A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

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JOSÉ GUILHERME CARVALHO DA SILVA A Integração Sul-americana e o Brasil: o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA BELÉM – PARÁ 2004

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Monografia apresentada por José Guilherme Carvalho da Silva ao Curso Internacional de Formação de Especialistas em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas – FIPAM XVIII, do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA, como requisito para obtenção do título de especialista, orientado pela Profª. Drª. Edna Castro.

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JOSÉ GUILHERME CARVALHO DA SILVA

A Integração Sul-americana e o Brasil: o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

BELÉM – PARÁ 2004

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JOSÉ GUILHERME CARVALHO DA SILVA

A Integração Sul-americana e o Brasil: o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

Monografia apresentada por José Guilherme Carvalho da Silva ao Curso Internacional de Formação de Especialistas em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas – FIPAM XVIII, do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA, como requisito para obtenção do título de especialista, orientado pela Profª. Drª. Edna Castro.

BELÉM – PARÁ 2004

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JOSÉ GUILHERME CARVALHO DA SILVA

A Integração Sul-americana e o Brasil: o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

Banca examinadora da Monografia

Profª. Drª. Edna Castro – Orientadora

Prof. Dr. Thomas Hurtienne

Prof. Dr. Manoel Dutra – Examinador externo

BELÉM – PARÁ 2004

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Aos meus pais, Manoel e Fátima, que não tiveram a oportunidade ainda em vida de dividir comigo esse momento de grande alegria. À minha amada esposa Regina e aos meus amados filhos Alexandre e Lucas. Às minhas irmãs Leila, Lúcia, Lucilene e Lília Ao Pe. João Beuckenboon, homem digno e comprometido com a justiça social. Às minhas professoras de primário Maria e Oliveti, com quem comecei essa longa caminhada. Aos meus colegas da FASE-Pará.

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AGRADECIMENTOS Este trabalho monográfico foi possível em grande parte por conta do inestimável apoio e companheirismo das seguintes pessoas: • Profª. Edna Castro que, apesar da sua agenda movimentada, aceitou com a

maior boa vontade orientar-me na produção desta monografia; • Meus grandes amigos Carlinho e Letícia, pelo incentivo à especialização; • Os amigos João Batista, Selma, Raoni e Ramon pelas alegrias dos finais de

semana; • Nanani, Lílian Leitão, Elen, Iane, Walena, Cléa e demais colegas do FIPAM

XVIII • Os colegas da Coordenação da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras

Multilaterais; • Membros do Fórum da Amazônia Oriental – FAOR; • Colegas da FASE-Nacional; • Luciano Brito, pela ajuda com os mapas.

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O ser de uma coisa finita é trazer em si o germe de sua contradição. A hora do seu nascimento é também a hora de sua morte. (Hegel)

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SUMÁRIO DEDICATÓRIA

AGRADECIMENTOS

EPÍGRAFE

LISTA DE SIGLAS

1. INTRODUÇÃO 01

2. INTEGRAÇÃO: DIFERENTES PERSPECTIVAS EM DEBATE 04

3. INTEGRAÇÃO DA INFRA-ESTRUTURA FÍSICA: A GRANDE

ESTRATÉGIA DO MOMENTO

21

4. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A ATUAÇÃO DO BRASIL

NO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO REGIONAL DA AMÉRICA

DO SUL

38

5. NOTAS CONCLUSIVAS 57

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 63

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LISTA DE SIGLAS ALCA - Área de Livre Comércio das Américas

AMI – Acordo Multilateral de Investimentos

BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD - Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Banco Mundial)

BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CAF - Corporação Andina de Fomento

CAN – Comunidade Andina das Nações

CCT – Comitê de Coordenação Técnica

CDE – Comitê de Direção Executiva

CEPAL – Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe

ENID - Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento

FAOR – Fórum da Amazônia Oriental

FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional

FONPLATA – Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata

GTE – Grupos Técnicos Temáticos

IFMs - Instituições Financeiras Multilaterais

IIRSA - Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura da América do Sul

NAFTA - Acordo de Livre Comércio da América do Norte

OCDE – Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico

OEA – Organização dos Estados Americanos

OLAS - Organização Latino-Americana de Solidariedade

OMC - Organização Mundial do Comércio

ONGs – Organizações Não Governamentais

PL – Projeto de Lei

PPA - Plano Plurianual

PPP – Plano Puebla-Panamá

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LISTA DE QUADROS E FIGURAS Quadros

Quadro 1: Processos setoriais integrantes da IIRSA p. 29

Quadro 2: Investimentos previstos para Roraima p. 35

Quadro 3: Investimentos previstos para o setor de transporte rodoviário na

Amazônia brasileira

p. 52

Quadro 4: Investimento previstos para o setor de comunicações na Pan-

Amazônia

p. 54

Figuras

Figura 1: As “barreiras” territoriais sul-americanas p. 23

Figura 2: Acesso aos recursos naturais sul-americanos p. 31

Figura 3: Eixo Multimodal do Amazonas p. 32

Figura 4: Eixo Peru – Brasil – Bolívia p. 33

Figura 5: Investimentos no trecho Boa Vista (Brasil) – Georgetown (Guiana) p. 34

Figura 6: Eixo Venezuela – Brasil – Guiana – Suriname p. 36

Figura 7: Integração das Bacias do Prata e Amazônica p. 51

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Introdução Este trabalho tem como principal objetivo refletir sobre o significado da Iniciativa para

a Integração da Infra-estrutura da América do Sul – IIRSA nesta parte do continente

americano, destacando o papel desempenhado pelo Brasil na implementação dessa estratégia.

Diferentemente do que afirmam alguns estudiosos do processo de globalização

capitalista, que defendem o ponto de vista de que os Estados Nacionais encontram-se à mercê

do capital financeiro, das empresas multinacionais e de organismos multilaterais, os

argumentos expostos ao longo desse estudo buscarão evidenciar que os Estados não sofrem do

mesmo modo ou grau de magnitude as conseqüências dessa globalização.

No caso da IIRSA, em particular, o argumento principal é de que o Estado brasileiro1

através da sua política externa, da ação de instituições como o Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, das negociações comerciais firmadas até o

momento com os países vizinhos, entre outras ações, tenta garantir sua hegemonia nesse

processo. Por conseguinte, afirma-se de modo claro que tal estratégia beneficia

fundamentalmente os segmentos inseridos e capazes de fazer a disputa no mercado

internacional.

Se no plano externo a IIRSA tem sido um dos pilares da atuação do Estado brasileiro,

no plano interno a implementação dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento –

ENID constituiu-se na principal diretriz do desenvolvimento econômico do país. Porém, com

uma perspectiva internacional desde o seu nascedouro, conforme será mostrado no decorrer

do trabalho.

Durante a leitura desse trabalho notar-se-á uma ausência que merece ser explicada,

pois diz respeito à falta de qualquer referência ao Mercado Comum do Cone Sul – Mercosul.

Ora, como falar de integração regional sem tratar de uma experiência dessa magnitude na

América do Sul? Ocorre que, enquanto há disponibilidade de uma vasta produção científica

acerca desse assunto, seja na forma de publicações ou mesmo na internet, pouco ou quase

1 Neste trabalho, a expressão “Estado brasileiro” está associada à teoria ampliada de Estado elaborada pelo socialista italiano Antonio Gramsci que, ao abordar a questão do Estado num de seus escritos, afirmou: “Eu amplio muito a noção de intelectual e não me limito à noção corrente, que se refere aos grandes intelectuais. Esse estudo leva também a certas determinações do conceito de Estado, que habitualmente é entendido como sociedade política - ou ditadura, ou aparelho coercitivo para adequar a massa popular a um certo tipo de produção e à economia de um dado momento); e não como um equilíbrio entre sociedade política e sociedade civil (ou hegemonia de um grupo social sobre a inteira sociedade nacional, exercida através de organizações ditas privadas, como a Igreja, os sindicatos, as escolas, etc.)” (GRAMSCI apud COUTINHO, 1981, p. 91). Por conseguinte, “Estado brasileiro” busca expressar a aliança estratégica atualmente existente entre o “Estado em sentido estrito” (ibidem), grupos e organizações sociais nacionais e/ou associados ao grande capital internacional para garantir a integração sul-americana, tendo como ponto de partida a IIRSA.

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nada há relacionando a implementação da IIRSA com seu rebatimento sobre a Amazônia

brasileira – ou ainda a Pan-Amazônia2.

O entendimento do significado da IIRSA e do papel desempenhado pelo Brasil nesse

processo, não pode secundarizar a reflexão sobre a (Pan)Amazônia, posto que ela tem

importância estratégica para esse processo de integração regional, perseguido pelo Brasil e

seus vizinhos.

Essa dificuldade de encontrar estudos relacionando a IIRSA com a Amazônia resultou

obviamente em enormes obstáculos para a coleta e sistematização de informações. Entretanto,

também representou um grande desafio intelectual para a continuidade do estudo em questão.

Um alerta também deve ser feito quanto a análise da atuação dos diferentes atores

sociais – os das sociedades civis nacionais, em especial -, que buscam interferir nas

negociações em andamento. Mesmo considerando a relevância e a pertinência dessa reflexão,

decidiu-se por desenvolvê-la em estudos posteriores, posto que não havia como realizá-la de

forma satisfatória, dado os limites de tempo, principalmente. O mestrado permitirá maior

aprofundamento de diversos aspectos do tema em questão nesta monografia.

O motivo da escolha do tema acerca da integração regional remonta o ano de 1987,

quando o Banco Interamericano de Desenvolvimento ameaçou cancelar o financiamento do

Projeto de Macrodrenagem da Bacia do Una3. Diante dessa situação, uma comissão de

moradores das Sub-bacias 2 e 3 (Canais da Visconde de Inhaúma e Pirajá) - da qual o autor

deste trabalho fazia parte – mais uma técnica da Federação de Órgãos para Assistência Social

e Educacional – FASE-Pará, dirigiram-se a Brasília para tratar do problema através de

reuniões com os representantes do BID no Brasil, com membros da Secretaria de Assuntos

Internacionais do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e com parlamentares da

bancada federal paraense. Essas reuniões foram intermediadas pela Rede Brasil sobre

Instituições Financeiras Multilaterais, uma Organização Não Governamental que, entre outras

atividades, monitora os acordos firmados pelo governo brasileiro com os bancos multilaterais.

2 A abordagem sobre o Mercosul é bem diversa, envolvendo temas como políticas educacionais, tributárias e fiscais, as mudanças nas legislações nacionais referentes aos direitos trabalhistas e previdenciários, reforma do Estado e outros. Entre as publicações disponíveis pode-se encontrar ADVOGADRO, Enrique Guillermo. Brasil Argentina: o Processo de Integração do Mercosul. Ed. Topbooks, 1997; BAUMAM, J. C. Lerda. Brasil-Argentina-Uruguai: A Integração em Debate. Ed. Marco Zero, 1987; CHIARELLI, Carlos Alberto Gomes & SIENRA, Jorge (orgs.). Educação em um Processo de Integração: o Caso Mercosul. Ed. LTR, 2001; MEIRELES, José Ricardo. Impostos Indiretos no Mercosul e Integração. Ed. LTR, 2000. 3 Belém é recortada por bacias hidrográficas, cada qual constituída por vários igarapés – nome dado aos braços de rios – que, influenciados pelas marés, alagam permanentemente uma grande faixa de terras da capital, ocupada desordenadamente por milhares de famílias há muitos anos. Nesses locais, denominados baixadas, o saneamento básico é precário. A Bacia do Una é a maior de todas, abarcando cerca de 3,664 ha, quase metade da parte continental do município.

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A partir de então, os temas relacionados à atuação das IFMs no Brasil passaram a fazer

parte da agenda de debates e de intervenção, não somente de algumas organizações

comunitárias da Bacia do Una, como também, da FASE e, posteriormente, do Fórum da

Amazônia Oriental (rede que articula diferentes entidades dessa parte da Amazônia).

De 1988 até hoje já foram realizados seis encontros estaduais da Rede Brasil no Pará,

divulgados artigos e lançadas publicações tratando das políticas das IFMs para o Brasil e para

a Amazônia, em especial.

Atualmente a Rede Brasil constituiu o Grupo de Trabalho Infra-estrutura que integra

uma articulação de organizações não governamentais – ONGs e movimentos sociais sul-

americanos, que trata especificamente da IIRSA, da qual o autor deste trabalho é membro.

Esta monografia portanto, é fruto de uma experiência de vida no interior dos

movimentos sociais, tratando de políticas e projetos que contam com a participação efetiva

das IFMs no Brasil e em outros países; de outro, é fruto também de uma inquietação teórica

quanto ao lugar da Amazônia nesse processo de integração regional.

A monografia está baseada fundamentalmente em dados secundários. A multiplicidade

de fontes consultadas - relatórios, documentos, textos de ativistas, sítios na internet e outras,

elaborados por instituições financeiras, governo brasileiro, ongs e pesquisadores -, exigiu um

enorme esforço de análise do material coletado, que resultou no produto aqui apresentado.

Por fim, é necessário dizer o modo como está estruturado este trabalho: o primeiro

capítulo apresenta de forma sintética alguns dos diferentes pressupostos teóricos acerca do

papel do Estado, do significado da globalização e sua relação com a integração regional. O

segundo, busca explicar o significado da IIRSA e a sua relação com as políticas de reformas

estruturais no âmbito daquilo que instituições como o Banco Interamericano de

Desenvolvimento - BID denominam de o novo regionalismo. O terceiro, analisa o papel

desempenhado pelo Brasil no processo de implementação da IIRSA. Em seguida, são

apresentadas as conclusões a que se chegou até o momento.

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I. Integração: diferentes perspectivas em debate

A perspectiva integracionista no nosso continente remonta à época pós-colonial,

quando surgiram as primeiras manifestações no sentido de construir a unidade entre as nações

recém-independentes. A integração defendida nesse período tinha caráter eminentemente

político-militar (MACHADO, [200-?]). José G. Artigas e Simón Bolivar, alguns dos líderes

de vários processos independentistas no continente, estão entre os maiores defensores da

integração latino-americana. Bolívar, em particular, defendia um tipo de integração

denominada hispanoamericanismo, pois "tenia como objetivo la formación de uma nación

única, soberana y libre" como "alternativa al proyecto estadounidense panamericanista"

(MACHADO, [200-?]). O hispanoamericanismo de Bolívar defendia a construção de um

sistema de cooperação entre as nações latino-americanas – fundamentalmente as de origem

hispânica -, que as protegessem não somente das tentativas européias de constituir

movimentos de restauração da ordem colonial no continente, como também, dos Estados

Unidos e sua Doutrina Monroe4.

Em 1815, Bolívar lançou a idéia da constituição de uma Confederação Americana.

Porém, somente em 1826, após intensas negociações, conseguiu realizar o Congresso do

Panamá5, que "tuvo como antecedente un intento de reunión en la Asamblea Nacional

Constituyente de la América Central que por decreto del 6 de noviembre de 1823, acordaba

convocar a una Confederación General de toda América" (MACHADO, [200-?]).

Boa parte das jovens nações vivenciava problemas internos da maior gravidade para a

consolidação da sua independência das metrópoles e, muitas vezes, os conflitos entre aquelas

dificultavam ainda mais as tentativas de integrá-las política e militarmente. Por outro lado, os

Estados Unidos se mostraram desde o início indispostos a apoiar qualquer tentativa que se

4 No início do século XIX o continente americano vivenciava intensa agitação política nas colônias por sua independência dos impérios espanhol e português. Foi nesse período que o Congresso dos Estados Unidos debateu e aprovou em 1823 um documento que definia a política daquele país em relação aos seus vizinhos e as nações de outras partes do mundo: a Doutrina Monroe (por conta de James Monroe, presidente dos EUA de 1817-1825). Criada para se contrapor às tentativas de recolonização forçada do Novo Mundo, essa doutrina serviu posteriormente para justificar toda e qualquer intervenção norte-americana nos assuntos internos das nações do continente quando considerassem que seus interesses estavam sendo prejudicados. Em linhas gerais, a Doutrina Monroe está baseada nos seguintes princípios: a) o continente americano não pode ser objeto de recolonização; b) é inadimissível a intervenção de qualquer país europeu nos negócios internos de países americanos, e; c) os Estados Unidos, em troca, se absterão de intervir nos negócios pertinentes aos países europeus. O lema que sintetiza os princípios dessa doutrina é “América para os Americanos”, mas o correto seria dizer “América para os Estados Unidos contra os interesses das nações de outros continentes”.

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aproximasse das teses de Bolívar. Ao contrário disso, os sucessivos governos estadunidenses

adotaram postura agressiva de defesa dos seus interesses na região, sendo a Doutrina Monroe

a expressão maior dessa política.

O termo panamericanismo surgiu na imprensa estadunidense em 1889 por ocasião da

Primeira Conferência Panamericana, ocorrida em Washington. A realização desta Conferência

"configura un evento fundacional de una nueva etapa em las relaciones internacionales de los

estados independientes de América" (MACHADO, [200-?]). Segundo Machado, esta nova

etapa é marcada pelo protagonismo da política exterior dos Estados Unidos, em detrimento

das teses bolivarianas, fato facilmente comprovável se tomarmos como base os resultados das

diversas conferências ocorridas no século XX.

A I Conferência Panamericana foi marcada por conflitos em relação à proposta dos

Estados Unidos de integração do continente. É interessante abordar, mesmo que brevemente,

alguns dos fatos ocorridos nesse evento posto que, de uma forma ou de outra, alguns dos

conflitos ali explicitados ainda se encontram presentes atualmente nas negociações para a

constituição da Área de Livre Comércio das Américas - ALCA.

Em 1881, o secretário de Estado norte-americano James Gilespie Blayne apresentou a

proposta da conformação de uma união aduaneira6, a fim de melhorar as comunicações e os

fluxos comerciais entre as nações do continente. Com essa proposta buscava-se

fundamentalmente assegurar a prevalência dos interesses dos Estados Unidos sobre os seus

competidores europeus e, conseqüentemente, consolidar a hegemonia desse país na região.

Todavia, o assassinato do presidente James Garfield, ainda em 1881, contribuiu para que a

proposta de Blayne não tivesse seqüência (ESCUDÉ at al, 2000).

1889 é o ano do retorno de Blayne ao Departamento de Estado e é também o momento

da realização da I Conferência Panamericana, demonstrando a afirmação da estratégia

encabeçada por Blayne enquanto política do governo estadunidense para a América que, por

sua vez, baseava-se na Doutrina Monroe. O projeto do chefe do Departamento de Estado

retomou a proposta de 1881 que visava:

5 Brasil e Estados Unidos foram convidados por Bolívar para participar do Congresso do Panamá, mas não se fizeram presentes (MACHADO, [200-?]). 6 Atualmente “a Zona de Livre Comércio é o estabelecimento, pela via de tratados internacionais, da livre circulação das mercadorias sem barreiras ou restrições quantitativas ou aduaneiras, conservando os Estados integrantes total liberdade nas relações com terceiros países, inclusive com matérias relacionadas com importação e exportação. A União Aduaneira é um passo além da zona de livre comércio cujo elemento característico da livre circulação de mercadorias incorpora, completando-o com a adoção de uma tarifa aduaneira comum (...)”. Ver http://www.plannersbrasil.com.br/mercosul/prof_maria2.html

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crear una unión aduanera que facilitara el comercio entre las naciones del hemisferio y dejara a los europeos en posición de inferioridad. Para lograr este objetivo, la delegación norteamericana presentaria un conjunto de propuestas buscando establecer pesos y medidas comunes, una unidad monetaria común, un mecanismo judicial para resolver conflictos, una red de transporte y la creación de una oficina central que recolectaría e distribuiría información de interés para todos los miembros americanos (ESCUDÉ at al, 2000)

Ocorre que a proposta norte-americana encontrou feroz resistência da Argentina – dos

portenhos, em particular. Isto porque o comércio exterior daquele país tinha fortes

vinculações com a Europa, sem falar nas relações culturais que marcaram profundamente os

referenciais de sociedade das suas elites. Portanto, a perspectiva panamericanista dos Estados

Unidos passou a ser vista como uma ameaça aos interesses dos segmentos que

hegemonizavam o aparelho de Estado argentino.

Roque Sáenz Peña, membro da delegação argentina na Conferência e anos depois

presidente do país, foi um dos mais ferrenhos opositores da união aduaneira proposta pelos

Estados Unidos. Em contraposição à máxima norte-americana da Doutrina Monroe de

“América para os Americanos” Sáenz Peña bradou o lema “América para a Humanidade”,

afirmando que as repúblicas hispanoamericanas necessitavam dos mercados do mundo inteiro

para desenvolverem-se e alcançarem o progresso comercial (ESCUDÉ at al, 2000)7.

Apesar da retórica hispanoamericana, as elites argentinas não jogavam maior peso

para a construção da unidade entre as nações de língua espanhola do continente. Isto porque

viam nas relações econômicas com a Europa a peça-chave para o seu próprio

desenvolvimento. Esse “americanismo argentino” foi expresso, com bastante clareza, nas

reflexões de intelectuais como Juan Bautista Alberdi:

En este sentido, el americanismo alberdiano fue, como el profesado por mucho de los hombres de gobierno de la Argentina embriónica previa a la conformación del Estado Nacional, un americanismo de orientación europeista o inspirado por um vago sentimento hispanoamercanista. Este sentimiento reflejó, por una parte, cierto grado de nostalgia por un ya irreversible pasado virreinal. Por la outra, llevó al estado argentino, tanto en su fase embriónica como en la de estado nacional consolidado, a evadir compromisos permanentes com paises americanos, que pudieran atentar contra la independencia en el margen de acción externo de dicho estado, o contra los lazos económicos, políticos y culturales existentes entre éste y las naciones europeas (ESCUDÉ at al, 2000a)

7 Atualmente uma corrente de pensamento da qual faz parte Reinaldo Gonçalves, professor titular de Economia Internacional da UFRJ, defende mudanças nas diretrizes da política externa brasileira. No que diz respeito à economia, propõe que o enfoque prioritário do Brasil seja o estabelecimento de acordos bilaterais, o “desengajamento gradual” do Mercosul, a rejeição à ALCA, a limitação das relações comerciais com a Argentina, entre outras propostas (GONÇALVES, 2000, 2002).

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7

Diante da não aprovação da sua proposta de união aduaneira durante a I Conferência

Panamericana, em grande parte por conta da renhida resistência argentina, os delegados norte-

americanos partiram para a negociação com os representantes dos demais países, a fim de que

fossem firmados tratados de reciprocidade comercial bilateral ou multilateral, no intuito de

que o aprofundamento desse processo redundasse mais tarde na constituição de uma área de

livre comércio no continente. Os delegados do Brasil, Nicarágua, Venezuela, Colômbia,

México e Estados Unidos firmaram tal proposta. Contudo, Argentina e Chile alegaram que o

mandato da conferência dizia respeito tão somente à aprovação ou não da união aduaneira, o

que excluía a apreciação de qualquer outro tratado (ESCUDÉ at al, 2000).

Os Estados Unidos não conseguiram lograr o seu principal objetivo na conferência.

Porém, isto não significou uma derrota à sua perspectiva estratégica de hegemonia sobre o

continente. Tanto é verdade que em 1892, a coroa britânica temerosa do poder alcançado

pelos norte-americanos e preocupada com a possibilidade de um reordenamento territorial na

América do Sul que atentasse contra a sua hegemonia, fez com que Hugh Wyndhan,

representante britânico no Rio de Janeiro, falasse de planos para “anexar Bolivia a la

Argentina y Uruguay al Brasil” para fazer frente a essa ameaça (ESCUDÉ at al, 2000b).

Infelizmente para as nações européias com forte presença na América, as conferências

panamericanas posteriores refletiram a completa hegemonia dos Estados Unidos na região.

Não é objetivo deste trabalho fazer uma análise exaustiva do que foram tais

conferências. Entretanto, é importante ressaltar que muitas das críticas suscitadas pelas nações

latino-americanas – da Argentina, em particular –, ao sentido do panamericanismo norte-

americano revelaram-se corretas. Nessa perspectiva podemos citar as posições de Argentina e

Brasil contra o plano de arbitragem proposto pelos Estados Unidos, considerado por ambos

um perigo à soberania dos demais países8.

Os posicionamentos de Sáenz Peña que considerava a proposta de união aduaneira um

perigoso instrumento de intervenção dos Estados Unidos na política interna dos demais

países, revelou-se em toda sua crueza nas ações militares norte-americanas no Caribe – Cuba,

8 Hoje em dia, a proposta presente na ALCA (e já implementada pela Área de Livre Comércio da América do Norte – NAFTA) de constituição de um tribunal internacional para atuar acima das legislações nacionais, a fim de dirimir os conflitos entre empresas e Estados nacionais, é foco de repúdio de inúmeros segmentos sociais do continente, que a consideram lesivas aos interesses dos países latino-americanos. Tal proposta também foi discutida no interior da Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, que reúne os principais países industrializados do planeta, entre eles o Brasil - no âmbito do Acordo Multilateral de Investimentos - AMI. Esse acordo só não foi aprovado por conta da forte mobilização social internacional, da Europa, em especial, que fez com que os membros da OCDE recuassem. Todavia, essa discussão foi deslocada para o interior da Organização Mundial do Comércio – OMC, que aguarda o “momento adequado” para colocá-la na pauta dos debates.

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em 1897, por exemplo. Como bem disse ele “la Doctrina Monroe se pronunció contra la

intervención, pero su pronunciamento se hizo com reservas mentales (...) reservando la

intervención norteamericana” (GROUSSAC, TARNASSI apud ESCUDÉ at al, 2000).

A perspicácia de Sáenz Peña também pode ser constatada na crítica que desenvolveu à

política tarifária dos Estados Unidos. De acordo com ele, a proposta de reciprocidade

comercial apresentada pela delegação daquele país na I Conferência não assegurava a redução

das tarifas, mas serviria, isto sim, como mecanismo de represália norte-americana contra os

países que porventura entrassem em colisão com os interesses estadunidenses.9

A consolidação da hegemonia dos Estados Unidos e da sua perspectiva integracionista

no continente caminhou lado a lado com diferentes iniciativas, que visavam romper de

alguma forma com o modelo panamericanista de Washington, como as conferências

promovidas pela Organização Latino-Americana de Solidariedade - OLAS, encabeçada por

Cuba e diversos grupos de esquerda da Ásia, África e América Latina - que deu origem à

Tricontinental.

A integração buscada pela OLAS tinha como principal objetivo "unir, coordinar e

impulsar la lucha contra el imperialismo norteamericano por parte de todos los pueblos

explotados de América Latina" (MACHADO, [200-?]). Tal integração possuía caráter

eminentemente político, pois visava a constituição de movimentos revolucionários nos

diversos países contra o sistema capitalista. Entretanto, durante as décadas de 60 e 70, com o

assalto ao poder por parte de regimes autoritários de direita em boa parte dos países latino-

americanos, resultaram no definhamento da OLAS e dos grupos que a integram.

Os anos 70 são profundamente marcados, entre outras coisas, por dois fatos

significativos: o fim do regime cambial baseado na paridade ouro-dólar e a crise econômica

mundial, com a conseqüente explosão das dívidas externas dos países em desenvolvimento.

Segundo Fiori (2001, p. 64), a globalização não é um “fenômeno exclusivamente econômico,

nem muito menos tecnológico”, porém, mesmo no campo estritamente econômico, diz ele,

sua especificidade se dá justamente com o fim do regime cambial dos anos 70. Ou seja o

“carro-chefe” da globalização se deu no mundo das finanças e alcançou sua “máxima

intensidade e extensão nos anos 80, quando se pode falar, efetivamente, de um mercado

9 Tal crítica poderia ser estendida aos dias de hoje, bastando para isso acompanhar as medidas protecionistas do governo dos Estados Unidos para preservar setores pouco competitivos internacionalmente, como o siderúrgico, por exemplo, do qual as sobretaxas são um dos principais mecanismos para penalizar as exportações de países como o Brasil. Por outro lado, as tarifas também são utilizadas como instrumento de barganha para garantir o apoio de vários governos às iniciativas estadunidenses, principalmente nesse momento histórico em que o

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global e desregulado de capitais em atividade 24 horas por dia” (ibidem). Em que pese na

esfera manufatureira não existirem nem um mercado, nem uma produção “verdadeiramente

globais”.10

De acordo com Fiori (2001a, p. 196) os anos 70 representam um profundo corte nos

planos geopolítico, geoeconômico e no cultural. É o início “dessa etapa de transformações que

leva o apelido de globalização”; um novo período de afirmação do poder dos Estados Unidos

em escala global:

A construção daquele mercado financeiro mundial foi alvo do poder e de decisões políticas e teve conseqüências que vão muito além da própria economia. Começou com a decisão do governo americano, no início dos anos 70, de suspender a convertibilidade e desvalorizar sua moeda, rompendo as regras estabelecidas em Breton Woods, depois da 2ª Guerra Mundial. Só se consolidou como projeto global a partir das políticas de liberalização e desregulação dos mercados financeiros nacionais promovidas ativamente, durante toda a década de 80, pelos governos conservadores de Ronald Reagan e Margareth Thatcher. A partir dali, o poder estrutural das finanças anglo-saxônicas impôs aos demais países desenvolvidos as mesmas políticas desregulacionistas, sob pena de assistirem a uma fuga massiva de capitais em direção a Wall Street e à City. Foi o que se chamou de “processo de desregulamentação competitiva”, movido pelo poder das “altas finanças” e por uma renovada crença, quase religiosa, nas virtudes dos mercados auto-regulados (FIORI, 2001, p. 64-65)

A redemocratização política dos países latino-americanos ocorrida de modo

generalizado a partir da década de 80, esteve vinculada desde o seu início a esse processo

mais amplo de reformas estruturais em vista da abertura dos mercados dos países em

desenvolvimento, da flexilbilização das suas legislações trabalhista e previdenciária, da

criação de mecanismos para o favorecimento da livre circulação do capital financeiro, da

privatização indiscriminada de empresas públicas e da integração econômica entre diferentes

países:

Baseados no princípio do livre comércio, começaram a se multiplicar os acordos de cooperação e complementação econômica, inicialmente entre dois ou três países e posteriormente entre um grupo maior, fazendo surgir blocos regionais de comércio, como eram mais conhecidos. A integração natural, vinda da aproximação entre vizinhos contíguos, foi sendo aceita como um componente facilitador do processo integracionista na Europa e nos Estados Unidos quanto na América Latina, representando para esta última região

combate ao terrorismo é a mola-mestra da política externa desse país. Nesse caso, o ingresso ou não no mercado norte-americano é uma das armas utilizadas para “conquistar” os apoios necessários. 10 Fiori é um crítico do uso indiscriminado do termo “globalização” que, segundo ele, “mesmo no espaço acadêmico se propõe designar, diagnosticar e explicar, ao mesmo tempo, todas as transformações mundiais dos últimos vinte e cinco anos do século XX”. (FIORI, 2001, p. 63)

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10

uma possibilidade de acesso aos cobiçados mercados dos países industrializados e também uma perspectiva de desenvolvimento (BEÇAK, 2000, p. 15)11

Diversos autores se debruçaram sobre a problemática da integração econômica para

mostrar que ela contribui para a superação de obstáculos entre os mercados (TINBERGEN,

HOFFMAN apud BEÇAK, 2000, p. 16), e sua capacidade de provocar a destruição de

barreiras sociais (MYRDAL, KINDLEBERGER apud BEÇAK, 2000, p. 16), portanto, dentro

dos marcos do sistema capitalista. Outros autores, porém, identificam o atual processo de

integração como a mais nova modalidade de dominação dos países desenvolvidos e de suas

empresas sobre as nações pobres. Uma das questões centrais desse debate diz respeito ao

papel do Estado-Nação nesse momento histórico.

Voltando um pouco no tempo nos deparamos com a interessante produção de Barnet e

Müller (1974) sobre o perfil dos gerentes mundiais, os quais, segundo os autores, a lealdade

empresarial está acima da lealdade nacional. De acordo com os autores, os administradores

mundiais são homens que, pela primeira vez na história, podem, efetivamente, administrar o

mundo como uma unidade integrada, posto que "possuem a organização, tecnologia, recursos

e a ideologia" para tanto (1974, p. 13). A empresa global é considerada "a primeira instituição

na história humana dedicada ao planejamento centralizado em escala mundial" (ibidem, p.

14), o que dá a ela enorme capacidade de decidir, de forma racional e eficaz, sobre

investimentos, sem as amarras e limitações a que estão submetidos os Estados nacionais:

A ascensão da empresa planetária está produzindo uma revolução organizacional tão profunda em suas implicações para o homem moderno como a Revolução Industrial e a ascensão da própria nação-estado (...) os estrategistas empresariais gostam de observar que, como o Papa, não possuem divisões em seu comando. As fontes de seu extraordinário poder, no entanto, são encontradas em toda parte - no poder de transformar a economia política e mundial e, ao fazê-lo, de transformar o papel histórico da nação-estado (BARNET, MÜLLER, 1974, p. 15)

Nessa perspectiva, portanto, os Estados-Nação são vistos pelos administradores

globais como obstáculos à expansão das forças do mercado; as fronteiras e as legislações

nacionais são consideradas como empecilho à nova etapa do sistema capitalista, cabendo às

"empresas mundiais" o papel histórico de transformar radicalmente a realidade, já que o

aspecto revolucionário destas não está relacionado ao tamanho das mesmas, mas à "visão

11 Em que pese o "acesso aos mercados dos países industrializados" por parte dos países em desenvolvimento enfrentar inúmeras formas de barreiras e de protecionismo - como ficou patente na recente reunião da Organização Mundial do Comércio - OMC, ocorrida em Cancun, no México, em 2003 -, a integração econômica continua sendo o carro-chefe das negociações multilaterais.

Page 20: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

11

mundial" que possuem - elemento que, segundo os administradores globais, falta aos Estados

nacionais.

Um dado interessante apresentado por Barnet e Müller diz respeito às críticas que

executivos de algumas das maiores empresas do planeta fazem aos Estados nacionais, como

Carl A. Gerstacker, então presidente da Dow Chemical Company:

Há muito sonho em comprar uma ilha que não pertença a nação alguma e nela construir o Quartel General da Dow, em terreno verdadeiramente neutro, sem obrigações para com qualquer nação ou sociedade. Se estivéssemos localizados em um terreno assim realmente neutro, poderíamos, na verdade, operar nos Estados Unidos como cidadãos americanos, no Japão como japoneses, no Brasil como brasileiros e não, como agora, sermos basicamente governados pelas leis dos Estados Unidos... poderíamos pagar bem a quaisquer nativos nela residentes para que se mudassem para outro lugar (1974, p. 16)

De acordo com o relatório de pesquisas da Adverte Business International de 1967

destinada a seus clientes, a nação-Estado caminha para a morte, posto que não há qualquer

sentido significativo para ela no futuro. Da mesma forma, o referido relatório alerta que “o

mesmo acontecerá às empresas que permanecerem essencialmente nacionais” (BARNET,

MÜLLER, 1974, p. 19).

Há, todavia, depoimentos de executivos, apresentados por Barnet e Müller, que não

acreditam no definhamento do Estado-nação, como o então presidente da Unilever. Este, em

função desse ponto de vista, defendeu que um "papel positivo" deveria ser encontrado para o

Estado-nação, sem no entanto ter especificado qual (1974, p. 21).

A perspectiva da análise de Barnet e Müller é interessante pelo fato de enfatizar o

protagonismo das empresas multinacionais, ou mais especificamente dos seus

“administradores globais”, para a reestruturação da ordem político-econômica mundial; uma

nova ordem capitalista que reconstrói a noção de fronteira entre os países e coloca em xeque a

própria necessidade do Estado-nação. Tomando como base o ideário desses administradores,

pode-se concluir que a integração projetada por eles está relacionada à ação articulada das

empresas multinacionais nos diversos pontos do planeta, e não propriamente à constituição de

blocos econômicos entre diferentes países.

Para outros autores, o conceito de integração precisa passar por uma revisão do seu

embasamento teórico tanto quando se trata de uma economia nacional, quanto de um conjunto

de países (ROLIM, 1994). Segundo Rolim:

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12

a palavra integração aparece na análise econômica com vários sentidos. Ora refere-se à integração entre firmas, ora à integração dentro de uma mesma firma ou de um mesmo setor econômico, ora refere-se à integração entre países na perspectiva do comércio internacional e ainda é integração nacional. Aqui começa uma das fontes de confusão, na medida em que o adjetivo regional é utilizado para caracterizar as tentativas de liberação comercial entre países próximos ou então é utilizado no contexto da integração das diversas regiões que irão compor uma economia nacional (ROLIM, 1994, p. 55 – grifo do autor)

O uso da palavra integração para “indicar a combinação de economias separadas em

grandes regiões econômicas é muito recente”, sendo que somente em 1947 o termo apareceu

pela primeira vez em documentos oficiais (MACHLUP apud ROLIM, 1994, p. 56). Ocorre

que, segundo Rolim, o termo guarda mais divergências do que consenso, posto que o mesmo

pode se referir à noção de processo, como a um “estado final obtido em decorrência desse

processo” (ibidem). Algumas formulações teóricas destacam, por exemplo, que enquanto a

liberação comercial maximiza o bem-estar da sociedade na medida em que permite a livre

circulação de mercadorias e estimula a competitividade, a união aduaneira (uma das formas

que pode assumir a integração), tem efeito limitado sobre esse bem-estar, já que provoca

distorções comerciais entre os países membros da união, e entre estes e os demais. Já a

perspectiva cepalina12 evidenciada nos anos 50, entendia a integração dos países latino-

americanos como um meio de aumentar sua produtividade, ampliar mercados e se defender da

concorrência diante dos países capitalistas mais poderosos.

Bela Belassa, um dos principais expoentes da Teoria da Integração Econômica,

participa desse debate nos anos 50 e 60 a partir de uma abordagem desenvolvimentista. Na

Europa, a questão da integração do continente estava marcada pelas discussões sobre o papel

do Estado nesse processo, “na medida em que o que se advogava era o supranacionalismo,

enfatizado pela integração, opondo-se à força interventora das políticas nacionais” (ROLIM,

1994, p. 60). Todavia, se de um lado Belassa questiona a intervenção estatal nas economias

nacionais européias; por outro, reconhece que no caso dos países subdesenvolvidos o quadro é

completamente diferente, posto que considera ser relevante o papel do Estado para promover

a integração e o desenvolvimento desses países:

No que diz respeito aos países subdesenvolvidos, o crescimento econômico surge como consideração primordial. Os países que seguem os conselhos dos defensores

12 Para Guido Mantega, a CEPAL constituiu-se numa espécie de laboratório para a elaboração e divulgação das idéias de uma corrente de pensamento desenvolvimentista latino-americana a partir da segunda metade dos anos 40 do século passado, que defendia a intervenção do Estado na economia para impulsionar a industrialização dos países da região. A CEPAL tornou-se, então, “o grande bastião da industrialização e de seu planejamento, que iria congregar os principais pensadores dessa nova ideologia”. (MANTEGA, 1995, p.12)

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13

da doutrina do crescimento equilibrado podem procurar a integração econômica a fim de assegurar um mercado suficientemente vasto para o desenvolvimento paralelo de novas indústrias. Ao levar a cabo o programa de industrialização, tornar-se-á importante o aproveitamento de economias de escala, que não são possíveis nos reduzidos mercados nacionais. Alega-se também que o estabelecimento de uma união intensifica o desenvolvimento econômico por meio do aumento do poder de negociação e da redução da vulnerabilidade externa dos países-membros. Finalmente, o interesse crescente pela integração dos países subdesenvolvidos pode atribuir-se em parte ao desejo de imitar o exemplo europeu e aos esforços deliberados para compensar os possíveis efeitos de desvio de trocas comerciais resultantes do Mercado Comum Europeu (BELASSA apud ROLIM, 1994, p. 60-61)

É importante ressaltar que muitos dos argumentos de Belassa sobre o papel do Estado

na integração dos países subdesenvolvidos, guardaram estreita relação com as formulações

cepalinas sobre as estratégias de desenvolvimento para a América Latina, e ainda hoje estão

presentes nas justificativas para a composição do Mercosul, ou mesmo da construção de um

bloco regional envolvendo todos os países sul-americanos, conforme veremos mais adiante.

Atualmente, diferentes autores apresentam abordagens críticas acerca dos processos de

integração econômica, vista por eles enquanto uma forma de dominação dos países ricos

sobre os pobres. Essa é a visão de Bourdieu (2001), que toma como exemplo o processo

envolvendo as economias dos Estados Unidos e do Canadá. Segundo ele, tal integração

deixou o Canadá sem qualquer capacidade de defesa diante da potência americana.

Para alguns dos críticos da integração econômica, tal processo tem resultado no

enfraquecimento dos Estados Nacionais diante do grande capital internacional:

Por sua independência de movimento e irrestrita liberdade para perseguir seus objetivos, as finanças, comércio e indústria de informação globais dependem da fragmentação política - do morcellement (retalhamento) - do cenário mundial. Pode-se dizer que todos têm interesse adquiridos nos "Estados fracos" - isto é, nos Estados que são fracos mas mesmo assim continuam sendo Estados (BAUMAN, 1999, p. 75 – grifo do autor)

Esse mesmo pensamento é defendido por Bourdieu quando afirma que:

(...) As políticas ditas de "ajuste estrutural" visam garantir a integração dentro da subordinação das economias dominadas; isso, reduzindo o papel de todos os mecanismos ditos "artificiais" e "arbitrários" da regulação política da economia associados ao Estado social, única instância capaz de se opor às empresas transnacionais e às instituições financeiras internacionais, em benefício do mercado dito livre, por um conjunto de medidas convergentes de desregulamentação e privatização, tais como a abolição de todas as proteções do mercado doméstico e o relaxamento dos controles impostos aos investimentos estrangeiros (em nome do postulado darwinista segundo o qual a exposição à concorrência tornará as empresas mais eficientes) (BOURDIEU, 2001, p. 107)

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14

Outros problemas são apontados como decorrentes do processo de integração

econômica, como a perda de soberania por parte dos Estados Nacionais (BAUMAN, 1999), o

deslocamento do poder de decisão para as instâncias internacionais que se tornam dessa

maneira "governos invisíveis" (BOURDIEU, 2001; HELD, McGREW, 2001) e a

concentração de capital, de poder e de liberdade de decisão por parte das nações do Primeiro

Mundo e de suas empresas. Essa perda de soberania está relacionada à incapacidade de os

Estados nacionais decidirem sobre questões centrais de interesse dos países, como a de definir

suas próprias diretrizes para o desenvolvimento que se pretende alcançar:

(...) As instâncias internacionais, sem exercer todas as funções geralmente atribuídas aos Estados nacionais (como as que tocam à proteção social), governam de maneira invisível os governos locais que, cada vez mais reduzidos à gestão dos negócios secundários, constituem um véu de ilusão política próprio a mascarar os verdadeiros lugares de decisão (BOURDIEU, 2001, p. 108)

Pensamento semelhante é expresso por Bauman:

O tripé da soberania foi abalado nos três pés. Claro, a perna econômica foi a mais afetada. Já incapazes de se manter se guiados apenas pelos interesses politicamente articulados da população do reino soberano, as nações-estados tornam-se cada vez mais executoras e plenipotenciárias de forças que não esperam controlar politicamente. (...) Os Estados não têm recursos suficientes nem liberdade de manobra para suportar a pressão – pela simples razão de que “alguns minutos bastam para que empresas e até Estados entrem em colapso” (BAUMAN, 1999, p. 73)

De acordo com Baumam, a globalização reduz os Estados nacionais ao cumprimento

de suas necessidades básicas, ou seja, seu poder de repressão. Por conta disso, estes tornam-se

meros instrumentos de garantia da segurança das mega-empresas:

Devido à total e inexorável disseminação das regras de livre mercado e, sobretudo, ao livre movimento do capital e das finanças, a “economia” é progressivamente isentada do controle político; com efeito, o significado primordial do termo ‘economia’ é o de ‘área não política’. O que quer que restou da política, espera-se deve ser tratado pelo Estado, como nos bons velhos tempos – mas o Estado não deve tocar em coisa alguma relacionada à vida econômica: qualquer tentativa nesse sentido enfrentaria imediata e furiosa punição dos mercados mundiais” (BAUMAN, 1999, p. 74)

Já para o norte-americano Petras (1999), a globalização é um "produto de políticas

estatais ligadas a instituições econômicas internacionais". Até aí nada de diferente de outros

autores que ressaltam o papel dos Estados Nacionais nesse processo. Entretanto, o que

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15

diferencia sua análise da de outros é o fato de compreender a globalização como um

"fenômeno cíclico", vinculado a capacidade das "forças capitalistas" de imporem derrotas às

classes trabalhadoras em cada país. Ou seja, o sucesso das forças capitalistas ao impor seus

interesses significa um período de ascensão da globalização. Por outro lado, o revigoramento

de "movimentos revolucionários nacionais e sociais" define um período de declínio. Para

Petras, a luta de classes é um elemento da mais alta importância para a perspectiva de cada

período – se de ascensão ou de declínio:

Em suma, a "globalização" não é um fenômeno novo, como também não é a culminação da história. Historicamente, tem seu ciclo de ascensão, consolidação e decadência. Para compreender a “globalização”, deve-se vê-la como uma conseqüência do processo sociopolítico. Isso requer uma análise de seus agentes sociais (...) (PETRAS, 1999, p. 29)

Para Held e McGrew (2001), os céticos13 destacam em suas formulações as distintas

formas de relação dos Estados nacionais com as dinâmicas do mercado internacional,

diferenciando-se, substancialmente, das premissas de Bourdier e Bauman sobre a submissão

dos Estados às instituições internacionais:

(...) Em vez de conceber os governos nacionais como simplesmente reagindo a forças econômicas externas, a visão dos céticos reconhece seu papel crucial (especialmente o dos mais poderosos) na criação das condições nacionais e internacionais necessárias à própria existência de mercados globais. Vistos por esse prisma, os Estados tanto são arquitetos quanto súditos da economia mundial. Como súditos, porém, os Estados não reagem de maneira idêntica à dinâmica dos mercados mundiais ou dos choques econômicos externos. Embora os mercados financeiros internacionais e a competição internacional possam impor tipos semelhantes de disciplina econômica a todos os governos, isso não prefigura necessariamente uma convergência das estratégias ou políticas econômicas nacionais. Essas pressões são mediadas por estruturas internas e arranjos institucionais que produzem enormes variações na capacidade de reação dos governos nacionais (HELD, McGREW, 2001, p. 58)

Não obstante o caráter diametralmente oposto, presente nas análises dos defensores e

dos críticos do processo de integração econômica sobre as vantagens e os problemas

13 Para Held e McGrew os céticos se caracterizam, entre outras coisas, por conceberem a globalização contemporânea “como uma construção primordialmente ideológica ou mítica de valor explicativo marginal” (HELD, McGREW, 2001, p. 9). Esses autores reconhecem a existência de diversas visões sobre o processo de globalização, e que os “globalistas” e os “céticos” representam apenas algumas dessas interpretações da realidade. Por fim, destacam que “globalistas” e “céticos” apresentados no livro são construções de um tipo ideal, que são “recursos heurísticos que ordenam um campo de investigação e identificam as áreas primárias de consenso e dissenção. Elas ajudam a esclarecer as linhas-mestras de argumentação e, com isso, a esclarecer os pontos de discordâncias fundamentais (...)” (idem. p. 9-10)

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provocados pelo mesmo, um ponto comum parece aproximar ambos os segmentos: a

constituição de blocos regionais e a globalização não devem ser vistas como antagônicas.

De acordo com Held e McGrew (2001, p. 33), os globalistas não compreendem o

regionalismo como uma "barreira à globalização política contemporânea", mas, ao contrário,

"tem sido basicamente compatível com ela". Já para Bauman (1999, p. 77), "a integração e a

divisão, a globalização e a territorialização são processos mutuamente complementares”.

Pensamento semelhante é expresso por Devlin e Esteveordal (2001), membros do Banco

Interamericano de Desenvolvimento - BID, quando afirmam que "las fuerzas centrífugas de la

globalización económica en los años noventa actuaban al mismo tiempo que las fuerzas

centripetas de la regionalización".

Há ainda autores que defendem o ponto de vista de que a constituição de blocos

geoeconômicos regionais representam a estratégia dos Estados Nacionais para inserirem suas

economias em melhores condições na disputa global dos mercados (MAGNOLI, 1997).

Segundo Magnoli, as tendências:

integradoras e globalizadoras da economia contemporânea colocam novos desafios para os Estados Nacionais. A resposta a tais desafios evidencia não uma suposta fraqueza dos Estados mas, pelo contrário, sua força e vitalidade. Exercendo a soberania, o Estado-Nação posiciona-se no interior da economia mundial e escolhe políticas capazes de moldar o próprio processo de globalização (MAGNOLI, 1997, p. 41)

Esse raciocínio é compartilhado pelos céticos (HELD, McGREW, 2001). Para estes a

interdependência econômica não reduz necessariamente a autonomia ou a soberania

nacionais; pelo contrário, pode até mesmo fornecer maiores "oportunidades de crescimento

econômico nacional sustentado" do qual os Tigres Asiáticos são exemplos destacados.

Estamos diante, portanto, de uma perspectiva teórica que aponta os Estados Nacionais

enquanto sujeitos ativos do processo de globalização e reais protagonistas das iniciativas de

integração econômica. Magnoli (1997) chega a afirmar que os Estados podem desfazer a

globalização da mesma forma que a fazem hoje.

O papel dos Estados Nacionais no delineamento da nova ordem mundial é evidenciado

no enfoque dado pelos Estados Unidos à integração econômica do continente americano. De

acordo com a política externa do governo Bush, além dos objetivos comerciais de interesse

das mega-empresas norte-americanas, essa integração também se constitui num dos pilares da

estratégia estadunidense de combate ao terror, portanto, possui um caráter militar da mais alta

relevância àquele país. Ainda mais nos dias de hoje em que a administração Bush implementa

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17

uma mobilização planetária dos diversos governos nacionais contra os segmentos

considerados terroristas.

Essa perspectiva se apresentou de forma nítida na declaração do embaixador Lino

Gutierrez durante a abertura da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA. Naquela

oportunidade – pouco depois dos atentados de 11 de setembro de 2001 contra as torres

gêmeas de Nova York – o embaixador norte-americano afirmou categoricamente que o

comércio livre e a estabilidade econômica do continente compunham um dos eixos

estratégicos da ação dos Estados Unidos na região:

Em particular, quero destacar nosso firme compromisso com o comércio mais livre e o crescimento econômico. Como assinalou o representante do Comércio dos Estados Unidos, Bob Zoolick, “os inimigos de antes aprenderam que a América do Norte é o arsenal da democracia; os inimigos de hoje aprendem que a América do Norte é o motor econômico da liberdade, da oportunidade e do desenvolvimento”. (...) O presidente reconheceu que a integração econômica do hemisfério é um momento importante da futura prosperidade dos Estados Unidos e do bem-estar do hemisfério (GUTIERREZ, [200-?], p. 17 – grifo nosso).

Ou seja, a integração econômica é vista pelo governo estadunidense como boa para os

negócios, mas também como essencial para manter a hegemonia política, econômica, militar e

cultural daquele país no planeta e para assegurar a sua própria segurança. Nesse sentido, o

comércio, as armas, a ideologia e as finanças são os meios disponibilizados pela única

potência planetária para fazer valer seus interesses não somente na América, mas em escala

global14.

Por outro lado, há os que como Emir Sader vêem a integração entre os países latino-

americanos – e destes com outros do Cone Sul – como uma das alternativas para fazer frente

aos interesses das nações capitalistas mais poderosas e de suas empresas. Tal orientação

destaca a dimensão política desse processo, o que não significa que haja desconsideração à

relevância da dimensão econômica. Também nessa perspectiva de análise sobre a integração,

os Estados Nacionais aparecem como sujeitos ativos. Contudo, com o claro propósito de

alterar estruturalmente as relações atuais entre os países:

14 A Guerra do Golfo no início dos anos 90 consolidou a nova fase da estratégia de guerra estadunidense no planeta, posto que se baseou na articulação de três fatores fundamentais: uso intensivo de tecnologia, capacidade excepcional de deslocamento e de agrupamento de tropas e utilização de soldados profissionais adequados para diferentes tipos de arena de luta num mesmo conflito. A Guerra do Golfo em 1990, assim como as recentes invasões de tropas norte-americanas no Afeganistão e no Iraque, atendem a interesses geopolíticos e geoeconômicos substanciais para os Estados Unidos, que envolvem o controle da segunda maior reserva de

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Uma nova forma de inserção internacional é indispensável para todos os países que desejam romper com o neoliberalismo e construir um outro tipo de sociedade, fundado nos direitos de todos e na justiça social. A inserção subordinada ou soberana é assim condição de uma política soberana e fundada nos direitos sociais. Os países latino-americanos deveriam, antes de estabelecer qualquer outra aliança internacional, integrar-se entre si, para dispor de força própria, baseada na identidade de seus interesses. Deveriam, ao mesmo tempo, trabalhar para a formação de uma frente dos países do sul do mundo – todos excluídos dos três mega-mercados mundiais -, antes de tudo com aqueles que têm mais peso, como a China, a Índia, a África do Sul, o Irã, para estabelecer vínculos comuns, intercâmbios e uma plataforma de reorganização da ordem econômica e política mundial (SADER, 2002, p. 41)

É inegável que as medidas adotadas pelos governos dos países capitalistas periféricos,

principalmente após a década de 80, como a abertura indiscriminada de suas economias à

concorrência externa, privatizações de setores estratégicos, dolarização da moeda nacional

(como no caso do Equador), crescentes déficits na balança comercial e outros problemas,

significaram aumento substancial da vulnerabilidade dessas nações, ainda mais porque tais

medidas contribuíram para agravar o já terrível quadro de desigualdades sociais. Todavia,

todos esses países sofreram as conseqüências desse processo da mesma maneira? É possível

enquadrar nessa análise países tão díspares como Brasil e Haiti, por exemplo?

Se, de um lado, as condições impostas pelas “instituições internacionais”, de que fala

Bourdieu, aos países capitalistas periféricos reforçam a vulnerabilidade destes, por outro, não

se pode desconsiderar que a materialização dessas diretrizes se dá no plano interno de cada

nação; portanto, dependem da aceitação e do compromisso dos governos e de seus aliados a

tais políticas. Ou seja, não se pode falar de uma relação mecânica de submissão do nacional

ao externo. O recente fracasso das negociações promovidas pela Organização Mundial do

Comércio – OMC, em Cancun, cujos países africanos e latino-americanos tiveram papel

relevante para que tal fato ocorresse, demonstra que a submissão ou a insubmissão às

condicionalidades das “instituições internacionais” depende em grande parte da orientação

política hegemônica em cada país num determinado momento histórico. Como nos diz Santos:

(...) as fronteiras mudaram de significação, mas nunca estiveram tão vivas, na medida em que o próprio exercício das atividades globalizadas não prescinde de uma ação governamental capaz de torná-las efetivas dentro de um território. A humanidade desterritorializada é apenas um mito (SANTOS, 2000, p. 42)

Seria correto dizer que os Estados Nacionais são meros administradores dos negócios

dos “novos senhores do mundo”, no caso as mega-empresas, como nos diz Baumann? Esse

petróleo do mundo (no caso do Iraque); acesso e exploração das reservas existentes em países do antigo bloco

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tipo de afirmação não acaba reforçando as próprias teses dos grupos sociais que advogam o

“Estado mínimo”, justamente as teses que autores como Baumann pretendem combater?

Partindo de uma premissa completamente diferente, Fiori questiona aqueles que falam

da morte da soberania dos Estados como resultado da globalização. Como fazer tal afirmação,

se foi no século XX que os “Estados territoriais” se multiplicaram e se transformaram num

fenômeno global? – indaga ele.

Do mesmo modo que as reformas estruturais adotadas e implementadas pelos diversos

países não repercutiram da mesma maneira em todos eles, posto que os contextos políticos,

econômicos e sócio-culturais eram e são diferentes (nível de organização da sociedade civil,

estrutura produtiva e outras), também o exercício da soberania por parte dos Estados

nacionais não é algo que independa das relações de poder presentes na atualidade e que foram

constituídas historicamente. Em outras palavras, a soberania não é exercida da mesma forma

por todos os estados; nem todos eles precisam ser necessariamente fracos para atender aos

interesses das grandes corporações. A soberania é, portanto, um dado histórico tal como nos

diz Fiori:

Quando se fala de soberania, quase todos pensam num poder supremo, absoluto, perpétuo, indivisível e inalienável, que se manteve igual através dos tempos, uma jurisdição política territorial reconhecida pelos demais estados e pela sua própria população. Essa visão quase “metafísica” da soberania está na cabeça das pessoas que anunciam o fim dos estados, porque eles teriam perdido seu poder frente às grandes corporações multinacionais e aos agentes dos mercados financeiros globais. O que a história ensina, entretanto, é que a soberania nunca foi um poder absoluto, e sempre foi objeto de conflitos e negociações, que redefiniram seu significado e extensão várias vezes através do tempo e dos espaços geopolíticos mundiais (FIORI, 2001, p. 66)

Desenvolver reflexão acerca da integração sul-americana, levando em consideração

diferentes perspectivas teóricas como as expostas aqui, é um grande desafio intelectual. Isto

porque a implementação dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento e da

Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura da América do Sul parece conter elementos que

servem para comprovar os argumentos dos diferentes autores aqui apresentados e seus

enfoques. Não é possível desconhecer, por exemplo, que a abertura indiscriminada das

economias nacionais, a desregulamentação, a privatização de empresas públicas, a liberdade

de movimentação do capital financeiro e o peso crescente das dívidas externa e interna, entre

outras questões, limitam enormemente a capacidade de os Estados elaborarem e promoverem

soviético, e o seu transporte pelo território do Afeganistão, entre outras questões.

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políticas públicas voltadas ao desenvolvimento nacional, de combate às desigualdades, entre

outras.

Por outro lado, a integração econômica que se pretende alcançar na América do Sul

conta com o engajamento decisivo dos diversos Estados Nacionais, com a liderança do Brasil,

visando, entre outros objetivos, alcançar melhor posição nas negociações multilaterais ora em

andamento, bem como ampliar o escoamento dos produtos da região para o mercado

internacional. O que, sem dúvida alguma, atende aos interesses de grandes grupos econômicos

exportadores, como o setor de agronegócios.

Além disso, a integração econômica está associada aos processos de reformas

estruturais em execução em todos os países sul-americanos; reformas estas cobradas por

instituições financeiras multilaterais, empresas multinacionais e o grupo dos sete países mais

ricos do mundo – o verdadeiro centro do poder para alguns autores – incluindo,

evidentemente, os mais variados segmentos sociais articulados à dinâmica da globalização

capitalista presentes no interior dos países sul-americanos.

A integração da infra-estrutura física da América do Sul, já em pleno andamento no

sub-continente, consiste num audacioso plano, cuja principal função é constituir-se num dos

pilares da almejada integração econômica dos países dessa região; estratégia que conta com a

participação ativa dos respectivos governos nacionais.

O capítulo seguinte, portanto, estará voltado ao debate sobre a IIRSA, no intuito de

tornar mais claro do que trata realmente essa iniciativa, bem como de tentar compreender o

porquê de tal estratégia na atualidade, a partir dos argumentos de alguns dos principais atores

envolvidos com a implementação da mesma.

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II. Integração da infra-estrutura física: a grande estratégia do momento A integração regional abarca diversas dimensões das relações entre os países que vão

do econômico ao cultural, da política aos aspectos socio-ambientais. Portanto, é um tema

amplo e complexo, posto que envolve as diversas faces da intervenção dos Estados Nacionais

e de suas respectivas sociedades, e está impregnado dos diferentes interesses dos atores

sociais em disputa no interior de cada país e no plano externo.

Entretanto, há um ponto de partida comum nas declarações e nos acordos promovidos

pelos governos sul-americanos, nas estratégias para alocação de recursos por parte das

Instituições Financeiras Multilaterais - IFMs e na pressão exercida pelos grandes grupos

empresariais: a integração física dos países é uma das condições primordiais para alcançar a

integração regional nas suas diferentes dimensões. Esse é o pensamento predominante nos

documentos oficiais e largamente veiculado pelos meios de comunicação da região.

Durante a XLIII Reunião Anual do BID, realizada em março de 2002 na cidade de

Fortaleza, o sr. Enrique V. Iglesias, presidente do banco, afirmou que "la integración física,

concretada mediante obras de infraestructura para unir a países vecinos, es uma pieza clave

para construir la integración de América Latina" (BID, 2002). Ainda de acordo com Iglesias,

a integração física foi vista durante muito tempo como um tema acessório durante as

negociações dos acordos comerciais, porém, "hoy nos damos cuenta, a medida que

profundizamos estos procesos, de que el tema de la integración física es fundamental" (BID,

2002).

Nesse mesmo evento, o então ministro do Planejamento do governo Fernando

Henrique Cardoso, sr. Martus Tavares, afirmou que "los temas macroeconómicos son

absolutamente indispensables, pero no resumen todo. El tema de la integración física

igualmente importante para que nuestros pueblos concretem en los hechos la integración

comercial que tanto deseamos" (BID, 2002).

Já no ano passado, durante um seminário promovido pelo Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES e pela Corporação Andina de Fomento –

CAF, o sr. Carlos Lessa, presidente do BNDES, afirmou que infra-estrutura “é a locomotiva

do desenvolvimento econômico e social”. E, num tom de lamento sobre a pouca integração

sul-americana, afirmou:

(...) toda vez que olho o mapa do Novo Mundo, sempre fico levemente desconfortável quando percebo o que aconteceu na parte norte do continente em relação à parte sul. Há 200 anos que a parte norte do Novo Mundo está ligada de

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costa a costa; há 200 anos existem sinergias de imensa importância entre os lados do Novo Mundo banhados pelos dois maiores oceanos da Terra. Nós estamos chegando ao terceiro milênio e não completamos essas ligações fundamentais. Na verdade, o nosso continente ainda padece de uma histórica extroversão e, para que ninguém ponha o boné, eu acuso o Brasil disto que é olhar muito para o oceano, olhando relativamente pouco para o seu interior (BNDES, 2003)

Tal como Lessa, o sr. Henrique Garcia, presidente da CAF, posicionou-se

incisivamente a favor da integração regional como meio de ampliar a competitividade dos

países da América do Sul:

Vemos que um obstáculo fundamental para a inserção efetiva da região é, precisamente, a baixa competitividade. Assim, a infra-estrutura e a logística se convertem nos elementos fundamentais nesse processo de transformação e de busca pela competitividade. Evidentemente que a infra-estrutura não deve ser vista como um fim em si, mas como meio – como Carlos Lessa, com toda clareza, explicou (BNDES, 2003)

De acordo com os pontos de vista expressos por Lessa e Garcia, a integração da infra-

estrutura contribui para a construção de sinergias e, consequentemente, para a ampliação da

competitividade sul-americana no mercado internacional. Todavia, a visão predominante

presente nos relatórios e documentos oficiais é a de que, se de um lado a América do Sul

possui enormes potencialidades, de outro possui também enormes gargalos derivados do

ambiente natural existente na região - a formação geológica e a cobertura vegetal, entre outras

coisas -, da parca infra-estrutura e das grandes distâncias entre os lugares.

Durante o seminário promovido pelo BNDES e a CAF, Lessa lançou uma frase de

efeito que resume bem o pensamento presente entre os setores envolvidos na implementação

de políticas e de projetos voltados à integração da infra-estrutura sul-americana: “A

cordilheira dos Andes é certamente uma beleza, mas é um terrível problema de engenharia”

(BNDES, 2003). A América do Sul é vista, portanto, como um continente fragmentado em

grandes blocos, por conta dos obstáculos naturais existentes que precisam ser integrados a fim

de garantir o desenvolvimento da região, conforme demonstra a figura a seguir:

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Figura 1: As “barreiras” territoriais sul-americanas

Fonte: http://www.pucp.edu.pe/invest/iee/iee/actividades/activ2003/seminsub/ponencias/Lunes2029/1_iirsa.pdf

O debate sobre a integração da infra-estrutura ganhou grande destaque nos últimos

anos, principalmente após o ano 2.000 quando na reunião de presidentes de países da América

do Sul, ocorrida nos dias 31 de agosto e 1º de setembro daquele ano, em Brasília, o Banco

Interamericano de Desenvolvimento – BID, a pedido do governo brasileiro, apresentou a

proposta “Plano de Ação para a Integração da Infra-estrutura da América do Sul”. Segundo

os autores, o referido plano baseava-se nos seguintes princípios básicos (BID, 2000):

1. Visão integral da infra-estrutura (física, social, ambiental e informacional);

2. Enquadramento dos projetos dentro de um planejamento estratégico, organizado a partir

da identificação dos eixos de integração e desenvolvimentos regionais no continente sul-

americano;

3. Reforma e atualização dos sistemas normativos e instituições que regulamentam o uso das

infra-estruturas nacionais;

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4. Fortalecimento da capacidade dos Estados na formulação de políticas, planos e quadros

normativos;

5. Harmonização das políticas, planos e quadros normativos e institucionais entre os

Estados;

6. Valorização da dimensão ambiental e social dos projetos;

7. Melhoria da qualidade de vida e das oportunidades das populações locais a partir dos

projetos de integração regional;

8. Incorporação de mecanismos de participação e de consulta das comunidades envolvidas;

9. Desenvolvimento de novos mecanismos regionais para a programação, execução e gestão

de projetos de integração física;

10. Otimização do uso das fontes de financiamento desenvolvendo estratégias comuns.

Os princípios básicos definidos no referido plano demonstram o quanto é abrangente a

estratégia de integração da infra-estrutura da América do Sul, não se resumindo à execução de

projetos físicos, mas envolvendo também a realização de mudanças nas legislações, normas e

regulamentos nacionais, a fim de facilitar o intercâmbio comercial entre os países; inclui

ainda a desburocratização de algumas áreas, como o comércio exterior, para que sejam

facilitadas a circulação de mercadorias e a reforma do Estado, entre outras coisas. Além

disso, busca-se planejar e executar ações coordenadas que potencializem a utilização de

recursos financeiros e humanos. Por isso, um dos preceitos básicos do acompanhamento do

plano de ação é “evitar a criação de novas instituições, aproveitando os recursos humanos e

financeiros de instituições nacionais, regionais e multilaterais já existentes” (BID, 2000).

Em relação à integração da infra-estrutura física, o plano de ação definiu as áreas de

transporte, energia e telecomunicações como prioritárias das ações do que se denominou

Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura da América do Sul – IIRSA, a partir da

constituição de eixos de integração regionais – questão que será abordada mais adiante. O

referido plano também apresentou uma proposta de estrutura para articular as ações das

diversas instituições envolvidas na elaboração e implementação da IIRSA, estrutura esta

composta de:

• Um Comitê de Direção Executiva (CDE) “integrado por representantes de alto nível

designados pelos governos da América do Sul, pertencentes às entidades que os

respectivos governos considerem pertinentes”;

• Grupos Técnicos Executivos (GTE) “integrados por funcionários e especialistas

designados pelos governos da América do Sul, pertencentes às entidades que os

Page 34: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

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respectivos governos considerem pertinentes”. Para cada eixo de integração seria

constituído um GTE de caráter temporário voltado à análise de temas específicos, “tais

como harmonização de marcos normativos, métodos para a identificação integrada de

projetos, etc.”;

• Um Comitê de Coordenação Técnica (CCT) integrado por representantes do BID, da CAF

e do Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA), cujo

objetivo principal seria o de ajudar ativamente os governos na implantação e

monitoramento “do desenvolvimento do Plano de Ação em áreas como a de identificação

e de avaliação integrada de projetos e a de mobilização dos recursos financeiros para o

desenvolvimento dos mesmos”.

Em dezembro de 2000, o Banco Interamericano de Desenvolvimento apresentou um

documento intitulado Um Nuevo Impulso a la Integración de la Infraestructura Regional en

América del Sur (BID, 2000a) que, entre outros aspectos, aponta os entraves os quais,

segundo a instituição, inibem o comércio entre os países da região, bem como indica

alternativas para a sua dinamização. A estratégia geral do documento reproduz as análises e os

termos das negociações mantidas pelos presidentes na reunião de Brasília, no sentido de

garantir a competitividade da economia dos países sul-americanos na disputa comercial

internacional.

Segundo o documento apresentado em dezembro de 2.000, a visão estratégica de

médio e longo prazos deveria, de um lado, garantir a participação cada vez maior da América

do Sul no mercado internacional de bens, capital e de conhecimento; de outro, deveria ter

como meta uma região “socialmente estable, com crescimiento económico social y

ambientalmente sostenible, comprometida en la lucha para reducir la pobreza y para aumentar

el acceso a oportunidades de educación y empléo” (BID, 2000a, p. 52). Desse modo, a

constituição de um espaço econômico integrado deveria orientar-se por uma nova concepção

que os documentos do BID, em especial, denominam como regionalismo aberto ou novo

regionalismo (BID, 2000; BID, 2000a; BID, 2002a; BID, 2003; IGLESIAS: 1997; DEVLIN,

ESTEVADEORDAL, 2002). Evidentemente, se há um novo regionalismo, é porque em

algum momento houve o que se poderia chamar de antigo regionalismo. Mas, quais as

características de um e de outro?

Segundo Devlin e Estevadeordal (2002), no “antigo regionalismo” o objetivo central

dos acordos comerciais era o de apoiar o modelo de desenvolvimento da Industrialização

Substitutiva de Importações – ISI, que impunha elevados índices de proteção nacional e

Page 35: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

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estimulava a intervenção direta do Estado nos mercados. O modelo de desenvolvimento,

portanto, era orientado para o mercado interno. Dessa forma, a adoção de medidas voltadas ao

estabelecimento de vínculos comerciais com os países industrializados não se constituía em

assunto central da política latino-americana.

Ainda de acordo com esses autores, esse quadro muda radicalmente a partir de 1986

com a realização dos acordos comerciais entre Estados Unidos e Canadá. Isto porque os

referidos acordos introduziram temas inovadores em relação ao sistema de comércio

multilateral, transcendendo os assuntos referentes a acesso a mercados “hasta llegar a las

áreas de politicas de soberania tradicionales que se relacionan com el modo en que las

sociedades regulan sus economías nacionales” (p. 6). Por conseguinte, as novas modalidades

de acordos comerciais – que mais tarde resultaram na constituição da Área de Livre Comércio

da América do Norte – NAFTA, influenciaram decisivamente o panorama das negociações

bilaterais e multilaterais nos quatro cantos do planeta. Além disso, os acordos firmados com o

Canadá demonstraram a mudança de enfoque dos EUA em relação às negociações comerciais

do período, na medida em que estes optaram pelo estabelecimento de acordos bilaterais, como

a forma mais eficiente de fazer valer sua agenda e seus interesses.

O novo regionalismo dos anos 90 é fruto desse processo, tendo os acordos de 1986

entre EUA e Canadá como referência básica. Esse novo regionalismo é considerado parte

integrante das amplas reformas estruturais que se tem produzido na América Latina (BID,

2000; BID, 2000a; BID, 2002a; BID, 2003; IGLESIAS, 1997; DEVLIN,

ESTEVADEORDAL, 2002), cujas características estratégicas centrais são:

(a) A abertura para os mercados mundiais;

(b) A promoção da iniciativa privada;

(c) A retirada do Estado da atividade econômica direta.

Com base nos documentos elaborados pelo BID, por Iglesias, Devlin e Estevadeordal

é possível apresentar, de forma sintética, as principais diferenças destacadas por eles entre o

novo e o antigo regionalismo:

• No novo regionalismo não há maiores restrições por parte dos países em desenvolvimento

à entrada de investimentos estrangeiros diretos provenientes das nações industrizalizadas;

• Há um maior avanço do comércio intrarregional (entre os continentes);

• Do ponto de vista geopolítico, há maior exigência sobre os diversos países para que

tenham participação estratégica efetiva nos foros hemisféricos e em escala mundial, bem

como para que estabeleçam mecanismos de maior cooperação entre os mesmos

Page 36: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

27

(negociação em bloco, por exemplo). Além disso, a integração e o comércio regional são

considerados elementos de grande relevância para a consolidação da democracia e

estabelecimento da paz nas fronteiras;

• O estabelecimento de acordos comerciais de vinculação recíproca, entre os países da

América Latina com os EUA e com outras nações industrializadas, seria impensável no

antigo regionalismo;

• Novos temas e bens são incluídos nas negociações entre os países;

• Arquitetura institucional reduzida para a articulação das ações e dos recursos necessários;

• A integração regional é considerada o terceiro nível de um processo mais amplo, cujos

níveis anteriores foram a liberalização unilateral (redução substancial das tarifas externas)

e liberalização multilateral (Rodada do Uruguai e criação da Organização Mundial do

Comércio – OMC);

• O novo regionalismo é dirigido pelo e para o mercado.

Tal integração baseada no novo regionalismo é compreendida, portanto, enquanto uma

nova etapa para completar e consolidar as reformas estruturais em andamento nos diversos

países do continente (BID, 2000a), buscando ampliar a participação da iniciativa privada em

todas as atividades econômicas, inclusive naquelas em que o Estado é o principal agente e nas

quais é considerado ineficiente na provisão dos serviços. Daí que o papel do Estado é

repensado no intuito de que ele fique restrito às ações de regulação, planificação e

financiamento da infra-estrutura e seus serviços, cabendo a ele também a tarefa de continuar

com intervenções para viabilizar iniciativas nacionais e regionais, "cuyos dividendos

económicos e sociales de largo plazo no son suficientemente atractivos a inversores

financieros privados" (BID, 2000a, p. 32-33). Ou seja, as áreas que não oferecem condições

vantajosas para a obtenção de lucros à iniciativa privada deverão ser atendidas pelas ações do

Estado até que as mesmas tornem-se atraentes:

Con respecto a la planificación, su necessidad parece imprescindible en aquellos sectores donde existen notorias “fallas de mercado”, tales como externalidades, economías de escala e indivisibilidades, que dificultan las respuestas de mercado. Estas “fallas” hacen aconsejable la planificación estatal, pero en un sentido indicativo. Este nuevo escenario puede entenderse como um cambio de paradigma respecto al rol del Estado en la planificación de la infraestructura en la región BID, 2000a, p. 17)

O novo regionalismo visa, portanto, atender as demandas do mercado; ou melhor

dizendo, dos segmentos com capacidade de competir no mercado internacional. Isto significa

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que nessa estratégia não há espaço para setores produtivos destituídos de poder de

investimentos financeiros vultuosos, de lobbie sobre governos, de forte representação política

nos parlamentos e perfeitamente afinados com a lógica globalizadora atual. Por conseguinte,

os produtos a serem comercializados são aqueles do agronegócio e os dos setores industriais

que são competitivos em outros países.

Ocorre que a integração regional – na perspectiva do novo regionalismo – passa pela

integração da infra-estrutura física do continente, como bem demonstra o Relatório Anual do

Banco Interamericano de Desenvolvimento:

O aumento do comércio entre os países vizinhos após a formação dos acordos regionais faz crescer a demanda por uma integração maior da infra-estrutura. Na América Latina, sérios gargalos causados pelo maior volume de comércio precisam ser eliminados. As malhas rodoviárias – a principal modalidade de transporte de cargas – necessitam de grandes melhorias, bem como de manutenção. Muitos outros meios de transporte devem ser igualmente melhorados. Entretanto, até agora, a infra-estrutura que liga os países em fase de integração de um modo geral não recebeu ainda melhoramentos suficientes. No centro da questão existe o problema das externalidades. Os projetos de infra-estrutura regional têm custos e benefícios que ultrapassam as fronteiras dos países. O trecho da estrada que se constrói a um lado da fronteira traz benefícios para o país vizinho. No contexto de um processo descentralizado de tomada de decisões, essas externalidades resultarão naturalmente numa provisão deficiente de infra-estrutura regional. A questão fundamental é como fazer para que esses projetos se concretizem, estabelecer formas de tomadas de decisões coordenadas, que internalizem as externalidades e, ao mesmo tempo, superem outros riscos políticos e normativos que possam surgir devido o caráter multinacional dos projetos. Os governos enfrentarão esse desafio. As 12 nações da América do Sul, com a Iniciativa de Integração da Infra-estrutura da América do Sul (IIRSA), e o México e a América Central, por meio do Plano Puebla-Panamá (PPP), lançaram iniciativas intergovernamentais sem precedentes, com apoio de organizações regionais, para atacar o problema da coordenação da infra-estrutura regional (BID, 2002a, p. 10 - grifo nosso)

A IIRSA é um ambicioso plano baseado em sete processos setoriais e dez eixos de

integração, que buscam integrar todo o sistema de transporte (fluvial, marítimo, rodoviário e

ferroviário), conectando a América do Sul aos mercados de todo o planeta (BID: 2003a). A

IIRSA também "contempla mejorar los sistemas regulatorios de los sectores de energía y

telecomunicaciones, los mercados de servicios logísticos como fletes, seguros,

almacenamiento y los trámites de permisos y licencias" (BID, 2002). Com relação ao setor de

energia, o objetivo é a formação de mercados regionais e avançar para um sistema integrado

de livre mercado.

Adiante está a relação dos processos setoriais que fazem parte da IIRSA, bem como as

justificativas para a escolha de cada um deles. Tais justificativas demonstram de modo claro

os principais objetivos que se espera alcançar com a implementação desses processos:

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• reduzir os custos de transporte;

• aumentar a competitividade econômica dos países sul-americanos;

• dinamizar o comércio intra e extraregional;

• ampliar a participação da iniciativa privada nas economias nacionais e proteger

juridicamente os seus investimentos;

• redefinir o papel do Estado;

• prover infra-estrutura.

As justificativas apresentadas (BID, 2003a, p. 12-13) também demonstram a perfeita

sintonia entre a implementação dos processos setoriais e as reformas estruturais em

andamento nos países sul-americanos, posto que correspondem a uma mesma matriz

estratégica, apoiada e financiada por IFMs como o BID:

Quadro 1: processos setoriais integrantes da IIRSA

PROCESSOS

SETORIAIS

JUSTIFICATIVA

Sistemas operativos de transporte

marítimo

“la mayor parte del comercio extrarregional y buena parte del transporte intrarregional va a realizarse através del transporte marítimo. La reducción de costos, la mayor frecuencia y la mayor confiabilidad serán claves para la competitividad de la región. En un mercado en el que los principales actores son privados, las normas reguladoras que adopten los países pueden facilitar esos objetivos, evitando la separación entre tráficos intra y extrarregionales que puede estar impidiendo un uso eficiente de los equipos”

Sistemas operativos de transporte aéreo

“este modo de transporte tendrá una incidencia creciente en el transporte intra y extrarregional de cargas, y un rol decisivo en el transporte de pasajeros por negocios y turismo. Su objetivo es lograr la mayor cobertura y frecuencias, y menores precios, para cargas y pasajeros. La mejor articulación entre los servicios extrarregionales e intrarregionales – que dependen de las regulaciones que adopten los países – puede constituir la clave para hecrlo. Al igual que com el transporte marítimo, el “impulso” que gerenran los tráficos extrarregionales puede constituir una oportunidad para mejorar los servicios intrarregionales”

Sistemas operativos de transporte multimodal

“el tipo de comercio que se prevé requirirá en forma creciente las operaciones integradas, que combinem modos de transporte y empresas com una alta sincronización. Ello requiere no sólo la infraestructura adecuada, sino una sólida armazón jurídica y el desarrollo de operadores regionales”

Facilitação do tráfego de fronteira

“estas acciones son claves para la movilidad de bienes y personas en la región. Deben tender a permitir operaciones perfectas (seamless), logrando estándares similares a los que se han obtenido en otras regiones del mundo”

Tecnologias da informação e das

comunicações

“se deben proveer servicios de alta calidad, que constituyen una clave para la competitividad y generan numerosas externalidades al mejorar la conectitividad de áreas marginales, por lo que se va a propiciar el desarrollo de regulaciones, infraestructura y contenidos que faciliten el desarrollo económico y social, y promuevan la igualdad de oportunidades”

Marcos normativos de mercados

“el desarrollo de mercados energéticos regionales permiti optimizar el uso de los recursos y mejorar la calidad del suministro, favoreciendo también la protección

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energéticos regionais

del medio ambiente. Deberian removerse los obstaculos para lograr esos mercados y aprovechar plenamente sus ventajas, ante cualquier escenario. Los beneficios de los mercados energéticos serán: optimizar el stock de capital; diminuir los custos marginales de largo plazo; mejorar la calidad y seguridad del suministro; reducir los impactos energéticos sobre el medio ambiente; e incrementar la dimensión de los mercados, atrayendo inversores privados”

Instrumentos para o financiamento de

projetos de integração física

regional

“la financiación de los proyectos seguramente requerirá de mecanismos novedosos, más allá de las formas tradicionales de concessión. Ante la escassez de recursos públicos y los limites del endeudamiento, será crucial atraer capital privado. La administración de los riesgos, com el apoyo de los Estados y los organismos mutilaterales, serán la clave para lograrlo, adquiriendo un rol singular las perspectivas crecientes de las associaciones público-privadas”

Já os eixos de integração definidos a partir das negociações envolvendo os países sul-

americanos e o BID foram os seguintes:

1. Eixo Mercosul-Chile (São Paulo-Montevidéu-Buenos Aires-Santiago);

2. Eixo Andino (Caracas-Bogotá-Quito-Lima-La Paz);

3. Eixo Andino do Sul (do Norte ao Sul da Argentina);

4. Eixo da Hidrovia Paraná-Paraguai;

5. Eixo de Capricórnio (Antofogasta/Chile-Jujuy/Argentina-Assunção/Paraguai-Porto

Alegre/Brasil);

6. Eixo do Escudo Guyanes (Venezuela-Brasil-Guiana-Suriname);

7. Eixo Multimodal do Amazonas (Brasil-Colômbia-Equador-Peru);

8. Eixo do Sul (Talcahuano-Concepción/Chile-Neuquen-Bahia Blanca/Argentina);

9. Eixo Peru-Brasil (Acre-Rondônia)-Bolívia;

10. Eixo Interoceânico Central (Brasil-Bolívia-Paraguai-Peru-Chile).

Mas o que vem a ser os eixos de integração e desenvolvimento? Segundo o BID:

El concepto de eje de integración e desarrollo intenta plasmar un enfoque de planeamiento más moderno e integral, en el cual la infraestructura no está aislada sino que forma parte de un conjunto de acciones en el territorio, vinculando la inversión física a la dimensión social y ambiental del desarrollo y propiciando el aprovechamiento de sinergia entre los diversos tipos de infraestructura (BID: 2000a)

Os eixos representam, portanto, a concentração de recursos para dotar de infra-

estrutura determinadas partes do território sul-americano, propiciando a sinergia entre as

diversas modalidades de transporte e os sistemas de energia e de telecomunicações – a

instalação de cabos de fibra ótica concomitantemente à implementação de túneis, redes de

energia elétrica, ferrovia e outras, por exemplo. Como disse certa vez Eliezer Batista, homem

forte da Companhia Vale do Rio Doce quando esta era estatal, e um dos maiores defensores

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da estratégia agora materializada na IIRSA, “tudo fica mais barato quando se faz ao mesmo

tempo” (DANTAS, CALDAS, 2003?).

Os eixos buscam estimular o estabelecimento de cadeias produtivas e alavancar

negócios nas áreas atendidas pelos diversos projetos de infra-estrutura. Por analogia pode-se

dizer que a visão predominante é a da pedra lançada num lago, onde suas ondas se espalham a

partir de um determinado ponto, atingindo amplos territórios no interior de cada país,

interligando-os comercialmente com outras nações da América do Sul e mesmo de outros

continentes.

Com a implementação dos eixos de integração na América do Sul, o acesso do grande

capital às imensas riquezas naturais e biológicas da região será facilitado de maneira nunca

vista antes na história do continente, como se pode notar nesta figura:

Figura 2: acesso aos recursos naturais sul-americanos

Fonte: Ricardo Buitrón http://www.accionecologica.org/

É evidente o esforço para acelerar a implementação dos projetos de infra-estrutura na

Pan-Amazônia dada as imensas riquezas existentes nessa parte do continente e a importância

estratégica da mesma para viabilizar a integração sul-americana com os mercados de outras

regiões do planeta (BNDES, 2003) nos quatro sentidos (norte-sul-leste-oeste). Por conta

disso, quatro dos dez eixos priorizados pela IIRSA serão implementados totalmente na Pan-

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Amazônia. Abaixo serão apresentados alguns desses eixos, sem a pretensão de discuti-los

exaustivamente, mas tão somente mostrar o redesenho que a IIRSA promoverá na região.

O eixo multimodal do Amazonas, que articula projetos no Brasil, Colômbia, Equador

e Peru possibilitará a integração Leste-Oeste sul-americana, conectando, dessa forma, os

oceanos Atlântico e Pacífico através da Amazônia. Um dos projetos previstos nesse eixo é o

Corredor Intermodal Tumaco-Puerto Asís-Belém do Pará “Un Camino Verde Hacia la Paz”,

envolvendo os transportes fluvial (2.862 km no Brasil e 1.580 km na Colômbia) e 474 km de

estradas e possibilitando a exploração somente no território colombiano de petróleo e gás

natural, reservas auríferas e de metais básicos (como cobre e zinco), madeira, além de

possibilitar a expansão do agronegócio e de outras atividades. Entre outros projetos, encontra-

se também o que integrará Tabatinga (Amazonas) até o porto peruano de Taipa.

Figura 3: Eixo Multimodal do Amazonas

Fonte: http://www.iirsa.org/esp/ejes/amazonas.shtml

Já o eixo Peru-Brasil-Bolívia possibilitará a integração desde Porto Velho (Rondônia)

até os portos peruanos de Maratani e Ilo, passando por Rio Branco (Acre), possibilitando,

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dessa forma, mais um caminho em direção aos países da Ásia e da Oceania, bem como

integrar-se-á ao eixo multimodal do Amazonas a partir da hidrovia Madeira-Amazonas,

permitindo a circulação de produtos nos sentidos Leste-Oeste e em direção ao Norte através

da BR-174. Além disso, tal eixo irá possibilitar, entre outras coisas, a implementação de

vultuosos investimentos na Bolívia, principalmente no setor de energia elétrica.

O eixo Peru-Brasil-Bolívia é de grande importância para os produtores de soja de

Rondônia e do estado do Mato Grosso, principalmente.

Figura 4: Peru – Brasil – Bolívia

Fonte: http://www.iirsa.org/esp/ejes/peru_brasil.shtml

Outro percurso para a integração já está se dando através da rodovia que liga Manaus

(Amazonas) a Boa Vista (Roraima), a BR-174, e daí para os portos caribenhos da Venezuela,

permitindo um amplo leque de opções de transações comerciais com os países das Américas

Central e do Norte e do Caribe. Outra opção que está se conformando é a que liga Boa Vista,

através da BR-401, até o município roraimense de Bonfim, estendendo-se ao porto marítimo

de Georgetown, na Guiana, integrando transporte rodoviário e marítimo, expansão de uma

linha de transmissão de energia elétrica e instalação de cabos de fibra ótica. Também estão

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sendo realizados os estudos para interligar Georgetown até o Oiapoque (Amapá)15, que faz

parte do eixo Venezuela-Brasil-Guiana-Suriname. Dessa forma, o extremo norte sul-

americano estará completamente integrado não somente por via rodoviária, como também por

via aérea, de Georgetown até Belém do Pará – o que vai demandar a modernização do

aeroporto de Macapá (Amapá).

O eixo Venezuela-Brasil-Guiana-Suriname é exemplar na concepção de integração de

projetos de transporte, energia e comunicação. No que diz respeito à integração entre Brasil e

Guiana, por exemplo, a estrada Bonfim–Georgetown está sendo projetada para receber tráfego

pesado, assim como o porto da capital da Guiana será preparado para receber embarcações de

grande calado – como navios da classe Panamax (FERREIRA, 2002)16. Já em relação as

comunicações, prevê-se a instalação de cabos de fibra ótica (12 fibras) seguindo o traçado da

BR-401, numa extensão aproximada de 425 km. Estes conectar-se-ão com os cabos América

II e estender-se-ão até Manaus. Tal investimento está estimado em cerca de US$ 1 milhão -

somente os cabos.

Com relação à geração de energia, prevê-se o fornecimento através da hidrelétrica de

Turtubra, localizada no rio Mazurini, na Guiana. Estima-se a produção de 600 mw na primeira

fase do projeto, podendo chegar até 1.500 mw no final. O investimento estimado é de US$

1,25 bilhões. Por sua vez, a linha de transmissão Brasil-Guiana numa extensão aproximada de

680 km custará cerca de US$ 540 milhões. Com isso o Pólo Industrial de Boa Vista será

abastecido pelas hidrelétricas de Turtubra (Guiana – 600 mw) e de Guri (Venezuela – 600

mw) estendendo-se as linhas de transmissão até Manaus.

Figura 5: Investimentos Trecho Boa Vista (Brasil) – Georgetown (Guiana)

15 O trecho Oiapoque Macapá (Brasil) foi incorporado no Plano Plurianual do governo Lula. 16 A estrada Bonfim-Georgetown custará cerca de US$ 300 milhões, enquanto o porto da capital guianense terá de receber investimentos na ordem de US$ 120 milhões.

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Fonte: (FERREIRA, 2002) – http://www.investebrasil.org.br/

Segundo os projetistas, o portfólio de projetos de integração Brasil – Guiana irá

dinamizar, no lado brasileiro, o pólo industrial de Boa Vista, onde já está sendo prevista a

alocação de vultuosos empreendimentos até 2007 (FERREIRA, 2002):

Quadro 2: Investimentos previstos para Roraima

EMPREENDIMENTO INVESTIMENTO/DESTINO Fábrica de celulose BrancoCel Investimento de US$ 300 milhões e

exportação de US$ 110 milhões/ano Smelter – Alumínio Investimento de US$ 650 milhões, produção

de 250.000 ton/ano e exportação de US$ 620 milhões/ano (mercado – EUA)

Frigorífico Investimento de US$ 25 milhões, produção de 5.000 ton/ano (mercado – Europa e África)

Processador de soja Investimento de US$ 85 milhões, produção de 300.000 ton/ano, numa área plantada de 100.000 há (mercado – Japão)

Torrefadora de café Investimento de US$ 30 milhões, exportações no valor de US$ 12 milhões/ano (mercado – Japão e Sudeste Asiático)

Curtume Investimento de US$ 85 milhões, produção de 20.000 m²/ano (mercado – Europa)

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36

Os projetos previstos para o Pólo Industrial de Boa Vista dão a exata dimensão dos

segmentos beneficiados pelos empreendimentos do respectivo eixo: o agronegócio e as

indústrias eletrointensivas. Atividades econômicas voltadas fundamentalmente à exportação,

sendo grandes consumidoras de recursos naturais, concentradoras de capital (terra, por

exemplo) e que geram pouca quantidade de empregos formais.

Por fim, ainda sobre o eixo Venezuela-Brasil-Guiana-Suriname, o Plano Plurianual do

governo Lula prevê a pavimentação da BR-156 do Oiapoque, na fronteira com a Guiana

Francesa, até o município Ferreira Gomes, numa extensão de 453 km. O custo estimado para

esta obra é de R$ 200 milhões. Porém, o objetivo é chegar até a localidade de Laranjal do Jari.

Com isso, será possível ir dessa parte do Amapá até Manaus ou Boa Vista, ou atravessar a

Venezuela em direção aos países andinos ou para o Norte através da América Central (Plano

Puebla-Panamá) por via rodoviária.

Figura 6: Eixo Venezuela – Brasil – Guiana – Suriname

Fonte: http://www.iirsa.org/esp/ejes/v_b_g_s.shtml

Page 46: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

37

Um dos mais ambiciosos objetivos perseguidos pela IIRSA é a integração sul-

americana de Norte a Sul, principalmente através do transporte hidroviário. Para que isto

ocorra, será necessário implementar diversos projetos para tornar alguns rios como o Meta

(Colômbia) navegáveis. Além disso, será preciso intervir para que a região do Pantanal

brasileiro possibilite a interligação das bacias Amazônica e do Prata. Ou seja, que deixe de ser

considerado um problema de engenharia, como preferem dizer os defensores da IIRSA. Uma

alternativa apontada pelo governo brasileiro – que a considera estratégica para a integração

nacional, incorporada na carteira de projetos da CAF, é a implementação do Complexo Rio

Madeira, que potencializará diversos projetos previstos pelos eixos Interoceânico Central,

Multimodal do Amazonas e Peru-Brasil-Bolívia.

A importância desse projeto para o governo brasileiro ficou patente no discurso

proferido por Carlos Lessa, presidente do BNDES, durante o Seminário de Prospecção de

Projetos promovido por esse banco em conjunto com a CAF:

(...) Creio que os 22 projetos aqui apresentados se distribuem mais ou menos assim: vinte deles somam alguma coisa em torno de 5,5 bilhões de dólares; dos dois brasileiros, o do Rio Madeira tem o tamanho dos outros 20, e há um menor. O projeto Rio Madeira, sozinho, tem quase 6 bilhões de dólares. Eu insisti muito para que o projeto Rio Madeira fosse apresentado nesse seminário. Primeiro, eu estou absolutamente convencido de que um projeto dessa magnitude irá gerar muita controvérsia e, quanto mais controvérsia gerar, mais viabilização haverá para ele; em segundo lugar, esse projeto era, da carteira dos nossos projetos, o que tinha mais o sentido da conquista do Oeste, o sentido da construção no interior do continente, de um espaço de prosperidade e de um espaço articulado de expansão. Eu não sei se a energia dessas usinas será para Manaus, se irá numa ou noutra direção17, mas estou absolutamente certo de que 4,8 mil quilômetro de aquavias – 30 milhões de hectares de terras no Brasil, na Bolívia e Peru abertos à produção – representam para a história do continente um movimento em pequena escala do que foi a ocupação do velho oeste do continente norte-americano. Eu acho que é um gesto, um projeto que tem este significado de pôr a modernidade sul-americana na interlândia ainda não ocupada (...) (BNDES, 2003)

De certa forma, o discurso de Carlos Lessa sintetiza o pensamento dominante nas

formulações da IIRSA: é preciso ocupar espaços, explorar as riquezas disponíveis, aumentar a

competitividade e exportar o máximo possível, a fim de que os países sul-americanos possam

se desenvolver. A defesa do meio ambiente e o combate à pobreza, mesmo que apareçam

enquanto objetivos estratégicos da IIRSA, normalmente se encontram secundarizados diante

da magnitude dos projetos de infra-estrutura em estudo, em execução ou já executados.

17 O projeto prevê a construção das usinas hidrelétricas Jirau (3.900 MW) e Santo Antônio (3.580 MW) além de um trecho binacional em estudo (aproximadamente 3.000 MW), bem como, a construção de eclusas.

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Nesse contexto, a Pan-Amazônia continua a ser vista como um imenso vazio

demográfico e atrasada economicamente, que precisa ser incorporada aos centros dinâmicos

capitalistas nacionais e internacionais, reproduzindo, dessa forma, discursos e atos

historicamente conhecidos na região.

Outro fato relevante, que chama atenção no discurso do presidente do BNDES citado

acima, diz respeito ao papel do Brasil nesse processo. Nosso país tem tido um papel ativo na

definição da agenda regional para a integração sul-americana, sendo que os interesses de

poderosos grupos econômicos e políticos nacionais e/ou associados ao grande capital

internacional têm orientado a política externa brasileira nas negociações comerciais que

mantemos com outros países de forma bilateral, ou no interior dos organismos multilaterais.

Entre esses setores podemos destacar o agronegócio e os ramos industriais calçadista,

siderúrgico e automobilístico, por exemplo. É justamente sobre o papel que o Brasil tem

desempenhado na América do Sul, para garantir a implementação da IIRSA, o tema central do

próximo capítulo.

Page 48: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

39

III. Breves considerações sobre a atuação do Brasil no processo de

integração regional da América do Sul. O leque de ações desenvolvidas pelo governo brasileiro na América do Sul em relação

à integração regional é bastante diversificado, posto que envolve diplomacia, estabelecimento

de acordos comerciais e outros aspectos. Nesse sentido, buscaremos centrar nossa atenção em

dois aspectos que consideramos relevantes para este estudo. No primeiro momento

refletiremos sobre a atuação do Brasil no interior de algumas das IFMs envolvidas com a

implantação da IIRSA, do Banco Interamericano de Desenvolvimento e da Corporação

Andina de Fomento, em particular. Em seguida, destacaremos a relação entre a IIRSA e os

Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento do Brasil. Finalmente, abordaremos de

forma sucinta alguns dos projetos de integração pensados pelo governo brasileiro para a

Amazônia.

O BID e a CAF têm exercido importante papel no financiamento de políticas,

programas e projetos direcionados à integração regional. Todavia, esse papel não se resume

ao empréstimo dos recursos solicitados pelos países sul-americanos para que executem o que

está previsto na IIRSA. A natureza da ação das IFMs vai além disso, e somente pode ser

compreendida se analisada no seu conjunto. De um modo geral, podemos dizer que as IFMs –

o BID e a CAF aí incluídas – possuem quatro vertentes estratégicas de atuação:

a) Financiadoras de políticas, programas e projetos – Essa é a atividade mais conhecida das

IFMs. Como bancos que são, atuam no sentido de obter lucros com as transações

financeiras que realizam, seja através de empréstimos a países ou a empresas;

b) Produtoras de conhecimento - Essa é uma das mais importantes características das IFMs e

um dos principais diferenciais destas em relação às instituições financeiras privadas. As

IFMs são na atualidade grandes centros produtores de conhecimento em diversas áreas das

ciências humanas; conhecimento este comprometido com o fortalecimento do mercado e a

reprodução da sociedade capitalista e de suas instituições (BIRD: 2001)18, e que embasa

18 Esse relatório do Banco Mundial é muito interessante pela maneira clara e sem subterfúgios com que defende o mercado, e pela reflexão que faz sobre a necessidade de instituições eficientes que promovam e fortaleçam esse mercado; a concorrência como meio de aumentar a eficiência e/ou a qualidade das instituições, bem como forma de destacar as pessoas bem sucedidas; além de estimular os países – os em desenvolvimento, em especial - para que adotem as “inovações do setor privado”, entre outras coisas. O referido relatório é, segundo seus autores, uma “orientação para as políticas públicas, com uma abordagem pragmática” (BIRD: 2001, p. 2), voltado ao “entendimento de como as instituições apoiam os mercados, do que essas instituições fazem e de como construir instituições eficazes para apoiar os mercados” (idem, p. 4).

Page 49: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

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as estratégias dessas instituições financeiras, as denominadas diretrizes políticas

aprovadas por suas direções;

c) Formuladoras de políticas e prestadoras de assessoria – As IFMs influenciam

decisivamente na implementação de políticas públicas dos seus países-membros, posto

que os empréstimos concedidos são orientados por políticas e objetivos muito precisos:

ajuste estrutural, ampliação da participação da iniciativa privada na economia e reforma

do Estado, por exemplo. Uma outra ação relevante desempenhada pelas IFMs diz respeito

à promoção e/ou realização de estudos, como o desenvolvido pelo Banco Mundial no

Brasil sobre recursos hídricos, que serviu de base para o projeto de lei do governo

Fernando Henrique Cardoso regulamentando a concessão privada da prestação dos

serviços de saneamento (PL 4.147/2001);

d) Formadoras das tecnoburocracias governamentais – Um número considerável de

membros de governos, principalmente das áreas econômica e do planejamento, além de

dirigentes de estatais consideradas estratégicas nos países em desenvolvimento, em

especial, são oriundos das IFMs ou destas se tornaram funcionários quando da saída dos

seus respectivos cargos públicos. O Brasil é um caso exemplar nesse sentido, basta

relembrarmos apenas o mandato de Fernando Henrique Cardoso: Pedro Malan (ex-

ministro da Fazenda), Armínio Fraga (ex-presidente do Banco Central), Francisco Grós

(ex-presidente do BNDES e da Petrobrás), Paulo Paiva (ex-ministro do Planejamento) e

outros.

Essas quatro vertentes estratégicas da atuação das IFMs são evidenciadas no processo

de implementação da IIRSA através do financiamento de projetos, da elaboração teórica sobre

o novo regionalismo que orienta as ações em curso, da prestação de assessoria e do

desenvolvimento de estudos setoriais.

É importante ressaltar, porém, que as IFMs são instituições públicas, cujos recursos

são compostos de dinheiro público oriundo dos orçamentos de diversos países, que são seus

sócios. E são esses países que elaboram e deliberam sobre as políticas dessas instituições.

Portanto, não se pode pensar a relação estabelecida entre as IFMs e seus membros como

sendo de mão única, de imposição externa, e sim como uma relação pactuada e, às vezes,

conflituosa, dado os diferentes interesses em jogo entre os países e no interior de cada um

deles.

A correlação de forças no interior das IFMs é definida tendo como base o poder

econômico de cada país – refletido no número de ações que o mesmo detém na composição

Page 50: A Integração Sul-americana e o Brasil:o protagonismo brasileiro na implementação da IIRSA

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do capital do banco; pela capacidade de negociação com outros governos; pela definição clara

dos objetivos e interesses a serem defendidos pelo país nessas instituições, entre outras

questões.

Como o Brasil é uma das nações mais industrializadas do mundo, o segundo parque

industrial do continente americano, com dimensões continentais, conta com um enorme

mercado interno, além de ser um grande tomador de empréstimos e um ótimo mutuário, tem

peso importante dentro das IFMs – do BID, em particular.

O Banco Interamericano de Desenvolvimento é uma instituição financeira multilateral

regional que tem como acionistas não somente países do continente americano, com exceção

de Cuba, mas também nações do Oriente Médio, da Ásia e da Europa19. O poder de voto de

cada país membro no interior do banco é definido pela subscrição de capital. Nesse sentido, "a

divisão aproximada das subscrições é a seguinte: América Latina e Caribe, 50%; Estados

Unidos, 30%; Japão, 5%; Canadá, 4%; outros países não-mutuários, 11%” (BID, 2000b).

Brasil e Argentina estão empatados em segundo lugar enquanto acionistas do BID, e estes

juntamente com o México possuem quase o mesmo número de ações dos Estados Unidos. Ou

seja, governos como o brasileiro, mexicano e argentino são sujeitos ativos desse processo e,

juntamente com os EUA, os principais responsáveis pela orientação política do banco no

nosso continente.

Em relação à integração regional latino-americana, o BID tem atuado no intuito de

contribuir para adaptar essa parte do continente a uma economia global, estimulando a

realização de acordos comerciais regionais e sub-regionais, a fim de que os países da região

consigam atrair investimentos privados e tenham acesso aos mercados internacionais.

Atualmente o BID tem somado esforços com a Organização dos Estados Americanos

– OEA e com a Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe –

CEPAL no estabelecimento da agenda continental, em função da constituição da Área de

Livre Comércio das Américas - ALCA a partir de 200520. Suas diretrizes políticas, que

orientam os financiamentos e o apoio técnico da instituição para o Plano Puebla-Panamá –

PPP e a IIRSA, têm como objetivo principal criar as condições para a integração econômica

19 Alemanha, Argentina, Áustria, Bahamas, Barbados, Bélgica, Belize, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Croácia, Dinamarca, El Salvador, Equador, Eslovênia, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Israel, Itália, Jamaica, Japão, México, Nicarágua, Noruega, Países Baixos, Panamá, Peru, Portugal, Reino Unido, República Dominicana, Suécia, Suíça, Suriname, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela. 20 Recentes declarações dos ministros das Relações Exteriores do Brasil e da Argentina deixaram claro a impossibilidade de a ALCA ser viabilizada já a partir do ano que vem.

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do continente – que passam pela redefinição do papel do Estado e a ampliação da participação

da iniciativa privada na economia regional:

El Banco posee instrumentos financieros y humanos idóneos para apoyar la promoción de la infraestructura regional. Sin embargo, su acción há sido limitada en ocasiones por restricciones financieras en los países miembros. Por ello, es importante incorporar al sector privado en el esfuerzo por modernización y expansión de la infraestructura regional. Com el ALCA, PPP, IIRSA y proceso de Cumbres Hemisféricas, el Banco há desarrollado outro nicho de especialización: apoyo colectivo en materia organizacional, logística, técnica y financiera en conjunto com otras organizaciones regionales. Esta colaboración para apoyar iniciativas de gran envergadura há sido una pieza clave para lanzarlas y hacerlas progresar. El Banco contribuye com el conocimiento de su personal y su neutralidad institucional que garantiza servicios calificados y homogéneos a todos los participantes (BID, 2003, p. 13)

Já a Corporação Andina de Fomento tem como sócios majoritários os países andinos

(Bolívia, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela). Além deles, Brasil, Chile, Jamaica, México,

Paraguai, Panamá e Trinidad e Tobago encontram-se entre seus acionistas. A partir de 1992 a

CAF “precisó su misión circunscribiéndola a dos pilares básicos: el desarrollo sostenible y la

integración regional” (CAF, 2003).

A CAF afirma estar inteiramente comprometida com a implementação da IIRSA,

desenvolvendo uma série de ações em áreas de fronteiras, apoiando o setor privado,

realizando encontros e outros eventos nos principais centros financeiros mundiais para

promover a Comunidade Andina, financiando diversos projetos previstos pela IIRSA e

participando ativamente do seu Comitê de Coordenação Técnica, entre outras iniciativas.

Como dissemos anteriormente, o Brasil tem assumido uma postura de liderança

regional no processo de implementação da IIRSA. Isto fica evidente nas movimentações

realizadas pelo governo brasileiro para ocupar posições estratégicas no interior do BID e da

CAF, que juntos têm enorme importância na consolidação da IIRSA.

Recentemente o Banco Interamericano de Desenvolvimento criou uma nova área de

atuação denominada Coordenação Especial para o Programa de Integração Física Sul-

americana, voltada "especificamente para o financiamento de projetos de infra-estrutura na

região" (Gazeta Mercantil, 06/08/03). Não por coincidência, o titular da nova coordenadoria é

o brasileiro Mauro Marcondes Rodrigues, oriundo do Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social - BNDES. Segundo Mauro Rodrigues, o foco do BID será o de "financiar

projetos conjuntos de integração física entre dois ou mais países da região montando, para

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isso, diferentes engenharias financeiras de acordo com as características e necessidades dos

projetos" (Gazeta Mercantil, 06/08/2003).

O fato dessa nova coordenadoria ser ocupada por uma pessoa oriunda do BNDES

também não deve ser considerado um mero acaso, posto que este banco tem tido importante

papel na concepção e financiamento dos projetos previstos pela IIRSA no Brasil e nos demais

países sul-americanos, juntamente com o BID e a CAF.

O BNDES é uma instituição poderosa. Seus recursos disponíveis anualmente para

investimento, em muito superam os destinados conjuntamente pelo Banco Mundial (BIRD) e

BID ao nosso país para o mesmo espaço de tempo21. Efetivamente, o BNDES é um dos

pilares do governo Lula para tornar a IIRSA uma realidade:

Os projetos de infra-estrutura ganham relevância também devido a prioridade dada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva à consolidação e ampliação do Mercosul, bem como à integração econômica e física dos países da América Latina. Neste sentido, vários empreendimentos já foram definidos no âmbito da Integração da Infra-estrutura Sul-Americana (IIRSA), que reúne todos os países do subcontinente. Também já é decisão do governo brasileiro que o BNDES será um dos pilares de financiamento desses projetos. Os outros dois devem ser a Corporação Andina de Fomento e o Banco Interamericano de Desenvolvimento” (Gazeta Mercantil, 17/09/2003)

Atualmente o BNDES está destinando recursos para o financiamento das exportações

de alguns dos países vizinhos, como a Argentina, e já mantém negociações com outros nessa

mesma perspectiva. A instituição também vem adquirindo crescente poder no interior da

CAF, onde elevou sua participação no capital desta de 2,5% para 5% e chegará ao final de

2004 com cerca de 10%. Esse fato é importante dado que a CAF:

é a maior agencia multilateral de fomento na América do Sul, com carteira de financiamentos de US$ 6,18 bilhões. Desse total, 76,5% referem-se a projetos de infra-estrutura. O Brasil tem participação de 8% na carteira da CAF, de quem obteve recursos para, entre outros projetos, a construção da rodovia que liga Manaus a Boa Vista (Roraima); a implantação da linha de transmissão da hidrelétrica de Guri (Venezuela) a Roraima; e o gasoduto que liga Santa Cruz de La Sierra (Bolívia) a São Paulo, com ramal para Porto Alegre (Gazeta Mercantil, 08/08/2003)

21 No dia 13 de abril deste ano o jornal Gazeta Mercantil publicou uma matéria intitulada “Governo Lula tem saldo negativo com BID e BIRD”. Nela consta a informação de que passados 14 meses do atual governo, o Brasil teve uma perda líquida de US$ 3,05 bilhões. Isto ocorreu porque o país contratou empréstimos no valor de US$ 2,40 bilhões, mas desembolsou cerca de US$ 5,54 bilhões no mesmo período. Entretanto, apesar da gravidade da situação relatada pela matéria, o que interessa nesse momento é destacar os valores em questão, posto que são inferiores aos recursos disponibilizados para investimentos somente pelo BNDES, um único banco público brasileiro.

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Em dezembro de 2002, ao final do governo Fernando Henrique Cardoso, o BNDES e a

CAF assinaram um Protocolo de Cooperação, do qual destacamos os seguintes pontos

(BNDES, 2002):

(a) As "Instituições" se comprometem a estabelecer um mecanismo apropriado para

intercâmbio de informações e experiências no campo da integração, da infra-

estrutura física, do comércio exterior e do desenvolvimento sustentável, com a

finalidade de conhecer o desenvolvimento de projetos e programas, assim como

para identificar oportunidades de negócios nos setores de atuação de ambas as

"Instituições".

(b) As "Instituições" estruturarão operações nas quais o "BNDES" venha participar

mediante o financiamento à importação de bens e serviços de procedência

brasileira, e a "CAF" mediante o financiamento de gastos locais e/ou recursos

complementares.

(c) As "Instituições", atendidos seus procedimentos operacionais, poderão apoiar

projetos na modalidade de co-financiamento, quando a finalidade de financiamento

for a constituição de "joint-ventures" de empresas brasileiras e de países acionistas

da "CAF".

Cada instituição poderá solicitar à outra carta de intenção de financiamento

conjunto para as oportunidades identificadas de apoio creditício ou co-

financiamento.

(d) As "Instituições" cooperarão mutuamente na identificação de programas de

comércio exterior e apoiarão, atendidos seus procedimentos operacionais,

esquemas de financiamento para micro, pequenas e médias empresas nos países

acionistas da "CAF"

Os termos do protocolo formalizado pelo BNDES com a CAF, além de evidenciar a

relevância da atuação do banco brasileiro no contexto sul-americano, ressalta um outro

elemento pouco explorado até aqui que diz respeito aos interesses de grupos econômicos do

Brasil e/ou associados ao capital internacional nos mercados e nos recursos naturais dos

países vizinhos. Os itens do protocolo destacados acima demonstram bem isso na medida em

que potencializam as exportações do Brasil para os países andinos, assim como a atuação nas

nações vizinhas de empresas brasileiras e estrangeiras aqui instaladas. Daí o porquê de o

Brasil buscar consolidar maior espaço dentro da CAF, ampliando sua participação no capital

acionário desta.

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Outros passos já foram dados pelo governo brasileiro para consolidar sua posição

junto à Comunidade Andina. A Bolívia já se associou ao Mercosul, o Peru já sinalizou

positivamente e a Venezuela já afirmou que se associará ao bloco, mesmo que os outros

países da CAN não o façam. O próprio secretário-geral da Comunidade Andina das Nações,

sr. Guillermo Fernández Soto, defendeu a aceleração das negociações entre esta e o Mercosul,

a fim de que fosse assinado um acordo de livre comércio entre os dois blocos até o final de

200322. Guilhermo Soto avaliou também que:

a proposta comunitária se enquadra na meta de criar um espaço sul-americano, que envolva valores como integração comercial, diálogo político, defesa das instituições democráticas, integração física, cooperação financeira, proteção ao meio ambiente e desenvolvimento humano (Gazeta Mercantil, 25/08/03)

No que diz respeito às relações entre o BNDES e o BID, se pode afirmar que as

mesmas são consistentes. Como exemplo, basta ressaltar o fato de o primeiro ser o principal

parceiro do BID na América do Sul, com 14 operações realizadas até o ano passado. Além

disso, o banco brasileiro negociava, meses atrás, um empréstimo de cerca de US$ 1 bilhão

junto ao Banco Interamericano, e parte desse recurso já estava comprometido com o

financiamento de projetos previstos pela IIRSA (Gazeta Mercantil, 07/08/2003).

A relevância do BNDES no processo de integração regional da América do Sul é

inegável, dada a sua capacidade de investimento e suas profundas e sólidas relações mantidas

com o BID e com a CAF; e uma das formas que o governo brasileiro tem utilizado nos

últimos anos para ampliar a influência do país na região se dá justamente através do BNDES,

que há tempos deixou de ser uma instituição com atuação limitada ao território nacional23.

O outro aspecto da reflexão sobre a atuação do Brasil no processo de integração

regional diz respeito às relações existentes entre a IIRSA e os Eixos Nacionais de Integração e

Desenvolvimento. Segundo Dantas e Caldas (2003?), um estudo finalizado em 1996 por

Eliezer Batista - ex-secretário de Assuntos Estratégicos no governo Fernando Collor de Mello

e ex-dirigente da Companhia Vale do Rio Doce -, e patrocinado pela CAF e o Conselho

Empresarial para o Desenvolvimento Sustentado, entre outras entidades, já esboçava a

estratégia de integração física sul-americana como elemento impulsionador do

desenvolvimento regional, afirmando a necessidade de investimentos na ordem de US$ 600

22 O que efetivamente ocorreu. 23 Hoje, por exemplo, em seu portfólio de projetos se encontram a usina de Três Gargantas (China), o gasoduto Bolívia/Brasil, as barragens San Francisco (Equador) e Rio Blanco (Honduras).

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bilhões/ano num prazo de 10 anos para que o objetivo fosse alcançado. Ainda de acordo com

os autores:

(...) na origem do estudo de Eliezer esteve um pedido de Fernando Henrique Cardoso, quando ainda era ministro da Fazenda de Itamar Franco. Ele estava interessado no potencial estratégico do “Merconorte”, um acordo regional entre o Brasil e os países andinos. A idéia era a de se chegar, posteriormente, à união dos blocos do Norte e do Sul do subcontinente, em um projeto de integração da América do Sul semelhante ao que foi deslanchado na cúpula sul-americana realizada em Brasília

A integração física defendida no estudo de Eliezer Batista ancorava-se na noção de

“eixos de desenvolvimento” tal como prevista pela IIRSA na atualidade. Todavia, o fato

interessante a ser ressaltado neste momento é que esses “eixos” foram incorporados pelo

governo Fernando Henrique Cardoso como a sua estratégia de desenvolvimento para o Brasil,

materializada, de modo especial, no Plano Plurianual 2000-2003, mais conhecido como

Avança Brasil.

Dantas e Caldas [200-] afirmam que o Avança Brasil “abordou de forma tímida a idéia

de integrar os diferentes países sul-americanos”. Tal afirmação precisa ser relativizada. Isto

porque a idéia dos “eixos de desenvolvimento” já nasce mesmo numa perspectiva que

ultrapassa as fronteiras brasileiras, e isto ficou mais do que evidente nos eixos e projetos para

a integração econômica nacional previstos e priorizados nos PPAs 1996-1999 e 2000-2003,

elaborados durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso.

Mesmo que se diga que de 1996 a 200024 as negociações em torno da integração física

sul-americana não tenham conseguido deslanchar de modo acelerado25, a centralidade

adquirida pelos eixos de desenvolvimento nos planos do governo federal, a reorientação do

papel do BNDES para atuar no financiamento de projetos dos governos vizinhos – sobretudo

em relação a empreendimentos que se articulavam com as hidrovias, estradas e barragens que

estavam sendo implementados no Brasil, mostra que passos importantes para a integração

física sul-americana estavam sendo dados mesmo antes da formalização da IIRSA, e isto se

deve em grande parte ao protagonismo do governo brasileiro, representando os interesses de

poderosos grupos econômicos que atuam no mercado internacional.

24 1996 foi o ano da conclusão do estudo de Eliezer Batista e 2000 o ano da reunião em Brasília dos presidentes dos países da América do Sul. 25 Ainda mais porque foi um período extremamente conturbado no plano internacional com as crises financeiras na Ásia, por exemplo, cujos efeitos repercutiram pesadamente sobre as economias do sub-continente.

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De acordo com Bianca Nasser (2000), no PPA 1996-1999 foi introduzida a noção de

“macroeixos de desenvolvimento”, expressando um conceito e uma orientação da ação

governamental “para atender a objetivos como a correção de desequilíbrios regionais, a

integração entre as diversas regiões e a redução do fluxo migratório para as grandes cidades e

os custos de transporte” (NASSER, 2000, p. 165). Posteriormente, com base nos estudos que

serviram de referência para o referido PPA, se avançou para o estabelecimento:

de uma nova redivisão do território brasileiro com a utilização dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento, porém com um conceito de Eixo utilizado de forma mais ampla do que no PPA de 1996/99 e que se tornou o principal insumo para a elaboração do PPA de 2000/03 (...) (ibidem, p. 165-166)

Para realizar o estudo dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento – ENID

foi constituído o Consórcio Brasiliana, formado pelas empresas de consultorias Booz Allen &

Hamilton do Brasil Consultores, Bechtel International Incorporation e Banco ABN Amro,

contratadas pelo governo Fernando Henrique Cardoso e que ficaram sob a supervisão de

equipes do BNDES e do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Segundo o

relatório síntese apresentado pelo referido consórcio, estas foram as principais diretrizes do

estudo (NASSER, 2000, p. 167):

1. Assegurar a integração dos Eixos, nos níveis nacionais e internacional, com vistas à

competitividade internacional do país, à redução das disparidades regionais e ao

desenvolvimento sustentável, considerando a integração das regiões como fator de

competição internacional;

2. Orientar os investimentos básicos para a geração de novos negócios e novos espaços, com

o objetivo de geração de maior número de empregos;

3. Orientar os investimentos básicos para o aumento do valor agregado;

4. Destacar a dimensão informação e conhecimento (educação, capacitação científica,

empreendimentos e tecnologias de acesso à informação);

5. Introduzir inovação tecnológica e gerencial em empreendimentos de desenvolvimento

local;

6. Considerar o meio ambiente como área de oportunidade de implementação de

investimentos;

7. Considerar a importância crescente do setor de serviços na economia;

8. Adotar o conceito de rede intermodal de infra-estrutura econômica;

9. Identificar e ressaltar oportunidades de inserção internacional em cada espaço; e

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10. Destacar a integração do país com a América Latina e o caráter multilateral das relações

internacionais do país.

As diretrizes acima expressam de modo claro que os Eixos Nacionais de Integração e

Desenvolvimento somente têm razão de ser quando articulados com ações similares nos

países vizinhos. Por isso, o empenho do Brasil em garantir através das negociações

diplomáticas e comerciais mantidas nos últimos anos, que os demais governos sul-americanos

se engajem nesse processo de forma determinada.

Isto porque os governantes brasileiros parecem ter chegado à conclusão de que o

aumento da competitividade brasileira no mercado internacional depende, em boa parte, de

que a América do Sul esteja integrada. Daí que os projetos previstos no Avança Brasil e no

atual PPA do governo Lula eram e são compreendidos interligados a outros no exterior,

conforme veremos mais adiante em relação aos que são pensados para a Amazônia brasileira.

Com a incorporação dos ENID como pedra angular do planejamento governamental

durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, houve uma mudança substancial na

concepção do território nacional, posto que o recorte adotado não se prendia ao aspecto

político-administrativo, já que a definição dos eixos obedeceu os seguintes critérios: as vias

de transporte existentes, os focos dinâmicos identificados no país, a hierarquia funcional das

cidades e a diferença dos ecossistemas das diversas regiões brasileiras (NASSER, 2000, p.

168).

Um dos resultados práticos da aplicação desses critérios foi a divisão do território

nacional em nove Eixos: Arco-Norte, Madeira-Amazonas, Araguaia-Tocantins, Oeste,

Sudoeste, Transnordestino, São Francisco, Rede Sudeste e Sul. O Pará, por exemplo,

integrava os quatro primeiros eixos26. Os reflexos disto para o planejamento estadual, por

exemplo, precisariam ser melhor perscrutados em outros trabalhos..

O estudo elaborado pelo Consórcio Brasiliana definiu Eixo da seguinte maneira:

Eixo é um recorte espacial composto por unidades territoriais contíguas, efetuados com objetivo de planejamento, cuja lógica está relacionada às perspectivas de integração e desenvolvimento consideradas em termos espaciais. Nesse sentido, dois critérios devem ser levados em conta na sua definição e delimitação: a existência de uma rede intermodal de transporte de carga, efetiva ou potencial, permitindo a acessibilidade aos diversos pontos situados na área de influência do eixo; e a presença de possibilidades de estruturação produtiva interna, em termos de um conjunto de atividades econômicas que definem a inserção do eixo em um espaço

26 Falamos “integrava” porque em que pese o governo Lula estar dando seqüência aos ENID do PPA anterior, há outras iniciativas que valorizam o aspecto regional. Nesse caso, a Amazônia é vista como unidade constituída de entes federados. Ou seja, as relações entre os entes federados e a União parece ter se tornado ainda mais complexa, e merece ser refletida de forma mais precisa, escapando aos objetivos deste trabalho.

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mais amplo (nacional ou internacional) e a maximização dos efeitos multiplicadores dentro de sua área de influência” (NASSER, 2000, p. 168)

A justificativa para a definição e delimitação de um eixo é a capacidade de uma

determinada área geográfica gerar economia de escala e servir como pólo irradiador de

desenvolvimento para outras áreas. Nesse sentido, tanto a visão de eixo presente na IIRSA,

quanto na apresentada pelo Consórcio Brasiliana traz embutida uma expectativa futura de

produção, uma projeção sobre a potencialidade das regiões atendidas pelas obras de infra-

estrutura. Todavia, essas projeções podem servir muito mais para responder a interesses de

determinados segmentos econômicos – os empreiteiros, por exemplo – do que representar

uma necessidade real dessas obras.

Um estudo desenvolvido por Lima et alli (2000), por exemplo, questiona algumas das

projeções da produção agroindustrial no Brasil, que servem de base para a definição de um

conjunto de investimentos no setor de transporte. No caso do Mato Grosso, dizem eles que há

muita “disparidade nas avaliações sobre suas perspectivas de crescimento em curto, médio e

longo prazos” (p. 169). Entretanto, apesar dessas disparidades, a expansão da fronteira

agrícola mato-grossense tem sido utilizada para justificar um leque amplo de investimentos,

tais como: Ferronorte, hidrovias do Madeira, Teles Pires-Tapajós, do Araguaia, do Tietê-

Paraná e do Paraná-Paraguai, além da rodovia Santarém-Cuiabá. Isto sem falar no

inconveniente econômico da utilização de determinados percursos, mesmo sendo hidroviários,

dada a distância que há entre os centros produtores do Estado e alguns dos corredores de

transporte, que chegam a variar de novecentos a mais de dois mil quilômetros em certos

casos.

Por outro lado, os eixos estão profundamente vinculados ao objetivo de atendimento

de demandas externas. Daí que a possibilidade “de estruturação de atividades produtivas

internas” poderá não ocorrer do modo esperado, mas sim através do estabelecimento de

relações verticais entre grandes empresas produtoras e o mercado externo, sem efetiva

geração de uma cadeia produtiva horizontal27.

Apesar dos riscos citados acima, a lógica da implantação dos eixos como pedra

angular do desenvolvimento nacional atravessou os dois mandatos do presidente Fernando

Henrique Cardoso e permaneceu como elemento estruturante da política do governo Lula.

Contudo, a vinculação entre os ENID e a IIRSA parece ter adquirido ainda maior importância

27 Como a que se evidencia com as empresas de alumínio presentes na Amazônia.

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na estratégia do atual governo, materializada no PPA 2004-2007, também conhecido como

Plano Brasil de Todos:

Cada vez mais o destino das regiões depende de uma dimensão nacional e crescentemente relacionada à América do Sul e ao conjunto da dinâmica internacional. Isto muda o enfoque do planejamento e do desenvolvimento exclusivamente nacional e implica uma estratégia de fortalecimento e de integração das logísticas de infra-estrutura na América do Sul, na construção progressiva de um destino comum para o continente. É uma alteração deliberada de perspectivas do desenvolvimento que se orienta para o oeste, novamente contrabalançando o excessivo adensamento econômico do litoral (BRASIL, 2003, p. 29)

O objetivo de integrar a infra-estrutura da América do Sul aparece de forma nítida em

outras partes do Plano Brasil de Todos, vinculada à idéia de modernização econômica,

aumento da competitividade sistêmica nacional, redução do custo-Brasil e diversificação da

pauta de exportação. Ou seja, a inserção competitiva brasileira no cenário internacional

depende, em parte, segundo as diretrizes presentes no PPA 2004-2007, do êxito do país em

conseguir a integração sul-americana. Isto exigirá um gigantesco esforço diplomático e

comercial do Estado brasileiro para que este fim seja alcançado.

O interesse do Brasil na integração da América do Sul e a importância política e

econômica dessa iniciativa para o país foi enfatizada no discurso do sr. Marco Aurélio Garcia,

Chefe da Assessoria Especial da Presidência da República, durante o Seminário de

Prospecção de Projetos, realizado pelo BNDES em conjunto com a Corporação Andina de

Fomento, em agosto de 2003:

A política sul-americana do governo Luiz Inácio Lula da Silva tem como um dos elementos centrais a busca desta integração física do continente. No suposto de que esta integração física será também a premissa de uma integração política, num momento em que o mundo vive incertezas – seja do ponto de vista econômico, seja do político – em que cada vez mais uma perspectiva multilateral se afirma como necessária, é evidente que dar consistência à política da região, estreitar os laços e buscar uma interligação econômica e sobretudo uma atividade política mais articulada, é elemento essencial (BNDES, 2003)

E a Amazônia? Como ela se insere nesse esforço de integração da economia brasileira

e da infra-estrutura sul-americana?

Sem dúvida alguma, o fato de a Amazônia brasileira fazer fronteira com sete países

sul-americanos, se converteu hoje em uma nova fonte de oportunidades para o grande capital,

em especial. Aquilo que no passado era visto com apreensão e elemento de risco à segurança

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nacional, hoje é encarado como um dado favorável à afirmação do Brasil enquanto liderança

regional do processo de integração:

A orientação observada na política nacional é a de traçar medidas que reforcem a integração de mercados com os países que se alinham nas amplas fronteiras da região amazônica, sob a liderança pretendida do Brasil. Essa dinâmica do jogo equaciona, a nosso ver, de outra forma, o lugar da Amazônia na atual geopolítica, como estratégia nacional. É possível que se esteja inclusive em face de uma revisão da noção de fronteira, não mais somente como espaço de (re)conquista e ocupação de atores econômicos e sociais, de novos usos dados aos recursos naturais, mas como fronteira cujo papel político é redefinido pela sua capacidade de potencializar a integração de mercados para além dos limites nacionais, substituindo a noção de mercados protegidos, valorizada no discurso nacionalista (CASTRO, 2001, p. 7)

Entretanto, ao mesmo tempo em que se observa uma mudança qualitativa na atuação

do Estado brasileiro em relação à Amazônia, por conta do papel desta para a integração

regional, observa-se a permanência de um discurso conservador que reproduz velhos

estereótipos, como os que enfatizam o atraso econômico da região, a suposta irracionalidade

econômica das atividades produtivas das populações tradicionais da região, as imensas

riquezas pouco exploradas, o pequeno número de habitantes, o isolamento do restante do país

e outros mais. Discurso este que serve para justificar na atualidade a retomada de grandes

projetos de infra-estrutura na Amazônia, principalmente nas áreas de transporte e de energia.

Hoje, assim como no passado, o discurso oficial bate na tecla do fim do isolamento regional:

Há pouco tive a oportunidade de afirmar que a política do meu Governo em relação à Amazônia é a mesma dos meus antecessores. Ela não se modificou. Desde o Governo Castelo Branco, que lançou um programa de ressurgimento de toda a Amazônia, programa continuado no Governo Costa e Silva e que teve um extraordinário relevo no Governo do Presidente Médici, sobretudo através da construção da Transamazônica, este programa continua em vigor e ativado. É claro que ele apresenta nuanças, variações decorrentes das mutações que se operam na própria área, das nossas condições internacionais, das dificuldades que a crise nos apresenta. A intensidade do programa, então, pode modificar-se. Os pontos de aplicação podem variar, mas o programa sobrexiste, tem o mesmo propósito e será levado ao fim, dentro do maior objetivo de integrar esta imensa região na comunidade nacional. Vamos dar a essa região um desenvolvimento compatível com os nossos recursos, acabar com o seu isolamento e fazer com que através dela a vitalidade do Brasil se torne maior do que tem sido hoje” (GEISEL, 1976, p. 44)

No que tange aos novos projetos de infra-estrutura previstos para a região amazônica,

estes sofreram mudanças substanciais em termos de concepção. É o caso da construção de

novas hidrelétricas, por exemplo, onde a demanda não se reduz somente à produção e

distribuição de energia. Não! Agora, além disso, as hidrelétricas têm também a função de

contribuir para dotar os rios amazônicos de condições de navegabilidade para embarcações de

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grande calado, adequadas para o transporte de um volume maior de produtos direcionados ao

mercado internacional. Hidrelétricas e eclusas são pensadas de forma conjunta. Daí, que

energia e transporte sejam partes de uma mesma estratégia, diferentemente do que ocorria no

passado em que uma não estava necessariamente acoplada a outra, como no caso das eclusas

de Tucuruí em relação à barragem. O caso do Complexo do Rio Madeira, comparado por

Carlos Lessa, presidente do BNDES, à construção de Brasília, é exemplar dessa visão

integrada dos novos projetos:

Com custo aproximado de R$ 14 bilhões, ou cerca de US$ 5 bilhões, o projeto envolve a construção de duas usinas elétricas, entre 4 mil e 4,8 mil quilômetros de aquavias e 30 milhões de hectares destinados ao plantio de soja, visando à ocupação de fronteira. Segundo Lessa, o Complexo do Rio Madeira completa um processo de ocupação do interior da América Latina, com imensa potencialidade para o agronegócio (Agência Brasil, 06/08/03)

A ampliação da monocultura da soja para o território amazônico é um bom exemplo

das novas funções designadas para projetos como o Complexo do Rio Madeira que, de forma

alguma, pode ser compreendido apenas como um grande empreendimento hidrelétrico. Essa

obra, por exemplo, assume um componente geopolítico de triplo significado na medida em

que, de um lado, busca consolidar a “ocupação do oeste” ou do “interior” brasileiro; de outro,

serve como instrumento de negociação com a Bolívia para assegurar a exploração de recursos

naturais daquele país, como o gás, e, por último, é componente relevante da estratégia de

integrar as bacias do Prata e do Amazonas por via fluvial.

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Figura 7: Integração das Bacias do Prata e Amazônica

Fonte: http://www.cid.harvard.edu/andes/CompetitividadyDesarrollo/sosa.pdf

As obras previstas pelo governo brasileiro na Amazônia, assim como em outras

regiões do país, já nascem com uma perspectiva internacional. Isto porque elas são concebidas

de forma integrada às obras que estão sendo ou que serão realizadas nos países vizinhos;

muitas delas com financiamento brasileiro. Ou seja, é a parte que cabe ao Brasil para a

implementação dos eixos de integração previstos pela IIRSA.

O quadro abaixo, demonstrativo de algumas dessas obras na Amazônia, deixa claro

que somente um olhar panorâmico sobre elas é capaz de fazer compreender o real significado

das mesmas, posto que elas são partes constitutivas da estratégia brasileira de viabilizar a

integração sul-americana:

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Quadro 3: Investimentos no setor de transporte rodoviário na Amazônia brasileira

REGIÃO OBRA PREVISTA JUSTIFICATIVA Acre BR 317 – Rio Branco/divisa

Acre – Amazonas Interligar a cidade de Rio Branco à divisa do Acre com o Amazonas e à cidade de Boca do Acre (AM), às margens do rio Purus

BR 317 – Brasiléia - Assis Brasil

Integrar o Acre ao sistema rodoviário nacional e promover a ligação do Brasil com a Bolívia e o Peru, propiciando uma saída para o Pacífico

BR 364 – Sena Madureira - Rio Liberdade

Integrar o Acre ao sistema rodoviário nacional; promover a integração econômica da Fronteira Norte do Brasil, com escoamento de produtos agroindustriais e favorecer o ecoturismo

BR 364 – Anel Rodoviário de Rio Branco

Facilitar o tráfego na interconexão com as BRs 317 e 364 nos acessos à cidade de Rio Branco

Amazonas BR 317 – Boca do Acre/divisa Amazonas – Acre

Interligar a cidade de Boca do Acre à divisa do Acre com o Amazonas e à cidade de Rio Branco, capital do Acre

BR 220 – Humaitá – Lábrea Interligar a Região Norte no trecho compreendido entre o rio Purus e Madeira, possibilitando o estabelecimento do transporte intermodal e o escoamento dos produtos agropecuários produzidos. Além disso, permitirá melhor atendimento médico-hospitalar e suprimento de gêneros de primeira necessidade às populações extremamente carentes localizadas na região

Roraima BR 401 – Boa Vista – Normandia

Promover a ocupação e segurança da Fronteira Norte do Brasil; facilitar o tráfego na região, em qualquer época do ano, por via pavimentada, e interligar o Brasil à Guiana e aos países do platô das Guianas

Amapá

BR 156 – trecho Ferreira Gomes – Oiapoque

Integrar o Amapá ao sistema rodoviário nacional e interligar o Brasil aos países vizinhos da região Norte: Guiana Francesa, Suriname e Guiana. Possibilitar a utilização do Porto de Macapá pelos países vizinhos para seu intercâmbio comercial

Pará BR 163 – trecho divisa Pará/Mato Grosso – Santarém

Promover a fluidez do tráfego com segurança; reduzir o tempo de viagem no principal eixo de ligação da região Norte ao Centro-Oeste e escoar produtos agrícolas, destacando-se a soja através do porto de Santarém

BR 230 – trecho divisa Pará/Tocantins – Marabá – Altamira – Itaituba

Interligar a BR 230 com as BRs 153, 158, 222 e 422; melhorando o escoamento da produção agrícola e beneficiando a população dos municípios estabelecidos na área de influência da rodovia no estado do Pará, ampliando a ligação pavimentada com o Tocantins

Mato Grosso BR 364 – trecho Diamantino – Sapezal – Comodoro

Promover o escoamento da safra na fronteira agrícola do Estado do Mato Grosso até os portos de Porto Velho/RO e Itacoatiara/AM

Fonte: PPA 2000-2003 – http://www.abrasil.gov.br/

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O ponto em comum entre todas as obras previstas acima é a sua perfeita sintonia com

os eixos de integração previstas pela IIRSA. No caso do Acre, por exemplo, sua capital Rio

Branco vai se constituir num ponto de interseção importante em direção a leste com os eixos

Peru-Brasil-Bolívia e daí com o Andino no sentido do Pacífico, assim como em direção ao

Norte (Escudo Guyanes e Multimodal do Amazonas) e ao Sul do continente (Andino Sul, do

Sul e Interoceânico, entre outros).

A mesma leitura integracionista pode ser feita tendo como referência os ENID

previstos pelos estudos do Consórcio Brasiliana. Nesse caso, pode-se dizer que Rio Branco

estará conectada diretamente aos eixos Madeira-Amazonas e Oeste e daí aos demais (Arco

Norte, Araguaia-Tocantins, Sudoeste, Transnordestino, São Francisco, Rede Sudeste e Sul),

que, por sua vez, estão todos articulados aos eixos definidos pela IIRSA.

As obras rodoviárias previstas para os demais estados da Amazônia Legal reproduzem

a mesma característica integracionista das do Acre. Esse é o elemento comum a todas elas.

Reduzir o tempo de viagem, ocupar e integrar a Amazônia, favorecer o escoamento da safra

agrícola da região e de outras partes do Brasil são alguns dos argumentos utilizados para

justificar as obras rodoviárias; argumentos que não diferem substancialmente de tantos outros

surgidos ao longo dos anos para defender a execução de grandes projetos de infra-estrutura

nessa parte do país. Até mesmo a questão da segurança reaparece no discurso oficial, como no

caso da BR 401. E é somente numa única ocasião que a questão social é apresentada como

uma das justificativas para a implementação do projeto rodoviário: trata-se da BR 220.

Outra questão relevante, que pode ser apreendida desse quadro de obras, diz respeito

ao fato de que ele explicita as funções que são destinadas à Amazônia nessa tentativa de

integração, que é torná-la um grande corredor de mercadorias tanto para dentro quanto para

fora do país, e ao mesmo tempo mantê-la como exportadora de produtos primários e de

energia para o exterior e para os centros econômicos mais dinâmicos do Brasil. Nessa

empreitada encontramos o governo federal e seus aliados na região (governos e

parlamentares, principalmente), grupos empresariais do Brasil e do exterior, além das

Instituições Financeiras Multilaterais.

Um outro exemplo de carteira de projetos prevista pelo governo brasileiro para a

Amazônia, que já traz embutido desde o nascedouro o “gene” integracionista está vinculada

ao setor de comunicações.

O quadro abaixo apresenta os projetos previstos pelo Ministério das Comunicações do

governo Fernando Henrique Cardoso para a Amazônia. Talvez o aspecto mais interessante do

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56

mesmo seja o relacionado às referências feitas aos empreendimentos que devem ser ou que

serão executados de modo integrado nos países vizinhos, todos eles vinculados aos eixos da

IIRSA.

Quadro 4: Investimentos no setor de comunicações na Pan-Amazônia

EIXO PROJETO/FINALIDADE ABRANGÊNCIA Venezuela-Brasil-Guiana-Suriname

Projeto Backbone28 de Internet – prover acesso à internet para usuários domésticos como corporativos na área abrangida pelo eixo. Projeto Telefonia Celular (Roaming) – permitir ao usuário viajante utilizar o seu aparelho celular nas viagens nos países envolvidos. Projeto TV Digital – estabelecer um padrão de TV Digital para a América do Sul e dotar as populações de meios de acesso à TV Digital.

Brasil: Macapá, Porto Grande, Oiapoque, Manaus e Boa Vista. Guiana Francesa: Cayenne, Saint Laurent du Maroni. Suriname: Paramaribo, Bakhuls e Apoera. Guiana: Corriverton, Georgetown e Lindlen. Venezuela: S. Elena de Guairén, El Dorado, Ciudad Bolivar, Barcelona e Caracas

Amazonas Projeto Backbone de Internet Projeto Telefonia Celular (Roaming) Projeto TV Digital

Brasil: Belém, Macapá, Santarém, Itacoatiara, Manaus e Tabatinga. Peru: Leticia, Iquitos, Nauta, Srameriza, Yurimaguas, Corral Quemado, Osmos, Piura e Paita. Colômbia: Arica, El Encanto, Gueppi, Mocoa, Pasto, Tumaco e Bogotá29. Equador: Quito e Esmeraldas.

Peru-Brasil-Bolívia Projeto Backbone de Internet Projeto Telefonia Celular (Roaming) Projeto TV Digital

Brasil: Porto Velho, Guajará Mirim, Sena Madureira30, Brasiléia31, Rio Branco e Assis Brasil. Bolívia: Cobija, Pto. Health, Guayaramerin e La Paz. Peru: Iñapari, Puerto Maldonado, Inambari, S. Gabán, Cuzco, Urcos, Juliaca, Puno, Desaguadero32, Arequipa, Maratani, Moquega e Ilo33.

Fonte: Brasil - Ministério das Comunicações 28 Backbone - Em português, espinha dorsal. O backbone é o trecho de maior capacidade da rede e tem o objetivo de conectar várias redes locais. No Brasil, foi a RNP (Rede Nacional de Pesquisa) que criou o primeiro backbone da Internet, a princípio para atender entidades acadêmicas que queriam se conectar à rede. Em 1995, a Embratel começou a montar um backbone paralelo ao da RNP para oferecer serviços de conexão a empresas privadas. Os fornecedores de acesso costumam estar ligados direta e permanentemente ao backbone. Ver http://www.ondeir.rec.br/informatica/dicionario.asp 29 Bogotá está incluída somente no Projeto Telefonia Celular (Roaming). 30 Sena Madureira não será atendida pelo Projeto TV Digital. 31 Brasiléia não será atendida pelos Projetos Backbone de Internet e Telefonia Celular (Roaming). 32 Desaguadero não será atendida pelo Projeto TV Digital. 33 Moquega e Ilo não serão atendidas pelos Projetos Backbone de Internet e Telefonia Celular (Roaming).

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Com base no quadro acima, pode-se observar que não somente as grandes cidades

aparecem enquanto beneficiárias diretas dos projetos do setor de comunicações, como Belém,

Manaus (no caso do Brasil), ou ainda Bogotá e Quito. Incluem-se nesse rol pequenas e médias

cidades que, dessa forma, são incorporadas à estratégia perseguida com a implementação dos

eixos de integração.

Ao refletir sobre um tipo de literatura que entende a globalização como oportunidade

de desenvolvimento para as grandes cidades, Ribeiro (2000, p. 13) ressalta que o nexo

produtivo é entendido como um dos nexos estruturais “entre a dinâmica urbana e o

desempenho macroeconômico”, posto que “a obsolescência e a deficiência da infra-estrutura

urbana reduzem a produtividade das empresas e, portanto, a produtividade agregada da

economia” (ibdem).

Sena Madureira, Porto Grande, Oiapoque, Itacoatiara ou Santarém não são grandes

cidades, mas serão atendidas por modernos serviços de comunicação. E é notório que tais

serviços são importantes para o pleno desenvolvimento das atividades econômicas que a

IIRSA e os ENID pretendem estimular, na medida em que a comunicação é um dos elementos

vitais para garantir a competitividade das empresas participantes da dinâmica da globalização

capitalista, principais beneficiárias dessas políticas.

Na Amazônia esse processo não está restrito às grandes cidades e precisa, por isso

mesmo, ser analisado de forma mais cuidadosa por aqueles envolvidos na reflexão sobre o

urbano nessa região, a fim de compreender melhor as particularidades dessa dinâmica.

Até aqui buscou-se demonstrar o papel protagonista exercido pelo Brasil para a

implementação da estratégia de integração da infra-estrutura física e econômica da América

do Sul. As ações do governo brasileiro nas negociações comerciais e nas discussões sobre o

financiamento do desenvolvimento buscam reafirmar a cada momento a hegemonia do Brasil

na região. As movimentações dos representantes brasileiros no interior da CAF e do BID, e o

papel exercido pelo BNDES nos governos Fernando Henrique Cardoso e Lula, confirmam o

interesse brasileiro na integração sul-americana, desde que sob sua coordenação.

Por sua vez, a Amazônia assume importância geopolítica e geoeconômica para a

materialização dessa estratégia integracionista. Todavia, tal estratégia não está voltada ao

atendimento dos interesses das comunidades indígenas, ribeirinhas, extrativistas, agricultores

familiares e outros segmentos, que não estão “aptos” à competição imposta pelas “forças do

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mercado”. Tudo leva a crer que esses setores serão os mais atingidos pelos efeitos negativos

desse processo, profundamente excludente do ponto de vista social e ambiental.

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IV. Notas conclusivas O capitalismo neste início do século XXI parece esgarçar toda e qualquer relação

social a um patamar que coloca em xeque o próprio futuro da humanidade. A diferença entre

pobres e ricos se acentua cada vez mais no plano internacional, ampliando o fosso existente

entre os países. Todavia, a crise social não está restrita aos países pobres, posto que ela

também está presente, de forma cada vez mais aguda, no interior das nações industrializadas

do centro capitalista.

Se a globalização possibilita o desmoronamento das fronteiras para a livre circulação

do capital especulativo, por outro lado, não é capaz, por sua própria natureza, de incorporar

milhões de excluídos em busca de emprego e de uma vida digna fora de seus países de

origem. Muros físicos e institucionais se erguem a cada momento para impedir a livre

circulação de pessoas, principalmente as oriundas da América Latina, África e de outras

regiões capitalistas periféricas.

De um lado, temos os Estados Unidos e Rússia com capacidade militar de pôr em risco

a continuidade da própria civilização, em que pese a disparidade existente na atualidade entre

os dois países, posto que o primeiro destina somente para as suas forças armadas recursos

correspondentes a todo o Produto Interno Bruto do segundo; de outro, presencia-se o

definhamento de Estados Nacionais mergulhados em guerras tribais e/ou étnicas.

A crise ambiental é outro grave problema deste período. A concentração populacional

em um número cada vez menor de cidades do planeta tem evidenciado o caráter insustentável

das mesmas. O desaparecimento acelerado de espécimes animais e vegetais, e a contínua

poluição e desperdício dos estoques de água doce são algumas das formas de como se

materializa essa crise para indivíduos e comunidades dos quatro cantos do planeta.

Entretanto, ao lado disso, surgem grupos e organizações das sociedades civis

articuladas em torno de bandeiras de lutas e de ações de caráter internacional, denunciando o

caráter insustentável do modelo de desenvolvimento defendido pelos governos dos países

centrais, assim como por instituições financeiras multilaterais e empresas multinacionais,

entre outros. Daí os protestos que tais grupos de pressão da sociedade civil exercem contra os

tratados de livre comércio, as políticas do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial

e da Organização Mundial do Comércio, a proliferação das armas nucleares, a intervenção

militar patrocinada pelos países ricos ao redor do mundo e o ataque aos direitos humanos,

somente para ficar nesses exemplos de mobilização internacional.

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Toda essa situação parece não deixar dúvidas sobre a incapacidade dos Estados

Nacionais de responderem adequadamente aos desafios históricos do momento. Tal

pensamento encontra correspondência nos argumentos de alguns dos autores citados neste

trabalho, defensores da idéia de que os Estados-Nação encontram-se completamente

subordinados aos interesses do mercado financeiro, das empresa multinacionais e das

Instituições Financeiras Multilaterais, constituindo-se dessa forma em meros “gestores de

negócios secundários”.

O fato é que os Estados Nacionais não são atores unitários e nem representam

interesses nacionais únicos, e a própria mobilização internacional da sociedade civil corrobora

tal afirmação. É fato também que as condicionalidades criadas pelos países ricos para que os

demais tenham acesso a recursos para o financiamento do seu desenvolvimento, estão

acopladas a uma agenda das chamadas reformas estruturais que, diferentemente do que é

apregoado pelos seus defensores, têm aumentado ainda mais as desigualdades entre as nações,

bem como as existentes no interior de cada país. Isto sem falar no caráter ideológico que

acompanha e realimenta o receituário liberal.

Entretanto, não se pode negligenciar as opções políticas feitas no interior de cada país

pela adoção ou não da agenda que interessa às nações mais poderosas. A não ser que se

acredite firmemente na inexorabilidade das premissas políticas, econômicas e sócio-culturais

da globalização capitalista.

Os Estados-Nação são construções históricas. Essa afirmação parece óbvia. Não

obstante, é necessária para que não se perca de vista as particularidades presentes na

constituição de cada um deles. Isto posto, torna-se inconcebível falar do exercício de

soberania por parte desses Estados como algo transcendente ou alheio aos condicionantes

históricos. Dito de outra forma, soberania está associada à correlação de forças e à capacidade

de hegemonia num dado momento, entre outras coisas. Dessa forma, torna-se irreal falar de

perda de soberania colocando no mesmo patamar todos os Estados Nacionais. Evidentemente

Estados Unidos não pode ser comparado ao Chile, nem o Brasil ao Haiti.

Os Estados-Nação estão entre os principais protagonistas da globalização capitalista.

Porém, somente alguns realmente exercem esse papel de forma a impor aos demais os

interesses dos segmentos que os hegemonizam. Para isso fazem guerra, fecham acordos,

vetam resoluções das Organizações das Nações Unidas, determinam os parâmetros das

negociações no interior dos organismos multilaterais, espionam, pressionam, boicotam,

impõem sanções e utilizam muitos outros instrumentos de “persuasão” ao seu dispor.

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O Estado brasileiro nunca esteve entre os mais poderosos do planeta. Todavia, na

América do Sul, Brasil e a Argentina sempre mantiveram pretensões hegemônicas sobre essa

parte do continente americano, tendo provocado diversos conflitos entre governos das duas

nações ao longo da história. No século XIX, por exemplo, Sáenz Peña identificou Brasil e

Estados Unidos como perigosos às nações hispanoamericanas, argumento utilizado como uma

das justificativas para combater a proposta de integração regional apresentada na I

Conferência Panamericana.

Hoje, porém, a gravidade da crise política, econômica e social argentina retirou deste

país a condição de disputar com o Brasil a liderança sul-americana. E é essa ausência, ao

menos momentânea, de um adversário de peso, que faz do Brasil o principal interlocutor do

processo de integração regional.

A integração econômica da região passou a ser nos últimos anos uma das principais

políticas do Estado brasileiro,34 principalmente a partir do governo Collor através dos

primeiros estudos coordenados por Eliezer Batista, cujos resultados se tornaram mais tarde a

base da estratégia de desenvolvimento nacional, consubstanciada nos Eixos Nacionais de

Integração e Desenvolvimento presentes nos Planos Plurianuais dos dois mandatos de

Fernando Henrique Cardoso, e mantida na sua essência no Plano Brasil de Todos do governo

Luiz Inácio Lula da Silva.

Não é exagero afirmar que os ENID já nasceram com uma perspectiva internacional,

posto que, desde o início, guardam estreita correspondência com outros projetos previstos

pela IIRSA nos demais países sul-americanos e mesmo no Brasil. Por sua vez, a IIRSA está

articulada a outras iniciativas importantes de integração existentes no continente americano,

como o Plano Puebla-Panamá. Tais iniciativa são elementos importantes para tornar possível

a constituição da Área de Livre Comércio das Américas; um dos maiores objetivos dos

Estados Unidos na região.

Ocorre que, para o governo Lula, o processo de integração regional deve servir para

consolidar a liderança do Brasil na América do Sul, em vista da inserção competitiva do país

no mercado internacional, bem como da sua afirmação enquanto global player,35 o que em

muitos momentos se choca com os interesses estadunidenses. Essa inserção internacional

34 Quando falamos de Estado brasileiro não estamos nos referindo a uma estrutura alheia às disputas presentes no interior da sociedade, como se fosse um ente autônomo. Tais políticas são a materialização dos interesses dos segmentos sociais que hegemonizam o aparelho estatal, vinculados ao processo de globalização capitalista. Pode-se destacar entre eles o agronegócio e poderosos grupos empresariais dos setores automobilístico, eletrointensivo, mineração e calçadista.

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significa não somente atingir os mercados de outros continentes, como também ampliar o

máximo possível os mercados dos países vizinhos às empresas brasileiras - associadas ou não

aos grupos empresariais multinacionais que atuam no Brasil.

No PPA do governo Lula, a idéia de que o desenvolvimento econômico brasileiro, ou

em outras palavras, a inserção competitiva do Brasil no mercado internacional, passa pela

integração sul-americana e, por conta disso, tornou-se uma das diretrizes centrais da política

externa do país. Não é mero acaso, portanto, o maciço investimento da diplomacia brasileira e

de outras importantes instituições governamentais, como o BNDES, além do próprio

presidente da República, no sentido de estreitar as relações com os países vizinhos.

A atuação dos representantes do governo brasileiro no interior de instituições como a

CAF e o BID consiste em garantir a liderança do país no processo de integração sul-

americana. Ou seja, que a agenda de negociação e os projetos de interesse do Brasil sejam

contemplados nos acordos que estão sendo firmados pelos países da região.

Por necessitar de grande quantidade de capital para ser implementada, a IIRSA traz em

seu bojo toda uma rede de mecanismos para atrair a iniciativa privada, a fim de que participe

de todas as fases da estratégia, desde a concepção dos projetos até a posterior gestão dos

empreendimentos.

Não obstante, a integração física prevista pela IIRSA será insuficiente para alavancar o

comércio intra-regional, de acordo com os seus formuladores e/ou apoiadores, se os Estados

Nacionais não negociarem e firmarem acordos para compatibilizar suas legislações e regras

aduaneiras, resolverem problemas fronteiriços, entre outros. Além disso, é necessário que

cada país tome a iniciativa de melhorar e ampliar sua própria infra-estrutura física, o que o

Brasil já vem fazendo através dos ENID.

Quanto à Amazônia brasileira (ou a Pan-Amazônia), por ser uma região de grande

importância para a articulação dos diversos projetos previstos pela IIRSA, em vista da

conexão da América do Sul com os mercados de países de todos os continentes, bem como

pela riqueza da sua biodiversidade, vivenciará possivelmente outra fase de instalação de

grandes projetos de infra-estrutura, tal como ocorreu há alguns anos antes da crise alastrada

pela região a partir da década de 80 do século passado. A tendência, portanto, é que esses

empreendimentos atinjam regiões da Amazônia ainda relativamente preservadas, fazendo com

35 Um país capaz de manter relações comerciais diversificadas com várias nações, a fim de não se tornar tão dependente, como ocorre com a economia do México em relação a dos Estados Unidos.

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que recrudesça o desmatamento, a proliferação e/ou expansão de núcleos urbanos, o êxodo

rural e a degradação ambiental.

Buscou-se mostrar neste trabalho que a IIRSA está fundamentalmente voltada ao

atendimento das demandas dos segmentos com forte atuação no mercado internacional. Estes

podem ser considerados os maiores vencedores desse processo, caso consigam implementar a

IIRSA da forma como ela vem sendo negociada. Por conseguinte, faz-se necessário agora

finalizar esta reflexão dedicando espaço para um breve comentário sobre os excluídos dessa

política integracionista, ou seja, todos aqueles que não se adeqüem ao jogo e às regras do

grande capital.

No documento intitulado “Além das Fronteiras, o Novo Regionalismo na América

Latina”, o BID (2002, 21) aborda sobre a necessidade de um plano de ação para “proteger os

perdedores”36. Para que tal proteção seja efetivada o referido plano propõe a adoção de

medidas como:

• Realização de programas de treinamento e procura de emprego que possam suavizar a

transição e ajudem os trabalhadores substituídos a se reciclar, tornando-os mais produtivos

rapidamente;

• Implementação do seguro-desemprego e de programas de garantia de renda;

• Criação de redes de segurança social;

• Aperfeiçoamento da educação;

• Medidas para sanar a desigualdade regional (internamente a cada país);

• Conscientização pública sobre a necessidade de que à abertura dos países no Sul

corresponda o desmantelamento das barreiras comerciais no Norte.

Como se vê, o plano de ação prioriza as políticas de caráter compensatório como meio

de combater as conseqüências da implementação dos grandes projetos de infra-estrutura nessa

parte do continente americano, assim como das perdas de direitos sociais, previdenciários e

trabalhistas advindas das reformas, que são partes constitutivas da estratégia do novo

regionalismo, entre outras coisas.

O referido plano também reafirma a orientação política dos últimos anos para o setor

educacional, colocando-o a serviço do atendimento das “necessidades do mercado”.

36 O documento em questão aborda esse assunto da seguinte forma: “Dado que a a teoria e a experiência mostram que as iniciativas comerciais e de integração adequadamente planejadas podem gerar benefícios líquidos e que suas vantagens não são distribuídas eqüitativamente, a política social recomendada nesse terreno precisa concentrar-se numa maneira de proteger os perdedores e facilitar o processo de ajuste do mercado de trabalho” (p. 21)

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Talvez o mais importante disso tudo é o reconhecimento, ainda que a contragosto, de

que a integração materializada pela IIRSA provocará desigualdades. Entretanto, as medidas

propostas em nada alteram a essência da estratégia em execução. Pelo contrário, reforçam e

realimentam a mesma, restando aos países do Sul, depois de terem aberto suas economias,

esperar que as nações do Norte se conscientizem de que é necessário rever suas tarifas

alfandegárias, seus subsídios, enfim, suas barreiras comerciais.

Os perdedores são identificados de forma genérica como “trabalhadores”. Todavia,

estes são de carne e osso, têm sonhos e esperanças, possuem muitos rostos, pertencem a raças

e etnias diversas e não são somente do sexo masculino. E, num país como o Brasil – e numa

região como a Amazônia, em particular, são milhões aguardando e lutando quotidianamente

por dias melhores. Isto sem falar em tantos outros milhões vivendo nos países vizinhos, cujos

Estados Nacionais e os mecanismos de proteção social são mais débeis ainda.

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