastos (importações) e honrar seus compromis-

O maior devedor do mundosos (remessas de juros, lucros e dividendos) como resto do mundo. O déficit em conta correntedos EUA, que somava perto de 1,5% do PIB em1994, hoje alcança 4,1% do PIB norte-america-no. Isso significa que o mundo está transferindocerca de 360 bilhões de dólares ano ano parafinanciar o sonho americano”. O déficit comercialnorte-americano atingiu 271 bilhões de dólaresno ano de 1999 e, apenas no mês de janeiro de2000, chegou a 28 bilhões de dólares. Os Esta-dos Unidos financiam esse nível de consumo edéficit, em parte por serem a locomotiva da eco-nomia mundial (20% do valor da produção mun-dial, estimada em 30 trilhões de dólares); em partepor ser o dólar a moeda mundial de fato; e emparte porque os Estados Unidos beneficiam-seda especulação mundial. Nesse sentido, o servi-ço da dívida externa brasileira é, de fato, um ser-viço ao grande capital norte-americano.

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A década perdida

Nos anos 30, vários países latino-ame-ricanos suspenderam total ou parcialmen-te o serviço de suas dívidas, o que facili-tou seu desenvolvimento e sua industria-lização.

Nos anos 80, a história foi outra. Em ape-nas três anos (1981-83) a América Latinadesembolsou 81,7 bilhões de dólares comopagamento do serviço da dívida, o dobrodo que havia pago durante os anos 70.

O resultado foi a chamada década per-dida: estagnação econômica, inflação altae crise social. A crise acelerou a queda dasditaduras, geralmente substituídas por go-vernos civis que continuaram servindo àdívida.

No final de 1981, o governo brasileirodizia que no ano seguinte haveria uma“sensível melhoria nos indicadores rela-tivos de endividamento externo”. Mas,

Roncou, roncou,/ roncou de raiva a cuíca,/ roncou de fome.../ alguémmandou,/ mandou parar/ – a cuíca é coisa dos home./ A raiva dá pra

parar, pra interromper./ A fome não dá pra interromper./ A fome e a raiva écoisa dos home./ A fome tem que ter raiva pra interromper./ A raiva e a

fome de interromper./ A fome e a raiva é coisa dos home./(O ronco da cuíca, de João Bosco e Aldir Blanc)

em agosto de 1982, o governo mexicanonão conseguiu continuar pagando a dívi-da e declarou moratória. Como reação,os bancos privados praticamente inter-romperam os créditos novos para os paí-ses devedores, inviabilizando assim acontinuidade da rolagem “espontânea” dadívida externa.

Tem início, então, um processo dereprogramação e refinanciamento das dí-vidas externas, sob supervisão do FundoMonetário Internacional (FMI), a quemcabia assegurar o pagamento integral dosjuros da dívida. Sem isso, os principaisemprestadores dos anos 70, os bancos pri-vados, poderiam quebrar, gerando conse-qüências terríveis para o capitalismo dospaíses centrais.

A renegociação da dívida com os credo-res oficiais foi feita pelo chamado Clubede Paris – grupo de países credores, cria-do em 1956, que mantém laços estreitoscom o FMI. A negociação das dívidas com

A serviço da dívida

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os bancos privados foi conduzida por umcartel destes, chefiado no caso brasileiropelo Citybank.

Enquanto os credores atuavam comocartel, os devedores foram tratados caso acaso, vinculando eventuais acordos a ado-ção de programas de ajuste supervisiona-dos pelo FMI.

A primeira carta de intenções entre ogoverno brasileiro e o Fundo, assinada emjaneiro de 1983, diagnosticou a crise eco-nômica do país como resultado da situa-ção internacional, mas também de fato-res internos como: “excessivo endivida-mento externo”; “excessiva presença de

empresas estatais na economia”; “exces-sivo volume de incentivos fiscais e sub-sídios creditícios”; “distorções nas taxasalfandegárias, restrições às importaçõese operações cambiais”; “aumentos sala-riais para os trabalhadores, acima da pro-dutividade”.

A criatividade nunca foi o forte do FMI:todos os países vitimados pela crise dadívida receberam o mesmo diagnóstico eo mesmo remédio. Por isso, sofreram ba-sicamente as mesmas conseqüências:recessão econômica acompanhada de al-tas taxas de inflação, crise social acompa-nhada de instabilidade política.

A dívida abriu a porta para o neolibera-lismo: anos depois, o mesmo diagnósticoseria repetido pelo “Consenso de Washing-ton”.

O programa de ajuste acertado com oFMI visava, a médio e longo prazos, alte-rar o padrão de desenvolvimento e modi-ficar a forma de inserção do Brasil na eco-nomia mundial. De imediato, para honraro serviço da dívida, tratava-se de gerarmegasuperávits comerciais.

As metas firmadas em sucessivas “car-tas de intenções” nunca foram plenamen-te alcançadas. O crescimento das lutaspopulares e a vitória da oposição liberalnas eleições de 1982 reduziram bastante amargem de manobra do último governomilitar, que temia ser derrotado na eleição

A “década perdida”, paradoxalmente, foitambém de enormes avanços organizativose políticos para os trabalhadores brasileiros:a Anistia (ainda que parcial e “recíproca”), areconstrução da União Nacional dos Estudan-tes (UNE), a criação do Partido dos Traba-lhadores (PT) e o surgimento ou a legaliza-ção de outros partidos de esquerda, osurgimento da Central Única dos Trabalha-dores (CUT) e do Movimento dos Trabalha-dores Rurais Sem Terra (MST), a inscrição deimportantes direitos na Constituição e o fan-tástico desempenho da esquerda nas elei-ções de 1988 e 1989. Nos anos 90, tambémuma década economicamente perdida, a clas-se trabalhadora viveu uma fase defensiva.

Os ganhos da“década perdida”

Os 44 delegados presentes à Conferência deBretton Woods criaram o Fundo Monetário Inter-nacional (FMI) e o Banco Internacional de Re-construção e Desenvolvimento (BIRD, mais co-nhecido como Banco Mundial). O BIRD seria res-ponsável pelo financiamento de projetos de re-cuperação e construção da infra-estrutura neces-sária ao desenvolvimento econômico. O FMI te-ria a função básica de fornecer recursos finan-

O Fundo Monetário Internacionalceiros, tal como um banqueiro de última instân-cia, para aqueles países que apresentassemdéficits nas contas externas, decorrentes de con-junturas internacionais adversas.

Na prática, tanto o FMI como o Banco Mundi-al ganham importância com a crise da dívida,emprestando para aqueles países que se dis-põem a adotar programas de ajuste de caráterneoliberal.

Fonte: BARROS, Marcos César Lopes. Um estudo sobre o papel do FMI no sistema financeiro internacional.Dissertação de mestrado apresentada no IEI-UFRJ, 1994.

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presidencial indireta marcada para o iní-cio de 1985.

O período em que o governo se submetequase totalmente às exigências do FMI(dezembro de 1983/setembro de 1984) co-incide com o auge da campanha pelas elei-ções diretas para a presidência da Repú-blica; as eleições terminam sendo indire-tas, com a vitória do candidato da oposi-ção liberal, Tancredo Neves. Como estemorre antes de tomar posse, um acordoinconstitucional garante a posse do vice-presidente José Sarney (que apenas novemeses antes era presidente do Partido De-mocrático Social – PDS, que dava susten-tação parlamentar à ditadura militar).

Ironicamente, em fevereiro de 1987,caberia ao presidente Sarney informar em

pronunciamento oficial que, devido àqueda no superávit comercial e à redu-ção nas reservas brasileiras, o governodecidira suspender unilateralmente todosos pagamentos de juros relativos à dívi-da externa de médio e longo prazo, devi-da aos bancos comerciais estrangeiros.Ao mesmo tempo, foram congelados osdepósitos comerciais e interbancários emagências de bancos brasileiros no exte-rior. Segundo Paulo Nogueira Batista Jr.,se nenhuma medida fosse adotada, as re-servas brasileiras estariam totalmente es-gotadas em questão de meses (em fins defevereiro de 1987, as reservas haviambaixado para pouco mais de 3 bilhões dedólares, o equivalente a menos de trêsmeses de importação).

Neoliberalismo: até a Primeira Guerra Mundial,o liberalismo era a doutrina preferida pelos capi-talistas. Na política, o liberalismo defendia umademocracia super-restrita, sendo que o direito devoto era muitas vezes limitado aos proprietários.Na economia, o liberalismo defendia o máximode direitos para o Capital e o mínimo de direitospara o Trabalho.

Após a Segunda Guerra Mundial, depois de 30anos de catástrofes e diante de um forte movi-mento socialista, os capitalistas transitaram paraoutra doutrina, segundo a qual cabe ao Estadoadotar políticas que previnam as causas eremediem os efeitos das crises econômicas –evitando que elas se transformem em catástro-fes, guerras e revoluções. Essa nova doutrinaeconômica – geralmente chamada de keynesia-nismo – foi dominante nas décadas de 1950 e1960. Mas as receitas keynesianas não conse-guiram debelar a crise dos anos 70. Com isso,pouco a pouco tornou-se hegemônica entre osgrandes capitalistas a doutrina chamada deneoliberal, que recupera as idéias do liberalismo:menos gastos sociais, menos impostos,privatizações, liberdade de comércio, livre trân-sito dos capitais, menos sindicatos etc. A doutri-na neoliberal orientou a grande ofensiva do Ca-

Neoliberalismo e Consenso de Washingtonpital contra os governos socialistas, social-demo-cratas e nacional-desenvolvimentistas, tudo emnome de uma sociedade “mais livre e mais rica”.O resultado está aí para quem quiser ver: 16% dapopulação controlam 80% da riqueza mundial.

Consenso de Washington: a expressão surgiunum encontro organizado na capital dos EstadosUnidos, em novembro de 1989, pelo Institute forInternational Economics e patrocinado pelo Ban-co Mundial, FMI, Banco Interamericano de De-senvolvimento e pelo próprio governo norte-ame-ricano, para discutir políticas econômicas para aAmérica Latina. Eis os principais pontos do “con-senso”: controle do déficit fiscal, cortes nos gas-tos públicos, reforma tributária, administração dastaxas de juros e câmbio, abertura do mercado eliberação de importações, liberdade para entra-da de investimentos externos, privatização dasempresas estatais, desregulamentação da eco-nomia, eliminação de barreiras restritivas, redu-ção de direitos trabalhistas, garantia de direitosde propriedade etc. Durante a campanha de 1994,Fernando Henrique Cardoso foi acusado de serum agente da implantação do Consenso de Wa-shington no Brasil, para concluir a adesão do paísà ortodoxia neoliberal, tarefa iniciada porFernando Collor.

Fonte: ARRUDA, Marcos e QUINTELA, Sandra. ABC da dívida externa: a vida antes que a dívida. Salvador,CESE/CONIC, 1999.

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Adotada por falta de opções, como me-dida de desespero, por um governo cujoapoio popular era declinante e desacom-panhada de medidas que modificassem omodelo econômico brasileiro, a morató-ria foi rapidamente abandonada. Em no-vembro de 1987, o governo brasileiro jáestava negociando a retomada dos paga-mentos.

Mas a normalização das relações com a“comunidade econômica internacional”ainda demandaria algum tempo e a parti-cipação de Bresser Pereira, ministro daFazenda que sucedeu o artífice da mora-tória, Dilson Funaro; de Marcílio MarquesMoreira, embaixador em Washington du-rante o governo Sarney (1985-1989) eministro da Fazenda durante parte do go-verno Collor (1990-1992); de ArmínioFraga, diretor do Banco Central durante ogoverno Collor; de Pedro Malan, presiden-te do Banco Central no governo ItamarFranco (1992-1994); e do próprioFernando Henrique Cardoso. Cada umdestes senhores é responsável direto peloduvidoso mérito de o Brasil ter retomadosua condição de “bom pagador”.

O retorno dos capitais

Em 1994, Fernando Henrique Cardoso,então ministro da Fazenda, declarou aoSenado que estava “extremamente felizcom o fim do problema da dívida externa”.

A felicidade tinha uma explicação: oingresso de capitais estrangeiros ganha-ra alento em meados de 1991. Processosimilar ocorreu em toda a América Lati-na, com a entrada líquida total de capitaispassando de 9,3 bilhões de dólares (1989)para 60,8 bilhões de dólares (1992). AÁsia também conheceu o mesmo fenô-meno, que acabou por ser a principal cau-sa da crise asiática que eclodiu em outu-bro de 1997.

Para atrair esses capitais, o governo bra-sileiro adotou várias medidas, entre asquais uma elevada taxa de juros. De ja-neiro de 1992 a junho de 1994, a taxamédia anualizada de juros internos foi oitovezes superior à taxa internacional, esti-mulando as empresas privadas a tomar re-cursos no mercado externo.

Mas era preciso dar garantias ao capitalestrangeiro. Uma dessas garantias foi aassinatura de um acordo de reestruturação

O Brasil era, até abril de 1994, o único dos prin-cipais devedores latino-americanos que ainda nãohavia aderido ao chamado Plano Brady. A ade-são brasileira foi negociada no final do mandatode Fernando Collor, por um governo profunda-mente fragilizado, ameaçado de impeachment,que tentava apressar a definição das caracterís-ticas fundamentais do acordo, com o intuito decriar um fato político capaz de reforçar sua basede apoio externa e suas chances de sobrevivên-cia em face da crescente oposição interna. A

finalização do acordo ocorreu, por sua vez, du-rante a gestão de um ministro da Fazenda quepreparava sua candidatura à presidência da Re-pública e encontrava na conclusão da negocia-ção com os bancos estrangeiros um meio de so-lidificar o suporte internacional a suas pretensõespolíticas. Por isso, Fernando Henrique estava dis-posto não só a respeitar integralmente as condi-ções aceitas por Collor como a introduzir modifi-cações nos termos originais que tornaram o acor-do ainda mais oneroso para o país.

Como se “resolveu” a crise da dívida

Fonte: BATISTA Jr., Paulo Nogueira & RANGEL, Armênio de Souza. A renegociação da dívida externa bra-sileira e o Plano Brady: avaliação de alguns dos principais resultados. Caderno Dívida Externa. São Paulo,Pedex/CESE, n. 7,1994, p. 33.

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da dívida externa, que aparentemente te-ria encerrado a “crise da dívida”.

Nas negociações realizadas entre 1982e 1988, os credores eram contrários à re-dução no valor da dívida. Em 1989,Nicholas Brady, então secretário do Tesou-ro dos Estados Unidos, apresentou um pla-no cujos princípios orientaram o acordoassinado em abril de 1994, no final da ges-tão de Fernando Henrique Cardoso comoministro da Fazenda. Logo depois de assi-nar o acordo, ele seria lançado candidatoà presidência da República.

O Plano Brady previa a redução no va-lor da dívida externa, mediante a reduçãodo principal ou das taxas de juros. Previa,também, a extensão dos prazos de paga-mento e a substituição de obrigações comtaxas de juros flutuantes por títulos comtaxas fixas.

A maioria dos acordos realizados porpaíses latino-americanos, com base nosprincípios do Plano Brady, resultaram emdescontos moderados, não ocorrendo re-dução significativa do nível de endivida-mento.

No caso brasileiro, o acordo firmado emabril de 1994 referia-se apenas a parte dadívida do setor público com bancos comer-

ciais estrangeiros. Em números redondos,o acordo dizia respeito a uma parcela de49 bilhões de dólares, de uma dívida ex-terna total (em dezembro de 1993) de 145bilhões de dólares. O desconto efetivo as-sociado ao acordo foi de 3,7 bilhões dedólares ou de 7,6% do valor da dívida afe-tada pelo acordo. Na prática, entretanto, oacordo

“representou o levantamento da mora-tória parcial que vigorava desde 1989.Com a entrada em vigor do acordo,substituiu-se a dívida velha, sujeita auma suspensão parcial de pagamentos,por bônus que não permitem a capitali-zação dos juros. O resultado é um au-mento significativo dos pagamentos emcomparação com a situação anterior aoinício do processo de negociação, quan-do o Brasil pagava 30% dos juros devi-dos. [Como resultado] a despesa anuallíquida com juros no primeiro ano [devigência do acordo] alcança 2,5 bilhõesde dólares, aproximadamente o triplo dadespesa de juros na situação anterior eapenas 600 milhões de dólares a menosdo que se pagaria caso estivessem vigen-tes as condições contratuais anteriores”.

Como resultado da política econômica adota-da por Collor e Fernando Henrique, de “aberturacomercial e financeira”, o Brasil acumulou, entre1991 e 1999, um déficit de 132 bilhões de dóla-res em suas relações com o mundo. Para cobri-lo, o Brasil depende dos capitais estrangeiros,que podem ser divididos em três categorias: em-préstimos, investimento direto e capitalespeculativo.

O capital especulativo, como o próprio nomeindica, é de curto prazo e tira mais recursos dopaís do que traz benefícios. A maior parte doinvestimento direto foi destinada a compra deempresas (estatais ou privadas). Financiou, por-tanto, a transferência de patrimônio, não a cria-ção de riqueza nova. Com um agravante: quan-

Aumenta a dependência externado estrangeiros, os novos proprietários, mesmoque sua atividade não gerasse um único dólarpara o país, passaram a remeter lucros e divi-dendos para suas matrizes no estrangeiro. Fi-nalmente, os empréstimos: em sua maioria, fo-ram feitos por empresas privadas, que pegaramdinheiro no exterior, a taxas de juros mais bai-xas que as do Brasil. Esses empréstimos au-mentaram a dívida externa, mas geralmente nãoforam aplicados em atividades que gerassem di-visas (e, portanto, que ajudassem a captar osdólares necessários para pagar sua própria dí-vida). O resultado é que o Brasil se torna cadavez mais dependente do capital estrangeiro, paracobrir os déficits gerados por este mesmo capi-tal, num círculo vicioso.

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O Brasil só conseguiu cobrir o serviçoda dívida graças ao extraordinário afluxode capitais, que ampliou “nossas” reser-vas em moeda estrangeira (ver tabelas 14e 15, na p. 44).

O fato de conseguirmos “servir à dívi-da” não implicou redução de seu estoque(ver na tabela 2, na p. 40, a evolução dadívida brasileira entre 1993 e 1999).Tampouco ampliou a capacidade do paísde gerar divisas próprias em moeda estran-geira (nesse sentido, o endividamentoocorrido nos anos 90 é pior do que o dosanos 70).

Como subproduto do fluxo de capitaisestrangeiros, mas também por motivos po-lítico-eleitorais, a nova moeda brasileira,o real, foi artificialmente valorizada emrelação ao dólar. Como uma das conse-qüências disto, entre 1995 e 1999, as im-portações (mais baratas) superaram as ex-portações (mais caras), gerando um défi-cit comercial acumulado de 24,7 bilhõesde dólares.

No caso da balança de serviços – queregistra viagens internacionais, fretes, re-messas de lucros, pagamentos de royaltiese juros da dívida externa –, o déficit acu-mulado entre 1995 e 1999 é de 122,7 bi-lhões de dólares (ver tabela 16, na p. 45).

Entre 1994 e 1995, o déficit das transa-ções correntes (soma do déficit comercialcom o déficit de serviços) entre o Brasil eo mundo decuplicou, indo de 1,7 bilhãode dólares para 17,9 bilhões de dólares. Odéficit acumulado, entre 1995 e 1999, nabalança de transações correntes alcançou134,7 bilhões de dólares!

O crescimento do passivo externo totaldo país (ver tabela 17, na p. 45) foi acom-panhado pelo crescimento da dívida pú-blica interna, que no final de 1999 soma-va 516 bilhões de reais. A previsão é que,apenas no ano de 2000, o governo federaldeverá pagar 69 bilhões de reais aos de-tentores da dívida interna pública.

O vigoroso fluxo de capitais estrangei-ros permitiu, durante um curto período, con-tornar todos esses déficits. Nos últimosanos, embora crescentemente endividado,o país não atrasou seus pagamentos. Mas,com as crises do México (1994) e do Sudes-te Asiático (1997), os capitais começaram acobrar ainda mais caro para ingressar num“mercado emergente” como o Brasil.

Com a crise da Rússia (1998), as reser-vas brasileiras caíram velozmente: de 74bilhões de dólares em abril de 1998, che-gamos a 33 bilhões de dólares em marçode 1999.

O Brasil sempre foi altamente integrado à eco-nomia internacional. Basta lembrar que os recur-sos saídos daqui, na época colonial, ajudaramno que Marx denominou “acumulação primitivado capital”. Durante séculos, a atividade econô-mica brasileira foi dirigida aos mercados euro-peus e, portanto, submetida aos ciclos daquelaseconomias.

Com a industrialização, mudou o tipo de cone-xão do Brasil com a economia capitalista interna-cional, inclusive com a instalação de importantesmultinacionais no país. De 1930 aos anos 80, ocentro dinâmico de nossa economia transferiu-se progressivamente para o próprio país. Com

as reformas neoliberais de Collor e de FernandoHenrique, a economia brasileira tornou-se nova-mente muito vulnerável aos humores da econo-mia internacional. Essa vulnerabilidade expres-sa-se num crescente passivo externo, que é cons-tituído pelo estoque da dívida externa e pelo es-toque do capital estrangeiro investido no país. Opassivo externo tem como resultado um conjun-to de valores que o Brasil tem de remeter, anual-mente, a título de: serviço da dívida, remessa delucros e dividendos, pagamentos de royalties, fre-tes e seguros, importações etc. Nos anos 90, adívida externa cresceu, mas o passivo externocresceu muito mais.

O passivo externo do país

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A fuga de capitais comprometeu a ca-pacidade de pagar a dívida e financiar osdéficits. Para evitar a suspensão dos pa-gamentos, o governo brasileiro negociouum empréstimo “preventivo” de 41,5 bi-lhões de dólares junto ao FMI, ao BancoInternacional de Compensações (BIS) e aoBanco do Japão.

No início de 1999, a maioria dos analis-tas voltou a falar nas dificuldades parahonrar a dívida. Como acontecera nos anos70, ao fluxo seguiu-se o refluxo. Com umdetalhe: o presidente Fernando Henriquee seu o ministro da Fazenda, Pedro Malan,protagonistas da ida ao FMI nosanos 90, combateram a políticade endividamento da ditadura esua submissão às receitas doFundo. Quem terá esquecido oque dizia?

Ela é e(x)terna?

Ao final de 1999, a dívida ex-terna brasileira era de 241,2 bi-lhões de dólares. Deste total,212,6 bilhões de dólares eramdívida de médio/longo prazo (su-perior a um ano); e 28,6 bilhõesde dólares de dívida de curto prazo.

Da dívida total, 100 bilhões de dólaressão dívida do setor público não-financei-ro e 141,2 bilhões de dólares são dívidado setor privado. A predominância dosdébitos privados é um fenômeno que vemdesde 1996, quando os empresários con-traíram empréstimos externos a juros bai-xos, lucrando depois com os altos jurosinternos.

A distribuição por moeda revela umaabsoluta preponderância do dólar norte-americano, cerca de 86% da dívida regis-trada. Em 1997, 43% da dívida registradaestava nas mãos de bancos comerciais

(brasileiros e estrangeiros, principalmenteamericanos) e 16% com organismos eagências internacionais (como FMI, Ban-co Mundial etc.). Outra parte correspondea papéis negociados no mercado financei-ro internacional, pulverização que compli-ca a gestão e a eventual renegociação dadívida.

Segundo o Banco Central, a amortiza-ção da dívida externa registrada de médioe longo prazos implicará o desembolso, atéo final do mandato do próximo presidente(2006), de um valor superior a 80 bilhõesde dólares. Mas o valor final será maior: o

Banco Central calcula que osvencimentos de médio e lon-go prazos para 2000 superarãoos 30 bilhões de dólares. Aprevisão é que a despesa comos juros chegue a 17 bilhõesde dólares.

Nossa dívida externa totalequivale a 42% da riqueza queo Brasil produz durante umano inteiro. Ou cinco anos denossas exportações. Seis vezesas reservas em moeda estran-geira em posse do Banco Cen-tral em março de 20003.

Nos últimos 30 anos (1968/1999), em valores nominais, o estoque dadívida externa brasileira cresceu 237 bi-lhões de dólares! Se tomarmos como pon-to de partida o ano de 1982 (crise do Mé-xico), o estoque cresceu 158 bilhões dedólares. Se nos limitarmos ao período(1995/1998), correspondente ao primeiromandato do atual presidente, FernandoHenrique Cardoso, o estoque da dívidacresceu 99 bilhões de dólares.

3. Em 1999, o PIB brasileiro atingiu 562 bilhões dedólares e as exportações atingiram 48 bilhões dedólares. Em março de 2000, o Brasil detinha 38,4bilhões de dólares em suas reservas (“caixa”).Conjuntura Econômica, fev. 2000 & Banco Central,Nota para a imprensa, 17 abr. 2000.

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Analisando esses números fantásticos,alguém pode imaginar que o Brasil nuncapagou nada. Engano: só durante o primei-ro mandato de Fernando Henrique (1995-98), desembolsamos cerca de 128 bilhõesde dólares a título de juros e amortização.Quanto mais pagamos, mais devemos. Épor isso que muita gente diz que a dívidaexterna é, na verdade, “eterna”.

Um modelo torto

Com o pagamento do serviço da dívida,parte da riqueza criada no país foitransferida para o exterior e/ou se concen-trou ainda mais, ampliando a desigualda-de social.

Como o Brasil é um dos países mais de-siguais do mundo em termos sociais, aomesmo tempo que é uma das principais

economias mundiais, fica claro que a elitebrasileira é co-beneficiária do processo detransferência de riqueza.

A sociedade com o grande capital inter-nacional – inclusive no endividamento –é uma das características do capitalismobrasileiro, ao lado do latifúndio, dasuperexploração da força de trabalho, daconcentração de renda e de propriedade.

A transferência de riqueza para o ex-terior e a concentração interna de rique-zas são faces distintas do mesmo fenô-meno. Aliás, nossas elites guardam forado país um montante substancial de suasriquezas.

Parte da transferência de riqueza ocor-reu por meio do chamado “serviço da dí-vida”. Mas este é apenas um dos mecanis-mos de transferência de riquezas geradasno Brasil em direção aos centros econô-micos mundiais. Há outros mecanismos,

A evidência empírica a respeito da desnaciona-lização da economia brasileira é conclusiva (vertabela 18). A relação entre o fluxo de investimentoexterno direto e a formação bruta de capital fixoaumentou de 2,5% em 1995 para 24,6% em 1999.

Como resultado, as empresas estrangeiras,que controlavam 6,8% do estoque de capital fixototal no País em 1995, passaram a controlar12,4% em 1999. A participação estrangeira noestoque líquido de riqueza total aumentou de5,7% em 1995 para 9,7% em 1999. O aumentoda participação estrangeira no valor bruto da pro-dução não foi menos significativo: 13,5% em 1995e 24,6% em 1999. Vale ainda mencionar que aparticipação estrangeira no valor das vendas das550 maiores empresas aumentou de 33,3% em1995 para 43,5% em 1998.

No que se refere a um setor-chave da econo-mia – o setor bancário –, a desnacionalizaçãodobrou em quatro anos. A participação dos gran-des bancos estrangeiros no total dos ativos dosistema bancário brasileiro aumentou de 11,9%em 1995, para 22,5% em 1998 e cerca de 24%em janeiro de 2000.

Fluxo de investimento bruto = Investimentoexterno direto (excluindo conversão e descontan-

Investimento direto e desnacionalizaçãodo a repatriação) / formação bruta de capital fixo(em valores correntes).

Estoque de capital fixo = Imobilizado das em-presas estrangeiras / estoque líquido de capitalfixo produtivo (estruturas não-residenciais e má-quinas e equipamentos); em valores constantesde 1995.

Estoque líquido de riqueza = patrimônio líqui-do das empresas estrangeiras / estoque líquidode riqueza total (estruturas residenciais; estrutu-ras não-residenciais, máquinas e equipamentos,automóveis e eletrodomésticos; deduzindo depre-ciação e a dívida externa); em valores constan-tes de 1995.

Valor bruto da produção = faturamento dasempresas estrangeiras / faturamento total dasempresas (em valores correntes).

Vendas das grandes empresas = vendas dasempresas estrangeiras / vendas das 550 mai-ores empresas do País (em valores corren-tes).

Ativos do sistema bancário = ativos dos ban-cos estrangeiros / ativos totais do sistema ban-cário brasileiro (em valores correntes).

O dado para o setor bancário em 1999 é umaestimativa preliminar.

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tais como: a) a exportação de produtosbrasileiros a preços baixos; b) a importa-ção de produtos estrangeiros a preços al-tos; c) a venda de ativos brasileiros – em-presas privadas ou estatais – a preço bai-xo; d) a remessa de lucros, dividendos,royalties e pagamentos por assistência téc-nica etc.

Para transferir riqueza, o Brasil necessi-ta dispor de moeda estrangeira: os dólaresque saem do Brasil, primeiro devem en-trar aqui. Para pagar os juros e amortizaro principal da dívida, não basta ter o ne-cessário em reais; é preciso conseguir di-visas (moeda estrangeira: dólares, marcos,ienes, francos, libras etc.).

Entende-se assim a popularidade, naselites, da teoria segundo a qual o Brasildispõe de reduzida poupança interna: parapodermos crescer, precisaríamos de “pou-pança externa”, seja na forma de emprés-timos, investimento estrangeiro direto,capital especulativo ou até mesmo lava-gem de narcodólares.

O ciclo de “importação de capitais” dosanos 70 ocorreu basicamente por meio doendividamento externo, que a partir decerto momento tornou-se um círculo vi-cioso: novas dívidas, para pagar velhasdívidas.

Já o ciclo de “importação de capitais”ocorrido nos anos 90 envolve, além do

endividamento externo, um substancial in-vestimento direto e um enorme volume decapitais especulativos. Entre 1996 e 1998entraram no Brasil 45 bilhões de dólaresde investimentos líquidos estrangeiros.Nesse mesmo período, enviamos 108 bi-lhões de dólares para o exterior, só a títulode juros e amortizações.

Em determinado momento, ocorre a re-versão no ciclo e o país se vê diante deuma crise cambial. Não se trata necessa-riamente da “falta de meios” para honraro pagamento; trata-se, isto sim, de faltade divisas.

Quando chega nesta situação, o gover-no recorre à estatização das dívidas priva-das, ao esforço exportador a “qualquercusto”, à alienação patrimonial, à renego-ciação das dívidas, à desvalorização cam-bial e à suspensão dos pagamentos. Emtodas essas oportunidades, o prejuízo foidescarregado sobre a maioria dos brasi-leiros, que não foi consultada sobre o en-dividamento e não foi também beneficia-da com ele.

Juro campeão

A taxa de juros, várias vezes superioraos juros internacionais, tem sido o prin-cipal mecanismo de atração de capitais es-

A dívida privada é paga por quem pegou o di-nheiro emprestado, certo? Errado. No Brasil, adívida pode ser privada, o credor pode ser priva-do, mas quem paga é você, pois a dívida acabano colo do Estado, que cobra impostos, aumen-ta os juros e adota uma política econômica vol-tada para pagar a dívida, cujos impactos reca-em sobre a maioria dos trabalhadores. Inclusi-ve, você. Nos anos 70, por exemplo, foi muitocomum o Estado contrair empréstimos no exte-rior e repassá-los, direta ou indiretamente, semos riscos cambiais e de juros envolvidos, para

Estatizando as dívidasempresas privadas. A partir dos anos 90, o pro-cesso se torna ainda mais sofisticado: o grandeempresário toma dinheiro emprestado fora dopaís, a juros muito baixos, vende as divisas parao Banco Central e, com parte do dinheiro, com-pra títulos da dívida pública interna brasileira,com correção cambial e direito a juros genero-sos. Se tudo correr bem, ao final do período con-seguirá pagar sua dívida graças ao rendimentodos títulos. E se tudo correr mal, por exemplo sehouver uma desvalorização do real, os títulos comcorreção cambial protegem a empresa.

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trangeiros. Para se ter idéia da discrepân-cia entre a taxa de juros brasileira e a nor-te-americana, esta última foi de 6% emmaio de 2000, enquanto no Brasil ela erade 18% ao ano. Em novembro de 1997,chegou a ser de 42% ao ano. Isso “inchou”as reservas em moeda estrangeira no Ban-co Central, que foram de 36,5 bilhões dedólares em 1994 para US$ 74 bilhões emabril de 1998.

Toda entrada líquida de moeda estran-geira no país é comprada pelo Banco Cen-tral, que repassa aos proprietários o valorequivalente em reais.

Para consegui-los, e também para con-tornar os riscos de inflação, o governo ven-de títulos no mercado e toma reais empres-tados, aumentando a dívida pública inter-

na. Parte dessa dívida é pós-fixada, combase na taxa de juros ou no câmbio.

Tem-se, assim, um capitalismo sem ris-co: 23% da dívida mobiliária federal forado Banco Central é corrigida pelo câmbioe 61% pela taxa de juros.

Como os juros são mantidos altos paraatrair capitais estrangeiros e para tentarevitar sua saída do país, o resultado é oenorme crescimento da dívida pública in-terna. A dívida mobiliária federal, porexemplo, saltou de 62 bilhões de reais(1994) para 432 bilhões de reais (2000),em preços correntes de cada ano.

A íntima ligação entre o crescimento dadívida interna e o crescimento do passivoexterno (aí incluída a dívida e outras obri-gações do país em moeda estrangeira) ex-

Em 1883, Machado de Assis escreveu uma de-liciosa crônica sobre a contratação de emprésti-mos pelo governo do Brasil junto aos banqueirosRothschilds em Londres (Crônicas de Lélio, 2 desetembro de 1883). A percepção do nosso escri-tor era de que havia sido feito um mal negócio,visto que as comissões eram altas. Machado deAssis propunha, então, que as autoridades bra-sileiras desembarcassem em Londres dizendoque tinham ido lá simplesmente para “empalharcrocodilos” e que quando os senhoresRothschilds, abarrotados de dinheiro, propuses-sem algum empréstimo, aí sim é que se negocia-riam melhores condições de empréstimo.

Talvez porque não leram Machado de Assis,as autoridades brasileiras tendem a fazer, de fato,péssimos negócios nas emissões de global bonds– cujos lançamentos têm sido utilizados pelo go-verno brasileiro para captar recursos diretamen-te no mercado financeiro internacional.

O mercado financeiro internacional se carac-terizou no passado recente (1996-97) por umexcesso excepcional de liquidez, isto é, por umadisponibilidade extraordinária de recursos paraempréstimos. A oferta de recursos era tão eleva-da que o Banco Internacional de Compensaçõesna Basiléia – uma espécie de banco central debancos centrais –, no seu relatório anual de 1997,fez um alerta quanto aos riscos de contração da

Empalhando crocodilosoferta no futuro próximo e de inadimplência dedevedores. O drama se repetiria por meio do ci-clo vicioso já observado várias vezes na história:excesso de dinheiro no mundo, endividamentodescontrolado por parte de governos oportunis-tas, países com crescente vulnerabilidade exter-na, aumento do risco, contração da oferta de re-cursos externos, crise cambial nos países, cri-ses econômicas, sociais e políticas.

A situação de “liquidez empoçada” fez com quepraticamente todo título que se pretendesse co-locar, por exemplo, em Nova York, fosse vendidocom certa facilidade. O problema é sempre o pre-ço. Esse é exatamente o ponto que nos permiteafirmar que, no lugar do “sucesso estrondoso”,reverberado por papagaios jactantes, o lança-mento dos global bonds brasileiros foi, de modogeral, um fracasso.

Tomemos os lançamentos de 1997. A taxa dejuro dos global bonds foi de 10,125% e constaque os títulos foram lançados com deságio, o queteria elevado a taxa de juros para 10,9%. Essataxa é muito alta segundo qualquer parâmetro.Ela foi quase o dobro da taxa de títulos do gover-no da Alemanha e 50% maior do que a dos títu-los do governo dos Estados Unidos com mesmamaturidade.

Ademais, os global bonds foram trocados portítulos lançados em 1994 com taxas muito in-

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feriores, a saber, par bonds (de 4% a 6%),discount bonds (Libor mais 13/16, isto é, 6,5%),C-bonds (8%).

E mais: se compararmos a taxa dos globalbonds com aplicações de longo prazo no Brasil,também chegaremos à constatação de que esselançamento foi um problema grave. Se da renta-bilidade nominal dos global bonds descontamosuma inflação de 2% nos EUA, a taxa de juro realdos bônus brasileiros comprados nos EUA é de8,9%, enquanto a taxa de rentabilidade real (des-contada a variação cambial) da aplicação na ca-derneta de poupança no Brasil foi da ordem de6%. Isso significa, na prática, que a dívida con-traída pelo governo Fernando Henrique no exte-rior tem um serviço na forma de pagamento dosjuros sobre os global bonds que é, em termosreais, cerca de 50% maior do que a rentabilidadeda caderneta de poupança.

A primeira impressão é que estaríamos, assim,violentando a situação óbvia de que, em paísesricos em capital, a taxa de juros é menor do queem países pobres em capital. Não é nada disso,o fato é que o governo Fernando Henrique acabapagando juros elevadíssimos no mercado finan-ceiro internacional porque tem colocado o paísnuma trajetória de alto risco e tem poucacredibilidade internacional! De fato, às vésperasdo lançamento dos global bonds de 1997, a re-vista The Economist (22 de março de 1997) clas-sificou o Brasil como o terceiro país de maior ris-

co dentre os países em desenvolvimento, só sen-do precedido pelo México e pela Rússia.

O melhor indicador de que a taxa de juros dosbônus do Brasil é muito alta é o fato de que hou-ve um excesso de oferta de recursos para com-pra dos global bonds em 1997. Consta que parao lançamento de 3 bilhões de dólares houve umaoferta da ordem de 16 bilhões de dólares. Ao in-vés de ser um sinal de sucesso avassalador ou,ainda, de grande confiança da comunidade inter-nacional no governo, esse excesso de oferta re-fletiu o simples fato de que a oferta depende dopreço. Preço excessivamente alto significa umaoferta excepcionalmente elevada, isto é, a taxaabsurdamente alta significou uma excepcionaloferta de capital externo (grande procura pelostítulos brasileiros). A oferta de qualquer merca-doria está positivamente relacionada com o pre-ço. Para saber disso não precisamos consultaraqueles que se extasiaram com o falso sucessoda emissão dos global bonds. Era melhor fazercomo Machado de Assis: “Conversei mesmo comum barbeiro, que me provou a todas luzes que odinheiro é mercadoria.

Ainda seguindo a sugestão de Machado deAssis, o secretário do Tesouro do Brasil, na pró-xima vez que for a Nova York para fazer mais umlançamento de global bonds, se o objetivo forpegar dinheiro mais barato, deve levar um croco-dilo para ser empalhado, e não papagaiosjactantes.

plica por que o recente acordo entre o go-verno brasileiro e o FMI estipulou metasprecisas de superávit fiscal.

Trata-se de garantir ao investidor estran-geiro que a dívida interna será honrada.Caso contrário, os portadores abandona-rão os títulos do governo, transformarãoseus reais em dólares e sairão do país, ge-rando uma crise cambial.

Para que isso não ocorra, o governofaz cortes nos gastos sociais e amplia acobrança de tributos e impostos. Nãoexiste limite para os gastos com a dívi-da. Em 2000, o Congresso aprovou uma“Lei de responsabilidade fiscal” quepune o administrador público que nãohonrar em primeiro lugar... o serviço dadívida.

Ao mesmo tempo que atrai capitais estran-geiros, a alta taxa de juros sobrecarrega aatividade das empresas e pessoas que ope-ram em reais. As grandes empresas, por suavez, aproveitam o diferencial entre os jurosinternos e externos, tomando dinheiro em-prestado no exterior e aplicando-o no Brasil.

É importante destacar que, apesar de adívida externa destas empresas ser “priva-da”, é o conjunto da população que pagapor ela. Em primeiro lugar, porque o Te-souro Nacional é seu garantidor em últimainstância, diretamente ou indiretamente, pormeio de títulos públicos com coberturacambial. Em segundo lugar, porque o es-forço de obter dólares para pagar tais dívi-das é feito por todo o país, submetido aosefeitos daninhos da alta taxa de juros.

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26O BRASIL ENDIVIDADO

Uma economiavulnerável

Ao lado dos juros altos, a privatizaçãofoi importante na atração de capitais es-trangeiros. O governo argumentava que asprivatizações permitiriam o pagamento departe substancial da dívida interna, possi-bilitariam os investimentos que o Estadonão conseguia mais viabilizar, além demelhorar a qualidade dos produtos e ser-viços.

Segundo o governo federal, de1991 a 1998 o país teria arreca-dado 85 bilhões de reais com asprivatizações. Cálculos mostramque – mesmo desconsiderandoos preços subavaliados e o im-pacto social negativo – o gover-no perdeu pelo menos 87 bilhõesde reais com as privatizações.

Embora tenha produzido umabatimento contábil na dívida interna, aprivatização aumentou a dívida externa eo passivo externo do país. Por exemplo,com os empréstimos contraídos no exteri-or por empresas privadas que compraramestatais. É o caso da Vale do Rio Doce, umadas maiores estatais brasileiras, que depoisde privatizada contraiu um empréstimo bi-lionário nos Estados Unidos para partici-par da compra da Light, estatal de energiaelétrica.

Além da dívida externa, cresce tambémo passivo externo do país: quando umaestatal é vendida para proprietários estran-geiros, os novos donos remetem lucros edividendos para o exterior, sem falar emoutras formas disfarçadas de remessa decapitais. A remessa de lucros e dividen-dos para o exterior triplicou: de 9 bilhõesde dólares, no período 1981-90, para 27,3bilhões de dólares no período 1991-99.

A previsão é de que no ano de 2000 a re-messa líquida de lucros e dividendos sejade 5 bilhões de dólares.

Além disso, as ex-estatais passaram acomprar dos fornecedores habituais dosnovos proprietários, o que aumentou asimportações e, portanto, o déficit comer-cial. As controladoras estrangeiras vendemno mercado interno brasileiro (em reais)mas compram dos seus fornecedores ha-bituais no exterior (em dólares).

Muitas empresas privadas também fo-ram vendidas para controladores estran-geiros, com um resultado similar ao das

privatizações: mais re-messa de lucros e maisimportações.

Com a abertura comer-cial (desde 1990) e com odólar valorizado (desde1994), o país gerou umdéficit comercial acumu-lado de 23,5 bilhões dedólares durante o primei-

ro mandato de Fernando Henrique Cardo-so (1995-98). Essas importações forampossíveis graças ao fluxo de capitais es-trangeiros: o consumo presente – em reais– foi “financiado” por uma dívida futura– em dólares (ver tabela 19, na p. 45).

A inundação de importados, somada aosaltos juros, levou um grande número deempresas ao fechamento ou ao “ajuste”:demissões, ampliação da jornada de tra-balho, “flexibilização” de direitos e redu-ção salarial. Como parte do consumo foirealizado a crédito, o desemprego e o fe-chamento de empresas gerou também umaforte inadimplência.

Grande parte do capital estrangeiroque entrou no Brasil destinou-se à espe-culação e à aquisição de patrimônio jáexistente, não resultando, portanto, emnovo investimento e crescimento econô-mico.

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O governo brasileiro incentivou o cha-mado investimento estrangeiro direto, pormeio de subsídios e renúncias fiscais. Ban-cos públicos emprestaram dinheiro paraque empresas estrangeiras comprassemnossas estatais. Na chamada guerra fiscal,governos estaduais emprestam dinheiro,doam terrenos e concedem isenção de im-postos para atrair empresas sediadas emoutras unidades da federação, benefician-do também empresas estrangeiras.

Acontece que a maior parte das empre-sas beneficiárias orienta suas vendas parao mercado interno (que não gera dólares),ao mesmo tempo que aproveita os recur-sos públicos para especular, aumentar suamargem de lucro e remeter divisas para oexterior.

Mais recentemente, o governo tem es-tudado a adoção de maiores incentivos àsexportações: as empresas exportadoras(turbinadas por subsídios públicos) ven-derão ao Estado (a preços de mercado) osdólares obtidos na exportação, tornando-

se detentoras de títulos públicos e, portan-to, credoras do mesmo Estado que as sub-sidiou.

O efeito agregado dessas políticas temsido: crise social, desemprego e outrasmedidas concentradoras de renda; redu-ção dos investimentos públicos; transfe-rência patrimonial (do Estado e/ou de ca-pitalistas privados nacionais para gran-des capitalistas, geralmente estrangeirosou associados); e a vulnerabilidade daeconomia brasileira diante das crises in-ternacionais.

A cada ano, para fechar as contas emdia, o governo paga o preço que o capitalestrangeiro exige, mesmo que isso impli-que cortar aposentadorias miseráveis, con-centrar ainda mais a renda, privatizar asúltimas estatais, colocar um conhecidoespeculador na presidência do Banco Cen-tral e outro na presidência do Banco Na-cional de Desenvolvimento Econômico eSocial (BNDES), aceitando sem contes-tação a orientação dos Estados Unidos.

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28O BRASIL ENDIVIDADO

Quem deve para quem?

Em 1952, Alemanha e Israel concluíramum acordo macabro: como indenizaçãopelo assassinato de 6 milhões de judeuspelos nazistas, entre 1933 e 1945, a Ale-manha pagaria o correspondente a 125 bi-lhões de dólares (valores atualizados).

Se os países endividados exigissem umareparação pelo seqüestro e assassinato demilhões de indígenas e negros durante osséculos de escravidão, pelo roubo de ter-ras, pelo saque das riquezas naturais, pe-los desastres ecológicos, pelas guerras,pelos golpes militares, pelo lixo “cultural”,pela especulação financeira... a indeniza-ção a ser paga superaria em muito os 2trilhões de dólares – quantia equivalenteà dívida externa atual do mundo “em de-senvolvimento”.

É importante lembrar disso quando fa-lamos da dívida: dependendo do critério,

Dia e noite vem de longe, branco e preto a trabalhar, e o dono, senhor detudo, sentado mandando dar, e a gente fazendo conta pro dia que vai

chegar, e a gente fazendo conta pro dia que vai chegar. Aroeira, Geraldo Vandré.

somos credores e não devedores. Mas, éclaro, o critério que prevalece no governobrasileiro e nas instituições dominantes domundo (como o FMI, o Banco Mundial eo G7) é outro: a dívida é legítima, legal edeve ser paga.

Foi esse o princípio adotado, nos anos80, pelo FMI, que viabilizou a rolagem dadívida, supondo que as reformas estrutu-rais propostas pelo Fundo normalizariama situação.

Em meados dos anos 80, começaram asurgir propostas que enfatizavam a redu-ção/reestruturação parcial da dívida, comoforma de dar maior fôlego aos países de-vedores. Essas propostas reconheciam oefeito danoso das políticas do FMI sobrea capacidade de geração de divisas dos de-vedores; o surgimento de um mercado se-cundário, em que os títulos da dívida eramvendidos com um forte deságio; e a ne-cessidade de evitar um colapso financeirodos países devedores, que poderia ter con-

Por um milêniosem dívidas

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O “Grupo dos sete” ou simplesmente G7, éformado por Estados Unidos, Japão, França,Itália, Inglaterra, Alemanha e Canadá, os setepaíses mais ricos do mundo. Promoveperiodicamente reuniões de cúpula, paradefinir políticas econômicas e resolverconflitos políticos. Às vezes a Rússiaparticipa das reuniões; nessas ocasiões, ogrupo é denominado G8. O FMI, o BancoMundial, o G7, a Organização Mundial doComércio (criada em 1º de janeiro de 1995),a Organização do Tratado do Atlântico Norte(OTAN) e o governo dos Estados Unidos sãoos pilares da atual “ordem” capitalistamundial.

seqüências danosas sobre a economia in-ternacional, ainda que os bancos estives-sem mais protegidos do que no final dosanos 70.

Alguns chegaram a defender o perdãototal ou parcial da dívida, vinculado à ado-ção de reformas estruturais propostas peloFMI e limitado a casos de países extrema-mente pobres, particularmente africanos.

A renegociação e a reestruturação dasdívidas transformaram-nas em bônus co-mercializáveis no mercado financeiro eabateram uma pequena parcela do estoqueda dívida. O efeito sobre a situação dospaíses endividados foi mínimo.

Hoje surgem propostas de escopo maisamplo, desde a Taxa Tobin até a de uma“nova arquitetura” para a economia inter-nacional. Mesmo especuladores comoGeorge Soros advogam a necessidade decontrole sobre a especulação financeira,argumentando que sem reformas urgenteso capitalismo pode desembocar numa cri-se ainda mais grave que a atual.

O grande problema para essas propos-tas reformistas reside no fato de os Esta-dos Unidos, que em tese seriam “capazes”de reformar o mercado mundial, seremtambém os maiores beneficiários da atual“arquitetura”. E para manter a “ordem” ogoverno norte-americano gasta, anual-

mente, 278 bilhões de dólares com suasforças armadas. Repetindo: gastam todoano um valor superior à dívida externa to-tal brasileira.

A volta do cipó de aroeira

Mas, e se a dívida externa já tiver sidopaga diversas vezes, sendo seu crescimen-to fantástico, nos últimos 20 anos, um atode agiotagem? (ver Tabela 20, na p. 46) Ese a dívida externa não for legítima nemlegal?

Os pilares da “ordem”capitalista

Em 1978, James Tobin, professor na Universi-dade de Yale e prêmio Nobel de economia em1981, publicou seu artigo mais conhecido propon-do a criação de um tributo sobre as transaçõesde câmbio. Sua primeira contribuição sobre otema é, no entanto, mais antiga. Ela remonta a1972, pouco tempo depois da dissolução, por ini-ciativa unilateral dos Estados Unidos, em agostode 1971, do sistema de taxas de câmbio fixas,criado pelo tratado de Bretton Woods, em 1944.

A Taxa Tobin serviu de base para a criação,em 3 de junho de 1998, na França, da Association

A Taxa Tobinpour une Taxation des Transactions financièrespour l’Aide aux Citoyens (Associação por umataxa sobre as transações financeiras especulati-vas para ajuda aos cidadãos). A idéia surgiu deum editorial do jornal Le Monde Diplomatique,intitulado “Desarmar os mercados”, publicado emdezembro de 1997. Hoje, a Attac é um movimen-to internacional, com propósitos mais amplos queos originalmente vinculados à Taxa Tobin. Segun-do Maria da Conceição Tavares, “em geral, a es-querda não gosta da taxa Tobin porque pareceineficaz”.

Fonte: CHESNAIS, François. Tobin or not Tobin?. São Paulo, Edunesp/Attac, 1999.

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Com o desenvolvimento do capitalismo indus-trial, ampliou-se o processo pelo qual o modelode desenvolvimento se sustenta pelo consumoda natureza (os recursos minerais e florestais, abiodiversidade, os solos, as águas etc.) e pelaexploração do trabalho humano. Esse consumo,indiscriminado e praticamente gratuito, da natu-reza e do trabalho humano é baseado na destrui-ção e na exaustão do meio ambiente e dos re-cursos naturais.

O modelo dominante constrói-se por meio doduplo movimento de opressão e superexploraçãode grande parte da humanidade e do meio natu-ral. Surgem daí os conceitos de “dívida social” ede “dívida ecológica”. O objeto dessa segundadívida pode ser definido como “o patrimônio vitalda natureza, necessário para seu equilíbrio e suareprodução, que foi consumido e não restituído aela”. Esse patrimônio “compreende tanto os re-cursos naturais como as condições ecológicas(pureza do ar, da água, da atmosfera etc.)”.

Um grupo de cientistas norte-americanos con-seguiu listar 17 formas de “serviços” que a natu-reza pode proporcionar ao homem: regulaçãohídrica, de gases, climática e de distúrbios físi-cos, abastecimento de água, controle de erosãoe retenção de sedimentos, formação de solos,ciclo de nutrientes, tratamento de detritos,polinização, controle biológico, refúgios de fauna,produção de alimentos, matéria-prima, recursosgenéticos, recreação e cultura. A durabilidadedos benefícios decorrentes da natureza ou, sese preferir, dos serviços que ela presta à huma-nidade, depende da manutenção dos processosecológicos e da diversidade biológica, postos emrisco pela exploração excessiva dos recursosnaturais e pela destruição dos hábitats pelo ho-mem. Temos, portanto, uma enorme dívida paracom a natureza.

A dívida ecológicaMas, desde já, parece claro que o termo “dívi-

da” não é totalmente adequado. De um lado, anatureza não vai reclamar algo que lhe seria de-vido; de outro, a natureza não pode ser vista comoum negócio. Deve ser vista em seu conjunto comoa “herança da humanidade”, que precisa sermantida e manejada para garantir qualidade devida para hoje e para o futuro. Usamos todavia otermo “dívida ecológica” na tentativa de definirresponsabilidades e abrir a possibilidade de pe-nalidades para os que transformaram essa he-rança da humanidade em base para a acumula-ção privada desenfreada. Nessa perspectiva,como o capitalismo industrial é dominante nospaíses do Norte, a dívida ecológica é basicamentede sua responsabilidade.

Se há dívida, há credor e devedor. Se é a natu-reza que foi afetada, é ela a credora? A naturezapor si não tem voz nem fala, não pode declarar-se credora. São os seres humanos, certos seto-res sociais mais do que outros, que foram priva-dos destes recursos, que são credores em nomedela e em seu próprio. “Em nome dela”? Querdizer que a natureza tem direitos e que cobra-mos por ela esses direitos? O credor ambiental,de fato, é a “unidade socioambiental” afetada poruma dívida ecológica. Há dívida ecológica, porexemplo, porque a apropriação privada esgotouas reservas de minério de ferro no entorno deBelo Horizonte ou de manganês na Serra do Na-vio, no Amapá, deixando as serras e a florestaem estado de total desolação. O credor, dessaforma, é a própria serra, a própria floresta? Pen-samos ser mais correto afirmar que os credoressão a população de Belo Horizonte e os povosindígenas e os caboclos do Amapá, afetados emsua qualidade de vida, em seu futuro e na possi-bilidade de usufruir corretamente seu patrimôniocoletivo. No segundo caso, o estado do Amapá

As taxas de juros flutuantes e, posterior-mente, a capitalização dos juros fizeramcom que o estoque da dívida crescesseenormemente, apesar de os países deve-dores terem pago uma ou mais vezes oequivalente ao que lhes fora emprestado.

O povo, que paga a conta, não foi con-sultado sobre o endividamento, contraídogeralmente por ditaduras e/ou aprovadosem os trâmites legislativos adequados.

Parte do dinheiro foi gasto em projetosfaraônicos e/ou que beneficiaram grande-mente os credores (por exemplo, por meiodas importações “casadas” com emprésti-mos). Outra parte da dívida foi desviadapara corrupção, fuga de capitais e outrasfinalidades similares, de conhecimento doscredores.

Com base nesses e em outros argumen-tos similares, surgiram propostas de não-

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pagamento da dívida externa ou, pelomenos, de suspensão do pagamento, se-guida de auditoria, que verificaria o exa-to estado das contas, determinando o quepode/deve ser pago. No fundo destas pro-postas, está a idéia de que a construção deum mundo de igualdade, ou pelo menosde menor desigualdade, passa por subver-ter os fundamentos econômicos e por in-verter o fluxo dos recursos mundiais, que

e, por intermédio dele, o Brasil, são privados derecursos dos quais se poderia dispor estrategi-camente e que, de fato, foram esgotados para oenriquecimento de uma minoria.

Pensemos, por exemplo, na Fazenda Cristali-na, no Pará, propriedade da Volkswagen nosanos 70, onde foram derrubados e queimadosde uma só vez dezenas de milhares de hectaresde floresta amazônica. Não é a floresta que podegritar por reparos. O credor é primeiramente apopulação diretamente afetada hoje, bem comoas gerações futuras, que estão sendo privadasdas alternativas oferecidas pelos recursos quenão existem mais, já que os acontecimentos de30 anos atrás nos afetam hoje. Também o con-junto dos cidadãos, mesmo os que não foramatingidos diretamente pela frente pecuária queinvadiu a Amazônia nos anos 70, pode se sentirvítima e lesado na medida em que, preocupadocom o futuro do país, perceba que o modelo im-plantado minou a possibilidade de promover naAmazônia um desenvolvimento que garanta jus-tiça social sem destruir a enorme sociobiodiver-sidade da região.

O credor, além disso, pode ser a instância ins-titucional que representa os interesses dessapopulação: o município, um conjunto de municí-pios, o Estado ou a União. E é também, em umsentido mais profundo, embora não exista umainstância institucional que possa responder porela, a própria humanidade, pois as perdas danatureza a impedem de continuar a prestar osserviços que são essenciais à humanidade.

Por todos esses motivos é que dizemos que ocredor é uma “unidade socioambiental”, assimcomo se poderia dizer que a dívida é ecológico-social.

Quem é o devedor? De um modo geral, po-deríamos responder que são os consumidores,do Norte e do Sul, pois toda a destruição

socioambiental se processa em nome de ummercado, ao mesmo tempo produtor e a serviçode uma sociedade de consumo. Boa parte dahumanidade é assim culpada e/ou cúmplice peladívida.

O Norte consome mais, mas não basta res-ponder que os culpados são os países industria-lizados, por causa de seu padrão de produção econsumo. Ao culpabilizar apenas um modelo ge-ral de desenvolvimento, e vagamente um con-junto de países ricos, diluímos as responsabili-dades. Não se trata de afirmar exatamente dequem se vai cobrar a dívida ecológica. É precisodistinguir e hierarquizar as responsabilidades, oque muitas vezes é uma tarefa complexa.

Quem é mais responsável pelo efeito-estufa?É fundamental atribuir a cada país industrializa-do, incluindo suas forças econômicas dominan-tes, a sua cota, para depois acompanhar seusesforços, se houver, e pressioná-los de forma es-pecífica. É importante distinguir o que é devido àatividade industrial e o que é devido à queima deflorestas. Na contribuição das queimadas para oefeito-estufa, por exemplo, que em grande parteé responsabilidade do Brasil, é preciso definirquem são os atores concretos desse impacto. Asqueimadas foram e são produzidas muitas vezesno Brasil por dinâmicas e agentes externos, comono caso já mencionado da Fazenda Cristalina.Existe também todo um modelo de tecnologiaagrícola que induz os agricultores ao trato insus-tentável da terra e de seus ecossistemas.

A quem reclamar pela dívida desse modelo?Às multinacionais da agroindústria, com certeza,mas também à FAO (Organização das NaçõesUnidas para a Agricultura e a Alimentação), quedefendeu entusiasticamente a Revolução Verde,às agências multilaterais de financiamento do de-senvolvimento (BIRD e BID), sem falar da res-ponsabilidade das agências governamentais.

Fonte: LEROY, Jean-Pierre. A dívida ecológica brasileira. Quem deve a quem? Texto inédito.

hoje vai dos pobres para os ricos, passan-do a ser dos ricos para os pobres.

Na primeira metade dos anos 90, a abun-dância de capitais estrangeiros abafou aquestão da dívida. Mas na segunda meta-de as crises do México, do Sudeste Asiá-tico e da Rússia reavivaram as críticas aochamado modelo neoliberal.

No Brasil, em 1999, realizou-se o Tri-bunal da Dívida Externa, que aprovou um

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veredito que sintetiza as opiniões e pro-postas de um amplo setor da sociedadebrasileira, cuja conclusão básica é que adívida externa brasileira é injusta e insus-tentável ética, jurídica e politicamente: emtermos substantivos ela já foi paga e per-siste apenas como um mecanismo de sub-missão e escravização da sociedade aopoder financeiro da usura e da globaliza-ção do capital, e de transferência de ri-quezas para os credores.

O veredito do Tribunal defende a uniãode todos os povos em favor do cancela-mento geral e irrestrito das dívidas exter-nas dos países de baixa renda maisendividados, e devolução das riquezas quelhes foram pilhadas; a auditoria da dívidapública externa e de todo o processo deendividamento brasileiro, a fim de verifi-car contábil e juridicamente se ainda exis-te dívida a pagar, de quem ela deve ser co-brada, e de estabelecer normas democrá-ticas de controle sobre o endividamento; amoratória soberana, o rompimento doacordo com o FMI e a redefinição das dí-vidas com base nos resultados da audito-ria, e na afirmação da soberania nacional;o firme controle do câmbio, incluindo me-canismos efetivos de controle, fiscalizaçãode toda forma de entrada e saída ilegal demoedas e de mercadorias em geral.

Teria sido possível...

Ao longo do primeiro mandato deFernando Henrique, transferimos para oscredores algo como 128 bilhões de dóla-res, cerca de 233 bilhões de reais. Comesse dinheiro teria sido possível pagar um“bônus” de 1.474 reais para cada brasilei-ro. Ou dar 45 mil reais para cada famíliabrasileira que vive com até 1 salário míni-mo. Ou investir 58 bilhões de reais ao ano,durante quatro anos, para erradicar a po-breza.

Em maio de 2000, o governo dizia que seo salário mínimo subisse para 176 reais issoprovocaria um “rombo” superior a 2,2 bi-lhões de reais nas despesas do InstitutoNacional de Seguridade Social (INSS) noano 2000. Com o dinheiro gasto com a dí-vida externa, entre 1995-98, seria possívelcobrir este rombo por 106 anos!

O país gastou, em 1997, 67 bilhões dereais com as aposentadorias do setor pú-blico e do setor privado. Segundo o go-verno, houve um déficit de 19 bilhões dereais. Pois bem, com o que se gastou entre1995-98 com a dívida externa, seria pos-sível cobrir aquele déficit por 12 anos.

Teria sido possível criar 504 mil empre-gos diretos em montadoras de automóveis.

A metodologia do Banco Mundial define “po-bre” como aquele que recebe “um dólar por dia”ou aproximadamente 365 dólares ao ano. Se-gundo este critério, existiriam no mundo 1,3 bi-lhão de pessoas “abaixo da linha da pobreza” (e3 bilhões de pessoas com renda inferior a doisdólares diários). Mas nos Estados Unidos o cri-tério adotado desde os anos 60 pela Adminis-tração da Seguridade Social era outro: “o custode uma dieta mínima adequada, multiplicada portrês para cobrir outros gastos”. Assim, em 1996,

O que é um “pobre”o governo norte-americano considerava “pobre”uma família de quatro pessoas (dois adultos eduas crianças) que recebesse menos de 16 mildólares por ano, cerca de 11 dólares por pes-soa/dia. Essa discrepância de critérios cria oseguinte paradoxo: enquanto nos Estados Uni-dos 13,7% da população estaria abaixo da linhada pobreza (segundo os critérios válidos naquelepais), no México apenas 10,9% da populaçãoviveria nessa situação (segundo os critérios doBanco Mundial).

Fonte: CHOSSUDOVSKY, Michel. El ajuste econômico: el Perú bajo el dominio del FMI. Lima, Mosca Azuleditores, 1992, p. 83; SADER, Emir. Um capitalismo parasitário. Correio Braziliense, Brasília, 30 abr. 2000.

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Ou então criar mais de 10 milhões de em-pregos diretos em indústria têxteis. Ou,ainda, criar mais de 15 milhões de empre-gos diretos na construção civil. O desem-prego seria sensivelmente reduzido ou atéeliminado.

Teria sido possível construir mais de 15milhões de moradias populares, em lotesde 200 metros quadrados, ao custo unitá-rio de 15 mil reais. Acabaria o déficit ha-bitacional existente no Brasil.

Teria sido possível, entre 1995-98, au-mentar o gasto per capita do Brasil emsaúde de 280 dólares para 479 dólares! Emesmo assim continuaríamos abaixo daArgentina (795 dólares) e dos EstadosUnidos (3.858 dólares).

Teria sido possível assentar 5,8 milhõesde famílias de agricultores, ao custo de 40mil reais cada uma. O que acabaria com oproblema dos sem-terra no Brasil, estimu-laria a atividade econômica, baratearia opreço dos alimentos, reduziria a popula-ção dos grandes centros e, de quebra, ain-da reduziria o poder dos políticos conser-vadores.

Teria sido possível financiar 50% da pro-dução agrícola brasileira (menos que nospaíses desenvolvidos, onde o crédito che-ga a 80% do valor produzido), quando nostrês primeiros anos de governo FernandoHenrique o crédito rural financiou apenas10% da produção agrícola do país.

Teria sido possível muita coisa. Mas navida real, o governo pratica o não-paga-mento da dívida social. Pagamento em dia,só para os grandes capitalistas.

A campanhacontra a dívida

Forte nos anos 80, enfraquecida no co-meço da década seguinte, a campanha con-tra a dívida ganhou novo alento em mea-dos dos anos 90, no contexto das crises doMéxico, do Sudeste Asiático e da Rússia.

Um estímulo importante veio da encíclicapapal sobre a Chegada do Terceiro Milê-nio, na qual se vincula o Jubileu ao per-dão da dívida dos países mais pobres.

Segundo Leonardo Boff, o Jubileu reme-te à idéia bíblica da “anistia geral” de to-das as dívidas (e da escravidão que teriamimplicado) a cada 50 anos. Essa idéia apa-receu no Seminário sobre Dívida Externa,em agosto de 1984, em Havana, Cuba.

Nos anos 80, Boff alertava que essa idéia– embora desse “um revestimento bíblicoà proposta de moratória” – supunha tam-bém a “legitimidade da dívida”: pedir per-dão é reconhecer a própria “culpabilida-de” e, o que é pior, é deixar nas mãos dosbanqueiros a decisão final.

Por isso algumas campanhas enfatizama idéia do Jubileu 2000, do “milênio semdívidas”; outras o Jubileu 2000 – como sea campanha terminasse este ano.

No Brasil, a “Campanha Jubileu 2000,por um milênio sem dívidas” reúne igrejas,movimentos populares, partidos políticose outras entidades. Em outros países, a pre-sença da “sociedade civil” limita-se a seto-res da hierarquia católica e às ONGS.

Em 1998, real izou-se em Brasíl ia umsimpósio intitulado “Dívida Externa: implicaçõese perspectivas”. Nesse simpósio, foi lançada aidéia do Tribunal da Dívida Externa, que reuniumais de duas mil pessoas no Rio de Janeiro,

O Tribunal da Dívidaem 1999. O veredito final, o parecer dos jura-dos e a exposição das testemunhas foram reu-nidos no livro Tribunal da Dívida Externa: A vidaacima da dívida (Rio de Janeiro, Oficina doAutor, 2000).

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Nossa campanha busca ter um caráterde massas, exigindo mudanças na políticado governo. Em outros países, a campa-nha constitui um “grupo de pressão”, quebusca principalmente sensibilizar os orga-nismos multilaterais, os governos e os for-madores de opinião dos países ricos.

A campanha brasileira e a coalizão Ju-bileu Sul – lançada em novembro de 1999,em Johanesburgo, na África do Sul, porrepresentantes de 33 países – vinculamfortemente a luta contra a dívida e a lutacontra o modelo econômico internacional,destacadamente o comércio desigual e aespeculação financeira. Outros setores dacampanha internacional priorizam o per-dão ou a renegociação da dívida.

A coalizão Jubileu Sul opta pelo con-fronto com organismos como o FMI e oBanco Mundial, enquanto outras campa-nhas cooperam com esses organismos,dispondo-se até mesmo a participar deprogramas de “troca de dívida por inves-timentos”.

Vale lembrar a profunda diferença exis-tente entre os países devedores. De umlado, há mais de 50 países pobres altamen-

te endividados, que estão em situaçãofalimentar. Para esses países, o BancoMundial está propondo cancelar dívidas,em troca de investimentos; mas só faz issopara quem aceitar determinadas “condicio-nalidades”: políticas de ajuste de tiponeoliberal. A “sociedade civil” é convida-da a legitimar a dívida e a cooperar comos organismos internacionais na adminis-tração dos programas de “cancelamento”e ajuste. No início de 2000, o Banco Mun-dial falou no perdão de dívidas no valorde 14 bilhões de dólares, quando a dívidatotal dos países pobres gira ao redor de372 bilhões de dólares.

Para dourar a pílula, o Banco Mundialfala também em trocar dívida por “progra-mas de combate à pobreza”, particular-mente programas na área da educação,políticas compensatórias que não atacamas estruturas geradoras de desigualdade.

De outro lado, há países, como o Brasil,que têm conseguido pagar suas dívidas, aum custo social e econômico altíssimo.Mas o que importa para os credores é queseus contratos sejam honrados; os contra-tos com o povo podem ser quebrados,

Em agosto de 1985, convocados pelo primei-ro-ministro cubano Fidel Castro, reuniram-se emHavana para discutir o problema da dívida 1.200representantes de países latino-americanos, in-cluindo cinco ex-chefes de Estado e liderançascomo Lula. O único chefe de Estado presente,Fidel Castro, apesar de ter lançado uma campa-nha incisiva pela moratória temporária da dívida,vinha conduzindo as negociações da dívida cuba-na de forma ordeira e convencional, o que o tor-nava vulnerável à crítica de que não praticava oque pregava. Fidel respondeu que com exceçãode dois ou três grandes países, a única força daAmérica Latina estava na unidade e que peque-nos países, como Cuba, não poderiam enfrentaros credores sozinhos e vencer. A reunião de Ha-

A reunião de Havanavana, a eleição do presidente Alan García noPeru, que impôs um limite às remessas de juros(equivalente a 10% dos ganhos de exportação) ea eleição de um presidente civil no Brasil leva-ram os chefes de Estado dos 11 países devedo-res do Grupo de Cartagena a darem um tímidopasso em direção a uma ação coletiva na reu-nião de dezembro de 1985, no Uruguai, quandoformaram um comitê permanente de acompanha-mento das negociações. Mas nem esse comitênem os contatos mais freqüentes entre os chefesde Estado resultaram em diligências coletivas juntoaos bancos credores. E a dívida continuou a serhonrada, apesar de seu enorme custo social e semque nenhum passo importante tivesse sido dadoem direção a uma solução global.

Fonte: KUCINSKI, Bernardo e BRANFORD, Sue. A ditadura da dívida: causas e conseqüências da dívidalatino-americana. São Paulo, Brasiliense, 1987.

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como se vê nos confiscos salariais, nasordens judiciais descumpridas, nas aposen-tadorias atrasadas, nos direitos sociais nãorespeitados etc.

Para um país como o Brasil, os organis-mos multilaterais não sugerem perdão par-cial, troca de dívida por investimentos e/ou combate à pobreza. Aqui, trata-se desugar o máximo possível, pelo maior tem-po possível. Por isso, a alternativa tem queser uma decisão soberana, que limite totalou parcialmente os gastos com a dívida,tendo em vista investir os recursos poupa-dos na superação da desigualdade social.

A dívida externa mundial correspondea cerca de 5% do estoque de capital finan-ceiro existente no mundo: 2 trilhões em37 trilhões de dólares, segundo cálculosde Eric Toussaint, economista que integrao Comitê para a Anulação da Dívida doTerceiro Mundo.

Num só dia, o mercado financeiro inter-nacional de câmbio movimenta recursosequivalentes ao total da dívida externamundial.

É por isso que o G7 pode se dar ao luxode prometer o “perdão” de 70 bilhões dedólares das dívidas dos países pobres. Seamanhã toda a dívida externa fosse can-celada, mas continuassem de pé os funda-mentos desiguais da economia mundial,

No ano de 1999, o governo FernandoHenrique gastou 11 bilhões de reais no mi-nistério da Educação; 20 bilhões de reais noda Saúde e 1,3 bilhão no ministério que tratada reforma agrária. No mesmo ano, o gover-no Fernando Henrique gastou 96 bilhões dereais com os encargos financeiros da União.Já o orçamento de 2000 apresentado pelogoverno destinava 44% de seus recursospara servir à dívida e apenas 5,99% para asaúde.

As prioridadesorçamentárias

Fonte: Banco de dados e documentos do Or-çamento da União, Execução orçamentária de1999, Prodasen.

não acabaria a pobreza na Terra. Aliás, no-vos créditos poderiam até mesmo azeitarpartes enferrujadas da economia.

Por isso tudo, é fundamental uma coa-lizão entre os países devedores, a coope-ração entre a campanha da dívida e ou-tras articulações internacionais, bemcomo a construção de uma agenda pró-pria, que inclua temas como a reduçãoda jornada de trabalho e o combate aoimperialismo. Trata-se de tratar a dívidaexterna como a ponta do iceberg, a partirda qual se pode questionar a ordem eco-nômica mundial e as elites nacionais queoprimem os trabalhadores.

Os países mais empobrecidos e maisendividados, segundo dados compilados em1995, são os seguintes: Angola, Bangladesh,Benin, Bolívia, Burkina Fasso, Burma, Burundi,Camarões, Camboja, Chade, Costa do Marfim,Etiópia, Filipinas, Gâmbia, Gana, Guiana, Guiné,Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Haiti, Honduras,Iêmen, Jamaica, Laos, Libéria, Madagascar,Malawi, Mali, Marrocos, Mauritânia, Moçambique,Nepal, Nicarágua, Niger, Nigéria, Peru, Quênia,

Pobres e endividadosRepública Centro-Africana, República Popular doCongo, República Democrática do Congo,Ruanda, São Tomé/Príncipe, Senegal, SerraLeoa, Somália, Sudão, Tanzânia, Togo, Uganda,Vietnã, Zâmbia, Zimbábue. Em 1994, esses paí-ses, a maioria dos quais localiza-se na África ena América Central, com uma população total de967 milhões de habitantes, deviam juntos 372,8bilhões de dólares.

Fonte: ARRUDA, Marcos. Dívida e(x)terna: para o capital, tudo; para o social, migalhas. Rio de Janeiro,Vozes/PACS, 1999.

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• p. 5 – As informações sobre os pagamentos atrasa-dos, as dívidas do setor público e a dívida ex-terna brasileira são da Nota para a imprensa doBanco Central, de 18/2/2000.

• p. 7 – O dado sobre a dívida portuguesa está emKUCINSKI, Bernardo. Jornalismo econômico.São Paulo, Edusp, 1996, p. 200.– Sobre nosso primeiro empréstimo externo e aherança deixada para a República ver BOUÇAS,Valentim. História da dívida externa. Rio deJaneiro, Edições Financeiras, 1950, p. 39 e 123– A citação de Frank Griffith Dawson está emA primeira crise da dívida latino-americana(São Paulo, Editora 34, 1998, p. 286).

• p. 8 – A informação sobre a dívida no fim do gover-no Washington Luís e as citações de GetúlioVargas e de José Maria Whitaker estão na obrajá citada de Valentim Bouças, p. 299 e 343-44.– Sobre o crescimento dos empréstimos norte-americanos ao Brasil ver ABREU, Marcelo dePaiva. A dívida pública externa do Brasil, 1931-1943. Pesquisa e Planejamento Econômico,v. 5, jun. 1975, n. 1, p. 39.

• p. 9 – A citação referente ao estudo da dívida e a deOsvaldo Aranha também estão na obra deValentim Bouças, p. 350-51 e 353-54.– Os dados sobre a suspensão e a renegociaçãoda dívida e seu estoque em 1945 são da obra jácitada de Marcelo de Paiva Abreu, p. 43 e 40.

• p. 10 – As informações sobre o Plano Marshall estãoem GEORGE, Susan. The Debt Boomerang.Londres, Pluto Press, 1992, p. XV-XVI.– Os dados sobre a dívida da América Latina esobre o Brasil no período 1947-56 estão emKUCINSKI, Bernardo e BRANFORD, Sue. Aditadura da dívida: causas e conseqüências dadívida latino-americana. São Paulo,Brasiliense, 1987, p. 87-90.

• p. 11 – As informações sobre o endividamento dosgovernos militares brasileiros foram extraídasde ARRUDA, Marcos. “Prometeu acorrentado”.In: Dívida externa e igrejas: uma visãoecumênica. São Paulo, CEDI, 1989.

• p. 13 – Os dados sobre o aumento dos preços do pe-tróleo e da taxa básica de juros de emprésti-mos bancários estão em GALVEAS, Ernane.A saga da crise. Rio de Janeiro, Forense, 1985.

• p. 15 – A informação sobre o desembolso da Améri-ca Latina nos anos 80 está no livro já citado deBernardo Kucinski e Sue Branford, p. 172.

• p. 18 – A informação sobre a crise asiática está emGONÇALVES, Reinaldo. “Crise, vulnerabilidadee dívida externa: América Latina e Brasil”.Pesquisas, São Paulo, Centro de EstudosKonrad-Adenauer-Stiftung, n. 15, 1999.

• p. 19 – A citação sobre o acordo de renegociação dadívida brasileira é de BATISTA JR., Paulo

Notas e referênciasNogueira & RANGEL, Armênio de Souza. “Arenegociação da dívida externa brasileira e oPlano Brady: avaliação de alguns dos princi-pais resultados”. Caderno Dívida Externa, SãoPaulo, Pedex/CESE, n. 7, 1994, p. 25.

• p. 20 – Os dados sobre o déficit comercial e o déficitnas transações correntes no período 1995-99estão em Conjuntura Econômica, fev. 2000.– A informação sobre o valor da dívida públi-ca interna em 1999 e o pagamento a ser feitoaos detentores da dívida interna pública em2000 estão no jornal Valor, 1º mai 2000.– O dado sobre a queda das reservas brasileirasestá em depoimento do deputado federal AloízioMercadante (PT-SP) no Senado Federal, em 05de maio de 1999, a partir do relatório da CPIdos Bancos do Congresso Nacional.

• p. 21 – As informações sobre a dívida de médio/lon-go prazo e seus vencimentos são da Nota paraa imprensa do Banco Central, de 16/3/2000.– Sobre as despesas com juros, ver o jornalValor, 1o maio 2000.

• p. 23 – O dado sobre os pagamentos de juros e amor-tizações entre 1996 e 1998 está em Conjuntu-ra Econômica, fev. 2000.

• p. 24 – Os dados sobre as diferenças entre as taxas dejuros no Brasil e nos Estados Unidos estão emARRUDA, Marcos. Dívida e(x)terna: para ocapital tudo; para o social, migalhas.Petrópolis, Vozes, 1999, p. 62.– Sobre a correção da dívida mobiliária, os da-dos são da Nota para a imprensa do Banco Cen-tral, de 21/2/2000.– Sobre o crescimento da dívida mobiliáriaentre 1994 e 2000 ver SANTOS, Fábio Perei-ra. O plano real e o crescimento da dívida pú-blica no Brasil. Dissertação de mestrado apre-sentada na FGV/EAESP, 2000; e a Nota paraa imprensa do Banco Central, de 21/2/2000.

• p. 26 – Os cálculos sobre as perdas do governo comas privatizações estão em BIONDI, Aloysio.O Brasil privatizado: um balanço do desmon-te do Estado. São Paulo, Editora FundaçãoPerseu Abramo, 1999.– Sobre a remessa de lucros para o exterior verConjuntura Econômica, fev. 2000.– Sobre a previsão da remessa líquida de lu-cros em 2000 ver o jornal Valor, 1o mai. 2000.

• p. 28 – A informação sobre a indenização da Alema-nha a Israel está em SCHILLING, Paulo. “Dí-vida externa: quem são os devedores?”. In: Dí-vida externa e igrejas: uma visão ecumênica.São Paulo, CEDI, 1989.

• p. 33 – A citação de Leonardo Boff está no texto desua autoria “Dívida externa e Teologia da Li-bertação” (In: Dívida externa e igrejas, SãoPaulo, CEDI, 1989).

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37 GONÇALVES & POMAR

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http://www.users.skynet.be/cadtm• Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento: http://

ww.unctad.org• Dieese: http://www.dieese.org.br• Fundo Monetário Internacional: http://www.imf.org• IBGE: http://www.ibge.gov.br• Ministério da Fazenda: http://www.fazenda.gov.br• Organização Mundial do Comércio: http://www.wto.org• OTAN: http://www.nato.int

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39 GONÇALVES & POMAR

Anexos

Quadro 1 – Dívida externa: componentes

DÍVIDA EXTERNA TOTAL

DÍVIDA DE CURTO PRAZO DÍVIDA DE LONGO PRAZO FMI: USO DE CRÉDITOS

Por devedor

Dívida privada não-garantida Dívida pública e com garantia pública

Por credor

Credores oficiais Credores privados

Multilateral Bilateral Bancos comerciais Bônus

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40O BRASIL ENDIVIDADO

Tabela 1 – Dívida externa total do Brasil, por prazo:1982-1999 (milhões de dólares)

Fonte: Conjuntura Econômica, fev. 2000 & Banco Central.

Tabela 2 – Dívida externa total do Brasil, pública e privada:1993-1999 (milhões de dólares)

Fonte: Conjuntura Econômica, fev. 2000.

Tabela 3 – Crescimento da economia brasileira: 1900-98(taxa média anual de crescimento real)

Período PIB1900-10 4,21910-20 4,21920-30 4,51930-40 4,41940-50 5,91950-60 7,41960-70 6,21970-80 8,61980-90 1,61990-96 2,8

Fonte: Reinaldo Gonçalves, Globalização edesnacionalização, p. 81.

Ano Dívida total Médio elongo prazo

Curto prazo

1979 55.803 49.904 5.8991980 64.245 53.848 10.3971981 73.963 61.411 12.5521982 85.304 70.198 15.1061983 93.556 81.319 12.2371984 102.040 91.091 10.9491985 105.171 95.857 9.3141986 111.203 101.759 9.4441987 121.188 107.514 13.6741988 113.511 102.555 10.9561989 115.506 99.285 16.2211990 123.439 96.546 26.8931991 123.910 92.996 30.9141992 135.949 110.835 25.1141993 145.726 114.270 31.4561994 148.295 119.668 28.6271995 159.256 129.313 29.9431996 179.935 142.148 37.7871997 199.998 163.283 36.7151998 234.694 210.659 24.0351999 241.200 212.600 28.600

Ano Dívida total Pública Privada1993 145.726 90.613 55.1131994 148.295 87.330 60.9651995 159.256 87.455 71.8011996 179.935 84.299 95.6361997 199.998 76.247 123.7511998 234.694 94.902 139.7921999 241.200 100.000 141.200

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41 GONÇALVES & POMAR

Tabela 4 – Dívida externa dos países em desenvolvimento,segundo a região (1996)

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C, The World Bank, 1997,volume 1, p. 190-203.Nota: Dados preliminares, sujeitos a revisão.

Tabela 5 – Dívida e vulnerabilidade externa da América Latina:indicadores, 1980, 1990 e 1996 (em percentagem)

1980 1990 1996Dívida externa total /

exportação de bens e serviços201,8 255,9 202,8

Dívida externa total / produtonacional bruto

36,8 46,5 41,4

Serviço da dívida total /exportação de bens e serviços

36,3 24,4 30,0

Pagamento de juros /exportação de bens e serviços

19,3 12,2 11,8

Pagamento de juros / produtonacional bruto

3,4 2,2 2,4

Reservas internacionais /dívida externa total

22,3 12,3 21,8(*)

Reservas internacionais /importação de bens e serviços

4,3 3,6 4,9*

Dívida de curto prazo /dívida total

26,7 16,3 18,6

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C., 1997,v. 2, p. 26.Notas: Dados preliminares para 1996, sujeitos a revisão.(*) Dado para 1995.

Tabela 6 – Dívida e vulnerabilidade externa do Brasil:1980, 1990 E 1995 (em percentagem)

1980 1990 1995Dívida externa total /

exportação de bens e serviços306,5 324,6 269,8

Dívida externa total / produtonacional bruto

31,2 28,1 24,0

Serviço da dívida externa /exportação de bens e serviços

63,3 22,2 37,9

Pagamento de juros /exportação de bens e serviços

33,9 6,1 18,9

Pagamento de juros / produtonacional bruto

3,5 0,5 1,7

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C., 1997, volume 2, p. 112.

Regiões Dívida total(bilhões

de dólares)

Dívida externa/Exportações de bens e

serviços (%)

Dívida externa /Produto Nacional

Bruto (%)Países em

desenvolvimento: total 2.177,0 146,2 37,0Leste asiático

e Pacífico 451,8 98,9 30,8Europa

e Ásia Central 451,4 126,3 34,7América Latina

e Caribe 656,5 202,8 41,4Oriente Médio eNorte da África 220,8 126,8 34,0

Sulda Ásia 161,0 208,8 28,3África

Subsaariana 235,4 236,9 76,2

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42O BRASIL ENDIVIDADO

Tabela 7 – Dívida externa total da América Latina:1980, 1990 e 1996 (em bilhões de dólares)

1980 1990 1996Estoque total (A + B + C) 257,3 474,9 656,5A) Dívida de longo prazo 187,3 379,2 510,7Dívida pública e c/ garantia pública 144,8 354,1 424,7Dívida privada não-garantida 42,5 25,1 86,0B) FMI: uso de crédito 1,4 18,3 26,7C) Dívida de curto prazo 68,6 77,4 122,0Dos quais, atrasados 0,1 25,6 2,5

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C, The WorldBank, 1997, v. 1, p. 190-203.Nota: Dados preliminares para 1996, sujeitos a revisão.

Tabela 8 – Dívida externa total da América Latina, por país (1995)

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C., 1997, volume 2, p. 53-58.

Tabela 9 – Os países mais endividados da América Latina:1980, 1990 e 1995-97 (valores em US$ bilhões)

Países 1980 1990 1996 1997A. Latina: dívida total 257,3 474,9 629,1 644,6

México 57,4 104,4 160,0 156,0Brasil 71,5 119,6 178,1 188,2

Argentina 27,2 62,2 99,1 108,0Peru 9,4 20,1 33,6 27,9Chile 12,0 19,2 23,0 26,9

Colômbia 6,9 17,2 29,2 31,7Venezuela 29,3 33,2 35,3 33,3

Fonte: 1980-90 – Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C, TheWorld Bank, 1997, volume 2.1995-97 – CEPAL, Indicadores Económicos, Santiago, Chile, Naciones Unidas, ComisiónEconómica para América Latina y el Caribe, março 1998, p. 47.

País Dívida ExternaTotal

(bilhões dedólares)

Produto NacionalBruto

(bilhões dedólares)

Dívida externatotal / exportação

de bens eserviços (%)

Serviço da dívidatotal / exportação

de bens eserviços (%)

México 165,7 237,1 343 56Brasil 159,1 663,6 289 31

Argentina 89,7 271,4 359 34Venezuela 35,8 73,2 188 21

Peru 30,8 56,9 431 30Chile 25,6 59,1 154 23

Colômbia 20,8 73,7 148 28Equador 14,0 16,6 322 24

Nicarágua 9,3 1,6 2.050 36Costa Rica 3,8 8,9 112 16Honduras 4,6 3,7 291 30Panamá 7,2 7,1 82 4Bolívia 5,3 5,8 427 31

El Salvador 2,6 9,6 89 12Trinidad e Tobago 2,6 4,8 100 24

Uruguai 5,3 16,4 150 19Rep. Dominicana 4,3 11,7 142 13

Jamaica 4,3 3,2 133 19Barbados 0,6 1,7 66 12

Guatemala 3,3 14,7 116 12St. Kitts e Nevis 0,06 0,2 41 4

Paraguai 2,3 7,8 58 8Belize 0,3 0,6 74 9Guiana 2,1 0,6 346 17

Haiti 2,1 0,6 330 8St. Vincent 0,2 0,2 — —Dominica 0,1 0,2 80 6Granada 0,1 0,3 88 6St. Lucia 0,1 0,5 32 3

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43 GONÇALVES & POMAR

Tabela 10 – Serviço da dívida externa da América Latina:1980, 1990 e 1996 (em bilhões de dólares)

1980 1990 1996Serviço da dívida: total 46,3 45,4 97,3Principal: repagamento 21,7 22,8 59,1

Juros 24,6 22,6 38,2Longo prazo 17,6 18,6 30,2

FMI 0,1 1,5 1,1Curto prazo 6,9 2,5 6,9

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C, The WorldBank, 1997, volume 2, p. 26.Nota: Dados preliminares para 1996, sujeitos a revisão.

Tabela 11 – Balança comercial do Brasil, em milhões de dólares(1980/1999)

Ano Exportações Importações Saldo1980 20.133 22.954 -2.8211981 23.292 22.092 1.2001982 20.176 19.395 7811983 21.899 15.429 6.4701984 27.006 13.916 13.0901985 25.642 13.154 12.4881986 22.349 14.045 8.3041987 26.224 15.053 11.1711988 33.789 14.605 19.1841989 34.383 18.263 16.1201990 31.414 20.661 10.7531991 31.620 21.041 10.5791992 35.862 20.554 15.3081993 38.597 25.659 12.9381994 43.545 33.105 10.4401995 46.506 49.664 -3.1581996 47.747 53.301 -5.5541997 52.990 61.347 -8.3571998 51.120 57.594 -6.4841999 48.006 49.212 -1.206

Fonte: Conjuntura Econômica, fev. 2000.

Tabela 12 – Taxa de crescimento do PIB real:principais economias capitalistas, séculos XIX e XX

País/Período 1820-1870 1870-1913 1913-1950 1950-1973 1973-2000 1820-2000EUA 4,5 3,9 2,8 3,6 2,6 3,6Grã-Bretanha 2,0 1,9 1,3 3,0 1,9 2,0Japão 0,3 2,3 2,2 9,3 3,0 2,7França 1,2 1,5 1,1 5,0 2,1 1,9Alemanha 1,6 2,8 1,3 5,9 2,2 2,5Média 2,4 2,5 2,0 4,9 2,5 2,7

Fontes e Notas: Elaboração de Reinaldo Gonçalves com base em dados de Angus Maddison, Dynamic Forces in CapitalistDevelopment. A Long-run Comparative View, Oxford University Press, 1991, p. 50; e IMF, World Economic Outlook, WashingtonD.C., .International Monetary Fund, October, p. 172. Dados para 1999-2000 referem-se a projeções.A média para cada período entre 1820 e 1973 refere-se à média aritmética das taxas das 16 principais economias capitalistasavançadas. A média para o período 1973-2000 refere-se à taxa média ponderada para 28 economias capitalistas avançadas.

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Tabela 13 – Taxa de crescimento do PIB real per capita:principais economias capitalistas, séculos XIX e XX

País/Período 1820-1870 1870-1913 1913-1950 1950-1973 1973-2000 1820-2000EUA 1,5 1,8 1,6 2,2 1,5 1,7Grã-Bretanha 1,2 1,0 0,8 2,5 1,6 1,3Japão 0,1 1,4 0,9 8,0 2,4 1,9França 0,8 1,3 1,1 4,0 1,7 1,5Alemanha 0,7 1,6 0,7 4,9 2,0 1,6Média 0,9 1,4 1,2 3,8 1,9 1,6

Fontes e Notas: Elaboração de Reinaldo Gonçalves com base em dados de Angus Maddison, Dynamic Forces in CapitalistDevelopment. A Long-run Comparative View, Oxford University Press, 1991, p. 49 e IMF, World Economic Outlook, WashingtonD.C., .International Monetary Fund, October, p. 176. Dados para 1999-2000 referem-se a projeções.A média para cada período entre 1820 e 1973 refere-se à média aritmética das taxas das 16 principais economias capitalistasavançadas. A média para o período 1973-2000 refere-se à taxa média ponderada para 28 economias capitalistas avançadas.

Tabela 14 – Fluxo de recursos externos de longo prazopara a América Latina: 1980, 1990 e 1996 (em US$ bilhões)

1980 1990 1996A) Fluxo líquido de recursos: 29,9 21,6 69,2– Empréstimos 23,2 10,0 23,8– Investimento externo direto 6,1 8,1 25,9– Investimento de portfólio 0 1,1 16,5– Doações 0,6 2,4 2,9B) Pagamento de capital 22,5 25,0 42,6– Juros da dívida 17,6 18,6 30,2– Remessa de lucros 4,9 6,4 12,4C) Transferência líquida (A - B) 7,5 -3,3 26,6

Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C, The World Bank, 1997, v. 2, p. 26.Nota: Dados preliminares para 1996, sujeitos a revisão.Fonte: Banco Mundial, Global Development Finance, 1997, Washington D.C., 1997, v. 2, p. 26.Notas: Dados preliminares para 1996, sujeitos a revisão.

Tabela 15 – Reservas em moeda estrangeira noBanco Central brasileiro, 1982-1999, conceito caixa (US$ milhões)

1979 9.6891980 6.9131981 7.5071982 3.9941983 4.5631984 11.9951985 11.6081986 6.7601987 7.4581988 9.1401989 9.679

1990 9.9731991 9.4061992 23.7541993 32.2111994 38.8061995 51.8401996 60.1101997 52.1731998 44.5561999 36.342

Fonte: Conjuntura Econômica, fev. 2000.

44O BRASIL ENDIVIDADO

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Tabela 16 – Balança de serviços do Brasil 1994-99,em valores líquidos (bilhões de dólares)

1994 1995 1996 1997 1998 1999Viagens internac. -1.181 -2.419 -3.593 -4.376 -4.146 -1.437

Transportes -2.441 -3.200 -3.480 -4.123 -4.150 -2.802Seguros -132 -122 -62 73 82 -127

Lucros/dividendos -2.483 -2.590 -2.374 -5.597 -7.182 -4.058Juros líquidos -6.338 -8.158 -9.840 -10.391 -11.947 -15.170

Outros -2.085 -1.910 -1.912 -2.333 -2.883 -1.618Saldo -14.743 -18.594 -21.707 -26.897 -30.351 -25.212

Fonte: Conjuntura Econômica, fev. 2000.

Tabela 17 – Passivo externo da economia brasileira (estoque):1994-1997 (em bilhões de dólares)

1994 1995 1996 1997Passivo externo total 213,4 227,9 275,5 320,9Dívida externa total 148,2 159,2 179,9 199,9Investimento externo direto (IED) 39,9 44,5 54,4 71,5Investimento de portfólio 25,2 24,2 41,2 55,6Ativos externos do Brasil 63,9 70,8 83,2 74,5Passivo externo líquido 149,5 157,1 192,3 246,4

Fonte: Reinaldo Gonçalves, Globalização e desnacionalização, p. 75.

Tabela 18 – Desnacionalização da economia brasileira: indicadores,1995-99 (Indicadores da participação do capital estrangeiro em %)

Tabela 19 – Serviço do passivo externo do Brasil: lucros, jurose amortizações: 1994-1997 (em bilhões de dólares)

1994 1995 1996 1997Juros -6.388 -8.168 -9.173 -10.390Lucros e dividendos -2.483 -2.590 -2.374 -5.597Amortizações (pagas)da dívida externa -11.001 -11.023 -14.419 -26.021Total -19.872 -21.781 -25.966 -42.008

Fonte: Reinaldo Gonçalves, Globalização e desnacionalização, p. 76.

Fonte: Gonçalves, Reinaldo. Desnacionalização econômica. Jornal dos Economistas, Rio de Janeiro, Corecon-RJ, nº 131,mar. 2000, p. 3-4.Notas: (nd) não disponível.

Participação do capital estrangeiro 1995 1996 1997 1998 1999Fluxo de Investimento bruto 2,5 6,1 10,2 15,4 24,6Estoque de capital fixo 6,8 7,8 9,2 10,5 12,4Estoque líquido de riqueza 5,7 6,3 7,0 8,0 9,7Valor bruto da produção 13,5 15,5 18,3 20,8 24,6Vendas das grandes empresas 33,3 34,1 36,3 43,5 ndAtivos do sistema bancário 11,9 13,6 21,1 22,5 24,0

45 GONÇALVES & POMAR

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Tabela 20 – Amortização do principal e pagamento de juros da dívidaexterna brasileira, 1979/1999 (bilhões de dólares)

Fonte: Conjuntura Econômica, fev. 2000.

Ano Amortizações(pagas e

refinanciadas)

Juroslíquidos

1979 6,4 4,21980 5,0 6,31981 6,2 9,21982 6,9 11,41983 6,9 9,61984 6,5 10,21985 8,5 9,71986 11,6 9,31987 0,82 8,81988 17,1 9,81989 14,6 9,61990 8,8 9,71991 7,8 8,61992 8,6 7,31993 9,9 8,21994 50,4 6,31995 11,0 8,21996 14,3 9,81997 28,7 10,41998 33,6 11,91999 51,9 15,2

46O BRASIL ENDIVIDADO

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Índice de boxesDireitos econômicos, sociais e culturais................................................................................6

Os tipos de dívida...................................................................................................................6

Quanto você deve ao mundo..................................................................................................8

Dívida e ditaduras................................................................................................................10

Os investimentos do II PND.................................................................................................11

Expansão e crise.................................................................................................12

Exportando capitais..............................................................................................................13

O acordo de Bretton Woods.................................................................................................13

O maior devedor do mundo..................................................................................................14

Os ganhos da “década perdida”............................................................................................16

O Fundo Monetário Internacional........................................................................................16

Neoliberalismo e Consenso de Washington.........................................................................17

Como se “resolveu” a crise da dívida...................................................................................18

Aumenta a dependência externa..........................................................................................19

O passivo externo do país.....................................................................................................20

Investimento direto e desnacionalização.............................................................................22

Estatizando as dívidas..........................................................................................................23

Empalhando crocodilos.......................................................................................................24

Os pilares da “ordem” capitalista........................................................................................29

A Taxa Tobin........................................................................................................................29

A dívida ecológica................................................................................................................30

O que é um “pobre”..............................................................................................................32

O Tribunal da Dívida............................................................................................................33

A reunião de Havana............................................................................................................34

As prioridades orçamentárias..............................................................................................35

Pobres e endividados............................................................................................................35

GONÇALVES & POMAR47

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