Ademar Arthur Chioro Dos Reis - Magnetismo, Vitalismo e o Pensamento de Kardec

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    ADEMAR ARTHUR CHIORO DOS REIS

    MAGNETISMO, VITALISMOE O PENSAMENTO DE KARDEC

    CPDoc Centro de Pesquisa e Documentao Esprita

    Santos

    1996Digitalizado em fev/2011 pelo CPDoc

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    SUMRIO

    SOBRE O CPDOC 3

    PREFCIO 4

    INTRODUO 6

    I. ASPECTOS PRELIMINARES

    1. O CENRIO: A SADE NAS FORMAES SOCIAIS CAPITALISTAS 9

    2. O DESENVOLVIMENTO DO RACIONALISMO CIENTFICO 15

    3. AS ACADEMIAS DE CINCIA E A LEGITIMAO DA VERDADE 17

    II. MAGNETISMO

    1. MESMER E O MAGNETISMO 20

    2. MAGNETISMO, SONAMBULISMO E HIPNOSE 26

    3. O HIPNOTISMO 32

    4. O DECLNIO DO MAGNETISMO 35

    5. O MAGNETISMO, O ESPIRITISMO E KARDEC 38

    III. VITALISMO

    1. ORIGEM E TRAJETRIA DO VITALISMO 44

    2. HAHNEMANN E O VITALISMO 50

    3. VITALISMO E KARDEC 53

    4. O DESTINO DO VITALISMO 58

    CONCLUINDO 61

    BIBLIOGRAFIA 63

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    SOBRE O AUTOR

    ADEMAR ARTHUR CHIORO DOS REIS

    * Reside em Santos-SP

    * Mdico sanitarista e homeopata

    * Secretrio da Sade de So Vicente-SP e Presidente do Conselhode Secretrios Municipais de Sade do Estado de So Paulo

    * Professor Regente em Sade Coletiva da Faculdade de CinciasMdicas de Santos

    * Professor no Curso de Ps-Graduao em Sade Pblica daUniversidade Catlica de Santos

    * Mestrando em Sade Coletiva da UNICAMP

    * Diretor de Estudos do Centro Esprita "Allan Kardec". (Santos-SP)

    * Membro do Grupo de Pesquisas Cientficas "Ernesto Bozzano"(GPCEB)

    * Membro do Centro de Pesquisa e Documentao Esprita (CPDoc)

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    SOBRE O CPDoc

    O Centro de Pesquisa e Documentao Esprita -CPDoc - umgrupo fundado em 1988, em Santos-SP, por jovens espritas que se

    conheciam dos Encontros Regionais realizados no Estado de So

    Paulo. Atualmente composto de 15 pessoas residentes nas

    cidades de Santos, So Paulo e Guarulhos. As reunies so

    bimestrais e acontecem quase sempre no primeiro domingo de todo

    ms par, alternando entre as cidades de Santos e So Paulo.Formado com a finalidade de desenvolver pesquisas sobre o

    Espiritismo, o CPDoc, desta maneira, cria um espao para a

    elaborao, discusso e divulgao de estudos e pesquisas nas

    diversas reas do conhecimento relacionadas com o Espiritismo.

    A atividade principal do CPDoctem sido a discusso de trabalhos

    escritos por integrantes do grupo. Seus membros desenvolvemindividualmente uma monografia com o tema de seu interesse. O

    autor repassa sua monografia aos demais integrantes no prazo de um

    ms antes da data prevista. Cada participante, por sua vez,

    compromete-se a apresentar, no dia da reunio, propostas de reviso.

    O autor, ento, prope-se a reescrever sua pesquisa com referncia

    s sugestes e observaes levantadas pelo grupo e reapresent-laposteriormente para uma nova apreciao. O objetivo desta maratona

    fazer com que os trabalhos apresentados cheguem ao nvel de

    serem publicados, como este livro. O CPDoc tambm divulga sua

    produo em Simpsios, Centros Espritas e Atividades Culturais.

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    PREFCIO

    O meio esprita possui, ao menos no Brasil, urna forte tendncia repetio incansvel de conceitos, juzos ou princpios que, umdia, foram ditos por algum de alguma expresso nesse meio. claro que referncias histricas so fundamentais para o Espiritismo,assim como tambm o so para qualquer escola de pensamentofilosfico ou qualquer sistema cientfico. O mal acontece quando talreferncia passa ser uma reverncia, porque ento est muito

    prxima de tornar-se um dogma.

    O efeito pernicioso do dogma no est no conceito, juzo ouprincpio que ele expressa (que pode, s vezes, ser de uma clareza eprofundidade maravilhosas), mas no fato que, por pressupor umaverdade absoluta, tolhe a mais importante caracterstica do homem,que sua criatividade, sua tendncia natural ao questionamento e explorao de novas facetas da verdade, ou da realidade.

    Dos vrios exemplos que dispomos para confirmar essa opinio,vamos atermos a dois, em particular: o primeiro diz respeito importncia do Magnetismo na estruturao do Espiritismo, e osegundo ao conceito de princpio vital.

    Uma idia comumente expressa no movimento esprita (e maiscomumente ainda aceita) que Kardec era adepto da teoria

    magnetista, mas que, achando-a insuficiente para a explicao dosfenmenos com os quais se defrontava, procurou outras explicaese acabou por codificar a doutrina dos espritos. Relegou ento oMagnetismo a um "segundo plano", o de mero auxiliar, no planofsico do Espiritismo. Esta idia, sem ser inteiramente falsa, nopermite abarcar de modo completo a afinidade do Espiritismo com oMagnetismo, que so, no dizer de Kardec, "duas cincias gmeas,

    que se completam e explicam uma pela outra". Nem fornece umaidia clara do quanto s prticas que eram seguidas nos primeiros

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    "crculos magnticos" influenciaram os primeiros centros espritas,de uma maneira tal que at hoje permanecem em alguns de nossoscentros.

    Com respeito ao vitalismo, adotado por Kardec com o postuladodo princpio vital como elemento de vivificao da matria, d-sealgo parecido. Tal conceito encarado pelos espritas comoabsoluto, no se levando em considerao toda a complexidade quefoi (e, de certo modo, continua sendo) para Kardec e seusseguidores a assuno de uma tese rejeitada pelas academias da"cincia oficial". Passa-se por alto a rejeio prpria Homeopatia,o surgimento do Neo-Vitalismo, a substituio do termo "fluidovital" por fora vital (em adequao s descobertas da fsicamoderna), enfim, toda uma gama de conceitos, juzos e princpiosque so importantssimos para a prpria sustentao do espiritismoen-quanto uma doutrina dinmica.

    Esta a importncia deste trabalho. O autor, com suacaracterstica forma, rigorosa e contundente, abre nossos olhos para

    a necessidade da discusso no meio esprita. Sabe ele daimportncia que , para a sobrevivncia da doutrina esprita, aestruturao de uma base slida sobre a qual os espritas de hojepossam, de modo seguro, construir o futuro do Espiritismo. Paratanto, faz um resgate histrico do Magnetismo e do Vitalismo, que,ao mesmo tempo que fornece subsdios para uma discusso maisampla sobre estes temas, relembra-nos da necessidade de no nosdeixarmos sucumbir s facilidades da estagnao, e alerta-nos sobrenosso papel na criao e desenvolvimento contnuo desta filosofiafantstica que o Espiritismo.

    Juntemo-nos ao autor nesta difcil, mas fascinante travessia.

    Santos, 3 de dezembro de 1995

    Reinaldo Di Lucia

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    INTRODUO

    A percepo de que o Espiritismo lido, consumido e divulgado demaneira extremamente estanque e dicotomizada, quando noequivocada, mobiliza a ateno deste trabalho. como se AllanKardec, autor e ator social mais importante do Espiritismo, seufundador, bem como os sujeitos espirituais que contriburam com seusolhares e discursos sobre o homem e o mundo, houvessem impostoum novo corte na histria, uma ruptura de paradigma que teria levadoa uma nova histria, cuja nica ligao pretrita se daria atravs doreferencial do Cristianismo, logicamente o no "contaminado",designado Cristianismo Redivivo ou por outra adjetivao qualquer.

    Com este vis, perdeu-se em grande parte a capacidade decompreender o corpo terico do Espiritismo e do pensamento deKardec, assim como suas implicaes frente aos conhecimentos

    cientficos e filosficos e as preocupaes morais e sociais de suapoca, e conseqentemente, impossibilitando-o frente a tarefa demanter-se vivo e permevel ao progresso das idias.

    Nosso objeto de estudo a anlise da influncia de duasimportantes vertentes do pensar cientfico, o Magnetismo e oVitalismo, no apenas do sculo XIX, mas que se encontraminseridas na histria do homem, e que permeiam toda a obra esprita

    de Allan Kardec, marco referencial terico do Espiritismo; presentesdesde o "Livro dos Espritos", at mesmo nas polmicas travadas anvel da "Revista Esprita".

    Pretendemos resgatar, atravs deste trabalho, uma parcela do"esprito de uma poca"1, analisando a origem, a trajetria e certasbases tericas e sociais das trs vertentes aqui desenhadas; anliseesta particularmente centrada num perodo considerado degestao

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    histrica e nascimento das trs disciplinas: o final do sculo XVIII ea primeira metade do XIX.

    O leitor observar, antecipamos, a emerso de categorias e

    conceitos num contexto histrico especfico, onde se esboam, semmaiores rigores metodolgicos uma anlise tambm epistemolgica,no sentido em que se examina continuidades e rupturas, tericas econceituais. O objetivo principal, repetimos, o de construir ouresgatar uma historicidade, atravs do estudo crtico do Magnetismoe do Vitalismoem contraposio ao Espiritismo e ao pensamento deKardec.

    importante frisar que perante as caractersticas bsicas doRacionalismo Cientfico Moderno, nem o Magnetismo, nem oVitalismo - e muito menos o Espiritismo - podem ser consideradasdisciplinas cientficas; nenhum dos trs cumpre os trs elementos desntese comum realidade cientfica: o modelo explicativo(mecanicista), o mtodo (experimentalista e dedutivista) e alinguagem (matematizante), ainda hoje no superada, muito embora

    tenhamos srias crticas esta categorizao cientfica, poisrefutamos a idia de que aquilo que se define como cincia seja onico caminho para a verdade, para o conhecimento.

    Durante todo nosso trabalho, importante salientar, estaremosdiscorrendo tambm sobre a Medicina e a prtica mdica, aquientendidas como a disciplina do social e do natural.

    Este trabalho tem por escopo, por fim, a inteno de legar aosinteressados no estudo do Espiritismo elementos para uma releiturada obra de Kardec. Se conseguirmos estabelecer relaes histricasentre o Magnetismo, o Vitalismoe o Espiritismo, os objetivos destetrabalho tero sido alcanados.

    Antes de inici-Io, entretanto, gostaramos de esclarecer aonosso leitor que este trabalho comeou a ser construdo em 1987,

    num evento realizado em Curitiba-PR, cujo objetivo era discutir o"XIX - Sculo de Kardec". Posteriormente, ganhou forma de texto

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    para a reunio de fundao do Centro de Pesquisa e DocumentaoEsprita (CPDoc), em 1988. Foi transformado em dissertao paraobteno de ttulo de especialista em Homeopatia junto Associao Paulista de Homeopatia, e finalmente, cinco anos aps,

    assume uma verso final. Foi construdo durante todo o perodo;envolvendo e permeando as descobertas intelectuais do autor e, setome forma, isso se deve em grande parte ao estmulo, assugestes e crticas dos companheiros do CPDoc e do Grupo dePesquisas Cientficas"Ernesto Bozzano".

    1 LUZ, M.T. Natural, Racional, Social- Razo mdica e racionalidade cientfica moderna.Ed. Campus, Rio de Janeiro, 1988, cap. 1

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    I

    ASPECTOS PRELIMINARES

    O CENRIO:

    A SADE NAS FORMAES SOCIAIS CAPITALISTAS

    O final do sculo XVIII e incio do XIX foi o perododesenvolvimento do capitalismo industrial, caracterizado pelocrescimento da produo, pelo xodo rural e pela concentrao denovas populaes urbanas.

    A populao europia era submetida a jornadas de trabalho com

    durao que atingia 14 ou at mesmo 16 horas por dia, sendo oemprego de crianas (algumas vezes a partir de 3 anos, e maiscomumente, a partir dos 7 anos), dos velhos e gestantes, naproduo industrial, muito freqente.2

    Os salrios miserveis eram insuficientes para assegurar -necessidades da classe trabalhadora. As condies de moradia

    extremamente precrias e o desemprego, advindo principalmente emconseqncia da doena, uma ameaa.

    A situao sanitria,3 resultante do processo conturbado em quese dava a urbanizao e que em ltima instncia traduzia a misriasocial que proliferava nas cidades emergentes, era caracterizada porpssimas condies de higiene, promiscuidade, grandes epidemias,acidentes de trabalho, desnutrio, enfim, de uma massa de

    trabalhadores muito pobre. Pobreza esta, componente e retrato de

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    uma populao imensa e mendiga, com condies propcias para criara doena, a delinqncia, o banditismo, a violncia e a prostituio.

    A luta pela sade, nesta poca, identifica-se com a luta pela

    sobrevivncia: "viver para o operrio no morrer".4

    Neste cenrio, as classes dirigentes europias, influenciadas

    pelos ideais mercantilistas e preocupadas em aumentar o podernacional, tiveram que eleger o trabalho como elemento essencial degerao de riqueza, tornando necessria a formulao de polticasde sade que enfrentassem as grandes epidemias, a doena e amorte: evitando perdas de produtividade e assegurando o

    crescimento populacional e o fornecimento da fora de trabalho;questes centrais para o desenvolvimento do capitalismo.5

    Na Alemanha, a interveno enfermidade social foidesenvolvida atravs da idia de polcia mdica, cuja base doutrinriapartia da doutrina mercantilista (camarelismo) e do absolutismo.6

    Foi na Inglaterra, entretanto, onde a organizao da sade

    pblica e a interveno estatal sobre os problemas sociais foi maislonge. Definiu-se a questo do controle sanitrio corno um problemainerente nova ordem social atravs da identificao da mqualidade de vida, das habitaes, da superpopulao, a ausncia deabastecimento de gua e de rede de esgotos, com a determinaoda sade ou da doena. E o impacto obtido na mortalidade e nocontrole de vrias epidemias foi extremamente importante.7

    Para o que aqui nos interessa, cabe ressaltar que o modelo inglse o alemo influenciaram de forma importante as medidas a seremadotadas na Frana. No perodo que compreende fins do sculoXVIII e a primeira metade do sculo XIX, o movimento higienistatraduziu, de certa forma, a resposta social ao perigo representadopela misria reinante.

    As medidas realizadas foram, primeiro, no sentido da efetuaode vigilncia intensa da natalidade (estmulo ao crescimento), sobre

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    a mortalidade, aos projetos de recluso, preveno, assistncia aospobres e higienizao das cidades, principalmente dos cemitrios ematadouros.8Secundariamente, no controle da circulao. No dosindivduos, mas das coisas. Essencialmente da gua e do ar, j que

    a teoria miasmtica ainda era hegemnica,9ocorrendo intervenesna higienizao das cidades, principalmente em Paris. Construram-se corredores de ar, avenidas, etc. Mesmo limitada cientificamente,a prtica sanitria demonstrou grande permeabilidade e aplicaonos programas de preveno, de medidas de engenharia sanitria esaneamento do meio ambiente.

    Estas intervenes eram realizadas e implementadas pelasAcademias de Cincias (de mdicos, qumicos e bilogos), tendo oEstado como grande estimulador das aes em prol da sadepblica, fornecendo pioneiramente o atendimento mdico - aindacoletivo - quela multido que, at ento, no possua condies deter orientao mdica individual devido ao seu alto custo e aineficcia de uma prtica inconsistente e altamente lesiva. Caberessaltar que a prtica cirrgica ainda no havia sido incorporada prtica mdica, o que s ocorreu aps o advento da anestesia; j asprticas medicamentosas eram extremamente limitadas e agressivas.

    FOUCAULT levanta a hiptese de que o "capitalismo,desenvolvendo-se em fins do sculo XVIII e incio do sculo XIX,socializou um primeiro objeto que foi o corpo, enquanto fora deproduo, de trabalho".10Mas no foi o corpo que trabalha, o corpo

    proletrio que primeiramente foi assumido pela Medicina. Foisomente em ltimo lugar, na segunda metade do sculo XIX, que secolocou o problema do corpo e da sade ao nvel da fora produtivados indivduos.

    A histria dos hospitais11-12 nos d idia deste processo: atmeados do sculo XIX, o hospital no existia para curar. Eraessencialmente uma instituio de assistncia a pobres e invlidos.13

    Ali eram abandonados os portadores de doenas, pois existia apossibilidade de contgio. O hospital possua a funo tanto de

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    recolher o pobre, como de proteger o restante da populao - leia-se: abastada - do perigo. Era lugar de algum que necessitava deajuda material e espiritual, afinal estava morrendo. Eram osreligiosos que dirigiam os hospitais, e realizavam transio entre a

    vida e a morte.

    O apelo s Academias, de especialistas e cientistas, respeitveise neutras, para que intercedessem na qualidade de vida foi possvela partir do momento em que a burguesia e a Igreja foram perdendosua credibilidade e sua imagem de cunho humanista. Quando aspreocupaes com a sade se consubstancial numa estratgia cujosobjetivos eram "concernentes rao da ordem moral e da ordemsocial nas aglomeraes operrias".14

    As Academias de Cincia,15 desta forma, acabaramdesempenhando importante papel no interior das relaes sociais,influenciando decisivamente na reorganizao, reordenao edisciplinarizao da ordem social capitalista.

    O mdico, "reformador da economia ou da poltica umpersonagem freqente na segunda metade do sculo XVIII (...) Omdico se torna o grande conselheiro e o grande perito; se no naarte de governar, pelo menos na de observar, corrigir e melhorar o"corpo social".16E era sua funo de higienista que lhe asseguravaposio poltica privilegiada no sculo XVIII e econmica e social noXIX.

    A Sade Pblica, enquanto Sanitarismo, configurou nesteperodo aquilo que foram as prticas sanitrias, restringindo-as a umconjunto de aes sobre os fatores que foram encarados como osresponsveis pelo aparecimento da doena coletivamente, eidentificados com o meio urbano, que foi reduzido disponibilidademaior ou menor das condies adequadas de moradia, esgoto, etc.O cuidado mdico individual no tinha a sade como objeto, mas adoena, e por isso foi tido como limitado, dentro da visomiasmtica.

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    Neste vazio em relao as prticas mdicas individuais, cujaorigem procuramos relatar at aqui, que foi possvel o surgimentode propostas teraputicas como as magnticas, a homeopatiavitalista e as prprias prticas medinico-espirituais espritas.

    Aps a segunda metade do sculo XIX, os Estados europeus jgarantiam uma interveno em termos de polticas sociaisconsidervel, representada de um lado, pelo cuidado ao pobre, deoutro, pela implementao de medidas de proteo e controle doambiente, bem come das doenas transmissveis e das epidemias.17Aresoluo em parte destes graves problemas, a pobreza e ascondies sanitrias, juntamente com o desenvolvimento de um novoreferencial terico para a explicao da determinao da causalidadedo processo sade-doena, bem como a perspectiva concreta deinterveno que proporcionaram, explicam, em parte, orecrudescimento das polticas sanitrias e a supremacia da assistnciaindividual, que adotar um modelo claramente hegemnico a partir depostulados bem definidos, como veremos a seguir.

    2 DEJOURS, C. A loucura do trabalho: estudos de psicopatologia do trabalho. OborEditorial, So Paulo, 1987.

    3 ROSEN, G. Da Polcia Mdica Medicina Social.Graal, Rio de Janeiro,1979.4DEJOURS, C. A loucura do trabalho; estudos de psicopatologia do trabalho. op. cit.,

    cap. 1, citando Guerin,G.5 COSTA, N.R. Lutasurbanas e controle sanitrio. Origens das polticas de sade no

    Brasil. Vozes, Petrpolis, 2i! edio, 1986.6 COSTA, N.R.. Lutas urbanas. op. cit. p.20 . A polcia mdica alem, autoritria e

    paternalista, "partia do pressuposto que ao Estado cabia assegurar bem-estar esegurana para o povo, mesmo que contrariando os interesses individuais e justificavao controle coercitivo sobre os problemas sanitrios como mecanismo de assegurar adefesa pelo Estado dos interesses gerais da nao."

    7 .COSTA, N.R. Lutas urbanas. op. cit., p.22.8 FOUCALT, Michel. Microfsica do Poder. 6 ed., Graal, Rio de Janeiro, 1986.9

    Para a teoria dos miasmas, crena compartilhada por grande parte do saber mdico-cientfico do sculo XIX, as febres epidmicas e grande parte das doenas tinham

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    origem na matria vegetal e animal em putrefao e nas emanaes das guasestagnadas. Partes dos mdicos aderiam teoria do contgio, muito embora, importante ressaltar, o significado do mundo dos seres microscpicos s tenha sidodesvendado a partir das descobertas de Pasteur e Koch, em 1870, at entoprevalecendo a teoria da gerao espontnea.

    10 FOUCAULT, Michel. Microfsica do Poder. op. cit..11CREDIDIO, E. Homeopatia: Doutrina e Prtica. Ed. Papiros, Campinas, 1987.12 FOUCAULT, Michel. Microfsica do Poder. op. cit..13MERHY, E.E. Capitalismo e Sade Pblica. Papiros, Campinas, 19, p.33. "Aqui o

    sentido d perigo tem duplo aspecto: por um lado ele entendido a partir daconcepo de que o pobre, que um "indolente", possa contaminar os que trabalham,e por outro lado a partir da constatao de que so os pobres os principais portadoresdas molstias que levam doena e morte em idades precoces".

    14 DEJOURS, C.A loucura do trabalho. op. cit.15CREDIDIO, E. Homeopatia: Doutrina e Prtica. op. cit.16FOUCAULT, Michel. Microfsica do Poder. op. cit.17DONNANGELO, M.C.F. Sade e Sociedade. Livraria Duas Cidades, So Paulo, 1979,

    p.68.

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    O DESENVOLVIMENTO

    DO RACIONALlSMO CIENTFICOOs avanos empreendidos no sculo XVIII pela Medicina

    Moderna Cientfica, com as descobertas no campo da biologia, dafisiologia e da qumica, e principalmente do universo celular, com apatologia, que tiveram em MORGGANI sua grande expresso, noforam suficientes para orientar uma interveno da cincia, coerentecom os novos conhecimentos e prticas advindos dos avanoscientficos.

    S a partir de meados do sculo XIX que foram criados osdispensrios e o acesso s consultas individuais mdicas passou aser menos reprimido. Distribuam-se medicamentos e elaboravam-seprojetos de organizao, pesquisa e interveno mdica.Multiplicaram-se os hospitais. A medicalizao18 da sociedade

    tomava cada vez mais o rumo do individual. verdade, entretanto, que isto foi possvel em funo do

    desenvolvimento de um novo referencial terico construdo a partir dePASTEUR e KOCH (1870) e o desenvolvimento da vertentebacteriolgica. Os avanos da microbiologia nasceram em umcontexto de grandes conquistas das cincias naturais a partir demeados do sculo XIX, entre os quais se destaca o uso do

    microscpio em vrios campos da investigao cientfica.19Demonstrou-se que as doenas infecciosas eram produzidas pormicroorganismos e no pelas emanaes miasmticas. A partir da, foipossvel adequar os modelos explicativos do processo sade-doenaao pensamento racional moderno. As bases da cincia racionalpuderam superar as bases miasmticas que at ento prevaleciam.

    O modelo racionalista, mecanicista e dualista, e que mais tardeincorporou organicismo e o evolucionismo (que caracterizavam a

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    racionalidade cientfica e que se tornou predominante na Medicinaprecocemente), dificultou ou mesmo impossibilitou oreconhecimento de outras verdades.20

    A cincia passou a ser o modo de produo de verdadessocialmente dominantes, substituindo a teologia. verdade,tambm, que a razo cientfica operou uma objetivao do que sechama mundo natural, por um lado, e do mundo humano por outro,dissociando-os do mundo sobrenatural.21

    18 DONNANGELO, C. Sade e Sociedade. op. cit.. A autora conceitua medicalizao

    como o processo de mascaramento da realidade, das ver-

    dadeiras determinaes doprocesso sade-doena atravs da utilizao de prticas, medicamentos as ou no.19COSTA, N.R. Lutas urbanas. op. cit.20LUZ, M.T. Natural, Racional, Social. op. cit., p.121.21 LUZ, M.T. Natural, Racional, Social. op. cit., p.57.

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    AS ACADEMIAS DE CINCIAE A LEGITIMAO DA VERDADE

    At o incio do sculo XVIII, e em alguns casos at meados doXIX, a Inquisio22era a instituio responsvel pela resistncia noapenas sobre bruxos e feiticeiras, mas tambm sobre herticos, isto, "...sobre dissidentes das doutrinas oficiais sobre o mundo, omovimento dos planetas, a composio da matria e dos sereshumanos, etc. Quando a inquisio se retraiu, finalmente, em

    matria de julgar o conhecimento. Academias tomaram o lugar dejulgadores da veracidade ou falsidade das proposies cientficas".23

    De fato, as teorias cientficas modernas foram geralmentemarcadas por acirradas disputas que tiveram como palco asAcademias de Cincias patrocinadas pelas naes, bancos e pelocomrcio. Segundo Luz:

    "A instncia de legitimao do saber corporativa, a Academia.Os cientistas comunicam-se internacionalmente, trocampublicaes, experincias, solidariedade em caso de perseguiespolticas. Mas tambm competem entre si, usurpam as "idias"uns dos outros, denunciam seus inimigos e concorrentes aoEstado, tentam vender seus projetos a financiadores, ou firmarpatentes, no intuito no s de garantir a paternidade, mastambm a propriedade de suas invenes.24

    A legitimao terica e a qualificao eram obtidas atravs dasAcademias, corporaes dos sbios, instncia elitista, apesar deconstruda em oposio ao Santo Ofcio, particularmente nos pasesde forte tradio catlica, "onde ainda no sculo da razo a fogueirae a tortura faziam calar certas verdades dissidentes sobre anatureza, o mundo, a alma e o homem".25 Na prtica, o que garantia

    a aprovao e a legitimao de uma nova teoria ou conceito era aaprovao das Academias. Tinham o poder, juntamente com as

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    Escolas e Universidades (controladas pelos acadmicos), de colocarsobre uma teoria o selo da verdade, elevando ou desqualificando seuautor junto aos seus pares, sociedade, s Cortes e ao governo.Estava criada a figura do charlato:

    "...essa figura de desviante moral e hertico da cincia, criaodo sculo da razo. Desde esse momento, o pior epteto que umcientista pode ouvir, pois implica em desmoralizao e perda destatus social e profissional.26

    A partir do triunfo da razo cientfica, em meados do sculo XIX,nenhuma teoria ou conceito poderia fugir dos limites do desenho domodelo cientfico, pois seria considerada no cientfica e, portanto,no verdadeira.

    Por todo esse perodo, gostaramos de ressaltar, enquanto oEstado buscava controlar os programas de ensino27e atribuio dediplomas, as universidade e corporaes possuam o encargo dedefinir e fornecer a normatizao da prtica e do saber cientfico.

    Cremos ser insuficiente, para reconstituir o almejado nestas

    consideraes preliminares, o exposto at aqui. No por objetivoelucidar o processo de organizao da pblica e de prestao deassistncia sade no sculo XIX, do desenvolvimento doracionalismo cientfico e do papel institucional desempenhado pelasAcademias. Ressalta-se, todavia, que de fundamental importnciapara a compreenso do cenrio onde foi possvel emergirexperincias to fantsticas como a do Magnetismo, das prticas

    embasadas no Vitalismo e, como no poderia deixar de ser, doprprio Espiritismo, trs aspectos considerados fundamentais e queprocuramos discutir at aqui: aquilo a que HOBSBAWN denominouas conseqncias humanas da industrializao,28 as limitaes doconhecimento e das prticas cientificas que prevaleceram at osurgimento da vertente bacteriolgica; e o papel de legitimao dosaber e das prticas desempenhado pelas Academias de Cincia.

    Indicamos a leitura de FOUCAULT, de Luz e particular-mente deROSEN, queles que se propuserem a reconstituir mais

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    detalhadamente alguns aspectos necessrios melhor compreensodo Sculo de Kardec.

    22Os estudiosos do Espiritismo encontram em "Obras Pstumas", de Allan Kardec,a oportunidade de verificar a atuao da Inquisio contra obras espritas, no queficou conhecido como Auto de F de Barcelona.

    23LUZ,M.T. Natural, Racional, Social. op. cit.24LUZ, M. T. Natural, Racional, Social. op. cit., p.118.25LUZ, M.T. Natural, Racional, Social, op. cit., p.119.26LUZ, M.T. Natural, Racional, Social, op. cit., p.120.27Como podemos averiguar na biografia de Kardec, a prpria obra do prof. Rivail

    sobre reformulao do ensino em Frana comprova esta nossa afirmao.28HOBSBAWN, E. Da revoluo industrial inglesa ao imperialismo. Forense, Rio de

    Janeiro, 1978, cap. 4.

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    II

    MAGNETISMO

    MESMER E O MAGNETISMO

    Em 1766, Franz Anton MESMER apresentou tese doutoral naFaculdade de Medicina de Viena "De planetarum inflexu. expondosuas observaes sobre o influxo dos planetas, afirmando queexistiam influncias recprocas entre os corpos celestes, a Terra e osseres animados, assim como um fluido onipresente de extraordinriasutileza que servia de veculo, tais influncias, renovando assim astradies da antigidade (as contribuies de Van HELMONT ePARACELSO, que havian expostos iguais princpios.29

    MESMER (1734-1815) era um mdico a quem seuscontemporneos reconheciam, ao mesmo tempo, uma inteligncia,excepcional e um gosto excessivo pela farsa e pela mistificaoApesar de tudo, exerceu grande influncia no progresso da medicinae da psicologia moderna.

    Publicou em 1775 uma Carta explicativa na qual exps sacademias da Europa sua teoria, aplicando o princpio de atraouniversal(NEWTON) e admitindo como verdade primeira a teoria dofluido universal conhecida h dois sculos. Verificou que o fluidoexercia sobre o corpo humano efeitos anlogo ao do im, devido apresena, nos nervos, de um fluido eletro magntico. Ele supunhaque atuando sobre este fluido, poderia curar as doenas, de nervos

    e outras.30

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    No entanto, a idia de MESMER no era nova. Por longe queremontemos na historia das cincias, encontraremos grandestalentos que a formularam melhor ou pior. Envolta no manto domistrio, o Magnetismo origina-se, nos primrdios da civilizao.

    "A arte de curar esteve estritamente ligada, em todas as pocas eem todas as sociedades, 'a magia e 'a bruxaria; por vezesconfundiu-se com essas prticas".31

    "O mdico/mgico pretende ultrapassar essas cincias, penetrar odesconhecido talvez desconhecvel, influir na terrvel fatalidade. Ahistoria da Medicina a historia de uma longa e difcil luta entre amaioria cientista e uma minoria mgica, onde os progressistas

    nessa arte, por paradoxo que seja, nem sempre so oscientistas.32

    No Egito haviam os templos do sono, onde os doentes eramconduzidos ao templo de Isis, entregando-se exerccios espirituais,para obterem o tratamento atravs dos sonhos.33

    As primeiras naes da Antigidade, como a ndia, Prsia,

    Assria, Caldia e China conheciam o magnetismo de toques epasses34 e o uso de im entre os mdicos da China e OrientePrximo, bem conhecido.35

    Na Grcia, numerosos templos se erguiam, dedicados Esculpio, onde de observava pomposo e complicado ritual, cujoprincipal objetivo era o de impressionar os doentes. Obrigados alongas e exaustivas peregrinaes para chegarem aos templos, eram

    submetidos a uma infinidade de cerimnias, ablues e severosregimes. Adotavam tambm a prtica de adoraes e promessas,representadas por oferecimentos da parte orgnica afetada.36

    Curioso notar que, no obstante os sculos percorridos e amutao que se operou nos cultos religiosos, essas prticas nodesapareceram, como atestam os rituais empreendidos pelos fieis,seja em Aparecida-SP, nas encruzilhadas e templos das afro-religiese, infelizmente, em muitos centros ditos espritas.

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    De importncia histrica imensurvel a contribuio de Jesusde Nazar, cujos fenmenos, curadores ou no, at hojepermanecem inigualveis e objeto de estudos e anlises em todomundo.

    No sculo V, Aetius de ALMEIDA suprimia as dores da gota dasmos e dos ps com o uso de im.37

    J no sculo XV, um professor de Florena chamadoapresentava suas idias que esboavam a concepo domagnetismo emergente, crendo que os indivduos exercem aesuns sobre os outros, atravs de fluidos que passam pelos olhos sob

    o domnio da vontade.38

    No sculo XVI o suo Theophrastus Bombastus Von

    HOHENHEIM abalou a cincia com suas revolucionrias teorias. Paraele, todos os seres vivos estavam submetidos ao influxosideromagntico dos astros, que agia sobre os homens eespecialmente sobre as enfermidades. Realizava curas magnticas,utilizando-se de minerais magnticos.39Considerava o corpo humano

    como um verdadeiro im, dotado de propriedades de atrair o fluidodos astros. Chamou magnetismo 'a comunicao de um indivduo aoutro, de um fluido que faz parte do fluido universal.

    MAXWELL estabeleceu a teoria do magnetismo a propsito dasmanifestaes aparentes do esprito vital. Para ele, o agentemagntico era o: "...princpio que unifica o corpo e a alma e que sepode comunicar de um indivduo a outro".40 MAXWELL

    recomendava que s estudasse o magnetismo os iniciados de todasas virtudes, pelo poder que o seu conhecimento dava sobre outrem.Mas MESMER quem vai retomar todas essas teorias.Impressionado com as curas feitas pelo Padre Maxiliano HELL(1720-1792) utilizando-se de um im, MESMER comeou aempregar na cura de seus pacientes um magneto. Consistia a parteprincipal do tratamento em desencadear crises de convulso nos

    doentes. Posteriormente, verificou que obtinha o mesmo efeito semobjetos magnticos, isto , apenas impondo suas mos (passes). Os

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    efeitos alcanados foram atribu-dos ao magnetismo humano(animal), distinto do im e capaz de, por si s, determinar a curafsica e mental. J no atribua ao im, mas ao toque manual, a curados pacientes. Publicou, ento, em 1779, uma "Memria sobre

    Magnetismo Animal", retificando sua tese inicial divulgada naCarta.41

    Atrado pela Frana devido ao avano das idias que ai severificava, instalou-se em Paris. Sua fama cresceu vertiginosamente,tendo oportunidade de curar pessoas ilustres. O nmero deenfermos aumentou tanto, que foi obrigado a conceber um sistemade magnetizao coletiva, partindo no incio, para a magnetizaode objetos ou gua.42

    Com a inveno da cuba mesmrica, passou a atender 30pacientes por sesso, 300 diariamente. A cuba consistia numrecipiente com gua magnetizada, do qual saiam numerosas varasferro, em cujos extremos pontiagudos se prendiam os doentes,colocando estas pontas em suas partes enfermas. Produziam-se,

    ento, variadas reaes nervosas ou histricas, em com efeitoscurativos em muitos casos.43 MESMER revestido de um traje lils eturbante cor-de-rosa, andava de um para o outro, tocando-os comuma vara mgica, ao som de magnetizante, auxiliado por esbeltosjovens de calas e peitos nus.44Os doentes eram conduzidos paradois compartimentos contguos, um para cada sexo, chamados salasde convulses. Os homens batiam nas paredes, outros vociferavam.As mulheres despiam-se, rasgavam a roupa, outras proferiampalavras incoerentes.45-46-47

    O caso provocou um escndalo de grande repercusso. O cleroprotestou vigorosamente contra essas prticas. Mas MESMERobtinha curas em muitos casos. Provocou reaes contraditrias,com partidrios muito entusiasmados e tambm enrgicos inimigos.Em 1784 alguns adversrios persuadiram Luis XVI a nomear

    comisso para investigar o mesmerismo. Uma da Academia deCincias (FRANKLIN, LE ROY, BAILLY, DE BORY, E LAVOSIER),

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    outra da Faculdade de Medicina (MAJAULT, SALLIM, D'ARCET eGUILHOTIM), e da Real Sociedade de Medicina (POISONNER,CAILLE, MAUDNYT, ANDRY e JUSSIER). O relatrio das trscomisses foi inteiramente desfavorvel a MESMER, concluindo-se

    que a crise convulsiva apresentada pelos pacientes era devidounicamente imaginao e imitao.48

    Verificaram que muitos doentes podiam ser curados atravs debarras de ferro que julgavam estar magnetizadas mas no estavam.Concluram dai, que o fluido no existia e que tudo se passava naimaginao. Chamou-se os adeptos dessa teoria de animistas.Porm, o botnico JUSSIER no apoiou essa concluso,demonstrando atravs de experimentao (uma cega que reagia aimanes que lhe eram aproximados do estmago) que MESMER tinharazo. Chamou-se ento os partidrios de MESMER de fluidistas.

    Estava criada a polmica entre animistas e fluidistas que, decerta maneira persiste at hoje, e que foi objeto de preocupao eanlise de KARDEC e seus principais seguidores, entre eles

    DELANNE e BOZZANO, nitidamente adeptos de uma terceira teoriaque admite tanto as teses fluidistas como animistas, acrescentandoa influncia do elemento espiritual na explicao dos fenmenos.

    Com as concluses das comisses o prestgio de MESMERdeclinou, porm havia deixado escola. Retirou-se da Frana, passoupor toda a Europa, e por fim foi para a Sua, onde viveu os ltimosanos de sua vida. Com suas descobertas iria abrir o caminho no s

    para a Medicina Moderna, como para todas as cincias que lidamcom a mente humana e a fenomenologia paranormal, tendoinfluenciado profundamente, segundo especialistas, a obra de FREUD.

    29AIZPRUA, Jon. Historia de Ia Parapsicologia. Universidade de Caracas, Venezuela,1986.

    30 LANTIER, J. O Espiritismo. Colees Esfinge. Edies 70, Lisboa1971, p.28.31

    LANTIER, J, O Espiritismo. op. cit., p.27.32LANTIER, J. O Espiritismo. op. cit., p.28.

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    33 DELEE, S. Hypnotism in pregnancy and labor. J.A.M.A., 159: 750-754, 1955.34DAVIS, A. Tratamento de Ias enfermidades por Hipnotismo y Sugestion. Antnio

    Rocha Editor, Barcelona, s.d.35TEIXEIRA, P.C. Homeopatia x Alopatia ou Vitalismo x Materialismo. Verso Editora,

    So Paulo, 1985.36PASSOS, A.M.Aspectos atuais da Hinologia. Linogrfica Editora, So Paulo, 1961.37PASSOS, A.M.Aspectos atuais da Hinologia. op. cit.38LANTIER, J. O Espiritismo. op. cit., p.29.39 VOLGYESI, E. El alma lo es Todo. Caralt Editor, Barcelona, 1956.40MAXWELL. Tratado de Medicina Magntica. 1673, citado por PASSOS, A.M. op. cit.41PASSOS, A.M.Aspectos atuais da Hipnologia. op. Cit.42

    Parece-nos muito convincente a tese de que as mais tradicionais prticas espritas,tais como os passes magnticos e o tratamento com gua flu-dica, tem sua origem naincorporao e assimilao de tais prticas mesmricas.

    43AIZPRUA, Jon. Historia de Ia Parapsicologia. op. cit.44PASSOS, A.M.Aspectos atuais da Hipnologia. op. cit.45LANTIER, J. O Espiritismo. op. cit., p.30.46A origem das salas de desobssesso, assim como a diviso da platia por sexo,

    prticas ainda encontradas na maioria das instituies espritas, tambm parece

    encontrar no Mesmerismo sua fonte inspiradora.47Segundo LANTIER, J. O Espiritismo. op. cit., p.30, "foi assim que se criou em pleno

    centro de Paris, com o encorajamento de altas personalidades do Estado, a maisinslita explorao mdica que alguma vez se viu".

    48VAN PELT, S. Hypnotism and the power within. Fawcett Publications, New York,1974.

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    MAGNETISMO, SONAMBULISMO E HIPNOSE

    Na mesma poca que MESMER, o padre GASNNER curava osenfermos por meio de imposio das mos, pela palavra e peloexorcismo.49

    Em 1784 o marqus de PUYSGUR (1751-1825), treinando-seem magnetizar os camponeses segundo os mtodos mesmerianos,teve a surpresa de ver cair num sono de tipo des-conhecido um de

    seus aldees que estava sendo tratado de uma enfermidadepulmonar. No decurso de seu sono magntico, o campons respondia perguntas, inclusive mentais, e podia diagnosticar e tratarenfermidades, sua e de outras pessoas, assim como adivinhar ondehaviam sido escondidos alguns objetos, tudo isso sem as habituaiscrises histricas. Apresentava, ainda, amnsia total ao acordar.

    Havia descoberto o sonambulismo, e havia estabelecido uma

    conexo entre o magnetismo, o hipnotismo e a percepo extra-sensorial.50 Publicou duas obras com suas concluses: ELmagnetismo animal"(1809) e "Investigaciones, experincias yobservaciones fisiolgicas acerca dei hombre en estado desonambulismo natural y provocado por Ia accin magntica"(1811).51

    O Marqus de PUYSGUR teve inmeros seguidores e

    constituram-se em Paris os primeiros crculos magnticos.52Segundo LANTIER: "estas pequenas sociedades transformar-se-

    iam, na sua maior parte, depois de acontecimentos muitossurpreendentes (mesas girantes), em crculos espritas".53 Oentusiasmo pelo magnetismo, neste incio de sculo era to grandeque a opinio pblica levou o governo francs a retomar o processode MESMER, sendo a Academia de Cincia, em 1826, intimada a

    pronunciar-se, concluindo e condenando, em primeira instncia, ojuzo proferido contra- MESMER, e em seguida, por presso da

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    Igreja, que "a pesquisa do magnetismo deveria ser encorajada, comoum ramo muito curioso da psicologia e da histria natural, mas nocomo teraputica".54

    Incidentes lamentveis, preconceitos, e a prpria impotncialevaram a Academia de Medicina de Paris por proibir o uso domagnetismo em 1840, com as pesquisas sendo abando-nadas pelacincia oficial.

    A igreja condenava, porm muitos padres haviam tomado-semagnetizadores e, no campo, prestavam servios como curandeiros.O Santo-Ofcio desencadeou inmeros inquritos contra

    magnetizadores, condenando seus poderes diablicos que osarrastavam para fora dos caminhos da moral.

    Em 1813 aparece em Paris o Abade FARIAS, adepto da teoriaanimista, que trouxe para a Europa os conhecimentos domagnetismo oriental.55 Explicou os fenmenos do magnetismo nosentido atual da sugesto, esclarecendo que o sono magntico noderiva de qualquer fluido ou fora especial emitida pelo

    magnetizador. FARIA se iniciou nas prticas magnticas do Marqusde PUYSGUR, e atribuiu-se seus xitos tambm estatura e a corfortemente bronzeada da pele. Suas atividades de magnetizadoreram conhecidas desde 1803, quando freqentou os sales daMarquesa de CRISTINE. Continuou seus trabalhos e foi nomeadoprofessor de Filosofia na Academia de Marselha, em1811. Pareceque neste ano foi considerado membro da sociedade mdica, em

    virtude de suas prticas de magnetizador, embora no fosse mdico.Em Paris iniciou um curso pblico sobre o sono lcido. Suas

    conferncias tiveram grande repercusso, constando de exposiooral e demonstrao prtica do sonambulismo. Foi o primeiro aproclamar a tese da sugesto, no fazendo distino entre o sonolcido, o sonambulismo provocado e o sono natural. Tentou explicaratravs das teorias humorais os fenmenos do sonambulismo. Com

    ele nasce tambm duas idias novas: a causa do sonambulismo noreside no magnetizador e sim no prprio sujeito e, a induo do sono

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    pela palavra durma sem o uso de gestos. Influiu profundamente emBRAID.56

    No mesmo perodo o professor do Museu de Histria Natural deParis, o fluidista Joseph P. DELEUZE (1753-1835) escreveu,reunindo tudo quanto se sabia a respeito, e acrescentou:

    "Creio firmemente em uma emanao de mim mesmo, porque seusefeitos se produzem sem que eu tome o sujeito magnetizado, eporque o que no existe no pode produzir nada. Desconheo anatureza desta emanao e no posso precisar a que distncia podeestender-se, porm sei que emitida e dirigida pela minha vontade,porque quando deixo de querer, deixo de fazer.57

    E mais,a respeito dos requisitos para se magnetizar:

    "O primeiro que se necessita para magnetizar a vontade; osegundo, a confiana que em si mesmo tem o que magnetiza; e emterceiro, o operador deve estar animado pelo desejo de fazer obem."

    Fenmenos diversos foram descritos por DELEUZE e encontram-

    se resumidos na excelente e didtica obra de JON AIZPRUA.58Em 1829, CLOQUET faz o primeiro relato da utilizao do

    mesmerismo como anestesia, procedendo a amputao de umamama, mtodo j utilizado por DUBOIS (1797) e RECAMIER (1821).59

    Jean DU'POTET (1796-1881) foi outro experimentador francsque estudou a fundo as relaes entre o sonambulismo magntico e

    as faculdades supra-normais, continuando a tradio de PUYSGURe DELEUZE, publicando "Manual do estudante Magnetizador", muitodivulgado, e "Tratado completo de Magnetismo Animal".60

    Na Universidade de Londres, J. ELLIOTSON, professor decirurgia, influenciou-se muito pelas demonstraes de JEAN DUPOTET, iniciando suas prprias experincias e com elas os atritoscom os colegas, que acabaram desencadeando a proibio da

    prtica do mesmerismo em 1838, levando ELLIOTSON renncia dactedra. Continuou, entretanto, a praticar o mesmerismo e, em

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    1843, com um grupo de simpatizantes, publicou um jornal fisiologia cerebral e ao mesmerismo, o "Zoist", que saiuregularmente de 1843 1855, figurando entre as publicaesamputaes de coxas, pernas, e partos, realizados sem dor, durante

    transe mesmrico.61

    Como resultado da influncia do "Zoist", vrios hospitaismesmricos foram fundados em Londres e na Europa, como emExeter, onde PARKER fez 200 cirurgias sem dor e mesmerizou 1200pessoas.62

    James ESDAILLE (1808-1959) tornou-se um dos maiores

    magnetizadores, inspirado nas tcnicas de ELLIOTSON, Cirurgio,trabalhou num hospital mesmrico em Calcut, ndia, onde realizoumilhares de pequenas cirurgias e 300 de grande porte sem dor, pelomagnetismo, com diminuio impressionante dos ndices demortalidade. No empregava a sugesto verbal, mas o passe e ainsuflao magntica, obtendo estados profundos de letargia,catalepsia, sonambulismo e insensibilidade. Concluiu que:

    "o mesmerismo uma fora natural do organismo humano, queafeta diretamente o sistema nervoso muscular; que aadministrao crnica do mesmerismo atua como um utilssimoestimulante da debilidade funcional; que a gua pode sercarregado com fludo magntico e tem um poderoso efeito sobreo sistema; que a influncia mesmrica pode se transmitidaatravs do ar a considervel distncia".63

    Em 1830, Justinus KERNER (1786-1862), notvel e respeitadomdico alemo publicou o livro "La Voyante-de Prevorst", no qualrelata as notveis experincias que teve com a sonmbula FredericaHAUFFE durante 3 anos, que entrava em transe sonamblico todosos dias s 7 horas, quando identificava metais escondidos dentro decaixas, via fantasmas, fazia predies controladas e confirmadaspelo Dr. KERNER e equipe, e indicou o prprio tratamento por

    passes magnticos. Esta obra, segundo AIZPRUA

    64

    "antecipou em

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    vrias dcadas o que veio a ser estudado pelo hipnotismo,espiritismo e pela parapsicologia".

    49KAECH, R. Mesmer e magnetismo animal. Rev. Psicol. Norm. Pato 3: 589-625, 1957.50AIZPURUA, Jon. op. cit.51PYUSGUR. citado por AIZPRUA, Ion. op. cit.52Esta , em nossa opinio, uma das evidncias de que o fenmeno de Hydesville e o da

    mesas girantes no deva ser considerado o marco histrico do surgimento doEspiritismo. A seguir sustentaremos que a incorporao de uma srie de prticas domagnetismo sejam os mais fortes indcios de nossa afirmao.

    53LANTIER, J. op. cit., p.38.54PASSOS, A.M. op. cit.55VOLGYESI, E. op. cit.56MONIZ, E. El Abade Farias en la Historia de la Hipnosis. Editorial Poblet, Buenos Aires,

    1960.57 DELEUZE. Histria crtica do Magnetismo Animal. citado por PASSOS, A.M., op. cit.58AIZPRUA, Jon. op. cit.59KROGER, W. lntrodution and Supplementary Reports. In: Hipnosis in Medicine and

    Surgery, The Work oi James. Esdaile, New York, 1967.60AIZPURUA, Jon. op. Cit.61BRAMWELL, 1. Hypnotism, its History, Practica and Theory. The Julian Press, New

    York, 1956.

    Franz Anton MESMER(1734-1815)

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    62Ressalta-se que at ento inexistiam mecanismos de analgesia e que o impacto sociale humanitrio que a incorporao de uma nova tcnica de tal monta produziu foramimensurveis.

    63ESDAILLE J. Cirurgia mayor e menor bajo hipnosis. Ed. Crespilil Buenos Aires, 1959.64AIZPRUA, Jon. op. cit.

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    O HIPNOTISMO

    Em 1841, James BRAID, cirurgio em Manchester, foi assistir auma demonstrao do magnetizador suo LA FONTAINE, que tiveraviolenta oposio da igreja na Itlia, mas fora estimulado, emaudincia especial pelo prprio Papa PIO IX65. Queria desmascar-Io,pois o considerava charlato. Achou a primeira demonstrao uminsulto inteligncia cientfica,66no resistindo, porm, a curiosidadede assistir a outras demonstraes. Na segunda vez, convenceu-se da

    realidade de uma catalepsia ocular, induzido em um seu amigo.Ansioso para descobrir a causa fisiolgica dos fenmenos

    observados, uma vez que no aceitava as explicaes domagnetizador, elaborou atravs da observao, hiptese de que osono era determinado pela fadiga dos olhos, experimentando oprocesso com amigos, aos quais ordenava que olhassem fixamenteum objeto. Em todos os casos foi capaz de produzir um sono

    (estado) semelhante ao transe, chegando a concluso de que osfenmenos eram puramente subjetivos.

    Em 1842 publica um trabalho onde aparece pela primeira vez otermo hipnose, como estado ou condio de sono nervoso, ehipnotizador, como aquele que induz o sono nervoso, e hipnotismo.

    BRAID, como tantos outros, pensou que a hipnose fosse umaforma de cansao do olho espiritual. Convenceu-se logo depois, da

    desnecessidade do sono para os principais fenmenos hipnticos(catalepsia, anestesia e amnsia) e do papel primordial da sugestoverbal.67 Tentou, ento, mudar o nome que criara, mas a palavraestava consagrada e at hoje permanece.68

    BRAID, WARD e BROCCA, publicaram milhares de casos cirrgicosoperados sem dor atravs da hipnose. Apareceram ainda os trabalhosde CARPENTER, CUMES e do Baro REICHEMBACH, que descreviam

    o fluido magntico com o nome de fora dica. Na Frana, PHllLIPSapresentou a teoria do eletrodinamismo vital. Apareceram as primeiras

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    observaes de Azim sobre o desdobramento da personalidade. Forampublicados livros de STWART, LIEBEAULT e LASEGUE sobre acatalepsia provocada em casos de histeria.69

    LIEBEAULT, mdico francs, que acrescentou ao mtodo deBRAID a sugesto verbal, e que desde 1848 interessava-se pelomagnetismo, abriu em 1854, em Nancy, um dispensrio gratuito paratratar os pobres por meio do hipnotismo. Chama, atravs da cura deum determinado paciente, a ateno de BERNHEIM, famoso professorda Faculdade de Medicina de Nancy, que se converte, tornando-seseu grande amigo e criando a famosa Escola de Nancy.70

    Charles RICHET foi tambm um grande adepto da hipno-se,influenciando profundamente CHARCOT, que desenvolveu suasatividades na Salptriere, fundando a chamada Escola de Paris.Acreditava que hipnose, magnetismo e histeria eram sinnimos.Esteve muito mais ligado ao mesmerismo que ao hipnotismo e erafluidista. Fez a primeira classificao cientfica da hipnose.71

    A Escola de Paris72acreditava que os fenmenos estudados eramsinnimos de uma mesma condio, sendo a hipnose e osfenmenos magnticos, uma forma de histeria que poderia serinduzida em certos indivduos constitucionalmente predispostos. Poroutro lado, estavam mais ligados ao magnetismo que ao hipnotismo,e admitiam que a influncia magntica era real. Consideravam aletargia, a hiper-excitao neuromuscular, como nico fenmenonotvel, e disto se serviam para mostrar que no havia simulao.Tiveram. sempre a preocupao de estudar fenmenos objetivos, de

    verificao mais simples, e se desinteressavam pelos da sugesto.A Escola de Nancy,73 considerava a sugesto um fator de real

    importncia, pois no estado normal toda idia questionada, e comoconseqncia, aceita ou rejeitada. No estado magnetizado, porm, huma tendncia peculiar para transformar a idia sugerida em ato, eisto feito to rapidamente que a inibio intelectual no tem tempode atuar; assim, as sugestes se tornam s vezes de tal modo vivas e

    acentuadas que chegam a se converter em alucinaes. Criticava ade Paris precisamente pelo fato desta no levar em considerao o

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    papel da sugesto nas experimentaes que realizava em suasenfermarias, utilizando-se, apenas, de pacientes histricas eesquecendo-se que os fenmenos, podiam se reproduzir por imitao.

    Importa salientar que o advento das gloriosas Salpetrire eNancy, que atingiram o mximo de seu esplendor em fins do sculopassado, quando nelas pontificava os grandes CHARCOT eBERNHEIN, tiveram o grande mrito de atrair a ateno de todospara o estudo do consciente e das suas relaes com osubconsciente e inconsciente. Imprimiram novas diretrizes ao estudodo psiquismo humano, alargando extraordinariamente o campo dasobservaes e pesquisas, no propsito de melhor penetrar e

    conhecer os mistrios que ainda cerceiam o pensa mento humano eos fatores que contribuem, tanto para perturb-lo, como para cur-Io.

    Em 1887, o Coronel DE ROCHAS publicava seu primeiro livroreforando o magnetismo e seus discpulos na convico com adivulgao de impressionantes casos de crianas e jovens eltricos.

    BREUER (1880) descobriu o tratamento hipntico nas emoesreprimidas (tcnica de liberao de sentimentos reprimidosassociados a memria traumtica). Atraiu a ateno de FREUD, quecom ele publicou em 1895 o "Studien uber Hysterie". FREUD esteveem Paris em 1885 observando CHARCOT, em 1889 em Nancy comLIBAULT e BERNHEIN. Entretanto, cedo abandonou a hipnose emfavor do mtodo por ele criado da livre associao.7465VAN PELTS, S. op. cit.66GINDES, B. New concepts of Hipnosis. The Julian Press, New York, 1965.67PASSOS, A.M. op. cit.68VAN PELTS, S. op. cit.69 PASSOS, A.M. op. cit.70 PASSOS, A.M. op. cit.71MILECHNIN, A. La hipnosis. Libreria Hachette. Argentina, 1961.72PASSOS, A.M. op. Cit.73MILECHNIN, A. op. Cit.74 MILECHNIN. A. op. cit.

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    O DECLNIO DO MAGNETISMO

    Quando abordamos o desenvolvimento histrico das cinciasmdicas e a assimilao do papel curativo, descritos no inicio denosso trabalho, procuramos demonstrar importante aspectosrelacionados ao cenrio e aos diferentes sujeitos, coletivos ou no,que fomentaram o surgimento e o declnio de Magnetismo (e decerta forma tambm do Vitalismo) junto ao homens de cincia.

    Entre os fatores mais importantes que contriburam para o

    declnio do magnetismo no final do sculo XIX, destacamos odesenvolvimento, em primeiro lugar da anestesia e das descobertasde PASTEUR, e em segundo lugar, porm sem menor importncia,do desenvolvimento de tcnicas psicoterpicas advindas com asdescobertas de FREUD, bem como sua atitude em relao aoMagnetismo e a Hipnose.

    O trato com a doena sofreu uma pasteurizao no que dizrespeito ao hospital psiquitrico e a prtica em relao a doenamental.

    A despsiquiatrizao, movimento de reao produo dedoenas, ao uso de pacientes histricos, ao processo questionvelda sugesto, que tinha em CHARCOT seu grande representante,entrava em processo de questionamento intenso. Redimensionou-se

    o trato com a sade e o doente mental. A Psicanlise no deixou deser uma forma de despsiquiatrizao que surgiu provocada pelotrauma do magnetismo, que consistia, no dizer de FOCAULT: "naretirada para fora do espao asilar, a fim de apagar os efeitosparadoxais do sobre-poder psiquitrico, colocando a noo detransferncia como processo essencial cura, e a contrapartidafinanceira, como forma de no possibilitar uma retomada daestrutura de poder anterior".75 Ressalta-se tambm odesenvolvimento da psicofarmacologia. constituindo escola adversa

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    da psicanalista, mas to importante quanto na reao que estamosdenominando despsiquiatrizao.

    Nestes novos tempos de racionalismo cientfico, a exploraocada vez mais frequente dos fenmenos do Magnetismo eHipnotismo nos palcos, nos circos e nas reunies de entretenimento,acentuaram-lhe as caractersticas de charlatanismo, magia e atocultismo, que lhe pesavam nos ombros, desde os tem-pos deMESMER, constitundo-se em outro importante fator para a rejeiodo Magnetismo e das cincias correlatas, entre as quais o prprioEspiritismo.

    Outro aspecto que deve ser analisado a relao impor-

    tanteexistente entre Magnetismo e Espiritismo, e depois, a hip-nose e aparapsicologia. Muitos adeptos da teoria fluidista acabaram aderindoao Espiritismo. Muitos foram compor as fileiras da Metapsquica edepois da Parapsicologia, sendo o Magnetismo, objeto de anlise epesquisas das sociedades de investigao psquica que floresceramna Europa e Estados Unidos, aps a dcada de 60 do sculo

    passado. Perfilaram nomes, citando talvez os mais expoentes entreos que pertenceram as referidas sociedades de pesquisa, tais como:WALLACE, MORGAN, V ARLEY, CROOKES, VISCONDE DE ADARE,BARRET, MYERS, GURNEY, SIDWICK, PODMORE, HODGSON,HYSLOP, e entre os Metapsiquistas destacamos GELEY, RICHET,MEYER, SUDE e OSTY.

    Mais do que a perda de quadros para os novos movimentos

    espiritista e metapsquista, parece-nos que o Magnetismo esgotava-se enquanto modelo terico e prtico, sendo superado pelosmovimentos congneres que surgem no sculo XIX que incorporamparcialmente seus conceitos e prticas.76

    No havia mais espao para a mstica ao magntica,principalmente nos asilos e hospitais de caridade. O Magnetismo,quando estudado, passaria a ficar restrito a esse grupo de cientistas

    e homens de pesquisa. Pelo menos no que diz respeito prtica doMagnetismo curador, no havia mais espao frente a cincia oficial.

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    Mesmo assim, segundo conta LANTIER,77em 1892 foi criada poruma esprita eminente uma escola prtica de magnetismo e demassagem, admitida pelo governo francs. Frente a reao dosmdicos, um novo projeto sobre o exerccio da medicina foi

    discutido pelo Parlamento, levando os espritas, magnetizadores,curandeiros e massagistas a fundarem um sindicato, conseguindovinte e cinco mil assinaturas favorveis sua petio em defesa deseus interesses. Em funo de vrios processos contra curandeiros,espritas e magnetizadores, e particularmente num caso envolvendoMouroux em 1896, o Congresso Internacional Esprita que serealizou em 1900 em Paris, discutiu e deliberou que o Magnetismo

    realmente possui propriedades curativas e a eficcia de suautilizao para o tratamento das doenas sem qualquer perigo esolicitando a alterao da legislao sobre o exerccio da medicina.

    Seja como for, a teoria do magnetismo animal foi e con-tinuou aser, do final do sculo XVIII at meados do sculo XIX, a maisavanada para explicar os fenmenos paranormais e, na ocasio,para os provocar. Foi no seio dos movimentos interessados pelo

    Magnetismo que surgiu a extraordinria aventura do Espiritismo,78

    constituindo-se em nosso entendimento em seu marco inicial pelomenos no tocante as suas ticas mais tradicionais, excetuando-se amedinica.

    75FOUCAULT, Michel. op. Cit.76O passe, a cmara de passe, a msica magnetizante no ambiente, a gua fludica, a

    diviso da assistncia em lugares distintos por sexo, a incorporao de temas comosonambulismo, xtase, dupla vista, letargia e catalepsia, etc, e principalmente aincorporao da mentalidade assistencial-curativa na prtica esprita e de outrasdoutrinas e religies espiritualistas e msticas corroboram esta afirmao.

    77LANTIER, J. op. cit., p.17.78LANTIER, J. op. Cit.

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    MAGNETISMO, O ESPIRITISMO E KARDEC

    Deliberadamente procuramos no fazer referncia at aqui aHippolyte Len Denizard RIVAIL. Muitos de seus bigrafosdestacam-no como grande magnetizador, o que todavia, no podeser confirmado em nosso trabalho de pesquisa realizado obras decunho no esprita.

    Porm KARDEC mesmo que se mostrar familiarizado com as

    coisas do Magnetismo. Em 1854, por ocasio de sua fatdicaconversa com CARLOTII,79diz no entender nada de espritos, "masestar muito familiarizado com os segredos do magnetismo animal,como partidrio convicto das teorias de Mesmer". Sua primeirahiptese para explicar os fenmenos das mesas girantes, era omagnetismo, bom lembrar.

    Na Introduo de sua obra basilar, "O Livro dos Espritos",80

    KARDEC refere-se ao Magnetismo, ao lado da teoria do meio-ambiente e a esprita, como as nicas que se apoiavam em teoriasracionais para explicar os fenmenos espritas. Explica que para omagnetismo as manifestaes atribudas aos espritos seriam apenasefeitos magnticos.

    "Os mdiuns ficariam num estado que se poderia chamar desonambulismo acordado, fenmeno co-nhecido de todos que

    estudaram o magnetismo. Neste estado as faculdades intelectuaisadquirem um desenvolvimento anormal, os crculos de percepointuitiva se ampliam alm dos limites de nossa percepoordinria(...) No seremos ns quem contar o poder dosonambulismo, cujos prodgios presenciamos, estudando-lhe

    todas as facetas, durante mais de 35 anos(...) Concordamos que,de fato, muitas manifestaes espritas podem ser explicadas poresse meio.81

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    Na verdade, a formao intelectual do jovem prof. RIVAIL,ecltica e realizada no crculo intelecto-cultural de ento, marcadapor um ambiente de grande efervescncia de idias. "Bacharel emCincias e Letras, doutor em Medicina, tendo jeito todos os estudos

    mdicos e brilhantemente defendido tese", segundo um dos seusbigrafos, SAUSSE82, e tendo feito "estudos especiais de Anatomia,ensinando essa matria, como outras de cincias fsicas enaturais".83KARDEC inegavelmente efetuou estudos e vivenciou osfenmenos magnticos, o que o enquadra no grupo de magnetistas,mas no no de magnetizadores como muitos insistem.

    Em 1858, nas pginas da "Revista Esprita", reflete:

    "O magnetismo preparou o caminho para o Espiritismo, e osrpidos progressos desta ltima doutrina so incontestavelmentedevidos vulgarizao das idias acerca da primeira. Dosfenmenos magnticos, do sonambulismo e do xtase smanifestaes espritas, no h seno um passo; sua conexo tal, que , por assim dizer, impossvel falar de um sem falar deoutro". 84

    No mesmo ano, KARDEC comenta que certos magnetistas aindano admitiam a existncia ou, pelo menos, a manifestao dosEspritos; pensavam, diz ele:

    "que podem tudo explicar s pela ao do fluido magntico. Nsmesmos a partilhvamos a princpio; mas como tanto outros,tivemos que nos render as evidncias dos fatos. Ao contrrio, os

    adeptos do Espiritismo so todos concordes com o Magnetismo,todos admitem sua ao e reconhecem nos fenmenossonamblicos uma manifestao da alma." Meses depois, lamentaque "certos magnetistas ridicularizavam o Espiritismo, usando atrepreslias, para com essa cincia irm que s pode prestar ao

    magnetismo um apoio salutar.85

    Sobre a importncia dos adeptos do magnetismo nos quadros do

    movimento esprita de sua poca, KARDEC, em artigo intitulado"Estatstica do Espiritismo", coloca os magnetistas em primeiro

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    lugar, ao lado dos mdicos homeopatas, entre os profissionaisliberais adeptos do Espiritismo, e comenta:

    "Se os magnetistas figuram na primeira linha, logo aps oshomeopatas, malgrado a perseguio persistente, e por vezesacerba de alguns, que os oponentes no formam seno umapequenssima minoria ao lado da massa dos que so, pode-sedizer, espritas por intuio".

    Segundo este artigo, para KARDEC a oposio entre osmagnetistas ficaria na proporo de 2 a 3 %, e seria maior em Parisdo que em outros lugares. E continua:

    "O Magnetismo e o Espiritismo so, com efeito, duas cinciasgmeas, que se completam e explicam uma pela outra, e dasduas, a que no quer imobilizar-se no pode chegar ao seucomplemento sem se apoiar na sua congnere. Em todos ostempos os magnetistas se dividiram em 2 grupos: os epiritualistase os fluidistas. Estes ltimos, muito numerosos, pelo menosfazendo abstrao do princpio espiritual, quando no o negamabsolutamente, atribuindo tudo ao do fludo material, estopor conseqncia, em oposio de princpios com os espritas86

    KARDEC enfrentava grandes obstculos em seu relacionamentocom a vertente materialista das academias; com a Igreja e atmesmo entre aqueles, a quem procurava aproximar-se, como era ocaso dos magnetistas.

    nas pginas da "Revista Esprita", ainda, que ele ex-plicita seu

    ntimo relacionamento com os magnetistas, muito em parteconstrudo em tempos anteriores na militncia, nos crculosmagnticos e acadmicos. Homenageou o Baro DU POTET, diretordo Journal du Magntisme, o Sr. MILET, diretor da UninMagntique, e os pioneiros Marqus de PUYSEGUR e DELEUZE, peladedicao com que lidaram ao magnetismo87, "ao qual o Espiritismose liga por laos ntimos, como cincias solidrias".

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    Lembra que o Marqus, modificando os mtodos de MESMERcriou o magnetismo animal (sonambulismo provoca-do), juntamentecom D'ESLON e o naturalista DELEUZE, bibliote-crio do Jardim dasPlantas.

    Em certa oportunidade, por ocasio do aniversrio de MESMER,foi convidado para banquetes oferecidos por diferentes grupos demagnetizadores, que se dividiam em escolas, e portanto, concepesdiferentes do prprio Magnetismo. Em artigo na Revista,88 agradeceuaos convites, enalteceu todos, confessou novamente que h 35anos profetizava a cincia magntica. E aceitou o convite do Dr.DUPLANTY, lder da Escola Animista, em detrimento dos convitesfeitos por outras escolas, entre os quais o da Escola Mesmeriana ouNaturalista, dirigida pelo Baro DU POTET e que congregava entreoutros, ROUSTAN, R, JAPHET. Alguns de seus bigrafos89 oincluram nesta escola. Porm, as evidncias nos levam a crer que cmantinha relaes com as vrias escolas, sem aparente cerrar fileiraspor nenhuma, na ferrenha batalha que travam entre si.

    Os magnetizadores de sua poca tendiam para os trabalhos decura, diagnose e teraputica. Mas tambm estudaram vriosfenmenos catalogados como metapsquicos e parapsicolgicos,como ao distncia, viso atravs de corpos opacos,clarividncia, premonio e outros. Parece-nos que KARDEC seguiaessa orientao apesar das divergncias.

    KARDEC abria as pginas da Revista para as conquistas

    cientficas do Magnetismo e do Hipnotismo. Em 1860,90

    porexemplo, disserta sobre como o magnetismo oficializava-seen-quanto cincia atravs da hipnose, aps 20 anos de espera, viaanalgesia (hipnoanalgesia). Em tom idealista, mesmo romntico,comemora o passo. Mas com a seriedade que o caracterizou,adverte: " uma primeira barreira derrubada, eis tudo".

    Reproduz neste artigo interessante matria publicada na revista

    cientfica Sicle, de 1859, onde consta as experincias do Dr. Paul

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    BROCCA, 20 anos aps o hipnotismo ser descoberto por BRAID,que grande repercusso alcanaria na Frana e em toda a Europa.

    O magnetismo, enquanto doutrina e prtica experimental,permeou toda a obra da Codificao do Espiritismo. Dos casosestudados e relatados, saram muitos conceitos tericos eperquiries elaboradas a posteriori, com os espritos. Esses estudosno se reduzem a notcias e artigos publicados "Revista Esprita".

    Sobre o magnetismo KARDEC dedicou dois captulos do "Livrodos Espritos", tratando do sono e os sonhos, da transmisso dopensamento, da letargia, catalepsia, morte aparente, sonambulismo,

    xtase, dupla vista, poder oculto, talism e feitios, aos quaisretomou em "A Gnese", anos aps.91

    Em "O Livro dos Mdiuns92, encontramos o magnetismopermeando toda a obra, ora como hiptese, ora como objeto deaplicao prtica comparada, ou mesmo confundindo-se com osfenmenos espritas. Em "Obras Pstumas" foram compiladosalguns captulos sobre o estudo do magnetismo.

    KARDEC polemizava com muita determinao. Conquistoumuitos inimigos e exaltou nimos de seus adversrios ao abordarquestes como as das curas por meio da prece e imposio demos. Questionava muito a taxao de exerccio ilegal da medicina echarlatanismo, a que eram impostos os adeptos tanto domagnetismo, como do Espiritismo.

    A respeito da Homeopatia, Alopatia e Fluidoterapia, dizia: "So 3ramos da arte de curar, destinados a se suplementar e se completar,conforme as circunstncias, mas dos quais, nenhuma tem o direitode se julgar a panacia universal do gnero humano".93

    KARDEC, e posteriormente seus principais seguidores - DENIS,FLAMMARION, BOZZANO, DELANNE, LOMBROSO e outros -utilizaram o Magnetismo como objeto de anlise e estudo,

    procurando classificar os fenmenos e explic-Ios, dando-

    Ihes leis.Conclumos com palavras de KARDEC, em "O Livro dos Espritos":

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    "O Espiritismo e o Magnetismo nos do a chave de umainfinidade de fenmenos sobre os quais a ignorncia tece muitasfbulas, em que os fatos so exagerados pela imaginao. Oconhecimento dessas duas cincias, que se resumem numa s,

    o melhor preservativo contra as idias supersticiosas, porquerevela o que impossvel, o que est nas leis da Natureza e o queno passa de crena ridcula."

    79KARDEC, Allan. Obras Pstumas. FEB, Rio de Janeiro, 1978.80KARDEC, Allan. O Livro dos Espritos. FEB, Rio de Janeiro, 1984, item XVI.81KARDEC, Allan.:O Livro dos Espritos. op. cit..82 SAUSSE, Henri. citado por WANTUIL, Z. Meticulosa Pesquisa Bibliogrfica. FEB, Rio

    de Janeiro, 1 vol.83KARDEC, Allan: Revista Esprita. Edicel, So Paulo, v.1859, p.9284 KARDEC, Allan: Revista Esprita. Edicel, So Paulo, v.1858, p.92-182.85KARDEC, Allan. Revista Esprita. 1858, p.92-182.86 KARDEC, Allan. Revista Esprita. 1869, janeiro.87KARDEC, Allan. Revista Esprita. 1858, p.92-182.88 KARDEC, Allan. Revista Esprita. 1858, p.92-182.89ABREU, Canuto. O Livro dos Espritos e sua tradio histrica e lendria. Jornal

    Unificao, So Paulo, 1957.90KARDEC, Allan. Revista Esprita. 1860, janeiro.91KARDEC, AlIan.A Gnese. FEB, Rio de Janeiro, capo XIV, XV.

    92KARDEC, AlIan. O Livro dos Mdiuns. FEB, Rio de Janeiro.93 KARDEC, AlIan. Revista Esprita. 1868. Proporo Relativa dos Espritos.

    James Braid(1795-1860)

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    III

    VITALISMO

    ORIGEM E TRAJETRIA DO VITALlSMO

    O Vitalismo a doutrina segundo a qual "os seres vivos sodotados de uma fora particular em si mesmos, a fora vital,irredutvel fisicoqumica, e que d origem aos fenmenos vitais".

    Essa definio bastante genrica, embora exata, nos faculta umaviso ampla do Vitalismo, como escola filosfica, permitindo-nosincluir, sob esta denominao, uma extensa lista de doutrinas,teorias e hipteses pertinentes concepo idealista da vida.

    O Vitalismo tambm pode ser definido como "a doutrina filosfica-cientfica, segundo a qual os fenmenos vitais so regulados edirigidos por um princpio ou fora vital, distinto no s da almapensante como das propriedades fsico-qumicas do organismo94.

    Por certo muitas outras denominaes seriam possveis, embora

    pouco viessem acrescentar ao nosso entendimento sobre a questo.Melhor ser percorrer, num breve histrico, a construo do antigoedifcio do Vitalismo, procurando conhecer o que deixaram osgrandes pensadores que criaram filosofias e teorias cientficas arespeito, enfeixando em conceitos variados a uniformidade damanifestao da vida.

    Onde situar a origem do vitalismo?

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    Ele parece surgir com o mais antigo tratado de cincias mdicase biolgicas que se tem conhecimento, o Nei King, atribudo aoimperador HOANG TI, da dinastia Han escrito h aproximadamente500 anos a.C. O livro resume quase todos os pensamentos

    filosficos da China Antiga: confucionismo, escola cosmolgica doYing e do Yang, os cinco elementos e o taosmo, bem comoconhecimentos detalhados de anatomia, fisiologia, acupuntura,chegando at mesmo a descrever o trajeto da energia nosmeridianos. Esta obra fruto da observao e experimentao, ondese somam as diversas correntes de pensamento da poca parafundar sua prpria doutrina sobre a energia vital.95

    Segundo o Nei King, a vida permanece enquanto a energia seintegra ao organismo; quando esta deixa o corpo, a vida chega aoseu fim. E mais, a perturbao das energias csmicas e comoconseqncia a perturbao da energia humana, a causa de todasas molstias. A unio das duas energias, Ying e Yang, cria umaunidade, cujos maiores inimigos so a surmenage, os desejosexcessivos e as emoes fortes.

    HIPCRATES de Cs (460a.C.),96 admitia no homem e nosanimais uma natureza que agia instintivamente, que fazia crescer enutrir todas as coisas vivas; admitia um princpio de ao, que seriaa alma, a qual atuaria atravs do crebro, sobre todo o organismo.

    HIPCRATES no separou fora vital da alma, ambasconstituindo-se, para ele, um s princpio. Dizia que a alma um

    sopro (pneuma), uma espcie de ter universal expandindo em todaa natureza, desempenhando as mais diversas funes necessriaspara a vida do corpo. Explica, porm, que esta diviso indicaria trsfunes principais de uma s alma, isto , a razo, a emoo e avida animal.

    ARISTTELES dizia que o essencial a todas as almas seria oprincpio da vida nos corpos naturais vivos. A alma este princpio

    interno, que a causa da vida. Todo aquele que possui uma alma um ser vivo. A alma para ele uma substncia e existem trs tipos

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    de substncias: a matria, a forma e o composto. Trata-se de saberde qual natureza a alma. Por matria, compreendiaARISTTELES,97 aquela que em si no determinada, que recebe oscontrrios e que no est seno em potncia. Por forma, aquilo que

    faz que um ser seja aquilo que e no outro. Por composto o corponatural, resultante da forma e da matria, o prprio animal. Suafilosofia predominou por muitos e com muitos seguidores ecompreende, por fim, a alma enquanto essncia, causa, como o fim.

    PLOTINO, da escola de Alexandria, ensinava que a vida idntica a alma; a alma tem por essncia a vida e d vida ao corpoque anima, possuindo a vida por si mesma.

    Santo AGOSTINHO dizia que a alma que pensa a mesma aImaque anima e adoece o corpo. Para ele o corpo no era uma priso daalma, mas seu instrumento.

    Na Idade Mdia, So TOMS DE AQUlNO, discutindo a unidadeou pluralidade da alma, opta por uma alma nica, racional eresponsvel tambm pela manuteno da vida e dos fenmenos

    vitais, reconhecendo tambm uma funo vivificante na mesma.Na Renascena, Paulus VENETUS admitia para o homem no

    somente duas almas, a sensvel, que corruptvel e a racio-nal,imortal, mas tambm vrias almas vegetativas presidindo sdiversas partes do corpo.

    J Theophrastus Bombastus Von HOHENHEIM, no sculo XVI,tambm conhecido como PARACELSO, admitia princpios ativos deorganizao e de vida expandidos dos elementos dos minerais e dosvegetais, esprito anima; ou arqueus nos animais. No homem, abaixoda alma racional, ele coloca um grande nmero de arqueus igual aonmero de rgos distintos e de funes particulares da vida. Para ogrande alquimista,98o homem deveria penetrar "nas foras invisveisque fazem atuar a matria visvel".

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    Iniciava-se o confronto entre o vitalismo e o cartesianismoracionalista a partir no apenas de conceitos, mas dI8 prpriosprincpios de investigao.

    VAN HELMONT, influenciado por PARACELSO, afirmou umaalma sensvel e perecvel semelhante a flama, que a cada instante seconsome e pode extinguir-se, governando o corpo. Elaborou umarqueu central presidindo a todo o organismo e secundariamentearqueus particulares que presidem a cada funo particular, atcerto ponto independentes.99

    Segundo Zohar e a Kabala, cujas doutrinas exerceriam ento uma

    certa influncia no pensamento da poca, o homem compreende-sede: um esprito, o grau mais elevado de seu ser; uma alma, sede dobem e do mal; e um esprito mais grosseiro imediatamente emrelao com o corpo e coordenando-o.100

    BACON e GASSENDI acreditavam no duplo dinamismo, ou seja,que alma racional do homem deve juntar-se uma segunda, denatureza inferior, para governar o corpo (comum aos animais

    inferiores).Descartes viu que a espiritualidade uma verdade de observao

    imediata, contida no seu aforismo: cogito, ergo sun. Para ele, dopensamento consciente em si mesmo que se faz a essncia da alma.Portanto, a alma no poderia fazer nada que no fosse pensar e queno constitusse apenas puro pensamento. Havia para o pensador,um fogo ou princpio animador, uma espcie de princpio ou fora

    vital mal definida, provavelmente propriedade da prpria matria.101

    Na filosofia moderna, LEIDNITZ foi talvez, com sua tese dasmnadas e harmonia preexistente, o maior animista. Para ele a almaera o princpio da vida e da organizao em seu sentido mais geral.A alma atuaria s pela sua presena como fora organizadora, comoatividade, como energia vital.102

    Foi STHL quem se encarregou de refutar LEIDNITZ, no emessncia, mas em sua forma de explicar o animismo. No admitia a

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    hiptese da harmonia pr-estabelecida, dando ampla liberdade deatuao alma sobre o corpo, atribuindo-lhe tambm, todos osmovimentos vitais, semimecanismos intermedirios. Combatiaviolentamente os iatroqumicos e anatomistas da poca, achando que

    a reduo do organismo nessas cincias no estava de acordo com aharmonia que deveria reinar na atuao da alma sobre o corpo.

    Enquanto DESCARTES abria o caminho ao mecanicismo e aoquimismo com suas idias, STHAL implantava, com nfase, oanimismo na Europa, principalmente na Alemanha. Por suainfluncia, floresceu no sculo XVIII a Escola de Montpellier. Seusmestres, SAUVAGE, GRIMAND e ROUSSEL, por volta de 1737atacaram o mecanicismo em voga, via cartesianismo e ampliaram osconceitos vitalistas, admitindo um outro princpio que no a almapara dirigir todas as nossas funes, unido ela, mas que nodesfruta de seus atributos.103

    Na verdade, a Escola de Montpellier, to influenciada por STHAL,acabou distanciando-se do grande mestre animista.

    Com BARTHEZ realizou-se um esforo mais completo para operaro desejado divrcio entre o animismo e o vitalismo. As idias deBARTHEZ constituram o smbolo mdico e filosfico da Escola deMontpellier. Segundo BARTHEZ, os atos atribudos a estas forasdiversas que atuam no organismo vivo, no so nem isolados, nemindependentes, nem encadeados uns aos outros de uma maneiranecessria; mas so regras, dirigidas, dispostas para um mesmo fim

    e seguindo as necessidades que nascem e que mudam a todos osmomentos. Estes depende pois, de uma causa essencialmentenica. A unidade, a individualidade do sistema, eis a grandecontribuio de BARTHEZ, a grande unidade do princpio vital: "...euchamo princpio vital. causa que produz todos os fenmenos da vidano corpo do homem".104 A polmica entre BARTHEZ e STHAL sesituou no ponto onde ele achava impossvel que o princpio vital

    fosse uma faculdade da alma.

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    Na Alemanha, HUFELAND e BLUMENBACH foram os maioresseguidores de BARTHEZ. FRJEDRICK, iniciador do Vitalismo alemo,dizia que o ser do homem era composto por uma alma espiritual,uma fora vital e um corpo material. E mais, que a vontade da alma

    s poderia atuar sobre o corpo por intermdio da fora vital.

    94 RIBEIRO, C.A.M. O Vitalismo. Rev. Similia, So Paulo, sld, 0.9.95 SAM, M. Tratado de Medicina Chinesa. Coquemard, Lisboa, 1957.96 DURANT, W. Histria da Civilizao. Companhia Editora Nacional, So Paulo, 1954.97 CASTIGLIONO, A. Histria da Medicina. Companhia Editora Nacional, So Paulo,

    1954.98 RUSSEL, B. Histria da Filosofia Ocidental. Companhia Editora Nacional, So Paulo,

    1977, 3 voI.99 CASTIGLIONO, A. op. cit.100 CASTIGLIONO, A. op. cit.101 RUSSEL, B. op. cit.102 RUSSEL, B. op. cit.103 CASTIGLIONO, A. op. cit.104 RUSSEL, B. op. cit.

    Theophrastus BombastusVon HOHENHEIMou

    PARACELSO(1493-1541)

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    HAHNEMANN E O VITALlSMO

    Surge no sculo XVIII a concepo da existncia de uma foravital renovadora do organismo. O Vitalismo toma novamente fora esua influncia no mundo das cincias se estender at o incio dosculo seguinte, chegando com sua concepo de fora vital biologia, medicina, filosofia e encontrando na figura deHAHNEMANN seu mais claro expoente. ele quem vai fazer doprincpio vital um sistema cientfico diferente, no especulativo, mas

    sim, baseado em experincias, pretensamente aplicando aoVitalismo o rigor cientfico que sua poca exigia.

    Pela anlise das escolas do passado, fica-se com a ntidaimpresso que HAHNEMANN inspirou-se em HIPCRATES e emBARTHEZ para conceber seu Vitalismo. Nos pargrafos do Organon,ele trata da fora vital, dando-nos precisos e prticos conceitossobre a mesma:

    "No estado de sade, a fora vital imaterial que dinamicamenteanima o corpo material, reina com poder ilimitado e mantm todasas suas partes em admirvel atividade harmnica, nas suassensaes e funes, de maneira que o esprito dotado de razoque reside em ns, possa livremente dispor deste instrumentovivo e so para atender os mais altos fins de nossa existncia105

    "O organismo material, destitudo de fora vital, no capaz denenhuma sensao, nenhuma atividade, nenhuma auto-conservao,...106

    "Quando o homem adoece, essa fora vital, imaterial, de atividadeprpria, presente em toda parte em seu organismo, a nica queinicialmente sofre a influncia dinmica hostil vida, de umagente morbgeno; somente o princpio vital, perturbao poruma anormalidade, que pode fornecer ao organismo sensaesdesagradveis e impel-lo, destarte. a atividades irregulares a quechamamos doenas...107

    "...O organismo , na verdade, o instrumento material da vida,no sendo porm concebvel sem a animao que lhe dada pelodinamismo instintivamente perceptor e regulador (fora vital),tanto quanto a fora vital no concebvel sem o organismo".108

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    HAHNEMANN por mais de 40 anos foi alvo de acusaes,perseguies e agresses. Por vrias vezes foi obrigado aaban-donar as cidades em que viveu. Seus ltimos dias sopassados na Frana, preocupado em divulgar suas idias, onde veio

    a falecer em 1843 aos 88 anos de idade.109 -110HAHNEMANN fundou e organizou novas dimenses de

    conhecimento e redefiniu a prtica mdica. Provocou reaesviolentas na medida que perturbou conhecimentos tidos comoverdadeiros e nicos, extrapolando, inclusive, a dimenso histricada disciplinarizao e servido da Cincia ao Estado, especialmenteno caso alemo e suas polcias" mdicas, como j tivemos

    oportunidade de discutir no incio do nosso trabalho.111

    Importante ressaltar que apenas na quinta edio de sua obra

    fundamental, Organon, que ele utilizar o termo Lebenskraft,foravital (1833), recusando vincular o Vitalismo sua obra por 39 anos(a primeira edio de Organon foi em 1810). A referida expressofoi utilizada pela primeira vez na Alemanha por UNGER, que seguiaSTAHL. At a quinta edio, portanto, HAHNEMANN pode ser

    considerado um dinamista (considera a vida como uma fora).

    Allan Kardec(1804-1869)

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    105 HAHNEMANN, S. Organon de la Medicina. Editorial Porma, Mxico, 1984,6" ed.,pargrafo 9.

    106HAHNEMANN, S. op. cit., pargrafo 10.107HAHNEMANN, S. op. cit., pargrafo 11.

    108HAHNEMANN, S. op. cit., pargrafo 15.109EISAYAGA, F.X. Tratado de Medicina Homeoptica. Ed. Manual, Argentina, 1972.110Segundo seus historiadores os nove ltimos anos foram os mais fecundos em termos

    de produo.111 Se na Frana o enfrentamento da questo da doena feito pela interveno no

    espao e higienizao das coisas, a face absolutista do Estado alemo implanta apoltica das polcias mdicas, cuja finalidade era exercer o poder em nome doEstado, afastando os doentes e controlando a vida das pessoas, doentes ou no.

    Ver ROSEN, G. e FOUCAULT, MicheI. op. cit.

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    VITALlSMO E KARDEC

    As trs primeiras dcadas do sculo XIX foram palco de intensaspolemizaes entre os adeptos tia escola vitalista, animista ematerialista, esta ltima j ento hegemnica, principalmente naFrana.

    A formao intelectual de Allan KARDEC, ainda o jovemprofessor RIVAIL, foi permeada por essa discusso. Sua polmicabiografia demonstra o quo ecltica foi sua formao.

    KARDEC trata, logo na Introduo de "O Livro dos Espritos", daalma, do princpio vital e do fluido vital, caracterizando qual oentendimento da Doutrina Esprita para cada um desses vocbulos,facilmente compreensvel aps a viagem histrica efetuada at aqui.Sua preocupao, como se viu, procedia. As divergncias deopinies no se prendiam questes lxicas. Avanavam, tomavam

    corpo e se chocavam em grandes contradies conceituais. Almapara KARDEC, como princpio da vida orgnica material, no tendoexistncia prpria e extinguindo-se com a vida, era inaceitvel:"puro materialismo, seria efeito e no causa".112Como variedade dopantesmo, ou seja, alma como poro de Deus, tambm inaceitvel.

    Para KARDEC a alma era o ser imaterial e individual que existeem ns e sobrevive ao corpo. E lana o conceito, ressaltamos, na

    introduo de sua obra bsica e fundamental, contra a polmica e oambiente hostil que o crculo intelectual apregoava sobre o princpiovital: "princpio da vida material e orgnica, qualquer que seja afonte donde promane, princpio este comum a todos os seres vivos,desde as plantas at o homem".113 Ele, a princpio, levantou duashipteses para explicar o princpio vital: como propriedade damatria ou residente em um fluido especial, universalmente

    espalhado e do qual cada ser a