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1 A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA PARA A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE: O CASO DA IGREJA NOSSA SENHORA IMACULADA CONCEIÇÃO DE DOURADOS/MS CAMILA DE BRITO QUADROS LARA Memória e identidade: apontamentos iniciais A memória pode ser entendida popularmente como a capacidade que o ser humano tem de conservar e relembrar experiências e informações relacionadas ao passado, sendo estas, parte de processos de interação de cada indivíduo com seu meio. A partir do início do século XX, sobretudo nas Ciências Humanas, o conceito de memória passou a ser definido como um fenômeno social, na medida em que as relações entre os indivíduos são estabelecidas pelas formas em que os mesmos interagem entre si, através dos aspectos socioculturais, como por exemplo, nos ambientes: familiar, profissional, político, religioso, dentre outros. Tais elementos são fundamentais na construção das memórias e, consequentemente, da história destes indivíduos. Jacques Le Goff (2013) aponta a relação entre memória e história, quando salienta: “Tal como o passado não é a história, mas o seu objeto, também a memória não é a história, mas um dos seus objetos e, simultaneamente, um nível elementar de elaboração histórica.” (LE GOFF, 2013, p. 51). Assim, a memória também pode ser utilizada para reconstruir os fatos históricos a partir de resignificações individuais. Maurice Halbwachs (2003), em seu livro “A memória coletiva”, discorre no primeiro capítulo sobre as duas principais categorias da memória: a memória individual - “O primeiro testemunho a que podemos recorrer será sempre o nosso” (p. 29) e a memória coletiva - “É como se estivéssemos diante de muitos testemunhos” (p. 30). Diante da perspectiva que o indivíduo nunca está sozinho, mesmo os acontecimentos vividos solitariamente são percebidos enquanto lembranças que permanecem coletivas, ou seja, para o autor, a memória individual é construída a partir da memória coletiva. Halbwachs (2003) ainda enfatiza que para se rememorar uma lembrança ou confirmá-la não se fazem necessários testemunhos “no sentido literal da palavra, ou seja, indivíduos presentes sob uma forma material” Mestranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Grande Dourados (PPGH/UFGD). Bolsista Capes.

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A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA PARA A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE: O

CASO DA IGREJA NOSSA SENHORA IMACULADA CONCEIÇÃO DE

DOURADOS/MS

CAMILA DE BRITO QUADROS LARA

Memória e identidade: apontamentos iniciais

A memória pode ser entendida popularmente como a capacidade que o ser humano

tem de conservar e relembrar experiências e informações relacionadas ao passado, sendo

estas, parte de processos de interação de cada indivíduo com seu meio. A partir do início do

século XX, sobretudo nas Ciências Humanas, o conceito de memória passou a ser definido

como um fenômeno social, na medida em que as relações entre os indivíduos são

estabelecidas pelas formas em que os mesmos interagem entre si, através dos aspectos

socioculturais, como por exemplo, nos ambientes: familiar, profissional, político, religioso,

dentre outros. Tais elementos são fundamentais na construção das memórias e,

consequentemente, da história destes indivíduos. Jacques Le Goff (2013) aponta a relação

entre memória e história, quando salienta: “Tal como o passado não é a história, mas o seu

objeto, também a memória não é a história, mas um dos seus objetos e, simultaneamente, um

nível elementar de elaboração histórica.” (LE GOFF, 2013, p. 51). Assim, a memória também

pode ser utilizada para reconstruir os fatos históricos a partir de resignificações individuais.

Maurice Halbwachs (2003), em seu livro “A memória coletiva”, discorre no primeiro

capítulo sobre as duas principais categorias da memória: a memória individual - “O primeiro

testemunho a que podemos recorrer será sempre o nosso” (p. 29) e a memória coletiva - “É

como se estivéssemos diante de muitos testemunhos” (p. 30). Diante da perspectiva que o

indivíduo nunca está sozinho, mesmo os acontecimentos vividos solitariamente são

percebidos enquanto lembranças que permanecem coletivas, ou seja, para o autor, a memória

individual é construída a partir da memória coletiva. Halbwachs (2003) ainda enfatiza que

para se rememorar uma lembrança ou confirmá-la não se fazem necessários testemunhos “no

sentido literal da palavra, ou seja, indivíduos presentes sob uma forma material”

Mestranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Grande

Dourados (PPGH/UFGD). Bolsista Capes.

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(HALBWACHS, 2003, p. 31). Le Goff (2013) também aponta alguns elementos importantes

para o estudo da memória e insere o caráter de identidade como fundamental para conceituá-

la como algo a ser conquistado, construído:

A memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade,

individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos indivíduos

e das sociedades de hoje, na febre e na angústia. Mas a memória coletiva é não

somente uma conquista é também um instrumento e um objeto de poder. São as

sociedades cuja memória social é sobretudo oral ou que estão em vias de constituir

uma memória coletiva escrita que melhor permitem compreender esta luta pela

dominação da recordação e da tradição, esta manifestação da memória (LE GOFF,

2013, p.435, destaque do autor).

Trabalhando nessa construção de pensamento, há que se justificar o motivo e a

importância de se estudar a memória. Segundo Le Goff (2013, p.437) “A memória, a qual

cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura salvar o passado para servir ao presente

e ao futuro”. Enquanto geradora da identidade, a memória pode ser vislumbrada como sendo

participante de sua construção, uma vez que, a própria identidade de uma sociedade, realiza

certas seleções da memória, e ainda, dá forma às predisposições que vão conduzir o indivíduo

a incorporar alguns aspectos particulares do passado.

Pollak (1992, p. 01-03) destaca como característica da memória, tanto individual como

coletiva, o caráter mutante. Tais elementos mutáveis são, sobretudo, episódios vividos

pessoalmente ou pelo o grupo no qual a pessoa se relaciona. A memória também pode sofrer

flutuações, dependendo do momento em que ela está sendo abordada. O autor analisa ainda,

os elementos constitutivos da memória e ordena-os em: acontecimentos, pessoas e lugares. Os

acontecimentos podem ser vividos pessoalmente ou acontecimentos vividos “por tabela”

(vividos em coletividade); as pessoas podem ser categorizadas por personagens encontradas

durante a vida e também vividas indiretamente, ou “por tabela”. Por fim, os lugares da

memória, lugares de comemoração, que ficaram marcados na memória pública do indivíduo,

os vestígios datados da memória. “Esses três critérios, conhecidos direta ou indiretamente,

podem obviamente dizer respeito a acontecimentos, personagens e lugares reais,

empiricamente fundados em fatos concretos. Mas pode se tratar também da projeção de outros

eventos” (POLLAK, 1992, p. 03). O autor ainda enfatiza que a memória é essencial na

percepção de si e dos outros. Dessa forma, ela acaba sendo constituída pelo resultado de um

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trabalho de organização e de seleção daquilo que é importante para o sentimento de unidade,

de continuidade e de coerência, ou seja, de identidade.

Estudar os elementos que constroem e constituem a memória se faz deveras

importante, pois a mesma está intrinsecamente ligada ao processo de construção da

identidade, seja ela individual ou coletiva. A partir de tais aspectos podem-se reconhecer os

acontecimentos passados e ainda conservar as informações que nos são relevantes à

preservação, rememoração.

A transmissão da memória social ocorre pelos vários tipos de comunicação que são à

ela empregados e diretamente influenciados na organização de uma sociedade. Peter Burke

em sua obra: Variedades de história cultural (2011) contribui, nesse sentido, com as variáveis

desses tipos de comunicação onde a memória é inserida: as tradições orais, a esfera de ação do

historiador, as imagens, as ações, e por fim, o espaço. O autor aponta ainda a função do

historiador diante deste contexto: guardião da memória e dos acontecimentos públicos

(BURKE, 2011, p. 74-75).

Nesta perspectiva, pode-se afirmar que a memória, por conservar certas informações,

contribui para que o passado não seja totalmente esquecido, pois ela acaba por capacitar o

homem a atualizar impressões ou informações passadas, fazendo com que a história se

eternize na consciência humana (LE GOFF, 2013, p. 387).

Marc Bloch em “Apologia da História ou o ofício do historiador” (2001) traz à tona a

questão da relação do historiador com algumas “ferramentas” de pesquisa para a investigação

do passado: testemunhos e vestígios. Para Bloch, independente se o passado pesquisado é

longínquo ou mais recente, como o próprio autor esclarece, “todo conhecimento da

humanidade, qualquer que seja, no tempo, seu ponto de aplicação, irá beber sempre nos

testemunhos dos outros uma grande parte de sua substância” (BLOCH, 2001, p. 70). Já os

vestígios, garantem a especificidade do “saber histórico” são elementos deixados pelo passado

para serem escritos e descritos pela história. Paul Ricœur (2007) também enfatiza a

importância do testemunho no sentido em que se trata da primeira etapa do processo que

passa a memória declarada, antes de torna-se documento. Nesse sentido, o historiador trabalha

com as ideias construídas pelos indivíduos sobre o passado, tendo estreita relação com a

época, com os símbolos e com as representações do tempo histórico em que esse indivíduo

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está inserido. Assim, para o autor, a partir memória há uma significação do passado, o qual é

retratado através da narrativa do tempo histórico vivido (RICŒUR, 2007, p. 174).

Isto posto, podemos dizer que a história de Dourados foi e tem sido escrita, em grande

parte, por meio de memórias, testemunhos e vestígios escritos, sobretudo por autores

memorialistas. Dentre vários outros, destacamos os memorialistas e suas publicações, os quais

serão utilizados neste artigo: Ercília de Oliveira Pompeu (Monografia do município de

Dourados, publicado em 2014), Regina Heloíza Targa Moreira (Memória Fotográfica de

Dourados, publicado em 1990) e João Augusto Capilé Jr. (“Sinjão”), Julio Capilé, Maria de

Lourdes da Cruz e Souza (História, fatos e coisas douradenses, publicado em 1995).

O surgimento da Igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição de/em Dourados/MS:

memória e identidade cultural

A história da Igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição, principal templo religioso

católico do município confunde-se, em grande parte, com a própria história da criação e

desenvolvimento da cidade de Dourados, na medida em que esses dois “personagens”

surgiram, cresceram e tem se desenvolvido conjuntamente, delegando à igreja, aspectos que

revelam identidades conferidas aos moradores e criando relações, que ora permanecem, ora se

dispersam na multiculturalidade religiosa já presente no início do povoado e cada vez mais

crescente no município.

Stuart Hall (2014) discorre sobre o universo multicultural como sendo parte de um

processo de fragmentação identitária, por vezes contraditório, do sujeito pós-moderno. Nesta

perspectiva, preconizou-se a intenção de se rememorar a história do surgimento da Igreja

Nossa Senhora Imaculada Conceição do povoado de Dourados neste texto, destacando alguns

fatos, personagens e datas, a fim de se estabelecer uma possível compreensão sobre as marcas

simbólicas que fazem parte do conjunto maior em que foi construída a identidade cultural

douradense. Dessa forma, entende-se que a identidade é elaborada através dos eventos

históricos, dos símbolos, das datas, das tradições, das imagens e rituais, ou seja, um conjunto

de elementos que representam experiências partilhadas pelo grupo (HALL, 2014, p. 31),

sendo estes que dão sentido à essa identidade.

A igreja foi a primeira instituição que surgiu no núcleo central urbano, atuando,

inclusive na organização do espaço urbano. Posteriormente surgiram as escolas, os hospitais,

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e os outros elementos que foram compondo este espaço (MOREIRA, 1990, p. 21). Tais

elementos são entendidos como características formadoras de identidade cultural e da história

do município, de maneira que os moradores foram construindo, além de um sentimento de

pertencimento pelo lugar, e também por estabelecer um vínculo entre as memórias trazidas

dos locais de onde vieram. Esse vínculo, segundo Le Goff (2013) que se torna afetivo,

possibilita que essa população passe a se enxergar como “sujeitos da história”, que possuem

assim como direitos, também deveres para com a sua localidade.

Alguns “sujeitos” da história de Dourados são “destacados” nos discursos

memorialistas em suas atividades profissionais ou ações políticas, os chamados “pioneiros”.

Moreira (1990, p. 21) aponta algumas características dessas famílias que mais tarde darão

início ao processo de construção da primeira igreja católica na localidade.

A estrutura familiar é patriarcal. A vida ubana é quase que constituída de famílias.

São casas esparsas de famílias que já manifestam a necessidade de organizar o

espaço urbano. Estas famílias se destacam de várias formas: participando da política

local e regional, integrando comissões para construções de igrejas, lutando por

escolas [...].

Na tentativa de compreender os vestígios e os símbolos identitários que foram

construídos através da Igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição, tomaremos como

contribuição o conceito de identidade presente nos estudos de Stuart Hall (2014, p. 32)

quando cita como sendo o conjunto de características construídas a partir do reconhecimento

de alguma origem comum, ou de características que são partilhadas com outros grupos ou

pessoas, ou ainda a partir de um mesmo ideal.

A religiosidade, principalmente o culto católico, sempre esteve presente nas práticas

dos indivíduos que aqui se instalaram. Tais práticas religiosas foram, sobretudo, trazidas pelos

migrantes e incorporadas à “nova vida” que aos poucos foi se formando. Assim, a

religiosidade católica também originou memórias, que foram base para a formação de uma

possível identidade cultural do município.

A questão da religiosidade católica foi tão marcante na região, que já esteve presente

até mesmo em um dos primeiros “nomes” dados ao povoado. A memorialista Ercília Pompeu

afirma que no decorrer do ano de 1909 surgiu a ideia de fundação do patrimônio de “Três

Padroeiras” porque existiam três cruzeiros em pontos estratégicos do povoado. O primeiro

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cruzeiro ficava onde foi a residência episcopal sobre a invocação da Imaculada Conceição,

onde em 1912 foi rezado o primeiro terço. O segundo onde é hoje o loteamento São Pedro,

invocando Santa Rita e o terceiro na atual Cabeceira Alegre sobre a proteção de Santa

Catarina (POMPEU, 2014, p. 19).

No cruzeiro que dedicado à Imaculada Conceição, considerado um símbolo da fé da

pequena população que se formava, os fiéis costumavam juntar-se para fazer suas preces e

rezar os rosários e terços, geralmente em intenção à alma de algum conhecido ou familiar

(CAPILÉ JUNIOR; CAPILÉ; SOUZA, 1995, p. 107).

O cenário religioso vislumbrado na região era, de certo modo, precário. Pela falta de

assistência católica, leigos realizavam os batizados em casa, algumas famílias se encontravam

para “puxar as rezas” nas fazendas, com muitos elementos de crendices populares. “O povo

tinha sede de religião” (CAPILÉ JUNIOR, CAPILÉ, SOUZA, 1995, p. 187).

Na primeira década de existência do patrimônio não havia capelas, nem padres nem

juiz de paz. Os casamentos, batizados, missas e outras práticas que necessitavam da figura do

padre eram realizados quando os mesmos estavam de passagem pela região, as chamadas

“visitas de desobriga”. Moreira (1990) discorre sobre a figura do “padre” utilizando a obra de

Hélio Serejo “Homens de aço - a luta nos ervais do Mato Grosso” para discorrer sobre o que

ocorria nesta região:

Constantemente, pelos ervais, aparece um padre á cavalo, vasta bagagem, cheio de

santinhos, e rosários, alguns crucifixos, pequenas imagens, e pobres peças de

vestimenta religiosa. É o batizador, como o cognomina o povo simples do sertão.

(...) Fazendo aqui um batizado, ali um casamento, celebrando mais além uma missa,

ele se internava cada vez mais pelo sertão, convicto que cumpria um dever sagrado.

Quando ele aparecia, famílias inteiras, viajando longos dias, vinham trazer os filhos

para o batismo (SEREJO apud MOREIRA, 1990, p. 22).

Ou seja, de acordo com a autora, mesmo sem haver ainda um templo, uma capela onde

se encontrariam os fiéis para exercer suas práticas religiosas, a figura do padre se inseriu e

permaneceu na mística religiosa do povo, constituindo como tais a aspectos de identidade

cultural na medida em que os indivíduos necessitavam exercer os costumes e tradições

católicas trazidos consigo das regiões de onde vieram.

A partir desta necessidade e nesse contexto, os habitantes do povoado começaram a se

organizar para construir uma capela em 1923 (CAPILÉ JUNIOR; CAPILÉ; SOUZA, 1995, p.

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107), fato que culminou com uma comissão, composta em sua maioria por mulheres, pró-

construção da “capela da Conceição” (MOREIRA, 1990, p. 25). A primeira capela de

Dourados foi construída no espaço de tempo entre junho e dezembro de 1925, com doação do

terreno por um morador, espaço este onde atualmente fica a Catedral Imaculada Conceição.

No dia 08 de dezembro1 de 1925, a capela2 foi aberta ao público e recebeu a imagem de Nossa

Senhora Imaculada (POMPEU, 2014; MOREIRA, 1990). Porém, a inauguração oficial deu-se

somente em 1926, quando por ocasião esteve na região o padre missionário João Giardelli. A

Paróquia foi criada em outubro de 1935, ano em que Dourados se torna município e, em junho

de 1957 é criada a Diocese de Dourados, tendo sempre, como templo religioso principal a

Igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição, antes capela.

Diante de tais apontamentos históricos, podemos entender que algumas marcas

simbólicas que são identificadas através das memórias dos lugares, personagens, datas e

acontecimentos são relevantes na tentativa de significar alguns aspectos identitários que

fazem parte do processo de criação do município e desenvolvimento do povoado a partir da

igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição.

Nesse sentido, entendemos que a história da igreja em questão, se confunde muitas

vezes com a própria história do município e dos seus moradores, constituindo-se, dessa forma,

como uma herança de significados, ligados diretamente à memória e à questão do

pertencimento. Desse modo, essas memórias são importantes nos processo de formação

identitária do município, uma vez que nos faz entender-se também como sujeito pertencente

deste processo histórico.

Assim, a memória e a identidade cultural da Igreja Nossa Senhora Imaculada

Conceição fazem parte de um conjunto de fatores que podem contribuir para a organização do

processo e do sentido histórico da cidade. Atuando, sobretudo, na intenção de manter a

unidade do grupo social em torno dos referenciais de identidade em comum.

Referências Bibliográficas

1 Data de comemoração da Imaculada Conceição de Maria, mãe de Jesus, segundo as práticas católicas. 2 Nesta época, a capela ficou subordinada à Diocese de Corumbá.

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BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Jorge

Zahar, 2001.

BURKE, Peter. Variedades de história cultural. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 2011.

CAPILÉ JUNIOR, João Augusto.; CAPILÉ, Júlio.; SOUZA, Maria de Lourdes da Cruz.

História, fatos e coisas douradenses. Dourados/MS: s/ed., 1995.

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2003.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu da

Silva & Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: Lamparina, 2014.

LE GOFF, Jacques. História e memória. 7. ed. Campinas/SP: Editora da Unicamp, 2013.

MOREIRA, Regina Heloiza Targa. Memória fotográfica de Dourados. Campo Grande/MS:

UFMS; Centro Universitário de Dourados, 1990.

POLLAK, Michael. Memória e identidade social. Estudos históricos. Rio de Janeiro, vol. 5,

n. 10, 1992, p. 200-212.

POMPEU, Ercília de Oliveira. Monografia do município de Dourados. Editor: Nicanor

Coelho; Grupo Arandu, 2014. Texto original: 1965.

RICŒUR, Paul. A memória, a história e o esquecimento. Campinas/SP: Editora da

Unicamp, 2007.