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248 A inovação estilística dos convites de casamento no século XXI Denise Giarola Maia Universidade Federal de São João del-Rei-REUNI Orientador: Cláudio Márcio do Carmo Universidade Federal de São João del-Rei Resumo: O convite de casamento é um gênero que possui um formato bem padronizado e um estilo formal. No entanto, certas mudanças podem ser percebidas em relação ao estilo dos convites de casamento, produzidos no início deste século. O presente trabalho tem como objetivo descrever essa inovação estilística em convites de casamento, datados do século XXI. Para isto, apresentamos primeiramente uma discussão sobre o estilo e o gênero discursivo, fundamentada em Possenti (1988) e Bakhtin (2000). Em seguida, descrevemos as características recorrentes do estilo e da configuração dos convites de casamento, conforme Travaglia (2007), e as comparamos a cinco convites de casamento produzidos no início do século XXI. A partir dos dados obtidos, podemos perceber um estilo mais informal e subjetivo nesses convites. Palavras-chaves: Gênero discursivo. Estilo. Convite de casamento. Abstract: The wedding invitation is a genre that has a standardized form and a formal style. However, certain changes can be perceived in relation to the style of wedding invitations produced in the earlier of this century. This paper aims to describe the stylistic innovation in wedding invitations, dating from the XXI century. For this, firstly we present a discussion on the style and genre, based on Possenti (1988) and Bakhtin (2000). Then, we describe the recurrent features of style and configuration of wedding invitations as Travaglia (2007), and compare them with five wedding invitations made at the beginning of the XXI century. From the data obtained, we can see a more informal and subjective style in these invitations. Keywords: Genre of discourse. Style. Wedding invitation. Introdução Na sociedade ocidental, o funcionamento das famílias tende a seguir o ciclo de vida, dividido em seis estágios: os jovens solteiros, o novo casal, famílias com filhos pequenos, famílias com filhos adolescentes, o ninho vazio e famílias no estágio tardio de vida. A passagem da primeira etapa (jovens solteiros) para a segunda (o novo casal) geralmente é marcada por um ritual, o casamento civil e/ou religioso. Neste ritual, o casal promete, perante aquele que preside a celebração, e também perante as testemunhas, os familiares e os amigos, a formar outra família e assumir a partir daquele instante os deveres de cônjuges.

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A inovação estilística dos convites de casamento no século XXI

Denise Giarola Maia Universidade Federal de São João del-Rei-REUNI

Orientador: Cláudio Márcio do Carmo

Universidade Federal de São João del-Rei

Resumo: O convite de casamento é um gênero que possui um formato bem padronizado e um estilo formal. No entanto, certas mudanças podem ser percebidas em relação ao estilo dos convites de casamento, produzidos no início deste século. O presente trabalho tem como objetivo descrever essa inovação estilística em convites de casamento, datados do século XXI. Para isto, apresentamos primeiramente uma discussão sobre o estilo e o gênero discursivo, fundamentada em Possenti (1988) e Bakhtin (2000). Em seguida, descrevemos as características recorrentes do estilo e da configuração dos convites de casamento, conforme Travaglia (2007), e as comparamos a cinco convites de casamento produzidos no início do século XXI. A partir dos dados obtidos, podemos perceber um estilo mais informal e subjetivo nesses convites. Palavras-chaves: Gênero discursivo. Estilo. Convite de casamento.

Abstract: The wedding invitation is a genre that has a standardized form and a formal style. However, certain changes can be perceived in relation to the style of wedding invitations produced in the earlier of this century. This paper aims to describe the stylistic innovation in wedding invitations, dating from the XXI century. For this, firstly we present a discussion on the style and genre, based on Possenti (1988) and Bakhtin (2000). Then, we describe the recurrent features of style and configuration of wedding invitations as Travaglia (2007), and compare them with five wedding invitations made at the beginning of the XXI century. From the data obtained, we can see a more informal and subjective style in these invitations. Keywords: Genre of discourse. Style. Wedding invitation.

Introdução

Na sociedade ocidental, o funcionamento das famílias tende a seguir o ciclo de vida,

dividido em seis estágios: os jovens solteiros, o novo casal, famílias com filhos pequenos,

famílias com filhos adolescentes, o ninho vazio e famílias no estágio tardio de vida. A

passagem da primeira etapa (jovens solteiros) para a segunda (o novo casal) geralmente é

marcada por um ritual, o casamento civil e/ou religioso. Neste ritual, o casal promete, perante

aquele que preside a celebração, e também perante as testemunhas, os familiares e os amigos,

a formar outra família e assumir a partir daquele instante os deveres de cônjuges.

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O objeto que pretendemos estudar está vinculado a essa prática social. Ao solicitar a

presença dos familiares e amigos na cerimônia de casamento, faz-se o uso do gênero convite.

Nesse sentido, nosso interesse é descrever as características do estilo e da configuração dos

convites de casamento, de acordo com Travaglia (2007), para posteriormente, compará-las a

cinco convites de casamento produzidos no início deste século, buscando identificar se há

neles marcas linguísticas de um estilo informal que evidencie uma maneira diferente de esses

sujeitos tratarem o destinatário, a situação comunicativa e o tema.

O presente artigo se insere na linha de pesquisa sobre variação linguística, estilo e

gêneros discursivos, numa perspectiva bakhtiniana de estilo como pertencente à natureza dos

gêneros. E, é divido em três momentos: um primeiro, em que discutimos sobre a questão do

estilo e dos gêneros discursivos, e descrevemos as características estilísticas e a configuração

do conteúdo dos convites de casamento; um segundo, no qual comparamos cinco convites de

casamento do início deste século às características recorrentes desse gênero, tentando

identificar marcas estilísticas que evidencie um estilo informal e diferenças na configuração

do conteúdo; e finalmente, um terceiro, no qual fazemos as considerações finais, assegurando

a dinamicidade e a plasticidade dos gêneros, e também as restrições que o nosso dizer sofre

em relação à esfera, à situação sociocomunicativa e ao gênero, mantendo assim os valores

culturais do grupo. Em contrapartida, podemos observar que a maneira como estruturamos

nossos dizeres também podem afetar a situação comunicativa, a relação entre os sujeitos, e até

modificar nossa percepção acerca de certos temas.

Fundamentação teórica

Estilo e gêneros discursivos

Quando falamos ou escrevemos, isto é, produzimos enunciados verbais orais ou

escritos, preocupamo-nos não somente com o conteúdo da mensagem que será transmitida, o

objeto do discurso, mas também com o como construiremos esses enunciados, a fim de

sermos compreendidos e, sobretudo, de atingirmos nossos propósitos comunicativos.

Assim, temos sempre em mente, nosso interlocutor, aquele para quem dirigimos

nossos enunciados. E, de acordo com sua posição social, faixa etária, gênero, entre outros,

fazemos escolhas dos recursos linguísticos de que dispomos para interagirmos uns com os

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outros. De modo que, dentro da potencialidade do sistema linguístico, fazemos escolhas, nos

diferentes níveis (fonológico, morfológico, sintático) da estrutura, daquilo que acreditamos

que melhor expresse e represente o que queremos significar.

Além disso, nossas escolhas estilísticas dependem do, ou são “motivadas” pelo

contexto. Embora Possenti (1988) considere que o contexto possa ser alterado dependendo

das escolhas dos recursos linguísticos que empregamos em nossos enunciados.

A partir dessa compreensão de que estilo não é apenas um ato individual, mas que

fatores sociais implicam para que falemos e escrevamos sobre um objeto de maneira distinta,

a disciplina de estilística deu um salto significativo para perceber que há estilo sempre, e não

somente quando estamos inseridos na esfera artística. Isto porque, por algum tempo, o estilo

esteve relacionado à noção de desvio, elaboração e conotação, e, portanto, somente os textos

literários eram considerados como portadores de estilo. E a análise estilística desses textos,

muitas vezes, resumia-se a encontrar os traços (desvios) recorrentes de cada autor.

Encontramos o tratamento do estilo nos trabalhos do Círculo de Bakhtin que, aliás,

criticava a estilística tradicional de sua época, muito presa ao texto literário1. Para Bakhtin

(2000), há estilo em todos os gêneros do discurso, até mesmo naqueles cujas formas são bem

padronizadas e que eram considerados como sem estilo por essa estilística tradicional.

Na obra Marxismo e Filosofia da Linguagem, Bakhtin (1988, p. 43) comenta que

“cada época e cada grupo social têm seu repertório de formas de discurso na comunicação

sócio-ideológica.” Ou seja, de acordo com as práticas sociais de cada época e grupo,

possuímos enunciados tipificados que nos permitem interagir e compreender cada situação e,

dessa forma, ter acesso a determinadas práticas sociais de certas esferas de atividade humana.

O estilo de nossos enunciados, para Bakhtin (1988), é um dos elementos

fundamentais para o entendimento do que são e como funcionam os gêneros do discurso, e de

como essas formas da língua influenciam e são influenciadas pela organização hierarquizada

das relações sociais.

O respeito às regras de ‘etiqueta’, do ‘bem-falar’ e as demais formas de adaptação da enunciação à organização hierarquizada da sociedade têm uma importância imensa no processo de explicação dos principais modos de comportamento. (BAKHTIN, 1988, p. 43)

1 A própria noção de gênero nos remete à classificação dos textos literários.

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No texto Os gêneros do discurso, Bakhtin (2000) explica que os enunciados possuem

características estruturais que lhes são comuns e fronteiras delimitadas, e, portanto, nosso

discurso se molda à forma do enunciado, ou seja, aos gêneros do discurso. “Para falar,

utilizamo-nos sempre dos gêneros do discurso, em outras palavras, todos os nossos

enunciados dispõem de uma forma padrão e relativamente estável de estruturação de um

todo.” (BAKHTIN, 2000, p. 301)

Os gêneros do discurso, portanto, são definidos como “tipos relativamente estáveis

de enunciados” (BAKHTIN, 2000, p. 279) [grifo do autor], em termos de conteúdo temático,

estrutura composicional e estilo, e que transitam por todas as esferas de atividade humana.

Eles são enunciados ‘relativamente estáveis’, porque, apesar de todo gênero ter suas

convenções, são dinâmicos e flexíveis às mudanças históricas e socioculturais, o que pode

implicar no surgimento de novos gêneros e desaparecimento de outros.

As inovações tecnológicas multiplicaram e inovaram os gêneros em nossa sociedade,

o que nos permite dizer que alguns gêneros de hoje não são os mesmos, ou não existiam há

duzentos anos. Ao mesmo tempo, uma comunidade que não faz uso dessas tecnologias será

totalmente alheia aos novos gêneros, ou “gêneros emergentes” (MARCUSCHI, 2004), tais

como, e-mail, chat, blog, vídeo-conferência interativa, etc. Observe, no entanto, que as novas

tecnologias, televisão, celular, computador, internet e outras, por si só não produzem esses

gêneros. O aparecimento deles se dá devido à intensidade do uso destas tecnologias e suas

influências nas atividades comunicativas.

Quanto aos novos gêneros produzidos pelas mídias, Marcuschi (2003, p.20) lembra-

nos que “são formas inovadoras, mas não absolutamente novas”, pois, um gênero é sempre a

transformação de um gênero do passado. O autor nos adverte que os gêneros não devem ser

definidos a partir dos seus traços lingüísticos (forma). Pois, um gênero pode não possuir um

determinado traço lingüístico, ou assumir outra forma e, no entanto, continuar sendo o mesmo

gênero.

Utilizamos assim, a expressão “'intertextualidade inter-gênero' para designar o

aspecto da hidridização ou mescla de gêneros em que um gênero assume a função de outro”.

(FIX, 1997 apud MARCUSCHI, 2003, p.31)2

A intertextualidade inter-gênero evidencia a plasticidade e dinamicidade dos gêneros

e também reafirma o predomínio da função sobre a forma. Contudo, alguns gêneros são mais 2 MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionamento. In: DIONISIO, A.; MACHADO, A.; BEZERRA, M. Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Lucerna, 2003.

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propensos à intertextualidade inter-gênero como é o caso dos gêneros produzidos no domínio

publicitário.

Mas, voltando à noção do estilo dentro da perspectiva dos gêneros discursivos de

Bakhtin, tem-se que o locutor, com intuito de dizer algo e com a intencionalidade de provocar

uma “responsiva ativa” no seu destinatário, escolhe o gênero em que seus enunciados serão

estruturados. Mas, essa escolha é determinada

[...] em função da especificidade de uma dada esfera da comunicação verbal, das necessidades de uma temática (objeto do sentido), do conjunto constitutivo dos parceiros, etc. Depois disso, o intuito discursivo do locutor, sem que este renuncie à sua individualidade e à sua subjetividade, adapta-se e ajusta-se ao gênero escolhido, compõe-se e desenvolve-se na forma do gênero determinado. (BAKHTIN, 2000, p. 301)

Quanto às individualidade e subjetividade do locutor, Bakhtin (2000) não as ignora

como fica evidente na citação acima, contudo, para ele, nem todos os gêneros permitem que o

querer-dizer individual do locutor se manifeste. É o caso, por exemplo, dos ofícios, dos

documentos, das leis e das contas, que apresentam formas bem padronizadas.

Para Bakhtin (2000, p.284), “os estilos da língua pertencem por natureza ao gênero”,

isto é, devemos analisar o estilo, o modo de expressar de um locutor, mediante o gênero, pelo

qual a interação é realizada; ou então, acabamos por fazer julgamentos preconceituosos acerca

de um determinado estilo. Por exemplo, muitos criticam as abreviações e alterações fonéticas

que ocorrem nos textos produzidos na internet, julgando errado este tipo de variação da língua

que, para eles, pode destruir a Língua Portuguesa. Há pessoas que se recusam, por exemplo,

numa conversa no bate-papo, escrever naquele estilo, tornando-se, na verdade, inadequadas

àquela interação. Pois, tal estilo corresponde perfeitamente à finalidade comunicativa

(máximo de expressão num mínimo de esforço) daquela situação de interação.

O papel ativo do destinatário no processo comunicativo, percebido por Bakhtin

(2000), é também fundamental para o entendimento do estilo, nessa perspectiva dos gêneros

do discurso. “A quem se dirige o enunciado? Como o locutor (ou escritor) percebe e imagina

seu destinatário? Qual é a força da influência deste sobre o enunciado? É disso que depende a

composição, e sobretudo o estilo do enunciado.” (BAKHTIN, 2000, p. 321).

Portanto, nesta perspectiva, a escolha do gênero, e assim, dos recursos linguísticos

(estilo) e também dos procedimentos composicionais empregados, é determinada pela

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maneira como o locutor percebe seu destinatário e pressupõe sua responsiva ativa.

(BAKHTIN, 2000)

Além disso, através da análise estilística dos gêneros discursivos, é possível

identificar como os membros de um determinado grupo de indivíduos se relacionam

socialmente, e quais são as visões de mundo que eles têm sobre determinado tema, em um

dado momento histórico.

Bakhtin (2000, p. 326) termina o texto Os gêneros do discurso dizendo que “uma

análise estilística que queira englobar todos os aspectos do estilo deve obrigatoriamente

analisar o todo do enunciado e, obrigatoriamente, analisá-lo dentro da cadeia da comunicação

verbal que o enunciado é apenas um elo inalienável.” [grifo do autor]

Gênero convite de casamento

De acordo com Travaglia (2007), os gêneros convite, convocação, intimação,

notificação, que têm o objetivo de solicitar a presença de alguém em um lugar e/ou evento,

possuem em comum alguns elementos de conteúdo, como: quem solicita a presença, quando e

onde se deve comparecer e para o que.

Travaglia (2007) observa que, na caracterização desses gêneros, o convite tem um

detalhamento maior no conteúdo, configurando-se em espécies, de acordo com o elemento

para o qual se convida como é o caso do objeto de estudo deste artigo, o convite de

casamento.

Geralmente, os convites são configurados da seguinte maneira: primeiramente, é

apresentado o nome dos pais, os anfitriões da festa e, em seguida, o nome dos noivos. Abaixo

dos nomes, tem-se um texto contendo as informações sobre o evento, e por fim, o endereço

residencial dos pais. É comum também uma mensagem – um versículo bíblico ou um verso de

música, de poesia – que pode vir no início, acima do nome dos pais, ou no final, abaixo dos

endereços, e, além disso, uma imagem. O convite da ilustração (1), produzido na década de

80, é um exemplo deste formato descrito acima.

Pelas convenções do gênero, o convite de casamento possui um estilo bastante

formal, visto que a cerimônia do casamento3 é uma prática da esfera religiosa, que exige certa

3 Apesar de os noivos casarem também no civil, o comum é o convite para a cerimônia religiosa.

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polidez. Desse modo, os gêneros pertencentes a essa esfera utilizam-se daquelas formas

linguísticas marcadas por certo prestígio social, ou que denotam formalidade.

No convite de casamento, marcas desse estilo podem ser observadas, por exemplo,

no uso dos pronomes de tratamento. Para a gramática normativa, a utilização dos pronomes de

tratamento deve se adequar ao grau de intimidade, ao prestígio social, o grau hierárquico, e a

idade daquele a quem dirigimos nossos enunciados.

Portanto, os pronomes de tratamento utilizados nos convites de casamento para se

dirigir aos convidados geralmente são aqueles mais cerimoniais, tais como: Senhor (Sr.),

Senhora (Sr.ª), Vossa Senhoria (V. S.ª). Dentro do discurso, estes dão o sentido de que aquele

que fala mantém certo distanciamento, ou respeito, com aquele que é seu interlocutor.

Monteiro (1991, p. 73) comenta que “num processo comunicativo, todo emissor experimenta

às vezes graduação efetiva em relação ao receptor e isto tem que ser expresso por mudança da

expressão tratamental.” Isto é, às vezes, dirigimo-nos ao nosso interlocutor de maneira formal,

utilizando um “senhor”, e ao longo da conversa, à medida que vamos nos conhecendo,

trocamos para “você”.

Marcas recorrentes do estilo dos convites de casamento também podem ser

observadas em relação aos numerais. A gramática prescreve certas regras para o emprego dos

numerais em certas situações do uso da língua e em certos gêneros. Por exemplo, emprega-se

o numeral cardinal (aquele que indica a quantidade exata de seres) na numeração de artigos,

leis, decretos e outros gêneros jurídicos, a partir do dez. Também ao preencher um cheque, o

cliente deve preocupar-se em destacar o valor pago em forma numérica (algarismo) e em

forma escrita (numeral cardinal). Além disso, o Manual de Redação da Editora Abril (1991)

prescreve que não se deve iniciar frases com algarismos, mas com o numeral escrito por

extenso.

Segundo Cunha e Cintra (1985, p.365), “nas referências aos dias do mês, usam-se os

cardinais, salvo na designação do primeiro dia, em que é de regra o ordinal. Também na

indicação dos anos e das horas empregam-se os cardinais.” Os autores não fazem

especificação se esse numeral deve aparecer por extenso, ou em algarismo; nos exemplos que

eles dão na gramática, os numerais aparecem por extenso. Já o Manual de Redação da

Editora Abril (1991) apresenta certas situações, tais como, em horas e em endereços, nas

quais se deve usar o algarismo, ao invés de escrever o numeral por extenso.

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Nos convites de casamento apresentados nas ilustrações (1), a data e horário do

casamento são escritos por extenso (numeral cardinal), e não por algarismos.

Em relação à colocação pronominal, a gramática normativa determina que os

pronomes oblíquos átonos (me, te, se, o, a, lhe, nos, vos, os, as, lhes) podem ocupar três

posições em relação ao verbo: antes do verbo (próclise), no meio do verbo (mesóclise) e

depois do verbo (ênclise). A mesóclise é usada quando o verbo estiver no futuro do presente,

como a que aparece no convite de casamento acima (sentir-se-ão), ou no futuro do pretérito.

No português brasileiro, há um desuso da mesóclise. Assim, utilizar mesóclises, mesmo

quando a situação exige, pode criar um efeito de arcaísmo, por se tratar de uma forma em

desusos, o mesmo acontece, por exemplo, com a utilização das formas correspondentes aos

pronomes “tu”4 e “vós”.

Outra característica estilística dos convites de casamento é que o ato de convidar é

sempre feito em terceira pessoa (singular ou plural), como podemos observar no convite da

ilustração (1). Nesse tipo de discurso, há o apagamento dos sujeitos, já que não há marcas de

subjetividade, ou seja, formas linguísticas que designam a pessoa que fala (eu) e a quem se

fala (tu). Enquanto que “ele” é a pessoa da qual se fala, não pertencendo à situação de

enunciação. “Ele” é a “não-pessoa”, segundo Benveniste (2006). Desse modo, os efeitos

gerados com o apagamento dessas marcas de subjetividade são: distanciamento, neutralidade,

verdade e objetividade.

Vejamos agora o estilo dos convites de casamentos em relação aos tipos de frase.

Segundo Martins (1989, p. 130), “como unidade de comunicação, a frase exprime um sentido,

encerra um conteúdo, que corresponde à sua função.” Em outras palavras, cada tipo de frase -

declarativa, exclamativa, imperativa - realiza uma função: representativa, emotiva, apelativa,

respectivamente. Há ainda uma quarta função, interpessoal, que se caracteriza pela

modalidade. Geralmente, os convites de casamento são frases declarativas. Nesse tipo de

frase, “o emissor exprime um fato que a seu juízo é verdadeiro ou falso”. (Martins, 1989, p.

130)

Além disso, Monteiro (1991, p. 51) diz que “a opção pelos períodos curtos ou longos

tem sempre uma motivação estilística.” Para este autor:

4 Na verdade, as formas estilísticas do “tu” exprimem certa intimidade entre os interlocutores, porém, o “tu” quase não é utilizado no português brasileiro, restringindo aos falantes dos estados do sul e do nordeste do país. A forma “tu” foi substituída por “você” como a forma de intimidade, mas, também usada com tratamento de igual para igual ou de superior para inferior. (CUNHA; CINTRA, 1985)

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[...] os períodos curtos, incisivos, atêm-se ao coloquialismo, à espontaneidade. São estruturas da linguagem prevalentemente afetiva. Os períodos mais longos, armados hipotaticamente, exprimem menor escala de afetividade e se prestam para linguagens denotativas, técnicas. (MONTEIRO, 1991, p. 51)

Nos convites de casamento, geralmente, opta-se por períodos longos, no qual é

transmitido todo o conteúdo (quem convida, para o que, onde e quando). Além disso, quanto

ao ato de convidar, apesar de não ser o caso do convite da ilustração (1), em que o verbo

“sentir” expressa um processo mais relacionado ao mundo mental, é bastante recorrente o

emprego do verbo “convidar”, relacionado ao processo do fazer, do acontecer.

Por fim, não podemos deixar de fazer uma observação em relação às imagens, que

geralmente podem vir acompanhando o texto escrito. Estas normalmente são o símbolo das

duas alianças cruzadas, representando a união eterna de duas pessoas, já que a aliança é um

círculo e não tem fim. Além disso, é de costume ainda na época do namoro o homem dar uma

aliança à mulher amada como sinal de compromisso e fidelidade. Ou, outro símbolo comum é

o de dois pombinhos, representando o casal apaixonado.

Por todas essas características identificadas, podemos descrever o convite de

casamento como um gênero com um formato mais padronizado e um estilo mais formal.

No entanto, como vimos, no item 1.1, os gêneros são dinâmicos e flexíveis, e

transformam-se, juntamente com a língua, a sociedade e a cultura. Desse modo, coletamos 46

(quarenta e seis) convites de casamento - 20 (vinte) produzidos no final do século XX, entre a

década de 70 e década de 90, e 26 (vinte e seis) convites produzidos no século XXI, entre os

anos de 2001 e 2009. Notamos que vem ocorrendo uma sutil inovação na produção dos

convites de casamento, especialmente, em termos de configuração e de estilo, em decorrência

da maneira como os parceiros têm se relacionado nessa interação verbal, do como têm

percebido a cerimônia de casamento.

Para a análise que pretendemos realizar neste artigo, no próximo tópico, escolhemos,

entre os 25 convites produzidos no século XXI, 5 (cinco) que exemplificam as principais

inovações observadas, em relação à configuração e ao estilo desse gênero. Como referente à

tradição, destacamos um convite da década de 80 (ilustração 1), que nos servirá como

parâmetro para indicação das alterações.

Assim, desenvolveremos o seguinte procedimento de análise: (i) a partir da

fundamentação teórica sobre estilo e gênero discursivo, bem como da descrição das

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características recorrentes dos convites de casamento, tomando como parâmetro o convite da

ilustração 1, identificaremos quais foram as escolhas feitas pelos locutores nos convites das

ilustrações 2, 3, 4, 5 e 6; (ii) discutiremos, simultaneamente, quais são os efeitos produzidos

pelos recursos linguísticos utilizados, que tipo de relação o locutor pretende estabelecer com

seu interlocutor, e que fatores socioculturais e históricas estão imbricadas na configuração e

estilo desses convites.

As inovações na produção do convite de casamento

O conteúdo do convite de casamento não varia muito. Nele, encontramos

basicamente as seguintes informações: os nomes dos pais e dos noivos, o dia, a hora, o local,

o endereço residencial dos pais e se terá ou não recepção festiva. (TRAVAGLIA, 2007) Mas,

apesar da rigidez na forma e no conteúdo desse gênero, algumas motivações podem ser

descritas em relação à configuração e ao estilo dos convites que vêm sendo produzidos nesses

últimos anos.

No convite da ilustração (2), as informações aparecem em tópicos, sem que haja a

utilização de verbos, isto é, o texto compõe-se apenas de frases nominais que se

classificariam, de acordo com Martins (1989), como frases incompletas, cujo entendimento

exige certos dados contidos na situação de enunciação ou no contexto linguístico.

As frases nominais são usadas para destacar a informação. Esse tipo de frase é muito

usado em propagandas, placas, tabuletas, faixas, e em capas de revista, principalmente, nas

chamadas.

Já no convite da ilustração (3), há uma mistura de frase verbal, ou frase completa, e

de frases incompletas. Podemos notar ainda alguns enunciados interrogativos, em que ocorre

a elipse5 de quase todos os termos, ficando apenas o pronome ou advérbio interrogativo,

evitando assim que informações anteriormente mencionadas se repitam.

Conforme descrevem Halliday e Matthiessen (2004), a elipse pode ocorrer nas

orações, de diferentes formas. Por exemplo, nas orações interrogativas com o emprego de “o

que”, “onde”, “quando” 6, em que pode ocorrer a elipse de toda a oração, isto é, o todo da

5 A elipse é tratada como um traço estilístico. Para os autores Halliday e Matthiessen (2004), a elipse é um recurso do sistema de coesão do texto. Assim, é possível omitir partes da estrutura que podem ser pressupostas pelo que foi dito anteriormente. 6 Em inglês, são os elementos “wh”: what, where, who, why.

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frase é usualmente omitido, restando apenas o elemento da resposta. Assim, temos no convite

(3) a seguinte elipse:

• “Convidam familiares e amigos a participar de um momento especial na vida de seus

filhos. O que [é este momento especial na vida de seus filhos]? O casamento!

Quando [será o casamento]?” [Será no dia] 08/07/2006 [às] 18:40 hs. Onde [será o

casamento]? Paróquia São Paulo Apóstolo [situada na] Av. Alberto Ramo, [no

número] 614, [no bairro] Jardim Independência, [na cidade de] São Paulo, [no estado

de] São Paulo.”7

Observe que nas respostas, novamente, tudo é omitido, em outras palavras, eles

apresentam apenas o conteúdo da informação demandada:

• “Quando [será o casamento]? [O casamento será] 08/07/2006.”

Para Halliday e Matthiessen (2004), a elipse ocorre tipicamente em sequências

dialógicas, isto é, perguntas e respostas.

A frase interrogativa é “simultaneamente emotiva (exprime o desejo do locutor de

saber alguma coisa, podendo ir de uma discreta curiosidade a uma intensa ansiedade) e

apelativa (atua sobre o interlocutor do qual se espera uma resposta).” (MARTINS, 1989, p.

131)

• “Por que? Porque os dois são loucos... um pelo outro!”

Aqui, temos as reticências, criando uma expectativa no leitor, e ao mesmo tempo,

permitindo que ele a complete. A palavra “loucos” nos remete a certo discurso, no qual o

casamento não é nada romantizado, pelo contrário, visto como uma espécie de “forca”, de

“fim do mundo”, já que a pessoa casada não poderia mais ter os mesmos comportamentos da

vida solteira, perdendo assim a “liberdade”.

7 Usamos as chaves [ ] para marcar a informação omitida, ou seja, a elipse. Já os termos sublinhados são aquelas informações que nos ajudam a recuperar o que foi omitido na oração seguinte. Os termos em negrito marcam a informação que se pretende receber na resposta.

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Portanto, esse tipo de construção, em que se dá preferência aos períodos curtos, ajudar

a inovar o estilo desses convites, justamente por não apresentar aquele formato padronizado

da mensagem, ou seja, é uma maneira nova de apresentar o mesmo conteúdo, destacando as

informações e facilitando a leitura, pois permite uma rápida visualização do todo do conteúdo.

Além disso, torna ainda o estilo mais coloquial, espontâneo e afetivo, conforme Monteiro

(1991).

Podemos observar ainda que, nesses dois convites analisados, optaram-se por

registrar a data e o horário em algarismos, e não por extenso, como é o convencional.

Outra característica estilística que tem se tornado mais comum nos convites de

casamento é o ato de convidar ser realizado em primeira pessoa, mostrando assim

subjetividade, ou seja, há presente, neste discurso, sujeitos que se comprometem com aquilo

que é dito.

As marcas de primeira pessoa podem fazer referência simplesmente aos noivos,

como no convite da ilustração (4), e em outros dizeres, tais como: “Para quem não

acreditava... vamos nos casar. Abençoados por Deus e nossos pais.”, “Nós [nome do casal]...

temos o prazer de convidar...”; ou então, elas fazem referência aos noivos e aos pais, já que

muitos convites trazem dizeres do tipo: “Em nome de nossos pais [nome dos pais]... vimos

convidá-lo...”, “Nós [nome do casal]... nossos pais [nome dos pais]... sentiremos honrados...”.

Geralmente, o convite começa com o nome dos pais, por serem os anfitriões da festa.

O nome do homem (pai) vem sempre primeiro e, em seguida, o nome da mulher (mãe), e

depois os dois filhos (os noivos), o que nos remete à estrutura hierárquica de uma família no

sistema patriarcal, em que os pais tinham certo controle sobre a vida dos filhos e os

casamentos eram estabelecidos pelos patriarcas, que casavam seus filhos com a intenção de

manter a herança em família, de aumentar territórios e de formar alianças políticas.

Certos convites produzidos na década de 80, por exemplo, trazem dizeres, tais como:

“As famílias [sobrenome] convidam...”. O sobrenome da família é algo muito importante em

nossa sociedade, mas, principalmente, em épocas mais remotas, na qual o indivíduo era

identificado como “bom” ou “ruim” pela família à qual ele pertencia, ou o (a) filho (a)

deveriam obedecer aos costumes religiosos para não “sujar, ou desonrar o nome do pai”.

Hoje, a relação entre pais e filhos tem se mostrado mais amigável. Isso pode ser

notado no convite de casamento pela configuração diferente para os nomes. Alguns convites

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trazem dizeres do tipo: “[nome do casal] juntamente com seus pais [nome dos pais] convidam

para a cerimônia...”.

Também podemos perceber, nos convites produzidos no século XXI, uma mudança

no tratamento do interlocutor, como na ilustração (3) e (5). Nestes dois, é empregado o

pronome “você” para se dirigir aos convidados, ou os termos “familiares” e “amigos”.

O convite da ilustração (5) apresenta, além do conteúdo esperado nessa espécie de

convite, uma breve narrativa em quadrinhos sobre a história do casal, ou seja, como o casal se

conheceu, o desejo de ficarem juntos, os empecilhos que a princípio os separaram e,

finalmente, o desfecho feliz, o casamento dos dois. Mas, ao contrário, dos romances

românticos, ou contos de fadas, a história dos dois termina com um fim interrogativo.

Portanto, neste convite, temos um exemplo da ‘intertextualidade inter-gênero’

(MARCUSCHI, 2003), conforme foi discutido no item 1.1.

Na ilustração (6), a seguir, podemos observar o mesmo fenômeno. O gênero convite

de casamento assume o formato de anúncio de espetáculo teatral, mas, a função continua a

mesma.

Aqui, a intertextualidade inter-gênero, isto é, a hibridização do convite de casamento

com outros gêneros, produz um efeito humorístico. Não se esperaria, em uma ocasião formal

como o casamento religioso, que o convite apresentasse um formato de cartaz de filme ou

peça teatral (ilustração 6), como se o casamento fosse uma produção hollywoodiana. Embora,

ultimamente, os cerimoniais tenham buscado transformar esse ritual em um grande negócio,

como mostra a reportagem de Heringer (2010, p. 4), cujo título e subtítulo são:

Casar está na moda

O que para muitos representam uma instituição falida, para os profissionais de casamento, não. Este mercado está crescendo e se aprimorando cada vez mais, exigindo profissionais qualificados e atendimento vip.

Outra matéria, publicada no site do Yahoo, Bares e restaurantes substituem buffes de

casamento8, informa sobre essa nova preferência dos casais por uma cerimônia festiva com

menos formalidade, como, por exemplo, em um bar.

8 CANALE, Felippe. Bares e restaurantes substituem buffes de casamento. Yahoo. 2011. Disponível em: <http://br.noticias.yahoo.com/s/08022011/48/manchetes-bares-restaurantes-substituem-tradicionais-buffets.html> Acessado em 9 fev.2011.

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Nossa última análise é com relação às imagens. Como mostram os quatro convites

(ilustrações 2, 3, 5 e 6), atualmente, as imagens são caricaturas dos noivos, ou desenhos

engraçados de bonequinhos de noivos se puxando por uma corda. Isto torna o convite de

casamento muito mais engraçado e inovador.

No convite (3), também a imagem desenhada dos noivos permite criar uma interação

bastante íntima entre esses dois participantes e aqueles que os observam. A caricatura do casal

retrata apenas seus rostos, ou seja, em uma distância curta, de proximidade entre eles e

aqueles que os observam (o “interlocutor”). Além disso, o noivo direciona seu olhar para o

observador, demandando desse algo.

Considerações finais

A partir desses dados, podemos dizer que, se o estilo dos convites de casamento era

bastante formal, e (re)produzia uma sociedade com valores um pouco mais conservadores,

nesses 5 (cinco) convites de casamento analisados deste século, o estilo se apresenta bem

mais informal, afetivo e até lúdico. Além disso, os destinatários desses convites são tratados

com certo grau de familiaridade, intimidade, e sem muita cortesia.

A análise realizada neste artigo contribui, portanto, para se pensar nas práticas e nas

relações sociais, e como elas se dão na e pela linguagem. O casamento, ao mesmo tempo em

que é uma cerimônia religiosa, é também percebido pelos sujeitos como uma cerimônia

festiva. Na imagem do último quadrinho do convite da ilustração (5), os pais e os noivos estão

segurando uma taça, certamente, brindando esse momento de união. Desde modo, esse estilo

e a configuração do convite permitem criar outro contexto, no qual o casamento é tido pelos

destinatários como uma situação informal, mas, não necessariamente simples, pelo contrário,

alguns casamentos são uma produção técnica espetacular.

De acordo com o site da Revista Noiva9, as empresas responsáveis pelo cerimonial

têm classificado convites como o da ilustração (1) como convites tradicionais, e os convites

das ilustrações (2), (3), (5) e (6) como convites modernos. Ou então, definindo o estilo do

convite como tradicional ou moderno também pela diferença do suporte físico e virtual. Essa

escolha por um convite tradicional ou moderno, segundo a revista, implica como será

9 Informação extraída do e-book, Convites de casamento: saiba como escolher o seu, da Revista Noiva. Disponível em: <http://www.noivasecia.com.br/como-escolher-seu-convite-de-casamento.php>. Acessado: 17 abril de 2009.

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organizada toda a cerimônia, como, por exemplo, a decoração do salão festivo, o traje da

noiva, as músicas, as lembranças da festa, etc.

Assim, vemos que as inovações estilísticas apresentadas nos convites produzidos

neste século não são motivadas apenas por uma individualidade, ou somente pelas

transformações culturais e históricas, mas também motivadas pelo capitalismo da “indústria

do casamento” (HERING, 2010) que quer se dar bem e, portanto, cria essas estratégias para

que se consumam esse tipo de serviço especializado.

Por fim, acredita-se que outras pesquisas podem ser realizadas em relação aos

convites que vêm sendo produzidos nesses últimos anos, por exemplo, com relação ao

suporte, muitos dos convites têm um formato (quadrado, retangular, com abertura de cima

para baixo, ou da direita para esquerda) e textura ou material (tipo de papel) diferente e, além

disso, alguns ainda trazem um endereço eletrônico de um site dos noivos, como o convite da

ilustração (5), em que os convidados podem acessá-lo para saber mais detalhes da cerimônia,

bem como ver fotos e ter informações sobre o casal. Além disso, neste site poderão ser

postados posteriormente fotos da cerimônia, como uma espécie de cobertura do evento.

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Anexos10

10 Para manter em sigilo a identidade dos sujeitos, os nomes foram apagados e substituídos por suas iniciais, enquanto os endereços estão representados pela letra X.

Ilustração 1. Convite de casamento da década de 80

Ilustração 2. Convite de casamento do início do séc. XXI

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Ilustração 3. Convite de casamento do início do séc. XXI

Ilustração 4. Convite de casamento do início do séc. XXI

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Ilustração 5. Convite de casamento com formato de história em quadrinhos

Ilustração 6. Convite de casamento com formato de cartaz