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Ernesto Araújo nasceu em Porto Alegre, em 1967. Bacharel em Letras, pela Uni- versidade de Brasília, ingressou no Instituto Rio Branco em 1990 e con- cluiu o Curso de Preparação à Car- reira de Diplomata em 1991. Nos primeiros anos de sua carreira di- plomática, trabalhou com temas de integração regional e MERCOSUL. Serviu na Missão do Brasil junto às Comunidades Europeias, em Bruxe- las, e nas Embaixadas na Alemanha, Canadá e Estados Unidos. Em Brasília, trabalhou também com assuntos financeiros e negocia- ções comerciais, além de ter atua- do como Subchefe do Gabinete do Ministro das Relações Exteriores e como Diretor do Departamento dos Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos, função que exer- ceu até assumir o cargo de Ministro de Estado das Relações Exteriores, em janeiro de 2019. Publicou os livros MERCOSUL Hoje (coautoria com Sergio Abreu de Lima Florêncio) e MERCOSUL: negociações extrarregionais , bem como três obras de ficção e diversos artigos sobre temas atuais. coleção Política Externa Brasileira SELEÇÃO DE DISCURSOS, ARTIGOS E ENTREVISTAS DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES 2019 Fundação Alexandre de Gusmão A NOVA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA Este livro reúne uma seleção dos principais discursos, artigos e en- trevistas do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, ao longo de 2019, primeiro ano do governo do Presidente Jair Messias Bolsonaro. Trata-se de fon- te primária fundamental para todos os que se interessem por conhecer e estudar a nova política externa brasileira, baseada nos eixos da democracia; da transformação eco- nômica e do desenvolvimento; da soberania; e dos valores da nação brasileira, eixos esses conjugados pelo conceito de liberdade. A publicação desta importante obra insere-se no objetivo básico da Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG) de “divulgar a política ex- terna brasileira em seus aspectos gerais” (Lei nº 5.717, de 26 de ou- tubro de 1971, art. 1º, III). Trata-se de tradição da FUNAG, que sempre procurou publicar coletâneas de textos de chanceleres brasileiros, como fonte primária para o estudo da política externa do país. Outros textos sobre a nova po- -lítica externa brasileira podem ser encontrados na seguinte página da FUNAG: http://www.funag.gov.br/ nova-politica-externa/. “Somos um país universalista, é certo, e a partir desse universalismo queremos construir algo bom e produtivo com cada parceiro. Mas universalismo não significa não ter opiniões. Universalismo não significa uma geleia geral. Não significa querer agra- dar a todos. A vocação do Brasil não é ser um país que simplesmente existe para agradar. Queremos ser escutados, mas queremos ser escutados não por repetir alguns dogmas insignificantes e algumas fra- ses assépticas, queremos ser escutados por ter algo a dizer. Nós buscaremos as parcerias e as alianças que nos permitam chegar onde queremos, não pediremos permissão à ordem global, o que quer que ela seja. Defenderemos a liberdade e a vida. Defenderemos o direito de cada povo de ser o que é, com liberdade e dignidade, com a dignidade que unicamente a li- berdade proporciona.” Ernesto Araújo Ministro das Relações Exteriores (Excerto do discurso de posse, 02/01/2019) www.funag.gov.br ISBN 978-65-87083-32-2 9 786587 083322 > A NOVA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA SELEÇÃO DE DISCURSOS, ARTIGOS E ENTREVISTAS DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES Ernesto Araújo 2019

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  • Ernesto Araújo nasceu em Porto Alegre, em 1967.

    Bacharel em Letras, pela Uni-versidade de Brasília, ingressou no Instituto Rio Branco em 1990 e con-cluiu o Curso de Preparação à Car-reira de Diplomata em 1991. Nos primeiros anos de sua carreira di-plomática, trabalhou com temas de integração regional e MERCOSUL. Serviu na Missão do Brasil junto às Comunidades Europeias, em Bruxe-las, e nas Embaixadas na Alemanha, Canadá e Estados Unidos.

    Em Brasília, trabalhou também com assuntos financeiros e negocia-ções comerciais, além de ter atua-do como Subchefe do Gabinete do Ministro das Relações Exteriores e como Diretor do Departamento dos Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos, função que exer-ceu até assumir o cargo de Ministro de Estado das Relações Exteriores, em janeiro de 2019.

    Publicou os livros MERCOSUL Hoje (coautoria com Sergio Abreu de Lima Florêncio) e MERCOSUL: negociações extrarregionais, bem como três obras de ficção e diversos artigos sobre temas atuais.

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    Este livro reúne uma seleção dos principais discursos, artigos e en-trevistas do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, ao longo de 2019, primeiro ano do governo do Presidente Jair Messias Bolsonaro. Trata-se de fon-te primária fundamental para todos os que se interessem por conhecer e estudar a nova política externa brasileira, baseada nos eixos da democracia; da transformação eco-nômica e do desenvolvimento; da soberania; e dos valores da nação brasileira, eixos esses conjugados pelo conceito de liberdade.

    A publicação desta importante obra insere-se no objetivo básico da Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG) de “divulgar a política ex-terna brasileira em seus aspectos gerais” (Lei nº 5.717, de 26 de ou-tubro de 1971, art. 1º, III). Trata-se de tradição da FUNAG, que sempre procurou publicar coletâneas de textos de chanceleres brasileiros, como fonte primária para o estudo da política externa do país.

    Outros textos sobre a nova po--lítica externa brasileira podem ser encontrados na seguinte página da FUNAG: http://www.funag.gov.br/nova-politica-externa/.

    “Somos um país universalista, é certo, e a partir desse universalismo queremos construir algo bom e produtivo com cada parceiro. Mas universalismo não significa não ter opiniões. Universalismo não significa uma geleia geral. Não significa querer agra-dar a todos. A vocação do Brasil não é ser um país que simplesmente existe para agradar. Queremos ser escutados, mas queremos ser escutados não por repetir alguns dogmas insignificantes e algumas fra-ses assépticas, queremos ser escutados por ter algo a dizer.

    Nós buscaremos as parcerias e as alianças que nos permitam chegar onde queremos, não pediremos permissão à ordem global, o que quer que ela seja. Defenderemos a liberdade e a vida. Defenderemos o direito de cada povo de ser o que é, com liberdade e dignidade, com a dignidade que unicamente a li-berdade proporciona.”

    Ernesto Araújo Ministro das Relações Exteriores

    (Excerto do discurso de posse, 02/01/2019)

    www.funag.gov.br

    ISBN 978-65-87083-32-2

    9 786587 083322 >

    A NOVAPOLÍTICA EXTERNA

    BRASILEIRASELEÇÃO DE DISCURSOS, ARTIGOS E ENTREVISTAS

    DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

    Ernesto Araújo

    2019

    http://www.funag.gov.br/nova-politica-externa/http://www.funag.gov.br/nova-politica-externa/

  • Ernesto Araújo nasceu em Porto Alegre, em 1967.

    Bacharel em Letras, pela Uni-versidade de Brasília, ingressou no Instituto Rio Branco em 1990 e con-cluiu o Curso de Preparação à Car-reira de Diplomata em 1991. Nos primeiros anos de sua carreira di-plomática, trabalhou com temas de integração regional e MERCOSUL. Serviu na Missão do Brasil junto às Comunidades Europeias, em Bruxe-las, e nas Embaixadas na Alemanha, Canadá e Estados Unidos.

    Em Brasília, trabalhou também com assuntos financeiros e negocia-ções comerciais, além de ter atua-do como Subchefe do Gabinete do Ministro das Relações Exteriores e como Diretor do Departamento dos Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos, função que exer-ceu até assumir o cargo de Ministro de Estado das Relações Exteriores, em janeiro de 2019.

    Publicou os livros MERCOSUL Hoje (coautoria com Sergio Abreu de Lima Florêncio) e MERCOSUL: negociações extrarregionais, bem como três obras de ficção e diversos artigos sobre temas atuais.

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    Este livro reúne uma seleção dos principais discursos, artigos e en-trevistas do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, ao longo de 2019, primeiro ano do governo do Presidente Jair Messias Bolsonaro. Trata-se de fon-te primária fundamental para todos os que se interessem por conhecer e estudar a nova política externa brasileira, baseada nos eixos da democracia; da transformação eco-nômica e do desenvolvimento; da soberania; e dos valores da nação brasileira, eixos esses conjugados pelo conceito de liberdade.

    A publicação desta importante obra insere-se no objetivo básico da Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG) de “divulgar a política ex-terna brasileira em seus aspectos gerais” (Lei nº 5.717, de 26 de ou-tubro de 1971, art. 1º, III). Trata-se de tradição da FUNAG, que sempre procurou publicar coletâneas de textos de chanceleres brasileiros, como fonte primária para o estudo da política externa do país.

    Outros textos sobre a nova po--lítica externa brasileira podem ser encontrados na seguinte página da FUNAG: http://www.funag.gov.br/nova-politica-externa/.

    “Somos um país universalista, é certo, e a partir desse universalismo queremos construir algo bom e produtivo com cada parceiro. Mas universalismo não significa não ter opiniões. Universalismo não significa uma geleia geral. Não significa querer agra-dar a todos. A vocação do Brasil não é ser um país que simplesmente existe para agradar. Queremos ser escutados, mas queremos ser escutados não por repetir alguns dogmas insignificantes e algumas fra-ses assépticas, queremos ser escutados por ter algo a dizer.

    Nós buscaremos as parcerias e as alianças que nos permitam chegar onde queremos, não pediremos permissão à ordem global, o que quer que ela seja. Defenderemos a liberdade e a vida. Defenderemos o direito de cada povo de ser o que é, com liberdade e dignidade, com a dignidade que unicamente a li-berdade proporciona.”

    Ernesto Araújo Ministro das Relações Exteriores

    (Excerto do discurso de posse, 02/01/2019)

    www.funag.gov.br

    ISBN 978-65-87083-32-2

    9 786587 083322 >

    A NOVAPOLÍTICA EXTERNA

    BRASILEIRASELEÇÃO DE DISCURSOS, ARTIGOS E ENTREVISTAS

    DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

    Ernesto Araújo

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    http://www.funag.gov.br/nova-politica-externa/http://www.funag.gov.br/nova-politica-externa/

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    ção Política

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    SELEÇÃO DE DISCURSOS, ARTIGOS E ENTREVISTAS DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

    2019

  • Ministério das Relações ExterioresFundação Alexandre de Gusmão

    A Fundação Alexandre de Gusmão – FUNAG, instituída em 1971, é uma fundação pública vinculada ao Ministério das Relações Exteriores e tem a finalidade de levar à sociedade informações sobre a realidade internacional e sobre aspectos da pauta diplomática bra‑sileira. Sua missão é promover a sensibilização da opinião pública para os temas de relações internacionais e para a política externa brasileira.

    A FUNAG, com sede em Brasília, conta em sua estrutura com o Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais – IPRI e com o Centro de História e Documentação Diplomática – CHDD, este último no Rio de Janeiro.

  • Ernesto Araújo

    A NOVA POLÍTICA EXTERNA

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    SELEÇÃO DE DISCURSOS, ARTIGOS E ENTREVISTAS DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

    2019

    Brasilia – 2020

  • Direitos de publicação reservados àFundação Alexandre de GusmãoMinistério das Relações ExterioresEsplanada dos Ministérios, Bloco H, anexo II, Térreo70170 ‑900 Brasília–DFTel.: (61)2030‑9117/9128Site: www.funag.gov.brE ‑mail: [email protected]

    Equipe Técnica:Acauã Lucas LeottaDenivon Cordeiro de CarvalhoDiego Marques Morlim PereiraGabriela Del Rio de RezendeLuiz Antônio GusmãoHigor GomesRafaela de Sousa Medeiros

    Revisão:Roberto GoidanichFernanda Antunes Siqueira

    Programação Visual e Diagramação:Varnei Rodrigues ‑ Propagare Comercial Ltda.

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    A663 Araújo, Ernesto

    A nova política externa brasileira: seleção de discursos, artigos e entrevistas do Ministro das Relações Exteriores – 2019 / Ernesto Araújo. - Brasília: FUNAG, 2020

    580 p. - (Coleção Política Externa Brasileira)

    ISBN 978-65-87083-32-2

    1. Política externa - Brasil. 2. Relações exteriores. II. Título.

    CDU 327CDD 327

    Depósito legal na Fundação Biblioteca Nacional conforme Lei nº 10.994, de 14/12/2004.Bibliotecária responsável: Raimunda Lima Evangelista, CRB-1/3382

  • Sumário

    Lista de siglas .................................................................................................11

    1. Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exte-riores, em Brasília (02/01/2019) ..........................................................15

    2. Discurso na cerimônia de transmissão de cargo do Secretário-Geral das Relações Exteriores, em Brasília (03/01/2019) .........................33

    3. Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal como o encontrou, artigo publicado pela Bloomberg (07/01/2019) ...............................37

    4. Agora falamos, artigo publicado pela revista The New Criterion (janeiro, 2019) ..........................................................................................45

    5. Apresentação na reunião ministerial informal da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Davos (25/01/2019) ...............59

    6. Discurso na Conferência Ministerial para Promover um Futuro de Paz e Segurança no Oriente Médio, em Varsóvia (14/02/2019) ..63

    7. Contra o consenso da inação, artigo publicado no portal Metapolítica 17 (03/03/2019) .......................................................................................69

    8. Aula magna no Instituto Rio Branco, em Brasília (11/03/2019) ..73

    9. Discurso na abertura da 1ª reunião de Sherpas do BRICS, em Curitiba (14/03/2019) ...........................................................................................105

    10. Entrevista concedida à Brasil Paralelo, em Brasília (17/03/2019) ...........................................................................................115

  • 11. Alocuções no “Dia do Brasil” na Câmara de Comércio dos Estados Unidos, em Washington, D.C. (18/03/2019) ..................................131

    12. Entrevista sobre a Venezuela e o Brasil no cenário mundial, concedida ao Terça Livre TV (19/03/2019) ........................................................137

    13. Apresentação inicial na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília (27/03/2019) 151

    14. Discurso por ocasião do Encontro Empresarial Brasil-Israel, em Jerusalém (02/04/2019) .......................................................................169

    15. Apresentação inicial na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal, em Brasília (04/04/2019) ...............177

    16. Palestra na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), em São Paulo (08/04/2019) ................................................................189

    17. Palestra no Conselho Argentino para as Relações Internacionais (CARI), em Buenos Aires (09/04/2019) ..........................................211

    18. Discurso na cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco (03/05/2019) ...........................................................................................237

    19.Os primeiros avanços da nova política externa, artigo publicado no jornal Valor Econômico (08/05/2019) ........................................245

    20. Discurso na conferência “A cooperação entre o Brasil e a África”, por ocasião da celebração do Dia da África, em Brasília (27/05/2019) ...........................................................................................249

    21. Apresentação por ocasião do trigésimo aniversário da Embrapa Territorial, em Campinas (30/05/2019) ...........................................261

  • 22. Discurso em evento empresarial durante visita presidencial, em Buenos Aires (06/06/2019) .................................................................267

    23. Palestra no seminário da Fundação Alexandre de Gusmão sobre globalismo, em Brasília (10/06/2019) ...............................................271

    24. Alocução por ocasião da celebração de 4 de Julho na Embaixada dos EUA, em Brasília (04/07/2019) ..................................................283

    25. Discurso na data nacional da Venezuela, em Brasília (05/07/2019) ...........................................................................................285

    26. Discurso na reunião do Conselho do Mercado Comum, em Santa Fé, Argentina (16/07/2019) .................................................................291

    27. Discurso na XXIV Reunião Ordinária do Conselho de Ministros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada em Mindelo, Cabo Verde (19/07/2019) ...........................................297

    28. Apresentação inicial em audiência pública na Comissão de Se-guridade Social e Família da Câmara dos Deputados, em Brasília (07/08/2019) ...........................................................................................309

    29. Liberdade religiosa, religião libertadora, artigo publicado no portal Metapolítica 17 (19/07/2019) ....................................................... 317

    30. Discurso na abertura da III Reunião de Ministros das Relações Exteriores do BRICS, no Rio de Janeiro (26/07/2019) .................325

    31. Alocução na VIII Reunião do Corredor Rodoviário Bioceânico, em Campo Grande (22/08/2019) .............................................................335

    32. Incêndios na Amazônia: o processo de bruxaria contra o go-verno do Brasil, artigo publicado no jornal Le Figaro, França (28/08/2019) ...........................................................................................341

  • 33. Palestra na Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) sobre a nova política externa do Brasil e sua vertente co-mercial, no Rio de Janeiro (28/08/2019) ..........................................349

    34. Discurso no seminário “60 anos das relações Brasil-República da Coreia”, em Brasília (03/09/2019) ......................................................365

    35. Alocuções na reunião de trabalho da Rede de Agentes de Combate ao Suborno Transnacional da América Latina e Caribe da OCDE, em Brasília (03/09/2019) .....................................................................371

    36. Discurso na Heritage Foundation, em Washington, D.C. (11/09/2019) ...........................................................................................377

    37. Alocução no National Press Club, em Washington, D.C. (13/09/2019) ...........................................................................................407

    38. Alocuções no evento Rebuilding Communities: Ensuring a Future for Persecuted Christians, em Nova York (27/09/2019) ..............417

    39. Discurso no lançamento da publicação dos compromissos voluntários do Brasil no contexto da candidatura do país ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Brasília (04/10/2019) ............423

    40. O Brasil está aberto a negócios, artigo publicado no perfil do governo federal no LinkedIn (10/10/2019) .....................................................431

    41. Discurso na abertura do Fórum de Investimentos Brasil 2019, em São Paulo (10/10/2019) .......................................................................435

    42. Painel no Fórum de Investimentos Brasil 2019, em São Paulo (10/10/2019) ...........................................................................................439

    43. Discurso na Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC) Brasil 2019, em São Paulo (12/10/2019) ..........................................449

  • 44. Alocução da mesa-redonda “Perspectivas do cenário macroeconômico e do ambiente de negócios no Brasil”, em Doha (28/10/2019) ...463

    45. Alocução na abertura do seminário empresarial sobre o Brasil no Conselho das Câmaras Sauditas, em Riade (30/10/2019) ...........467

    46. Discurso no lançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Comércio Internacional e do Investimento – Frencomex, em Brasília (06/11/2019) ............................................................................471

    47. Alocuções na sessão ampliada da XVI Reunião dos Minis-tros das Relações Exteriores do Grupo de Lima, em Brasília (08/11/2019) ...........................................................................................479

    48. Saudação na abertura da VIII Conferência sobre Relações Exteriores (CORE), em São Paulo (11/11/2019) ...............................................489

    49. Discurso no seminário internacional “Novos anseios da po-lítica externa brasileira: renovar para avançar”, em Brasília (21/11/2019) ...........................................................................................493

    50. Mensagem para os participantes do III Fórum Nacional da Liga Cristo Rei, no Rio de Janeiro (23/11/2019) .....................................501

    51. Um novo Brasil no mundo: avanços da política externa no governo Bolsonaro, artigo publicado na revista Interesse Nacional ........505

    52.Trump, Venezuela, acordo com União Europeia: Ernesto Araújo fala sobre os desafios do novo Itamaraty, entrevista publicada no jornal Gazeta do Povo (03/12/2019) ................................................517

    53. Discursos na LV Reunião do Conselho do Mercado Comum (CMC), em Bento Gonçalves (04/12/2019) ...................................................535

  • 54. Palestra no Ministério das Relações Exteriores de Angola, em Luanda (13/12/2019) ...........................................................................................549

    55. Balanço da política externa em 2019 e mensagem de final de ano, em Brasília (17/12/2019) .....................................................................561

    56. Para além do horizonte comunista, artigo publicado pela revista Terça Livre (18/12/2019).....................................................................563

    57. Discurso na cerimônia de cumprimentos ao corpo diplomático, em Brasília (18/12/2019) ............................................................................569

    58. Mensagem de final de ano, em Brasília (27/12/2019) ..................575

  • 11

    Lista de siglas

    ABC – Agência Brasileira de Cooperação, do MRE

    ACP – Acordo de Comércio Preferencial

    AFRICOM – Comando Militar dos EUA para África (United States Africa Command)

    AGU – Advocacia-Geral da União

    ALCA – Área de Livre Comércio das Américas

    Apex-Brasil – Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos

    ASEAN – Associação de Nações do Sudeste Asiático (Association of Southeast Asean Nations)

    BIF – Fórum Brasil de Investimentos (Brazil Invetment Forum)

    BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

    CDH – Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas

    CEDEAO ou ECOWAS – Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Economic Community of West African States)

    CGU – Controladoria-Geral da União

    CNA – Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil

    CORE – Conferência sobre Relações Exteriores do IPRI/FUNAG

    COSBAN – Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação

    CPAC – Conferência de Ação Política Conservadora (Conservative Political Action Conference)

    CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

    CSW – Comissão sobre o Status da Mulher das Nações Unidas (United Nations Commission on the Status of Women)

    DNA ou ADN – Ácido desoxirribonucleico (deoxyribonucleic acid)

  • 12

    Ernesto Araújo

    EFTA – Associação Europeia de Livre Comércio

    Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

    EUA – Estados Unidos da América

    FAB – Força Aérea Brasileira

    FEB – Força Expedicionária Brasileira

    FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo

    Firjan – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro

    Frencomex – Frente Parlamentar Mista em Defesa do Comércio Internacional e do Investimento

    FUNAG – Fundação Alexandre de Gusmão, vinculada ao MRE

    HIV/AIDS ou SIDA – Síndrome da imunodeficiência adquirida (hu-man immunodeficiency virus / acquired immune deficiency syndrome)

    IBSAMAR – India-Brazil-South Africa Maritime, exercícios navais que reúnem Índia, Brasil e África do Sul

    IED – Investimento estrangeiro direto

    IILP – Instituto Internacional da Língua Portuguesa, da CPLP

    INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

    IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (Intergovernmental Panel on Climate Chance)

    IPRI – Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, da FUNAG

    MAGA – Make America Great Again

    MERCOSUL – Mercado Comum do Sul

    MRE – Ministério das Relações Exteriores

    NDB – Novo Banco de Desenvolvimento (New Development Bank), do BRICS

    OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

    ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

  • 13

    Lista de siglas

    OEA – Organização dos Estados Americanos

    OMC – Organização Mundial do Comércio

    OMS – Organização Mundial da Saúde

    ONG – Organização não governamental

    ONU – Organização das Nações Unidas

    OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte

    PEC – Proposta de emenda constitucional

    PGR – Procuradoria-Geral da República (ou Procurador-Geral da República)

    PIB – Produto interno bruto

    PMDB (atualmente MDB) – Partido do Movimento Democrático Brasileiro

    PPI – Programa de Parcerias de Investimentos

    PROSUL – Foro para o Progresso e Integração da América do Sul

    PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira

    PT – Partido dos Trabalhadores

    SACU – União Aduaneira da África Austral (Southern African Customs Union)

    SADC – Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (Southern African Development Community)

    SNDPD – Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

    SPIO – Grupo de Altos Funcionários de Integridade Pública (Working Party of Senior Public Integrity Officials), da OCDE

    SPS – Medidas sanitárias e fitossanitárias (sanitary and phy-tosanitary measures)

    TEC – Tarifa externa comum do MERCOSUL

    TIAR – Tratado Interamericano de Asssistência Recíproca

    TSE – Tribunal Superior Eleitoral

  • 14

    Ernesto Araújo

    UNASUL – União de Nações Sul-Americanas

    UNCAC – Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (United Nations Convention against Corruption)

    UNFCCC – Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (United Nations Framework Convention on Climate Change)

    USTR – Representante Comercial dos EUA (United States Trade Representative)

  • 1515

    1. Discurso na cerimônia de posse como Mi-nistro das Relações Exteriores, em Brasília (02/01/2019)

    Meu ilustre antecessor, Senador Aloysio Nunes Ferreira, Senhora Gisele,

    Excelentíssimo Senhor Ministro José Antonio Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal,

    Excelentíssimo Senhor Presidente Fernando Collor de Mello,

    Sua Alteza Imperial e Real Dom Bertrand de Orleans e Bragança, que juntamente com os Presidentes Toffoli e Collor muito honram esta Casa e muito me honram pessoalmente, cuja presença muito agradeço,

    Excelentíssimo Dom Giovanni d’Aniello, Núncio Apostólico,

    Excelentíssimos demais Chefes de missões diplomáticas acreditadas junto ao governo do Brasil,

    Excelentíssima Senhora Tereza Cristina, Ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento,

    Excelentíssimo Senhor Ricardo de Aquino Salles, Ministro do Meio Ambiente,

    Excelentíssimo General Carlos Alberto dos Santos Cruz, Ministro da Secretaria de Governo,

    Excelentíssima Senhora Raquel Elias Ferreira Dodge, Procuradora-Geral da República,

    Excelentíssimo Senhor Senador Flávio Bolsonaro,

    Excelentíssimos demais Senhores Senadores e Deputados,

    Excelentíssimo senhores Secretários Executivos,

    Excelentíssimas demais autoridades civis, militares, eclesiásticas,

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    Ernesto Araújo

    Senhores Embaixadores,

    Minha mulher, Maria Eduarda, minha filha, Clarice, meus enteados, Joaquim e Pedro, minha mãe, Marylin, meu padrasto Luís Carlos, minha irmã Liss Mary, meu sogro, Embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa, grande chefe desta Casa, minha sogra, Marilu de Seixas Corrêa,

    Meus queridos amigos, colegas,

    Inicialmente, gostaria de agradecer muito vivamente as palavras tão amáveis do Ministro e Senador Aloysio Nunes a meu respeito. Agradeço, muito tocado, sua deferência e gostaria de dizer que a história sempre lembrará a sua condução sempre segura, serena, competente, desta Casa, em momentos difíceis, e queria dizer que tive muito orgulho em trabalhar sob sua chefia em temas importantes desse Ministério. O senhor deixará um legado muito importante para o Itamaraty.

    Gostaria de começar com uma frase que é absolutamente funda-mental para entender o que está acontecendo no Brasil. Vou dizê-la de uma maneira diferente do que vocês estão acostumados a ouvir:

    Gnosesthe ten aletheian kai he aletheia eleutherosei humas.

    “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.”

    Essa convicção íntima e profunda animou o Presidente Jair Bolsonaro na luta extraordinária que ele travou e está travando para reconquistar o Brasil e devolver o Brasil aos brasileiros.

    Nesse versículo de São João há três conceitos cruciais para o pensamento humano, para a vida humana e para o nosso momento histórico. Nós temos Gnosis, que é o conhecimento, Aletheia, a verdade, e Eleuthería, a liberdade.

    Aletheia. A tradução mais literal dessa palavra grega seria “desvelamento”, ou, melhor ainda, “desesquecimento”. Lethe é esque-cimento. Lethe é o rio do esquecimento que, na tradição grega, os

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    mortos cruzavam para ir para o outro lado. Então Aletheia é cruzar o rio de volta para cá. Aletheia é a superação do esquecimento. Algo que está esquecido e escondido e que de repente se recupera. Aletheia envolve uma experiência autêntica, individual, sentimental, de tal maneira que o nosso conceito atual de “verdade” é muito pobre diante desse conceito original. Nosso conceito de verdade normalmente se refere apenas à verdade factual, é um conceito um pouco técnico e frio, quando deveria ser algo orgânico e vivido.

    A Aletheia faz-nos desesquecer e reconectar-nos conosco mes-mos, e nesse redescobrimento e reconexão conosco mesmos é que a verdade liberta. Pois onde estava preso aquele que se vê libertado pela verdade? Estava preso fora de si mesmo. Estava procurando ser o que não é. O Brasil estava preso fora de si mesmo. E eu arriscaria dizer que a política externa brasileira estava presa fora do Brasil.

    Eleuthería, eleutherosei humas. Eleuthería é outra palavra genial criada pelos gregos. Eu não conheço nenhuma outra língua antiga – não conheço tantas, enfim; não conheço hitita, não conheço sânscrito

    – mas não conheço nenhuma outra língua antiga que possua esse conceito, exceto o latim libertas, mas que já é uma tradução tardia do grego. Então, mesmo assim, na Grécia antiga, eleuthería significava basicamente a liberdade civil, era um termo jurídico. Somente com a literatura cristã, e especialmente com esse trecho de São João, eleuthería tornou-se algo mais completo, mais profundo e mais elevado.

    É um conceito que se desgastou também ao longo dos séculos, a palavra liberdade desgastou-se ao longo dos séculos, mas preserva uma força incrível. A palavra liberdade ainda é uma palavra que acende o coração das pessoas. A pessoa pode estar lá, desanimada, no seu canto, mas quando escuta a palavra “liberdade”, não há quem não levante a cabeça, subitamente alerta, e pergunte: “Liberdade? Onde? Eu quero.”

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    Ernesto Araújo

    O Presidente Bolsonaro está libertando o Brasil por meio da verdade. Nós vamos também libertar a política externa brasileira, vamos libertar o Itamaraty, como o Presidente Bolsonaro prometeu que faríamos, em seu discurso de vitória.

    Bem, nós falamos da verdade e da liberdade, mas ainda não falamos do conhecimento, da gnosis. A verdade liberta, mas para chegar à verdade é preciso conhecê-la. E não se trata aqui de um conhecimento racional, pois a verdade não pode ser ensinada, a verdade nesse sentido profundo não pode ser ensinada por dedução analítica. Gnosis é o conhecimento no sentido de uma experiência mais íntima. A verdade é essencial, mas não pode ser ensinada nem aprendida. Mas se é assim, como é que nós vamos conhecer a verdade, que é a chave disso tudo?

    Para explicar isso eu queria apelar a um brasiliense ilustre, Renato Russo, quando ele diz: “é só o amor, é só o amor que conhece o que é verdade.”

    Não são a cautela ou a prudência que conhecem o que é a verdade, mas o amor. A cautela, a prudência e o pragmatismo são bons instrumentos, quando sabemos para onde queremos ir, mas eles não nos ensinam para onde ir, não nos mostram o que somos, não nos explicam a nós mesmos.

    É só o amor que explica o Brasil. O amor, o amor e a coragem que do amor decorre conduziram os nossos ancestrais a formarem esta nação imensa e complexa. Nós passamos anos na escola, quase todos nós, eu acho, escutando que foi a ganância ou o anseio de riqueza, ou pior ainda, o acaso, que formou o Brasil, mas não foi. Foram o amor, a coragem e a fé que trouxeram até aqui, através do oceano, através das florestas, pessoas que nos fundaram, pessoas que disseram coisas como esta que vou ler agora:

    Anuê Jaci, etinisemba-ê Indê irú manunhê

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    Yara rekô embobeuká tupirã Rekôku ya subí Embobeuká tupirabê Nge membyrá Tupã.

    Essa é a Ave Maria em tupi, na versão original do Padre José de Anchieta, onde ele traduz Maria por Jaci, a lua, Anuê Jaci, e Jesus por Tupã, o trovão.

    E aqui precisamos da Aletheia. O desesquecimento. Precisamos libertar a nossa memória histórica da qual essa modesta oração faz parte.

    Para libertar o Itamaraty através da verdade, precisamos recu-perar o papel do Itamaraty como guardião da continuidade da memória brasileira.

    Eu me lembro da emoção que eu senti pela primeira vez, quando era Terceiro-Secretário, que subi as escadas para este terceiro andar, e vi, logo ao subir a escada, o quadro da Coroação de Dom Pedro I e o quadro do Grito do Ipiranga. Imediatamente, eu, que tinha 22 anos, me lembrei de quando tinha cinco anos e assisti maravilhado no cinema ao filme Independência ou Morte, com Tarcísio Meira e Glória Menezes. E pensei: então tudo isso existe, não é? Tudo isso existe... E tudo isso é aqui!

    Eu me lembro desse momento muito marcadamente, e eu percebi: olha, isso aqui não é simplesmente uma repartição pública, isso aqui é uma espécie de um santuário. É uma espécie de túnel do tempo, onde os heróis estão vivos, os heróis famosos e os heróis anô-nimos, onde nós convivemos com os descobridores, com Alexandre de Gusmão, José de Anchieta, com D. João VI, com os imperadores e as princesas, com os bandeirantes e os abolicionistas, com os seringueiros e garimpeiros e tropeiros que construíram essa nação, e até mesmo com o estranho caso de um Barão monarquista que se tornou o grande ídolo da República.

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    Ernesto Araújo

    Eu não sei se alguns de vocês já tenham assistido provavelmente a um seriado espanhol chamado Ministerio del Tiempo. Eu recomendo. E eu diria que o Itamaraty, em certo sentido, não é somente um Ministério das Relações Exteriores, é também um Ministério do Tempo. Como talvez nenhuma outra instituição no Brasil, nós temos a responsabilidade de proteger e regar esse tronco histórico multissecular por onde corre a seiva da nacionalidade.

    O Presidente Bolsonaro disse que nós estamos vivendo o momento de uma nova independência. É isso que os brasileiros profundamente sentimos. E deveríamos senti-lo e vivê-lo, ainda mais aqui no Itamaraty, onde a história está tão presente. Deveríamos deixar fluir por estes salões e corredores a emoção deste novo nas-cimento da pátria.

    Precisamos desesquecer e lembrar de quem somos, de quem estamos voltando a ser.

    Diz o lema do Barão: Ubique patriae memor. Normalmente se traduz como “em todos os lugares, lembrar-se da pátria”. Aqui, os senhores me perdoarão a um professor de latim frustrado, que nunca fui, antes de querer ser diplomata, para dizer que está errada essa tradução. Memor é uma primeira pessoa. Então, na verdade é: “em todos os lugares, eu me lembro da pátria.” É um compromisso de vida pessoal que cada um de nós assume, e não uma simples anotação na agenda. Onde quer que seja, eu me lembro da pátria. E “eu me lembro da pátria”, aqui, não significa simplesmente que, quando estamos no exterior, devemos pensar no Brasil. Significa, se nós pensarmos no conceito de Aletheia: eu sinto essa verdade profunda que é a pátria, eu sinto o que é ter uma pátria e lembrar-se da pátria, portanto, como uma verdade central, essa verdade que liberta e que só se pode conhecer pelo amor.

    Lembrar-se da pátria. Não é lembrar-se da ordem liberal inter-nacional, não é lembrar-se da ordem global, não é lembrar-se do que

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    diz o último artigo da Foreign Affairs ou a última matéria do New York Times. É lembrar-se da pátria como uma realidade essencial.

    Não estamos aqui para trabalhar pela ordem global. Aqui é o Brasil.

    Não tenham medo de ser Brasil.

    Não tenham medo.

    Pensem, por exemplo, em Dom Sebastião. Quando preparava sua expedição à África, algum nobre da corte portuguesa perguntou a Dom Sebastião se ele não tinha medo. Dom Sebastião olhou e perguntou: “De que cor é o medo?”

    Alguém objetará que Dom Sebastião morreu pouco depois no areal do Alcácer Quibir, que é verdade, mas nós estamos falando aqui dele, não é? Nós sabemos quem ele é. Dom Sebastião tornou-se um mito, aquele que há de voltar das ondas do mar, num dia de muita névoa. Nós não nos lembramos das pessoas que ficaram em casa, daqueles que não foram ao Alcácer Quibir. A Aletheia que liberta está com os que foram, com os que seguiram a bandeira dos seus reis e dos seus santos, sem saber se iriam voltar, sem se importar se iriam voltar.

    O mito ensina a não ter medo, e é curioso que o mito é o mito, e no momento atual o mito é o apelido carinhoso que o povo brasileiro deu ao Presidente Bolsonaro.

    Marcel Proust dizia que os nossos sentimentos vão-se atrofiando por medo, por medo de sofrer. E eu acho que a nossa política externa vem-se atrofiando por medo de ser criticada. Então, não tenham medo de sofrer e não tenham medo de ser criticados.

    Por sua vez, Clarice Lispector dizia, falando do Brasil e do nacionalismo: “A nossa evidente tendência nacionalista não provém de nenhuma vontade de isolamento: ela é movimento sobretudo de autoconhecimento.” Autoconhecimento, a verdade. Aletheia, a verdade que liberta.

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    Ernesto Araújo

    Então, para não ter medo, vamos ler menos Foreign Affairs, e mais Clarice Lispector ou Cecília Meireles.

    Vamos ler menos The New York Times, e mais José de Alencar e Gonçalves Dias.

    Vamos escutar menos a CNN e mais Raul Seixas.

    Por que Raul Seixas? “Não fiquemos no trono de um aparta-mento”, ou de uma embaixada, “com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar”.

    Vamos fazer alguma coisa pelas nossas vidas e pelo nosso país. Mergulhemos no oceano de sentimento e na esperança do nosso povo. Não mergulhemos nessa piscina sem água que é a ordem global.

    O Itamaraty existe para o Brasil, não existe para a ordem global.

    O Itamaraty existe para o Brasil, não existe para si mesmo. Nós somos uma Casa de excelência? Somos, claro que sim. Mas para sê-lo precisamos mostrá-lo, e não ficar simplesmente repetindo isso uns para os outros. Nós vamos cuidar da nossa administração, do fluxo de carreira, vamos solucionar esse e muitos outros problemas, se Deus quiser, que legitimamente afligem a instituição, para que o Ministério possa melhor capacitar-se para sua tarefa maior. Queria dizer que nós não precisamos e não vamos abrir os quadros do Itamaraty para pessoas de fora da carreira, além dos casos que já existem. O Presidente Bolsonaro confia plenamente na capacidade desta Casa e desta carreira de implementar a sua política. Nós simplesmente estamos tomando a medida de flexibilizar a ocupação de cargos no Itamaraty por funcionários da carreira em determinados níveis hierárquicos justamente para arejar o fluxo da carreira e inclusive estimular os nossos colegas a ocuparem esses cargos.

    Nós temos tradições, é claro, mas precisamos empregá-las como estímulo para buscar a verdade e a liberdade, como serviço à pátria, como serviço a todos os brasileiros, tanto os mais humildes, quanto

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    os mais afortunados do nosso povo, esse povo que uma ideologia perversa não mais divide.

    Temos tradições, mas, como dizia o Embaixador Azeredo da Silveira, na frase famosa, “a maior tradição do Itamaraty é saber renovar-se”.

    Quando eu ingressei no Itamaraty, repetia-se essa frase a torto e a direito. Você não conseguia cruzar um corredor sem ouvir essa frase da tradição do Itamaraty sabendo renovar-se; mas há alguns anos, há muito tempo, eu pessoalmente já não tenho escutado essa frase. Não sei bem por quê. Talvez seja por um pouco desse ensimesmamento, de um certo comodismo que se criou.

    Nós nos apegamos muito à nossa própria autoimagem e fizemos dela uma espécie de um ídolo, e ficamos nos olhando um pouco no espelho e dizendo que nós somos o máximo, e dizendo que os governos não nos entendem, mas que o Itamaraty está acima dos governos. Nós nos tornamos diplomatas que fazem coisas que só são importantes para outros diplomatas. Isso precisa acabar. Deixemos de olhar no espelho e passemos a olhar pela janela. Ou melhor ainda, vamos sair à rua para o Brasil verdadeiro.

    Não tenhamos medo do povo brasileiro. Somos parte do povo brasileiro.

    Certa vez, ainda no Instituto Rio Branco, eu ouvi de um diplo-mata antigo o seguinte: “o Itamaraty não pode ser melhor do que o Brasil.” Nessa época, eu tomei isso como um sinal de um grande pessimismo. Era um momento difícil na história do Brasil e eu achei que ele estava dizendo “olha, o Brasil está ruim, e o Itamaraty está igual”. Mas hoje eu acho que finalmente eu compreendo o que ele queria dizer. O Itamaraty não pode achar que é melhor do que o Brasil. O Itamaraty não pode achar que não faz parte do Brasil. Fazemos parte, voltamos a fazer parte de uma aventura magnífica.

  • 24

    Ernesto Araújo

    A partir de hoje, o Itamaraty regressa ao seio da pátria amada.

    O Itamaraty voltou, porque o Brasil voltou.

    Fernando Pessoa afirmava o seguinte: “O poeta superior diz o que sente. O poeta médio diz o que decide sentir. O poeta inferior diz o que acha que deve sentir.” O mesmo talvez se possa dizer do diplomata. E o mesmo se aplica ao um país na sua presença internacional.

    Por muito tempo o Brasil dizia o que achava que devia dizer. Era um país que falava para agradar os administradores da ordem global. Queríamos ser um bom aluno na escola do globalismo, e achávamos que isso era tudo. Éramos um país inferior, aplicando a classificação de Fernando Pessoa.

    Mas o Brasil volta a dizer o que sente, e a sentir o que é.

    Vocês podem dizer que isso é “quixotesco”, talvez, e as pessoas nos chamam, às vezes, ou me chamam de tantas coisas bem piores que, então, “quixotesco”, vocês podem dizer que já estaria bom,

    “quixotesco” já seria um bom adjetivo. Mas isso me lembra algo que escutei do Professor Olavo de Carvalho, um homem que, após o Presidente Jair Bolsonaro, talvez seja o grande responsável pela imensa transformação que o Brasil está vivendo. Certa vez eu ouvi o Professor Olavo referir-se a um trecho do Dom Quixote de Cervantes, que é, talvez, o ponto central dessa obra. É quando Dom Quixote está caído à beira do caminho, em algum lugar de La Mancha, em espécie de delírio, e começa a conversar com os passantes como se fossem o Marquês disso, o Conde daquilo, ou algum herói de cavalaria, enquanto fala das suas próprias façanhas. Lá pelas tantas, ele se refere a um camponês que está passando como Marquês de Mântua. E o camponês para e olha para ele e diz: “Espera aí, eu sei quem é o senhor. Eu não sou Marquês de Mântua, eu sou seu vizinho, Pedro Alfonso. E o senhor não é Dom Quixote, o senhor é um bom

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    homem, que conheço há muitos anos, o senhor é Alonso Quijano.” E Dom Quixote para um segundo, pensa e responde: “Yo sé quién soy.”

    Algumas pessoas dirão que o Brasil não é isso tudo que o Presidente Bolsonaro acredita e que eu também acredito, dirão que o Brasil não tem capacidade de influir nos destinos do mundo, de defender os valores maiores da humanidade, que devemos apenas exportar produtos e atrair investimentos, pois afinal somos um bom país, quieto e pacífico, mas não temos poder para nada. Dirão que o Brasil é apenas Alonso Quijano. Mas o Brasil responderá: Eu sei quem eu sou.

    Eu sei quem eu sou.

    Somos um país universalista, é certo, e a partir desse universa-lismo queremos construir algo bom e produtivo com cada parceiro. Mas universalismo não significa não ter opiniões. Universalismo não significa uma geleia geral. Não significa querer agradar a todos. A vocação do Brasil não é ser um país que simplesmente existe para agradar. Queremos ser escutados, mas queremos ser escutados não por repetir alguns dogmas insignificantes e algumas frases assépticas, queremos ser escutados por ter algo a dizer.

    Nós buscaremos as parcerias e as alianças que nos permitam che-gar onde queremos, não pediremos permissão à ordem global, o que quer que ela seja. Defenderemos a liberdade e a vida. Defenderemos o direito de cada povo de ser o que é, com liberdade e dignidade, com a dignidade que unicamente a liberdade proporciona.

    Quem ama, luta pelo que ama. Então nós admiramos quem luta, admiramos aqueles que lutam pela sua pátria e aqueles que se amam como povo, por isso admiramos por exemplo Israel, que nunca deixou de ser uma nação, mesmo quando não tinha solo – em con-traste com algumas nações de hoje, que mesmo tendo seu solo, suas igrejas e seus castelos já não querem ser nação. Por isso admiramos os Estados Unidos da América, aqueles que hasteiam sua bandeira

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    Ernesto Araújo

    e cultuam seus heróis. Admiramos os países latino-americanos que se libertaram dos regimes do Foro de São Paulo. Admiramos nos-sos irmãos do outro lado do Atlântico que estão construindo uma África pujante e livre. Admiramos os que lutam contra a tirania na Venezuela e em outros lugares. Por isso admiramos a nova Itália, por isso admiramos a Hungria e a Polônia, admiramos aqueles que se afirmam e não aqueles que se negam. O problema do mundo não é a xenofobia, mas a oikofobia – de oikos, oikía, o lar. Oikofobia é odiar o próprio lar, o próprio povo, repudiar o próprio passado.

    É mais fácil não amar, não lutar, porque amar e lutar também significam sofrer, significam muitas vezes não ser compreendido, significam suscitar o ódio, o desprezo, a inveja – então muitas nações, assim como muitas pessoas optam pelo conforto e pela facilidade de não amar e de não lutar. Nós aqui não optamos nem pelo conforto, nem pela facilidade.

    Além da oikofobia, o ódio contra o próprio lar, deveria preocu-par-nos, também, cada vez mais, a teofobia, o ódio contra Deus. Há uma teofobia horrenda, gritante, na nossa cultura. Não só no Brasil, em todo o mundo. Um ódio contra Deus, proveniente sabe-se lá de onde, canalizado por todos os códigos de pensamento e de não pensamento que perfazem a agenda global.

    Para destruir a humanidade é preciso acabar com as nações e afastar o homem de Deus, e é isso que estão tentando, e é contra isso que nos insurgimos.

    O globalismo constitui-se no ódio, através das suas várias ramificações ideológicas e seus instrumentos contrários à nação, contrários à natureza humana, e contrários ao próprio nascimento humano. Nação, natureza e nascimento, todos provém da mesma raiz etimológica, e isso se dá porque possuem entre si uma conexão profunda. Aqueles que dizem que não existem homens e mulheres são os mesmos que pregam que os países não têm direito a guardar

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    suas fronteiras, são os mesmos que propalam que um feto humano é um amontoado de células descartável, são os mesmos que dizem que a espécie humana é uma doença e que deveria desaparecer para salvar o planeta. Por isso a luta pela nação é a mesma luta pela família e a mesma luta pela vida, a mesma luta pela humanidade em sua dignidade infinita de criatura.

    Quando eu era criança, ouvia, e adolescente também, ouvia muita gente dizendo: “O mundo caminha inexoravelmente para o socialismo.” Mas não caminhou. Não caminhou porque alguém foi lá e não deixou.

    Hoje escutamos que a marcha do globalismo é irreversível.

    Mas não é irreversível.

    Nós vamos lutar para reverter o globalismo e empurrá-lo de volta ao seu ponto de partida.

    Nós queremos levar a toda parte o grito sagrado da liberdade, eleuthería. Esse foi o primeiro grito de guerra do Ocidente em seu nascimento, na batalha de Salamina, Eleutheroûte Patrída. Libertai a pátria.

    Então temos aqui o Barão dizendo “eu me lembro da pátria”, eu trago a pátria de dentro do seu escondimento, eu vivo a pátria na verdade. E temos Ésquilo gritando pela liberdade, libertai a pátria, Eleuthería. Mas Aletheia e Eleuthería só são possíveis pelo conhecimento da pátria, que se dá pelo amor.

    Um dos instrumentos do globalismo, para abafar aqueles que se insurgem contra ele, é espalhar que, para fazer comércio e negócios, não se pode ter ideias nem defender valores. Nós provaremos que isso é completamente falso. O Itamaraty terá, a partir de agora, o perfil mais elevado e mais engajado que jamais teve na promoção do agronegócio, do comércio, dos investimentos e da tecnologia. De fato, ao se distanciar do Brasil e do povo brasileiro, o Itamaraty havia-se distanciado também do setor produtivo nacional. Pois

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    Ernesto Araújo

    agora estaremos junto com o setor produtivo nacional, como nunca estivemos. Nós não vamos mais apenas “acompanhar os temas”, como se diz no jargão antigo, o jargão daquele Itamaraty fechado ao povo. O Itamaraty não será mais um ministério que só fica olhando. Vamos trabalhar sem descanso para promover o comércio agrícola, a indústria, o turismo, a inovação, a capacitação tecnológica, os investimentos em infraestrutura e energia, avançando ombro a ombro com os outros ministérios – graças a essa extraordinária equipe ministerial que o Presidente Bolsonaro criou com um espírito de harmonia e um sentido de missão sem precedentes.

    Quando digo extraordinária me excetuo, porque não quero falar de mim mesmo. Estou falando dos outros 21 Ministros.

    Formularemos com cada parceiro internacional um programa de trabalho específico, para desenvolver o potencial de cada relação, de maneira criativa e dinâmica. Para isso contaremos, entre outros, com esse instrumento extraordinário que é a Apex, uma Apex renovada, redinamizada e integrada ao conjunto da nossa estratégia de política externa. Contaremos também com um setor de promoção comercial dentro do Itamaraty que multiplicaremos por quatro, vamos des-burocratizar os setores de promoção comercial nas embaixadas no exterior, transformando-os em verdadeiros escritórios comerciais capazes de gerar negócios e ocupar novos mercados para os nossos produtores.

    Implementaremos uma política de negociações comerciais para os dias de hoje. Estivemos negociando acordos comerciais, alguns mais exitosamente, outros menos, mas em muitos casos no modelo dos anos 90. Em alguns casos também estamos negociando esses acordos desde os anos 90, e até agora, em alguns casos, vão involuindo com o passar do tempo. Nós negociamos esses instrumentos em abstrato, e não aquilo que deveríamos fazer, que são entendimentos efetivos direcionados às nossas potencialidades concretas. Nós

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    negociamos muitas vezes a partir de uma posição de fraqueza, como se estivéssemos implorando acesso a mercados, quando na verdade deveríamos negociar a partir de uma posição de força, como um dos maiores e potencialmente o maior produtor de alimentos do mundo, por exemplo.

    Nós orientaremos todas as relações bilaterais e multilaterais para a geração de resultados concretos para o emprego, a renda e para a segurança dos brasileiros. Ao mesmo tempo que as relações bilaterais, investiremos renovado esforço também nas negociações multilaterais, especialmente na OMC, que está construindo uma nova e promissora agenda da qual, hoje, o Brasil ainda está de fora, mas na qual entrará com todo o seu peso e toda sua criatividade.

    No sistema multilateral político, especialmente na ONU, vamos reorientar a atuação do Brasil em favor daquilo que é importante para os brasileiros – não do que é importante para as ONGs. Defenderemos a soberania. Defenderemos a liberdade – a liberdade de expressão, a liberdade de crença, a liberdade na Internet, a liberdade política. Defenderemos os direitos básicos da humanidade, o principal dos quais talvez seja, se me permitem usar o título de uma novela dos anos 60, o direito de nascer.

    Abriremos o Itamaraty para a sociedade, seremos a Casa de todos os brasileiros. Muito se escuta que o brasileiro não se interessa por política externa. Na verdade, o brasileiro não se interessava por política externa quando achava que política externa era simplesmente um exercício de estilo, infinitas variações para não dizer nada em um discurso da ONU. Desde a eleição do Presidente Bolsonaro, o brasileiro está profundamente interessado e envolvido em política externa, mesmo porque o Presidente dá uma atenção enorme a essa área, pois a considera algo profundamente integrado na vida nacional, e não alguma disciplina arcana à qual só teriam acesso alguns especialistas. O brasileiro sente que na frente externa se dá

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    Ernesto Araújo

    uma das principais, senão a principal batalha pelos seus ideais e valores mais profundos. O brasileiro entende que da frente externa depende em grande medida a sobrevivência e o êxito do projeto de redescoberta e libertação, esta aventura de aletheia e eleutheríaque estamos vivendo com amor e com coragem.

    Falar com a sociedade não é simplesmente falar, é principal-mente ouvir. Vou dar um exemplo do que temos para ouvir. É o comentário de uma pessoa que segue a minha conta do Twitter, que diz o seguinte... li isso ontem:

    Antes eu não entendia o amor do povo da Inglaterra pe-la Rainha. Agora entendo. Quando temos alguém que ama seu país e seu povo e os defende, ganha amor e res-peito. Não conhecíamos isso antes de Bolsonaro.

    A isso me proponho aqui. Fazer do Itamaraty um instrumento de amor pelo nosso país e pelo nosso povo.

    Estou certo de que podemos tornar o Brasil ao mesmo tempo mais competitivo e mais autêntico, ao mesmo tempo mais econômica e comercialmente dinâmico e mais verdadeiro, mais respeitado internacionalmente e mais fiel a si mesmo.

    Não deixem o globalismo matar a sua alma em nome da com-petitividade. Não acreditem no que o globalismo diz quando diz que para ter eficiência econômica é preciso sufocar o coração da pátria e não amar a pátria. Não escutem o globalismo quando ele diz que paz significa não lutar.

    Os senhores me perguntarão: e como faremos isso?

    Pela palavra.

    Acreditemos no poder infinito da palavra, que é o logos criador.

    O Presidente Jair Bolsonaro está aqui, chegou até aqui, e nós com ele, porque diz o que sente. Porque diz a verdade. E isso é o logos.

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    Discurso na cerimônia de posse como Ministro das Relações Exteriores,em Brasília (02/01/2019)

    Eu vou terminar falando do princípio e citando novamente São João, a abertura do Evangelho de São João, quando diz “en archê ên ho logos”. O princípio era o logos. A palavra. O verbo. Archê, a última palavra em grego que eu vou dizer aqui hoje, significa princípio, tanto no sentido de início, quanto no sentido, principalmente, de força estruturante, princípio estruturante. A realidade, pelo menos a realidade humana, está estruturada em torno da linguagem, da palavra, do verbo, portanto do logos.

    Tudo o que temos, tudo de que precisamos, é a palavra. Ela está aprisionada, mas com amor e com coragem havemos de libertá-la.

    Que Deus abençoe a todos vocês, aos que creem e aos que não creem, aos que estão conosco e aos que ainda não estão conosco. Que Deus abençoe o Presidente Jair Bolsonaro e que Deus abençoe o Brasil.

    Anuê Jaci!

    Muito obrigado!

  • 3333

    2. Discurso na cerimônia de transmissão de cargo do Secretário-Geral das Relações Ex-teriores, em Brasília (03/01/2019)

    Muito bom dia!

    Senhor Ministro Aloysio Nunes,

    Senhores Embaixadores, Secretário-Geral, ex-Secretários-Gerais,

    Senhores diplomatas, membros do corpo diplomático,

    Queridos colegas,

    Em primeiro lugar, queria pedir desculpas pelo atraso intei-ramente motivado por mim, por essa cerimônia, pelo fato de que estava na primeira Reunião Ministerial convocada pelo Presidente Jair Bolsonaro, e tivemos mais de três horas de reunião e, evidente-mente, sobretudo sendo a primeira, eu não podia deixar a reunião antes do término.

    Queria começar só recordando uma experiência de quando era Terceiro-Secretário recém-formado, no Rio Branco, e estava em um daqueles plantões da Divisão de Comunicações que se faziam no Bolo de Noiva, à época. Eu devia ter uma semana de formado e recebi um telefonema de um Embaixador que estava em algum lugar do Oriente Médio, eu acho, que queria simplesmente perguntar:

    “O novo Secretário-Geral já tomou posse?” E eu, assim, nem sabia direito, na verdade; naquele dia que me dei conta da importância do Secretário-Geral para a Casa e, claro, em um tempo que não tinha Internet, mal tinha telefone, essa imagem, para mim, ficou muito gravada da preocupação de um Embaixador para saber se o novo Secretário-Geral já tinha tomado posse.

    E pouco depois, pela primeira vez, eu vi ao vivo um Secretário-Geral, que foi o meu sogro, não então sogro, Embaixador

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    Ernesto Araújo

    Seixas Corrêa, aqui na Secretaria-Geral, e foi um momento tam-bém de surgimento daquela, que se chama, em inglês, reverential awe, aquela sensação de que a gente está diante de uma figura que evidentemente vai além, simplesmente, daquele momento e que representa algo de fundamental.

    A gente vai sempre aprendendo. Eu estou tentando sempre formular uma metáfora para entender os papéis que nós estamos, aqui, nesses poucos dias de exercício aqui do cargo. Nessa metáfora que eu imaginei, eu penso no Presidente da República como arqui-teto, no Ministro como o engenheiro e no Secretário-Geral como mestre de obras. E a meu ver, a mentalidade que nos deve governar aqui deve ser essa da construção de um edifício, e não da simples administração e um edifício já existente. Nessa nossa política externa, que pretendemos implementar, devemos ter essa mentalidade de que estamos construindo algo, e não simplesmente administrando.

    E, mais do que isso – isso é algo que eu já tinha percebido, mas que trago de maneira muito marcante dessa primeira Reunião Ministerial –, que esse edifício é parte de um complexo maior. Não é uma casa no meio do campo. Ele é parte de um projeto arquite-tônico maior, e não algo isolado. É parte de um governo que tem uma característica de coesão e de articulação interna que, pelas pessoas que têm, evidentemente, mais experiência, não se conhecia anteriormente.

    Para usar mais uma metáfora, eu diria que a participação do Itamaraty (como de qualquer outro órgão, mas, no nosso caso, a participação do Itamaraty) nesse governo, não é um jogo de tênis; é um jogo de rugby. Nós não vamos estar jogando isoladamente, mas com aquela necessidade de espírito de equipe e de articulação conjunta.

    Queria transmitir o agradecimento de toda a Casa, muito sin-cero, ao Embaixador Marcos Galvão, pelo seu exercício brilhante da Secretaria-Geral durante esses mais de dois anos, quase três. O

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    Discurso na cerimônia de transmissão de cargo do Secretário-Geral das Relações Exteriores,em Brasília (03/01/2019)

    Embaixador Marcos Galvão assumiu esse posto e tranquilizou o Itamaraty em um momento difícil, após o impeachment. Trabalhou com dois Ministros de fora da carreira, o que sempre é um desafio diferente para um diplomata, evidentemente. Claro que teve o bene-fício de ter dois excelentes Ministros, ambos os quais se mostraram, também, diplomatas natos e membros desta Casa, assim como os diplomatas de carreira. O Embaixador Marcos Galvão assegurou o funcionamento material da Casa e deu-lhe coerência política de maneira admirável durante esse período. Sempre com orientação segura, sempre presente em todas as áreas, sempre acessível, sempre com a sua extraordinária capacidade de ação e de análise.

    Eu só queria referir-me a um caso específico, que me marcou muito, que foi na Reunião Ministerial da OEA, em Cancún, onde o Embaixador Marcos Galvão estava atuando como Ministro interino e fez um discurso emocionante em defesa da democracia na Venezuela, e em defesa da democracia em geral. Algo que, realmente, eu estava na fila de trás, evidentemente, e fiquei arrepiado, e tive a oportunidade de dizer isso a ele na ocasião. E até hoje, no tratamento desse tema da Venezuela, aquele discurso que foi de improviso, que foi uma coisa do coração, é algo que me inspira. Desejo ao Embaixador Marcos Galvão, e a toda sua família, muito êxito em seu posto em Bruxelas e que conte comigo e com toda a Casa para o bom exercício de sua nova missão.

    Quero, então, saudar de maneira muito especial, muito afetuo-sa, muito profunda o Embaixador Otávio Brandelli, que assume a Secretaria-Geral. Otávio é, antes de mais nada, um amigo. Nós fica-mos amigos, sobretudo, quando servimos, justamente, em Bruxelas, e até hoje nós rimos dos mesmos trocadilhos que formulamos naquela época (temos novos, mas ainda nos lembramos daqueles trocadilhos), mas, às vezes, eu olho para o Otávio e já sei o que ele está pensando, qual é o trocadilho de que ele está se lembrando, e acho que a recíproca é verdadeira. A amizade da Maria Eduarda e

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    Ernesto Araújo

    minha com o Otávio e Rosa é uma permanente fonte de alegria, tranquilidade e inspiração para nós.

    Otávio é um dos diplomatas mais competentes da nossa geração – e de qualquer geração, eu diria. É um diplomata que não é só diplomata; que sempre soube olhar para fora; sempre soube pensar o Itamaraty a partir do Brasil, e não o Brasil a partir do Itamaraty. Otávio é um diplomata que faz acontecer, é um gestor brilhante, extraordinário. Mostrou isso na sua atuação no Departamento do MERCOSUL, assim como em seu exercício da presidência no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, e em tantas outras funções. Ao mesmo tempo, é um formulador, é um diplomata que sempre consegue extrair soluções de qualquer problema, sempre uma solução criativa, de uma maneira pertinente e que vai além do momento, sempre com uma visão estratégica extraordinária.

    Otávio, assim como eu, é alguém que ama essa instituição, que ama o Itamaraty e que, por isso mesmo, sente que precisamos mudar algumas coisas para que ela continue sendo um sustentáculo e uma coluna inabalável deste edifício que nós estamos construindo no Brasil.

    Para terminar, eu gostaria só de dizer que nós vamos ter que introduzir uma exceção em uma coisa que é um lema dos partidá-rios, de todas as pessoas que votaram no Presidente Bolsonaro, que é aquilo de que “a nossa bandeira jamais será vermelha”. A nossa bandeira jamais será vermelha, exceto se for a bandeira do Internacional, está bem?

    Muito obrigado.

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    3. Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal como o encontrou, artigo publicado pela Bloomberg (07/01/2019)1

    Versão original, em inglês:

    Bolsonaro Was Not Elected to Take Brazil as He Found It

    “Brazilian foreign policy cannot change.” That is how a Brazilian politician summarized his dislike for the foreign policy of President Jair Bolsonaro and myself. Those views are representative of people who have been so traumatized by the shambolic, far-left foreign policy of the governments of Luiz Inácio Lula da Silva and Dilma Rousseff (2003–2016) that they prefer inaction and indifference to any attempt to make Brazil a global player again. They are so used to bad change that they would rather not risk any change at all.

    Those people think the only alternative to Lula’s disaster in foreign policy is to think small, repeat United Nations talking points and try to do some trade. They strive for golden mediocrity. They want Brazil to accept “the world as we found it,” to paraphrase the famous expression of Ludwig Wittgenstein.

    That reference is found in paragraph 5.631 of the Tractatus Logico-Philosophicus, where the Anglo-Austrian philosopher asserts: “There is no such thing as the subject that thinks and entertains ideas.” That sort of avant-la-lettre postmodern deconstruction of the human subject, and denial of the reality of thought, is thus associated with the renunciation of one’s own capacity to act and

    1 Artigo disponível em: https://www.bloomberg.com/opinion/articles/2019-01-07/brazil-s-bolsonaro-brings-foreign-policy-revolution-says-araujo. Acesso em: 9 set. 2020.

    https://www.bloomberg.com/opinion/articles/2019-01-07/brazil-s-bolsonaro-brings-foreign-policy-revolution-says-araujohttps://www.bloomberg.com/opinion/articles/2019-01-07/brazil-s-bolsonaro-brings-foreign-policy-revolution-says-araujo

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    Ernesto Araújo

    influence the world, implicit in the pessimism of “taking the world as we found it.” Those are the philosophical roots of our current globalist totalitarian ideology. By denying independence of thought and the substance of ideas, it manages more and more to dominate the human self as it dictates to people: “you don’t deserve freedom because you don’t exist, you don’t exist as an independent self, you are just the sum of the parts of your body and your ideas are just social constructs, so shut up!”

    I don’t like Wittgenstein.

    President Bolsonaro was not elected to take Brazil as he found it and to leave it there. He was not elected to take Brazilian foreign policy as he found it, to raise the flag of “pragmatism” perfunctorily, and go home. This is not what the Brazilian people—thinking, independent selves with their own passions and ideas, and not postmodern automata—want and deserve.

    Brazilian foreign policy must change: this is part of the people’s sacred mandate entrusted to Jair Messias Bolsonaro.

    We are convinced that Brazil has a much larger role to play in the world than the one we currently attribute to ourselves.

    We want to promote freedom of thought and freedom of expres-sion around the world. This is essential to promote any other sort of change and any other sort of freedom. Bolsonaro’s election in Brazil was only possible because people could freely exchange their ideas and express their feelings unencumbered by mainstream media’s straitjacket. This lesson is priceless.

    Unfortunately, today’s world has countries where thought is directly controlled by the state. It also has countries, mainly in the West, where thought is indirectly and insidiously controlled by the media and academia, leaving very few places untouched by Wittgensteinian death-of-the-subject oppression. Brazil has now shown that it is possible to break free and, through the sheer force

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    of speech, transform the political reality of a country of more than 200 million people and peacefully dismantle a decades-old system of crime and corruption with courage, determination and sincerity.

    We also want to promote peace and security in our region and everywhere. But you don’t promote peace and security by pretending that the threats you face either don’t exist or can’t realistically be addressed. You have to face the threats, and the main one comes from non-democratic regimes that export crime, instability and oppression. You can’t simply wish away dictatorships such as Venezuela and Cuba. Especially when you don’t even wish. Especially when you let them preserve and extend their power, with the excuse that this is “the world as we found it” or “the natural march of things.”

    And we want, of course, to expand trade. Brazilian trade policy, as part of our foreign policy, has slumbered for too long. We are determined to negotiate trade, investment and technology deals with all our partners, in an ambitious and creative way, exploring different models with different partners, always with the concrete needs of the productive sector in mind.

    Critics would say that by talking about freedom and democracy, and by taking those concepts seriously, we are ideological. They would argue that the advocacy of freedom and democracy will jeopardize our trade. It would be a sad world if this were the case. But I am convinced that a much more assertive Brazil, a country speaking with its own voice and not just dubbing in someone else’s, will be a much better partner—in trade and in any other area.

    Some people think our marketing approach should be: “Look, I’m Brazil. I don’t think anything. I don’t have any ideas. Just like Wittgenstein’s deconstructed subject, I don’t have a self. I don’t bother anyone. Trade with me!”

    But this doesn’t work. No one respects such behavior, and you don’t reach good trade deals when there is no respect. Look at China.

    Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal  como o encontrou, artigo publicado pela Bloomberg (07/01/2019)

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    Ernesto Araújo

    China unapologetically defends its system, asserts its national inter-ests and identity, its specific ideas about the world—and everyone does more and more trade with China. Why should other countries be required to sign up to certain ideas before being considered good trade partners? Should we renounce our commitments to freedom and democracy when others are not required to renounce their commitments to their systems?

    Brazil will show that you can increase your share in international trade and investment flows even as you confidently step onto the world stage to defend freedom, speaking with your nation’s own voice.

    Brazilian foreign policy can change, and the world can change. We don’t have to take them as we found them.

    Tradução para o português:

    Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal como o encontrou

    “A política externa brasileira não pode mudar.” Foi assim que um político brasileiro resumiu seu descontentamento em relação às posições de política externa do Presidente Jair Bolsonaro e minhas. Essa opinião é representativa daqueles que ficaram tão traumatizados com a caótica política externa de extrema esquerda dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff (2003-2016) que preferem a inação e a indiferença a qualquer tentativa de tornar o Brasil um ator global novamente. Estão tão acostumados a mudanças para pior que preferem não arriscar mudança nenhuma.

    Essas pessoas acham que a única alternativa para o desastre de Lula na política externa é pensar pequeno, recitar a cartilha das Nações Unidas, e tentar fazer algum comércio. Eles lutam por uma mediocridade dourada. Eles querem que o Brasil simplesmente aceite “o mundo tal como o encontramos”, para parafrasear a famosa expressão de Ludwig Wittgenstein.

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    Essa referência encontra-se no parágrafo 5.631 do Tratactus Logico-Philosophicus, no qual o filósofo anglo-austríaco afirma: “o sujeito que pensa e tem ideias simplesmente não existe.” Essa espécie de desconstrução pós-moderna avant-la-lettre do sujeito humano e de negação da realidade do pensamento está, portanto, associada à renúncia da própria capacidade de agir e de influenciar o mundo, implícita no pessimismo de “tomar o mundo tal como o encontramos”. Essas são as raízes filosóficas da nossa atual ideologia totalitária globalista. Ao negar a independência do pensamento e a substância das ideias, ela consegue cada vez mais dominar o eu humano, enquanto dita às pessoas: “você não merece liberdade porque você não existe, você não existe como um eu independente, você é apenas a soma das partes do seu corpo e suas ideias são apenas construções sociais, então cale-se!”

    Não gosto de Wittgenstein.

    O Presidente Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal como o encontrou. Não foi eleito para deixar a política externa brasileira tal como a encontrou, para levantar mecanicamente a bandeira do “pragmatismo” e ir para casa. Não é isso que o povo brasileiro – feito de seres pensantes e independentes, com suas próprias paixões e ideias, e não de autômatos pós-modernos – quer e merece.

    A política externa brasileira precisa mudar: isso faz parte do mandato sagrado do povo confiado a Jair Messias Bolsonaro.

    Estamos convencidos de que o Brasil tem um papel muito maior a desempenhar no mundo do que esse que atualmente nos atribuímos.

    Queremos promover a liberdade de pensamento e de expressão pelo mundo. Isso é essencial para promover qualquer outro tipo de mudança e qualquer outro tipo de liberdade. A eleição de Bolsonaro no Brasil só foi possível porque as pessoas puderam trocar livremente

    Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal  como o encontrou, artigo publicado pela Bloomberg (07/01/2019)

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    Ernesto Araújo

    suas ideias e expressar seus sentimentos, sem serem tolhidas pela camisa-de-força da grande mídia. Essa lição não tem preço.

    Infelizmente, no mundo de hoje, há países onde o pensamento é controlado diretamente pelo Estado, e há países, principalmente no Ocidente, onde o pensamento é controlado, de forma indireta e insidiosa, pela mídia e pela academia, deixando pouquíssimos espaços intocados pela opressão wittgensteiniana da morte-do-sujeito. O Brasil mostrou agora que é possível libertar-se e, pela simples força da palavra, transformar a realidade política de um país de mais de 200 milhões de pessoas e desmontar pacificamente um sistema de décadas de crime e corrupção, com coragem, determinação e sinceridade.

    Também queremos promover a paz e a segurança em nossa região e em toda parte. Mas não se pode promover a paz e a segurança fingindo que as ameaças que você enfrenta não existem ou não podem ser realisticamente abordadas. É preciso enfrentar as ameaças, e a maior delas vem de regimes não democráticos que exportam o crime, a instabilidade e a opressão. Você não pode simplesmente esperar que ditaduras como Venezuela e Cuba desaparecerão somente porque você o deseja. Especialmente quando você nem o deseja. Especialmente quando você as deixa manter e ampliar seu poder, com a desculpa de que isso seja “o mundo tal como o encontramos” ou “a marcha natural das coisas”.

    E queremos, é claro, fazer comércio. A política comercial bra-sileira, como parte de nossa política externa, ficou adormecida por muito tempo. Estamos determinados a negociar acordos de comércio, de investimentos e de tecnologia com todos os nossos parceiros, de forma ambiciosa e criativa, explorando diferentes modelos com diferentes parceiros, tendo sempre em mente as necessidades con-cretas do setor produtivo.

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    Os críticos dirão que, ao falarmos sobre liberdade e democracia, e ao levar esses conceitos a sério, estamos sendo “ideológicos”. Argumentam que a defesa da liberdade e da democracia colocará nosso comércio em risco. Seria um mundo triste, se esse fosse o caso. Mas estou convencido de que um Brasil muito mais assertivo, um país que fala com sua própria voz em vez de dublar a de outros, será um parceiro muito melhor – no comércio ou em qualquer outra área.

    Algumas pessoas acham que nossa abordagem de marketing deveria ser: “Olha, eu sou o Brasil. Eu não penso nada. Eu não tenho ideias. Assim como o sujeito desconstruído de Wittgenstein, eu não tenho um ‘eu’. Eu não incomodo ninguém. Faça negócios comigo!”

    Mas isso não funciona. Ninguém respeita esse tipo de com-portamento, e você não faz bons negócios quando não há respeito. Vejam a China. Ela defende sem reservas o seu sistema, afirma seus interesses nacionais e sua identidade, suas ideias específicas sobre o mundo – e todo o mundo negocia cada vez mais com a China. Por que outros países deveriam ser obrigados a esposar certas ideias antes de serem considerados bons parceiros comerciais? Deveríamos renunciar a nossos compromissos com a liberdade e a democracia quando outros não são obrigados a renunciar a seus compromissos com seus próprios sistemas?

    O Brasil mostrará que você pode aumentar sua participação no comércio internacional e nos fluxos de investimento, ao mesmo tempo em que sobe confiante no palco mundial para defender a liberdade, falando com a própria voz da sua nação.

    A política externa brasileira pode mudar, e o mundo pode mudar. Não precisamos deixá-los tais como os encontramos.

    Bolsonaro não foi eleito para deixar o Brasil tal  como o encontrou, artigo publicado pela Bloomberg (07/01/2019)

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    4. Agora falamos, artigo publicado pela revista The New Criterion (janeiro, 2019)2

    Versão original, em inglês:

    Now we do“I am very worried; he talked too much about God.” So said a

    prominent Brazilian political commentator on TV after hearing President Jair Bolsonaro’s victory speech on the night of October 28, 2018, when the polls showed his victory by a 55–45 margin over the Marxist candidate, Fernando Haddad.

    So now talk of God is supposed to worry people. This is sad. But the people of Brazil don’t care. Bolsonaro’s government, in which I serve as foreign minister, doesn’t care what pundits say or what they worry about: they don’t have a clue about who God is or who the Brazilian people are and want to be. Their worry is that of an elite about to be dispossessed. They are afraid because they can no longer control public discourse. They can no longer dictate the limits of the president’s or anyone else’s speech. The last barrier has been broken: we can now talk about God in public. Who could imagine?

    Over the years, Brazil had become a cesspool of corruption and despair. The fact that people didn’t talk about God and didn’t bring their faith to the public square was certainly part of the problem. Now that a president talks about God and expresses his faith in a deep, heartfelt way, that is supposed to be the problem? To the contrary. I am convinced that President Bolsonaro’s faith is instrumental, not accidental, to his electoral victory and to the wave of change that is washing over Brazil.

    2 Artigo disponível em: https://newcriterion.com/issues/2019/1/now-we-do. Acesso em: 9 set. 2020.

    https://newcriterion.com/issues/2019/1/now-we-do

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    Ernesto Araújo

    Brazil is experiencing a political and spiritual rebirth, and the spiritual aspect of this phenomenon is the determinant one. The political aspect is only a consequence.

    For a third of a century, Brazil was subject to a political system composed of three parties acting increasingly in concert. Only now are we realizing the shape and full extent of that domination. First we had the Brazilian Democratic Movement (PMDB), which took over after the regime established in 1964 (misleadingly called the military regime) gave away power peacefully in 1985. Originally a moderate left-wing opposition to the regime (although with some far-left infiltration), PMDB took the reins of government, wrote a new constitution, and became a broad front for the old oligarchy under a more modern, urban, social-oriented guise. That group mas-tered the art of political favors and bureaucracy, establishing itself as the foundation of the system. The extent to which the bureaucracy is able to allocate resources in the Brazilian economy—choosing winners and losers—has always been astounding, and during this period it became a full-fledged system of governance that completely stifled the economy.

    The 1990s saw the ascendance of the Social-Democratic Party (PSDB), an offshoot of PMDB with roots on the Left but better groomed, which started to cater to voters eager for economic stability after a decade and a half of mismanagement and hyperinflation. PSDB refashioned itself as the free market party, more or less hiding its true colors and its cultural-liberal agenda, and surfed on sound macroeconomic policies to become the dominant force from 1994 to 2002, always retaining its links to the traditional political-bureaucratic cabals represented by PMDB.

    The third branch of the system emerged in the early 2000s, in the shape of the Workers’ Party (PT), an Orwellian name, by the way, since real workers are rarely spotted in this party ruled by Marxist

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    Agora falamos, artigo publicado pela revistaThe New Criterion (janeiro, 2019)

    intellectuals, former left-wing guerrillas, and members of the trade-union bureaucracy. After the election of Luiz Inácio Lula da Silva (known universally as Lula) in 2002, PT—which had been preparing for this for years—quickly captured and co-opted the PMDB–PSDB power scheme, retaining the old tit-for-tat machinery run by PMDB and the stability policies represented by PSDB and establishing a much firmer grip on power than its predecessors. PMDB became the junior party in PT’s coalition, while PSDB took the role of tamed opposition, participating in presidential elections every four years in which its role was to lose nobly to PT.

    PT acquired control of all the levers of bureaucratic power, dominating the economy through public investment banks and state companies, and created a complete mechanism of crime and corruption. Almost every business, along with every local politician, every cultural, sports, and educational institution, and indeed almost everyone in Brazil, depended on the central government for its survival and had to pay its share in bribes, political support, or both. The model was so successful that PT started to export it to other Latin American countries, trying to create and consolidate a network of corrupt leftist regimes across the region.

    At the same time, a left-wing agenda quickly took over Brazilian society. The promotion of gender ideology; the artificial stoking of race tensions; the displacement of parents by the government as the provider of “values” to children; the infiltration of the media; the dislocation of the “center” of public debate very far to the Left; the humiliation of Christians and the taking over of the Catholic Church by Marxist ideology (with its attendant promotion of birth control); the misdirection of the arts through the allocation of public cultural financing; and so on—these were the results of the new government’s policies.

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    Ernesto Araújo

    Dominance was thus established over the political institutions, over the economy, and over the culture: a thoroughly totalitarian enterprise. It seemed indestructible. The system only admitted debate about how best to implement itself. There was some debate on privatization, but it never went anywhere near the core of the corruption mechanism. The supposedly big privatization wave of the 1990s led by PSDB left Brazil with 418 state companies—com-pared to America’s fourteen—and an economy totally dependent on government financing for any serious projects, but PSDB dutifully played the role of “neoliberal” party that PT assigned to it.

    In foreign policy, the system played the globalist tune without a flaw. It helped the transfer of power from the United States and the Western alliance to China; it favored Iran; it worked tirelessly to raise a new socialist iron curtain over Latin America by fostering left-wing governments or parties in Argentina, Venezuela, Ecuador, Bolivia, Chile, Colombia, Peru, Paraguay, Uruguay, the Dominican Republic, Nicaragua, Honduras, and, of course, Cuba. All of that occurred under the benign gaze of Barack Obama, who rarely raised a finger to counter any socialist or Islamist regime anywhere on earth, and who described Lula as “my man.” Yes, Lula was globalism’s guy, a guy who squandered all the resources that flew to Brazil during the commodities boom—hundreds of billions of dollars—to help dictatorships and to enrich his party and himself. Brazil was indeed a wonderful showcase for globalism. Starting with a traditional crony capitalist, oligarchic system in the late 1980s, the country went through fake economic liberalism in the 1990s, until it got to globalism under PT: cultural Marxism directed from within a seemingly liberal and democratic system, achieved through corruption, intimidation, and thought control.

    A system so deep-seated would never reform itself. It would only find new masks to extend its rule—that was what several non-PT political figures strove to do every four years in the elections. Real

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    Agora falamos, artigo publicado pela revistaThe New Criterion (janeiro, 2019)

    change could only come from without, from the intellectual and spiritual domain.

    So what broke the system? Olavo de Carvalho, Operation Car Wash, and Jair Bolsonaro. Since the mid-1990s, in parallel to the ascendance of an atheistic, corrupt regime (back then still in the making), strange new ideas started to circulate in the books and articles of Olavo de Carvalho, a Brazilian philosopher, perhaps the first person in the world to see globalism as the result of economic globalization, to understand its horrific purposes, and to start thinking about how to topple it. For many years he was also the only person in Brazil to use the word “communism” to describe PT’s strategy and everything that was going on in the country, at a time when everyone thought communism was just a sort of collectivism that had died with the Soviet Union, blind to its survival in many other guises in the culture and in “global issues.” Thanks to the internet boom, and especially the social media revolution, Olavo’s ideas suddenly started to percolate through the whole country, reaching thousands of people who had been fed only the official mantras. These ideas broke all dams and converged with the cou-rageous stance of the only truly nationalist Brazilian politician of the last hundred years, Jair Bolsonaro, giving him a totally unprec-edented level of grassroots support. Brazil suddenly redefined itself as a conservative, anti-globalist, nationalist country. At the same time, Operation Car Wash, the investigation into the PT corruption scheme—perhaps the largest criminal enterprise ever—evolved and started to throw light on the depths of PT’s attempt to destroy the country and seize absolute power, demoralizing the whole gang and sending its leader to jail.

    With a wave of a hand, the nation cast away decades of political indoctrination and political correctness and finally elected a leader who leads and who knows where he wants to go.

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    Ernesto Araújo

    But the story is, of course, much more complicated. Everything conspired against this national rebirth. It was not supposed to happen. But at every turn, especially since the large anti-everything protests of 2013, social, political, and economic events started mysteriously to fit into place. Denunciations, political breakups and alliances, revelations of new corruption from unsuspected quarters, and thousands of other pieces were somehow assembled. These delivered the country its newly acquired freedom—with all