A Morte Na Obra de Carlo Collodi

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A morte na obra de Carlo Collodi - As Aventuras de Pinóquio: história de uma marionete A literatura infanto juvenil surgiu com propósitos pedagógicos de passar um “bom exemplo” para as crianças de como se comportar, esse tipo de literatura visava educar e moldar as crianças. O surgimento de uma leitura para esse público alvo nasceu juntamente com uma revisão do papel da criança na sociedade, a partir do século XVII. Assim, essas passaram a ser vistas como dependentes do afeto e da proteção familiar, dessa forma, a literatura infanto juvenil também intentava proteger as crianças da realidade. Porém, ao longo do tempo essa visão de literatura infanto juvenil não prevaleceu. De acordo com Mastroberti (2007), essa literatura não passa de um rótulo que visa seus interesses econômicos, pois se encontra num mercado que produz e vende muitos livros. A autora ainda adiciona que Há que se perguntar, então, se ao invés de nos precipitarmos em definir tal produção como um gênero, não seria mais prudente avaliar se ela não se realiza dentro de um sentido discriminatório cultural, buscando o apartamento entre o ser jovem e o ser aduolto, como se fossem espécies diferentes. Fica a pergunta: não haverá um ponto de esforço onde nos comuniquemos na mesma língua? Por que tanto esforço em evitar uma integração entre adultos e jovens? (MASTROBERTI, Paula)

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A morte na obra de Carlo Collodi - As Aventuras de Pinóquio: história de uma

marionete

A literatura infanto juvenil surgiu com propósitos pedagógicos de passar um “bom

exemplo” para as crianças de como se comportar, esse tipo de literatura visava educar e

moldar as crianças. O surgimento de uma leitura para esse público alvo nasceu

juntamente com uma revisão do papel da criança na sociedade, a partir do século XVII.

Assim, essas passaram a ser vistas como dependentes do afeto e da proteção familiar,

dessa forma, a literatura infanto juvenil também intentava proteger as crianças da

realidade.

Porém, ao longo do tempo essa visão de literatura infanto juvenil não prevaleceu. De

acordo com Mastroberti (2007), essa literatura não passa de um rótulo que visa seus

interesses econômicos, pois se encontra num mercado que produz e vende muitos livros.

A autora ainda adiciona que

Há que se perguntar, então, se ao invés de nos precipitarmos em definir tal

produção como um gênero, não seria mais prudente avaliar se ela não se

realiza dentro de um sentido discriminatório cultural, buscando o

apartamento entre o ser jovem e o ser aduolto, como se fossem espécies

diferentes. Fica a pergunta: não haverá um ponto de esforço onde nos

comuniquemos na mesma língua? Por que tanto esforço em evitar uma

integração entre adultos e jovens? (MASTROBERTI, Paula)

Para Mastroberti rotular como literatura infanto juvenil é determinar seu destino e, por

consequência limitar a literatura. A autora também afirma que não é necessário usar

uma linguagem “especial” na literatura para crianças e jovens, pois esses têm

capacidade de entender e poder tirar conhecimento das obras que leem. De acordo com

Mastroberti, toda leitura é assimétrica, todos somos assimétricos em relação a alguma

coisa, habilidade ou experiência, não importa a idade ou ciscuntâncias do leitor, o autor

sempre será assimétrico a ele.

Para ilustrar as teorias de alguns autores de que as crianças conseguem lidar com temas

considerados “pesados”, como a morte. Apresenta-se aqui o livro de Carlo Collodi “As

Aventuras de Pinóquio História de uma marionete”, nesta obra em contrapartida com a

versão de Walt Disney, o Pinóquio é uma marionete cabeça-dura, inflexível e

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desobediente. Apesar de não ser uma personagem malvada, Pinóquio comete inúmeros

erros ao longo da história devido à sua desobediência, porém ele é responsável por esses

erros e toma as consequências de todos.

Em muitos momentos da obra Pinóquio é castigado, e neste trabalho será analisado uma

das punições que o boneco é submetido: a morte. No capítulo quinze, quando Pinóquio

corre dos assassinos que o perseguem, este vê uma casinha branca e decide correr até lá

para pedir ajuda. Nesse momento, quem atende Pinóquio é a Fada e esta não abre a

porta para Pinóquio se esconder, pois está morta e assim, diz para Pinóquio que não

poderá abrir a porta. Dessa forma, Pinóquio é pego pelos assassinos e levado para uma

forca num grande carvalho, o autor então descreve a morte de Pinóquio, que se

apresenta de forma mórbida e triste:

Pouco a pouco seus olhos se toldaram e, embora sentisse aproximar-se a morte,

esperava ainda assim que de um momento a outro aparecesse alguma alma

caridosa para ajudá-lo.Porém, quando depois de muito esperar viu que

ninguém, ninguém mesmo, voltou-lhe à lembrança o seu pobre pai... [...] Não

teve fôlego para dizer mais nada. Fechou os olhos, abriu a boca, estirou as

pernas e, depois de uma grande sacudidela, ficou ali como se congelado.

(COLLODI, Carlo)

Analisando este trecho do livro de Collodi, percebe-se que o autor não procura poupar

as crianças da realidade, ele cria uma cena bem descritiva de como Pinóquio tem seus

últimos suspiros até entregar-se a morte. Apesar de Pinóquio voltar a vida no capítulo

seguinte, a personagem toma as consequências de suas desobediências, foi avisado de

que poderia cair nas mãos de assassinos, e assim aconteceu.

Essa visão de Collodi de expor o Pinóquio como alguém com defeitos, que erra

repetidamente mas que sofre os efeitos de seus atos, pode ensinar muito mais as

crianças, pois esta personagem é mais realista, mais fácil de se relacionar do que, por

exemplo, o Pinóquio de Walt Disney, pois este é sempre um bom menino, porém muito

ingênuo (beirando o débil) que sempre é enganado pelas personagens trapaceiras.

Portanto Carlo Collodi, aparentemente, não vê as crianças como esses seres ingênuos, e

estas não são.

Tratando-se do tema morte, há uma personagem que deve ser mencionada, esta é a

Fada. Essa personagem de Collodi se apresenta de diferentes maneiras na obra, em um

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momento é uma menina, mulher e até ovelha. Portanto, pode-se dizer que a Fada é uma

personagem “polimorfa”, ou seja, apresenta diferentes formas, e o modo como Pinóquio

a reconhece é sempre pelos cabelos azuis. Além disso, pode-se adicionar que a Fada

representa uma “senhora da morte” devido à suas várias mortes na história. Logo,

percebe-se que essa personagem sofre metamorfoses (a cada morte, desaparição, a Fada

sobre uma metamorfose), assim no momento em que Pinóquio se torna um menino de

verdade, o ciclo de metamorfoses é quebrado e, dessa forma, a Fada morre, e se

metamorfoseia para o plano dos sonhos saindo do plano da matéria.

Referências:

COLLODI, Carlo. As aventuras de Pinóquio: história de uma marionete. Trad.

Marina Colasanti; ilustrações Odilon Moraes. São Paulo: Companhia das Letrinhas,

2002.

MANGANELLI, Giorgio. Pinóquio: um livro paralelo; trad. Eduardo Brandão. São

Paulo: Companhia das Letras, 2002.

CAMPOS, Camila da Silva Alavarce. A IRONIA EM AS AVENTURAS DE

PINÓQUIO, DE CARLO COLLODI: ARTE LITERA´RIA OU PEDAGÓGICA?.

Uberlândia, ILEEL (Instituto de Letras e Linguística).

MASTROBERTI, Paula. Literatura infanto-juvenil: gênero, estilo ou etiqueta?.

2007.