A INTEGRA‡ÌO DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA NAS ......das Confedera“łes de FIFA em 2013,la...

111
ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXRCITO ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO Maj TLIO MARCOS SANTOS CERVOLO !"# %& ’()&"*# 2014 A INTEGRAO DA ATIVIDADE DE INTELIGNCIA NAS OPERA˝ES INTERAGNCIAS NO BRASIL CONTEMPORNEO

Transcript of A INTEGRA‡ÌO DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA NAS ......das Confedera“łes de FIFA em 2013,la...

  • ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXRCITO

    ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO

    Maj TòLIO MARCOS SANTOS CERçVOLO

    !"#$%&$'()&"*#$

    2014

    A INTEGRAÌO DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA NAS OPERAÍES INTERAGæNCIAS NO BRASIL

    CONTEMPORåNEO

  • +$

    Maj TòLIO MARCOS SANTOS CERçVOLO

    A INTEGRAÌO DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA NAS OPERAÍES

    INTERAGæNCIAS NO BRASIL CONTEMPORåNEO

    Dissertao apresentada Escola de

    Comando e Estado-Maior do Exrcito,

    como requisito parcial para a obteno

    do ttulo de Mestre em Cincias

    Militares.

    Orientadora: Prof Dra Adriana Aparecida Marques

    Rio de Janeiro RJ 2014

    $

  • Cervolo, Tlio Marcos Santos A Integrao da Atividade de Inteligncia nas Operaes

    Interagncias no Brasil Contemporneo / Tlio Marcos Santos Cervolo - Rio de Janeiro, 2014.

    110 p. Dissertao (Mestrado) - Escola de Comando e Estado

    Maior do Exrcito, Rio de Janeiro, 2014. Orientadora: Prof Dra Adriana Aparecida Marques 1.Integrao 2.Inteligncia 3. Interagncias 4. Efetividade

    CDD: 355.4!

    C411i!

  • Scanned by CamScanner

  • ,$

    DEDICATîRIA

    A minha esposa e minhas filhas uma homenagem

    como forma de gratido pela execuo deste

    trabalho

    $

  • -$

    AGRADECIMENTOS

    Ë minha esposa e minhas filhas pelo amor, pelo incentivo e pela compreenso nos

    momentos de ausncia familiar.

    Aos meus pais, pela formao pessoal e cultural e pelo incentivo em buscar novos

    desafios.

    Ë Prof Dra Adriana Marques, pelas orientaes objetivas e pelo apoio na

    concretizao das pesquisas de campo.

    Ë Escola de Comando e Estado Maior do Exrcito e ao Instituto Meira Matos, pela

    oportunidade de me aprofundar no meio acadmico e no tema inteligncia.

    Aos entrevistados, por terem contribudo com ideias que foram essenciais para a

    realizao do trabalho.

    $

  • .$

    RESUMO

    Esta dissertao aborda o tema das foras que interferem na efetividade da

    integrao da atividade de inteligncia no contexto das operaes interagncias no

    mbito de um pas. Essas foras foram categorizadas por meio de indicadores, os

    quais foram usados para analisar a operao de desintruso da Terra Indgena Aw

    para a retirada de pessoas no autorizadas e os ltimos grande eventos ocorridos

    no Brasil, tais como: a Conferncia para o Meio Ambiente Rio + 20 em 2012, a Copa

    das Confederaes de FIFA em 2013,la Jornada Mundial da Juventude em 2013 e a

    Copa do Mundo da FIFA de 2014. A metodologia empregada foi qualitativa e a

    tcnica utilizada foi a etnogrfica, j que o pesquisador entrevistou diversos

    profissionais do Sistema Brasileiro de Inteligncia (SISBIN) a fim de coletar dados

    que pudessem se relacionar com as referncias bibliogrficas existentes sobre o

    assunto. O consenso de que no existe uma agncia de inteligncia que possa

    apoiar o processo decisrio com efetividade de forma isolada no cenrio atual,

    porque as informaes esto dispersas nos distintos rgos que compem a

    admininstrao pblica e tambm no setor privado. Cabe destacar que a atividade

    de inteligncia possui peculiaridades que influenciam tanto os profissionais como as

    agncias, e que fazem da integrao da inteligncia no ambiente interagncias uma

    ao verdadeiramente complexa. Os resultados obtidos na pesquisa apresentaram

    indicadores de efetividade relacionados com aspectos legais, organizacionais e

    culturais. Por fim, interessante destacar que os grandes eventos ocorridos no

    Brasil serviram como importantes estudos de caso para a anlise dos indicadores.

    Palavras Chaves: integrao, inteligncia, interagncias, efetividade

    $

  • /$

    ABSTRACT

    This dissertation addresses the forces that interfere with an efficient

    Intelligence interaction in the context of integration between Agencies inside a

    country. These forces were categorized through indicators which were the same

    used to analyze the eviction operation of Terra Indigena Awa from its non

    authorized personal and were also present in the most recent global scale events

    that took place in Brazil such as the Rio +20 United Nations Conference of

    Sustainable Development in 2012, the FIFA Confederations Cup in 2013, the

    Catholic World Youth Day in 2013 and the FIFA World Cup in 2014. The

    methodology used within this work was a qualitative research in conjunction with the

    technique of ethnography as the researcher interviewed various professionals from

    SISBIN (Sistema Brasileiro de Inteligencia) with the intent of collecting data that

    could be compared against the various bibliographical references available in the

    subject. The consensus is that there is no Intelligence Agency that could by itself

    support the decision process with efficiency in the current scenario because the

    information is dispersed across too many public administration offices and also

    scattered around many areas in the private sector. It is important to emphasize that

    the field of Intelligence has particularities that influence not only its professionals but

    also its Agencies and that in itself makes any integration effort a truly complex action.

    The results obtained in this research displayed indicators of efficiency that are related

    to legal, cultural and organizational aspects of society. It is imperative and

    fundamental to note that the mentioned recent global scale events that took place in

    Brazil were an important source for the development of case studies in order to

    analyze these indicators.

    Key Words: Integration; Intelligence; Interagency; Effectiveness

    $

  • 0$

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    FBI Escritrio Federal de Investigaes

    DIA Agncia de Inteligncia de Defesa

    DIS Estado-Maior de Inteligncia de Defesa

    5¼ JMM 5¼ Jogos Mundiais Militares

    VANT Veculos areos no tripulados

    JIC Comit de Inteligncia Conjunta

    MI5 Inteligncia Militar - Seo 5

    MI6 Inteligncia Militar - Seo 6

    GCHQ Quartel General de Comunicaes do Governo

    JTAC Centro Conjunto de Anlise sobre o Terrorismo

    CIA Agncia Central de Inteligncia

    NSA Agncia de Segurana Nacional

    INR Escritrio de Inteligncia e Pesquisa

    DEA Agncia de Combate as Drogas

    DNI Diretor Nacional de Inteligncia

    IRTPA Reforma da Inteligncia e Ato de Preveno ao Terrorismo

    NCTC Centro Nacional de Contraterrorismo

    NCPC Centro Nacional de Contraproliferao

    NIC Conselho Nacional de Inteligncia

    NCIX Centro Nacional de Contrainteligncia

    NIE Estimativa nacional de inteligncia

    DSI Departamento de Segurana Interna

    SISBIN Sistema Brasileiro de Inteligncia

    GSI Gabinete de Segurana Institucional

    ABIN Agncia Brasileira de Inteligncia

    CENSIPAM Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteo da Amaznia

    ESINT Escola de Inteligncia

    DIE Departamento de Inteligncia Estratgica

    DCI Departamento de Contrainteligncia

    DCT Departamento de Contraterrorismo

    DISBIN Departamento de Integrao do Sistema Brasileiro de Inteligncia

    SINDE Sistema de Inteligncia de Defesa

    $

  • 1$

    SISP Subsistema de Inteligncia de Segurana Pblica

    SENASP Secretaria Nacional de Segurana Pblica

    DPF Departamento de Polcia Federal

    DPRF Departamento de Polcia Rodoviria Federal

    COAF Conselho de Controle de Atividades Financeiras

    COPEI Coordenao Geral de Pesquisa e Investigao

    SRF Secretaria da Receita Federal

    SENAD Secretaria Nacional de Polticas Sobre Drogas

    CIM Centro de Inteligncia da Marinha

    CIE Centro de Inteligncia do Exrcito

    CIAer Centro de Inteligncia da Aeronutica

    EMCFA Estado-Maior Conjunto das Foras Armadas

    CIG Grupos Centrais de Inteligncia

    IOC Central de Inteligncia Olmpica

    JIC Central de Inteligncia Conjunta

    JTTF Fora Tarefa Conjunta para o Terrorismo

    TTIC Centro Integrado sobre a Ameaa Terrorista

    UE Unio Europeia

    EUROPOL Organizao de Polcia Europeia

    DSDP Poltica Democrtica de Segurana e Defesa

    GAULA Grupo de Ao Unificada contra o Sequestro e a Extorso

    CINTEG Centro de Integrao

    SIPAM Sistema de Proteo da Amaznia

    IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

    Renovveis

    ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade

    CIM Central de Inteligncia Militar

    CIR Centro de Inteligncia Regional

    CIN Centro de Inteligncia Nacional

    CML Comando Militar do Leste

    ONU Organizaes das Naes Unidas

    CISE Centro de Inteligncia de Servios Estrangeiros

    SG/PR Secretaria Geral da Presidncia da Repblica

    $

  • 2$

    SUMçRIO

    1. INTRODUÌO ................................................................................................... 11

    2. A ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA ..................................................................... 15

    2.1 RAMOS DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA ..................................................... 17

    2.2 VERTENTES DA INTELIGæNCIA ...................................................................... 17

    2.3 CICLO DA INTELIGæNCIA ................................................................................. 20

    2.4 FONTES DE INTELIGæNCIA ............................................................................. 21

    2.5 MODELOS DE SISTEMA DE INTELIGæNCIA ................................................... 23

    2.6 O MODELO BRASILEIRO .................................................................................. 28

    3. AS OPERAÍES INTERAGæNCIAS ................................................................ 31

    3.1 CARACTERêSTICAS DAS OPERAÍES INTERAGæNCIAS ............................ 32

    3.2 MODELOS TEîRICOS ...................................................................................... 34

    3.3 FATORES DE SUCESSO .................................................................................. 38

    4. INTEGRAÌO DA INTELIGæNCIA NAS OPERAÍES INTERAGæNCIAS .... 46

    4.1 ASPECTOS LEGAIS, ORGANIZACIONAIS E CULTURAIS .............................. 47

    4.2 MELHORES PRçTICAS DE INTEGRAÌO ...................................................... 58

    4.3 O MODELO BRASILEIRO .................................................................................. 64

    5. METODOLOGIA E ANçLISE DOS RESULTADOS DA PESQUISA ................. 69

    5.1 METODOLOGIA ................................................................................................. 69

    5.2 INDICADORES DE EFETIVIDADE NA INTEGRAÌO DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA NAS OPERAÍES INTERAGæNCIAS ........................................... 73

    5.2.1 Diferenciao na atribuio funcional das agncias de inteligncia......... 73

    5.2.2 Atividade fim do rgo integrador ................................................................ 74

    5.2.3 Centralizao hierrquica .............................................................................. 75

    5.2.4 Planejamento integrado ................................................................................. 76

    5.2.5 Autonomia funcional do representante ........................................................ 76

    5.2.6 Disputa por recursos ..................................................................................... 77

    5.2.7 Grau tecnolgico da comunicao ............................................................... 77

    5.2.8 Nvel de barreiras organizacionais ............................................................... 78

    $

  • +3$

    5.2.9 Grau de cobrana externa ............................................................................. 79

    5.2.10 Caractersticas pessoais ............................................................................. 79

    5.2.11 Conquista da confiana ............................................................................... 80

    5.2.12 Proteo da agncia e da carreira .............................................................. 81

    5.2.13 A liderana .................................................................................................... 81

    5.2.14 Conhecimento funcional mtuo .................................................................. 82

    5.2.15 Cultura organizacional X cultura do profissional de inteligncia ............ 82

    5.2.16 Cultura de proteo do conhecimento ....................................................... 83

    5.3 INTEGRAÌO DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA NAS OPERAÍES INTERAGæNCIAS NO BRASIL CONTEMPORåNEO A LUZ DOS INDICADORES DE EFETIVIDADE ..................................................................................................... 84

    5.3.1 5¼ JMM ............................................................................................................. 85

    5.3.2 Rio +20 ............................................................................................................ 88

    5.3.3 Copa das Confederaes de 2013 e Jornada Mundial da Juventude ........ 91

    5.3.4 Copa do Mundo de 2014 ................................................................................ 94

    5.3.5 Desintruso da Terra Indgena Aw/MA ....................................................... 98

    6. CONCLUSÌO ................................................................................................... 103

    REFERæNCIAS........................................................................................................106

    $

    $

  • ++$

    1. INTRODUÌO

    A origem da atividade de inteligncia remonta ao perodo romano, quando o

    exrcito empregava tropas especiais chamadas de especuladores a fim de obter

    informaes sobre o inimigo. Contudo, somente foi possvel identificar as primeiras

    organizaes voltadas para a atividade a partir da segunda metade do sculo XIX

    (HERMAN, 1996).

    A 2» Guerra Mundial foi um momento histrico em que a inteligncia teve um

    papel relevante, mas o perodo de maior desenvolvimento da atividade foi na Guerra

    Fria. Nessa fase histrica, o mundo vivia a bipolaridade de foras, a qual

    possibilitava a existncia de adversrios claramente definidos. Assim, a inteligncia

    tinha a possibilidade de ser mais efetiva, pois sabia onde deveria buscar a

    informao e sobre quem (HERMAN, 1996).

    Aps a queda do Muro de Berlim, houve certa corrente de pensamento que

    afirmava que a inteligncia teria uma rotina mais fcil e que seria de certa forma

    dispensvel, pois o mundo tenderia para uma situao de paz. Contudo, o mundo

    ps Guerra Fria se tornou multipolar, mais complexo, mais imprevisvel e mais

    instvel, fazendo aumentar a importncia da atividade de inteligncia a fim de

    proteger a nao e seus interesses internacionais (HERMAN, 1996).

    As ameaas tradicionais contra a segurana dos Estados e as novas

    ameaas adquiriram caractersticas peculiares. O risco de proliferao de armas de

    destruio em massa e o terrorismo transnacional mudaram as regras das relaes

    internacionais. As grandes potncias no conseguiram mais prover sua prpria

    segurana, pois organizaes fracas se tornaram ameaas importantes. A

    inteligncia, e no o poder militar, se tornou a primeira linha de defesa da nao

    (ZEGART, 2009).

    O terrorismo um grande desafio para a inteligncia, pois os terroristas no

    possuem uma infraestrutura elaborada e no precisam mobilizar muitas pessoas

    para um ataque. Eles visam produzir o maior efeito possvel com o mnimo de foras

    (LOWENTHAL, 2011). Os grupos terroristas tm a capacidade de atuar em lugares

    imprevisveis e so compostos por integrantes de diferentes pases. Eles podem

    estar em qualquer lugar e em qualquer momento e o combate ao terrorismo

    normalmente depende mais da atividade de inteligncia do que de tropas

  • +4$

    especializadas para ser eficiente. Assim, a inteligncia identificou que para enfrentar

    o terrorismo teria que buscar o compartilhamento de informaes interagncias

    (HERMAN, 1996).

    Outro desafio para a inteligncia surgiu na atuao em apoio ao combate ao

    crime organizado. A lgica dessa ameaa foi uma novidade, porque os objetivos

    eram ganhos financeiros e no a violncia indiscriminada como o terrorismo

    (HERMAN, 1996). Os integrantes dessas organizaes criminosas so articulados

    em vrios setores da sociedade e, para ser efetiva, a inteligncia necessita integrar

    diversas informaes oriundas de organizaes de estado especializadas em

    inteligncia no mbito de um cenrio interagncias.

    Para acompanhar esses alvos e assessorar corretamente os decisores, a

    inteligncia teve que buscar a integrao de suas atividades no ambiente

    interagncias. Contudo, essa mudana exigia a interferncia do setor poltico por

    meio de medidas que pudessem superar os obstculos integrao existente no

    mbito da comunidade de inteligncia (ZEGART, 2009).

    As organizaes de estado voltadas para a atividade de inteligncia formam

    uma estrutura chamada comunidade de inteligncia ou servio de inteligncia, o qual

    pode ser caracterizado por agências compostas por profissionais que são

    responsáveis pela coleta, análise e disseminação de informações consideradas

    relevantes para o processo de tomada de decisões e para a implementação de

    políticas públicas nas áreas de política externa, defesa nacional e provimento de

    ordem pública (CEPIK, 2001).

    Os profissionais e as agncias de inteligncia possuem caractersticas que,

    em conjunto, formam um aspecto relevante para a atividade que a cultura

    organizacional, a qual compreendida como os distintos padres de cultura e mini-

    cultura existentes dentro de uma organizao. Cada agncia de inteligncia possui

    suas peculiaridades dependendo de seu ramo de atuao fazendo com que a

    cultura da inteligncia no seja igual, mas que tenha alguns pontos em comum em

    quase todas as organizaes de inteligncia (HERMAN, 1996).

    As questes organizacionais como as estruturas, a cultura e os incentivos

    profissionais encontradas na comunidade de inteligncia influenciam decisivamente

    no que as agncias de inteligncia fazem e como elas executam seu trabalho. As

    estruturas criam capacidades e determinam competncias funcionais, a cultura

    possui uma poderosa fora invisvel de influenciar o modo de ser e de atuar do

  • +,$

    profissional de inteligncia. Os incentivos profissionais estimulam certos

    comportamentos e inibem outros (ZEGART, 2009).

    A histria mostra que mudanas de vulto raramente se efetivam sem a

    ocorrncia de um evento histrico importante. Acontecimentos como tragdias,

    catstrofes e escndalos desafiam as instituies e tendem a alterar seu status quo.

    Aps a Guerra Fria, os Estados Unidos sabiam que deveriam fazer modificaes em

    seu sistema de inteligncia para poder fazer frente ao terrorismo, mas no

    conseguiram e facilitaram a ocorrncia do ataque de 11 de setembro. A novidade

    desse caso que, mesmo aps a ao terrorista, desafios importantes para a

    melhoria da comunidade de inteligncia norte americana como a integrao

    interagncias, ainda no foram resolvidos devido resistncia oferecida pela cultura

    organizacional dos profissionais e das agncias de inteligncia, pelos interesses

    polticos e pela fragmentao das estruturas de Estado. Assim, verifica-se que

    realizar mudanas em um sistema de inteligncia bastante difcil (ZEGART, 2009).

    A importncia que um pas dedica inteligncia est intimamente ligada

    percepo da existncia de ameaas e vulnerabilidades internas e externas. As

    naes que possuem problemas de segurana concretos incrementam seus

    investimentos em inteligncia (HERMAN, 1996).

    O Brasil um pas que no visualiza nenhuma ameaa iminente, mas vive um

    momento de protagonismo no cenrio mundial. O Pas foi sede dos Jogos

    Panamericanos de 2007, dos 5¼ Jogos Mundiais Militares em 2011, da Conferncia

    da ONU Rio + 20 em 2012, da Copa das Confederaes e da Jornada Mundial da

    Juventude em 2013 e da Copa do Mundo em 2014. Esses eventos contriburam

    fortemente para a projeo internacional do poder nacional. No mbito interno, o

    pas vem desenvolvendo operaes integrando vrios rgos a fim de cumprir

    deteminaes judiciais como foi o caso da desintruso da Terra Indgena Aw/MA, a

    fim de obter credibilidade interna junto a sociedade civil. Em todos os casos, houve

    planejamento e execuo da atividade de inteligncia. A experincia brasileira foi

    caracterizada pela implementao de estruturas diferentes para cada evento e isso

    est servindo para amadurecer a integrao da atividade de inteligncia no Brasil.

    O interesse na presente pesquisa surgiu quando o autor foi integrante da

    estrutura de inteligncia montada para os 5¼ Jogos Mundiais Militares (5¼ JMM) e

    para a Conferncia Rio + 20. Nesses eventos, foram identificadas oportunidades de

  • +-$

    melhoria para a integrao da inteligncia brasileira nos aspectos legais,

    organizacionais e culturais.

    O desafio brasileiro permanecer nos prximos anos devido a grandes

    eventos como as Olimpadas de 2016, mas o Pas tem condies de aprender com

    experincias estrangeiras e buscar aprimorar a sua atividade de inteligncia no que

    tange integrao a fim de colaborar com a segurana nacional e a projeo de

    poder no mbito internacional.

  • +.$

    2. A ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA

    Para que seja possvel compreender como a atividade de inteligncia pode

    ocorrer dentro de um ambiente interagncias necessrio ter noes bsicas do

    que a atividade de inteligncia. Antes de iniciar esse passo, para melhor

    entendimento, o termo informação será empregado para tudo que puder ser

    conhecido sem a existncia de um procedimento especfico de anlise. J

    conhecimento de inteligência será usado quando se tratar da informação que foi

    coletada, processada e selecionada para atender a um determinado usurio. Em

    resumo, o conhecimento de inteligncia baseado em informaes, mas nem toda

    informao diz respeito inteligncia (LOWENTHAL, 2011).

    A palavra inteligncia pode ser compreendida de diferentes maneiras. Uma

    forma entend-la como produto, ou seja, como o conhecimento de inteligncia.

    Outra maneira considerar inteligncia como organizao com suas agncias e

    estruturas. Por fim, inteligncia pode ser assimilada como processo ou metodologia

    para a produo do conhecimento, ou seja, como uma atividade (MORAES, 2012).

    A atividade de inteligncia o processo pelo qual informaes especficas e

    importantes para a segurana de um pas so requeridas pelo poder poltico e

    coletadas, analisadas e fornecidas a ele pela comunidade de inteligncia

    (LOWENTHAL, 2011).

    Uma das finalidades de uma agncia de inteligncia dar o alerta oportuno

    para evitar a surpresa estratgica, a qual pode ser caracterizada quando uma

    ameaa tem a capacidade de colocar em perigo a existncia da nao. Outra

    finalidade prover o Estado de profissionais especializados em pensar sobre o

    futuro da nao, em estimativas de longo prazo, a fim de compensar o pouco tempo

    que os polticos tm para isso, pois permanecem nos cargos por perodos restritos

    nas democracias. Mais uma finalidade da agncia apoiar o processo poltico,

    atendendo s necessidades dos lderes sem interferir diretamente na conduo da

    poltica. Cabe tambm s agncias manter em segredo os conhecimentos, as

    necessidades e os mtodos empregados pela atividade de inteligncia, tornando a

    atuao da agncia de inteligncia diferente e nica no contexto da burocracia

    governamental (LOWENTHAL, 2011). A agncia serve tambm para produzir

  • +/$

    conhecimentos a fim de potencializar o poder e a influncia internacional de um pas

    em tempo de paz e multiplicar o poder de combate em guerra (HERMAN, 1996).

    Uma das tarefas mais rduas do profissional de inteligncia convencer o

    usurio a considerar os conhecimentos fornecidos para o embasamento das

    decises, tornando o processo decisrio mais baseado em anlises do que na

    intuio do responsvel pela deciso (HERMAN, 1996, p. 152). Contudo, o homem

    de inteligncia deve ter em mente que o decisor sempre tem a liberdade de rejeitar

    ou ignorar o conhecimento de inteligncia oferecido a ele (LOWENTHAL, 2011).

    A razo de ser da inteligncia obter informaes sobre o adversrio e sobre

    as ameaas ao Estado a fim de aumentar o grau de conhecimento sobre os

    problemas de segurana interna e externa. Todas as informaes que dizem

    respeito ao prprio Estado, seus meios, suas potencialidades no fazem parte do

    escopo da inteligncia (CEPIK, 2001). Os principais alvos da inteligncia so as

    aes, as polticas e as capacidades de pases inimigos, neutros, amigos e de

    organismos no estatais como organizaes internacionais, grupos terroristas, entre

    outros. Porm, os objetivos da inteligncia sobre esses alvos no so apenas

    militares, mas so tambm polticos, econmicos, sociais, ligados ao meio ambiente,

    sade pblica e cultura (LOWENTHAL, 2011).

    A boa inteligncia deve seguir alguns princpios. Um deles o da

    oportunidade, pois mais importante disseminar o conhecimento para o usurio a

    tempo do que esperar complementos da coleta ou se prender a aspectos formais.

    Outro princpio o da pertinncia, pois a inteligncia deve focar no conhecimento

    que esteja sendo demandado pelo usurio e no buscar objetivos por conta prpria.

    A inteligncia deve tambm ser de fcil assimilao, ou seja, o conhecimento de

    inteligncia deve ser apresentado ao usurio de forma que ele possa ser

    compreendido com o mnimo de esforo. A inteligncia deve buscar a amplitude,

    pois o usurio deve saber de forma transparente tudo o que conhecido, tudo o que

    desconhecido e o grau de sigilo do conhecimento recebido. Por fim, a inteligncia

    deve buscar a objetividade, pois sem esse atributo no h como atender aos outros

    enumerados (LOWENTHAL, 2011).

  • +0$

    2.1 RAMOS DA ATIVIDADE DE INTELIGæNCIA

    A atividade de inteligncia subdividida em dois ramos a fim de ser melhor

    compreendida. Um ramo a inteligncia e o outro a contrainteligncia. Na

    execuo da atividade propriamente dita, esses ramos so interligados, pois a

    existncia de um depende da ao do outro. O ramo inteligncia corresponde

    atividade permanente e especializada de coleta de dados, produo e difuso

    metdica de conhecimentos, a fim de assessorar o usurio na tomada de deciso

    (ALMEIDA NETO, 2009).

    A contrainteligncia se caracteriza por ser o ramo da atividade de inteligncia

    responsvel por proteger informaes que, se de posse dos adversrios, tornariam o

    estado vulnervel e inseguro (CEPIK, 2001). Um de seus princpios bsicos o da

    compartimentao, que significa que a informao deve ser disponibilizada somente

    para aquele que tem a necessidade de conhecer (HERMAN, 1996).

    A contrainteligncia inclui tanto a parte de anlise quanto a parte operacional.

    Quanto anlise, buscam-se informaes sobre as capacidades dos servios de

    inteligncia adversos. Na parte operacional, h um foco no setor defensivo por meio

    da implantao de obstculos com o intuito de evitar aes adversas e um foco no

    setor ofensivo que visa identificar e recrutar oponentes, a fim de direcionar as aes

    dos adversrios e confundir o inimigo por meio da manipulao, distoro ou

    falsificao de informaes oferecidas a ele, caracterizando a desinformao

    (LOWENTHAL, 2011).

    2.2 VERTENTES DA INTELIGæNCIA

    Dentro da atividade de inteligncia, h agncias especializadas em

    inteligncia externa, inteligncia interna e inteligncia militar. A inteligncia externa

    responsvel por produzir conhecimentos de inteligncia baseados na coleta, no

    processamento, na integrao, na anlise e na avaliao de informaes disponveis

    sobre temas estrangeiros como governos, organizaes ou reas (RICHELSON,

    2011).

    A inteligncia interna faz o trabalho similar externa, a diferena que o foco

    se vira para as ameaas segurana do pas (RICHELSON, 2011). O receio da

    ocorrncia de revolues em massa no sculo XIX e o medo da disseminao do

    comunismo por meio da subverso no mundo foram os fatos histricos que

  • +1$

    provocaram o surgimento de servios de inteligncia voltados para a inteligncia

    interna. Ao longo do sculo XX, surgiram vrios deles como o Servio de Inteligncia

    de Segurana Canadense, a Direo Francesa de Vigilncia do Territrio e o Shin

    Beth em Israel. Os Estados Unidos delegaram a atribuio de inteligncia de

    segurana para o rgo de polcia nacional chamado Escritrio Federal de

    Investigaes (FBI) (HERMAN, 1996). Essa vertente da inteligncia a que mais

    tem se desenvolvido nos ltimos anos, pois assumiu novas responsabilidades como

    a contrainteligncia, o contraterrorismo, o combate ao crime organizado, ao

    narcotrfico, s fraudes financeiras, lavagem de dinheiro e, mais recentemente,

    aos crimes eletrnicos (CEPIK, 2001).

    Contudo, as ameaas segurana interna de um pas podem atuar tanto

    dentro como fora do territrio. Assim, a inteligncia externa precisa trabalhar em

    sintonia com a inteligncia interna, pois as ameaas tm ramificaes dentro e fora

    das fronteiras (HERMAN, 1996, p. 47).

    A inteligncia militar surgiu devido ao rpido desenvolvimento da tecnologia

    militar a partir da segunda metade do sculo XIX, a qual produziu equipamentos

    como o telgrafo, as locomotivas e os navios que permitiram que os exrcitos

    pudessem aplicar surpresas estratgicas por meio de rpidos movimentos e

    concentraes de tropas. Essa nova realidade fez com que os exrcitos tivessem

    que criar estruturas que estudassem os exrcitos dos outros pases a fim de permitir

    um melhor assessoramento ao processo decisrio. O objetivo da inteligncia militar

    obter informaes sobre o inimigo e sobre o campo de batalha e algumas

    ferramentas empregadas so a observao, os radares, os equipamentos de

    aquisio de alvos e a guerra eletrnica (HERMAN, 1996).

    A guerra o momento em que a inteligncia se torna mais pura no seu

    sentido de funcionamento. O objetivo final a vitria e o alvo , sem dvida, o

    inimigo. H um consenso entre os estudiosos em inteligncia que a atividade

    chave para o sucesso de uma ao militar, pois a inteligncia capaz de auxiliar as

    unidades militares a dispor seus recursos de forma eficiente (HERMAN, 1996).

    Um dos grandes desafios de uma guerra aplicar o fundamento conhecido

    como economia de foras, o qual entendido pela aplicao do maior poder de

    combate no local e no momento decisivo. Somente com informaes confiveis,

    possvel empregar esse fundamento na sua plenitude. Quanto mais rpida a

  • +2$

    informao chegar, mais tempo haver para a tomada de deciso e, assim, mais

    chance de sucesso (HERMAN, 1996, p. 146).

    A inteligncia militar um ramo to importante para uma nao que pode ser

    considerada uma comunidade parte, apesar de pertencer ao sistema nacional.

    Nesse contexto, os nveis militares de comando operacional e ttico devem possuir

    suas prprias fontes de inteligncia, mas necessrio que exista uma integrao

    entre esses nveis e, para isso, os sistemas de tecnologia da informao da

    inteligncia militar devem ser capazes de transmitir informaes tanto para os

    comandos superiores quanto aos subordinados (HERMAN, 1996, p. 32).

    Um exemplo de integrao da inteligncia militar no mbito das foras

    armadas surgiu nos Estados Unidos com a criao da Agncia de Inteligncia de

    Defesa (DIA) em 1961. Na Inglaterra, a integrao se deu em 1964 com a criao do

    Estado Maior de Inteligncia de Defesa (DIS) (HERMAN, 1996, p. 19).

    Uma das principais tarefas da inteligncia militar atender o conceito de

    Conscincia Situacional Dominante no Campo de Batalha, a qual significa dar aos

    comandantes em tempo real todas as informaes sobre as condies

    meteorolgicas e os monitoramentos existentes no campo de batalha em que ele

    atua. O objetivo diminuir as incertezas e dar vantagens operacionais aos

    comandantes, pois eles podero empregar suas foras de forma mais efetiva e

    alcanar seus objetivos de maneira mais rpida com menos perdas humanas.

    Ressalta-se que essencial haver o filtro da inteligncia para o comandante, pois

    impossvel fornecer a ele todas as informaes, pois receberia tanto conhecimento

    que no seria possvel process-los, ocupando o tempo e tornando a misso do

    comandante mais difcil (LOWENTHAL, 2011). Alguns tericos julgam que os novos

    sensores e plataformas tendem a diminuir a importncia da atividade de anlise,

    porm o efeito contrrio devido ao risco de sobrecarga informacional (CEPIK,

    2009).

    H tambm outras vertentes de inteligncia como a financeira, a econmica e

    a sociolgica. A inteligncia financeira foca nas instituies, pessoas e meios de

    comunicaes que tenham relao com a transferncia de recursos econmicos

    direcionados para o financiamento de organizaes e atividades ilcitas como o

    terrorismo, a venda de armas ou a construo de artefatos nucleares. A inteligncia

    econmica visa compreender a fora de um pas baseado na sua economia a fim de

    identificar pontos fortes e fracos, caso seja necessria uma eventual atuao por

  • 43$

    meio de sanes econmicas ou aes diretas. A inteligncia sociolgica analisa as

    relaes entre grupos sob o enfoque tnico, religioso, poltico visando identificar o

    impacto disso na estabilidade do pas (RICHELSON, 2011).

    2.3 CICLO DA INTELIGæNCIA

    O ciclo da inteligncia uma criao militar para descrever a lgica de um

    processo que visa atender s necessidades de um comandante. O decisor define

    quais so suas necessidades de conhecimentos e a inteligncia busca atend-las

    (HERMAN, 1996). O ciclo dividido em fases para possibilitar ao leitor entender

    melhor as mudanas qualitativas que a informao sofre antes de seguir para o

    usurio (CEPIK, 2001). O faseamento proposto somente existe para o entendimento

    do mtodo, pois na execuo prtica propriamente dita, as fases s vezes se

    confundem.

    O ciclo tem incio quando o usurio informa quais so suas necessidades de

    conhecimentos para apoiar seu processo decisrio (HERMAN, 1996). Alm das

    necessidades, ele deve determinar uma prioridade, pois a capacidade da inteligncia

    de empregar seus meios sempre ser menor do que as demandas (LOWENTHAL,

    2011). A partir disso, os especialistas transformam essas necessidades em objetivos

    de inteligncia, os quais devem ser alcanados pelos agentes responsveis pela

    coleta de informaes. Esses especialistas obtm a informao "crua", ou seja, no

    analisada, sobre o assunto (HERMAN, 1996, p. 285). A principal finalidade da

    determinao das demandas dar inteligncia alguma forma de priorizar suas

    aes (LOWENTHAL, 2011).

    A coleta o alicerce da inteligncia. Ela pode ser definida como a aquisio

    de qualquer informao que possa ser til para um analista por meio das fontes

    abertas, humanas, tcnicas, entre outras (RICHELSON, 2011). Algumas demandas

    so especficas de determinadas fontes de inteligncia, outras devem ser coletadas

    por diversas fontes a fim de dar mais matria-prima para a prxima fase que a

    anlise. A questo do custo importante para a coleta, pois as fontes mais tcnicas,

    que envolvem satlites por exemplo, tm um custo muito alto (LOWENTHAL, 2011).

    A informao coletada transformada pelos analistas em conhecimento de

    inteligncia (HERMAN, 1996, 285). A anlise pode ser considerada o esteio da

    atividade de inteligncia, pois ela que produz o conhecimento que vai atender a

  • 4+$

    demanda do usurio. Esse conhecimento pode ser um produto relacionado

    situao vivida no presente, ou seja, a inteligncia corrente, ou pode buscar

    tendncias do mdio e do longo prazo. A inteligncia corrente mais empregada em

    situaes de crise ou conflito, pois as decises a serem tomadas so mais tticas.

    Contudo, a inteligncia a longo prazo o emprego mais nobre da atividade e a mais

    desejada pelos analistas (LOWENTHAL, 2011).

    Por fim, a disseminao essencial para a efetividade da inteligncia, pois o

    conhecimento, alm de ser til, deve chegar ao usurio no prazo correto. Para isso,

    necessrio um sistema de tecnologia da informao dedicado para o sistema de

    inteligncia tanto no mbito interno como para a transmisso de conhecimentos ao

    usurio. A disseminao costuma ser o calcanhar de Aquiles da inteligncia, pois a

    presso para o cumprimento do prazo essencial para o reconhecimento do

    trabalho da inteligncia (HERMAN, 1996, p. 44 45).

    Depois de recebido o produto, novas necessidades de conhecimento surgem

    e o ciclo reiniciado (HERMAN, 1996, 285). Por vezes, o retorno por parte do

    usurio no ocorre e a inteligncia fica sem saber a utilidade de seu produto. Assim,

    desejvel um dilogo entre analistas e usurios no momento da entrega do

    conhecimento de inteligncia a fim de se buscar os ajustes necessrios para tornar o

    processo mais efetivo (LOWENTHAL, 2011). A falta do retorno por parte dos

    usurios ocorre porque o interesse pela atividade de inteligncia por parte de deles

    variado. H pessoas fascinadas pela atividade e outras que a consideram

    desnecessria (HERMAN, 1996). Em outros casos, os usurios no decidem ou no

    tm capacidade de transformar suas necessidades de conhecimento em demandas

    de inteligncia. Quando isso ocorre, os prprios analistas de inteligncia formulam

    as demandas. O risco ocorrer uma mistura entre a inteligncia e a poltica, ou seja,

    o profissional de inteligncia fazer parte do processo decisrio, o que no

    desejvel (LOWENTHAL, 2011). Assim, a orientao do ciclo acaba sendo feita pela

    prpria inteligncia e o feedback positivo ou negativo recebido do usurio que vai

    mostrar se o ciclo deve se manter ou deve ser reorientado (HERMAN, 1996).

    2.4 FONTES DE INTELIGæNCIA

    Dentre as vrias fontes de inteligncia, a fonte humana aquela em que os

    dados so obtidos por meio das pessoas, as quais podem ser especialistas,

  • 44$

    informantes, refugiados, imigrantes, populao local, desertores, prisioneiros de

    guerra, entre outros. A motivao que a pessoa tem para passar a informao pode

    ser de cunho ideolgico, financeiro, poltico, frustrao pessoal, vingana, sexual,

    entre outros (HERMAN, 1996). Em regra, o emprego da fonte humana envolve o

    envio de agentes para uma misso a fim de realizar o recrutamento de pessoas.

    uma atividade que demanda tempo e experincia de aproximadamente sete anos

    para que o agente se torne um perito (LOWENTHAL, 2011).

    A inteligncia do sinal coleta a informao por meio das emisses

    eletromagnticas, seja em relao ao seu contedo propriamente dito, seja em

    relao anlise do trfego de dados e a localizao eletrnica da transmisso

    (CEPIK, 2001). a fonte que mais se desenvolveu nas ltimas dcadas devido

    revoluo em curso nos setores de informtica e telecomunicaes desde o final do

    sculo XX (HERMAN, 1996).

    A inteligncia de imagens materializada pela obteno da informao sobre

    qualquer objeto, natural ou artificial, que possa ser observado e tenha importncia

    para a segurana. A observao pode ser feita de avies, veculos areos no

    tripulados (VANTs), satlites e at por cmeras comuns. Uma das vantagens dessa

    fonte ser visual, pois esse formato mais bem compreendido pelo usurio. Uma

    das desvantagens a dependncia de bons equipamentos para a qualidade da

    imagem e de especialistas para interpretar essa imagem (LOWENTHAL, 2011).

    Imagens obtidas por fontes abertas como televises, jornais e internet tambm

    podem ser analisadas por especialistas dessa rea (HERMAN 1996).

    H fontes menos usuais como a nuclear, especializada em emisses

    nucleares, a radiolgica, que busca emisses de radares inimigos, e a acstica, que

    vai identificar os sons emitidos sob a gua (HERMAN, 1996). H tambm a fonte de

    medidas, que se caracteriza pela interceptao de telemetria de msseis,

    monitoramento de fenmenos geofsicos, entre outros (CEPIK, 2001).

    Uma fonte que cresceu de importncia nas ltimas dcadas conhecida

    como fonte aberta. Ela caracterizada pelas mdias impressas, rdio, televiso,

    internet, informaes pblicas governamentais e informaes pblicas ou privadas

    de associaes profissionais, entidades acadmicas entre outras (LOWENTHAL,

    2011). O mundo mais aberto incrementou a disponibilidade de informaes. Ocorreu

    a ampliao da cobertura jornalstica e televisiva internacional e a possibilidade de

    acessar vrios bancos de dados dentro e fora do pas (HERMAN, 1996). A maior

  • 4,$

    vantagem da fonte aberta a acessibilidade e a maior desvantagem o grande

    volume. O melhor emprego dessa fonte servir como ponto inicial da coleta, pois

    aps se determinar o que est disponvel, possvel focar as outras fontes no que

    realmente est protegido pelo adversrio. Teoricamente, a grande quantidade de

    informaes disponveis atualmente tornaria o trabalho de inteligncia mais fcil.

    Contudo, o papel da inteligncia buscar a informao que no est disponvel e

    no simplesmente buscar nas fontes abertas (LOWENTHAL, 2011).

    2.5 MODELOS DE SISTEMA DE INTELIGæNCIA

    A disseminao de organizaes de inteligncia ao longo do sculo XX fez

    com que surgisse a necessidade de que os conhecimentos especializados nas reas

    do exrcito, da marinha, da fora area, da poltica e da economia fossem

    integrados no nvel nacional para ser possvel elaborar uma viso mais ampla sobre

    o inimigo. Assim, houve a necessidade de se estruturar uma comunidade de

    inteligncia formando um sistema nacional (HERMAN, 1996, p. 26). Em geral, um

    sistema de inteligncia formado por um rgo central de coordenao, agncias

    de coleta de informao e agncias de anlise de dados. Alm desses, h um rgo

    de formao e treinamento para a especializao dos recursos humanos (CEPIK,

    2001).

    Estes sistemas seguem, em regra, modelos consagrados no mundo. O

    parmetro bsico para esta classificao diz respeito ao nvel de centralizao de

    uma autoridade sobre o sistema de inteligncia como um todo, ou seja, em que

    medida as ordens centrais emanadas so cumpridas. O modelo terico anglo-saxo

    marcado pela centralizao com um rgo com hierarquia sobre as agncias. O

    modelo europeu continental marcado pela mdia centralizao, enquanto o

    asitico apresenta baixa centralizao. O modelo brasileiro pode ser enquadrado

    como sendo de mdia centralizao na teoria, mas descentralizado na prtica.

    Normalmente, os sistemas de inteligncia so vinculados ao poder executivo e

    atendem, como principal usurio, ao Chefe de Estado (CEPIK, 2001).

    O sistema de inteligncia da Inglaterra tem como caracterstica uma

    organizao de nvel nacional chamada Comit de Inteligncia Conjunta (JIC) que

    responsvel por direcionar e supervisionar a organizao e o funcionamento da

    inteligncia britnica visando eficincia, economia de recursos e rpida

  • 4-$

    adaptabilidade evoluo das necessidades. O JIC tem poder sobre o oramento e

    tem status superior na hierarquia sobre as agncias das foras armadas, das

    polcias, entre outras. Contudo, um modelo utpico, pois na prpria Inglaterra, h

    vrias organizaes de inteligncia que so independentes (HERMAN, 1996).

    As principais agncias de inteligncia da Inglaterra so o MI5, o MI6 e o

    Quartel General de Comunicaes do Governo (GCHQ). O MI5 responsvel pela

    inteligncia interna e, assim, pela proteo do pas contra o terrorismo, a

    espionagem, as armas de destruio em massa, os riscos economia, entre outros.

    O MI6 responsvel pela inteligncia externa e o GCHQ responde pela inteligncia

    do sinal. Para atuar no tema terrorismo, a Inglaterra criou o Centro Conjunto de

    Anlise sobre o Terrorismo (JTAC) que composto por profissionais do MI5, MI6,

    GCHQ e do Estado Maior de Inteligncia de Defesa (DIS). O DIS subordinado ao

    Chefe da Inteligncia de Defesa, o qual est ligado diretamente ao Secretrio de

    Defesa e controla a Agncia Geogrfica e de Imagens de Defesa (LOWENTHAL,

    2009).

    Nos Estados Unidos, a necessidade de sistema nacional e amplo de

    inteligncia surgiu aps a dcada de 1940, quando o pas se tornou uma potncia

    mundial e se envolveu em questes ligadas a vrias partes do mundo. O modelo

    americano sempre se caracterizou como competitivo, pois surgiu no meio militar com

    disputas entre o exrcito e a marinha e se expandiu para o meio civil com novas

    rivalidades entre o FBI e a Agncia Central de Inteligncia (CIA). Era um sistema no

    qual ningum queria compartilhar as informaes (LOWENTHAL, 2011).

    A CIA foi criada na dcada de 1940 para coordenar a inteligncia produzida

    por todas as agncias dos Estados Unidos. Ela deveria integrar os conhecimentos

    produzidos a fim de evitar vises contraditrias (LOWENTHAL, 2011). Porm, os

    polticos e as agncias j existentes no concordavam com um sistema centralizado.

    Assim, a legislao aprovada no conferiu poderes para que o chefe da CIA

    pudesse realmente coordenar a comunidade de inteligncia (ZEGART, 2000). Alm

    disso, no houve a adoo de medidas que permitissem a atuao da CIA sobre o

    controle do oramento da inteligncia nos Estados Unidos, o qual sempre foi um dos

    pontos mais controversos do debate sobre a comunidade de inteligncia no pas

    (LOWENTHAL, 2011).

    A integrao do sistema de inteligncia dos Estados Unidos, visando a

    formao de uma comunidade de inteligncia, teve incio com o ataque japons a

  • 4.$

    Base de Pearl Harbour em 1941. Esse revs norte-americano foi considerado uma

    clssica falha da inteligncia. Houve negligncia em relao ao tratamento das

    informaes, pois os processos eram falhos e no havia compartilhamento de

    conhecimentos entre as agncias (LOWENTHAL, 2011).

    Atualmente, a comunidade de inteligncia dos Estados Unidos composta

    principalmente pelos seguintes rgos: CIA, DIA, Agncia de Segurana Nacional

    (NSA), Agncia Nacional de Inteligncia Geoespacial, Escritrio de Inteligncia e

    Pesquisa (INR) do Departamento de Estado, Departamento de Energia,

    Departamento de Segurana Interna, Escritrio de Inteligncia do Tesouro, FBI,

    Agncia de Combate as Drogas (DEA), Escritrio Nacional de Reconhecimento e as

    agncias de inteligncia do Exrcito, da Marinha, da Fora Area, da Guarda

    Costeira e dos Fuzileiros Navais (BOARDMAN, 2006). O Escritrio do Diretor

    Nacional de Inteligncia (DNI) tambm integra essa comunidade (RICHELSON,

    2011).

    Em relao coleta de dados, os Estados Unidos possuem, em nvel

    nacional, a NSA para a inteligncia de sinais, o Escritrio Nacional de

    Reconhecimento para a coleta de informaes por meio de satlites e a Agncia

    Nacional de Inteligncia Geoespacial para a coleta de imagens georeferenciadas. O

    Departamento de Energia tem o foco direcionado para a questo nuclear, o DEA

    foca nos ilcitos ligados ao trfico de drogas e o Escritrio de Inteligncia do Tesouro

    produz conhecimentos de inteligncia financeira e econmica (RICHELSON, 2011).

    No que diz respeito atividade de anlise, os Estados Unidos possuem trs

    agncias que so sobrepostas, ou seja, analisam dados oriundos de todas as fontes

    e produzem um conhecimento final sobre todos os temas de interesse nacional. So

    elas o Departamento de Inteligncia da CIA, o INR do Departamento de Estado e a

    DIA. Esse modelo caracteriza o conceito de anlise competitiva, no qual analistas

    oriundos de diferentes agncias podem produzir conhecimentos que, se integrados,

    tm mais condies de serem isentos de vises institucionais (LOWENTHAL, 2011).

    O ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 e a falha da inteligncia em

    afirmar a existncia de armas de destruio em massa no Iraque em 2003 foram

    eventos que foram analisados sob o enfoque da inteligncia pela Comisso do 11 de

    Setembro. Ao trmino das investigaes, foi gerado um relatrio que provocou um

    ato legal por parte do poder executivo norte americano chamado Reforma da

    Inteligncia e Ato de Preveno ao Terrorismo (IRTPA). Uma das medidas previstas

  • 4/$

    nesse documento foi a criao do cargo de DNI com a misso de supervisionar e

    coordenar o sistema de inteligncia como sua maior autoridade e sem estar ligado a

    nenhuma agncia especfica (LOWENTHAL, 2011). O DNI possui, sob sua

    subordinao, um conjunto de agncias focadas no compartilhamento de

    informaes formado pelo Centro Nacional de Contraterrorismo (NCTC), Centro

    Nacional de Contraproliferao (NCPC), Conselho Nacional de Inteligncia (NIC),

    Centro Nacional de Contrainteligncia (NCIX) e pelos centros de fuso estaduais e

    locais (RICHELSON, 2011). A misso fundamental do DNI no produzir

    conhecimentos de inteligncia e sim proporcionar um ambiente favorvel para a

    integrao de conhecimentos oriundos de todas as agncias da comunidade de

    inteligncia dos Estados Unidos. Para isso, ele estabelece as necessidades de

    inteligncia que devem ser priorizadas pelas agncias (HENRY L. STIMSON

    CENTER, 2008).

    O NIC composto por profissionais responsveis por produzirem

    conhecimentos de inteligncia, entre eles a estimativa nacional de inteligncia (NIE),

    a qual se caracteriza por ser um conhecimento produzido com a participao de

    vrios analistas de diversas agncias. A maneira de se chegar a um produto final

    comum o consenso, ou seja, todas as discordncias devem ser resolvidas por

    meio de acordos realizados em encontros agendados entre os integrantes das

    diversas agncias. Apesar das rivalidades, as agncias tm interesse em participar

    com o objetivo de agregar valor ao conhecimento final e de saber como est o nvel

    da participao das outras agncias nesse processo (LOWENTHAL, 2011).

    O NCTC responsvel por organizar os esforos na rea de inteligncia e no

    setor operacional em relao ao contraterrorismo. Ele responsvel por integrar os

    dados oriundos das fontes provenientes de todas as agncias, produzindo

    conhecimentos e fazendo a difuso para toda a comunidade (HENRY L. STIMSON

    CENTER, 2008).

    O NCPC mais um rgo coordenador da inteligncia ligada a no

    proliferao de armas de destruio em massa do que uma agncia de inteligncia.

    O NCPC serve para identificar deficincias na coleta e na anlise sobre o tema e

    promover solues para melhorar o processo. O NCIX o rgo principal da

    contrainteligncia nos Estados Unidos e responsvel por desenvolver os planos e

    as polticas de contrainteligncia. O NCIX no tem controle sobre as agncias

  • 40$

    especializadas em contrainteligncia, o que provoca uma falta de conexo entre o

    nvel estratgico e o ttico nessa rea (LOWENTHAL, 2011).

    O grande desafio do DNI ter habilidade para implantar uma srie de

    reformas organizacionais e culturais na comunidade de inteligncia. Como

    obstculos ele enfrenta as disputas por poder com os dirigentes das diversas

    agncias de inteligncia e a falta de uma estrutura apropriada, fazendo com que ele

    dependa do produto final oferecido pelas agncias subordinadas (LOWENTHAL,

    2011).

    Outra novidade surgida aps o 11 de setembro foi o Departamento de

    Segurana Interna (DSI) que foi criado para coordenar as agncias ligadas

    segurana interna dos Estados Unidos. No setor de inteligncia, o DSI criou uma

    Diviso de Anlise de Informao e Proteo de Infraestruturas que tem o desafio de

    buscar as informaes sobre ameaas relacionadas com armas de destruio em

    massa, radicalizao violenta de grupos, terrorismo domstico e segurana sanitria

    na comunidade de inteligncia a fim de avaliar as vulnerabilidades do pas. Para

    superar este desafio em relao ao terrorismo, o Departamento criou o Programa de

    Centros de Fuso Conjuntos, que consiste na instalao de setenta e dois Centros

    de Fuso em todo o pas para facilitar o compartilhamento de informaes entre os

    nveis federal, estadual e municipal (RICHELSON, 2011). Esses centros de fuso

    representam um esforo colaborativo de duas ou mais agncias a fim de prover

    conhecimentos que sirvam para detectar, prevenir e investigar aes ligadas a

    atividades terroristas (HENRY L. STIMSON CENTER, 2008).

    O sistema de inteligncia competitivo norte-americano gerou a ocorrncia de

    uma forma de trabalho independente entre as agncias, pois no havia um

    mecanismo formal de integrao, os oramentos eram prprios, as prioridades eram

    individuais de cada agncia, o pessoal era contratado e treinado por programas

    prprios, os sistemas de comunicao no falavam entre si e os bancos de dados

    eram incompatveis. Esta estrutura fragmentada atendeu ameaa comunista mais

    previsvel, mas o terrorismo internacional, com sua atividade dinmica e sigilosa,

    exigia um trabalho interagncias para que fosse possvel ser mais efetivo. A

    estrutura existente dificultava a integrao, principalmente com a extrema separao

    entre o FBI e a CIA, pois não há distinção entre dentro ou fora do país para o

    terrorista como havia para a CIA e para o FBI (ZEGART, 2009).

  • 41$

    2.6 O MODELO BRASILEIRO

    A histria da atividade de inteligncia no Brasil teve incio em 1927 com a

    criao de um rgo militar do chamado Conselho de Defesa Nacional que em

    pouco tempo teve o nome alterado para Conselho de Segurana Nacional. Esse

    rgo era responsvel por assessorar a Presidncia da Repblica com informaes

    sobre o presente e sobre ameaas segurana nacional. O primeiro rgo civil

    criado para atuar na rea de inteligncia foi o Servio Federal de Informaes e

    Contra-Informaes em 1958. Em 1964, no rol de mudanas institucionais que o

    Brasil vivia, o Servio Federal de Informaes e Contra-Informaes foi substitudo

    pelo Servio Nacional de Informaes, o qual tinha como atribuies atuar nos

    ramos da inteligncia e da contrainteligncia, bem como supervisionar e coordenar a

    atividade de inteligncia no Brasil. De forma simultnea, foi criado o Sistema

    Nacional de Informaes, o qual tinha um carter de subordinao, pois o Servio

    Nacional de Informaes tinha autonomia para acionar as agncias de inteligncia

    dos diversos ministrios do Pas mesmo sem a autorizao das autoridades

    competentes. Passado o perodo dos governos militares, o Servio Nacional de

    Informaes entrou num perodo de decadncia at ser extinto em 1990. Durante a

    dcada de 1990, o governo brasileiro determinou a realizao de estudos para

    encontrar um novo modelo inteligncia e em 1999 foi criada a Agncia Brasileira de

    Inteligncia com a incumbncia de ser a agncia central do novo Sistema Brasileiro

    de Inteligncia (SISBIN) (GONALVES, 2014).

    O SISBIN o nome oficial da comunidade de inteligncia do Brasil e sua

    funo principal assessorar o Chefe de Estado e de Governo do Pas. O SISBIN

    formado pelo Gabinete de Segurana Institucional (GSI), Agncia Brasileira de

    Inteligncia (ABIN), Ministrio da Defesa, Ministrio das Relaes Exteriores, Casa

    Civil da Presidncia da Repblica, Ministrio da Justia, Ministrio da Integrao

    Regional, Ministrio da Integrao Nacional, Ministrio da Cincia e Tecnologia,

    Ministrio do Meio Ambiente, Ministrio da Sade, Ministrio da Previdncia Social,

    Ministrio do Trabalho e Emprego, Ministrio da Fazenda, e Controladoria Geral da

    Unio (GONALVES, 2011). O Centro Gestor e Operacional do Sistema de

    Proteo da Amaznia (CENSIPAM) tambm integra o SISBIN, mas como

    subordinado ao Ministrio da Defesa desde 5 de janeiro de 2011 (BRASIL, 2011).

    Ressalta-se que os demais entes federados tambm podem ser membros do

  • 42$

    SISBIN mediante ajustes e convnios. A composio do Sistema e a possibilidade

    de agregar rgos estaduais e municipais fornecem, na teoria, a possibilidade de

    que o sistema tenha extensa capilaridade caso consiga uma efetiva cooperao

    entre todas as agncias (GONALVES, 2011).

    A ABIN o rgo central do SISBIN e tem como competncias o

    planejamento, a execuo, a coordenao, a superviso e o controle da atividade de

    inteligncia no Brasil. Alm disso, ela responsvel pela obteno de dados,

    produo de conhecimentos nos mbitos interno e externo para o assessoramento

    do Presidente da Repblica, desenvolvimento da contrainteligncia, formao de

    recursos humanos e promoo da doutrina de inteligncia. Ela subordinada ao

    Ministro-Chefe do GSI e, na prtica, seu enfoque majoritariamente a inteligncia

    interna (GONALVES, 2011).

    Legalmente, a ABIN tem poderes para planejar, executar, supervisionar,

    controlar as atividades de inteligncia no Brasil e regular o fluxo de informaes

    produzidas pelas agncias de inteligncia. Assim, sempre que houver aes que

    envolvam mais de um membro do SISBIN, a coordenao da atividade de

    inteligncia deve ser da ABIN (CEPIK, 2009).

    Os rgos principais da ABIN so a Escola de Inteligncia (ESINT), o

    Departamento de Inteligncia Estratgica (DIE), o Departamento de

    Contrainteligncia (DCI), o Departamento de Contraterrorismo (DCT) e o

    Departamento de Integrao do Sistema Brasileiro de Inteligncia (DISBIN). A

    ESINT promove a capacitao e o desenvolvimento de recursos humanos da

    maioria dos rgos do SISBIN e promove a doutrina de inteligncia. A DIE

    responsvel pela reunio de dados para a posterior produo de conhecimentos por

    meio das operaes de inteligncia, dos adidos de inteligncia brasileiros lotados no

    exterior e dos estrangeiros lotados em Braslia. A DCI trabalha na obteno de

    informaes para exercer a salvaguarda de assuntos sensveis de interesse do

    Estado e da sociedade. O DCT planeja e executa atividades de preveno s aes

    terroristas e tambm obtm e produz conhecimentos sobre organizaes terroristas.

    O DISBIN tem como competncias a busca por intercambiar dados entre os

    membros do SISBIN e integrar as aes de planejamento e de execuo do Centro

    de Integrao do SISBIN (GONALVES, 2011).

    O Diretor-Geral a autoridade mxima da ABIN. Ele o principal assessor do

    Ministro-Chefe do GSI na rea de inteligncia e tem como atribuies ser o

  • ,3$

    responsvel por coordenar a atividade de inteligncia do SISBIN, coordenar todas as

    atividades da ABIN e aprovar planos de operao a serem cumpridos pela agncia.

    Em teoria, o Diretor-Geral deve ser o coordenador geral de todas as aes conjuntas

    do SISBIN, semelhana do que era o Diretor da CIA antes da implementao do

    DNI, mas sua atuao nessa rea efmera (GONALVES, 2011).

    Alm do SISBIN, h no Brasil o Sistema de Inteligncia de Defesa (SINDE) e

    o Subsistema de Inteligncia de Segurana Pblica (SISP). O SISP responde pela

    integrao da inteligncia criminal, interna, contrainteligncia e contraterrorismo e

    coordenado pela Secretaria Nacional de Segurana Pblica (SENASP) do Ministrio

    da Justia. Os principais integrantes do SISP so o Departamento de Polcia Federal

    (DPF), o Departamento de Polcia Rodoviria Federal (DPRF), o Conselho de

    Controle de Atividades Financeiras (COAF) do Ministrio da Fazenda, a

    Coordenao Geral de Pesquisa e Investigao (COPEI) da Secretaria da Receita

    Federal (SRF), o Ministrio da Integrao Regional, o Ministrio da Defesa, a ABIN,

    a Secretaria Nacional de Polticas Sobre Drogas (SENAD), as policias civis e as

    policias militares (CEPIK, 2009).

    O SINDE faz a integrao entre as trs foras singulares e fortalece a

    capacidade institucional do Ministrio da Defesa. Ele articula o Centro de Inteligncia

    da Marinha (CIM), o Centro de Inteligncia do Exrcito (CIE), o Centro de

    Inteligncia da Aeronutica (CIAer) e o Estado Maior Conjunto das Foras Armadas

    (EMCFA) sob a coordenao do Departamento de Inteligncia Estratgica do

    Ministrio da Defesa (CEPIK, 2009). O SINDE tem atribuio exclusiva no que diz

    respeito atividade de inteligncia operacional necessria ao planejamento e a

    conduo de campanhas e operaes militares, pois, para esse caso, no h

    competncia legal da ABIN (GONALVES, 2011).

  • ,+$

    3. AS OPERAÍES INTERAGæNCIAS

    No sculo XXI, os complexos desafios para a segurana nacional requerem

    uma integrao de recursos e unidade de esforos no mbito do governo

    (MARCELLA, 2008). O ambiente atual enfrentado pelos pases de estruturas

    nacionais e internacionais mescladas, aumento do nmero de partes envolvidas nos

    problemas, crescimento da disponibilidade de informaes e necessidade de

    acelerao do ciclo de tomada de decises. A soluo mais comumente empregada

    para atuar nessa situao a participao de atores estatais com competncias

    complementares, redundantes e competitivas, gerando elevados gastos pblicos

    desnecessrios e eventuais falhas no processo decisrio que podem ocasionar

    vulnerabilidades nacionais (RAZA, 2012). O cenrio mundial demanda solues para

    os problemas sociais e burocrticos existentes. Diante das dificuldades, as

    autoridades precisam tomar uma atitude e a operao interagncias uma sada

    relativamente barata, simblica e eficiente (BARDACH, 1998).

    O governo de um pas executa suas aes por meio de agncias executivas,

    as quais foram implementadas na burocracia estatal a fim de melhorar a

    admininstrao pblica, atendendo a alguns princpios tericos. Um deles o da

    economia, pois as agncias so mais eficientes por serem mais especializadas e

    formadas por funcionrios pblicos profissionais gerando um servio melhor e com

    custo menor. O lado negativo que as agncias tendem a demorar a reagir quando

    do surgimento de mudanas no contexto social, pois enfrentam bloqueios polticos

    que impedem a devida agilidade s decises governamentais (RAZA, 2012).

    Numa realidade mundial de corte de recursos oramentrios, muitos governos

    buscam diminuir os custos e reduzir redundncias por meio da integrao

    interagncias, a qual se caracteriza por ser um esforo de profissionais de no

    mnimo duas agncias que coordenam suas atividades e compatilham recursos a fim

    de obter um resultado que no seria possvel de ocorrer se atuasse de forma isolada

    (SCOTT, 2003). A teoria indica que todas as agncias necessrias devem ser

    includas para o cumprimento de determinado processo, o qual deve ser conduzido

    por meio do consenso, ou seja, de negociaes que devem ser conduzidas para se

    chegar a um senso comum (LOWENTHAL, 2011).

  • ,4$

    As operaes interagncias correspondem a um processo que envolve seres

    humanos e organizaes complexas com diferentes culturas e vises prprias sobre

    os interesses nacionais. um processo poltico, pois baseado na disputa pelo

    poder, seja pessoal, seja organizacional, que tem como algumas de suas

    caractersticas a resistncia a mudanas e a luta pelo cumprimento de

    compromissos assumidos (MARCELLA, 2008). As operaes interagncias

    envolvem organizaes que possuem atribuies legais e culturas organizacionais

    prprias. H uma fragmentao do poder, o qual distribudo entre os vrios atores.

    Nenhum ator individual ou grupo de atores tem o poder de controlar o processo

    (CHUN & JONES, 2008).

    A operao interagncias corresponde a uma atividade conjunta feita com a

    finalidade de aumentar o valor pblico do produto final da operao e tambm das

    agncias envolvidas. A atividade conjunta varia desde uma fora tarefa trabalhando

    por um longo perodo de forma centralizada at encontros eventuais feitos por

    profissionais para acertar detalhes de trabalhos que envolvem as agncias. O valor

    pblico ocorre quando o resultado final da atividade atingido com eficincia,

    efetividade e justia (BARDACH, 1998).

    Para o Ministrio da Defesa, operaes Interagncias so interaes entre

    agncias pblicas, privadas e no governamentais com a finalidade de conciliar

    interesses e coordenar esforos para a consecuo de objetivos ou propsitos

    convergentes que atendam ao bem comum, evitando a duplicidade de aes,

    disperso de recursos e a divergncia de solues com eficincia, eficcia,

    efetividade e menores custos (BRASIL, 2012).

    3.1 CARACTERêSTICAS DAS OPERAÍES INTERAGæNCIAS

    As operaes interagncias podem alcanar diversos tipos de integrao

    como a cooperao, a coordenao e a colaborao interagncias. A cooperao

    uma relao menos formal e com forte influncia exercida pelas lideranas

    carismticas. A coordenao demanda um arranjo institucional que faa com que

    uma agncia considere a atuao das outras agncias no planejamento de suas

    atividades. A colaborao consiste na sntese das funes da cooperao e da

    coordenao, ou seja, seria um ponto ideal da relao entre as agncias a fim de

    incrementar valores pblicos por meio de um trabalho conjunto (RAZA, 2012).

  • ,,$

    As melhores prticas de governana interagncias esto relacionadas com o

    alinhamento de propsitos por parte das organizaes envolvidas com problema a

    ser resolvido. O resultado desse trabalho deve ser eficiente, por meio de menores

    custos, eficaz, por meio da antecipao do prazo em se atingir metas, e efetivo,

    proporcionado pela manuteno da eficcia no tempo com eficincia (RAZA, 2012).

    Uma operao interagncias requer que as organizaes discutam e se

    acordem sobre os objetivos e as responsabilidades. A complexidade das agncias,

    as diferenas culturais, os objetivos institucionais e polticos peculiares e a

    competio por recursos so algumas das dificuldades desse mundo (ALZATE,

    2010). O principal desafio deste tipo de operao estabelecer mecanismos para

    hamonizar culturas e esforos diversos, a fim de obter uma deciso que possa

    responder a problemas complexos (RAZA, 2012).

    As dinmicas interagncias podem ser compreendidas como um mecanismo

    de eleio de preferncias coletivas que atendem a trs condies: reconhecimento

    por parte de cada integrante de que cada agncia teve a oportunidade de manifestar

    a opinio, de que houve o entendimento da viso de cada agncia e de que a

    deciso final consensual ser acatada e executada. Essa dinmica demanda uma

    necessidade de mais recursos e de mais tempo de resposta a fim de se buscar o

    consenso (RAZA, 2012).

    H tericos que consideram que somente o incremento da troca de

    informaes entre as agncias seria suficiente para suprir a necessidade de uma

    operao interagncias, mas a experincia do Afeganisto mostrou que houve um

    intenso volume de informaes intercambiadas entre todas as agncias, mas que

    isso no foi suficiente para gerar a integrao, pois havia diferentes alternativas de

    resposta para o mesmo problema. A cooperao interagncias um meio e no

    um fim em si mesmo (RAZA, 2012, p. 34).

    As operaes interagncias exigem uma interdependncia funcional, ou seja,

    os recursos financeiros, os recursos humanos e as experincias devem ser

    integradas para que o resultado seja mais efetivo. Nenhuma questo de segurana

    nacional pode ser resolvida por uma agncia de forma isolada (RAZA, 2012).

    Um profissional apto a trabalhar num ambiente interagncias deve ter uma

    ampla compreenso sobre os instrumentos do poder nacional e sobre as culturas

    organizacionais das agncias, uma grande capacidade de comunicao escrita e

    falada, um cuidado em evitar as peculiaridades de suas prprias agncias, alm de

  • ,-$

    caractersticas pessoais como pacincia, senso de humor, tolerncia com a

    ambiguidade e com a indeciso. As operaes interagncias exigem capacidade de

    negociao, habilidade de trabalhar em rede e domnio sobre as nuances e

    linguagens do mundo poltico (MARCELLA, 2008). A colaborao interagncias

    um objetivo difcil de se alcanar, porque cada agncia tem sua cultura, sua

    hierarquia, sua tendncia e sua perspectiva. Assim uma operao desse tipo

    normalmente se caracteriza por ter uma estrutura em rede, diferentes modos e

    velocidades de deciso e dimenses verticais e horizontais (TUCKER, 2000).

    Um dos principais obstculos que dificulta a efetividade das operaes

    interagncias a falta de uma autoridade decisora, pois o paradigma que ningum

    est no comando (MARCELLA, 2008). Em teoria, a colaborao interagncias no

    setor pblico segue uma hierarquia que tem como maior autoridade o presidente da

    repblica. Contudo, o presidente no participa de todas as atividades interagncias

    fazendo com que a colaborao se torne, na maioria das vezes, uma rede sem

    hierarquia. Uma operao interagncias com vis mais hierrquico tem como

    vantagens permitir um processo decisrio e a consequnte implementao de forma

    mais rpida, sendo mais indicada para situaes crticas no curto prazo. A

    colaborao em rede mais eficiente em adotar solues mais inteligentes, geis e

    flexveis, pois os participantes tm autonomia para mudar seus pontos de vista sem

    a necessidade de pedir autorizao para suas agncias permitindo solues mais

    adaptadas realidade enfrentada, sendo mais indicada para situaes de longo

    prazo (TUCKER, 2000).

    No h um rgo superior que possa forar o acordo ou isolar uma agncia

    que se negue a colaborar. O meio existente a negociao, a qual traz

    consequncias como a necessidade de muito tempo para se chegar a um acordo,

    demonstrando o grande poder que dado para a agncia que se nega a concordar.

    Alm disso, h o risco de se buscar decises menos elaboradas para atender ao

    tempo e ao consenso (LOWENTHAL, 2011).

    3.2 MODELOS TEîRICOS

    Um dos modelos tericos que explica a operao interagncias a teoria da

    rede interorganizacional, que busca analisar como o relacionamento entre as

    agncias surge, como se expande e como incrementa o valor do resultado final e do

  • ,.$

    trabalho de cada participante. A teoria enfatiza a importncia da capacidade de

    comunicao, que entendida como as relaes entre as agncias e entre os

    indivduos, como um fator crtico de sucesso, pois cria entre os participantes uma

    cultura de integrao e um nvel de confiana que permite aos participantes atingir

    entendimentos de forma rpida (BARDACH, 1998). Esse modelo determina a

    criao de diversas instncias de superviso e controle estabelecidas e alojadas na

    estrutura formal e regular do governo. As instncias funcionam como ns de uma

    rede que so integradas dentro dos propsitos do governo (RAZA, 2012). A

    tecnologia da informao um fator relevante nesse modelo, pois permite o acesso

    e o compartilhamento de informaes entre as agncias. O tipo ideal de rede

    aquele em que todos os receptores possuem autonomia para decidir e tm a

    capacidade de se comunicar com os outros integrantes da rede, sem a necessidade

    de autorizao para a difuso de informaes, facilitando as operaes

    interagncias. A teoria da rede interorganizacional no capaz de motivar a

    colaborao interagncias ou superar barreiras estruturais de integrao, mas uma

    boa ferramenta para incrementar a capacidade de cooperao numa operao

    interagncias, pois melhora a coordenao e o compartilhamento de informaes

    (SCOTT, 2003).

    Outro modelo chamado de integrao por segmentos articulados, o qual

    prev a criao de uma organizao temporria, designada para atuar em um

    problema especfico que necessite da participao de diversos setores e com

    superioridade hierrquica sobre as agncias. O objetivo criar um microcosmo

    simplificador da realidade burocrtica dos ministrios para a obteno de consensos

    e compromissos de forma mais gil. o modelo mais comum e mais utilizado para a

    colaborao interagncias, mas tende a gerar confuso e dvidas se forem criados

    de forma indiscriminada (RAZA, 2012).

    O modelo por fluxo hierrquico de processos prev a criao de um

    mecanismo de deciso colaborativa permamente que se desenvolve de forma

    vertical e hierrquica desde os nveis inferiores at os lderes de uma nao. A ideia

    que o consenso seja construdo desde a base para que as solues propostas

    sejam exequiveis e aceitveis. O problema desse modelo a necessidade de que as

    agncias criem estruturas voltadas para participar dos processos decisrios, o que

    gera custos e exige mudana nas agncias e nas culturas organizacionais (RAZA,

    2012).

  • ,/$

    A teoria da comunidade epistmica prope que o desenvolvimento de

    polticas interagncias mais efetiva se h uma comunidade de profissionais com

    semelhana de pensamentos, que compartilham as ideias e que trocam informaes

    atravs das fronteiras burocrticas das agncias. Uma comunidade epistmica

    consiste em profissionais de diferentes agncias que compartilham normas, valores

    e crenas. Eles concordam com as prticas adotadas no mbito de sua

    especialidade e com a validade das tcnicas empregadas visando o aprimoramento

    da atividade. A presena destas caractersticas em um determinado grupo de

    agncias pode indicar a possibilidade de um maior grau de cooperao na operao

    interagncias. A existncia de um grupo de profissionais oriundos de diversas

    agncias que trabalha rotineiramente junto, contribui ainda mais para a formao da

    conscincia de comunidade e, consequentemente, para o sucesso da operao

    interagncias, pois relaes pessoais fortes so estabelecidas, gerando um clima de

    confiana por haver similaridade de pontos de vista e objetivos. Mesmo sem a

    existncia de grupos permamentes, a ocorrncia de encontros frequentes entre os

    profissionais serve para reforar o compartilhamento de crenas e o fortalecimento

    do esprito de comunidade. Essa comunidade deve se esforar para encorajar a

    cooperao entre suas agncias por meio de medidas que visem a mudana de

    mentalidade. Alm disso, h um consenso de que caractersticas pessoais devem

    ser observadas para selecionar o profissional que participar de uma operao

    interagncias, pois uma pessoa que tenha dificuldade de relacionamento tende a

    dificultar a interao social (SCOTT, 2003).

    A teoria da Poltica Burocrtica mostra que a disputa por poder, atribuies e

    recursos conduzem as agncias governamentais a atuarem de forma no

    colaborativa, ou seja, a cooperao interagncias no uma atividade esperada e

    desejada. Agncias com forte poder conseguem ampliar sua esfera de atuao

    enquanto agncias com pouca estrutura correm o risco de serem dissolvidas.

    Contudo, h caractersticas nessa teoria que favorecem a colaborao

    interagncias. A existncia de um poder central forte numa operao interagncias

    faz com que as decises sejam adotadas de forma unilateral, contudo a tendncia

    que ocorram sabotagens por parte dos atores envolvidos, que atuaro para defender

    os interesses de suas prprias agncias, comprometendo o resultado final da

    operao. A ausncia de poder central forte d mais flexibilidade e liberdade para o

    compartilhamento de informaes e de recursos de acordo com necessidade de

  • ,0$

    cada agncia envolvida. A busca por espao feita por meio da negociao,

    diminuindo a disputa por poder poltico e o processo decisrio feito por meio de

    algum tipo de votao, na qual os participantes, pelo consenso, encontram uma

    soluo coerente que reflete uma viso coletiva das agncias. A motivao em

    cooperar depende dos objetivos e das tendncias de cada agncia e dos objetivos

    pessoais dos profissionais envolvido na cooperao. Em geral, o profissional

    envolvido tende a proteger a atribuio principal de sua agncia, evitando que as

    outras interfiram nessa tarefa. Assim, a cooperao mais aceita quando os

    interesses da operao so convergentes com os interesses de cada agncia

    participante. Deve-se envolver as agncias na soluo dos problemas e nunca

    buscar culpados em caso de eventuais falhas. A disputa por recursos entre duas

    agncias com atribuies similares uma das dificuldades do trabalho interagncias

    num ambiente burocrtico. O resultado final a perda de poder e recursos de uma

    em relao a outra ou a cooperao forada entre as agncias, as quais evitam

    relaes devido ao receio de perder poder. Deve haver a compreenso de que

    nenhuma agncia tem os recursos necessrios para atender com qualidade todos

    seus objetivos da operao, fazendo da cooperao uma soluo vivel (SCOTT,

    2003).

    Considerando que a operao interagncias provoca uma alterao

    importante na rotina de trabalho de uma agncia, a teoria das organizaes ensina

    que a questo da mudana organizacional difcil mesmo em empresas privadas,

    as quais muitas vezes dependem de uma transformao para sobreviver num

    mundo to competitivo. A teoria nos mostra que as agncias de governo no foram

    feitas para mudanas, pois delas se espera confiabilidade e justia e no luta por

    sobrevivncia (ZEGART, 2009).

    Outro ensinamento dessa corrente terica que as barreiras culturais

    internas da organizao dificultam a ocorrncia de mudanas. Esses obstculos so

    os hbitos, os modos de pensar, as rotinas, os valores, as ideias e a identidade

    institucional que os empregados adquirem e passam a defender. A cincia poltica

    auxilia a compreender os obstculos externos existentes para que uma organizao

    realize alteraes que permitam que ela atue num ambiente interagncias. O poder

    poltico interfere nas organizaes limitando a fora dos indivduos que ocupam

    cargos pblicos. Esses indivduos so estimulados a buscar autonomia para suas

    agncias e dificultar interaes, resistindo a qualquer modelo de centralizao e

  • ,1$

    prejudicando as operaes interagncias. Assim, a teoria mostra que as medidas

    necessrias para se implementar mudanas internas numa organizao podem ser

    discursos, manuais de conduta e punies. Externamente, possvel atuar por meio

    da aprovao de leis que regulem a atuao das agncias (ZEGART, 2009).

    As organizaes tm dificuldades para mudar por elas mesmas. Quanto mais

    fragmentada uma organizao em estruturas especializadas, mais dificuldade h

    para a comunicao. Os diversos empregados desconhecem as atividades

    desempenhadas pelos outros e mesmo os dirigentes tm dificuldades de

    acompanhar todo o trabalho executado. Quanto mais estruturas, regras e

    tecnologias aplicadas para a busca de eficincia, mais difcil para ocorrer

    mudanas organizacionais. O tempo outro fator que dificulta a mudana, pois

    quanto mais tempo um empregado permanece na organizao mais ele resiste s

    mudanas. Ele se habitua s normas, aos relacionamentos pessoais e aos

    comportamentos e faz com que os novos integrantes aceitem e aprendam essas

    rotinas. Essa situao favorvel para dar esprito de corpo organizao por meio

    de uma cultura prpria de como fazer as coisas, mas tambm serve de barreira s

    mudanas que so necessrias para se atuar numa operao interagncias

    (ZEGART, 2009).

    3.3 FATORES DE SUCESSO

    Os fatores de sucesso da operao interagncias esto ligados a aspectos

    objetivos e subjetivos. Os objetivos incluem acordos formais, nmero de pessoas,

    oramento, equipamento e espao fsico destinado iniciativa interagncias. Os

    subjetivos dizem respeito s espectativas positivas, s crenas e confiana mtua

    dos profissionais. O sucesso de uma operao interagncias depende ainda da

    estruturao de um sistema operacional, da obteno de consenso nos objetivos da

    atividade conjunta, da criao de uma efetiva cultura de relacionamento profissional

    interpessoal e da correta seleo dos dirigentes da atividade interagncias, os quais

    devem possuir caractersticas pessoais como capacidade de improvisao,

    adaptao e liderana, alm de habilidade para compreender a natureza da

    colaborao (BARDACH, 1998)

    Toda operao interagncias tem a capacidade de gerar reorganizaes

    institucionais na admininstrao pblica devido s novas dinmicas que so

  • ,2$

    desenvolvidas com potencial de criar um novo sistema. Essa possibilidade se torna

    uma ameaa devido possibilidade de que a agncia possa perder status no

    contexto do Estado, o que gera um protecionismo organizacional que se concretiza

    numa resistncia em colaborar. As agncias tm a percepo de que se protegerem

    suas atribuies funcionais podero manter seu valor pblico, o qual entendido

    como sendo o prestgio do rgo perante a sociedade e o Estado. Assim, elas tm

    averso ao risco de perder atribuies e, por isso, temem que a operao

    interagncias possa alterar o status de sua competncia legal peculiar. Caso a

    colaborao seja efetiva, uma agncia com uma atribuio muito especfica pode

    perder sua razo de existir e ser extinta. Em regra, as agncias menores tm mais

    temor de que isso ocorra, mas elas tambm se sentem atradas por poderem fazer

    parte de coalizes importantes. Quando uma atribuio especfica de uma

    agncia, nenhuma outra tem essa misso. Assim, se essa agncia no fizer seu

    trabalho, mesmo assim nenhuma outra o far. Como a misso importante para a

    sociedade, a agncia deve execut-la sem permitir que uma colaborao

    interagncias supra essa deficincia e ameace a sua existncia. As lideranas das

    agncias sempre buscam incrementar o valor pblico de seus rgos. Elas tm um

    papel importante na operao interagncias e suas agncias sero mais ou menos

    participativas quanto maior ou menor for a percepo que os lderes tiverem de que

    seus interesses e desejos sero atendidos (BARDACH, 1998).

    Os profissionais que participam das operaes interagncias buscam

    defender a competncia legal de suas agncias, as quais so responsveis por

    justificar o valor de sua instituio perante a sociedade. Mas o real interesse desse

    profissional proteger sua prpria carreira. Um cargo da administrao pblica

    deveria ser um instrumento neutro da burocracia para servir ao Estado, mas ele

    tende a ser influenciado por interesses individuais como estabilidade, prestgio,

    remunerao, poder, em suma, uma busca por oportunidade de dar um carter

    essencial para aquele trabalho. A operao interagncias pode afetar a segurana

    funcional e salarial de uma carreira, pois ela tem como premissa eliminar

    redundncias, podendo provocar uma reestruturao funcional com perda de

    atribuies em determinados cargos e a consequente possvel perda salarial. Em

    contrapartida, h casos em que o profissional perde o entusiamo com sua carreira

    com o tempo de servio, pois apesar de continuar acreditando na misso, na

    competncia, nas boas intenes de suas agncias, ele se cansa das limitaes

  • -3$

    polticas, das aes e das defesas de causas pessoais. Assim, esse profissional se

    sente atrado pelos incentivos que podem ser dados s iniciativas interagncias pelo

    setor poltico e pelo prprio ambiente interagncias, pois nele no h uma rotina

    burocrtica nem hierarquia, as tarefas so complexas, h um forte sentimento de

    cumprimento da misso, uma sensao de poder reinventar o sistema, uma maior

    autonomia e maior esprito de colaborao. As melhores ideias so interdisciplinares

    e interfuncionais. H tambm o oferecimento de oportunidades para profissionais

    com habilidades em cooperao e com confiabilidade para atuar em aes

    descentralizadas (BARDACH, 1998).

    As dificuldades de se formar um efetivo sistema de colaborao interagncias

    podem ser superadas com o estabelecimento de uma cultura de confiana e um

    ambiente pragmtico para a formao de um consenso. Contudo, confiana e

    consenso no so objetivos fceis de se atingir, eles demandam tempo, esforo,

    habilidade e pessoas interessadas em construir relaes prximas e efetivas. A

    natureza humana favorvel reciprocidade e a ligao confivel entre pessoas

    que trabalham juntas rotineiramente. Com o tempo, as pessoas conhecem as

    afinidades e buscam increment-las para aumentar a confiana. O trabalho em

    foras tarefas interagncias comea com um sentimento de incerteza, mas o

    conhecimento pessoal e a compreenso do papel de cada agncia faz com que se

    crie um verdadeiro esprito de grupo. Quando uma equipe tem um resultado coletivo,

    os profissionais se sentem mais ligados uns aos outros e ao grupo (BARDACH,

    1998).

    Para alcanar o valor pblico, importante haver especializao e

    diferenciao. A especializao diviso da tarefa em subunidades que devem ser

    integradas por unidades responsveis por isso. Essas unidades devem se pautar

    pela diferenciao funcional, pela coordenao hierrquica e pelos relacionamentos

    pessoais informais (BARDACH, 1998). A operao interagncias tem mais chance

    de prosperar quando os objetivos das agncias participantes no so alcanados de

    forma independente, no so mutuamente exclusivos e quando no restringida por

    protecionismos organizacionais ou por restries operacionais (SCOTT, 2003). A

    questo da competncia funcional de cada agncia o aspecto mais importante

    quando se discute uma operao interagncias, pois significa a razo de ser de

    cada agncia. dela que deriva o oramento e, por isso, protegida com muito

    zelo. Se as agncias competem pelo mesmo nicho funcional, lcito supor que elas

  • -+$

    podem desconfiar mutuamente das motivaes em cooperar no ambiente

    interagncias e esconder informaes relevantes para o trabalho. H risco de perda

    de valor pblico na operao interagncias quando h mais de uma agncia com

    atribuies legais iguais. Nessa situao, elas tendem a competir e,