A Persistência da Memória

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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

A Persistência da Memória – Salvador Dalí

Henrique Silva Lima Gomes dos Santos

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A Persistência da Memória – Salvador Dalí

Prof. Dr. Ricardo Marques de Azevedo

Junho – 2013

São Paulo – SP

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Introdução

Na virada para o séc. XX, nota-se certa quebra com o tradicional (ex.: Freud, Klimt),

resumida basicamente a valorização da parcela instintiva do homem. Anos depois, se inicia a

Primeira Grande Guerra, colocando em tona a dúvida a respeito do sentido da razao e das

conequências de seu uso. Aliando tal sentimento aos estudos de Freud, aflora o surrealismo,

movimento que tem como centro o inconsciente, o instintivo, o surreal. Como fruto destas

junções está Dalí, pintor espanhol nascido em 1904 em Figueres, Espanha.

Este trabalho visa analisar a obra ‘’ A Persistência da Memória’’ de Salvador

Domingo Felipe Jacinto Dali i Domènech e tem como objetivo explicitar e explicar as

características mais importantes do quadro, além de auxiliar no entendimento do movimento

artístico do qual pertence.

Sendo o contexto histórico marcado pelos conflitos psicológicos em relação ao uso da

razão e suas consequências (Primeira Grande Guerra) e pela maior popularização e

conhecimento dos estudos de Freud, a análise baseia-se nas possíveis conexões entre Freud,

Surrealismo e a obra, uma vez que um pode ser facilmente usado para explicar os demais. O

Contexto artístico se resume ao contexto histórico, e o último pode ser explicado pelas obras

contidas no movimento surrealista, tendo como fortes exemplos as obras de Dalí.

A análise será feita, basicamente, através da elaboração de um quadro cronológico

(auxílio no entendimento do contexto), explicação de conceitos contidos na obra e uma breve

descrição do movimento artístico no qual a obra se encaixa.

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Surrealismo

Trata-se de um movimento artístico surgido no início da década de 1920 na França

tem como marco inicial a publicação do Manifesto Surrealista por André Breton, em 1924.

Esse movimento, que posteriormente difundiu-se po diversos países, surgiu em consequência

da situação espiritual da juventude a qual viu a Europa ‘’morrer’’ após a primeira grande

guerra.

Resumidamente, trata-se de um movimento cujo objetivo principal é trazer a

tona o inconsciente/instinto humano, uma vez que, para os surrealistas, o inconsciente é de

extrema importância para a criatividade do homem. Tal característica evidencia a influência

das teses psicanalíticas Freud – médico austríaco responsável pela criação da psicanálise.

Tendo em mente que a psicanálise é o campo que investiga e estuda a inconsciência

humana, nota-se facilmente o ponto mais básico de união entre Freud e Surrealismo –

necessidade de expor o lado inconsciente do ser humano, uma vez que nele constam as

características mais primitivas e naturais do homem. Além deste ponto, podem-se citar outros

dois consequente deste primeiro: libertação da mente em relação aos padrões

comportamentais e morais estabelecidos pela sociedade e colocação do sonho como a única

forma de visão e execução de cenários surreais.

O movimento é fruto do dadaísmo e teve como um dos maiores representantes

Salvador Dalí. Seus quadros, apesar de representarem bem o movimento, se diferenciam de

quadros de outros artistas surrealistas por tratarem de um mundo não tão distante da realidade,

uma vez que Dalí representa o mundo psicológico através da utilização de objetos do

cotidiano de forma precisa.

Ponha-se no estado mais passivo ou receptivo, dos talentos de todos

os outros. Pense que a literatura é um dos mais tristes caminhos que levam a

tudo. Escreva depressa, sem assunto preconcebido, bastante depressa para

não reprimir, e para fugir à tentação de se reler. A primeira frase vem por

si, tanto é verdade que a cada segundo há uma frase estranha ao nosso

pensamento consciente pedindo para ser exteriorizada..(BRETON, ANDRÉ,

Manifesto Surrealista, 1924)

Tal frase resume e explica bem o movimento, pois, tendo a inconsciência como idéia

central, tais artistas tinham em mente a criação sem consideração de valores, preceitos e,

principalmente, valores burgueses.

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Linha cronológica

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A Persistência da Memória

Autor: Salvador Domingo Felipe Jacinto Dali i Domènech

Localização: MoMa(Museu de Arte Moderna), Nova York, Estados UnidosAno: 1931

Técnica: Óleo sobre telaTamanho: 24cm x 33cmMovimento: Surrealismo

O Quadro ‘’A persistência da memória’’ foi exposto no ano de 1956 em Nova Iorque,

durante o período em que Dalí morou nos Estados Unidos (após o início da segunda grande

guerra)e se encontra, atualmente, no Museu de Arte Moderna. É considerado um dos mais

bem representantes do movimento surrealista, portanto , é responsável pelo grande aumento

de sua notoriedade pública.

As pinturas de Dalí podem ser divididas, basicamente, em 4 grupos: Freudianos,

Metamorfósicos, Religiosos e Nucleares. Tais grupos se resumem a principal influência

sofrida pelo autor no momento de criação. ‘’A Persistência da Memória’’ pertence ao grupo

dos freudianos, sendo que tal influência (que teve início por volta do início da década de

1920), juntamente com outros aspectos da obra, serão explicados a seguir.

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Mutabilidade do tempo e ligações com Freud

Em tal obra, Dalí coloca em jogo a idéia do tempo fixo e imutável com as pesquisas

de Freud relativas ao inconsciente e à importância da interpretação dos sonhos. Essa questão

explica a existência de três relógios derretidos (consequência do derretimento de um queijo

observado por Dalí) e maleáveis marcando horas diferentes, dando a entender que o tempo

pode ser interpretado de várias formas. O passado se funde com o presente, que pode vir a se

fundir com o futuro, e a percepção temporal pode ser diferente de indivíduo para indivíduo.

Essa questão resume bem a idéia da obra, que coloca a memória e o inconsciente como

responsáveis pela interpretação alternativa da realidade, do tempo e do concreto, explicitando

a influência direta de Freud em suas obras.

Sigmund Freud, na virada do séc. XIX para o séx XX, assim como os movimentos

Secessão, Art Noveau, quebra com o tradicional ao colocar uma idéia nova em jogo. No caso

de Freud, tal idéia é o estudo e valorização do inconsciente em detrimento dos preceitos

morais burgueses. Ele estrutura o aparelho mental em 3 partes: Id(inconsciente e irracional),

Ego(mediador, personalidade) e Superego(preceitos, modos e moral), e além de tais conceitos,

pode-se e deve-se citar a questão dos sonhos. Em ‘’Interpretação dos Sonhos’’, Freud diz que

o sonho segue uma lógica diferente e desconhecida, ou seja, não segue a lógica cotidiana

conhecida pelo homem. Tal questão se explica pelo colocação do sonho como a realização de

um desejo, cuja realização não é possível na ‘’vida real’’. Em outras palavras, o superego

(moralidade) acaba por suprimir tal desejo, fazendo com que o mesmo seja realizado no

campo do inconsciente.

Como já foi dito acima, Dalí coloca o tempo como algo maleável e relativo, diferindo

da noção comum de tempo, onde o mesmo é uma linha reta e e necessariamente sucessória.

Todavia, o próprio título da obra – ‘’A Persistência da Memória’’ - ajuda no entendimento

dessa questão, uma vez que o conceito de memória é responsável pela quebra com a noção

linear de tempo. A memória, por ser a faculdade psíquica por onde se consegue lembrar de

acontecimentos passados, acaba por trazer ao presente fatos já ocorridos, misturando o

presente com passado e colocando o tempo como algo que vai e vém, sem muito sentido ou

regularidade.

As questões da memória, inconsciência e supressão de desejos se ligam a Freud na

medida em que o sonho, em seu ponto de vista, é fruto de alguma memória, memória essa que

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independentemente de poder ser lembrada consciente ou insconscientemente, auxilia para o

entendimento do tempo como algo maleável.

Indo além da questão do tempo e memória, outra possível ligação com Freud pode ser

feita pela simples existência de uma atmosfera surreal, que só seria possível nos sonhos, no

inconsciente.

Autorretrato

Percebe-se, na obra, a presença de um objeto cinzento próximo ao centro do quadro.

Trata-se de um autorretrato de Salvador Dalí, presente também em outras obras do artista.

Ao analisar tal imagem, nota-se a presença de um relógio derretido em cima do

‘’rosto’’, além de um grande olho fechado. Relacionando tais imagens com o sentido e

significado da obra, pode-se deduzir que remetem a idéia de que uma vez dormindo, de olhos

fechados, o homem dá espaço ao sonho e ao inconsciente, permitindo a mesclagem e

mutabilidade do tempo através dos sonhos, constituídos basicamente de memórias e desejos,

segundo Freud. Dizem que o olho fechado representa a morte, porém, é difícil afirmar tal

coisa tendo em vista que a temática da obra não tem forte ligação com tal ato.

Representação do irrepresentável

‘’ Toda a minha ambição no campo pictórico é materializar as imagens da

irracionalidade concreta com a mais imperialista fúria da precisão.” Tal frase foi dita pelo

próprio Salvador Dalí. Em outras palavras, ele gostaria de representar o irrepresentável,

gostaria de representar o surreal com precisão realista. Sendo a qualidade gráfica de seus

quadros altíssimas, a representação do surreal magnífica (seus quadros são famosos por

parecerem cenas de filmes gravados no interior de nossas cabeças) e considerando que

conseguiu reproduzir conceitos razoavelmente complexos através de imagens, pode-se dizer

que Dalí obteve total êxito no quesito.

Formigas sobre o relógio: repúdio ao tempo imutável

Nota-se um único relógio não deformado, de cor alaranjada, sob diversas

formigas. É difícil acreditar que estão presentes na obra por mera coincidência.

Uma vez que a temática do quadro gira entorno da maleabilidade do tempo e que Dalí

odiava formigas (elas aparecem em suas obras como representantes da decadência), é cabível

a relação entre a existência de tais matérias e a temática principal da obra. Isso porque,

provavelmente, a imagem (relógio não deformado+formigas) representa o repúdio a idéia de

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tempo regular, ou até mesmo a ansiedade e preocupação do homem em relação ao controle do

tempo, colocando o tempo como responsável por certa decadência psicológica do homem,

principalmente no contexto histórico da publicação da obra.

Contrastes e crítica-paranóica

Tecnologia e natureza(relógio pendurado na árvore), luz e sombra(parte superior –

horizonte e rochas x parfe inferior do quadro), dureza e suavidade (sólido de ângulos retos,

plano próximo ao horizonte e horizonte/natureza , mole e duro, relógios). Tais aspectos

presentes na composição da obra denunciam a existência de forte contrastes que,

provavelmente, representam certo conflito psicológico.

Além de tais dualidades compositivas, nota-se a presença da crítica paranóica, que

pode ser resumida a duplicidade de sentido de certas imagens, e tem como forte exemplo o

autorretrato presente no quadro. Para uns, tem ligação com a morte, já para outros, com o

sonho e inconsciente, enquanto para outros não parece ser sequer um autorretrato.

Conclusão

‘’A Persistência da Memória’’ representa uma atmosferra surreal próxima dos sonhos.

Em tal atmosfera, são expostos diversos conceitos, representados por simples objetos do

cotidiano, suas combinações e(ou) deformações, todos dotados de grande qualidade gráfica.

Tendo como idéia central a questão memória-tempo, dialoga fortemente com o Surrealismo e

com Freud, auxiliando no entendimento de uma época turbulenta e dotada de diversas

mudanças.

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Bibliografia

BALLARD, J.G.(1974). Dali

BOSQUET, Alain (1967). Dali Desnudado

DALI, Salvador (1942). A Vida Secreta de Salvador Dali

BRETON, André (1924). Manifesto Surrealista

Universia (2012) Conheça A Persistência da Memória, de Salvador Dali. Disponível em: http://noticias.universia.com.br/destaque/noticia/2012/01/07/903289/conheca-persistencia-da-memoria-salvador-dali.html