A nova era do melhoramento genético do arroz em Portugal · 2017-11-22 · melhoramento genético...

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VOZ DO CAMPO MARÇO 2017 MARÇO 2017 VOZ DO CAMPO O passado... Na década de 50, a Comissão Reguladora do Comércio do Arroz, que regulamentava os preços e a investigação em arroz, tinha a possibilidade de cobrar uma taxa por cada quilograma de arroz produzido em Portugal e financiar, desta forma, os trabalhos de melhoramento genético do arroz desenvolvidos pelo INIA. Os trabalhos de Melhoramento deram origem a novas variedades de arroz que foram sendo utilizadas pelos agricultores portugueses. Simultaneamente, a pesquisa funcionava em Salvaterra de Magos num centro de apoio que divulgava a tecnologia desenvolvida. No final da década de 80 foi interrompida a investigação em melhoramento genético de arroz. A consequente descontinuidade no fluxo de obtenção de novas variedades portuguesas que eram utilizadas pelos agricultores portugueses, levou a que os mesmos e as indústrias começassem a importar variedades, principalmente de Itália e Espanha. O reinício do Melhoramento Nacional em 2003 O Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), consciente da importância do melhoramento nacional, reiniciou em 2003, a investigação neste domínio com o arranque do Programa Nacional de Melhoramento Genético do Arroz juntamente com o Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier (ITQB NOVA). Na primeira fase do programa foi estudada a coleção de germoplasma de arroz, com cerca de mil entradas com origens diversas, nomeadamente, de países estrangeiros, das várias zonas orizícolas de Portugal e ainda algumas linhas avançadas provenientes do melhoramento genético. A nova era do melhoramento genético do arroz em Portugal O melhoramento genético nacional possibilita a criação de novas variedades ajustadas às condições agro-económicas do sistema de produção de arroz em Portugal e a disponibilização das mesmas aos agricultores nacionais. O processo de melhoramento Início do processo de seleção de gerações segregantes em 2006 Uma vez que as probabilidades de sucesso aumentam efetuando a seleção das plantas nos locais a que a cultura se destina, foram identificados, numa primeira fase, dois locais- chave para o processo: Salvaterra de Magos e Vale do Mondego. A partir de 2006 juntam-se ao Programa o COTArroz, no qual participam todos os – do reinício até à inscrição de novas variedades Ana Sofia Almeida 1 , Benvindo Maçãs 1 , Paula Marques 2 , José Coutinho 1 , Carla Brites 1 , António Jordão 3 , Margarida Oliveira 4,5 , Pedro Marques 6 , Jorge Zambujo 6 1 Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária – INIAV/MAFDR 2 Centro Operativo e Tecnológico do Arroz – COTArroz 3 Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro - DRAP Centro 4 Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier, Universidade Nova de Lisboa 5 Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica 6 Agrupamento de Produtores de Arroz do Vale do Sado - APARROZ Figura 1 – Etapas para obtenção de uma nova variedade de arroz, que será ainda sujeita, por parte da DGAV, a 2 anos de ensaios para aprovação de inscrição no Catálogo Nacional de Variedades (CNV) Figura 2 – Emasculação de panícula para execução de cruzamento artificial agentes da fileira (investigação, produção e indústria) e a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro (DRAP Centro). Nesse ano iniciou-se o processo de seleção na primeira F2 (geração de máxima segregação após cruzamento) instalada no COTArroz, e nos campos experimentais do Bico da Barca no Mondego. Assim, a seleção das gerações segregantes é efetuada nestes dois locais, onde as plantas são sujeitas à pressão natural de cada região (Fig. 4). Neste contexto, no ano de 2016 foram semeadas 1350 linhas segregantes. Em paralelo, foram iniciados estudos de caracterização molecular, desenvolvidos pelo ITQB/IBET utilizando conhecimento disponível a nível mundial para o arroz. Foram usados marcadores para avaliar a diversidade genética de parte da coleção nacional de germoplasma (178 acessos). Início da avaliação agronómica (produção e quali- dade) das linhas avançadas em 2010 O Programa Nacional de Melhoramento Genético do Arroz tem progredido continuamente. Desde 2010 que se instalam anualmente ensaios (Tabela 1) que incluem as linhas avançadas selecionadas no Programa Nacional de Melhoramento do Arroz e variedades comerciais (testemunhas de comparação) com o objetivo de avaliar diversos parâmetros agronómicos e de qualidade. Conjuntamente a resistência ou susceptibilidade às principais doenças, nomeadamente à piriculariose foliar e panicular ( Pyricularia oryzae ) e à helmintosporiose (Helminthosporium oryzae) são avaliadas nos diversos ensaios. Figura 4 – Gerações segregantes na estação experimental da DRAP Centro em Montemor-o- Velho (Bico da Barca) genético de plantas é longo, dinâmico e dispendioso, sendo necessários cerca de 12 anos para a obtenção de uma nova variedade (Fig. 1). Os primeiros cruzamentos artificiais em 2004 A informação recolhida quer através de observações diretas no campo ou compilada em diversas publicações, permitiu escolher genótipos que serviram de base aos cerca de 2600 cruzamentos artificiais (Fig. 2) já efetuados desde 2004. O programa base é desenvolvido nos campos experimentais do COTArroz, em Salvaterra de Magos, onde é anualmente instalado o bloco de cruzamentos, grupo de progenitores base de cada ano (Figura 3) e executados os cruzamentos artificiais. Figura 3 – Bloco de progenitores usados na realização de cruzamentos artificiais Os ensaios são conduzidos em três locais: na região do Vale do Mondego no Bico da Barca (DRAP Centro), na região do Vale do Tejo, nos campos experimentais do COTArroz (Fig. 5) e na região do Vale do Sado, em terrenos de um agricultor com a colaboração da APARROZ. Início da Rede Nacional de Ensaios de Adaptação em 2014 Em 2014 foi criada a Rede de Ensaios de Adaptação (REA) a qual consiste na instalação e condução de ensaios multilocais para avaliação agronómica e da qualidade tecnológica anual das linhas avançadas que provém do Programa de Melhoramento do Arroz. A REA integra ensaios comuns nas 3 regiões portuguesas produtoras de arroz, nomeadamente Tejo, Mondego e Sado, permitindo adicionalmente avaliar a interação genótipo x ambiente (Fig. 6). A mesma é financiada por um projeto PRODER (LUSARROZ), o qual é desenvolvido por um consórcio constituído pelo INIAV, COTArroz e duas organizações de produtores a Benagro e a APARROZ. Figura 5 – Ensaios de avaliação agronómica instalados no COTArroz, na região do Vale do Tejo Inscrição de 2 variedades portuguesas no CNV em 2017 Após mais de duas décadas e meia, em que os orizicultores portugueses, apenas tiveram à sua disposição para semear variedades estrangeiras, foram recentemente inscritas no Catálogo Nacional de Variedades duas Figura 6 – Ensaios da REA em São Romão do Sado variedades portuguesas de arroz, uma variedade de arroz carolino designada CERES (Fig. 7) e uma variedade de arroz agulha designada MAÇARICO. Uma vez que a obtenção de variedades portuguesas foi identificada pela fileira do arroz como uma prioridade para o setor, esta atividade de investigação foi igualmente financiada por diversas organizações de produtores e por empresas do setor. Figura 7 – Arroz branqueado da variedade portuguesa de arroz carolino CERES Pub. GRANDE REPORTAGEM GRANDE REPORTAGEM Tabela 1 –Ensaios de avaliação agronómica instalados de 2010 a 2016 em Salvaterra de Magos (Tejo), Montemor-o-Velho (Mondego) e São Romão do Sado (Sado). Vale do Tejo Salvaterra de Magos Vale do Mondego Montemor-o-Velho Vale do Sado Alcácer do Sal 2010-2016 N.º de ensaios N.º de linhas avançadas (genótipos) N.º de testemunhas 10 11 12 13 14 15 16 10 11 12 13 14 15 14 15 16 TOTAL 21 512 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 2 2 2 2 1 1 12 26 50 46 55 67 39 9 28 26 26 28 27 27 22 24 5 5 3 5 4 4 5 5 2 6 7 8 7 9 7 4 26 27

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VOZ DO CAMPO MARÇO 2017MARÇO 2017 VOZ DO CAMPO

O passado...Na década de 50, a Comissão Reguladora

do Comércio do Arroz, que regulamentavaos preços e a investigação em arroz, tinha apossibilidade de cobrar uma taxa por cadaquilograma de arroz produzido em Portugale financiar, desta forma, os trabalhos demelhoramento genético do arrozdesenvolvidos pelo INIA. Os trabalhos deMelhoramento deram origem a novasvariedades de arroz que foram sendoutilizadas pelos agricultores portugueses.Simultaneamente, a pesquisa funcionava emSalvaterra de Magos num centro de apoioque divulgava a tecnologia desenvolvida.

No final da década de 80 foi interrompida ainvestigação em melhoramento genético dearroz. A consequente descontinuidade nofluxo de obtenção de novas variedadesportuguesas que eram utilizadas pelosagricultores portugueses, levou a que osmesmos e as indústrias começassem aimportar variedades, principalmente de Itáliae Espanha.

O reinício do MelhoramentoNacional em 2003

O Instituto Nacional de InvestigaçãoAgrária e Veterinária (INIAV), consciente daimportância do melhoramento nacional,reiniciou em 2003, a investigação nestedomínio com o arranque do ProgramaNacional de Melhoramento Genético doArroz juntamente com o Instituto deTecnologia Química e Biológica AntónioXavier (ITQB NOVA).

Na primeira fase do programa foi estudadaa coleção de germoplasma de arroz, comcerca de mil entradas com origens diversas,nomeadamente, de países estrangeiros, dasvárias zonas orizícolas de Portugal e aindaalgumas linhas avançadas provenientes domelhoramento genético.

A nova era do melhoramentogenético do arroz em Portugal

O melhoramento genético nacionalpossibilita a criação de novas variedadesajustadas às condições agro-económicas dosistema de produção de arroz em Portugal e adisponibilização das mesmas aos agricultoresnacionais. O processo de melhoramento

Início do processo de seleçãode gerações segregantesem 2006

Uma vez que as probabilidades de sucessoaumentam efetuando a seleção das plantas noslocais a que a cultura se destina, foramidentificados, numa primeira fase, dois locais-chave para o processo: Salvaterra de Magose Vale do Mondego.

A partir de 2006 juntam-se ao Programa oCOTArroz, no qual participam todos os

– do reinício até à inscrição de novas variedades

Ana Sofia Almeida1, Benvindo Maçãs1, Paula Marques2, JoséCoutinho1, Carla Brites1, António Jordão3, Margarida Oliveira4,5,Pedro Marques6, Jorge Zambujo6

1 Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária –INIAV/MAFDR2 Centro Operativo e Tecnológico do Arroz – COTArroz3 Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro - DRAPCentro4 Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier,Universidade Nova de Lisboa5 Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica6Agrupamento de Produtores de Arroz do Vale do Sado - APARROZ

Figura 1 – Etapas para obtenção de uma novavariedade de arroz, que será ainda sujeita, porparte da DGAV, a 2 anos de ensaios paraaprovação de inscrição no Catálogo Nacional deVariedades (CNV)

Figura 2 – Emasculação de panícula paraexecução de cruzamento artificial

agentes da fileira (investigação, produção eindústria) e a Direção Regional de Agriculturae Pescas do Centro (DRAP Centro). Nesseano iniciou-se o processo de seleção naprimeira F2 (geração de máxima segregaçãoapós cruzamento) instalada no COTArroz, enos campos experimentais do Bico da Barcano Mondego. Assim, a seleção das geraçõessegregantes é efetuada nestes dois locais,onde as plantas são sujeitas à pressão naturalde cada região (Fig. 4). Neste contexto, noano de 2016 foram semeadas 1350 linhassegregantes.

Em paralelo, foram iniciados estudos decaracterização molecular, desenvolvidospelo ITQB/IBET utilizando conhecimentodisponível a nível mundial para o arroz. Foramusados marcadores para avaliar a diversidadegenética de parte da coleção nacional degermoplasma (178 acessos).

Início da avaliaçãoagronómica (produção e quali-dade) das linhas avançadas em2010

O Programa Nacional de MelhoramentoGenético do Arroz tem progredidocontinuamente. Desde 2010 que se instalamanualmente ensaios (Tabela 1) que incluem aslinhas avançadas selecionadas no ProgramaNacional de Melhoramento do Arroz evariedades comerciais (testemunhas decomparação) com o objetivo de avaliardiversos parâmetros agronómicos e dequalidade. Conjuntamente a resistência oususceptibilidade às principais doenças,nomeadamente à piriculariose foliar epanicular (Pyricularia oryzae) e àhelmintosporiose (Helminthosporium oryzae)são avaliadas nos diversos ensaios.

Figura 4 – Gerações segregantes na estaçãoexperimental da DRAP Centro em Montemor-o-Velho (Bico da Barca)

genético de plantas é longo, dinâmico edispendioso, sendo necessários cerca de 12anos para a obtenção de uma nova variedade(Fig. 1).

Os primeiros cruzamentosartificiais em 2004

A informação recolhida quer através deobservações diretas no campo ou compiladaem diversas publicações, permitiu escolhergenótipos que serviram de base aos cerca de2600 cruzamentos artificiais (Fig. 2) jáefetuados desde 2004.

O programa base é desenvolvido noscampos experimentais do COTArroz, emSalvaterra de Magos, onde é anualmenteinstalado o bloco de cruzamentos, grupo deprogenitores base de cada ano (Figura 3) eexecutados os cruzamentos artificiais.

Figura 3 – Bloco de progenitores usados narealização de cruzamentos artificiais

Os ensaios são conduzidos em três locais:na região do Vale do Mondego no Bico daBarca (DRAP Centro), na região do Vale doTejo, nos campos experimentais doCOTArroz (Fig. 5) e na região do Vale doSado, em terrenos de um agricultor com acolaboração da APARROZ.

Início da Rede Nacional deEnsaios de Adaptação em 2014

Em 2014 foi criada a Rede de Ensaios deAdaptação (REA) a qual consiste na instalaçãoe condução de ensaios multilocais paraavaliação agronómica e da qualidadetecnológica anual das linhas avançadas queprovém do Programa de Melhoramento doArroz. A REA integra ensaios comuns nas 3regiões portuguesas produtoras de arroz,nomeadamente Tejo, Mondego e Sado,permitindo adicionalmente avaliar a interaçãogenótipo x ambiente (Fig. 6). A mesma éfinanciada por um projeto PRODER(LUSARROZ), o qual é desenvolvido por umconsórcio constituído pelo INIAV,COTArroz e duas organizações de produtoresa Benagro e a APARROZ.

Figura 5 – Ensaios de avaliação agronómicainstalados no COTArroz, na regiãodo Vale do Tejo

Inscrição de 2 variedadesportuguesas no CNV em 2017

Após mais de duas décadas e meia, em queos orizicultores portugueses, apenas tiveramà sua disposição para semear variedadesestrangeiras, foram recentemente inscritas noCatálogo Nacional de Variedades duas

Figura 6 – Ensaios da REA em São Romãodo Sado

variedades portuguesas de arroz, umavariedade de arroz carolino designada CERES(Fig. 7) e uma variedade de arroz agulhadesignada MAÇARICO.

Uma vez que a obtenção de variedadesportuguesas foi identificada pela fileira doarroz como uma prioridade para o setor, estaatividade de investigação foi igualmentefinanciada por diversas organizações deprodutores e por empresas do setor.

Figura 7 – Arroz branqueado da variedade portuguesa de arroz carolino CERES

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GRANDE REPORTAGEM GRANDE REPORTAGEM

Tabela 1 –Ensaios de avaliação agronómica instalados de 2010 a 2016 em Salvaterra de Magos (Tejo),Montemor-o-Velho (Mondego) e São Romão do Sado (Sado).

Vale do TejoSalvaterra de Magos

Vale do MondegoMontemor-o-Velho

Vale do SadoAlcácer do Sal

2010-2016

N.º de ensaios

N.º de linhasavançadas(genótipos)

N.º detestemunhas

10 11 12 13 14 15 16 10 11 12 13 14 15 14 15 16 TOTAL

21

512

1111111112222211

12 26 50 46 55 67 39 9 28 26 26 28 27 27 22 24

5535445526787974

26 27

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