A POLÍTICA DE COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO...

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com o apoio Resumo A política de Cooperação para o Desenvolvimento enquanto “campo” de conhecimento capaz de se articular com o impacto da aplicação das políticas públicas nos países em desenvolvimento, é nos dias de hoje, uma das áreas mais importantes no âmbito das relações internacionais. Suscetível a fatores externos e internos, a Cooperação tem sido confrontada com a grave crise económica que afeta o sistema mundial, não sendo por acaso que os países recetores da Ajuda Internacional tenham sido os mais afetados. Considerado como um dos cenários mais dramáticos por Peter Wahl (2008) a Cooperação clama por uma solução junto dos parceiros internacionais. É, portanto, crucial entendermos o impacto que a crise económica teve na política de Cooperação não num contexto global, mas no contexto específico português. Desta forma, pretende-se mostrar até que ponto a política de Cooperação Portuguesa tem sido afetada e de que forma tem penalizado (nas suas relações de Cooperação) países como Guiné-Bissau, Cabo Verde, Moçambique e S. Tomé e Príncipe. Para isso, a investigação, alicerçar-se-á nas prioridades estabelecidas, nos planos de governos e nos investimentos concedidos pelo IPAD (presentes nos quadros do Diário da República) desde 2008. WP 109 / 2012 A POLÍTICA DE COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO NO CONTEXTO DA CRISE ECONÓMICA DO SÉCULO XXI: O CASO PORTUGUÊS Raquel Faria

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com o apoio

Resumo

A política de Cooperação para o Desenvolvimento enquanto “campo” de conhecimento

capaz de se articular com o impacto da aplicação das políticas públicas nos países em

desenvolvimento, é nos dias de hoje, uma das áreas mais importantes no âmbito das

relações internacionais. Suscetível a fatores externos e internos, a Cooperação tem sido

confrontada com a grave crise económica que afeta o sistema mundial, não sendo por

acaso que os países recetores da Ajuda Internacional tenham sido os mais afetados.

Considerado como um dos cenários mais dramáticos por Peter Wahl (2008) a

Cooperação clama por uma solução junto dos parceiros internacionais.

É, portanto, crucial entendermos o impacto que a crise económica teve na política de

Cooperação não num contexto global, mas no contexto específico português. Desta

forma, pretende-se mostrar até que ponto a política de Cooperação Portuguesa tem sido

afetada e de que forma tem penalizado (nas suas relações de Cooperação) países como

Guiné-Bissau, Cabo Verde, Moçambique e S. Tomé e Príncipe. Para isso, a

investigação, alicerçar-se-á nas prioridades estabelecidas, nos planos de governos e nos

investimentos concedidos pelo IPAD (presentes nos quadros do Diário da República)

desde 2008.

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A POLÍTICA DE COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO

NO CONTEXTO DA CRISE ECONÓMICA DO SÉCULO XXI:

O CASO PORTUGUÊS

Raquel Faria

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WORKING PAPER / DOCUMENTOS DE TRABALHO

O CEsA não confirma nem infirma

quaisquer opiniões expressas pelos autores

nos documentos que edita.

O CEsA é um dos Centros de Estudo do Instituto Superior de Economia e Gestão da

Universidade Técnica de Lisboa, tendo sido criado em 1982.

Reunindo cerca de vinte investigadores, todos docentes do ISEG, é certamente um dos

maiores, senão o maior, Centro de Estudos especializado nas problemáticas do

desenvolvimento económico e social existente em Portugal. Nos seus membros, na

maioria doutorados, incluem-se economistas (a especialidade mais representada),

sociólogos e licenciados em direito.

As áreas principais de investigação são a economia do desenvolvimento, a economia

internacional, a sociologia do desenvolvimento, a história africana e as questões sociais

do desenvolvimento; sob o ponto de vista geográfico, são objecto de estudo a África

Subsariana, a América Latina, a Ásia Oriental, do Sul e do Sudeste e o processo de

transição sistémica dos países da Europa de Leste.

Vários membros do CEsA são docentes do Mestrado em Desenvolvimento e

Cooperação Internacional leccionado no ISEG/”Económicas”. Muitos deles têm

também experiência de trabalho, docente e não-docente, em África e na América Latina.

A AUTORA

RAQUEL FARIA

Licenciada em Administração Pública – doutoranda em Altos Estudos em História –

Época Contemporânea. Investigadora auxiliar no CEsA/ISEG

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1. INTRODUÇÃO

«(…) As atuais dinâmicas internacionais questionam as abordagens existentes e exigem

aos governos novas soluções políticas, capazes de conciliar as necessidades sociais, com

os enquadramentos económicos e com os novos contextos de segurança. O mundo está

hoje seguramente diferente do que era há 10 anos atrás e a cooperação assume um papel

inquestionável quando pensamos nas soluções para os problemas atuais da conflitualidade

internacional (…)» (Amaral, 2008, p. [8]).

Com o final da Guerra Fria e o crescimento da globalização, a constatação de que se

tornava imperativo não só a adoção de uma nova atitude face aos relacionamentos

estabelecidos entre os países do Norte e do Sul, de modo a evitar exclusões de alguns

dos países, nomeadamente do Sul, assim como preocupações inerentes ao

financiamento, à harmonização, à qualidade e à eficácia da Ajuda tem caraterizado todo

um longo período da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. Neste período,

as primeiras décadas do século XXI parecem sobressair em relação às demais, pela

concertação de esforços que têm sido desenvolvidos em prol de uma maior e melhor

Ajuda, tendo como preocupações dominantes as situações de pobreza extrema, o

respeito pelos Direitos Humanos e, sobretudo, o compromisso por alcançar as metas

acordadas internacionalmente ao nível dos Objetivos do Desenvolvimento do Milénio

(ODM).

Falamos assim, num período onde dos diversos encontros, cimeiras, conferências

emergiram importantes documentos, entre os quais, a Declaração do Milénio (2000), o

Consenso de Monterrey (2003), a Declaração de Roma (2003), o Memorando de

Marrakech (2004), a Declaração de Paris (2005), o Consenso Europeu (2005), a Agenda

da Acção de Acra (2008), Declaração de Doha sobre o Financiamento para o

Desenvolvimento (2008), a Declaração de Busan (2011) e a Declaração de Díli (2011).

Ambos os documentos alicerçaram-se, essencialmente, nas relações de Cooperação, na

erradicação da pobreza extrema, na qualidade e na eficácia da Ajuda e, sobretudo, nos

ODM, cuja referência foi uma constante em todos. Efetivamente, ficou claro o

compromisso político, em todos os períodos em que os respetivos documentos foram

assinados, de continuar a desenvolver esforços para que as metas acordadas

internacionalmente fossem atingidas, nos limites temporais fixados, nomeadamente:

erradicar a pobreza extrema e a fome; alcançar o ensino primário universal; promover a

igualdade de género; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater

o VHI/SIDA, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental; e,

fortalecer uma parceria mundial para o Desenvolvimento (Nações Unidas, 2000).

Estes mesmos objetivos, que se encontram presentes em qualquer política de

Cooperação, segundo diversas fontes de natureza periódica e mesmo oficial

(CAD/OCDE), encontram-se em risco de não serem cumpridos, assim como todo um

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conjunto de compromissos políticos assumidos internacionalmente e localmente

(programas de governo).

Se em 2008 fomos confrontados com artigos que se resumiam a alertar para o perigo da

crise financeira no âmbito da Cooperação para o Desenvolvimento,

«A crise financeira, principalmente a crise real da economia irão fazer com que os

encargos dos Estados subam violentamente. A dívida pública vai crescer

vertiginosamente, o que irá cercear de forma dramática o espaço destinado à Cooperação

para o Desenvolvimento. Uma Cooperação que, antes da crise, já apresentava enormes

dificuldades de atingir suas metas» (Wahl, 2008).

Nos anos seguintes, os artigos já mudaram de conteúdo e afirmaram, categoricamente,

os efeitos negativos dessa mesma crise, onde, mais uma vez os países mais vulneráveis

voltaram a ser os primeiros e principais prejudicados.

«(...) a atual crise económica – a qual não foi provocada pela África – ameaça reverter os

ganhos da última década. Os países africanos sofrem com a saída maciça de capital de

bancos e empresas estrangeiras, que retornam aos seus mercados de origem, e a escassez de

crédito coloca em risco as exportações e os projetos de infraestruturas no continente»

(Ismail, 2009).

«(...) A pergunta “porque havemos de ajudar os pobres de outros países quando temos

tantos dentro do nosso próprio território” exprime uma visão protecionista e redutora da

realidade» (Ferreira, 2011).

Depois de toda esta informação, de todos os estados de alerta e de confirmação do efeito

da crise financeira mundial na Cooperação para o Desenvolvimento, surge, em 2012, os

resultados da fonte oficial (CAD/OCDE), que vêm confirmar tudo o que havia sido

publicado e noticiado. Em 2011, a Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) dos países

membros do CAD (União Europeia) diminuiu cerca de 3%, mais precisamente, 2,7%.

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Ilustração 1- Volume da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) em 2011.

Fonte: DAC/OECD (2012).

Ilustração 2- Volume da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD)

dos países europeus membros do CAD/OCDE em 2011.

Fonte: DAC/OECD (2012).

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Desta diminuição da APD, os países membros do CAD da União Europeia, onde se

verificaram os maiores níveis de redução foram a Grécia (39,3%), a Espanha (32,7%), a

Áustria (14,3%) e a Bélgica (13,3%).

Em relação a Portugal, também se assistiu a um decréscimo do volume da APD

concedida. Decréscimo esse, que não assumiu proporções como os países anteriormente

mencionados, mas que é importante referir: em 2011, o volume da APD nacional

diminuiu 3%, não cumprindo, assim, um dos objetivos estabelecidos pela Cooperação

Multilateral portuguesa: aumentar o volume da APD nacional.

Desta forma, e tendo em conta, a gravidade da crise financeira atual é importante refletir

sobre até que ponto, esta mesma crise tem colocado em causa todo um conjunto de

objetivos, prioridades e compromissos estabelecidos ao nível dos próprios governos,

neste caso o governo português, principalmente num cenário onde o volume da APD

nacional diminuiu.

2. A POLÍTICA DE COOPERAÇÃO PORTUGUESA

a) Contextualização

Após a revolução dos Cravos, a 25 de abril de 1974, a política de Cooperação

Portuguesa assumiu uma tipologia “puramente” descentralizada seja na sua orgânica

seja na definição de estratégia até 1999, permanecendo assim, um modelo de

Cooperação descentralizada durante 35 anos. Apenas em 1985 quando se criou a

Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação com o governo de Nobre

da Costa foi possível observar o início do desenvolvimento de um programa de

Cooperação.

A política de Cooperação nacional mantém – se em todo o período como uma das

vertentes da política externa nacional, e segue linhas de atuação que visam sobretudo a

paz, o espírito de solidariedade entre os povos, o estabelecimento e a consolidação de

um regime político democrático em todos os países, independentemente da sua cultura,

religião ou etnia. Procura acima de tudo o respeito pelos direitos do homem em

qualquer circunstância, assim como a promoção da língua portuguesa e a proteção do

meio ambiente.

Para além das linhas de atuação e características identificadas, a política de Cooperação

nacional faz-se acompanhar por um amplo leque de objetivos, entre os quais: «reforçar a

democracia e o Estado de Direito; reduzir a pobreza, promovendo as condições

económicas e sociais das populações mais desfavorecidas, bem como desenvolver as

infraestruturas necessárias ao nível de educação (infraestruturas básicas de educação e

saúde primária); estimular o crescimento económico, fortalecendo a iniciativa privada;

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promover o diálogo e integrações regionais; e, promover uma parceria europeia para o

desenvolvimento humano» (Sangreman, 2007).

É importante salientar que desde a revolução de 1974 duas grandes e importantes

características permanecem no domínio da Cooperação portuguesa: a relação com os

PALOP de forma a ajudá-los nos mais diversos setores (educação, saúde, saneamento

básico, …) (pois países que surgem na estatística da Cooperação como Marrocos apenas

refletem a abertura de linhas de crédito para empresas ou missões militares e de policia

como a Sérvia) e a tipologia descentralizada.

A relação estabelecida entre Portugal e os PALOP não surgiu por acaso, dado que todo

o «enquadramento institucional da Cooperação Portuguesa iniciou-se, precisamente,

quando as colónias portuguesas africanas de Angola (novembro de 1975), Moçambique

(junho de 1975), Guiné-Bissau (setembro de 1974), S. Tomé e Príncipe e Cabo Verde

(julho de 1975) tornaram-se independentes» (Monteiro, 2001). O “fracasso” de Portugal

relativamente à capacidade de desenvolver e fomentar um processo pacífico de

independência das mesmas colónias, após 1974, foi, igualmente, um dos grandes

motivos que levou o nosso país a alicerçar a concentração de ajudas no apoio às

mesmas.

Em 1999, com a portaria n.º43/99 do Conselho de Ministros foi aprovada “A

Cooperação Portuguesa no limiar do século XXI”, cujo principal objetivo estratégico

apontado e até hoje prevalecente era o de «(…) saber articular nos planos político,

económico e cultural, a dinâmica de constituição de uma comunidade, estruturada nas

relações com os países e as comunidades de língua portuguesa no mundo, e de

reaproximação a outros povos e regiões (…)» (Documento citado). Segundo Sangreman

(2008), esta reforma foi estabelecida com o objetivo de transformar de forma

progressiva e gradual o modelo descentralizado de Cooperação.

Mediante o objetivo criado, e por conseguinte o desafio estabelecido, assistiu-se ao

surgimento de novos instrumentos de “apoio” no âmbito da política de Cooperação

portuguesa: os Programas Indicativos de Cooperação (PIC), os Programas Integrados de

Cooperação, as Delegações Técnicas de Cooperação, Agência Portuguesa de Apoio ao

Desenvolvimento (APAD). Tal portaria foi seguida em 2005 por uma RCM “a visão

estratégica para a Cooperação Portuguesa” que manteve o essencial da anterior e criou

novos instrumentos institucionais. O balanço da mesma, feito em finais da legislatura

(MNE, 2009) reclama um progresso sem precedentes na política da área. Os governos

em 2002 e 2003 extinguiram a APAD e voltaram ao modelo de um único instituto para

coordenar a cooperação (IPAD) retomando a cultura administrativa da Direção Geral. A

descentralização por que se pauta a política de Cooperação, tem conduzido a um

aumento do número de atores que podem assumir a forma de ONGs, de Municípios, de

Ministérios, Tribunais, Universidades, Fundações, …. Todo este conjunto de atores

constitui, sem dúvida, uma mais-valia que se traduz numa maior capacidade de

desenvolver e fomentar ações nesta área.

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Assim, estruturalmente a Cooperação nacional, mudou alguma coisa nos últimos cinco

anos, mas não muito. O aumento da cooperação multilateral em detrimento da bilateral,

tendo a primeira uma média de 44 % do orçamento com a União Europeia como

principal destinatário e como consequência o Ministério das Finanças tem a execução da

maioria do orçamento (OCDE, 2010) e não o MNE. Foram criados instrumentos de

relação com a sociedade civil, o Fórum da Cooperação para o Desenvolvimento e com o

público estudantil com o programa de estágios INOV Mundus que também

contribuíram para as transformações estruturais.

b) A Cooperação Multilateral Portuguesa

A Cooperação multilateral portuguesa encontra- se, essencialmente, orientada para

auxiliar o continente africano, principalmente os Países Menos Desenvolvidos (PMD) e

os designados Estados Frágeis (países cujo sistema político é frágil, apresentando

grandes e graves dificuldades), de forma a contribuir para o desenvolvimento dos

mesmos. Associadas a este auxílio encontram-se outras linhas orientadoras que

assumem particular importância no quadro da Cooperação nacional, a saber: o

alinhamento e a harmonização entre as diversas estratégias de natureza nacional e

internacional de forma a prosseguir os ODM e o reforço do espaço lusófono, utilizando

a língua portuguesa como propulsora de intervenções e de constituição de redes, de

forma a contribuir para o reforço da capacidade de resposta aos países da CPLP aos

desafios da globalização em geral e aos desafios do desenvolvimento consubstanciados

nos ODM, em particular (IPAD, s.d.).

Dá prioridade à União Europeia, à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

(CPLP), a organizações como as Nações Unidas, o CAD e o Centro de

Desenvolvimento (OCDE), o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, os

Bancos Regionais (BAFD – Banco Africano de Desenvolvimento, BASD – Banco

Asiático de Desenvolvimento e o BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento), a

conferência Ibero-americana, a União Africana, a Comunidade Sul Africana do

Desenvolvimento (SADC) e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental

(CEDEAO) que acabam por enformar todo o espaço multilateral no qual se enquadra a

política de Cooperação multilateral portuguesa.

O espaço multilateral português, no seu todo, e tendo em conta todas as organizações

regionais e internacionais que o compõem, tem como principal foco de atenção os

países em desenvolvimento e, por conseguinte, todas as fragilidades a estes associados,

procurando ajuda-los através de todo um enquadramento subjacente a uma política de

Cooperação para o Desenvolvimento global.

A diversidade de organizações que constituem todo o espaço multilateral português,

permite com que seja possível selecionar, pelos objetivos e pelos meios que detêm, as

organizações regionais e/ou internacionais que venham a assumir a designação de

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parceiros no prosseguimento e na promoção do alcance dos objetivos definidos pelas

estratégias delineadas no âmbito da Cooperação para o Desenvolvimento. De todas as

instituições, organizações (regionais e internacionais), … que enformam o já referido

espaço multilateral, a União Europeia é indubitavelmente a que assume maior

importância no quadro da política de Cooperação nacional (DAC/OECD, 2010), por

vários motivos. Motivos esses, que passam por razões de natureza institucional, política

e económica (mais precisamente pelos fluxos financeiros que desta provêm). Aliás, não

é por acaso que a União Europeia, segundo o documento “A Estratégia multilateral da

Cooperação portuguesa” (IPAD, s.d.) assume a designação de ator global na área de

Cooperação. Não só por ser o maior dador multilateral, mas também por se encontrar

presente em todos os países em desenvolvimento e através dela o nosso país procurar

desenvolver meios que contribuam para o desenvolvimento dos países mais

desfavorecidos a uma escala mundial.

Mas qual a posição de Portugal em relação às estratégias de desenvolvimento

desenvolvidas pela União Europeia?

A que nível se verifica a sua intervenção nas mesmas?

No âmbito das estratégias fomentadas pela União Europeia, Portugal participa no

processo de definição e de decisão de estratégias que podem ser delineadas por regiões,

por temas, por setores, tendo como objetivo último, um dos grandes princípios

consignado a toda a política de Cooperação portuguesa: promover o desenvolvimento

nas vertentes sociais, económicas e políticas dos países do continente africano

(principalmente as ex-colónias), os Países Menos Desenvolvidos e os Estados Frágeis.

Como anteriormente mencionado, a União Europeia destaca-se pela enorme capacidade

de financiamento que detém e que simultaneamente controla, desempenhando um papel

crucial no âmbito da Cooperação. Neste sentido, convém perceber que forma assume

esse financiamento quando é direcionado para os países que se encontram numa

situação de pobreza extrema, com graves problemas do ponto de vista político, cultural

e socioeconómico.

Com os acordos de Cooperação estabelecidos, os financiamentos provenientes da União

Europeia assumem a forma de fundos concessionais. Estes fundos esgotam uma das

fatias mais significativas da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) multilateral,

segundo o IPAD (s.d.).

Uma vez referidas as principais linhas de orientação da Cooperação multilateral

portuguesa, falta-nos agora refletir sobre os princípios subjacentes a esta mesma forma

de Cooperação. Assim, e diretamente relacionados com as grandes linhas orientadoras

identificam-se os seguintes princípios:

Dar continuidade aos ODM;

Impulsionar um sistema de ajuda realmente eficaz nas suas diversas vertentes;

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Promover no âmbito da Cooperação bilateral e multilateral, a coerência não só

das políticas para o Desenvolvimento, mas também ao nível nacional e

internacional quer entre os diversos atores da Cooperação, quer na própria

definição de políticas e normas internacionais, como na atividade operacional

intra e interorganizações multilaterais. Igualmente, a coordenação e a

complementaridade devem estar presentes (IPAD, s.d.).

A política de Cooperação multilateral faz-se, ainda, acompanhar, logicamente, por um

amplo leque de objetivos, podendo ser de natureza geral e/ou específica. Assim, e

relativamente aos primeiros, identificam-se: fortalecer o poder do nosso país do ponto

de vista político e do ponto de vista das organizações multilaterais, através do aumento

da eficácia da Cooperação multilateral portuguesa e da operacionalização da abordagem

bi-multi aos diferentes níveis (ao nível das sedes e do terreno, nos países parceiros da

Cooperação portuguesa); fomentar a coerência e a eficácia dos esforços provenientes

dos atores institucionais da Cooperação multilateral portuguesa a partir de uma

estruturação das diversas relações estabelecidas entre os atores institucionais executores

da política nacional de Cooperação para o desenvolvimento (IPAD, s.d.).

Uma vez identificados os objetivos de natureza geral subjacentes à política de

Cooperação nacional, na sua forma multilateral, urge a necessidade de se identificar um

outro grupo de objetivos que se encontram intimamente relacionados com os primeiros -

objetivos específicos.

Assim, e tendo, igualmente, como suporte o documento estratégico de Cooperação

multilateral portuguesa do IPAD (s.d.), identificam-se como objetivos de natureza mais

específica, os seguintes:

Aumento do volume e da previsibilidade da APD portuguesa;

Possibilidade de deter informação relativa ao sistema e a eventuais novos

instrumentos no âmbito da Cooperação para o Desenvolvimento. Ainda

associado ao sistema da política de Cooperação para o Desenvolvimento, a

possibilidade de participar neste;

Deter “capacidade” para financiar os programas e projetos nos domínios

prioritários da Cooperação bilateral e para financiar os projetos que sejam do

interesse dos parceiros da política de Cooperação nacional;

Possibilidade de financiar bens públicos não só numa escala regional, mas

também global, principalmente no que concerne ao ambiente (alterações

climáticas e energias renováveis), a doenças transmissíveis (por exemplo:

HIV/SIDA, …), o comércio internacional (justo e não discriminatório), a solidez

ao nível internacional dos mercados financeiros, a paz e a segurança;

Participar, intervir em outros domínios, como na gestão macroeconómica, no

apoio ao desenvolvimento do setor privado, à integração regional e na ajuda ao

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comércio, de forma a contribuir para o crescimento económico e para o

desenvolvimento dos países mais pobres.

b1) A estratégia da Cooperação Multilateral portuguesa no quadro do UE

A União Europeia é, como inicialmente referido, um dos espaços prioritários no quadro

da política de Cooperação multilateral portuguesa. Assume particular importância pela

capacidade de financiamentos que mobiliza, sendo, portanto, um parceiro “valioso” para

Portugal no âmbito da Cooperação para o Desenvolvimento. Dada a sua importância no

contexto internacional, a União Europeia tendo como objetivo o desenvolvimento dos

países mais desfavorecidos, define e implementa um amplo leque de leis, que vão

determinar até que ponto o governo português participa no desenvolvimento dos PVD.

De igual modo, Portugal enquanto país membro da União Europeia, e segundo as

normas comunitárias, detém capacidade suficiente para dar o seu parecer, o seu

contributo em relação a decisões tomadas por esta. Sejam decisões de natureza política

ou económica. E é ao fazer-se valer desta capacidade, que o Estado português procura,

aquando a elaboração e definição de políticas procura orientá-las para continentes como

a África, a Ásia e a América Latina, tendo como objetivo setores como a educação, o

comércio, a saúde, os Direitos Humanos, a Boa Governação, as questões de género, o

ambiente, a segurança, a paz, …(IPAD, s.d.).

É indubitável, portanto, a relação entre Portugal e a União Europeia no quadro político

de Cooperação. E, é precisamente na decorrência desta mesma relação, que estes

partilham os mesmos propósitos. Propósitos esses, que se perspetivam em áreas como a

pobreza (combate a situações de pobreza extrema), o desenvolvimento (duradouro) e a

economia global (conduzir à participação dos países mais fragilizados em termos

políticos e socioeconómicos na economia global, de modo a contribuir para o seu

desenvolvimento).

c) Evolução da Ajuda Pública ao Desenvolvimento Portuguesa: 2008-2010

Uma vez identificadas as prioridades estabelecidas ao nível da política de Cooperação

nacional, e tendo presente o contexto de crise vigente, é importante perceber até que

ponto a crise económica tem afetado (ou não) o volume da APD portuguesa concedido

às ex-colónias africanas e a Timor-Leste, no período entre 2008 e 2010. Tendo presente

que, em relação a estas antigas colónias, às prioridades estabelecidas ao nível da boa

governação, participação e democracia; dos clusters da Cooperação; do

desenvolvimento sustentável e da luta contra a pobreza, ficaram definidas como áreas

de atuação, as seguintes:

1. Boa Governação, Participação e Democracia

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1.1.Capacitação da AP (Angola);

1.2.Capacitação institucional (Timor-Leste, Cabo Verde);

1.3.Processos eleitorais (Timor-Leste);

1.4.Cooperação na Justiça (Angola, Timor-Leste);

1.5.Cooperação Técnico-militar (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique,

São Tomé e Príncipe, Timor-Leste);

1.6.Cooperação na área da Polícia e Segurança (Angola, Cabo Verde, Moçambique,

São Tomé e Príncipe, Timor-Leste);

1.7.Finanças Públicas (Cabo Verde, Timor-Leste);

1.8.Apoio à administração do Estado: segurança e justiça, finanças (Guiné-Bissau,

Moçambique);

1.9.Reforço institucional (São Tomé e Príncipe).

2. Clusters da Cooperação (Angola (desenvolvimento rural e comunitário), Cabo

Verde (área das TIC), Moçambique (desenvolvimento sustentado, reforço das

capacidades dos atores locais e criação de parcerias para a execução de projetos

sociais, culturais), S. Tomé e Príncipe (saúde) e Timor-Leste (turismo).

3. Desenvolvimento sustentável e luta contra a pobreza:

3.1.Educação (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, S. Tomé e Príncipe;

Timor-Leste);

3.2.Desenvolvimento sociocomunitário (Angola, Guiné-Bissau, Moçambique, S.

Tomé e Príncipe, Timor-Leste);

3.3.Capacitação e Investigação na área da saúde, da agricultura e da segurança

alimentar (Angola);

3.4.Formação Profissional (Cabo Verde, Timor-Leste);

3.5.Desenvolvimento social (Cabo Verde);

3.6.Infraestruturas (Cabo Verde);

3.7.Saúde (Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe);

3.8.Cultura (Moçambique);

3.9.Gestão sustentável dos recursos naturais (Moçambique);

4.Ambiente e ordenamento do território (S. Tomé e Príncipe);

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4.1.Desenvolvimento rural (Timor-Leste);

4.2.Emprego (Timor-Leste);

4.3.Consolidação da língua portuguesa (Timor-Leste).

Uma vez identificadas as áreas de atuação da política de Cooperação nacional, e tendo

por base, igualmente, a informação constante do Instituto Português de Apoio ao

Desenvolvimento (IPAD, 2011) a realidade da Ajuda Pública nacional é uma realidade

compartilhada por diversos países onde o volume da APD tem vindo a diminuir,

particularmente a partir do ano de 2011. Independentemente, de em anos anteriores,

nomeadamente, em 2010, a APD portuguesa ter atingido um dos maiores rácios da

história desde 2004, 0,29% do Rendimento Nacional Bruto (RNB), o que se traduziu

num aumento superior a 30% em relação ao ano anterior. Para este rácio contribuíram

as linhas de crédito que foram concedidas a Cabo Verde e Moçambique, sendo que o

primeiro1 foi o principal beneficiário da APD Bilateral portuguesa em 2010 (cerca de

60% da APD nacional foi bilateral, em relação a 40% do tipo multilateral2), enquanto

que, Moçambique foi o grande beneficiário no ano anterior, 2009.

É importante salientar ainda que, no ano em que despoletou a crise financeira, a APD

nacional atingiu 0,27% do RNB, igualmente, como resultado da concessão de uma linha

de crédito destinada para o norte de África, mais precisamente para Marrocos (IPAD,

2011).

1 Cabo Verde.

2 Esta tendência também se verificou no ano de 2008 sendo que, apenas em 2009, a percentagem de

APD bilateral apresentou um valor ligeiramente mais baixo, cerca de 55%.

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Ilustração 3- Evolução do volume e esforço da APD Portuguesa/RNB (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

Ilustração 3- Distribuição bilateral e multilateral da APD portuguesa (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

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Ilustração 4- Distribuição da APD Bilateral portuguesa (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

Tal como referido anteriormente, no período em análise, as ex-colónias africanas Cabo

Verde e Moçambique, destacaram-se no âmbito da APD nacional, no sentido em que

foram os principais beneficiários da mesma (em anos diferentes). Cabo Verde, como

resultado da concessão de uma linha de crédito para o financiamento de diversos

projetos relacionados com as energias renováveis, com a proteção e conservação do

meio ambiente e com a água. Moçambique, também como resultado de uma linha de

crédito, mas orientada para a aquisição de bens de capital e serviços (IPAD, 2011).

Contudo, é importante ressalvar que, São Tomé e Príncipe também se destacou,

precisamente pelo volume de financiamento que lhe foi concedido. Relativamente, a

Guiné-Bissau e Timor-Leste, entre 2009 e 2010 verificou-se um ligeiro aumento da

APD bilateral. Excecionalmente, Angola, foi o único país onde se verifica,

graficamente, um decréscimo do volume da APD bilateral portuguesa, como resultado

do pagamento da dívida por parte de Angola (IPAD, 2011).

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Ilustração 5- A Evolução da APD portuguesa nas ex-colónias africanas e em Timor-Leste (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

Setorialmente, e tendo em conta os países referenciados e em análise, a APD Bilateral

portuguesa direcionou-se, essencialmente, para os serviços e infraestruturas sociais

(principalmente ao nível da educação), para a capacitação institucional e para os

serviços de saúde.

Angola, foi um dos países onde a APD Bilateral portuguesa foi canalizada,

essencialmente, para as infraestruturas sociais e para a capacitação institucional (IPAD,

2011).

Ilustração 6- Distribuição setorial da APD Bilateral portuguesa em Angola (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

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Ilustração 7- Distribuição setorial da APD Bilateral portuguesa em Cabo Verde (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

As infraestruturas e serviços sociais continuaram a destacar-se como principal área de

canalização da APD Bilateral portuguesa em Guiné-Bissau, sendo que, mais uma vez, a

educação (concessão de bolsas de estudo e desenvolvimento de alguns projetos

destinados a melhorar/desenvolver as capacidades) assumiu particular relevância,

seguida do setor da saúde (IPAD, 2011).

Ilustração 8- Distribuição setorial da APD Bilateral portuguesa em Guiné-Bissau (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

Em Moçambique, a APD Bilateral portuguesa foi canalizada, segundo a mesma fonte

(2011), no período de 2008 a 2010, para 3 (três) grandes áreas:

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1) infraestruturas e serviços sociais (onde, mais uma vez, o setor educativo

apareceu em primeiro lugar, seguido de projetos fomentados no setor da saúde,

da Boa Governação e da Cooperação policial e técnico-militar);

2) ações diretamente relacionadas com a dívida;

3) ajuda-programa (nomeadamente, no suporte ao orçamento do país e de

concessão de linhas de crédito) (IPAD, 2011).

Ilustração 10- Distribuição setorial da APD Bilateral portuguesa em Moçambique (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

São Tomé e Príncipe não foi exceção, e a educação enquanto prioridade da política de

Cooperação nacional, manteve-se como principal área para à qual os financiamentos

foram concedidos, seguido da saúde.

Relativamente aos anos de 2008 e de 2009, a ajuda-programa, neste mesmo país,

aumentou significativamente, como resultado da concessão de uma linha de crédito

(IPAD, 2011).

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Ilustração 11- Distribuição setorial da APD Bilateral portuguesa em São Tomé e Príncipe (2008-2010).

Fonte: IPAD (2011).

Finalmente, a distribuição setorial da APD (Bilateral) portuguesa em Timor-Leste, foi

muito idêntica à distribuição que ser verificou na ex-colónia africana angolana, no

sentido em que a educação e a capacitação institucional foram as grandes áreas de

intervenção.

A educação associada a todo um objetivo de reintrodução da língua portuguesa e a

capacitação institucional, ao nível do próprio governo e da sociedade civil (IPAD,

2011).

Ilustração 12- Distribuição setorial da APD Bilateral portuguesa em Timor-Leste (2008-2010)

Fonte: IPAD (2011).

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Analisando os gráficos de forma muito sucinta, observamos que, mesmo num cenário

de crise, as prioridades estabelecidas ao nível da política de Cooperação portuguesa têm

sido cumpridas, com particular relevância para o setor educativo, seguido da

Administração Pública e serviços, desenvolvimento e planeamento social e sociedade

civil e, a saúde.

Contudo, a questão que se coloca é: ter-se-á mantido esta tendência no ano de 2011,

precisamente o ano em que foi pedido resgate financeiro e se assistiu, segundo o

CAD/OCDE (2012), a uma redução do volume da APD nacional?

Segundo os dados publicados e constantes no quadro do Diário da República (DR) do

1.º semestre desse mesmo ano, tudo parece indicar que essa tendência se manteve,

apesar de não o podermos afirmar categoricamente, uma vez que ainda não dispomos do

quadro de financiamentos concedidos relativamente ao 2.º semestre.

Não obstante esse fato, e tendo em conta a fonte disponível, ou seja, o quadro dos

financiamentos concedidos pelo IPAD publicado no DR, procuramos tratar essa

informação tendo como base a obra publicada pelo Ministério dos Negócios

Estrangeiros (MNE) em 1995, intitulada “Dez anos de Cooperação”:

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Em relação às variáveis apresentadas, tem-se plena noção que a Ajuda Alimentar,

Humanitária e de Emergência não é Cooperação, mas em estudos anteriores foi

imprescindível agrupar este tipo de Ajuda para perceber a sua real evolução ao longo

dos anos. Relativamente à variável “outros e não discriminados”, correspondem todos

aqueles projetos cuja designação não nos permite identificar em que áreas se inserem.

Uma vez feitas as ressalvas necessárias, é chegado o momento de vermos como se

distribui, setorialmente, a APD bilateral portuguesa:

Ilustração 13- Distribuição setorial da APD bilateral portuguesa (1.º semestre 2011).

3. CONCLUSÃO

Num cenário de crise, onde as economias mundiais se encontram deveras contraídas,

são diversas as notícias que nos alertam para o perigo e impacto que esta tem tido junto

da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. Foram e, ainda são, publicados

artigos e notícias que alertam para o fato de os países mais pobres serem os mais

prejudicados no meio de toda esta “problemática” internacional.

Não é por acaso que, segundo a Concord – Confederação Europeia das ONG de

Desenvolvimento e Ação Humanitária, citado na Plataforma das ONGD Portuguesa

(2012), refere que «pela primeira vez, desde o inicio da crise financeira, 12 países da

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União Europeia reduziram os seus orçamentos de APD. (...) Os países europeus estão a

reduzir a ajuda de forma mais rápida do que as suas economias estão a regredir».

Portugal, é um desses países onde, segundo o CAD da OCDE (2012), o orçamento

destinado à APD, diminuiu em cerca de 3%. Após um cenário, como tivemos

oportunidade de ver anteriormente, onde o volume da APD portuguesa aumentou, tendo

atingido um dos maiores rácios do Rendimento Nacional Bruto (RNB) da história da

Cooperação nacional, assistimos a um ano de 2011 marcado pela recessão. Recessão

essa, que teve claras e inequívocas consequências nas verbas destinadas para a

Cooperação bilateral e multilateral. À partida, e tendo em conta que o ano de 2011, foi

precisamente o ano em que se assistiu ao resgate financeiro do nosso país, era dedutível

e sobretudo, previsível, que tal acontecesse, dado que novas regras terão que ser

respeitas e, acima de tudo, cumpridas junto dos parceiros internacionais.

Com esta redução, um dos objetivos estabelecidos ao nível da Cooperação Multilateral

já fracassara (aumentar o volume da APD), girando em torno de todos os outros

objetivos uma grande expectativa. Perguntas como se os objetivos ao nível da

Cooperação Bilateral junto das ex-colónias portuguesas haviam, igualmente, fracassado

foram uma constante ao longo de toda a investigação.

Porém, e contrariamente, ao que se observara ao nível do objetivo referido (Cooperação

Multilateral), os objetivos e prioridades estabelecidas ao nível da Cooperação Bilateral

foram cumpridos, independentemente do menor volume da APD.

Efetivamente, os dados mostram que Portugal tem desenvolvido todo um conjunto de

esforços e iniciativas que permitam com que se continue a destacar pelo respeito

constante das prioridades estabelecidas junto das ex-colónias. Tanto nos anos onde se

assistiu a um aumento da APD, como no ano de 2011 onde esta diminuiu, foi

canalizada, essencialmente para três grandes áreas: a educação, a Administração Pública

e serviços, desenvolvimento e planeamento social e sociedade civil e, a saúde. Sendo

que, a concentração de verbas como as que se observaram em todas as ex-colónias

portuguesas nos últimos anos (2008 a 2010), para a educação (incluindo a reintrodução

da língua portuguesa em Timor-Leste) veio reforçar ainda mais o papel do nosso idioma

como valor chave da política externa, no sentido em que a sua promoção contribui não

só para a sedimentação, como para a longevidade de toda uma comunidade linguística

que «constitui a um só tempo, um importante contributo histórico português para o

mundo, e um trunfo relevante na era da globalização. (...) Através do apoio à educação

básica e à alfabetização nos países parceiros, consubstancia-se como um instrumento

imprescindível para a promoção da nossa língua» (IPAD, 2008, p. 12).

Conclui-se, assim que, e apesar da redução observada ao nível do volume da APD

portuguesa, o que é certo é que, Portugal em menor ou maior percentagem tem-se

procurado cumprir com os objetivos e prioridades estabelecidas desde 1999.

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