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    A Profecia da Senhorada Pena

    Luis de Matos, 2013

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    AVISO:

    Contm linguagem mundana. A obra procura retratar as personagens como elas seriam mundo real, onde se faz uma modulao lingustica de acordo com os ambientes sociaisque se frequentam.

    Disclaimer:

    Esta uma obra de fico. Qualquer semelhana com nomes, pessoas, marcas comerciais, empresas,lugares, factos ou situaes da vida real ter sido mera coincidncia. Passa-se no tempo presente, em Svila medieval portuguesa, existente e real, onde se poder encontrar o Palcio da Pena e a Capela daSenhora da Pena que servem de ponto de partida para a fico. Contudo toda a construo de enredo,personagens, eventos, citaes e referncias so simples criaes literrias ou caricaturas compostas dmltiplas influncias que, partindo do mundo real, criam um universo imaginrio, sem pretenderem pa

    por descries factuais e rigorosas de nada nem de ningum.

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    PARTE I

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    CAPTULO I

    O caf estava frio. Vicente rodopiou a chvena no ar como se esse gesto aquecesse a cuitaliana expresso que tinha sua frente.

    - Sim, esta semana estou mais ou menos livre. Penso que s comeamos o Fojo da Mol para Setembro, por isso at l apanhas-me aqui ao telefone na esplanada e a beber cfrio. Esta porra no presta! Argh! Oh rapaz! Ento isto assim, p? Est frio. ummistela! Uma zurrapa do piorio! Sim, p, fala mais alto que no se ouve nada, tenhotelemvel todo fodido porque - oh mido, tira-me l um caf como deve ser, bemquentinho em chvena escaldada, p, um gajo paga mais caro na esplanada e ainda lcom estes nmeros! - dizia que tenho o telemvel todo refodido porque tinha-o comigquando ca na Cerveira l dentro do poo. Pois, p, nas grutas no h rede nem camelstica, rebolei por ali abaixo e quase partia o osso da perna quando bati numa rocmais sada. Se doeu, p? O que que tu achas? Sim, j estou bom, lixei o telefone torasguei o equipamento, mas j passou tudo. Agora o que eu quero mesmo um cafezinOh rapaz, 'ato o meu caf?

    O Arquitecto Joo Tavares ligava-lhe frequentemente quando tinha problemas com minas no Parque Nacional da Pena, logo aps a poca das chuvas. Vicente era

    espelelogo. Na verdade era um jeitoso, homem dos sete ofcios e de nenhum. " fono morro!", costumava dizer. Seguia os passos do seu av que o criara, a quem chamafectivamente "pai", homem humilde da Eugaria que andava jorna na agricultura e jardinagem das casas mais abastadas do vale de Colares. Vicente era tudo, mas o qgostava mesmo era de andar nas grutas da Serra. Aprendeu a explorar cavernas commelhores, fez cursos de segurana, andou nos bombeiros, estudou a fauna, criou grupoentusiastas. Aos 12 anos tinha um morcego de estimao que dormia no telhado l dcasa. Hoje trata-os por tu e conhece todas as espcies que povoam o territrio nacionAs correntes freticas da Serra de Sintra no tm segredos para ele. Desde muito noajudava a desentupir poos, a reparar minas e a levar gua s fontes mais seculares quiam deixando entupir com o tempo. Ajudou nas escavaes arqueolgicas do Castelo Mouros, onde encontraram algumas galerias mais pequenas. Foi ele que, h uns anos bresgatou um grupo de midos que se meteu pelo poo da Quinta da Regaleira - aindaquilo era dos japoneses - e se perderam no labirinto de tneis. Foi dar com eles sentano escuro, c no cho, numa reentrncia mais escondida, a tremer de frio e de medo, deles todo borrado, calas, trusses e tudo.

    - Mas ento o que ? Alguma mina? Sim, sei. Vejo. Sei. Quando? Ah, sei. Sim, sei. pilim? O pilim, p. O graveto. J sabes, sem maravedis no h palhaos... A gente tem

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    comer - e beber a porra do caf! Oh meu! 'Ato o meu caf, p?! Andas a dormir ou qOlha que eu quero isso bem quentinho! - dizias tu que eram quantos? O qu? Ah! 'Tbem, filho. J sei, j sei. O oramento, j sei. Mas neste pas ningum paga a ninguquem se entala aqui o "je". Sim, o "je". Porra! O "moi". O M-U-, o "moi"! Isso

    filho, eu. Sim. Ento v l o que que arranjas, p, que isso de ir de borla no p'ra miTomou o pacote de adoante que vinha com a nova chvena de caf expresso.

    - Oh rapaz, eu pedi isto? Quero acar a srio. Isto no nada. So comprimidos dfarinha. Eu pareo-te gajo que coma disto?

    - Desculpe senhor...

    - V l e despacha-te, que seno o caf fica frio. Eu no gosto de caf frio!

    O rapaz correu ao balco e voltou com um pacote de acar. Vicente despejou-o comeou a mexer.

    - Sim, claro que fao o servio. No me importo de receber semana. Isso para mutempo?... Sei... Eh p, se calhar ainda bem. Conta comigo.

    Fez uma pausa para chegar a chvena boca.

    - Foda-se! Apre! Puta que o pariu mais o caralho! No, no contigo, no! a chvque est a arder, esta merda... Foda-se!...

    Pousou a chvena quase a entornando, sempre com o telemvel ao ouvido.

    - Queimei-me, p! Queimei-me! Irra! No! No! No, no vou para a dizer asneiras. bem, 't bem, eu sei, filho, eu sei o que uma capela e que preciso respeito, mas tenhboca a arder! Porra de chvena escaldada! Apre...

    O empregado deixou a bandeja no balco e fugiu para a cozinha.

    - L estarei amanh. Ento tchau!.. Apre!...

    Soprou a borda da chvena e bebeu com muito cuidado esticando os lbios como se fodar um beijo a um chipanz. O caf, cremoso, envolveu-lhe as papilas e encheu-o prazer. Respirou fundo.

    - Aaaah!... No h nada como um cafezinho bem tirado e quentinho!... Quanto devo?

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    CAPTULO II

    O solo em frente ao altar da Capela de Nossa Senhora da Pena, no antigo Convent Jernimo da Pena em Sintra, hoje Palcio Nacional da Pena, apresentava um buraco larga dimenso. Havia alguma terra numa das bordas sobre um plstico esbranquiado j tinha sido transparente. Vicente e o Arquitecto Tavares entraram pelo corpo da Capee estavam de frente para o altar. Alguns homens em fato de trabalho limpavam os ltimresqucios de terra que levavam para o ptio l fora onde um monte maior se encontraO cheiro no ar era pouco vulgar. Vicente sabia reconhecer a morfologia de um tnel ouuma gruta pelo seu cheiro. Mas ali o almiscarado da terra muito hmida juntava-sealgum bafio como se viesse de uma sala que estivesse fechada h muito tempo, mas oar fosse, de algum modo, respirvel. No era ftido, era apenas um suave mofo.

    - Dra. Mila, importa-se de chegar aqui, queria apresentar-lhe o nosso espelelogo.

    Erguendo-se do cho, onde estava deitada com a cabea dentro do buraco aberto frentealtar, a Dra. Mila levantou-se, sacudiu alguma da terra que se agarrara ao fato de macatirou as luvas que bateu uma na outra e desceu as escadas at ao lugar onde o ArquiteTavares a chamara. Quando chegou tirou o capacete de proteco, soltando o cabeloestendeu a mo a Vicente, que no pode deixar de imaginar o corpo esguio que socultava nas roupas de trabalho muito masculinas, mas justas. A mo de Mila no era auma arqueloga ou de algum habituado a trabalho rduo. Sentiu firmeza, mas suavidaAs unhas estavam bem tratadas e o sorriso muito aberto s era escondido por uma dmadeixas de um castanho muito claro e primaveril que lhe caiu no rosto.

    - Vicente, apresento-te a Dra. Mila Santos, Historiadora de Arte, que est connosco dirigir os trabalhos de restauro da Capela. Ela vem da Universidade de Florena ondeformou, mas portuguesa.

    - Muito prazer - disse Vicente, contido, ainda surpreso por aquele raio de sol numverdadeiro estaleiro de obras. Ela no devia ter mais que 28 anos, pensou...

    - O prazer meu, Sr. Vicente. Creio que nos poder ajudar muito.

    - No me chame "senhor" que me faz velho... - disse Vicente, rapaz para no mais de u35 anos, mas com pretenses a parecer ter uns 30. Fez-se ao elogio e deixou a pausa nopara ver se ela a rematava.

    - Velhos so os trapos, no verdade? - disse ela - Est bem, trato-o sem o "senhorQuer vir comigo ver o buraco?

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    - Claro. - disse Vicente, fazendo trocadilhos juvenis na cabea e piscando o olho aArquitecto Tavares quando passou por ele, puxado pela mo de Mila.

    - Venha da.

    Era um rombo irregular no cho, suficientemente largo para nele caber um armridemasiado pequeno para ser um acesso intencional a alguma sala ou gruta que estivesssubsolo da capela.

    - Como que isto aconteceu? - perguntou Vicente.

    Mila olhou para o Arquitecto.

    - No lhe contou como foi?

    - Ainda no.- Bem, na verdade foi por causa do sismo. Lembra-se? H umas semanas?

    - J foi h dois meses. - corrigiu Tavares.

    - Aquela merda?

    Tavares fuzilou Vicente com o olhar.

    - Quero dizer, aquela porr... Aquela... Aquela trepidao... toda? Aquela?

    - Sim.

    - Houve estragos em muitos edifcios e monumentos nacionais e ns no escapmoscomplementou o Arquitecto Tavares, tentando manter um tom normal e fazer esquecer

    gaffe .

    - Eu ouvi qualquer coisa na televiso - respondeu Vicente - Acho que quem entalou o foram os padrecos em Ftima, no foi? Aquilo no aguentou a chapada e parece quenova Baslica tem rachas por todo o lado!

    - Vicente, modera a lngua, este um espao sagrado. - repreendeu Tavares.

    - Peo desculpa aos presentes, foi sem inteno. A Baslica est cheia de fissuras, era oeu queria dizer. Fissuras pela m construo. Desculpem.

    Mila riu-se para dentro. Notava-se que Vicente no se continha, mas era de impulsgenuno, no era maldade.

    - Vicente, quer entrar l dentro?

    - muito grande? Tem tnel ou uma cripta?

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    - Sim, tem um tnel. Se descer tenha cuidado que h uma pedra que perigosa paracabea. Ponha um capacete de segurana.

    - Obrigado Mila, um gajo no quer partir os... partir os ossos logo no primeiro dia!

    Riram-se do quase deslize, evitado no ltimo momento.- Vicente, veja l no os parta nem no primeiro dia, nem nos outros! - brincou Mila.

    - Os ossos... - disse Tavares, no resistindo, mas ao mesmo tempo querendo mantercompostura da conversa.

    Vicente desceu agarrado a uma escada metlica.

    - Muitas igrejas e capelas tm criptas por baixo - disse ele com a cabea virada para c

    enquanto descia.- verdade - confirmou Mila - Depois explico-lhe porqu. J chegou ao fundo?

    - J. Pensei que fosse mais fundo! s uns metros. Sero dois andares?

    - Isto s o incio. H um tnel direita. Consegue v-lo?

    - Sim - a voz de Vicente estava cada vez mais abafada e distante - Eh p, isto ainda deum bocado. ngreme.

    - Vai dar a uma cisterna seca e depois segue.Vicente continuava a falar, mas j no se entendia o que dizia. Parecia satisfeito comque via. Ao fim de uns minutos voltou a ver-se a luz do seu capacete no fundo do burac

    - Interessante, Tavares. Muito interessante. Olha o que eu encontrei! O segredo de Sintr

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    CAPTULO III

    O fumo espesso do charuto cubano envolveu o extico candeeiro Tiffany que banhavsala com uma luz esverdeada, seca. Um raio de sol entrava por uma nesga da janela cbatentes estavam fechados, cortando como uma faca a pastosa claridade artificienvolvente.

    - Foi em Praga, num leilo. Foi l que o comprei. - disse o Engenheiro Malador levandcharuto boca.

    - magnfique. - respondeu Jean-Charles Tremblay, com o seu forte sotaque entre

    francs canadiano e o portugus alfacinha.- No acha que destoa um bocadinho da envolvente? - perguntou Motta.

    - No percebo. - contestou Malador, prolongando o olhar de interrogao com um soprmais vigoroso, que levou o fumo quase ao meio da sala.

    - Ento, Engenheiro, no v? O Palcio da Pena de mil oitocentos e picos, mas decorao do seu gabinete est entre oart nouveau , o kitsch mais brega e o exticooriental com estes tapetes persas muito coloridos.

    - O Palcio pode ser o que quiser ser, l fora. Eu no trabalho para o Palcio. Sou Presidente da "Mons Lunae - Gesto de Floresta, Recursos Naturais e EdifciosMonumentais - Empresa Pblica". Eu que mando no Palcio. Por isso, no meu gabinc dentro, a poca que eu quiser e ningum tem nada com isso.

    Motta no se conformou.

    - Tenha pacincia, mas voc tem um Cargaleiro ao lado do galo de Barcelos!

    - Motta, deixe-se de esttica, que o seu campo a explorao de minas. Deixe para estetas o que s os estetas podem compreender. - disse Malador com um arcondescendente.

    - Balelas... - contestou o Engenheiro Motta.

    - Acha 74.000 Euros balelas, Engenheiro? Acha? Pois foi o que custou o candeeiro. original!

    - Voc que um original, Malador. No h outro como voc... E isso foi comprado posi, ou foi o "contribuinte"?

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    - Para que saiba Motta, quando fui nomeado Secretrio de Estado da Indstria passeitrabalhar no melhor interesse do contribuinte. Voc no se pode queixar. A sua emprefamiliar estava a morrer, ou no? Era contribuinte, mas no via um cntimo de volta. quanto tempo as minas estavam quase paradas? Se no fosse eu, com o melhor intere

    dos contribuintes em mente, onde que voc j estava? Ai agora no responde? Ecandeeiro foi pago pelo contribuinte quando estive em Praga numa feira industrial, mtem estado ao meu servio desde ento. E estando ao meu servio, est ao servio do poDo "contribuinte", como gosta de lhe chamar. No malbaratei o dinheiro. Investi-o emnome do colectivo e o bem aqui est, em uso, para todos verem.

    - Eu bem digo que voc exemplar nico. Como foi que o trouxe da Secretaria de Estadepois de ter vindo trabalhar para aqui?

    - Isso o mais fcil... - e deixou o enigma ficar no ar propositadamente enquantreclinado para trs na cadeira, brincava com o charuto entre os dedos da mo direita.

    O Coronel estava de p, procurando ver de perto uma tela que lhe parecia curiosa.

    - Ento voc no diz nada, Coronel Oliver? - perguntou Malador.

    - Estava aqui a ver este quadro. Est um bocado escuro, mas isto um...

    - Sim, sim. um Bordalo Pinheiro original. Veja no canto inferior direito, est l"Columbano". Vocs na Amrica no tm disto.

    O velho Coronel voltou-se e sorriu.

    - H muita coisa que no temos l. E muita coisa que viemos buscar aqui. Se que mentende...

    - O Bordalo tambm foi pago pelo Z? - perguntou Motta.

    - Quem?

    - Pelo Z Povinho? Se foi pago pelo pagode?

    - Ah! Sim... - riu-se - Pode dizer-se que sim. Fui busc-lo a Londres. Estava a leiloSotheby's, na coleco de um daqueles nobres ingleses que tinham negcios em Gaia, o vinho do Porto. O que nosso anda l por fora. Se no fosse eu...

    - Um verdadeiro mecenas - disse Motta com ironia - E a si ainda no lhe fizeram umesttua?

    Malador no percebeu a subtileza.

    - No. - fez uma pausa, reflectindo - Mas olhe, tenho uma rua com o meu nome. L nCovilh. Um primo meu, que me devia um favor, l o pus no partido e foi a Presidente

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    Cmara, um desgraado, nunca fez nada na vida, o pai era rico, mas ele era o mapreguioso dos irmos, por isso estava para ali atirado sem fazer nada, l o pusemos coPresidente. Depois houve aquilo dos fundos para os lanifcios e a coisa l se resolveu, se um Parque Industrial novo, reclassificaram-se umas terras que no davam nada

    lavoura e abriram-se umas fbricas. E a rua principal do Parque tem o meu nome.- O senhor sabe-a toda. - disse Motta, palavras que Malador recebeu com indisfarvprazer - Mas aquilo agora no est s moscas?

    - No. a avenida principal do Parque. dela que saem todas as ruazinhas dos armaze das fbricas.

    - Sim, mas ainda h l fbricas? Eu ouvi dizer que...

    - No, fbricas h poucas - interrompeu Malador - Aquilo tem fechado tudo. a crisSabe como , acabaram os fundos estruturais estratgicos e aquilo parou um bocadinho

    - Ou seja, est s moscas...

    - As fbricas sim. Pensei que se referia minha avenida...

    - Por quem , Engenheiro, por quem ! Claro que no. A "sua" avenida ser sempre a avenida, cheia de trnsito e de gente.

    - J lhe disse que a avenida principal?

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    CAPTULO IV

    - O segredo de Sintra!Vicente subia os degraus da escada metlica. Quando a sua cabea emergiu vinha cuma lata de Coca-Cola em cima do capacete de segurana.

    - Vejam, esta lata est aqui h centenas de anos! - disse, brincando - Vamos reescrevehistria das bebidas aucaradas!

    Mila riu-se. Tavares olhou para os auxiliares que l estavam.

    - Mas quem que deixou isto l em baixo?- Fui eu, senhor Arquitecto. Desculpe, era para a trazer para cima e esqueci-me... - dium deles, levantando a mo, enrascado por to infantil falta.

    - Que no se repita. Esto a ouvir todos? L em baixo no quero nem comida nemrefrigerantes. Se precisarem de gua tm os cantis, mas aquilo no uma esplanadaTavares estava irritado e ao mesmo tempo envergonhado com o comportamento dos sefuncionrios. Era um homem estrito, muito competente e gostava de ordem e de limpeNo admitia faltas de rigor e o desleixo deixava-o fora de si.

    - Bom dia a todos - saudou o Engenheiro Malador, entrando na capela, acompanhado dsuas visitas.

    - Bom dia, senhor Engenheiro. - cumprimentou Tavares.

    - O que temos aqui? - inquiriu Malador ao ver Vicente.

    - Engenheiro Malador, quero-lhe apresentar o Antnio Vicente, espelelogo. Vai-noajudar nas exploraes. - disse Tavares apontando para Vicente, que tirou o capacete

    proteco e estendeu a mo.Malador no se aproximou, deixando-o com a mo oferecida, suspensa no ar.

    - Quem que lhe disse para chamar um espelhlogo? - perguntou em tom severo Tavares.

    - Ningum, mas como o senhor Engenheiro sabe, a descoberta de novas galerias obrinos a ter especialistas e aqui o Vicente um dos mais experimentados de Sintra.

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    - Nem pense nisso! Isto no para amadores! Isto trabalho para quem sabe. Apresenlhe o Engenheiro Motta, que vai dirigir as exploraes que vierem a ser feitas de agoradiante.

    - Muito prazer. - disse Motta, um pouco embaraado e de sorriso tmido olhando os questavam na capela.

    Tavares interrompeu as formalidade.

    - Senhor Engenheiro, no sei quem o Engenheiro Motta, mas pode confiar no meamigo Vicente, que j nos tem ajudado em outras alturas aqui no Palcio e...

    - Cale-se, que isto no tem nada a ver com o Palcio. Isto uma deciso da Mons Lunaponto final. O Engenheiro Motta Engenheiro de Minas e est aqui porque eu quero. E que sei em quem confio. Por isso - e apontou para Vicente - ponha-se a andar, que nest c a fazer nada.

    Vicente ficou sem reaco. Olhou para Tavares e depois para Malador, que mantinhaexpresso lapidar no rosto.

    - Eu no quero causar problemas... Se querem que eu v, eu...

    - Est quieto, Vicente. Tu ficas. - ordenou Tavares.

    - Arquitecto, Arquitecto - comeou Malador - Vocs no tm autoridade. Eu queescolho a equipa e esta a equipa. A Mons Lunae tem os seus compromissos e eu questa equipa aqui - desviou-se para apresentar os outros dois - Alm do Engenheiro Motambm teremos a ajudar-nos o Dr. Jean-Charles Tremblay, adido cultural da Embaixado Canad em Lisboa, especialista no perodo histrico do Romantismo Europeu e Coronel Oliver Rosenberg, da Embaixada dos Estados Unidos, que nos pode ser dgrande valia.

    Ambos fizeram uma curta vnia para o grupo, visivelmente acanhados.

    - Pode escolher a equipa que quiser. At pode trazer o Cristiano Ronaldo, mas o Palctem uma palavra a dizer e eu quero c a Dra. Mila e o Vicente. - disse Tavares, com umvoz firme, que no disfarava o tremor que lhe ia por dentro.

    - Ela pode ficar, mas ele est a mais.

    - E um militar americano no est? - A coragem de Tavares em falar no era acompanhpela sua pose, muito nervosa, de confronto tmido.

    - Cabe Mons Lunae valer-se dos consultores que entender. Por favor, no insulte pa

    que so nossos aliados h muitos anos. Eles ficam. O Indiana Jones vai. No se esqueque o estatuto mudou, agora somos ns que gerimos a Serra de Sintra toda, parqu

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    floresta, jardins, Palcio e tudo. Tudo. A Mons Lunae no vai permitir insubordinanem gastos imprevistos. Mando eu e no h oramento para excessos.

    - Para gastos relativos ao Palcio temos tudo averbado. E nem pode ser de outro modo,contratei o Vicente por seis meses que h muito trabalho para fazer alm deste. Ele ago meu funcionrio. J no amador. - disse Tavares.

    Vicente ainda fez meno de dizer que no se importava de ir, mas foi parado com ugesto por Tavares.

    - Voc deve pensar que o dinheiro dos contribuintes para gastar como quiser! - berrMalador no se apercebendo da ironia - Aqui cada centavo conta. Quer que o homefique, pois que fique, mas se faltar graveto para o salrio dele... do seu bolso que o tPercebeu, sua besta? E tenha cuidadinho quem enfrenta. Pode dar-se mal.

    - No se preocupe, Engenheiro, que eu no fao jogging na mata sozinho...

    Malador quase explodia. Fez um gesto com a mo, que suspendeu. Ento rodopiou e sintempestivamente. A sua comitiva no sabia o que fazer. Com um improvisado acenodesculpas saram para o ptio exterior. De l ainda se ouviu Malador berrar:

    - E algum que v mostrar a merda do palcio aos estrangeiros. Mas que no sejaTavares, que hoje j no o posso ver mais. Estou no meu gabinete se precisarem de mim

    O Arquitecto Tavares ficou plido. Mila aproximou-se e deu-lhe uma palmada nas cosdizendo:

    - assim mesmo, Tavares. O gajo merece. Algum tem de lhe fazer frente. TavareTavares???

    O Arquitecto comeou a virar os olhos e a desfalecer. Os outros acudiram-no, mas quano o agarravam e foi a custo que se manteve de p. Depois cambaleou para um cantocapela e comeou a vomitar incontrolavelmente. Eram os sinais do nervosismo. J tipassado o momento, mas a tenso era arrasadora e Tavares no aguentou. Ainda co

    restos de suco gstrico a pender da boca sentou-se no coro da capela e deixou a cabecair. O seu fato impecavelmente negro e a gravata de um azul intenso e profundo estavagora cobertos de restos de comida que bolsara sem controlo. Com a cabea entre mos, quase em posio fetal, ali ficou em silncio.

    Vicente aproximou-se.

    - Tavares, no te preocupes, eu vou embora. No arranjes mais problemas.

    - No! - berrou o Arquitecto - No serei um pau mandado. Tu ficas!

    E com mais sinceridade do que raiva disse:

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    - Preciso de ti, Vicente. Deus sabe como preciso de ti aqui.

    Vicente ficou desconcertado. Trocou um olhar com Mila, que estava igualmente surpreDeu um abrao ao amigo e disse-lhe ao ouvido:

    - C estarei, Tavares. C estarei.

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    CAPTULO V

    - Dra. Mila, veja l, se quiser podemos voltar noutro dia. - disse Jean-Charles copreocupao.

    - No. - respondeu ela - Eu tambm preciso desanuviar. Aquilo l dentro foi... intenso. mostro-vos o Palcio agora. Vai-me ajudar a pr os pensamentos em ordem.

    - No leve a mal, menina, mas isto no pr'a mim. - disse Motta - Eu sou mais homem cincias do que de histria. E depois j conheo o Palcio desde que era puto. Voandando.

    - Respeitosamente, Dra. Mila, eu tambm me retiro porque tenho de estar na Embaixadentro de uma hora. - o Coronel Oliver aproveitou a deixa.

    Mila e Jean-Charles despediram-se com a formalidade devida.

    - Vocs tm c alguma cafetaria? - perguntou Jean-Charles.

    - Sim, h ali uma esplanada com uma vista fantstica sobre o Parque.

    - Importa-se que a convide para tomar uma gua comigo? No sei porqu, fiquei co

    alguma sede depois daquela discusso.Dirigiram-se esplanada da cafetaria, situada sobre as antigas cavalarias do Palcio, js velhas cozinhas. Jean-Charles pediu a sua gua bem gelada, Mila ficou-se por umlatte .A vista era deslumbrante. Ao fundo, quase de um lado ao outro no horizonte longnquo rio Tejo entrava pelo mar dentro, que desaparecia direita no infinito. No primeirplano um tapete compacto de verde fazia o Palcio sobressair como um navio num magitado. Este tapete estendia-se a sul at um monte que se alava sobre a encosta aqui erochosa, aqui e ali muito cerrada, terminando num pico encimado por uma cruz num

    base slida que sobressaa das rochas agrestes em seu redor.- a Cruz Alta - explicou Mila - o ponto mais alto da Serra de Sintra, com 528 metroH uns anos foi atingida por um raio. Alis, durante a histria do Parque, houve ali vrcruzes, porque de vez em quando um raio d cabo dela.

    - No admira.

    - Daqui no se percebe, mas esta uma reproduo da mais antiga, em estilo manueliReproduz uma rvore seca, com os ndulos mortos. H uma igual, mais pequena, aqu

    entrada.

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    - Ah! Eu vi. O que o estilo "Manuel Lino"? o nome de um arquitecto, no ?

    Mila riu-se. Depois procurou recompor-se, de modo a no parecer que zombava da gaffe do canadiano.

    - Deve estar a confundir com o Arquitecto Ral Lino. Mas no a mesma coisa! O RaLino foi discpulo do Albrecht Haupt e morreu em 1974.

    - Ento no h um Arquitecto Manuel Lino?

    - Deve haver, mas o estilo no dele. Diz-se "Manuelino", numa s palavra. Refere-senosso rei D. Manuel. um gtico tardio portugus. Caracteriza-se por ser um estilflamejante, escultrico e decorativo, onde os elementos martimos da epopeia dDescobertas so integrados harmoniosamente nos elementos decorativos do gticflamgero quatrocentista.

    - Por isso se riu! - Jean-Charles sorri e, colocando a mo sobre o pulso de Mila pousasobre a mesa, confessou baixinho, com se fosse contar um grande segredo - No percquase nada do que disse, porque o meu portugus um bocado bsico.

    O sotaque afrancesado era muito musical. Mila sentiu o calor agradvel da mo de JeCharles, olhando-o instintivamente nos olhos, que j se tinham desviado e vagueavsoltos de emoo.

    - Quebtte que eu sou! Tudo isto deve ser manuelino, claro e eu aqui a pensar numarquitecto. As vossas Descobertas so o perodo mais importante da vossa histria! Je suis fou, je suis.- riu. Parecia um menino, alegre e inocente.

    No estava frio, mas Mila sentiu um arrepio de prazer no brao.

    - No, Dr. Jean-Charles, o Palcio tardio, de meados do sculo XIX, o estiloManuelino do sculo XIV. - A voz era condescendente e maviosa. Mila ria-se podentro, tanto de graa como de prazer.

    - No me chame de Doutor. to formal. Vamos trabalhar juntos. A mim vai chamar-mde Jeany, que era como me chamava a minha me - dizendo isto deu-lhe uma palmadinno brao e tomou o copo para beber mais um pouco de gua.

    - Muito bem, Jeany. Porque no? O meu nome j sabe, Mila. No tenho outro mapequeno. - disse ela estendendo a mo como para o cumprimentar.

    Jean-Charles tomou a sua mo, levantou-se da cadeira, e levou-a aos lbios, beijandcom uma vnia.

    - Enchant . - disse, batendo os calcanhares um no outro.

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    Mila sorriu embaraada. Cobriu os olhos como se quisesse ocultar o olhar juvenil doutros visitantes que disfrutavam do sol na esplanada. Riu, levantou-se e fez um plie como lhe haviam ensinado noballet em criana.

    - Enchant - respondeu.

    - V? Agora j lhe posso dizer que me lembro de ter estado na Torre de Belm e n Jernimos quando cheguei a Portugal, h uns cinco anos. J me lembro. E logo nepoca fiquei convencido que eram os dois do tal Arquitecto Lino. Mas voc fez por mhoje um grande servio. E poupou-me umembarras qualquer dia numa recepo naEmbaixada. Obrigado, minha amiga.

    - No tem de qu, Dr. Jean-Charles.

    - Jeany... - corrigiu ele.

    - Sim, Jeany... Desculpe.

    - Desculpa...

    - Sim, desculpa. - Mila parecia uma bailarina desajeitada, tropeando de palavras epalavras como quem no conhece a msica.

    Jean-Charles terminou a gua e pousou o copo com um largo sorriso.

    - Sabe de uma coisa? Gostava que este momento se prolongasse no tempo. Aquediscusso, h pouco, foi muito desagradvel. Mas agora aqui, consigo, o tempo pareceeterno.

    - da magia do Palcio. muito belo.

    - Disparate. Empalidece ao seu lado. Estoudesol de vir conhecer a Pena consigo. Assimno vou apreciar o lugar com a mesma distncia tcnica. Olho para si e para o seu Pale parece que a vejo numa tela em que ele a moldura e voc amuse .

    Mila ruboresceu. No sabia bem o que dizer. Ria por dentro como uma perdida, maqueria manter um ar de respeito.

    - Jeany, voc um perigo. J vi que diz isso a todas...

    - Desculpe o meu atrevimento. Foi involuntrio. Desculpe. No volta a acontecer.

    - Espero que no. No me faa repreend-lo outra vez. - A falta de convico na voz notria.

    O telefone de Jean-Charles fez um sinal. Pegou nele como que para ler uma mensageDepois olhou Mila.

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    - Que pena, tenho de regressar a Lisboa. Mas eu gostava tanto de conhecer a histria Palcio.

    - Amanh temos o dia ocupado com o incio da apreciao tcnica do subsolo da capemas no dia seguinte eu tenho folga, por isso posso c vir consigo.

    - Fazia isso por mim?

    - Claro. No trabalho nenhum. Fica ento para Quinta-Feira.

    - Voc uma joia, Mila. Desculpe aquilo de h um bocadinho.

    - No faz mal.

    - Eu no a queria envergonhar. J vi que tem namorado. Desculpe a minha... como

    diz?...impulsivit .- No se rale, Jeany. No, no tenho namorado, se isso que quer saber. Estoudemasiadamente ocupada com o meu trabalho para pensar em homens! Tambm, comque me tem sado na rifa!... No se aproveita um.

    - Bof! No se deixe desanimar. No so os portugueses que dizem "Quem espera sempalcntara"?

    Mila riu-se.

    - mais ou menos isso, Jeany. Mais ou menos.

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    CAPTULO VI

    - Estes tneis so muito estreitos - queixou-se Tavares.- E baixos! - acrescentou Mila, pondo a mo sobre o capacete.

    - natural. Isto muito antigo - explicou Vicente.

    - O que que uma coisa tem que ver com a outra? - Mila no percebia a relao. Havtneis antigos que eram mais largos...

    - A Serra de Sintra est cheia de tneis como estes e so pelo menos da poca mediev

    Ora vejam os traos da construo - disse Vicente, apontando a luz para uma das parede passando a mo pela parede rugosa. - Foram cavados fora de picaretas e outrinstrumentos de metal, batendo, batendo, batendo. Isto no fcil de fazer. rocha viDoutora, material rijo de se escavar!

    - E andavam procura de qu? - perguntou Jean-Charles. - Tanto trabalho... Para algimportante seria...

    - Na maior parte dos casos que eu conheo, e eu conheo a Serra muito bem desde miprocuravam gua. Mas h muitos tneis que no parecem ter sentido nenhum! E segupor centenas de metros e depois acabam sem se perceber onde queriam chegar. mucomum c em Sintra. - Vicente falava alto, de modo a que todos o ouvissem.

    - O homem medieval era de estatura mais baixa do que a nossa actual, talvez por isso egalerias sejam to baixas e apertadas. - sugeriu Tavares.

    - Sim, por isso. - confirmou Mila - Fiz um estudo sobre roupa na corte Portuguesa atempo de D. Diniz e fiquei surpreendida com as medidas da maioria da nobreza, a quera j de si de estatura um pouco mais alta do que os serviais e o povo.

    - Mas os tneis deste tipo no eram s escavados para procurar veios de gua e minasinterveio Motta.

    - Ento que mais ia fazer algum andar a partir rocha slida marretada? - perguntoVicente.

    - Era precisa muita motivao, Engenheiro - concordou Jean-Charles - O que seria?

    - por isso que eu c estou. Minas, meus caros, minrio. A procura de metaisEspecialmente ferro e prata. E sal. - respondeu Motta.

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    - Mas em Sintra? - O tom de Vicente era de dvida. - Nunca ouvi falar. - L porque tinhum canudo, o velho achava que conhecia a Serra melhor do que ele.

    - No, meu caro, em Sintra talvez no. Mas o que lhe digo que estes tneis no sdiferentes dos tneis de minas de prata que encontra por toda a Europa. Eu fiz um estgna Floresta Negra, na Alemanha e recordo-me de galerias para extrao de minrprecisamente iguais a estas. As Alems so do sculo XII e XIII. O mtodo de constru idntico. E a geologia do terreno muito parecida.

    - No h actividade mineira conhecida em Sintra, Engenheiro - contraps Tavares.

    - Talvez por ter sido uma montanha sagrada houvesse algum tabu e ningum a quisesabrir - ofereceu Motta.

    - No por ter sido. Ela ainda sagrada.- corrigiu Tavares.

    - Voc sabe o que eu quis dizer. As supersties dos povos mais primitivos j l vo. Ho mundo diferente.

    - Mas a montanha permanece sagrada. - insistiu Tavares.

    Motta no quis discutir.

    - Que seja, senhor Arquitecto. O que quero dizer que pode ter havido motivo parnunca se terem explorado as potencialidades geolgicas da Serra de Sintra. Tanto quansei, a formao da Serra deu-se por intruso magmtica. Por isso formaram-se rochaalguma profundidade que demoraram uns quantos milhes de anos a subir superfcpor aco das foras tectnicas e telricas. Talvez a maior quantidade dessas rochas eSintra seja grantica. Mas tambm h uma plataforma calcria significativa, que constituda por sedimentos cristalizados, os quais foram quebrados pelas rochas que iaascendendo durante o perodo de formao da Serra. Ou seja, podem haver interessanjazidas de quartzo e outros cristais, que vemos em partculas pequenas no granito. Podainda haver veios de rochas metamrficas. No se esqueam dos mrmores de PePinheiro e Montelavar. H muita coisa valiosa que pode estar debaixo dos nossos ps.

    - Isso um parecer tcnico? - perguntou Malador, que vinha l atrs, mas acompanhavconversa com interesse. Afinal a Mons Lunae geria todos os recursos da Serra, incluindseu subsolo.

    - No, Engenheiro Malador. No se entusiasme. Estou s a falar por falar. A Serra dSintra elevou-se de um solo mais ou menos plano. Basta olhar em toda a volta. Esse splano era feito de sedimentos que aqui chegavam ao esturio do Tejo e se depositavaEst a ver os agitadores, que parecem tampas de panela, que usam os garimpeiros nos r

    Esta zona era mais ou menos assim. Vinham ter aqui areias e sedimentos de todo o ladque criavam camadas e solidificavam em rocha. Uma erupo magmtica que no che

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    superfcie, portanto, que no fez um vulco, elevou a montanha do meio desssedimentos. As foras tectnicas so tais que, com o calor e as presses houvmetamorfoses vrias. Foi o caso dos mrmores. Quando o magma solidificou e arrefecdeu origem, por exemplo, ao granito, entre outras rochas que ainda hoje encontramos

    Serra. Ou seja, aqui havia um enorme agitador de garimpeiro, mas nunca se fez o trabade garimpo. O que aqui est, ningum sabe bem. Mas o que certo que parecem tandado procura, num passado distante.

    - Como que sabe? - perguntou Malador.

    - Note, logo no incio h um trecho do tnel que composto por grutas de formaonatural, abertas pela fora da gua. Nada de estranho. Depois passmos por um segmenonde andmos num aquaducto, at cisterna seca e dali chegmos a uma pequena snatural e desta ao tnel onde estamos agora. Ora, este tnel artificial e no para extrgua. Foi aberto a pulso na rocha, a golpes de metal. E isso frequente na poca medieH muitos exemplos, como o que j contei da Floresta Negra, e isso chama a ateno.no era para conduzir gua, era para explorar o qu?

    - Queres ver que foram os sete anes que escavaram isto... - brincou Mila.

    - No foram, mas podiam ter sido. - disse Oliver .

    - J c faltava o Disney. Vocs americanos querem tudo ao vosso jeito. Oliver, olhe quehavia mineiros anes antes dos desenhos animados! - brincou Vicente, rindo-se.

    - Ora notem como aqui o tnel mais alto, mas continua estreito e como h madeira escorar o tecto ali em cima. - disse Motta.

    Todos olharam. As luzes dos capacetes convergiram num toro de madeira que amparaas paredes transversalmente cerca de um metro abaixo do tecto. Aos poucos o tntornava-se mais alto e exguo, com vrios toros idnticos a diferentes alturas. Uns metadiante j no se conseguia ver o topo do tnel, que desaparecia na escurido.

    - Mas que coisa esquisita... - disse Tavares - Estamos numa autntica fenda, um corredde uma altura impossvel de determinar, cujas paredes so sustentadas por madeira.

    - Deve ser uma chamin. - acrescentou Motta, olhando com muita ateno para cimaTambm deve ter sido aberta pelo homem. Daqui no d para ver, mas no deve snatural.

    Vicente tentava ver at onde se abria aquele abismo ao contrrio, acima das suas cabea

    - Eu j volto. - disse, impaciente. Nisto fez um esforo para alcanar um dos toros dmadeira e, uma vez pendurado nele, alou-se de modo que subiu e se equilibrou nele,p.

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    - V l, no caias! - gritou Tavares, surpreendido pela agilidade do espelelogo.

    Vicente olhou para baixo e, daquele toro alcanou um outro, de tal modo que em poucminutos tinha escalado vrios metros e conseguia alcanar com a sua lanterna mais long

    - uma chamin, mas no sei dizer a que profundidade estamos. - gritou l de cima. - I tudo escavado.

    - Bem me quis parecer. - disse Motta - Avancemos enquanto ele desce porque de certeque encontramos uma galeria mais ampla a frente.

    De facto assim foi. O tecto comeou a descer e logo adiante uma pequena sala abria-selado direito, com espao suficiente para que todo o grupo parasse e esperassem poVicente. Motta tomava notas no seu caderno de apontamentos e Jean-Charles tocava nparedes com curiosidade.

    - Tambm artificial. - disse. - Esto aqui algumas marcas da escavao.

    Quando Vicente chegou, vinha com a cara muito vermelha e suava bastante.

    - Isto tpico. E as paredes tambm. Notem como esto escuras. - disse Mottaaproximando-se do lugar onde Jean-Charles estava a ver as marcas.

    - Porque que esto assim? - perguntou Mila.

    - Porque uma tcnica de minerao era precisamente fazer uma fogueira que aquecessparedes para que os metais que a pudessem estar ficassem mais maleveis e a prprocha mais propcia ao trabalho. claro que precisavam fazer umas chamins para sade fumo. Foi o que vimos. - disse Motta.

    Vicente sentou-se no cho, tirando o capacete e limpando a testa com um leno.

    - Quer gua? - perguntou Mila.

    - Obrigado, tenho aqui o meu cantil. - Deu um gole sfrego e depois despejou o resto e

    cima da cabea imaculadamente rapada, abanando-a e atirando com gotas de gua todas as direces.

    - No devia fazer isso, Vicente. uma imprudncia. - disse Motta.

    Vicente no gostava que o Engenheiro o corrigisse. Imprudente?

    - Estou com calor.

    Motta abanou a cabea em sinal de reprovao. Vicente j ia dizer uma das suas quanMalador interveio, num tom reconciliatrio que lhe era pouco usual:

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    - Aqui o Engenheiro esteve preso numa mina de diamantes em Angola h uns anos. Forquatro dias sem gua nem comida, com a pretalhada toda, que aquilo at fedia, semprpensar que os deixavam l ficar a apodrecer. No verdade, Motta?

    O Engenheiro fez um gesto de desgosto com a boca e estalou a lngua como se estivesprovar uma bebida amarga.

    - Nem gosto de pensar nisso... - Fechou os olhos abanando a cabea - E olhe que tratarangolanos como "pretalhada" injusto. Se no fosse a coragem dos que nos socorreratinha l deixado os ossos. Deixei l muitos amigos quado tive de voltar, depois comguerra.

    - Mas ultimamente pagam-lhe bem, no Motta? - perguntou Malador.

    - Sim, mas os amigos de antigamente morreram todos. J l no h ningum.

    - Ento voc no s Engenheiro de Minas - disse Vicente - Voc dos que anda cade diamantes... Desculpe que lhe pergunte, se no indiscrio, o que que anda aqufazer, em Sintra? Em que que a sua especializao nos pode ajudar? Do que que aaqui procura?

    Antes que Motta pudesse responder, j Malador interrompia:

    - No da sua conta, o Engenheiro est aqui a meu soldo e eu que sei porque quequero c. Engenheiro de Minas sempre Engenheiro de Minas. - O tom era enrgicoOlhe, quer ver? Por aquilo! - disse, apontando para o seguimento do tnel uns metradiante.

    Todos olharam. De facto pareciam haver algumas pedras soltas no cho, que at ali equase liso. Aps uma inspeco mais cuidada percebeu-se que a galeria onde estavcontinuava por um tnel escavado j em solo sedimentar, fora da rocha grantica quetinha acompanhado at ali. Era precisamente ao iniciar o percurso sedimentar que algumpedras tinham cado do tecto e impediam a passagem segura.

    - Vou ver mais de perto. - disse Vicente aproximando-se. No tinha dado mais que unpassos quando um bloco grantico com o tamanho de um tronco humano se desprendeda parede lateral e quase o esmagava.

    - Vicente! - gritou Mila, ao aperceber-se do perigo.

    Ele parou instintivamente. Ao passar pelas pedras que estavam j no cho, fez algumassustentavam o bloco que agora se soltara resvalar, perdendo a sustentao. Por poupoderia ter sido grave. A estabilidade das paredes estava comprometida h muito e nhavia sinais de manuteno. Talvez fossem os primeiros a ver aquele tnel desde que f

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    abandonado. Concordaram que seria necessrio escorar bem a passagem pelos sedimenpara poder perceber o que estava mais alm.

    - De facto, isto precisa de algum trabalho. Temos aqui para dias. - Motta tomava j notadicionais.

    - p'ra isto, que ele c est, v? - Malador ficou sem resposta de Vicente.

    Mila procurou aliviar o ambiente, perguntando outra vez acerca da chamin que tinhadescoberto. Motta fechou o seu caderno de apontamentos e voltou a sentar-se no chprosseguindo a explicao:

    - s vezes a chamin servia para ter acesso rpido ao exterior, ou para escapar em casoum abatimento como este. Mas no usavam escadas nem cordas. Os mineiros medievencostavam as costas a uma parede e com os ps na outra, porque eram paredes muprximas, conseguiam subir e descer como se estivessem a caminhar. H chamins cmais de 200 metros de profundidade onde subiam e desciam sem cordas ou escadas!

    - Nunca pensei! - exclamou Mila.

    - Mas mesmo assim. Agora veja o trabalho que isto dava a fazer. Eram precisos muihomens, muita madeira para escorar e aquecer as paredes, muitas horas de trabalhopacincia. J viram que s neste tnel, na rocha viva, j andmos mais de 300 metros?

    - Na verdade, andmos cerca de 850 metros - corrigiu Vicente, orgulhoso de que as sunotas fossem mais rigorosas que as do Engenheiro.

    - Nem me tinha apercebido que era tanto! Quase um quilmetro. - Mila estava surpresa

    - Motta, voc refere-se a este tnel artificial, certo? que desde o subsolo da capelaandmos mais.

    - Sim, esta parte escavada na poca medieval. S esta. Agora imaginem o trabalho quee o tempo que demorou!

    - Quantos homens trabalhavam na abertura de um tnel numa mina como estas? perguntou Jean-Charles.

    - Aqui na sala mais ampla seriam uns 4 a 6. Mas nos tneis de acesso, apenas 2, um atdo outro. No h espao para mais. Um partia a rocha da parede, o outro carregava odetritos para fora.

    - E quanto tempo demorava, por exemplo, abrir uns 5 metros de tnel nesta rocha? - qusaber Tavares.

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    - Bom, isso depende. Um bom trabalhador naquela poca podia fazer entre 1 e 5centmetros por dia.

    - Centmetros?! - Tavares no queria crer.

    - Sim, sim. Portanto os seus 5 metros podiam demorar bem mais de 3 meses.- E j andmos 850 metros... - Mila fazia contas de cabea.

    - As minas medievais onde estagiei na Alemanha tinham galerias onde trabalharam vgeraes at as completarem. Chamavam-se as Galerias de Herana e eram trabalhadaspor uma mesma famlia de mineiros, de pais a filhos.

    - curioso que nos conte isso, Engenheiro Motta, porque no somente D. Fernando era de origem alem e deveria estar familiarizado com estas histrias e as tradimineiras do seu pas, mas o Engenheiro que fez o projecto do Palcio, Eschwege, eEngenheiro de Minas! - sublinhou Tavares, que encontrou a coincidncia muitinteressante.

    - Ol... Queres ver que andaram aqui a escavar ou procura de alguma coisa... - disse JCharles.

    - Deviam ser diamantes... L voltamos aos sete anes. - acrescentou Vicente baixinMotta ouviu-o, mas no disse nada.

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    por Augusto Morgado era datado de 15 de Agosto de 1972, de acordo com um livro dFrancisco Costa, a mais antiga referncia que encontrara. Rafael desconfiava que todooutros tinham simplesmente copiado o que estava no livro de Costa e que nunca tinhalido o artigo original. Se h muita inveja no mundo da pesquisa acadmica, imagine

    neste mundo para-acadmico onde todos gostam de dizer que so isto e aquilo e tmoutro e o aqueloutro. Assim, todos os investigadores mantinham as cartas junto ao peitafirmavam - todos - que eles e s eles tinham o jornal original, afirmando alguns samigos pessoais do espelelogo Augusto. E o mistrio mantinha-se, porque era s "dque", mas ningum apresentava cpias para o comprovar.

    Foi com compreensvel entusiasmo que Rafael abriu o enorme volume encadernado a pda Biblioteca Nacional onde estava a edio de 15 de Agosto de 1972 do Jornal pocNo entanto, bem folheado o exemplar, rapidamente descobriu que o artigo no existi

    Tinham estado todos a mentir! O artigo no existia! No havia Augusto espelelogo, nfotografias, nem mapas, nem tneis.

    Um momento de dvida percorreu-lhe a mente. E se, ao dar a data de 15 de Agosto d1972, Francisco Costa se tivesse enganado e a entrevista realmente existisse mas fossoutra data? E se todos os outros, copiando o livro de Costa, acabassem por perpetuarerro, tornando assim impossvel encontrar aquela pea fundamental para o estudo dTemplrios em Sintra? Colocou ento a hiptese de estar errado o dia da edio, ou o mou o ano. Depois teve um pensamento ainda mais inquietante: e se o prprio Jorn

    estivesse errado e a publicao pertencesse a outro Jornal diferente? Um verdadeilabirinto, com inmeras portas para explorar.

    Comeou por considerar que o ms podia estar errado. Consultou o Jornal de 15 de Julhde 1972, sem sucesso. De seguida consultou a edio de 15 de Setembro de 1972, migualmente sem sucesso. Tentou a edio de 14 de Agosto, mas nada havia. Era precisopacincia. A pacincia leva-nos longe. Decidiu ento consultar pelo menos todos exemplares publicados entre 15 de Agosto e o final desse ms e, se no encontrasequacionar de novo a tarefa mais tarde. E foi assim, armado de pacincia e perseveraque consultou, uma a uma, as edies dirias do poca, recordando o Vero de 1972, aem que nascera. Todos os acontecimentos. As Revistas no Parque Mayer, os filmes ereprise, os saraus, as notcias internacionais, as praias e o Vero. Ao chegar edio dede Agosto encontrou o que procurava! Ali estava! Entrevista, fotos, diagramas, tuEstava comprovada a sua tese: a referncia no livro de Francisco Costa continha um ede datao e desde 1972 mais ningum tinha lido o artigo original, que agora tinha sfrente. Um erro involuntrio ou talvez uma simples gralha tipogrfica, juntamente cominveja e a mentira de todos os que diziam conhecer o original, tornou o original quaimpossvel de encontrar. Como uma pescadinha de rabo na boca, todos se citavam en

    si, e todos perdiam, com base uns nos outros, a data da pea que procuravam! Cegguiando cegos...

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    Rafael fez uma cpia do artigo e leu-o avidamente, descobrindo a razo pela qual espelelogo Augusto era desconhecido. O livro de Francisco Costa continha mais uerro! A entrevista tinha sido feita a Alexandre Morgado e no a um inexistente Augustoidentificava ainda uma outra anterior, de 26 de Maro do mesmo ano, sobre os tneis d

    Castelo dos Mouros, com os respectivos diagramas. Era como se tivesse descoberto ouDesde ento estes dados foram devidamente disponibilizados por Rafael, refazendo todhistria, ao ponto de se ter encontrado o espelelogo perdido - que emigrara para o Bra- e os tais tneis que ligam as Adegas das Caves ao Palcio Nacional da Vila de Sintra.

    Foi ento este Rafael que se sentou na esplanada do Caf Versailles, naquela tarde quen espera de Vicente. Tinham-se conhecido atravs dos passeios em Sintra e do grupo Facebook. Ficaram verdadeiros amigos muito depressa. Ambos adoravam a Serra, amtinham uma paixo pela aventura, ambos queriam explorar a histria desconhecida da V

    medieval, ambos preferiam uma tarde a examinar uma mina perdida no mato cerrado que ir ao centro comercial comer pipocas e ver um filme da moda. Nunca trocariam o em espao aberto pelo ar confeccionado dos espaos fechados.

    E aquele era um dia de sol. Os turistas tiravam fotografias com as chamins gmeas Palcio ao fundo e os pssaros chilreavam nas rvores. Uns alemes compravam VinhoPorto numa loja de esquina e um grupo que parecia espanhol degustava travesseiros Periquita, com a caixa aberta e pousada sobre a balaustrada do terreiro do Palcio, falanem voz alta, entre risos. Um casal, de mochila s costas, cada um na sua biciclet

    desmontou ao chegar praa e dirigiu-se a um polcia para pedir informaes. tranquilidade estava no ar. A luz era brilhante e estilhaava-se nas copas das rvores, janelas de palcios romnticos, nos telhados ocre dos alcantilados da Serra. Deixar a tapassar era um deleite, apenas sentado na esplanada, apenas respirando a existncia, mais nada, sem preocupaes e sem rudo na cabea, deixando fluir a realidade de Sintrpitoresca e turstica Vila, simples, bela e deliciosa, amena e sedutora. Sintra tinha econdo para Rafael. Fazia-o desligar-se dos problemas, flutuar mais alm das inquietae dos cuidados rotineiros. No havia nada de rotineiro nas impresses que agora preenchiam, sentado na esplanada do Caf Versailles e olhando a torre dos Mouros l

    alto, recortada num cu muito azul de fundo.E por baixo dos seus ps, que mistrios e mundos se calavam, num remansoesquecimento?

    Vicente chegaria a qualquer momento.

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    CAPTULO VIII

    - Est a ver este lado, Jeany?O canadiano ps a mo sobre as sobrancelhas para tapar o sol e tentar ver mais longe.

    - Este lado onde est a capela, no ? - perguntou.

    - Sim. a parte mais antiga da edificao e dever remontar a meados do sculo XOnde v a torre est, por baixo, mais ou menos ali, o altar-mor. Foi a que apareceuNossa Senhora da Penha, em data que no se consegue determinar. Ao que se sabe fonte segura, no final do sculo XIV os Priores de So Pedro de Penaferrim, que a igrque est entrada do Castelo dos Mouros, na outra colina, j l iam ao Sbado rezmissa por ordem de El-Rei D. Joo I. Ali mesmo, na boca da gruta onde se dizia taparecido a Senhora, o povo, que muito devoto, construiu uma capela de madeira, murstica, que tapava pouco mais que o altar, metido numa rocha que hoje est emparedaSenhora da Penha significa "senhora da rocha" e a rocha est l. So duas lajes mugrandes, elevadas a uns 15 metros, que se juntam ao nvel da capela. Parecem uma l"A", tocando-se no topo, onde s vemos fora de terra a ponta superior. Pode ter havidum culto muito anterior a uma deusa ou um dlmen. O que certo que no reinado dD. Manuel...

    - O do "manuelino"... - interrompeu Jean-Charles, mostrando que estava atento explicao.

    - Sim, ele mesmo - reconheceu Mila, prosseguindo depois - Era o nosso Rei VenturosAndava El-Rei a caar na mata quando viu, ao longe na boca do rio Tejo, as naus dNicolau Coelho, da frota do Almirante Vasco da Gama, que regressavam da ndia. Eum feito notvel. Aps dezenas de anos de tentativas, o projecto do Prncipe Henrique Navegador, administrador da Ordem de Cristo, via o seu culminar. O Tejo e o Indo

    estavam ligados. O Oriente e o Ocidente num s.- Que interessante, Mila. Parece que est a descrever este Palcio, que s apareceu tsculos depois. H um misto de arte oriental,indienne e arabe , um sentimento selvagemnos recantos e nos pormenores arquitectnicos, bem contrastados com elementos muimarcantes de uma arte de raiz europeia. o que sinto quando olho o Palcio no conjunAlm, aquela enorme torreredonde parece coberta de um turbanteberbere , at podia serFez, e deste lado, o recorte quadrangular junto torre do relgio, marcadamente cristVejo ali um prticosalmnico , com duas magnficas colunas torcidas, mas aqui mesmo

    minha frente estetristo , este animal, parece sado de lendas martimas de sereias e figurasdaAtlantide . E as cruzes da Ordem de Cristo, as das vossas Descobertas, esto em todo o

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    lado. Ao lado de azulejos mouriscos, com lanas ecroissants , sol e lua... magnfico,Mila...

    A vista da varanda do ptio onde se encontravam era muito ampla. A multiplicidade estilos deliciava a vista.

    - De tudo o que vemos, s do sculo XV e XVI esta parte que corresponde ao claustrO resto foi mandado construir j no sculo XIX pelo rei consorte D. Fernando II. claque ele, compreendendo a importncia do lugar e procurando homenagear a alma luincorporou todos esses elementos no Palcio. O mesmo navegador Nicolau Coelho, pexemplo, que D. Manuel viu chegar da ndia desde aqui, foi colocado no ano seguintefrota de Pedro Alvares Cabral, que descobriu o Brasil. Se olhar com ateno veelementos que tambm ligam ao Brasil. Mas no me obrigue a pular tanto na histria.

    - Ento daqui viu-se chegar da ndia e partir para o Brasil, na poca em que ambos continentes se descobriam... Incrvel. Houve um mundo antes da Senhora da Pena e umundo depois da Senhora da Pena. Este lugar quase um eixo, um meridiano de histmartima. E a vista daqui alcana at ao infinito. Desculpe desvi-la da sua linha pensamento, mas que o seu entusiasmo tambm me aquece o corao.

    Mila sorriu.

    - Mas como lhe dizia, El-Rei D. Manuel ficou devoto da Senhora da Penha e atribuindlhe o milagre da ligao do Oriente ao Ocidente por Vasco da Gama, mandou construaqui no seu reinado uma capela j de pedra e alvenaria e mandou que o lugar fosguardado pelos monges hieronimitas. Inicialmente aqui viveram 19 monges e o snmero nunca aumentou. As obras foram dirigidas pelo Mestre Boytaca e seriamfinalmente rematadas com um retbulo de alabastro do escultor Nicolau de Chanterenn esse retbulo que tapa a gruta original e que est frente do acesso sala subterrnque andamos agora a explorar.

    - Espere, Mila, espere. O Mestre Boytaca... Eu conheo esse nome. No me diga, que eu sei. Ele fez outra obra importante, no fez?

    - Sim, quer que lhe diga qual?

    - No. Deixe-me ver se me lembro. Ainda ontem andei a ver isso na internet...

    Jean-Charles fazia um esforo para se lembrar. Estava parado e com a mo direita fechbatia devagar nos lbios como que para que estes abrissem e revelassem o nome qprocurava. Mila olhou-o enternecida. Parecia mesmo o Zeca, adorvel sobrinho dela uns 7 anos, que fazia o mesmo gesto quando queria lembrar-se da tabuada.

    - Mila, no me lembro.

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    - Foi o arquitecto do Mosteiro de Santa Maria de Belm, ou Mosteiro dos Jernimos.

    - Pois claro. Claro. Aqui monges Jernimos e l monges Jernimos. V como estconsigo me perturba? J nem sei o que ando a fazer! O Mosteiro dos Jernimos fconstrudo no estilo manuelino, claro.

    - Claro, Jeany. Alis Boytaca trabalhou aqui, nos Jernimos, na Torre de Belm e Mosteiro da Batalha, onde acabou por morrer. O manuelino definiu-o a ele e ele definiumanuelino. Ainda h muito que dizer sobre Boytaca. Ora, todo este corpo quecorresponde ao claustro e capela era ento o corpo original.

    - Ento, as galerias que partem debaixo da capela e nos conduzem ao interior da serra, nsabemos ainda onde, esto l desde essa poca? Sero do sculo XV?

    - Penso que no. Devem ser mais antigas. Lembra-se do que disse o Engenheiro Mottatcnica de construo assemelha-se ao das minas medievais. Note que com o contacto co oriente foi possvel a introduo da plvora chinesa no ocidente, o que passou a faciltodo o empreendimento de explorao mineira. Ainda demorou algum tempo, mas todas inovaes chegavam pelos portos lusitanos e andaluzes. Estes tneis parecem ser mantigos. Lembro-me de ter visto alguns semelhantes na Palestina, quando l fui h danos com uns amigos em frias.

    - Acha que isto tem mais de 2000 anos? Ser?

    - No sei, uma rea que no estudei. Mas a realidade que h muitos vestgios romanao redor de Sintra, por isso no me surpreenderia se eles tivessem explorado minas. O a mim me intriga que no parece haver minrio!...

    - Mas h, Mila. H ouro nestas encostas.

    - O que diz?

    - H ouro em Sintra e eu sei-o bem. E h uma joia incomparvel espera de sedescoberta.

    - Lendas?

    - Que lendas... Digo-lhe Mila, que h ouro, uma joia preciosa e tudo est protegido pum feitio que encanta os mais atrevidos.

    Mila olhou-o com descrdito. Jean-Charles olhou-a nos olhos por segundos, depoafastou-se, encostou-se balaustrada de pedra e, olhando o horizonte, disse baixinho:

    - Pobre daquele que se deixar hipnotizar pelos olhos traioeiros das ninfas de cabelo

    oiro e olhos de esmeralda que guardam as passagens secretas da Serra. Ficam presos p

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    sempre, que nem um pssaro na gaiola do amor. - e virando-se para ela - Digo-lhe quesei. Vim do Qubec para ficar cativo em Sintra...

    Mila riu-se.

    - Voc no desiste...- Voc gosta.

    Ela no respondeu.

    - So os ares da Serra que o esto a afectar, Jeany. Sabe que aqui em cima o oxignirarefeito e pode provocar alucinaes. Acho que j est a alucinar! melhor eu no pcom as minhas explicaes e continuar a falar. A histria eventualmente vai faz-lo voa si. Vou falar, falar, falar e no me calo, para que no possa dizer das suas...

    - Adoro ouvi-la falar, Mila. - disse ele com os olhos muito grandes e respirando fundoar fresco da serra. - Continuamos?

    - Sim, venha comigo - disse ela, agarrando-o pela mo - Vamos capela e depois vmostrar-lhe o salo nobre.

    Desapareceram os dois pelos corredores do Palcio.

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    CAPTULO IX

    - Rafael, no andes para a a contar isto. - Vicente olhou em redor, mais por reflexo dque por medo de ser ouvido - Ando na Pena num trabalhinho de explorao e tenho deperguntar umas coisas. Tu que s capaz de saber...

    - Conta, se eu te puder ajudar...

    - J ouviste falar de minas em Sintra?

    - Sim, claro. Quase todas as Quintas tm um sistema de captao de gua com algumminas e depois h um sistema maior que as liga umas s outras, mas isto no oficiAlis, tu sabes disso muito bem. No foste tu que andaste h uns anos na Quinta doSaldanha a desentupir uma das minas porque o tecto tinha rudo? - Rafael estranhoupergunta.

    - Sim, fui eu. - respondeu Vicente - J faz tempo. Mas no estou a falar dessas minas, Isso para a gua. Tudo certo. Essas conheo eu! Mas no dessas. mina, mina.

    - Mina, mina? O que uma mina mina?

    - Foda-se, p. s parvo ou qu? Mina! Uma mina!

    - Olha l, tento na lngua! Esta uma das esplanadas mais exclusivas da Vila. Faladireito. Achas que por dizeres "MINA" mais alto que vou perceber? No do som... no mina de gua, mina de qu?

    - Ora exactamente! Foda-se, chegaste l! - levantou-se para chamar o empregado - Quuma caf ou alguma coisa?

    - No, obrigado. Pode ser uma gua.- Pst! pintas, d aqui uma gua e um sumo de laranja natural.

    - Mas, Vicente, continuo sem perceber...

    - Ests no gozo?... 'Ato foste tu que, agora mesmo, disseste que se a mina no era gua, do que que era afinal!

    - Sim, mas do qu?

    - Hn?

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    - Do qu, Vicente? Do qu?

    - Pois, p. Do qu?

    - Isto um dilogo de surdos...

    - H p'ra muitas minas de gua, essas eu conheo. J andei por buracos que no lembrao diabo, mas a maior parte eram minas de gua, ou aquedutos ou merdas do gnerEsts a ver? gua, p, gua. Todas as quintas tm jardins, todas precisam de gua. Tlagos, fontezinhas, riachos, agora tm piscinas. gua o que precisam. Por isso a Seest cheia de minas. E ainda por cima gua da boa, que eu j bebi em quase todasfontes e... - interrompeu o que estava a dizer metendo o dedo dentro do copo alto dsumo que lhe foi servido, fazendo-o verter por fora - Hey! Isto no sumo de laranja, i concentrado. Eu pedi sumo de laranja natural, isto no vale um caracol! Traga-me

    sumo de laranja a srio, que isto uma merda. Vocs servem isto aos turistas?- Desculpe, senhor, que se acabaram as laranjas.

    - Se acabaram as laranjas diga que acabaram as laranjas. No me d esta porra! Isto nnada. Depois admiram-se que os turistas no voltam. No tm mais laranjas?

    - Peo desculpa, mas no. - disse o empregado, embaraado, levantando o copo estendendo com a outra mo um guardanapo de linho branco para que Vicente selimpasse. Este, entendendo mal o gesto, esticou o dedo molhado que tinha colocad

    dentro do copo e limpou-o no guardanapo que o empregado segurava como quem limos dois lados da lmina de uma faca.

    - J est. Pode seguir.

    - Desculpe mais uma vez senhor. - respondeu o empregado retirando-se.

    - J viste esta merda? Que porra... Um gajo quer um sumo como deve de ser e estes gqueriam empurrar a zurrapa como se fosse a mesma coisa... - virou-se de novo paraempregado - Ento traga-me um caf e uma torrada. Onde que estvamos?

    Rafael tentou pensar em retrospeco. Antes de ter conseguido encontrar o fio meadaVicente continuava:

    - Do caralho, no achas?

    - Fala mais baixo ou no digas tantos palavres, Vicente. No gosto disso.

    - Foda-se, desculpa... Eu no sou um tipo sofisticado como tu. Almofadinha! Eu c nufui de minhoquices. Fui puto de oficinas e aprendiz de ladrilhador, p. Fui canalizado

    bombeiro. Ests a ver? Com muito orgulho! Nunca roubei nada a ningum. Nunca. Si

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    eu falo atropelado, e nem sempre sei dizer as coisas certinhas no seu lugar. Mas no cp'ra me f... fundir o juzo. P.

    - Deixa l. O que que ?

    - O que que , o qu?- Outra vez?

    - Hn? No percebo...

    - Vicente, o que que ... aquilo...

    - Aquilo? Aquilo o qu?

    - O que que do caralho?!

    - Foda-se, meu! No grites, p! J no te percebo!... Umas vezes isto, outras vezes aqumas l no fundo tambm precisas ter cuidado com o que dizes! No sou s eu...

    - Mas, se foste tu que...

    - Que qu...

    - Esquece. Diz l...

    - No, quer dizer... Do caralho, do caralho que as minas ou so de gua ou so de quHn? Ests a ver? De qu? De qu?!

    - No sei, Vicente. Perdes-me. Se as minas no so de gua so de...

    - De minrio, p! J est! De minrio. Ests a ver? As minas que no so de gua devemde minrio!

    - Mas Sintra no tem tradio de minas de minrio. Bom, na verdade tenho um amigo uma freguesia prximo de Almargem do Bispo onde ele diz que haviam minas de feMas isso foi h sculos. Alis, a aldeia chama-se mesmo Covas de Ferro e fica na SerrMonfirre. Que interessante... Nunca tinha relacionado: Monfirre ser "monte de ferro"?

    - Pode ser, pode ser. Ests a ver que havia minas prximo de Sintra? Ainda agora achaque no.

    - E agora que falas nisso, Algueiro, que uma localidade prxima da Serra, significarabe "O Buraco" e havia l uma pedreira muito grande. Na zona da Base Area aindauns lagos que ocupam o buraco deixado pela explorao de uma jazida de pedra. No bem o que era, mas est l. E em Pero Pinheiro temos os mrmores. Pensando bem,

    sinais de que houve alguma indstria extractiva por aqui. Mas porqu? O que que item que ver com o que andas a fazer na Pena?

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    - Ora, esse o mistrio. Lembras-te do tremor de terra que houve h uns tempos?

    - Sim.

    - Pois imagina que um pedao de cho da capela da Pena abriu e descobriram uma gr

    por baixo! Um buraco do tamanho de um carro. Chamaram-me l para ajudar a explola.

    - A srio? Podes levar-me contigo?

    - No! No fales disto a ningum, p! confidencial. a Mons Lunae que est a diriaquilo.

    - Esses? Ui, Vicente!... Essa gente muito mazinha. Esto sempre a tapar as grutas qugente encontra, agora no deixam que se ande na Serra sem ser com autorizao pagando! E pagando bem! Agora aquilo um negcio. E ainda por cima fazereflorestaes sem respeitar as normas, reparam muros, casas e estradas com materagressivos para o ambiente (que algum lhes vende). J viste os mamarrachos que pusecomo bilheteiras para ir Pena e ao Castelo? So contentores de navios. Autnticcontentores. Algum se forrou bem ao projectar aquilo e a vender o material. E se quevisitar s o Palcio pagas tambm o preo dos Jardins. E se disseres que no queres ve Jardins porque no tens tempo, explicam-te que para chegar ao Palcio h que paspelos Jardins e por isso, mesmo no visitando, paga que bonito!

    - Estou a ver que os conheces...- Muito bem, Vicente. Muito bem. Deviam ser administradores do nosso patrimnio, anosso servio, cuidando e protegendo a Serra. Mas desde que a Mons Lunae foi criadaSerra um condomnio privado em que eles mandam sem rei nem roque, sem que sintrenses tenham uma palavra a dizer e nos esfolam os bolsos para usufruirmos do qunosso. H muitas reas onde ningum pode entrar. Ningum sabe porqu e ningumresponde. Conheo muita gente a reclamar, a mandar emails, a fazer queixa, mas nadianta. E os dinheiros daquilo? O buraco que aquilo ? Paga o pagode. Digo-te, no

    se h criaturas espectrais em Sintra na curva das estradas da Serra com se v no YoutuMas sei que h c vampiros e nem sequer se disfaram.

    Vicente rui-se.

    - Tambm no me quiseram l... Tm um Engenheiro e queriam que eu fosse embora. no fosse o Arquitecto Tavares...

    - O Director do Palcio?

    - Sim, foi ele que me chamou. O outro filho da puta, o da Mons Lunae, como que ele chama? O... Tu sabes.. O... O gajo Engenheiro e foi Secretrio de Estado no sei do q

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    - Malador?

    - Isso, Malador. Ele mesmo. Esse quis correr comigo. O filho da puta. Mas escuta l, qeu preciso saber umas coisas: tu conheces algumas minas, das de minrio, em SintMesmo que sejam antigas?

    O empregado pousou uma torrada em po de forma e um caf. Vicente agradeceu.

    - No, que me lembre no. J sabes que h muitas minas de gua, algumas grutas, masminrio no conheo.

    - Olhe l! Isto margarina! - Vicente olhava com ateno uma das fatias da sua torradaempregado veio a correr. - Isto margarina! Mas que porra! Isto no manteiga...

    - Desculpe, senhor, posso-lhe assegurar que manteiga. Nesta esplanada s usamosmelhor.- O mais caro j eu sei, mas o melhor... Est para se ver... esta merda no manteiga naqui nem na China. margarina e ainda por cima industrial. Voc sabe quanto custa umtorrada aqui na esplanada?

    - ... Sei ... - o empregado respondeu a medo.

    - Pois 'fachavor de descontar isso da minha conta que no quero esta rodilha mal feita escorrer margarina! Leve isso para dentro, que porra!

    - Desculpe, mas...

    - V, v, v, v... Leve l isso. Que horror, Rafael, no que isto se tornou! Cada vez menos brio por servir o cliente.

    Rafael manteve-se calado.

    - No dizes nada? - perguntou Vicente, deitando acar no caf.

    Rafael olhava, espera de ver se o amigo aprovava a bebida, ou se a conversa interrompia mais uma vez. Vicente apalpou a chvena.

    - Est fria. Este caf est frio de certeza. Estes gajos...

    Ainda bebeu um bocadinho, mas fez um esgar com a boca que indiciava odescontentamento.

    - S um segundo, Rafael.

    - Est vontade...

    Com um falso sorriso chamou o empregado:

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    - Por baixo da capela da Pena, dizes tu? H um amigo meu com quem devias falar. pensaste que pode ser uma ligao ao complexo de tneis que se diz que est dentro montanha?- Nunca ouvi falar disso.- Pois no, mas ele pode ajudar.- No sei... Eu no quero comear a contar isto por a, p. Isto confidencial, entendeNo para se saber.- Mas olha que ele capaz de ter resposta para o que tu queres saber. E gente dconfiana.- De confiana, dizes tu?- Sim. No te preocupes.- No sei...Nesse momento um Mercedes metalizado de gama alta parou mesmo ao fundo dpequena escadaria, bloqueando a sada da esplanada.- Olha-me p'rquilo! Estes filhos da puta estacionam onde querem. S porque tmgraveto, um ver se te avias. E o polcia alm e no faz nada... fodido. Se fosse eu comeu carro j me tinham posto a andar. Este pas s vezes parece uma repblica africanaterceira categoria.

    Nesse momento o Engenheiro Malador surgiu na esplanada, vindo da sala interior dCaf Versailles. Estava acompanhado de um africano vestido de maneira distinta, faitaliano, culos escuros de armao de ouro, com uma pochette de crocodilo segura nasmos inchadas onde os anis de ouro sobressaam e, num deles, o que parecia uma lide pequenos diamantes bem lapidados reflectia o sol do fim de tarde em milhares de ramulticor. Passaram pelos dois amigos sem sequer darem por eles. Ochofeur j tinha aporta aberta para que os seus passageiros entrassem. Fechou-a e apressou-se a regressaseu lugar e arrancar em direco estrada da Pena.

    - Achas que os gajos ouviram? Achas que o tal Malador te reconheceu?- No. - disse Vicente, mais para espantar o desconforto do que convicto do que diziaMas eu nem me referia a estes.- "Repblica africana de terceira categoria"? Vicente...- Olha que no, Rafael. Tu viste bem o gorila? Aquilo era de uma repblica africana primeira categoria!Os dois riram.

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    CAPTULO X

    - Engenheiro, se for necessrio mandar mquinas e homens, j sabe que pode concomigo. O Motta j est a nosso cargo, mas um telefonema seu e ponho-lhe a umbatalho de reservistas para o ajudar.

    - Esteja tranquilo, General. Angola sempre foi o nosso melhor parceiro e ainda por cifalamos a mesma lngua! - Malador marcava um nmero no seu telemvel.

    - S se for esta lngua... - disse o General esfregando o polegar no indicador, como qufala de dinheiro.

    Malador riu e acenou afirmativamente com a cabea, mas j estava a iniciar a chamada

    - Berta, no se esqueceu da lembrana do General Ngongo, pois no? Sim, sim. NBerta, a outra. Essa para ele levar esposa quando for amanh para Milo, que ela estdesde o fim de semana. A dele. Sim, a garrafa. Perfeito. Muito bem. No. J ndemoramos. Quem? O Tavares? No, no. No. Diga-lhe que no temos tempo. Istoassunto da Mons Lunae, no tenho de servir de capachinho e apresent-los. Para qu, n? Ele que se lixe.

    O Mercedes subia a serra atacando as curvas apertadas da estrada com muita segurana- General, voc Umbundo, no ? - perguntou Malador.

    - Sim, sou do Kuito, no Bi.

    - No quer dizer Silva Porto? - Malador procurava provoc-lo.

    - No. - soou seco.

    - Sabe que eu andei em Angola a lutar contra os turras? Se me permite a expresso... A

    sim senhor. Foi em 67. Est a ver, misso de soberania. amos todos. Da minha aldeiap da Covilh morreram l trs dos moos com que andei na escola. E uma enfermeiEra assim. A soberania nacional impunha-se. Portugal comeava no Minho e terminaem Timor!

    - E onde andou a "matar turras" na sua "misso de soberania"? - O General Ngongoestava desagradado e notava-se na voz. Tentava ser irnico. No fundo sabia que Malads o queria provocar para o tirar do srio e ganhar posio negocial quando chegassemdiscusso de mbito financeiro. Controlava-se. Ele, que levara com bombardeamen

    cerrado na mata do Andulo, sabia manter a calma.

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    - Por Deus, General! Eu no disse que andei a matar ningum! Eu estava nacomunicaes e rdio. Estive em Cabinda, mas conheo a sua zona porque h trs anestive l em visita oficial com o vosso Ministro, nas minas de diamantes. Foi pena no termos conhecido nessa altura.

    - Foi.

    - Voc no homem de muitas palavras...

    - Engenheiro, comigo os nmeros falam melhor.

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    CAPTULO XI

    - Neste vitral pode ver D. Manuel, com o Mosteiro da Pena na mo. Foi na poca delfinais do sculo XV, que o culto Senhora da Pena se tornou mais popular. O Mosteirfoi aqui fundado e fazer a ascenso at este monte pelos difceis caminhos da Serra uma significativa prova de f. Limpavam-se os pulmes ao subir aos cus e limpavam-almas.

    Jean-Charles notou um detalhe que o intrigou.

    - E quem este que est ao lado? Vejo um navio, mas tem as velas recolhidas. Sem

    pensei que as velas dos vossos barcos tivessem a cruz da Ordem de Cristo.Mila aproximou-se do vitral para mostrar melhor o detalhe.

    - Os nossos navios eram caravelas. Era o nome que tinham. Eram muito inovadores no tempo. Navegavam contra o vento, " bolina" como se diz, um dos conhecimentos quecolocavam frente de outros concorrentes, como os espanhis ou ingleses. Est a ver torre aqui? a Torre de Belm, o forte que est entrada do rio Tejo em Lisboa. A cerepresenta a chegada de Vasco da Gama da ndia. Lembra-se que foi daqui que D. Manviu a frota a chegar quando andava caa na Serra?

    - Sim, voc contou o episdio. Por isso as velas esto recolhidas.

    - uma forma de dizer que aquela misso est cumprida. Tambm d Senhora da Peum sentido proftico.

    - E aqui a temos, a Senhora da Pena, no primeiro quarto do vitral.

    - Os dois primeiros quartis, como esto acima, representam o mundo do esprito. Ela Me Universal, coroada de estrelas, protectora com o filho ao colo, uma palma na mo

    fulgor das labaredas do sol por detrs e os ps sobre a lua. a Virgem. E no caso da Pea Virgem a que aqui se rende culto a Senhora da Pena. A Senhora da Rocha ou dPedra. Mas tambm, por associao de ideias, a Senhora do penar, do sofrimento. A qacolhe todos os que sofrem e os cura dos seus males. A Me Universal, Me Celeste.

    - Muito interessante, Mila.

    - Ao lado dela, no mesmo plano do arqutipo, tem So Jorge, que esmaga o dragodomina a sua cabea com a lana do cavaleiro invencvel, que era Lancelot, na qual ergestandarte alvirrubro de Cristo. Tal como Vasco da Gama, em baixo, este completou jsua tarefa. Vasco da Gama ultrapassou o mostrengo alm mar e...

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    - Ultrapassou o qu? - Jean-Charles estava surpreendido com a palavra, que no entend

    - Mostrengo. Nunca ouviu "mostrengo"?

    - No...

    - Monstro sabe o que , no sabe?

    - Sim, sei. Est um do outro lado do Palcio.

    - Sim o Trito. Isso um monstro, sim. Faz parte do imaginrio fantstico criado pelmarinheiros. No s eles viam muitas criaturas que desconheciam e s quais tinhadificuldade em dar nomes e em as descrever, at porque no tinham preparao para mas tambm inventavam muito! Criavam histrias fantsticas, aventuras impossveisvencer que tinham sido ultrapassadas por milagre ou interveno divina. Todo o horrdos monstros terrestres dos seus antepassados eram passados para os mares. Muitomonstros povoavam o imaginrio martimo naquela poca.

    - E o "mostarrango"?

    - "Mostrengo", o mostrengo um monstro especial. o que guardava o Cabo daTormentas, na frica do Sul, no ponto em que as correntes do Atlntico se juntam coas correntes do ndico. Ali as tempestades so frequentes e mortais. As guas straioeiras. Quando os portugueses desbravaram os mares desconhecidos, ali no haajudas, no havia perdo. Era o homem com o mostrengo. Os marinheiros olhavam parenorme rochedo do Cabo e personificavam-no num mostrengo, maior que um monstrmais letal e impiedoso, ali colocado para os impedir de chegar ao outro lado. Umguardio sanguinrio, poderoso, cruel. Sabe quem derrotou o mostrengo?

    - No.

    - Foi Bartolomeu Dias. Dobrou o Cabo das Tormentas em 1488 e desde ento passou chamar-se Cabo da Boa Esperana. Foi isso que abriu caminho a Vasco da Gama, qcompletou a viagem at India e regressou.

    - Bela histria.

    - E verdadeira. O mostrengo retirou-se para os confins cavernosos dos medos humanono voltou mais. Tal como So Jorge acima que domina o drago, Vasco da Gamderrotou o mostrengo.

    Jean-Charles aproximou-se mais, olhando atentamente para um pormenor no caninferior esquerdo do vitral.

    - E o que isto? O vitral trazia cdigo de barras?

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    Mila encolheu ombros, com uma expresso de reprovao.

    - o Engenheiro Malador. O que quer? Desde que ele chegou, isto mudou tudo. Logo primeira semana contratou a empresa de um amigo para andarem a pr esses autocolanem tudo o que "patrimnio". Diz ele que para o numerar e proteger. No verdadeque eu sei. O Palcio tem um arquivo com todo o seu patrimnio fotografado, estudadonumerado. Foi s um negcio de amigos. Agora voc anda pelo Palcio e em todo o lal est o irritante cdigo de barras!

    - Voc parece no gostar muito do Malador.

    - Mas h algum que goste?

    - Eu conheo-o mal, Mila.

    - Eu tambm no privo com ele. Mas uma figura muito conhecida em Portugal, porqsempre esteve ligado poltica. E uma vez por outra a umas polmicas de favorecimene negcios escuros, mas nunca foi provado. O ltimo processo prescreveu o ano passaainda ele era Secretrio de Estado da Indstria. O que curioso que ele passou uma bparte da ltima dcada a lutar para estar no governo. Antes de ter vindo de Angola, onfoi consultor de negcios do governo de l, foi lder parlamentar na oposio, foi vereana Cmara Municipal de Lisboa, foi porta-voz do partido dele nas eleies que acabarpor vencer e finalmente foi nomeado Secretrio de Estado da Indstria.

    - Uma carreira de xito, ento.- Quem quer ter xito, encosta-se ao Engenheiro Malador! Ele atrai o xito. Acho que ntem muitos amigos que se possam queixar. Ele tambm no deixa! Quando o questionaabandona-os logo. Vai fazendo inimigos por todo o lado! Havia um semanrio que nlargava as histrias de gente dele que o abandonou e agora lhe tm rancor.

    - Um poltico, normal, diria eu.

    - Sim, mas ainda no lhe disse o que me intriga. Note que trabalhou tanto para chegar

    Governo e ao fim de menos de um ano, surpreendentemente abandonou-o para vir paPresidente da Mons Lunae. Enfim, eu sei que a morte do anterior Presidente, oArquitecto Cordeiro Reis, foi inesperada, mas o Arquitecto Tavares era quem estava muitos anos na linha para lhe suceder. Foi uma surpresa para todos ter havido umnomeao poltica para a Mons Lunae. H quem diga que o quiseram punir por algumcoisa, porque na realidade foi descer de posto. De Secretrio de Estado a presidente uma empresa municipal... Deve ter muitos inimigos no partido.

    - Mas no sempre assim, Mila?

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    - At parece que fazem de propsito. J viu, de Secretrio de Estado da Indstria MoLunae num nico passo! Mas o que que a Serra de Sintra tem que ver com indstria?indstria de Sintra a cultura, o saber, o patrimnio histrico, o turismo, o esprito, bem estar... Agora, pensando bem, ele tambm foi o Secretrio de Estado da Indstria s

    saber nada de indstria... Vinha do meio autrquico.- A poltica...

    - Isso mesmo, Jeany, a poltica... Parece que fazem de propsito.

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    CAPTULO XII

    Vicente e Rafael tinham acabado de passar pela Quinta da Regaleira e tomavam agouma estrada que descia ao lado da Quinta do Relgio.

    - Ainda longe essa Casa do Fausto? - perguntou Vicente.

    - No, j ali.

    - E o teu amigo est l?

    - Sim, ele vai l muitas vezes. amigo dos donos. s vezes vai l lanchar e tomar u

    cervejinha, porque h l um Pub medieval e um ponto de encontro de uma Sintra m"alternativa", se que me entendes.

    - Panilas?

    - No, p, gente mais ligada aos esoterismos e s coisas da Nova Era e aquelas coisasdruidismo. No ests o ver o gnero?

    - Ah! Os abraa-rvores?! Tive uma namorada assim. A gaja era louca por rvores! Viacarvalho e comeava logo a correr para lhe fazer festinhas e abra-lo. Aquilo no

    normal.- Deixou-te por uma rvore?

    - No, p! Eu que a larguei, que aquilo no era p'ra mim. Mas estou a ver o tipo. O tamigo assim? - perguntou, fazendo um gesto com o dedo nas tmporas, como queapertar um parafuso.

    - No, no maluco. Alis, hoje em dia a malta que se interessa por esoterismos mumais socivel e normal. Quer dizer, alguns no os conseguias distinguir numa multid

    So gente como a outra, mas com inquietaes espirituais.- E andam por a a abraar rvores?

    - No, no andam. Tanto ns no "Sintra Profunda", como eles ali na Casa do Faustoorganizamos passeios na Serra para conhecer a natureza e senti-la. Tu que te interessas grutas deves saber o que isso .

    - Sim, percebo. fantstico passear na floresta, beber das fontes, sentar nos recantosSerra, aproveitar a Vila quando no h muita gente. Sei o que queres dizer. Mas da

    andar a abraar rvores... - voltou a fazer o gesto do parafuso a menos.

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    Rafael riu-se.

    - Vais ver que vais gostar do Cristvo. Ele bom gajo.

    A Casa do Fausto era uma antiga Quinta agora convertida num espao de usos mltipl

    Tinha dois edifcios prximos um do outro e um enorme terreno com rvores, caminhofontes e lagos. Uma das casas era um Hotel budget pensado para a clientela de trotmundos e mochila s costas e a outra casa - mais apropriadamente designada "do Faust- era um centro onde se realizavam conferncias, cursos e muitas iniciativas relacionacom o esoterismo no seu sentido mais lato. Desde a espiritualidade vibrante at um ceestilo de vida saudvel com preocupaes ambientais, s vezes csmicas, outras vemeramente ecolgicas, mas sempre universalistas e sempre com o bem-estar e bem-exem mente. Havia tambm uma editora que publicava o que de melhor se escrevia sobrassunto, uma livraria e o Pub medieval. Ao redor destes equipamentos iam circulantodo o tipo de ideias, algumas velhas de sculos, outras novas e cheias de dinamismMais do que um lugar, a Casa do Fausto era uma comunidade, uma tribo de ge