A Sociedade Civil e as Políticas Públicas em São Tomé e Príncipe

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A Sociedade Civil e as Políticas Públicas em São Tomé e Príncipe ACEP Associação para a Cooperação Entre os Povos FONG-STP Federação das ONG em São Tomé e Príncipe

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A Sociedade Civil e as Políticas Públicasem São Tomé e Príncipe

ACEP Associação para a Cooperação Entre os Povos

FONG-STP Federação das ONG em São Tomé e Príncipe

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A Sociedade Civile as Políticas Públicas em

São Tomé e Príncipe

Em parceria comEdição

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Ficha Técnica

Título: A Sociedade Civil e as Políticas Públicas em São Tomé e Príncipe

Coordenação e Edição: ACEP - Associação para a Cooperação Entre os Povos

Parceria: FONG-STP - Federação das ONG em São Tomé e Príncipe

Apoio Financeiro: Este documento foi realizado com o apoio financeiro do Camões - Instituto da Cooperação e da Língua. O conteúdo deste documento é da única responsabilidade da ACEP e da FONG-STP e não pode, em nenhum caso, ser considerado como reflectindo a posição do Camões, ICL.

Criação Gráfica: Ana Filipa Oliveira

Execução Gráfica: Guide Artes Gráficas

Fotografia da Capa: Liliana Azevedo, São Tomé

Depósito Legal: 353227/12

ISBN: 978-989-8625-02-1

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ÍndiceINTrOduçãO ....................................................................................................................

PrOGrAMA dA MESA rEdONdA .............................................................................

A rELAçãO dAS ONG SANTOMENSES COM O ESTAdO ................................

por Eduardo Elba

O PAPEL dAS OSC NA dELINEAçãO dE AGENdAS POLÍTICAS E POLÍ-

TICAS PúbLICAS EM SãO TOMé E PrÍNCIPE .......................................................

por Aires Bruzaca de Menezes

AId WATCh: uMA ExPErIêNCIA dE MONITOrIA dE POLÍTICAS Pú-

bLICAS PELAS ONG POrTuGuESAS ........................................................................

por Fátima Proença

OSC E MEdIA: uMA PArCErIA PArA A MudANçA ............................................

por Conceição Lima

O PAPEL dAS OSC E AS POLÍTICAS PúbLICAS: CONCLuSõES E rECO-

MENdAçõES ......................................................................................................................

ANExOS ................................................................................................................................

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Introdução

A Mesa redonda “O Papel das OSC e as Políticas Públicas em São Tomé e Prínci-pe”, que se realizou a 13 de dezembro de 2012, no Centro Cultural Português da cidade de São Tomé, insere-se no projecto “reforço da Federação das ONG de São Tomé e Príncipe e recursos de Apoio às ONG” financiado pela Cooperação Portuguesa, da iniciativa conjunta da Associação para a Cooperação Entre os Povos (ACEP) e da Fede-ração das Organizações Não Governamentais em São Tomé e Príncipe (FONG-STP) que teve como objectivo contribuir para o reforço das iniciativas de desenvolvimento, de base local e comunitária, e de luta contra a pobreza, com o reforço da participação das populações, das suas organizações e da sociedade civil em geral.

Ao longo dos dois anos do projecto, realizaram-se acções de formação para Orga-nizações da Sociedade Civil (OSC), lançaram-se as bases de um plano de comunicação interna e externa, através de boletins informativos e programas radiofónicos, criaram-se condições físicas e materiais, incluindo a construção e equipamento de instalações próprias para que a FONG-STP esteja em medida de cumprir com a sua missão de plataforma e potenciar o trabalho das ONG nela filiadas. A Mesa redonda insere-se no programa de parcerias e constituiu um primeiro passo no aprofundamento do trabalho conjunto com outros actores da sociedade civil, de São Tomé e Príncipe mas também de países parceiros. Esta publicação faz a síntese das apresentações e debates desse dia e inclui também um conjunto de documentação de apoio na altura disponibilizada.

Importa salientar que a Mesa redonda permitiu reunir membros das ONG filiadas na FONG-STP, mas também outras organizações da sociedade civil e outros actores do desenvolvimento, entre os quais jornalistas e investigadores. Foram ali debatidos

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temas importantes como a governação interna das OSC, o diálogo interno à sociedade civil ou a relação da sociedade civil com o Estado e com os media. houve ainda espaço para discussão sobre o papel das OSC na elaboração de políticas públicas e programas de desenvolvimento, enquanto parceiro privilegiado do Estado, e sobre a necessidade de as consultar e envolver nos processos de desenvolvimento do país. Os participantes no debate sublinharam ainda a necessidade das OSC assumirem um maior dinamismo e participação, procurando acompanhar os debates nacionais e influenciá-los numa abor-dagem de defesa dos direitos das comunidades junto das quais intervêm.

Foram assim lançadas as pontes para um futuro muito próximo. O trabalho iniciado em 2009 com o apoio da Cooperação Portuguesa permitiu criar uma base de trabalho suficiente que veio possibilitar o apoio de outros, nomeadamente da Cooperação Fran-cesa e da união Europeia. Assim, nos próximos três anos, daremos continuidade ao trabalho de comunicação, capacitação e advocacia, com vista a melhorar as condições de participação das ONG no diálogo sobre políticas públicas, em articulação com ou-tras organizações da sociedade civil, no sentido de afirmar cada vez mais as OSC como parceiras de desenvolvimento de direito e competências próprias.

ACEP e FONG-STPDezembro 2012

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MESA rEdONdA / PrOGrAMA

O PAPEL DAS OSCE AS POLÍTICAS PÚBLICAS13 dEZEMbrO 2012 | CENTrO CuLTurAL POrTuGuêS | S. TOMé 9H30 – SESSÃO DE ABERTURA _Nuno Vaz, Adido para a Cooperação na Embaixada de Portugal _Celso Pontes, Secretário do Conselho Executivo da FONG-STP – Federação das ONG em São Tomé e Príncipe_Fátima Proença, Presidente da ACEP – Associação para a Cooperação Entre os Povos

10H – PLENÁRIO_Experiência na relação com o Estado. Eduardo Elba, Secretário Executivo da FONG-STP_O papel das OSC na delineação de agendas públicas e políticas públicas em S. Tomé e Príncipe. Aires bruzaca de Menezes, Phd em Estudos de desenvolvimento pela uTAd _Experiência da Plataforma Portuguesa das ONGd na monitoria da Politica de Coope-ração. Fátima Proença, Presidente da ACEP

12h / 14h – Pausa para almoço

14H – SESSÕES TEMÁTICAS_Governação Interna das OSC _relação da Sociedade Civil com o Estado _diálogo Interno à Sociedade Civil _Sociedade Civil e Media

16h – Pausa

16h30 – devolução das principais conclusões e recomendações

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EDUARDO ELBA

Actual Secretário Executivo da FONG-STP. Gestor, natural de Fátima-São Tomé, foi professor de história em São Tomé e na região Autónoma de Príncipe, a nível do Ensino Secundário, trabalhou para a Câmara de Comércio, Indústria, Agricultura e Serviços, tendo exercido dentre várias funções, o cargo de Secretário-Geral. Licenciado em Gestão de Empresa pelo Instituto Superior Politécnico de São Tomé .

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A relação das ONG santomenses

com o EstadoEduardo Elba

Após a independência, o Estado assumiu-se como gestor de quase todas as activida-des económicas, independentemente das áreas de actividade e do tamanho das unidades económicas. O falhanço completo dessa opção determinou que novas políticas fossem adoptadas para inverter a situação.

Em 1990, o país entrou num processo de profundas mudanças estruturais, carac-terizado pela liberalização da economia e pela democratização da vida política. Essas mudanças provocaram um afastamento progressivo do estado da gestão das unidades económicas, através da implementação de programas de privatização de empresas agrí-colas e não agrícolas e de distribuição de terras. A nível social, esse afastamento do Es-tado reflectiu de forma muito directa e rápida sobre os antigos trabalhadores agrícolas.

Na altura, muitas famílias receberam as terras, mas estavam desprovidas de meios para as trabalhar, não tinham experiência acumulada, nem conhecimentos técnicos para sozinhas levar adiante a exploração dessas mesmas terras. Inicia-se, assim, a formação de algumas associações de trabalhadores rurais, numa perspectiva de mobilizar apoios para combater a pobreza a que ficaram submetidos.

Apenas para citar alguns exemplos: em 1995, formou-se uma associação de médios agricultores – a ASPAP. dois anos mais tarde, criou-se uma Federação Nacional de As-sociações de Pequenos Agricultores (FENAPA).

Essas associações de base e de natureza profissional terão surgido em face da desresponsabilização do Estado, na sequência da nova opção económica. Ao longo do tempo, as coisas evoluíram e foram-se criando várias ONG, com missão e visão diferentes, numa tentativa de responder aos desafios da evolução económica, num

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espaço de actuação fora das competências do Estado.A 19 de Abril de 2001, foi criada a Federação das Organizações Não Governamen-

tais em São Tomé e Príncipe (FONG-STP), fundada por escritura notarial celebrada nos registos de São Tomé, a 26 de Junho de 2001. é uma organização sem fins lucrativos, que se rege pelos Estatutos, regulamento Interno, pelas deliberações da Assembleia Geral, bem como pelas disposições aplicáveis na rdSTP.

A FONG-STP alberga assim ONG de âmbito nacional e internacional e definiu como principais objectivos:

- representar as várias Organizações Não Governamentais (ONG) a actuar em São Tomé e Príncipe;

- Promover uma maior cooperação e coordenação entre as ONG nacionais, estran-geiras e o Governo de São Tomé e Príncipe, bem como com doadores e outras institui-ções envolvidas na nos processos de desenvolvimento do país;

- Promover e mediar a cooperação regional e internacional das ONG bem como desenvolver redes de comunicação para melhor inserção e solidariedade dos seus asso-ciados;

- Promover o fortalecimento das ONG nacionais com vista a facilitar a sua susten-tabilidade a longo prazo.

Por outro lado, a FONG-STP elegeu como valores e princípios:- O ser humano deve estar no centro do desenvolvimento;- Equidade e justiça social são as prioridades para os mais desfavorecidos;- diálogo, abertura, flexibilidade e pragmatismo;- Transparência e rigor na prestação de contas;- reforço das capacidades dos seus membros;- Promover a auto-suficiência dos seus membros;

São esses valores e princípios que têm norteado a actuação da Federação e das suas mais destacadas associadas. Ao longo da sua existência, a Federação tem mantido uma relação institucional, relativamente saudável com o Estado. Tem sido convidada a in-tegrar algumas comissões governamentais e tem participado, junto do Governo, nos esforços para o desenvolvimento do país, essencialmente, através de parcerias para execução de subprojectos comunitários.

um exemplo dessa parceria é o envolvimento da FONG na execução das actividades inscritas no Projecto de Apoio ao Sector Social (PASS), por intermédio das ONG, em 2005, com acções a nível de Serviços de Consultoria, Formação e Workshop, e Subpro-jectos.

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Título de projecto Montante total do orçamento Parceiro financeiro Ano

Fundo Japonês para Desenvolvimento Social (JSDF)

649.450 uSdGoverno Japonês, através do banco Mundial

2004-2006

Projecto de Apoio ao Sector Social H088

1.034.623 uSdbanco Mundial, no quadro do projecto PASS

2005-2009

Projecto Fast-track 152.000 uSdbanco Mundial, no quadro do projecto PASS

2009-2011

Subprojecto de Construção de La-trinas Melhoradas

50.000 uSdbanco Mundial, no quadro do projecto PASS

2012

Fundo Japonês para Desenvolvimento Social (JSDF)

649.450 uSdGoverno Japonês, através do banco Mundial

2004-2006

1 - Relativamente a esse projecto destacam-se as seguintes actividades realiza-das em 2005:

1.1 – Execução de 24 subprojectos comunitários, nas áreas:• Educação – 10 subprojectos • VIh/SIdA – 5 subprojectos• Saúde – 9 subprojectos

1. 2 - Reforço de capacidades institucionais das Organizações da Sociedade CivilEsta componente consistiu no reforço das capacidades, consultas e criação de redes,

tendo sido realizadas as seguintes acções:- base de dados das ONG criada e testada;- Centro de recursos instalado, mas não completamente apetrechado. Foi disponibi-

lizado um serviço de biblioteca com materiais bibliográficos, jornais nacionais, enciclo-pédia, materiais de reprografia e equipamentos informáticos;

- O Manual Operativo da FONG foi elaborado e disseminado durante o segundo trimestre (Maio 2005). é um instrumento de trabalho onde estão estabelecidos regras e procedimentos, particularmente no que diz respeito aos métodos de Procurement e às linhas de orientação para a Selecção, Avaliação e Seguimento de Projectos de iniciativa comunitária. Foi produzido também, um Manual de Procedimentos Administrativos Financeiros e Contabilísticos.

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- Foi realizado um seminário de disseminação sobre métodos de aquisições e Forne-cimento de equipamentos

1.2 - Formação e troca de experiência Esta componente esteve focalizada nas actividades de formação para o reforço da

capacidade de grupos comunitários e de OSC.

Algumas acções de formação desenvolvidas:

Designação DataGestão Administrativa e financeira Fevereiro 2005Formação em seguimento e avaliação para as ONG Julho 2005Elaboração e orçamentação de projectos Outubro 2005

A execução financeira global foi de 481.024.53 uSd, que representa 74% do mon-tante total previsto para o Projecto.

2 - Actividades realizadas em 2006

2.1 – Reforço de capacidades das Organizações da Sociedade CivilNo que toca as acções implementadas, realçamos:- desenvolvido de um plano de formação;- realizado de um atelier participativo para a elaboração do Plano estratégico da

FONG;- Selecção de um consultor para assistir as ONG’s na elaboração de projectos; - Actualização do Manual Operativo;- realização de visitas de Intercâmbio entre as ONGs;- Elaboração do Plano de Comunicação da FONG;- Produção e divulgação de um programa radiofónico “A FONG informa”;- Produção e publicação de um boletim informativo sobre as actividades das ONG,

da Federação e sobre diversos temas da actualidade de interesse para as ONG;- Construção de um Website da FONG;- Promoção de Encontros entre os diferentes representantes da Sociedade Civil (In-

ternational Alert).- Seguimento do projecto de lei das ONGs junto do parlamento, Ministro da Justiça;

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2.2 - Formação e troca de experiência

Acções de formação desenvolvidas

Designação DataFormação em contabilidade - Região Autónomado Príncipe

Fevereiro 06

Elaboração de projectos, gestão de centro de recursos e aprofundamento do Manual Operativo da FONG

Abr a Ago 06

Formação de formadores para as ONG sobre a preven-ção do VIH/SIDA e Paludismo

Abril 06

Formação em seguimento e avaliação para Comités Comunitários

Maio 06

Formação sobre Reforço das Capacidades de Liderança para os responsáveis das ONG

Setembro 06

Formação em Contabilidade e Informática para os técni-cos das ONG

Set a Nov 06

2.3 - Projectos-piloto de Iniciativa Comunitária para Desenvolvimento da Saúde, Educação e VIH/SIDA

relativamente as actividades realizadas destaca-se:- Implementação de subprojectos comunitários, sendo que durante o ano, estiveram

em curso 19 suprojectos;

Projecto de apoio ao sector social H088

1.034.623 uSd banco Mundial, no quadro do projecto PASS

2004-2010

3 - A FONG e o PASS

3.1 - Actividades realizadas pelas ONG no quadro do PASS, em 2007de acordo com o Plano Anual de Trabalho 2007, foram programadas 28 actividades

distribuídas por categoria da seguinte forma:- Serviços de Consultoria e Auditoria com 13 actividades representando 46% das

actividades programadas;- Formação e Workshops com 4 actividades representando 14% das actividades pro-

gramadas;- Sub-projectos com 2 actividades. Apesar de, em termos de número de actividades,

essa categoria de despesas representar apenas 7% das actividades programadas, ela re-

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presenta, em termos financeiros, cerca de 72% do orçamento global; - Custos Operacionais com 9 actividades, representando 32% do total das activida-

des programadas.

3.2 - Grau de execução das actividades programadas

3.2.1 - Serviços de Consultoria Fazendo referência à situação acumulada até 31 de dezembro, das 13 actividades

programadas para esta categoria, 7 (54%) foram concluídas, 2 (15%) estavam em curso, nomeadamente, (i) Elaboração do Projecto-Lei do mecenato e (ii) Elaboração do regu-lamento Interno da FONG.

3.3 - Implementação de sub-projectosEm 2007, foram implementados 20 subprojectos, sendo 4 que tinham sido aprova-

dos em 2006 e 16 aprovados em 2007, o que representa um engajamento financeiro de 343.914,37 uSd e execução de 272.529,26 uSd, ou seja cerca de 79% de engajamento financeiro está a ser executado.

4 – Actividades programadas, em 2008de acordo com o Plano Anual de Trabalho para o Período Setembro de 2008 a

Junho de 2009, foram programadas 18 actividades suportadas por 4 categorias de des-pesas, nomeadamente (i) serviços de consultoria, (ii) formação e workshop, (iii) subpro-jectos e (iv) monitorização.

5 - Outros exemplos de relacionamento com o Estado

5.1 – Programa de Apoio Participativo Agricultura Familiar e Pesca ArtesanalO PAPAFPA é um programa do Governo, financiado essencialmente pelo FIdA,

num montante de 9,97 milhões de dólares, para um período de 12 anos, cujo início é datado de 2003 e deverá terminar em 2015.

O objectivo geral do programa consiste em aumentar o rendimento dos pequenos agricultores, pescadores artesanais e palaiês.

O programa tem 3 componentes: administrativa, oferta de serviços (fundo de infra-estrutura comunitário) e económica.

A componente económica tem 6 fileiras:1 – Fileira de peixe fresco sobre gelo executado pela MArAPA;2 – Fileira do cacau de qualidade (Cooperativa CECAQ 11), faz cobertura da zona

centro e sul;

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3 – Fileira do cacau biológico (Cooperativa CECAb) e cobre a zona norte e a região Autónoma do Príncipe;

4 – Fileira pimenta e especiaria (Cooperativa de exportação da pimenta e baunilha);5 – Fileira de culturas alimentares, que visa assegurar a dieta alimentar dos agriculto-

res a nível de produtos alimentares, banana, mandioca, matabala, etc..;6 – Fileira café biológico (Cooperativa CECAFEb)

5.2 – Projecto de Reabilitação de Infraestrutura de Apoio à Segurança AlimentarO projecto é financiado pelo bAd, no montante de 5.000.000 uSd, para um perío-

do de 5 anos e teve o seu início em 2011.O objectivo do projecto visa reduzir a pobreza e melhorar a segurança alimentar

através da construção e reabilitação de infra-estrutura. A MArAPA está envolvida no projecto, na vertente técnica de apoio à direcção das pescas, na execução de actividades de sensibilização, formação, etc.

5.3 – Programa de luta contra VIH/SIDA, Tuberculose e PaludismoNesta componente da saúde, também, existe uma parceria com o Estado, essencial-

mente na componente de sensibilização para a mudança de comportamentos. Importa sublinhar que, em 2012, a FONG-STP viu aprovada e publicada a Lei das ONG, após a introdução de uma proposta junto do Governo em 2006.

Por iniciativa de uma associada da FONG-STP – a Fundação da Criança e Juventude – algumas propostas de Lei, nomeadamente (i) Lei da Família, (ii) Lei de Protecção de menores e jovens em perigo e (iii) Lei de acolhimento institucional.

6 – Considerações FinaisApesar de algum progresso registado no relacionamento com o Estado, não pode-

mos deixar de salientar que muitas das vezes essa relação é imposta pelos parceiros de desenvolvimento.

Sentimos que ainda não há uma adequada apropriação por parte do Estado no que toca à força que as ONG agregadas constituem como factor de desenvolvimento do País. de facto, não existe um quadro normativo que regula o relacionamento entre as Organizações da Sociedade e o Estado.

Após anos de várias políticas, quase sempre com resultados aquém das espectativas, a questão da governação tornou-se numa temática essencial de abordagem em muitos fora. São Tomé e Príncipe parece estar ainda à procura de um modelo económico de desenvolvimento que se traduza na eficácia da coordenação das ajudas ao desenvol-vimento. Assim, afigura-se necessário o desenvolvimento e reforço de parcerias sob múltiplas formas, incluindo a criação de mecanismos de “diálogo de políticas públicas” entre a Sociedade civil e o poder público.

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AIRES BRUzACA DE MENEzES

doutorado em Estudos de desenvolvimento pela universidade de Trás-os-Montes e Alto douro (Portugal), é mestre em desenvolvimento e Cooperação Internacional pelo ISEG (Lisboa, Por-tugal). Tem uma larga experiência na gestão de programas e projectos de desenvolvimento e das OSC e é assistente de investigação no Centro de Estudos Transdisciplinares da uTAd e profes-sor na universidade Lusíada, em São Tomé e Príncipe.

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O Papel das OSCna delineação

de Agendas Políticase Políticas Públicas em

São Tomé e PríncipeAires bruzaca de Menezes

INTRODUçãOFruto da colonização portuguesa cuja independência data de 1975, São Tomé e

Príncipe é um pequeno Estado insular (PEI) cujo trajectória histórica, composição de classes dinâmicas sociais endógenas e condições ecológicas, tem contornos muito parti-culares. Caracterizada na altura da conquista da independência por grandes níveis de po-breza absoluta (mais de 50% da população absolutamente pobre), baixos indicadores de saúde e educação, situação económica e financeira depauperada, administração pública deficiente e infra-estruturas, tanto económicas como sociais, degradadas, São Tomé e Príncipe não tinha outra alternativa que não fosse o estabelecimento de agendas de de-senvolvimento fomentadoras de políticas públicas de combate aos flagelos apontados e estabelecimento de plataformas para a reconstrução do país.

Na sua trajectória de 37 anos da independência as OSC estiveram sempre presen-tes, sobretudo a partir de finais da década de 80, dando o seu contributo, embora os resultados globais não tenham sido os mais desejados. A análise da agenda pública e das políticas públicas desenhadas e colocadas em prática em São Tomé e Príncipe, não raro de forma parcial e inacabada, não pode, portanto, ser feita sem considerar a participação activa das OSC. Na sua essência, o que sempre esteve em causa após a independência do país foi e continua a ser a conquista do “desenvolvimento” – este “eldorado fugidio”, na perspetiva do Wallerstein assinalado no seu trabalho “Após o liberalismo: em busca da reconstrução do mundo”, que vem sendo perseguido através de uma permanente luta contra a pobreza.

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Esta comunicação começa com uma abordagem sobre quatro conceitos que lhe dizem respeito: (i) agendas públicas; (ii) agendas políticas; (iii) políticas públicas e natu-ralmente (iv) o conceito das OSC. dado este passo, prossegue-se com a análise sobre as OSC no contexto de São Tomé e Príncipe, cujo objectivo final é identificar e compre-ender o seu papel na prossecução das políticas públicas.

OS CONCEITOS DE AGENDA PÚBLICA E AGENDA POLÍTICA Em termos conceituais, a agenda pública1 é vista como um conjunto de temas que

as sociedades estabelecem como relevantes e prioritárias nos seus processos de de-senvolvimento. Por seu turno, a agenda política é entendida, como uma estratégia que descreve acções relacionadas com actividades que devem ser implementadas para atingir um determinado fim, quer ao nível nacional quer ao nível local, constituindo-se, deste modo, numa ferramenta analítica útil na procura de soluções para os problemas que afligem as sociedades.

Neste contexto, Cobb & Elder (1976) apud Melo (2007), afirmaram que “para que um assunto passe de agenda pública para agenda política são necessários três requisitos: (i) seja objecto de conhecimento público; (ii) o público na sua maioria o considere útil e necessário; e (iii) a comunidade considere que o assunto pode ser materializado por alguma entidade”. Aguilar (1996: 29), corroborando as ideias de Cobb & Elder (1976), adiantou que a agenda política é “o conjunto de problemas, necessidades, questões e assuntos, que os governantes seleccionam e ordenam como objecto de sua acção, mais propriamente, como objectos sobre os quais decidem se devem actuar ou consideraram que têm que actuar”.

O CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICASPolíticas Públicas são, na perspectiva de Mény e Thoenig, programas de acção gover-

namental num sector da sociedade ou num determinado espaço geográfico específico (Mény e Thoenig 1989). Trata-se, como definiu Muller (1998: 24), de um processo de mediação social, na medida em que o objecto de cada política pública consiste em as-sumir os desnivelamentos entre diferentes sectores ou entre estes e a sociedade na sua generalidade. Muller, apud baudoin (2000: 251), disse ainda que

[…] estudar políticas públicas é visualizar e compreender a política tal como se con-cebe e tal como se pratica. é considerá-la não apenas como uma modalidade singular de conquista e do exercício do poder, mas também como uma forma complexa de regulação e de seguimento das relações sociais.

1 Cobb & Elder (1971: 906) apud Melo (2007) explicam que “a agenda pública é mais abstracta e mais ampla que qualquer domínio da agenda política, podendo, inclusive, não haver correspondência de priori-dades entre as duas. Estes autores levantam a hipótese de que quanto maior for a disparidade entre as duas agendas, maiores serão a intensidade e a frequência de conflito no sistema político”.

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daí a necessidade de programação e de definição de etapas para que uma política pública seja formulada de forma consistente, clara e transversal, ou melhor, para que a acção das autoridades públicas ganhem a sua verdadeira dimensão.

O CONCEITO DE OSCNessa comunicação adotou-se a conceção de Gramsci, que olha para as OSC como

espaço social distinto do Estado e das instituições políticas, de sector de negócios e aci-ma de tudo que se conforma com a existência de uma concessão de fluxos de informa-ção. Também apelidados de autores não-estatais pela união Europeia, as OSC incluem no seu seio as Organizações Não – Governamentais, as Organizações Comunitárias de base (OCb), as organizações religiosas, associações económicas e os sindicatos. Portan-to, podemos definir as OSC como aquelas organizações que não sendo estatais, realizam acções que complementam, ou deveria complementar actividades materializadas pelo Estado. Para a caracterização das OSC foram identificados (Edwards 2004: 138) três posições teóricas: (i) descritiva; (ii) normativa e (iii) esfera pública.

A concepção que designa de “descritiva” concebe as OSC como elementos da socie-dade, composta por redes e associações entre o Estado e a família, ou entre o Estado, os mercados e a comunidade, concebidas para avançar interesses comuns e facilitar a ação coletiva.

No segundo caso, o conceito de OSC tem a ver com as diferenças em relação quer ao Estado, quer ao mercado, designando não só a esfera da liberdade, mas também a da solidariedade. A perspectiva normativa concebe ao conjunto das OSC como um tipo de sociedade, em que a esfera do serviço é entregue aos outros e o terreno onde se geram atitudes e valores como cooperação, confiança, tolerância e não-violência.

Finalmente, no que toca a terceira característica, este conjunto de organizações é enquadrado no âmbito da esfera pública, ou seja, é passível de deliberação pública e do exercício da cidadania activa em busca de interesse comum (ver Edwards 2004 viii).

O PAPEL DAS OSC NA DELINEAçãO DA AGENDA PÚBLICA E PO-

LÍTICAS PÚBLICAS EM SãO TOMé E PRÍNCIPENos tempos actuais, as OSC têm vindo a evidenciar na prática, um papel fundamen-

tal tanto na concepção como na materialização de políticas públicas em São Tomé e Príncipe. A temática das OSC não constitui coisa nova no contexto deste país. A extinta associação de socorros mútuos na antiga Vila da Trindade, a brilhante trajectória da Santa Casa de Misericórdia, os patronatos e as obras sociais dos padres, as acções das madres canossianas espalhadas um pouco pelos distritos do país são exemplos ímpares de uma participação meritória das OSC num processo difícil de luta pela sobrevivência e que nunca deixaram de ter o cunho de participação na agenda política e política pública em São Tomé e Príncipe.

Se bem que estas acções marcaram, no passado colonial e nos primeiros anos da independência um certo protagonismo, foi a partir dos finais dos anos 80 e com a in-

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trodução do evento da democracia multipartidária que as OSC assumiram o papel que têm hoje. A partir do início dos anos 90 verificou-se uma verdadeira explosão do movi-mento das OSC e particularmente das ONGs em São Tomé e Príncipe. Embora frágeis, do ponto de vista institucional, organizacional e financeiro (totalmente dependentes da ajuda pública ao desenvolvimento), entre desaparecimento de umas e surgimento de outras, foram assumindo contornos que conduziram a criação da actual Federação das Organizações não-governamentais (FONG) que todos conhecem.

Para compreender esta dinâmica é preciso estabelecer a relação Estado/Sociedade civil. Trata-se de uma relação que nem sempre facilitou a emergência de movimentos sociais quer durante o regime colonial, quer durante o período do partido único. Como afirmaram Monteiro e José (1995: 57)

o Estado e o partido único eram os únicos intervenientes de vulto na vida política, eco-nómica e social do País. O Estado assumia o papel de interveniente direto na economia e o partido controlava e dirigia a participação associativista, o que não estimulou o surgimento livre e espontâneo de iniciativas de auto Organização da Sociedade Civil […].

Tratou-se da prevalência de um sistema top/down (de cima para baixo). Em São Tomé e Príncipe, este sistema, cedo deu mostras da sua incapacidade na busca de busca de alternativas para que a Sociedade encontrasse respostas às suas necessidades básicas e foi substituído por um sistema de cunho democrático, o que permitiu uma maior parti-cipação da Sociedade civil e das suas organizações. A participação e o desempenho das OSC no delineamento e materialização das políticas públicas em São Tomé e Príncipe é hoje um dado adquirido. As OSC são chamadas para participar de forma activa e com o concurso dos parceiros internacionais nos projectos de desenvolvimento em São Tomé e Príncipe nas mais diversas áreas, desde a educação, saúde, hIV/SIdA, meio ambiente, infraestruturas comunitárias, etc.

Isso não significa porém, que em São Tomé e Príncipe, esta participação tenha atin-gido resultados muito satisfatórios, pois, ao proceder-se a qualquer reflexão sobre a par-ticipação destas organizações no contexto são-tomense não se pode descurar as suas, ainda grandes fragilidades socio-estruturais, assim como as instabilidades sociopolíticas endémicas que fustigam o país e afetam qualquer ação, que se pretenda, no sentido as-cendente. O problema é que grande parte das iniciativas de políticas públicas que vêm constituindo a agenda política são-tomense, quer com a participação destas OSC quer não, tem conseguido ter início, meio e fim. As coisas vão sempre ficando pelo meio e, desta forma, o que se constata hoje é que os conflitos políticos e institucionais não permitem que qualquer política ou estratégia tenha consequências positivas. Por outro lado, é preciso ter em conta que os pressupostos básicos para a materialização da relação Estado/sociedade civil é o neoliberal. hoje, sabe-se que este sistema fracassou e não se adapta as realidades endógenas de um país como São Tomé e Príncipe.

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CONCLUSõESFace ao exposto conclui-se que1. a presença de um quadro institucional estável e legal facilita o papel das OSC no

processo de formulação e implementação de políticas públicas;2. a introdução de mecanismos de garantia da capacidade técnica, recursos financei-

ros, lealdade institucional e transparência fortalecem o seu papel no processo de imple-mentação de políticas públicas;

3. o nível de participação das OSC na formulação de políticas públicas depende em grande medida da perceção e do entendimento dos governos da importância das OSC no processo de desenvolvimento.

Para finalizar, alguns conselhos que poderão ser úteis as OSC: - a formação permanente dos dirigentes das OSC deve ser uma constante afim de

estarem a altura dos desafios complexos;- devem ser sempre, adoptados mecanismos que facilitem a apropriação e o respeito

pelos acordos assinados, quer a nacional, quer internacional;- os mecanismos de eficiência e eficacidade devem fazer parte das regras internas e

de conduta das OSC.Qualquer reflexão que se queira sobre políticas públicas em São Tomé e Príncipe

não pode ser feita fora do contexto da sua própria realidade endógena e as OSC são-tomenses são parte intrínseca desta realidade.

REFERêNCIAS BIBLIOGRáFICASAGuILAr,V. L. F. (1996), El estudio de las políticas públicas – Antologias de Política Públi-

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CEA, 1ª EdiçãoMuLLEr, Pierre, (1998), Les Politiques Publiques, Paris, PuF

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FáTIMA PROENçA

Intervém na cooperação não governamental para o desenvolvimento desde a década de 80, em processos de investigação/acção, de inovação na documentação e comunicação sobre África e de advocacia na sociedade portuguesa, em colaboração estreita com organizações da sociedade civil africana. dirige, desde 1997, a ACEP - Associação para a Cooperação Entre os Povos e, entre 2002 e 2008, presidiu à Plataforma Portuguesa das ONGd

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Aid Watch: uma experiência de

monitoria de políticas públicas pelas

ONG portuguesasFátima Proença

1. A generalidade das Organizações Não Governamentais e as da Sociedade Civil em geral surgem em Portugal após o 25 de Abril. As primeiras organizações aparecem assim ligadas a algumas redes internacionais, aos partidos políticos recém-criados ou recém-legalizados, ou também ligadas a diversas igrejas. A excepção a esta realidade é a de uma organização – o CIdAC – cujas raízes vêm da resistência clandestina ao regi-me e da luta anti-colonial, que, posteriormente à queda da ditadura, surge à luz do dia, primeiro com a designação de Centro de Informação Anti-Colonial e, após as indepen-dências das então colónias, se passa a chamar Centro de Informação e documentação Amílcar Cabral e se envolve no apoio aos Estados recém-criados.

A intervenção na cooperação para o desenvolvimento e na sensibilização da popu-lação portuguesa por parte das organizações existentes ou das que entretanto foram sendo criadas registou um impulso considerável após a adesão à união Europeia (uE), em 1986. As actividades desenvolvidas por sua iniciativa são então sobretudo centradas em projectos individuais, de duração muito limitada, com uma visão de curto prazo e correspondendo a uma fraca consciência do seu papel enquanto actores de desenvolvi-mento e da sua natureza de expressão de direitos de participação política não partidária.

O processo de integração europeia vai assim permitir a este conjunto de ONG – que no caso concreto das que intervêm no desenvolvimento internacional se passam a designar de ONGd, sendo o d, de desenvolvimento – passarem a acompanhar os debates internacionais sobre políticas de cooperação e de desenvolvimento e a conse-guirem construir progressivamente visões mais alargadas sobre o seu papel enquanto Organizações da Sociedade civil na sua diversidade.

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2. Passam assim praticamente 20 anos entre o momento da criação da Plataforma Por-tuguesa de ONGd e a adesão de Portugal à uE e o início do primeiro processo de mo-nitoria da política pública do sector. Iniciado em 2006, o chamado processo Aid Watch, numa iniciativa da confederação das plataformas de ONGd europeias, a que a Plataforma portuguesa aderiu, levou àcriação, no quadro da plataforma portuguesa, de um grupo de trabalho especializado que existe e funciona regularmente até hoje – o Grupo Aid Watch.

Trata-se de um grupo formado por diversas ONGd que procura fazer o seguimen-to e análise da política portuguesa de cooperação para o desenvolvimento, começando pelos seus aspectos quantitativos, sobretudo com base nos elementos constantes do Orçamento do Estado e nos relatórios sobre a sua aplicação; progressivamente a abar-car também os aspectos da qualidade da cooperação, seguindo os compromissos inter-nacionais que foram sendo assumidos pelo estado Português, em particular os que têm a ver com a chamada “Eficácia da Ajuda”, aprovada em 2005 em reunião internacional em Paris.

3. As motivações da Plataforma bem como das ONGd envolvidas neste trabalho são de vária ordem e umas poderão estar mais presentes nalgumas organizações do que noutras.

Podemos dizer, em primeiro lugar, que a decisão de realização deste trabalho parte da consciência de que os projectos, por si só, não respondem aos problemas e desafios do desenvolvimento, se as políticas que os determinam e enquadram não forem as mais adequadas. Concluiu-se assim que tão importante como desenvolver bons projectos é ter a garantia de boas políticas e que entre as políticas e os projectos não pode haver um vazio, mas tem que existir uma articulação que garanta coerência entre uns e outras.

Em segundo lugar, este trabalho representa também a consciência criada de que os direitos democráticos não se esgotam no voto nas eleições, mas que precisam de incluir uma participação activa a outros níveis. A participação no debate e na monitoria da po-lítica de cooperação é assim entendido como uma expressão concreta deste direito de participação que dá qualidade à democracia em construção. O conceito de participação que é assim afirmado pelo processo Aid Watch é o de que a participação se realiza pelo menos a dois níveis: o nível da acção concreta e de terreno, através de projectos concre-tos, e o nível do debate e monitoria das políticas que vão condicionar aqueles projectos e os recursos que lhes são atribuídos.

Em terceiro lugar, o trabalho do Grupo Aid Watch partiu também da consciência de que a qualidade da democracia e das políticas que ela concebe e implementa só têm a ganhar com a contribuição de um olhar independente relativamente aos diversos órgãos do Estado, de organizações de diferentes naturezas, que representam diferentes experi-ências e formas de trabalhar.

4. um dos principais desafios a que este trabalho teve que fazer face foi o de conven-cer as instituições do Estado e os seus responsáveis políticos de que a cooperação para o desenvolvimento e o próprio sistema democrático só tinham a ganhar com o exercício deste papel e deste tipo de direitos por parte de Organizações da Sociedade Civil. Em face da consciência desta dificuldade houve assim, num primeiro momento, que adop-

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tar diferentes estratégias complementares, desde o confronto com alguns sectores até à conquista de aliados noutros sectores do Estado.

O segundo desafio traduziu-se em convencer as instituições que o acesso à infor-mação útil é um direito, que assiste aos cidadãos individuais e ainda mais organizados, numa época em que o princípio da transparência passou a ser considerado como um dos elementos de base do Estado de direito. de facto, sem o acesso à informação ne-cessária, clara e em tempo adequado não seria possível qualquer processo de monito-ria. E o próprio objectivo da monitoria teve que ser bem explicitado: ou seja, foi (tem sido) necessário demonstrar que a actividade de monitoria da aplicação de uma política pública não tem por objectivo condenar ninguém, mas sim contribuir para melhorar a governação do Estado e a aplicação das políticas. No caso concreto da política de cooperação para o desenvolvimento, a monitoria teria assim a dupla vantagem de po-der contribuir para melhorar a qualidade da governação democrática e a qualidade do desenvolvimento.

5. Este processo Aid Watch tem sido assim um desafio também às próprias ONGd, um desafio a vários níveis. um primeiro nível tem a ver com o grande investimento que lhes tem sido exigido, em termos de quantidade e qualidade de trabalho, para dominarem os conceitos, as técnicas e as ferramentas, que lhes permitam produzir análises credíveis.

um segundo desafio tem-se traduzido na decisão de assumirem alguns riscos. No processo de construção da democracia, enquanto processo recente e nem sempre bem sucedido, este tipo de trabalho de Organizações da Sociedade Civil não é bem visto por todos, em particular por muitos que por vezes se sentem alvo de crítica e se sentem tentados ao exercício de represálias quando dispõem do poder – político ou financeiro – para as exercer. Estes riscos exigem assim estratégias que impeçam que eles se tornem “suicidários” e que condenem ou ponham em risco o futuro das organizações e o tra-balho que desenvolvem e os compromissos com os seus parceiros de desenvolvimento. Estas estratégias têm passado por um trabalho de construção de alianças, nacionais e internacionais, que impeçam o isolamento e garantam complementaridades – por exem-plo, alianças com redes internacionais, alianças com sectores da investigação científica ou com profissionais e meios de comunicação social.

6. Para a Plataforma Portuguesa das ONGd este trabalho iniciou-se também na base de uma ideia muito clara: a de que este não seria um trabalho apenas para os seus dirigentes ou para o seu corpo técnico permanente fazer. de facto, este seria um traba-lho a ser assumido em conjunto entre dirigentes de ONGd e técnicos, caso contrário estaria condenado ao fracasso em termos de resultados para o trabalho de monitoria e para a elevação da consciência cívica das organizações membros.

7. Finalmente, este tem sido um processo que tem assentado na consciência de que os resultados não se obtêm do dia para a noite – é um processo que inclui muitas componentes e que todas elas exigem tempo: tempo para estudo, tempo para provocar mudança de mentalidades, tempo para construir relações de confiança, tempo para ser reconhecido e conquistar o lugar adequado no processo da governação democrática, local, nacional, internacional.

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CONCEIçãO LIMA

Poeta e jornalista são-tomense, trabalhou e exerceu cargos de direcção na rádio, na televisão e na imprensa escrita, em São Tomé e Príncipe, e foi jornalista da bbC. Em 1993, fundou o já extinto O País Hoje. Licenciada em Estudos Africanos, Portugueses e brasileiros pelo King’s College de Londres, é mestre em Estudos Africanos pela School of Oriental and African Studies (Londres).

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OSC e media:uma parceria

para a mudançaConceição Lima

há algum tempo, uma reportagem da TVS, a única estação televisiva são-tomense, lançou ondas de choque entre os telespectadores mais prevenidos: desavenças entre um casal culminaram na expulsão da mulher do domicílio, após violento espancamento. O público ouviu primeiro a mulher banhada em lágrimas e, estupefacto, não conseguiu descortinar a razão do longo “tempo de antena” concedido ao homem para confirmar e justificar a agressão e a expulsão como exercício legítimo das suas prerrogativas de ma-cho. do mesmo modo, houve quem não tenha logrado entender que nem uma só das organizações não-governamentais que erguem a defesa dos direitos da mulher como razão da sua existência, tenha denunciado o modo como a televisão nacional acabara por se transformar em promotora dos mais retrógrados e repudiáveis valores, num caso de polícia e de Justiça. E contudo, a indignação de mulheres e homens fez-se ouvir em brados ou em surdina, sem ultrapassar o domínio do desabafo mais ou menos privado.

Vem este exemplo a propósito do tema Sociedade Civil e Media, com que se encerrou a mesa redonda “O papel das OSC e as políticas públicas”, uma acção conjunta da Federação das ONG em São Tomé e Príncipe (FONG-STP) e da Associação para a Cooperação entre os Povos (ACEP).

durante o debate, constatou-se ser imperativa, imprescindível e mutuamente vanta-josa uma parceria séria, crítica e permanente entre as Organizações da Sociedade Civil (OSC) e os media.

Não se trata aqui, da parte das OSC, de esperar que o jornalista cerceie ou abdi-que do espírito crítico que deve preservar em todas as circunstâncias. uma eventual iniquidade de uma OSC deve ser exposta e denunciada com a mesma prontidão e

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rigor com que se denunciaria qualquer outra iniquidade.Nem se trata aqui, como disse Fátima Proença, da ACEP, baseada numa longa ex-

periência de relacionamento com os media em vários países, de as OSC olharem para o jornalista como alguém que se limita a divulgar os comunicados de imprensa e a reportar eventos, assegurando sobretudo a visibilidade imagética das Organizações da Sociedade Civil.

Numa altura em que as OSC são-tomenses apostam na passagem do estatuto de meros executores de projetos (em cuja formulação nunca ou raramente participam), para se assumirem como vetores de construção de uma cidadania participativa, trata-se antes de tudo, para os próprios jornalistas de se apropriarem de conceitos arredados do discurso político e social, largamente ausentes do seu vocabulário profissional e da sua agenda quotidiana, conhecer as dinâmicas das OSC no terreno, as suas esferas de intervenção, o seu modus operandi, a sua filosofia de acção.

Trata-se, para os jornalistas, de estarem capacitados a inscrever na sua agenda diária a acção e os princípios que as OSC se propõem assumir, como factores de mudança de mentalidades e de hábitos, vocacionadas para influenciar as políticas públicas e, amiúde, veículos dos que não têm voz junto das instâncias de decisão política. daí decorre, antes de tudo, a necessidade de apreensão do significado, das implicações e das vantagens, para o cidadão e para o conjunto da sociedade, dos valores contidos, por exemplo, no fulcral conceito de cidadania participativa.

A eficácia da parceria acima referida passa, pois, antes de tudo pela formação dos jornalistas. uma vez formados, uma vez cientes e conscientes do papel que deve ser o das OSC na definição de políticas públicas, o jornalista assumir-se-á, ele próprio, como vector de mudança de hábitos, comportamentos e mentalidades. Se a escandalosa re-portagem da TVS exemplificou, por um lado, a flagrante impreparação cívica de um repórter, o mediático silêncio das ONG traduziu, por outro, a impreparação para usar permanentemente os media como instrumento de edificação dos valores da cidadania.

daí a importância de que se reveste a ideia, lançada durante o debate, de um workshop para jornalistas, a ser promovido pelas OSC e pela Comunicação Social, como ponto de partida de uma parceria que promete alterar os modos de representação da sociedade e do país nas grelhas de programação dos media, alargando o leque temático, apro-fundando abordagens, inscrevendo perspectivas inovadoras e forjadoras de uma outra consciência cívica, baseada no conhecimento dos direitos políticos, económicos, sociais e culturais, do direito à reclamação e à exigência, do direito à palavra como imprescindí-vel à dignidade e à integridade do ser. Em termos muito breves, a parceria entre as OSC e os media deve induzir e conduzir à capacitação do cidadão como agente na resolução dos seus problemas e agente do desenvolvimento nacional.

há constrangimentos a superar? Vários.Antes de tudo, a aposta na maturação cívica e na cidadania participativa suscita, em

não poucos decisores políticos, uma reacção ambivalente. Ao mesmo tempo que, nos discursos públicos, defendem a necessidade de se aliviar o Estado do peso das suas

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responsabilidades, encaram a perspectiva da sua concretização com fundas suspeições, muito ciosos da intocabilidade das suas prerrogativas. uma dinâmica de reforço do pa-pel das organizações da sociedade civil através dos media, merecerá, de alguns, aplausos imediatos e engavetamento automático. Nem todos, felizmente, padecem de tal miopia e a tendência parece apontar para o fortalecimento dos apologistas do reforço do papel das OSC.

Outro aspecto central ao debate do tema Organizações da Sociedade Civil e Media, re-lacionou-se com a esmagadora predominância da imprensa estatal, submetida, em 22 anos de regime pluralista, a estratégias de governamentalização, em graus variáveis mas idêntica natureza. reconhecido o peso e a centralidade actuais da TVS e da rádio Na-cional na projectada parceria OSC/media, abordou-se igualmente a importância de rá-dios, jornais, e imprensa digital privados, das redes sociais e vídeos, entre outros meios.

Os media influenciam e geram correntes de opinião, têm a capacidade de definir e redefinir, numa escala sem concorrência, o rumo e o sentido das mudanças sociais. O seu poder pode ser perverso ou benéfico. A parceria com as Organizações da Sociedade Civil são-tomense, em plena transição na sua filosofia de acção, pode contribuir de for-ma muito significativa para aumentar a capacidade dos media de agirem para a mudança positiva em São Tomé e Príncipe.

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O papel das OSC e as Políticas Públicas:

Conclusões erecomendações

Membros da FONG e outros convidados estiveram reunidos em mesa redonda no Centro Cultural Português na Cidade de São Tomé, no dia 13 de dezembro de 2012, organizada pela Federação das ONG em São Tomé e Príncipe (FONG-STP) e a Asso-ciação para a Cooperação Entre os Povos (ACEP), cujo tema central foi “O Papel das OSC e as Politicas Publicas”.

Após apresentações e debates sobre diversos temas incluídos no programa de traba-lhos, forma formuladas as seguintes conclusões:

- Têm existido, em geral, relações institucionais relativamente saudáveis entre as Organizações da Sociedade Civil e o Estado, essencialmente ao nível da execução de projetos de iniciativa governamental.

- As ONGs têm estabelecido parcerias com o Estado e nesse quadro têm sido de-senvolvido projetos, sobretudo nas áreas da Saúde, Educação e Combate ao hIV-Sida.

- Embora seja reconhecido um nível razoável de funcionamento e de intervenção das ONGs, centrada em projectos, elas registam ainda fragilidades institucionais e fun-cionais.

- O normal relacionamento entre OSC e Estado é por vezes afectado por sentimen-tos de rivalidade que precisam de ser ultrapassados e substituídos por um espírito de colaboração e complementaridade.

- A existência de um quadro legal claro que facilite a relação entre OSC e Estado pode ter um papel importante na superação de algumas das dificuldades registadas

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- Para além disso, existe a consciência de que uma acção centrada exclusivamente em projectos não permite enfrentar os problemas do desenvolvimento, que exigem previamente um debate e a participação na elaboração e seguimento das politicas que os vão enquadrar.

- No entanto, considera-se que não existe uma adequada perceção por parte do Esta-do quanto à importância das ONGs, no seu conjunto, como fator de desenvolvimento, no quadro de uma nova abordagem de governação.

- de facto, o conceito de participação democrática não se limita ao exercício do di-reito ao voto devendo haver maior participação das OSC na vida política.

- Identifica-se por isso a necessidade de desenvolvimento e reforço de mecanismos de diálogo sobre as políticas públicas, entre as diversas componentes da Sociedade Civil e os diversos órgãos do Estado, que podem vir a passar pelo estabelecimento de convé-nios, protocolos e acordos específicos para esse efeito.

- é necessário que nos vários domínios da relação Estado / OSC se encontrem me-canismos de garantia do reforço das capacidades técnicas e de reforço da transparência no acesso e gestão dos recursos financeiros, que permitam o fortalecimento do papel das OSC tanto na monitoria como na implementação das políticas públicas.

- As parcerias com órgãos da comunicação social e instituições universitárias e de investigação e a colaboração regular com jornalistas e investigadores serão uma base indispensável para facilitar o acesso a informação, para a melhorar as capacidades das OSC e credibilizar a sua intervenção na formulação e monitoria de políticas publicas.

Face às constatações e conclusões do debate acima apontadas, os participantes deci-diram aprovar as seguintes recomendações:

- é urgente e indispensável iniciar um diálogo com o Estado sobre o papel mais abrangente das OSC e sobre os novos tipos de parcerias OSC/Estado, não se limitando a uma relação de execução de projectos.

- Esse diálogo deverá ter como base a afirmação da ideia de que a monitoria de políticas não é um acto de julgamento público de ninguém, mas sim uma forma de contribuir para uma maior eficácia das políticas, com impacto no desenvolvimento e na melhoria da governação

- A participação das OSC neste domínio exige condições favoráveis, que passam nomeadamente pela disponibilização da informação adequada por parte dos diversos departamentos e instituições do Estado.

- Necessário se torna que as ONGs tenham uma planificação mais correcta e eficaz capaz de influenciar o Estado.

- As OSC devem centrar esforços na colaboração entre si, definir níveis de especia-lização e complementaridades e elaborar planos de acção que lhes permitam exercer influência na definição, monitoria e implementação das políticas públicas.

- uma nova visão e atitude do Estado quanto ao papel das OSC deve implicar a re-

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cusa de quaisquer medidas de represália relativamente às ONGs e outros actores sociais, nomeadamente os meios de comunicação social e seus profissionais.

- As OSC devem criar analisar a criação de uma plataforma de comunicação que lhes permita melhor divulgar as suas actividades junto dos meios de comunicação social.

- As OSC organizadas devem iniciar um debate com os meios de comunicação social, que permita o reforço mútuo e a independência face ao Estado e às forças partidárias

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AnexosLista de Organizações Participantes

documentos de Apoio

Organizações Participantes na Mesa Redonda

AdAPPA CECAb-STPAdAdEr Cooperativa J.MachelAdIEE FAhErC-GIMEAJuP FLIMrA-EPMALISEI FNFAJuM GdMezochiAMbM KITEMbuANEP Legi CabomgueArCAr MArAPAArPA QuATELAASMJ rAP-AMPAssociação Côto SINEPCáritas uNdPCIP ZATONA-AdILCJV

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OS DESAFIOS DA BOA GOVERNAçãO1

Carlos Jalali / Professor no Departamento de Ciências Sociais, Políticase do Território da Universidade de Aveiro

Nas últimas duas décadas, o conceito de boa governação adquiriu substancial sali-ência na cooperação. Tal é reflectido na declaração do Milénio, onde os Objectivos do desenvolvimento e da erradicação da pobreza são explicitamente considerados como dependentes “de uma boa governação em cada país”.

Contudo, a ubiquidade da boa governação no discurso e prática da cooperação ocul-ta também desafios em termos da sua definição e operacionalização. Como salienta o investigador holandês Martin doornbos, a boa governação tornou-se uma “expressão de moda” na cooperação a partir da década de noventa do século passado; e, “como frequentemente acontece com estas expressões, está longe de haver consenso sobre o conceito, ou uma ideia comum sobre como pode ser aplicado concretamente”.

Assim, se a centralidade da boa governação para a cooperação é inegável, importa ir para além do lugar-comum na sua abordagem. Tal requer responder ao duplo desa-fio enunciado por Martin doornbos: primeiro, como podemos definir o conceito de boa governação na arena da cooperação? E, segundo, como podemos operacionalizá-lo concretamente na cooperação?

Primeiro desafio: definir a “boa governação”Para definir a boa governação, torna-se necessário primeiro abordar as diferentes

perspectivas do conceito, especificamente duas questões-chave que procuramos de se-guida clarificar.

A primeira prende-se com a natureza do conceito – se esta se centra unicamente nos processos de governação (aspectos como a participação dos cidadãos nas decisões; transparência e accountability no processo de governação; ou as limitações ao âmbito da governação que o Estado de direito impõe2); ou se abarca também políticas públicas específicas resultantes (como p.ex. associar a boa governação a políticas públicas que promovam o comércio internacional ou que limitem a intervenção do Estado na eco-nomia3).

A opção deve recair numa definição processual da boa governação, por três motivos: 1) é um elemento comum a todas as definições do conceito na área da cooperação; 2) permite lidar com uma crítica recorrente ao conceito de boa governação, que se centra na sua apropriação para fazer avançar agendas ideológicas em termos de políticas pú-blicas; 3) permite centrar a acção em dimensões suficientemente consensuais quer nos

1 Texto originalmente publicado no boletim Melhor Cooperação, Melhor Desenvolvimento #Novembro 2011 (ed. ACEP)2 dimensões processuais frisadas nas definições de boa governação do PNud, dFId, FMI ou banco Mundial, por exemplo.3 resultados específicos salientados na abordagem à boa governação do FMI, por exemplo.

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países doadores, quer nos países parceiros. Tal é particularmente relevante tendo em conta a declaração de díli de 2010 que alerta para o facto dos países parceiros serem muitas vezes negligenciados na definição de estratégias de boa governação.

A segunda questão-chave prende-se com o âmbito do conceito de boa governação. Com efeito, a ausência de clareza definicional deriva também de visões excessivamente abrangentes do que é “boa governação”. No limite, virtualmente todas as áreas podem ser subsumidas sob o “chapéu” da boa governação: como a investigação existente ilus-tra, a boa governação pode ser relacionada a áreas tão diversas como a saúde, a literacia financeira e o sector empresarial, entre (muitas) outras. Nesse sentido, consideramos ser importante demarcar claramente o âmbito do conceito, de modo a evitar que a boa governação se torne um meta-conceito que se sobrepõe e subsume todos os outros aspectos da cooperação.

Como então definir o conceito de boa governação? Podemos estruturar a sua defi-nição em torno de três princípios centrais da boa governação: a liberdade, a igualdade e o controlo. O primeiro remete para a dimensão dos direitos civis de cada indivíduo. Assim, a boa governação tem como uma das suas funções assegurar a protecção dos direitos individuais, da legalidade e, consequentemente, da liberdade individual. Por sua vez, o princípio da igualdade remete para a dimensão dos direitos políticos dos cidadãos, que devem ter oportunidades iguais de influenciarem as escolhas colectivas. Por fim, o controlo político visa dois aspectos interligados: primeiro, assegurar a capacidade efec-tiva de governação das instituições democráticas; e, relacionado, garantir a responsabili-zação e imputabilidade – accountability – nos processos de governação.

Podemos então definir a boa governação como processos que defendem os direitos dos cidadãos e lhes permitem efectivamente escolher as políticas públicas que desejam para o seu país de forma informada, transparente e livre. A partir desta definição, iden-tificamos sete objectivos específicos da cooperação para esta área:

- Promover e reforçar os direitos civis (quer na sua dimensão legal, quer no seu exer-cício real por parte dos cidadãos);

- Promover e reforçar os direitos políticos;- Promover a participação eleitoral;- Promover e reforçar a participação política;- Aumentar e reforçar o accountability; e- Aumentar e reforçar a capacidade de governação.

O segundo desafio: operacionalizar a “boa governação”A discussão anterior em torno da definição da boa governação é de utilidade limitada

se não for possível transpor os seus princípios e objectivos para o terreno da coopera-ção. Esta secção visa assim abordar como a boa governação pode ser operacionalizada,

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examinando quatro dimensões a montante de qualquer acção nesta área: as suas esferas, prioridades, actores e governação.

Podemos identificar seis esferas-chave de intervenção na cooperação para a boa governação: o contexto e enquadramento legal que constituem um alicerce crucial para o exercício dos direitos civis e políticos; os recursos administrativos e técnicos, cruciais para assegurar a capacidade de governação; a vitalidade da sociedade civil, quer como indicador per se, quer enquanto mecanismo de accountability; o apoio e legitimidade po-pular; o papel das instituições políticas, na medida em que são elas que operacionalizam os conceitos abstractos de liberdade, igualdade e controlo; e, por fim, a segurança dos cidadãos, considerado um pré-requisito para assegurar a liberdade e igualdade.

A segunda dimensão prende-se com as prioridades da cooperação que devem ter em conta as especificidades históricas, políticas, sociais e económicas dos países parceiros. Como frisa a declaração de díli, “o contexto nacional deve guiar cada caminho distin-tivo para o desenvolvimento sustentável.” Por outro lado, as diferenças entre contextos implicam também que algumas medidas na área da boa governação devem preceder ou-tras. A título de exemplo, a segurança física tenderá a preceder a protecção social: com efeito, a implementação de mecanismos de protecção social, como por exemplo a pro-tecção no desemprego, será de utilidade e impacto escasso num contexto de guerra civil.

relativamente aos actores, a cooperação para esta área requer o envolvimento de um leque abrangente de intervenientes, quer instituições governamentais e quasi-go-vernamentais, quer organizações não-governamentais e entidades privadas. Ao mesmo tempo, importa assegurar que esta diversidade de actores se insere numa estrutura de intervenção consistente e coerente, que permita articular o importante trabalho no ter-reno das diferentes instituições.

Por fim, devemos salientar a importância da “governação” da cooperação. A própria cooperação deve ser pautada por princípios de boa governação como a prestação de contas, a participação e a transparência. Esta prestação de contas deve ser bidireccional, vinculando não só os parceiros em relação aos doadores, mas também os doadores pe-rante os parceiros e demais stakeholders. Aprofundar uma cultura de boa governação da cooperação é fundamental para assegurar a sua legitimidade; e é instrumental em termos de gerar um maior fluxo de informação, necessário para melhorar programas e projec-tos. Em última análise, a cooperação para a boa governação, para ser eficaz, requer uma boa governação da cooperação.

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ONGD – IDENTIDADE, INTERVENçãOE AUTO-REGULAçãO1

Equipa ACEP

O termo ONG engloba um vasto universo de organizações cuja natureza e fins dife-rem bastante entre si, não havendo uma definição precisa e unanimemente aceite. Pode-mos dizer que as ONG são organizações formalmente constituídas, independentes, que actuam em diversas áreas (direitos humanos, ambiente, migrações, desenvolvimento, acção humanitária, etc.) com vista a gerar melhorias na sociedade, sejam de impacto mais limitado no tempo, sejam promotoras de mudanças estruturais.

O universo das ONG abrange áreas de trabalho e realidades muito díspares. Focar-nos-emos aqui nas ONG que intervêm na Cooperação para o desenvolvimento, na Ajuda humanitária e de Emergência, bem como nos domínios da Educação e Sensibili-zação para o desenvolvimento e na Advocacia, ou seja, aquelas que foi convencionado designar como ONG de desenvolvimento (ONGd). Na sua base legal define-se que dos seus fins não constam os fins lucrativos (tal significando no entanto que podem desenvolver actividades económicas lucrativas em domínios coerentes com a sua missão e facilitadoras de condições económicas para o seu prosseguimento, mas não podem distribuir os lucros entre os membros), nem político-partidários, sindicais, militares ou religiosos. com vista a um mundo mais justo, mais inclusivo e menos desigual.

Nos últimos 20 anos, as ONGd ganharam visibilidade e reconhecimento, muito devido à sua proximidade com as populações, à sua flexibilidade e capacidade de acção rápida, experimentação de abordagens inovadoras, mas devido também ao seu papel de advocacia, de monitoria de políticas e de defesa dos direitos humanos. Ao mesmo tempo, a sua progressiva profissionalização favoreceu a capacidade de se afirmarem enquanto actores com múltiplas competências, de pleno direito e parceiros-chaves, cha-mados, em muitos países, a participar na definição das políticas de Cooperação e de desenvolvimento.

As ONGD enquanto actores do DesenvolvimentoAs ONGd são actores incontornáveis do desenvolvimento, quer pelas finalidades

que prosseguem e o trabalho que desenvolvem, quer pelo volume de recursos, incluindo financeiros, que mobilizam e gerem. As actividades de advocacia em prol do desenvol-vimento e o debate em torno da definição de prioridades políticas e da sua monitoriza-ção contribuem para a sensibilização das populações dos países financiadores de Ajuda Pública ao desenvolvimento e também para a percepção da opinião pública em relação à Cooperação para o desenvolvimento. Concorrem ainda para a implementação das políticas de cooperação nacionais e europeia. de acordo com a OCdE, em 2009, as

1 Texto originalmente publicado no boletim Melhor Cooperação, Melhor Desenvolvimento #dezembro 2011 (ed. ACEP)

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ONG geriram pelo menos 13% da totalidade da Ajuda Pública ao desenvolvimento (APd) dos países membros do Comité de Ajuda ao desenvolvimento (CAd)2 (a quota em Portugal, embora com sentido crescente, não ultrapassa ainda os 3%).

Praticamente todos os países membros do CAd/OCdE3 têm uma política de cola-boração com as organizações da sociedade civil. No caso de Portugal, esta é parte inte-grante da Visão Estratégica para a Cooperação Portuguesa (2005-2009)4, cujo balanço destaca o papel activo da sociedade civil portuguesa e o incremento do diálogo entre o Instituto Português de Apoio ao desenvolvimento (IPAd) e a Plataforma Portuguesa das ONGd5.

Em 2008, governantes e responsáveis de agências multilaterais reconheceram, no Terceiro Fórum de Alto Nível sobre a Eficácia da Ajuda, a importância das OSC “en-quanto actores de desenvolvimento a título próprio, cujos esforços complementam os dos governos e do sector privado”6. Em Acra, países financiadores da APd e os Países em desenvolvimento (PEd) assumiram o compromisso de aprofundar a colaboração com as OSC, criando e/ou reforçando um ambiente favorável à sua participação, com-promisso reiterado em busan em dezembro de 20117, onde as OSC viram reconhecido o seu papel como promotoras de acesso aos direitos e na definição, monitorização e implementação das políticas de desenvolvimento.

As ONGd enquanto facilitadoras de acesso a bens públicosNos PEd as ONGd participam em iniciativas que facilitam o acesso das comu-

nidades a serviços sociais básicos, politicas públicas onde se registou um enorme de-sinvestimento por parte de muitos Estados (e mesmo à anulação das suas capacidades internas), a partir dos Programas de Ajustamento Estrutural, promovidos pelo FMI e banco Mundial e adoptados pelos PEd como condição de acesso a apoio externo. devido em parte à sua grande proximidade às populações, as agências financiadoras têm vindo a considerar cada vez mais as ONGd como parceiras-chave para o objectivo global de erradicação da pobreza.

Em simultâneo verifica-se um aumento de projectos da iniciativa das agências finan-ciadoras e por elas desenhados, em que as ONGd se limitam ao papel de executantes, num novo segmento de mercado que garante a sua sustentabilidade financeira. No en-tanto, estas situações de subcontratação, em que as ONGd estrangeiras garantem uma execução de projectos e um “reporting” de acordo com os padrões de exigência das

2 OECd (2011), how dAC members work with civil society organisations: an overview3 O CAd da OCdE é composto por 23 paises: Alemanha, Austrália, Áustria, bélgica, Canadá, dinamarca, Espanha, Estados unidos da América, Finlândia, França, Grécia, holanda, Itália, Irlanda, Japão, Coreia do Sul, Luxemburgo, Nova Zelândia, Noruega, Portugal, reino unido, Suécia, Suíça, e Comissão Europeia4 www.ipad.mne.gov.pt/Cooperacaodesenvolvimento/EstrategiaCooperacaoPortuguesa/documents/Visao_Estrategica_editado.pdf5 www.ipad.mne.gov.pt/Cooperacaodesenvolvimento/EstrategiaCooperacaoPortuguesa/documents/balanco_visao_coop.pdf6 AAA, p.6, www.oecd.org/dataoecd/58/59/41202060.pdf7 busan Partnership Agreement for Effective development Cooperation, Artigo 20, p.6, www.aideffective-ness.org/busanhlf4/images/stories/hlf4/OuTCOME_dOCuMENT_-_FINAL_EN.pdf

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instituições financiadoras, têm vindo a gerar efeitos negativos nas ONGd locais, (e por vezes para os próprios Estados dos PEd) que se vêm subalternizadas e substituídas, pondo assim também em causa a durabilidade e sustentabilidade futura e perpetuando a dependência da Ajuda ao desenvolvimento.

Encontramo-nos assim perante a necessidade de debater e pensar o papel das ONGd, muitas vezes encarado como um papel de gestão de fundos e de projectos – papel que lhes tolhe em parte a sua capacidade de formular propostas e gerar mudanças, e as acantona numa esfera de controle por parte dos doadores.

O que distingue as ONGD dos restantes actores da CooperaçãoAs ONGd têm um papel que vai muito além da facilitação do acesso das comu-

nidades a serviços que os Estados podem não estar em condições de assegurar. Elas têm por fim o objectivo de suscitar mudanças sócio-económico-políticas, cabendo-lhes assim também um papel de sensibilização e de advocacia e influência social e política. Fazem parte do debate pela qualidade da democracia e constituem-se como força de pressão, chamando a atenção para questões como a abordagem baseada nos direitos, sustentabilidade ambiental, as questões da transparência, da luta contra a corrupção, a coerência das políticas nacionais. Ao contribuírem para monitorização das políticas nacionais e programas internacionais, constituem-se como força de mudança – um exemplo disto é a plataforma better Aid que representou a sociedade civil nos Fóruns de Acra e busan, com resultados muito concretos nas decisões políticas aí tomadas. As ONGd tornaram-se de facto num elemento importante, e reconhecido, da governação democrática mundial.

As ONGD e as relações de parceria internacional para o desenvolvimentoEmbora sejam actores com a mesma natureza, as ONGd do mundo desenvolvido

e as dos PEd não conseguiram quebrar as relações assimétricas de poder existentes. Verifica-se aliás uma tendência crescente, por parte de ONGd europeias de competir com as ONGd dos PEd para a obtenção de fundos, ou reduzindo-as a um papel ins-trumental para obtenção de recursos financeiros “em parceria”, mas secundarizando a sua participação efectiva. O próprio conceito de “parceria” tem sido contestado e objecto de intenso debate nos últimos anos. Existe um pressuposto óbvio de que a Cooperação deve conduzir a uma maior autonomia, empoderamento e sustentabilidade das ONGd nos PEd, levando a um maior reforço da Sociedade Civil local: com uma efectiva liberdade de determinar a sua própria estratégia e modelos de intervenção e, em conjunto, contribuírem para a construção de uma relação horizontal inter-pares, em vez de relações que bloqueiam as organizações dos Países em desenvolvimento em relações verticais de poder e na perpetuação da dependência.

Por outro lado muitas ONGd europeias dependem financeiramente de fundos pú-blicos, o que limita a sua flexibilidade e independência, levando-as muitas vezes a im-por condições às ONGd suas parceiras dos Países em desenvolvimento. Além disso,

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existem dados objectivos que configuram uma ausência de confiança da parte de muitas ONGd europeias nas suas congéneres dos Países em desenvolvimento, dando mesmo lugar a perguntar se não se trata de travar de facto as formas de financiamento directo às ONGd nos Países em desenvolvimento.

Existe outra dimensão que pode representar um outro factor de desequilíbrio de poder: as representações e imagens criadas sobre os Países em desenvolvimento. À semelhança dos media, nas últimas décadas, a representação de África e da Ásia tem sido construída também por imagens difundidas pelas organizações internacionais e ONGd, numa tentativa de mostrar a sua contribuição para melhorar a vida das popula-ções. O recurso a imagens de calamidade, pobreza ou conflito constrói representações das populações locais como actores passivos, apenas à espera de ajuda externa. Na últi-ma década assiste-se a um debate – interno e externo – nalgumas ONGd sobre o seu papel como mediadoras entre a sociedade onde se inserem e as sociedades com quem cooperam. Porém, a prática de ocultação das ONGd parceiras na comunicação das ONGd europeias é ainda dominante, dando origem a uma representação unilateral dos Países em desenvolvimento.

Da necessidade da auto-regulaçãoAs ONGd têm-se vindo a constituir como força de pressão sobre os seus gover-

nos, no sentido de uma maior accountability e transparência por parte destes. Toda-via, as suas próprias práticas nem sempre são consistentes com estas reivindicações. A prestação de contas, por exemplo, é uma das áreas nas quais as ONGd precisam imperiosamente de melhorar o seu desempenho, publicando de forma pró-activa, clara e atempada os seus relatórios de actividades e financeiros - uma boa prática que lhes permitirá reforçar a sua credibilidade junto dos doadores e do público em geral, não só relativamente ao dinheiro público, mas também as contribuições privadas. Mas convém não esquecer que a prestação de contas não pode ser apenas “para cima”, ou seja para com os financiadores, mas deve ser também para com os outros parceiros e populações envolvidas e não se esgota no tema da gestão eficiente dos recursos e no alcance dos objectivos.

O papel progressivamente mais importante das ONGd, quer na esfera social quer na esfera política, acarreta um maior escrutínio sobre as suas actividades e sobre as práticas de gestão. O tema da auto-regulação das ONGd tem-se tornado cada vez mais premente, havendo necessidade de debater e definir princípios e modos de actuação comuns, no sentido de reforçar a coerência com os princípios, a responsabilização e a sua contribuição efectiva para o desenvolvimento, num pano de fundo de relações de poder equilibradas.

A auto-regulação pode assumir variadíssimas formas como, por exemplo, a adopção de códigos de ética e conduta, com o objectivo desenvolver mecanismos de controle que balizam as práticas das ONGd e dêem confiança aos seus stakeholders. No en-tanto, estes códigos, para serem efectivos, precisam de ser vinculativos e definirem a instância de poder de monitorização (seja ela externa seja inter-pares).

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Os mecanismos de auto-regulação passam assim pela afirmação da responsabilidade social das organizações e pela discussão de questões éticas, não só no plano financeiro. uma postura ética exige tornar claro e público os valores pelos quais as ONGd se regem, valores que devem ser postos em prática em toda a linha de actuação da or-ganização: na utilização dos fundos, na política de comunicação, na política de gestão do pessoal, etc. Os Princípios de Istambul, aprovados em Setembro de 2010, são um exemplo de mecanismo de auto-regulação, essencial para incrementar a accountability das ONGd.

Relação das ONGD com o EstadoOs governos participantes do Processo de Paris sobre a Eficácia da Ajuda assu-

miram-se como responsáveis pela criação de um ambiente favorável à actuação das ONGd, a começar pela criação de condições legais nesse sentido. Em Portugal, o qua-dro legal foi definido em 1998, num Estatuto das Organizações não Governamentais de Cooperação para o desenvolvimento (Lei n.º 66/98 de 14 de Outubro8).

A Plataforma Portuguesa das ONGd (constituída em 1985) tem desempenhado um papel importantíssimo para o reconhecimento das ONGd como legítimos actores da Cooperação. Contudo, a reivindicação pelo direito de participação na definição das políticas e programas de cooperação continua actual.

Apesar da relação das ONGd com o Estado estar sujeita a oscilações (dependendo aliás demasiado do perfil das pessoas com a responsabilidade política e institucional no sector e menos das instituições propriamente ditas), foram concretizados avanços signi-ficativos. Nos últimos anos, a criação do Fórum da Cooperação para o desenvolvimen-to, que reúne as diversas expressões da sociedade civil com os responsáveis públicos do sector, contribuiu consideravelmente para um reconhecimento mútuo e para a criação de um espaço de debate de políticas, apesar da direcção centralizada e do direito de ini-ciativa ter sido limitado aos responsáveis governamentais e das instituições do Estado. A adopção de Normas e Critérios para as Candidaturas de ONGd ao co-financiamento de projectos de Cooperação e de Educação para o desenvolvimento, bem como a aber-tura regular dessas candidaturas são outros exemplos de avanços positivos.

A independência das ONGd face ao Estado é uma sua mais-valia no sector da Co-operação para o desenvolvimento. é essa independência que lhes permite por um lado definirem as suas prioridades em articulação com os seus parceiros de desenvolvimento e, por outro, desempenharem o papel de monitoria de políticas atrás referido. Mas a independência é ao mesmo tempo o calcanhar de Aquiles das ONGd. E a saída tem que ser encontrada por ambos os lados: do lado do Estado com a recusa de tentações de controle e instrumentalização, antes contribuindo para a potenciação deste capital de desenvolvimento e de democracia; do lado das ONGd procurando consolidar e alargar alianças, acessos a outras fontes de recursos, num processo que se poderia chamar de internacionalização socialmente responsável.

8 www.ipad.mne.gov.pt/SociedadeCivil/documents/Estatuto.pdf

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Bibliografia de Referência

_ brehm, V. M. (2004), “Autonomy or dependence? North–South NGO Partner-ships”, in INTRAC Briefing Paper No. 6, July 2004

_ Fundación Lealtead, Guia de la Transparência y las buenas prácticas de las ONG, www.guiatransparenciaong.org/guiaong/principios

_ Gugerty, Mary Kay (2007), Models of NGO Self-Regulation: Theory and Evidence from Africa, http://evans.washington.edu/files/EvansWorkingPaper-2007-04.pdf

_ hammer, Michael, rooney, Charlotte and Warren, Shana (2010), Addressing accoun-tability in NGO advocacy: Practice, principles and prospects of self-regulation www.oneworldtrust.org/publications/doc_download/414-addressing-accountability-in-ngo-advocacy-practice-principles-and-prospects-of-self-regulation

_ OECd (2010), Better Aid: Civil Society and Aid Effectiveness: Findings, Recommendations and Good Practice, www.oecd-ilibrary.org/content/book/9789264056435-en

_ OECd (2011), How DAC members work with civil society organisations: an overview, www.oecd.org/dataoecd/3/27/48843465.pdf

_ Warren, Shana and Lloyd, robert (2009), Civil Society Self-Regulation, The Global Pic-ture, www.oneworldtrust.org/publications/doc_download/377-cso-self-regulation-the-global-picture-2009

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OS PRINCÍPIOS DE ISTAMBULPARA A EFICáCIA DO DESENVOLVIMENTODAS ORGANIzAçõES DA SOCIEDADE CIVIL

As Organizações da Sociedade Civil (OSC) são um elemento vital na vida democrá-tica dos países, colaborando com uma grande diversidade de pessoas e promovendo os seus direitos. Como actores do desenvolvimento, as OSC caracterizam-se por serem voluntárias, diversificadas, não-partidárias, autónomas, não-violentas, trabalhando para gerar mudança. Tendo em conta estas características, os Princípios de Istambul para a Eficácia do desenvolvimento das OSC guiam o seu trabalho e as suas práticas, seja em situações de conflito ou em contexto de paz, em diferentes áreas, desde a monitorização de políticas públicas a situações de emergência humanitária até a acções de desenvolvi-mento a longo prazo.

Respeitar e promover os Direitos Humanos e a Justiça SocialAs OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… desenvolvem eimplementam estratégias, actividades e práticas que promovem os direitos huma-

nos individuais e colectivos, incluindo o direito ao desenvolvimento com dignidade, condições de trabalho dignas, justiça social e igualdade para todas as pessoas.

Incorporar a igualdade e equidade de género, promovendo, em simultâneo, os direitos das mulheres e das raparigas

As OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… promovem e praticam uma Cooperação para o desenvolvimento que põe em prática a equidade de género, que reflecte as necessidades e experiências das mulheres ao mesmo tempo que apoiam os esforços para a realização plena dos seus direitos individuais e colectivos, de forma a permitir a participação de actores plenamente empoderados no processo de desen-volvimento.

Centrar-se no empowerment das pessoas, na apropriação e na participação democráticas

As OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… apoiam o empowerment e a participação inclusiva da população de forma a expandir a sua apropriação democrá-tica das políticas e iniciativas de desenvolvimento que afectam a sua vida, com especial ênfase para os pobres e marginalizados.

Promover a sustentabilidade ambientalAs OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… desenvolvem e imple-

mentam prioridades e abordagens que promovem a sustentabilidade ambiental para as

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gerações presentes e futuras, incluindo respostas urgentes para as crises climáticas, com atenção especial para as condições sócio-económicas, culturais e locais de integridade ecológica e a justiça.

Praticar a transparência e a prestação de contasAs OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… demonstram um compro-

misso institucional assente na transparência, prestação de contas a múltiplos actores e a integridade no funcionamento interno.

Estabelecer alianças equitativas e solidáriasAs OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… se comprometem a estabe-

lecer relações transparentes com a sociedade civil e outros actores do desenvolvimento, de forma livre e igualitária, baseadas em objectivos e valores do desenvolvimento, res-peito mútuo, confiança, autonomia organizacional, acompanhamento de longo prazo, solidariedade e cidadania global.

Criar e partilhar conhecimento e comprometer-se com a aprendizagem mútuaAs OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… melhoram as formas de

aprendizagem com as suas experiências e de outras OSC e actores do desenvolvimento, incluindo o conhecimento e a sabedoria das comunidades locais e indígenas, fortalecen-do a inovação e a visão de futuro que querem construir.

Comprometer-se com a criação de uma mudança sustentável e positivaAs OSC são efectivas como actores do Desenvolvimento quando… colaboram para obter re-

sultados e impactos sustentáveis nas suas acções de desenvolvimento, focando-se nos resultados e nas condições para uma mudança duradoura para as pessoas, com especial ênfase nas populações mais pobres e marginalizadas, assegurando um legado durável para as gerações presentes e futuras.

Guiadas por estes Princípios de Istambul, as OSC comprometem-se a tomar medi-das pró-activas de forma a melhorar as suas práticas em prol do desenvolvimento e a prestar contas sobre as mesmas. Será igualmente importante contar com políticas e prá-ticas propícias por parte de todos os actores. Através de acções concertadas com estes princípios, os doadores e os governos dos países parceiros demonstram o compromisso expresso na Agenda de Acção de Acra de “partilhar um interesse em assegurar as con-tribuições das OSC para alcançar o desenvolvimento em todo o seu potencial”. Todos os governos têm obrigação de garantir os direitos humanos básicos – entre outros, o direito de associação, de reunião e a liberdade de expressão. Estas são as pré-condições para a Eficácia do desenvolvimento.

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FUNDACIóN LEALTAD: PRINCÍPIOSDE TRANSPARêNCIA E DE BOAS PRáTICAS

Los Principios de Transparencia y buenas Prácticas de las ONG son recomendacio-nes de la Fundación Lealtad en materia de transparencia y gestión de las ONG. Se trata de indicadores definidos por la Fundación Lealtad que dan respuesta a las demandas de información de los donantes (particulares o institucionales) sobre las ONG.

Para su diseño se tuvo en cuenta la información requerida por la sociedad española sobre las ONG y se estudiaron otros modelos implantados con éxito en países como Estados unidos y reino unido. Además se llevó a cabo una ronda de consultas con las principales plataformas y coordinadoras de ONG, con ONG de distintos perfiles, representantes de la Administración Pública y expertos del Tercer Sector.

Para ofrecer al donante una información completa, los Principios abarcan múltiples aspectos del funcionamiento de las ONG. A través de los Principios, el donante podrá conocer mejor el trabajo y la realidad de las ONG, y contará con criterios objetivos para decidir con rigor con qué ONG colaborar.

Pulsa sobre cada Principio para consultar los motivos que lo justifican y el detalle decada uno de ellos.

1.- Principio de Funcionamiento y Regulación del órgano de Gobierno.El órgano de gobierno es el principal responsable de que la ONG cumpla con su

misión y de la gestión eficiente de sus recursos.El buen funcionamiento del órgano de gobierno en una ONG, al igual que en una

empresa, revierte en toda la actividad de la misma. Gobernar una organización implica asistir a las reuniones, participar activamente en la toma de decisiones que afectan a la estrategia y funcionamiento de la ONG e involucrarse en los procesos de planificación y seguimiento de la actividad. Por otro lado, conocer qué personas forman parte del órgano de gobierno de la ONG contribuye a generar confianza de la sociedad en la organización.

Para garantizar un correcto funcionamiento del órgano de gobierno es necesario que este esté formado por un mínimo de miembros, que se reúnan periódicamente, que se produzca una renovación periódica de sus cargos, y que cuente con mecanismos para asegurar su independencia en la toma de decisiones y evitar posibles conflictos de in-terés en su seno. Ello hace posible el control de la labor realizada por el propio órgano de gobierno.

AEl órgano de gobierno estará constituido por un mínimo de 5 miembros.

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BEl órgano de gobierno se reunirá al menos 2 veces al año con la asistencia física o

por videoconferencia de más del 50% de los miembros del órgano de gobierno.

CTodos los miembros del órgano de gobierno asistirán en persona o por videoconfe-

rencia, al menos, a una reunión al año.

Drespecto a los miembros del órgano de gobierno, serán públicos los nombres, pro-

fesión, cargos públicos y relación de parentesco y afinidad con otros miembros del órgano de gobierno y con el equipo directivo de la organización. Será público el cur-rículum vitae de los miembros del equipo directivo. La organización hará públicas las relaciones que existan entre miembros del órgano de gobierno y los proveedores y co-organizadores de la actividad.

ESólo un número limitado de los miembros del órgano de gobierno podrá recibir

ingresos de cualquier tipo, procedentes tanto de la propia organización como de otras entidades vinculadas. Este porcentaje será inferior al 40% de los miembros.

FLos miembros del órgano de gobierno se renovarán con cierta regularidad.

GExistirán mecanismos aprobados por el órgano de gobierno que eviten situaciones

de conflicto de interés en el seno del órgano de gobierno. Estos mecanismos serán públicos.

2.- Principio de Claridad y Publicidad del Fin Social.Tener un fin social claro, fácilmente accesible al público y que identifique claramente

la actividad y los beneficiarios de la ONG es vital para la captación de colaboradores, particulares e institucionales, y para la motivación de los trabajadores y voluntarios. Ello ayuda a la toma de decisiones estratégicas así como al diseño de los programas, y garan-tiza la coherencia entre las actividades previstas en Estatutos y las realmente ejecutadas.

AEl fin social estará bien definido. deberá identificar u orientar sobre su campo de

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A Sociedade Civil e as Políticas Públicas em São Tomé e Príncipe

actividad y el público al que se dirige.

BTodas las actividades que realice la organización estarán encaminadas a la consecuci-

ón del fin social, de modo que la organización no lleve a cabo actividades que no estén explícitamente contempladas en sus Estatutos.

CEl fin social será conocido por todos los miembros de la organización, incluidos los

voluntarios y será de fácil acceso para el público.

3.- Principio de Planificación y Seguimiento de la Actividad.una planificación de la actividad bien diseñada permite a la ONG anticipar posibles

cambios en el entorno y adaptarse a nuevas situaciones. de igual forma, la existencia de sistemas internos de seguimiento y evaluación de la actividad, permiten la medición del impacto de los proyectos realizados. En ambos procesos resulta fundamental la impli-cación del órgano de gobierno de la ONG, así como en la definición de los criterios y procesos de selección de proyectos y de las entidades que colaborarán en su ejecución. El seguimiento de una línea de trabajo específica indica la experiencia de la ONG en el ámbito de actuación y la zona geográfica en la que opera. Por otro lado, evita que puedan darse situaciones en las que se soliciten fondos para proyectos fuera del ámbito o zona de actuación de la ONG primando el voluntarismo sobre el uso eficiente de los mismos.

AExistirá un plan estratégico o un plan anual que englobe toda la organización con

objetivos cuantificables, cronograma y responsables. Serán públicos los objetivos rela-cionados con el área de proyectos.

BLa planificación tendrá que estar aprobada por el órgano de gobierno.

Cdurante los últimos tres años, los programas habrán seguido una línea de trabajo

específica.

DContarán con sistemas formalmente definidos de control y de seguimiento interno

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de la actividad y de los beneficiarios. Estos estarán aprobados por el órgano de gobier-no.

ELa organización elaborará informes de seguimiento y finales justificativos de los

proyectos que estarán a disposición de los financiadores.

FLa organización contará con criterios y procesos de selección de proyectos y contra-

partes aprobados por el órgano de gobierno. Contarán con sistemas formalmente de-finidos de control y de seguimiento interno de la actividad y de los beneficiarios. Estos estarán aprobados por el órgano de gobierno.

ELa organización elaborará informes de seguimiento y finales justificativos de los

proyectos que estarán a disposición de los financiadores.

FLa organización contará con criterios y procesos de selección de proyectos ycontrapartes aprobados por el órgano de gobierno.

4.- Principio de Comunicación e Imagen Fiel en la Información.La comunicación recurrente de la ONG con la sociedad es fundamental para incre-

mentar la confianza en la misma y ampliar y fidelizar su base social (socios, voluntarios, etc.). El detalle de la información facilitada al público y el hecho de que el mensaje que se transmita a la sociedad sea veraz y no induzca a error reflejan el talante transparente de la ONG.

En la era de las nuevas tecnologías es, además, imprescindible que la ONG cuente con una página Web con información completa y actualizada.

ALas campañas de publicidad, captación de fondos e información pública reflejarán

de manera fiel los objetivos y la realidad de la organización y no inducirán a error.

BAl menos una vez al año se informará a los donantes y colaboradores sobre las acti-

vidades de la organización.

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CSon requisitos para llevar a cabo la comunicación de forma eficiente contar con cor-

reo electrónico institucional y página web propia en funcionamiento, con información de todas las actividades de la organización y actualizada al menos una vez al año.

DLa organización pondrá a disposición de quien lo solicite la memoria anual de acti-

vidades y la memoria económica anual. La memoria anual de actividades y los estados financieros con su correspondiente informe de auditoría serán accesibles a través de la web.

5.- Principio de Transparencia en la Financiación.Para mejorar el clima de confianza es importante que se conozcan los medios a

través de los cuales se financia la ONG y qué entidades, públicas o privadas, están apor-tando fondos a sus actividades. Igualmente, es esencial que la ONG respete la identidad de los donantes individuales, ajustándose a lo que establece la Ley de Protección de datos vigente.

En la relación con empresas y entidades privadas resulta fundamental que la ONG cuente con criterios de selección de colaboradores aprobados por su órgano de gobier-no y que sean públicas las condiciones en las que cede el uso de su imagen.

ALas actividades de captación de fondos privados y públicos, su coste y su recaudaci-

ón anual (donaciones, socios y otras colaboraciones) serán públicos.

bSerán públicos los fondos recaudados con detalle de los principales financiadores,

tanto públicos como privados, y las cantidades aportadas por los mismos.

CSerá conocida la imputación de los fondos recaudados a la actividad de cada año,debidamente documentada.

DEn caso de solicitar datos personales, la organización incluirá en sus soportes de

recogida de datos la información pertinente según la legislación vigente en materia de datos personales. La organización tendrá registrados sus archivos de socios y donantes particulares en la Agencia de Protección de datos.

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EExistirán criterios de selección de empresas y entidades colaboradoras aprobados

por el órgano de gobierno.

FLos acuerdos de cesión del logotipo de la entidad a empresas e instituciones deberán

estar formalizados por escrito. Las cláusulas de cesión del logotipo no serán confiden-ciales.

6.- Principio de Pluralidad en la Financiación.resulta necesario que la ONG cuente con fuentes de financiación diversificadas, que

aseguren la independencia de la organización en la toma de decisiones, sin estar sujetas a las directrices que pueda marcar su principal financiador. una financiación diversifica-da asegura la estabilidad y la continuidad de la ONG en el caso de que alguna de estas fuentes de financiación desaparezca. También, es importante que la ONG cuente con un mínimo de financiación privada, que refleje el respaldo de la sociedad y le permita cubrir unos mínimos gastos de estructura para la gestión de la organización.

ALa organización deberá diversificar su financiación con fondos públicos y privados.

En ningún caso los ingresos privados serán inferiores al 10% de los ingresos totales.

BLa organización contará con una variedad de financiadores externos que favorezca

la continuidad de su actividad. Ninguno de ellos aportará más del 50% de los ingresos totales de la organización de forma continuada durante los dos últimos años.

7.- Principio de Control en la Utilización de Fondos.Para mejorar la confianza es importante conocer el destino de los fondos de la ONG,

concretamente cuánto se destina a proyectos, cuánto se gasta en la dirección y gestión de la ONG y cuánto en actividades de captación de fondos. Contar con una política de aprobación de gastos y con criterios de selección de proveedores aprobados por el órgano de gobierno de la entidad contribuirá al control del uso de los fondos.

La ONG debe elaborar un presupuesto de ingresos y gastos, ya que ésta es una herramienta de gestión fundamental y ayuda a que la planificación de actividades sea coherente con los recursos existentes. La posterior liquidación del presupuesto es de gran ayuda para detectar posibles desviaciones y analizar sus motivos.

Las inversiones financieras deben ajustarse a la política de inversión aprobada por el órgano de gobierno, ser prudentes y evitar poner en peligro los ingresos de la ONG.

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En cuanto a la participación en sociedades no cotizadas, la organización deberá demos-trar que dicha participación contribuye de forma directa a la consecución de su misión, como por ejemplo la integración laboral de personas con discapacidad en el caso de las organizaciones que atienden a este colectivo y que han creado centros especiales de empleo.

En el caso de solicitar fondos para un fin concreto (emergencias, proyectos, progra-mas de apadrinamiento, etc.) la ONG debe asegurar que esos fondos se han destinado al fin para el que fueron solicitados.

ASerá conocida la distribución de los gastos de funcionamiento agrupados en las ca-

tegorías de Captación de Fondos, Programas-Actividad y Gestión-Administración. Será además conocido el destino de los fondos desglosado por cada proyecto y línea de actividad de la organización.

BExistirá un detalle de los principales proveedores y co-organizadores de la actividad.

La organización contará con una Política de Aprobación de Gastos, así como criterios de selección de proveedores aprobados por el órgano de gobierno.

CLa organización deberá preparar un presupuesto anual para el año siguiente con la

correspondiente memoria explicativa y practicar la liquidación del presupuesto de in-gresos y gastos del año anterior. El presupuesto y la liquidación estarán aprobados por el órgano de gobierno y serán públicos.

DLa organización no contará con recursos disponibles excesivos en los dos últimos

años.

ELa organización no presentará una estructura financiera desequilibrada de forma

continuada en los últimos tres años.

FLas inversiones deberán cumplir unos requisitos de prudencia razonable.

G

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En el caso de contar con inversiones financieras, la organización contará con unas normas de inversión aprobadas por el órgano de gobierno.

HLas inversiones en sociedades no cotizadas estarán relacionadas y ayudarán directa-

mente a la consecución del fin social.

ILa organización respetará la voluntad de los donantes y se establecerán sistemas de

seguimiento de fondos dirigidos. Los fondos procedentes de apadrinamiento se consi-derarán fondos dirigidos.

8.- Principio de Presentación de las Cuentas Anuales y Cumplimiento de las Obligaciones Legales.

Las organizaciones no lucrativas tienen la obligación de rendir cuentas anualmente ante la Administración Pública. La ONG debe presentar sus cuentas anuales y memoria de actividades ante su registro o protectorado correspondiente. Las cuentas anuales, que se deben elaborar conforme al Plan General Contable de Entidades sin Fines Lucrati-vos, han de ser aprobados por el órgano de gobierno de la ONG. El hecho de someter las cuentas anuales a una auditoría externa permite que éstas sean verificadas por un experto independiente.

También es fundamental que la ONG esté al corriente de sus obligaciones fiscales ante la Administración Tributaria y la Seguridad Social.

ALa organización acreditará el cumplimiento de las obligaciones legales ante la Ad-

ministración Tributaria, Seguridad Social y Protectorado o registro correspondiente.

BLa organización elaborará las cuentas anuales de acuerdo con el Plan General de

Contabilidad de Entidades sin Fines Lucrativos que serán sometidas a auditoría externa y aprobadas por la Asamblea General o el Patronato.

9.- Principio de Promoción del Voluntariado.uno de los principales indicadores del impacto social de una ONG es el número

de voluntarios con los que cuenta. Son personas que viven el día a día de la organizaci-ón y son los mejor posicionados para garantizar que las aportaciones altruistas que se realizan tanto de dinero como de tiempo, son invertidas en el fin social. Suponen, por ello, un control y una crítica positiva interna. Para que los voluntarios estén plenamente

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A Sociedade Civil e as Políticas Públicas em São Tomé e Príncipe

integrados en la organización es necesario que la ONG cuente con un plan concreto de actividades a desarrollar por los mismos, así como un plan de formación a disposición de los voluntarios para que éstos puedan llevar a cabo sus actividades con diligencia.

También resulta fundamental contratar un seguro que cubra el riesgo de la participa-ción de los voluntarios en las actividades de la ONG.

ALa organización promoverá la participación de voluntarios en sus actividades.

BEstarán definidas aquellas actividades que están abiertas a ser desarrolladas por vo-

luntarios. El documento en el que se recojan dichas actividades será público.

CSe contará con un plan de formación acorde con las actividades designadas, a dispo-

sición de los voluntarios.

DLos voluntarios estarán asegurados de acuerdo al riesgo de la actividad que desar-

rollan.

Fonte: http://www.guiatransparenciaong.org

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A TRANSPARêNCIA COMO CAMINHOPARA A RESPONSABILIzAçãO1

Marina Costa Lobo / Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa

Talvez a questão da transparência nunca tenha estado tanto na ordem do dia. A 7 de dezembro de 2010, Julian Assange, fundador do Wikileaks entregou-se à polícia britânica. A caça ao homem tinha começado dias antes, quando aquele site deu início à divulgação de centenas de milhares de telegramas confidenciais enviados pelos servi-ços diplomáticos americanos colocados em todo o mundo. Assange diz que luta para obrigar os governos à transparência. desde 2006, a Wikileaks já publicou documentos denunciando abusos de poder por parte de autoridades em todo o mundo. Mas foi em 2010 que este site realmente saltou para a ribalta. Em parceria com cinco dos mais conceituados jornais do mundo (Der Spiegel, The New York Times, Le Monde, The Guardian e o El Pais) deu início à divulgação dos telegramas confidenciais do corpo diplomático americano, desencadeando um enorme debate mundial sobre o alcance e os limites da transparência no trabalho governamental.

Em que medida é que as acções do governo e de todo o Estado devem poder ser escrutinadas pelo público? Essa informação deve ser disponibilizada mesmo que ponha em causa a segurança das pessoas? E para que serve a informação dada ao público? Que consequências tem essa informação para a relação entre representantes e eleitores? Este episódio serve para ilustrar as dificuldades não apenas em definir os limites da transparência como em transformar o objectivo da transparência num bem público, ou numa mais-valia para a vida política. Este último objectivo parece-me particularmente importante, e é relevante para este conjunto de estudos. A transparência não deve ser um fim em si mesma, mas deve antes contribuir para a alteração de comportamentos e para a melhoria nas relações entre cidadãos e representantes, entre parceiros internacio-nais, ou entre ONG.

Para que isso aconteça, é fundamental cumprir alguns requisitos de base. Em pri-meiro lugar, é preciso que transparência não seja equacionada com o dumping de in-formação. Muitos governos, e instituições em geral, já entenderam que a simples dispo-nibilização de informação, sobretudo se for feita em grandes quantidades, pode servir mais para confundir do que iluminar. Aliás, até certo ponto, o próprio caso do Wikileaks ilustra este ponto, na medida em que os documentos tinham de ser trabalhados por equipas de jornalistas para trazer à luz o sentido da informação contida. A internet potenciou muitíssimo a disponibilização de informação. Mas ao mesmo tempo, nunca foi tão necessário a existência de filtros para a compreensão dessa realidade que temos ao alcance de um click.

1 Texto originalmente publicado no boletim Melhor Cooperação, Melhor Desenvolvimento #Janeiro 2011 (ed. ACEP)

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Um exemploParticipei na elaboração de um índice de transparência do processo orçamental em

Portugal. Este é um dos casos em que, na maioria das vezes a informação – em bruto – está disponível. Qualquer um pode consultar o site da direcção Geral do Orçamento e ter acesso a relatórios, propostas, e leis orçamentais. No entanto, é extremamente difícil para um cidadão comum, ou mesmo para um deputado comum, extrair conhecimento relevante sobre o estado das finanças públicas a partir destes documentos. Isto porque os esforços de transparência no sentido de divulgação dos objectivos de políticas para cada ministério, ou não são realizados de forma explícita, ou a informação relevante está dispersa por variadíssimas secções e, quem não souber juntar as peças, fica totalmente ignorante. Isto sem se poder dizer que a informação não está lá. Portanto, uma das funções mais importantes daqueles que se preocupam com transparência é a exigência, junto das instituições e autoridades, que não camuflem a transparência com informação. é preciso comunicar para expor com transparência. Por vezes, o objectivo mais quan-titativo da informação, objectivo a que as autoridades e todas as instituições estão mais sensíveis nesta época da internet, pode até servir para mascarar falta de transparência.

Em segundo lugar, é preciso compreender que embora a comunicação seja funda-mental, este não deve ser por si só o principal objectivo. Para que a transparência seja útil para o sistema político, e para as sociedades em geral, é preciso que esta seja empre-gue na promoção da responsabilização política, isto é da accountability. Cada vez mais, os eleitores e os cidadãos em geral têm níveis educacionais mais elevados, e têm mais conhecimento - devido ao acesso facilitado a informação - sobre a forma como as ins-tituições e as entidades com fins públicos tomam decisões e agem. Esta transformação ao nível do eleitorado gera exigências sobre as instituições. Enquanto anteriormente era possível que uma instituição se assumisse enquanto legítima simplesmente por tradição, por hábito, ou por circunstâncias históricas, essa legitimidade “enquanto dado adquiri-do” é cada vez mais rara.

hoje em dia, a legitimidade depende em parte dos resultados das acções institucio-nais, e em parte da racionalidade com que as acções são desempenhadas. E para que essas acções sejam aceites, têm de ser conhecidas e compreendidas pelos cidadãos. é neste âmbito que têm vindo a ser feitos grandes esforços na área da cooperação, para melhorar a legitimidade das acções de todos aqueles que trabalham nesta área, sejam go-vernos, sejam ONG. Neste domínio, a transparência tem sido entendida de forma lata, nomeadamente na definição de objectivos, motivações e fins, na criação das relações entre parceiros, e na partilha de informação sobre meios e resultados. Essa transparên-cia não só servirá para reforçar a legitimidade dos parceiros envolvidos, como também poderá contribuir para maior igualdade entre doadores, e receptores na cooperação para o desenvolvimento.

Como foi referido anteriormente, a promoção e a efectiva aplicação do conceito transforma a transparência num bem público e é o único caminho possível para a reno-vação de relações de igualdade e legitimidade para todos aqueles que estão envolvidos no processo de Cooperação e desenvolvimento.

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UMA INTRODUçãO ÀS ACçõES DE ADVOCACIA1

Implementar um programa de advocacia significa tomar medidas para provocar a mudança. As acções de advocacia decorrem por isso num contexto específico e têm um objectivo em concreto.

As acções de advocacia podem estar direccionadas para a mudança de políticas ou de práticas nacionais ou internacionais. Mas podem também realizar-se ao nível local, possibilitando a capacitação de cidadãos e comunidades locais a agir para a mudança.

uma estratégia abrangente de advocacia que procure alcançar uma mudança de fun-do – como por exemplo o melhoramento do sistema de abastecimento de água e sa-neamento – requer necessariamente acções de advocacia coordenadas ao nível local, regional, nacional e internacional.

Implica também um entendimento claro da capacidade de influenciar politicamente o alvo das acções de advocacia.

Este documento visa clarificar os diferentes contextos políticos nos quais o trabalho de advocacia decorre e irá ilustrar de que forma os contextos se influenciam mutua-mente.

O que irá aprender neste documento- A ideia de ‘governação’ como alvo das acções de advocacia- Como as questões de política e de poder são transferidas para a governação e quais as implicações

para o trabalho de advocacia- Como evoluem as políticas e como é que as acções de advocacia podem influência o processo- As acções de advocacia no sector do desenvolvimento precisam muitas vezes de ser direccionadas

para diferentes contextos em simultâneo

Governo e governaçãoAs acções de advocacia visam mudar as políticas, são por isso dirigidas às entidades,

instituições ou indivíduos, que são responsáveis pela elaboração, decisão e implemen-tação de políticas.

Quem tem poder? Como são tomadas as decisões? Quem tem influência e que estru-turas existem para que possa fazer valer a sua capacidade de influência?

“Governo” é o acto ou o processo de governar; em particular é o processo de fazer, decidir, implementar, controlar e administrar políticas públicas dentro de uma unidade política, como o Estado-nação ou uma parte dele, por exemplo um município. A palavra “governo” também descreve um grupo de indivíduos a quem foi dada a autoridade e responsabilidade de governar um estado, designadamente através de:

- Poder executivo: a parte do governo responsável pela gestão corrente dos assun-

1 Traduzido e adaptado por ACEP a partir de WaterAid (2007), “The Advocacy Sourcebook”, London

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tos do estado/ município e que também implementa as leis- Poder legislativo: a parte do governo que decide que leis e políticas o executivo

deve implementar- Poder judiciário: a parte do governo que é responsável pela interpretação e apli-

cação da lei

Esta separação é muito útil para as organizações determinarem a quem a suas acções de advocacia devem ser dirigidas.

No entanto, quando analisamos a forma como o poder é exercido, estamos a falar de “governação”. Com vista a realizar um trabalho efectivo de advocacia, é importante clarificar o ambiente político no qual está a trabalhar. Como é que o país ou o distrito é gerido? Quais são as tradições e os processos que influenciam a tomada de decisão? Como é que os cidadãos são envolvidos no exercício do poder? Os decisores políticos prestam contas? As respostas a este tipo de perguntas irão ajudar a analisar o estado da governação.

Ideia-chave: GovernaçãoGovernação, de acordo com o Programa das Nações unidas para o desenvolvimento (PNud), é

“o exercício da autoridade económica, política e administrativa para gerir os assuntos de um país a todos os níveis. Governação abrange os complexos mecanismos, processos e instituições, através dos quais os cidadãos e os seus grupos articulam os seus interesses, exercem os seus direitos legais, cumprem as suas obrigações e medeiam as suas diferenças”. in uNdP (2001): Governance for Sustainable human development: A uNdP Policy document

O PNud acrescenta que governação transcende o governo e inclui a sociedade civil e o sector privado. A “boa governação” tem como características a prestação de contas e a transparência, é eficaz, equitativa e promove o Estado de direito.

O problema da política e do poderClaro que governação e governo não ocorrem no vazio. Toma forma através de

grupos e pessoas, cada qual com uma agenda política e pessoal própria, que são influen-ciados de forma diferente e que têm níveis diferentes de poder.

A governação é necessariamente influenciada pela política e pelo poder.Em consequência, a governação nem sempre segue um caminho racional. Conse-

guir um sistema de abastecimento de água e saneamento num determinado distrito, por exemplo, pode não ser o resultado de uma sua necessidade, das políticas em curso ou de como o orçamento foi planeado. Muitas vezes deve-se aos caprichos de um decisor político que pode simplesmente querer responder às necessidades de um determinado grupo ou influência.

A política tem a ver com o modo como, numa sociedade, os actores – indivíduos, empresários, sociedade civil e outros – se organizam para aumentar o seu poder de in-fluência, visto procurarem promover ou proteger interesses concretos.

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Para combater as razões pelas quais milhões de pessoas carecem do acesso ao abas-tecimento de água e ao saneamento, é necessária uma compreensão do contexto politico e económico no qual se decidem as políticas de abastecimento de água e de saneamento, bem como das relações de poder envolvidas.

O mesmo princípio é verdade quer ao nível nacional quer ao nível internacional, ou até ao nível local ou comunitário. Para que as suas acções de advocacia sejam efectivas, as ONG precisam de entender as relações de poder e a política a cada nível. (E precisam evitar serem influenciadas por um partido ou grupo em particular, para não enviesar o seu trabalho.)

Na prática: Quem tem o poder no domínio do abastecimento de água e saneamento?uma análise das relações de poder no sector do abastecimento de água e saneamento pode ajudá-lo

a examinar relações do mesmo tipo noutros campos. Estes são exemplos de algumas perguntas que pode colocar.

- Quem são as pessoas que não têm acesso aos serviços de abastecimento de água e saneamento?- Quem tem o poder de tomar decisões acerca de quem tem ou não acesso?- Quem ganha com essas decisões e qual o seu poder de influência sobre os decisores políticos?- Quem é responsável por elaborar e decidir a política para o sector?- Quem e como influencia os decisores políticos?- Que interesses têm os decisores políticos em consentir ou recusar o acesso serviços de abasteci-

mento de água e saneamento?- Em que ambientes trabalham os decisores políticos; quais são os desafios e as barreiras que enfren-

tam na tomada de decisão acerca do acesso a serviços de abastecimento de água e saneamento?- Quem decide sobre os níveis de financiamento público para estes serviços?- Como é que o financiamento é atribuído e distribuído?

Consoante a importância de uma determinada questão para o governo e outros gru-pos alvo das acções de advocacia, uma ONG pode achar relativamente fácil ou muito difícil conseguir uma mudança política.

Espaços para a participação da sociedade civilEspaços fechados: Alguns espaços de tomada de decisão estão fechados no sentido

em que as decisões são tomadas, à porta fechada, por um conjunto de actores designa-dos, tais como os representantes eleitos e os peritos, sem qualquer possibilidade de uma consulta alargada.

Espaços convidados: Como são feitos esforços para ampliar a participação, novos espaços se abrem aos quais nos podemos referir como ‘espaços convidados’, onde as pessoas (utilizadores, cidadãos ou beneficiários) são convidados a participar por dife-rentes tipos de autoridades, como o governo, as agências supranacionais ou as organiza-ções não-governamentais. Os espaços convidados podem ser regularizados ou momen-tâneos, como um fórum anual ou uma consulta única sobre um assunto.

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Espaços criados ou reivindicados: Estes são espaços criados ou reivindicados pelos cidadãos independentemente do governo ou conjunto com o governo. Podem emergir de um conjunto de preocupações comuns e podem vir a surgir como resultado da mobilização popular, ou podem consistir em espaços nos quais pessoas que parti-lham uma mesma opinião se juntam em torno de actividades comuns.

Ocasionalmente, o envolvimento em debates podem consentir às ONG um “lugar à mesa”, do qual pode tentar influenciar as políticas. Compreender estas relações de po-der pode ajudar uma ONG a determinar a sua estratégia e evitar que esta seja cooptada involuntariamente pelas metas das acções de advocacia.

Em muitos casos, é a implementação de uma determinada política que constitui o problema e não a política em si mesma. Nestas situações, a pesquisa deve focar-se nos bloqueios à implementação. Por exemplo, uma política de governo pode ditar que deve haver um determinado nível de saneamento por habitante no país, mas vereadores lo-cais corruptos podem ter impedido a implementação desta política. Neste exemplo, um programa de advocacia dirigido a decisores políticos ao nível nacional é descabido. Ig-nora a raiz do problema, ao passo que uma acção de lobby no sentido de um município mais transparente e responsável pode ser mais eficiente.

Como evolui a política?Quando um governo reconhece existir um problema público e concorda fazer algu-

ma coisa para o resolver, os decisores políticos procuram soluções práticas sob forma de políticas.

é importante que as ONG e as organizações comunitárias percebem claramente quais as diferentes etapas da elaboração de políticas no seu país ou contexto. Irá ajudá-las a garantir que as suas actividades de advocacia estão direccionadas para as fases mais críticas do processo de tomada de decisão – não é suficiente apresentar evidências aos decisores políticos e assumir que o resto se fará por si só.

Ideia-chave: Políticas PúblicasAs políticas públicas podem ser descritas como “o decurso de uma acção” tomada pelo governo ou

um decisor político e que, a maior parte das vezes, resulta “em planos e acções” e efeitos “no terreno” – ou na falta deles.

Alguns exemplos de políticas públicas:- uma expressão de intenção, geralmente feita por um político, para encorajar o desenvolvimento

económico, por exemplo- um conjunto de propostas detalhando a forma como um governo tenciona abordar uma série

de questões num mesmo programa. Por exemplo, os documentos Estratégicos de Combate à Pobreza- uma resposta formal do governo a uma preocupação pública concreta. Por exemplo, a erradicação

da cólera- um documento com orientações num determinado sector. Por exemplo, política agrária- um orçamento do governo local ou nacional

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O processo de decisão política, qualquer seja o contexto de governação no qual ocorra, é complexo. Inúmeras fases sobrepõem-se e dentro de cada uma existem mui-tos subníveis. é raramente um processo sistemático ou até racional. Está muitas vezes sujeito a pressões, poderes e politicas como as que foram descritas acima. Pode envolver diferentes grupos que apresentam alternativas concorrentes. Por vezes, o processo de tomada de decisão pode seguir o seu curso sem os decisores terem um conhecimento claro sobre o problema ou que são as pessoas afectadas.

Rápido e útil: Exemplos de fases do processo de decisão política- definição da agenda- Formulação de políticas- Tomada de decisão- Implementação- Monitoria- Avaliação- Ajustamento- revisão

As análises teóricas dos processos de decisão política identificam duas categorias-chave de actores:

_Comunidade política. Inclui pessoas e instituições envolvidas na formulação de políticas. Envolve actores que estão interessados em formular uma análise ou alternati-vas de políticas.

A comunidade política é onde se situa o conhecimento sobre uma determinada polí-tica. Por exemplo, no sector da água e saneamento, a comunidade política pode envolver indivíduos e agências do governo responsáveis pelo sector, bem como ONG, consulto-res, investigadores e grupos de reflexão ligados ao sector.

_Rede política. é um subgrupo de actores saído da comunidade política. Traba-lham em conjunto ou interagem regularmente para alcançar mudanças específicas.

A rede política pode ser descrita como o lugar onde as acções relacionadas com a mudança política ocorrem. A rede política que procura trazer mudanças pode incluir ONG a outras organizações da sociedade civil, seus aliados no seio da comunidade de doadores e até departamentos governamentais.

Prestação de contas e legitimidadeAs ONG prestam contas aos seus financiadores, ao conselho de administração e

aos seus apoiantes e membros, alguns dos quais podem não ser a favor de actividades de advocacia. Preocupações quanto à sua opinião podem influenciar a posição que uma ONG toma sobre uma determinada questão política. iv

Em resposta ao crescente envolvimento das ONG em actividades de advocacia,

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algumas vozes críticas têm levantado questões sobre a legitimidade. é uma questão particularmente viva quando as ONG de países ditos desenvolvidos realizam acções de advocacia em nome dos povos dos países ditos em desenvolvimento; existe o risco que quem implementa as acções de advocacia faça reivindicações em nome de outros que não podem ser fundamentadas.

uma crescente proximidade entre as ONG e os doadores proporciona mais opor-tunidades de influência, pode todavia constituir também uma “faca de dois gumes” das quais as ONG têm de estar conscientes e saber atenuar. Os doadores podem, por sua vez, influenciar (quer explicita ou implicitamente) a agenda política das ONG. v

A fim de serem eficazes nas actividades de advocacia, as ONG precisam de definir de forma clara os pressupostos por detrás de cada posição política que tomam, junta-mente com a pesquisa e os indicadores em que se apoiam. Esta informação tem de estar disponível a todas as partes interessadas (stakeholders), sejam elas apoiantes internos ou externos da ONG.

Na prática: Como é que a organização WaterAid consegue legitimidade- WaterAid trabalha com organizações parceiras locais na implementação de projectos integrados de

água, saneamento e higiene em comunidades que não têm acesso.- WaterAid desenvolve boas práticas na prestação de serviços, juntamente com as suas organizações

parceiras, que são mostradas e promovidas junto de outros, nomeadamente outras ONG, financiadores, entidades governamentais locais e nacionais.

- A experiência directa de prestação de serviços e de trabalho com outros prestadores de serviço do sector permite melhor compreender os desafios que se colocam.

- WaterAid desenvolve trabalho de pesquisa e de análise no sentido de perceber o contexto mais amplo do sector da água e saneamento, as causas dos problemas e possíveis soluções. Trabalha com vista a implementar alterações nas políticas existentes que são prejudiciais para as populações pobres e tem como objectivo o acesso universal à água e saneamento.

- WaterAid interage com actores ligados à água e saneamento ao nível local, nacional e internacional com vista a aumentar e partilhar o conhecimento sobre boas práticas, e defender soluções em conjunto.

Relacionando acções de advocacia ao nível local, nacional e internacionalAs acções de advocacia podem ser direccionadas para alvos diferentes, consoante

o contexto. No sector do desenvolvimento, a maior parte das vezes, será necessário direccionar as acções para diferentes actores em simultâneo – ao nível local, nacional e internacional. Acções de advocacia eficazes exigem uma boa comunicação entre os actores que operam a esses diferentes níveis. Afinal as causas dos problemas de desen-volvimento que as acções de advocacia procuram resolver são complexas e estão inter-ligadas a cada um desses níveis.

_Do local ao nacional. Quando projetos locais requerem acções de advocacia, o alvo dessas acções será frequentemente ao nível nacional. Por exemplo, um projecto local para instalar bombas de água pode depender de acções de advocacia ao nível nacional para que sejam canalizados fundos que possam assegurar o projecto. uma

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questão como esta, que é relevante ao nível nacional não pode ser abordada apenas ao nível local.

Muitas acções nacionais de advocacia surgem inicialmente ao nível local onde o seu impacto é sentido. Passar do nível local ao nível nacional contribuir para que funcioná-rios e políticos respondam às prioridades das comunidades mais pobres.

_Do nacional ao local. Por vezes as açcões de advocacia podem emergir apenas ao nível nacional, por exemplo, o desenvolvimento de uma estratégia nacional de sane-amento. Essas “janelas políticas” oferecem uma oportunidade para realçar o impacto de tais políticas têm nas comunidades locais e para trazer vozes locais para o primeiro plano.

_Do internacional ao nacional. Estes processos inter-relacionados também são replicáveis ao nível nacional e internacional. Por exemplo, uma ONG nacional pode querer responder a um assunto de ordem internacional, como são as condições associa-das à concessão de empréstimos por parte do banco Mundial. Entretanto a ONG pode desenvolver acções de advocacia ao nível internacional relacionadas com questões que afectam a agenda política nacional, por exemplo, como é que os empréstimos concedi-dos pelo banco Mundial são utilizados no país.

de facto, quando questões globais são abordadas em simultâneo ao nível nacional e internacional, uma resposta muito mais forte pode ser dada. um exemplo disso é a campanha global para o alívio da dívida. um poder semelhante existe quando acções nacionais e internacionais de advocacia se realizam em torno de um problema comum.

_Do nacional ao nacional. Também podem ser desenvolvidas acções com diferen-tes redes nacionais com vista a defender uma questão específica. Ou podem ser desen-volvidas um conjunto de actividades de advocacia entre países diferentes ou mesmo ao nível regional, por exemplo Africa Ocidental.

Este processo de coordenação e inter-relação com outras redes aos mais diversos ní-veis é importante. Não só aumenta a legitimidade e a relevância das acções de advocacia, como possibilita apoios cruciais entre os diferentes níveis e redes. As organizações que desenvolvem acções de advocacia ao nível nacional dependem da informação detalhada que lhes chega das bases para sustentar essas acções. As organizações nacionais podem, por sua vez, proporcionar apoio, formação e informação às organizações locais.

Na prática: Acções de advocacia da WaterAid a múltiplos níveisEstes são exemplos de acções de advocacia levados a cabo pela WaterAid a múltiplos níveis:- Investigação conjunta sobre questões que interessam tanto às populações dos países do Norte

como às populações dos países do Sul, como a participação do sector privado no sector da água e sa-neamento

- Acções coordenadas em torno de objectivos comuns – trabalhar com governos (dos países do Norte e do Sul) para conseguir colocar na agenda das cimeiras internacionais as questões da água e saneamento

- Preparação conjunta para conferências internacionais onde se tomam medidas politicas

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DESENVOLVIMENTO, ONGS E SOCIEDADE CIVILEditado por Deborah Eade e apresentado por Jenny Pearce

PrefácioO desenvolvimento, no sentido de um corpo de pensamento e prática sobre por

que a pobreza existe e persiste e sobre como erradica-la, tem uma história relativamente recente. diz-se que a era do desenvolvimento foi lançada pelo Presidente Truman em 1949 e é verdade que a maioria das agencias especializadas da ONu foram estabelecidas nessa época. (1) As ONG’s do desenvolvimento, por tanto, são muito mais recentes embora muitos dos nomes que hoje são familiares – Save the Children Fund, CArE, Oxfam – começaram como agencias de assistência ou de ajuda em emergências e, ou se ‘converteram’ ao desenvolvimento nas décadas de 60 e 70 ou, pelo menos, o des-cobriram. Milhares surgiram à medida que a industria do desenvolvimento realmente decolava. A medida em que se começou a entender melhor que as causas da pobreza e a vulnerabilidade eram estruturais e não ‘naturais’, as ONG’s começaram a entender que o desenvolvimento era a melhor forma de prevenção de desastres e que uma resposta ‘desenvolvimentista’ era mais apropriada em emergências que uma proeza. Natural-mente, uma grande variedade de enfoques e atividades foram – e ainda são – colocadas dentro do pacote da categoria ‘desenvolvimento’ que cobre tudo e qualquer coisa, desde a construção de latrinas e esgotos, até o apoio a programas educativos de sindicatos e trabalhos pelos direitos humanos. Mas, seja que as ONG’s assumissem um enfoque de ‘necessidades básicas’ ou de ‘mudança estrutural’, havia um amplo consenso quanto a que, para erradicar a obstinada pobreza, era necessário algo mais e bastante diferente, do que a ajuda humanitária. Em contraste, a sociedade civil tem uma história de séculos no pensamento político de Ocidente que data dos filósofos da antiga Grécia e que hoje está viva e goza de boa saúde – apesar de que é cada vez mais obvio que é um termo bas-tante ‘folgado’. Como alguns dos seus predecessores na linguagem desenvolvimentista – ‘comunidade’, ‘participação’, ‘desenvolvimento de baixo para cima’ – invoca-se mais freqüentemente para dar um brilho benigno do que para iluminar o debate ou a prática.

Por que estas três categorias – desenvolvimento, sociedade civil e ONG’s – che-garam a ser vistas não só como categorias que se reforçam mutuamente, mas como termos superpostos ou quase sinônimos? Porque, lendo certa literatura da política de ajuda dos anos 90, e a julgar pelos recentes padrões de concessão de fundos das maio-res agencias doadoras, poderia se perdoar pensar que sociedade civil é igual a ONG’s e que as ONG’s são uma parte essencial não somente da ‘entrega’ da ajuda para o de-senvolvimento, mas da entrega do desenvolvimento mesmo. Em outras palavras, que o desenvolvimento depende das ONG’s. Como foi fabricado este mito?

Existem vários elementos diferentes que podem fazer parte da explicação.Em primeiro lugar, o projeto neoliberal – como expressado através do ajuste estru-

tural no Sul e promovido pelos seus ideólogos e lideranças políticas no Norte (ronald

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reagan e Margaret Thacher foram os mais notáveis) – requer um controle sobre os gas-tos do estado, uma redução a níveis anteriores às inversões no setor social. Em teoria, um mercado sem restrições forneceria serviços mais eficientes e criaria trabalhos que gerariam a riqueza necessária para sustenta-los. Como agências privadas voluntárias, as ONG’s podiam ocupar esse novo espaço confortavelmente, principalmente, por exem-plo, no que se refere à participação em projetos de redes de segurança e fundos de inves-timento social que, supostamente, aliviariam os efeitos imediatos do ajuste estrutural. Por tanto, as ONG’s foram estimuladas a se apresentarem como os canais apropriados para ajudar os mais pobres, aqueles em perigo de cair pelos buracos da rede ou aqueles que a rede nunca protegeu nem foi chamada a proteger. Muitas ONG’s que antigamente se orgulhavam da pouca ajuda financeira que aceitavam do governo começaram a au-mentar os seus limites auto-impostos na medida em que o dinheiro entrava.

Segundo, a ruptura do bloco soviético, que culminou com o colapso do muro de berlim em 1989, foi associado com – e para alguns observadores atribuído a – o surgi-mento de organizações populares através das quais articulava-se poderosamente a opo-sição ao sistema político prevalecente. Estas incluíam grupos eclesiásticos, sindicatos, corpos profissionais e, também, o nascente setor de ONG’s. A idéia de organizações autônomas da sociedade civil que obrigassem o governo a prestar contas e, que ao mes-mo tempo impulsionassem uma agenda democrática, atraia observadores de diferentes pontos do espectro político – tanto pragmáticos quanto românticos – mas a abertura das economias centralizadas na Europa Oriental coincidiu também, claramente, com os avanços da agenda neoliberal que já estava a caminho tanto na América do Norte quanto na Europa Ocidental e em grande parte do Sul.

Terceiro, na América Latina existe uma longa tradição de organização social como forma de resistência a ditaduras militares no Continente, especialmente porque o es-paço político para o diálogo foi fechado. As ONG’s jogaram um papel vital em países como o brasil e o Chile servindo, muitas vezes, para manter o pouco espaço que po-deria existir para o debate ou para aferrar-se a uma visão alternativa da sociedade. Na América Central, as prolongadas guerras civis, que envolveram a maior parte da região na década de 80, estavam militarmente num ponto morto no final da década. Com os Estados unidos e a uE voltados para a Europa Oriental, o fio dos fundos estava a ponto de ser desligado e a ajuda externa começou a ir pelo ralo: o apoio dos Estados unidos aos contra na Nicarágua e ao governo e aos militares em El Salvador, estava-se tornando cada vez mais difícil de justificar diante do eleitorado doméstico em termos da ‘crescente onda do comunismo’, e o prolongado apoio da uE a soluções políticas para as guerras estava começando a declinar. E, o assim chamado colapso do socialismo teve claras repercussões no tipo de futuro que os movimentos de esquerda e centro esquerda da América Central podiam visualizar. O momento de gloria do vanguardis-mo tinha passado, definitivamente. A medida em que a possibilidade de algum tipo de processo de paz ia tomando forma, as ONG’s e os ´think-tanks´ alternativos viraram-se para Antonio Gramsci – um dos mais influentes pensadores da sociedade civil – mais do que para o Che Guevara, para pensar como poderiam ajudar na construção do novo

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Estado, ao mesmo tempo em que mantinham a sua função independente de cão de guarda e protagonista político. (O mesmo tipo de debate aconteceu depois na África do Sul, quando as ONG’s e os ‘cívicos’ tiveram que redefinir o seu papel no contexto da tomada do poder pelo CNA, o que demandou algumas rápidas mudanças de marcha. (Veja-se, por exemplo, Pieterse 1997).)

Que o aumento do neoliberalismo tenha coincidido com processos profundos (em-bora não já revolucionários) de transição enraizados nas suas próprias sociedades e culturas, pode não ter sido um acidente da história. Prestou-se, porem, tanto à apro-priação – inclusive ao seqüestro – destes processos pela ala ideológica do Consenso de Washington – com o seu foco num bom governo e uma democratização do Sul e do Leste – quanto ao abraço, sem sentido crítico, por doadores e comentaristas políticos, ONG’s incluída, de qualquer coisa que se autodenominasse ‘sociedade civil’. houve um florescimento de noções neo-românticas de comunidades auto-abastecidas e auto-reguladas versus os estados normativos e intrometidos. Inclusive os críticos mordazes do ‘cassino capitalista’, como david C. Korten que defendeu durante muito tempo que o desenvolvimento genuíno deve estar ‘centrado no povo’(2), atribuíram qualidades quase messiânicas às ‘comunidades locais’ autônomas que seriam a única esperança de resistência contra o assalto do capitalismo corporativo. A sociedade civil não podia errar e não existia nada que não pudesse fazer. As ONG’s, pelo seu lado, floresciam como cogumelos e ofereciam-se para ser, tanto o canal para fortalecer a sociedade civil quanto as organizações da sociedade civil em si mesmas – e inclusive, às vezes, parecendo recla-mar o direito divino a representar ou a falar em nome de toda a sociedade civil. O que foi convenientemente deixado de lado foi que tanto as organizações neonazistas quanto as de direitos humanos, as máfias e as organizações de beneficência, os sindicatos e os rompe greves, os grupos pela defesa dos direitos dos animais y os que defendem a caça da raposa, todas fazem parte da sociedade civil. A internet também abriu muitas possibi-lidades para que pessoas com mentalidade parecida formassem ‘comunidades virtuais’ e compartilhassem as suas idéias. Algumas redes da sociedade civil vêem a necessidade de estados mais efetivos, regulamentação de mercado, impostos para as transações finan-ceiras especulativas, etc. Outros vêem a sociedade civil como a única que pode garantir as liberdades individuais sustentando que o socialismo e o estado do bem-estar social podem socavar a família, promover a desintegração social e gerar dependência. Estes diferentes grupos não trabalham de maneira harmoniosa por uma democratização das instituições públicas ou por um bom governo e, muitas vezes, nem mesmo se mostram tolerantes com a idéia da existência dos outros. No melhor dos casos, representam os interesses dos seus membros. uma minoria de ONG’s no mundo fazem, inclusive, isso. é claro, então, que em lugar de ver a sociedade civil e as suas formas organizacionais polifacéticas como uma alternativa coletiva ao estado, vêem que somente um estado aberto e efetivo pode proteger os direitos de todos os seus cidadãos no caso de que sejam pisados por outros.

Como uma subespécie particular da organização da sociedade civil, as ONG’s se definem, como freqüentemente tem sido dito, pelo que não são mais que pelo que são.

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(3) São de todo tipo e tamanho e as agendas e ações de algumas são diametralmente opostas às de outras. Algumas fazem proselitismo como condição para receber bene-fícios dos projetos; outras se concentram num tema ou numa área geográfica; outras são agencias operativas especialistas enquanto que outras só concedem fundos e outras, apoio; algumas se concentram na promoção e defesa em alto nível internacional, outras trabalham em silêncio e sem obstruir ninguém na base. Mas, com muita freqüência, as ONG’s do desenvolvimento estão, de alguma maneira, vinculadas com a transferência de recursos de sociedades que têm de sobra para aquelas que têm pouco e, por tanto, com muita freqüência, dependem da sua capacidade de mobilizar esses recursos de onde moram os contribuintes. é isto, muito mais do que qualquer outra coisa, o que as torna susceptíveis a seguir, ou pelo menos a se acomodar, as agendas e modas estabe-lecidas pelos que fornecem os fundos, sejam doadores oficiais, organizações religiosas, fundações políticas ou de qualquer outro tipo. (4) Em termos da estreita sobrevivência institucional, mobilizar dinheiro torna-se mais importante que mobilizar pessoas.

As tensões entre a ‘industria do desenvolvimento’ e as organizações da sociedade civil, não são necessariamente negativas. Entretanto, como argumenta Jenny Pearce no seu ensaio introdutório, o problema é que estas tensões são freqüentemente ignoradas ou minimizadas dando-se uma boa aparência a sua natureza cambiante. O resultado é que as ONG’s podem adaptar-se com êxito a um mercado mutável para garantir um fluxo continuo de recursos, mas à custa de impulsionar realmente uma mudança social radical ou de representar uma alternativa real ao paradigma dominante (veja Fowler, 2000, para uma boa discussão destes temas). Pior ainda, as ONG’s (tanto do Sul quanto do Norte) podem de fato impedir com as suas ações o funcionamento salutar de orga-nizações da sociedade civil e, até, socavar as funções do estado. Salientando a mistura de estudiosos-ativistas-praticantes que caracteriza a revista desenvolvimento na Prática da qual foram extraídos os que contribuíram neste Compêndio, ela dirige um poderoso chamado às ONG’s para que se envolvam com mais energia e mais vigor em debates teóricos sobre desenvolvimento, para serem mais humildes ao reconhecerem a miríade de outras formas de ação social e para serem o suficientemente valentes para reconhe-cer que, a menos que estejam preparadas para mudar radicalmente a sua maneira de trabalhar, podem não fazer parte da resposta para erradicar a pobreza e a injustiça no século xxI.

(1) As bretton Woods Institutions foram fundadas em 1944 enquanto que a FAO foi estabelecida em 1945, a uNESCO e a uNICEF em 1946 seguidas pela WhO em 1948 e a uNhCr em 1951. A uNdP, porém, hoje uma das maiores fontes de recursos para a cooperação do desenvolvimento, só foi estabelecida em 1965. A mais antiga das agencias da ONu é ILO, que data de 1919. Continua sendo única entre as agencias da ONu pela sua estrutura tripartite, com representação dos governos, os comerciantes (empregadores) e sindicatos (trabalho organizado); em termos atuais, estado, mercado e sociedade civil.

(2) david C. Korten preside o People-Centred development Forum (Foro para o desenvolvimento Centrado nos Povos), é autor de muitos livros, incluindo The Post-

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Corporate World: Life under Capitalism (1999) e When Corporations rule the World (1995).

(3) é interessante que o termo mais antigo, ‘agencia voluntária’, há muito que deixou de ser usado no contexto internacional. Na Grã bretanha, por exemplo, hoje se entende por ‘setor voluntário’, agencias locais ou nacionais freqüentemente sub contratadas pelo governo. Inclusive nos Estados unidos, onde o termo PVO (Organizações Privadas Voluntárias) era de uso corrente até há poucos anos, ONG tem se tornado muito mais comum.

(4) Inclusive a ONu é, por fim, um refém das políticas domésticas dos seus princi-pais doadores: em setembro de 1998, os Estados unidos deviam mais da metade dos uS$2.5 bilhões das suas taxas não pagas, apesar de existirem tratados que obrigam os estados membros. (A dívida morosa de 1998 de uS$ 197 milhões foi paga em novem-bro de 1998 para reter o direito a voto na Assembléia Geral.) O Congresso dos Estados unidos usa a sua influência massiva não somente para insistir em reformas internas den-tro da ONu (incluindo grande número de dispensas), mas para realmente influenciar as políticas de algumas das agencias especializadas. Fundos que já tinham sido prometidos a uNFPA foram detidos com a desculpa de que supostamente apóia a política coercitiva de controle da população na China (uN NGLS 1999: 21).

Referências Fowler, Alan (2000) Civil Society, NGdOs and Social development : Changing the rules of the Game, Geneva 2000 Occasional Papers, Number 1, Geneva : uNrISd. Pieterse, Edgar (1997) ‘South African NGOs and the trials of transition’, development in Practice 7(2): 157-166. uN NGLS (1999) Go between 72, december 1998- January 1999, Geneva: NGLS

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O APOIO DO MASC À PLATAFORMAS DE ORGANIzAçõES DA SOCIEDADE CIVIL

Boletim do Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil, Outubro 2012

O engajamento da Sociedade Civil (SC) na monitoria e advocacia da governação através de fóruns, redes ou plataformas de OSCs, tem demonstrado resultados positivos ao nível da capacidade das OSCs assim como em termos de promover mudanças posi-tivas na implementação de políticas públicas, em resposta às acções de advocacia desen-cadeadas por estas OSCs. As plataformas são uma oportunidade para a união de forças, criação de sinergias em complementaridade de competências entre as OSCs. Perante o governo, as plataformas propiciam às OSCs maior reconhecimento e legitimidade como representantes da SC como um todo.

Na sua estratégia de intervenção, o MASC prioriza o apoio à plataformas de OSCs por considerar que são mecanismos democráticos e flexíveis; espaços onde o investi-mento em recursos e desenvolvimento de capacidades é mais eficiente e; onde o finan-ciamento externo não condiciona a realização dos seus objectivos. Até Agosto de 2012 o MASC financiou 15 projectos através de fóruns e plataformas de OSCs, em todo o país, de entre as quais mais de metade são plataformas distritais1 . Na primeira chamada de propostas do período de extensão lançada em 2012 dos 41 projectos aprovados, 12 são de plataformas ou fóruns de OSCs, dos quais cinco são plataformas distritais.

A Plataforma da Sociedade Civil de Nampula - Um caso de sucesso2

A Plataforma da Sociedade Civil de Nampula é um Caso de Sucesso directamente associado à contribuição do MASC para o fortalecimento das capacidades das OSCs e do seu engajamento na monitoria e advocacia da governação, contribuindo assim para a promoção da boa governação e prestação de contas aos cidadãos. Esta foi estabelecida em 2009, por iniciativa de um grupo de OSCs nacionais e internacionais que operam em Nampula visando responder aos seguintes problemas relacionados com a eficiência e eficácia das intervenções da SC na província: i) Fraca capacidade da SC de monitorar a aplicação dos fundos distritais; ii) Fraca coordenação das OSCS na monitoria e diálogo com o governo; iii) deficientes mecanismos de produção de evidências pelas OSCs para as acções de advocacia; iv) Inexistência de mecanismos/acções coordenadas de advoca-cia; v) um sentimento de que os mecanismos de prestação de contas do governo eram inadequados ou insuficientes.

O apoio do MASC à Plataforma da Sociedade Civil de Nampula iniciou em 2010 e prolongou-se até 2012. O mesmo enquadra-se no âmbito do projecto denominado

1 Para o período de extensão, o apoio às plataformas distritais continua uma das prioridades do MASC, como forma de assegurar o envolvimento das OSCs locais e OCbs na monitoria e advocacia da governação.2 Veja o estudo de caso completo em www.masc.org.mz

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Capacitação da Sociedade Civil para Monitoria da Governação em Nampula, que inclui financiamento para realização de acções de capacitação das OSCs membros da plata-forma e das redes temáticas; estabelecimento e consolidação de redes temáticas ao nível dos distritos; monitoria e advocacia da implementação de políticas públicas e do Plano Estratégico de desenvolvimento da província de Nampula. No âmbito deste apoio foram desenvolvidas as seguintes acções: i) Alocação de recursos humanos para coor-denar e dinamizar as acções da plataforma; ii) Capacitação dos membros da plataforma e das redes temáticas; iii) realização de encontros regulares das redes temáticas; iv) re-alização de estudos de caso3 e visitas regulares de monitoria sobre a implementação dos planos e políticas públicas (produção de evidências); v) Participação nos Observatórios de desenvolvimento (Od) e advocacia.

Resultados e mudançasNo fortalecimento e engajamento da SC na advocacia e Monitoria da GovernaçãoMaior envolvimento das OSCs na monitoria e advocacia da governaçãoAtravés da integração das OSCs em diferentes redes temáticas quer ao nível provin-

cial ou distrital, e da coordenação da participação da SC nos Od ao nível da província, um cada vez maior número de OSCs participa no diálogo com o governo sobre as estra-tégias de desenvolvimento e sobre os processos de governação como um todo. As redes temáticas promovem encontros regulares onde discutem os assuntos que configuram a agenda da SC no diálogo com o governo, o qual é sustentado pelas evidências recolhidas através de estudos de caso e visitas de monitoria realizados pelas redes temáticas.

Melhoria da qualidade de diálogo entre as OSCs e o GovernoA acção da plataforma melhorou a qualidade do diálogo entre a SC e o governo no

processo de governação. um dos factos que sustentam esta melhoria é a submissão de um único relatório para as sessões do Od, o qual reflecte as recomendações do fó-rum de diálogo que integra membros do governo, parceiros de cooperação nacionais e internacionais, OSCs e agentes económicos. Neste processo importa realçar o papel da unidade de Coordenação de desenvolvimento Integrado de Nampula (uCOdIN)4 que articula o diálogo entre o governo, a SC, os parceiros de cooperação e os agentes económicos.

Maior acesso da SC aos centros de tomada de decisão em NampulaA acção conjunta das OSCs através da Plataforma contribuiu para a remoção das

barreiras no acesso aos centros de tomada de decisões ao nível da província, pois pro-

3 Foram realizados pelo menos três estudos: Constituição e Funcionamento dos Conselhos Consultivos; Estudo sobre o uso dos Fundos do AdE; Estudo sobre a implementação do regulamento florestal sobre a sobretaxa das receitais de exploração florestal.4 A uCOdIN reconhece a melhoria da qualidade das intervenções da SC nos Od e o valor agregado da plataforma para esses resultados.

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piciam maior legitimidade da voz da SC perante o governo.Na implementação das políticas públicas e prestação de contas pelo GovernoO trabalho da plataforma e a sua acção coordenada no diálogo com o governo

estão a contribuir para melhor resposta deste às questões levantadas pela SC em torno da implementação de políticas públicas na província. São exemplos disso os seguintes:

O Governo decidiu reforçar a capacidade de fiscalização dos Conselhos de EscolaEm resposta à pressão feita pela SC e às recomendações do estudo sobre o contri-

buto do Fundo de Apoio directo às Escolas no Processo de Ensino–Aprendizagem realizado pela plataforma o governo da província decidiu capacitar os Conselhos de Escola para uma melhor fiscalização da gestão do AdE nos distritos.

Criação de condições para maior acesso das comunidades às receitas da exploração florestal

Esta é uma resposta à advocacia da SC de Nampula com base nas evidências e reco-mendações do estudo sobre a utilização e o acesso da sobretaxa de repovoamento flo-restal, feito pela plataforma no distrito de Mongicual. Na sequência, o governo decidiu abrir contas bancárias comunitárias e adoptar a rotação sistemática dos fiscais florestais, visando maior transparência na gestão dos 15% das receitas de exploração florestal.

reconstituição e estruturação dos Conselhos Locais em NampulaO governo aprovou a proposta da plataforma sobre a reconstituição e Estruturação

dos Conselhos Consultivos e Fóruns Locais a qual foi baseada na experiência anterior da constituição e funcionamento dos Conselhos Consultivos em Nampula. Com o aval do governo, a plataforma liderou o processo que culminou com a constituição de 18 Conselhos Consultivos distritais, 62 Conselhos de Postos Administrativos, 164 Fóruns de localidade e 1000 Fóruns Locais de povoação. Esta experiência encontra-se docu-mentada na reflexão sobre a reconstituição dos Conselhos Locais em Nampula, uma publicação conjunta da plataforma e o governo da província, que pode ser usada como referência em processos similares ao nível do país.

Associa-se igualmente a estes exemplos a resposta às denúncias sobre a má qualidade dos Centros Tecnológicos de Treinamento feitas no Od, assunto que está neste mo-mento a ser objecto de análise pelo governo provincial.

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APOIANDO OS MEDIA NA PROMOçãODA BOA GOVERNAçãO

Boletim do Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil, Dezembro 2011

Os media desempenham um papel importante na promoção da boa governação. No seu desenho, o MASC estabeleceu uma parceria com o Fórum das rádios Comunitárias de Moçambique (FOrCOM) como Agente Facilitador, por reconhecer o papel que as rádios comunitárias desempenham como agentes de mudança, especialmente ao nível local. Cerca de 50 rádios comunitárias membros do FOrCOM beneficiaram de capa-citação oferecida pelo MASC, incluindo trocas de experiências e oportunidades para networking dentro e fora do país. Outras acções para o estreitamento de alianças com os media no âmbito do MASC incluem o desenvolvimento e manutenção de relações com jornalistas e editores dos principais media para encorajar a cobertura de acções sobre governação. Actualmente, o MASC está a financiar cinco projectos implementa-dos por organizações de media nomeadamente as rádios comunitárias de Catandica e GESOM em Manica, o MISA em Cabo delgado, o PANOS e o CAICC/CIuEM ao nível nacional.

Ampliando o CAICC e suas redes para fortalecer a governação. Este é um pro-jecto implementado pelo CAICC/CIuEM com objectivo de empoderar comunidades e OSCs para uma intervenção mais activa no domínio da governação usando as TICs. Através do projecto, cidadãos e OSCs passaram a ter maior acesso à informação útil sobre governação, contactos, redes e oportunidades para aprendizagem sobre monitoria e advocacia da governação, como resultado do apoio dado a 55 centros1 (60% de todos existentes no país) em 52 distritos (40% de todo o país).

Fortalecimento da demanda dos cidadãos para a transparência nas políticas da indústria extractiva através de abordagens de pesquisa baseadas em evidên-cias. é um projecto da PANOS, com o objectivo de fortalecer a capacidade dos cida-dãos, os media, OSCs e órgãos eleitos para se engajarem na promoção de políticas pró-desenvolvimento com ênfase na indústria extractiva, através da promoção do jornalismo investigativo. Alguns resultados deste projecto até a data incluem i) o estabelecimento da Plataforma da Sociedade Civil para a Monitoria da Indústria Extractiva, para a qual o seguimento estrito da candidatura de Moçambique para a EITI2 é uma das prioridades; ii) assinatura de Memorandos de Entendimento entre o PANOS e sete medias (rM, TVM, SOICO, Mediacoop, Notícias, Magazine Independente e diário de Moçambique, no âmbito do projecto; iii) realização de missões conjuntas (jornais, rádios e televisões) em Maputo e Zambézia que culminaram com a produção de reportagens críticas sobre i) remoção e reassentamento de comunidades em Matutíne, Maputo; ii) delapidação de

1 Incluindo rádios Comunitárias, Centros Multimédia Comunitários e Telecentros.2 Iniciativa de Transparência da Indústria Extractiva.

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recursos florestais na Zambézia; iii) garimpo versus educação e segurança alimentar na Zambézia; entre outras. Após publicação de reportagens sobre a delapidação da madei-ra na Zambézia pela STV, “O País”, “notícias”, “Savana” e TVM, o Ministro da Agricul-tura suspendeu o Chefe dos Serviços Florestais, suspeito de envolvimento no esquema.

A Rádio Comunitária de Catandica (RCC) na monitoria da governação local em Manica3

Em Julho de 2010, a rCC iniciou um projecto com financiamento do MASC cujo objectivo é promover uma melhor prestação de serviços públicos aos cidadãos, no dis-trito de Catandica.

de forma específica, a rCC contribuiu para a melhoria do acesso á água e educa-ção, melhoria do atendimento nos serviços públicos (saúde, polícia e conservatória), melhoria da qualidade das obras públicas e para reduzir a corrupção e abuso de poder no sector público. Três casos de intervenção da rCC na governação local destacam-se desde o início do projecto em 2010.

O primeiro caso relaciona-se com a denúncia de abuso do poder e corrupção por um agente da polícia na localidade de Serra Choa. O agente exigia suborno para arquivar queixas-crime ou para solucionar casos. Consta que o polícia exigiu uma cabeça de gado e 2.000,00 Mt para não enviar o caso de um cidadão acusado de possuir machamba de suruma ao Comando distrital. O líder comunitário e moradores de Serra Choa denun-ciaram o caso através da rCC. O administrador, ao ouvir a notícia, deslocou-se ao local e reuniu-se com a comunidade, tendo ficado evidente a existência da prática do suborno do polícia. Foi aberto um processo disciplinar e, posteriormente, o polícia foi afastado do posto.

O segundo caso envolveu a união distrital dos Camponeses (udAC) e os Servi-ços distritais de Actividades Económicas (SdAE). Consta que o presidente da udAC vendeu bens da associação, entre os quais uma viatura, e fugiu com o dinheiro, tendo o carro ido parar às mãos do director dos SdAE de forma pouco transparente. Os membros da udAC denunciaram o caso através da rádio, o que ditou a intervenção do administrador do distrito, que reuniu com o director do SdAE e com os camponeses, acabando o carro por ser devolvido à udAC.

O terceiro caso envolveu um explorador mineiro que não cumpriu com as promes-sas feitas à população em torno da concessão da exploração das minas de turmalina na localidade de Nhampassa. Este prometera construir 250 casas, um mercado e dar uma ambulância para a comunidade. Três anos se passaram e as casas não tinham sido cons-truídas, a ambulância era um carro velho e o mercado construído era de má qualidade. Membros da localidade convidaram jornalistas da rádio para um encontro que teriam com o empresário e para o qual também foram convidados o Secretário Permanente do distrito, os directores dos Serviços distritais de Saúde e dos Serviços distritais de

3 Veja o estudo de caso completo em www.masc.org.mz/MASC histórias de Sucesso.

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Educação. O debate foi ao ar na rádio e a pressão feita através deste processo obrigou o empresário a destruir o mercado, estando neste momento a construir um novo.

Cidadãos e representantes do governo afirmam que a rCC tem um papel importan-te na governação local na medida em que a rádio ouve a comunidade, faz levantamento dos problemas, promove debates e persegue o desfecho das denúncias feitas, oferecen-do, assim, um espaço de participação e diálogo entre cidadãos e autoridades do governo e promovendo a aproximação entre ambos. dois representantes do governo afirmaram terem replanificado as actividades a partir de notícias divulgadas pela rádio.

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MUITO POUCAS ONG TêM UMA REAL CONSCIêN-CIA DO QUE é A COMUNICAçãO DO SEU TRABALHO1

Jorge Balbis Pérez / Secretário Executivo da ALOP - Associación Latinoamericanade Organizaciones de Promócion al Desarrollo (México)

Com as autoridades, às vezes temos resultados positivos, outras temos alguns pro-blemas, como dizíamos – a perda da capacidade crítica, a dependência das prioridades da empresa ou da autoridade pública e também, o que notamos, não são acções de longo prazo. São acções muito concretas, muito pontuais, que se limitam a uma acção e não há forma de continuar os processos. Perante a situação de não ter possibilidade de fazer praticamente o seu trabalho e ter esta outra possibilidade – com muitas limitações também – muitas vezes, operando com estes vínculos a curto prazo para que possa ter algum resultado, ainda que não seja em perspectiva de um processo ou de uma mudança de estrutura ou de um processo de concretização política.

No que respeita à relação com os meios de comunicação há um sério problema para as ONG. Lamentavelmente, muito poucas ONG têm uma real consciência do que é a comunicação do seu trabalho. Nesse sentido, muito poucas desenvolvem estratégias de comunicação que suponham ou que tenham presentes os meios de comunicação como um objectivo do seu trabalho. Pelos temas que trabalham, são muito poucas as que dão prioridade às relações com os meios de comunicação social. Portanto, o seu trabalho normalmente não tem o impacto que podia ter ou não tem a difusão e reconhecimento que podia ter e merecer porque, realmente, na estratégia das ONG não está presente o tema das comunicações. Por exemplo, a nossa associação tem 30 anos de existência e, nos últimos três anos, tem definido uma estratégia de comunicação – o que pode supor a sua relação com os media e delinear os seus mecanismos e modos de comunicar. Nor-malmente, a nossa relação com os meios de comunicação é deixada à sorte e ao azar: o que será, será. Se se consegue, bem. Se conseguimos que algumas das nossas acções ou projectos desperte o interesse de algum meio de comunicação, bem. E quando o conseguimos celebramos como se fosse uma conquista, porque alguém num jornal nos prestou atenção. Na própria definição da nossa acção, temos assumido a importância da comunicação, particularmente os meios de comunicação social, como instrumento, como actores que nos podem ajudar a melhorar a nossa acção.

Quando as organizações da sociedade civil se deparam com a necessidade de estabelecer mecanismos próprios ou uma linha de orientação para a relação com os media, na sua opinião quais são os critérios e quais são os riscos que devem ser observados?

O que observamos é que normalmente a abordagem ou tratamentos dos temas que nós trabalhamos, em primeiro lugar, não têm muito a ver com o que são as prioridades

1 Texto retirado do livro Media, Cidadania e Desenvolvimento – Triângulos Imperfeitos (2010), Coordenação e edição ACEP, Financiamento: IPAd, pp.99-103

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dos meios de comunicação. A não ser que trabalhemos sobre uma situação de necessi-dade ou de pobreza em determinada comunidade – isso evidentemente não é relevante para um meio de comunicação, ao menos que possa ser para um meio de comunicação local. Não é uma prioridade, ou não é de interesse para os meios de comunicação difun-direm necessariamente o resultado de uma investigação ou trabalho que realizamos. Se os grandes meios de comunicação social são o objectivo da nossa estratégia de comu-nicação, temos de utilizar a maior quantidade de alternativas possível. Todos os meios alternativos de comunicação, por exemplo, as rádios comunitárias, cremos que são es-paços que devemos e poderíamos utilizar.

No nosso trabalho, reconhecemos que a comunicação é uma ferramenta estraté-gica no conjunto da acção da associação, do seu fortalecimento institucional e da sua acção junto do espaço público. Não como um tema específico do plano de trabalho. A ideia é que toda a nossa estratégia de incidência política, de capacitação institucional, assim como reflexão de determinados temas (democracia, desenvolvimento sustentá-vel, direitos humanos, etc) deve preocupar-se com o tema da comunicação. Isto supõe sensibilizar a própria associação sobre a importância da comunicação dentro das suas respectivas estratégias de acção, desenvolvendo uma estratégia política sobre o papel da comunicação, assim como a relação com os meios alternativos que se deverão valorizar e desenvolver. Será importante desenvolver uma política de comunicação como parte integrante da planificação, assim como ter uma previsão que permita desenvolvê-la e contar com apoios sociais que disponham de experiência e capacidade reconhecida na matéria. A partir desta definição, devemos desenvolver o nosso próprio mecanismo de comunicação e estabelecer um diálogo com os meios de comunicação social que permi-ta uma maior difusão daquilo que fazemos.

Porém, insisto, esta estratégia é recente, data de 2008. Até este momento, a nossa acção com os media era fazer quando se podia, com quem se podia. Por exemplo, nos últimos anos temos cultivado sistematicamente uma acção pessoal com jornalistas. Coi-sa básica. Queremos ter alguma “entrada” nos meios de comunicação. Temos de ser muito mais proactivos, estar permanentemente a estabelecer contactos com os media ou pelo menos saber a quem dirigir a informação daquilo que fazemos. Chegamos a este extremo: não temos sequer ideia a quem devemos dirigir as nossas iniciativas, as nossas informações, seja num jornal, na rádio, ou até mesmo na televisão.

Por que pensa que isso foi assim? Essa falta de referências?Por várias razões. durante muitos anos, nós nas ONG acreditámos que o nosso

trabalho é positivo e valioso em si e por si mesmo. E como tal não julgávamos impor-tante dar conta do que estávamos a fazer, mostrar a outros o que estávamos a fazer. Tínhamos uma reacção muito positiva no interior daqueles que faziam o mesmo traba-lho, dizíamos “pois bem, não é uma questão que realmente importe”. Por outro lado, tínhamos uma visão muito limitada da própria concepção do trabalho. A realidade é que num mundo tão complexo e internacional em que vivemos obviamente que a nossa acção não se vincula a outros cenários e outros actores. Pode ser muito positiva para

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o grupo pequeno no qual trabalhamos, mas não significa que tenha mais impacto. Por outro lado, a dificuldade crescente que encontramos, seja a nível político ou a nível de financiamento, levou as ONG a tomar consciência da necessidade de se projectar não só pelo conteúdo político, como também pela necessidade de financiamento. Mostrar aos outros o que se faz pode despertar o interesse em que estejam dispostos a apoiar uma iniciativa, mesmo que não esteja relacionado com o seu próprio projecto político ou económico, mas como uma causa que vale a pena apoiar.

há outro elemento muito importante também. Nos últimos anos, tem crescido nas ONG a consciência da necessidade da transparência. Tem a ver com o que disse ini-cialmente: as ONG querem que o seu trabalho seja bom e portanto não hesitam em informar, dar conta ou mostrar o que está a fazer. Por outras razões, mas também por uma necessidade de revisão de contas, de transparência, de mostrar em que se utilizam os recursos que recebe, em mostrar os resultados do trabalho. utilizam o papel da comunicação como uma forma de se legitimar, de mostrar de forma transparente as suas acções, quando tanta vez se recebe críticas. Evidentemente que as ONG recebem recursos, mas aplicam-nos. uma valorização da comunicação que, insisto, para muitas das organizações – estou a pensar naquelas que integram a ALOP – é uma questão que não tem ainda reconhecimento. Algumas das associadas já compreenderam e abordam seriamente a comunicação, ao vínculo com os meios de comunicação ao ponto de algu-mas assumirem uma nova direcção da comunicação. Porém, nem todas têm capacidade própria, do ponto de vista financeiro ou técnico, para poder desenvolver por si só es-tratégias de comunicação. Aí, a possibilidade de acesso a meios alternativos ou mesmo a redes que lhe facilitem a capacitação, por exemplo, no uso de determinado recurso ou meios. Não estou a falar de apoios económicos. Estou a falar fundamentalmente de know how. Como poder utilizar a comunicação? Como ter um meio de comunicação próprio que é relativamente difícil?

Temos vindo a assistir nalguns casos e provavelmente nas organizações não-governamentais com mais recursos financeiros, inclusivamente, à contratação de jornalistas profissionais ou de antigos jornalistas para desempenhar funções nos gabinetes de comunicação dessas ONG. Como é que o Jorge avalia a estra-tégia desses órgãos, sobretudo dos que têm mais meios?

é uma estratégia válida porque é know how que se incorpora no trabalho da organi-zação. Porém, se as organizações são muito pequenas e não podem conciliar tal recurso, depende da boa vontade do jornalista. São muito poucas as organizações que os con-templam. Por exemplo, colocámos no quadro [Plano Trienal da ALOP] 2008-2011 da nossa associação a contratação a meio tempo de um técnico de comunicação. Já passou um ano e meio do plano e ainda não o contratámos. há uma falta de valorização e da real consciência do valor que pode supor a dimensão da comunicação. Ou, passemos ao exemplo das nossas próprias associadas. Temos uma [ONG] associada que tem uma radio comunitária especializada em questões de género. Tem uma grande consciência do que representa o seu trabalho, porém a sua própria capacidade tecnológica permite-

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lhe difundir o seu trabalho num círculo muito reduzido. Seria interessante e importante estabelecer um diálogo entre este know how e as outras 49 associadas, por exemplo. há um problema sério de reconhecimento da importância da comunicação, quando deveria ser parte integrante, desde início, de qualquer estratégia de trabalho.

Queira lançar-lhe um último desafio: no meio de toda esta discussão, há sem-pre um conceito de desenvolvimento implícito. Se tivesse de desenvolver o con-ceito de desenvolvimento, como é que o desenharia?

O desenvolvimento passa pelo desenvolvimento de capacidades. Ou seja, o desen-volvimento supõe, evidentemente, dimensões económicas, políticas, sociais, culturais, mas tudo passa por que os indivíduos sejam cidadãos que sejam capazes de reclamar os seus direitos e de lutar por eles. Sejam direitos políticos, económicos, culturais e outros. Portanto, para nós, desenvolvimento e democracia andam estreitamente unidos. desen-volvimento sem participação política e sem respeito pelos direitos pode ser crescimento, mas não será desenvolvimento.

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MUITO POUCOS MEDIA DISPõEM DE REDES SUFI-CIENTES PARA COBRIR O PAÍS NA SUA EXTENSãO1

Taoufik Ben Abdallah / Responsável do Programa ENDA - Environnement et Developpement du Tiers Monde (Senegal)

Da sua experiência, se tivesse de descrever o conceito de desenvolvimento, como é que o descreveria? O que é que o desenvolvimento implica?

O conceito está morto. Porque é um conceito mal empregue, que é usado ao acaso, por diversos actores que não fazem dele a mesma leitura. Por outro lado, o conceito de desenvolvimento surgiu com a história recente dos países em desenvolvimento que saíram da colonização e transporta com ele algo que se revelou historicamente errado, isto é, que o desenvolvimento seria uma espécie de progresso constante da produtivida-de, do domínio da tecnologia. Na verdade, o conceito refere-se a uma visão do modelo europeu de progresso. Em segundo lugar, dá a entender que existiria um antes e um depois do desenvolvimento, e portanto um atraso. Em relação a quê? Em relação a que referências? Não se sabe… Foi utilizado, quer por organizações internacionais – o FMI, por exemplo – quer por organizações de cooperação – como ONG ou empresas –, e para cada um destes actores, desenvolvimento quer dizer uma coisa totalmente diferen-te. Por último, consente a um certo número de actores evitar o debate entre o tipo de políticas implementadas num determinado momento, então toda a gente fala de desen-volvimento como se houvesse um consenso e como se houvesse apenas uma maneira de falar de desenvolvimento, quando não é verdade. A visão veiculada pelo banco Mun-dial não tem nada a ver com a visão que têm um certo número de decisores políticos que gostariam, por exemplo, de manter o controlo sobre os seus recursos naturais, que gostariam de centrar as suas políticas económicas em torno de questões sociais em vez de as centrar em torno de políticas económicas liberais. E há ainda ONG para as quais o desenvolvimento é, regra geral, o acesso da população a um certo número de elementos de bem-estar como a água, a saúde, a educação. E afinal apercebemo-nos de que em muitos países os indicadores sociais melhoram, mas que não se pode verdadeiramente falar em desenvolvimento e muito menos em desenvolvimento sustentável.

há problemas de fundo, de medida. E se se privilegiar a dimensão social, chega-se a um certo tipo de indicadores mas se, ao invés, se privilegiar questões puramente económicas, chega-se a outros indicadores. de qualquer forma apercebemo-nos que a melhoria das condições de vida não dura se não for o resultado cumulativo de um certo tipo de políticas económicas e sociais e se não houver, a longo prazo, um controlo sufi-ciente das condições nas quais essas políticas são definidas e talvez a história recente nos mostre que, por exemplo em África, durante mais de 25 anos, os países africanos foram praticamente despojados do controlo das suas políticas e portanto neste caso não existe o que se poderia chamar desenvolvimento.

1 Texto retirado do livro Media, Cidadania e Desenvolvimento – Triângulos Imperfeitos (2010), Coordenação e edição ACEP, Financiamento: IPAd, pp.97-98

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Qual é que é a interacção ou o papel que os media, mais especificamente a cobertura jornalística, tem ao dar uma certa noção de desenvolvimento, ao en-quadrar os chamados interesses do desenvolvimento?

A questão dos media, evidentemente, coloca-se em termos diferentes dependendo se estamos numa situação de relativa liberdade de expressão ou se estamos em situação de monopólio do Estado e de palavras controladas. Mas digamos que a liberdade de expressão não é uma condição suficiente para ter media que contribuem para o debate democrático. Então, se tomar o exemplo da situação em África, apercebemo-nos que numa boa parte desses países “recentemente democráticos”, os media ficam em boa medida sob domínio do Estado. Outra parte, que se privatizou, continua a ser gerida segundo a concepção completamente liberal, ou seja uma imprensa que, apesar de pri-vada, também tem um papel político.E então, apercebemo-nos que não chega. Nesses países, a dinâmica da imprensa e dos media não é suficiente para fazer com que o ci-dadão esteja informado do que se passa no seu país, na sua sociedade, não é suficiente para nos transmitir um certo número de questões reais sobre as quais pode agir e isto por diferentes razões. Por um lado, porque muitos órgãos de comunicação social, como já referi, são privados e mesmo numa situação de relativa expressão democrática, de liberdade de expressão, permanecem controlados, quer por grupos políticos, econó-micos, por vezes grupos religiosos, quer porque o acesso da população aos media é muito limitado porque esses media exprimem-se na maior parte dos casos em língua estrangeira, que é ou o francês ou o inglês, ou se for a imprensa – a imprensa também está em francês ou em inglês – apenas uma minoria pode aceder. Sem falar que o modo como os media estão organizados é, regra geral, muito centralizada. Muitos poucos me-dia dispõem de redes suficientes para cobrir o país na sua extensão, na sua diversidade, por motivos económicos. de modo que nos nossos contextos, que são essencialmente contextos da oralidade, a imprensa não está muito presente. Vendem-se jornais, escuta-se rádio, mas digamos que a recolha de informações nessas regiões sofre ainda graves insuficiências, o que leva a que as zonas rurais não estejam por isso suficientemente visíveis no panorama nacional.

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