A Importância Da Fisioterapia Motora No Acompanhamento de Crianças Autistas n 3 v 3 (1)

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Rev. Eletrôn. Atualiza Saúde | Salvador, v. 2, n. 2, p. 76-83 , jan./jun. 2016 | 76  A IMPORTÂNCIA D A FISIO TERAPIA MO T ORA NO  AC OMP ANHAMENT O DE CRIANÇAS A UTIS T AS  Anderson Azevedo*  Mayra Gusmão** Resumo O Autismo é um transtorno ainda desconhecido, com inuência direta no desenvolvimento neu- ropsicomo tor de toda criança, manifestando-se ainda no início da infância. A sioterapia motora tem extrema importância no tratamento de tal comorbidade e inuencia, muitas vezes, nessas três principais vertentes: a interação social, a comunicação e a linguagem. É relevante informar tal aspecto a prossionais, estudant es, pais e pessoas que tenham interesse sobre o tema, enfatizando a importância da intervenção da sioterapia motora em crianças com o diagnóstico de Autismo. rata-se de estudo de revisão sistemática da literatura, com busca de artigos nas bases de dados Ovid Medline, NHS Evidence Embase, Web of Science, Sciello, com os descritores: Autismo. Sín- drome do espectro autista. Prevalência d o autismo. Fisioterapia em autismo. Fisioterapia motora em autistas. Repercussão motora em autistas no período de 2000 a 2015. Foram encontrados 106 trabalhos (20 artigos no Ovid Medline, 38 artigos no NHS Evidence Embase, 18 na Web of Science e 30 artigos no SciELO), sendo 70 na língua inglesa, 24 na língua espanhola e 12 na língua portuguesa, no período avaliado. Selecionaram-se 21 artigos. Percebe-se que a sioterap ia motora tem grande importância na qualidade de vida não só da criança, mas de todos que com ela convivem, melhora ndo habilidades motoras, posturas e funções d a vida diária. Palavras-chave Autismo. Fisioterapia motora. Síndrome do Espectro Autista. * Bacharel em Educação Física formado pela Universidade UNIP/Brasilia, Bacharel em Fisioterapia pela FSBA e Especialista em Fisioterapia Pediátrica Neonatal pela Atualiza Cursos. E-mail: aazevedosio@ gmail.com ** Bacharel em Fisioterapia formada pela Faculdade Unime e Espe cialista em Fisioterapia Pediátrica Neo- natal pela Atualiz a Cursos. E-mail: [email protected] 1. Introdução O Autismo é um transtorno ainda desconhecido, com inuência direta no desenvolvimento neurop- sicomotor de toda criança, manifestado no início da infância. Demonstra algumas de suas carac- terísticas, geralmente, nos três primeiros anos de  vida, fechando concretamen te o seu diagnóstico aos 3 ou 4 anos de idade, a depender do grau da doença, e prevalece durante todas as fases do cres- cimento e desenvolvimento humano. Ele age nos três pilares principais: a interação social, a comuni- cação e a linguagem (SEGURA et al., 2011).

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 A IMPORTÂNCIA DA FISIOTERAPIA MOTORA NO

 ACOMPANHAMENTO DE CRIANÇAS AUTISTAS

 Anderson Azevedo*

 Mayra Gusmão**

Resumo

O Autismo é um transtorno ainda desconhecido, com influência direta no desenvolvimento neu-

ropsicomotor de toda criança, manifestando-se ainda no início da infância. A fisioterapia motora

tem extrema importância no tratamento de tal comorbidade e influencia, muitas vezes, nessas

três principais vertentes: a interação social, a comunicação e a linguagem. É relevante informar talaspecto a profissionais, estudantes, pais e pessoas que tenham interesse sobre o tema, enfatizando

a importância da intervenção da fisioterapia motora em crianças com o diagnóstico de Autismo.

rata-se de estudo de revisão sistemática da literatura, com busca de artigos nas bases de dados

Ovid Medline, NHS Evidence Embase, Web of Science, Sciello, com os descritores: Autismo. Sín-

drome do espectro autista. Prevalência do autismo. Fisioterapia em autismo. Fisioterapia motora

em autistas. Repercussão motora em autistas no período de 2000 a 2015. Foram encontrados

106 trabalhos (20 artigos no Ovid Medline, 38 artigos no NHS Evidence Embase, 18 na Web

of Science e 30 artigos no SciELO), sendo 70 na língua inglesa, 24 na língua espanhola e 12 na

língua portuguesa, no período avaliado. Selecionaram-se 21 artigos. Percebe-se que a fisioterapia

motora tem grande importância na qualidade de vida não só da criança, mas de todos que comela convivem, melhorando habilidades motoras, posturas e funções da vida diária.

Palavras-chave

Autismo. Fisioterapia motora. Síndrome do Espectro Autista.

* Bacharel em Educação Física formado pela Universidade UNIP/Brasilia, Bacharel em Fisioterapia pela

FSBA e Especialista em Fisioterapia Pediátrica Neonatal pela Atualiza Cursos. E-mail: aazevedofisio@

gmail.com

** Bacharel em Fisioterapia formada pela Faculdade Unime e Especialista em Fisioterapia Pediátrica Neo-

natal pela Atualiza Cursos. E-mail: [email protected]

1. IntroduçãoO Autismo é um transtorno ainda desconhecido,

com influência direta no desenvolvimento neurop-

sicomotor de toda criança, manifestado no início

da infância. Demonstra algumas de suas carac-

terísticas, geralmente, nos três primeiros anos de

 vida, fechando concretamente o seu diagnóstico

aos 3 ou 4 anos de idade, a depender do grau da

doença, e prevalece durante todas as fases do cres-

cimento e desenvolvimento humano. Ele age nos

três pilares principais: a interação social, a comuni-

cação e a linguagem (SEGURA et al., 2011).

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AZEVEDO, A.; GUSMÃO, M. | A importância da fisioterapia motora no acompanhamento de crianças autistas

Asperger, em 1944, descreveu a doença como um

transtorno que, além de afetar a comunicação, a lin-

guagem e o convívio social, influencia também no

desenvolvimento psiconeurológico. Não é uma sim-

ples deficiência, mas um conjunto de variações inti-

tulado “Espectro do Autismo”, sendo relacionado adiversas síndromes, com variadas características. A

partir daí, vários especialistas denominam tal doença

como Síndrome de Asperger (SEGURA et al., 2011).

Klin (2006) afirma que não se sabem ao certo as

causas do Autismo. Especialistas acreditam que é

um transtorno causado por uma possível falha do

desenvolvimento dos neurônios, ainda durante o

processo de maturação gestacional. Pelo fato de

não poder ser diagnosticado durante a gestação,alguns sinais aparecem na fase de recém-nascido,

com comportamentos atípicos em uma criança de

desenvolvimento normal. Outros começam a se

manifestar a partir de, aproximadamente, dezoito

meses de vida, com o aparecimento de característi-

cas típicas de crianças portadoras dessa deficiência.

Estudiosos afirmam que, para se conseguir reverter

algumas dos traços dessa doença, é primordial que

ela seja identificada antes dos sete anos, porém, o

diagnóstico só pode ser fechado com 3 ou 4 anos,idade em que a criança já possui maturação neu-

rológica a nível neuropsicomotor (BRAMBILLA et

al., 2003; MÜLLER et al., 2011).

Entre os especialistas, existe um consenso de que o

Autismo é decorrente de uma série de disfunções do

Sistema Nervoso Central (SNC), levando, assim, a

uma desordem em diversas áreas da criança. Estu-

dos de neuroimagem e autópsias apontam uma va-

riedade de anormalidades cerebrais em indivíduos

autistas, como, por exemplo, tamanhos anormaisdas amígdalas, hipocampo e corpo caloso, matu-

ração atrasada do córtex frontal, desenvolvimento

atrofiado dos neurônios do sistema límbico e pa-

drões variados de baixa atividade em regiões ce-

rebrais diversas, como o córtex frontal e o sistema

límbico (REDCAY; COURCHESNE, 2005).

A prevalência do autismo varia entre 4 a 13/10.000,

ocupando o terceiro lugar entre os distúrbios de

desenvolvimento infantil, ficando à frente das mal-

formações congênitas e da Síndrome de Down. Nos

Estados Unidos da América, a cada 1.000 crianças

nascidas, pelo menos uma, em alguma altura do

seu desenvolvimento, irá receber o diagnóstico do

ranstorno do Espectro Autista (RUER, 2005).

Esses estudos epidemiológicos mostraram que há

uma maior incidência de Autismo em meninos do

que em meninas, com proporções médias relatadas

de cerca de 3,5 a 4,0 meninos para cada menina.

Uma das melhores explicações para tal fato é que

o Autismo é uma condição genética ligada ao cro-

mossomo X, tornando, assim, os homens mais vul-

neráveis (RUER, 2005).

A maioria dos estudos encontrados na literatu-

ra relacionados ao tratamento de crianças diag-

nosticadas com o espectro autista cita somente o

acompanhamento de psicólogos, terapeutas ocu-

pacionais e profissionais de musicalidade, negli-

genciando a repercussão motora que a doença

pode trazer, com quadros hipotônicos e eixos

desorganizados, o que ocasiona, na primeira fase

da vida, um atraso em seu desenvolvimento neu-

ropsicomotor. Poucos artigos falam sobre essas in-

tervenções, achando-os, de forma secundária, em

artigos da língua inglesa e espanhola.

O presente estudo propõe avaliar sistematicamente

a importância de uma intervenção da fisioterapia

motora em crianças com o diagnóstico de Autis-

mo, visando informar a profissionais, estudantes,

pais e pessoas que tenham interesse sobre o tema.

2. Metodologia

rata-se de uma revisão sistemática de literatura.

Os documentos avaliados foram identificados com

base em pesquisa bibliográfica na Ovid Medline,

NHS Evidence Embase, Web of Science e Sciello,

sob diferentes descritivos (Autismo, Síndrome do

Espectro Autista, prevalência do Autismo, fisiote-

rapia em Autismo, fisioterapia motora em autistas,

repercussão motora em autistas), reportados na lín-

gua inglesa e espanhola. Cada documento identifi-

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cado foi revisado e assegurado independentemente

pelos 2 pesquisadores, conforme os seguintes cri-

térios de inclusão: artigos incluídos em periódicos

indexados, publicados nos últimos 15 anos.

Após as análises dos artigos, os pesquisadores fize-ram uma relação dos principais tópicos relaciona-

dos à repercussão motora e às principais abordagens

fisioterapêuticas, descrevendo cada uma delas.

3. Resultados e Discussão

Os dados obtidos a partir do levantamento biblio-

gráfico são apresentados a seguir, de acordo com

os critérios de inclusão previamente estabeleci-

dos. Número de artigos encontrados, segundo osdescritores retromencionados e segundo a classi-

ficação em nacional e internacional, no período

entre 2000 a 2015: nas seguintes bases dados Ovid

Medline, NHS Evidence Embase, Web of Science,

Sciello, foram encontrados 106 trabalhos (20 arti-

gos no Ovid Medline, 38 artigos no NHS Eviden-

ce Embase, 18 na Web of Science e 30 artigos no

SciELO), sendo 70 na língua inglesa, 24 na língua

espanhola e 12 na língua portuguesa, no período

avaliado. Selecionaram-se 22 artigos, conforme oscritérios de inclusão/exclusão, e que serão, neste

momento, analisados. É importante mencionar

que 84 artigos foram excluídos.

Essa informação reforça o entendimento de que o es-

tudo do acompanhamento de fisioterapeutas a crian-

ças autistas se faz importante para o aumento da

qualidade de vida em suas funções na rotina diária.

al abordagem é algo recente nas publicações da área

da saúde. As principais publicações são de psicólogos

e terapeutas ocupacionais, não havendo publicaçõessobre o tema por profissionais da fisioterapia.

Após leitura dos artigos, realizou-se a sistematização

das informações sobre as principais características

modificáveis, com o acompanhamento de profissio-

nais de Fisioterapia a uma criança autista. Esta for-

ma de análise se deu pelo fato de que, pela literatura,

a maioria das crianças com o diagnóstico do autis-

mo apresenta uma ou mais dessas características.

Quando se fala em corpo, segundo Ferreira (2000),

tem-se que pensar que ele é um organismo vivo,

um ser desejante, atuante, emocional, inteligente,

enfim, não se pode esconder ou apenas renegar a

história que ele carrega. É preciso entender que o

corpo muda com o passar do tempo, dependendodos valores e das necessidades do local, da situa-

ção, e é necessário aceitar as suas diferenças.

Segundo Ferreira (2002), as experiências motoras

da criança são decisivas na elaboração progressi-

 va das estruturas que, aos poucos, dão origem às

formas superiores de raciocínio, isto é, em cada

fase do desenvolvimento, ela consegue uma deter-

minada organização mental que lhe permite lidar

com o ambiente. Pode-se assim dizer que, em ter-mos de evolução, a motricidade é uma condição de

adaptação vital. Sua essência reside no fato de nela

o pensamento poder manifestar-se. A pobreza de

seu campo de exploração irá retardar e limitar a

capacidade perceptiva do indivíduo.

A corporeidade é a linguagem mais primitiva des-

se indivíduo desde a sua fase uterina. Assim, o

movimento está em ligação direta com a criança,

pois é parte dela que se comunica com o mundo, e

também é a partir dele que irá organizar-se como

sujeito pensante e atuante para dar conta da sua

participação na sociedade.

Podemos encontrar crianças apáticas, hipotônicas,

com a atividade motora reduzida, e posturas vicio-

sas, com dificuldades de iniciar um movimento.

Ou crianças hiperativas, sem ter nenhum interesse

por objetos ou pessoas (GESCHWIND, 2013).

3.1 Alterações do tônus muscular

Em crianças com ranstorno do Espectro Autista,

muitas vezes, é difícil avaliar o tônus isolado. Hi-

potonia moderada é observada em mais de 50%

e pode provocar alterações da coluna vertebral

(escoliose) na puberdade. Mas algumas crianças

podem ter hipertensão ou alternância das duas va-

riedades de tônus (GESCHWIND, 2013, SACREY

et al., 2014).

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AZEVEDO, A.; GUSMÃO, M. | A importância da fisioterapia motora no acompanhamento de crianças autistas

O autor explica que o equilíbrio, ou desequilíbrio,

do tônus muscular, suas variações ou seus blo-

queios irão traduzir a maneira de ser da criança,

suas emoções, suas vivências psíquicas, além de

participarem também como elemento na comu-

nicação não verbal. A atitude da mãe pesa muitono desenvolvimento da criança, desde o período

gestacional, quando há um aumento considerável

de medos, muitas vezes, sem motivo aparente, de

ansiedades, depressões, enfim, uma gama de sen-

timentos que irão repercutir, mais tarde, no de-

senvolvimento psicológico, intelectual, afetivo e

psicomotor da criança. Existe, portanto, uma co-

municação constante, um diálogo corporal entre

mãe e filho, na esfera do qual as modificações tôni-

cas acompanham não apenas cada afeto, mas tam-bém cada fato da consciência (MORAES, 2002).

Seguindo na abordagem de Ferreira (2000), ele vi-

sualiza, então, que as capacidades motoras, intelec-

tuais e afetivas que facultam à criança estabelecer re-

lação com o mundo estão sujeitas à sua carga tônica

pessoal, a qual é, por sua vez, construída a partir das

estimulações que o meio e as pessoas lhe impõem.

Será pela percepção das diferentes experiências que

a criança terá possibilidade de criar a base para o de-senvolvimento de sua independência e autonomia

corporal e sua maturidade socioemocional.

3.2 As posições e atitudes

As crianças com o ranstorno do Espectro Autis-

ta são, muitas vezes, bizarras, mal equilibradas e

desconfortáveis, isso para um grau mais grave (SA-

CREY et al., 2014).

Ferreira e Tompson (2002) informam que o au-tista apresenta dificuldade de compreender seu

corpo em sua globalidade e em segmentos, assim

como seu corpo em movimento. Quando partes

do corpo não são percebidas e as funções de cada

uma são ignoradas, podem-se observar movimen-

tos, ações e gestos pouco adaptados. O distúrbio

na estruturação do esquema corporal prejudica

também o desenvolvimento do equilíbrio estático,

da lateralidade, da noção de reversibilidade; fun-

ções de base necessárias à aquisição da autonomia

e aprendizagens cognitivas.

3.3 A marcha

Um aspecto muito importante, pois estão intima-mente ligados à sua funcionalidade, os movimen-

tos sincronizados durante a caminhada podem

estar ausentes ou serem precários. A marcha a pé

(sem deformidade ou doença neurológica) pode

ocorrer em 19% dos casos (SANOS; FERNAN-

DES, 2012, SALIMI; JUNQUEIRAII, 2013).

Cifuentes (2010) realizou estudos de transtornos

de desenvolvimento motor nos primeiros meses

de vida, analisando o sentar, o engatinhar, o ficarem pé e o andar. Encontrou, já nesta fase, padrões

de assimetria de movimento, alguns reflexos ainda

não inibidos na idade apropriada em desenvolvi-

mento, enquanto outros não apareceram quando

deveriam, como os reflexos de proteção ao cair,

atraso no desenvolvimento dos estágios de cami-

nhar e posicionamento anormal de marcha. Essas

normalidades foram atribuídas à retenção anormal

do reflexo primitivo, devido a um sistema neural

imaturo. Fernandes (2013) relata que crianças comdiagnóstico tardio de transtorno autista apresenta-

ram problemas no padrão motor da marcha, em

que utilizavam a ponta dos pés para tal, mostraram

também uma postura assimétrica do braço duran-

te a caminhada e anomalias no movimento geral.

Os autores sugerem que o movimento anormal do

braço pode estar relacionado com o controle do

equilíbrio, sugerindo, assim, um envolvimento do

cerebelo, devido ao seu papel na coordenação mo-

tora e controle de balanço.

3.4 Atraso no desenvolvimentoneuropsicomotor

Há um atraso na aquisição dos movimentos natu-

rais (descer escadas com movimentos alternados) e

dificuldades de aquisições de habilidades motoras

finas (vestir e despir, desenho e escrita, dificuldades

na condução do índice do polegar). Isso tem um im-

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pacto negativo nas funções das atividades da vida

diária, complicando até a prática de um esporte um

pouco mais complexo (GESCHWIND, 2013; SA-

CREY et al., 2014; ROSA NEO et al., 2013).

3.5 Estímulos a habilidadesde forma precoce

Em algumas crianças, essas competências moto-

ras muito específicas são incomuns de desenvolver

(SACREY et al., 2014).

Segundo Levin (2000), o esquema corporal é o

que se pode dizer ou representar acerca do pró-

prio corpo. A representação que temos do mes-

mo é da ordem do evolutivo, do temporal. Dentro

do esquema corporal, encontram-se as noções deproprioceptividade, interoceptividade e extero-

ceptividade. Na evolução psicomotora da criança,

o esquema corporal irá se construindo, ele é sus-

cetível à mensuração e à comparação com outro,

por exemplo, nas medidas padronizadas em que a

criança corresponde a cada idade, a um peso, uma

altura, etc.

Para Ferreira e colaboradores (2002), o esquema

corporal é elemento básico indispensável para aformação da personalidade da criança. É a repre-

sentação relativamente global, científica e diferen-

ciada que a criança tem de seu próprio corpo. A

estruturação espaço-temporal fundamenta-se nas

bases do esquema corporal, sem o qual a criança,

não se reconhecendo em si mesma, só muito difi-

cilmente poderia aprender o espaço que a rodeia.

orna-se necessário que ela adquira o domínio

corporal, o reconhecimento corporal e a passagem

para a ação. Sem essas habilidades, uma criança,por exemplo, poderá chocar-se constantemente

com os amigos durante brincadeiras que envolvam

corrida, machucar-se ao passar por espaços limi-

tados e sentir dificuldades em transferir líquidos

de um recipiente para outro ou derramar os líqui-

dos ao bebê-los. As etapas do desenvolvimento

do esquema corporal abrangem o corpo vivido, o

conhecimento das partes do corpo, a orientação-

-espaço-corporal e a organização espaço-corporal.

3.6 As estereotipias

emos que levá-las em consideração, pois impactam

nas relações sociais. Elas respondem à necessidade de

expressar emoções através do movimento, acompa-

nhadas por uma busca da sensação de relaxamentoe prazer. Podem variar e evoluir na mesma criança

e, em última instância, são capazes de agir negativa-

mente sobre o músculo-esquelético (GESCHWIND,

2013; SACREY et al., 2014; PFEIFFER et al., 2013).

Levin (2000) informa que os movimentos estereo-

tipados apresentados pelas crianças autistas po-

dem ser chamados de movimentos autísticos, uma

 vez que não se dirigem a ninguém. O movimento,

ao não passar por outro registro, não se separou.

Ele sugere que uma das possíveis vias de entradano tratamento dessas crianças é por meio desses

movimentos estereotipados (autoeróticos). Por

essa via, procura-se escindir, separar esse corpo do

gozo: tenta-se fazer com que o movimento comece

a funcionar, desse modo, no registro do desejo, si-

tuando-o em outra posição separada do gozo.

3.7 A voz

É uma característica importante de crianças comSíndrome do Espectro Autista, pois aspectos mo-

tor-fonológicos em produção podem ter impacto

na comunicação (ROSA NEO et al., 2013).

3.8 Linguagem

Um fator que não deve ser esquecido é que os au-

tistas possuem seus próprios desejos, preferências

e personalidade, sem ignorar os outros aspectos do

desenvolvimento. A linguagem, sobretudo, é cons-tituinte do sujeito, sendo base para a estruturação

psíquica, cognitiva e também psicomotora. Ao fa-

lar de corpo, o objetivo é ajudar o indivíduo autista

a superar algumas de suas dificuldades, permitin-

do seu desenvolvimento em outros planos, ofere-

cendo novos meios de expressão, favorecendo a

conscientização, possibilitando o acesso a funções

importantes, como o olhar e o tocar, enfim, bus-

cando melhorar a sua qualidade de vida.

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AZEVEDO, A.; GUSMÃO, M. | A importância da fisioterapia motora no acompanhamento de crianças autistas

3.9 Medicação

O impacto das drogas sobre o Sistema Motor: o

terapeuta deve conhecer os medicamentos que a

criança toma e seu potencial de ação no sistema

muscular. Os antipsicóticos podem induzir a certarigidez do movimento ou causar discinesia aguda

ou tardia. O antiepilético pode levar a tremedeiras

nos membros inferiores e influenciar nas habilida-

des motoras finas (PFEIFFER et al., 2013).

4. Conclusão

Fica claro que intervir em um processo vivencial é

intervir na totalidade humana, seja através de um

simples olhar, do escutar, do tocar e até mesmo nofalar. Provocar algumas variações nessa experiên-

cia é alterar a vivência global do ser em sua forma

de ser, estar e viver no mundo.

Podemos, assim, dizer que uma das primeiras in-

tervenções a que somos submetidos se dá através

do olhar. No primeiro momento da vida, quando

nascemos, alguém nos olha e diz quem nós somos.

A partir daí, começamos a delinear e nos posicio-

nar em nosso lugar no mundo, nossa identidade. O

toque, o sorriso, o falar, o olhar dos pais são de vitalimportância para o desenvolvimento emocional,

intelectual e motor da criança. O desejo do outro

marca e influencia seu próprio desejo.

É papel do profissional de Fisioterapia compreen-

der e viver em profundidade o fato de que a crian-

ça necessita de alguém que se encante com seu

mundo e o compreenda como essencial ao ato de

 viver; alguém que sonhe, fantasie, deseje, sorria,

dê gargalhadas, se alegre, busque realizar, alguémque, conscientemente, construa a existência para si

e para o outro: um profissional que lança mão do

arcabouço de seu conhecimento para o exercício

de seu trabalho, ao mesmo tempo em que é repleto

de sensibilidade e sutileza relacional.

Utilizando o pensamento de Ferreira e colabora-

dores (2002), o profissional que decide lidar com acriança autista deve considerar tudo o que é sabi-

do sobre o processo de desenvolvimento normal e

os fatores que otimizam o desenvolvimento, como

também tem de considerar o que se sabe sobre os

aspectos anormais que interferem no desenvolvi-

mento das crianças autistas.

É fácil perceber que a criança autista não possui

um corpo vivenciado. A sensação que se tem é que

o corpo é um objeto à parte, sem significação, sem

importância. Existe uma grande dificuldade, por

parte dela, em compreender seu corpo como um

todo. Ela não desenvolve, de maneira adequada, as

noções de Esquema Corporal, o que tem diversas

implicações, como foi possível observar ao lon-

go deste artigo. Para uma criança autista, o corpo

pode ser um objeto de angústia e de pânico, sobre-

tudo se ele não é bem estimulado e compreendido.

Por isso, é necessário que ele se torne um polo de

segurança e estabilidade.

Posso, a princípio, concluir que uma das maneiras

de auxiliar no tratamento do Autismo é por meio

do corpo, tentando estabelecer uma relação entre

o psíquico e o orgânico. A partir de experiências

sensório-motoras, o autista poderá aumentar sua

relação com o mundo, inicialmente impossível pela

dificuldade de entrar em contato com os outros,

seja por meio do toque ou por meio do olhar. Fica

a proposta para, num próximo estudo, buscar te-

rapias que utilizem o corpo nessa intermediaçãocorpo-mente e verificar de que forma elas podem

contribuir para o tratamento de crianças autistas.

THE IMPORTANCE OF PHYSICAL THERAPY MOTOR IN CHILDREN WITH AUTISM MONITORING

Abstract

Autism is a disorder still very unknown, with direct influence on psychomotor development of

a child, yet manifested in the early childhood, physical therapy has a great importance in the

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AZEVEDO, A.; GUSMÃO, M. | A importância da fisioterapia motora no acompanhamento de crianças autistas

treatment of this comorbidity influencing many times in the three main characteristics: a partner

interaction, communication and language. o inform professionals, students, parents and people

who are interested on the topic, emphasizing the importance of physical therapy intervention

in children with autism diagnosis. Tis is a systematic review of the literature study, to search

articles in the database: Ovid Medline, Embase NHS Evidence, the Web Science, SciELO with

the descriptors: autism, autism spectrum syndrome, prevalence of autism, physical therapy inautism, physical therapy for autism, motor repercussions in autistic from 2000 to 2015. Found

106 studies (20 articles on Ovid MEDLINE, 38 articles on NHS Evidence Embase, Web of Science

18 and 30 articles in SciELO), 70 in English 24 in Spanish and 12 in Portuguese during the study

period. Being selected 21 articles. It can be seen that physical therapy is very important in quality

of life not only of the child most of all with whom they live, improving motor skills, positions and

functions of everyday life.

Keywords

Autism. Physical therapy. Syndrome Autism Spectrum.

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