A interpretação de texto como ferramenta de leitura do mundo

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Mitsa Karen Toledo Christino Danielli Pós-graduanda em docência no Ensino Superior (Verbo Educacional, PE 2014) Graduada em Letras, habilitada em docência de Língua Portuguesa e Língua Inglesa, Literatura e Redação (UniSeb, SP 2012) Atualmente leciona Português para o ensino fundamental séries finais.

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Mitsa Karen Toledo Christino Danielli

Pós-graduanda em docência no Ensino Superior (Verbo Educacional, PE – 2014)

Graduada em Letras, habilitada em docência de Língua Portuguesa e Língua Inglesa,

Literatura e Redação (UniSeb, SP – 2012)

Atualmente leciona Português para o ensino fundamental – séries finais.

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A INTERPRETAÇÃO DE TEXTO COMO FERRAMENTA

DE LEITURA DO MUNDO

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo mostrar que a prática da leitura pode mudar

nossa percepção de mundo, visto que desde o momento em que começamos a

"compreender" as coisas que nos cercam, sempre motivados pelo constante

desejo de decifrar e interpretar o sentido das mesmas, de perceber o mundo

sob diversas perspectivas, de relacionar a realidade ficcional com a que

vivemos, no contato com um livro, vendo uma propaganda, enfim, em todos

estes casos estamos, de certa forma, lendo - embora, muitas vezes, não nos

damos conta. Através da prática da interpretação de texto pode-se desenvolver

outras habilidades no leitor, como a resolução de problemas, concentração,

raciocínio e outras.

Palavras-chave: leitura; interpretação; textos

INTRODUÇÃO

Ler não é somente decodificar símbolos, mas é, de fato, interpretar e

compreender o que se lê. A leitura só acontece quando o leitor apreende o

sentido do texto, quando além dos símbolos o leitor percebe o significado do

que aquele conjunto quer dizer.

No processo de leitura, é claro, existem requisitos prévios para que o leitor

consiga realmente ler: os linguísticos, que correspondem ao vocabulário e

regras da língua e seu uso; os textuais, que englobam o conjunto de noções e

conceitos sobre o texto; e os de mundo, que correspondem ao acervo pessoal

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do leitor. Para que a leitura seja satisfatória, ou seja, na qual a compreensão do

que se lê é alcançada, esses diversos tipos de conhecimento estão em

interação. Logo, percebemos que a leitura é um processo interativo.

Hoje fala-se muito em conhecimento de mundo para realizar uma interpretação

textual, e portanto há que se levar em conta o tipo de texto adequado ao leitor,

já que a compreensão da leitura depende do caráter subjetivo que essa

atividade assume.

Para Leonardo Boff (1984, p.23)

“cada um lê com os olhos que tem. E interpreta onde os pés

pisam. Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para

entender o que alguém lê, é necessário saber como são seus

olhos e qual é a sua visão de mundo. Isto faz da leitura sempre

um releitura. [...] Sendo assim, fica evidente que cada leitor é

co-autor.”

A partir daí, podemos começar a refletir sobre o relacionamento leitor-texto. Já

dissemos que ler é, acima de tudo, compreender. Para que isso aconteça, além

dos já referidos processamento cognitivo da leitura e conhecimentos prévios

necessários a ela, é preciso que o leitor esteja comprometido com sua leitura.

Ele precisa manter um posicionamento crítico sobre o que lê, não apenas

passivo. Quando atende a essa necessidade, o leitor se projeta no texto,

levando para dentro dele toda sua vivência pessoal, com suas emoções,

expectativas, seus preconceitos etc. É por isso que consegue ser tocado pela

leitura.

O ideal é que o leitor mergulhe no texto e se confunda com ele, em busca de

seu sentido. Isso é o que afirma Roland Barthes (1984, p.21), quando compara

o leitor a uma aranha:

“[...] o texto se faz, se trabalha através de um entrelaçamento

perpétuo; perdido neste tecido - nessa textura -, o sujeito se

desfaz nele, qual uma aranha que se dissolve ela mesma nas

secreções construtivas de sua teia.”

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Há entretanto, uma condição para que a leitura seja de fato prazerosa e válida:

o desejo do leitor. Como afirma Daniel Pennac (1996, p.11), "o verbo ler não

suporta o imperativo". Quando transformada em obrigação, a leitura se resume

a simples enfado. Para suscitar esse desejo e garantir o prazer da leitura,

Pennac prescreve alguns direitos do leitor, como o de escolher o que quer ler,

o de reler, o de ler em qualquer lugar, ou, até mesmo, o de não ler.

Respeitados esses direitos, o leitor, da mesma forma, passa a respeitar e

valorizar a leitura. Está criado, então, um vínculo indissociável. A leitura passa

a ser um imã que atrai e prende o leitor, numa relação de amor da qual ele, por

sua vez, não deseja desprender-se.

A LEITURA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Quando falamos em leitura na escola, logo pensamos na “sala de leitura” ou na

biblioteca. Começamos a planejar períodos para que os alunos possam

escolher livros, levar para casa, ler e devolver à escola. Assumimos o

compromisso, claro, de ouvir esse aluno contar como foi a leitura, o que

aprendeu, e quando possível solicitamos um resumo, que é para termos

certeza que ele leu e entendeu. Será que que entendeu mesmo?

Para Paulo Freire (1994 p.45) muita de nossa insistência, enquanto

professores, para que os estudantes “leiam”, num semestre, vários capítulos de

livros, reside na compreensão errônea que às vezes temos do ato de ler.

O autor relata ainda, que parece importante, contudo, para se evitar uma

compreensão errônea de sua afirmação, sublinhar que a crítica à

marginalização da palavra não significa, de maneira alguma, uma posição

pouco responsável com relação à necessidade que temos, educadores e

educandos, de ler, sempre e seriamente, os clássicos neste ou naquele campo

do saber, de nos adentrarmos nos textos, de criar uma disciplina intelectual

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sem a qual inviabilizaremos a nossa prática enquanto professores e

estudantes.

Freire (1994 p. 56) descreve: inicialmente parece interessante reafirmar que

sempre vi a alfabetização de adultos como um ato político e um ato de

conhecimento, por isso mesmo, com um ato criador. Para mim seria impossível

enganjar-me num trabalho de memorização mecânica dos ba-be-bi-bo-bu, dos

la-le-li-lo-lu.

Nota-se que a partir desta análise não se pode reduzir a alfabetização ao

ensino puro das palavras, das sílabas ou das letras. Ensino em cujo processo o

alfabetizador fosse “enchendo” com suas palavras vazias dos alfabetizandos.

Pelo contrário, enquanto ato de conhecimento e ato criador, o processo da

alfabetização tem, no alfabetizando, o seu sujeito.

O fato de ele necessitar de ajuda do educador, como ocorre em qualquer

relação pedagógica, não significa que a ajuda do educador deva a sua

criatividade e a sua responsabilidade na construção de sua linguagem escrita e

na leitura dessa linguagem.

Na prática, o que se observa é que a escola não vem desenvolvendo as

atividades de leitura dentro dessa perspectiva ampla. Sendo função básica da

escola ensinar a ler e a escrever, ela vem privilegiando a leitura do escrito em

detrimento da “leitura do mundo”, que a criança já faz e traz para a escola.

Além de negligenciar a importância da interdependência entre essas duas

leituras, ela vem em relação à leitura do escrito, enfatizando somente o

trabalho de levar a criança a adquirir os mecanismos básicos da grafia que lhe

permitem o acesso ao mundo do escrito. Embora seja um aspecto relevante do

processo de alfabetização, merecendo atenção especial e sistemática do

professor, a leitura não deve restringir-se ao ato mecânico de conhecimento,

reprodução de palavras e frases, assim como não deve favorecer uma leitura

passiva do texto.

COMO DIRECIONAR ATIVIDADES DELEITURA NA ESCOLA

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Num processo natural de aprendizagem, o aluno pode avançar (muitas vezes

com esforço) em seus conhecimentos através das possibilidades que a leitura

dos textos, em suas também variadas possibilidades, lhe estarão propiciando.

Se o professor sonda, acompanha, propõe diversificados textos e com

dificuldades diferentes para o aluno ir ampliando seus horizontes de

expectativas não só antes conteúdos, temas, conceitos ou histórias que tais

textos veiculam, veriam possibilidades de conhecer diversas maneiras de se

interpretar, representar, ou captar o mundo pelas palavras. Aí, a fantasia, o

sonho, o fato, o conceito, o som, o ritmo, a imagem… há diversos tipos de

textos. Há diversos tipos de leitores; há diversos tipos de leitura… é preciso ler

muito, comentar muito…

Um trabalho desenvolvido no sentido de formar leitores, de acordo com Yasuda

(1991 p. 102), exige avaliação complexa, plural, em longo prazo. Cada texto,

cada leitor ou grupo de leitores poderá sugerir pistas de que aspectos e como

avaliar. Essa avaliação deve levar em conta, por exemplo, a capacidade do

aluno de estabelecer relações entre as conversões próprias dos textos lidos

com as de futuras leituras. O aluno poderá perceber, então, como diferentes

linguagens podem se relacionar com a obra de arte literária. Principalmente,

essa avaliação não pode perder de vista o processo de construção da

linguagem do e pelo aluno.

A formação de um leitor competente é também a formação de ser sensível,

inteligente e aberto para aprendizado constante que se pode fazer com a

leitura na escola. E é, portanto, na prática que esse resultado poderá ser

construído.

REFERÊNCIAS

BARTHES, Roland. Escrever a leitura. In: O rumor da língua. Trad. de A.

Gonçalves, Lisboa, Edições 70, 1984.

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BOFF, Leonardo. A águia e a galinha: uma metáfora da condição humana. 36

ed., Petrópolis: Rio de Janeiro, Vozes, 2000;

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler em três artigos que se completam.

26ª Ed. São Paulo: Cortez e Autores Associados, 1994.

______. Pedagogia do oprimido. 14ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1983.

______. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários da autonomia. 21ª.

São Paulo: Paz e Terra.

INEP. Letramento em Leitura. Disponível em

<http://www.inep.gov.br/internacional/pisa >. Acesso em: 1º agosto 2013;

PENNAC, Daniel. Como um romance. 2ª ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1996;

PCN. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa. Secretaria de

Educação Fundamental.Brasília,1997;

YASUDA, A. M. B. G.; TEIXEIRA, M. J. C. “A circulação do paradidático no

cotidiano escolar”. In: BRANDÃO, H; MICHELETTI, G. Aprender a ensinar com

livros didáticos e paradidáticos. São Paulo: Cortez, 1991.