Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato...

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ANDRÉ LUIZ NOVAIS DORIA AÇÃO SOCIOEDUCATIVA COMO MEIO PARA TRANSPOR AS BARREIRAS QUE ENGENDRAM O COMETIMENTO DE ATO INFRACIONAL SÃO CRISTÓVÃO – SE 2009

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ANDRÉ LUIZ NOVAIS DORIA

AÇÃO SOCIOEDUCATIVA COMO MEIO PARA TRANSPOR AS BARREIRAS QUE ENGENDRAM O COMETIMENTO DE ATO

INFRACIONAL

SÃO CRISTÓVÃO – SE 2009

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ANDRÉ LUIZ NOVAIS DORIA

AÇÃO SOCIOEDUCATIVA COMO MEIO PARA TRANSPOR AS BARREIRAS QUE ENGENDRAM O COMETIMENTO DE ATO

INFRACIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social. Orientado pela Prof. Dra. Thereza Cristina Zavares Tanezini.

SÃO CRISTÓVÃO – SE 2009

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À minha família, pelo carinho, apoio e paciência que

possibilitaram o desenvolvimento desse trabalho, e ao meu novo

irmão, Jonathan Rabelo Maia, pela presença constante nessa

jornada.

Em memória a minha tia Marilene Machado Ferreira, que

sempre me incentivou a buscar meus sonhos.

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AGRADECIMENTOS

À Thereza Cristina Zavares Tanezini, orientadora e companheira nessa jornada,

pelas orientações coerentes e estimulantes durante a pesquisa.

Aos professores que se fizeram presentes ao longo de minha caminhada pelo

saber, especialmente as professoras Rosimeire pelo desafio lançado de tornar-me um

pesquisador, Etelvina pelo carinho e gentileza, mas, principalmente por transformar meu não

gostar em amor a temática Criança e Adolescente, materializado aqui nesse trabalho.

Ao movimento estudantil, e em especial o de Serviço Social pelo grande

aprendizado, durante o período de militância, no CASS – UFS, na gestão da CR da ENESSO,

na gestão da CN da ENESSO. As pessoas maravilhosas que entraram na minha vida nesse

período, em especial: Jonathan, Heide, Itanamara, Carol, Débora, Carla Raphaella, Ana

Márcia, Talita, Carol caloura, Celso, Nathalia, Manu minha irmãzinha, Glauber irmão e

apreciador de um W12 anos, Valdomiro (Salminho), Roberto (tróia), Charles UFES, Aline

UFES, Keiko (amante) UFES, Fabiano Guaçuí irmão da UFES, Anastácia Mariana e tantos

outros que foram e são muito importantes nesse momento. A Shis amiga sempre presente em

minha vida.

A SEMASC pela oportunidade de desenvolver este trabalho. E aos amigos de

trabalho, que me aturaram nesse último mês, e com quem tive bons momentos de

descontração, a minha amiga de infância, Alexandra, a Cristiane, Rosária pela confiança, ao

Elber e a Rosana pela alegria de sempre, as meninas do monitoramento, Dani, Lú, Paula,

Weslânia, a Albany, a Mariana, e Silvana por acreditar no meu potencial.

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“Uma atitude indagadora, prudente. Experimental, é necessária a cada momento; a cada passo, devemos confrontar o que estamos pensando e dizendo com o que estamos fazendo, sendo”. Foucault.

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RESUMO

Historicamente, os sujeitos envolvidos com atos infracionais – vítimas da sociedade

brasileira que exclui e discrimina, tinham um tratamento todo especial. O qual não tinha o

intuito de educar ou socializar, apenas de vigiar e punir o adolescente e o jovem infrator,

marcando-os com tratamentos desumanos e excludentes. Com a regulamentação do Estatuto

da Criança e do Adolescente, lei nº 8.069/90 houve uma mudança de concepção, passamos a

atuar dentro da linha da proteção integral, o Estado assume a responsabilidade de zelar pelo

desenvolvimento da criança e do adolescente, e ofertar serviços, projetos, e programas com

atendimento preferencial a estes. Diante desta perspectiva, em 2004 a Secretaria Municipal de

Assistência Social e Cidadania iniciou o processo de implementação da política de proteção à

criança, ao adolescente e ao jovem, a partir da estruturação do Sistema de Garantia de Direitos

da Criança e do Adolescente – SGD, com a organização de serviços em três eixos: Prevenção,

Proteção e Reinserção. Assim sendo, o CREAS Viver Legal tem como função a execução de

medidas socioeducativas em meio aberto, trabalhando no intuito da reinserção sócio-familiar

e comunitária. Nosso trabalho visa comprovar ou refutar a hipótese de que a atividade

socioeducativa, desenvolvida durante o cumprimento de medida, é o mecanismo de ação que

cria a possibilidade do usuário compreender a sua realidade e transpor as barreiras que

engendram o cometimento de ato infracional.

Palavras-chave: Criança e Adolescente. ECA. Ato Infracional. Medida Socioeducativa.

Atividade Socioeducativa.

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ABSTRACT

Historically, the subjects involved in infringement acts - victims of Brazilian society

that excludes and discriminates, had a special treatment. This was not the purpose of

educating or socializing, only to monitor and punish the adolescent and the young offender,

marking them with inhumane and exclusionary treatment. With the regulations of the Statute

of Children and Adolescents, Law No. 8069/90 there was a change of conception, we start to

act in the full line of protection, the State assumes the responsibility of ensuring the

development of children and adolescents, and offer services, projects and programs with

preferential service to them. Given this perspective, in 2004 the Secretaria Municipal de

Assistência Social began the process of implementation of the politics to protect children, to

adolescents and young people from the structure of the System of Guarantee of Rights of the

Child and Adolescent - SGD, the organization of services in three areas: Prevention,

Protection and Reintegration. Thus, the CREAS Viver Legal function is to the implementation

of measures childcare in middle open, working in order to re-member family and community.

Our work aims to prove or disprove the hypothesis that the activity workers, developed during

the term of measurement, is the mechanism of action that creates the possibility of the user to

understand their reality and overcome the barriers that engender the commission of an

infringement.

Keywords: Child and Adolescent. ECA. Infringement acts. Measure childcare. Activity

childcare.

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LISTA DE SIGLAS

CF88 – Constituição Federal de 1988

CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente

CREAS – Centro de Referência Especializado da Assistência Social

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

LA – Liberdade Assistida

ONU – Organização das Nações Unidas

PNAS – Política Nacional da Assistência Social

PSC – Prestação de Serviço à Comunidade

SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

SGD – Sistema de Garantia de Direitos

SUAS – Sistema Único da Assistência Social

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

1. A CAMINHO DA PROTEÇÃO INTEGRAL DE CRIANÇA E ADOLESCENTES: 13

1.1 Violência Juvenil Como Expressão da Questão Social; 13

1.2 A experiência internacional; 20

1.3 O reflexo da normatização internacional na legislação brasileira: Código de Menores de 1927 e 1979, e Política Nacional de Bem-Estar do Menor de 1964; 28

1.4 Em fim a Proteção Integral: ECA o meio para se chegar ao fim; 38

2. AÇÕES SOCIOEDUCATIVAS COMO MEDIAÇÃO PARA AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVA: 46

2.1Medida Socioeducativa a partir do SINASE; 46

2.2 História da Municipalização das Medidas Socioeducativas em Meio Aberto de Aracaju; 49

2.3 Ação socioeducativa oportunizando a um enfrentamento mais efetivo da exclusão; 56

CONSIDERAÇÕES 71

BIBLIOGRAFIA 75

APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO USUÁRIOS 78

APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO EQUIPE TÉCNICA 79

ANEXO A – DECLARAÇÃO DE GENEBRA 80

ANEXO B – CÓDIGO DE MENORES DE 1927 81

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1 - INTRODUÇÃO:

Historicamente, os sujeitos envolvidos com atos infracionais – vítimas da sociedade

brasileira que exclui e discrimina, eram tratados como caso de polícia, não tendo o intuito de

educar ou re-socializar, e sim de vigiar e punir o adolescente infrator, marcando-os com

tratamentos desumanos e discriminando-os quanto a sua classe social, encaminhado para os

pais quando rico e a reclusão quando pobre.

O objeto deste estudo é a política de assistência social, e particularmente a execução

de medidas socioeducativa em meio aberto, a prestação de serviço a comunidade e liberdade

assistida, realizada pela Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania de Aracaju,

através do Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS Viver Legal.

O trabalho investigativo enfoca a apreensão dos usuários em cumprimento de

medidas, e buscará responder ao questionamento: “como são trabalhadas as ações

socioeducativas, e até que ponto elas podem modificar a vida de adolescente em cumprimento

de medida?”.

Partindo da hipótese de que a medida socioeducativa pode ser vista como um dos

mecanismos de transformação da vida do usuário, e como ação que cria a possibilidade de

compreender a sua realidade e transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato

infracional, se conseguir inserir o adolescente e sua família na chamada rede de proteção

social, articulando políticas sociais: de assistência social, educação, saúde, trabalho, etc. Para

tanto, abordaremos aspectos relacionados à teoria, metodologia e prática usada para que se

cumpra o objetivo máster da medida socioeducativa, que é a re-inserção do usuário no seu

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meio sócio-familiar e comunitário, dando-lhe os instrumentos de compreender os aspectos

negativos e positivos deste meio.

Diante disso, abordam-se conceitos fundamentais para a temática como: ato

infracional; medida socioeducativa; prestação de serviço à comunidade; liberdade assistida;

re-socialização; re-inserção sócio-familiar e comunitária.

A temática trabalhada remete a uma importante área de atuação dos assistentes

sociais, e constituí-se como conquista dos movimentos sociais de defesa dos direitos das

crianças e adolescentes que buscavam um modelo de proteção integral, diferente do que vinha

sendo implementado – Código de Menores de 1927, Plano Nacional de Bem-Estar do Menor

de 1964, e o Código de Menores de 1979 – tornando-se possível a partir da aprovação do

Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, 1990.

Soma-se à mencionada relevância social o apreço que o pesquisador tem pela

temática, tendo sido organizador de uma publicação institucional da Secretaria Municipal de

Assistência Social e Cidadania que buscou o levantamento histórico e analítico das ações

realizadas nesse âmbito. Isso demonstra que o tema tem importância institucional, o que

motiva o aprofundamento do estudo.

No âmbito acadêmico-científico revelasse a importância deste trabalho, haja vista

que, embora a temática criança e adolescente seja alvo de inúmeros trabalhos, o acervo

nacional e local sobre medidas socioeducativas em meio aberto é uma barreira a ser superada.

O objetivo deste trabalho foi analisar o desenvolvimento das ações socioeducativas

em meio aberto no CREAS Viver Legal no município de Aracaju. Além deste teve como

objetivos específicos: historicizar a execução de medidas socioeducativas em meio aberto no

município de Aracaju; identificar as principais dificuldades da equipe do CREAS no processo

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socioeducativo; analisar as relações sócio-culturais e econômicas com a prática de ato

infracional; verificar se houve alteração nos índices de reincidência no cumprimento de

medidas socioeducativas em meio aberto.

Este estudo dialoga com a mencionada publicação da SEMASC, cuja abordagem

quantitativa estava dissociada da qualitativa. Neste segundo momento cumprisse a obrigação

de ampliar a base quantitativa e mescla - lá com uma análise qualitativa acerca das relações

proeminentes constantes nesse levantamento documental, ou seja, confrontar dados com o

contexto no qual esse adolescente encontra-se inserido a partir da sua própria ótica e daqueles

que atuavam diretamente com eles.

Esta é uma pesquisa qualitativa, e para tanto, optou-se pela utilização de amostras

não probabilísticas, tendo como universo 2 (dois) grupos, o grupo dos usuários que tem 86

(oitenta e seis) adolescentes em cumprimento de media socioeducativa em meio aberto, e o

grupo dos trabalhadores do CREAS, com 14 (quatorze) funcionários. Como amostra

intencional para o grupo dos usuários 10 (dez) adolescentes, dentre os quais 3 (três) são

reincidentes, dos quais como amostra foram 6 (seis) que compõem a equipe técnica da

instituição, Com o grupo de usuários foi utilizado ainda a técnica de observação direta não

participante. Foram aplicadas 16 (dezesseis) entrevistas semi-estruturadas individuais, com 10

(dez) usuário e 6 (seis) técnicos. As entrevistas foram realizadas em 4 (quatro) visitas durante

o mês de maio de 2009, onde pode-se também realizar o método de observação direta não

participativa, as entrevistas foram gravadas e transcritas. Os roteiros de entrevistas foram

específicos para cada um dos grupos que compõem a amostra (apêndices A e B).

Além desses aspectos abordados para a obtenção de informação proveniente do

nosso universo de pesquisa, utilizamos também a revisão bibliográfica para consolidar o

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embasamento teórico, e faremos uma releitura do trabalho anterior buscando superá-lo, na

perspectiva de trazer a tona novos elementos de análise.

Também faz parte deste processo investigativo a coletas de dados provenientes da

documentação presente na instituição, sobretudo no CREAS Viver Legal. Foram analisados

dados coletados a partir de sua classificação de acordo com as categorias, para um melhor

entendimento sobre a temática e serão utilizados ao longo da narrativa textual para confirmar

ou refutar a hipótese levantada.

A estrutura do trabalho se divide em dois capítulos, primeiro é feito uma reflexão a

cerca da violência juvenil enquanto indicador de exclusão, e enquanto expressão da questão

social, em seguida apresenta-se a normatização internacional sobre o direito da criança e do

adolescente ao longo dos anos, posteriormente tem-se a exposição dos rebatimentos da

legislação internacional a construção da legislação referente à criança e adolescentes no

Brasil, a exemplo do Código de Menores de 1927 e 1979, a Política Nacional do Bem-Estar

do Menor de 1964, aborda-se ainda o Estatuto da Criança e Adolescente de 1990, passando

pela relação com a Constituição Federal de 1988, bem como as normatizações de execução de

Medidas Socioeducativas em Meio Aberto nas vertentes do SINASE e da PNAS e suas

contradições.

No Capítulo II foi resgatado o processo de execução das medidas em Aracaju,

centrando a atenção na municipalização do serviço e retratando aspectos da concepção

adotada no período de implantação. Na seqüência foi realizada uma caracterização das

atividades socioeducativas executadas pelo Projeto Viver Legal e na análise de suas ações

balizada a partir de arcabouço teórico sobre a temática de nível nacional.

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1 - A caminho da Proteção Integral de Criança e Adolescentes:

1.1 – Violência Juvenil Como Expressão da Questão Social;

Diante de uma sociedade cercada pelas perdas de direitos, e pela redução da

intervenção do Estado como provedor do bem-estar social, onde o chamado “Estado

Mínimo”, caracteriza-se como modelo estatal desresponsabilizado de deveres, reduzido, que

tem como princípio de atuação a regulamentação para o mercado, de forma distinta ao

“Welfare State” ou “estado de Bem-Estar Social” que é intervencionista. O Estado mínimo

diminui sua carga diante das políticas sociais, preenchendo as lacunas deixadas por essa

redução com ações da sociedade civil - que passa a ser co-responsável por tais políticas. Está

claro que a noção de Estado Mínimo criado pelo modelo liberal e neoliberal, restringe o

Estado a elemento regulador do mercado e minimizador de conflitos de classes, fazendo

concessões quando necessária e retaliando quando possível o proletariado.

Além disso, o modelo de crescimento econômico – que remete ao incremento de

produção e ao acumulo de riqueza, difere de desenvolvimento, que remete a melhor divisão

da riqueza – adotado historicamente gerou nas últimas décadas, abismos sociais que são

bastante expressivos, ocasionando o aumento das expressões da questão social, que

provocam, além de outras coisas, alterações comportamentais nos indivíduos, dada a

fragilidade nas relações sociais, provenientes da sociedade capitalista que mercantiliza

diversas dimensões da vida.

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A crise atual que eclode no setor de financiamento imobiliário, e passa a ser

acompanhada diariamente pela mídia, se espalha rapidamente por toda a economia mundial,

desde setembro de 2008, inaugura uma nova conjuntura marcada pela revalorização da

intervenção do Estado para salvar as grandes empresas, mas agudiza o problema estrutural

que está no centro desta análise, evaporam-se os empregos e torna muito mais difícil a

perspectiva de acesso ao trabalho estável.

Um elemento da análise estrutural é o fato da sociedade contemporânea estar

centrada no consumo, e não na produção, e, ao contrário do processo produtivo, a atividade de

consumir é meramente individual (BAUMAN apud COSTA 2005). Contudo, apesar do

convite ao consumo através da mídia atingir a todos, as formas de acesso aos bens e serviços

se diferem, e dentro de uma sociedade marcada pela exclusão da maioria do mercado de

trabalho formal. Os indivíduos – sobre tudo os jovens – que são excluídos da sociedade, do

mercado de trabalho, tendem ser atraídos aos chamados do mundo do crime, organizado ou

não, como alternativa para participarem ativamente nesta sociedade como consumidores.

Conforme Ana Paula (2005), para se atingir os padrões que a sociedade do consumo

promove, há que se buscar os fins diretamente, significando que dentro do padrão

estabelecido de consumo, não existem regras para se alcança-los, assim, os fins justificam os

meios e ampliam-se os espaços para o crescimento da criminalidade. Portanto, a

criminalidade é produto próprio da desigualdade do consumo e do desemprego estrutural,

onde quanto mais elevada for a busca por consumidores, mais sedutora e prospera será a

sociedade de consumo, mas, teremos também uma maior distância entre os que desejam e os

que podem ter.

Costa afirma ainda que:

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Cada vez mais, ser pobre é encarado como um crime, empobrece como produto de predisposições e intenções criminosas. Os pobres, em vez de fazer jus aos cuidados de assistência, merecem ódio e condenação. Comportamentos como abuso de álcool, de jogos de azar, de drogas, assim como a vadiagem e a vagabundagem, dependendo de quem os pratica, são objetos de criminalização. (COSTA, 2005, p. 68).

A violência aparece nesse contexto como uma das muitas expressões da questão

social, pondo a prova a idéia de sociedade perfeita, livre da insegurança, e como tal, traz

consigo o sentimento de insegurança, que impulsiona a tomada de decisões e construção de

modelos de compensação ao sentimento supracitado. Quando a população reivindica e o

Estado adota como medida protetiva o uso da Força Policial Ostensiva – PM, e legitima-se o

direito do uso de violência como forma de coerção social, cada vez mais aproximando-se dos

agressores, tornando toda a sociedade violenta. Notadamente para que tal modelo de

intervenção não se confunda com uma contravenção penal, aciona-se a sociedade punitiva,

que dá ao nosso desejo de punir de forma dura cada ação criminal à que são acometidos, o

caráter legal.

A mesma autora ressalta:

Muito embora a criminalidade seja socialmente desigual na sua distribuição, o crime e o medo do crime são hoje vividos como fatos da vida moderna, características do modo de vida dos nossos tempos. Vulgariza-se, portanto, a violência das relações sociais, naturaliza-se o crime e propaga-se, enquanto solução, o apelo à ampliação do sistema punitivo, ou mesmo da privatização das soluções por meio da autorização tácita da vingança privada. (COSTA, 2005, p. 69).

A naturalização da violência faz com que os atos cometidos por adultos percam

importância midiática, notadamente tais casos não mais chocam a opinião pública, assim para

chamar a atenção da sociedade para o seu veículo de comunicação e essa oportunidade

aparece quando do cometimento de um ato infracional de gravidade por um adolescente, cria-

se então o fato, e esse é o sinal para que as atenções da sociedade punitiva se sinta no dentro

desse contexto, restando para a mesma uma única saída a “punição”. Ato infracional segundo

o art. 103 do ECA “Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou

contravenção penal”.

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Afirma ainda que:

De forma mais específica, a violência praticada por jovens é um tema cada vez mais presente e assustador na vida cotidiana e nos meios de comunicação em vários países do mundo. No Brasil, o grave momento de crise social alimenta ainda mais o temor que a população vivencia em meio a muitas formas de violência, especialmente nos centros urbanos. Nesse contexto, o alarme do crescimento do número de infrações da população juvenil e a propagação midiática deste tipo de violência geram solicitações de medidas repressivas por parte da população, que se materializam nos vários projetos de lei e de emendas à constituição que tramitam no Congresso Nacional, buscando a redução da idade de imputabilidade penal. (COSTA, 2005, p. 74)

O mito no qual a sociedade foi envolvida premeditadamente pela mídia se apóia na

distorção de dados oficiais, onde em meio estatístico isso é facilmente desfeito, bastando para

isso fazermos uma comparação como sugeri Volpi apud Costa (2005, p. 75) onde até 1997 o

número de presos adultos era de 88 para 100 mil habitantes, contra 3 adolescentes em

privação de liberdade para 100 mil habitantes, sendo que essa proporção pouco alterou nesses

últimos anos.

O mito segundo VOLPI (2008) é composto por três idéias: a) hiperdimensionamento,

que consiste em considerar que os atos infracionais praticados por adolescentes representam

parcel muito significativa dos crimes ocorridos no país; b) periculosidade, estudos apontam

que dos atos infracinais cometidos por adolescentes, apenas 3% são contra a pessoa humana;

c) irresponsabilidade penal, o desconhecimento do ECA leva a uma visão distorcida dos

avanços desta lei no concerne a proteção integral a criança e adolescentes.

André, et al afirma que :

O Brasil possui hoje 187.228 milhões habitantes e aproximadamente 32 milhões de adolescentes na faixa de 12 a 18 anos, o que representa 17% da população brasileira. Sergipe tem 1.939.426 habitantes e tem 273.812 adolescentes, o que corresponde a aproximadamente 14% da população. Já Aracaju possui uma população de 520.303 habitantes, sendo que o percentual dos jovens aracajuanos que foram encaminhados para o cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto (a Prestação de Serviço à Comunidade - PSC e a Liberdade Assistida Institucional – LAI) é equivalente a 0,18% da população jovem entre 12 e 18 anos de Sergipe. (DORIA, 2008, p. 12)

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Não se pode ignorar que a mídia brasileira tem construído uma imagem

estigmatizante e preconceituosa da população jovem presente nas faixas de pobreza das

cidades, fazendo uso de expressões cada vez mais predatórias para tratar de adolescentes que

cometem ato infracional, de forma a propagar a idéia de aumento da delinqüência juvenil e

induzir a população a reivindicar medidas repressivas, isto é, a mídia erige uma imagem da

intensificação da violência urbana1 que para a opinião pública tem como protagonistas jovens

perigosos e agressivos, cujos atos infracionais permanecem impunes.

A ação maniqueísta da mídia brasileira tem como principal objetivo convencer a

opinião pública acerca da imprescindibilidade da redução da idade de imputabilidade penal,

classificando-a como algo vital para a diminuição da violência urbana à qual se encontra

sujeita grande parcela da população que, por sua vez, contribui para acirrar o debate em torno

dessa questão. Como conseqüência, a vida desses adolescentes é submetida a um processo de

banalização, o caráter punitivo se naturaliza e justifica na medida em que, cada vez mais, são

visualizados como “culpados”, quando na verdade são “vítimas” de um país repleto de

desigualdades.

A despeito dessa visão – que tem por principal objetivo culpabilizar o indivíduo,

numa forma neo-positivista de análise – podemos notar que ao contrário do que a mídia

burguesa nos mostra, o que realmente acontece é a fragilização do meio sócio-familiar e

comunitário, fruto da forte implementação do modelo neoliberal de políticas sócio-

econômicas. Fator este decisivo para a desregulamentação da ação do Estado frente às

políticas públicas essenciais para o desenvolvimento pessoal da população no tocante à

garantia de saúde, educação, moradia, lazer, cultura, entre outros elementos necessários para

sedimentar uma vida melhor.

1 Vale ressaltar que tanto a violência urbana quanto a violência rural, que não trataremos aqui, tem como

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Segundo Rodrigues e Bosco:

Essa situação tem como raiz a concentração de renda, a falta de oportunidades de

usufruto dos benefícios trazidos pela produção econômica e avanços da ciência e da

tecnologia, a falta de qualidade e, mesmo, por muitas décadas, a inexistência de uma

rede de serviços essenciais ao desenvolvimento humano adequado (educação, saúde,

cultura, esportes, lazer). Tal situação é conseqüência da falta de igualdade entre as

pessoas, independentemente de sua condição de gênero, etnia, ou socioeconômica, e

também da precária política de segurança pública que vitimiza a população da

periferia, principalmente os jovens trabalhadores que ainda teimam em rimar

trabalho com escola (noturna), conforme atestam as estatísticas oficiais.

(RODRIGUES e BOSCO, 2005, p. 17)

A realidade da população juvenil inserida na faixa de pobreza da população brasileira

é muito crítica, a falta de políticas para a juventude, que alcance esse segmento populacional

com amplitude e efetividade, além da quase inexistência de qualidade nas políticas públicas

para os jovens e suas famílias, tem sido uma das principais causas da exposição às situações

de vulnerabilidade sócio-familiar e comunitária.

Fica claro que a violência relaciona-se diretamente com a desigualdade social, e que

a falta de perspectiva de inserção social e a negação de direitos, torna a juventude vulnerável à

criminalidade e à cooptação para atividades ilegais. Para além disso, encontramos na falta de

perspectiva a construção de uma permanente tensão, onde o jovem fica entre o “querer estar”

e a “possibilidade de estar” numa situação minimamente digna, essa tensão configura-se

como um dos motivos em que muitos jovens optam por uma via mais fácil de ascensão,

mesmo que para isso tenha que se utilizar de atividades ilegais.

Conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA recairá sobre o

adolescente infrator as sanções presentes no art. 112:

fonte de suas motivações a intensificação da desigualdade social, a fragilização dos laços familiares e comunitários entre outras expressões da questão social no Brasil.

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Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I. advertência; II. obrigação de reparar o dano;

III. prestação de serviços à comunidade; IV. liberdade assistida; V. inserção em regime de semi-liberdade;

VI. internação em estabelecimento educacional; VII. qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI;

Aos municípios cabe a execução de projetos de execução de medidas socioeducativas

em meio aberto, ou seja, a prestação de serviço à comunidade e a liberdade assistida, como

prevê o SINASE (2006, p. 35):

Aos municípios cabe: 1) coordenar o Sistema Municipal de Atendimento Socioeducativo; 2) instituir, regular e manter o seu sistema de atendimento socioeducativo,

respeitadas as diretrizes gerais fixadas pela União e pelo respectivo Estado;

3) elaborar o Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo; 4) editar normas complementares para a organização e funcionamento dos

programas de seu sistema; 5) fornecer, via Poder Executivo, os meio e os instrumentos necessários ao

pleno exercício da função fiscalizadora do Conselho Tutelar; 6) criar e manter programas de atendimento para a execução das medidas de

meio aberto; 7) estabelecer consórcio intermunicipais, e subsidiariamente em cooperação

com o Estado, para o desenvolvimento das medidas socioeducativas de sua competência.

Conforme prevê o SINASE (2006) a medida socioeducativa de prestação de serviço

à comunidade deve ser considerada como prestação de serviço de relevância comunitária pelo

adolescente, buscando uma ação pedagógica que privilegie a descoberta de novas

potencialidades, de forma a direcionar construtivamente seu futuro. Já a medida de liberdade

assistida tem como objetivo estabelecer um processo de acompanhamento, auxílio e

orientação. Sua intervenção e ação socioeducativa devem estar estruturadas com ênfase na

vida social do adolescente, possibilitando, assim, o estabelecimento de relações positivas que

é base de sustentação do processo de inclusão social deste adolescente.

Nesse contexto a execução de medidas socioeducativas em meio aberto torna-se um

desafio para qualquer gestor da Assistência Social, e como tal deve ser encarado com muita

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seriedade a fim de consolidar um projeto que possibilite uma verdadeira reintegração,

trabalhando os jovens que cometem ato infracional para a sua participação na sociedade como

ator do seu próprio desenvolvimento social, ultrapassando as barreiras pré-estabelecidas pela

sociedade punitiva e preconceituosa.

Atualmente o projeto tem contribuído, para a reintegração social de adolescentes e

jovens em conflito com a lei, por meio de atividades socioeducativas que objetivam a

construção de novos paradigmas para vida dos usuários, que perpassem pela ampliação da

gama de conhecimento e que possibilitem uma melhor convivência dentro desta sociedade

desigual. Tal perspectiva é brindada quando podemos observar resultados como o baixo

índice de reincidência. Reincidência aqui é considerada a volta do usuário ao programa após o

termino da medida socioeducativa para a execução de uma nova medida.

1.2 – A experiência internacional;

Antes de adentrar propriamente na base legal de proteção à crianças e adolescentes

no Brasil, se faz necessária um resgate aos parâmetros internacionais que serviram de subsídio

para o caso brasileiro, enfatizando os direitos de crianças e adolescentes que cometem ato

infracional.

Vale ressaltar que faremos grandes cortes temporais na história internacional.

Partiremos do ponto que consideramos um marco na construção de direitos para crianças e

adolescentes, a popularmente chamada “Declaração de Genebra” que em 1924, deu o passo

inicial no processo que assegura à humanidade a possibilidade de crianças e adolescentes

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terem acesso a direitos primordiais às suas vidas, incutindo na humanidade a necessidade de

diferir o tratamento adotado para crianças e adultos, levantando a importância de dotar a

criança de meios necessários para o seu desenvolvimento normal, protegendo-a de toda forma

de exploração.

Marcelo Gomes Silva afirma:

Um dos marcos iniciais na tentativa de garantir os direitos das crianças e dos adolescentes, no século XX, deu-se com o advento da Declaração de Genebra dos Direitos da Criança, de 26 de setembro de 1924, firmada pela então Liga das Nações e elaborada pela União Internacional para o Bem-estar Infantil, que já previa a necessidade de propiciar proteção especial à criança. (SILVA, 2008, p. 26).

Essa Declaração se torna uma referência fundamental no processo de normatização

da situação da criança, por levantar pela primeira vez a necessidade de diferenciar as ações

destinadas a esse público, e isso fica nítido quando da escrita do seu preâmbulo ao afirmar

que “a humanidade deve a criança o melhor que tem para dar [...]”. Fica claro também que os

cinco artigos que a compõem explicitam o dever de todo homem e mulher para o

cumprimento desta.

Cumpre salientar que a Liga das Nações era composta por países desenvolvidos, e

que, portanto, carregaram em si os anseios – de crescimento econômico em detrimento do

desenvolvimento – de seus países no que tange a corrente ideo-política. O que implica na

falta, por parte dos Estados nacionais, da criação de mecanismos legais e de aparatos

institucionais para viabilizar esse processo. A Declaração de Genebra constitui-se, na linha da

Doutrina de Situação Irregular, que consagra o binômio pobreza/ delinqüência, embora

reconheça que a criança delinquente deve ser tratada de forma diferenciada, buscando a sua

valorização.

Outro momento importante na construção internacional dos direitos da criança e do

adolescente é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada em 10 de dezembro de

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1948 pela Organização das Nações Unidas – ONU que veio substituir a antiga Liga das

Nações. Em seu cerne reconhece que todo ser humano – sem distinções de espécie alguma –

gozam do direito e liberdade de que essa se refere. Além de determinar no artigo 25 que: “[...]

a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou

fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social”.

Essa Declaração representa um avanço em termos de concepção política da

sociedade conclama o respeito que os Estados-Nação devem para com a mesma, como

resposta à Segunda Guerra Mundial, e aos atos desumanos oriundos deste conflito.

Um terceiro documento que merece destaque é a Declaração dos Direitos da Criança

aprovada na assembléia geral da ONU, em 20 de novembro de 1959, que contribuiu para

reforçar e ampliar as resoluções contidas tanto na “Declaração de Genebra”, quanto na

Declaração dos Diretos Humanos, especificando-as. Essa declaração conta com 10 princípios,

e clama o apoio dos pais, da sociedade, das organizações e das autoridades para que se

empenhem pela observância destes princípios, que versam sobre o direito à proteção especial,

o dever de lhes garantir oportunidades e facilidades capazes de permitir seu desenvolvimento

normal, a prioridade no atendimento em caso de calamidades, receber educação, criar-se em

uma ambiente de afeto e segurança, entre outros direitos.

Destaca-se nesta nova declaração não apenas o aumento no número de princípios a

serem observados, bem como o chamado à participação de todos os que compõem o Estado

propriamente dito (autoridades locais e governos nacionais) e a sociedade civil (os pais,

homens e mulheres, organizações). Outro ponto importante remete a ampliação do sentido de

liberdade necessário ao desenvolvimento da infância, com vistas a usufruir com felicidade dos

direitos que esta declaração lhe confere. E por fim a iniciativa de incentivar a criação de leis

específicas para a infância, que leve em consideração os melhores interesses da criança, não

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excluindo a possibilidade de construção de programas, projetos e serviços voltados para esse

fim, tornando claro o amplo papel da sociedade na consolidação de oportunidades e

facilidades para infância.

A declaração traz em seu sexto princípio o perfil de ambiente em que a criança deve

ser criada, para que lhe seja possível um desenvolvimento completo e harmonioso, conforme

citação abaixo:

Para o desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a criança precisa de amor e compreensão. Criar-se-á, sempre que possível, aos cuidados e sob a responsabilidade dos pais e, em qualquer hipótese, num ambiente de afeto e de segurança moral e material; salvo circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não será apartada da mãe. À sociedade e às autoridades públicas caberá a obrigação de propiciar cuidados especiais às crianças sem família e aquelas que carecem de meios adequados de subsistência. É desejável a prestação de ajuda oficial e de outra natureza em prol da manutenção dos filhos de famílias numerosas (Princípio 6º, Declaração dos Direitos da Criança, 1959).

O tratamento especial a que se refere este princípio, não tem construção

metodológica, deixando assim, a critério dos Estados signatário a formulação destes cuidados.

Um quarto momento importante na construção dos direitos de crianças e

adolescentes foi o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, adotado pela ONU em

16 de dezembro de 1966, traz no artigo 24: toda criança terá direito – sem discriminação

alguma – às medidas de proteção que a sua condição de menor requer por parte de sua

família, da sociedade e do Estado; ser registrada logo após seu nascimento e deverá receber

um nome; ter o direito de adquirir uma nacionalidade. O Pacto, assim como as declarações

anteriores, criam uma trincheira de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, e as

coloca em situação peculiar, de sujeitos em formação.

Em 1969 é aprovada a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, também

conhecida como “Pacto de San José da Costa Rica”, que traz em seu corpo, mais

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precisamente no artigo 19, que toda criança tem direito às medidas de proteção que sua

condição de menor requer.

Contudo, mesmo diante do estabelecimento de direitos tidos com fundamentais ao

ser humano, como compromisso dos países que compõe a ONU, e mesmo antes a Liga das

Nações, enfrentamos, ainda hoje, após sessenta e um anos, o desrespeito aos direitos de

crianças por parte dos signatários das duas declarações referidas, a exemplo dos EUA, que

deflagrou – durante o governo W. George Bush – uma série de investidas contra civis durante

as ofensivas militares no oriente médio, cometendo agressões recorrentes a Declaração dos

Direitos Humanos e, particularmente das crianças e adolescentes daqueles países

O cenário internacional que antecede a mudança de paradigmas é marcada pela crise

de acumulação do capitalismo, que na década de 70 motivou as alterações na relação capital/

trabalho, ocasionando a passagem turbulenta do padrão fordista – modelo de produção e

gestão do trabalho que vigorou antes da crise de acumulação do capitalismo – para o padrão

do toyotismo, que introduziu a gestão da acumulação flexível e seus desdobramento. No

contexto da economia política temos o neoliberalismo que evidencia o desejo de redução do

Estado como saída para a crise do capital. Esse conjunto de fatores, juntamente com a

revolução informacional, provocaram o processo de reestruturação produtiva, e outras

mudanças que acarretaram ampliação das expressões da questão social, notadamente o

desemprego estrutural e a precarização das relações de trabalho.

Esse contexto era de enfrentamento do Welfare State, que até os anos 1970 tinha

sido referência de Estado social forte na seguridade social, produzindo pleno

emprego, previdência social, saúde, assistência social, políticas públicas, direitos

sociais e maior equidade social. Com esse enfraquecimento, a crise social avança

sobre os direitos dos trabalhadores, das categorias profissionais e das geracionais,

pondo em evidência o paradigma da “proteção social” na Europa, ou da “situação

irregular” no Brasil, que tinham como inspiração o Welfare State. Mundialmente, o

paradigma menorista da “proteção tutelada” estava esgarçado pelas modificações

Page 26: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

estruturais da nova fase do capitalismo, que criticava duramente o Welfare State

enquanto Estado paternalista, assistencialista e, em seu lugar instituía o Estado

mínimo. (Op. cit., p. 33-4).

Com as Regras Mínimas das Nações Unidas Para a Administração da Justiça da

Infância e da Juventude, também conhecida com Regras de Beijing, adotadas em 29 de

novembro de 1985, pela Assembléia das Nações Unidas, tem-se então, a elaboração de

normativas para a execução processual de crianças e adolescentes, respeitando o direito a

tratamento diferenciado, pela condição especial de ser humano em desenvolvimento.

A normativa, que se constitui em grande avanço, esta dividida em seis partes: 1)

princípios gerais; 2) investigação e processamento; 3) decisão judicial e medidas; 4)

tratamento em meio aberto; 5) tratamento institucional; e 6) pesquisa, planejamento,

formulação de políticas e avaliação.

Em vários pontos as Regras de Beijing significaram avanços primeiramente por

ampliar os direitos de proteção de criança e adolescentes, em segundo lugar trás elementos

importantes para o foco deste estudo, ou seja, quando crianças e adolescentes cometem atos

infracionais, como na regra nº 7:

Respeitar-se-ão as garantias processuais básicas em todas as etapas do processo, como a presunção de inocência, o direito de ser informado das acusações, o direito de não responder, o direito à assistência judiciária, o direito à presença dos pais ou tutores, o direito à confrontação com testemunhas e a interrogá-las e o direito de apelação ante uma autoridade superior (Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude, 1985).

Por fim, reafirmam-se direitos de crianças e adolescentes, na Convenção Sobre os

Direitos da Criança, adotada em Assembléia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de

1989. Pode-se destacar que esta é a que melhor aglutinou todo o processo teórico de evolução

para a proteção integral à criança e adolescente.

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A convenção é caracterizada pela separação dos problemas sociais dos criminais, por

adotar a postura de impositiva de cumprimento das determinações de como deverão acontecer

as intervenções estatais, e das obrigações que os Estados terão diante do desrespeito aos

direitos estabelecidos a crianças e adolescentes, e determinam ainda que pra os fins desta

convenção criança são todos aqueles menores de 18 anos – o que incluem os adolescentes,

afirma ainda o dever de tratar toda criança privada de liberdade com a humanidade e o

respeito que merece a dignidade da pessoa humana, levando em conta aspectos inerentes a

sua idade e sexo.

O conjunto das normativas que apresentamos aqui é de extrema importância para o

desenvolvimento do sistema normativo brasileiro voltado para a criança e adolescente, e

como tal é imprescindível à análise conjuntural no decorrer desse processo.

Em 1990 tem se a aprovação das Orientações das Nações Unidas para a Prevenção

da Delinqüência Juvenil conhecida como (Diretrizes de Raid ou Princípios Orientadores de

Raid), que contou com a participação de uma equipe de especialistas em cooperação com o

Departamento das Nações Unidas de Viena, para construção de diretrizes que norteiam as

políticas de prevenção da delinquência.

As Diretrizes de Raid se dividem em sete partes, os Princípios Fundamentais,

Âmbito dos Princípios Orientadores, Prevenção Geral, Processo de Socialização, Política

Social, Legislação e Administração da Justiça de Menores, e Investigação, Elaboração de

Políticas e Coordenação.

Destacam-se nos Princípios Fundamentais, os itens 5 e 6 que abordam a concepção

política dessa orientação, como veremos a seguir:

Page 28: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

5. Deverá reconhecer-se a necessidade e a importância de adotar políticas progressivas de prevenção da delinqüência, de efetuar um estudo sistemático, de elaborar medidas que evitem criminalizar e penalizar um menor por um comportamento que não cause danos sérios ao seu desenvolvimentos ou prejudique os outros. Tais políticas e medidas devem envolver: a) A promoção de oportunidades, em especial oportunidades educacionais, para satisfazer as várias necessidades dos jovens e servir como enquadramento de apoio para salvaguardar o desenvolvimento pessoal de todos os jovens, em especial daqueles que se encontram manifestamente em perigo ou em situação de risco social e têm necessidade de cuidados e proteção especiais. b) A adoção de concepções e de métodos especialmente adaptados à prevenção da delinqüência e concretizadas nas leis, processos, instituições, instalações e numa rede de serviços destinada a reduzir a motivação, a necessidade e as oportunidades da prática de infrações e a eliminar as condições que dão lugar a tal comportamento: c) Uma intervenção oficial cuja finalidade primordial seja velar pelo interesse gera; do jovem e seja guiada pela justiça e eqüidade; d) A proteção do bem-estar, desenvolvimento, direitos e interesses de todos os jovens; e) A consideração de que o comportamento ou conduta dos jovens, que não é conforme às normas e valores sociais gerais, faz muitas vezes parte do processo de maturação e crescimento e tende a desaparecer espontaneamente na maior parte dos indivíduos na transição para a idade adulta; f) A consciência de que, na opinião predominante dos peritos, rotular um jovem como desviante, delinqüente ou pré-delinqüente contribui muitas vezes, para o desenvolvimento pelos jovens de um padrão consistente de comportamento indesejável. 6. Devem ser criados os serviços e programas de base comunitária para a prevenção da delinqüência juvenil, especialmente nos locais onde ainda não foram criados organismos oficiais. Os organismos formais de controle social só devem ser utilizados como último recurso (Orientações das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil, 1990).

Outro aspecto importante encontra-se no Processo de Socialização, que se torna um

diferencial, tendo em vista adotar como meta a atenção as necessidades emanantes das

famílias, tendo esta como base de socialização sem a qual o processo pode vir a falhar. A

educação como dever público, e que privilegie a promoção e o desenvolvimento de

personalidades, aptidões físicas e mentais, atividades que motivem o sentimento de

identificação e pertencimento comunitário, prestação de informação e formação profissional.

A comunidade como espaço de socialização, deve ser provida de medidas de apoio

comunitário, espaços de lazer e entretenimento que sejam um aporte aos jovens em situação

de vulnerabilidade e/ou risco social. Imprimir na Comunicação Social o papel de contribuir de

forma positiva para o desenvolvimento psicossocial dos jovens, viabilizando acesso a outras

formas de cultura que permitam acúmulo de conhecimento a cerca da sociedade, tomando

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para si a responsabilidade social inerente a sua condição de Comunicação Social. Quanto as

políticas sociais, estas devem garantir o acesso e possibilitar a alteração do status quo no qual

os jovens estejam inseridos.

Diante dessa perspectiva podemos visualizar o aprofundamento na qualidade e

quantidade de direitos que passam a ser assegurados a crianças e adolescentes, visando

possibilitar um ambiente que permita o desenvolvimento social destes.

No próximo tópico serão analisadas as transformações que ocorreram no caso

brasileiro de busca pela proteção integral à criança e adolescentes, para tanto, veremos de que

forma as mudanças de concepção internacional influenciaram e possibilitaram a melhoria na

legislação nacional.

1.3 – O reflexo da normatização internacional na legislação brasileira:

Código de Menores de 1927 e 1979, e Política Nacional de Bem-Estar do

Menor de 1964.

Antes de adentrar na legislação nacional, faz-se necessário mais uma menção a um

encontro internacional anterior as normativas mencionadas anteriormente e considerado

importante passo no processo de construção do direito da criança, o Primeiro Congresso

Internacional de Menores. Este evento que contou com a participação de vários juristas, foi

realizado em Paris no período de 29 de junho a 1º de julho de 1911, representando o ínicio de

uma nova perspectiva para a ação do jurista, que deveria atuar como um pai e um juiz de

vigilância (MACHADO, 2003).

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Com desdobramento desse congresso foi criado o primeiro Tribunal de Menores em

Illinois (EUA). O Brasil em 1923 estabelece através do Decreto Federal n.º 16.273 o primeiro

juízo de menores, situado no Rio de Janeiro, sendo este o segundo da América Latina. O

primeiro tribunal Latino-Americano foi em Buenos Aires, Argentina.

A atuação nessas instâncias segue os moldes pré-estabelecidos em Paris, que se

consagram como “Doutrina da Situação Irregular”, enraizando o binômio carência/

delinqüência, conforme afirma João Batista Costa Saraiva (2009, p. 39) “A caminhada de

proteção dos direitos da infância colocava como pressuposto a superação de garantias como o

princípio da legalidade, em face da suposta figura de um juiz investido de todas as

prerrogativas do bom ‘pater familiae’”.

Esse recorte histórico assinala a segunda etapa do direito juvenil2, a de caráter tutelar,

que teve sua origem nos Estados Unidos e se irradia pelo mundo no início do século XX

inclusive no Brasil, resultando no novo modelo da cultura de seqüestro dos conflitos sociais,

quer dizer, a cultura segundo a qual cada patologia social deveria corresponder a uma

arquitetura especializada de reclusão (MENDEZ, 1998, p. 53 apud SARAIVA, 2009, p. 38).

João chama a atenção que:

na linha deste caráter tutelar da norma, a nova ordem acaba por distinguir as crianças bem nascidas daquelas excluídas, estabelecendo uma indefinição entre a infância socialmente desvalida e a infância “delinquente”, criando uma nova categoria jurídica: os menores. (SARAIVA, 2009, p. 41).

Nesse contexto de início do século XX, marcado pela passagem do direito juvenil de

caráter penal indiferenciado3 para o de caráter tutelar adotado também no Brasil, que

estabeleceram os fundamentos da legislação de menores, onde temos como marco o Código

2 Emílio Garcia Mendez enumera que, do ponto de vista do Direito, é possível dividir a história do direito juvenil em três etapas: a) de caráter penal indiferenciado; b) de caráter tutelar; e c) de caráter penal juvenil.

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de Menores de 1927, conhecido também como Código de Mello Matos, através do Decreto

17.493-A.

No seu artigo 1º estabelece que “o menor, de um ou outro sexo, abandonado ou

delinquente, que tiver menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente

ás medidas de assistência e proteção contidas neste Código”. Ressalta-se que em um decreto

anterior de n.º 16.272, de 20 de dezembro de 1923, foi criada as primeiras normas de

Assistência Social visando a “proteger os menores abandonados e delinqüentes”, que é

caracterizado no código de Mello Matos4, como segue abaixo:

Art. 26. Consideram-se abandonados os menores de 18 anos: [...] III, que tenham pai, mãe ou tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente impossibilitado ou incapaz de cumprir os seus deveres para, com o filho ou pupilo ou protegido; IV, que vivam em companhia de pai, mãe, tutor ou pessoa que se entregue á pratica de atos contrários á moral e aos bons costumes; V, que se encontre em estado habitual de vadiagem, mendicidade ou libertinagem; VI, que freqüentem lugares de jogo ou de moralidade duvidosa, ou andem na companhia de gente viciosa ou de má vida. VII, que, devido á crueldade, abuso de autoridade, negligencia ou exploração dos pais, tutor ou encarregado de sua guarda, sejam:

3 O direito juvenil de caráter punitivo indiferente se caracteriza pela não distinção entre crianças e adultos considerando-os praticamente da mesma forma. 4 Art. 26. Consideram-se abandonados os menores de 18 anos: I. que não tenham habitação certa, nem meios de subsistência, por serem seus pais falecidos, desaparecidos ou desconhecidos ou por não terem tutor ou pessoa sob cuja, guarda vivam; II. que se encontrem eventualmente sem habitação certa, nem meios de subsistência, devido a indigência, enfermidade, ausência ou prisão dos pais. tutor ou pessoa encarregada de sua guarda; III, que tenham pai, mãe ou tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente impossibilitado ou incapaz de cumprir os seus deveres para, com o filho ou pupilo ou protegido; IV, que vivam em companhia de pai, mãe, tutor ou pessoa que se entregue á pratica de atos contrários á moral e aos bons costumes; V, que se encontre em estado habitual de vadiagem, mendicidade ou libertinagem; VI, que freqüentem lugares de jogo ou de moralidade duvidosa, ou andem na companhia de gente viciosa ou de má vida. VII, que, devido á crueldade, abuso de autoridade, negligencia ou exploração dos pais, tutor ou encarregado de sua guarda, sejam: a) vítimas de maus tratos físicos habituais ou castigos imoderados; b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensáveis á saúde; c) empregados em ocupações proibidas ou manifestamente contrarias á moral e aos bons costumes, ou que lhes ponham em risco a vida ou a saúde; d) excitados habitualmente para a gatunice, mendicidade ou libertinagem; VIII, que tenham pai, mãe ou tutor, ou pessoa encarregada de sua guarda, condenado por sentença irrecorrível; a) a mais de dois anos de prisão por qualquer crime; b) a qualquer pena como co-autor, cúmplice, encobridor ou receptador de crime cometido por filho, pupilo ou menor sob sua guarda, ou por crime contra estes (Código de Menores de 1927).

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[...] c) empregados em ocupações proibidas ou manifestamente contrarias á moral e aos bons costumes, ou que lhes ponham em risco a vida ou a saúde; d) excitados habitualmente para a gatunice, mendicidade ou libertinagem; (Código de Menores de 1927).

As medidas aplicáveis aos menores quando estes se enquadram nas condições acima

explicitadas, remetem à reclusão, e maximiza “o perverso binômio carência/ delinqüência,

que marcou, a lógica operativa deste sistema, e a resultante confusão conceitual, não

distinguindo os abandonados dos infratores, até hoje presentes na cultura brasileira, que foi o

fundamento das primeiras legislações brasileiras em relação ao Novo Direito da Criança”

(SARAIVA, 2009, p.40), são expressas no código como se vê abaixo:

Art. 55. A autoridade, a quem incumbir a assistência e proteção aos menores, ordenará a apreensão daqueles de que houver noticia, ou lhe forem presentes, como abandonados os depositará em lugar conveniente, o providenciará sobre sua guarda, educação e vigilância, podendo, conforme, a idade, instrução, profissão, saúde, abandono ou perversão do menor e a situação social, moral e econômica dos pais ou tutor, ou pessoa encarregada de sua guarda, adotar uma das seguintes decisões. a) entrega-lo aos pais ou tutor ou pessoa encarregada de sua guarda, sem condição alguma ou sob as condições que julgar úteis á saúde, segurança e moralidade do menor; b) entrega-lo a pessoa idônea, ou interna-lo em hospital, asilo, instituto de educação, oficina escola do preservação ou de reforma; c) ordenar as medidas convenientes aos que necessitem de tratamento especial, por sofrerem de qualquer doença física ou mental; d) decretar a suspensão ou a perda do pátrio poder ou a destituição da tutela; e) regular de maneira diferente das estabelecidas nos dispositivos deste artigo a situação do menor, si houver para isso motivo grave, e for do interesse do menor. (Código de Menores de 1927, grifo noso).

Essa ação acaba por contrastar com alguns dos princípios do direito, entre eles, o

direito a ampla possibilidade de defesa. Ao analisar o trecho acima podemos verificar como as

idéias e premissas provenientes do Primeiro Congresso Internacional do Menor de 1911 estão

no cerne do Código de Menores de 1927, quando, por exemplo, vemos a brecha que

representa a alínea “e”, ao possibilitar ao jurista definir outra ação não prevista pelo próprio

código.

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O Código ainda aborda outros aspectos e situações, a exemplo dos atos considerados

contravenções penais cometidos pelos menores de 14 anos de idade, ao quais seriam julgados

seguindo o exposto no artigo 68 deste:

O menor de 14 anos, indigitado autor ou cúmplice de fato qualificado crime ou contravenção, não será submetido a processo penal de, espécie alguma; a autoridade competente tomará somente as informações precisas, registrando-as, sobre o fato punível e seus agentes, o estado físico, mental e moral do menor, e a situação social, moral e econômica dos pais ou tutor ou pessoa em cujo guarda viva (Código de Menores de 1927, grifo nosso).

Nos casos em que os o adolescente se encontra-se entre 14 e 18 anos seria lhe

atribuídas as condições expostas pelo artigo 69 e seus parágrafos, como segue abaixo:

O menor indigitado autor ou cúmplice de fato qualificado crime ou Contravenção, que contar mais de 14 anos e menos de 18, será submetido a processo especial, tomando, ao mesmo tempo, a autoridade competente as precisas informações, a respeito do estado físico, mental e moral dele, e da situação social, moral e econômica dos pais, tutor ou pessoa incumbida de sua guarda. § 1º Se o menor sofrer de qualquer forma de alienação ou deficiência mental, for epiléptico, surdo-mudo e cego ou por seu estado de saúde precisar de cuidados especiais, a autoridade ordenará seja submetido ao tratamento apropriado. § 2º Se o menor não for abandonado, nem pervertido, nem estiver em perigo de o ser, nem precisar do tratamento especial, a autoridade o recolherá a uma escola de reforma pelo prazo de um a cinco anos. § 3º Se o menor for abandonado, pervertido, ou estiver em perigo de o ser, a autoridade o internará em uma escola de reforma, por todo o tempo necessário á sua educação, que poderá ser de três anos, no mínimo e de sete anos, no máximo. (Código de Menores de 1927, grifo nosso).

Já os crimes considerados graves e cometidos por adolescentes entre 16 e 18 anos de

idade, seguiriam o estabelecido no artigo 71 do código de menores, enquadrando-o no código

penal, trazendo em seu bojo uma punição severa, com possibilidades de colocá-los em

ambientes previstos para adultos, como podemos conferir abaixo:

Se for imputado crime, considerado grave pelas circunstâncias do fato e condições pessoais do agente, a um menor que contar mais de 16 e menos de 18 anos de idade ao tempo da perpetração, e ficar provado que se trata de indivíduo perigoso pelo seu estado de perversão moral o juiz lhe aplicar o art. 65 do Código Penal, e o remeterá a um estabelecimento para condenados de menor idade, ou, em falta deste, a uma prisão comum com separação dos condenados adultos, onde permanecerá até que se verifique sua regeneração, sem que, todavia, a duração da pena possa exceder o seu máximo legal. (Código de Menores de 1927, grifo nosso).

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Todas as citações do código de menores de 27 servem para confirmar as afirmações

de que, embora a promulgação deste represente um avanço no campo jurídico e na busca pelo

direito de crianças e adolescentes, o caráter punitivo foge da tão almejada compreensão da

realidade que possibilite a construção do modelo de proteção integral.

Note que, embora internacionalmente encontremos avanços significativos com a

aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, depois de um período

conturbado que durou 24 anos, aliada a posterior aprovação em 1959 da Declaração dos

Direitos da Criança da ONU – mesmo presos ao caráter tutelar – tenhamos criado o embrião

para a construção da proteção integral no final do século XX, ainda em estávamos no centro

da ação que trazia no seu cerne a idéia de incapacidade dos menores.

A idéia de incapacidade dos menores, colocados como insusceptíveis de qualquer

responsabilidade, os colocava em uma condição similar aos inimputáveis por

sofrimento psíquico, tanto que as medidas aplicáveis aos menores se faziam por

tempo indeterminado, em caráter muito semelhante à medida de segurança aplicável

aos inimputáveis por capacidade mental. (SARAIVA, 2009, p.45, grifo nosso).

A concepção apresentada na citação acima toma forma e legitima a modificação no

Direito Penal acarretando na aprovação do Código Penal de 1940, que implementa

imputabilidade penal aos menores de 18 anos, tendo como cerne deste a idéia da imaturidade

do menor.

Durante o Governo Vargas em 1942 foi criado o SAM – Sistema de Assistência ao

Menor, que tinha perfil semelhante ao do Sistema Penitenciário, com a diferença de ser

voltado para os delinqüentes e abandonados, embora estes fossem tratados sem distinções.

O início da ditadura militar traz conseqüências que vão para além das amplamente

divulgadas e já conhecidas – fim dos direitos civis e políticos – interferindo diretamente na

vida de crianças e adolescentes, ao promulgar em 1º dezembro de 1964 a Lei Federal n.º

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4.513/ 64 que cria a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor, que conforme o artigo 5º

teria “como objetivo formular e implantar a política nacional do bem-estar do menor,

mediante o estudo do problema e planejamento das soluções, a orientação, coordenação e

fiscalização das entidades que executem essa política” embora saibamos que tinha como

principal mote a substituição do Sistema Assistência ao Menor criado por Vargas em 1942,

incorporando assim todo o seu patrimônio e atribuições.

Tem-se então que o órgão nacional gestor da Política Nacional do Menor é a

FUNABEM e os órgãos executores estaduais eram as FEBEMs – Fundações Estaduais de

Bem-Estar do Menor, onde os menores eram “alvos do mais absoluto controle, ocultamento e

violência institucionalizada” (BIERRENCH et al., 1987; HERZER, 1984 apud SALES, 2007,

p. 87).

Lembremos que o caráter tutelar da legislação, que remete ao fortalecimento do

binômio carência/ delinqüência remontam ao Primeiro Congresso de Menores de 1911

mencionado anteriormente, se consolida com a introdução da Política Nacional de Bem-Estar

do Menor em 1964, e alcança seu auge com a construção do Código de Menores de 1979.

O Código de Menores instituído pela lei federal n.º 6.697/ 79 implanta no Brasil a

Doutrina da Situação Irregular5, que lança suas ações aos menores que se encontrem imerso

nas expressões da questão social.

5 Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; II - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b) exploração em atividade contrária aos bons costumes; IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;

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Movida pela Doutrina da Situação Irregular, tinha por destinatários apenas as crianças e jovens considerados em situação irregular, onde se incluíam aqueles menores em estado de necessidade em razão da manifesta incapacidade dos pais para mantê-los, colocando-os na condição de objeto potencial de intervenção do sistema de Justiça, os Juizados de Menores. (SARAIVA, 2009, p.50, grifo nosso).

O artigo 1º do Código de Menores diz que este dispõe sobre assistência, proteção e

vigilância a menores, e é sob essa égide que são extirpados direitos dos menores. Esse é a

grande problemática do código, ao atribuir a idéia de proteção e vigilância, e ao mesmo tempo

não dotar a criança e adolescente de direitos, faz com que no processo estes sejam penalizadas

por serem vítimas da situação irregular na qual o Brasil está inserido.

Ao serem atingidos pelas expressões da questão social a criança e o adolescente são

sentenciados pela Doutrina da Situação Irregular, e passíveis das ações previstas no código.

Saraiva refletindo o exposto no trabalho de Mary Beloff extraí como características

da Doutrina da Situação Irregular6:

VI - autor de infração penal. Parágrafo único. Entende-se por responsável aquele que, não sendo pai ou mãe, exerce, a qualquer título, vigilância, direção ou educação de menor, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente de ato judicial. (Código de Menores de 1979). 6 Aqui se insere as alíneas que não utilizamos na citação, mas são importantes para a compreensão da temática. a) as crianças e os jovens aparecem como objetos de proteção, não são reconhecidos como sujeitos de direitos, e sim como incapazes. Por isso as leis não são para toda a infância e adolescência, mas sim para os “menores”. b) Utilizam-se categorias vagas e ambíguas, figuras jurídicas de “tipo aberto”, de difícil apreensão desde a perspectiva do direito, tais como “menores em situação de risco ou perigo moral ou material”, ou “em situação de risco”, ou “em circunstâncias especialmente difíceis”, enfim estabelece-se o paradigma da ambigüidade. c) Neste sistema, é o menor que está em situação irregular; são suas condições pessoais, familiares e sociais que o convertem em um “menor em situação irregular” e por isso objeto de uma intervenção coercitiva, tanto dele como sua família. d) Estabelece uma distinção entre as crianças bem nascidas e aqueles em “situação irregular”, entre criança e menor, de sorte que as eventuais questões relativas àquelas serão objeto do Direito de Família e destes dos Juizados de Menores. e) Surge a idéia de que a proteção da lei visa aos menores, consagrando o conceito de que estes são “objeto de proteção” da norma. f) Esta “proteção” freqüentemente viola ou restringe direitos, porque não é concebida desde a perspectiva dos direitos fundamentais. g) Aparece a idéia de incapacidade do menor. h) Decorre deste conceito de incapacidade, a opinião da criança faz-se irrelevante. i) Nesta mesma lógica se afeta a função jurisdicional, já que o Juiz de Menores deve ocupar-se não somente de questões tipicamente judiciais, mas também de suprir as deficiências de falta de políticas públicas adequadas. Por isso se espera que o Juiz atue como um “bom pai de família” em sua missão de encarregado do “patrono” do Estado sobre estes “menores em situação de risco ou perigo moral ou material”. Disso resulta que o juiz de

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k) Estabelece-se uma indistinção entre criança e adolescente que cometem delitos com questões relacionadas com as políticas sociais e de assistência, conhecido como “seqüestro e judicialização dos problemas sociais”. l) Deste modo, instala-se uma nova categoria, de “menor abandonado/ delinqüente” e se “inventa” a delinqüência juvenil. m) Como conseqüência deste conjunto, desconhecem-se todas as garantias reconhecidas pelos diferentes sistemas jurídicos no Estado de Direito, garantias estas que não são somente para pessoas adultas. n) Principalmente, a medida por excelência que é adotada pelos Juizados de Menores, tanto para os infratores da lei penal quanto para as “vítimas” ou “protegidos”, será a privação de liberdade. Todas estas medidas impostas por tempo indeterminado. o) Consideram-se as crianças e adolescentes inimputáveis penalmente em face dos atos infracionais praticados. Esta ação “protetiva” resulta que não lhes será assegurado um processo com todas as garantias que têm os adultos, e que a decisão de privá-los de liberdade (SARAIVA, 2009, p. 53, grifos do autor).

O código já surgiu defasado, ponto que, ele nada mais é que um desdobramento da

filosofia menorista do Código de Menores de 1927. Vale lembrar que em 1979 foi

comemorado o Ano Internacional da Criança, fruto da mobilização mundial em busca de

atenção especial aos direitos das crianças e dos adolescentes, que o código posto em

aplicação não contemplado. O código foi lançado num momento de contestação e respaldado

na Política Nacional de Bem-Estar do Menor – PNBM, representava os ideais militares que

estavam em crise.

Ele não correspondia aos anseios das forças políticas, sociedade civil e nem

representava os interesses das crianças e dos adolescentes que permaneciam confinados nas

instituições totais e submetidos ao poder discricionários do Juiz de Menores. Durante a

execução do “Código de Menores, a grande maioria da população infanto-juvenil recolhida

às entidades de internação do sistema FEBEM no Brasil, na ordem de 80%, era formada por

crianças e adolescentes, “menores”, que não eram autores de fatos definidos como crime

pela legislação penal brasileira.” (Op. cit., p. 54)

Menores não está limitado pela lei e tenha faculdades ilimitadas e onipotentes de disposição e intervenção sobre a família e a criança, como amplo poder discricionário. j) Há uma centralização do atendimento.

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Notem, que a doutrina presente no código é o de “Situação Irregular”, e é partindo

desse prisma que alguns autores afirmam que este penalizava a pobreza, como mostraremos.

O Código de Menores, ao se dirigir à chamada situação irregular, tratava apenas dos

efeitos da pobreza, não se referindo a direitos e não indo nunca às causas dos

problemas sociais. E por isso era injusto, porque todas as ações incidiam sobre as

próprias crianças e adolescentes, internando-os em instituições que eram verdadeiros

depósitos de crianças pobres. Quanto aos chamados menores infratores, ao não

oferecer as garantias processuais, o Código cometia tremendas injustiças, não

distinguindo entre infrações leves e graves e deixando todas as decisões nas mãos

dos juízes. Assim, um adolescente podia ser punido mais severamente do que um

adulto que cometesse a mesma infração, podendo inclusive ser apreendido por pura

suspeição de autoria de ato infracional – e isso tudo em nome da sua proteção.

(ARANTES, 2005, p. 65, grifos nossos).

Diante disto podemos afirmar, com o auxílio de Maria Liduina de Oliveira e Silva,

que:

As críticas feitas ao Código de Menores de 1979 podem ser agrupadas em duas, que

consideramos as mais importantes. A primeira delas é que crianças e adolescentes

chamados, de forma preconceituosa, de “menores” eram punidos por estar em

“situação irregular”, pela qual não tinham responsabilidade, pois era ocasionada

pela pobreza de suas famílias e pela ausência de suportes e políticas públicas. A

segunda era referente às crianças e adolescentes apreendidos por suspeita de ato

infracional, os quais eram submetidos à sem que a materialidade dessa prática fosse

comprovada e eles tivessem direitos para sua devida defesa, isto é, inexistia o devido

processo legal. Nesse sentido era regulamentada a criminalização da pobreza.

(SILVA, 2005, p. 33, os grifos em aspas são do autor, nosso em itálico).

Na década de 1980, o surgimento de denúncias7 sobre a real situação de crianças e

adolescentes que se encontravam em estabelecimentos da FUNABEM, alimentava a crescente

insatisfação da sociedade civil e das forças políticas, culminando com a mudança de

7 Sobre as denúncias levantadas, e que posteriormente se transformou em uma Comissão Parlamentar de Investigação, encontramos um documento de raro valor que infelizmente não tivemos tempo hábil para analisar e inseri-lo neste trabalho. BRASIL. CONGRESSO. CÂMARA DOS DEPUTADOS. CPI destinada a investigar o Problema da Criança e do Menor Carentes no Brasil. A realidade brasileira do menor; relatório. Brasília, Coordenação de Publicações, 1976.

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paradigma e adoção da Doutrina de Proteção Integral pela Constituição Federal de 1988,

revogando implicitamente a legislação em vigor à época. A Carta Magna estabeleceu em seus

artigos 227 e 228 pontos específicos que abordam pela primeira vez na história brasileira, a

questão da criança como prioridade absoluta, e a sua proteção é dever da família, da

sociedade e do Estado. A nação clamava por um texto infraconstitucional consoante com as

conquistas da Carta Magna, o que veio a ser consolidado no Estatuto da Criança e do

Adolescente, através da Lei n° 8.069/1990.

1.4 – Em fim a Proteção Integral: ECA o meio para se chegar ao fim;

O Estatuto trouxe uma mudança doutrinária: abandonou o paradigma de “situação

irregular” que regia os antigos Códigos de Menores e passou a adotar a doutrina da

“proteção integral”, expressa na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito da

Criança. A doutrina da proteção integral compreende a criança como sujeito de

direitos; defende a inclusão dos direitos de crianças e adolescentes nos códigos

legislativos, e afirma ainda que esses segmentos são detentores privilegiados dos

direitos de cidadania, o que implica a discriminação positiva da criança e do

adolescente. O Estatuto reafirma os direitos individuais e coletivos assegurados na

Constituição Federal e acrescente disposições específicas que sustentam os

privilégios de toda a população infanto-juvenil, abandonando a antiga dicotomia

entre menor e crianças. (GONÇALVES, 2005, p. 37, os grifos em aspas são do

autor, nosso em itálico).

Ressalta-se que o texto da Constituição de 1988 antecipou a Convenção Internacional

de Direitos da Criança de 1989, promovida pela ONU, sendo que esta se soma outro

documento internacional: As Regras mínimas das Nações Unidas para a Administração dos

Direitos do Menores, conhecida também como regras de Beijing de 29 de novembro de 1985,

que consubstanciaram a formulação do Estatudo da Criança e do Adolescente; Como

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desdobramentos do avanço da concepção do direito institucional das crianças e adolescentes,

as Regras das Nações Unidas para a Proteção dos Menores Privados de Liberdade e as

Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil, conhecidas como

Diretrizes de Raid ambas de 14 de dezembro de 1990.

Esse conjunto de normativas internacionais superou a antiga concepção de proteção

tutelar, trazendo a criança e o adolescente para uma condição de sujeito de direitos, sendo

estes titulares de direitos e deveres próprios de sua condição peculiar de pessoa em

desenvolvimento, dando um novo contorno a justiça da Infância e juventude, abandonando o

conceito de menor.

O Estatuto da Criança e do Adolescente se assenta no princípio de que todas as

crianças e adolescentes, sem distinção, desfrutam dos mesmos direitos e sujeitam-se

a obrigações compatíveis coma a peculiar condição de desenvolvimento que

desfrutam, rompendo, definitivamente, com a idéia até então vigente de que os

Juizados de Menores seriam uma justiça para os pobres, na medida em que a

doutrina da situação irregular se constatava que para os bens nascidos, a legislação

baseada naquele primado lhes era absolutamente indiferente. (SARAIVA, 2009, 85,

grifo nosso).

Podemos afirmar que o ECA se distingue dos demais códigos principalmente em

quatros pontos: na concepção político-social implícita; na visão da criança e do adolescente;

nos mecanismo de participação; e na fiscalização do cumprimento da lei.

Quando falamos de concepção político-social implícita vemos o ECA como um

instrumento de desenvolvimento social, voltado para o conjunto da população infanto-juvenil

do país, garantindo proteção especial àquele segmento considerado de risco social e pessoal.

Quanto à visão da criança e do adolescente este o vê enquanto sujeito de direitos e pessoa em

condição peculiar de desenvolvimento. Já nos mecanismos de participação o Estatuto institui

instâncias colegiadas de participação (conselhos de direitos paritários, entre representantes do

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Estado e da Sociedade Civil), nas três instâncias da administração, e cria no nível municipal

os Conselhos Tutelares, formado por membros escolhidos pela comunidade local e

encarregados de zelar pelos direitos de crianças e adolescentes. Por fim instâncias de

fiscalização na comunidade, podendo estas utilizarem os mecanismos de defesa e proteção

dos interesses difusos e coletivos para casos de omissão e transgressões por parte das

autoridades públicas.

Ao olharmos mais profundamente para o Estatuto, veremos que ele está dividido em

dois livros, onde o primeiro tem três títulos, que perpassam pelas disposições preliminares,

direitos fundamentais e prevenção; o segundo livro traz sete títulos, que perpassam pelas

políticas de atendimento, medidas de proteção, prática de ato infracional, medidas pertinentes

aos pais ou responsável, conselho tutelar, acesso à justiça, crimes e infrações administrativas.

Analisando o Livro I com seu três títulos podemos ver que, no Título I ao abordar as

disposições preliminares o Estatuto reafirma o texto contido na atual Constituição afirma que

a lei dispõe sobre a proteção integral de crianças e adolescentes (art. 1º). E que crianças e

adolescentes gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana (art. 3º). O

dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público em garantir a

absoluta prioridade no atendimento a criança e adolescente8 (art. 4º). Seu artigo 2º do Estatuto

refere-se A sua competência em razão da pessoa: em princípio, o menor de 18 anos. Dentro

do conceito de "menor", distingue a situação da "criança" e do "adolescente", entendendo,

para os efeitos da lei, como criança a pessoa até 12 anos e adolescente aquela entre os 12 e os

8 Art. 4° É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária. Parágrafo Único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à

juventude.

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18 anos de idade. Do mencionado artigo emerge também que, excepcionalmente e quando

disposto na lei, o Estatuto é aplicável aos que se encontram entre os 18 e os 2 1 anos (p. ex.,

prolongamento da medida de internação até os 21 anos e assistência judicial - não

representação - para os maiores de 16 e menores de 21 anos, previstos nos arts. 121 e 1429 do

ECA).

Art. 121 A internação constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. § 1° Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário. § 2° A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. § 3° Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. § 4° Atingindo o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 5° A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade. § 6° Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério público. (Estatuto da Criança e do Adolescente, 1990).

O Título II que versa sobre os direitos fundamentais, como direito à vida e à saúde,

direito à liberdade, ao respeito e à dignidade, direito a convivência familiar e comunitária, do

direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, direto a profissionalização e à proteção no

trabalho e o Título III aborda a prevenção e cuidados especiais no tocante a informação,

cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos, produtos, serviços e viagens.

Ao discriminar aquilo que já foi tratado no texto constitucional, o Estatuto realiza dois movimentos. Primeiro, introduz, de maneira inédita na legislação específica os direitos de cidadania de crianças e jovens, antes tratados em outros dispositivos legais; com isso, contribui para construir no corpo social a visão da criança como cidadão a ser protegido, e não perigo a ser vigiado. Segundo, reafirma a aplicabilidade dos direitos constitucionais aos sujeitos específicos sobre os quais legisla, detalha esses direitos e as vias pelas quais eles se exercem; tornando mais consistente o próprio tecido jurídico e fortalece, para a infância e juventude, a fundamentação do direito. O efeito de fortalecimento do princípio legal a partir de sua reafirmação na legislação específica é discutido por Bobbio (1989), para quem a formulação de normas específica consonantes com a norma geral tem a propriedade de tornar ao mesmo tempo mais complexo e mais sólido o ordenamento jurídico. (GONÇALVES, 2005, p. 40, grifo nosso)

9 Art. 142 Os menores de dezesseis anos serão representados e os maiores de dezesseis e menores de vinte e um anos assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na forma da legislação civil ou processual. Parágrafo Único. A autoridade judiciária dará curador especial à criança ou adolescente, sempre que os interesses destes colidirem com os de seus pais ou responsável, ou quando carecer de representação ou assistência legal ainda que eventual.

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O Livro II é mais amplo e versa em seu Título I sobre a política de atendimento à

população infanto-juvenil, e normatiza as linhas, as diretrizes, os princípios, os regimes e a

fiscalização das unidades de atendimento. O Título II expressa os motivos nos quais as

medidas de proteção devem ser acionadas e elenca as medidas cabíveis como proteção. O

Título III aborda a prática do ato infracional, definindo o que pode ser considerado ato

infracional, os direitos individuais que são inerentes a crianças e adolescentes, as garantias

processuais, e as medidas socioeducativas aplicáveis em caso de ato infracional. O Título IV

fala sobre as medidas a que estão suscetíveis os pais e responsáveis em caso de falta, omissão

ou abuso. O Título V trata do conselho tutelar e dita o conceito do que é o conselho, quem

pode ser representante no conselho, os detalhes de funcionamento e a quantidade mínima de

conselhos, as atribuições, o processo de escolha dos conselheiros e dos impedimentos. O

Título VI dispõem sobre as garantias de acesso à justiça, das competências do juizado da

infância e juventude, do juiz da infância e da juventude, dos procedimentos jurídicos, da

perda ou suspensão do pátrio poder, da destituição da tutela, da colocação em família

substituta, da apuração de ato infracional, da apuração de irregularidades em entidades de

atendimento, da apuração de infração administrativa, dos recursos, do Ministério Público, do

advogado, da proteção Judicial do interesses individuais, difusos e coletivos. O Título VII

trata dos crimes e das infrações Administrativa, firmando os crimes em espécie.

Ressalta-se que o ECA é resultante de um conjunto de três sistemas harmônicos, que

formam o Sistema de Garantias de Direitos – SGD, e que se articulam entre si:

a) o Sistema Primário, que dá conta das Políticas Públicas de atendimento a

crianças e adolescentes (especialmente os artigos 4°, 86 a 88 do ECA)10 de

10 Art. 86 A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Art. 87 São linhas de ação da política de atendimento:

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caráter universal, visando a toda a população infanto-juvenil brasileira, sem

quaisquer distinções;

b) o Sistema Secundário que trata das Medidas de Proteção dirigidas a crianças e

adolescentes em situação de risco pessoal ou social, não autores de atos

infracionais (embora também aplicável a estes, no caso de crianças, com

exclusividade, e de adolescentes, supletivamente – art. 112, VI, do ECA)11, de

natureza preventiva, ou seja, crianças e adolescentes enquanto vítimas. Enquanto

violados em seus direitos fundamentais (especialmente os artigos 98 e 101)12. AS

I – políticas sociais básicas; II – políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitem; III – serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão; IV – serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos; V – proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente. Art. 88 São diretrizes da política de atendimento: I – municipalização do atendimento; II – criação de conselhos municipais, estaduais e nacionais dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais e municipais; III – criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-administrativa; IV – manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente; V – integração operacional de órgãos do judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilização do atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional; VI – Mobilização de opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade. 11 Art. 112 Verificada a prática do ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: VI – internação em estabelecimento educacional; 12 Art. 98 As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III – em razão de sua conduta. Art. 101 Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II – orientação, apoio e acompanhamentos temporários; III – matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômano; VII – abrigo em entidade;

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medidas protetivas visam a alcançar crianças e adolescentes enquanto

vitimizados.

c) o Sistema Terciário, que trata das medidas socioeducativas, aplicáveis a

adolescentes em conflito com a lei, autores de atos infracionais, ou seja, quando

passam a condição de vitimizadores (especialmente os artigos 10313 e 112).

Notem que o SGD presente no ECA atua de forma gradual, o sistema primário é

responsável pela prevenção, trabalhando através da aplicação de políticas públicas que dão

prioridade a população infanto-juvenil, além da execução de serviços, programas e projetos

dos quais estes são o público alvo. O sistema secundário e o de proteção e encontra nos

conselhos tutelares seu operador, responsável pela ação junto à criança, à família e à

comunidade. Já o sistema terciário é o socioeducativo, que atua junto ao adolescente que

comete ato infracional, e que supostamente atua por falha nas outra duas etapas do sistema.

O Estatuto prevê ainda, uma rede de sustentação que leva em conta, a participação da

sociedade civil na participação para a efetivação dos direitos e deveres estabelecidos neste,

para tanto, a sociedade civil pode ser executora de política específica para a população

infanto-juvenil, e deve ser parte integrante dos conselhos de direitos de forma paritária com o

Estado.

O Estatuto prevê a implantação de uma complexa rede capaz de levar a todo o território nacional as mudanças que a lei propõe. Esta rede, formada pelos Conselhos de Direitos, opera em três níveis: federal, estadual e municipal, sempre na forma paritária. Aos Conselhos de Direitos competem decisões sobre as formas de atenção à criança e ao adolescente; a eles estão subordinados programas (sua concepção e gestão) e investimentos de recursos (definição de prioridades e acompanhamento). Tem-se construído, assim, um dispositivo que penetra em todos os municípios brasileiros, com grande poder diagnóstico e político na questão social da infância e da adolescência. Vê-se, portanto, que o modelo de proteção integral – que, reafirmo, visa à organicidade entre direitos e deveres – demanda a participação do Estado e da

VIII – colocação em família substituta. Parágrafo Único. O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade. 13 Art. 103 Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.

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sociedade, construção viabilizada nos Conselhos de Direitos. (GOÇALVES, 2005, p. 42, grifo nosso).

Diante do exposto, e no intuito de consolidar os conselhos nos distintos níveis, foi

promulgada, um ano após a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei n°

8.242 de 12 de outubro de 1991, que cria o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do

Adolescente – CONANDA e deu outras providências.

O CONANDA integra o conjunto de atribuições da Presidência da República, e tem

entre outras competências – elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos

direitos da criança e do adolescente e zelar pela aplicação da política e gerir o fundo da

nacional de direito da criança e do adolescente14 (art. 2°).

Retomemos o Livro II, Título III que remete a prática do ato infracional, tendo em

vista que nos dispusemos nesse trabalho a analisar a ação socioeducativa como princípio

básico do cumprimento de medidas socioeducativas descritas nesse título.

O Título III da Lei n° 8.069 trata da prática de ato infracional por crianças e jovens, e incorpora mudanças substantivas sobre as disposições dos antigos Códigos, dentre as quais têm sido destacadas: a) acolhida ao dispositivo segundo o qual nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente (art. 106); b)

14 Art. 2° Compete ao CONANDA: I – elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, fiscalizando as ações de execução, observadas as linhas de ação e as diretrizes estabelecidas nos arts. 87 e 88 da Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); II – zelar pela aplicação da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente; III – dar apoio aos Conselhos Estaduais e Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, aos órgãos estaduais, municipais, e entidades não governamentais para tornar efetivos os princípios, as diretrizes e os direitos estabelecidos na Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990; IV – avaliar a política estadual e municipal e a atuação dos Conselhos Estaduais e Municipais da Criança e do Adolescente; V – vetado; VI – vetado; VII – acompanhar o reordenamento institucional propondo, sempre que necessário modificações nas estruturas públicas e privadas destinadas ao atendimento da criança e do adolescente; VIII – apoiar a promoção de campanhas educativas sobre os direitos da criança e do adolescente, com a indicação das medidas a serem adotadas nos casos de atentados ou violação dos mesmos; IX – acompanhar a elaboração e a execução da proposta orçamentária da União, indicando modificações necessárias à consecução da política formulada para a promoção dos direitos da criança e do adolescente; X – gerir o fundo de que trata o art. 6° desta Lei e fixar os critérios para sua utilização, nos termos do art. 260 da lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990; XI – elaborar o seu regimento interno, aprovando-o pelo voto de , no mínimo, dois terços de seus membros, nele definindo a forma de indicação do seu presidente.

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introdução do contraditório nos processos que envolvem menores de 18 anos acusados de prática de ato previsto no Código Penal ou na Lei das Contravenções Penais, permitindo ao adolescente o exercício da defesa quando acusado de infringir a lei; c) exigência da comprovação da materialidade e autoria do delito (à exceção única da advertência, para cuja aplicação se exigem provas de materialidade e indícios de autoria); d) a internação, medida que envolve a restrição da liberdade, não pode em hipótese alguma exceder o prazo máximo de três anos, e cuja aplicação está condicionada à gravidade do delito, à prática reiterada de atos infracionais graves ou ao descumprimento de medida judicial aplicada. (GONÇALVES, 2009, p. 48-9).

Neste sentido, precisamos compreender que dentro da lógica de proteção integral, a

medida socioeducativa assume o papel, ainda que receba uma carga retributiva, de se

constitui em elemento pedagógico, de modo que possa atender os adolescentes que cometem

ato infracional como pessoas em peculiar condição de desenvolvimento.

2 – Ações Socioeducativas como Mediação para as Medidas Socioeducativa:

2.1 – Medida Socioeducativa a partir do SINASE;

Embora, o Estatuto seja o elemento normativo que estabelece a aplicação das

medidas socioeducativas, não é este que formula a intervenção das unidades de atendimento

a adolescente em cumprimento de medidas. Nota-se que este se enquadra no plano jurídico e

político-conceitual, não chegando efetivamente aos seus destinatários (SINASE, 2006).

Por isso, o CONANDA e a Secretaria Especial de Direitos Humanos – SEDH/SPCA,

em parceria com Associação Brasileira de Magistrados e Promotores da Infância e Juventude

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– ABMP e o Fórum Nacional de Organizações Governamentais de Atendimento à Criança e

ao Adolescente (FONACRIAD), construíram a partir de encontros regionais, estaduais e um

encontro nacional com juízes, promotores, conselheiros, técnicos e gestores de entidades e/ou

programas de atendimento socioeducativo. O objetivo era debater a construção de lei de

execução de medidas socioeducativas da ABMP, bem como a prática pedagógica com vistas a

possibilitar que o CONANDA construísse os parâmetros e diretrizes para a execução das

medidas socioeducativas. Desse debate nasce o Sistema Nacional de Atendimento

Socioeducativo – SINASE que se constituí em um guia de execução das medidas

socioeducativas. (SINASE, 2006).

O SINASE se apresenta em nove capítulos: 1º) o Marco Situacional, que faz um

apanhado da situação de criança e adolescente no Brasil, levando em conta a prática do ato

infracional e outros fatores; 2º) Conceito e Integração das políticas públicas que trata de um

alinhamento conceitual que busca potencializar a integração das políticas públicas e seu

entorno; 3º) Princípios e Marco Legal do Sistema de Atendimento Socioeducativo que retrata

as normatizações que contribuem para a consolidação da doutrina de proteção integral de

criança e adolescente; 4º) Organização do SINASE trata dos moldes de organização do

sistema de atendimento de criança e adolescente; 5º) da gestão dos programas; 6º) os

parâmetros de gestão pedagógica no atendimento sócio educativo; 7º) aspectos arquitetônicos

das unidades de atendimento; 8º) o sistema e seu financiamento; e 9º) o processo de

monitoramento e avaliação.

Essa análise fixou-se em alguns dos capítulos do SINASE, e inicia-se pelo segundo

capítulo, que tem por intuito conceituar o sistema e consolidar a idéia presente desde o ECA

de integração de políticas públicas no atendimento à população infanto-juvenil. Observa-se

que o entendimento é de que este “é o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios, de

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caráter jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo que envolve desde o

processo de apuração de ato infracional até a execução de medida socioeducativa.” E que este

é entendido como um subsistema do Sistema de garantia de Direitos - SGD. (SINASE, 2006,

p. 22).

Pode-se notar que o SINASE se integra com o sistema de educação, de saúde, de

segurança pública e justiça, e da assistência social, sem que estes interajam entre si,

considerando, dessa forma, que o centro deste sistema é o próprio SINASE. Notem que “o

SINASE constitui-se de uma política pública destinada à inclusão de adolescente em conflito

com a lei que se correlaciona e demanda iniciativas dos diferentes campos das políticas

públicas e sociais.” (SINASE, 2006, p. 23).

Quanto à organização o SINASE traz elementos concernentes às três esferas dos

quais algumas são atribuições comuns aos três níveis, outras comuns apenas aos estados e

municípios e algumas específicas a cada esfera. Ao que cabe analisar para o trabalho é o

aspecto específico do município15, no caso de Aracaju mais precisamente o item 6, que versa

sobre a criação e manutenção de programas de atendimento para a execução de medidas de

meio aberto. Reafirma-se assim, o que já se encontra estabelecido no ECA sobre a

municipalização do atendimento a criança e adolescente (art. 88 item I).

15 Aos municípios cabe: 1) coordenar o Sistema Municipal de Atendimento Socioeducativo; 2) instituir, regular e manter o seu sistema de atendimento socioeducativo, respeitadas as diretrizes gerais fixadas pela União e pelo respectivo Estado; 3) elaborar o Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo; 4) editar normas complementares para a organização e funcionamento dos programas de seu sistema; 5) fornecer, via Poder Executivo, os meio e os instrumentos necessários ao pleno exercício da função fiscalizadora do Conselho Tutelar; 6) criar e manter programas de atendimento para a execução das medidas de meio aberto; 7) estabelecer consórcio intermunicipais, e subsidiariamente em cooperação com o Estado, para o desenvolvimento das medidas socioeducativas de sua competência.

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Dentro da perspectiva do nosso trabalho, outro ponto importante constante do

SINASE sem o qual não poderíamos de forma alguma avançar na análise, são os parâmetros

da gestão pedagógica no atendimento socioeducativo, tendo em vista que ao abordarmos o

aspecto educativo do SINASE possibilitaremos um melhor aprofundamento no debate sobre a

ação socioeducativa realizada no CREAS VIVER LEGAL.

A abordagem que é dada à gestão do parâmetro pedagógico leva em consideração a

necessidade de propiciar ao adolescente o acesso a direitos e às oportunidades de superação

de sua situação de exclusão, de ressignificação de valores, bem como o acesso à formação de

valores para a participação na vida social, contemplando assim o atendimento inicial previsto

no ECA.

2.2 – História da municipalização das medidas socioeducativas em meio

aberto de Aracaju;

A execução de medidas socioeducativas é prevista no Estatuto da Criança e do

Adolescente, promulgado em 13 de julho de 1990, sob a Lei n° 8.069, e desde então é a

prática adotada quando um adolescente comete um ato infracional, que segundo o próprio

Estatuto, é a conduta descrita como crime ou contravenção penal (art. 103). E no que

concerne ao teor conceitual, visa uma mudança de atitude em referência ao que se tinha como

ação adotada pelos códigos anteriores as crianças e adolescentes em conflito com a lei.

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Agora, o que se pretende é garantir aos adolescentes16 um tratamento digno,

respeitando seus direitos de cidadania e sua liberdade de ir e vir. O cometimento de um ato

infracional não decorre simplesmente da índole má ou de um desvio moral. A maioria

absoluta é reflexo da luta pela sobrevivência, abandono social, das carências e violências a

que meninos e meninas pobres são submetidos, ou seja, a violência juvenil é uma das

expressões da questão social decorrente da perversa sociabilidade capitalista, geradora de

profundas desigualdades alimentadas pela legislação da Doutrina da Situação Irregular que

enraíza o perverso binômio carência/ deliquência.

Garantir uma intervenção adequada da Polícia ou de quem flagrar menino(a) no

cometimento de um ato infracional não significa querer justificar sua atitude; significa

garantir-lhe um tratamento digno de ser humano que se encontra em uma situação-limite que

corrobora a sua degradação.

Diante desta nova perspectiva, que leva em consideração o direito ao processo

adequado de averiguação e de tratamento para o adolescente em conflito com a lei, adotada

desde 1990, a execução das medidas socioeducativas aqui em Aracaju ficou sob a

responsabilidade do novo Juizado da Infância e da Juventude, embora ainda seja buscada a

integração com as demais Políticas Públicas, na tentativa de garantir a execução do Sistema

de Garantias de Direitos.

Esse modelo de execução, embora confrontasse com o art. 88 do ECA que versa

sobre a municipalização do atendimento a criança e adolescentes, se mantêm inalterada até o

final do ano de 2004, quando, motivado pela construção do Sistema Nacional de Atendimento

Socioeducativo – SINASE, convoca a Secretaria Municipal de Assistência Social e

Cidadania/SEMSC – que vivia nesse ano o início da implantação do Sistema Único de

16 Aqui trata-se apenas de adolescente porque a diferenciação nas ações destinadas a crianças que cometem ato

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Assistência / SUAS, consolidado a partir da publicação da Norma Operacional Básica/ NOB-

SUAS e a Política Nacional da Assistência Social/ PNAS. Isso implicou numa reconfiguração

da execução da Política de Assistência Social no município – e a Fundação Renascer17 para

discutir a municipalização das medidas de Prestação de Serviço a Comunidade – PSC e a

Liberdade Assistida – LA, além da municipalização dos Abrigos que estavam sob

responsabilidade do Estado e que deveriam ser assumidos pelo município.

Parte desse momento a municipalização das medidas socioeducativas, quando,

inicialmente a SEMASC absorve nas suas ações a execução da PSC, criando dentro da lógica

do SUAS o Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS que trata da

execução de medidas socioeducativas, firmando um acordo entre esta e a 17ª Vara da Infância

e da Juventude de assumir logo que houvesse condições estruturais e financeira também a

medida socioeducativa de LA.

Portanto em 2005 tive início a execução da Prestação de Serviço à Comunidade –

PSC, que tinha como fluxo a apresentação do adolescente perante a 17ª Vara para que

ocorresse o julgamento da ação considerada ato infracional. Após o Juiz da Infância e

Juventude emitir a sentença de PSC, o adolescente era liberado até que o processo fosse

encaminhado ao CREAS. Quando este chegava à esta instituição, então a equipe técnica ia em

busca do adolescente, que nem sempre compareciam para a execução da medida que lhe fora

imposta.

Como se pode perceber na citação abaixo:

Ao analisarmos os dados em separado, podemos verificar que no ano 2005, [...], o percentual de conclusão foi muito reduzido, apenas 35% dos usuários concluíram medidas, 2% tiveram suas medidas extintas, 2% obtiveram suspensão das medidas,

infracional, que em geral é mandado a família com notificação, ou colocado em abrigo. 17 A Fundação Renascer que faz parte da estrutura da atual Secretaria Estadual de Inclusão e Desenvolvimento Social, é a responsável pela execução das medidas socioeducativas de internação e semiliberdade.

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enquanto 61% dos processos continuaram em aberto – ou pelo não comparecimento para o cumprimento da medida socioeducativa, ou permaneceram cumprindo a medida até o ano seguinte. Consideramos que o modelo de fluxo adotado à época pode ter sido o grande motivador deste baixo índice de conclusão, tendo em vista que no ano de surgimento do Projeto Viver Legal, os usuários só eram encaminhados ao Projeto após o envio do Processo por parte da 17ª Vara, o que ocasionava o baixo comparecimento por parte dos usuários. Aliado a isso, podemos inferir que a metodologia adotada no período em questão também contribuiu para a não conclusão ou afastamento do jovem em cumprimento de medida, uma vez que no ano de 2005 a única modalidade de medida socioeducativa aplicada era a Prestação de Serviço à Comunidade – PSC. (DORIA, et al, 2008, 24-5).

No ano 2006 temos a aprovação do Projeto Viver Legal18 junto a Secretaria Especial

de Direitos humanos – SEDH/PR, o que possibilitou uma melhor adequação estrutural e um

aporte financeiro que foi traduzido no início da execução da medida socioeducativa de LA. A

partir desse momento temos mudanças concretas no que concerne à metodologia aplicada

para a execução de medidas socioeducativas de meio aberto, assinalando melhoria no índice

de conclusão, como podemos observar na análise do mesmo autor.

Em 2006, identifica-se um movimento ascendente no percentual de conclusão das medidas socioeducativas que atinge 68%; ocorre também um aumento da suspensão de medidas, que alcança um percentual de 8%, maior pico no período 2005-2007. Vale destacar que, a partir março de 2006 houve um acréscimo nas medidas socioeducativas com a implementação da Liberdade Assistida – LA. (Op. cit., p. 25).

Vale ressaltar que esse período é envolto também pela construção do SINASE, que

influencia diretamente o modo de pensar e executar as medidas socioeducativas, no âmbito

municipal, principalmente pela noção diferenciada que passa a permear a ação pedagógica

desse processo.

Com a alteração no fluxo, que ocorre em 2007, o adolescente passou a ser

acompanhado pela equipe técnica do Juizado da 17ª Vara da Infância e Juventude logo após

receber a sentença de PSC ou LA, diminuindo, assim, o índice de processos que continuaram

sem conclusão.

18 O nome Viver Legal passou a fazer parte da nomenclatura do Centro de Referência Especializado da Assistência no momento da aprovação do Projeto pela SEDH/PR.

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No ano de 2007, a mudança no fluxo – o usuário passou a ser conduzido ao Projeto Viver Legal logo após a audiência, independente do prazo de envio do processo – possibilitou uma maior agilidade no encaminhamento e início do cumprimento das medidas, o que se reflete no aumento do percentual relativo à conclusão das medidas socioeducativas, que atinge 81%, [...]. (Op. cit., p. 26).

Em nossa avaliação, as mudanças possibilitaram um maior grau de conclusão das

medidas, o que não remete a qualidade dessa execução, entretanto, nos chama a atenção que a

percepção da equipe técnica possibilitou as alterações de fluxo e metodologia de atendimento,

tornando as ações socioeducativas mais eficientes.

A nova pesquisa documental realizada em 2009 junto aos arquivos do CREAS Viver

Legal evdenciou que o número de processos enviados pela 17ª Vara, vem decrescendo em

comparação aos anos anteriores, o que permitiu questionar o real motivo para tanto, durante

as entrevistas com um membro da equipe técnica do CREAS. Foi respondido que isso se deve

as constantes mudanças no corpo do Juizado da Infância e Juventude, causando

descontinuidade no desenvolvimento dos processos em trâmite por esta Vara. Essa quebra de

continuidade implica não só na redução de encaminhamentos ao CREAS, mas também, numa

modificação na concepção dos encaminhamentos que devem ser tomados, haja vista, que até o

novo Juiz ganhar ritmo e compreensão da dinâmica desta Vara, leva tempo, o que para o

adolescente é inquietante, tendo em vista a não resolução de sua situação conflitante com a

lei.

Para facilitar a análise, mostraremos no gráfico 1, seguinte o comparativo dos tipos

versus a quantidade de processos encaminhados nus últimos 04 (quatro) anos:

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Gráfico 1. O gráfico referente a 2005/2007 foi extraído de (DORIA et al, 2008, p. 32). Os dados referentes a 2008 foram fornecidos pelo CREAS Viver Legal durante o trabalho de campo de maio de 2009.

Levando em conta que no ano de 2005 a única medida executada pelo CREAS era a

PSC, podemos notar que nos três anos seguintes houve quedas significativas no

encaminhamento deste tipo de medida socioeducativo. Considerando, ainda, que esta

modalidade de medida é usualmente sentenciada a adolescentes que comentem ato infracional

de baixa gravidade, entretanto, como não há nenhuma gradação para balizar a sentença, pode-

se inferir que as constantes mudanças influenciaram no discernimento do índice de gravidade

do ato infracional, ocasionando outras sanções para o cometimento do mesmo ato infracional.

Outro movimento decrescente encontra-se na modalidade de medidas casadas19,

onde, embora a queda não seja tão expressiva quanto à da modalidade PSC, pode representar

um avanço, se tomarmos por base o princípio de alta gravidade para que esta medida seja

aplicada. Isso significaria uma queda no grau de gravidade dos atos infracionais, cometidos

pelos adolescentes – sempre lembrando que, como esses aspectos não estão no cerne do nosso

trabalho, identificamos estas análises como hipotéticas, haja vista a falta de elementos de

comprovação neste trabalho.

19 Nomenclatura utilizada quando da sentença de duas modalidades de medidas são aplicadas ao mesmo adolescente, para cumprimento concomitante, nesse caso PSC e LA.

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Já no encaminhamento da modalidade de LA encontramos um movimento em forma

de “V”, que em estatística representa um dado que perde força em um determinado momento,

para logo em seguida voltar a ganhá-la. Nesse caso específico, podemos colocar as alterações

na conta das mudanças que fizeram parte da realidade do Juizado da 17ª Vara da Infância e

Juventude. Notem que partimos do princípio da inexistência de uma gradação de medidas

estabelecida como regra, o que pode ocasionar entendimentos diversos sobre a modalidade

aplicável a determinado ato infracional ou contexto.

O gráfico 2 apresenta na seqência análise comparativa entre o número de processos

enviados pela 17ª Vara Civil, do Juizado da infância e Juventude, e o número de conclusão

das medidas.

Gráfico 1. O gráfico referente a 2005/2007 foi extraído de (DORIA et al, 2008, p. 32). Os dados referentes a 2008 foram fornecidos pelo CREAS Viver Legal durante o trabalho de campo de maio de 2009.

Como se pode observar, ele retrata os altos e baixos, tanto no envio, quando na

conclusão, sendo que os motivos são distintos. Enquanto o envio de processo é decorrente das

constantes mudanças no juizado, o freio na crescente conclusão dos processos pode ser

encarado como o encrudecimento da drogadição em Aracaju, fato esse que dificulta o

desenvolvimento das atividades socioeducativas e seus resultados.

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2.3 – Ação socioeducativa oportunizando um enfrentamento mais efetivo da

exclusão;

Uma proposta socioeducativa tem fins protetivos e educacionais. Conjuga, em sua ação, objetivos que promovam a sociabilidade como forma intencional de assegurar a proteção necessária para cidadãos que se encontram em condição de vulnerabilidade social. As ações socioeducativas buscam fomentar a colaboração e o espírito de solidariedade entre os participantes. Em outras palavras, pretende-se conhecer a criança, o jovem, suas famílias e as práticas culturais mais sutis de sua comunidade, de forma a fortalecer as formas de interação entre os grupos, tomando como instrumentos o exercício da oratória (fala), a interpretação lingüística (escrita e leitura) e as expressões culturais (artes ciências, plásticas, dramaturgia, musical, instrumental) para então proporcionar o surgimento de uma interface entre senso-comum e senso-crítico. (BARRETO, et al, 2008, p. 19).

Essa idéia comunga com os ideais presentes no SINASE, onde o atendimento

socioeducativo esta estabelecido em doze diretrizes que versam sobre a prevalência da ação

socioeducativa sobre os aspectos meramente sancionatórios; tendo o projeto pedagógico como

ordenador de ação e gestão do atendimento; contando com a participação do adolescente na

construção, no monitoramento e na avaliação das ações socioeducativas; respeitando as

singularidades do adolescente; presença educativa e exemplaridade como condições

necessárias na ação socioeducativas; exigências e compreensão como elementos primordiais

de reconhecimento e respeito ao adolescente; diretividade no processo socioeducativo;

disciplina como meio para a realização da ação socioeducativa; horizontalidade na

socialização das informações; organização espacial e funcional que garantam possibilidades

de desenvolvimento pessoal e social para o adolescente; diversidade étnico-racial, de gênero e

de orientação sexual norteadora da prática pedagógica; participação efetiva da família e

comunidade; preservando a formação continuada dos atores sociais.

Nesse sentido em seu Relatório anual de 2007, o Centro de Referência Especializado

da Assistência Social – CREAS relata o desenvolvimento das seguintes ações:

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Acolhimento – é o primeiro contato mantido com o adolescente e seus familiares, após o encaminhamento do Juizado. Neste momento, é realizada a entrevista social. Atendimento Psicossocial e Jurídico – procedimento técnico normal ou específico, realizado durante todo o processo de cumprimento de medida aos adolescentes e seus familiares. Acompanhamento – procedimento técnico contínuo e específico, desde o primeiro momento até o término da medida, podendo incorrer num estudo de caso. Encaminhamento – No processo de atendimento e acompanhamento é identificado o tipo de medida a ser cumprida (PSC e LA), bem como as necessidades apresentadas pelo adolescente. Visitas domiciliares – procedimento técnico utilizado para convocação, identificação da situação sócio-familiar do adolescente, assim como o motivo de sua ausência no cumprimento de medida. Visita institucional – procedimento utilizado para acompanhamento dos jovens no cumprimento de medidas nas instituições, assim como verificar a situação escolar dos mesmos e viabilizar parcerias para tratamento de drogas, inserção no mercado de trabalho e em cursos profissionalizantes. Oficinas de Arte Educação – as oficinas desenvolvidas no CREAS, por exemplo, de Informática, Música, Customização entre outras, são prioritariamente oferecidas aos adolescentes que participam do Projeto Viver Legal e, estendidas à comunidade local, conforme o número de vagas disponíveis. As atividades socioeducativas – consistem em um instrumento operacional utilizado para desenvolver ações dinâmicas e educativas, devidamente planejadas para determinado fim. São diversas as metodologias a serem utilizadas, pois a participação dos adolescentes é fundamental. Orientação Pedagógica – é uma atividade de cunho pedagógico educacional, voltado ao atendimento de jovens e adolescentes do projeto que não estejam freqüentando a escola e/ou tenham dificuldade na escrita e na leitura. Oficina de Apoio Familiar – a participação da família envolve a co-responsabilidade e o fortalecimento dos vínculos familiares. Desde o primeiro momento, a família é convocada a acompanhar o cumprimento das medidas, não só quando solicitada, mas também nas reuniões mensais que são distribuídas em dois dias, para facilitar a participação dos familiares. Cursos profissionalizantes – ofertados aos adolescentes do projeto, com a proposta de capacitação e qualificação para o mercado de trabalho e/ou totalmente abertos à comunidade, adolescentes e seus familiares, em parceria com instituições públicas e privadas. Elaboração do Plano de Atendimento Individual – PAI, plano este de extrema importância para o acompanhamento do desenvolvimento do adolescente durante o cumprimento da medida, pois traça um perfil minucioso do mesmo. (Relatório Anual do CREAS Viver Legal 2007).

As ações desenvolvidas a partir do acolhimento do adolescente, até a conclusão das

medidas, têm como objetivo refletir junto ao adolescente sobre a perspectiva de vida com

garantia de direitos, responsabilidades no cumprimento de deveres e a construção de

projetos de vida. Nesse processo, a participação da família é fundamental, por isso nos

encontros mensais, busca-se fortalecer os vínculos familiares, a partir do apoio e orientação

aos seus membros. A diversidade dos casos exige que o planejamento das atividades atenda

aos interesses dos adolescentes e que a rede sócio-assistencial funcione a contento para

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atendimento e tratamento dos dependentes químicos, sendo este o maior desafio no

acompanhamento dos adolescentes no cumprimento de medidas sócio educativas. Por

conseguinte, para repensar as ações e imprimir maior qualidade aos serviços prestados, é

fundamental conhecer os adolescentes atendidos e o alcance da violação dos seus direitos,

com vistas a planejar soluções alternativas e contribuir para a promoção de mudanças efetivas

na vida dos adolescentes atendidos pelo Projeto Viver Legal.

Temos assim a efetivação de parte considerável das diretrizes estabelecidas pelo

SINASE, contudo, o CREAS ainda carece de Projeto Pedagógico específico para o

atendimento de adolescente em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto.

Desde a sua criação o que tem sido utilizado para se pensar as ações socioeducativas, são as

diretrizes que constituem o ECA, assim como, a grosso modo, as temáticas transversais que

norteiam ao atendimento a famílias, crianças, adolescentes e idosos na perspectiva da PNAS,

encontrando aporte para a construção pedagógica, principalmente, no próprio contato com

adolescente no dia-a-dia, observando as demandas que são levantadas e usando o bom senso

da equipe técnica para a execução destes.

Diante da perspectiva de verificar a efetividade do desenvolvimento das ações

socioeducativas na mediação com as medidas socioeducativas, os roteiros disitintos de

entrevistas (apêndice A e B) junto a dois grupos distintos, o grupo do corpo técnico da

instituição, composta por: 1 Coordenadora, 2 Assistentes Sociais, 2 Psicólogas e 2

Educadoras; e o grupo de usuários formado por 10 adolescentes sendo que 3 deles

reincidentes.

Buscou-se na entrevista semi-estruturada avaliar junto ao corpo técnico questões

pertinentes à concepção teórica que baliza a construção das atividades socioeducativas, e

junto aos adolescentes que cumprem medidas, compreender como a execução dessas

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atividades interage com a sua vida, ou seja, se dão subsídios para que eles entendam o

contexto em que estão inseridos, e se ampliam a capacidade de refletir e agir em função da

retomada ou de novos projetos de vida, possibilitando mudanças efetivas.

O roteiro para o corpo técnico é composto por 20 (vinte) perguntas (apêndice B)

abertas e fechadas, embora mesmo nas perguntas fechadas tenha sido criada a possibilidade

de uma incursão subjetiva, visando o aprofundamento da análise qualitativa. As perguntas

estão dispostas em dois grandes blocos que objetivam possibilitar um melhor entendimento

sobre o processo de construção das atividades, e a participação dos usuários no

desenvolvimento das atividades e seus reflexos.

Diante das respostas foi possível construir o perfil dos cargos ocupados,

determinando quais as atribuições de cada um. Sendo assim, o cargo de assistente social tem

como atribuições desenvolver acolhimento, acompanhamento, visitas domiciliares e

institucionais, realizar encaminhamentos, reuniões, atendimento individual ao adolescente e a

sua família, atendimento junto com a psicóloga, no atendimento psicossocial e no trabalho

com os egressos. O cargo de psicóloga tem como atribuições o trabalho de escuta, o

acolhimento, trabalho em grupo, acompanhamento, relatório, atendimento psicossocial e

encaminhamentos. O cargo de educador social tem como atribuições estar à frente das ações

socioeducativas e acompanhar as atividades. Já o cargo de coordenação tem como atribuições

a gerência das ações desenvolvidas no CREAS, a articulação com outras instituições em

busca de parcerias, orientação aos profissionais que compõe a equipe técnica e aos

profissionais responsáveis pelas ações administrativas da instituição.

Dentro do primeiro grande bloco, foi perguntado se há projeto pedagógico na

instituição, e tivemos quase na totalidade a afirmativa de que este se encontra em processo de

construção, reconhecendo-o como instrumento de importância para o desenvolvimento das

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ações, entretanto, levantaram que o modelo de construção das ações perpassa pela

participação coletiva, inclusive ouvindo os adolescentes prioritariamente, e adequando,

quando necessário, as ações ao contexto destes. Todavia, boa parte da equipe demonstrou

desconhecer o instrumental desenvolvido para traçar diretrizes das atividades socioeducativas

no município de Aracaju (BARRETO et al, 2008), muito embora, esta por ser uma obra

voltada inicialmente para proteção social básica não atende às necessidades específicas do

contexto de média complexidade, exigindo desdobramento. Foi recorrente a afirmativa de que

enquanto o projeto pedagógico não está pronto, estes se utilizam das normatizações nacionais

como PNAS e SINASE, como confirma a fala transcrita a seguir:

“O que norteia a gente tem a política, agente tem o SINASE que norteia, e temos o trabalho que a gente faz aqui, que de acordo com as demandas que vão surgindo, vai norteando os caminhos a serem seguidos, que apesar de serem todos adolescentes em conflito com a lei, mas tem as singularidades, tem as diferença, cada um com as suas particularidades, e às vezes a gente vai norteando de acordo com as demandas que eles têm, mas a gente tem norteado com através do SINASE, da política nacional. [...] um projeto pedagógico próprio do Projeto Viver Legal hoje nós não temos, testado, debatido, definido, estruturado ainda não temos, mas estamos trabalhando nele.”

Outro ponto fundamental para a análise perpassa pela existência de planejamento e

avaliação das atividades socioeducativas, assim como as demais atividades executadas pelo

CREAS, e o que se observar é que estão estabelecidos como açõe institucional as reuniões

semanais, que possibilitam uma avaliação acerca da execução do planejamento mensal,

derivando daí ajustes necessários ao contexto do adolescente.

No que diz respeito às atividades desenvolvidas, os entrevistados afirmaram que as

ações socioeducativas são desenvolvidas através de oficinas que abordam diversas temáticas,

dentre as quais: violência, sexualidade, drogadição, família, cidadania, direitos etc.;

trabalhadas através de atividades lúdicas, utilizando músicas e vídeos; atividades externas;

jogos educativos, apoio pedagógico entre outros mecanismos de trabalho em grupo.

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Quanto aos objetivos a equipe técnica tem clareza do objetivo das ações

socioeducativas na execução das medidas de meio aberto, mostrando uma abordagem

conceitual uniforme. Principalmente no que concerne às diretrizes contidas no SINASE, haja

vista que

As ações socioeducativas devem exercer uma influência sobre a vida do adolescente, contribuindo para a construção de sua identidade, de modo a favorecer a elaboração de um projeto de vida, o seu pertencimento social e o respeito às diversidades [...], possibilitando que assuma um papel inclusivo na dinâmica social e comunitária. (SINASE, 2006, p. 52).

A sintonia entre a documentação de referência e o discurso da equipe técnica é

demonstrada pela declaração de um dos seus membros da equipe na transcrição abaixo.

“As ações socioeducativas visam exatamente fazer com que os adolescentes reflitam sobre a condição deles naquele momento, no momento em que ele entra aqui, no momento em que ele está participando das atividades, e até o momento em que ele chega a um ponto, quando ele entra aqui a sério, sem nenhuma perspectiva de vida fazer com que ele saia com algum projeto de vida, querendo alguma coisa, [...] então dentro do objetivo que você perguntou, é exatamente isso que se propõe as atividades e as oficinas que são realizadas aqui, fazer com que o adolescente sinta vontade, de que sua auto-estima, não é que ele tenha perdido, mas que seja burilada que ela volte a fazer parte do dia-a-dia dele, que ele se sinta um cidadão, que ele tome gosto, e que ele saiba que ele pode consiga alguma coisa na vida, que ele não é um ser marginal, não porque ele fez um deslize, ele é uma pessoa igual a todos nós, só que aconteceu isso na vida dele, e não é porque isso aconteceu que ela vai regredir, a gente [quer] que ele progrida e tenha um projeto de vida, busque alguma coisa pra melhorar de vida.”

O segundo bloco de perguntas que versa sobre a relação da equipe técnica com os

adolescentes, e aborda a percepção de mudança nos mesmos por parte da equipe técnica.

O primeiro destaque desse bloco vai para a forma como todos da equipe técnica

tratam os adolescentes, sempre com muito respeito e carinho, como se depreende das falas e

foi corroborado pela observação direta do cotidiano institucional nas quatro visitas realizadas

ao longo de 2 semanas. Essa postura não elimina a firmeza impondo os limites necessários

para o seu desenvolvimento normal, mas nunca os diferenciando, discriminando ou olhando

para eles de forma preconceituosa.

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“Eu me relaciono bem, sabe, eu vejo assim angustiante, porque às vezes eles depositam na gente uma confiança tão grande e que a gente vai poder dar conta das demandas, das necessidades deles, e acaba às vezes a gente termina por não conseguir muitas vezes isso, mas eu, a minha relação com eles é muito boa, eu vejo como uma coisa muito positiva, eles me ajudam muito e eu acredito que eu também contribuo bastante, então é uma relação afetiva bem gostosa de se trabalhar.”

A forma afetuosa com que eles são tratados também é destacada de modo geral nos

depoimentos dos adolescentes.

Quanto à participação dos usuários nas atividades, essa é considerada boa, levando

em conta sempre a dificuldade que é o trabalho com adolescentes por conta da hiperatividade,

como se vê na fala seguinte:

“Eles comparecem às atividades, às vezes você recebe um grupo que participa bastante, que questiona, que corre, que participa; às vezes eles estão apáticos ali e não querem participar, o meio de participar deles é estar ali no grupo isolado, então a gente percebe que o adolescente é muito, [...]tudo dele tem que ser muito imediato, então aquela às vezes de muita conversa, pra chegar e tocar nele é muito complicado, então a participação deles depende muito das atividade que esta sendo realizada, mesmo que a atividade que está sendo realizada seja uma demanda daquilo que eles necessitam, a gente percebe que eles se sentem muito acanhados em participar [...]. Mas depende muito das atividades pra eles estarem participando [...] mas eu acho que os efeitos esperados e propostos são atingidos na maioria das vezes.”

A drogadição é outra das dificuldades citadas, e esta pode ser considerada um dos

maiores problemas, que interferem diretamente no desenvolvimento das atividades

socioeducativas, e que foge ao controle da equipe técnica, restando a estes a esperança de

mudar o quadro com a determinação e empenho no exercício de suas atribuições.

“Preconceito, tráfico, preconceito, a falta de escolaridade deles, a falta de interesse de voltar para escola, o uso da droga, principalmente o uso do ‘CRACK’, […] a gente corre atrás de um curso, de um emprego, mas a gente se esbara na questão [do] perfil desses adolescentes, então a gente vê o preconceito, discriminação, a falta de escolaridade, […] e o uso da droga, são os entraves de se atingir o objetivo das medidas que é de reinserção a comunidade, a escola, ao trabalho, agente encontra muito empecilho pelo preconceito.”

Outro ponto importante desse segundo bloco de perguntas, diz respeito a percepção

da equipe técnica quanto a mudança comportamental do adolescente, durante o processo de

execução da medida socioeducativa.

Page 64: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

Há que se destacar o grande investimento que a SEMASC tem feito na capacitação

do seu corpo de trabalhadores (SILVA, 2008), fator amplamente reforçado durante a

entrevista com os técnicos, quando perguntados sobre a participação em reciclagens e/ou

capacitações, sendo levantado também, que esse fator tem ajudado de forma decisiva na

melhora da intervenção destes profissionais junto aos usuários.

A análise das entrevistas com os adolescentes que cumprem medidas socioeducativa

em meio aberto, refere-se a uma amostra de 10 (dez) adolescentes num universo de 86

usuários (representando 11,62 % deste total). É relevante destaca que os entrevistados situam-

se os 3 (três) únicos reincidentes que estão em cumprimento de medidas socioeducativa. Seus

depoimentos possibilitam uma melhor compreensão sobre como se dá interação com as ações

socioeducativas desenvolvidas pelo CREAS Viver Legal, do ponto de vista do usuário, que,

em geral apresentaram proximidade com a visão da equipe técnica.

O roteiro é composto de 25 (vinte e cinco) perguntas (apêndice A) seguindo a mesma

lógica utilizada anteriormente na entrevista da equipe técnica, sendo que este dividido em 3

(três) blocos, levantando no primeiro dados referentes ao perfil sócio-econômico e cultural, à

relação familiar e comunitária com a intenção de facilitar a análise desta expressão da

questão social. O segundo bloco refere-se ao cumprimento de medidas e no terceiro às

atividades socioeducativas para que assim possamos ter subsídios suficiente para dar

sustentação a nossa hipótese.

O perfil sócio-econômico e cultural dos adolescentes que compuseram a amostra

mostra que: pudemos identificar que: 90% a quase totalidade. Essa discrepância pode ser

reflexo das distintas formas de lidar com o período de transição que é a puberdade; enquanto

os homens tendem a tentar se auto afirmar como ser viril, as mulheres encontram-se mais

cedo com a maturidade.

Page 65: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

Com relação à situação de moradia focando a relação familiar a maioria 60% mora

apenas com a mãe, 20% não mora com os pais, 20% mora com os pais. Isso reflete as tensões

existentes no meio intra-familiar e interfere diretamente no comportamento do adolescente,

por fugir do desejado “perfil harmônico para o seu completo desenvolvimento”.

A respeito da escolarização a maioria absoluta 80 % está em séries iniciais do ensino

fundamental, e somente 20% no ensino médio. O baixo índice de escolaridade, tem

interferência direta com as possibilidade de acesso ao trabalho, mas também em alguns casos,

reflete a necessidade de uma dupla jornada, entre trabalho e escola o que acaba por afastá-los

desta última.

Quase todos os entrevistados 90% não trabalham. Essa grave situação sócio-

econômica é reflexo não só da baixa escolaridade, como também das constantes mudanças no

mundo do trabalho na contemporaniedade, mudanças que extinguem vagas para o trabalho, e

aumentam as filas de busca pelo trabalho, quanto o tempo referido para obtê-lo, além do

número crescente dos que jamis conseguirão (desemprego estrutural), fortalecendo o

capitalismo e intensificando as dificuldades impostas ao trabalhador.

Estes números reforçam a tese levantada por COSTA (2005) que, entre os

adolescentes das classes populares, a família, o Estado e a comunidade não têm conseguido

exercer seu papel protetivo, por isso os mesmos convivem com a falta de perspectivas de

integração social ou constituição de um projeto de vida, contribuindo para que alguns apelem

para a prática de atos infracionais, se envolvam com o mundo do uso e/ou tráfico de drogas,

que lhes oferece vantagens simbólicas não obtidas em outros meios sociais, tais como status,

auto-estima e virilidade.

Page 66: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

No segundo bloco foi abordada a relação sócio-familiar e comunitária, enfocando os

vínculos interiores das famílias perpassando ou não pela drogadição e violência. Ao serem

perguntados sobre como é a relação deles com a família, a totalidade dos entrevistados

afirmou manter um bom relacionamento com a família, embora demonstrando em alguns

casos descontentamento ou problemas de relacionamento antes da medida.

“Era conflito, se bateu com ela dentro de casa aí já era, aí aprontava, tomava uma bicicleta, tomava isso. Nunca vivi mais meu pai, só mesmo minha mãe mesmo, que é pai e mãe e até hoje tá aí.”

Na perspectiva de analisar o contexto maior no qual se insere a família foram feitas

perguntas voltadas para a comunidade onde eles residem. Questionados se eles gostam do

bairro onde moram, a grande maioria deles 70% demonstraram: ter afinidade com o bairro,

conhecer pessoas na redondeza de onde moram, e ter laços afetivos com algumas destas, e

participar dos eventos e acontecimentos culturais que ocorrem nos mesmos. Já os demais

30%, demostraram ser indiferentes, afirmando que, embora conheçam o bairro, preferem se

relacionar com pessoas de outros bairros. Quando questionados sobre o acesso a educação e

lazer em seus bairros, foi unânime a afirmativa de que há facilidade de acesso, tanto a escolas,

quanto a espaços de lazer, como praças, quadras, campos de futebol e outros.

Com o intuito de aprofundar a análise sobre as relações familiares perpassando pela

drogadição, foi questionado se há na família algum caso de uso de drogas (lícitas e/ou

ilícitas), ao que, infelizmente quase todos os entrevistados 90% fazem uso de drogas lícitas

como álcool e cigarro. Dentre as drogas o álcool é o que mais atingi as famílias, como ilustra

o seguinte depoimento.

“Meu irmão, bebe, fuma caí e levanta, e caí de novo e ainda continua bebendo e caindo.”

Ao expandirmos esse questionamento sobre a drogadição para um ciclo maior de

relacionamentos dos adolescentes, isso é, ao ser perguntado se há amigos que fazem uso de

Page 67: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

drogas (lícitas e/ou ilícitas) as respostas tiveram a seguinte variação: a grande maioria 70%

tem amigos que usam drogas ilícitas, 20% tem amigos que fazem uso de drogas lícitas e 10%

os amigos não fazem uso de nenhum tipo de droga.

Sobre a relação dos adolescentes com as drogas, os percentuais se repetiram: a

grande maioria 70% usa drogas ilícitas, 20% faz uso de drogas lícitas e 10% não fazem uso de

nenhum tipo de droga. Diferentemnete do que uma análise apenas quantitativa poderia

sugerir, a análise qualitativa, caso a caso camparando os 2 fenômenos mostra que eles não

tem um ligação direta, há casos em que amigos não fazem uso e o adolescente faz, há casos

em que os amigos usam e o adolescente não. Mesmo assim, efetivamente a relação entre

amigos que usam e adolescente que usa é muito grande, o que reafirma que a necessidade de

ter o sentimento de pertencimento e identidade com um grupo, faz com que as práticas sejam

repetidas.

Se o uso de drogas pelos adolescentes é comparado com os familiares vê-se que o

uso das drogas lícitas, por 90% dos familiares é a porta de entrada para as drogas ilícitas para

osadolescentes.

“Vários, bebe, fuma um CRACK, fuma um tudo, cheiram, tudo que você pensar eles

fazem, “desdobram” os outros. Não, não, eu só fumo um (maconha), é, só, pra

relaxar a mente, fumei muito do um.”

Ao serem perguntados se alguém em sua família já cometeu algum ato infracional,

quase a totalidade 90% afirmou que ninguém, além deles, cometeram atos ilícitos, e apenas

10% afirmaram que há outros casos na família. Essas respostas apontam que não há relação

diretamente proporcional entre os dois fenômenos, ou seja, a prática de ato infracional não

está diretamente ligada à prática de delitos por membros da família, entretanto, no caso em

Page 68: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

que se constatou a presença da prática na família, ficou evidenciado que o adolescente seguiu

os mesmos passos do seu familiar.

O terceiro bloco de questões volta-se para o cometimento do ato infracional e o

cumprimento da medida socioeducativa pelo adolescente. Questionados sobre qual o ato

infracional que eles cometeram, e quais as motivações, as respostas foram diversas, mas

destacaram-se assalto, furto e roubo pela freqüência, diante disso, pode-se verificar a

materialização de alguns apontamentos abordados inicialmente, na tentativa de atingir um

patamar de igualdade de acesso aos bens materiais, tudo se torna válido, transformando

vítimas da exclusão em vitimizadores.

Perguntado também, se esta era a primeira vez que cometeram ato infracional,

obtendo como resposta de 70% (setenta porcento) dos adolescentes que havia sido o primeiro

ato infracional cometido, contra 30% (trinta porcento) que já haviam cometido. Diante das

respostas avançamos nos questionamentos, perguntamos nessa feita se esta era a primeira

medida, obtivemos o mesmo percentual apresentados acima. Ao verificarmos a reincidência

no cometimento de ato infracional e cumprimento de medida socioeducativa, continuamos

questionando, qual fora a medida socioeducativa que cumpriram anteriormente, e todos os 3

(três) tiveram como medida a PSC.

“Qual deles, eu tenho vários, agora, agora foi uma tentativa de homicídio, agora esse, porque o resto eu tenho um “bucado”. Mas hoje eu tô mais calmo, tô diferente de um tempo pra cá. [Qual o motivo?] rapaz a de homicídio porque o cara pegou me chinela […] aí eu peguei ele, eu ia matar ele mais não deixaram, ainda dei duas facadas. [Quais foram as outras] Assalto, furto, roubo, arrombamento, comecei novo. [Você começou com quantos anos?] Comecei com 11, quase 12.”

Quando há reincidência, o adolescente passa a ter uma maior atenção do técnico

responsável pelo seu acompanhamento, entretanto, o adolescente participa das mesmas

atividades dos demais adolescentes em cumprimento de medida, isso para que não haja

diferenciação no tratamento destes. A intenção é que o convívio com os outros adolescentes

Page 69: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

favoreça a construção de novos projetos de vida, e isso acaba sendo comprovado na entrevista

feita junto aos adolescentes.

Mediante as respostas foi questionado como eles se sentiam em relação à medida em

cumprimento, obtendo como resposta descrições diversas dos sentimentos destes

adolescentes, destacando-se no geral a percepção de que a medida é o meio para mudança do

comportamento, e para a construção de uma nova vida. De certo, muitas dessas declarações

são carregadas de sentimentos e vontades de que a vida se renove com um novo sentido,

contudo, dentre estes sentimentos existe um que se agiganta, a incerteza do porvir, algo que

nem mesmo a melhor ação socioeducativa poderia transpor. Eles começam a se perceber

enquanto atores, e não mais como telespectadores da suas vidas, carregando assim a

responsabilidade de buscarem os meios para atingirem uma nova vida.

“Rapaz, hoje eu tô levando como exemplo, de outras, […] vai olhando cada vez mais, pra não acontecer mais, porque ficar outro, outro, e outro é chato “né”, fica acordando cedo pra vir pra cá é complicado.”

Quando perguntados sobre o que eles acham das atividades desenvolvidas, foram

unânimes em afirmar que gostam das ações, demonstrando em alguns casos suas preferências.

Ao serem perguntados sobre o que não gostavam, não levantaram nenhuma questão, o que

pode significar algum desconforto em relação a entrevista e/ou suas consequências.

Destaca-se da entrevista a relação (in)existente entre os adolescentes em

cumprimento de medida, ficou claro que essa existe apenas durante a execução das atividades,

não se transferindo para fora desse âmbito institucional, embora alguns deles morem no

mesmo bairro ou próximos..

Ao se tratar do relacionamento com a equipe técnica, o que transpareceu das

respostas é que esse é o ponto forte do programa, ganhando contornos relevantes nas falas dos

Page 70: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

adolescentes, a importância desse relacionamento, principalmente, no que tange à perspectiva

de mudanças comportamentais, de construção de projetos de vida.

Outro aspecto importante levantado durante as entrevistas é que, embora a prestação

de serviço à comunidade apresente resultados interessantes, a grosso modo, nos casos em que

os adolescentes são reincidentes fora levantadas questões quanto a forma como estes foram

tratadas durante o cumprimento da medida, evidenciando o preconceito existente na relação

dos usuários com membros que compõem os espaços20 de cumprimento da medida.

“Melhor que PSC, serviço na comunidade, que você fica sentado o dia inteiro, ainda passa e olha feio pra você, discrimina, aqui não, aqui a gente fica a vontade. […] Aqui21 eu venho de boa, por aqui é bacana, as pessoas te trata bem.”

Chegando ao final da entrevista, os adolescentes foram questionados sobre se mudou

algo em suas vidas e em caso afirmativo, o quê? A fala seguinte é ilustrativa da resposta de

todos.

“Mudou, mudou, mudou não o quê, o meu comportamento também, que eu chegava aqui e pertubava que só a […], tá não, agora eu faço a minha parte, né não o quê, as duas assistentes, elas não me ajudam, eu ajudo elas também, fico de boa. Eu era mal criado antes, hoje nada, eu não sei também se porque eu tô ficando mais velho, vai ficando mais velho, vai acalmando, apreendendo.”

Perguntados sobre as expectativas para o futuro, os depoimentos foram unânimes em

apontar que houveram construções de projetos de vida, tendo como metas trabalhar, terminar

os estudos e construir uma família.

“Meu irmão eu quero tá formado e ter um emprego, pra frente, na verdade o dia de amanhã só pertence a Deus, mas a gente planeja, na cabeça. Já tive vontade [de entrar em uma universidade] mas nunca tive oportunidade, tipo as chances pra gente é pouco.”

Além dessa mudança na subjetividade dos adolescentes, a efetividade das medidas

socioeducativas pode ser objetivamente demonstrado pelos dados quantitativos e qualitativos

20 Geralmente as medidas de PSC são realizadas em equipamentos públicos existentes dentro da comunidade, como Unidades Básicas de Saúde, Centro de Referência da Assistência Social, Centro de Referência Especializado da Assistência Social e outros serviços da Assistência Social.

Page 71: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

sobre reincidência, que segundo DORIA et al (2008) são de 5% no período de 2005 a 2007.

Apesar do caráter exploratório desta pesquisa já podem balizar o correto direcionamento do

CREAS Viver Legal, apesar de seu estágio inicial (4 anos de implantação), quase o mesmo

tempo de implantação do SUAS, e, portanto, com várias dificuldades internas decorrentes

desse estágio do processo e, principalmente, pelo fato do contexto societário cada vez mais

perverso, produto das desigualdades oriundas do capitalismo.

21 A execução da Liberdade Assistida acontece no CREAS Viver Legal.

Page 72: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

Considerações Finais:

Discutir questões relativas à adolescência e à prática de atos infracionais demanda

um olhar multidisciplinar, haja visto que apenas a visão jurídica se mostra insuficiente para a

compreensão de todos os aspectos desta delicada questão.

Se, em um primeiro olhar, a proteção jurídica parece ser adequada, visto que

perfilha-se à doutrina da proteção integral e mostra-se condizente com o reconhecimento da

criança e do adolescente como sujeitos de direito, bem como demonstra respeito pelo valor

dignidade humana, por outro lado não se pode olvidar que, infelizmente, todo esse arcabouço

jurídico não tem resultado, via de regra, em um acréscimo efetivo da qualidade de vida de

muitas crianças e jovens.

A exclusão social é um fato de extrema relevância, e cujos efeitos podem ser sentidos

em todos os aspectos relacionados à questão; nenhum olhar sobre o tema “adolescentes e atos

infracionais” seria possível caso este fator fundamental fosse desconsiderado. No entanto,

apenas tomar consciência de sua existência não é suficiente; é preciso promover, exigir a

promoção e incentivar condutas que contribuam para a sua efetiva diminuição. Isso demanda

uma atuação política consciente e comprometida, bem como o compromisso social com o

fomento de uma cultura de respeito e promoção de direitos humanos.

Além das mudanças no contexto socioeconômico, é preciso que se busque a

desconstrução do estigma social que esses jovens carregam. A garantia dos seus direitos deve

ser reconhecida pelos diversos segmentos que atendem à população infanto-juvenil, pois,

esses adolescentes, apesar de violarem os direitos de terceiros, não deixam de ser

Page 73: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

adolescentes, que foram vitimizados por um contexto social mais amplo e, em menor grau por

contextos familiares afetados.

A realização deste trabalho possibilitou a compreensão mais profunda da realidade

da execução de medidas socioeducativas agregando a análise qualitativa ao quadro. Contudo,

não permite que se fale em conclusão. Sendo a temática tão complexa, não pode ter todas as

questões dirimidas em um único trabalho, acrescido das limitações inerentes ao tempo de

elaboração e ao próprio caráter de iniciação científica de uma monografia de graduação.

Contudo, permite fazer algumas considerações sobre a temática.

A primeira refere-se aos objetivos deste trabalho, que considera-se terem sido

alcançados com êxito. O levantamento histórico do direito da criança e do adolescente nos

possibilitou a identificação das diferentes concepções que embasaram a legislação a quase um

século, na busca pela dita “proteção” de crianças e adolescentes, mostrando também, os

avanços conceituais que permearam a construção do Estatuto da Criança e do Adolescente, e

permitindo comparações entre as normatizações, de forma a possibilitar uma melhor

compreensão dos preceitos da execução de medidas socioeducativas como ação protetiva, o

que possibilitou uma mudança no caráter das ações voltadas ao adolescente em conflito com a

lei.

A segunda é que ainda não há projeto pedagógico para a execução das medidas

socioeducativas no CREAS Viver Legal, contudo, isso não tem sido um impeditivo para a

execução com êxito das medidas. Um ponto positivo é que esse trabalho serve não só para

avaliar as ações socioeducativas, mas também, para estimular a construção do projeto

pedagógico, podendo ser utilizado como referencial teórico durante o processo de construção.

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Outro aspecto importante foi ter detectado que as constantes mudanças de juizes a

frente da 17ª Vara Civil – Juizado da Infância e Juventude, pode ser um dos fatores das

alternâncias no número de processos enviados ao CREAS Viver Legal.

É relevante ressaltar que as relações entre adolescentes e equipe técnica, refletem o

comprometimento destes em avançar no processo de mudança comportamental e construção

de projetos de vida reconhecido pelos usuários como ponto forte da execução de medidas

socioeducativas no CREAS Viver Legal, e mostra o comprometimento profissional que ao

tentar superar as dificuldades, apesar de desgastas a equipe técnica.

A hipótese de que a medida socioeducativa pode ser vista como um dos mecanismos

de transformação da vida do usuário, e como ação que cria a possibilidade de compreender a

sua realidade e transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional, foi

corroborada quando evidenciou-se a efetividade do CREAS tanto no aspecto subjetivo dos

adolescentes – que perpassa projetos de vida, quanto objetivamente pelo fato de se manterem

relativamente baixo os percentuais de reincidência, e de sua trajetória ser descentente – no

período de 2005/2007 era de 5% e hoje é de apenas 3%.

As respostas trouxeram a confirmação da hipótese levantada, o que significa dizer,

que a ação socioeducativa dentro do processo de execução de medidas socioeducativa cumpre

o papel de possibilitar a mudança comportamental, e na construção de um projeto de vida.

Para a equipe, a mudança de comportamento ocorre na grande maioria dos casos.

Contudo, fica nítida a preocupação com pós-medida, principalmente pela falta de

perspectivas de alteração do meio para o qual o adolescente retorna após o cumprimento da

medida.

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Esse dado é relevante por si só, e sobretudo, diante do incremento geral do uso de

drogas lícitas e ilícitas, que começam a ser tratadas com epidemia na área de saúde, além de

grave problema de segurança pública por sua associação com a violência que atinge mais

fortemente os jovens tanto como vítimas quanto como vitimizadores.

Esse momento de aproximação da abordagem desta temática, deixa a certeza de que

ainda há muito por fazer, e por saber, das relações que permeiam a execução de medidas

socioeducativas em meio aberto.

Fica claro, que alguns desdobramentos sobre a temática trabalhada podem compor

um novo estudo, como exemplo pode-se citar: com relação a equipe técnica a questão da

saúde do trabalhador, sob a perspectiva psicológica das tensões no trabalho; O preconceito

que permeia o ambiente de execução da prestação de serviço a comunidade, como entrave na

efetivação dos objetivos da medida socioeducativa; considerando estes como os de maior

relevância.

Ao final, é possível constatar que o reconhecimento e proteção garantidos pela

doutrina da proteção integral apenas poderão, um dia, resultar em conquistas reais se a visão

fragmentada do adolescente for substituída por uma concepção da integralidade deste, de sua

família e suas relações e ações correspondentes nesta direção.

Page 76: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

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Page 79: Ação Socioeducativa como meio para transpor as barreiras que engendram o cometimento de ato infracional

APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO USUÁRIOS Ações socioeducativas na perspectiva da busca por efetividade na execução de medidas socioeducativas em meio aberta. Questionário para usuários. Identificação:

1. Idade? 2. Sexo ( ) M ( ) F 3. Mora com os pais? 4. Bairro de residência? 5. Qual a sua escolaridade? 6. Você trabalha?

Caracterização:

7. Como é a relação com a sua família? 8. Algum familiar faz uso de drogas (lícitas ou ilícitas)? ( ) Sim, ou ( ) Não? 9. Algum familiar já cometeu algum delito ( ) Sim, ou ( ) Não? 10. Como é a relação com a sua bairro? 11. Algum amigo faz uso de drogas (lícitas ou ilícitas) ( ) Sim, ou ( ) Não? E você usa ( )

Sim ( ) Não? Qual? 12. O bairro que você mora tem espaços de lazer ( ) Sim, ou ( ) Não? 13. Você tem facilidade de acesso à educação ( ) Sim, ou ( ) Não? 14. Qual o ato infracional cometido? Circunstância, Razões? 15. Foi a primeira vez que praticou ato infracional ( ) Sim, ou ( ) Não? 16. É a primeira medida socioeducativa que você cumpri? ( ) Sim, ou ( ) Não? Quais

outras? 17. Como você se sente com relação à medida socioeducativa em execução? 18. Você gosta das atividades socioeducativas de que participa? ( ) Sim, ou ( ) Não? 19. Qual a atividade você mais gosta? 20. O que você não gosta no CREAS Viver Legal? 21. Como é sua relação com os outros usuários? 22. Como é sua relação com a equipe técnica? 23. Mudou alguma coisa em você depois de participar das atividades socioeducativas? Se

sim o quê? 24. Quais são suas expectativas para o futuro? 25. Sugestões para aperfeiçoar o programa?

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APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO EQUIPE TÉCNICA Ações socioeducativas na perspectiva da busca por efetividade na execução de medidas socioeducativas em meio aberta. Questionário para equipe técnica.

1. Formação? 2. Cargo ocupado? 3. Tempo no cargo? 4. Quais são as atribuições do cargo ocupado? 5. Há Projeto Político-Pedagógico na instituição para o cumprimento de medidas? ( )

Sim, ou ( ) Não? 6. Há planejamento das ações socioeducativas? ( ) Sim, ou ( ) Não? Como se dá? 7. Como se dá a construção das atividades socioeducativas na instituição? 8. Quais são as atividades socioeducativas? 9. Qual o objetivo das ações socioeducativas? 10. Com é sua relação com os usuários? 11. Como é a participação dos usuários nas atividades desenvolvidas? 12. Quais são, se é que há, as maiores dificuldades na execução das atividades

socioeducativas com os usuários? 13. Você consegue perceber mudanças no comportamento dos usuários após a execução

da medida? 14. Tem participado de capacitações ou reciclagens? ( ) Sim, ou ( ) Não? 15. Os objetivos têm sido alcançados? 16. Quais são as dificuldades que existem na execução das ações socioeducativas? 17. Sugestões para melhoria do serviço? 18. Há reincidência? ( ) Sim, ou Não ( )? Por quê? 19. Quando o usuário é reincidente há variação nas atividades socioeducativas? 20. Como é a relação com os outros profissionais?

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ANEXO A – DECLARAÇÃO DE GENEBRA

Geneva Declaration of the Rights of the Child

Adopted 26 September, 1924, League of Nations

By the present Declaration of the Rights of the Child, commonly known as "Declaration of Geneva," men and women of all nations, recognizing that mankind owes to the Child the best that it has to give, declare and accept it as their duty that, beyond and above all considerations of race, nationality or creed:

1. The child must be given the means requisite for its normal development, both materially

and spiritually;

2. The child that is hungry must be fed; the child that is sick must be nursed; the child that is

backward must be helped; the delinquent child must be reclaimed; and the orphan and the

waif must be sheltered and succored;

3. The child must be the first to receive relief in times of distress;

4. The child must be put in a position to earn a livelihood, and must be protected against

every form of exploitation;

5. The child must be brought up in the consciousness that its talents must be devoted to the service of fellow men.

Declaração dos Direitos da Criança de Genebra

Aprovado em 26 de setembro de 1924, Nações Unidas

Pela presente Declaração dos Direitos da Criança, vulgarmente conhecida como "Declaração de Genebra", homens e mulheres de todas as nações, reconhecendo que a humanidade deve à criança o melhor que tem para dar, declarar e aceitá-la como seu dever que, para além e acima de todas as considerações de raça, nacionalidade ou religião:

1. A criança deve ser dotada de meios necessários para o seu desenvolvimento normal,

tanto materialmente e espiritualmente;

2. A criança que tem fome deve ser alimentada, a criança que está doente deve ser

Alimentada; a criança que está para trás devem ser ajudadas, o filho delinqüente deve

ser valorizado, e os órfãos e os vagabundo devem ser protegidos e socorridos;

3. A criança deve ser a primeira a receber ajuda em momentos de perigo;

4. A criança deve ser colocada em posição de ganhar um sustento, e deve ser protegida

contra toda forma de exploração;

5. A criança deve ser levada até a consciência de que o seu talento deve ser dedicada ao

serviço dos colegas homens.

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ANEXO B – CÓDIGO DE MENORES DE 1927

Presidência da República Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos DECRETO Nº 17.943-A DE 12 DE OUTUBRO DE 1927.

Revogado pela Lei nº 6.697, de 1979. Consolida as leis de assistencia e protecção a menores. O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil, usando da autorização constante do art. 1º do decreto n. 5083, de 1 de dezembro de 1926, resolve consolidar as leis de assistencia e protecção a menores, as quaes ficam constituindo o Codigo de Menores, no teôr seguinte:

CODIGO DOS MENORES PARTE GERAL

CAPITULO I DO OBJECTO E FIM DA LEI Art. 1º O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinquente, que tiver menos de 18 annos de idade, será submettido pela autoridade competente ás medidas de assistencia e protecção contidas neste Codigo.

CAPITULO II DAS CREANÇAS DA PRIMEIRA IDADE Art. 2º Toda creança de menos de dous annos do idade entregue a criar, ou em ablactação ou guarda, fóra da casa dos paes ou responsaveis, mediante salario, torna-se por esse facto objecto da vigilancia da autoridade publica, com o fim de lhe proteger a vida e a saude. Art. 3º Essa vigilancia comprehende: toda pessoa que tenha uma creança lactante ou uma ou varias creanças em ablactação ou em guarda, entregue aos seus cuidados mediante salario; os escriptorios ou agentes de informações que se occupem de arranjar collocação a creanças para criação, ablactação ou guarda. Art. 4º A recusa de receber a autoridade, encarregada da inspecção ou qualquer pessoa delegada ou autorizada em virtude de lei, é punida com as penas do crime de desobediencia, e em caso de injuria ou violencia com as do crime de desacato. Art. 5º Quem quer que entregar uma creança á criação, ablactação ou guarda, mediante salario, é obrigado, sob as penas do art. 388 do Codigo Penal, a fazer declaração perante funccionario do registro especial a esse fim. Art. 6º A pessoa que quizer alugar-se como nutriz. é obrigada a obter attestado da autoridade policial do seu domicilio, indicando si o seu ultimo filho é vivo, e si tem, no minimo, a idade de quatro mezes feitos. e si é armammentado por outra mulher que preencha as condições legaes. Art. 7º Nenhuma creança póde ser recebida para qualquer dos fins de que se occupa esta lei: a) por alguem de cujo cuidado tenha sido removida qualquer creança em consequencia do máos tratos ou infracção a deveres para com ella: b) por quem tenha sido condemnado por delictos dos arts. 285 a 293, 298, 300 a 302 do Codigo Penal; c) em casa de onde tenha sido removida creança, por ser perigosa, ou anti-hygienica, ou por qualquer motivo interdictada enquanto durar a interdicção. Art. 8º Quem abrigar ou fizer abrigar creança em opposição a preceito do artigo antecedente, será punido com a pena de multa de 50$ a 500$ e de prisão cellular de um a seis mezes.

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Art. 9º A autoridade publica póde impedir de ser abrigada, e si já o estiver póde ordenar a apprehensão e remoção, a creança nas condições deste capitulo: a) em alguma casa cujo numero de habitantes fôr excessivo, ou que fôr perigosa ou anti-hygienica; b) por alguem que, por negligencia, ignorancia, embriaguez, immoralidade, máo procedimento ou outra causa semelhante, fôr incapaz de ser encarregado da creanca: c) por pessoa ou em alguma casa, que, por qualquer outro motivo, estiver em contravenção com as leis e regulamentos de assistencia e protecção a menores. O infractor incorrerá nas mesmas penas do artigo antecedente. Art. 10. Si. em consequencia de infracção de dispositivo deste capitulo ou da falta de cuidado da parte da nutriz ou guarda, resultou damno á, saude, ou vida da creança, será applicada a pena do art. 306 ou 297 do Codigo Penal. Art. 11. Os Estados e municipios determinarão em leis e regulamentos: I, os modos de organização do serviço de vigilancia instituido por esta lei; II, a inspecção medica e de outras ordens, a creação, as attribuições e os deveres dos funccionarios necessarios; lII, as obrigações impostas ás nutrizes, aos dectores de escriptorios ou agencias e todos os intermediarios de collocação de creanças; IV, a forma das declarações, dos registros, certificados ou attestados, e outras peças de necessidade. Art. 12. A vigilancia instituida por esta lei é confiada no Districto Federal á Inspectoria de Hygiene Infantil. Art. 13. O Governo Federal é autorizado a auxiliar, de accôrdo com a lei de subvenções, as creches, os institutos de gotta de leite, ou congeneres de assistencia á primeira infancia e puericultura.

CAPITULO III DOS INFANTES EXPOSTOS Art. 14. São considerados expostos os infantes até sete annos de idade, encontrados em estado de abandono, onde quer que seja. Art. 15. A admissão dos expostos á assistencia se fará por consignação directa, excluido o systema das rodas. Art. 16. As instituições destinadas a recolher e crear expostos terão um registro secreto, organizado de modo a respeitar e garantir o incognito, em que se apresentem e desejem manter os portadores de creanças a serem asyladas. Art. 17. Os recolhimentos de expostos, salvo nos casos previstos pelo artigo seguinte, não podem receber creança sem a exhibição do registro civil de nascimento e a declaração de todas as circumstancias que poderão servir para identifical-a; e deverão fazer a descripção dos signaes particulares e dos objectos encontrados no infante ou junto deste. Art. 18. Si é a mãe que apresenta o infante, ella não é adstricta a se dar a conhecer, nem a assignar o processo de entrega. Si, porém, ella espontaneamente fizer declaração do seu estado civil, que qualquer outra que esclareça a situação da creança, taes declarações serão recebidas e registradas pelo funccionario do recolhimento. § 1º Ella poderá tambem fazer declarações perante um notario da sua confiança, em acto separado, que é prohibido communicar ou publicar sob qualquer forma, salvo autorização escripta da autoridade competente; e entregar ao respectivo funccionario do recolhimento esse documento encerrado e lacrado, para ser aberto na época e nas circumstancias que ella determinar, e que ficarão constando do registro da creança. § 2º Si é uma outra pessoa que apresenta o infante. O funccionario do recolhimento procurará mostrar-lhe os inconvenientes do abandono, sem, todavia,. fazer pressão, sob pena de

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demissão. Si o portador da creança insistir em a deixar, o funccionario pedirá o registro civil de nascimento, ou informações do cartorio e da data em que foi feito o registro. Si o portador declarar que não póde, ou não quer, fornecer indicação alguma, essa recusa ficará registrada, mas a creança será recolhida. Art. 19. A violação do segredo de taes actos é punida com multa de 50$ a 500$, além das penas do art. 192, do Codigo Penal. Art. 20. Si o infante fôr abandonado no recolhimento, em vez de ser ahi devidamente apresentado, o funccionario respectivo o levará a registro no competente officio, preenchendo as exigencias legaes; sob as penas do art. 388 do Codigo Penal. Art. 21. Quem encontrar infante exposto, deve apresental-o, ou dar aviso do seu achado, á autoridade policial no Districto Federal ou, nos Estados, á autoridade publica mais proxima do local onde estiver o infante. Art. 22. A autoridade, a quem fôr apresentado um infante exposto, deve mandar inscrevel-o no registro civil de nascimento dentro do prazo e segundo as formalidades regulamentares, declarando-se no registro o dia, mez e anno, o logar em que foi exposto, e a idade apparente; sob as penas do art. 388 do Codigo Penal, e os mais de direito. § 1º O envoltorio, roupas e quaesquer outros objectos e signaes que trouxer a creança, e que possam a todo tempo fazel-a reconhecer, serão numerados, alistados e fechados em caixa lacrada e sellada, com o seguinte rotulo: "pertencente ao exposto tal........ assento de fl..... do livro........."; e remettidos com uma duplicata ao juiz de menores, onde o houver, ou ao juiz de orphãos, para serem recolhidos a logar de segurança. § 2º Recebida a duplicata com o competente conhecimento do deposito, que será archivada, far-se-hão á margem do assentamento as notas convenientes. Art. 23. Os expostos que não forem recolhidos a estabelecimentos a esse fim destinados, ficarão sob a tutela das pessoas que voluntaria o gratuitamente se encarreguem da sua creação, ou terão tutores nomeados pela juiz. Art. 24. Quem tiver em consignação um infante, não póde confial-o a outrem, sem autorização da autoridade publica ou do quem de direito; salvo si não fôr legalmente obrigado, ou não se tiver obrigado, a prover gratuitamente á sua manutenção. Art. 25. Incorrerá em pena de prisão celluIar por um a seis mezes e multa de 20$ a 200$000: I, quem entregar a qualquer pessoa ou a estabelecimento publico ou particular, sem o consentimento da autoridade ou da pessoa de quem houver recebido, menor abaixo da idade de sete annos. II, quem, encontrando recem nascido ou menor de sete annos abandonado, não o apresentar ou não der aviso do seu achado, á autoridade publica.

CAPITULO IV DOS MENORES ABANDONADOS Art. 26. Consideram-se abandonados os menores de 18 annos: I. que não tenham habitação certa, nem meios de subsistencia, por serem seus paes fallecidos, desapparecidos ou desconhecidos ou por não terem tutor ou pessoa sob cuja, guarda vivam; II. que se encontrem eventualmente sem habitação certa, nem meios de subsistencia, devido a indigencia, enfermidade, ausencia ou prisão dos paes. tutor ou pessoa encarregada de sua guarda; III, que tenham pae, mãe ou tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente impossibilitado ou incapaz de cumprir os seus deveres para, com o filho ou pupillo ou protegido; IV, que vivam em companhia de pae, mãe, tutor ou pessoa que se entregue á pratica de actos contrarios á moral e aos bons costumes; V, que se encontrem em estado habitual do vadiagem, mendicidade ou libertinagem;

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VI, que frequentem logares de jogo ou de moralidade duvidosa, ou andem na companhia de gente viciosa ou de má vida. VII, que, devido á crueldade, abuso de autoridade, negligencia ou exploração dos paes, tutor ou encarregado de sua guarda, sejam: a) victimas de máos tratos physicos habituaes ou castigos immoderados; b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensaveis á saude; c) empregados em occupações prohibidas ou manifestamente contrarias á moral e aos bons costumes, ou que lhes ponham em risco a vida ou a saude; d) excitados habitualmente para a gatunice, mendicidade ou libertinagem; VIII, que tenham pae, mãe ou tutor, ou pessoa encarregada de sua guarda, condemnado por sentença irrecorrivel; a) a mais de dous annos de prisão por qualquer crime; b) a qualquer pena como co - autor, cumplice, encobridor ou receptador de crime commettido por filho, pupillo ou menor sob sua guarda, ou por crime contra estes. Art. 27 Entende-se por encarregado da guarda do menor a pessoa que, não sendo seu pae, mãe, tutor, tem por qualquer titulo a responsabilidade da vigilancia, direcção ou educação delle, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia. Art. 28. São vadios os menores que: a) vivem em casa dos paes ou tutor ou guarda, porém, se mostram refractarios a receber instruccão ou entregar-se a trabalho sério e util, vagando habitualmente pelas ruas e Iogradouros publicos; b) tendo deixado sem causa legitima o domicilio do pae, mãe ou tutor ou guarda, ou os Iogares onde se achavam collocados por aquelle a cuja autoridade estavam submettidos ou confiados, ou não tendo domicilio nem alguem por si, são encontrados habitualmente a vagar pelas ruas ou logradouros publicos, sem que tenham meio de vida regular, ou tirando seus recursos de occupação immoral ou prohibida. Art. 29. São mendigos os menores que habitualmente pedem esmola para si ou para outrem, ainda que este seja seu pae ou sua mãe, ou pedem donativo sob pretexto de venda ou offerecimento de objectos. Art. 30. São libertinos os menores que habitualmente: a) na via publica perseguem ou convidam companheiros ou transeuntes para a pratica de actos obscenos; b) se entregam á prostituição em seu proprio domicilio, ou vivem em casa de prostituta, ou frequentam casa de tolerancia, para praticar actos obscenos; c) forem encontrados em qualquer casa, ou logar não destinado á prostituição, praticando actos obscenos com outrem; d) vivem da prostituição de outrem.

CAPITULO V DA INHIBITAÇÃO DO PATRIO PODER E DA REMOÇÃO DA TUTELA Art. 31. Nos casos em que a provada negligencia, a incapacidade, o abuso de poder, os máos exemplos, a crueldade, a exploração, á perversidade, ou o crime do pae, mãe ou tutor podem comprometer a saude, segurança ou moralidade do filho ou pupillo, a autoridade competente decretará a suspensão ou a perda do patrio poder ou a destituição da tutela, como no caso couber. Art. 32. Perde o patrio poder o pae ou a mãe: I, condemnado por crime contra a segurança da honra a honestidade das familias, nos termos dos arts. 273 paragrapho unico e 277 paragrapho unico do Codigo Penal;

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II, condemnado a qualquer pena como co-autor, cumplice, encobridor ou receptador de crime perpetrado pelo filho, ou por crime contra este (lei n. 4.242, de 5 de janeiro de 1921, art. 3º,§ 1º, n. VII, Iettra b): III, que castigar immoderadamente o filho (Codigo Civil, art. 395, n. 1); IV, que o deixar em completo abandono (Codigo Civil, art. 395,n. lI); V, que praticar actos contrarios á moral e aos bons costumes (Codigo Civil, art. 395, n. III). Art. 33. A decretação da perda do patrio poder é obrigatoria, extende-se a todos os filhos, e abrange todos os direitos que a lei confere ao pae ou á mãe sobre a pessoa e os bens do filho. Art. 34. Suspende-se o patrio poder ao pae ou á mãe: I, condemnado por sentença irrecorrivel em crime cuja pena exceda de dous annos de prisão (Codigo Civil. art. 394, paragrapho unico), salvo o disposto no art. 4º. ns. I e II; II, que deixai o filho em estado habitual de vadiagem, mendicidade, libertinagem, criminalidade, ou tiver excitado. favorecido, produzido o estado em que se achar o filho, ou de qualquer modo tiver concorrido para a perversão deste, ou para o tornar alcoolico (lei n. 4.242, de 5 de janeiro de 1921, art. 3º, § 1º, ns. V e VI lettra d, e § 15): III, que, por máos tratos ou privação de alimentos ou de cuidados indispensaveis puzer em perigo a saude do filho (lei n. 4.242, de 5 de janeiro de 1921, art. 3º, § 1º, n. VI, lettras a e b); IV, que o empregar em occupações prohibidas ou manifestamente contrarias á moral e aos bons costumes, ou que lhe ponham em risco a saude, a vida, a moralidade (lei numero 4.242, de 5 de janeiro de 1921, art. 3º § 1º, n. VI, lettra c); V, que por abuso de autoridade, negligencia, incapacidade, impossibilidade de exercer o seu poder, faltar habitualmente ao cumprimento dos deveres paternos (Codigo Civil, art. 394, lei n. 4.242 de 5 de janeiro de 1921, art. 3º, § 1º, n. III). Art. 35. A decretação da suspensão do patrio poder é facultativa, pode referir-se unicamente ao filho vietimado ou a todos, e abranger todos os direitos do pae ou da mãe sobre a pessoa e bens do filho ou sómente parte desses direitos. Art. 36. E' licito ao juiz ou tribunal deixar de applicar a suspensão do patrio poder, si o pae ou mãe se comprometter a internar o filho ou os filhos, em estabelecimento de educação, ou garantir, sob fiança, que os filhos serão bem tratados. Art. 37. Dá-se a destituição da tutela: I, nos casos do art,. 413 ns. IV e V, e art. 445 do Codigo Civil. II, nos casos dos arts. 273, n. 5º, e 277 paragrapho único do Codigo Penal III, em qualquer dos casos de abandono figurados no art. 3º, § 1º, da lei n. 4. 242, de 5 de janeiro de 1921. Art. 38. A suspensão ou a perda do patrio poder abrange o pae e a me, si os dous vivem juntos, ainda no caso de um só delles ter sido julgado indigno do exercicio do patrio poder. O conjuge innocente, porém, deixando de viver em companhia do conjuge indigno por desquite, ou por morte deste, póde reclamar a restituição do patrio poder, de que foi destituido sem culpa, desde que prove achar-se em condições moraes e economicas de prover á manutenção e educação dos filhos. Art. 39. Si os conjuges não viverem juntos, os poderes do pae poderão passar a ser exercidos pela mãe, quando estiver em condições economicas e moraes de prover á manutenção e educação do filho. Art. 40. Tratando-se de pessoa que não seja o pae, a mãe ou o tutor, e provado que os menores sob sua guarda estão em algum dos casos previstos no art. 26, ser-lhe-hão retirados por simples despacho da autoridade competente sob as comminações legaes. Art. 41. O juiz ou tribunal, ao pronunciar a suspensão ou a perda do patrio poder ou a destituição da tutela, fixará a pensão devida pelo pae ou mãe ou pessoa obrigada á prestação de alimentos.

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Art. 42. Desde que a respectiva acção de inhibição do patrio poder ou remoção da tutela fôr iniciada, e em qualquer estado da causa, o juiz ou tribunal pode tomar as medidas provisorias, que achar uteis, para a guarda do menor até decisão definitiva. Art. 43. O juiz ou tribunal, na escolha de tutor para o menor retirado do patrio poder ou removido da tutela, deve observar os preceitos dos arts. 406 a 413, do Codigo Civil; salvo si o parente a quem competir a tutela não estiver em condições moraes e economicas de prover á manutenção e educação do menor. § 1º Os parentes com direito á tutela podem reclamar pelos meios legaes contra preterição, que lhes faça o juiz ou tribunal. § 2º Em falta de parente com direito á tutela o juiz ou tribunal decidirá que esta seja constituida segundo o direito commum, sem que, todavia, haja obrigação para a pessoa designada de acceitar o encargo. § 3º Durante o andamento da acção de inhibição ou de remoção qualquer pessoa póde dirigir-se ao juiz ou tribunal, pelo meio legal, afim de obter que o menor lhe seja confiado, sujeitando-se ás obrigações e aos encargos de direito; e, si fôr julgada idonea, o juiz ou tribunal poderá attendel-a. Art. 44. Os tutores instituidos em virtude deste Codigo desempenham suas funcções sem que seus bens sejam gravados de hypotheca legal, salvo si o pupillo possuir bens na época da instituição ou vier a possuil-os depois desta. Art. 45. O pae ou a mãe inhibido do patrio poder não póde ser reintegrado senão depois de preenchidas as seguintes condições. I, serem decorridos dous annos, pelo menos, depois de passada em julgado a respectiva Sentença, no caso de suspensão e cinco annos pelo menos, no caso de perda; lI, provar a sua regeneração ou o desapparecimento da causa da inhibição; lII, não haver inconveniencia na volta do menor ao seu poder; IV, ficar o menor sob a vigilancia do juiz ou tribunal durante um anno. Art. 46. Quando associações ou institutos regularmente autorizados ou particulares, no uso e goso dos seus direitos civis, tiverem acceitado o encargo de menores de 18 annos abaixo, que lhes tenham sido confiados pelos paes, mães ou tutores, o juiz ou tribunal do domicilio destes póde, a requerimento das partes interessadas e de commum accordo, decidir que em beneficio do menor sejam delegados os direitos do patrio poder e entregue o exercicio desses direitos A administração do estabelecimento ou ao particular guarda do menor. Art. 47. Quando as associações ou os institutos ou os particulares mencionados no artigo precedente tiverem recolhido o menor sem intervenção do pae, mãe ou tutor, devem fazer declaração, dentro de tres dias, á autoridade judicial, ou em falta desta á policial, da localidade em que n menor houver sido recolhido, sob pena de multa de 10$ a 50$; e a autoridade, que tiver recebido essa declaração, deve, em igual prazo e sob as mesmas penas, notifical-a ao pae, mãe, tutor. Em caso de reincidencia, applicar-se-ha a pena de prisão cellular de oito a trinta dias. Art. 48. Si dentro de um prazo razoavel, ao criterio da autoridade competente, mas nunca inferior a tres mezes. a datar da notificação, o pae, a mãe ou o tutor não reclamar o menor, quem o recolheu póde requerer ao juiz ou tribunal de seu domicilio que no interesse do menor o exercicio de todos ou parte dos direitos do patrio poder lhe seja confiado. Art. 49 .Quando o menor for entregue por ordem da autoridade judicial a um particular, para que fique sob a sua guarda ou á soldada, não ha necessidade de nomeação de tutor, salvo para os actos da vida civil em que é indispensavel o consentimento do pae ou mãe, e no caso do menor possuir bens: podendo, então, a tutela ser dada á mesma pessoa a que foi confiado o menor ou a outra. Art. 50. Quando, pela intervenção do pae, da mãe, do tutor ou por decisão judicial, o menor tiver sido confiado a alguma das pessoas previstas pelo artigos antecendentes e o reclamar

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quem tenha direito, si fôr provado que o reclamante desinteressou-se do menor desde logo tempo, a autoridade judicial póde, tomando em consideração o interesso do menor, mantel-o sob a guarda e responsabilidade da pessoa a quem estava confiado, determinando, si fôr preciso, as condições nas quaes o reclamante poderá vêl-o. Art. 51. Nos casos do artigo precedente, a autoridade judicial póde tambem, conforme as condições pessoaes do pae ou mãe, ou tutor, que reclama o menor, decretar a perda do patrio poder ou a remoção da tulola, concedendo-o, a quem o menor está confiado ou a outrem. Art. 52. Esse mesmo preceito é applicavel ao caso em que o responsavel pelo menor o entregue a terceiro, para o crear e educar gratuitamente, sem a declaração expressa de Ih'o restituir. Art. 53. A autoridade judicial póde a todo tempo, substituir o tutor ou guarda do menor, ex-officio, a requerimento do Ministério Publico ou das pessoas ás quaes aquelle foi confiado. Art. 54. Os menores confiados a particulares, a instituto ou associações, ficam sob a vigilancia do Estado, representado pela autoridade competente.

CAPITULO VI DAS MEDIDAS APPL ICAVEIS AOS MENORES ABANDONADOS Art. 55. A autoridade, a quem incumbir a assistencia e pprotecção aos menores, ordenará a apprehensão daqulles de que houver noticia, ou lhe forem presetnes, como abandonados os depositará em logar conveniente, o providenciará sobre sua guarda, educação e vigilancia, podendo, conforme, a idade, instrucção, profissão, saude, abandono ou perversão do menor e a situação social, moral e economica dos paes ou tutor, ou pessoa encarregada de sua guarda, adoptar uma das seguintes decisões. a) entregal-o aos paes ou tutor ou pessoa encarregada de sua guarda, sem condição alguma ou sob as condições qe julgar uteis á saude, segurança e moralidade do menor;; b) entregal-o a pessoa idonea, ou internal-o em hospital, asylo, instituto de educação, officina escola do preservação ou de reforma; c) ordenar as medidas convenientes aos que necessitem de tratamento especial, por soffrerem de qualquer doença physica ou mental; d) decretar a suspensão ou a perda do patrio poder ou a destituição da tutela; e) regular de maneira differente das estabelecidas nos dispositivos deste artigo a situação do menor, si houver para isso motivo grave, e fôr do interesse do menor. Art. 56. Si no prazo de trinta dias, a datar da entrada em, juizo o menor fugitivo ou perdido, ou que esteja nos casos do art. 26, ns. I e II, não fôr reclamado por quem de direito, o juiz, declarando-o abandonado, dar-lhe-ha conveniente destino. Todavia, a qualquer tempo que o responsavel reclamar, o menor poderá ser-lhe restituido. Art. 57. O menor reclamado será entregue si ficar provado: I, que se trata realmente do pae, mãe (legitimo, natural ou adoptivo), tutor ou encarregado de sua guarda; ll, que o abandono do menor foi motivado por circumstancia independente da vontade do reclamante; III, que o reclamante não se acha incurso em nenhum dos casos em que a lei commina a suspensão ou a pedra do patrio poder ou a destituição da tutela; IV, que a educação do menor não é prejudicada com a volta ao poder do reclamante. Art. 58. Feita a prova exigida no artigo antecedente, o menor poderá ser entregue por decisão do juiz. § 1º O menor, que fôr entregue, poderar ficar durante um prazo, não superior a um anno, sob a vigilancia do juiz, si assim fôr julgado necessario.

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§ 2º Si os paes ou tutor ou pessoa encarregada da guarda tiverem recursos pecuniarios sufficiente, será obrigados a indemnizar as despesas que com o menor houverem sido feitas. Esta indemnização tambem se dará no caso do menor não ser entregue. Art. 59. Em caso do não entrega do menor reclamado, o juiz declarará na sua decisão si cabe ou não procedimento criminal contra o pae, mãe, tutor ou encarregado do menor, por o haver abandonado ou maltratado. Art. 60. O pae a mãe, o tutor ou encarregado da guarda do menor julgado abandonado ou delinquente, que sciente e directamente houver excitado, favorecido ou produzido o estado em que se, acha o menor, ou de qualquer modo houver concorrido para a perversão deste ou para o tornar alcoolico ou deixando de prevenir podendo faze-lo os motivos que determinaram tal estado, incorrerá as multa de 100$ a 1:000$, além das mais penas que forem applicaveis. Art. 61. Si menores de idade inferior a 18 annos forem achados vadiando ou mendigando, serão apprehedidos a apresentados á autoridade judicial, a qual poderá. I. Si a vadiagem ou mendicidade não fôr habitual: a) reprehendol-os o os entregar ás pessoas que os tinham sob sua guarda, intimando estas a velar melhor por eIles; b) confial-os até A idade de 18 annos a uma pessoa idonea, uma sociedade em uma instituição de caridade ou de ensino publico ou privada. II. Si a vadiagem ou mendicidade fôr habitual internal-os até á maioridade em escola de preservação. Paragrapho único. Entende-se que o menor vadio ou mendigo habitual quando aprrehendido em estado de vadiagem ou mendicidade mais de duas vezes. Art. 62. Si menores de idade inferior a 18 annos se entregam á libertinagem, ou procuram seus recursos no (ilegível) ou em traficos ou occupações que os expõem á prostituição, á vadiagem, á mendicidade ou á, criminalidade, a autoridade policiai pode tornar uma das medidas especificadas no artigo antecedente, conforme a circumstancia de se dar ou não habitualidade. Art. 63. A todo tempo, ex-officio, a requerimento do Ministerio Publico, do menor ou do responsavel por este, a autoridade pode modificar a sua decisão a respeito da collocação do menor, em qualquer das hypotheses previstas neste capitulo. Art. 64. Um anno depois de começada a execução da decisão que colloca o menor fóra de sua familia, exceptuado os casos expressos em lei, o pae, a mãe ou o tutor poderá pedir á autoridade competente, que o menor lhe seja restituido justificando a sua emenda ou sua aptidão para educal-o. Em caso de recusa da autoridade haverá recurso com effeito devolutivo; e, rejeitado definitivamente o pedido, só poderá ser apresentado outro depois de novo prazo de um anno. Art. 65. Em todo caso, essas medidas serão objecto de revisão de tres em tres annos, quando seus effeito não houverem cessado no intervallo. Nos casos em que, decisão definitiva, proferida em gráo de recurso, fôr modificada, o juiz da execução recorrerá, ex-officio da decisão revisora para a autoridade que proferiu a sentença em execução. Art. 66. Os processos de internação de menores, abandono e inhibição do patrio poder, promovidos ex-officio ou por pessoas provadamente pobres, são isentos do pagamento de sellos e custas. Art. 67. As autoridades judiciarias e administrativas, ao usarem dos poderes que lhes são conferidos por este Codigo, deverão respeitar as convicções religiosas e phiìnsophicas das familias a que pertercerem os menores.

CAPITULO VII DOS MENORES DELINQUENTES

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Art. 68. O menor de 14 annos, indigitado autor ou cumplice de facto qualificado crime ou contravenção, não será submettido a processo penal de, especie alguma; a autoridade competente tomará sómente as informações precisas, registrando-as, sobre o facto punivel e seus agentes, o estado physico, mental e moral do menor, e a situação social, moral e economica dos paes ou tutor ou pessoa em cujo guarda viva. § 1º Si o menor soffrer de qualquer forma de alienação ou deficiencia mental. fôr apileptico, surdo-mudo, cego, ou por seu estado de saude precisar de cuidados especiaes, a autoridade ordenará seja elle submettido no tratamento apropriado. § 2º Si o menor fôr abandonado, pervertido ou estiver em perigo de o ser, a autoridade competente proverá a sua collocação em asylo casa de educação, escola de preservação ou confiará a pessoa idonea por todo o tempo necessario á sua educação comtando que não ultrapasse a idade de 21 annos. § 3º si o menor não fôr abandonado. nem pervertido, nem estiver em perigo do o ser, nem precisar de tratamento especial, a autoridade o deixará com os paes ou tutor ou pessoa sob cuja guarda viva, podendo fazel-o mediante condições que julgar uteis. § 4º São responsaveis, pela reparação civil do damno causado pelo menor os paes ou a pessoa a quem incumba legalmente a sua vigilancia, salvo si provarem que não houve da sua parte culpa ou negligencia. (Cod. Civ., arts. 1.521e 1.623.) Art. 69. O menor indigitado autor ou cumplice de facto qualificado crime ou Contravenção, que contar mais de 14 annos e menos de 18, será submettido a processo especial, tomando, ao mesmo tempo, a autoridade competente as precisas informações, a respeito do estado physico, mental e moral delle, e da situação social, moral e economica dos paes, tutor ou pessoa incumbida de sua guarda. § 1º Si o menor soffrer de qualquer forma de alienação ou deficiencia mental, fôr epileptico, sudo-mudo e cego ou por seu estado de saude precisar de cuidados especiaes, a autoridade ordenará seja submettido ao tratamento apropriado. § 2º Si o menor não fôr abandonado, nem pervertido, nem estiver em perigo de o ser, nem precisar do tratamento especial, a autoridade o recolherá a uma escola de reforma pelo prazo de um n cinco annos. § 3º Si o menor fôr abandonado, pervertido, ou estiver em perigo de o ser, a autoridade o internará em uma escola de reforma, por todo o tempo necessario á sua educação, que poderá ser de tres annos, no minimo e de sete annos, no maximo Art. 70. A autoridade póde a todo tempo, por proposta do director do respectivo estabelecimento, transferir o menor de uma escola de reforma para outra de preservação. Art. 71. Si fôr imputado crime, considerado grave pelas circumstancias do facto e condições pessoaes do agente, a um menor que contar mais de 16 e menos de 18 annos de idade ao tempo da perpetração, e ficar provado que se trata de individuo perigoso pelo seu estado de perversão moral o juiz Ihe applicar o art. 65 do Codigo Penal, e o remetterá a um estabelecimento para condemnados de menor idade, ou, em falta deste, a uma prisão commum com separação dos condemnados adultos, onde permanecerá até que se verifique sua regeneração, sem que, todavia, a duração da pena possa exceder o seu maximo legal. Art. 72. Tratando-se de contravenção, que não revele vicio ou má indole, póde o juiz ou tribunal, advertindo o menor entregal-o aos paes, tutor ou encarregado de sua guarda, ou dar-lhe outro destino, sem proferir condemnação. Art. 73. Em caso de absolvição o juiz ou tribunal pode: a) entregar o menor aos paes ou tutor ou pessoa encarregada da sua guarda, sem condições; b) entregal-o sob condições, como a submissão ao patronato, a aprendizagem de um officio ou uma arte, a abstenção de bebidas alcoolicas, a frequencia de uma escola, a garantia de bom comportamento, sob pena de suspensão ou perda do patrio poder ou destituição da tutela; c) entregal-o a pessoa idonea ou instituto de educação;

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d) sujeital-o a liberdade vigiada. Art. 74. São responsaveis pela reparação civil do damno causado pelo menor, os paes ou a pessoa a quem incumbia legalmente a sua vigilancia, salvo si provarem que não houve da sua parte culpa ou negligencia. (Cod. Civ., arts. 1.521 e 1.523.) Art. 75. Si o pae, a mãe, tutor ou responsavel pelo menor estiver em condições de o educar, e por culpa sua não o tiver feito, a autoridade lhe imporá a pena de multa de 100$ a 500$, ou a prisão cellular de cinco a 15 dias. Art. 76. A idade de 18 a 21 annos constitue circumstancia attenuante. (Cod. Penal, art. 42, § 11) Art. 77. Si, ao perpetrar o crime ou contravenção, o menor tinha mais de 18 annos e menos do 21, o cumprimento da pena será, durante a menoridade do condemnado, completamente separado dos presos maiores. Art. 78. Os vadios, mendigos, capoeiras, que tiverem mais de 18 annos e menos de 21, serão recolhidos á Colonia Correccional, pelo prazo de um a cinco annos. Art. 79. No caso de menor de idade inferior a 14 annos indigitado autor ou cumplice de facto qualificado crime ou contravenção, si das circumstancias da infracção e condições pessoaes d agente ou de seus paes, tutor ou guarda tornar-se perigoso deixal-o a cargo destes, o juiz ou tribunal ordenará sua collocação em asylo, casa de educação, escola de preservação, ou o confiara a pessoa idonea, até que complete 18 annos de idade. A restituição aos paes, tutor ou guarda poderá antecipar-se, mediante resolução judiciaria, e prévia justificação do bom procedimento do menor e daquelles. Art. 80. Tratando-se de menor do 14 a 18 annos sentenciado á internação em escola de reforma, o juiz ou tribunal póde antecipar o seu desligamento, ou retardal-o até ao maximo estabelecido na lei, fundando-se na personalidade moral do menor, na natureza da infracção e circumstancias que a rodearam no que possam servir para apreciar essa personalidade, e no comportamento no reformatorio, segundo informação fundamentada do director. Art. 81. Si o menor de 14 a 18 annos fôr sentenciado até a um anno de internação, o juiz ou tribunal, tomando em consideração a gravidade e a modalidade da infracção penal os motivos determinantes e a personalidade moral do menor, póde suspender a execução da sentença o pôl-o em liberdade vigiada. Art. 82. Quando a infraecção penal fôr muito leve pela sua natureza, e em favor do menor concorrerem circumstancias reveladoras de boa indole, o juiz ou tribunal póde deixar de condemnal - o, e, advertindo-o, ordenará as medidas da guarda. vigilancia o educação, que lhe parecerem uteis. Art. 83. O juiz ou tribunal póde renunciar a toda medida, si são passados seis mezes, depois que a infracção foi commettida por menor de 14 annos, ou si já decorreu metade do prazo para a prescripção da acção penal ordinaria, quando se tratar de infracção attribuida a menor de 14 a 18 annos. Art. 84. Toda internação que não tenha sido posta em execução durante tres annos, não poderá mais ser executada. Art. 85. O menor que ainda não completou 18 annos não póde ser considerado reincidente; mas, a repetição de infracção penal da mesma natureza ou a perpetração de outra differente contribuirá para o equiparar a menor moralmente pervertido ou com persistente tendencia ao delicto. Art. 86. Nenhum menor de 18 annos, preso por qualquer motivo ou apprechendido, será recolhido a prisão commum. § 1º Em caso de prisão em flagrante, a autoridade a quem fôr apresentado o menor, si não fôr a mesma competente para a instrucção criminal, deve limitar-se a proceder as formalidades essenciaes do auto de prisão ou apprehensão, e remetter aquelle sem demora á competente, proseguindo sem a presença do menor nas investigações e delingencias necessarias.

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§ 2º Si não puder ser fita immediatamente a apresentação a autoridade Competente para a instrucção Criminal, poderá o menor ser confiado, mediante, termo do responsabilidade, a sua propria familia, si elle não fôr profundamente vicioso e esta manifestamente má, ou, então, entregue a pessoa idonea ou a algum instituto de ensino ou de caridade, ou, finalmente, recolhido a estabelecimento que, não sendo destinado a prisão, queria, todavia, prestar-se a isso. § 3º Em caso, porérn, de absoluta necessidade, pela impossibilidade material de encontrar quem possa acolher provisoriamente o menor, póde este ser guardado preventivamente em algum compartimento da prisão commum, separado, entretanto, dos presos adultos. § 4º Si o menor não tiver sido preso em flagrante, mas a autoridade competente para a instrucção criminal achar conveniente não o deixar em liberdade, procederá de accôrdo com os §§ 2º e 3º. Art. 87. Em falta de estabelecimentos apropriados á execução do regimen creado por este Codigo, os menores de 14 a 18 annos sentenciados a internação em escola do reforma serão recolhidos a prisões comuns, porém, separados dos condemnados maiores, e sujeitos a regime adequado; - disciplinar o educativo, em vez de penitenciario. Art. 88. O processo a que forem submetidos os menores de 18 annos será sempre secreto. Só poderão assistir ás audiencias as pessoas necessarias ao processo e as autorizadas pelo juiz. Art. 89. É vedada a publicação, total ou parcial, pela imprensa ou por qualquer outro meio, dos aclos o documentos, do processo, debate e occurrencias das audiencias e decisões das autoridades. Assim tambem a exibição de retratos dos.menores.processados, de qualquer ilustração que lhes diga respeito ou se refira aos factos que lhes são imputados. Todavia, as sentenças poderão ser publicadas, sem que o nome do menor possa ser indicado por outro modo que por uma inicial. As infrações deste, artigo serão punidas com a multa de 1:000$ a 3:000$, além do sequestro da publicação e de outras penas que possam caber. Art. 90. No processo em que houver co-réos menoras do 18 annos e, maiores dessa, idade, se observará também esta regra, e para o julgamento se procederá á separação dos :menores. Art. 91 Os menores de 18 annos não podem assistir ás Audiencias e sessões dos juizes e tribunaes, nem ás do Juizo de menores, senão para a instrucção e o julgamento dos processos contra. elles dirigidos, quando houverem sido intimados a comparecer, ou quando houverem de depor como testemunhas, e; sómente durante o tempo em, que sua presença for necessaria.

CAPITULO VIII DA LIBERDADE VIGIADA Art. 92. A liberdade vigiada, consiste em ficar o menor companhia e sob a responsabilidade dos paes, tutor ou guarda, ou aos cuidados de um patronato, e sob a vigilancia do juiz, de accôrdo com os preceitos seguintes. 1. A vigilancia sobre os menores será executada pela pessoa e sob a forma determinada pelo respectivo juiz. 2. O juiz póde impor as menores as regras de procedimento e aos seus responsaveis as condições, que achar convenientes. 3. O menor fica, obrigado a comparecer em juizo nos dias e horas que forem designados. Em caso de morte, mudança de residencia ou ausencia não antorizada do menor, os paes, o autor ou guarda são obrigados a prevenir o juiz sem demora. 4. Entre as condições a estabelecer pelo juiz póde figurar a obrigação de serem feitas as reparações. indemnizações ou restituições devidas, bem como as de pagar as custas do processo, salvo caso de insolvencia provada e reconhecida pelo juiz, que poderá fixar prazo para ultimação desses pagamentos, tendo em attenção as condições economicas e profissionaes do menor e do seu responsavel legal. 5. A vigilancia não excederá de um anno.

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6. A transgressão dos preceitos impostos pelo juiz é punivel : a) com multa de 10 a 100$ aos paes ou autor ou guarda, si da sua parte tiver havido negligencia ou tolerancia pela falta commettida; b) com a detenção do menor até oito dias: c) com a remoção do menor. Art. 93. O liberado, juntamento com o seu responsavel, assignará um termo, do qual constarão as condições do livramento. Art. 94. A liberdade vigiada será revogada, si o menor commetter algum crime ou contravenção que importe pena restrictiva da liberdade, ou si não cumprir alguma das clausulas da concessão. Em tal caso, o menor será de novo internado, e o tempo decorrido durante o livramento não será computado. Decorrido, porém, todo o tempo que faltava, sem que o livramento seja revogado, a liberdade se tornará definitiva. Art. 95. A liberdade vigiada, será concedida por decisão do juiz competente, ex - officio ou mediante iniciativa o proposta do director da respectiva escola, o qual justificará em fundamento relatorio a conveniencia da concessão della. Art. 96. O juiz explicará ao menor, bem como a seus paes, tutor ou guarda, o caracter e o objecto dessa medida. Art. 97. Si a familia do menor ou o seu responsavel não offerecer sufficientes garantias de moralidade ou não puder occupar-se delle, deverá este ser collocado de preferencia em officina ou estabelecimento industrial ou agricola. sob a vigilancia do pessoa designada pelo juiz ou de patrono voluntario acceito por este; sendo lavrado termo de compromisso, assignado pelo juiz, o menor, o vigilante, ou patrono, e o chefe de familia, officina ou estabelecimento. Art. 98. A pessoa encarregada da vigilancia é obrigada a velar continuamente pelo comportamento do menor, e a visital-o frequentemente na casa ou em qualquer outro local, onde se ache internado. Não póde, porém, penctrar á noite nas habitações nem o consentimento do dono da casa. Quem impedir o seu licito ingresso será punido com as penas dos arts 124 e 134, do Codigo Penal. § 1º Deve tambem fazer periodicamente, conforme lhe fôr determinado, e todas as vezes que considerar util, relatorio ao juiz sobre a situação moral e material do menor. e tudo o que interessar A sorte deste. § 2º Em vista das informações do encarregado da vigilancia, ou espontaneamente, em caso de mão comportamento ou de perigo moral do menor em Liberdade vigiada, assim como no caso de serem creados embaraços systematicos vigilancia, o juiz póde, chama: á sua presença o rnenor, os paes, lutor ou guarda, para tomar esclarecimentos e adoptar a providencia que convier. Art. 99. O menor internado em escola de reforma poderá ubter Liberdade vigiada, concorrendo as seguintes condições: a) si tiver 16 annos completos; b) si houver cumprido, pelo menos, o minímo legal do tempo de internação; c) si não houver praticado outra infracção; d) si fór considerado normalmente regenerado; e) si estiver apto a ganhar honradamente a vida, ou tiver meios de subsistencia em quem lhos ministre; f) si a pessoa ou familia, em cuja companhia tenha de viver, fôr considerada idonea, de modo que seja presumive não commetter outra infracção. Art. 100. Além do caso do artigo anterior, o juiz ou tribunal póde pôr o mcnor em liberdade vigiada nos casos dos artigos, 36, 45 n. IV, 55, a e b, 58, § 1º,68, § 3º, 72, 73, 81, 175 n. I, 179 ns. I e II, e sempre que julgar necessario á segurança ou moralidade do menor.

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CAPITULO IX DO TRABALAHO DOS MENORES Art. 101. é prohibido em todo o territorio da Republica o trabalho nos menores de 12 annos. Art. 102. Igualmente não se póde ocupar a maiores dessa idade que contem menos de 14 annos. e que não tenham completando sua instrucção primaria. Todavia. a autoridade competente poderá autorizar o trabalho destes, quando o considere indispensavel para a subsistencia dos mesmos ou de seus paes ou irmãos, comtanto que recebam a instrucção escolar, que lhes seja possivel. Art. 103. Os menores não podem ser admittidos nas usinas, manufacturas, estaleiros, minas ou qualquer trabalho subterraneo, pedreiras, officinas e suas dependencias. de qualquer natureza que sejam, publicas ou privadas, ainda quando esses estabelecimentos tenham caracter profissional ou de beneficencia, antes da idade de 11 annos. § 1º Essa disposição applica-se no aprendizado de menores em qualquer desses estabelecimentos. § 2º Exceptuam-se os estabelecimentos em que são empregados sómente os membros da familia sob a autoridade do pae, da mãe ou do tutor. § 3º Todavia, os menores providos de certificados de estudos primarios, pelo menos do curso elementar, podem ser, empregados a partir da idade de 12 annos. Art. 104. Sao prohibidos aos menores de 18 annos os trabalhos perigosos á saude, á vida, á moralidade, excessivamente,. fatigantes ou que excedam suas forças. Art. 105. Nenhum menor de idade inferior a 18 annos póde ser admittido ao trabalho, sem que esteja munido de certificado de aptidão physica, passado gratuitamente por medico que tenha qualidade official para fazel-o. Si o exame fôr impugnado pela pessoa legalmente responsavel pelo menor, poder-se-ha. a seu requerimento, proceder a outro. Art. 106. As autoridades incumbidas da inspecção do trabalho, em seus delegados, podem sempre requerer exame medico de todos os menores empregados abaixo de 18 annos, para o effeito de verificar si os trabalhos, de que lhes estão encarregados, excedem suas- forças; e têm o direito de os fazer abandonar o serviço, si assim opinar o medico examinador. Cabe ao responsavel legal do menor o direito do impugnar o exame e requerer; outro. Art. 107. Nos instiluíos em que é dada instrucção primaria, não póde passar de tres horas por dia o ensino manual ou profissional para menores abaixo do 14 anos, salvo si possuirem o alludido certificado de curso elementar, e contarem mais de 32 annos de idade. Art. 108. O trabalho dos menores, aprendizes ou operarios. abaixo de 38 anos. tanto nos estabelecimentos mencionados no art,. 103, como nos não mencionados, não póde exceder de sois horas por dia. interrompidas por um ou varios repouso; cuja duraração não póde, ser inferior a uma hora. Art. 109. Não podem ser empregados em trabalhos nocturnos os operarios ou aprendizes menores de 18 annos. Parágrapho unico. Todo trabalho entre sete horas da noite e cinco horas da manhã é considerado trabalho noturno. Art. 110. As infracções aos artigos anteriores serão punidas com pena de multa de 50$ a 504$, por cada menor em pregado, não podendo, porém, a somma total de milhões exceder de 3:000$; e em caso de reincidencia. à multa póde ser addicionada prisão celular de oito dias até tres mezes. Paragrapho unico. Aquelles que, tendo autoridade, cuidado ou vigilancia sobre o menor, infringirem os dispositivos deste capitulo, confiando-lhe.ou permitindo-lhe trabalho prohibido, serão punidos com as mesmas penas, e mais a destiluição de respectivo poder. Art. 111. Os menores do sexo masculino de menos do 18 annos e os do Feminino de menos de 18, não podem ser empregados como actores, figurantes, ou de qualquer outro modo, nas

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representações publicas dadas em theatros e outras casas do divisões de qualquer genro, sob pena de muita do 1:000$ a 3:000$000. Tambem sob as mesmas penas, é interdicto a taes menores todo trabalho em estabelecimentos theatraes ou analogos, inclusive a venda de quaesquer objetos. § 1º Todavia, a autoridade competente póde, exepcionalmente, autorizar o empregado de um ou vários menores nos theatros, para representação de determinadas peças. § 2º Nos cafés-concertos e cabarats a prohibição vae até maioridade. Art. 112. Nenhum varão menor de 14 anos, nem mulher solteira menor de 18 anos, poderá exercer occupação alguma que se desempenho nas ruas, praças ou logares públicos; sob pena de ser apprehendido e julgado abandonado, e imposta ao seu responsável legal 50$ a 500$ de multa e dez a trinta dias de prisão cellular. Paragrapho único. Os menores de 14 a 18 annos só poderão entregar-se a occupações desse gênero mediante habitação perante a autoridade competente, e deverão ter sempre comsigo o titulo de licença e trazer visível a chapa numérica correspondente. Art. 113. Todo individuo que fizer executar por menores de idade inferior a 16 annos exercícios de força, perigosos ou de deslocação; todo individuo que não o pae ou a mãe, o qual pratique as profissões de acrobata, saltibanco, gymanasta, mostrador de animaes ou director de circo ou análogas, que empregar em suas representações menores de idade inferior a 16 annos, será punido com a pena de multa de 100$ a 1:000$ e prisão cellular de três mezes a um anno. Paragrapho único. A mesma pena e mais a suspensão do pátrio poder é applicavel ao pae ou mãe que, exercendo as profissões acima designadas, empregue nas representações filhos menores de 12 anos. Art. 114. O pae, a mãe, ou tutor ou patrão, e geralmente toda pessoa que tenha autoridade sobre um menor ou o tenha á sua guarda ou aos seus cuidados, e que dê, gratuitamente ou por dinheiro, seu filho, pupilo, aprendiz ou subordinado, de menos de 16 annos, a individuo que exerça qualquer das profissões acima especificadas, ou que os colloque sob a direcção de vagabundos, pessoas sem occupação ou meio de vida ou que vivam na mendicidade, serão punidos com a pena de multa de 50$ a 500$ e prisão cellular de dez a trinta dias. Paragrapho único. A mesma pena será applicada aos intermediários ou agentes, que entregarem ou fizerem entregar os ditos menores, e a quem quer que induza menores de idade inferior a 16 annos a deixarem o domicilio de seus Paes ou tutores ou guardas, para seguirem individuso dos acima mencionados. Art. 115 Os menores que houverem de tomar parte em espectaculos theatraes, sejam ou não de companhias infantis, ou em companhias eqüestres, de acrobacia prestidigitação, ou semelhantes, só serão admittidos mediante as seguintes condições: 1, os emprezarios ou responsáveis pelo espectaculo apresentarão á autoridade fiscalizadora autorização em devida forma dos paes ou represetantes legaes dos menores, para que estes tomem parte nos rcpresentações, o exporão em me morial as condições e o tempo de trabalho diario dos menores ; II, os menores não trabalharão em mais de um espectaculo por dia, salvo permissão especial, o a autoridade fiscalizadora póde exigir a alteração do tempo e morio de serviço, si a julgar conveniente á saude dos menores, negando a licença, si não fôr aceeita a alteração indicada, e cassando-a, no caso do não ser exactamente observada; III, O licito á autoridade fiscalizadora exigir que os menores sejam submettidos a exame medico de capacidade physica, e fiscalizar si a alimentação e o alojamento delles são conformes ás exigencias da hygiene, assim como verificar si elles são pagos regularmente pela forma convencionada com seus paes ou representantes legaes;

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IV, os menores não tomarão parte em peças, actos on scenas que possam offender o seu pudor ou a sua moralidade, ou despertar nelles intinctos máos ou doentios, ou que não sejam adequados á sua idade ou ao seu desenvolvimento physico e intellectual; V. não andarão em companhia de gente viciosa ou de má vida. Art. 116. E' prohibido empregar menores de 18 annos na confecção, no fornecimento ou na venda de escriptos, impressos, cartazes, desenhos, gravuras, pinturas, emblemas, imagens ou outros objectos, cuja venda, offerta, distribuição, afixação ou exposição são punidos pelas leis penaes como contrarios aos bons costumes, e bem assim em qualquer genero de trabalho relativo a esses mesmos objectos, que, embora não incorram na sancção das leis penaes, são de natuveza a offender sua moralidade. Penas: multa de 50$ a 500$, apprehensão e destruição dos objectos. Art. 117. Os chefes dos estabelecimentos industriaes e commerciaes, em que são empregados menores de 18 annos como operarios ou aprendizes, são obrigados a velar pela manutenção dos bons costumes e da decencia publica, bem como da hygiene e segurança dos logares de trabalho. Art. 118. Serão designados em regulamento expedido pelo governo quaes os generos de trabalho em que seja prohibido empregar menores de 18 annos, como operarios ou aprendizes, por serem insalubres ou perigosos, em virtude de ficarem os menores expostos a manipulações ou a emanações prejudiciaes á saude. Paragrapho unico. Emquanto não fôr publicado esse regulamento, a qualificação desses trabalhos será feita pelos funccionarios sanitarios a quem couber, com homologação da autoridade fiscal dos trabalhos dos menores. Art. 119. Os patrões ou chefes de industria e os locadores de força, motriz .são obrigados a affixar em cada estabelecimento as disposições legaes concernentes ao trabalho dos rnenores de 48 annos, e mais particularmente as referentes á sua industria. Art. 120. Em todas as salas de trabalho de operarios menores de 18 annos, officinas dos orphanatos, asylos de caridade ou beneficencia, dependentes de estabelecimentos religiosos ou leigos, deve ser collocado um quadro permanente, indicando em caracteres facilmente legiveis, as condições do trabalho dos menores, as hora,s em que começa e acaba o trabalho, assim como as horas e duração dos repousos, e determinando o emprego do dia. Art. 121. Os directores dos estabelecimentos referidos no artigo anterior devem remetter á autoridade fiscal dos trabalhos dos menores, em cada tres mezes, uma relação nominativa completa dos menores ahi empregados, indicando seus nomes, data e logar do nascimento, assignalando em cada relação as mutações havidas depois da remessa da anterior. Art. 122. Os chefes de industria ou patrões são obrigados a fornecer gratuitamente ao pae, mãe, tutor ou guarda do menor operario uma caderneta, na qual serão inscriptos o nome do menor, a data e o logar do seu nascimento, seu domicilio, a data de entrada para o estabelecimento o a da sahida. E nas dos menores que contarem 13 e 12 annos, será mencionado que elle possue certificado de instrucção primaria, pelo menos o elementar. Art. 123. Haverá tambem nesses estabelecimentos um registro, no qual senão mencionadas todas as indicações dos dous artigos anteriores. Art. 124. Todo individuo que exerça profissão ambulante, e tenha às suas ordens menores de 48 annos, é obrigado a trazer comsigo as respectivas certidões de idade, e justificar permite a autoridade competente, quando o exigir, a identidade delles mediante caderneta ou passaporte. Art. 125. A infração de qualquer dos dispositivos dos arts. 117 a 124 sera punida com a pena de 20$ a 2000 de multa, e o dobro nas reincidencias.

CAPITULO X DA VIGILANCIA SOBRE OS MENORES

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Art. 136. A autoridade publica encarregada da proteção nos menores póde visitar as escolas, officinas e qualquer outro logar onde se achem menores, e proceder a investigações, tomando as providencias que forem necessarias. § 1º tambem póde visitar as familias a respeito das quaes tenha tido denuncia, ou de algum outro modo venha a saber, de faltas graves na protecção physica ou moral dos menores. § 2º Póde ordenar o fechamento dos institutos destinados exclusivamente a menores, nos casos de infracção das leis de assistencia e protecção aos menores e offensas aos bons costumes, procedendo á verificação dos factos em processo summarisaimo, remettendo depois os culpados ao juizo que couber, § 3º As funcções de vigilancia e inspecção podem ser exercidas por funcionarios especiaes sob a direcção da autoridade competente. Art. 127. Nos collegios, escolas, asylos, em todos os institutos de educação ou de instrucção, bem como nos de assistencia, é prohibida, salvo prescrição medida, a subministração de bebidas alcoolicas aos menores. Pena de multa de 100$; em caso de reincidencia a multa pode ser elevada até 500$ ou substituida por prisão de oito a trinta dias. Art. 128. A. entrada das salas de espectaculos cinematographicos é interdicta aos menores de 14 annos, que não se apresentarem acompanhados de seus paes ou tutores ou qualquer outro responsavel. § 1º Poderão os estabelecimentos cinematographicos organizar para creanças até 14 anos,sessões diurnas, nas quaes sejam exibidas peliculas instructivas ou recreativas, devidamente approvadas pela autoridade fiscalizadora; e a essas sessões poderão os menores de 14 annos comparecer desacompanhados. § 2º Em todo caso é vedado nos menores de 14 annos o accesso a espectaculos, que terminem depois das 20 horas. § 3º As creanças de menos de 5 annos não poderão em caso algum ser levadas as representações. § 4º São prohibidas representações menores 18 annos do todas as fitas que façam temer influencia prejudicial sobre o desenvolvimento moral, intellectual ou physico, e possam excitar-lhes perigosamente a fantasia, despertar instinctos máos ou doentios, corromper pela força de suas suggestões. § 5º Será affixado claramente na entrada dos locaes de representações em que limites de idade o espectaculo é accessivel sendo prohibida a venda de entrada aos menores impedidos por lei. § 6º O trabalho dos menores nos stadios cinematographicos é, submetido ás regras commummente applicadas aos outros trabalhos de menores, e mais seguintes condições: I, autoriza escripta dos paes ou seus responsaveis legaes; II, licença especial da autoridade competente; III, a preparação e o desenvolvimento das seenas não se realizarão em horas adiantadas da noite, nem em logares insalubres ou perigosos; IV, a obra a representa será por sua qualidade duração compativel com a idade e as condições physicas dos menores para os quaes é pedida autorização, e o assumpto da representação será tal que não possa causar danno moral a elles; V, as permissões a creanças até tres annos de idade só serão concedidas excepcionalmente, quando a comparticipação dellas for necessaria no interesse da arte e da seiencia, e quando tiverem sido tomadas medidas especiaes para a protecção da saude e para os cuidados e salvaguarda da creança. § 7º Os emprezarios, directores ou donos de estabelecimentos cinematographicos, ou os responsaveis pelos espectaculos, que permittirem o accesso destes aos menores prohibidos por lei, ficam sujeitos á multa de 50$ a 200$ por menor adimitido, e ao dobro nas reincidencias. E nas mesmas penas incorrerão juntamente com essas pessoas os vendedores ou distribuidores de entradas, porteiros e empregados que venderem ou permitirem ingresso a menores

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interdictos de accesso aos espectaculos. Do mesmo modo serão punidas as pessoas que conduzirem consigo á representação menores aos quaes ella é interdicta; ou que tolerem ou permittam que menores sob sua responsabilidade ou a seus cuidados tenham accesso a representação prohibida. Em caso dc reincidencia, si o director ou dono do estabelecimento cinematographico ou o responsavel pelo espectaculo procedeu intencionalmente, a autoridade judiciaria, além dessas penas, poderá impor a de fechamento do estabelecimento e suspensão da exploração cinematographica por um prazo não excedente de seis mezes. § 8º A violacão do § 6" deste artigo dará, logar applicação uns penas do art. 110 e seu paragrapho. Art. 129. Os mesmos preceitos applicam-se ao accesso dos espectaculos em qualquer outra casa de diversões publicas, resalvados os dispositivos especiaes. Art. 130. Sob as mesmas penas não é permittido : aos menores de 18 annos o ingresso em casas de dancing ou de bailes publicos, qualquer que seja o titulo ou denominação que adoptem; aos menores de 21 annos o accesso aos cafés-concertos, music-halls, cabarets, bars nocturnos e congeneres; a entrada em casas de jogo aos menores de 21 annos. Art. 131. A autoridade protectora dos menores póde emìtir para a protecção e assistencia destes qualquer provimento, que ao seu prudente arbitrio parecer conveniente, ficando sujeita á responsabilidade pelos abusos de poder.

CAPITULO XI DE VARIOS CRIMES E CONTRAVENÇÕES Art. 132. O art. 292 do Codigo Penal é substituido pelo seguinte : "Expôr a perigo de morte ou de grave e imminente damno á saude ou ao corpo, ou abandonar, ou deixar ao desamparo, menor de idade inferior a sete annos, que esteja sub-mottido á sua autoridade, confiado á sua guarda ou entregue aos seus cuidados. Pena de prisão cellular de tres mezes a um anno. § 1º Si resultar grave damno ao corpo ou á saude do menor, o culpado será punido com prisão cellular de um a cinco annos; e de cinco a doze, si resultar a morte. § 2º As penas serão augmentadas de um terço: a) si o abandono occorrer em logar ermo; b) si o crime fôr commettido pelos paes em damno dos filhos, legitimos ou reconhecidos ou legalmente declarados, ou pelo adoptante em damno do filho adoptivo, ou pelo tutor em damno do pupillo. § 3º Quando o crime recaia sobre infante ainda não inscripto no registro civil, e dentro do prazo legal da inscripção, para salvar a honra propria ou da mulher ou da mãe, da descendente, da filha adoptiva ou irmã, a pena é diminuida de um terço a um sexto. Art. 133. Abandonar menor de 16 annos de idade, para com o qual tenha o dever legal de prover á manutencão, ou esteja sob o sua guarda ou confiado aos seus cuidados. Pena de prisão cellular de tres mezes a um anno. Paragrapho unico. Quando o abandono si dér por negligencia da pessoa responsabilidade pelo menor, a pena será de um a tres mezes de prísão cellular e multa de 50$ a 500$000. Art. 134. Negar sem justa causa ao filho, legitimo, natural ou adoptivo, menor de 16 annos de idade, os alimentos ou subsidios, que lhe deve em virtude de lei ou de uma convenção ou de decisão de autoridade competente; deixar de pagar, tendo recursos, a sua manutenção, estando elle confiado á terceiro com essa obrigação; recusar-se a retomal-o; abandonar, embora não o deixando só, quando elle se achar em perigo de morte ou em perigo grave e imminente para

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sua saude. Pena de prisão cellular de oito dias a dous mezes, e multa de 20$ a 200$; além da inhibicão do patrio poder. Art. 135. Desencarregar-se do filho, entregando-o a longo termo aos cuidados de pessoas, com as quaes sabia ou devia presumir que elle se acha moral ou materialmente em perigo. Pena de prisão cellular de quinze dias a tres mezes; e de um a seis mezes si a entre a foi feita com fito de lucro. Art. 136. Subtrahir, ou tentar subtrahir, menor de 18 annos ao processo contra elle intentado em virtude de lei sobre a protecção da infancia e adolescencia; subtrahil-o ou tentar subtrahil-o, embora com o seu consentimento, á guarda das pessoas a quem a autoridade competente o houver confiado; induzil-o a fugir do logar onde se achar collocado por aquelle a cuja autoridade estiver submetido ou a cuja guarda estiver confiado ou a cujos cuidados estiver entregue; não o apresentar, sem legitima excusa, ás pessoas que tenham o direito de reclamal-o. Penas de prisão cellular de trinta dias a um anno, e multa de 100$ a. 1:000$000. Si o culpado for o pae ou a mãe ou o tutor, as penas podem ser elevadas ao dobro. Paragrapho unico. Não restituir o menor nos casos deste artigo. Pena de prisão cellular de dous a doze annos. Art. 137. Applicar castigos immoderados, abusando dos meios de correcção ou disciplina, a menor de 18 annos, sujeito a sua autoridade, ou que lhe foi confiado, para crear, educar, instruir, ter sob a sua guarda ou a seus cuidados ou para o exercicio de uma profissão ou arte. Pena de prisão cellular de tres mezes a um anno; com a inhibicão do patrio poder ou remoção da tutela, si o culpado fôr pae ou mãe ou tutor. Art. 138. Dar a menor de 18 annos, sujeito a seu poder, cargo, guarda ou cuidado, máos tratos habituaes, de maneira que prejudique sua saude ou seu desenvolvimento intellectual, Pena de prisão cellular de tres mezes a um anno; com inhibição do patrio poder ou remoção da tutela. si o culpado fôr o pae a mãe ou tutor. Art. 139. Privar voluntariamente de alimentos ou de cuidados indispensaveis, ao ponto de lhe comprometter a saude, menor de 18 annos, sujeito a seu poder ou confiado a seu cargo ou guarda ou cuidado, e que não esteja em condições de prover á sua propria manutenção. Pena de prisão cellular de tres mezes a um anno; com a inhibição do patrio poder ou remoção da tutela, si o culpado fôr o pae, a mãe, ou tutor. Art. 140. Fatigar physica ou intellectualmente com excesso de trabalho, por espirito de lucro, ou por egoismo, ou por deshumanidade, menor de 18 annos, que lhe esteja subordinado como empregado, operario, aprendiz, domestico. alumno ou pensionista, de maneira que a saude do fatigado seja affectada ou gravemente compromettida. Pena de prisão cellular de tres mezes a um anno. Art. 141. Nos casos dos quatro artigos precedentes, si os castigos immoderados, os máos tratos, a privação de alimentos ou de cuidados, o excesso de fadiga causaram lesão corporal grave, ou comprometteram gravemente o desenvolvimento intellectual do menor, e si o delinquente podia prever esse resultado, a pena será de prisão cellular de um a cinco annos; e de cinco a doze annos, si causaram a morte, e o delinquente podia prevel-o. Art. 142. Mendigar em companhia de menor de 18 annos, ainda que seja filho, ou permittir que menor sujeito a seu poder ou confiado a sua guarda ou cuidado, ande a mendigar, francamente, ou sob pretexto de cantar, tocar qualquer instrumento, representar, offerecer qualquer objecto à venda, ou cousa semelhante, ou servir-se desse menor com o fim de exercitar commiseração publica. Pena de prisão cellular por um a tres mezes; com a inhibicão do patrio poder, si fôr o pae, ou a mãe. Art. 143. Permittir que menor de 18 annos, sujeito a seu poder ou confiado a sua guarda ou a seu cuidado : a) frequente casa de jogo prohibido ou mal afamada; ou ande em companhia de gente viciosa ou de má vida;

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b) frequente casas do espectaculos pornographicos, onde se representam ou apresentam scenas que podem ferir o pudor ou a moralidade do menor, ou provocar os seus instinctos máos ou doentios; c) frequente ou resida, sob pretexto serio, em casa de prostituta ou de tolerancia. Pena de prisão cellular de quinze dias a dous mezes, ou multa de 20$ a 200$000, ou ambas. Paragrapho unico. Si o menor vier a soffrer algum attentado sexual, ou se prostituir, a pena póde ser elevada ao dobro ou ao triplo, conforme o responsavel pelo menor tiver contribuido para a frequencia illicita deliberadamente ou por negligencia grave e continuada. Art. 144. Fornecer de qualquer modo escriptos, imagens, desenhos ou objectos obsceno a menor de 48 annos. Penas de prisão cellular por oito a trinta dias; multa ds 10$ a 500$000; apprehensão e destruição dos escriptos, imagens, desenhos ou objectos obscenos. Art. 145. As multas cobradas em virtude de infracções das leis protectoras dos rnenores serão recolhidas ao Thesouro Nacional ou ás repartições fiscaes estaduaes, como receita especial destinada aos serviços de protecção e assistencia áquelles.

PARTE ESPECIAL Disposições referentes ao Districto Federal

CAPITULO I DO JUIZO PRIVATIVO DOS MENORES ABANDONADOS E DELINQUENTER Art. 146. E' creado no Districto Federal um Juizo de Menores, para assistencia, protecção, defesa, processo e julgamento dos menores abandonados e delinquentes, que tenham menos de 18 annos. Art. 447. Ao juiz de menores compete : I, processar e julgar o abandono de menores de 18 annos, nos termos deste Codigo e os crimes ou contravenções por elles perpetrados; II, inquirir e examinar o estado physica, mental e moral dos menores, que comparecerem a juizo, e, ao mesmo tempo.a situação social, moral e economica dos paes, tutores e responsaveis por sua guarda; III, ordenar as medidas concernentes ao tratamento, collocação, guarda, vigilancia e educação dos menores abandonados ou delinquentes; IV. decretar a suspensão ou a perda do patrio poder ou a destituição da tutela, e nomear tutores; V, supprir o consentimento dos paes ou tutores para o casamento do menores subordinados á sua jurisdicção; VI, conceder a emancipação nos termos do art. 9º, paragrapho unico, n. 1, do Codigo Civil, aos rnenores "sob sua jurisdicção ; VII, expedir mandado de buscar a apprehensão de menores, .salvo sendo incidente de acção de nullidade ou anullação de casamento ou do desquite, ou tratando-se de casos da competencia dos juizes de orphãos; VIII, processar e julgar as infracções das leis e dos regulamentos de assistencia e protecção aos menores de 18 annos; IX, processar e julgar as acções de soldada dos menores sob sua jurisdicção; X, conceder fiança nos processos de sua competencia; XI, fiscalizar o trabalho dos menores; XIl, fiscalizar os estabeleccimentos de preservação e de reforma, e quaesquer outros em que se achem menores sob sua jurisdição. tomando as providencias que lhe parecerem necessarias; XIII, praticar todos os actos de jurisdicção voluntaria tendentes já protecção e assistencia aos menores de 18 annos, embora não sejam abandonados, resalvada a competencia, dos juizes de orphãos;

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XIV, exercer as demais attribuições pertencentes aos juizes do direito e comprehensivas na sua jurisdicção privativa; XV, cumprir e fazer cumprir as disposições deste Codigo, applicando nos casos omissos as disposições de outras leis, que forem adaptaveis ás causas civeis e criminaes da sua competencia: XVI, organizar uma estatistica annual e um relatorio documentado do movimento do juizo, que remetterá no Ministro da Justiça e Negocios Interiores; Art. 118. No juizo privativo de menores haverá mais o seguinte pessoal: 1 curador que accumulará as funcções de promotor; 1 medico-psychiatra; 1 advogado ; 1 escrivão; 4 escreventes juramentados; 10 commissarios de vigilancia; 4 officiaes de justiça; 1 porteiro; 1 Servente. Art. 149. O curador desempenhará as funções de curador de orphãos nos processos de abandono, e de suspensão ou perda do patrio poder ou distribuição da tutela, e as do promotor publico nos processos de menores delinquentes. e nos das infracções penaes ás leis de assistencia e protecção nos menores. Nas outras acções terá as attribuições que lhe couberem como representante do ministerio publico. Art. 150. Ao medico-psychiatra incumbe: I, proceder a todos os exames medicos e observações dos menores levados a juizo, e aos que o juiz determinar; II, fazer ás pessoas das famílias dos menores as visitas medicas necessarias para as investigações dos antecedentes hereditarios e pessoaes destes; III, desempenhar o serviço medico do Abrigo annexo ao juizo de menores. Art. 151. Ao advogado compete defender nos processos criminaes as menores que não tiverem defensor, e prestar nos processos civeis assistencia aos litigantes pobres Art. 152. Aos commissarios de vigilancia cabe: I, proceder a todas as investigações relativas aos menores, seus paes, tutores ou encarregados de sua guarda, e cumprir as instrucções que lhes forem dadas pelo juiz: II, deter ou apprehnder os menores abandonados ou delinquentes, levando-os á presença do juiz; III, vigiar ns menores, que lhes forem indicados; IV, desempenhar os demais serviços ordenados pelo juiz.. § 1º Os commissarios de vigilancia são da immediata confiança do juiz. § 2º Poderão ser admittidas na qualidade de commissarins de vìgilancia, voluntarios, secretos e gratuitos, pessoas idoneas, que mereçam a confiança do juiz. Art. 153. O escrivão, escrevente juramentado, officiaes de justiça. porteiro e servente exercerão as funcções que 1hes são peculiares e attribuidas por leis, regulamentos e praxe do fôro. Paragrapho unico. O escrivão é obrigado a ter um registro, no qual serão inscriptos os assentamentos relativos ao menor, e, um promptuario, onde serão reunidos todos os documentos e papeis uteis ao mesmo. Art. 154. Serão nomeados. I, pelo Presidente da Republica, o juiz, o curador, e medico e o advogado; II, por portaria do ministro da Justiça, o escrivão e os escreventes juramentados: aquelle mediante concurso, e estes por proposta do escrivão;

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III, pelo juiz, os demais funccionarios. Art. 155. O juizo de menores é classificado entre as varas administrativas da justiça local. Art. 156. A substituição do juiz de menores e a do curado. Far-se-hão de accordo com os preceitos da organização da Justiça Local do Districto Federal.

CAPITULO II DO PROCESSO Art. 157. O menor, que fôr encontrado abandonado, nos termos deste Codigo, ou que tenha commettido crime ou contravenção, deve ser levado ao juizo de menores, para o que toda autoridade judicial, policial ou administrativa deve, e qualquer pessoa póde, apprehendel-o ou detel-o. Art. 158. A noticia da existencia de qualquer menor nos casos deste Codigo, póde ser levada ao juiz por todo meio licito de communicação. Art. 159. Recebendo o menor, o juiz o fará recolher ao Abrigo, mandará submettel-o a exame medico e pedagogico, e iniciará o processo, que na especie couber. Art. 160. Antes de ser iniciada a acção propria, o juiz pôde proceder administrativamente ás investigações que julgar convenientes, ouvindo o curador de menores quando entender opportuno. Art. 161. O processo para verificação do estado de abandono de menores é summarissimo. § 1º Este processo póde começar ex-officio, por iniciattiva do curador, a requerimento de algum parente do menor ou por denuncia de qualquer pessoa, sendo dispensavel a assistencia de advogado. § 2º Iniciado o processo por uma das fórmas indicadas no paragrapho precedente, será notificado o pae, a mãe o tutor ou encarregado da guarda do menor, para comparecer em juizo, assistir á justificação dos factos allegados, com intervenção do curador, e apresentar sua defesa, requerendo as diligencias que lhe convier. § 3º Si o juiz quizer mais amplos esclarecimentos, como exame pericial ou outros, ordenará sua execução no mais curto prazo. § 4º Com as provas produzidas, irão os autos a conclusão do juiz, que depois de ouvir o curador, proferirá sentença . § 5º Da sentença caberá, appellação para o Conselho Supremo da Côrte de Appellação, reeebida sómente no effeito devolutivo. § 6º Os prazos, termos e demais formalidades do processo são os determinados no Codigo de Processo Civil e Commercial para as acções summarissimas. § 7º Conforme a natureza e as circunstancias do abandono o processo póde ser paramente administrativo. Art. 162. O processo de suspenso ou perda do pátrio poder ou de destituição da tutela é o summario. Entretanto, si no processo por abandono ficar provado que o pae, a mãe ou o tutor está incurso em algum dos casos de suspensão,perda ou destituição do seu poder, o juiz o decretará na mesma sentença em que declarar o menor abandonado. Art. 163. A acção para reintegração do patrio poder é summaria. § 1º O tutor, ou a pessoa a que esta confiado o menor será intimado a apresentar no interesse deste as observações e opposições que fôr util fazer, e acompanhar o feito até final sentença. § 2º O juiz póde decidir a restituição de certos direitos negando a de outros, segundo as conveniencias do menor. § 3º Determinando a reintegração ou a restituição de direitos, o juiz fixará, segundo as circumstancias, a indemnização devida ao tutor ou guarda do menor, ou declarará que em razão da indigencia dos paes nenhuma indemnização haverá. § 4º O pedido do pae, sendo rejeitado, não poderá ser renovado sinão pela mãe innocente, nos termos dos artigos 38 e 39.

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Art. 164. O menor internado por ordem do juiz em razão do art. 56 póde ser entregue por simples despacho, mediante reclamação do responsavel, quando houver cesado a causa da internação. § 1º Um ascendente ou parente collateral do menor nas condições deste artigo poderá, reclamal - o, emquanto o responsavel por elle não o fizer, ou estiver impedido do recebel-o; e o juiz, si considerar idoneo o reclamante, póde entregar-lho por simples despacho, de accôrdo com os artigos 57 e 58. § 2º Da decisão do juiz, recusando a entrega, caberá aggravo para o Conselho Supremo da Côrte de Appellacão. Art. 165. A. cobrança da pensão, a que se refere o art. 41. se fará ex-officio, nos termos e segundo as fórmulas da acção de alimentos. Da decisão final haverá appellação somente no effeito devolutivo, para o Conselho Supremo da Côrte de Appellação. Art. 166. As multas impostas em virtude dos arts. 60, 75, 89, 90, 92 n.6 lettra a, e a indemnização de que trata o art. 163, § 3º, e as despezas a que se refere o art. 58, § 2º, serão cobradas por meio de acção executiva, intentada ex-officio. § 1º A importancia das multas será recolhida ao Thesouro Nacional, por meio de guia passada pelo escrivão; a de despesas ou indemnizações será entregue a quem couber, depois de passada em julgado a sentença. § 2º Da decisão final cabe appellação, de effeito devolutivo, para o Conselho Supremo da Côrte de Appellação. Art. 167. A fiança a que se referem os arts. 36 e 179, n. II, é sempre definitiva, e só póde ser prestada por meio de deposito nos cofres publicos em dinheiro, metaes ou pedras preciosas, ou apolices, ou titulos da divida nacional, ou da municipalidade; ou hypothesa de immoveis livre de preferencias. § 1º A fiança em taes casos não tem o mesmo caracter a criminal e sim o de uma caução civel. § 2º O valor da fiança será de 100$ a 1 :500$; e, para determinar o seu valor, o juiz tomará em consideração as circumstancias pessoaes do menor e as condições de fortuna do fiador. § 3º O quebramento da fiança importa na perda da totalidado do seu valor e a remoção do menor; e o valor depositado será applicado a favor do Thesouro Nacional, depois de deduzidas as custas do processo. § 4º Do despacho, que declara perdida a quantia afiançada, cabe recurso para o Conselho Supremo da Côrte de Appellação. § 5 º A todo tempo, que achar conveniente, o juiz poderá revogar a fiança, mandando restituir sua importancia ao fiador. Art. 168. O menor de 14 a 18 annos, indigitado como tendo commettido crime ou contravencão, será processado e pulgado segundo as normas seguintes. Art. 169. Em caso de crime a autoridade policial competente, dentro do prazo maximo de 15 dias, procederá as diligencias de investigação o inquirição de testemunhas, que reduzirá a autos, e remetterá ao juiz de menores, com o auto de exame de corpo do delicto. certidão do registro civil de nascimento do menor, individual dactyloscopica, folha de antecedentes, boletim a que se referem os arts. 416 e 417 do Codigo do Processo Penal, quaesquer documentos que se relacionem com a infracção penal o mais esclarecimentos necessarios. § 1º Si não fôr possivel obter a certidão do registro civil do nascimento do menor, será este submetido a exame medico de idade. § 2º Lavrado o auto de flagrante pela autoridade competente, esta remetterá o menor sem demora ao juiz do menores, e proseguirá no inquerito. § 3º Embora não tenha havido prisão em flagrante, a autoridade policial apresentará o menor ao,juiz na mesma occasião em que lhe remetter os autos, para o que fará apprehensão delle. § 4º Nenhum menor de 18 annos, preso por qualquer motivo ou apprehendido, poderá ser recolhido a prisão commum; a autoridade policial o recolherá, a logar apropriado. separado

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dos presos que tenham mais de 18 annos da idade, e o remetterá sem demora ao juiz de menores, solicitando a este o seu comparecimento ás diligencias, quando sua presença fôr necessaria. Art. 170. As autoridades policiaes executarão as diligencias que lhes forem requisitadas pelo juiz de menores e prestarão a este o auxilio necessario. Art. 171. Todas as diligencias serão feitas em segredo de justiça sob pena de responsabilidade e as mais de direito. Art. 172. Nos casos em que, houver co-réos menores de 18 annos e maiores dessa idade (art. 90), aquelles serão processados e julgados pelo Juiz de Menores, a quem serão remettidos pelo,juiz criminal competente os documentos necessarios extrahidos do respectivo processo. § 1º Os co-reus menores de 18 annos comparecerão ao juizo do processo dos co-reus maiores, isoladamente, só para serem qualificados e interrogados. em audiencia secreta, seguindo-se os demais termos do processo na presença de seu defensor. § 2º Desde que sejam recolhidos no Abrigo de Menores, o Juiz mandará proceder ás investigações e diligencias preliminares, afim de não retardar o processo ulterior, e ficará esperando para os documentos que lhe deverá mandar o juiz crimirial, para proseguir como fôr de direito. Art. 173. Sempre que fòr victima da infacção penal algum menor de 18 annos, abandonado, pervertido ou em perigo de o ser, a autoridade policial ou o juiz da formação da culpa mandará entregal-o no juiz de menores, para, os fins de direito. Art. 174. O juiz póde nomear curador á lide, para patrocinar no juizo competente o menor victima da infracção, Art. 175. Recebendo o inquerito policial, o juiz submetterá o menor a exame medico-psyehologico e pedagogico, informar-se-ha do seu estado physico, mental e moral, e da situação moral, social e economica dos paes, tutor encarregado da sua guarda. nomeará defensor, si o não houver, e ouvirá o curador, depois do que conforme o caso, póde: I, julgar sem mais formalidades o menor, quando se tratar do contravenção, que não revele vicio ou má indole podendo entregal-o aos paes, tutor ou encarregado, depois do advertir o rnenor, sem proferir condemnação; II, proceder summariamente a outras diligencias para a instrucção do processo, quando se tratar de crime; III, proceder aos termos do julgamento, independente de denuncia, em caso do flagrante delicto. Art. 176. E' facultado ao juiz: I, indeferir o requerimento do curador para ser archivado o processo, e proceder ex-officio; II, independentemente de requerimento do curador, ordenar o depoimento de testemunhas, que não estejam arroladas na denuncia, " que lhe pareçam necessarias; III, ordenar as diligencias que entender convenientes. Art. 177. Ao menor será dado defensor, que o assista em represente em todos os termos do processo, quer compareça, quer seja revel. Art. 178. Conforme a natureza e as circumstancias da infracção penal o juiz póde dispensar o comparecimento do menor correndo o processo na presença do seu defensor. Art. 179. Durante a instrucção do processo, o juiz póde, conforme os antecedentes do menor, sua idade e a natureza da infracção penal, e a situação dos paes ou tutor ou guarda: I, entregal-o aos paes ou tutor ou pessoa delle encarregada, sendo idoneos, com obrigação, de o apresentar todas as vezes que fôr necessario; II, entregal-o aos mesmos individuos, mediar te fiança; III, internal-o no Abrigo de Menores ou em algum inatituto que, julgue conveniente.

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Art. 180. O processo instructorio das contravenções penaes será iniciado pela autoridade, policial ou pelo juiz, mediante auto de prisão em flagrante ou portaria expedida ex-officio. ou por provocação do curador de menores ou da parte offendida. § 1º Em caso de prisão em flagrante será incontinente lavrado o respectivo auto, em que, depois de qualificado o contraventor, deporão duas ou tres testemunhas. § 2º Iniciado o processo por portaria, o contraventor será citado para comparecer 24 horas depois da citação, e assistir á inquirição de duas ou tres testemunhas, o que se fará depois de qualificado o contraventor, ou á sua revelia si não comparecer. § 3º Será processado á revelia o contraventor, que não puder ser encontrado, por ser desconhecido o seu paradeiro, ou que se verifique occultar-se propositalmente, para evitar a citação pessoal. § 4º Lavrado o auto de prisão em flagrante, ou, no caso de processo mediante portaria, inquerida a ultima testemunha, tendo sido iniciado o processo por autoridade policial, esta remetterá os ;autos ao juiz, dentro em 24 horas, salvo o disposto no § 6º. § 5º No caso de prisão em flagrante ou de busca, serão logo arrecadados e depositados os objectos e valores que, nos termos da lei, passem a pertencer á Fazenda Nacional, por força de sentença condemnatoria. § 6º Nas contravenções que deixem vestigios ou exijam comprovação mais precisa do facto, a autoridade procederá ás buscas, apprehensões, acareações, exames de qualquer natureza, identificação do contraventor, e outras diligencias. que se tornem necessarias, de accordo com os arts. 239 e 210 do Codigo do Processo Penal e juntará ao processo os escriptos, documentos e objectos, que sirvam de elementos de convicção. § 7º As diligencias, a que se refere esse artigo, deverão ficar concluidas em tres dias, após o auto de flagrante, ou a inquirição da ultimo, testemunha no caso de inicio por portaria. § 8º A folha de antecedentes do contraventor deverá apparecer, junta aos autos mediante a individual dactyloscopica, bem como o boletim de investigações prescriptas pelos artigos 416 e 417 do Codigo do Processo Penal. § 9º Nos casos em que o contraventor se livra, solto ou afiançado, a autoridade, policial ou o juiz, antes de o pôr em liberdade, o fará assignar termo de comparecimento em juizo, em dia e hora que ficarão designados, de accordo com os prazos estabelecidos nos paragraphos anteriores. Da mesma forma se procederá nos processos por portaria aos quaes fôr presente o contraventor, finda a inquirição das testemunha," Art. 181. Para o julgamento de contravenção, o juiz, recebidos os autos que a autoridade policial lhe houver remettido, ou proseguindo si perante elle tiver sido iniciado o processo, submetterá o menor ás investigações e diligencias preliminares, ordenadas pelo art. 175, mandará ouvir o curador de menores, no prazo improrogavel de 24 horas, e depois mandará intimar o contraventor, f'azendo-o conduzir a juizo, si estiver detido. § 1º Comparecendo o contraventor, proceder-se-ha ao interrogatorio. § 2º Em seguida será concedido o prazo de tres dias, para apresentar allegações de defesa e o rol das testemunhas, que tiver, até ao maximo de tres. sendo-lhe tambem permittido nas allegações requerer as diligencias que julgar necessarias á sua defesa; devendo ser feita dentro de cinco, dias a producção dessas provas e diligencias. § 3º O juiz poderá, ex-officio ou a requerimento do acusado, reinquirir as testemunhas que depuzeram perante a autoridade policial. § 4º Terminadas as provas de defesa ou sem ellas, si o acusado nada tiver requerido, ou fôr revel, será ouvido o curador, no prazo de tres dias, e os autos serão conclusos ao juiz, que, depois de fazer sanar as nullidades que encontrar no processo, e proceder ás diligencias que julgar necessarias ao esclarecimento da verdade, proferirá a sentença no prazo de cinco dias. Art. 182. Da sentença cabe appellação, com effeito devolutivo, para o Conselho Supremo da Côrte de Apellação.

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Art. 183. O julgamento, nos casos de delicto se fará segundo o processo seguinte : I, apresentada a denuncia ou queixa, o juiz mandará autual-a e decidirá sobre sua acceitação ou rejeição; ou si o processo fôr instaurado ex-officio, mandará autuar a portaria incial; II, no dia designado, o juiz interrogará o menor, ouvirá as testemunhas, com assistencia do curador e do defensor, procedendo ás demais diligencias necessarias; III, depois o processo seguirá os termos e actos dos §§ 2º e 4º do artigo antecedente. Art. 184. Da sentença cabe appellação, com effeito devolutivo, para o Conselho Supremo da Corte de Appellação. Art. 185. As infracções das leis ou dos regulamentos de assistencia e protecção aos menores praticadas por individuos que tenham mais de 18 annos, as quaes não estejam subordinadas por este Codigo a processos especiaes, serão processadas e julgadas: I, si constituirem crimes, de accôrdo com o processo e julgamento da competencia dos juizes de direito, instituido no capitulo VI do titulo VIII do Codigo do Processo Penal; II, si constituirem contravenções punidas com prisão ou com prisão e multa, o processo seguirá os termos do capitulo Vl do titulo IX do Codigo do Processo Penal; III, si só lhes forem comminadas simples multas será. seguido o processo do capitulo VII do titulo IX do Codigo do Processo Penal, com as modificações decorrentes da, organização do Juizo de Menores. § 1º Os processos podem ser iniciados pelo juiz ou pela autoridade policial, mediante auto de prisão em flagrante ou portaria, expedida ex-officio, ou por provocação da Curadoria ou da parte offendida., ou por auto de infracção lavrado pelos commissarios de vigilancia. § 2º Nos casos do n. III, o auto de infracção lavrado pelo commissario de vigilancia, com as formalidades prescriptas nas leis, basta para fundamento do processo. Art. 186. Os julgamentos dos recursos das decisões do juiz de menores serão feitos de accordo com os regulamentos da côrte de Appellação. § 1º As partes arrazoarão na instancia inferior. § 2º O juiz remeterá os autos a superior instancia. justificando succintamente a decisão recorrida. § 3º O prazo para a remessa dos recursos de appellação será de 30 dias, cabendo cinco dias a cada uma das partes para arrazoar e cinco dias ao juiz para justificar a sentença. Art. 187. Dos autos de processo, do registro judicial ou dos assentamentos das escolas não se extrahirão certidões, excepto as necessarias á instrucção de outro processo. Art. 188. As leis de organização judiciaria e de processo da justiça local do Districto Federal são subsidiarias deste Codigo. nos casos omissos, quando forem com elle compativeis.

CAPITULO III DO ABRIGO DE MENORES Art. 189. Subordinado ao Juiz de Menores haverá um Abrigo, destinado a receber provisoriamente, até que tenham destino definitivo, os menores abandonados e delinquentes. Art. 190. O Abrigo compor-se-ha de duas divisões, uma masculina e outra feminina; ambas .subdividir-se-hão em secções de abandonados e delinquentes; e os menores serão distribuidos em turmas, conforme o motivo do recolhimento, sua, idade e gráo de perversão. Art. 191. Os menores se occuparão em exercicios de leitura, escripta o contas, lições de cousas e desenho, em trabalhos manuaes, gyinnastica e jogos desportivos. Art. 192. Qualquer menor. que de entrada no Abrigo será recolhido a um pavilhão de observação, com aposentos do isolamento, depois de inscripto na secretaria, photographado, submettido á identificação, e examinado pelo medico e por um professor; e ahi será conservado em observação durante o tempo necessario. Art. 193. O Abrigo terá o pessoal seguinte, com os vencimentos constantes da tabella annexa: 1 director;

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1 escripturario; 1 amanuense; 1 almoxarife; 1 identificador; 1 auxiliar de identificado; 1 professor primario; 1 professora primaria; 1 mestre de gymnastica; 1 mestre de trabalhos manuaes: 1 inspector ; 1 inspectora; e o pessoal subalterno de nomeação do director, constante da mesma tabella. Art. 194. O director será, nomeado por decreto; o escripturario, o amanuense, o almoxarife, o identificador e o auxiliar de identificador, os professores e mestres, os inspectores serão nomeados por portaria do Ministro da Justiça; os demais pelo director. Art. 195. O director receberá ordens do juiz de menores directamente. Art.196. O Abrigo terá um regimento interno approvado pelo ministro da Justiça e Negocios Interiores. Art. 197. O Juizo de Menores funccionará no mesmo edificio do Abrigo.

CAPITULO IV DOS INSTITUTOS DISCIPLINARES Art. 198. E' criada uma escola de preservação para menores do sexo feminino, que ficarem sob a protecção da autoridade publica. Art. 199. Essa escola é destinada a dar educacão phiysica.moral, profissional e litteraria ás menores. que a ella forem recolhidas por ordem do juiz competente. Art. 200. A ella não serão recolhidas menores com idade inferior a sete annos, nem excedente a 18. Art. 201. A escola será constituida por pavilhões proximos uns dos outros, mas independentes, cada um dos quaes abrigará tres turmas de educandas, constituidas cada uma numero são superior a 20, e com capacidade para 300 menores abandonadas. § 1º Haverá um pavilhão para menores que forem processadas e julgadas por infracção da lei penal. § 2º Haverá tambem pavilhões divididos em compartimentos, destinados á observação das menores á, sua entrada e ás indisciplinadas. Art. 202. As menores serão ensinados os seguintes officios : Costura e trabalhos de argulha; Lavagem de roupa; Engomagem ; Cozinha; Manufactura de chapéos; dactylographia; Jardinagem, horticultura, pomicultura e criação de aves. § 1º Os officios irão sendo creados, á medida que o desenvolvimento da escola o permittir. § 2º Os serviços domesticos da escola serão auxiliados pelas alumnas de acordo com a idade, saude e forças dellas. Art. 203. A Escola Quinze de Novembro é destinada á preservação dos menores abandonados do sexo masculino.

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Art. 204. Haverá uma escola de reforma. destinada a receber, para regenerar pelo trabalho, educação e instrucção, os menores do sexo masculino, de mais de 14 annos e menos de 18, que forem julgados pelo juiz de menores e por este mandados internar. Art. 205. A Escola de Reforma será constituida por pavilhões proximos, mas independentes, abrigando cada qual tres turmas de internado, constituida cada uma por numero não superior a 20 menores, para uma lotação de 200 delinquentes. Haverá tambem pavilhões divididos em compartimentos, destinados á observação dos menores, á sua entrada no estabelecimento, e á punição dos indisciplinados. Art. 206. A Escola de Reforma terá o seguinte pessoal: 1 director; 1 escripturario; 1 amanuense; 1 almoxarife; 1 medico; 1 pharmaceutico; 1 dentista; 1 instructor militar; 4 professores primarios; 4 mestres de officinas: 1 mestre de desenho; 1 mestre de musica; 1 mestre de gymnastica; 1 inspeotor geral. 4 inspectores: e o pessoal subalterno de nomeação do director, constante da tabella annexa. § 1º O Governo escolherá as officinas que devem ser installadas. § 2º Para cada turma, de internados haverá uma. professor um inspector, dous guardas e um servente. § 3º A' medida que se forem organizando as turmas regulamentares, irá sendo comeado o respectivo pessoal. Art. 207. O director será nomeado por decreto: o secretario o medico, o pharmaceutico o dentista; o escripturario, o amanuense, o almoxarife, os professores, os mestres e os inspectores, por portaria do Ministro da Justiça; os demais empregados, por portaria do director. Art. 208. O Governo póde confiar a associações civis de sua escolha a direcção e administração dos institutos subordinados ao Juizo de Menores, exceptuadas a Escola 15 de Novembro e a Escola João Luiz Alves, entregando-lhes as verbas destinadas ao custeio e manutenção delles. Art. 209. As escolas de qualquer dos sexos, em todas as secções, observarão no seu funccionamento as regras estipuladas nos artigos seguintes. Art. 210. Cada turma ficará sob a regencia de um professor, que tratará paternalrnente os menores, morando com estes, partilhando de seus trabalhos e divertimentos, occupando-se de sua educação individual, incutindo-lhes os principios e sentimentos de moral necessarios á sua regeneração, observando cuidadosamente em cada um seus vicios, tendencias. affeições, virtudes, os effeitos da educação que recebem, e o mais que seja digno de attenção, annotando suas observações em livro especial. Art. 211. Aos menores será ministrada educação physica, moral, profissional e litteraria. § 1º A educação physica comprehenderá a hygiere, a gymnastica, os exercicios militares (para o sexo masculino), os jogos desportivos, e todos os exercicios proprios para o desenvolvimento e robustecimento do organismo.

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§ 2º A educação moral será dada pelo ensino da moral pratica, abrangendo os deveres do homem para comsigo, a familia. a escola, a officina, a sociedade e a Patria. Serão facultadas nos internados as praticas da religião de cada um compativeis com o regimen escolar. § 3º A educação profissional consistirá na aprendizagem de uma arte ou de um officio, adequado á idade, força e capacidade dos menores e ás condições do estabelecimento. Na escolha da profissão a adaptar o director attenderá á informação do medico, procedencia urbana ou rural do menor, sua inclinação, á aprendizagem adquirida anteriormente ao internamento, e ao provavel destino. § 4º A educação litteraria constará do ensino primario obrigatorio Art. 212. O producto liquido da venda de artefactos e dos trabalhos de campo realizados pelos alumnos sera dividido em tres partes íguaes: uma será applicada á compra de materias primas e ás despesas da casa; outra a premios e gratificações aos menores, que se distinguirem por sua assiduidade é perícia no trabalho, por seu estudo e applicação, por seu comportamento e regeneração moral; e a terceira constituira um pecúlio dos menores, que será depositado trimestralmente em cadernetas da Caixa Econômica, e lhes será entregue á banida do estabelecimento. Art. 213 No regulamento das escolas se estabelecerá o regimen de prêmios e punições applicaveis aos educandos. Paragrapho único. São expressamente prohibidos os castigos corporaes, qualquer que seja a fórma que revistam. Art. 214. O juiz, ao mandar internar o menor, enviará uma noticia sobre a natureza do crime ou contravenção e suas circumstancias; comportamento, hábitos e antecedentes do menor; o caracter, a moralidade, a situação e os meios de vida do pae, mãe, tutor ou pessoa encarregada de sua guarda; e todas as demais informações úteis ao conhecimento das condições physicas, intellectuaes e Moraes do internado e sua família. Art. 215. Os directores dos estabelecimentos são da immediata confiança do Governo, que os nomeará e demittirá livremente. § 1º As relações entre o juiz de menores e os directores das escolas se farão sem dependência do Governo. § 2º Os directores receberão ordens do juiz de menores directamente. § 3º No que se referir pessoalmente aos menores, ao regimen educativo e disciplinar destes, os directores dependem exclusivamente do juiz de menores. § 4º Os directores remetterão ao juiz de menores um boletim das notas de comportamento, applicação e trabalho do menor, em cada trimestre, e quaesquer inofrmações, que achem conveientes, para mostrar o aproveitamento que alunor vae colhendo do regimen escolar. Art. 216. Qualquer menor, ao dar entrada na escola, será recolhido ao pavilhão de observação, pelo prazo fixado no regulamento depois de inscripto na secretaria. Photographado, submettido ás medidas de identificação e exame medico-psychologico e pedagógico. Art. 217 Os menores não trabalharão mais de seis horas por dia, e haverá um ou mais intervallos de descanço, não inferior a uma hora. Art. 218. Os educandos ficarão na escola o tempo determinado pelo juiz, salvo ordem legal em contrato ou licença de sahida provisória sob liberdade vigiada. Art. 219. O director da escola de preservação, mediante autorização do juiz, pede: a) desligar condicionalmente o educando, que se ache apto para ganhar a vida por meio de officio, e não tenha attingido á idade legal, desde que a própria escola, ou uma sociedade de patronato, se encarregue de lhe obter trabalho e velar por elle até attingir a idade legal; b) desligar o educando, dando-lhe trabalho em officina da escola como operário, passando neste caso o educando a viver sobre si, recebendo semanalmente o salário, que lhe será fixado de accordo com o que for ordinariamente pago, attendendo á sua habilitação e capacidade de trabalho.

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Art. 220. A' sabida do estabelecimento serão dados ao menor um diploma do officio ou arte, em que for julgado apto, e um. certificado de sua conducta morai durante os dous ultimos annos. Art. 221. E' licito aos particulares, pessoas ou associações, para isso especialmente organizadas, ou que a isso se queiram dedicar, instituir escolas de preservação para, qualquer sexo, com a condição de não terem em mira lucros pecuniarios, de obterem autorização do Governo, de se sujeitarem à sua fiscalização e as moldarem pela disposições legaes. O Governo não permittirá o funccionamento de taes escolas, sem que provern dispor do patrimonio inicial não inferior a 50.000$000.

CAPITULO V DO CONSELHO DE ASSISTENCIA E PROTECÇÃO AOS MENORES Art. 222. E' creado no Districto Federal, o Conselho de Assistencia e Protecção aos Menores, para os fins de: I, vigiar, proteger e collocar os menores egressos de qualquer escola de preservação ou reforma, os que estejam em liberdade vigiada, e os que forem designados pelo respectivo juiz; II, auxiliar a acção do juiz de menores e soma commissarios de vigilancia; III, exercer sua, acção sobre os menores na via publica, concorrendo para a fiel observancia da lei de assistencia e protecção aos menores; IV, visitar e fiscalizar os estabelecimentos de educação de menores, fabricas e officinas onde trabalhem, e commun car ao Ministro da Justiça e Negocios Interiores os abtaos e irregularidades, que notarem: V, fazer propaganda na Capital Federal e no; Estados, com o fim de, não só prevenir os males sociaes e tendentes a produzir o abandono, a perversão e o crime entre os menores, ou compromette." sua saude e vida, mas tambem de indicar os meios que neutralizem os effeitos desses males. VI, fundar estabelecimentos para educação e reforma de menores abandonados, viciosoa e anormaes pathologicos; VII, obter dos institutos particulares a acceitação do menores protegidos pelo Conselho ou tutelados pela Justiça; VIII, organizar, fomentar e coadjuvar a constituição de patronatos de menores no Districto Federal; IX, promover por todos os meios ao seu alcance a completa prestação de assistencia aos menores sem recursos, doentes ou debeis; X, occupar-se do estudo e resolução de todos os problemas relacionados com a infancia e adolescencia; XI, organizar uma lista das pessoas idoneas ou das instituições officiaes ou particulares que queiram tomar ao seu cuidado menores, que tiverem de ser collocados em casas de familias ou internados; XII, administrar os fundos que forem postos á sua disposição para o preenchimento de seus fins. Art. 223. O Conselho de Assistencia e Protecção aos Menores é considerado associação de utilidade publica, com personalidade juridica, para os effeitos de receber legados, lideranças, doações, etc. Art. 224. O seu patrimonio se constituirá pelos legados, heranças, doações que receba, e pelas subvenções officiaes, contribuições de seus membros, subscripções populares, etc. Art. 225. O numero de membros do Conselho é illimitada e seus serviços são gratuitos. Art. 226. Do Conselho farão parte os directores do Collegio Pedro II, do Instituto Benjamin Constant, do Instituto dos Surdos-Mudos, do Hospital Nacional de Alienados, das instituições de beneficencia subvencionadas pelo Estado ou consideradas de utilidade publica., designadas

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pelo ministro, de um representante da Prefeitura, do Instituto da Ordem dos Advogados, da Academia Nacional de Medicina e do Departamento Nacional de Saude Publica, designado pelo director. Art. 227. O Conselho terá presidente e os administradores necessarios, eleitos por tres annos. A. presidencia caberá ao Ministro da Justiça e Negocios Interiores sempre que comparecer ás sessões do Conselho. Art. 228. O Conselho póde delegar a pessoas de sua confiança poderes para desempenho das funções que lhe approuver, transitoria ou permanentemente. § 1º A esses representantes se denominará, "Delegados da Assistencia e Protecção aos Menores"; e serão nomeados pelo presidente. § 2º Quando esses delegados forem incumbidos de missão junto ao juizo de menores, o exercicio della dependerá de approvação do respectivo juiz. § 3º O juiz póde espontaneamente encarregar de serviços attinentes a menores abandonados e delinquentes esses delegados, aos quaes é livre a aceitação do encargo. § 4º Os delegados incumbidos da assistencia e pratecção de menores pelo juiz se manterão em contacto com o menor; observarão suas tendencias, seu comportamento, o meio em que vivem; sendo preciso, visitarão os paes, tutor, pessoas, associações, institutos encarregados da sua guarda; farão periodicamcnte, conforme lhes fôr determinado, e todas as vezes que. considerarem uiii, relatorio ao juiz sobre a situação moral e material do menor, e tudo o que interessar á sorte deste; e proporão as medidas que julgarem proveitosas ao menor. Art. 229. O modo de funccionamento do Conselho será estabelecido em regulamento decretado pelo Governo e haverá um regimento interno approvado pelo Ministerio da Justiça e Negocios Interiores. Art. 230. Sem embargo do funcionamento do Conselho, as instituições particulares de patronato poderão encarregar-se de menores abandonados, ou egressos dos institutos, disciplinares. ou pastos em liberdade vigiada, sob a fiscalização do curador de rnenores. Art. 231. Revogam-se as disposições em contrario. Rio de Janeiro, 12 de outubro de 1927, 106º da Independencia e 39º da Republica. WASHINGTON LUIZ P. DE S0USA Augusto de Vianna do Castello.