A minha alma gira em torno da minha obra literária - boa ou má, que seja, ou que possa ser.

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A minha alma gira em torno da minha obra literária - boa ou má, que seja, ou que possa ser. Tudo o mais na vida tem para mim interesse secundário.". Fernando Pessoa. Índice. Primeira Parte - Brasão. I - Os Campos. III - As Quinas. • Primeiro/ O Dos Castelos. - PowerPoint PPT Presentation

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  • A minha alma gira em torno da minha obra literria - boa ou m, que seja, ou que possa ser.

    Tudo o mais na vida tem para mim interesse secundrio."

    Fernando Pessoa

  • ndice

  • Primeira Parte - Braso

    I - Os CamposIII - As Quinas Primeiro/ O Dos Castelos Primeira/ D. Duarte, Rei de Portugal Segundo/ O Das Quinas Segunda/ D. Fernando, Infante de Portugal Terceira/ D. Pedro, Regente de PortugalII - Os Castelos Quarta/ D. Joo, Infante de Portugal Primeiro/ Ulisses Quinta/ D. Sebastio, Rei de Portugal Segundo/ Viriato Terceiro/ O Conde D. HenriqueIV - a Coroa Quarto/ D. Tareja Nunlvares Pereira Quinto/ D. Afonso Henriques Sexto/ D. DinisV - O Timbre Stimo (I)/ D. Joo O Primeiro A Cabea Do Grifo/ O Infante D. Henrique Stimo (II)/ D. Filipa De Lencastre Uma Asa Do Grifo/ D. Joo O Segundo A Outra Asa Do Grifo/ Afonso De Albuquerque

  • Segunda Parte - Mar Portugus

    I - O Infante

    II - Horizonte III - Padro IV - Mostengo

    V - Epitfio De Bartolomeu Dias VI - Os Colombos

    VII - Ocidente

    VIII - Ferno De Magalhes

    IX - Ascenso de Vasco Da Gama X - Mar Portugus

    XI - A ltima Nau XII - Prece

  • Terceira Parte - O Encoberto

    I - Os Smbolos

    Primeiro/ D. Sebastio

    Segundo/ O Quinto Imprio

    Terceiro/ O Desejado

    Quarto/ As Ilhas Afortunadas

    Quinto/ O Encoberto

    II - Os Avisos

    Primeiro/ O Bandarra

    Segundo/ Antnio Vieira

    Terceiro

    III - Os Tempos

    Primeiro/ Noite

    Segundo/ Tormenta

    Terceiro/Calma

    Quarto/ Antemanh

    Quinto/ Nevoeiro

  • PrimeiraParteBraso

  • I- os campos

    Primeiro/ O dos Castelos

    Segundo/ O das Quinas

  • Primeiro / O dos Castelos

    A Europa jaz, posta nos cotovelos: De Oriente a Ocidente jaz, fitando, E toldam-lhe romnticos cabelos Olhos gregos, lembrando.

    O cotovelo esquerdo recuado;

    O direito em ngulo disposto.

    Aquele diz Itlia onde pousado;

    Este diz Inglaterra onde, afastado,

    A mo sustenta, em que se apoia o rosto.

    Fita, com olhar esfngico e fatal, Ocidente, futuro do passado.

    O rosto com que fita Portugal. 8-12-1928

  • Segundo/ O das Quinas

    Os Deuses vendem quando do. Compra-se a glria com desgraa. Ai dos felizes, porque so S o que passa!

    Baste a quem baste o que lhe basta O bastante de lhe bastar!

    A vida breve, a alma vasta: Ter tardar.

    Foi com desgraa e com vileza Que Deus ao Cristo definiu: Assim o ops Natureza E Filho o ungiu.

    08/12/1928

  • II - Os Castelos

    Primeiro/ Ulisses

    Segundo/ Viriato

    Terceiro/ O conde D. Henrique

    Quarto/ D. Tareja

    Quinto/ D. Afonso Henriques

    Sexto/ D. Dinis

    Stimo (I)/ D. Joo o Primeiro

    Stimo (II)/ D. Filipa De Lencastre

  • Primeiro/ Ulisses

    O mito o nada que tudo. O mesmo sol que abre os cus um mito brilhante e mudo - O corpo morto de Deus, Vivo e desnudo.

    Este, que aqui aportou, Foi por no ser existindo. Sem existir nos bastou. Por no ter vindo foi vindo E nos criou.

    Assim a lenda se escorre A entrar na realidade, E a fecund-la decorre. Em baixo, a vida, metade De nada, morre.

  • Segundo/ Viriato

    Se a alma que sente e faz conhece S porque lembra o que esqueceu, Vivemos, raa, porque houvesse Memria em ns do instinto teu.

    Nao porque reincarnaste,

    Povo porque ressuscitou

    Ou tu, ou o de que eras a haste - Assim se Portugal formou.

    Teu ser como aquela fria

    Luz que precede a madrugada, E j o ir a haver o dia Na antemanh, confuso nada.

    22/01/1934

  • Terceiro/ O Conde D. Henrique

    Todo comeo involuntrio.

    Deus o agente.

    O heri a si assiste, vrio E inconsciente.

    espada em tuas mos achada Teu olhar desce.

    Que farei eu com esta espada?

    Ergueste-a, e fez-se.

  • Quarto/ D. Tareja

    As naes todas so mistrios. Cada uma todo o mundo a ss. me de reis e av de imprios. Vela por ns!

    Teu seio augusto amamentou com bruta e natural certeza O que, imprevisto, Deus fadou. Por ele reza!

    D tua prece outro destino A quem fadou o instinto teu! O homem que foi o teu menino Envelheceu.

    Mas todo vivo eterno infante Onde ests e no h o dia. No antigo seio, vigilante, De novo o cria!

    24/09/1928

  • Quinto/ D. Afonso Henriques

    Pai, foste cavaleiro.

    Hoje a viglia nossa.

    D-nos o exemplo inteiro E a tua inteira fora!

    D, contra a hora em que, errada, Novos infiis venam,

    A bno como espada, A espada como beno !

  • Sexto/ D. Dinis

    Na noite escreve um seu Cantar de Amigo O plantador de naus a haver,

    E ouve um silncio mrmuro consigo:

    o rumor dos pinhais que, como um trigo De Imprio, ondulam sem se poder ver.

    Arroio, esse cantar, jovem e puro, Busca o oceano por achar;

    E a fala dos pinhais, marulho obscuro, o som presente desse mar futuro, a voz da terra ansiando pelo mar.

    09/02/1934

  • Stimo (I)/ D. Joo o Primeiro

    O homem e a hora so um s

    Quando Deus faz e a histria feita. O mais carne, cujo p

    A terra espreita.

    Mestre, sem o saber, do Templo Que Portugal foi feito ser,

    Que houveste a glria e deste o exemplo De o defender.

    Teu nome, eleito em sua fama, , na ara da nossa alma interna, A que repele, eterna chama, A sombra eterna.

    12/02/1934

  • Stimo (II)/ D. Filipa de Lencastre

    Que enigma havia em teu seio

    Que s gnios concebia?

    Que arcanjo teus sonhos veio Velar, maternos, um dia?

    Volve a ns teu rosto srio, Princesa do Santo Gral, Humano ventre do Imprio, Madrinha de Portugal!

    26/09/1928

  • III - As Quinas

    Primeira/ D. Duarte, Rei De Portugal

    Segunda/ D. Fernando, Infante De Portugal

    Terceira/ D. Pedro, Regente De Portugal

    Quarta/ D. Joo, Infante De Portugal

    Quinta/ D. Sebastio, Rei De Portugal

  • Primeira/ D. Duarte, Rei De Portugal

    Meu dever fez-me, como Deus ao mundo.

    A regra de ser Rei almou meu ser, Em dia e letra escrupuloso e fundo.

    Firme em minha tristeza, tal vivi.

    Cumpri contra o Destino o meu dever. Inutilmente? No, porque o cumpri.

    26/09/1928

  • Segunda/ D. Fernando, Infante De Portugal

    Deu-me Deus o seu gldio, por que eu faa

    A sua santa guerra.

    Sagrou-me seu em honra e em desgraa, s horas em que um frio vento passa Por sobre a fria terra.

    Ps-me as mos sobre os ombros e doirou-me A fronte com um olhar;

    E essa febre de Alm, que me consome, E este querer grandeza so seu nome dentro de mim a vibrar.

    E eu vou, e a luz do gldio erguido d Em minha face clara.

    Cheio de Deus, no temo o que vir, pois, venha o que vier, nunca ser Maior do que a minha alma.

    21/07/1913

  • Terceira/ D. Pedro, Regente De Portugal

    Claro em pensar, e claro no sentir,

    E claro no querer;

    Indiferente ao que h em conseguir Que seja s obter;

    Dplice dono, sem me dividir, De dever e de ser -

    No me podia a Sorte dar guarida Por no ser eu dos seus.

    Assim vivi, assim morri, a vida, Calmo sob mudos cus,

    Fiel palavra dada e ideia tida. Tudo o mais com Deus!

    15/02/193

  • Quarta/ D. Joo, Infante De Portugal

    No fui algum. Minha alma estava estreita

    Entre to grandes almas minhas pares, Inutilmente eleita,

    Virgemmente parada;

    Porque do portugus, pai de amplos mares, Querer , poder s isto:

    O inteiro mar, ou a orla v desfeita - O todo, ou o seu nada.

    28/03/1930

  • Quinta/ D. Sebastio, Rei De Portugal

    Louco, sim, louco, porque quis grandeza

    Qual a Sorte a no d.

    No coube em mim minha certeza; Por isso onde o areal est

    Ficou meu ser que houve, no o que h.

    Minha loucura, outros que me a tomem Com o que nela ia.

    Sem a loucura que o homem Mais que a besta sadia, Cadver adiado que procria?

    20/02/1933

  • Iv - A Coroa

    Nunlvares Pereira

  • Nunlvares Pereira

    Que aurola te cerca?

    a espada que, volteando. Faz que o ar alto perca Seu azul negro e brando.

    Mas que espada que, erguida, Faz esse halo no cu?

    Excalibur, a ungida, Que o Rei Artur te deu.

    'Sperana consumada,

    S. Portugal em ser,

    Ergue a luz da tua espada Para a estrada se ver!

    08/12/1928

  • V - o Timbre

    A cabea do Grifo/ O Infante D. Henrique

    Uma asa do Grifo/ D. Joo o Segundo

    A outra asa do Grifo/ Afonso De Albuquerque

  • A cabea do Grifo/ O Infante D. Henrique

    Em seu trono entre o brilho das esferas,

    Com seu manto de noite e solido,

    Tem aos ps o mar novo e as mortas eras - O nico imperador que tem, deveras, O globo mundo em sua mo.

    26/09/1928

  • Uma asa do Grifo/ D. Joo o Segundo

    Braos cruzados, fita alm do mar.

    Parece em promontrio uma alta serra - O limite da terra a dominar

    O mar que possa haver alm da terra.

    Seu formidvel vulto solitrio

    Enche de estar presente o mar e o cu, E parece temer o mundo vrio

    Que ele abra os braos e lhe rasgue o vu.

    26/09/1928

  • A outra asa do Grifo/ Afonso De Albuquerque

    De p, sobre os pases conquistados

    Desce os olhos cansados

    De ver o mundo e a injustia e a sorte. No pensa em vida ou morte, To poderoso que no quer o quanto Pode, que o querer tanto

    Calcara mais do que o submisso mundo Sob o seu passo fundo.

    Trs imprios do cho lhe a Sorte apanha. Criou-os como quem desdenha.

    26/09/1928

  • Segunda Parte

    Mar

    Portugus

  • I - O Infante

    II - Horizonte

    III - Padro

    IV - O Mostrengo

    V - Epitfio De Bartolomeu Dias

    VI - Os Colombos

    VII - Ocidente

    VIII - Ferno De Magalhes

    IX - Ascenso de Vasco Da Gama

    X - Mar Portugus

    XI - A Ultima Nau

    XII - Prece

  • I- O Infante

    Deus quer, o homem sonha, a obra nasce. Deus quis que a terra fosse toda uma, Que o mar unisse, j no separasse. Sagrou-te, e foste desvendando a espuma. E a orla branca foi de ilha em continente, Clareou, correndo, at ao fim do mundo, E viu-se a terra inteira, de repente. Surgir, redonda, do azul profundo.

    Quem te sagrou criou-te portugus.

    Do mar e ns em ti nos deu sinal.

    Cumpriu-se o Mar, e o imprio se desfez. Senhor, falta cumprir-se Portugal!

  • II - Horizonte

    mar anterior a ns, teus medos Tinham coral e praias e arvoredos. Desvendadas a noite e a cerrao, As tormentas passadas e o mistrio, Abria em flor o Longe, e o Sul sidrio Splendia sobre as naus da iniciao.

    Linha severa da longnqua costa -

    Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta Em rvores onde o Longe nada tinha; Mais perto, abre-se a terra em sons e cores; E, no desembarcar, h aves. Flores, Onde era s, de longe a abstracta linha. O sonho ver as formas invisveis Da distncia imprecisa, e, com sensveis Movimentos da esperana e da vontade, Buscar na linha fria do horizonte A rvore, a praia, a flor, a ave, a fonte - Os beijos merecidos da Verdade

  • III - Padro

    O esforo grande e o homem pequeno. Eu, Diogo Co, navegador, deixei Este padro ao p do areal moreno E para diante naveguei.

    A alma divina e a obra imperfeita.

    Este padro sinala ao vento e aos cus

    Que, da obra ousada, minha a parte feita: O por-fazer s com Deus.

    E ao imenso e possvel oceano

    Ensinam estas Quinas, que aqui vs,

    Que o mar com fim ser grego ou romano: O mar sem fim portugus.

    E a cruz ao alto diz que o que me h na alma E faz a febre em mim da navegar

    S encontrar de Deus na eterna calma O porto sempre por achar.

    13/09/1918

  • IV - O Mostrengo

    O mostrengo que est no fim do mar Na noite de breu ergueu-se a voar; roda da nau voou trs vezes, Voou trs vezes a chiar, E disse, Quem ousou entrar

    Nas minhas cavernas que no desvendo, Meus tectos negros do fim do mundo? E o homem do leme disse, tremendo, El - Rei D. Joo Segundo!

    De quem so as velas onde me roo?

    De quem as quilhas que vejo e ouo?

    Disse o mostrengo, e rodou trs vezes,

    Trs vezes rodou imundo e grosso,

    Quem vem poder o que s eu posso,

    Que eu moro onde nunca ningum me visse E escorro os medos do mar sem fundo? E o homem do leme tremeu, e disse, El - Rei D. Joo Segundo!

    Trs vezes do leme as mos ergueu,

    Trs vezes ao leme as reprendeu,

    E disse no fim de tremer trs vezes,

    Aqui ao leme sou mais do que eu:

    Sou um Povo que quer o mar que teu;

    E mais que o mostrengo, que me a alma teme E roda nas trevas do fim do mundo, Manda a vontade, que me ata ao leme, De El - Rei D. Joo Segundo !

    09/09/1918

  • V - Epitfio de Bartolomeu Dias

    Jaz aqui, na pequena praia extrema,

    O Capito do Fim. Dobrado o Assombro, O mar o mesmo: j ningum o tema! Atlas, mostra o alto do mundo no seu

    ombro.

  • VI - Os Colombos

    Outros havero de ter

    O que houvermos de perder. Outros podero achar O que, no nosso encontrar, Foi achado, ou no achado, Segundo o destino dado.

    Mas o que a eles no toca a magia que evoca

    O Longe e faz dele histria. E por isso a sua glria justa aurola dada Por uma luz emprestada,

    02/04/1934

  • VII - Ocidente

    Com duas mos - o Acto e o Destino - Desvendmos. No mesmo gesto, ao cu Uma ergue o facho trmulo e divino E a outra afasta o vu.

    Fosse a hora que haver ou a que havia A mo que ao Ocidente o vu rasgou, Foi alma a Cincia e corpo a Ousadia Da mo que desvendou.

    Fosse Acaso, ou Vontade, ou Temporal A mo que ergueu o facho que luziu, Foi Deus a alma e o corpo de Portugal Da mo que o conduziu.

  • VIII - Ferno De Magalhes

    No vale clareia uma fogueira.

    Uma dana sacode a terra inteira. E sombras disformes e descompostas Em clares negros do vale vo Subitamente pelas encostas, Indo perder-se na escurido.

    De quem a dana que a noite aterra? So os tits, os filhos da Terra, Que danam da morte do marinheiro Que quis cingir o materno vulto - Cingi-lo, dos homens, o primeiro _ , Na praia ao longe por fim sepulto.

    Danam, nem sabem que a alma ousada Do morto ainda comanda a armada, Pulso sem corpo ao leme a guiar As naus no resto do fim do espao: Que at ausente soube cercar A terra inteira com seu abrao.

    Violou a Terra. Mas eles no

    O sabem, e danam na solido;

    E sombras disformes e descompostas, Indo perder-se nos horizontes, Galgam do vale pelas encostas Dos mudos montes.

  • IX - Ascenso De Vasco Da Gama

    Os Deuses da tormenta e os gigantes da terra

    Suspendem de repente o dio da sua guerra

    E pasmam. Pelo vale onde se ascende aos cus

    Surge um silncio, e vai, da nvoa ondeando os vus, Primeiro um movimento e depois um assombro. Ladeiam-o, ao durar, os medos, ombro a ombro, E ao longe o rasto ruge em nuvens e clares.

    Em baixo, onde a terra , o pastor gela, e a flauta Cai-lhe, e em extase v, luz de mil troves, O cu abrir o abismo alma do Argonauta. 10/01/1922

  • X - Mar Portugus

    mar salgado, quanto do teu sal So lgrimas de Portugal!

    Por te cruzarmos, quantas mes choraram, Quantos filhos em vo rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, mar!

    Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma no pequena.

    Quem quer passar alm do Bojador Tem que passar alm da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele que espelhou o cu.

  • XI - A ltima Nau

    Levando a bordo El - Rei D. Sebastio, E erguendo, como um nome, alto o pendo Do Imprio,

    Foi-se a ltima nau, ao sol aziago

    Erma, e entre choros da nsia e de pressago Mistrio.

    No voltou mais. A que ilha indescoberta Aportou? Voltar da sorte incerta Que teve?

    Deus guarda o corpo e a forma do futuro, Mas Sua luz projecta-o, sonho escuro E breve.

    Ah, quanto mais ao povo a alma falta, Mais a minha alma atlntica se exalta E entorna,

    E em mim, num mar que no tem tempo ou spao, Vejo entre a cerrao teu vulto bao

    Que torna.

    No sei, mas sei que h a hora,

    Demore-a Deus, chama-lhe a alma embora Mistrio

    Surges ao sol em mim, e a nvoa finda: A mesma, e trazes o pendo ainda Do Imprio.

  • XII - Prece

    Senhor, a noite veio e a alma vil. Tanta foi a tormenta e a vontade! Restam -nos hoje, no silncio hostil, O mar universal e a saudade.

    Mas a chama, que a vida em ns criou, Se ainda h vida ainda no finda. O frio morto em cinzas a ocultou: A mo do vento pode ergu-la ainda.

    D o sopro, a aragem - ou desgraa ou nsia -, Com que a chama do esforo se remoa, E outra vez conquistaremos a Distncia - Do mar ou outra, mas que seja nossa!

    31/12/1921 - 01/01/1322

  • TerceiraParteO Encoberto

  • I - Os Smbolos

    Primeiro/ D. Sebastio

    Segundo/ O Quinto Imprio

    Terceiro/ O Desejado

    Quarto/ As Ilhas Afortunadas

    Quinto/ O Encoberto

  • Primeiro/ D. Sebastio

    Sperai! Ca no areal e na hora adversa Que Deus concede aos seus

    Para o intervalo em que esteja a alma imersa Em sonhos que so Deus.

    Que importa o areal e a morte e a desventura Se com Deus me guardei?

    O que eu me sonhei que eterno dura Esse que regressarei.

  • Segundo/ O Quinto Imprio

    Triste de quem vive em casa,

    Contente com o seu lar,

    Sem que um sonho, no erguer de asa Faa at mais rubra a brasa Da lareira a abandonar!

    Triste de quem feliz! Vive porque a vida dura. Nada na alma lhe diz Mais que a lio da raiz -

    Ter por vida a sepultura.

    Eras sobre eras se somem No tempo que em eras vem. Ser descontente ser homem. Que as foras cegas se domem Pela viso que a alma tem!

    E assim, passados os quatro Tempos do ser que sonhou, A terra ser teatro

    Do dia claro, que no atro Da erma noite comeou.

    Grcia, Roma, Cristandade, Europa - os quatro se vo Para onde vai toda idade. Quem vem viver a verdade Que morreu D. Sebastio?

    21/02/1933

  • Terceiro/ O Desejado

    Onde quer que, entre sombras e dizeres, Jazas, remoto, sente-se sonhado, E ergue-te do fundo de no-seres Para teu novo fado!

    Vem, Galaaz com ptria, erguer de novo, Mas j no auge da suprema prova, A alma penitente do teu povo Eucaristia Nova.

    Mestre da Paz, ergue teu gldio ungido, Excalibur do Fim, em jeito tal Que sua Luz ao mundo dividido Revele o Santo Gral!

  • Quarto/ As Ilhas Afortunadas

    Que voz vem no som das ondas

    Que no a voz do mar?

    E a voz de algum que nos fala, Mas que, se escutarmos, cala, Por ter havido escutar.

    E s se, meio dormindo,

    Sem saber de ouvir ouvimos Que ela nos diz a esperana A que, como uma criana Dormente, a dormir sorrimos.

    So ilhas afortunadas So terras sem ter lugar, Onde o Rei mora esperando. Mas, se vamos despertando, Cala a voz, e h s o mar.

    26/03/1934

  • Quinto/ O Encoberto

    Que smbolo fecundo

    Vem na aurora ansiosa?

    Na Cruz Morta do Mundo A Vida, que a Rosa.

    Que smbolo divino Traz o dia j visto?

    Na Cruz, que o Destino, A Rosa que o Cristo.

    Que smbolo final

    Mostra o sol j desperto? Na Cruz morta e fatal A Rosa do Encoberto.

    21/02/1933 - 11/02/1934

  • II - Os Avisos

    Primeiro/ O Bandarra

    Segundo/ Antnio Vieira

    Terceiro

  • Primeiro/ O Bandarra

    Sonhava, annimo e disperso,

    O Imprio por Deus mesmo visto, Confuso como o Universo E plebeu como Jesus Cristo.

    No foi nem santo nem heri, Mas Deus sagrou com Seu sinal Este, cujo corao foi

    No portugus, mas Portugal.

    28/03/1930

  • Segundo/ Antnio Vieira

    O cu strela o azul e tem grandeza. Este, que teve a fama e glria tem, Imperador da lngua portuguesa, Foi-nos um cu tambm.

    No imenso espao seu de meditar, Constelado de forma e de viso, Surge, prenncio claro do luar, El-Rei D. Sebastio.

    Mas no, luar: luz do etreo.

    um dia; e, no cu amplo de desejo, A madrugada irreal do Quinto Imprio Doira as margens do Tejo.

    31/07/1929

  • Terceiro

    Screvo meu livro beira-mgoa. Meu corao no tem que ter. Tenho meus olhos quentes de gua. S tu, Senhor, me ds viver.

    S te sentir e te pensar

    Meus dias vcuos enche e doura. Mas quando querers voltar? Quando o Rei? Quando a Hora?

    Quando virs a ser o Cristo

    De a quem morreu o falso Deus, E a despertas do mal que existo A Nova Terra e os Novos Cus?

    Quando virs, Encoberto, Sonho das eras portugus,

    Tornar-me mais que o sopro incerto De um grande anseio que Deus fez?

    Ah, quando querers voltando, Fazer minha esperana amor? Da nvoa e da saudade quando? Quando, meu Sonho e meu Senhor?

    10/12/1928

  • III - Os Tempos

    Primeiro/ noite

    Segundo/ Tormenta

    Terceiro/ calma

    Quarto/Antemanh

    Quinto/ nevoeiro

  • Primeiro/ Noite

    A nau de um deles tinha-se perdido No mar indefinido.

    O segundo pediu licena ao Rei De, na f e na lei

    Da descoberta, ir em procura

    Do irmo no mar sem fim e a nvoa escura.

    Tempo foi. Nem primeiro nem segundo Volveu do fim profundo

    Do mar ignoto ptria por quem dera O enigma que fizera.

    Ento o terceiro a El-Rei rogou

    Licena de os buscar, e El-Rei negou.

    *

    Como a um cativo, o ouvem a passar Os servos do solar.

    E, quando o vem, vem a figura Da febre e da amargura,

    Com fixos olhos rasos de nsia

    Fitando a proibida azul distncia.

    *

    ContDi

  • Senhor, os dois irmos do nosso Nome - O Poder e o Renome -

    Ambos se foram pelo mar da idade tua eternidade;

    E com eles de ns se foi

    O que faz a alma poder ser de heri.

    Queremos ir busc-los, desta vil Nossa priso servil:

    a busca de quem somos, na distncia De ns; e, em febre de nsia,

    A Deus as mos alamos.

    Mas Deus no d licena que partamos.

  • Segundo/ Tormenta

    Que jaz no abismo sob o mar que se ergue? Ns, Portugal, o poder ser.

    Que inquietao do fundo nos soergue? O desejar poder querer.

    Isto, e o mistrio de que a noite o fausto... Mas sbito, onde o vento ruge,

    O relmpago, farol de Deus, um hausto Brilha e o mar scuro struge.

    26/02/1934

  • Terceiro/ Calma

    Que costa que as ondas contam E se no pode encontrar

    Por mais naus que haja no mar? O que que as ondas encontram E nunca se v surgindo? Este som de o mar praiar Onde que est existindo?

    Ilha prxima e remota, Que nos ouvidos persiste, Para a vista no existe.

    Que nau, que armada, que frota Pode encontrar o caminho praia onde o mar insiste, Se vista o mar sozinho?

    Haver rasges no espao Que dem para outro lado, E que, um deles encontrado, Aqui, onde h s sargao, Surja uma ilha velada, O pas afortunado

    Que guarda o Rei desterrado Em sua vida encantada?

    15/02/1934

  • Quarto/ Antemanh

    O mostrengo que est no fim do mar Veio das trevas a procurar

    A madrugada do novo dia, Do novo dia sem acabar;

    E disse, Quem que dorme a lembrar Que desvendou o Segundo Mundo Nem o Terceiro quer desvendar?

    E o som na treva de ele rodar

    Faz mau o sono, triste o sonhar, Rodou e foi-se o mostrengo servo Que seu senhor veio aqui buscar. Que veio aqui seu senhor chamar- Chamar Aquele que est dormindo E foi outrora Senhor do Mar.

    08/07/1933

  • Quinto/ Nevoeiro

    Nem rei nem lei, nem paz nem guerra, Define com perfil e ser

    Este fulgor bao da terra

    Que Portugal a entristecer-

    Brilho sem luz e sem arder,

    Como o que o fogo-ftuo encerra.

    Ningum sabe que coisa quer. Ningum conhece que alma tem, Nem o que mal nem o que bem. (Que nsia distante perto chora?) Tudo incerto e derradeiro. Tudo disperso, nada inteiro. Portugal, hoje s nevoeiro...

    a Hora!

    Valete, Frates.10/12/1928

  • Biografia do autor

  • 1888: Nasce Fernando Antnio NogueiraPessoa, em Lisboa.1893: Perde o pai.1895: A me casa-se com o comandanteJoo Miguel Rosa. Partem para Durban,frica do Sul.1904: Recebe o Prmio Queen MemorialVictoria, pelo ensaio apresentado no examede admisso Universidade do Cabo daBoa Esperana.1905: Regressa sozinho a Lisboa.1912: Estreia-se na Revista guia.1915: Funda, com alguns amigos, a revistaOrpheu.1918/21: Publicao dos English Poems.1925: Morre a me do poeta.1934: Publica Mensagem.1935: Morre de complicaes hepticas emLisboa