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A PRESCRIÇÃO NA REPETIÇÃO DE INDÉBITO E A LEI COMPLEMENTAR N° 118/2005 _______________________________ Marcela Carvalho Luz Bacharelando em Direito pela UNIFACS – Universidade Salvador E-mail: [email protected] 1 INTRODUÇÃO O presente estudo tem por objeto o instituo jurídico da prescrição do direito de pleitear a repetição de indébito nos casos de tributos sujeitos a lançamento por homologação, cuja disciplina jurídica está prevista no artigo 168, inciso I, do Código Tributário Nacional. A prescrição é o instituo jurídico que visa à estabilidade das relações sociais, propiciando a segurança jurídica – princípio basilar do Estado Democrático de Direito, através da imposição de limite temporal ao exercício da pretensão de um direito subjetivo violado. Assim é que a repetição de indébito, por ser o instrumento do exercício da pretensão do sujeito passivo da relação tributária em repetir o valor pago indevidamente a título de tributo, também está submetido à prescrição. A prescrição do direito de pleitear a repetição de indébito é a perda da pretensão de restituir o crédito, isto é, a perda da eficácia do poder que teria o sujeito passivo em exigir do Estado a quantia paga a maior ou indevidamente a título de tributo, espontaneamente ou à vista de cobrança

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A PRESCRIÇÃO NA REPETIÇÃO DE INDÉBITO E A LEI COMPLEMENTAR N° 118/2005_______________________________Marcela Carvalho LuzBacharelando em Direito pela UNIFACS – Universidade SalvadorE-mail: [email protected]

1 INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por objeto o instituo jurídico da prescrição do

direito de pleitear a repetição de indébito nos casos de tributos sujeitos a lançamento por

homologação, cuja disciplina jurídica está prevista no artigo 168, inciso I, do Código

Tributário Nacional.

A prescrição é o instituo jurídico que visa à estabilidade das relações

sociais, propiciando a segurança jurídica – princípio basilar do Estado Democrático de

Direito, através da imposição de limite temporal ao exercício da pretensão de um direito

subjetivo violado. Assim é que a repetição de indébito, por ser o instrumento do exercício

da pretensão do sujeito passivo da relação tributária em repetir o valor pago

indevidamente a título de tributo, também está submetido à prescrição.

A prescrição do direito de pleitear a repetição de indébito é a perda da

pretensão de restituir o crédito, isto é, a perda da eficácia do poder que teria o sujeito

passivo em exigir do Estado a quantia paga a maior ou indevidamente a título de tributo,

espontaneamente ou à vista de cobrança pelo sujeito ativo (Estado ou quem lhe faça às

vezes), por erro de fato ou de direito.

O termo inicial do prazo prescricional para a repetição do pagamento

indevido nos casos de tributo sujeito a lançamento por homologação é de intensa

controvérsia doutrinária e jurisprudencial, desde a vigência do Código Tributário

Nacional – Lei 5.172/66. No decorrer dos anos, diversas foram as interpretações extraídas

do artigo 168, inciso I, do CTN, para a determinação do início do prazo prescricional à

repetição desta modalidade de tributo.

Há pouco mais de uma década, ao apreciar a restituição do empréstimo

compulsório instituído pelo Decreto-Lei n° 2.288/86, obrigação essa declarada

inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, foi consolidada no Superior Tribunal de

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Justiça a interpretação do dispositivo em comento, no sentido de que a prescrição do

direito à repetição de indébito se efetivaria cinco anos contados da homologação,

expressa ou tácita, do lançamento.

Vale dizer, o Superior Tribunal de Justiça, órgão legitimado pela

Constituição Federal para interpretar normas infraconstitucionais, assentou, desde o

julgamento dos Embargos ao Recurso Especial n° 42.720-5/RS, em 14.03.1995, o

entendimento de que a prescrição do direito de pleitear a restituição do indébito se

concretizaria cinco anos após a data da homologação expressa, ou cinco anos após a

implementação da homologação tácita, nas hipóteses em que o Fisco não se pronuncia

sobre o procedimento adotado pelo sujeito passivo.

Malgrado essa jurisprudência tivesse sido consolidada no Egrégio

Superior Tribunal de Justiça em meados da década de noventa e reafirmada em 2004 no

julgamento dos Embargos ao Recurso Especial n° 435.835, em fevereiro de 2005 foi

editada a Lei Complementar n° 118, introduzindo alterações no Código Tributário

Nacional, notadamente no que concerne a contagem do prazo prescricional à ação de

repetição de indébito nas hipóteses de tributo sujeito a lançamento por homologação,

fazendo novamente imperativa a discussão de quando se inicia a contagem do prazo

prescricional à referida ação.

Ressalte-se que, a controvérsia implementada pela novel lei complementar

provém da intenção do legislador em modificar, retroativamente, sob a égide de lei

interpretativa, o termo inicial do prazo prescricional da repetição do pagamento indevido

a título de tributo à data do pagamento antecipado e não mais quando de sua efetiva

homologação, expressa ou tácita, como havia sido pacificado na jurisprudência. Destarte,

o entendimento consolidado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça e vigente desde

meados da década de noventa foi alterado pela Lei Complementar n° 118/05,

desapontando assim a indagação quanto à validade e eficácia do artigo 3° da mencionada

lei.

Portanto, diante da proeminente discussão que sobreveio, posto que

necessário se faz uniformizar o prazo prescricional da ação da repetição de indébito, para

que se possa alcançar a almejada segurança jurídica, e em vista de sua expressiva

importância econômica, face a intensa repercussão nas relações jurídicas entre o Fisco e o

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particular, é que o presente trabalho tem por escopo provocar a reflexão crítica do

instituto jurídico da prescrição do direito de pleitear a restituição do indébito, nos casos

de tributo sujeito a lançamento por homologação, com ênfase na repercussão da Lei

Complementar n° 118/2005 nesse instituto.

2 APLICAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N° 118/2005

A Lei Complementar n° 118, publicada no Diário Oficial de Justiça de 09

de fevereiro de 2005, foi promulgada com o propósito de promover alterações no Código

Tributário Nacional – Lei n° 5.172/66 – para adaptá-lo às inovações da nova Lei de

Falências – Lei n° 11.101/2005.

A LC n° 118, entretanto, ao acrescentar e alterar normas correlacionadas à

nova Lei de Falências e à cobrança de tributos modificou o entendimento jurisprudencial

pacificado no colendo Superior Tribunal de Justiça – órgão jurisdicional competente para

decidir em última instância sobre questões relacionadas à interpretação de lei federal

(artigo 105, III, “a” e “c”, CF/88), no que concerne à contagem do prazo prescricional

para a repetição de indébito dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, ao

inserir o artigo 3° na referida lei complementar dispondo sobre a interpretação do artigo

168, inciso I, do Código Tributário Nacional, nos seguintes termos:

Art. 3o Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.

E, ao dispor sobre o termo inicial da sua vigência, a Lei Complementar n°

118 estabeleceu, em seu artigo 4°, que a “lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após

sua publicação, observado, quanto ao art. 3°, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei n°

5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.”

Infere-se, nitidamente, que o legislador através dos dispositivos ora

transcritos pretendeu atribuir caráter interpretativo ao artigo 3° e, por conseqüência,

eficácia retroativa, nos termos do artigo 106, inciso I, do CTN. Sob o pretexto de lei

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interpretativa, portanto, fixou como termo inicial do prazo prescricional da ação de

repetição de indébito, nos casos de tributos sujeitos a lançamento por homologação, a

data do pagamento antecipado do crédito tributário, ou seja, determinou o prazo de

prescrição de 5 (cinco) anos a contar do pagamento antecipado para a referida repetição

de indébito ao estabelecer que a extinção do crédito tributário nessa espécie de tributo

ocorre quando do pagamento antecipado.

Ocorre que, como analisado anteriormente, o Superior Tribunal de Justiça,

através da douta Primeira Seção, consolidou sua jurisprudência, desde meados da década

de noventa, nos Embargos ao Recurso Especial n° 42.720-5/RS1, ao apreciar a restituição

do empréstimo compulsório instituído pelo Decreto-Lei n° 2.288/86, que havia sido

declarado inconstitucional, tendo reafirmado em 2004 nos Embargos ao Recurso Especial

n° 435.835/SC2, no sentido de que o termo inicial do prazo à repetição de indébito, para

as hipóteses de tributo sujeito a lançamento por homologação, seria a data da efetiva

1 TRIBUTÁRIO – EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO – CONSUMO DE COMBUSTÍVEL – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – DECADÊNCIA – PRESCRIÇÃO – INOCORRÊNCIA.- O Tributo arrecadado a título de empréstimo compulsório sobre o consumo de combustíveis é daqueles, sujeitos a lançamento por homologação. Em não havendo tal homologação, faz-se impossível cogitar em extinção do crédito tributário.- À falta de homologação, a decadência do direito de repetir o indébito tributário somente ocorre, decorridos cinco anos, desde a ocorrência do fato gerador, acrescido de outros cinco anos, contados do termo final do prazo deferido ao Fisco, para apuração do tributo devido.(STJ, Embargos de Divergência em Recurso Especial n° 42.720-5/RS, Primeira Seção, Ministro Relator Humberto Gomes de Barros, julgado em 14.03.1995, DJ 17.04.1995)2 CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. LEI Nº 7.787/89. COMPENSAÇÃO. PRESCRIÇÃO. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL DO PRAZO. PRECEDENTES.1. Está uniforme na 1ª Seção do STJ que, no caso de lançamento tributário por homologação e havendo silêncio do Fisco, o prazo decadencial só se inicia após decorridos 5 (cinco) anos da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio, a partir da homologação tácita do lançamento . Estando o tributo em tela sujeito a lançamento por homologação, aplicam-se a decadência e a prescrição nos moldes acima delineados.2. Não há que se falar em prazo prescricional a contar da declaração de inconstitucionalidade pelo STF ou da Resolução do Senado. A pretensão foi formulada no prazo concebido pela jurisprudência desta Casa Julgadora como admissível, visto que a ação não está alcançada pela prescrição, nem o direito pela decadência. Aplica-se, assim, o prazo prescricional nos moldes em que pacificado pelo STJ, id est, a corrente dos cinco mais cinco.3. A ação foi ajuizada em 16/12/1999. Valores recolhidos, a título da exação discutida, em 09/1989. Transcorreu, entre o prazo do recolhimento (contado a partir de 12/1989) e o do ingresso da ação em juízo, o prazo de 10 (dez) anos. Inexiste prescrição sem que tenha havido homologação expressa da Fazenda, atinente ao prazo de 10 (dez) anos (5 + 5), a partir de cada fato gerador da exação tributária, contados para trás, a partir do ajuizamento da ação.4. Precedentes desta Corte Superior.5. Embargos de divergência rejeitados, nos termos do voto.(STJ, Embargos de Divergência no Recurso Especial n° 435.835, Primeira Seção, Relator para acórdão Ministro José Delgado, julgamento em 24.03.2004, DJ 04.06.2007)

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homologação, se expressa, ou do término do respectivo prazo, se tácita, pois esse era o

momento que se efetivava a extinção do crédito tributário.

Embora nem sempre tenha sido esse o entendimento dos tribunais sobre a

contagem do prazo em comento – anteriormente entendia ser o prazo de cinco anos do

pagamento antecipado – e apesar de criticado por uma corrente minoritária da doutrina,

certo é que estava consolidado e tinha adequado suporte normativo quando da edição da

LC n° 118/2005.

2.1 A natureza jurídica do art. 3° da LC n° 118/2005: interpretativa ou inovadora?

Diante do ataque à jurisprudência consolidada pelo Colendo Superior

Tribunal de Justiça, no que concerne a contagem do prazo prescricional às ações de

repetição de indébito, cabe analisar a natureza, se interpretativa ou inovadora, do artigo

3° da Lei Complementar n° 118/2005.

Em primeiro lugar, deve-se destacar que no Direito Tributário, assim como

nos demais ramos do Direito, a lei deve ter eficácia prospectiva, deve reger fatos

imponíveis futuros, em face dos princípios constitucionais da segurança jurídica e da

irretroatividade das leis, os quais impõem previsibilidade das normas de conduta e a

estabilidade das relações jurídicas. No entanto, há situações excepcionais em que a lei

tributária pode regular fatos pretéritos, como no caso do artigo 106, inciso I, do Código

Tributário Nacional, que possibilita a aplicação das leis expressamente interpretativas a

atos e fatos ocorridos anteriormente a sua vigência.

Indaga-se, pois, se é suficiente, para ser caracterizada como lei

interpretativa, a auto-intitulação de interpretativa, como no caso do artigo 3°, a utilização

da expressão “para efeito de interpretação”, e a remissão feita pelo artigo 4° ao

dispositivo do Código Tributário que rege essa matéria (art. 106, inciso III, CTN).

Indubitavelmente, não basta inserir na lei um dispositivo afirmando ser

interpretativa. O fato de a lei dizer que é interpretativa não a faz assim. Da mesma forma,

o fato de a lei ser omissa não a impede de ser interpretativa.

Outro não é o raciocínio de Hugo de Brito Machado3:3 MACHADO, Hugo de Brito. A questão da Lei Interpretativa na Lei Complementar n° 118/2005: Prazo para Repetição do Indébito. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 59 e 66, maio/2005. No mesmo sentido

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A nosso ver, para que uma lei seja interpretativa, basta que não estabeleça regra jurídica nova, limitando a atribuir um sentido mais claro a dispositivo de lei anterior. Não é necessário dizer expressamente que apenas está interpretando a lei anterior. [...]Admitirmos que a lei expressamente interpretativa é naturalmente retroativa e contra ela não se pode alegar a garantia constitucional da irretroatividade seria dar ao legislador uma fórmula para produzir leis retroativas sempre que o desejasse.Com efeito, bastaria colocar na lei um dispositivo dizendo que ela é interpretativa para que restasse elidida a garantia constitucional, que se mostraria, assim, mera peça da literatura jurídica, sem qualquer utilidade. Dizer o legislador que a lei por ele elaborada é interpretativa seria uma fórmula poderosa para poder violar, sempre que o desejasse, a limitação que a Lei Maior lhe impõe.

Necessário, portanto, é analisar o conteúdo do texto normativo e “realizar

o cotejo com o preceito legal anterior que a lei pretenda interpretar”4. Como leciona

Paulo Roberto Lyrio Pimenta, “a essência de uma lei interpretativa não reside na

denominação, ou no propósito buscado pelo legislador [...]. O critério decisivo é a

eliminação de dúvida, de uma situação de incerteza jurídica, que leva a adoção de

posicionamentos diferentes pelos órgãos aplicadores [...]”5.

Isto posto, não se pode admitir que o artigo 3° da LC n° 118/05 enquadre-

se no conceito de lei interpretativa e tenha, por conseguinte, eficácia retroativa. Lei

interpretativa é aquela que elucida o texto normativo antes obscuro, dirimi suas dúvidas,

limita-se a esclarecer seu sentido, reduzindo a incerteza e a insegurança causada pela lei

interpretada, sem, contudo, inová-la, sem impor obrigações, proibições ou permissões

novas. E, como é notório, à época da promulgação da Lei Complementar n° 118/05 não

havia qualquer dúvida, incerteza a ser sanada no plano normativo, quanto à data da

extinção do crédito tributário nos casos de tributo sujeito a lançamento por homologação,

e, por conseguinte, quanto ao termo inicial da contagem da prescrição da repetição de

indébito dessa modalidade de tributo, pois a questão já se encontrava pacificada na

jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, órgão jurisdicional

Aliomar Baleeiro aduz que “‘expressamente interpretativa’, todavia, não quer dizer que o novo diploma empregue essas palavras sacramentais, apresentando-se como tal na ementa ou no contexto. Basta que, reportando-se aos dispositivos interpretados, lhes defina o sentido e aclare as dúvidas”. (Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 670).4 FOLLONI, André Parmo. Eficácia do art. 3° da Lei Complementar 118/2005. Revista de Direito Tributário, n. 94. São Paulo: Malheiros, p.254-270, 2007.5 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. A Aplicação da Lei Complementar n° 118/05 no Tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 115, maio/2006.

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constitucionalmente competente para decidir em última instância sobre questões

relacionadas à interpretação de lei federal e zelar pela sua uniformização, como no

presente caso.

O preceito em estudo, portanto, não esclarece ou elimina qualquer dúvida

surgida com dispositivo de lei anterior (artigo 168, inciso I, CTN), e isso porque situação

de dúvida inexistia no sistema normativo quando de seu advento. “Logo, não se trata de

lei interpretativa, [...] e sim de lei ‘pseudo-interpretativa’”6, que inova o ordenamento

jurídico ao reformular construção jurisprudencial pacificada, a mais de uma década, pela

Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.

Ademais, como ensina Ricardo Lobo Torres, para uma lei ser

interpretativa “é necessário que disponha no mesmo sentido das decisões judiciais; se vier

resolver conflito jurisprudencial ou estabelecer orientação contrária à da jurisprudência

vitoriosa, não será interpretativa, mas lei de natureza constitutiva ou ius novum”7

Evidente restou a intenção do legislador em modificar o dies a quo do

prazo prescricional para a propositura da ação de repetição de indébito nas hipóteses de

pagamento indevido a título de tributo sujeito a lançamento por homologação. Isto

porque, o texto normativo “interpretado” dispõe que “o direito de pleitear a restituição

extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I- nas hipóteses dos

incisos I e II do art. 165, da data da extinção do crédito tributário” e, nos casos de tributo

sujeito a lançamento por homologação, essa extinção ocorre, de acordo com o artigo 156,

inciso VII, do CTN, com o pagamento antecipado acrescido da homologação expressa ou

tácita. A data da extinção do crédito, portanto, será a da homologação expressa ou da

homologação tácita, no caso do Fisco não se pronunciar sobre o procedimento adotado

pelo sujeito passivo. A norma “interpretativa”, entretanto, prescreve que a extinção do

crédito ocorre com o pagamento antecipado, sendo prescindível a homologação. Logo,

6 Paulo Roberto Lyrio Pimenta conceitua lei “pseudo-interpretativa” como aquela que inova o ordenamento, que é “elaborada para obter determinados fins diversos, e não para esclarecer o sentido de texto obscuro”. (A Aplicação da Lei Complementar n° 118/05 no Tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 116, maio/2006)7 TORRES apud CAIS, Cleide Previtalli. O processo tributário. 5. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 755.

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confere conteúdo diverso ao dispositivo “interpretado” e inova o ordenamento, reduzindo

o prazo em detrimento do contribuinte8.

Assim, de acordo com o novo preceito de lei, o dies a quo do prazo

prescricional para a propositura da ação de repetição de indébito é a data do pagamento

antecipado e não mais da extinção do crédito tributário, que ocorre com o pagamento

antecipado acrescido da homologação expressa ou tácita, conforme jurisprudência

pacificada no Superior Tribunal da Justiça.

Conclui-se, portanto, que, o texto normativo da lei complementar criou

nova regra no ordenamento jurídico. Além dos critérios de prescrição que podem ser

construídos com base no artigo 168 do CTN, inseriu um novo mecanismo de contagem

do prazo, podendo ser descrito da seguinte forma: “Se for o caso de pagamento de tributo

sujeito a lançamento por homologação, então deve ser a contagem do prazo qüinqüenal

para a repetição no momento do pagamento antecipado do tributo”9 ou ainda “O direito

de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados

nas hipóteses dos incisos I e II do art. 165, da data do pagamento”10.

2.2 A eficácia do art. 3° da LC n° 118/2005

Firmados esses pressupostos, cabe analisar qual a eficácia produzida pelo

artigo 3° da LC n° 118/05 no ordenamento jurídico brasileiro. Duas são a possibilidade.

8 Na mesma direção sustenta Leandro Paulsen: “Em verdade, embora se coloque expressamente como interpretativa (“para efeito de interpretação”), o art. 3° da LC 118/05 inova na ordem jurídica. Isso porque, até então, tínhamos o dispositivo do art. 168, I, do CTN, dispondo no sentido de que o prazo para a repetição do indébito contava-se da extinção do crédito tributário, e o art. 156, VII, do CTN, dispondo que a extinção do crédito tributário se dava com o “pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no art. 150 e seus §§ 1° e 4°”. Por força disso os tribunais firmaram posição no sentido de que o prazo para a repetição seria contado da extinção do crédito tributário pela homologação tácita ocorrida após cinco anos da ocorrência do fato gerador. Daí o prazo de 5 anos + 5 anos = 10 anos. [...] Mediante interpretação sistemática do CTN, chega-se à norma aplicável nos casos de tributos sujeitos a lançamento por homologação. Note-se que a conjugação do art. 168, do CTN, com os artigos. 156, VII e 150, §§ 1° e 4°, do mesmo diploma revela a norma dos 5 anos + 5 anos. Evidencia-se, assim, que a LC 118/05, ao pretender alterar o termo “a quo” do prazo para repetição, que não mais será o momento da extinção do crédito, mas o momento do pagamento antecipado sujeito ainda à homologação, realmente inovou, alterando a norma jurídica aplicável.” (Código Tributário Nacional. 10. ed. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p.1068)9 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. A Aplicação da Lei Complementar n° 118/05 no Tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 116, maio/2006.10 MACHADO, Hugo de Brito. A questão da Lei Interpretativa na Lei Complementar n° 118/2005: Prazo para Repetição do Indébito. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 68, maio/2005.

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A primeira consiste que não sendo o dispositivo de caráter interpretativo, não obstante a

pretensão de interpretar, nenhuma eficácia produz no ordenamento, pois é nulo,

desprovido de validade. A outra possibilidade é que, apesar do preceito novo não ser

compatível com o precedente – suposto interpretado, o mesmo não é inconstitucional,

residindo o problema no direito intertemporal, quando da sua eficácia no tempo.

Doutrinadores como Sacha Calmon Navarro Coêlho e Valter Lobato11

sustentam a absoluta ineficácia do supracitado texto normativo, não tendo o mesmo

revogado, expressa ou tacitamente, qualquer dispositivo do Código Tributário Nacional,

em especial os artigos 150, §§ 1° e 4°, e 168, inciso I. O artigo 3° da LC 118/05 é, pois,

“vazio de normatividade, sendo que tentou apenas interpretar dispositivos já contidos no

CTN e não revogados.” Nesse sentido, asseveram os autores que,[...] não vale de forma retroativa a regra do art. 3°, sendo inconstitucional o art. 4°, ambos da Lei Complementar 118/2005, pois clara seria a tentativa de usurpar a jurisdição do Poder Judiciário, que já havia decidido o alcance do art. 168, I do CTN. E nem vale para os casos em andamento ou futuros o mesmo art. 3°, pois não inova a ordem jurídica, nada traz de novidade capaz de modificar o que o Judiciário já colocou uma “pá-de-cal”. Se o referido art. 3° é vazio de normatividade e a interpretação que dita não tem prevalência no Judiciário, não pode valer quanto ao passado, presente e o futuro . (grifos nossos)

Mário Luiz Oliveira da Costa12, por sua vez, alega que o art. 3° da LC n°

118/2005 contrariou o preceito do art. 106, I, do CTN, no qual pretendeu se fundamentar,

já que é manifestamente incabível a elaboração de lei interpretativa cujo objeto é

dispositivo legal que já fora exaustivamente interpretado pelo Judiciário, ainda mais

“quando a suposta interpretação pretendida mostra-se contrária à pacífica jurisprudência

atinente ao tema”. Julga, ainda, ser inconstitucional o dispositivo em questão, pois, “ao

pretender contornar a jurisprudência consolidada sobre a matéria, incorreu em manifesto

desvio de finalidade e abuso do poder, usurpando a competência do Poder Judiciário [...]”

11 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; LOBATO, Valter. Reflexos sobre o art. 3° da Lei Complementar 118. Segurança Jurídica e a Boa-fé como Valores Constitucionais. As leis interpretativas no Direito Tributário Brasileiro. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 117. São Paulo: Dialética, p. 122-123, jun./2006.12 COSTA, Mário Luiz Oliveira da. Lei Complementar n° 118/2005: a Pretendida Interpretação Retroativa acerca do Disposto no art. 168, I do CTN. RDDT n. 115. São Paulo: Dialética, p. 106-107, abr./2005. Analogamente Roque Antonio Carrazza sustenta a inconstitucionalidade do artigo 3° da LC nº 118 e aduz ser impossível o Governo, pela via legislativa, pretender alterar interpretação de preceito pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Entretanto, caso seja considerado constitucional, o referido dispositivo deverá produzir apenas efeitos ex nunc, ou seja, deverá alcançar somente atos e fatos ocorridos após a vigência da Lei Complementar 118/2005. (Curso de Direito Constitucional Tributário. 21. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p.344)

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e violando “os princípios da independência e harmonia dos poderes, segurança jurídica,

irretroatividade, boa-fé, moralidade, isonomia e neutralidade da tributação para fins

concorrenciais.” Afirma, portanto, ser nulo o artigo 3°, não tendo alterado o preceito do

artigo 168, I, do CTN.

Ainda nesse sentido Hugo de Brito Machado13 leciona que o artigo 3° da

LC n° 118/05 é inválido, pois o Legislativo ao impor ao Judiciário uma determinada

interpretação, inclusive contrária ao entendimento por ele construído no desempenho de

sua atividade típica de intérprete e de aplicador da lei, usurpa a sua atribuição primacial,

inutilizando-a, anulando-a. Todavia, o autor salienta que, se admitir que o dispositivo em

comento “é válido e que implica alteração no art. 168, inciso I, do Código Tributário

Nacional”, ter-se-á de concluir que “os seus efeitos não atingem situações pretéritas,

operando-se somente em relação aos tributos pagos indevidamente a partir do início de

sua vigência”14.

Data vênia às vozes doutrinárias que sustentam a absoluta ineficácia do

artigo 3° da LC n° 118/2005, não há que se cogitar ser inconstitucional o mencionado

preceito, pois se não se trata de lei interpretativa e sim de lei nova, que modifica

dispositivo preexistente, assim deverá ser apreciada e não simplesmente inutilizada.

Pela plena eficácia do referido texto normativo manifesta-se Paulo Roberto

Lyrio Pimenta15 ao defender que, para evitar a declaração de sua inconstitucionalidade, o

mesmo deve ser interpretado com base no princípio da presunção da constitucionalidade

das leis e não de forma literal, já que se confrontaria com o princípio da irretroatividade

da lei tributária, senão vejamos:Não há que se cogitar de inconstitucionalidade deste dispositivo, por ter importado em redução do prazo prescricional. Consoante o sólido magistério

13 MACHADO, Hugo de Brito. A questão da Lei Interpretativa na Lei Complementar n° 118/2005: Prazo para Repetição do Indébito. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 68, maio/2005.14 Assim também se manifesta Mário Luiz Oliveira da Costa: “Na pior das hipóteses, caso, por absurdo, se entenda possível afastar os vícios insanáveis de que padece o art. 3° da LC 118/2005, somente poderia ser a suposta ‘interpretação’ ali contida aplicável aos pagamentos [ou mesmo aos seus fatos geradores] verificados na sua vigência. Isso porque jamais poderia retroagir para, em prejuízo aos interesses dos contribuintes, atribuir a fatos pretéritos efeitos jurídicos distintos daqueles resultantes da lei então em vigor, em obediência aos princípios da segurança jurídica e irretroatividade”. (Lei Complementar n° 118/2005: a Pretendida Interpretação Retroativa acerca do Disposto no art. 168, I do CTN. RDDT n. 115. São Paulo: Dialética, p. 107, abr./2005)15 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. A Aplicação da Lei Complementar n° 118/05 no Tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 116-117, maio/2006. De forma similar se posicionou Cleide Previtalli Cais (O processo tributário. 5. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 753).

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de Antônio Roberto Sampaio Dória, lei nova que reduz o prazo de prescrição para o contribuinte é constitucional, desde que o novo prazo fixado pela lei nova não seja tão exíguo a ponto de inviabilizar a defesa do direito do sujeito passivo da relação tributária. No caso, o novo prazo não apresenta esse vício, não havendo como se falar, portanto, em inadequação perante o texto constitucional. O problema reside na eficácia no tempo do art. 3° da LC n° 118/05.[...] não se deve dar ao art. 3° da LC n° 118/05 uma interpretação literal, a qual não se coaduna com o significado da lei interpretativa, burlando, destarte, o princípio constitucional da irretroatividade da lei tributária (CF, art. 150, III, “a”). Para evitar a declaração de inconstitucionalidade deste dispositivo da legislação complementar – última opção interpretativa, em face do princípio da presunção da constitucionalidade das leis – deve-se lhe atribuir um sentido compatível com este princípio, vale dizer, dar uma interpretação conforme a Constituição, entendendo que o legislador, em verdade, editou nova norma jurídica tributária, fixando o termo inicial do prazo para a contagem do prazo de repetição nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, ao qual não se aplica o art. 168, I do CTN. Em se tratando de lei nova, terá eficácia prospectiva, seguindo o termo inicial de vigência fixado no art. 4°: 120 (cento e vinte) dias. (grifos nossos)

De forma análoga, Omar Augusto Leite Melo16 sustenta que embora o

artigo 3° da LC n° 118/05 não tenha trazido uma interpretação autêntica – logo, não é lei

interpretativa, pois ao versar sobre o termo inicial do prazo para pleitear a restituição do

indébito nas hipóteses de tributo sujeito ao lançamento por homologação foi de encontro

com os dispositivos pretenciosamente interpretados, bem como com a orientação

jurisprudencial consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, deve produzir eficácia,

como lei nova que é, prospectiva, da data da sua vigência.

Outro não foi o entendimento da Primeira Seção do Superior Tribunal de

Justiça ao apreciar os Embargos de Divergência em Resp. n° 327.043/DF, no qual a

Fazenda Nacional invocou a aplicação do artigo 3° da LC n° 118/2005 sob o fundamento

de que seria norma meramente interpretativa e, pois, de efeitos retroativos em face do

inciso I do artigo 106 do Código Tributário Nacional. A Seção no julgamento decidiu que

o artigo 3° não contém norma meramente interpretativa, não se amoldando ao inciso I do

artigo 106 do CTN para aplicação retroativa, pois a pretexto de interpretar os enunciados

dos artigos 168, inciso I e 156, inciso VII, ambos do CTN, conferiu-lhes um sentindo e

alcance distinto ao dado por aquela Corte, intérprete e guardiã da legislação federal,

inovando no plano normativo. Assentou, destarte, que o artigo 3° somente se aplica a

16 MELO, Omar Augusto Leite. A LC 118/05 e a Contagem Inicial do Prazo para pleitear a Restituição e Compensação de Indébito Tributário. RDDT, n. 117. Sã Paulo: Dialética, p. 95, jun./2006. Cf. FOLLONI, André Parmo. Eficácia do art. 3° da Lei Complementar 118/2005. Revista de Direito Tributário, n. 94. São Paulo: Malheiros, p.254-270.

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situações que venham a ocorrer a partir de 09 de junho de 2005 – data em que entrou em

vigor a LC n° 118/2005, isto é, apenas produz efeitos nas ações ajuizadas posteriormente

à vigência da legislação em análise. Assim, ao determinar o caráter inovador do preceito,

e, por conseguinte, afastar a sua eficácia retroativa, a Primeira Seção, por unanimidade,

conheceu dos embargos e lhes negou provimento, já que, in casu, se tratava de demanda

ajuizada anteriormente à vigência da lei complementar em comento.

Nesse aspecto, calha bem o trecho do voto proferido no caso supracitado

pelo Ministro Teori Albino Zavascki:Todavia, inobstante as reservas e críticas que possa merecer, o certo é que a jurisprudência do STJ, em inúmeros precedentes, definiu o conteúdo dos enunciados normativos em determinado sentido, e, bem ou mal, a interpretação que lhes conferiu o STJ é a interpretação legítima, porque emanada do órgão constitucionalmente competente para fazê-lo. Ora, o art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar esses mesmos enunciados, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a “interpretação” dada, não há como negar que a lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições normativas interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal. Se, como se disse, a norma é aquilo que o Judiciário, como seu intérprete, diz que é, não pode ser considerada simplesmente interpretativa a lei que dá a ela outro significado. Em outras palavras: não pode ser considerada interpretativa a lei que tem o evidente objetivo de modificar a jurisprudência dos Tribunais. Somente a jurisprudência é que pode, legitimamente, alterar a jurisprudência.7. Não se nega ao Legislativo o poder de alterar a norma (e, portanto, se for o caso, também a interpretação formada em relação a ela). Pode, sim, fazê-lo, mas não com efeitos retroativos. Admitir a aplicação do art. 3º da LC 118/2005, sobre os fatos passados, nomeadamente os que são objeto de demandas em juízo, seria consagrar verdadeira invasão, pelo Legislativo, da função jurisdicional, comprometendo a autonomia e a independência do Poder Judiciário. Significaria, ademais, consagrar ofensa à cláusula constitucional que assegura, em face da lei nova, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e à coisa julgada. Portanto, o referido dispositivo, por ser inovador no plano das normas, somente pode ser aplicado a situações que venham a ocorrer a partir da vigência da Lei Complementar 118/2005, que ocorrerá 120 dias após a sua publicação (art. 4º), ou seja, no dia 09 de junho de 2005. (grifos nossos)

Destaca-se também o voto-vista proferido pelo Ministro Castro Meira, no

qual demonstrou o caráter inovador do artigo 3° da Lei Complementar n° 118/2005 e, por

conseguinte, a sua incompatibilidade com o efeito retroativo previsto no artigo 106,

inciso I, do CTN, pois ao invés de encontrar fundamento de validade neste, o contrariou,

já que desnecessária e até abusiva a interpretação de preceito exaustivamente analisado e

pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça. Conclui, entretanto, pedindo vênia ao

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Ministro Teori Albino Zavascki por entender ser desnecessário o incidente de

inconstitucionalidade da parte final do art. 4° da LC n° 118/2005, ser possível interpretar

e aplicar o artigo 3° conforme a Constituição desde que seus efeitos limitem-se às ações

ajuizadas após o vacatio legis de 120 dias prevista na parte inicial do art. 4°, ou seja,

“ajuizada a ação após 9 de junho de 2005, poderá o art. 3° da LC n.° 118/05 ser aplicado

aos fatos geradores ocorridos antes de sua publicação”.

Infere-se, pois, que, apesar do preceito novo não ser compatível com o

precedente – suposto interpretado, o mesmo pode ser interpretado de acordo com o

princípio da presunção da constitucionalidade da lei e aplicado conforme a Constituição,

isto é, com eficácia prospectiva. O problema, portanto, reside no direito intertemporal,

quando da sua eficácia no tempo, quando o artigo 3° da LC n° 118/2005 será aplicado.

Diante da decisão proferida nos Embargos de Divergência em Resp. n°

327.043/DF a Fazenda Nacional passou a sustentar que o preceito em análise aplicar-se-

ia então necessariamente às ações ajuizadas a partir da sua vigência, isto é, 09 de junho

de 2005.

Logo, sem qualquer exame crítico, o Superior Tribunal de Justiça passou a

ter como dogma a concepção de que o artigo 3° da LC n° 118/2005 produziria eficácia

aos feitos ajuizados após o início de sua vigência, “mesmo que o pagamento antecipado

pelo contribuinte tenha sido realizado antes da vigência da Lei”17, considerando nestes

casos o prazo prescricional para repetição de cinco anos a contar do pagamento indevido,

conforme se observa nas ementas abaixo transcritas18:PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ICMS. MERCADORIAS DADAS EM BONIFICAÇÃO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE EXPRESSA INDICAÇÃO DOS DISPOSITIVOS LEGAIS TIDOS POR VIOLADOS. APLICAÇÃO DA SÚMULA N.º 284/STF.1. À luz da cognominada tese dos cinco mais cinco, restou reconsolidado pela Primeira Seção no EREsp n.º 327.043/DF a definição do termo a quo do prazo prescricional das ações de repetição/compensação de valores

17 Voto-vista do Ministro Castro Meira no ERESP n° 327.043.18 Joel Gonçalves de Lima Junior sustenta que as numerosas decisões que sucederam no Superior Tribunal de Justiça, sejam das Turmas ou monocráticas, repetindo a decisão do ERESP n° 327.043 da Primeira Seção “não se deve ao esgotamento do debate, mas sim ao fato de que todos os casos concretos que chegaram até agora àquela Corte são de demandas aforadas antes do início da vigência da Lei Complementar 118”. (A Lei Complementar 118 e as Demandas Ajuizadas após 9 de Junho de 2005: uma Releitura da Decisão do Supeiror Tribunal de Justiça. RDDT n° 142. São Paulo: Dialética, p. 25, jul./2007)

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indevidamente recolhidos a título de tributo sujeito a lançamento por homologação, desde que ajuizadas até 09 de junho de 2005.2. Deveras, naquela ocasião restou assente que: "... a Lei Complementar 118, de 09 de fevereiro de 2005, aplica-se, tão somente, aos fatos geradores pretéritos ainda não submetidos ao crivo judicial, pelo que o novo regramento não é retroativo mercê de interpretativo. É que toda lei interpretativa, como toda lei, não pode retroagir. Outrossim, as lições de outrora coadunam-se com as novas conquistas constitucionais, notadamente a segurança jurídica da qual é corolário a vedação à denominada 'surpresa fiscal'. Na lúcida percepção dos doutrinadores, 'em todas essas normas, a Constituição Federal dá uma nota de previsibilidade e de proteção de expectativas legitimamente constituídas e que, por isso mesmo, não podem ser frustradas pelo exercício da atividade estatal.' (Humberto Ávila in Sistema Constitucional Tributário, 2004, pág. 295 a 300)". (Voto-vista proferido por este relator nos autos dos EREsp n.º 327.043/DF)3. Conseqüentemente, o prazo prescricional para a repetição ou compensação dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, nas demandas ajuizadas até 09 de junho de 2005, começa a fluir decorridos 05 (cinco) anos, contados a partir da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio computado desde o termo final do prazo atribuído ao Fisco para verificar o quantum devido a título de tributo.4. É cediço na Corte que a ausência de indicação da lei federal violada, em sede de recurso especial, revela a deficiência das razões do mesmo, atraindo a incidência do enunciado sumular n.º 284 do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia" (Precedentes: REsp n.º 156.119/DF, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 30/09/2004; AgRg no REsp n.º 493.317/RJ, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 25/10/2004; e AgRg no REsp n.º 329.609/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 19/11/2001).5. Recurso especial interposto por GENERAL ELETRIC DO BRASIL LTDA parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.[...](STJ, REsp 688393 / RJ, Primeira Turma, Ministro Luiz Fux, DJ 13.11.2006)

TRIBUTÁRIO. FINSOCIAL. COMPENSAÇÃO. PRESCRIÇÃO.1. Na hipótese de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo para a propositura da ação de repetição de indébito é de 10 (dez) anos a contar do fato gerador, se a homologação for tácita (tese dos "cinco mais cinco"), e, de 5 (cinco) anos a contar da homologação, se esta for expressa. 2. "A Lei Complementar 118, de 09 de fevereiro de 2005, aplica-se, tão somente, aos fatos geradores pretéritos ainda não submetidos ao crivo judicial, pelo que o novo regramento não é retroativo mercê de interpretativo" (EREsp n. 539.212, relator Ministro Luiz Fux, DJ 27.6.2005).[...]5. Recurso especial parcialmente provido. (STJ, REsp 891214 / SP, Segunda Turma, Min. João Otávio de Noronha, DJ 08.03.2007)

Também as inúmeras decisões que sobrevieram nos Tribunais Regionais

Federais apenas repetiram a decisão, supracitada, do EREsp 327.043 proferida pela

Primeira Seção da Corte Superior19:

19 Cumpre ressaltar que essa posição não é pacífica. De acordo com o entendimento da Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso o marco para aplicação da LC n° 118/2005 não é o momento do

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TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. LC 118/05. PIS E COFINS. BASE DE CÁLCULO. EXCLUSÃO DO ICMS. IMPOSSIBILIDADE. PIS/COFINS-IMPORTAÇÃO. BASE DE CÁLCULO. VALOR ADUANEIRO. INCISO I DO ART. 7º DA LEI 10.865/04. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPENSAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA.1.A Lei Complementar nº 118, de 09 de fevereiro de 2005, que interpretou o disposto no art. 168, I, do CTN, para estabelecer que o prazo de cinco anos para a postulação da repetição do indébito conta-se do recolhimento do tributo supostamente indevido, e não da homologação tácita do lançamento (art. 150, § 4º do CTN), aplica-se apenas às ações ajuizadas sob sua vigência. Precedentes do STJ e da Corte Especial deste TRF4 (Argüição de Inconstitucionalidade nº 2004.72.05.003494-7/SC e embargos declaratórios correspondentes).2. Sendo a ação posterior à 09 de junho de 2005, quando se implementou o prazo de vacatio legis, da referida alteração legislativa, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos, a partir do recolhimento indevido.3. O valor do ICMS integra o preço de venda da mercadoria e, portanto, o faturamento, incluindo-se na base de cálculo da contribuição ao PIS e COFINS. Precedentes do STJ e deste Tribunal. Súmulas nºs 68 e 94 do STJ.[...](TRF 4ª Região, AMS nº 2006.72.05.006150-9/SC, Primeira Turma, Relator Min. Taís Schilling Ferraz, D.E. 07.08.2007)

PROCESSUAL CIVIL, TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL -CONTRIBUIÇÃO SOBRE SUBSÍDIO DOS OCUPANTES DE MANDATO ELETIVO (§13 DO ART. 40 DA CF/88 - EC Nº. 20/98): LEGITIMIDADE - DECADÊNCIA.1. Consoante o STJ, a decadência do direito à repetição de tributos lançáveis por homologação se conta na modalidade "5+5" e a decadência qüinqüenal de que trata a LC nº 118/2005 somente se aplica aos feitos ajuizados após o início de sua vigência (09 JUN 2005). A prescrição qüinqüenal prevista no Decreto nº 20.910/32 não se aplica em matéria tributária, que tem legislação específica. Ajuizada a demanda em 15 JUL 2005 restam apanhados pela decadência os recolhimentos havidos antes de 15 JUL 2000. [...]

ajuizamento da ação de repetição do indébito, mas sim o momento da extinção do pagamento antecipado:PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. TESE DOS 5+5. COFINS. ISENÇÃO. SOCIEDADES CIVIS PRESTADORAS DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS. ART. 6º, DA LC 70/91. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO FISCAL. LEI 9.430/96. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA HIERARQUIA DAS LEIS. APELAÇÃO. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE.1. Tratando-se de tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo prescricional da ação de repetição de indébito ocorrerá após o transcurso de cinco anos, contados da ocorrência do fato gerador (prazo decadencial), acrescido de mais cinco anos, contados da homologação tácita (prazo prescricional). 2. A aplicabilidade da LC 118/2005 se restringe aos tributos cuja extinção, pelo pagamento antecipado (art. 3º), se deu após o início da vigência da mencionada norma, pois, admitir-se a retroatividade da norma para as situações consumadas anteriormente à sua vigência, quando se entendia a extinção do crédito tributário somente quando da homologação, expressa ou tácita, seria aceitar a retroatividade em prejuízo aos contribuintes, o que é inaceitável, pois o contribuinte seria penalizado pela nova interpretação estabelecida pela lei, de forma que perderia o prazo tal como repetido e pacificamente assegurado pelo Poder Judiciário.[...](TRF 1ª Região, AMS 2006.38.11.005379-7/MG, Oitava Turma, DJ 10.08.2007, julgado em 12.06.2007)

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4. Apelação do INSS e remessa oficial providas. Apelação do autor prejudicada.5. Peças liberadas pelo Relator, em 25/06/2007, para publicação do acórdão. (TRF 1ª Região, AC n° 2005.38.00.025749-7/MG, Sétima Turma, Des. Federal Rafael Paulo Soares Pinto, DJ 06.07.2007, p. 94)

Certo, portanto, é que o novo preceito legal não pode ser aplicado aos

processos em curso, principalmente, aos já solucionados – coisa julgada.

Quanto aos processos administrativos, já advertira Paulo Pimenta20, a

mudança do critério jurídico da contagem do prazo prescricional com eficácia retroativa

vai de encontro com o artigo 146 do Código Tributário Nacional, pois de acordo com

esse dispositivo a modificação introduzida “nos critérios jurídicos adotados pela

autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em

relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a um fato gerador ocorrido posteriormente à

sua introdução”.

Todavia, cabe indagar se esse efeito produzido pela Lei Complementar n°

118 aos fatos ocorridos antes da sua vigência – 09 de junho de 2005, ainda que a ação

tenha sido ajuizada posteriormente a essa data, não é aplicá-la com efeito retroativo.

Assim, para determinar o evento divisor da eficácia retroativa e

prospectiva do disposto no artigo 3° da Lei Complementar n° 118, imprescindível é a

constatação de que o referido preceito introduziu ao ordenamento jurídico brasileiro

norma de conteúdo material, isto é, que aborda sobre a extinção do crédito tributário. Por

conseguinte, a lei que regula as modalidades de extinção do crédito é a vigente na data do

fato imponível. Calha mais uma vez recorrer à lição de Paulo Pimenta, na qual observa

que em face do art. 144 do CTN, “o lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato

gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente

modificada ou revogada”21. Logo, “toda a relação jurídico-tributária, desde o seu

nascimento até a extinção do crédito constituído pelo ato impositivo” é regulado pela lei

existente no momento do fato imponível.

Como é notório, a norma vigente antes da Lei Complementar n° 118 é

aquela decorrente da interpretação pacificada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça

de que, no caso dos tributos sujeito a lançamento por homologação, o prazo prescricional

20 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. A Aplicação da Lei Complementar n° 118/05 no Tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 117, maio/2006.21 Ressalvado as hipóteses dos §§ 1° e 2° do art. 144, nas quais não condiz com o presente estudo.

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é contado da data em que ocorrer a homologação, se expressa, ou do término do

respectivo prazo, se tácita, momento este que se efetiva a extinção do crédito.

Destarte, deve-se aplicar aos fatos geradores anteriores à vigência da Lei

Complementar n° 118 o prazo prescricional de cinco anos a contar da homologação

expressa ou do término do respectivo prazo e às relações jurídicas ocorridas

posteriormente a vigência da referida lei o prazo de cinco anos a contar do pagamento

indevido.

Nesse sentido, leciona Paulo Pimenta22,[…] as relações jurídicas surgidas antes do advento da LC n° 118/05 deverão ser reguladas pelo critério de interpretação fixada pelo STJ. Logo, em tais situações aplicar-se-á o prazo decenal, o qual, destarte, alcança todos os fatos jurídicos iniciados antes de 9 de junho de 2005 – termo inicial da vigência da lei mencionada – ainda que o pagamento antecipado do tributo não tenha sido efetuado. Para os fatos imponíveis posteriormente ocorridos, aí sim deverá ser aplicada a prescrição qüinqüenal, que fluirá do recolhimento antecipado da exação.

Por outro lado, pode-se chegar à mesma conclusão se observar, como

adverte Joel Gonçalves de Lima Junior23, que a prescrição, instituto jurídico pelo qual se

extingue o direito de pretensão sobre um ato ou fato jurídico ocorrido, tem por referência

a data do ato ou fato jurídico a ser demandado (teoria da actio nata), sendo irrelevante a

data do ajuizamento da ação. Esta só se demonstra relevante para constatar, diante de um

caso concreto, se foi ou não consumada a prescrição. Além disso, aponta que “uma lei é

de aplicação retroativa quando se aplica aos atos ou fatos jurídicos pretéritos. Ou seja, aos

atos ou fatos ocorridos anteriormente à vigência da lei superveniente. E uma lei é não

retroativa quando se aplica aos atos ou fatos futuros, ocorridos após a sua vigência”.

Conclui, destarte, que, a data da distribuição da demanda é externa ao instituto da

prescrição, assim como nada se relaciona com a retroatividade ou irretroatividade da lei,

“a referência tanto para o instituto da prescrição como para o estudo sobre a

retroatividade das leis é a data do ato ou fato jurídico demandado, e não a data do

ajuizamento da demanda”.

22 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. A Aplicação da Lei Complementar n° 118/05 no Tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário. RDDT n. 116. São Paulo: Dialética, p. 117, maio/2006.23 LIMA JUNIOR, Joel Gonçalves de. A Lei Complementar 118 e as Demandas Ajuizadas após 9 de Junho de 2005: uma Releitura da Decisão do Supeiror Tribunal de Justiça. RDDT n° 142. São Paulo: Dialética, p. 30, jul./2007.

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Em face do exposto, e tendo-se em vista que o fato jurídico-tributário

demandado é o pagamento indevido (art. 165 do CTN), conclui-se que, a Lei

Complementar n° 118 deve ser aplicada tão somente aos pagamentos indevidos ocorridos

sob sua vigência – a partir de 09 de junho de 2005, pois caso seja aplicada a atos e fatos

imponíveis ocorridos antes da mencionada data, estar-se-á sendo aplicada com efeitos

retroativos. O efeito retroativo, destarte, independe da ação ter sido ajuizada antes ou

depois de 09 de junho de 2005.

A eficácia da norma deve ser condicionada não somente à observância da

vacatio legis, mas, de igual modo, a aplicabilidade do dispositivo apenas a fatos

geradores ocorridos após a vigência da lei. Obviamente, isso não importa em que se

reconheça o direito adquirido a determinado prazo para o seu exercício, já que é cediço

inexistir direito adquirido a regime jurídico de institutos jurídicos. Contudo, se a

aplicação da nova regra a fatos passados importa, de um lado, em retroatividade da lei

nova, de outro implica na vulneração do princípio da segurança jurídica, que há de

informar as relações jurídico-tributárias, razões suficientes para que se advogue a

imperiosidade de restrição de sua aplicabilidade a fatos geradores pretéritos.

Diante das legítimas expectativas despertadas no sujeito passivo,

decorrentes de uma interpretação consolidada durante uma década na Corte

constitucionalmente incumbida da tutela do direito federal, a mudança radical na

aplicação do instituto jurídico da prescrição tributária certamente importaria em profundo

gravame à segurança jurídica. Portanto, a efetiva aplicação do dispositivo não pode

alcançar quantias recolhidas de forma indevida a título de tributo cujo prazo prescricional

para o resgate judicial já esteja em curso: nesses casos, há de se manter a aplicação da

contagem do lapso total de dez anos – cinco anos concernente à homologação pelo Fisco

mais cinco anos do prazo prescricional.

Posto isso, infere-se que equivocada e teratológica foi a decisão da

Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça no ERESP n ° 327.043 ao decidir que o

artigo 3° não terá efeito retroativo por inovar no ordenamento jurídico, entretanto,

determinar que o referido preceito se aplica a situações que venham a ocorrer a partir de

09 de junho de 2005, isto é, às ações ajuizadas posteriormente ao prazo de cento e vinte

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dias (vacatio legis) da publicação da referida Lei Complementar, ainda que o fato gerador

tenha se efetivado anteriormente.

Ademais, a aplicação do novel dispositivo legal a fatos imponíveis

pretéritos acarretará uma conclusão absurda, comprovando assim que a data do

ajuizamento da ação não pode ser tida como marco à sua aplicação e sim o recolhimento

indevido.

Explique-se. Se por suposição o pagamento das contribuições do PIS e da

COFINS ocorreu no exercício de 1999 com base no § 3° do artigo 4° da lei n° 9.718/98 –

declarado inconstitucional, e se não houve homologação expressa pelo Fisco, infere-se

que o contribuinte terá direito a restituir o pago indevidamente a título desses tributos.

Como é sabido, à época do fato gerador (1999) valia a regra pacificada na jurisprudência

da prescrição decenal a contar do pagamento indevido para a repetição do indébito. Com

efeito, a prescrição apenas consumar-se-ia no exercício de 2009. Ocorre que, em 09 de

junho de 2005 entrou em vigência a Lei Complementar n° 118, determinando a redução

do prazo para cinco anos a contar da data do pagamento. Ora, se fosse possível aplicar a

novel legislação – superveniente ao fato gerador, obter-se-ia a esdrúxula conclusão de

que o direito adquirido à repetição do indébito já teria sido prescrito antes mesmo do

advento da Lei Complementar n° 118. No presente caso, a prescrição teria se efetivado

desde 2004, um ano antes à sua vigência no ordenamento jurídico. Um absurdo! “O novel

prazo prescricional seria natimorto. Ter-se-ia escoada antes mesmo de a Lei

Complementar vir a ser editada” nos termos de Joel Gonçalves de Lima Junior24.

Ainda nesse contexto, o autor supracitado aduz que “a interpretação e

aplicação das leis não podem levar ao extremo de esvaziar o seu próprio conteúdo

normativo, ou tolher de todo o direito material das partes”, in casu “o direito do

contribuinte ficaria tolhido integralmente. Nenhum dia sequer teria tido o contribuinte

para exercer o direito de repetição.”25

Nesse diapasão, portanto, sensato foi a modificação, após pouco mais de

dois anos, do entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no que concerne ao

termo inicial da eficácia do artigo 3° da Lei Complementar n° 118/2005, quando da 24 LIMA JUNIOR, Joel Gonçalves de. A Lei Complementar 118 e as Demandas Ajuizadas após 9 de Junho de 2005: uma Releitura da Decisão do Supeiror Tribunal de Justiça. RDDT n° 142. São Paulo: Dialética, p. 37, jul./2007.25 Ibid., p. 37.

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apreciação da constitucionalidade do artigo 4° da referida lei, conforme será estudado no

próximo item, na Argüição de Inconstitucionalidade nos Embargos de Divergência em

Recurso Especial n° 644.736/PE.

A supracitada Corte, no mencionado julgamento, decidiu que o artigo 3°,

por se tratar de norma que reduz prazo de prescrição, deverá observar a regra clássica de

direito intertemporal de que “o termo inicial do novo prazo será o da data da vigência da

lei que o estabelece, salvo se a prescrição [...] iniciada na vigência da lei antiga, vier a se

completar, segundo a lei antiga, em menos tempo”. Destarte, conclui, nos termos do voto

do Ministro Teori Albino Zavascki, que com o advento da Lei Complementar n° 118/05 a

prescrição para a repetição do pagamento indevido a título de tributo sujeito a lançamento

por homologação deve obedecer: (i) quanto aos pagamentos efetivados previamente a

vigência da Lei Complementar n° 118, o regime do sistema anterior pacificado pelo STJ,

de que a prescrição ocorre cinco anos da homologação – seja expressa ou tácita, limitada,

porém ao prazo máximo de cinco a contar da vigência da nova lei; e (ii) quanto aos

pagamentos posteriores, a novel regra do artigo 3°, qual seja, o prazo de cinco anos a

contar da data do pagamento indevido.

Em que pese a recente mudança de posicionamento do Superior Tribunal

de Justiça, é notória a presença de julgados dessa Corte e dos Tribunais Regionais

Federais que adotam o novel entendimento de que o marco do termo inicial da eficácia do

artigo 3° não seja a data do ajuizamento da ação e sim a data em que foi efetivado o

pagamento indevido a título de tributo, senão vejamos26:26 Deve-se ressaltar, entretanto, que ainda há julgados, inclusive da Corte Superior, que adotam o entendimento dos EREsp 327.043/DF, isto é, que tem por divisor da eficácia ou ineficácia do artigo 3° da Lei Complementar n° 118/2005 a data do ajuizamento da ação e não a data do efetivo pagamento antecipado do tributo, conforme pode ser observado no REsp 979499 / SE, Segunda Turma, Ministro Humberto Martins, DJ 03.10.2007, julgado em 20.09.2007; nos EDcl na AC n° 20048200007751-6, TRF 5ª Região, Segunda Turma, Desembargador Federal Petrúcio Ferreira, DJ 05.09.2007, julgado em 31.07.2007; e na AMS n° 2006.70.00.003791-0, cuja ementa está abaixo transcrita:TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRESCRIÇÃO. ART. 4º DA LC 118/05. COFINS. LEI 9.718/98 E 10.833/03. ALTERAÇÃO DE BASE DE CÁLCULO. COMPENSAÇÃO.1. A Lei Complementar nº 118, de 09 de fevereiro de 2005, que interpretou o disposto no art. 168, I, do CTN, para estabelecer que o prazo de cinco anos para a postulação da repetição do indébito conta-se do recolhimento do tributo supostamente indevido, e não da homologação tácita do lançamento (art. 150, § 4º do CTN), aplica-se apenas às ações ajuizadas sob sua vigência. Precedentes do STJ e da Corte Especial deste TRF4 (Argüição de Inconstitucionalidade nº 2004.72.05.003494-7/SC e embargos declaratórios correspondentes).2. Sendo a ação posterior à 09 de junho de 2005, quando se implementou o prazo de vacatio legis, da referida alteração legislativa, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos, a partir do recolhimento indevido.

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TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COFINS. SOCIEDADE CIVIL. ISENÇÃO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO STF. COMPENSAÇÃO. PRESCRIÇÃO. ART. 3º DA LC Nº 118/05.1. O STF tem reconhecido que o conflito entre lei complementar e lei ordinária – como é o caso da alegada revogação da Lei Complementar nº 70/91 pela Lei 9.430/96 – possui natureza constitucional.2. Extingue-se o direito de pleitear a restituição de tributo sujeito a lançamento por homologação, não sendo esta expressa, somente após o transcurso do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador, acrescido de mais cinco anos contados da data em que se deu a homologação tácita (EREsp 435.835/SC, julgado em 24.03.04).3. Na sessão do dia 06.06.07, a Corte Especial acolheu a argüição de inconstitucionalidade da expressão "observado quanto ao art. 3º o disposto no art. 106, I, da Lei n. 5.172/1966 do Código Tributário Nacional", constante do art. 4º, segunda parte, da LC 118/05 (EREsp 644.736-PE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki).4. Nessa assentada, firmou-se o entendimento de que, "com o advento da LC 118/05, a prescrição, do ponto de vista prático, deve ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a ação de repetição de indébito é de cinco a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei nova".5. Recurso especial conhecido em parte e não provido.(STJ, REsp nº 955.831 – SP, Segunda Turma, Ministro Castro Meira, julgamento 28.08.2007)

CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - REVOGAÇÃO DA ISENÇÃO DA COFINS (PREVISTA NO ART. 6º, II, DA LC N. 70/91) PELA LEI Nº 9.430/96: CONSTITUCIONAL (STF).1. Em face do conflito aparente de normas no tempo, que decorre da superveniência da LC nº 118/2005, o STJ, em primeiro instante (ERESp nº 327.043/DF), definiu que o "novo" prazo decadencial (qüinqüenal) somente seria aplicado às ações ajuizadas na vigência da LC nº 118/2005 (09 JUN 2005); agora (JUN 2007), contudo, o STJ (ERESp nº 644.736) passou a entender que, [a] a repetição dos tributos recolhidos antes do início de vigência da aludida LC (09 JUN 2005) segue a decadência na modalidade "5+5", ao passo que [b] a repetição dos tributos recolhidos após o início de vigência da LC em questão segue a modalidade "qüinqüenal", não importando - em qualquer dos casos - perquirir se a ação foi ajuizada antes ou depois da LC nº 118/2005. A prescrição qüinqüenal prevista no Decreto nº 20.910/32 não se aplica em matéria tributária, que tem legislação própria e específica. 2. Superando a anterior posição jurisprudencial desta Corte, que priorizava o entendimento professado pelo STJ (no sentido de que a revogação, por lei ordinária, de isenção prevista em lei complementar malferiria a hierarquia das leis), o STF - recentemente (final de 2006) - declarou constitucional a revogação da isenção (prevista na LC nº 70/91) pela Lei nº 9.430/96 (esmaecendo, pois, a força da SÚMULA nº 276/STJ), sendo desinfluente,

[...](TRF 4ª Região, AMS n° 2006.70.00.003791-0, Primeira Turma, Relatora Desembargadora Taís Schilling Ferraz, D.E. 09.10.2007, Julgado em 19.09.2007)

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doravante, então, sequer examinar se a sociedade atende ou não aos critérios legais (Dl nº 2.397/87) para o gozo da (revogada) isenção.3. Apelação da Fazenda Nacional provida em parte. Apelação da autora não provida. 4. Peças liberadas pelo Relator, em 23/07/2007, para publicação do acórdão. (TRF 1ª Região, AC 2006.38.03.002890-4/MG, Sétima Turma, Relator Convocado Juiz Federal Rafael Paulo Soares Pinto, julgamento 23.07.2007, DJ 03.08.2007)

À luz do exposto, portanto, constata-se que o Poder Judiciário vem

respeitando o princípio da irretroatividade da lei, o princípio da autonomia e

independência dos poderes e a garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da

coisa julgada. Por conseguinte, respeitado também está o princípio constitucional basilar

do Estado Democrático de Direito, qual seja, o princípio da segurança jurídica, bem como

preservado está a função constitucional do Egrégio Superior Tribunal de Justiça de

interpretar e aplicar a lei federal em última instância, com uniformidade, possibilitando

aos contribuintes um mínimo de segurança nas relações jurídicas empreendidas na

sociedade.

2.3 Da inconstitucionalidade do art. 4° da LC n° 118/2005

Tendo em vista o caráter inovador do artigo 3° da Lei Complementar n°

118/2005 no ordenamento jurídico, depreende-se a inadmissibilidade de sua aplicação

retroativa, pois ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos

poderes (art. 2°, CF) e a garantia constitucional do direito adquirido, do ato jurídico

perfeito e da coisa julgada (art. 5°, inciso XXXVI, CF), ao restringir direitos dos

cidadãos. Assim, cabe analisar a constitucionalidade da expressão “observado, quanto ao

art. 3o, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 –

Código Tributário Nacional”, constante no artigo 4°, segunda parte, do referido diploma.

Desde os Embargos de Divergência n° 327.043 fora suscitada a argüição

de inconstitucionalidade do artigo 4° no que concerne a aplicação retroativa do artigo 3°

da Lei Complementar n° 118/2005, conforme se constata do voto proferido pelo Ministro

Teori Albino Zavascki:Ocorre que o art. 4º da Lei Complementar 118/2005, em sua segunda parte, determina, de modo expresso, que, relativamente ao seu art. 3º, seja observado “o disposto no art. 106, I, da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”, vale dizer, que seja aplicada inclusive aos atos ou fatos

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pretéritos. Ora, conforme antes demonstrado, a aplicação retroativa do dispositivo importa, nesse caso, ofensa à Constituição, nomeadamente ao seu art. 2º (que consagra a autonomia e independência do Poder Judiciário em relação ao Poder Legislativo) e ao inciso XXXVI do art. 5º, que resguarda, da aplicação da lei nova, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Assim, fica evidenciada a inconstitucionalidade do dispositivo, cumprindo observar, em relação a ele, o disposto no art. 97 da Constituição, instalando-se o devido incidente de inconstitucionalidade. Não basta, para contornar o incidente, simplesmente deixar de aplicar o dispositivo inconstitucional. Ao Judiciário, que está submetido à lei, somente é dado deixar de aplicá-la quando ela for incompatível com a Constituição, o que só pode ser reconhecido e declarado pela maioria absoluta dos seus membros ou dos membros do órgão especial. Bem a propósito, eis a orientação do STF a respeito, em situação absolutamente análoga:“A declaração de inconstitucionalidade de norma incidenter tantum, e, portanto, por meio do controle difuso de constitucionalidade, é o pressuposto para o juiz ou o Tribunal, no caso concreto, afastar a aplicação da norma tida por inconstitucional. Por isso, não se pode pretender, como o faz o acórdão recorrido, que não há declaração de inconstitucionalidade de uma norma jurídica incidenter tantum quando o acórdão não a declara inconstitucional, mas afasta a sua aplicação, porque tida como inconstitucional. Ora, em se tratando de inconstitucionalidade de norma jurídica a ser declarada em controle difuso por Tribunal, só pode declará-la, em face do disposto no artigo 97 da Constituição, o Plenário dele ou seu Órgão Especial, onde este houver, pelo voto da maioria absoluta dos membros de um ou de outro” (STF, RE 179.170, 1ª Turma, Min. Moreira Alves, DJ de 30.10.98).8. Ante o exposto, acompanho o entendimento do Ministro relator, mas proponho seja suscitado incidente de inconstitucionalidade da expressão “observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”, constante do art. 4º, segunda parte, da Lei Complementar 118/2005, submetendo-se a matéria à consideração do órgão especial, na forma dos arts. 199 e 200 do Regimento Interno. É o voto. (grifos nossos)

Todavia, o referido incidente de inconstitucionalidade, a ser decidido no

Plenário, proposto pelo Ministro Teori Albino Zavascki fora de logo rejeitado pelos votos

adiantados dos Srs. Ministros José Delgado, Luiz Fux e João Otávio de Noronha,

recebendo somente a adesão do Ministro Francisco Peçanha Martins. O Ministro Castro

Meira, por sua vez, pediu vista do processo suspendendo o seu julgamento. Em seu voto-

vista o ministro demonstrou o caráter inovador do artigo 3° da Lei Complementar n°

118/2005, e, por conseguinte, a sua incompatibilidade com o efeito retroativo previsto no

artigo 106, inciso I, do CTN, pois ao invés de encontrar fundamento de validade neste, o

contrariou, já que desnecessária a interpretação de preceito exaustivamente analisado

pelo judiciário. Concluiu, entretanto, pedindo vênia ao Ministro Teori, ser desnecessário o incidente de inconstitucionalidade da parte final do artigo 4° da LC n.° 118/05. É possível interpretá-lo conforme a Constituição, desde que

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os efeitos retroativos ali previstos limitem-se às ações ajuizadas após o vacatio legis de 120 dias prevista na parte inicial do dispositivo.Ajuizada a ação após 9 de junho de 2005, poderá o art. 3° da LC n.° 118/05 ser aplicado aos fatos geradores ocorridos antes de sua aplicação. O prazo de cinco anos poderá ser contado a partir do pagamento indevido, e não da homologação expressa ou tácita, desde que a ação tenha sido proposta depois de 09 de junho de 2005 e mesmo que o pagamento antecipado pelo contribuinte tenha sido realizado antes da vigência da Lei.

Diverso não foi o entendimento do Ministro Luiz Fux ao defender em seu

voto que “a Lei Complementar n° 118, de 09 de fevereiro de 2005, aplica-se, tão

somente, aos fatos geradores pretéritos, ainda não submetidos ao crivo judicial, pelo que

o novo regramento não é retroativo a mercê de interpretativo”. Ademais, aduz queÀ míngua de prequestionamento por impossibilidade jurídica absoluta de engendrá-lo, e considerando que não há inconstitucionalidade nas leis interpretativas como decidiu em recentíssimo pronunciamento o Pretório Excelso, o preconizado na presente sugestão de decisão ao colegiado, sob o prisma institucional, deixa incólume a jurisprudência do Tribunal ao ângulo da máxima tempus regit actum, permite o prosseguimento do julgamento dos feitos de acordo com a jurisprudência reinante, sem invalidar a vontade do legislador através suscitação de incidente de inconstitucionalidade de resultado moroso e duvidoso a afrontar a efetividade da prestação jurisdicional, mantendo hígida a norma com eficácia aos fatos pretéritos ainda não sujeitos à apreciação judicial, máxime porque o artigo 106 do CTN é de constitucionalidade induvidosa até então e ensejou a edição da LC 118/2005, constitucionalmente imune de vícios. (grifos nossos)

Nessa perspectiva, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça ao

deliberar que a norma do artigo 3° da LC n° 118/2005 não teria efeito retroativo, sendo

aplicável apenas aos processos ajuizados após a sua vigência – independente da data do

fato imponível, declarou ser desnecessário suscitar o incidente de inconstitucionalidade

do artigo 4° no que concerne a expressão “observado, quanto ao art. 3o, o disposto no art.

106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”,

pois este prescindia de vício e podia ser interpretado conforme a constituição.

Ocorre que, o Supremo Tribunal Federal, apreciando o Recurso

Extraordinário n° 486.888 interposto pela Fazenda Nacional, considerou que a Segunda

Turma do STJ, no julgamento do REsp n° 644.736, ao interpretar da forma supra citada,

estava afastando incidência de norma ordinária pertinente à lide para decidir sobre

critérios diversos alegadamente extraídos da Constituição, determinando o processamento

de incidente de inconstitucionalidade, nos termos do artigo 97 da Constituição Federal.

Isso porque, a Suprema Corte considera declaratório de inconstitucionalidade o acórdão

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que afasta a incidência de norma ordinária pertinente à lide e essa inconstitucionalidade

só pode ser proferida por órgão especial ou plenário – princípio constitucional de reserva

de plenário, o que não foi o caso dos autos do REsp n° 644.736/PE.

Desta forma, o Superior Tribunal de Justiça, em atendimento à decisão

proferida pela Corte Suprema, suscitou a Argüição de Inconstitucionalidade nos

Embargos do Recurso Especial n° 644.736/PE e pronunciou pela inconstitucionalidade

do artigo 4° da Lei Complementar n° 118/2005, na parte que determina a aplicação

retroativa do disposto no artigo 3° da mesma lei, por ofender o princípio constitucional da

autonomia e independência dos poderes (art. 2°) e o princípio da garantia do direito

adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (art. 5°, inc. XXXVI), conforme

ementa abaixo transcrita:CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. LEI INTERPRETATIVA. PRAZO DE PRESCRIÇÃO PARA A REPETIÇÃO DE INDÉBITO, NOS TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. LC 118/2005: NATUREZA MODIFICATIVA (E NÃO SIMPLESMENTE INTERPRETATIVA) DO SEU ARTIGO 3º. INCONSTITUCIONALIDADE DO SEU ART. 4º, NA PARTE QUE DETERMINA A APLICAÇÃO RETROATIVA.1. Sobre o tema relacionado com a prescrição da ação de repetição de indébito tributário, a jurisprudência do STJ (1ª Seção) é no sentido de que, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo de cinco anos, previsto no art. 168 do CTN, tem início, não na data do recolhimento do tributo indevido, e sim na data da homologação – expressa ou tácita - do lançamento. Segundo entende o Tribunal, para que o crédito se considere extinto, não basta o pagamento: é indispensável a homologação do lançamento, hipótese de extinção albergada pelo art. 156, VII, do CTN. Assim, somente a partir dessa homologação é que teria início o prazo previsto no art. 168, I. E, não havendo homologação expressa, o prazo para a repetição do indébito acaba sendo, na verdade, de dez anos a contar do fato gerador.2. Esse entendimento, embora não tenha a adesão uniforme da doutrina e nem de todos os juízes, é o que legitimamente define o conteúdo e o sentido das normas que disciplinam a matéria, já que se trata do entendimento emanado do órgão do Poder Judiciário que tem a atribuição constitucional de interpretá-las.3. O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar esses mesmos enunciados, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a 'interpretação' dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal.4. Assim, tratando-se de preceito normativo modificativo, e não simplesmente interpretativo, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.5. O artigo 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (CF,

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art. 2º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI).6. Argüição de inconstitucionalidade acolhida.

Logo, tendo a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça determinado

a inconstitucionalidade do dispositivo em análise, é de se aplicar o disposto no parágrafo

único do artigo 481 do Código Processo Civil27, isto é, de não submeter os órgãos

fracionários dos Tribunais, ou o órgão especial, à argüição de inconstitucionalidade se já

houver pronunciamento sobre a questão desses órgãos ou do Supremo Tribunal Federal.

Em face do exposto, infere-se, pois, que, poderão os magistrados,

monocraticamente ou em turma, afastar a aplicação retroativa do disposto no artigo 3° da

LC n° 118, conforme determina o artigo 4° do referido texto legal, suscitando apenas a

decisão prolatada na AI nos EREsp 644.736, sem incorrer, contudo, na violação do

princípio constitucional da reserva de plenário. Logo, prescindível será nova argüição de

inconstitucionalidade, de resultado moroso e obstruidor do Poder Judiciário, tendo em

vista que há jurisprudência precedente no mesmo sentido. Nessa direção já se manifestou

a Corte Superior:CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRAZO PRESCRICIONAL. LC 118/2005. INCONSTITUCIONALIDADE DA APLICAÇÃO RETROATIVA. PIS. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 9.718/98. CONCEITO DE FATURAMENTO. PRECEDENTES DO STF. COMPENSAÇÃO. TRIBUTOS DE DIFERENTES ESPÉCIES. SUCESSIVOS REGIMES DE COMPENSAÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA OU EXAME DA CAUSA À LUZ DO DIREITO SUPERVENIENTE. INVIABILIDADE. JUROS DE MORA.1. Sobre a prescrição da ação de repetição de indébito tributário de tributos sujeitos a lançamento por homologação, a jurisprudência do STJ (1ª Seção) assentou o entendimento de que, no regime anterior ao do art. 3º da LC 118/05, o prazo de cinco anos, previsto no art. 168 do CTN, tem início, não na data do recolhimento do tributo indevido, e sim na data da homologação – expressa ou tácita - do lançamento. Assim, não havendo homologação expressa, o prazo para a repetição do indébito acaba sendo de dez anos a contar do fato gerador.2. A norma do art. 3º da LC 118/05, que estabelece como termo inicial do prazo prescricional, nesses casos, a data do pagamento indevido, não tem eficácia retroativa. É que a Corte Especial, ao apreciar Incidente de Inconstitucionalidade no Eresp 644.736/PE, sessão de 06/06/2007, declarou inconstitucional a expressão "observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional", constante do art. 4º, segunda parte, da referida Lei Complementar.

27 Art. 481. Se a alegação for rejeitada, prosseguirá o julgamento; se for acolhida, será lavrado o acórdão, a fim de ser submetida a questão ao tribunal pleno.Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.

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3. Não podem ser desconsideradas as decisões do Plenário do STF que reconhecem constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de diploma normativo. Mesmo quando tomadas em controle difuso, são decisões de incontestável e natural vocação expansiva, com eficácia imediatamente vinculante para os demais tribunais, inclusive o STJ (CPC, art. 481, § único: "Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão"), e, no caso das decisões que reconhecem a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, com força de inibir a execução de sentenças judiciais contrárias, que se tornam inexigíveis (CPC, art. 741, § único; art.475-L, § 1º, redação da Lei 11.232/05). [...]13. Recurso especial a que se dá parcial provimento.(STJ, REsp 884230 / SP, Primeira Turma, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 16.08.2007, Julgado em 02.08.2007)

TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRESCRIÇÃO. ARTS. 3º E 4º DA LEI COMPLEMENTAR N. 118/2005. INCONSTITUCIONALIDADE 1. Na hipótese de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo para a propositura da ação de repetição de indébito é de 10 (dez) anos a contar do fato gerador, se a homologação for tácita (tese dos "cinco mais cinco"), e, de 5 (cinco) anos a contar da homologação, se esta for expressa.2. A Corte Especial do STJ, no julgamento da AI nos EREsp n. 644.736/PE, declarou que a segunda parte do art. 4º da Lei Complementar n. 118/2005 – que determina a aplicação retroativa de seu art. 3º para alcançar inclusive fatos passados – é inconstitucional, visto ofender os princípios da autonomia, da independência dos poderes, da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada.3. Estão os órgãos fracionários dos tribunais dispensados de submeter ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão (art. 481, § 1º, do CPC).2. Recursos especiais improvidos.(STJ, REsp 802267 / DF, Segunda Turma, Relator Ministro João Otávio de Noronha, DJ 21.08.2007, Julgado em 13.09.2007)

Conclui-se, portanto, que, a decisão proferida pela Corte Especial na AI

nos EREsp 644.736 declarou inconstitucional o artigo 4° da Lei Complementar n°

118/2005, no que diz respeito a aplicação retroativa do artigo 3°, e tornou imperativa a

aplicação da contagem do prazo prescricional à repetição de indébito, nas hipóteses de

tributo sujeito a lançamento por homologação, nos seguintes termos: (i) aos pagamentos

efetuados aquém dos cinco anos prévios à vigência da LC n° 118/2005, aplica-se

estritamente o critério de interpretação consolidado pelo STJ, ou seja, a “sistemática dos

cinco mais cinco”; (ii) aos recolhimentos realizados no interstício de 10.06.2000 e

09.06.2005, observa-se a “sistemática dos cinco mais cinco” de forma mitigada,

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limitando-se o prazo prescricional até cinco anos a contar da data da vigência da novel lei

complementar; e (iii) aos fatos imponíveis posteriores a 09.06.2005 incide as novas

disposições legais, qual seja, o prazo prescricional de cinco anos contados da data do

pagamento indevido28.

Não obstante, mais recentemente, a controvérsia sobre a

inconstitucionalidade do artigo 4° da LC n° 118/2005 chegou ao Supremo Tribunal

Federal por meio do Recurso Extraordinário n° 561.908-7 / RS interposto pela União. Ao

apreciar a matéria, em 19.10.2007, o Egrégio Tribunal reconheceu a existência de

repercussão geral da questão constitucional suscitada, submetendo ao Plenário a matéria

para deliberação a respeito, a qual ainda permanece pendente29.

3 CONCLUSÃO

1. O direito à repetição não pode ser exercido ad infinitum, em face do

princípio basilar do ordenamento jurídico, qual seja, da segurança jurídica. Desta forma,

o direito posto submete a pretensão do particular de restituir a quantia paga

indevidamente a título de tributo a um prazo prescricional. Configura-se como

prescricional a natureza jurídica desse prazo extintivo, posto que o direito de pleitear a

restituição não é um poder-dever (direito potestativo) e sim o exercício de uma pretensão,

o exercício de um direito a uma prestação, isto é, o poder do sujeito passivo da relação

jurídico tributária de exigir do Estado a quantia paga indevidamente a título de tributo.

2. No que concerne ao termo inicial do prazo prescricional da repetição do

valor pago impropriamente a título de tributo, depreende-se do artigo 168, inciso I, do

Código Tributário Nacional, que o mesmo ocorre quando da extinção do crédito

tributário. A grande divergência que perdurou durante décadas, no tocante aos tributos

sujeitos ao lançamento por homologação, destarte, diz respeito ao momento em que o

28 Cf. Voto proferito pelo Ministro Castro Meira nos autos do REsp 955.831.29 TRIBUTO – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – LEI COMPLEMENTAR N° 118/2005 – REPERCUSSÃO GERAL – ADMISSÃO. Surge com repercussão geral controvérsia sobre a inconstitucionalidade, declarada na origem, da expressão “observado, quanto ao art. 3o, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”, constante do artigo 4°, segunda parte, da Lei Complementar n° 118/2005.(STF, RE n° 561.908-7 / RS, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ 12.12.2007)

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crédito tributário se extingue, se do pagamento antecipado ou da homologação expressa

ou tácita.

3. A extinção e, por conseqüência, o termo inicial da prescrição, nessa

modalidade de tributo, ocorre no momento em que se efetiva a homologação, seja

expressa ou tácita, pois, conforme interpretação extraída do artigo 156, inciso VII, c/c o

artigo 150, §§ 1° e 4°, ambos do CTN, o pagamento indevido não é suficiente, por si só,

para extinguir o crédito tributário. Outro não foi o entendimento pacificado pelo Egrégio

Superior Tribunal de Justiça, desde meados da década de noventa.

4. Com a promulgação da Lei Complementar n° 118/2005, em 09 de

fevereiro de 2005, ficou estabelecido que para efeito de interpretação do artigo 168,

inciso I, do CTN, a extinção do crédito tributário se efetiva no momento do pagamento

antecipado, na modalidade dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, bem

como que essa interpretação tem aplicação retroativa com base no artigo 106, do CTN.

5. O artigo 3° da Lei Complementar n° 118/2005, norma auto-intitulada

interpretativa, pretendeu alterar o termo inicial do prazo prescricional da repetição de

indébito nos tributos sujeitos a lançamento por homologação à data do pagamento

antecipado do crédito tributário e não mais quando de sua efetiva homologação –

expressa ou tácita, indo de encontro com a jurisprudência do Superior Tribunal de

Justiça, órgão jurisprudencial competente para decidir em última instância sobre questões

relacionadas à interpretação de lei federal, como no presente caso.

6. O artigo 3º da LC nº 118/2005 não é lei interpretativa e, por

conseguinte, não tem eficácia retroativa, pois à época da promulgação da referida lei não

havia qualquer dúvida, incerteza a ser sanada no plano normativo por uma lei

interpretativa, no que concerne à data da extinção do crédito tributário no caso dos

tributos sujeitos a lançamento por homologação e, por conseguinte, no que diz respeito ao

termo inicial da contagem da prescrição da repetição de indébito dessa modalidade de

tributo, pois essa questão já se encontrava pacificada no STJ; bem como a referida norma,

visivelmente, inovou na ordem jurídica, ao estabelecer a data do pagamento antecipado

como o momento da extinção do crédito tributário e não mais a data da homologação,

expressa ou tácita, do lançamento.

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7. No que condiz à eficácia produzida pelo artigo 3º da LC nº 118/2005 no

ordenamento jurídico, não há de cogitá-lo ser inconstitucional, pois se não se trata de lei

interpretativa e sim de lei nova, que modifica dispositivo preexistente, assim deverá ser

examinado e não simplesmente inutilizado. Embora o preceito novo seja incompatível

com o precedente – suposto interpretado, o mesmo pode ser interpretado de acordo com o

princípio da presunção da constitucionalidade da lei e aplicado conforme a Constituição,

isto é, com eficácia ex nunc.

8. O problema da eficácia do artigo 3º da LC nº 118/2005 reside no direito

intertemporal, quando da sua eficácia. Portanto, diante de sua natureza inovadora, apenas

produzirá eficácia prospectiva, ou seja, apenas incidirá efeitos nos pagamentos efetuados

após a vigência da LC nº 118/2005.

9. É inconstitucional a expressão “observado, quanto ao art. 3o, o disposto

no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário

Nacional” do artigo 4º da Lei Complementar nº 118/05, tendo em vista que o artigo 3º do

referido texto legal é norma inovadora no ordenamento jurídico.

10. A contagem do prazo prescricional à repetição de indébito, nas

hipóteses de tributo sujeito a lançamento por homologação, deve ser realizada da seguinte

forma:

(i) aos pagamentos efetuados aquém dos cinco anos prévios à

vigência da LC n° 118/2005, aplica-se estritamente o critério de interpretação

consolidado pelo STJ, ou seja, a “sistemática dos cinco mais cinco”;

(ii) aos recolhimentos realizados no interstício de 10.06.2000 e

09.06.2005, observa-se a “sistemática dos cinco mais cinco” de forma mitigada,

limitando-se o prazo prescricional até cinco anos a contar da data da vigência da novel lei

complementar;

(iii) aos fatos imponíveis posteriores a 09.06.2005 incide as novas

disposições legais, qual seja, o prazo prescricional de cinco anos contados da data do

pagamento indevido.

REFERÊNCIAS

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