A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL: GT 7 Conflitos, Direitos ... · A REALIDADE DO SISTEMA...
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A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL: Um dilema entre as
penas e os direitos humanos
GT 7 – Conflitos, Direitos Humanos e Segurança Pública
Autoras
Josiane Marques
Lindalva Barreto
Ludmila dos Santos
Solange Silva P. Santos Santos
Valdicleide Dias Mato Grosso
RESUMO:
Este trabalho trata-se de uma análise do sistema sócio jurídico com recorte sobre o
sistema penitenciário brasileiro frente às previsões contidas na Lei de Execução
Penal, fazendo um resgate histórico do surgimento das prisões, sua utilização como
pena propriamente dita e a realidade atual dos presídios com foco no processo de
ressocialização como forma de garantir a reabilitação dos detentos levando em
consideração a promoção dos Direitos Humanos. Para tanto, traça um paralelo entre
o que se encontra na Lei de Execução Penal, onde estão expressos os direitos e os
deveres dos condenados e dos presos provisórios e o que de fato são efetivados, um
enfoque entre a realidade e a previsão normativa.
Palavras-chave: Direitos Humanos; sistema penitenciário; ressocialização, Lei de
Execução Penal.
Trabalho apresentado no V Seminário da Pós Graduação em Ciências Sociais: Cultura,
Desigualdade e Desenvolvimento - realizado entre os dias 02, 03 e 04 de dezembro de 2015, em
Cachoeira, BA, Brasil
Josiane Marques (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail:
[email protected]); Lindalva Barreto (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia –
UFRB, e-mail: - UFRB, e-mail: [email protected]); Ludmila dos Santos (Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail: [email protected]); Solange Silva P. Santos
(Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail: [email protected]);
Valdicleide Mato Grosso (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, e-mail:
INTRODUÇÃO
Considerando que a pena de prisão tem por objetivo a proteção da sociedade
contra o crime, entende-se também que esse objetivo só pode ser alcançado se
quando, durante o processo de reclusão, ao preso sejam proporcionadas condições
mínimas no qual ele compreenda que, após o cumprimento da pena, ao reingressar
na sociedade, o mesmo terá que, não somente respeitar a lei, mas principalmente de
auto sustentar-se diante da sociedade. Desta forma, o preso terá como direito as
condições que possibilitem o seu processo de ressocialização.
Essas condições, referentes ao processo de ressocialização, estão ligadas
diretamente aos diversos instrumentos de Direitos Humanos que são observados no
tratamento a ser dado às pessoas privadas de sua liberdade. Esses direitos, além de
estarem contidas nos princípios legais dos Direitos Humanos, como a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e
Políticos, encontram-se detalhados em vários outros instrumentos internacionais, dos
quais o Brasil é membro, como também, nos nacionais, que tratam especificamente
de pessoas presas e em condições de detenção.
Entre esses instrumentos destaca-se aqui, os Estatutos Penitenciários e a Lei
de Execução Penal (LEP) onde no Capítulo IV – Dos Deveres, dos Direitos e da
Disciplina - Art. 41 constituem direitos como: alimentação suficiente e vestuário;
atribuição de trabalho e sua remuneração; assistência material, à saúde, jurídica,
educacional, social e religiosa; entre outros.
O discurso jurídico penal brasileiro apresenta uma ideologia no qual, as
palavras chaves são prevenção, retribuição e ressocialização, mas numa melhor
compreensão sobre o sistema prisional, o que podemos observar é que apenas a
palavra retribuição faz parte do contexto. Assim, o sistema penitenciário brasileiro é
alvo de críticas por parte da sociedade, organizações nacionais e mesmo
internacionais de Direitos Humanos, pelas suas deficiências que ao invés de
proporcionar a ressocialização dos presos, acaba por aumentar o número de
infratores e reincidentes.
HISTÓRICO DO SISTEMA PRISIONAL
Em tempos atrás, os réus não eram condenados especificamente pela perda
da liberdade por algum período. Eram punidos com morte, suplício, açoite,
amputação de membros, trabalhos forçados, etc. Para viabilizar a punição imposta,
permaneciam presos durante um período necessário enquanto aguardava o
julgamento. Assim, o encarceramento era um meio, não o fim da punição. Nesse
contexto, não existia preocupação com a qualidade do recinto nem com a própria
saúde do prisioneiro.
A partir do século XVIII, a prisão torna-se, então, essência do sistema
punitivo. A finalidade do encarceramento passa a ser isolar e recuperar o infrator. O
atual cárcere insalubre, capaz de fazer adoecer seus hóspedes e matá-los antes da
hora, como simples acessório de um processo punitivo baseado no tormento físico,
apresenta a ideia de um estabelecimento público, severo, regulamentado, higiênico,
intransponível, capaz de prevenir o delito e ressocializar quem o comete.
O processo passa por uma mudança histórica significativa, ainda que muitas
vezes essas últimas características só estejam asseguradas no papel, por isso,
geralmente, o desenvolvimento da prisão é associado ao humanismo.
O sistema prisional atual, ao invés de proporcionar a reabilitação do preso,
acaba por criar novos infratores, mais violentos e revoltados com a sociedade. A
falta de projetos de ressocialização para os detentos e a própria infraestrutura dos
presídios torna o cárcere um ambiente vulnerável e propício à proliferação de
doenças e epidemias e todo tipo de degradação humana, quando deveria oferecer as
devidas assistências previstas na lei, que visa a garantia mínima dos Direitos
Humanos. Assim:
O sentimento de injustiça que um prisioneiro experimenta é uma
das causas que mais pode tornar indomável seu caráter. Quando se
vê assim exposto ao sofrimento que a lei não ordenou nem mesmo
previu, ele entra em estado habitual de cólera contra tudo que o
cerca; só vê carrascos em todos os agentes de autoridade: não
pensa mais ter sido culpado, acusa a própria justiça (FOUCAULT,
2009, p 252).
Essa falta de compromisso do poder público, dentre tantos outros problemas,
demonstram o fracasso do atual sistema penitenciário brasileiro. Essa situação crítica
que são submetidos os presos, sem que ocorra de fato a ressocialização e, portanto,
incentivando ao retorno à criminalidade, nos leva a observar o descaso com os direitos
humanos. “A prisão torna possível, ou melhor, favorece a organização do meio de
delinquentes, solidários entre si, hierarquizados, pronto para todas as cumplicidades
futuras” (FOUCAULT, 2009, p 222).
Um aspecto preocupante do sistema penitenciário brasileiro é a superlotação,
a falta de atendimento à saúde, rebeliões e fugas, corrupção, ineficiência na
reabilitação, entre outros, o que impossibilita o retorno, adequado, do apenado ao
convívio em sociedade. A pena é aplicada e cumprida, mas em condições
inadequadas, em condições degradantes e contrárias ao princípio da dignidade
humana e dos Direitos Humanos, verifica-se, portanto, a necessidade de mudanças.
OS DIREITOS HUMANOS SOB O OLHAR DA SOCIEDADE
Como padrões de referência da vida civilizada, os Direitos Humanos mantêm
relação intrínseca com o exercício da cidadania. É importante citar que, a Constituição
Federal de 1988 incorporou alguns preceitos enunciados nas declarações relativas aos
Direitos Humanos, entre outros, a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e
Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Ainda que, a maioria da população afirme que os Direitos Humanos devem
abarcar a todos, quando o assunto diz respeito à criminalidade no país, tais afirmativas
caem em contradição quando os mesmos declaram ser a favor das duras penas postas
aos indivíduos em conflito com a lei. Visualiza-se, nesse cenário, a concepção de que,
os Direitos Humanos só devem ser garantidos às pessoas “direitas”, e que, portanto,
quem infringe uma lei não se torna “digno” de possuí-los. Como se o desrespeito aos
direitos dos criminosos resultasse na preservação dos direitos de toda sociedade,
incitando-se, assim, a violência nas abordagens policiais, ou pior, a intensificação de
execuções sumárias.
No país existe uma população que não se dá conta da realidade vivida no seu
dia-a-dia, ao desconhecer a existência da legislação que norteia decisões importantes
de suas próprias vidas. Ficando, portanto, subjugado ao controle dos órgãos de
comunicação que funcionam como meio de manipulação, através dos quais é “feita a
cabeça” da maioria, que é levada pela forte influência da mídia. Temos um sistema
de comunicação que dizem o que bem entendem, a ponto de produzirem fatos a
serviço de suas versões.
É fato marcante de nossa sociedade que o sistema de comunicação e
informação são fontes relevantes de poder, portanto, irá sempre influenciar a opinião
pública e assim despertar o sentimento de vingança. É normal ao senso comum,
(influenciado também pela mídia) nutrir um desejo intrínseco de vingança e não de
justiça real, dando uma impressão de que a justiça não passa de uma vingança
formalizada com foco e ditada pelas normas morais e sociais movida pelo desejo de
proporcionar ao outro o que julga que lhe seja merecida.
Permeiam essas sentenças, uma concepção restrita que, considera que os
Direitos Humanos direcionam-se unilateralmente à defesa dos “direitos de
bandidos”. Dessa forma, vê-se que os “direitos não são universais nem automáticos,
mas restritos apenas àqueles que os merecem ou, quando menos, àqueles que não
fizeram nada para perdê-los.” (VENTURI, 2010, p.67). Neste sentido a sociedade
vive em busca de soluções e alternativas em sentido amplo, advindas por parte do
sistema sócio jurídico, no que se refere ao real significado das penas privativas de
liberdade.
O SISTEMA PRISIONAL ATUAL
Como pensar o sistema prisional numa sociedade desigual como a brasileira,
na qual as pessoas são condenadas (ou não) conforme seu statusquo, sendo que o
acesso à justiça é restrito e são utilizadas “formas inquisitórias de produção da
verdade jurídica e desigualdade jurídica?” (LIMA, 2004, p.49). Também não se pode
esquecer o sistema de privilégios do qual goza quem possui instrução superior e as
autoridades governamentais. Vê-se, portanto, que a igualdade perante a lei é apenas
formal, ainda que, como afirma Dias (2005) “o sistema jurídico assegura tratamento
isonômico e proteção igualitária a todos os cidadãos no âmbito social”.
Assim, o princípio constitucional da igualdade fica subsumido à interpretação
que os profissionais do direito fazem dos marcos jurídicos. Entretanto, é importante
destacar que, a cidadania não pode se restringir a princípios dogmático-formais sendo
que os direitos civis têm por premissa a proteção dos indivíduos. Vale destacar que, a
igualdade e a liberdade foram os primeiros Direitos Humanos a serem reconhecidos
enquanto tais.
O sistema prisional atual faz parte de uma política penitenciária e de segurança
pública que, ao invés de proporcionar a reabilitação do preso, acaba por criar novos
infratores, mais violentos e revoltados com a sociedade. A superlotação das prisões, a
falta de projetos de ressocialização dos detentos, a insalubridade dos presídios tornam
o cárcere um ambiente vulnerável e propício à proliferação de doenças e epidemias.
Essas faltas de compromisso do poder público, entre tantos outros problemas,
resultam no fracasso do atual sistema penitenciário brasileiro. Essa crítica situação a
que são submetidos, sem que ocorra de fato a ressocialização, acaba incentivando o
retorno à criminalidade, nos leva a observar o descaso com os Direitos Humanos.
Dessa forma,
A prisão não pode deixar de fabricar delinquentes. Fabrica-os pelo
tipo de existência que faz os detentos levarem: que fiquem
isolados nas selas, ou que lhe seja imposto um trabalho inútil, para
o qual não encontrarão utilidade, é de qualquer maneira, não
“pensar no homem em sociedade; é criar uma existência conta a
natureza inútil e perigosa”; queremos que a prisão eduque os
detentos, mas um sistema de educação que se dirige ao homem
pode ter razoavelmente como objetivo agir contra o desejo da
natureza? A prisão fabrica também delinquentes impondo aos
detentos limitações violentas; ela se destina a aplicar as leis e
ensinar o respeito por elas; ora, todo seu funcionamento se
desenrola no sentido do abuso do poder. (FOCAULT, 2009, p
252)
Nesse sentido, a prisão em si não passa de uma reles instituição falida, sem
mesmo conseguir cumprir seu principal dever. Vários fatores contribuíram para um
precário sistema prisional, o abandono, a falta de investimento e o descaso do poder
público. Sendo assim, a prisão na atualidade, não é senão, uma escola de
aperfeiçoamento do crime, além de ter como característica um ambiente degradante
e pernicioso, acometido dos mais degenerados vícios, sendo impossível a
ressocialização de qualquer ser humano.
ASPECTOS E FINALIDADES DA ATUAL LEI DE EXECUÇÃO PENAL
BRASILEIRA (LEP)
A Lei nº 7.210 de 1984 institui a Lei de Execução Penal - LEP na qual estão
estabelecidas as normas fundamentais que regerão os direitos e obrigações do
sentenciado no curso da execução da pena tem como finalidade atuar como um
instrumento de preparação para o retorno ao convívio social do recluso. Em seu
artigo 1º, a lei deixa claro que seu objetivo baseia-se em dois fundamentos: o estrito
cumprimento dos mandamentos existentes na sentença e a instrumentalização de
condições que propiciem a reintegração social do condenado.
O Brasil apresenta uma população carcerária que só faz crescer conforme
demonstra o gráfico abaixo:
1. Gráfico da Evolução da População Carcerária (2000 – 2010)
Dados atualizados até 07/out/2010 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
FONTE: DADOS EXTRAÍDOS DO DEPEN (DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO BRASILEIRO)
E DO CNJ (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA).
Por não existir Políticas Públicas efetivas, percebe-se que o sistema prisional
não atende se quer a demanda de assistir os carcerários. Isso acontece porque na
política de Execução Penal existem muitas falhas que começa na execução-gestão e
na falta de controle dos recursos públicos.
A LEP afirma que as resoluções de sentenças criminais têm como meta
garantir a integração social do condenado, porém, seguindo o pensamento do autor
Venturi, essa Lei nada fala sobre a realidade da superpopulação carcerária e sobre
alternativas efetivas para ressocialização do preso, além de outras garantias legais
que são esquecidas.
Analisando alguns dados extraídos do Formulário Categoria e
indicadores Preenchidos, do InfoPen (Sistema Integrado de
Informações Penitenciarias), do Departamento Penitenciário
nacional do Ministério da Justiça (DEPEN/MJ), referente a junho
de 2009, constata-se que a população carcerária nacional era de
469.546 internos, sendo 409.287 custodiados no sistema
penitenciário e 60.259 nas policiais e no sistema de segurança
pública. O número total de vagas, tanto no sistema penitenciário
quanto nas policiais e no sistema de segurança pública, era apenas
299.392 unidades, gerando um déficit momentâneo de 170. 154
acomodações. Em termos percentuais, significa que temos uma
excedente população de 57%, ou seja, para cada cúbico de quatro
camas, colocam-se dois presos ou mais para dormir no chão,
quadro atual da realidade carcerária brasileira no que diz respeito
ao número de vagas. (MAGALHAES, 2010, p 82)
65% 66% 66%
55%52% 54%
57% 57% 56% 56% 56%
35% 34% 34%
45%48% 46%
43% 43% 44% 44% 44%
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010*
Condenados
Provisórios
Podemos considerar que existe uma legislação, no entanto, não há garantia
na efetividade das leis, presencia-se uma população carcerária esquecida sem
nenhum tipo de assistência que possa pelo menos garantir um local adequado com
uma estrutura que possibilite atender a demanda desta população.
2. Gráfico da População Carcerária x Vagas no Sistema Prisional (2000 – 2010)
Dados de outubro de 2010.
FONTE: DADOS EXTRAÍDOSMDO DEPEN (DEPARTAMENTO PENINTENCIÁRIO
BRASILEIRO – MINISTÉRIO DA JUSTIÇA).
Significativa parcela da sociedade brasileira desconhece a função da LEP e
do Presídio. Para a população, as leis e o presídio servem somente para garantir a
prisão do condenado, sem acessibilidade de outros direitos que possibilite seu
retorno à sociedade. A própria LEP mostra que existe um conjunto de leis que
objetiva garantir serviços de saúde, assistência social, material, educacional,
religiosa e jurídico. Acontece que esses serviços encontra-se em deficiência, até
mesmo o atendimento jurídico gratuito (Defensoria Pública) visto que tal instituto
não consegue atingir o fim visado que seria o de prestar todo o auxílio às pessoas
necessitadas para a promoção de universalização do acesso eficiente à justiça.
Segundo Magalhães (2010), “para isso acontecer, deve ser o papel do Estado
garantir uma efetivação destes direitos”.
Percebemos que a LEP foi criada com base nos Direito Humanos, que tem
como finalidade garantir ao presidiário a possibilidade de ressocialização para um
futuro retorno a sociedade. Entretanto, as leis que surgiram para a garantia desses
72%66%
53%
72%
59%
67% 66%
54% 52%
61%64%
38%34%
47%
28%
41%
33% 34%
46% 48% 49%
36%População Carcerária
Vagas no Sistema Prisional
direitos, de fato não garantem uma efetivação dos mesmos. Nesse contexto, o Estado
surge como estrutura de poder institucional negligente porque não consegue resolver
o problema dos carcerários. Com base nisso, entendemos que o sistema prisional
brasileiro encontra-se defasado por não realizar uma política efetiva de
ressocialização.
Quanto aos direitos do homem, não basta fundamentá-los ou
proclamá-los. Nem tampouco basta protegê-los. O problema de
sua realização não é filosófica nem moral, mas tampouco é um
problema jurídico. É um problema cuja solução depende, não do
âmbito filosófico, mas do âmbito político. (BOBBIO, 1992, p 45)
Neste contexto, o Estado brasileiro apresenta um avanço com a criação da
Lei de Execução Penal, porém, presenciamos um país legal que possui leis que
foram criadas para ser executadas. Do outro lado um país real que mostra que as leis
são feitas, mas elas não são aplicadas ou efetivadas, quando vemos a realidade do
carcerário, encontramos uma situação que vai de desencontro aos Direitos Humanos.
Retomando a ideia de senso comum da população brasileira, - de que os
Direitos Humanos só devem ser garantidos às pessoas “direitas” - isso ocorre porque
muitos cidadãos não possuem informações adequadas para entender o papel do
Estado que é de garantir um direito ou de efetivar uma lei. Segundo Cano (2010), “a
população brasileira apresenta uma sensação de insegurança, devido à percepção de
que existe uma incapacidade do Estado de garantir a proteção ao cidadão”.
Fazendo um comparativo com os novos dados divulgados pelo Infopen, em
Junho de 2015, analisando os dados até 2014, houve um avanço nos números da
população carcerária de forma alarmante o que deixa a população jurídica,
acadêmica e sociedade em geral em estado de alerta.
O Brasil hoje ocupa a quarta posição com uma população carcerária de
607.731 pessoas presas, ficando atrás apena de Estados Unidos, China e Rússia,
tomando como base o ano de 2000, com 239 mil a população carcerária brasileira
tem obtido um crescimento anual de 7%. Um dado que reflete na superlotação das
celas em 2014, que alcança um déficit de 231 mil vagas o que deixa os presídios
com uma media de 1.6 por vaga, e em alguns com maior gravidade de 2.0 por vaga.
O relatório divulgado pelo Infopen aponta um valor de 1.1 de milhão
investidos pelo governo em construção de novos presídios, descentralizando cada
vez mais estas construções dos grandes centros, mas que se mostra um equívoco no
direcionamento das medidas.
Segundo Renato de Vitto (2015), diretor-geral do Depen, órgão que assina o
relatório, em entrevista à Revista Carta Capital:
É preciso analisar a 'qualidade' das prisões efetuadas e o perfil das
pessoas que têm sido encarceradas, para que seja
possível problematizar a 'porta de entrada' e as práticas de gestão
dos serviços penais, desde a baixa aplicação de medidas cautelares
e de alternativas penais até a organização das diversas rotinas
do cotidiano das unidades prisionais.
Nesta proporção de crescimento o Brasil chegará em 2022, com 1 milhão de
pessoas encarceradas e em 2075 a proporção é de 1/10; Com o agravamento de que
as pessoas mantidas nos presídios aguardando julgamento chega a uma proporção de
4/10. Dos presídios, 84% são para os chamados presos provisórios, mas também
abrigam condenados.
O perfil dos encarcerados continua o mesmo, mantem-se a baixa
escolaridade, uma referência que identifica essas pessoas como vítimas das mazelas
sociais e de pouco investimento na educação antes mesmo de cometerem algum
delito. De acordo com alguns dados (Carta Capital, 2015), predomina a raça negra
com 2/3 dos internos, sendo que deles 54% não tem ou não completaram o ensino
fundamental e para confirmar o que a imprensa em geral tem mostrado, 56% são de
jovens entre 18 e 29 anos e em maior número do sexo masculino.
Dos dados apresentados neste relatório merece uma maior atenção o
crescimento da população feminina nos presídios, o Infopen/mulheres fez um
levantamento dos números, embora haja uma lacuna de alguns anos sem colher
essas informações específicas. Foram utilizados dados de 1.424 unidades, onde estão
incluídos os dados das pessoas custodiadas em cárceres de delegacias ou similares
do Sistema de Segurança Pública.
Segundo os números coletados junto a Secretaria Nacional de Segurança
Pública e Ministério Público em junho de 2014 há 27.950 mil custodiados em
carceragens dos 607.731 total de detentos. Dessa população prisional, 37.380 são de
mulheres representando 6,4% dos encarcerados. O que deixa o Brasil na posição do
5º lugar mundial atrás de Estados Unidos com 205.400; China com 103.766; Rússia
com 53.304 e Tailândia com 44.751.
É importante destacar que o objetivo da LEP é fazer com que o criminoso
cumpra sua pena e que ao cumprir o mesmo não venha cometer outro delito.
Portanto sua finalidade é de ressocializar o preso para que o indivíduo tenha uma
nova chance de permanecer na sociedade e que este não venha a praticar novamente
ilicitudes. Porém a contatação de que a pena de reclusão (por si só) não se revelou
como solução eficaz para ressocializar o detento está no elevado índice de
reincidência dos criminosos oriundos do sistema carcerário. Presume-se, apesar de
não haver números oficiais, que no Brasil, cerca de 90% dos indivíduos que foram
presos, quando retornam à sociedade voltam a cometer crimes/delitos, e
consequentemente, acabam retornando à prisão.
A sociedade e as autoridades devem conscientizar-se de que a efetivação do
que esta previsto na Lei de Execução Penal é a principal solução para a garantia de
direitos da população prisional e o melhor caminho para proporcionar a integração
social dos detentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A exclusão social produz presidiários, e o Estado, por sua vez, é incapaz de
promover condições dignas de cumprimento de pena. Assim, conclui-se que as
palavras prevenção e ressocialização não fazem parte do universo jurídico penal, o
Estado não oferece instrumentos reais, sólidos para enfrentar a questão. Além da
fragilidade do Estado, temos ainda uma sociedade pouco esclarecida em que a
população é levada a acreditar que confinar as pessoas seja a única solução possível
para se evitar o caos e a desordem que só tem crescido cada vez mais.
Como medida para solucionar o grave problema do sistema penal brasileiro,
temos o APACS - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados - força
nacional da Defensoria Pública, mas ainda é muito pouco, pois essas práticas sofrem
os entraves burocráticos de leis na medida em que o Estado não viabiliza
instrumentos para a eficácia desse aparato legal. O Estado ao invés de viabilizar os
recursos para o cumprimento dessas leis em vigor preocupa-se em editar novas
regras (emenda) como forma de repressão.
Outra alternativa para solucionar a questão dos encarcerados seria a
efetivação de políticas públicas na garantia de uma educação escolar, que aliás,
encontra-se na LEP – Da Assistência Educacional - no qual garante a instrução
escolar e a formação profissional, o art. 20 mostra que as ações e atividades
educacionais poderão ser conveniada com as organizações públicas e privadas que
podem oferecer cursos especializados, já o art. 21 garante até uma biblioteca nos
estabelecimentos prisionais.
A crise no sistema prisional brasileiro vem se agravando com o decorrer dos
anos. As questões da violência e da criminalidade não são apenas problemas que se
restringem ao campo da segurança pública, trata-se, fundamentalmente, de
manifestações das graves carências que apresenta o perfil das políticas sociais e das
modalidades de (des) proteção social no Brasil, em áreas estratégicas da provisão de
serviços, tais como as que se referem à saúde, educação, moradia, emprego.
No momento contemporâneo, o sistema prisional tem se convertido em
dispositivo que, além de punir, serve ao propósito de tornar socialmente mais
invisíveis os fatores envolvidos na produção social da criminalidade, isso acontece
simplesmente confinando e abandonando nesse confinamento àqueles que
transgrediram a lei, desprovidos das formas mais elementares de proteção social e do
exercício de direitos que correspondem à condição humana.
As prisões são cenários constantes de violações dos direitos humanos. Os
principais problemas enfrentados entre muitos outros são: a superlotação; a
deterioração da infraestrutura carcerária; a falta de apoio de uma legislação digna
dos direitos do preso; e a reincidência que é de vital importância para as vistas da
sociedade. Todos estes problemas demonstram que o sistema prisional brasileiro
está aniquilando qualquer possibilidade de o preso se recuperar.
Se fosse efetivada integralmente, a Lei de Execução Penal certamente
propiciaria a reeducação e ressocialização de uma parcela significativa da população
carcerária atual. No entanto, o que ocorre é que, assim como a maioria das leis
existentes em nosso país, a LEP permanece satisfatória apenas no plano teórico e
formal, não tendo sido cumprida por nossas autoridades públicas.
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