A Reforma Tributária e Suas Perspectivas Rodrigues de Amaral
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A Reforma Tributária e suas Perspectivas
(Palestra na Federação das Indústrias de Santa Catarina, em 28/maio/99, em
Florianópolis, SC.
O conteúdo do debate subseqüente à exposição está resumidamente incorporado ao
texto da palestra).
Antonio Carlos Rodrigues do Amaral
Professor da Universidade Mackenzie (São Paulo)
ITP/LL.M’94 (HLS)
A questão da Reforma Tributária, e eu diria talvez, das "Reformas Tributárias" ora em
discussão, são projetadas em função da necessidade de fomentar o desenvolvimento do país,
a desoneração de exportações e o incentivo ao crescimento econômico sustentado.
Pretendo apresentar um quadro histórico da evolução do nosso sistema tributário, para
analisar um pouco as perspectivas do que acontece em âmbito internacional e como isso nos
afeta; passando a analisar, também de modo breve, o que atualmente ocorre no Congresso
Nacional em termos de encaminhamento de propostas de Reforma Tributária.
O nosso sistema tributário vai se delinear da forma, vamos dizer, economicamente melhor
detalhada, nos idos da década de 60, basicamente em 1965 e 1966, quando foi editado o
Código Tributário Nacional, que é o primeiro documento, em termos de história do Brasil,
que procura delinear o nosso sistema tributário segundo as bases econômicas que serviriam
para fins de imposição tributária.
De 1965 até hoje, tema recorrente é a Reforma Tributária, porque aquele sistema que se
modelou em 1965, não obstante fossem identificadas bases econômicas bastante importantes
para tributação, já sofreu uma profunda influência política no seu delineamento, notadamente
no que se refere à atribuição de competências e à repartição das cargas e das receitas
tributárias.
Quando analisamos a evolução da tributação durante o século XX, vamos verificando que,
via de regra, os países passaram por uma modificação da sua ótica no campo da imposição
tributária: deixando de lastrear os seus sistemas fundamentalmente num imposto sobre a
renda, para lastreá-los, basicamente, nos tributos sobre o consumo, notadamente pelo
denominado imposto sobre o valor agregado, o IVA.
A tributação do denominado "valor agregado" nada mais é do que uma técnica de imposição
tributária sobre o consumo. O Brasil, ao final na década de 60, foi o primeiro país do mundo
a introduzir um amplo imposto do tipo, cobrado segundo a técnica do valor agregado, o então
ICM (imposto sobre circulação de mercadorias). O ICM cobriu todas as etapas da cadeia
produtiva, envolvendo a produção, a distribuição e a venda ao consumidor final de um bem.
Fomos o primeiro país do mundo a fazer isso, inclusive de forma pioneira em relação à então
comunidade econômica européia.
O Brasil ao contrário do que fez a Europa e ao contrário do que fizeram cerca de cem países
em todo o mundo, a partir de meados da década de 60, repartiu essa tributação sobre o
consumo, entre as três esferas políticas brasileiras: União, Estados e Municípios.
Deixando o ICM com os Estados, criou-se o IPI, no âmbito federal, tributando basicamente
cinco fases da industrialização e deixando um tributo cumulativo, o ISS, para ser cobrado
pelas municipalidades. Ao contrário da regra adotada no mundo inteiro, quando se
implementa um amplo imposto sobre o valor agregado, no Brasil, aquela tributação sobre o
consumo, ao invés de ficar com o Governo Federal, repartiu-se em três esferas.
A partir daí a nossa vida, nos últimos trinta anos, vai demonstrando o grande pesadelo
administrativo em que se transformou a tributação sobre o consumo no Brasil, notadamente
por essa quebra entre IPI, ICMS e ISS, à qual se acrescentou algo que de longe os países
desenvolvidos foram abandonando, que é a adoção, também para a tributação do consumo,
dos chamados impostos cumulativos, PIS, COFINS, CPMF e assim por diante.
Desde 1965, nunca fizemos uma Reforma Tributária, embora sempre se tenha falado em
Reforma Tributária. Sempre fizemos pacotes tributários. Talvez nos últimos dez a vinte anos,
não tenhamos vivido nenhum ano, sem que ao final de cada exercício, tenhamos sido
surpreendidos por pacotes tributários.
Esses pacotes tributários, sempre retalham, fazem remendos em toda a nossa sistemática,
ampliam a arrecadação e trazem cada vez mais distorção ao nosso regime.
Por isso causou perplexidade para muitos as declarações que o secretário Everardo Maciel fez
há questão de uma semana atrás, na Comissão Parlamentar de Inquérito do Sistema
Financeiro em Brasília, quando dizia o Senhor Secretário, que o Brasil possui cerca de 825
bilhões de reais em circulação no mercado que não são objeto de tributação, seria mais um
PIB; e aponta uma série de outras distorções do nosso sistema. O que talvez devesse ter sido
igualmente sublinhado, é que essas distorções, pelo Senhor Secretário apontadas, seja por
práticas de sonegação, seja por práticas de elisão, de legítimo planejamento tributário, assim
por diante, são distorções que, na realidade, são o efeito da própria distorção do nosso sistema
tributário, retalhado pelo próprio Poder Público, nesses últimos 30 anos.
Então uma questão complexa como Reforma Tributária, não pode ser analisada apenas, por
assim dizer, na perspectiva dos mocinhos, os bons contribuintes e dos bandidos, os maus
contribuintes. Quer dizer, a questão da reforma tributária, como afeta substancialmente a vida
do país, tem que ser analisada com uma ampla participação de toda a sociedade. É
imprescindível uma análise profunda do que aconteceu no país nas últimas três décadas, do
que ocorre ao redor do mundo, e de quais são as nossas perspectivas sociais e econômicas,
inclusive no campo do desenvolvimento tecnológico e do setor de serviços em geral, para as
próximas décadas. O poder público quando vai tratar da arrecadação, o Estado quando vai
impor um sistema tributário, vai ter que lastrear a tributação em algumas bases econômicas; e
aí não cabe tanta criatividade: nós podemos ter uma criatividade muito grande nas espécies
tributárias, mas naquilo que nós vamos tributar não, porque o Estado na realidade buscará
identificar sempre a riqueza do cidadão ou da empresa. E o cidadão é sempre o mesmo, a
empresa é sempre a mesma, embora seja essa mesma riqueza base de tributação para todas as
esferas impositivas: União, Estados e Municípios.
A tributação é vinculada à geração, à manutenção ou ao consumo de uma riqueza. Quando
essa riqueza é adquirida pelo cidadão e nós tributamos a aquisição daquela riqueza, o
fazemos por tributos sobre a renda. A base econômica renda é tributada no momento em que
a riqueza é adquirida, em que ela ingressa no patrimônio do contribuinte. O momento da
aquisição é o escolhido para a imposição tributária.
Um segundo momento utilizado para imposição tributária é quando aquela riqueza se
encontra poupada ou imobilizada, através dos chamados impostos patrimoniais. A riqueza
adquirida que foi imobilizada, por exemplo num bem imóvel ou num automóvel, será objeto
de tributação através de alguns impostos sobre o patrimônio: IPTU - Imposto sobre
Propriedade Predial Urbana, ITR - Imposto Territorial Rural, IPVA, tributando os veículos,
assim por diante. Normalmente os tributos sobre o patrimônio são tributos de menor poder de
arrecadação, até porque a imobilização da riqueza num patrimônio não significa dizer que o
contribuinte terá liquidez para pagar o imposto incidente sobre aquele patrimônio.
Uma terceira grande base econômica que é identificada para fins de tributação, é o consumo,
é a riqueza consumida mediante a aquisição de bens ou serviços.
Do ponto de vista clássico, adquirir riqueza é uma manifestação da capacidade contributiva
do cidadão. Uma outra manifestação da capacidade contributiva, se lastreia na imobilização
daquela riqueza num patrimônio, e uma terceira manifestação da riqueza de cada um, projeta-
se no momento do consumo. A hora em que aquela riqueza poupada ou imobilizada é
consumida, é o momento da imposição dos tributos sobre o consumo.
Ademais, há, via de regra, também tributos sobre o consumo que são regulatórios do
comércio exterior; para regular importação e exportação e eventualmente algumas
contribuições que podem ser aplicadas a sistemas específicos de seguridade social, sistema
sindical, e assim por diante.
Ao falarmos em Reforma Tributária, em primeiro lugar temos que identificar dentro dessas
bases econômicas, renda, patrimônio e consumo, quais serão as mais adequadas, e com que
peso, para fins de delineamento do nosso sistema tributário. O desenho do sistema tributário
deverá, segundo ensina a ciência das Finanças Públicas, considerar a eficiência econômica, a
neutralidade, a administratibilidade e, sobretudo, a justiça fiscal na repartição de custos e
benefícios, sob a ótica dos direitos fundamentais esculpidos na Constituição Federal. Dessa
forma, o sistema tributário deverá produzir o menor volume de distorções possíveis na
sociedade e fomentar o desenvolvimento econômico, ou melhor dizendo, não atravancar, na
maior extensão possível, o desenvolvimento econômico do país.
Os europeus quando constituíram a comunidade européia, lá nos idos de 1957, 1959 (pelo
Tratado de Roma), verificaram que a melhor forma de competir numa economia que inicia
um processo de regionalização para posterior globalização, tendo em vista a interdependência
global que se apresenta a partir da segunda metade deste século XX, seria mediante a
eliminação das barreiras tarifárias e barreiras não tarifárias no comércio dentro daquele bloco
regional para o livre comércio.
O que os europeus estão procurando construir é justamente aquilo que nós identificamos num
país federal como o Brasil ou como os Estados Unidos: as chamadas quatro liberdades
fundamentais: livre circulação de pessoas, de bens e serviços, liberdade de estabelecimento e
livre trânsito de capitais. Dentro da nossa área territorial, dentro desse continente brasileiro,
os nossos Estados possuem um certo grau de autonomia e cada um de nós brasileiros pode
adquirir produtos ou serviços de qualquer lugar do Brasil, podemos exercer a nossa profissão
dentro de qualquer lugar do Brasil, podemos estabelecer as nossas operações industriais ou de
prestação de serviços em qualquer Estado e temos o livre trânsito de capitais: podemos
transferir nossos recursos de Porto Alegre para Manaus sem nenhum problema, detendo uma
moeda única.
O que os europeus pretenderam fazer no final da década de 50, início da década de 60, foi
justamente implementar algo semelhante ao regime federativo, iniciando pela busca à
eliminação das barreira tarifárias e não tarifárias ao comércio intrabloco. Quando os europeus
começaram a fazer as análises das repercussões à implementação daquele regime de
integração econômica (que depois confirmou-se em 1992 com o tratado de Maastrich);
quando analisavam qual a melhor forma de promover o crescimento econômico dentro da
Europa, mediante a integração de mercados, ficaram seriamente preocupados com toda a
distorção que o sistema de tributação poderia trazer ao desenvolvimento econômico dos
países.
Foram criadas diversas comissões de estudos a partir do início da década de 60 que durante
alguns anos analisaram os sistemas tributários europeus e os sistemas tributários existentes
nos outros países do mundo e procuraram delinear o princípio do que seria uma tributação
mais eficiente, mais justa e que não atravancasse o desenvolvimento, não inibisse a
integração e o crescimento econômico e social da Europa. Analisando as três bases clássicas,
renda, patrimônio e consumo, os europeus chegaram à conclusão que a tributação sobre a
renda não demandaria maiores complexidades em termos de acordos bilaterais. Havia uma
percepção geral no âmbito europeu que as distorções causadas pela tributação da renda
poderiam ser reguladas ou bastante reduzidas através dos chamados tratados para evitar a
bitributação.
Os europeus consideravam, de qualquer forma, que as condições de mercado trariam uma
harmonização no campo do imposto de renda, uma coordenação das várias jurisdições. O que
os europeus vislumbraram foi o seguinte: se a França impor um imposto de renda mais alto
do que tributa a Alemanha, provavelmente os investimentos iriam preferir a Alemanha. Então
os europeus não se preocuparam em fazer um elevado grau de regulamentação do imposto
sobre a renda, entendendo que o próprio mercado coordenaria a sua imposição. O que se
procurou evitar é que os integrantes da comunidade européia implantassem medidas
discriminatórias segundo a origem do capital ou a residência de seu detentor.
Em relação aos tributos patrimoniais ocorreu algo semelhante. Tanto no campo de imposto de
renda como no caso dos impostos patrimoniais, os europeus se preocuparam com que não
houvesse um tratamento diferenciado em função da nacionalidade do contribuinte. Então o
alemão, o inglês, seriam tributados como o francês operando na França. O francês na
Alemanha seria tributado como o alemão; tendo sido essa a preocupação maior em termos de
estipulação do regime tributário europeu no campo de imposto de renda e dos impostos de
caráter patrimonial.
Todavia, no campo dos impostos sobre o consumo, os europeus ficaram francamente
preocupados com as grandes distorções dos sistemas adotados nos diversos países, que então
iam compor a comunidade econômica européia. Muitos desses sistemas estavam lastreados
em tributos cumulativos. Para fins de tributação do consumo, tributos cumulativos, como o
nosso PIS, como a COFINS e a CPMF, como sabem, incidem em cascata. Assim, vão
acumulando-se em todas as etapas de produção e distribuição em direção ao consumo final,
de tal forma que não se consegue identificar ao certo, na composição final do preço, quanto
foi realmente a carga tributária que está inserida naquele produto.
Com essa grande preocupação quanto ao lastro do sistema tributário em impostos
cumulativos, os europeus colocaram como condição essencial para um país ingressar na
comunidade econômica européia, a substituição daquele sistema de impostos cumulativos
sobre o consumo por um amplo imposto sobre o valor agregado.
O imposto sobre o valor agregado significa um amplo tributo sobre o consumo cobrindo
todas as etapas de produção, desde o início, da aquisição das matérias-primas ou aquisição de
bens de capital e equipamentos, que seriam utilizados na produção de bens, passando pela
distribuição até o consumo final. Dessa forma, a técnica de tributação pelo valor agregado se
projeta na tributação do valor que se agrega em cada uma das etapas da operação. Quando
chegasse na ponta final, o contribuinte teria plena ciência de quanto daquele preço eqüivale a
tributos, com a vantagem adicional que ao identificar dentro do preço daquele produto o valor
do tributo respectivo, é possível excluir a tributação no caso da exportação. Nenhum país do
mundo, ou melhor nenhum país sério do mundo, procura implementar como política de
exportação, a exportação de tributos, porque exportar tributos, como é óbvio, não torna
competitivo os preços dos produtos no exterior. Daí o caráter racional do sistema adotado
pela União Européia, no sentido de se trilhar com imposto sobre o valor agregado, permitindo
a correta identificação do tributo incidente nos produtos respectivos e mais, permitindo
excluir da exportação todo o tributo que havia sido agregado desde a fase de produção.
Trouxemos para o Brasil esse conceito de tributação sobre o consumo, só que, como foi antes
destacado, repartimos entre a União e os Estados e Municípios, através do IPI e do ICM,
agora ICMS. Fizemos, entretanto, conviver no nosso sistema tributário, um amplo número de
impostos cumulativos, que vão se escondendo no preço dos produtos que fabricamos e torna
a nossa economia totalmente distorcida. Essa distorção também é exportada, quer dizer,
dando muito menor competitividade aos produtos brasileiros levados ao exterior.
Fazendo um breve parênteses dessa linha histórica de condução e passando para a questão da
distorção do nosso sistema, o que nos assusta ver, é que todo o projeto do governo
apresentado ao Fundo Monetário Internacional para fazer frente aos nossos déficits fiscais de
arrecadação, são lastreados em tributos cumulativos, o PIS, a COFINS, a CPMF etc. São
esses tributos cumulativos que vão servir de lastro à economia brasileira em termos de
arrecadação nos próximos três ou quatro anos, até o ano 2002, pelo Governo Federal; quer
dizer, esses mesmos tributos cumulativos que lá no final da década de 60 os europeus
procuraram erradicar de seus sistemas.
Voltando ao relato histórico, o sistema brasileiro vem sofrendo várias distorções, e hoje, o
problema que se enfrenta é que na realidade não se consegue sequer harmonizar as discussões
de Reforma Tributária no âmbito do setor privado. Eu diria que esse, talvez, seja um dos
pesados frutos do regime militar que fechou o nosso país não apenas em termos econômicos,
mais o fechou em termos intelectuais. Fechou o nosso país ao debate democrático. Com a
democratização, todos nós estamos nadando no meio de uma tempestade, inclusive o
Congresso Nacional que não está ainda afeito aos debates pelos mais diversos setores sociais,
em termos até de metodologia. Quer dizer, o Congresso Nacional não está preparado para
receber as sugestões, as influências dos mais diversos setores que compõem a sociedade
brasileira.
O setor privado primeiro precisa identificar o que ele quer em termos de sistema tributário.
Um sistema tributário lastreado fundamentalmente na tributação da renda (como nos Estados
Unidos)? Um sistema tributário lastreado nos impostos patrimoniais (que nos remete à
sistemática da antigüidade ou no máximo medieval)? Um sistema tributário lastreado na
tributação do consumo (que é a sistemática que mais cresce em termos contemporâneos); se
vamos lastreá-lo na tributação de consumo, que técnica de tributação utilizar? Tributos não
cumulativos (como o imposto sobre o valor agregado) ? Tributos cumulativos (como a CPMF
e a COFINS)? De quem será a competência? Da União, dos Estados ou dos Municípios? Que
nível de autonomia conferir para os entes da Federação? Para União, para os Estados, para os
Municípios?
Essa parece ser a dificuldade maior que têm enfrentado o setor privado, no sentido de não
serem harmonizados sequer os conceitos. Quando o setor público, União, Estados e
Municípios participam das discussões no âmbito do Congresso Nacional, participam de
maneira muito mais uniforme, até porque o debate que se faz no âmbito de Estados e
Municípios é a ampliação da arrecadação, a mesma coisa ocorrendo no âmbito do Governo
Federal.
Quando observamos, sob a ótica da reforma tributária, as declarações do Sr. Secretário
Everardo Maciel na semana passada, o que vemos é que reforma tributária para o governo
significa ampliação da tributação, ampliação de mecanismos que potencializem o poder da
Receita Federal e dos Fiscos Estaduais e Municipais para a arrecadação tributária. E, fato
relevante é que o presidente Fernando Henrique Cardoso, deu declarações confirmando a
intenção do governo em fazer uma reforma o quanto antes, no âmbito infra-constitucional,
para implementar os mecanismos defendidos pelo Sr. Secretário da Receita Federal, no
sentido de ampliar a arrecadação e os mecanismos de controle sobre o setor privado.
Hoje o governo é muito melhor preparado do que alguns governos anteriores, do ponto de
vista da preparação técnica. Embora às vezes ainda pareça que o governo, levando-se em
consideração as esferas políticas brasileiras, não tem a plena concepção das bases econômicas
para fins de tributação, ou melhor dizendo, de quem é que paga a conta dos gastos estatais.
Quando analisamos a riqueza que é tributada, verificamos que é sempre o mesmo cidadão
que será tributado quando adquire a riqueza, quando imobiliza a riqueza e quando aquela
riqueza é consumida. É sempre o mesmo cidadão que paga a conta.
E ainda é também sempre o mesmo cidadão que será tributado pelo poder público federal,
pelo poder público estadual e pelo poder público municipal. O cidadão não tem diversas
facetas, em que cada poder público escolheria uma delas para tributar. Não! É o mesmo
cidadão, é o todo de cada cidadão que é tributado o tempo todo, por todos esses entes
tributantes.
Algumas outras falhas na percepção conceitual da matéria, não sei se propositais ou não,
dizem respeito à grande discussão referente às distorções do nosso sistema tributário, no
sentido de dizer que as empresas pagam pouco tributo, que quem paga mais é o assalariado e
assim por diante.
As distorções do nosso sistema, levam a que cada vez mais o governo dê menos liberdade ao
cidadão. O governo tem feito reformas tributárias sim, infra-constitucionalmente, o governo
tem alterado nos últimos quatro, cinco anos substancialmente o nosso sistema tributário. E
todas as alterações que o governo vai fazendo, cada vez mais retiram a liberdade do cidadão
de pagar ou não pagar um tributo.
Sofre mais com isso, é fato, quem tem menos flexibilidade na composição de suas riquezas
que é o assalariado, que será tributado no momento que recebe a sua renda, o seu salário, e
não tem como fugir, sendo então substancialmente penalizado por uma carga tributária
desmedida e substancialmente injusta, se comparada à prestação de serviços essenciais por
parte do poder público.
Por outro lado, quando analisamos no campo das empresas, o IPI, o ICMS, o PIS ou a
COFINS, a CPMF, enfim uma parafernália de tributos que a cada vez mais são tributados por
um sistema de substituição tributária ou retenção por responsáveis tributários. O que vale
dizer, também cada vez mais os tributos declaratórios, aqueles que dependem da liberdade do
cidadão de pagar ou não, vão sendo retirados do nosso sistema.
Quando o governo lastreia potencialmente a sua arrecadação em tributos como a CPMF, está
lastreando a tributação em tributos sobre os quais o contribuinte não tem a menor liberdade
de não pagar. Não bastasse o caráter cada vez mais autoritário da sistemática impositiva,
acrescido da carga desmesurada sobre o cidadão, dada a alta concentração da incidência
tributária, o problema maior radica em uma tributação cumulativa. E assim o nosso sistema
tributário tem sido construído nos últimos anos, criando distorções absurdas na sociedade,
tirando competitividade da economia de uma forma substancial.
Querem uma demonstração simples desta realidade da perda de competitividade atrelada à
essa distorção do regime tributário? Nós poderíamos fazê-la na seguinte perspectiva: Vem
alguém e diz: vamos criar um grande tributo sobre a renda das empresas. Então vem o Sr.
Secretário e diz, "das quinhentas maiores empresas do Brasil, metade delas não pagou o
imposto de renda." Pagaram vários outros tributos mas, na ótica do Sr. Secretário, que deve
estar baseado em algumas estatísticas, metade das empresas geraram prejuízo e não pagaram
o imposto de renda.
Ora, o que é a empresa? A empresa em primeiro lugar não é nada mais do que uma ficção
jurídica, a empresa não existe por si só, quando falamos de personalidade jurídica, isso é uma
ficção que produz um efeito jurídico. Por exemplo, três pessoas assinam um papel e
constituem uma empresa que se chamará ABC Ltda., ou sociedade por ações ou o que for. E
este papel representa a empresa. É um pedaço de papel que espelha o seu patrimônio e suas
condições básicas de gestão. Essa empresa, assim, nada mais será do que aqueles mesmos
três sujeitos que a capitalizaram, acrescida dos seus funcionários, dos seus colaboradores, que
vão ser lá contratados.
Suponhamos que esta empresa seja uma indústria. Essa empresa nada mais será do que os três
sujeitos que a fundaram acrescida dos seus funcionários e colaboradores, acrescida daquela
comunidade que vive em torno daquela indústria e somada aos seus fornecedores e
consumidores. Então, quando falamos em empresa, na realidade falamos de uma ficção,
porque a empresa em si é composta dos seus donos, quotistas ou acionistas, pelos seus
funcionários, colaboradores, pelas famílias dos seus colaboradores, pelos seus fornecedores e
pelos seus consumidores.
Quando se aumenta substancialmente a tributação da empresa, na realidade o que se está
fazendo é diminuir níveis de lucratividade daquela empresa e ao diminuirmos
substancialmente níveis de lucratividade da empresa, impede-se o acionista ou proprietário
daquela empresa de deter recursos para reinvestir no seu negócio; ou desestimular o risco
industrial, empresarial, que está sendo assumido pelo acionista, de tal forma que o acionista
prefira em vez de produzir e assumir risco, pegar o seu dinheiro e ir embora ou imobilizá-lo
num patrimônio.
O primeiro efeito de se ampliar substancialmente a tributação, para se dar o exemplo na
empresa, seria a diminuição dos índices de retorno do capital investido por parte do
proprietário. Se as margens de lucratividade já estiverem muito diminutas, o segundo efeito
direto de uma ampla tributação na empresa é a diminuição da remuneração salarial, é o
congelamento da remuneração dos seus funcionários e em paralelo, diminuição de postos de
emprego, e se essa tributação é muito elevada, é o fechamento de postos de emprego.
O terceiro efeito na ampliação dos níveis de tributação por parte das empresas seria transferir
para o preço do produto o aumento da ampliação daquela carga tributária; na medida que se
amplia a transferência para o preço do produto daquela carga tributária, quem vai pagar o
tributo será aquele mesmo trabalhador ou aquela mesma família ou aquela mesma
comunidade que demanda os produtos fabricados por aquela empresa. O que vale dizer,
sempre e finalmente quem paga a conta é o cidadão, é o seu João, é a Dona Maria, seja
diretamente pelo aumento do preço de um produto, seja indiretamente pela perda do seu
posto de trabalho, pelo congelamento dos níveis salariais e assim por diante, atingindo-se os
fornecedores, etc.
Ao se fazer essa análise, fica claro um aspecto que é assustador dentro das distorções em que
se vive atualmente no Brasil. Por decorrência de uma nítida recessão, de uma quase depressão
econômica (e aí vem aquela grande discussão que os economistas fazem sobre a diferença
entre recessão e depressão: que se fala que recessão é quando o seu vizinho perde o emprego
e a depressão é quando você perde o emprego...), a economia certamente não está aquecida e
as empresas lutam para sobreviver.
Como é possível, num regime em que as empresa lutam para sobreviver, como é possível
num regime que o cidadão luta para manter seu emprego, que o governo, de forma reiterada,
bata recordes de arrecadação a cada mês? Ou seja, se toda tributação se lastreia na produção
de riqueza e o que estamos dizendo é que justamente a riqueza não está sendo produzida
porque estamos em recessão, estamos em depressão, o sujeito está desempregado, quer dizer,
se não há riqueza sendo produzida, como é que o governo consegue a cada mês manter
índices recordes de arrecadação?
A resposta está nessas alterações que o governo vem fazendo no regime, cada vez mais
tributando faturamento das empresa ou a receita bruta; cada vez mais tirando a liberdade do
cidadão de poder pagar ou não pagar um tributo.
Com essa distorção, o governo está esvaziando o patrimônio das empresas, dos acionistas,
dos seus trabalhadores. O patrimônio do trabalhador, a riqueza do trabalhador é o seu salário,
e a cada vez mais o seu salário fica mais baixo ou ele nem recebe o salário. Então, no mínimo
é assustador o regime que vivemos hoje, fruto dessas grandes distorções da nossa sistemática
tributária, a convivência de índices recordes de arrecadação com índice recorde de
desemprego. Isto demostra que cada vez mais estamos transferindo patrimônio do setor
privado para ser esterilizado nas burras estatais, nos cofres governamentais. E infelizmente
essa alta arrecadação também não tem revertido no ataque às altas distorções sociais que o
Brasil enfrenta. E nós convivemos com uma certa riqueza aqui no Sul e com uma pobreza
alarmante no Norte e Nordeste do Brasil.
A questão que passa pelo amplo debate social, quando falamos em níveis de arrecadação, em
questões de reforma tributária, não é uma discussão periférica como o governo muitas vezes
parece apresentar, como por exemplo quando vimos o Sr. Secretário da Receita Federal
discutir no âmbito do Congresso Nacional. Essa discussão é um pouco mais ampla e temo eu
que sejamos atropelados por medidas periféricas que vão cada vez mais retalhando nosso
sistema, sem que consigamos fazer uma reforma substancial de nossa estrutura tributária
atual.
Passemos a discorrer um pouco sobre o que acontece em termos de reforma tributária no
Congresso Nacional. Como todos nos lembramos, nos últimos 10, 15 anos, sempre se
propugna por reforma tributária no Brasil: todos queremos reforma tributária.
Há uma coincidência na identificação de alguns problemas notórios no nosso regime
tributário, no sentido de que é complexo, é distorcido, é burocrático, gera a perdas de
concorrência gritantes. Todos nós tendemos a concordar quanto à identificação dos
problemas, mas infelizmente não quanto às possíveis soluções. Podemos, assim, tentar
apreciar um pouco do que ocorre no Congresso Nacional.
O ano de 1995 representa um certo divisor de águas, porque é quando o governo apresenta ao
Congresso Nacional a sua primeira grande proposta, vamos dizer, de alteração estrutural do
sistema tributário brasileiro, através da PEC (Proposta de Emenda Constitucional), No 175,
de 1995.
À PEC/175, de 1995, foram apensadas outras oito propostas de emenda constitucional que
estavam em discussão no Congresso Nacional. Então, tínhamos na base dessa discussão,
quando foi criada a comissão de reforma tributária, no mínimo nove proposta de emenda
constitucional. A essas nove propostas, quando a PEC/175 abre prazo para recebimento de
propostas de alteração da própria emenda, foram apresentadas 98 emendas à PEC 175. Das
98 emendas, três outras de alteração total do sistema tributário.
Então, a PEC 175/95, na sua primeira versão, passa a circular dentro do âmbito do Congresso
Nacional com cerca de doze textos possíveis de sistema tributário. Isto é, na primeira
discussão são doze textos que são apresentados. Não é preciso muito esforço para verificar
que as idéias desses quatorze textos são muitas vezes diametralmente opostas, divergentes,
inconciliáveis.
O Deputado Mussa Demes, relator da Comissão Especial de Reforma Tributária da Câmara
dos Deputados, fez um primeiro trabalho de integração das várias propostas, tentando
encontrar um denominador comum para a conciliação de tão variadas espécies de sugestões.
Só que não podemos esquecer que discussão de reforma tributária não é mero acordo de
interesses políticos, na busca do tal denominador comum. Discussão de reforma tributária,
pelos profundos impactos e distorções que traz no desenvolvimento de um país, no
desenvolvimento de uma nação, tem que ter sempre um eixo de condução técnico. Se o eixo
de condução é meramente político, é meramente ideológico, criamos uma projeto
Frankenstein em que se analisam propostas por vezes diametralmente opostas e se tenta
conciliá-las.
É o que tentou fazer o Deputado Mussa Demes durante os anos de 1995 e 1996. Basicamente
o primeiro texto que se apresenta como sendo um texto matriz para discussão, vai incorporar
o IPI dentro do ICMS e levar a legislação do ICMS para a regulamentação no âmbito Federal.
Tais alterações foram, num primeiro momento, identificadas como muito tímidas em sentido
geral, contrariamente àquilo que se esperava em termos de reforma tributária.
No final de 1997, vai o Sr. Pedro Parente, então secretário executivo do Ministério da
Fazenda, fazer um depoimento na comissão de reforma tributária e diz que ao governo não
mais interessa a PEC 175 e que se irá apresentar um novo projeto que será lastreado na
modernização do sistema, eliminação dos tributos cumulativos, na criação de um imposto
sobre o valor agregado ao lado de um IVV (imposto sobre vendas à varejo, que tinha sido
sugerido pela FIPE, pela FIESP em São Paulo). Enfim, fora a questão polêmica do IVV, ele
apresentou princípios com os quais há uma concordância geral. Porém não apresentou a
implementação desses princípios em um texto, para que as pessoas pudessem verificar se são
contra ou a favor e qual é o real impacto daquilo que vai ser apresentado em termos de
reforma.
A partir de então, muito se discutiu no Brasil e durante praticamente um ano, um ano e meio
se debateu uma proposta virtual, porque simplesmente o secretário Pedro Parente, que havia
apresentado somente meia dúzia de transparências lá no Congresso Nacional, dizendo o que
seria o nosso Sistema Tributário, não apresenta o texto respectivo.
A sociedade começou a pressionar para que houvesse um texto porque a comissão de reforma
tributária parara de andar. Enfim, o Ministério da Fazenda preparou um texto que foi
apresentado no fim do ano passado. Esse texto ficou assustador, na medida em que parecia
não ter começo, nem meio, nem fim. O governo mudou todos os princípios que antes
anunciara. E mais, embora os procurasse reafirmar na introdução do texto, na prática
eliminava a esperada modernização do sistema. Enquanto anunciava que tirava os tributos
cumulativos, manteve os tributos cumulativos, enquanto dizia que criava um IVV, ele tirava o
IVV (o que, afinal, não era tão ruim). Mas as alterações fundamentais que o secretário Pedro
Parente apresentara conceitualmente e o Ministro Pedro Malan dizia que estavam
implementada no texto, lá não estavam. Bastava uma simples leitura para se verificar que o
texto então apresentado não se conciliava com o teor da introdução do Sr. Ministro, e menos
ainda com a apresentação feita anteriormente pelo secretário executivo do Ministério. Tanto
que o Deputado Mussa Demes e a Comissão de Reforma Tributária sequer levaram em
consideração esse texto apresentado pelo governo em novembro ou dezembro do ano
passado, e passou a trabalhar ainda no conceito da PEC/175.
O próprio governo parece que acabou concordando que aquele seu texto não tinha começo
nem meio nem fim, tanto que pediram para o Deputado Kandir fazer uma proposta
conciliatória, o que o Deputado Kandir fez há cerca de um mês e meio atrás.
O texto com que o Deputado Mussa Demes então passou a trabalhar, abriu vistas para
propostas de emenda e em abril, recebeu 93 propostas de alteração do seu texto matriz, às
quais se acrescentam aquelas 12 emendas de alteração global do Sistema Tributário. Dentro
dessas 93 propostas de emendas que foram apresentadas, diversas emendas alteram tudo que
já está em discussão. Pode-se assim imaginar que a discussão de reforma tributária está um
tanto quanto controvertida e tumultuada no âmbito do Congresso Nacional.
De mais a mais, o Governo Federal não parece ter o menor interesse numa reforma tributária.
E talvez não tenha de fato, pelo simples e bom motivo que a arrecadação lastreada no sistema
distorcido de impostos cumulativos, que tão pesadamente tem atentado contra o
desenvolvimento do setor privado do Brasil nos últimos anos (este sistema distorcido que o
Senhor Secretário da Receita Federal critica dizendo que gera evasão, que gera possibilidade
de não pagamento, com o que eu concordo, justamente porque é distorcido), esse mesmo
sistema com que o governo quer fechar as válvulas de escapes para aumentar ainda mais a
arrecadação, é o mesmo regime que tem levado a recordes sucessivos de arrecadação numa
economia em recessão e é esse mesmo regime que já está garantindo receita para o governo
nos próximos três anos.
Vale dizer, toda legislatura do Presidente Fernando Henrique Cardoso já está lastreada numa
arrecadação certa, efetiva, através dos tributos cumulativos, a não ser que o país realmente
quebre nos próximos seis meses, um ano ou dois.
Esse regime distorcido gera arrecadação para o Governo Federal para os próximos três anos,
o que vale dizer, que o Governo Federal não tem o menor interesse em uma Reforma
Tributária, embora o próprio governo concorde que um sistema distorcido como o atual é um
absurdo.
Por isso, apesar de o Ministro Pedro Malan dizer, em seus textos, que é preciso eliminar os
tributos cumulativos, que todos concordamos que são absurdos, como é que o governo dará
andamento à reforma tributária justamente quando tais tributos cumulativos é que lastrearão a
vida desse próprio governo nos próximos três, quatro anos? Então não há dúvida de que o
Governo Federal não tem nenhum interesse, do ponto de vista imediato (por imediato,
entenda-se durante essa legislatura ou durante o mandato do Presidente Fernando Henrique)
em fazer uma real reforma tributária. A reforma tributária está sendo provocada no Congresso
Nacional hoje por pressão da sociedade sim, e mais por uma atuação muito efetiva dos
representantes de Estados e Municípios que cada vez mais querem aumentar a sua base de
arrecadação, as suas bases tributárias.
Isso causa perplexidade. O Deputado Michel Temer esteve em São Paulo numa reunião do
Conselho da Associação Comercial, dizendo realmente que tem forte expectativa de que o
primeiro turno de votação se dê em setembro desse ano, com o primeiro texto conciliatório do
Deputado Mussa Demes sendo preparado para o final de julho. Resta saber o que vai estar
nesse texto, porque a pressão de Estados e Municípios certamente é muito grande, certamente
é uma pressão brutal, daí a razão pela qual é absolutamente necessário que Federações de
Indústria como a de Santa Catarina, que todos os órgãos que compõem a sociedade e o setor
privado, manifestem-se e pressionem o Congresso Nacional, para ver se desta reforma (que
eu acho que não vai ser num primeiro momento mais que uma reformulação do nosso
sistema), pelo menos incorpore alguns princípios básicos, pelo menos eliminando os tributos
cumulativos do nosso sistema tributário. Certamente dará mais fôlego e mais oxigênio para
essa sociedade brasileira que hoje compete internacionalmente, e não podemos esquecer que
os nossos competidores hoje são competidores de um mercado global.
Há cerca de três anos participei de reuniões com um grupo empresarial que queria fazer um
investimento muito relevante no Brasil. Tivemos encontros com os secretários de alguns
Estados, pois tais potenciais investidores gostariam de saber com que nível de incentivos
poderiam contar. O secretário de um determinado estado perguntou com quais estados estava
o seu próprio estado competindo. Os visitantes responderam que a delegação, não obstante
estivesse visitando vários estados brasileiros, na realidade a escolha para o local do
investimento envolvia locais como o Brasil, a Tailândia ou o México. Infelizmente, naquele
caso, quem ganhou foi o México.
Quer dizer, hoje os nossos competidores são competidores globalizados e se não tivermos um
sistema tributário coordenado compatível com os sistemas tributários adotados no resto do
mundo (ou com as economias dominantes, sendo mais precisos), cada vez mais vamos ver
nossa sociedade sendo penalizada, sendo empobrecida por um sistema tributário altamente
injusto e distorcido.
Gostaria ainda de sublinhar um ponto importante que se projeta na questão da carga
tributária. Não creio que seja factível raciocinar em termos de diminuição global da carga
impositiva ora verificada, atualmente por volta de 31 a 32% do PIB brasileiro. O que deve ser
feito é uma melhor distribuição da mesma, evitando a grave concentração sobre parcela
limitada de contribuintes e, mais do que isso, através de uma estrutura tributária mais
eficiente e mediante uma melhor gestão dos recursos públicos. A reforma fiscal, que leva em
conta também os gastos governamentais, certamente deverá vir na seqüência da reforma
tributária, buscando diminuir o profundo fosso ora existente entre as camadas mais ricas e
mais pobres da população brasileira, e permitindo uma melhor prestação dos serviços
públicos essenciais.
Não queria deixar uma mensagem pessimista, mas eu acho que a análise do que existe em
termos de discussão no Congresso Nacional hoje realmente assusta um pouco. Espero que
estas breves considerações sirvam para incentivar a que Federações como a da Indústria de
Santa Catarina e de outras Associações aqui presentes realmente vislumbrem a necessidade
de pressionar o Congresso Nacional, no sentido de modernizar, tornar mais justo e mais
eficiente o sistema tributário atual.
Espero, entretanto, que a pressão sobre o Congresso Nacional não se dê mediante a
apresentação de mais um texto de reforma. Mas sim, que sejam apresentados princípios,
porque se cada federação, cada associação apresenta um texto de reforma constitucional,
ninguém consegue discutir. Esse é o grande problema do setor privado: não estarmos
harmonizados. Então vamos lutar pelos princípios, quais os princípios? Vamos desonerar a
produção sim, basicamente por via da eliminação dos tributos cumulativos, isso já é uma
grande modificação no nosso sistema. Vamos procurar lutar por uma mínima harmonização
da nossa tributação do consumo no Brasil (hoje uma empresa que opera no Brasil em vários
estados tem uma enorme dor de cabeça burocrática), vamos procurar harmonizar as nossas
legislações internas. Enfim, vamos lutar por alguns princípios básicos que certamente já
modernizariam de forma substancial o nosso regime.
Essas são as breves considerações que gostaria de deixar à apreciação das senhoras e dos
senhores.