A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO NO BAIRRO DA ...
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A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO NO BAIRRO DA MARAMBAIA,
BELÉM-PA: UM ESTUDO DE CASO
Evandro Neves
[email protected] – Universidade do Estado do Pará
Filipe Dias
Evandro Neves
[email protected] – Universidade do Estado do Pará
INTRODUÇÃO
O espaço urbano se torna importante como objeto de análise por toda a sua
dinâmica de circulação de capital, mercadoria e pessoas, de transformações
socioespaciais criadas por seus próprios formadores e por interesses destes com o
espaço. Sendo assim, consideramos o espaço urbano como a materialização da dinâmica
do interesse capitalista que se intensifica e se renova com as novas necessidades que
surgem para sua reprodução e através da paisagem, nota-se a idealização dos interesses
ali impostos pelos agentes modeladores do espaço urbano.
Como toda expansão do capital não se constitui de forma homogênea, a
produção espacial, por conseguinte, apresentará contrastes que causam impactos no
âmbito socioespacial materializados na desigualdade gerada na formação do urbano
pelos agentes modeladores na organização e (re) produção do espaço, no qual os
principais no bairro da Marambaia são agentes imobiliários e o Estado, logo não são os
únicos.
Os agentes modeladores são responsáveis pela reorganização socioespacial, pela
incorporação de novas áreas ao espaço urbano através, sobretudo, da especulação
fundiária, assim como também são responsáveis pela realocação de conteúdos sociais
que não fazem parte do seu objetivo na construção da cidade para a acumulação de
capital, conteúdos esses que são caracterizados por uma população de baixa renda,
sendo assim camadas sociais que não participaram diretamente do processo. (C0RRÊA,
XXXX).
Dessa forma, a proposta/objetivo do trabalho é compreender a formação urbana
do bairro da Marambaia pelos agentes acima citados como um processo que está dando
continuidade na acumulação de capital, que consequentemente tende, cada vez mais, a
caracterizar o bairro como fragmentado e desigual. Assim, as características fundiárias e
sociais do bairro é produto da atuação do capital, sobretudo imobiliário, na formação
espacial do bairro.
O bairro fica localizado no centro da cidade de Belém, logo se percebe a sua
importância para a valorização da terra, por um posicionamento geográfico privilegiado,
que interliga facilmente os moradores ao centro da cidade através, sobretudo, da
Avenida Augusto Montenegro, que serve como via de escoamento tanto para entrar
quanto para sair do centro e/ou seu entorno.
O bairro da Marambaia faz parte do distrito administrativo do entroncamento
(DAENT) em conjunto com os bairros das Águas Lindas, Aurá, Castanheira, Curió-
Utinga, Guanabara, Mangueirão, Souza, Val-de-Cans e Universitário. Assim, O
DAENT compreende uma população com total de 125.400 (cento e vinte cinco mil e
quatrocentas) pessoas, sendo 66.708 (sessenta e seis mil e setecentas e oito) pessoas no
bairro da Marambaia, segundo o anuário estatístico do município de Belém de 2012.
A metodologia para a pesquisa se deu em trabalhos de campo e análises de
referenciais teóricos que pesquisam a formação das cidades, do espaço urbano, como
CARLOS (2007), CORRÊA (1995), SOUZA (2008), LEFEBVRE (1974). Os
resultados obtidos mostram que a produção do espaço na Marambaia se dá de forma
heterogênea através da intensificação das atividades do capital na formação do bairro
através do Estado e dos agentes imobiliários, que encontram no bairro uma frente de
expansão para dar continuidade na atividade imobiliária que é facilitada pela posição
geográfica central do bairro, e consequentemente (auto) segregam cada vez mais o
bairro e consequentemente redefinem o perfil social do bairro.
2. A CONSOLIDAÇÃO DO CAPITAL E A (RE) PRODUÇÃO DO ESPAÇO
O espaço se circunscreve em duas dimensões: a primeira refere-se a sua
localização, ou seja, a um determinado ponto no mapa e a segunda condiz a seu
conteúdo – este resulta das relações sociais presentes no espaço, CARLOS (2007). Os
conteúdos presentes neste espaço apresentam-se de forma diversificada, com interesses
diferentes, logo a constituição do espaço será heterogênea.
O conteúdo presente no bairro da Marambaia é o da consolidação do capital, o
bairro apresenta a entrada do capital, através de investimentos no setor imobiliário que
são cada vez mais crescentes por seus agentes modeladores. Uma característica comum
de espaços consolidados pelo capital no bairro é a presença do processo de
verticalização, materializado na construção de condomínios e prédios. A verticalização
inicia-se de forma lenta e compreende o anseio de uma classe média, logo se entende
que o bairro tem características físicas e sociais diferenciadas.
Na figura abaixo, demonstra-se o espaço em sua dialética, ou seja, a compleição
de uma forma do capital – evidenciada pelos surgimentos de prédios – com todo aparato
para a qualidade de vida, e ao mesmo tempo a presença de espaços com poucas
condições de infraestruturas. Assim o bairro da Marambaia corrobora as contradições
propiciadas pelo sistema capitalista.
Atuação dos agentes imobiliários no bairro da Marambaia. Fonte: Trabalho de campo, 2013.
Percebe-se que o bairro passa por uma redefinição fundiária caracterizada pela
produção dos agentes produtores do espaço que se idealiza na paisagem e que (re)
modela as características sociais preexistentes através da (auto) segregação que
intensifica a desigualdade socioespacial. Essa (re) produção do espaço no bairro então
está aos poucos se exibindo por meio dos condomínios fechados e conjuntos
habitacionais planejados e simultaneamente com as atividades do circuito superior
compreendido como o subsistema do sistema econômico urbano que possuem estruturas
modernas tecnológicas, burocráticas e mais articuladas para melhor circulação de
mercadorias e à efetuação dos serviços de modo mais eficaz para atender a demanda do
capital (SANTOS,1979).
É possível entender que a (re) produção do espaço leva às novas formas
espaciais que consequentemente trazem ou reformulam relações socioculturais, pois se
considerarmos que a produção do espaço se estabelece não apenas de mudanças da
produção e das forças produtivas em que estão no espaço, mas também dos modos em
que a realidade do espaço se apresenta (LEFEBVRE, 1974). Sobre esta concepção de
produção do espaço Lefebvre (1974) comenta “en Hegel y en Marx, se vê que El
concepto se desdobla: de un lado está La producción de productos: las cosas los bienes,
las mercancias, y Del otro lado La producción delas obras: lãs ideas, lós conocimientos,
lãs ideologías e incluso las instituiciones o las obras de arte”.
Supermercados, lojas, escolas particulares, e outros serviços acompanham as
necessidades da classe média habitante dos condomínios residenciais ou os quais
habitarão os prováveis condomínios futuros de tal modo que redefine as dinâmicas do
espaço do bairro, dando novos significados. Isso corresponde ao processo de inserção e
consolidação do capital imobiliário que precisa ser essencialmente compreendido como
um processo que se desenvolve de forma desigual no o espaço, pois as manifestações
são resultados do interesse de um grupo, no caso do bairro de uma parte dos agentes
modeladores, Estado e os agentes imobiliários.
Compreende-se que o avanço do capital imobiliário leva a um progressivo
aumento do bem-estar no bairro usufruído pela classe média através das moradias, aqui
no caso entendido pela verticalização e conjuntos habitacionais ordenados, mas que se
distribuem de forma geograficamente desigual (SANTOS, 1988). Em decorrência disso
surgem os contrastes materializados nas formas de habitações e no conteúdo social.
Entende-se que as formas de habitações escolhidas pela classe média é resultado da
produção desigual do espaço que como consequência intensifica a violência que se
manifesta no bairro e a partir disso se cria o discurso de moradia com segurança por
parte da classe média. Em entrevista com um dos moradores de um conjunto
habitacional no bairro isso fica evidente:
“A violência “tá”crescendo no bairro né? Com isso a gente tenta buscar
melhor segurança pra nossa família. Aí fora aí a gente fica sabendo assim
ne, pelos outros, que as casas foram arrombadas, invadidas por usuário de
drogas pra eles roubarem móveis, televisores e tudo que der pra eles
conseguirem dinheiro pra manter o seu vício né? Então se a gente pode se
proteger disso a gente faz né? “(Trabalho de campo, 2013).
3. A (AUTO) SEGREGAÇÃO DA CLASSE MÉDIA
Considerando-se o conceito de auto-segregação a partir do que alguns
renomados estudiosos da questão urbana como Marcelo Lopes de Souza aborda o
assunto, percebe-se que há nessas auto-segregações uma fuga do lugar comum, aqueles
locais que todos compartilham e convivem. Nessa perspectiva, se tratando do Bairro da
Marambaia, é notório que o crescimento das fragmentações espaciais é também
resultado justamente dessa fuga de locais comuns. Isso se deve ao fato de que o bairro
da Marambaia, heterogêneo, no âmbito social e econômico, é (re) formado por agentes
que buscas realizar seus interesses na reprodução do capital.
Feitas algumas observações no trabalho de campo é possível notar que os
espaços onde a infraestrutura urbana é menor, assim como onde a concentração de
capital se dá de maneira diferente das demais localidades, são onde ocorre o maior
índice de violência, onde, por coincidência, os pobres moram. É importante relembrar
que a intensificação da violência é produto da formação desigual do espaço que é
fragmentado ainda mais com a diferença de detenção de capital e consequentemente de
serviços de infraestrutura.
A questão da auto-segregação talvez seja respondida pelo fato da violência,
consequência das desigualdades, estar crescendo e isso ocasiona a necessidade de se
buscar lugares seguros por parte daqueles que têm poder aquisitivo considerável. A
auto-segregação da classe média no bairro se dá de maneira diversificada, não sendo
apenas através de condomínios fechados embora os condomínios sejam a principal
característica dessa população que se separa dos locais comuns para ter um padrão de
vida mais seguro, mas também através da verticalização.
Se entende aqui que a segregação é resultado das ações do agentes modeladores
do espaço da Marambaia que através de suas relações desenvolvem a diferença de
moradia e acabam valorizando algumas áreas no bairro e criando condições para
melhores infraestruturas neles, por outro lado, onde a fronteira do capital imobiliário
não explora o lugar, se percebe a permanência do modo de vida da população pobre que
não é beneficiada da formação do espaço e são “afastados” de melhores condições de
infraestrura.
A violência é mais abundante nas periferias do bairro, logo ela se concentra
nessas localidades com mais frequência pelo fato de nesse local residirem populações
com menos condições de infraestrutura, com baixo nível de vida e onde o direito por
moradia melhor não é realizado. Analisando-se então a fragmentação do espaço entre
duas populações que são totalmente diferentes econômico e socialmente, uma composta
pela classe média que cada vez mais se afasta das periferias e outra pela classe que
continua “na mesma”, que é segregada pelas políticas de formação do espaço pelos
agentes imobiliários e Estado, a violência também se distribui também de forma
heterogênea.
4. AS DICOTOMIAS SOCIOESPACIAIS
Como a distribuição econômica e os índices sociais são diferenciados, a
segurança também se distribui de maneira diferenciada no bairro, onde há um
planejamento de segurança que é organizado pela Polícia Militar, que embora devesse
se difundir de maneira igualitária para atender a necessidade de segurança dos
habitantes garantindo-lhes assim o seu direito à segurança, distribui-se de forma
heterogênea, fazendo-se mais presente e com mais eficiência nos arredores onde a
classe com maior poder aquisitivo, ou seja, próximo aos prédios e conjuntos
habitacionais e áreas com melhor planejamento de infraestrutura com o objetivo de
atender a população que não se sente segura, mas que podem pagar por morarem num
lugar mais “seguro”.
Figura 02
Fonte: Trabalho de campo, 2013. Na figura anterior se percebe a presença de um PM BOX em uma localidade do
bairro em que a criminalidade se faz pouco presente por aí residir a classe média, onde
há um planejamento para a segurança pública.
Por outro lado, nos espaços “esquecidos”, onde as questões socioeconômicas são
inferiores, as políticas públicas, a segurança, por exemplo, dão-se de forma ineficiente
não atendendo os verdadeiros anseios da população. Assim, entende-se que o
planejamento de formação do espaço pelo capital não atende de maneira eficiente as
necessidade da população com menor poder aquisitivo e favorece a classe média.
Fonte: Trabalho de campo, 2013.
Na figura acima é evidente que a consolidação do capital se distribui
desigualmente no bairro, por conseguinte são nesses espaços que fica evidente que a
produção do urbano se dá de forma diferenciada e de acordo com os interesses dos seus
formadores.
RESULTADOS
Portanto, os resultados de campo, que ainda se processam no entendimento dos
autores do trabalho que cada vez mais compreendem as redefinições que o bairro sofre
perante a atividade do capital imobiliário, são importantes para a compreensão da
realidade em que as cidades brasileiras hoje se encontram, onde são sinônimos de
concentração de infraestruturas, informações, tecnologias e tantos outros, mas também
são heterogêneas pela (re) modelagem do espaço pelos agentes transformadores do
espaço que consequentemente intensificam a violência e a desigualdade.
Então foi evidente nesta pesquisa que o capital imobiliário encontra no bairro da
Marambaia uma nova estratégia para sua reprodução que atende a classe média e gera
consequências que fortificam a desigualdade e a violência. Pela localização estratégica
do bairro, um posicionamento geográfico central na cidade, o capital imobiliário
encontra no bairro uma nova frente de expansão. Então a pesquisa considera que o
bairro da Marambaia funciona hoje como fronteira do capital imobiliário.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
________________________, O consumo do Espaço. In: CARLOS, Ana Fani
Alessandri; (org.) Novos Caminhos da Geografia. São Paulo: Contexto, 2001. P. 173-
186.
CORRÊA, Roberto Lobato. O espaço urbano. 3° Ed. São Paulo: Editora Ática, 1995.
IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados estatísticos da população,
extensão territorial e coordenada do município de Belém. 2012. Abstraído do Site:
<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acessado em 12/06/2013.
LEFEBVRE, Henrí. La produción del espacio. Artículo publicado en: Papers: revista
de sociologia, Año: 1974 Nº 3, p. 219-229.
SOUZA, Marcelo Lopes de. Fobópole: o medo generalizado e a militarização da
questão urbana. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2008.
SANTOS. Milton. Economia espacial: críticas e alternativas. – 6. ed. reimp. – São
Paulo: Editora de Universidade de São Paulo, 2012.
SANTOS. Milton. Metamorfoses do espaço habitado: Fundamentos Teóricos e
Metodológicos da Geografia / Milton Santos em colaboração com Denise Elias. – 6. ed.
reimp. – São Paulo: Editora de Universidade de São Paulo, 2012.