A Voz Dos Deuses de João Aguiar

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A Voz Dos Deuses de João Aguiar Resumo Algures numa das regiões da Lusitânia, um sacerdote culto, sábio e com uma grande história de vida (80 anos) resolve, como última vontade, narrar a história da sua vida. Viveu durante mais que a maioria dos homens e durante muito tempo não consegui compreender por que razão os deuses lhe haviam conservado a vida por tanto tempo, se ele pensava que o seu destino já se havia cumprido em juventude. O narrador, Tongio, adolescente com apenas 12 anos de idade, nasceu sob o domínio de Roma no antigo reino de Cineticum na altura em que os Romanos já dominavam metade da costa. O bisavô foi o último a seguir a carreira das armas, alistando-se no exército Cartaginês. Naquela altura dizia-se que os homens mortos não perdoavam a quem os deixava sem sepultura, e quando o seu bisavô morreu na guerra, não foi possível realizar-se os rituais fúnebres. Passado um tempo, os seus 4 filhos perderam quase todo o seu património. O 3º filho não se deixou vencer e fez ele próprio as cerimónias numa sepultura vazia. Morreu cedo, como mercador mas o seu avô soube refazer a sua riqueza, casou com uma jovem que pertencia à pequena nobreza e teve dois filhos, Camalo, seu tio, um comerciante e Camala, sua mãe. Camala nunca falou com Tongio acerca do seu pai, mas um dia, Camalo contou-lhe a história do seu pai. A história de que o seu pai, Tongétamo, terceiro filho de Tongétamo, Rei dos Brácaros, de descendência Lusa, um dos poucos sobreviventes da revolta que aniquilara quase toda a família Real, fora encontrado pelo seu tio e pela sua mãe, quando estes vinham de Myrtilis. Encontraram um corpo estendido atrás de uma moita. O homem tinha sido dado como morto, mas estava ainda vivo, muito doente. A sua mãe insistiu com o tio para cuidar de Tongétamo, seu pai. O tio acabou por ceder e Camala dedicou todos os seus dias que permaneceram em Myrtilis para 1

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Resumo do livro ' A Voz dos Deuses ' de João Aguiar . Edições Asa . Este trabalho foi realizado em 2011 para história , pela aluna Sofia Antunes da Escola Secundária Professor Herculano de Carvalho .

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A Voz Dos Deuses de João Aguiar

Resumo

Algures numa das regiões da Lusitânia, um sacerdote culto, sábio e com uma grande história de vida (80 anos) resolve, como última vontade, narrar a história da sua vida. Viveu durante mais que a maioria dos homens e durante muito tempo não consegui compreender por que razão os deuses lhe haviam conservado a vida por tanto tempo, se ele pensava que o seu destino já se havia cumprido em juventude. O narrador, Tongio, adolescente com apenas 12 anos de idade, nasceu sob o domínio de Roma no antigo reino de Cineticum na altura em que os Romanos já dominavam metade da costa.O bisavô foi o último a seguir a carreira das armas, alistando-se no exército Cartaginês.Naquela altura dizia-se que os homens mortos não perdoavam a quem os deixava sem sepultura, e quando o seu bisavô morreu na guerra, não foi possível realizar-se os rituais fúnebres. Passado um tempo, os seus 4 filhos perderam quase todo o seu património. O 3º filho não se deixou vencer e fez ele próprio as cerimónias numa sepultura vazia. Morreu cedo, como mercador mas o seu avô soube refazer a sua riqueza, casou com uma jovem que pertencia à pequena nobreza e teve dois filhos, Camalo, seu tio, um comerciante e Camala, sua mãe. Camala nunca falou com Tongio acerca do seu pai, mas um dia, Camalo contou-lhe a história do seu pai. A história de que o seu pai, Tongétamo, terceiro filho de Tongétamo, Rei dos Brácaros, de descendência Lusa, um dos poucos sobreviventes da revolta que aniquilara quase toda a família Real, fora encontrado pelo seu tio e pela sua mãe, quando estes vinham de Myrtilis. Encontraram um corpo estendido atrás de uma moita. O homem tinha sido dado como morto, mas estava ainda vivo, muito doente. A sua mãe insistiu com o tio para cuidar de Tongétamo, seu pai. O tio acabou por ceder e Camala dedicou todos os seus dias que permaneceram em Myrtilis para cuidar de Tongétamo, velou por ele todas as noites, pediu a todas as divindades ligadas à saúde, e conhecendo bem as plantas medicinais utilizou-as para curar Tongétamo. À medida que os dias iam passando Camala começava a nutrir um sentimento muito forte por aquele homem, e depois de acordar, também ele se apaixonou por Camala. Camala convenceu seu irmão para que Tongétamo voltasse com eles para Balsa com eles, afirmando que os deuses haviam predestinado o seu encontro. Mas esta conclusão errada levara à ira dos deuses e o casamento foi um fracasso. Embora Camala fosse muito amada, Tongétamo nunca se habituou à vida em Balsa, desejava vingar a morte dos seus familiares e passado poucos anos de Tongio nascer, Tongétamo suicidou-se.Tongio percebeu então que lhe corria sangue lusitano, e que agora o futuro lhe reservara novas oportunidades, de honrar a sua família, tornando-se um guerreiro.Esta conversa passara-se já em Gadir, pois a sua mãe e o seu tio abandonaram Balsa por diversos motivos, incluindo o facto de a mãe passar dias junto da sepultura do seu pai, e

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Camalo temer que ele se deixasse morrer.Gadir, a cidade que actualmente acolhia a sua família era a cidade mais antiga e mais rica da Hispânia e um motivo de orgulho para os seus habitantes. Contudo, o verdadeiro orgulho de Gadir era o santuário de Héracles onde repousam os restos mortais desse deus. Foi o local preferido da infância de Tongio e ele visitava-o com alguma frequência embora o templo se localizasse no outro extremo de Kotinoussa.Quando visitava o santuário, levava consigo a sua mãe ou o seu tio, e o seu escravo e tutor, Beduno, um escravo de confiança.O tio assegurou que Tongio obtivesse a melhor educação possível e portanto Tongio falava e escrevia grego e latim, e conhecia boa parte das línguas ibéricas, uma grande ajuda para Tongio que sucederia Camalo nos negócios. Quando atingiu os 14 anos começou a treinar a sua condição física pois precisava de ser tão destro na luta como hábil nas línguas e nas contas. Foi também aos 14 anos que Tongio recebeu a sua primeira espada, a espada do seu pai, recebeu um cavalo e ensinou-o e teve a sua primeira experiência com uma mulher, Lobessa, escrava da sua mãe. A ligação com Lobessa foi crescendo, tornando-se ela uma amante.Para Tongio, a guerra entre os Romanos e os Lusitanos parecia-lhe muito longínqua mas um dia, o tio chegou a casa visivelmente diferente. Soube então que o novo governador romano da Hispânia Ulterior, o pretor Sérvio Galba, depois de ter sido derrotado pelos Lusitanos em Outubro, refugiara-se no Cineticum e estabelecera quartéis de Inverno em Conistorgis. Camalo explica-lhe então que a cidade de Gadir pode estar em perigo de ser saqueada pelos Lusitanos.Entretanto as tropas acampadas junto a Gadir tinham sido pura e simplesmente esquecidas. Os homens aborreciam-se com tanta inactividade e gerou cada vez mais atritos e com o Inverno o abastecimento foi várias vezes interrompido e os roubos de lojas e bancas de mercado passaram a ser frequentes. As vítimas escolhidas eram preferencialmente estrangeiros o que fez com que os estrangeiros mais influentes da cidade convocaram uma reunião. Camalo ordenou que Tongio o acompanhasse onde o apresentou como seu herdeiro. Mais tarde, Camalo falou a Tongio de Eunois, um grande comerciante e amigo de Camalo, que segundo o tio, o sobrinho pode confiar como se fosse ele próprio. Tongio sente que algo de mal se vai passar para o tio lhe falar de Eunois e da sucessão nos negócios.No dia seguinte, o seu tio sai de madrugada, e Beduno impede que Tongio o siga.Depois de Tongio se vestir e de Beduno contar o que sabia, Tongio ouve vozes da rua a gritar ‘morte aos estrangeiros’. Saiu rapidamente e dirigiu-se a um pequeno largo onde legionários romanos se encontravam. Um centurião romano matou o seu tio.Tongio exige vingança e justiça pela morte de Camalo por um centurião romano.Vai conversar com Eunois, melhor amigo de Camalo que o aconselha a não tomar atitudes precipitadas e diz que independentemente das suas escolhas ele o apoiará sempre. Tongio, quando volta para casa, acompanhado por um dos escravos de Eunois decide arejar e anda sem rumo pelas ruas de modo a pensar e organizar as suas ideias.Durante o seu passeio, Tongio avista o homem que matou o seu tio, e decide segui-lo.

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Travam uma batalha e durante a mesma, Tongio ouve a voz dos deuses ‘menos ardor, mais estratégia!’, uma frase que Beduno lhe dizia muitas vezes durante os treinos. Dominando a sua raiva, Tongio consegue matar o centurião Romano. Tongio encontra-se com Eunois que a aconselha a abandonar a cidade pois ele será o primeiro suspeito da morte do centurião romano. Juntos tratam dos seus negócios e organizam a viagem que decorreria na mesma noite. A sua mãe, Beduno e Lobessa, seus escravos, acompanhá-lo-ão.Partem numa pequena embarcação que os leva ao grande ‘Hermes’.Desembarcam em Balsa onde no próprio dia seguiram viagem numa caravana para Baesuris. Durante a viagem Beduno e Tongio apercebem-se que os encarregados de os proteger se parecem bastante desinteressados, e com tanto ouro que Beduno traz consigo, começam a sentir-se inseguros e planeiam vigiá-los durante a noite e também de dia.A mãe de Tongio desmaia, com o cansaço da viagem e os seus protectores, fogem ao avistar uma hoste romana. Tongio e Beduno travam uma batalha de quatro para dois. Beduno morre.Uma hoste Lusitana auxilia Tongio e com a sua ajuda conseguem vencer a hoste Romana. Tongio mata o último romano responsável pela morte de Beduno.A escolta Lusitana pede a Tongio que fale sobre si e é aqui que conhece Viriato.As cerimónias fúnebres em honra de Beduno são realizadas. Junto de Viriato, Tongio decide seguir caminho até Arcóbriga onde Tongio terá guarida e poderá pensar melhor sobre o seu destino final.Durante a viagem Tongio faz perguntas a Viriato sobre o Deus Endovélico que Viriato invocou quando realizou as cerimónias fúnebres a Beduno e descobre que existe um ritual em que este Deus revela o futuro de uma pessoa. Depois de dois chegam a Arcóbriga onde Tongato, um ancião imponente, amigo de Viriato lhes oferece alojamento. Durante a noite, Tongato, Tongio, Tautalo e Viriato falam sobre o que os move até Arcóbriga.Tongio decide consultar o oráculo para saber que lugar devia seguir.Tongio visita o santuário de Endovélico e leva a sua mãe que necessita de cuidados médicos.Os Lusitanos preparam-se para retomar a sua viagem e Tongio prossegue com os ritos e fica sozinho numa gruta onde sonha com o seu destino, estava a lutar contra a legião romana ao lado dos Lusitanos e viu o seu tio. Depois, viu-se perante a divindade e acordou.Com a ajuda do sacerdote, interpretou o seu sonho e juntos compreenderam que o fim da sua vida seria o próprio deus Endovélico.O tempo foi passando e Tongio começava a perder a esperança de que o que a divindade lhe mostrara não fosse verdade e consultou de novo o oráculo mas dessa vez a divindade não lhe falou.A Primavera chegou e os tempos de pessimismo já pareciam longínquos. Tongio participou nos festivais e rituais.Chegaram então dois príncipes da Bestânia, Cúrio e Apuleio, fugidos da sua pátria.

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Juntaram-se aos Lusitanos para lutar contra Roma. Os príncipes e a sua hoste acamparam no vale. Um acaso fez com que Tongio se tornasse amigo de um guerreiro, Indibilis.O seu novo amigo sugeriu que Tongio se juntasse à hoste. Tongio aceitou e depois de se apresentar perante Cúrio, um dos príncipes, foi aceita.Durante a Primavera fizeram pequenas incursões na Betúria, mais para sobreviver do que para enfrentar romanos, e Tongio ficou com a sensação que eram mais um bando de salteadores do que um verdadeiro exército combatente. Durante um assalto Indibilis morre, Tongio vinga a sua morte matando o legionário responsável pela morte de Indibilis.Um grupo de cavaleiros do além-Tagus transmitiu uma mensagem de que estava a ser criada uma aliança lusitana com reis, príncipes e chefes tribais de diversas regiões para vingar a traição do Pretor Galba. Na altura eram cerca de 10000 homens.Os dois príncipes e comandantes da sua hoste, Cúrio e Apuleio, aceitaram participar nessa batalha.Prosseguiram então a viagem até Hermínios, onde uma escolta de onde Tongio fora destacado se iriam reunir com os restantes chefes.Tongio encontrou Viriato e Tautalo por entre os chefes que os puseram a par das notícias.As reuniões terminaram e foram escolhidos 5 chefes. Depois do banquete Tongio encontrou de novo Viriato e desejou estar na sua hoste, no entanto, devia a promessa aos príncipes.No dia seguinte houveram cerimónias religiosas e jogos.Os presságios anunciavam muitos perigos e alguns reveses, mas também uma grande vitória.À noite, Tautalo encontra Tongio que lhe pergunta a história de Viriato.Viriato era filho de um chefe tribal. Como segundo o costume Lusitano o primeiro filho herdava os bens familiares. Viriato, 3º filho, viu-se obrigado a seguir o caminho da vida rude dos bandos de saqueadores. Cresceu com os guerreiros de Igedum e com eles preparou-se para a guerra. O primeiro bando em que ele se integrou, rapidamente o nomeou chefe.Venceram na Bética, atacando romanos supresos. Depois de procederem a todas as pilhagens seguiram caminho. Dentro de dois dias chegariam a Gadir e isso fez com que Tongio se preocupa-se com a segurança de Eunois.Tongio ia observando Viriato e admirando a sua humildade e a disciplina que transmitia aos seus homens. Reconhecia-o com um verdadeiro líder e cada vez mais desejava fazer parte da sua insígnia, a insígnia do touro. Tongio conversou com Viriato e este não se mostrou muito convencido em que venceriam em Gadir pois os Romanos tinham um grande desejo de vingança e não se deixariam apanhar de surpresa de novo.Na manhã seguinte, Tongio acordou com um imenso barulho vindo de fora. Pensou que se tratava de um ataque mas na verdade tinham sido dois legionários romanos que tinham sido interceptados e mortos.Viriato censurava os guerreiros de Apuleio dizendo que os emissários nunca deviam ser mortos antes de revelarem a sua mensagem.Tongio encontrou no meio dos despojos dos dois legionários romanos uma ‘carta’,

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redigida em latim, dirigida a um pretor, ‘Caio Vetílio’. Pedia-lhe que avançasse com as tropas, para ajudar no combate aos Lusitanos que se encontravam às portas de Gadir como já era possível avistar.Chegaram então à conclusão que era impossível atacar Gadir.Viriato perguntou a Tongio se este se queria juntar à insígnia, ao que Tongio respondeu afirmativamente, mas que possuía uma promessa com os príncipes.Viriato prometeu arranjar uma solução pois achava que Tongio se lhe revelaria muito útil.O encontro com as tropas de Vetílio foi mais cedo do que se pensara. Venceram e Viriato salvou o príncipe Cúrio. Este, como paga, ofereceu-lhe dinheiro, ao que Viriato negou, pedindo-lhe apenas que Tongio passasse a combater na sua insígnia. Este aceitou e Tongio passou para a insígnia do touro.Prosseguiu-se a discussão se se deviam avançar ou não para Urso. Viriato defendia que deviam ficar, porque as tropas de Vetílio, que haviam enfrentado eram muito mais fortes que as tropas Lusitanas, mas a sede de pilhagens foi mais uma vez a vencedora e foi decidido que avançariam rumo à cidade de Urso.Viriato, fiel ao seu costume, enviou batedores para o reconhecimento do terreno e voltaram acompanhados de cavaleiros armados, habitantes de Urso, que por ódio a Roma ou ao seu domínio, se queria juntar ao exército.Ficaram a saber que as tropas Romanas os esperavam às portas da cidade de Urso e que podiam contar com cerca de dez mil homens. Finalmente tinham uma luta equilibrada.A batalha revelou-se caótica. Os Lusitanos foram derrotados e só as tropas de Viriato mantiveram a sua formação, o que salvou muitas vidas.A matança foi enorme e ao cair da noite, numa zona mais segura, contabilizaram. Eram agora dois mil, retirando-se a esse números os feridos graves.Seguiram para uma povoação abandonada para que pudessem ficar em segurança, tratar dos feridos e reorganizarem-se.Viriato e uma escolta prosseguiram procurando fugitivos. Conseguiram ainda reunir mais mil.Na manhã seguinte, quando Tongio acordou, viu que a maioria dos homens se tinham juntado perto das muralhas. Também ele o fez e quando olhou para fora, deparou-se com legionários romanos a toda a volta da muralha. Estavam cercados.Os Romanos aguardavam fora da cidade abandonada, enquanto durante dias, Lusitanos foram morrendo por doenças, infecções e febres que se iam gerando. Outros por fome e alguns por envenenamento e foi surgindo por entre eles a ideia de rendição.Foram enviados emissários para propor uma rendição.Voltaram à tarde, dizendo que Vetílio os recebera muito bem, e que lhes dera óptimas condições (uma rendição honrosa, a distribuição de terras aos guerreiros que desejassem estabelecer-se na Bética ou na Carpetânia, livre-circulação de quem preferisse regressar a casa) e em troca exigia que lhes entregassem as armas e que lhes dessem a palavra de que não voltariam a fazer guerras contra Roma ou contra os seus povos aliados.O chefe dos guerreiros de Conímbriga explicou então que isso se tratava de uma armadilha, porque os Romanos nunca tinham sido verdadeiros, nunca tinham cumprido a sua palavra. E para mais, os Lusitanos estavam cercados, não deviam exigir nada ou ter a

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menor regalia, no entanto, era-lhes oferecido tanto que não batia certo.Entregaram-se então à chefia de Viriato que lhes daria o comando e as ordens, que todos deviam seguir sem questionar.Viriato organizou toda a hoste Lusitana e explicou a todos o seu plano. Através dos pontos mais fracos das posições romanas, dividiriam a hoste em quatro grupos e romperiam o cerco dessa maneira.A sua frente, virada para o pretor, com cerca de mil homens sairia disparada contra a tropa do pretor e quando estivesse muito perto, alteraria completamente a sua rota, deixando o pretor completamente desprevenido para que assim pudessem escapar.A manobra de Viriato revelou-se perfeita e toda a hoste conseguiu escapar dos Romanos.Refugiaram-se na floresta e finalmente os cerca de cinco mil guerreiros lusitanos puderam comer e descansar.O Comandante ordenou que todos estivessem prontos nas primeiras horas da manhã para atacarem o acampamento do pretor Vetílio.O pretor, que agora se sentia com uma raiva imensa por ter deixado espaçar os Lusitanos, caiu na cilada que Viriato planejara. A ideia de Viriato foi de deixar visível o caminho que tinham tomado para que pudesse aguardar pelas tropas do pretor e assim o apanharem de surpresa.Quando a batalha começou, a hoste Lusitana, a galope, correu até perto da hoste Romana, mas quando se aproximava, inverteu o sentido, aplicando a mesma jogada que tinham feito anteriormente. Os Romanos, já esperando que isso acontecesse, começaram a perseguir os Lusitanos, logo.Viriato conduziu então as suas tropas para a floresta. Os Romanos, com a excitação de estarem tão perto dos Lusitanos não repararam que escondidos na floresta surgiam milhares de Lusitanos. Quando a batalha terminou, com os Lusitanos a saírem vencedores, os legionários Romanos, jaziam mortos no chão, eram cerca de quatro mil.Mais uma vez Viriato censurou um guerreiro, por ter morto um legionário Romano que se rendera. Depois de observar chegou à conclusão de que se tratava do pretor Vetílio e que perderam a oportunidade de receber um bom resgate, exigindo condições das suas necessidades.Depois de vencerem a Hispânia Ulterior, a hoste Lusitana prosseguiu até Barbéssua onde ficaram a dormir.O restante da hoste Romana (cerca de seis mil homens) refugiou-se em Carteia.Muitos dos chefes propuseram a Viriato que atacassem Carteia mas Viriato decidiu que iriam para a Carpetânia ensinar, disciplinar e reforçar as suas tropas com treino militar.Montaram acampamentos na Carpetânia, realizaram jogos, exercícios e treinos para se manterem activos.Viriato ordenou que qualquer mensageiro que fosse interceptado deveria ser trazido vivo para interrogatório.Nunca apareceu nenhum mensageiro mas souberam por mercadores que viajam que os Celtibéricos se haviam unido a Roma e que se dirigiam para Carteia para reforçar as suas tropas.

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Viriato ordenou então que atacassem os Celtiberos quando ali passassem.Foram apanhados de surpresa e totalmente trucidados.Seguiram para o Monte da Deusa onde iriam estabelecer quartéis de Inverno.Enquanto a hoste descansava, Viriato, o comandante, continuava a trabalhar. Procurava convocar um conselho para confirmar ou revogar a sua eleição como general.Durante a noite, Tongio falou com Tautalo sobre o facto de nunca ter visto Viriato com uma mulher, ao que ele respondeu que Viriato era homem de uma só mulher e que essa estava muito longe.Tongio aproveitou o tempo em que permaneceu no Monte da Deusa para passear. Num desses passeios, Tongio conhece Sunua, uma menina de doze anos que cuida do rebanho e tornam-se amigos. Todos os dias a visita e tenta desculpar a atracão que sente por ele pensando que se trata de uma ternura pela irmã que nunca tivera.Rapidamente a sua ligação com Sunua cresce e tornam-se amantes.Mas Tongio sabia que o que era tão intenso devia ser curto.O dia do conselho chegou e Viriato relembrou todas as batalhas e explicou que se queriam vencer Roma teriam de ter um chefe e não um número de hostes desorganizadas.Viriato foi então, nomeado general pelas hostes e finalmente os Lusitanos tinham um único chefe.Durante mais de uma quinzena Viriato treinou as suas tropas e fez planos para o futuro próximo.Ficou tomada a decisão que seguiriam para Norte para tentar que os Vetões e os Vaceus aderissem à sua hoste.Restava-lhes agora vencer o pretor Cláudio Unímano, o governador da Hispânia Citerior.Decidiram que sairiam assim que o mau tempo acabasse.Tongio sentia-se feliz por finalmente avançarem, mas ao mesmo tempo triste por ter de deixar Sunua.Esta disse-lhe que queria casa com ele, e que esperava um filho dele. Este disse que também queria casar com ele e que regressaria.Tongio não disse a Sunua, pois ela era apenas uma criança, mas Sunua não poderia estar grávida, porque nunca tinham tido relações sexuais.Os Vetões prometeram auxílio em todas as operações militares contra os Romanos e algumas centenas de Vetões juntaram-se à hoste.Os Vaceus, proclamaram a sua amizade pelos Lusitanos, o seu ódio a Roma e a sua disposição para combater, mas apenas quando os deuses lhes ordenassem.Atacaram Toletum, Segóvia e Segóbriga, aliadas de Roma.Chegaram então notícias do Sul, informando que um novo exército, comandado pelo substituto de Vetílio acabava de desembarcas para vingar a humilde derrota sofrida em Tríbola e Viriato achou que seria melhor passarem a margem sul do Tagus para os legionários não se habituarem ao solo da Ibéria.O novo pretor, Caio Pláucio Hipseu, pensou que seria fácil, no entanto caiu na mesma armadilha que Vetílio e foram exterminados, o que deu mais tempo a Viriato para pensar num plano da Hispânia Citerior.Depois da notícia de que Cartago caíra e que agora era posse de Roma.

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Viriato não perdeu tempo e dirigiu-se para a Hispânia Citerior onde venceu o pretor Cláudio Unímano em duas batalhas.Carregados de despojos voltaram então ao Monte da Deusa.Tongio ansiava por se encontrar de novo com Sunua.Mas assim que chegou, Sunua não estava em nenhum dos locais habituais e soube, por uma senhora de idade, que Sunua falecera, em delírio.Tongio ficou devastado e pediu à senhora que entregasse à mãe de Sunua o anel que Tongio prometera dar-lhe quando a pedisse em casamento.Enquanto permaneciam no Monte da Deusa, Tongio era frequentemente inundado por pesadelos com Sunua e pensava constantemente nela.Chegaram notícias de que o novo governador de Roma, Emiliano desembarcara com as suas tropas, um exército consular).Para sua sorte, mal chegou a Primavera, abandonaram o Monte da Deusa para combater o novo magistrado da Hispânia Citerior, o pretor Caio Nigídio, para evitar que fosse apanhados entre dois exércitos Romanos.Caio Nigídio revelou-se não melhor general do que os seus antecessores e os Lusitanos venceram mais uma vez.Ficaram a saber então que o exército Emiliano era composto por cerca de dezassete mil homens, porém a maioria dos efectivos eram recrutas inexperientes.Emiliano estabeleceu bases em Urso e Gadir.A entrada dos Lusitanos em Itucci e Urso, bem como a quase total passividade do cônsul, fizeram com que outras cidades ganhassem coragem e expulsassem as guarnições romanas e se proclamassem aliadas de Viriato.Viriato estabeleceu então quartéis de Inverno e explicou que era tempo de planear o próximo ano que se revelava duro.Emiliano fora nomeado pro-cônsul e com as suas escapadelas de confrontos contra os Lusitanos treinara a sua tropa de dezassete mil recrutas e era preciso abate-la o quanto antes.Arduno e Tongio seguiram caminho para o Cineticum e mais a norte para tentarem recrutar mais homens. Viriato foi falar de novo com povos Vetões, Vaceus e Calaicos.Balsa e o Cineticum fervilhavam de revoltas internas.Passaram na necrópole de Ossónoba, onde Tongio podia prestar homenagem aos seus antepassados, mas partiram, assim que notaram que a cidade se encontrava cheia de legionários e que dois os seguiam.Arduno consultou os presságios e estes indicaram-lhe Vipasca como o caminho mais indicado.Tongio assentiu e concordou que seria uma boa aliança visto que era uma cidade com minas para o fabrico de armas. Os povos de entre Tagus e Anas não se mostraram tão inclinados para a guerra como os Cónios. Em nenhum dos lugares em que passaram obtiveram uma adesão clara, embora muitas tribos se mostrassem dispostas a fazer incursões na Bética, no momento em que os seus chefes assentissem e quando os presságios fossem favoráveis.Em Vispaca ouviram rumores sobre a guerra, Emiliano estava a melhorar a qualidade dos

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seus legionários e o novo governador da Citerior, Caio Lélio, iniciara uma campanha que servia de apoio o procônsul.Rumaram para Ebora.A cidade de Baikor estava a favor dos Lusitanos. Ebora não deu uma resposta sobre uma possível aliança.Seguiram então para a Celtibérica mas demoraram bastante mais tempo do que o estimado, pois Arduno não quis ir de barco porque enjoava e ambos não conheciam o caminho e perderam-se. Como voltar seria perder ainda mais tempo, Arduno assentiu em irem de barco e vomitou durante toda a travessia, no entanto recuperou rapidamente.A estadia em Cetóbriga supunha-se curta quando o possível pois a presença romana era visível nos portos, e Tongio e Arduno não queriam levantar suspeitas mas, um incidente veio em seu auxílio. Um velho, que se encontrava à porta de casa perguntando a quem passava se sabiam como curar as dores que sentia (em Cetóbriga tinham um costume que os doentes saiam para a porta da rua e perguntavam a todos os que passavam se conheciam algum remédio que os curasse).Arduno, que era perito em medicamentos sentou-se ao lado do homem e começou a fazer-lhe perguntas. No fim, aconselhou-o a uma infusão de ervas.Depressa a notícia de que Arduno era perito se espalhou pela cidade e todos lhe vieram pedir ajuda com as suas doenças.Arduno curou o rapaz com magias e orações secretas e receberam as maiores aclamações de Cetóbriga.Descobriram então que Cetóbriga não tinha nenhuma relação com Roma o que fez nascer uma esperança.Rumaram para Equabona.Em Equabona receberam-nos bem, mas estava a decorrer uma festa estival e ninguém tinha tempo ou disposição para os ouvir. Não querendo que os julgassem ímpios, fizeram à sua oferenda à divindade festejada e seguiram caminho. Tongio e Arduno seguiram para Olisipo, para poderem preparar uma surpresa a Viriato. Passaram a noite numa gruta e dormiram mal. De manhã, Arduno pensou que se devia ao facto de não terem prestado homenagem ao deus de Olisipo.Rumaram até à Colina de Coarenioniceus, o Deus de Olisipo. Nessa colina encontravam-se os cavalos mais divinos de todo o mundo e pretendiam comprar cavalos mistos (resultantes da reprodução de cavalos normais com cavalos divinizados) pois os divinos não podiam abandonar a colina e os mistos conservavam muitas das qualidades dos divinos para que em poucos anos Viriato pudesse criar um magnífico corpo de cavalaria.Realizaram oferendas à divindade e depois, durante a reunião com o sumo-sacerdote as negociações ficaram a cargo de Tongio, que não se saiu nada mal, negociaram um bom preço e em troca seriam entregues os melhores potros a Viriato, logo que atingissem a idade conveniente.Os sacerdotes mostraram-se interessados em colaborar connosco pois temiam a influência dos Romanos.Seguiram então para a Serra da Lua. Na Serra da Lua consultaram o Oráculo mas uma estranha mensagem da sacerdotisa veio revelar um início de uma busca pela serra.

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A sacerdotisa disse que a deusa falaria a Tongio quando este estivesse à sombra do coelho.O sacerdote ajudou Tongio a interpretar o que lhe fora disto e Tongio e Arduno partiram em busca da mensagem da deusa, a sombra do coelho.Cedo encontraram uma rocha em forma de coelho e quando Tongio mostrou a Arduno, este imobilizou, e a Deusa, como que possuindo Arduno, explicou-lhe que o seu destino já lhe tinha sido mostrado. Que ‘a seguir ao touro virá a corça’.Depois, Arduno voltou ao seu estado normal e foi-lhe difícil acreditar no que acontecera porque este não se lembrava de nada.No caminho para Igedum, que lhes levou dez dias, pararam em Scallabis e Moron, duas cidades que interessavam converter à causa de Viriato.Chegaram então a Igedum onde a hoste Lusitana os esperava. Viriato estava em conferência com o Rei Caturo e aproveitaram para contar as novidades.‘Na batalha contra Emiliano, Viriato comandava a cavalaria e Táutalo a infantaria; só ele seria capaz de manter a ordem durante a retirada.’ in A Voz dos Deus, cap.VIII, pág.228, l.12-14

Todos assentiram, pois Audax era um bom guerreiro mas Audax lançou-se ao ataque sem conhecer bem o terreno e hostilizou os habitantes da região que lhe negaram apoio.Os chefes Calaicos aceitaram o comando de Viriato e em breve, vários contingentes reforçariam a hoste.Viriato decidiu que o próximo destino seria Baikor, iriam tentar reunir mais homens para o exército.Táutalo piscara o olho a Tongio quando Viriato referira Balkor e por isso durante o caminho, Tongio perguntou-lhe o que fizera.Ao que este disse que iriam parar em Aritium Vetus, onde Viriato iria pedir em casamento Tangina. Porque embora continuasse pobre, tinham uma grande reputação na Lusitânia e o pai de Tangina não recusaria.Como imaginara, Astolpas, o pai de Tangina não recusou o pedido de casamento, a distribuição de mantimentos e a recruta de alguns dos seus e em troca precisava da garantia de que a granda hoste lusitana evitaria incursões não autorizadas nas suas terras e as protegeria de vizinhos e contra as legiões romanas.Entraram em Baikor no princípio do Inverno.‘Aproveitando o período de seca e procurando uma oportunidade de pilhar alimentos que substituíssem os produtos das colheitas em perigo, vários dos povos por nós contactados abriram hostilidades contra Roma: Túrdulos, Vetões, Vaceus – e até os Turdetanos... em poucos dias, a rebelião alastrou pela Ibéria como fogo num palheiro.’ in A Voz dos Deus, cap.VIII,

pág.235, l.22-27

Chegaram ainda os contingentes Calaicos, disciplinados e ferozes.Durante o inverno, Viriato treinou os Calaicos, enquanto Crisso, Táutalo e Tongio se encarregaram de manter activa o resto da hoste.Numa das noites, Tongio falou com Viriato, sobre torná-lo o Rei dos Lusitanos, mas este disse que isso não aconteceria sem que os deuses o quisessem pois seria um acto de impiedade.Um dos dias passados em Baikor foi uma cerimónia religiosa.O fim da cerimónia acabou com a profetiza que escolheu Tongio para realizar os ritos.

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Tongio seguia no templo e depois de todos os ritos realizados a profetiza teve relações sexuais com Tongio.Todos os dias, a profetiza chamava Tongio e ele só regressava na manhã seguinte.Tongio compreendeu então o porquê de os homens o olharem, invejados, quando ele foi escolhido, e nos dias seguintes.Quando o mau tempo diminuiu chegaram a Baikor os cavalos sagrados e Viriato agradeceu publicamente a Arduno e Tongio.Viriato ficou tão impressionado com os animais que entrou em negociações com os sacerdotes para que no ano seguinte lhe entregarem mais uma centena.Chegaram notícias de que os povos prosseguiam as hostilidades e de que os governadores Romanos tinham sido substituídos como Viriato esperara.Emiliano fora trocado pelo pretor Quinto Pompeio que governava agora a Hispânia Ulterior e o pretor Quíncio que governava a Ulterior.Viriato decidiu atacar a Citerior primeiro mas só depois de alastrar a revolta e levá-la aos aliados de Roma.Tongio tinha de deixar a profetisa, que o tentava convencer a ficar, mas Tongio, ciente das suas preocupações e prioridades, agradeceu-lhe a companhia e despediu-se.Na Primavera os Lusitanos entraram na Citerior.Em vez de atacarem as legiões Romanas, Viriato conduziu-se às terras habitadas pelos Titos e pelos Belos. Esta terra deveria ser a última a dar acolhimento aos Lusitanos, desde que Viriato aniquilara as suas tropas, que iriam reforçar a hoste Romana em tempo de Vetílio.Mas Viriato reuniu-se com a assembleia de chefes e propôs que as suas terras se revoltassem contra Roma de forma a tornar mais fácil a vitória Lusitana. A proposta foi aceite sem hesitações.Faltava agora conquista a Numância e os Arevacos e depois poderiam começar a guerra contra a Citerior de Quíncio.A campanha contra Quíncio foi rápida, Viriato simulou uma derrota e retirou para o Monte da Deusa, escolheu as posições que mais lhe convinham e caiu de surpresa matando mil legionários Romanos.O pretor, desesperado com a notícia da revolta dos Celtiberos, enviou um corpo de exército sob o comando de Caio Márcio.Um destacamento por Táutalo destroçou essas tropas.Viriato voltou-se finalmente para a Bética, derrotou Quinto Pompeio e recuperou a cidade de Itucci.A cidade de Itucci passou a ser uma praça-forte Lusitana.Até ao Inverno multiplicaram as incursões à Betânia que se mostrava indefesa.‘O produto dos saques feitos na Bestânia foi suficiente para nos mantermos durante o Inverno sem exigir demasiados sacrifícios à população de Itucci’. in A Voz dos Deus, cap.IX, pág.253, l.8-10

Com as vitórias Lusitanas e a revolta dos Celtiberos o pânico instalou-se em Roma.O senado nomeou o cônsul Lúcio Cecílio Metelo para o governo da Hispânia Ulterior e dera-lhe ordem para marchar o mais rapidamente possível.Viriato preparou nova campanha para a Primavera e enviou Tongio para o Cineticum, para

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passar em Arcóbriga e Meríbriga e para ver a sua mãe.Quando Tongio chega ao Cineticum, 6 anos após tê-la deixado sente-se ansioso não só por ver a sua mãe e os seus amigos como para ver Lobessa.Dirige-se ao santuário e um sacerdote diz-lhe que a sua mãe falecera dois anos atrás. Tongio sente-se culpado por não a ter visto uma vez mais.Lobessa adquiriu a liberdade concedida por Camala e casou-se com um mercador. Teve um filho, que agora tinha 6 anos.Tongio fez contas e ao ver o rapaz, apercebeu-se das semelhanças que tinha com o rapaz e apercebeu-se de que o rapaz era seu filho.Lobessa disse que quando ele partira não sabia que estava grávida e que mesmo que soubesse, nunca lho diria, pois nunca quis ser um entrave na vida dele e ele demonstrara que já se fartava dela.Lobessa disse que quando soube teve de arranjar marido para que ninguém soubesse que o filho era de Tongio e Amínio, que a andava a rondar à muito tempo, pareceu-lhe a solução ideal. Pediu-lhe que não contasse a Amínio (seu marido) que o filho (também chamado de Amínio) era seu, porque Tongio nunca poderia ser um pai presente, e seria melhor assim.Tongio partiu assim, com a promessa de que voltaria para os visitar.Lacóbriga, Ossónoba e Conistorgis, cidades do Cineticum já estavam praticamente em revolta. Portus Hannibalis, Balsa e Baesuris juntaram-se à causa Lusitana.Tongio seguiu para Olisipo, mas primeiro passou no Promontório Sagrado para fazer uma libação aos deuses.Seguiu então de barco para Olisipo.Olisipo aderiu à causa Lusitana e prometeu começar revoltas.Tongio dirigiu-se para o Monte Santo, onde encontrou Arduno, que lhe fora transmitir o convite para a boda de Viriato.A pedido de Viriato levaram mais cinquenta cavalos para Aritium Vetus.O cavalo de Tongio, Trovão, encontrava-se fraco, e chegara a hora de o entregar aos deuses. Pediu a um sacerdote que o fizesse, pois ele não tinha coragem, e foi o sacerdote quem o matou. Entretanto, Tongio escolheu cavalo da linhagem divina, um cavalo branco, resplandecente. Deu-lhe o nome de Dardo.A campanha contra Metelo fora rápida e decisiva.Metelo não voltaria a incomodá-los.Crisso, um dos cavaleiros de Viriato, mostrava-se irritado pois Viriato nunca se mostrava satisfeito, nem mesmo nos dias anteriores ao seu casamento.Magon, um mensageiro enviado pelo príncipe da Turdetânia informou-os de que as tropas Romanas não saiam do quartel de Inverno a não ser para patrulhas.Metelo apresentou a sua demissão. O governo da Hispânia Ulterior estava entregue a um cônsul, Quinto Fábio Máximo Serviliano (irmão adoptivo de Quinto Fábio Máximo Emiliano).As duas legiões contavam com um total de dezoito mil homens, mil e seiscentos cavaleiros e dez elefantes.Viriato ordenou que Audax, Minuro e Ditalco seguissem para a Betúria e que visitassem as cidades aliadas depois da boda.Tongio contou a Viriato que ele e Arduno tinham consultado os Presságios e que se viam maus tempos para os Lusitanos e ao que Viriato respondeu que não se anunciava uma derrota definitiva, mas sim grandes dificuldades.

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O casamento de Viriato foi um casamento digno de um grande homem, cheio de posses. No casamento, além dos maiores representantes da hoste, e dos cerca de cem convidados do lado da noiva, foram também assistir, três Romanos, da parte de Astolpas (Astolpas tinha boa relação com todas as pessoas do mundo, como parte de um bom comerciante e administrador das terras). Viriato aproveitou o momento para dirigir algumas palavras para um povo que considerava desonesto, apenas interessados nas posses e no ouro, os Romanos.O pai de Tangina ficou totalmente irritado, no entanto os Romanos não entenderam o que Viriato dissera, pois o tradutor inventara outras frases mais dignas.No fim das cerimónias e dos ritos, Viriato e Tangina abandonaram Aritum Vetus com cinquenta Lusitanos.Viriato e Tangina tiveram uma pequena festa no acampamento da hoste.Com um esforço suplementar, os homens de Viriato construíram uma casa de madeira para Viriato e Tangina, um chefe da tribo da vizinhança enviou três escravas para Tangina e embora não fosse o mais feliz para Tangina, ficar ali, nunca disse nada.Viriato treinou as suas tropas durante o Inverno, e o seu sogro visitou-o durante esses dias para o avisar que abrira as hostilidades com Roma.Receberam notícias da Bética, Serviliano chegara à Ibéria e estava em movimento com as suas legiões na direcção de Itucci.No regresso à Bética, Tangina ficou entregue ao seu pai, pois embora quisesse acompanhar Viriato na campanha, este nunca o permitiria.Esperava-os em Itucci uma guerra contra Serviliano.Viriato explicou que iriam sair de Itucci porque não queriam que a hoste Romana os cercasse.A hoste Romana que iriam defrontar contava com cerca de seis mil homens e podiam esperar elefantes.Apanharam Serviliano de surpresa e sem forma de se defender, os Romanos recuaram para um campo aberto deixando para trás centenas de mortos.Viriato e a sua hoste, pensaram que seria fácil vencê-lo, a partir daí, mas esqueceram-se dos reforços Numidas e dos famosos elefantes.Embora oferecessem batalha, a desproporção era enorme e os Lusitanos tiveram de se retirar.Viriato percebeu então que Itucci seria tomada e enviou mensageiros à cidade para que lhes dissessem que não cedessem à tomada de posso dos Romanos para evitar que mais morressem.Itucci foi então tomada pelos Romanos.Crisso foi ferido por um dardo num combate de corpo a corpo e acabou por morrer.Os homens de Conímbriga ganharam uma nova força, para vingar a morte do seu chefe.Viriato disse aos seus homens que os Romanos não eram assim tão invencíveis e usaram a mesma táctica da batalha contra Vetílio, a da falsa retirada.Os Romanos, desorientados, perseguiram-nos e outros tantos Lusitanos os aguardavam. Morreram cerca de dois mil soldados Romanos.Notícias chegaram aos Lusitanos, Serviliano saíra de Itucci, reconstituíra o exército e apressara-se a atacar as praças-fortes na Betúria.O cônsul dirigia-se agora para o Cineticum.Viriato não subestimava Serviliano e sabendo que o Cineticum estava perdido, enviou Tongio para entre Tagus e Anas para encontrar a hoste de Cúrio e Apuleio, pedir reforços e revoltas internas. Tongio e o seu corpo de homens destacado, sob ordens de Cúrio tiveram uma vitória

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contra Serviliano, mas Apuleio, motivado pelo seu ideal de batalha campal, voltou atrás acompanhado da sua hoste mas em breve ficou demasiado embrenhado e sem escape possível Cúrio e a sua hoste interferiu mas Cúrio já estava ferido.Tongio ofereceu os seus serviços como curandeiro, mas assim que viu o príncipe percebeu que nada podia ser feito. Morreu, assim que Apuleio foi ao seu encontro.Apuleio, movido pela raiva, mandou que as tropas atacassem. Este ataque foi tão inesperado que causou muitas baixas no exército do cônsul.As cerimónias fúnebres a Cúrio foram realizadas e depois de deitarem fogo ao corpo, Apuleio suicidou-se em frente à sua hoste, envenenando-se. Regressaram aos Hermínios.A hoste de Viriato continuava no mesmo local, não faltavam lenha e comida pois Astolpas viera com mil e quinhentos guerreiros e provisões colocar-se sob as ordens de Viriato.Serviliano abandonou a ‘Mesopotâmia’ porque várias cidades se tinham revoltado a favor dos Lusitanos e aniquilado as guarnições Romanas.Em conversa entre Tongio e Arduno, Arduno explica a Tongio que pensa que Viriato vai avançar com a sua hoste ao encontro de Serviliano na Primavera.Pela sua parte, Tongio, desfez-se de uma pulseira de ouro que entreguei a um sacerdote para que ele oferecesse um boi aos deuses e perguntasse o futuro do seu filho.‘A resposta foi curta e severa: a criança estava sob protecção divina e eu não devia fazer perguntas.’ in A Voz dos Deus, cap.XIV, pág.313, l.28-31

Quando a Primavera rompeu, já eles se encontravam na Bética, e souberam que Serviliano estava em campanha, esmagara Connobas, o aliado dos Lusitanos, Turdetano, e preparava-se agora para cercar Erisane.A conquista de Connobas fora decisiva. Serviliano perdoar-lhes, mas fizera corta a mão direita a todos os seus guerreiros, um gesto de crueldade gratuita, visto que o corte das mãos é praticado em quase todas as tribos Lusitanas, mas como oferta aos deuses, para que ajudem na guerra.Viriato pediu a Tongio que se disfarçasse de Romano e que fosse a Erisane para ver em que local estavam as legiões Romanas para que lhe pudessem dar a resposta merecida.Viriato ordenou então que seguissem para um vale apertado próximo de Erisane.De noite, no meio de nevoeiro, os Lusitanos foram, fazendo o mínimo barulho (levavam palha nas patas dos cavalos e iam todos em silêncio), foram até Erisane, onde prepararam uma emboscada.Quando os Romanos chegaram às portas da cidade foram completamente chacinados, e os que escaparam estavam concentrados no fundo do vale, em redor do procônsul, mas não tinham saída, Serviliano estava virtualmente em seu poder.Várias ideias foram discutidas com Viriato sobre o possível fim da restante hoste Romana e de Serviliano. Pensaram em morte, cortarem-lhe a mão, como ajuste de contas, resgate e até usá-lo como refém, mas Viriato percebeu, que assim que este não pudesse assim o comando, outro lhe tomaria o lugar, e estariam eternamente em guerra, o que não fazia sentido e não seria justo para um exército cansado.Então, libertou Serviliano e elaborou um contracto prometido aos deuses, pensou Viriato, os Romanos nunca iriam sacrificar ou irritar os seus deuses. E assim, Serviliano partiu.‘De facto, Serviliano manteve-se fiel à sua palavra. Regressou a Corduba, mandou reforçar as guarnições das suas praças-fortes, porém absteve-se de acções ofensivas – e fez mais: dois

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meses depois, enviou um mensageiro a Viriato, saudando-o como Amicus Populi Romani. O Senado retificara o tratado e a paz fora, finalmente, conquistada.’ in A Voz dos Deus, cap.XV, pág.326, l.23-28

Mas cedo se enganaram. A paz conquistada tinha sido totalmente falsa. Servílio Cepião, não perdera tempo a ocultar as suas intenções e por isso estavam a fugir na Carpatetânia.A sua esperança foi então, Popílio Lenate, governador da Citerior, pois Lenate respeitara as tréguas com Numância até receber ordens de Roma e era a eles que deviam deviam oferecer submissão.As condições de Lenate eram muito duras, exigiam a entrega de um tribuno elevado, e entrega de desertores Romanos (havia muitos na Carpetânia) e também a entrega imediata dos chefes dos contingentes da hoste como reféns. Astolpas tinha de ser entregue também, e para evitar isso, Astolpas suicidou-se.A proposta, de que se entregariam, desde que não tivessem de entregar as armas e não todos os homens pudessem regressar às suas origines seria então levada a Cepião, por Audax e os seus amigos, coisa que agradou Tongio, que nunca nutrira boas impressões desse grupo.Demoraram muito tempo para voltarem e Tongio dissera que poderiam não voltar, podiam ter passado para o lado do inimigo.Mas efectivamente, voltaram, e trouxeram com eles as notícias de que o procônsul aceitara a proposta de Viriato.No dia seguinte, toda a hoste se desintegraria, voltando à sua terra de origem. A guerra Lusitana terminara.Todos foram dormir, e no dia seguinte, quando o sol nasceu, o campo encheu-se de ruídos, todos se preparavam para ir embora. Alguns foram comentando o facto de o Comandante ainda não ter saído da tenda, então, Tongio, Táutalo e Arduno foram à tenda ver o que se passa. Perceberam então que tinham sido traídos. Viriato jazia morto, com um corte no pescoço.Depois de reunirem todo o acampamento, perceberam que faltavam Audax, Ditalco e Minuro, que tinham desaparecido, com as suas malas e bagagens.‘Os assassinos iam longe, a caminho da Bética, para reclamar a Cepião a paga do seu crime.’ in

A Voz dos Deus, cap.XVI, pág.340 l.17-18

As cerimónias fúnebres a Viriato foram as maiores alguma vez realizadas em torno de um chefe. Milhares de homens, abatidos pela enorme perda de um espectacular chefe, sempre pronto a ouvir, cumpridor da sua palavra, honesto e sensato.Táutalo, o Novo Comandante, ordenou que a hoste marchasse e retomasse a guerra contra Saguntum. A expedição contra Saguntum fracassara, como Táutalo viria a explicar a Tongio, já tinha essa noção, queria apenas que Cepião tivesse consciência que os Lusitanos ainda podiam ser incómodos, para que este aceitasse as condições impostas. Todos sabiam que nunca existiria um tão grandioso chefe Lusitano como Viriato, e substitui-lo seria impossível.Arduno morreu, por sua vontade, não queria assistir ao domínio Romano.Tongio partiu então. Andou a divagar pela Ibéria durante o primeiro Inverno e depois, decidiu que abandonaria a Ibéria. Foi para Romana e curiosamente, recebeu cidadania Romana, e viu com terror e com um certo gozo, a maneira como os deuses se abateram em Roma de uma forma vingadora.Ganhou experiência e sabedoria.Mas a voz dos deuses é que decide o destino dos homens, mesmo quando eles não lhe dão

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ouvidos. In A Voz dos Deus, João de Barros, cap.III pág.352 l.18-19

Voltou ao Cineticum, no seu sexagésimo nono ano, pois queria morrer na sua terra.Então, o deus indicou-lhe como seu novo guardião e servidor. Endovélico.‘Finalmente estou em paz com todos os homens e posso ouvir, no silêncio, a voz do Senhor Endovélico. Todas as manhãs cumpro os ritos que lhe são devidos. E não me perturba a certeza de que, muito em breve, uma dessas manhãs será a última.’ In A Voz dos Deus, João de Barros, cap.III pág.353

l.17-20

Fim

SOFIA ANTUNES , Nº 27 , 10º J

ESCOLA SECUNDÁRIA PROFESSOR HERCULANO DE CARVALHO

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