A luz na pintura - parte 2 (Autor: Farlley Derze)
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Transcript of A luz na pintura - parte 2 (Autor: Farlley Derze)
1luz & cena 1luz & cena
BOLSHOI NO BRASIL
Escola de Cinema Darcy RibeiroUma década de educação audiovisual
entrevista
Osvaldo PerrenoudRenomado iluminador fala de carreira, decisões e aperfeiçoamento
Escola brasileira encena terceiroe mais belo ato de Raymonda
Direção de Fotogra� aInterpretando fotografi camente um roteiro
R$ 8,00
Editora Música & Tecnologia
ANO XVI - novembro 2012 - Nº 160 www.luzecena.com.br
EDITORIAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
PRODUTOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
DESTAQUE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
EM FOCO ............................................. 12
MEDIA COMPOSER . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA PARA VÍDEO....44
ILUMINANDO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
Novembro 2012
foto capa: Divulgação
entrevista
Osvaldo Perrenoud fala de sua trajetória profi s-sional, aperfeiçoamento e importantes decisões
por Rodrigo Sabatinelli
galeria
É campeão!
por Ricardo Ayres
32
56
holofote
Felipe Lourenço, iluminador
por Louise Palma
16
educação
Escola de Cinema Darcy Ribeiro completa uma década de atividades
por Louise Palma
18
capa
Bolshoi no Brasil
Toda a beleza do terceiro ato de Raymonda, encenado no Festival de Dança de Joinville
por Rodrigo Sabatinelli
22
2 luz & cena
Inspirado pelo trecho sobre luz elétrica e modernidade que integra a segunda parte da série
A representação da luz na pintura ocidental (você pode conferi-la nesta edição da Luz &
Cena, na seção Iluminando, tão bem conduzida por Farlley Derze), saiamos um pouco,
neste editorial, do universo em que luz é arte, caminhando apenas alguns metros junto à
dupla luz e sociedade.
Todos sabemos que a luz, enquanto produto, e sua escassez – na forma de sombra ou de
mais completa escuridão, inclusive –, são fortes indicadores de desenvolvimento ou de atraso,
de atenção ou descaso público, mas, aproveitando essa época pós-eleição, vale a pergunta: isso não é errado? Pensemos em Paris, a própria Cidade Luz. Veem à mente a iluminada
Torre Eiffel, os animados e brilhantes cafés, os museus com iluminação controlada, ideal para
que as obras neles expostas possam ser apreciadas adequadamente por muitas gerações.
No entanto, quão irônico não deve ser viver na Cidade Luz quando se é um morador de um
conjunto habitacional do subúrbio, cercado de má iluminação e violência?
No Brasil, muitos vivem sem luz em suas casas até hoje, e não me refi ro a gente moderna que adotou velas como únicas fontes de iluminação de seus lofts. Mas como as trevas não podem
ser eternas, acompanhamos o alvorecer de um programa do governo que, desde 2003, já
tirou cerca de 15 milhões de pessoas da escuridão. E se esse mesmo governo promete, para
os próximos anos, um avanço tão grande no investimento em educação graças ao dinheiro
que vem à tona junto com o petróleo, de repente o jovem que ontem nem tinha luz em casa
será o jovem formado, com a mente ligada em política, ciência, cultura... Amanhã ele poderá
ser um engenheiro elétrico, ou, quem sabe, depois de ver uma peça de teatro pela primeira
vez, ter a certeza de que será um lighting designer.
Dito isso, nessa edição da L&C temos, em detalhes, o terceiro ato de Raymonda, encenado
pela Escola do Teatro Bolshoi no Brasil durante o Festival de Dança de Joinville. Em nossas
páginas você também encontrará uma matéria sobre os dez anos da cada vez mais impor-tante Escola de Cinema Darcy Ribeiro e uma valiosa entrevista com nosso ex-colaborador, o iluminador Osvaldo Perrenoud, também conhecido como Oz. Além, claro, de nossas colunas.
Boa leitura!
Marcio Teixeira
Luz social
ANO XVI - Nº 160 - NOVEMBRO 2012
EDITOR
MARCIO TEIXEIRA
GERÊNCIA FINANCEIRA
LUCINDA DINIZ
COLABORARAM NESTA EDIÇÃO
CRISTIANO MOURA, FARLLEY DERZE
E LÉO MIRANDA
REDAÇÃO
FERNANDO BARROS,
LOUISE PALMA E
RODRIGO SABATINELLI
DIREÇÃO DE ARTE / DIAGRAMAÇÃO
CLIENT BY - clientby.com.br
FREDERICO ADÃO
LUIZ MILLER
PUBLICIDADE
MÔNICA MORAES
ASSINATURAS
KARLA SILVA
DISTRIBUIÇÃO
ERIC BATISTA
GRÁFICA EDITORA STAMPPA LTDA.
LUZ & CENA É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DA
EDITORA MÚSICA & TECNOLOGIA LTDA, CGC
86936028/0001-50, INSC. MUN. 01644696 E INSC. EST. 84907529
ASSINATURAS
EST. JACAREPAGUÁ, 7655 SL. 704/705
JACAREPAGUÁ – RIO DE JANEIRO – RJ
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NÃO É PERMITIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL
DAS MATÉRIAS PUBLICADAS NESTA REVISTA.
LUZ & CENA NÃO SE RESPONSABILIZA PELO CON-TEÚDO DOS ANÚNCIOS VEICULADOS.
4 luz & cena
50 luz & cena
ARTE NO MUNDO INDUSTRIALO mundo ocidental viu florescer no século 18 a nor-matização da ciência por meio da sistematização
dos métodos que cada cientista empregava em suas
experiências com vegetais, animais, gases, minerais,
líquidos e até com comportamento humano, de modo
que na segunda metade daquele século estava formado
o ambiente propício para dar origem à industrialização
dos materiais. Em pouco tempo, obras artísticas tam-
bém estariam industrializadas e chegariam ao alcance
de um público maior, inclusive o de outros países.
O filósofo Walter Benjamin escreve no século 20 sobre “a obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”,
publicado apenas em 1955. A industrialização em mas-sa de um produto (Revolução Industrial do século 18)
transformou o modo como o homem se comunicaria,
bem como a maneira de lidar com os materiais dispo-nibilizados pelo mundo cada vez mais mecanizado. A
A REPRESENTAÇÃO DA LUZ NA PINTURA OCIDENTAL
I luminando Farlley Derze
Luz neoclássica: A morte de Sócrates (Jacques Louis David, 1787)
(PARTE 2)
Luz romântica: A liberdade guiando o povo (Eugène Delacroix, 1831) e A balsa da medusa (Théodore Géricault, 1819)
curiosidade dos cientistas que viviam noite e dia em
seus laboratórios para desvendar mistérios da natureza
tornou possível a invenção de lâmpadas a gás (1792) e,
ao raiar do século 19, a lâmpada elétrica (1808), ambas
criadas na Inglaterra. Em pouco tempo, os empresários
se ocupariam da reprodutibilidade técnica dos inventos
que foram socializados no mundo. Em 1820 seria a vez
da invenção e popularização da fotografia.
Bem: se antes do século 19 o mundo dependeu dos
pintores para registrar com tintas e pincéis os eventos
particulares e públicos, a máquina fotográfica poderia fazer o mesmo. Resultado: os pintores deixariam de
pintar aquilo que seus olhos viam ou aquilo que lhes era
encomendado a pintar para produzir uma pintura com
outros olhos – os olhos da imaginação. Nascia a arte
moderna. Cada pintor tinha sua própria imaginação, e,
por conta disso, a forma de manipular as cores e os pin-céis traria novidades nas cores, nas formas, nos temas
representados em suas telas. Do século 18 ao século
20 o mundo mecanizado ou tecnológico vai impor um
novo ritmo à sociedade e novos conceitos sobre arte.
A LUZ NEOCLÁSSICAEstamos na segunda metade do século 18. Já sabe-mos o que vai acontecer no futuro com a industrializa-ção que se inicia nesse ponto da história. Enquanto
a ciência produz seus inventos, a luz da pintura
neoclássica é simbolizada pelo branco translúcido
da luz do Sol com a visualização de manchas que
representam sombras mais sutis que aquelas do mo-vimento anterior (barroco = sombras escuras ou áreas
não iluminadas). A representação da luz neoclássica
quer recuperar a luz renascentista, mas não elimina a
influência mais recente do barroco (sombras).
Bem, a ideia central na representação da luz neoclás-sica é fazer o mesmo que os renascentistas: deixar
visível tudo o que foi pintado na superfície da tela. A
ocorrência da sombra não deve comprometer a visu-alização das partes. Resultado: podemos dizer que a
representação da luz na pintura renascentista (séculos
15 e 16) e neoclássica (século 18) possui a mesma... di-gamos... genética estilística. O fato da pintura neoclás-sica buscar referência no passado (o renascimento),
não difere das situações que encontramos em nosso
cotidiano. Há inúmeras lojas especializadas em vender lustres, luminárias, mobiliário e eletrodomésticos que
pertenceram ao passado. A diferença é que no passado
se estava diante de um produto que representava a
modernidade com os recursos materiais e tecnológicos
disponíveis de sua época e tinha sua função utilitária
no cotidiano, e no futuro será retomado com outro
valor: valor histórico, valor afetivo, valor artístico...
negociados a preços especulativos.
52 luz & cena
A LUZ ROMÂNTICAEstamos na primeira metade do século 19. O romantis-mo nasce na literatura e se espalha nas demais verten-tes artísticas: pintura, música, teatro, arquitetura. Em
resposta ao romantismo, nasceu também, da literatura,
o realismo. O romantismo e o realismo foram forças
contrárias, pois uma se direcionava a imagens oníricas
ou de uma sociedade ideal, enquanto a outra queria
mostrar a realidade do mundo, dos trabalhadores no
campo, nas fábricas, e a realidade dos confl itos sociais. Assim, a representação da luz será feita com vários
pontos de luz e sombras em vários pontos da superfície
da tela, como se luz e sombra, ou área iluminada e área
escura, disputassem um lugar.
O resultado visual nos inspira a lembrar do resultado
visual da pintura barroca (século 17 e primeira metade
do século 18). É como se a luz romântica fosse uma
releitura da luz barroca... então... outro caso de genética
estilística. A diferença é que enquanto na luz barroca
a luz incide numa área específi ca da tela em oposição à outra área da mesma, onde não incide luz, na luz
romântica são vários pontos onde a luz incide na tela em
oposição a pequeninas áreas onde a luz não alcança,
ou áreas cobertas por manchas de sombra.
A LUZ MODERNAEstamos na segunda metade do século 19. Surge uma
relação de oposição entre romantismo e realismo (uma
pintura que pretende mostrar “a vida como ela é”).
Desse embate surgirá uma prole de “ismos”. E “ismos”
será o sobrenome da arte moderna: impressionismo,
pontilhismo, fovismo, neoplasticismo, cubismo, expres-
sionismo, futurismo, primitivismo, raionismo, suprema-tismo, construtivismo, dadaísmo, surrealismo. Nesse
ponto da história testemunham-se as consequências visuais na representação da luz na pintura ocidental
após o surgimento da máquina fotográfi ca.
O pintor francês Monet vai pintar, em 1872, a tela
Impressions soleil levant (impressões do sol nas-cente). Essa obra veio a público apenas dois anos
depois, quando já havia um grupo de outros pintores
“impressionistas”, e juntos apresentaram suas obras
dentro de uma galeria, já que no museu não teriam a
menor chance. A ideia da pintura impressionista era
capturar a luz atmosférica, ou seja, a luz natural que
incidia no ambiente em determinado horário. Monet
pintou a fachada da catedral de Rouen mais de 30
vezes para demonstrar que a luz era diferente no
outono, na primavera, no verão, no inverno, às 9h,
às 12h, às 17h... de modo que o conceito da pintura
impressionista era fi xar na tela a impressão recebida em nossos olhos pela luz atmosférica em determinado
horário. Isso explica a velocidade com a qual o pincel
foi manipulado na superfície da tela, afi nal, a nitidez dos objetos e cenas representadas na imagem eram
menos importantes do que deixar registrada com tintas
e cores a impressão da luz no horário em que o pintor
capturava a imagem. Monet chegou a retirar suas telas
e tintas de casa e montou seu estúdio em um barco
para poder produzir inúmeras telas ao longo do dia.
Conclusão: a luz natural deu origem ao conceito que
estruturou esse movimento artístico.
Mas a luz artifi cial, com a luz elétrica, vai dar o tom que faltava ao signifi cado da palavra “modernidade”. O pin-tor russo Larionov traduziu os fachos de luz elétrica em
suas obras e chamou sua forma de pintar de “raionismo”
Luz moderna: Impressions soleil levant (Claude Monet, 1872), Catedral de Rouen (Claude Monet, 1832-93/94) e Noite estrelada sobre Rhone (Vincent Van Gogh, 1888)
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Luz moderna: Raionismo (Mikhail Larionov, 1913)
Luz moderna: A metrópole (Georg Grosz, 1916)
Farlley Derze é professor do Instituto de Pós-Graduação, diretor de Gestão e Pesquisa da empresa Jamile Tormann Iluminação Cênica e Arquitetural e membro do Núcleo de Estética e Semiótica da UnB. Doutorando em Arquitetura. E-mail: [email protected]
Neoclássico (segunda metade do séc. 18): Re-presentação da luz com tonalidades da cor branca
translúcida (infl uência renascentista) que traduz a luz do Sol difusa no ambiente e com representação de
sombras que não comprometem a visualização do que
foi pintado na tela.
Romantismo (primeira metade do séc. 19): Repre-sentação da luz com tonalidades amareladas que tra-duzem vários fachos de luz salpicados na superfície da
tela, entremeados por diversas manchas de sombras.
Modernismo (segunda metade do séc. 19 e primeira metade do séc. 20): Representação da luz segundo
o conceito do pintor – representar a luz atmosférica no
horário em que pintava a cena; representar os raios de
luz elétrica; representar a vida social noturna.
Gostaria de recomendar o livro A obra
de arte na era de sua reprodutibilidade
técnica, de Walter Benjamin.
Síntese
Pausa para uma xícara de chá
(raios de luz). Quando vejo suas telas, me lembro dos
fachos de luz que tantas vezes vi em shows de música.
O termo “moderno” foi aplicado às artes como à música,
à pintura, à arquitetura, à escultura, ao teatro, à dança,
como um modo de dizer que as ideias, o mundo, a vida
estava em transformação. E a luz elétrica, assim como
a luz natural, também inspirou os artistas da pintura,
conforme pode ser visto nas obras apresentadas aqui.
A luz elétrica, além de transformar as cenas teatrais
e os shows de música na companhia de refl etores de todo tipo e formato, gobos, lentes, movings, mesas
analógicas ou digitais, também transformou as noites
urbanas, que nunca mais foram as mesmas desde
que o mundo noturno conheceu as lâmpadas a arco
voltaico, as incandescentes, as lâmpadas de neon, as
fl uorescentes, as de sódio e mercúrio nas vias públicas, as halógenas, a fi bra ótica, os LEDs...
A cidade moderna nasceu à noite.
A obra
de arte na era de sua reprodutibilidade