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ACOMPANHAMENTO PLENUS MAGISTRATURA ESTADUAL DIREITO ELEITORAL SEMANA 2 SINOPSE DE ESTUDO

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ACOMPANHAMENTO PLENUS

MAGISTRATURAESTADUAL

DIREITO ELEITORALSEMANA 2

SINOPSE DE ESTUDO

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SUMÁRIO

1. Introdução ao Direito Eleitoral .................................................................................................... 32. A Democracia e suas espécies ..................................................................................................... 43. Princípios fundamentais de direito eleitoral .............................................................................. 73.1 Princípio Republicano ................................................................................................................ 73.2 Princípio Federativo ................................................................................................................... 73.3 Sufrágio ...................................................................................................................................... 83.4 Princípio do pluralismo político .............................................................................................. 103.5 Princípio da legitimidade das eleições .................................................................................... 103.6 Princípio do aproveitamento do voto ..................................................................................... 113.7 Princípio da celeridade ...........................................................................................................123.8 Princípio da anualidade ou anterioridade da lei eleitoral (segurança jurídica) .................... 133.9 Princípio da moralidade eleitoral ............................................................................................ 163.10 Princípio da atipicidade eleitoral ........................................................................................... 183.11 Quadro-resumo dos princípios eleitorais .............................................................................. 184. Sistemas eleitorais ..................................................................................................................... 19

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1. Introdução ao Direito Eleitoral

O Eleitoral é um dos mais importantes ramos do Direito, uma vez que é fundamental à efetivação do regime democrático de direito delineado na Constituição da República de 1988, da soberania popular e da cidadania. Assim, urge, preliminarmente, traçar o conceito, objeto e objetivo desse ramo do Direito.

Nas palavras de José Jairo Gomes, o Direito Eleitoral é o ramo do Direito Público que tem como objeto “os institutos, as normas e os procedimentos que regulam o exercício do di-reito fundamental de sufrágio com vistas à concretização da soberania popular, à validação da ocupação de cargos políticos e a legitimação do exercício do poder estatal”1. Por seu turno, Joel J. Cândido conceitua o Direito Eleitoral como o “ramo do Direito Público que trata de institutos relacionados com os direitos políticos e as eleições, em todas as suas fases, como forma de es-colha dos titulares dos mandatos eletivos e das instituições do Estado”2.

A partir desses conceitos, é possível afirmar que o objeto do Direito Eleitoral, em sín-tese, é a normatização decorrente do direito de sufrágio, incluindo-se toda a organização de seu exercício, que tem início com o alistamento do eleitor e fim com a diplomação dos eleitos. Desse modo, a formação de coligações, a escolha e o registro de candidatos, a propaganda elei-toral, a votação, a apuração dos votos e a proclamação dos resultados, fazem parte do objeto do Direito Eleitoral, na medida em que são decorrência direta do direito de sufrágio.

Nesse viés, o Direito Eleitoral tem como objetivo prioritário resguardar o regime de-mocrático, a partir da garantia de legitimidade e representatividade do eleito em relação ao acesso e ao exercício do poder estatal, da igualdade de oportunidades entre os concorrentes e da normalidade do pleito eleitoral.

Conceito Objeto Objetivo

Ramo do direito que tem por objeto a normatização decorrente do direito de sufrágio, incluindo-se toda a organização de seu exer-cício.

Regulamentação do pro-cesso eleitoral, que tem início com o alistamento do eleitor e fim com a diplo-mação dos eleitos.

Resguardar o regime de-mocrático, a partir da ga-rantia de legitimidade e re-presentatividade do eleito, da igualdade de oportuni-dade entre os concorrentes e da normalidade do pleito eleitoral.

1 GOMES, José J. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 48.

2 CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral brasileiro. 13. ed. São Paulo: Edipro, 2008. p. 25.

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2. A Democracia e suas espécies

Conforme esclarecido no tópico anterior, imperioso esclarecer que o que dá norte ao estudo do direito eleitoral é a democracia. No entanto, difícil é a tarefa de se atribuir um con-ceito a palavra “democracia”. Embora se saiba que a democracia é princípio instituído na Cons-tituição da República de 1988 e que constitui valor fundamental predominante nas sociedades ocidentais, é inconteste que se trata de matéria que não possui conteúdo fixo, estando em cons-tante transformação, razão pela qual a ela é atribuída um sentido muitas vezes indeterminado.

Nesse sentido, de sorte a compreender o conteúdo da democracia, o cientista políti-co Robert A. Dahl3 indica cinco critérios que, caso presentes, teriam o condão de tornar deter-minado processo democrático:

a) Participação efetiva: necessidade de se oferecer aos membros do processo opor-tunidades iguais e efetivas de manifestação, de sorte a possibilitar que os demais a conheçam a sua opinião;

b) Igualdade de voto: possibilidade igual e efetiva de voto, com o mesmo peso, aos membros do processo;

c) Entendimento esclarecido: oportunidade a ser concedida aos membros de desen-volver consciência crítica acerca das políticas importantes;

d) Controle do programa de planejamento: oportunidade a ser concedida aos mem-bros de decidir as suas prioridades políticas de sorte a escolherem as questões que devem ser postas em pauta;

e) Inclusão dos adultos: necessidade de se oferecer a todos o direito de sufrágio, de maneira a evitar exclusões destituídas de razoabilidade de pessoas do processo político.

A partir de tais critérios, é possível se definir a democracia como um regime político baseado na participação popular efetiva, a quem é atribuído o acesso livre às informações, de maneira a permitir o entendimento esclarecido e a formação de um debate permanente acerca das prioridades políticas a serem estabelecidas, e a igualdade de voto.

Nesse ponto, para além do conceito de democracia, o mesmo autor reintroduz o con-ceito de “Poliarquia”. Segundo ele, a “Poliarquia” ou “governo de muitos”, além de significar oposição a Monarquia, a Oligarquia e a Aristocracia (“governo de poucos”) – regimes não demo-cráticos –, designa o que ele denomina de “democracia representativa moderna”, caracteriza-da por ser composta pelas seguintes instituições políticas: a) Funcionários eleitos; b) Eleições

3 DAHL, Robert A. Sobre a democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001. p. 49.

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livres, justas e frequentes; c) Liberdade de expressão; d) Fontes de informação diversificadas; e) Autonomia para as associações; e f) Cidadania inclusiva.

Ademais, a democracia pode ser classificada de diversas formas. A mais relevante é aquela que diferencia a democracia direta, a indireta e a semidireta. Veja-se:

a) Democracia direta: teve seu apogeu em Atenas dos séculos V e IV a.C. É o modelo clássico de democracia, no qual o poder popular é exercido diretamente, sem a presença de intermediários. Por ela almeja-se realizar o autogoverno, no qual coincidem as vontades de governantes e governados. Tem ganhado adeptos recentemente dado o desenvolvimento da tecnologia, que teria o condão de solucionar os problemas práticos da adoção desse modelo;

b) Democracia indireta (representativa): teve seu surgimento relacionado diretamen-te à Revolução Francesa, servindo como ideologia de dominação em favor da burguesia. Nesse modelo, cabe aos cidadãos, através do exercício do sufrágio, escolher os seus representantes políticos, que receberão um mandato. A participação popular no processo político é indireta, ocorrendo na escolha de seus representantes, a quem compete conduzir o governo;

c) Democracia semidireta (participativa ou mista): modelo predominante no mun-do contemporâneo. Nesse modelo, procura-se conciliar os dois modelos acima. Mantém-se a eleição dos representantes políticos do povo, todavia, também são previstos mecanismos de intervenção direta dos cidadãos no exercício do poder do Estado.

Com efeito, esse último modelo é aquele consagrado pela Constituição da República de 1988, que, em seu art. 1º, parágrafo único, assim dispõe: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Assim, a democracia representativa brasileira é dotada dos seguintes institutos de democracia direta: o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Nos termos da Constituição Federal de 1988:

“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:I - plebiscito;II - referendo;III - iniciativa popular.[...]Art. 61. [...]§ 2º A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com

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não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. ”

A regulamentação desses institutos é feita pela Lei nº. 9.709/98. Nos termos do art. 2º, caput, dessa lei, plebiscito e referendo são “consultas formuladas ao povo para que delibere so-bre matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa”.

O plebiscito consistiria na consulta prévia à edição de “ato legislativo ou adminis-

trativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido” (art. 2º, §1º, Lei nº. 9.709/98). Referendo, por seu turno, seria a consulta posterior à edição de “ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição” (art. 2º, §2º, Lei nº. 9.709/98).

Nas questões de relevância nacional, de competência do Poder Legislativo ou do Po-der Executivo, e no caso do §3º do art. 18 da Constituição Federal (incorporação, subordinação ou desmembramento de Estado), o plebiscito e o referendo são convocados mediante decreto legislativo, por proposta de um terço, no mínimo, dos membros que compõem qualquer das casas do Congresso Nacional (art. 3º, Lei nº. 9.709/98).

Aprovado o ato convocatório, o Presidente do Congresso Nacional dará ciência à Justiça Eleitoral, a quem incumbirá, nos limites de sua circunscrição, fixar a data da consulta popular, tornar pública a cédula respectiva, expedir instruções para a realização do plebiscito ou referendo e assegurar a gratuidade nos meios de comunicação de massa concessionários de serviço público, aos partidos políticos e às frentes suprapartidárias organizadas pela sociedade civil em torno da matéria em questão, para a divulgação de seus postulados referentes ao tema sob consulta (art. 8º, Lei nº. 9.709/98).

O referendo pode ser convocado no prazo de trinta dias, a contar da promulgação de lei ou adoção de medida administrativa, que se relacione de maneira direta com a consulta po-pular (art. 11, Lei nº. 9.709/98), sendo este e o plebiscito considerados aprovados ou rejeitados por maioria simples, de acordo com o resultado homologado pelo Tribunal Superior Eleitoral (art. 10, Lei nº. 9.709/98).

Por fim, a iniciativa popular consistiria no poder atribuído aos cidadãos para apre-sentar projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do elei-torado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles (art. 13, Lei nº. 9.709/98). O projeto de lei de iniciativa popular deve circunscrever-se a um só assunto, bem como não poderá ser rejeitado por vício de forma, cabendo à Câmara dos Deputados, por seu órgão competente, providenciar a corre-ção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação (art. 13, §§ 1º e 2º, Lei nº. 9.709/98).

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3. Princípios fundamentais de direito eleitoral

3.1 Princípio Republicano

As formas de governo dizem respeito a relação entre governantes e governados, ou seja, a maneira de atribuição do poder político-estatal.

Atualmente, são duas as formas de governo mais difundidas: a Monarquia e a Repú-blica.

A República se caracteriza por ser forma de governo que opõe frontalmente à Monar-quia e os correspondentes privilégios de cunho nobiliárquico, consistentes na hereditariedade e vitaliciedade do chefe de Estado. Desse modo, a República tem por fundamento a defesa da igualdade formal entre as pessoas, de modo que o poder político deverá ser exercido por aque-les diretamente escolhidos pelos cidadãos em eleições diretas e periódicas.

Desse modo, pode-se afirmar que o princípio republicano impõe a forma de governo

na qual o povo é o titular do poder político e a necessidade de eleição dos detentores do poder político, que marca o caráter temporário de permanência destes como tal.

Nesse sentido dispõe o art. 82, da CRFB/88, ser de quatro anos o mandato de Presi-dente da República. No mesmo sentido, o mandato de Prefeito e Vereador (art. 29, I, CRFB/88), de Governador (art. 28, CRFB/88), de Deputado Estadual (art. 27, §1º, CRFB/88), de Deputado Federal (art. 44, parágrafo único, da CRFB/88) e de Senador, cujo mandato é de oito anos (art. 46, 1º, CRFB/88).

Além disso, o princípio republicano se caracteriza por atribuir responsabilidade aos governantes por seus atos, seja com sanções civis e penais, seja com sanções políticas.

Monarquia RepúblicaVitaliciedade Temporariedade

Hereditariedade EletividadeIrresponsabilidade Responsabilidade

3.2 Princípio Federativo

As formas de estado consistem na forma de distribuição do poder político pelo terri-tório, limite espacial da soberania estatal.

Nesse diapasão, o princípio federativo é o responsável por definir a forma de Estado Federativa, caracterizada pela união indissolúvel de organizações políticas destituídas

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de soberania, já que somente o Estado Federal será reputado como soberano para o plano internacional, porém dotadas de autonomia.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, a República Federativa do Brasil é for-mada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal. Observa-se, portanto, um processo de descentralização política, no qual as competências são distribuídas dentre os denominados entes federativos.

Nesse âmbito, diz-se que a CRFB/88 inaugurou um federalismo do tipo cooperativo, sendo, por vezes, a competência legislativa de uma mesma matéria atribuída ao mesmo tempo a diversos entes federativos, porém em níveis diferentes (art. 24, CRFB/88), e a competência material distribuída simultaneamente em níveis iguais (art. 23, CRFB/88).

Nesse ponto, oportuno mencionar José Jairo Gomes, quando este afirma, em sua obra, que a Justiça Eleitoral oferece exemplo de como funciona o federalismo cooperativo, ve-ja-se:

A Justiça Eleitoral tem natureza federal: mantida pela União, seus ser-vidores são federais. Todavia, na primeira e na segunda instâncias, os Estados proporcionam grande contribuição para seu funcionamento. Os juízes eleitorais são também juízes de direito. Os tribunais regionais eleitorais são compostos de dois desembargadores do Tribunal de Jus-tiça, dois juízes de direito, além de um desembargador do Tribunal Re-gional Federal ou, em não havendo este no Estado, um juiz federal. Há, portanto, ingente cooperação entre União e Estados no sentido de se manter a Justiça Eleitoral4

3.3 Sufrágio

De acordo com o previsto no art. 14, da CRFB/88, a soberania popular “será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”. Essa previsão revela que o sufrágio, no âmbito do Estado Democrático brasileiro, é de relevância central. Po-rém, questiona-se: o que viria a ser sufrágio?

Segundo Paulo Bonavides, o sufrágio consiste no “poder que se reconhece a certo número de pessoas (o corpo de cidadãos) de participar direta ou indiretamente na soberania, isto é, na gerência da vida pública”5. Em outras palavras, o sufrágio é o direito de votar (capaci-dade eleitoral ativa) e de ser votado (capacidade eleitoral passiva).

No modelo democrático brasileiro, qual seja o participativo, esse direito é manifesta-

4 GOMES, José J. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 73.

5 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 293.

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do através do voto, que constitui instrumento de materialização do sufrágio seja nas eleições, nas consultas populares ou na iniciativa popular de lei.

Esclarece-se, portanto, desde já, que a Constituição atribuiu ao sufrágio e ao voto sentidos diversos, pois, ao passo em que o sufrágio consiste do direito de participar da política, o voto é a forma pela qual o cidadão irá exercer esse poder.

Por seu turno, o voto também não se confunde com escrutínio, possuindo esse termo diversos significados. Enquanto qualidade, seu sentido mais corriqueiro, o escrutínio designa o modo como o processo de votação se perfaz. Nesse viés, o escrutínio pode ser secreto, público, de lista etc. Por outro lado, essa palavra pode identificar o processo de apuração dos votos. Por fim, esse termo também pode designar a quantidade de vezes em que os mesmos eleitores são convidados a votar na mesma eleição, ou seja, é sinônimo de turno eleitoral.

Sufrágio Voto Escrutínio

Poder atribuído aos ci-dadãos de participar di-reta ou indiretamente da gerência da vida pública.

Forma de exercício do sufrágio.

Modo como o processo de votação se perfaz.

Ainda no que tange ao sufrágio, importante a distinção entre suas variadas espécies. Senão vejamos:

a) Sufrágio universal: a rigor, todo sufrágio é restrito. Entretanto, pode-se dizer que o sufrágio universal é aquele em que as restrições se dão em menor grau, fundadas em critérios de razoabilidade. Ou seja, nessa espécie de sufrágio, em geral, a faculdade de participar da vida pública encontra restrições outras que não sejam aquelas referentes às condições de riqueza, instrução, sexo, origem de nascimento e raça;

b) Sufrágio restrito: é aquele em que as restrições se dão em maior grau, fundadas em critérios destituídos de razoabilidade. Assim, nessa espécie de sufrágio, a possibilidade de participar da vida pública é conferida unicamente àqueles que preenchem determinados cri-térios de riqueza, instrução, sexo e origem de nascimento e raça, dando origem, conforme a restrição aplicada, as formas de sufrágio censitário, sufrágio capacitário, sufrágio por gênero e sufrágio racial;

c) Sufrágio igual (singular): aquele em que o indivíduo tem o poder de exercer um único voto;

d) Sufrágio plural: sufrágio por meio do qual o indivíduo, como resultado de distin-ções em decorrência de riqueza, grau de instrução, idade, sexto etc., pode exercer, mais de uma

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vez, o direito ao voto em determinado processo eleitoral, seja acumulando vários votos numa mesma circunscrição, seja podendo votar mais de uma vez em circunscrições distintas;

e) Sufrágio direto: quando os eleitores fazem, sem qualquer intermediário, de modo pessoal, a escolha de seus governantes;

f) Sufrágio indireto: o sufrágio é indireto quando a escolha dos representantes recai sobre intermediários, que são incumbidos de proceder a designação definitiva;

3.4 Princípio do pluralismo político

O pluralismo político é princípio insculpido no art. 1º, V, da CRFB/88, que assim dis-põe:

“Art. 1º, CF. A República Federativa do Brasil, formada pela união indis-solúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:[...]V - o pluralismo político”.

Como corolário, pois, dos valores democráticos esposados pela Constituição, o prin-cípio do pluralismo político fundamenta a democratização do poder e o respeito à diversidade, não se resumindo, portanto, ao pluripartidarismo. O pluralismo político, ao determinar que o poder político deve ser democratizado e difuso, reforça a necessidade de construção de uma sociedade livre para se autodeterminar, na qual todos sejam politicamente iguais.

Nesse sentido, o Direito Eleitoral revela-se como instrumento de grande relevância para a consagração do pluralismo político e da própria cidadania (revelada pela existência de direitos políticos fundamentais de participação, consubstanciados pela Carta Constitucional). Afinal, é o Direito Eleitoral o ramo do Direito Público que tem como objetivos a efetivação das garantias da normalidade e legitimidade do exercício do poder de sufrágio popular, garantindo, assim, a diversidade política e a soberania do povo, próprias da democracia.

3.5 Princípio da legitimidade das eleições

A legitimidade das eleições tem previsão no art. 14, §9º, da CRFB/88, veja-se:

“Art. 14. [...]§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influên-cia do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou em-

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prego na administração direta ou indireta. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994) ”

Segundo a clássica definição de Paulo Bonavides, “a legitimidade é a legalidade acrescida de sua valoração”6. No âmbito eleitoral, com esse conceito se quer dizer que o poder legítimo é aquele que, observado o procedimento legal eleitoral, é aceito como justo pelos ci-dadãos.

Assim, esse princípio impõe que a escolha dos governantes seja fruto da aceitação popular, após uma disputa isenta de quaisquer vícios, em que é respeitado o procedimento eleitoral legalmente delineado.

3.6 Princípio do aproveitamento do voto

Esse princípio pode ser aferido dos arts. 176 e 224, da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleito-ral), que assim dispõe:

“Art. 176. Contar-se-á o voto apenas para a legenda, nas eleições pelo sistema proporcional:I - se o eleitor escrever apenas a sigla partidária, não indicando o candi-dato de sua preferência;II - se o eleitor escrever o nome de mais de um candidato do mesmo Par-tido; III - se o eleitor, escrevendo apenas os números, indicar mais de um can-didato do mesmo Partido; IV - se o eleitor não indicar o candidato através do nome ou do número com clareza suficiente para distingui-lo de outro candidato do mesmo Partido.Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias”.

Segundo esse princípio, o juiz deve-se abster de pronunciar nulidades sem prejuízo. É por essa razão que, nas eleições pelo sistema proporcional, o voto proferido nas hipóteses previstas no art. 176 supracitado são aproveitados como votos de legenda.

Ainda sobre esse princípio, interessante mencionar entendimento proferido pelo TSE no sentido de reconhecer a inaplicabilidade do art. 224 do Código Eleitoral, preservando-se a

6 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 141.

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validade da eleição, quando a nulidade do voto decorrer meramente da manifestação apolítica dos eleitores (votos natinulos), de forma a valorizar a legitimidade da soberania popular:

“Agravo regimental. Recurso em mandado de segurança. Acórdão regio-nal. Determinação. Nova eleição.1. É facultado ao relator apreciar, monocraticamente, os recursos que lhe são distribuídos, inclusive analisando as questões de mérito neles suscitadas, nos termos do art. 36, §§ 6º e 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral.2. Para fins do art. 224 do Código Eleitoral, a validade da votação ou o número de votos válidos na eleição majoritária não é aferida sobre o to-tal de votos apurados, mas leva em consideração tão somente o percen-tual de votos dados aos candidatos desse pleito, excluindo-se, portanto, os votos nulos e os brancos, por expressa disposição do art. 77, § 2º, da Constituição Federal.3. Considerando o que decidido na Consulta nº 1.657 - no sentido de que não se somam aos votos nulos derivados da manifestação apolítica dos eleitores aqueles nulos em decorrência do indeferimento do registro de candidatos afigura-se recomendável que a validade da votação seja afe-rida tendo em conta apenas os votos atribuídos efetivamente a candida-tos e não sobre o total de votos apurados.Agravo regimental a que se nega provimento.(Recurso em Mandado de Segurança nº 665, Acórdão, Relator(a) Min. Ar-naldo Versiani Leite Soares, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrôni-co, Volume , Tomo -, Data 17/08/2009, Página 24)”.

3.7 Princípio da celeridade

Esse princípio é extraído da lógica do processo eleitoral. Com efeito, deve-se ter como pressuposto que o processo eleitoral ocorre em menos de seis meses, desde o registro de candidaturas até a diplomação. Assim, é exigência desse princípio que as decisões judiciais em matéria eleitoral sejam céleres, atendendo-se a previsão constitucional do art. 5º, LXXVIII, da CRFB/88.

É com base nesse princípio que os prazos recursais em matéria eleitoral são, em regra, de três dias.

Importante mencionar, também, que o Direito Eleitoral, desde 2009, é um dos únicos ramos do Direito a regulamentar expressamente a celeridade processual. Com efeito, assim dis-põe o art. 97-A, da Lei nº. 9.504/97:

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“Art. 97-A. Nos termos do inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Fede-ral, considera-se duração razoável do processo que possa resultar em perda de mandato eletivo o período máximo de 1 (um) ano, contado da sua apresentação à Justiça Eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)§ 1º. A duração do processo de que trata o caput abrange a tramitação em todas as instâncias da Justiça Eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)§ 2º. Vencido o prazo de que trata o caput, será aplicável o disposto no art. 97, sem prejuízo de representação ao Conselho Nacional de Justiça. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009) ”.

Assim, no âmbito eleitoral, o “prazo razoável” de duração do processo corresponde ao período máximo de um ano, contado da propositura da ação, abrangendo-se a tramitação em todas as instâncias. Caso tal prazo seja descumprido, é possível o oferecimento de represen-tação ao órgão competente, sem prejuízo de representação ao CNJ.

3.8 Princípio da anualidade ou anterioridade da lei eleitoral (segurança jurídica)

Encontra-se insculpido no art. 16 da CRFB/88:

“Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.

Como as eleições ocorrem sempre no primeiro domingo do mês de outubro, qual-quer alteração legislativa de regras que disciplinam o processo eleitoral deve ser feita até o primeiro domingo de outubro do ano anterior ao pleito. Desse modo, esse princípio tem por finalidade resguardar a segurança jurídica, evitando-se ofensas ao equilíbrio da disputa.

Por outro lado, quando o referido dispositivo afirma que a lei entra em vigor de ime-diato, isso significa tão somente que não há vacatio legis no campo eleitoral.

Ademais, entende o Supremo Tribunal Federal que esse princípio é garantia indivi-dual do eleitor, e, portanto, cláusula pétrea, constituindo óbice inclusive à atuação do legisla-dor constituinte derivado, veja-se:

“A inovação trazida pela EC 52/2006 conferiu status constitucional à ma-téria até então integralmente regulamentada por legislação ordinária federal, provocando, assim, a perda da validade de qualquer restrição à plena autonomia das coligações partidárias no plano federal, estadual, distrital e municipal. Todavia, a utilização da nova regra às eleições ge-

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rais que se realizarão a menos de sete meses colide com o princípio da anterioridade eleitoral, disposto no art. 16 da CF, que busca evitar a uti-lização abusiva ou casuística do processo legislativo como instrumen-to de manipulação e de deformação do processo eleitoral (ADI 354, rel. min. Octavio Gallotti, DJ de 12-2-1993). Enquanto o art. 150, III, b, da CF encerra garantia individual do contribuinte (ADI 939, rel. min. Sydney Sanches, DJ de 18-3-1994), o art. 16 representa garantia individual do cidadão-eleitor, detentor originário do poder exercido pelos represen-tantes eleitos e “a quem assiste o direito de receber, do Estado, o neces-sário grau de segurança e de certeza jurídicas contra alterações abrup-tas das regras inerentes à disputa eleitoral” (ADI 3.345, rel. min. Celso de Mello). Além de o referido princípio conter, em si mesmo, elementos que o caracterizam como uma garantia fundamental oponível até mes-mo à atividade do legislador constituinte derivado, nos termos dos arts. 5º, § 2º, e 60, § 4º, IV, a burla ao que contido no art. 16 ainda afronta os direitos individuais da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput) e do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). A modificação no texto do art. 16 pela EC 4/1993 em nada alterou seu conteúdo principiológico fundamental. Tratou-se de mero aperfeiçoamento técnico levado a efeito para facilitar a regulamentação do processo eleitoral. Pedido que se julga procedente para dar interpretação conforme no sentido de que a inovação trazida no art. 1º da EC 52/2006 somente seja aplicada após decorrido um ano da data de sua vigência. (ADI 3.685, rel. min. Ellen Gracie, j. 22-3-2006, P, DJ de 10-8-2006).

Esse princípio também é fruto de diversas controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais, notadamente no que se refere ao significado da expressão “processo eleitoral”.

A primeira controvérsia diz respeito à Lei da Ficha Limpa. Deveras, a Lei Complemen-tar nº. 135/2010, que incluiu novas hipóteses de inelegibilidade, foi publicada no D.O.U em 07 de junho de 2010. Nos termos de seu art. 5º, a lei deveria entrar em vigor na data de sua publicação.

Surgiu, então, acalorada discussão sobre a aplicabilidade da referida lei já para as Eleições de 2010, eis que, para alguns, teria alterado o processo eleitoral. É que, tendo sido publicada naquele ano, a aplicação imediata afrontaria o princípio da anualidade ou anteriori-dade da lei eleitoral, previsto no art. 16 da CRFB/88.

Os defensores de sua aplicabilidade imediata, contudo, argumentavam que a referi-da lei não teria alterado o processo eleitoral e que este sequer havia iniciado (argumentou-se que o início do processo eleitoral ocorreria no momento do registro das candidaturas e a referi-da Lei Complementar teria sido publicada antes de tal estágio).

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Foi formulada, então, consulta ao TSE que, em 10 de junho de 2010, após a oitiva da representante do Ministério Público Eleitoral, por maioria, decidiu que “lei eleitoral que dis-ponha sobre inelegibilidade e que tenha a sua entrada em vigor antes do prazo de 5 de julho poderá sim ser efetivamente aplicada para as eleições gerais de 2010”, uma vez que, nesse caso, a aplicação imediata da nova lei não teria o condão de gerar instabilidade na disputa nem privi-légios desmedidos a quaisquer candidatos.

A questão, de índole constitucional, foi, então, submetida à apreciação do Supremo Tribunal Federal, que, em 2010, optou por referendar esse entendimento, embora o referido julgamento tenha terminado empatado, uma vez que o Ministro Eros Grau já se encontrava apo-sentado, sem substituto definido.

Entretanto, empossado o Ministro Luiz Fux, já em 2011, a corte consolidou enten-dimento no sentido de que a Lei da Ficha Limpa não seria aplicável para as eleições de 2010, pois, se tal ocorresse, haveria violação ao princípio da anualidade ou anterioridade da lei elei-toral contida no art. 16, da CRFB/88. (RE 633703, rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, julgado em 23/03/2011).

Além disso, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral, respondendo a consulta, asse-verou que as disposições previstas na Lei nº 12.875/2013 (alterações concernentes à divisão dos recursos do fundo partidário e modificação da divisão do horário da propaganda eleitoral), que alteram o processo eleitoral, não teriam aplicação nas Eleições de 2014.

A consulta foi assim formulada:

“1. As novas regras dispostas pela Lei nº 12.875/2013 a respeito da pro-paganda eleitoral de candidatos alteram o processo eleitoral?2. As novas regras estabelecidas pela Lei nº 12.875/2013 são considera-das válidas para as eleições de 2014?Inicialmente, o Plenário afirmou que a Lei nº 12.875/2013 promoveu al-terações significativas nos arts. 29 e 41-A da Lei nº 9.096/1995, concer-nentes à divisão dos recursos do Fundo Partidário, além de ter modifica-do a divisão do horário da propaganda eleitoral.Ressaltou que o art. 16 da Constituição da República dispõe: “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigên-cia”.No ponto, esclareceu que o princípio da anterioridade eleitoral inscrito nesse dispositivo visa impedir a edição de norma que possa causar de-sigualdade entre os partidos e os candidatos ou que possa modificar os procedimentos já iniciados para a realização das eleições.Destacou ser indubitável que a alteração introduzida pela Lei nº

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12.875/2013 altera o direito de os partidos políticos terem acesso ao rá-dio e à televisão, previsto no § 3º do art. 17 da Constituição da Repúbli-ca, o que desestabiliza as oportunidades de as agremiações acessarem os meios de comunicação social para difundir a propaganda eleitoral, reduzindo o tempo garantido à minoria na legislação original e aumen-tando o espaço da maioria a partir de regra nova.Dessa forma, respondeu afirmativamente à primeira pergunta e negati-vamente ao segundo questionamento.Consulta conhecida somente em parte.(Consulta nº 433-44, Brasília/DF, rel. Min. Luciana Lóssio, em 29/05/2014).”

3.9 Princípio da moralidade eleitoral

Esse princípio tem previsão no art. 14, § 9º, da CRFB/88, que assim dispõe:

“Art. 14. [...].§ 9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício de mandato, considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.

O princípio da moralidade eleitoral estabelece que pessoas que não tenham condi-ções morais para exercer cargos públicos, vislumbrada, inclusive, a sua vida pregressa, devem ser consideradas inelegíveis. Nas palavras de José Jairo Gomes:

No âmbito dos direitos políticos, o princípio da moralidade inscrito no art. 14, §9º, da Constituição conduz a ética para dentro do jogo eleitoral. Significa dizer que o mandato obtido por meio de práticas ilícitas, an-tiéticas, imorais, não goza de legitimidade. Mais que isso: significa que o mandato político deve ser sempre conquistado e exercido dentro dos padrões éticos aceitos pela civilização7

Devido a utilização da expressão “considerada a vida pregressa”, é frutífero o debate acerca da possibilidade de se analisar a vida pregressa dos candidatos para fins de impugnação do registro de candidatura mesmo que os atos ameaçadores da moralidade ainda não estejam caracterizados após decisão judicial transitada em julgado. Além disso, a redação do referido dispositivo também levanta questionamento acerca da sua autoaplicabilidade.

7 GOMES, José J. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 86

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Quanto a esse último ponto, pacificou-se entendimento no âmbito da Justiça Eleito-ral de que o referido dispositivo não é autoaplicável, o que deu origem, inclusive, a formulação da Súmula nº. 13 do TSE, nestes termos: “Não é autoaplicável o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação da Emenda Constitucional de Revisão nº 4/1994”.

No âmbito do Supremo Tribunal Federal, essa matéria foi objeto de julgamento da ADPF nº. 144, tendo prevalecido o direito fundamental à presunção de inocência, observe-se:

“ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL [...] MÉRITO: RELAÇÃO ENTRE PROCESSOS JUDICIAIS, SEM QUE NELES HAJA CONDENAÇÃO IRRECORRÍVEL, E O EXERCÍCIO, PELO CIDADÃO, DA CAPA-CIDADE ELEITORAL PASSIVA - REGISTRO DE CANDIDATO CONTRA QUEM FORAM INSTAURADOS PROCEDIMENTOS JUDICIAIS, NOTADAMENTE AQUELES DE NATUREZA CRIMINAL, EM CUJO ÂMBITO AINDA NÃO EXISTA SENTENÇA CONDENATÓRIA COM TRÂNSITO EM JULGADO - IMPOSSIBI-LIDADE CONSTITUCIONAL DE DEFINIR-SE, COMO CAUSA DE INELEGIBI-LIDADE, A MERA INSTAURAÇÃO, CONTRA O CANDIDATO, DE PROCEDI-MENTOS JUDICIAIS, QUANDO INOCORRENTE CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO – [...] ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL JULGADA IMPROCEDENTE, EM DECISÃO RE-VESTIDA DE EFEITO VINCULANTE. (ADPF 144, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 06/08/2008, DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010 EMENT VOL-02391-02 PP-00342 RTJ VOL-00215-01 PP-00031)”.

Por outro lado, segundo a CRFB/88, Lei Complementar pode fixar novas hipóteses de inelegibilidade para proteger os seguintes institutos:

• Probidade administrativa;• Moralidade para o exercício do mandato;• Normalidade e legitimidade das eleições contra abusos do poder econômico ou

político.

A LC 64/90, em seu art. 1º, regulamentou os casos de inelegibilidade baseados no princípio da moralidade. Tal lei sofreu alteração pela LC 135/2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, que aumentou as hipóteses de inelegibilidade, visando a proteger a probidade adminis-trativa e a moralidade no exercício do mandato. Destarte, passou-se a prever a inelegibilidade dos candidatos que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por ór-gão judicial colegiado, em razão da prática de crimes contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público; contra o patrimônio privado, o sistema financei-ro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; e contra o meio ambiente e a saúde pública.

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E, ainda, que serão declarados inelegíveis os candidatos que tenham cometido cri-mes eleitorais para os quais a lei comine pena privativa de liberdade; de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; de tráfico de entorpecen-tes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos; de redução à condição análoga à de escravo; contra a vida e a dignidade sexual; e praticados por organização criminosa, quadri-lha ou bando.

Como se vê, a “Lei da Ficha Limpa” fundamenta-se na proteção da probidade admi-nistrativa e da moralidade, considerando a vida pregressa do candidato.

3.10 Princípio da atipicidade eleitoral

O princípio da atipicidade eleitoral, também denominado por alguns doutrinadores, como “princípio in dubio pro candidato”, tem como fundamento a proteção do exercício dos direitos políticos no Estado Democrático de Direito, ao estabelecer que eventuais restrições a tais direitos ocorram sempre de forma minimalista, a fim de que o exercício das plenas capaci-dades políticas dos cidadãos, nas suas dimensões ativa e passiva, seja preservado sempre que possível.

Como corolário do princípio da atipicidade eleitoral, surge o postulado segundo o qual onde não houver previsão de restrição a direitos políticos, não cabe ao intérprete fazê-la. Eventuais restrições, assim, ao exercício de tais direitos, devem obedecer à estrita legalidade.

Nesse sentido é o teor da Súmula nº. 9 do TSE:

“A suspensão de direitos políticos decorrentes de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação ou de prova de reparação dos danos”.

3.11 Quadro-resumo dos princípios eleitorais

Princípios Conceito

Republicano

Determina que o poder político deva ser exercido por aqueles diretamente escolhidos pelos cidadãos em eleições diretas e pe-riódicas, além de garantir que os eleitos sejam responsabilizados pelos seus atos;

Federativo

Define a forma de Estado Federativa, caracterizada pela união indissolúvel de organizações políticas destituídas de soberania e dotadas de autonomia, cujas competências são definidas pela Constituição, decorrente de um processo de descentralização;

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Sufrágio Poder atribuído aos cidadãos de participar direta ou indireta-mente da gerência da vida pública;

Pluralismo Político

Reforça a necessidade de construção de uma sociedade livre para se autodeterminar, na qual todos sejam politicamente iguais, assegurando-se espaço para debate entre as diversas cor-rentes políticas;

Aproveitamento do voto

O juiz deve-se abster de pronunciar nulidades sem prejuízo;

Celeridade

É exigência desse princípio que as decisões judiciais em matéria eleitoral sejam céleres. No âmbito eleitoral, o “prazo razoável” de duração do processo corresponde ao período máximo de um ano, contado da propositura da ação, abrangendo-se a tramita-ção em todas as instâncias;

Anualidade

A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência, a fim de resguardar a segurança ju-rídica, evitando-se ofensas ao equilíbrio da disputa;

MoralidadeEstabelece que pessoas que não tenham condições morais para exercer cargos públicos, vislumbrada, inclusive, a sua vida pre-gressa, devem ser consideradas inelegíveis;

Atipicidade eleitoral

Determina que eventuais restrições a tais direitos ocorram sem-pre de forma minimalista, a fim de que o exercício das plenas capacidades políticas dos cidadãos, nas suas dimensões ativa e passiva, seja preservado sempre que possível;

4. Sistemas eleitorais

Para José Afonso da Silva, os sistemas eleitorais podem ser conceituados como

O conjunto de técnicas e procedimentos que se empregam na realização de eleições, destinadas a organizar representação do povo no território nacional [...]. Conjuga técnicas como a divisão do território em distritos ou circunscrições eleitorais, o método de emissão do voto, e os procedi-mentos de apresentação de candidatos e de designação dos eleitos de acordo com os votos emitidos.8

De acordo com o escólio de José Jairo Gomes, o sistema eleitoral visa a

proporcionar a captação eficiente, segura e imparcial da vontade popu-

8 DA SILVA, José A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37 ed. São Paulo: Malheiros. p. 372.

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lar democraticamente manifestada, de sorte que os mandatos eletivos sejam conferidos e exercidos com legitimidade. É também sua função estabelecer meios para que os diversos grupos sociais sejam represen-tados, bem como para que as relações entre representantes e represen-tados se fortaleçam.9

Na Constituição Federal de 1988, foram consagrados os sistemas majoritário e pro-porcional.

No sistema majoritário, considera-se eleito o candidato que obtiver a maioria dos votos apurados, independentemente da legenda partidária à qual estiver filiado.

É o sistema adotado para a eleição de Prefeitos, Governadores, Presidente da República e respectivos vices, bem como para Senador.

Haverá, nas eleições majoritárias, exceto para o Senado e para a Chefia do Executivo nas cidades com menos de duzentos mil eleitores, dois turnos de votação, salvo se algum dos candidatos obtiver a maioria absoluta dos votos no primeiro turno, não se computando os vo-tos em branco e os nulos.

O sistema majoritário brasileiro não é unívoco, pois compreende duas espécies:

a) Por maioria simples, pelo qual deverá ser eleito o candidato mais votado. É a for-ma adotada para a eleição de Senador da República, bem como para Prefeito e Vice-Prefeito de cidades com população igual ou inferior a duzentos mil eleitores. Exige apenas um único turno de eleição;

b) Por maioria absoluta, pelo qual será eleito o candidato que obtiver mais da meta-de dos votos, não se computando os votos em branco e nulos. É a forma adotada para a eleição de Presidente da República, Governador de Estado e do Distrito Federal e Prefeito de cidades com mais de duzentos mil eleitores, bem como os respectivos vices. Pode demandar mais de um turno de eleição.

Maioria simples Maioria absolutaAdotado nas eleições para Senador e Prefeito de municípios com até du-zentos mil eleitores.

Adotado nas eleições para Presidente da República, Governadores e Prefei-tos de municípios com mais de duzen-tos mil eleitores.

9 GOMES, José J. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 143.

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Demanda apenas um único turno de votação.

Pode demandar mais de um turno de votação, caso o vencedor do primeiro turno não tenha obtido a maioria abso-luta dos votos.

Por sua vez, pelo sistema proporcional, segundo José Jairo Gomes, pretende-se “dis-tribuir entre as múltiplas entidades políticas as vagas existentes nas Casas Legislativas, tornan-do equânime a disputa pelo poder e, principalmente, ensejando a representação de grupos minoritários”10. Por essa razão, o voto pode ter caráter dúplice, de sorte que votar no candidato significa igualmente votar na agremiação.

Essa espécie é empregada para eleições destinadas ao preenchimento de cargos do Poder Legislativo, à exceção do cargo de Senador. Em outras palavras, aplica-se a eleição de Deputados Federais, Estaduais e Distritais, bem como de Vereador.

Para se saber se determinado candidato foi ou não eleito, deve-se fazer um cálculo aritmético: descobrir os números referentes ao quociente eleitoral, ao partidário e à distribui-ção das sobras.

A primeira etapa é determinar o quociente eleitoral. Nos termos do art. 106, da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleitoral):

“Art. 106. Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscri-ção eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalen-te a um, se superior”.

Quociente Eleitoral (QE) (nº. de votos válidos/nº. de lugares a preencher no parla-mento) = número mínimo necessário que um partido político ou coligação eleja um parlamen-tar.

É calculado a partir da divisão entre o número de votos válidos (todos os votos dados aos partidos e aos candidatos, excluídos desse cômputo os votos em branco e nulos) e o número de lugares a preencher no parlamento, desprezando-se a fração igual ou inferior a meio e ele-vando-se para um a fração superior a meio.

A segunda etapa é determinar o quociente partidário. Nos termos do art. 107, da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleitoral):

“Art. 107 - Determina-se para cada Partido ou coligação o quociente par-

10 GOMES, José J. Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 145.

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tidário, dividindo-se pelo quociente eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação de legendas, desprezada a fra-ção”.

Quociente Partidário (QP) (nº. de votos conquistados pelo partido/quociente elei-toral) = número de vagas obtidas pelos diversos partidos e coligações em determinado pleito eleitoral.

É obtido através da divisão entre o número de votos conquistados pelo partido ou coligação e o quociente eleitoral, desprezando-se a fração.

Entretanto, deve-se ressaltar que desde as Eleições de 2016, há a necessidade de se preencher uma votação nominal mínima, na forma do art. 108, da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleitoral):

“Art. 108. Estarão eleitos, entre os candidatos registrados por um parti-do ou coligação que tenham obtido votos em número igual ou superior a 10% (dez por cento) do quociente eleitoral, tantos quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido”.

Assim, ainda que atingido o quociente partidário, somente serão eleitos os candida-tos que obtiverem um número mínimo de votos, correspondentes a 10% do quociente eleitoral, a fim de impedir que candidatos que receberam um número ínfimo de votos sejam eleitos ape-nas em virtude da representatividade do partido político.

Considerando a existência de frações resultantes dos cálculos aritméticos, comum que haja vagas não preenchidas. Assim, a terceira etapa é a denominada distribuição das so-bras, que ocorrerá nos moldes do art. 109, da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleitoral):

“Art. 108. [...]Parágrafo único. Os lugares não preenchidos em razão da exigência de votação nominal mínima a que se refere o caput serão distribuídos de acordo com as regras do art. 109”.“Art. 109. Os lugares não preenchidos com a aplicação dos quocientes partidários e em razão da exigência de votação nominal mínima a que se refere o art. 108 serão distribuídos de acordo com as seguintes regras:I - dividir-se-á o número de votos válidos atribuídos a cada partido ou coligação pelo número de lugares definido para o partido pelo cálculo do quociente partidário do art. 107, mais um, cabendo ao partido ou coligação que apresentar a maior média um dos lugares a preencher, desde que tenha candidato que atenda à exigência de votação nominal

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mínima; II - repetir-se-á a operação para cada um dos lugares a preencher;III - quando não houver mais partidos ou coligações com candidatos que atendam às duas exigências do inciso I, as cadeiras serão distribuídas aos partidos que apresentem as maiores médias.§ 1º O preenchimento dos lugares com que cada partido ou coligação for contemplado far-se-á segundo a ordem de votação recebida por seus candidatos. § 2º. Poderão concorrer à distribuição dos lugares todos os partidos e coligações que participaram do pleito. (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017) ”.

Sobra de Votos (SV) (Votos válidos de cada partido ou coligação)/(número de lugares por ele obtido + 1). Considera-se a maior média.

Importante ressaltar que a antiga redação do §2º, do art. 109, da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleitoral) dispunha que somente poderiam concorrer à distribuição dos lugares os par-tidos ou as coligações que tivessem obtido o quociente eleitoral.

Esse dispositivo foi alterado pela Minirreforma Eleitoral de 2017, dispondo, agora, que todos os partidos e coligações que participaram do pleito poderão concorrer à distribuição dos lugares, não se exigindo mais o atingimento do quociente eleitoral.

Por fim, mesmo nas eleições pelo sistema proporcional, pode ocorrer a eleição por maioria de votos. É o que prevê o seguinte dispositivo da Lei nº. 4.737/65 (Código Eleitoral):

“Art. 111. Se nenhum Partido ou coligação alcançar o quociente eleito-ral, considerar-se-ão eleitos, até serem preenchidos todos os lugares, os candidatos mais votados”.

A esta situação dá-se o nome de “Sistema Distritão”.