AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC) Relatório de Estágio de Conclusão do Curso de Agronomia para a obtenção do título de Engenheiro Agrônomo. Orientador: Prof. Dr. Ademir A. Cazella Acadêmico: Marcos José de Abreu Florianópolis, Abril de 2006. ´

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Trabalho de Conclusão de Curso - Marcos José de Abreu, CCA/UFSC, 2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do

Campeche – Florianópolis (SC)

Relatório de Estágio de Conclusão do Curso de Agronomia para a obtenção do título de Engenheiro Agrônomo. Orientador: Prof. Dr. Ademir A. Cazella Acadêmico: Marcos José de Abreu

Florianópolis, Abril de 2006.

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AGRADECIMENTOS Agradeço por ter “la alegria de vivir ao cuerpo”, como diz “la chica Côco”. Por

minhas motivações, inquietudes e paixões. Também agradeço ao grande criador por

existir no meu coração e reger este universo. Ao inesperado, o novo, o verdadeiro, a

mudança e a busca pelo que de fato dá sentido a vida.

Aos meus pais, José e Ana, que com tanto trabalho, luta, dedicação e esmero

me geraram, cuidaram e fizeram-me crescer com valores simples, respeito e amor.

Às minhas irmãs, Joseana e Mariana, á Isabelinha por compartilharem suas vidas

comigo. E ainda agradeço aos meus familiares, que são dezenas, por contribuírem

na minha formação humana, pelo amor e por suas referências de vida.

Aos moradores da Praia das Areias, em especial ao Luiz e a Liu pela atenção

e carinho com esta comunidade.

A Grande família da Base do Morro das Pedras, Evandro, Rafa, Dani, Cainã,

Jú, Côco, Ágata e todas aquelas pessoas que passam por nossas vidas e as

constroem, dividem, somam e sempre deixam suas contribuições. Sem esquecer

dos Sacis e suas peripécias.

Ao pessoal do Cepagro, em especial ao Bagé e Luiz, que participaram muito

da minha vida e formação acadêmica, sendo exemplos de vida e trabalho pra mim.

Agradeço também a Cordélia, Inês, Prof Abdon, Liliam, e a galera do Pastoreio

Voisin..

Ao povo da Agricultura Urbana da AS-PTA e da Cidades Sem Fome, os

“rapazi” da Associação Orgânica e a família Harmonia Na Terra.

Aos companheiros da faculdade e da vida, Enrico, Júlio, Paulinho, Ogata,

Pedrão, Raoni, Tiaguinho, Carol, Hatsi, Rafaéis, Rodrigo, etc.. etc...etc... aqueles e

aquelas que participaram intensivamente em algum momento destes 5 anos e meio.

Pela atenção do Henrique da Inês e orientação do Kito neste trabalho.

À vida........

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ÍNDICE

1 – INTRODUÇÃO.......................................................................................................5 2 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.................................................................................8 2.1 – Contextualizando a Agricultura Urbana....................................................8 2.2 – Aspectos da Agricultura Urbana.............................................................10 2.3 – Metodologias de trabalho em Agricultura Urbana..................................12 3 – METODOLOGIA..................................................................................................17 3.1 – Como construímos um panorama sócio-econômico e Histórico da

Comunidade...............................................................................................................17 3.2 – Métodos utilizados para fazer a Pesquisa (Diagnóstico) e a formação do

Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura em Quintais..................................18 4 – RESULTADOS E DISCUSSÕES.........................................................................20 4.1 – Comunidade da Praia das Areias do Campeche: aspectos históricos,

sócio-econômicos, culturais e estruturais...................................................................20

4.2 – Principais elementos do diagnóstico sócio-econômico das famílias e

suas experiência em Agricultura Urbana....................................................................26 4.3 – Aspectos dos entrevistados que “NÃO” praticam Agricultura Urbana... 31 4.4 – Aspectos dos entrevistados que responderam que já praticaram

Agricultura Urbana, mas pararam..............................................................................34 4.5 – Aspectos dos entrevistados que responderam que fazem Agricultura

Urbana........................................................................................................................35 4.5.1 – Panorama da Agricultura Urbana demonstrado pelos

entrevistados..............................................................................................................36 4.5.2 – Manejo dos Quintais.................................................................39 a) Construção dos Canteiros......................................................39 b) Adubação...............................................................................40 c) Cobertura de solo...................................................................41 d) O solo dos quintais................................................................42 e) O uso da Água.......................................................................43 f) “Pragas” e “Doenças”..............................................................44

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g) Lixo doméstico.......................................................................45 4.6 – Aspectos do Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura em

Quintais......................................................................................................................46 5 – CONCLUSÕES....................................................................................................48 6 – REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................51 7 – ANEXOS..............................................................................................................55 Anexo I............................................................................................................55 Anexo II...........................................................................................................57 Anexo III..........................................................................................................61 Anexo IV..........................................................................................................65

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“ E a história humana não se desenrola apenas nos campos de batalhas e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola também nos quintais, entre plantas e galinhas, nas ruas dos subúrbios, nas casas de jogos, nos prostíbulos, nos colégios, nas usinas, nos namoros de esquinas. Disso eu quis fazer a minha poesia. Dessa matéria humilde e humilhada, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição a vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que não tem voz.” (Ferreira Gullar)

1. INTRODUÇÃO

Entre setembro e dezembro de 2005 foi realizado este Estágio de Conclusão

de Curso, sendo desempenhado as atividades através do Centro de Estudos e

Promoção da Agricultura de Grupo (Cepagro). Utilizando métodos de pesquisa-ação,

pretendíamos diagnosticar as diferentes práticas de agricultura urbana, bem como, a

estrutura social que envolve este tema na comunidade que faz parte da Associação

dos Moradores da Praia da Areias (AMPA), bairro Campeche, municípios de

Florianópolis/SC, com o propósito de empreender ações que promovam esse tipo de

agricultura de forma associada à princípios de preservação ambiental e segurança

alimentar.

Antecedendo este Estágio algumas ações e vivências construíram um

panorama da Agricultura Urbana na minha vida acadêmica. Primeiramente,

participamos de um trabalho prático na Comunidade da Praia das Areias do

Campeche, executado entre maio e dezembro de 2004, chamado de Agroecologia

Urbana. Esse trabalho contou com a participação do Cepagro, da Associação dos

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Moradores da Praia das Areias (AMPA), do Instituto Harmonia Na Terra1, da

Associação Orgânica2 e voluntários.

Através de um grupo de mães que participavam do Projeto Aplysia3 na

comunidade, demonstraram interesse em aprender a fazer pão integral. A partir

deste fato foi planejada e estruturada as estratégias de atuação nesta comunidade.

A Oficina do Pão foi tema gerador de discussões e propostas para outras atividades;

o local de encontros era a sede da AMPA e a demanda do grupo foi de se fazer

oficinas de pão integral e alimentação saudável, organização de um grupo de

produção para geração de renda e o trabalho denominado por elas de “Hortas

Caseiras”.

Nos encontros das Oficinas do Pão e das Hortas Caseiras participamos na

condição de responsável por este último tema. Assim, o projeto iniciou em maio com

discussões internas sobre a metodologia, as ações a desenvolver e a identificação

do local de implementação do projeto. Teve sua primeira atividade concreta em

agosto, junto à diretoria da Associação dos Moradores das Areias que aceitou ceder

o espaço físico para a discussão das atividades com a comunidade interessada e

para a realização das primeiras oficinas do pão. A partir de então foram realizadas

as seguintes atividades:

• 4 encontros na comunidade para divulgação, planejamento e avaliação

de atividades futuras;

• 6 Oficinas do pão, com uma participação média de 8 mulheres por

oficina;

• produzidos mais de 100 pães integrais e 20 tortas integrais de banana

e realizado demonstrações de receita e degustação de carne de soja;

• implantadas 3 hortas, sendo 2 nas residências de participantes da

Oficina do pão e 1 no quintal da AMPA. Esse trabalho foi realizado com

as crianças do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI).

1 OSCIP de Florianópolis que trabalha com Ecopedagogia, Educação Ambiental e trabalhos de geração de renda em comunidades. Atuou no Projeto promovendo um trabalho chamado de “Comunidade Viva”, revitalizando a AMPA. 2 Através de práticas em agricultura orgânica, diversos profissionais e produtores a compõe e praticam atividades como: certificação de produtos orgânicos, gerenciamento de resíduos sólidos, educação ambiental e produção de alimentos orgânicos. Contribuiu com o trabalho doando composto proveniente do trabalho desenvolvido junto ao CEASA/SC. 3 ONG que promove oficinas de Dança Contemporânea em comunidades periféricas de Florianópolis.

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• 1 oficina de brinquedos com material reciclável com as crianças do

PETI e um “teatrinho” com os bonecos elaborados na oficina.

• Plantio de árvores frutíferas no espaço da AMPA.

• Implantação de 2 composteiras para resíduos orgânicos na residência

de duas famílias participantes do projeto.

• Em parceria com o Instituto Harmonia Na Terra, realizamos a

recuperação da sede da AMPA, através do azulejamento da cozinha,

construção de um forno a lenha e recuperação da instalação elétrica da

sede.

• Realização de um trabalho contínuo de educação ambiental junto às

crianças que participam do PETI, através de diversas atividades como

caminhadas de observação, trabalhos em grupo, oficinas de

reciclagem, visitas a composteiras e atividades fora da comunidade e a

produção e consumo de produtos da horta.

Este trabalho motivou-nos em saber mais sobre a Agricultura Urbana, por

isso, durante os meses de julho e agosto de 2005 realizamos estágios extra-

curriculares na Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-

PTA), que desenvolve um projeto de agricultura urbana na cidade do Rio de Janeiro

há seis anos. Outro local de estágio foi junto à Prefeitura de São Paulo através da

organização Cidades Sem Fome4, onde tivemos a oportunidade de conhecer o

Projeto de Agricultura Urbana na Cidade de São Paulo executado durante o

mandato da ex-prefeita Marta Suplicy. Estes estágios extra-curriculares nos

motivaram a executar o estágio de conclusão de curso sobre o tema da Agricultura

Urbana na Comunidade da Praia das Areias do Campeche, adaptando e

aprimorando metodologias de trabalho utilizadas nas ações anteriores executadas

pelo Projeto Agroecologia Urbana.

Assim, esta etapa do estágio partiu do propósito de realizar um diagnóstico

socioeconômico das famílias desta comunidade, visando a promoção da Agricultura

Urbana e educação ambiental, através de métodos de pesquisa-ação. Sendo assim,

este trabalho apresenta três focos principais:

4 ONG formada por técnicos que trabalhavam no Programa de Agricultura Urbana da Cidade de São Paulo, despedidos formaram esta ONG para captar recursos com a finalidade da promoção da Agricultura Urbana.

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a) conhecer melhor a Comunidade da Praia das Areias, traçando um perfil

sócio-econômico e resgatar a História de formação desta comunidade, identificando

as pessoas que participam ou participaram de algum movimento social ou

comunitário;

b) Fazer um levantamento sobre agricultura urbana com seus moradores,

identificando as pessoas da comunidade que não praticam ou que já praticaram

Agricultura Urbana e pararam. Na forma quantitativa e qualitativa saber quem são as

pessoas que praticam agricultura em seus quintais, de que forma a praticam e quais

são suas motivações e limitações. Também procuramos conhecer das práticas de

agricultura em quintais através do manejo de solo, irrigação, adubação, controle de

pragas e doenças, espécies cultivadas, bem como, saber se os cultivos apresentam

significativos incrementos na renda familiar ou importância na segurança alimentar

destas famílias;

c) constituir um Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura em Quintais

nesta comunidade, convidando os entrevistados a participar deste Grupo para

tratarmos de assuntos temáticos como: compostagem, controle de pragas e

doenças, banco de sementes, agroecologia, economia solidária através de oficinas.

Também pretendemos fazer mutirões de trabalhos nos quintais dos envolvidos.

. Mas antes de discutirmos esses focos, apresentamos alguns elementos

referentes à agricultura urbana a partir de bibliografias e das experiências dos

estágios extra-curriculares mencionados acima.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 - Contextualizando a Agricultura Urbana Devido ao rápido crescimento das cidades no mundo, o interior e a periferia

das áreas urbanas executariam um papel cada vez mais importante na alimentação

de sua população. (FAO, 2005)

O crescimento da população no planeta nos próximos 30 anos estará

concentrado nas áreas urbanas dos países em desenvolvimento, isto significa que

em torno de 60% da população destes países viverão em cidades. Atualmente, a

agricultura em áreas urbanas e peri-urbanas proporcionam comida a cerca de

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700 milhões de moradores nas cidades, ou seja, um quarto da população urbana

mundial. (FAO, 2005)

Ainda segundo a FAO, a produção agrícola em cidades é um fenômeno

crescente no mundo, principalmente nos países em desenvolvimento, onde a

possibilidade de acesso aos alimentos é muito desigual e o sistema de

abastecimento inadequado. A FAO define agricultura urbana ou intra-urbana como

aquela referente ao cultivo dentro das cidades; já a agricultura peri-urbana como

sendo aquela praticada em unidades periféricas, no entorno das cidades. Ambas

são realizadas principalmente por ex-camponeses, trabalhadores da terra que,

devido ao êxodo rural, vieram para os centros urbanos em busca de emprego. Ao

produzir alimento para seu próprio consumo, esses moradores também reforçam sua

renda com a comercialização do excedente da colheita, proporcionando à

comunidade local maior acesso a alimentos de qualidade e a preços mais baixos.

Este debate conceitual sobre agricultura peri-urbana e intra-urbana é motivo

de muitas controvérsias, Mougeot (2000), em revisão de estudos de todo o mundo

sobre agricultura urbana, diz que os critérios utilizados para definir a "agricultura

intra-urbana" são: o número de habitantes; a densidade mínima; os limites oficiais da

cidade; os limites municipais da cidade; o uso agrícola da terra zonificada para outra

atividade; e a agricultura dentro da competência legal e regulamentar das

autoridades urbanas. Já para a agricultura peri-urbana, sua definição quanto ao local

é mais problemática. Os sítios peri-urbanos estão em contato mais próximo com as

áreas rurais e tendem a sofrer, no decorrer do tempo, mudanças agrícolas mais

profundas que os locais mais centrais e as partes construídas da cidade. Os autores

têm buscado traçar o limite externo da área peri-urbana, identificando por exemplo

as zonas urbanas, suburbanas e peri-urbanas com relação à sua porcentagem de

edificações, à infraestrutura viária e aos espaços abertos por km². Outros usam a

distância máxima entre o centro urbano e as áreas que podem abastecer, com bens

perecíveis, a cidade, de modo cotidiano; ou a área até a qual as pessoas que vivem

dentro dos limites administrativos da cidade podem deslocar-se para se dedicarem a

atividades agrícolas. O importante é que para estas definições foram analisados

estudos feitos a partir de casos conduzidos em grandes cidades, freqüentemente

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capitais nacionais ou de províncias/estados e, portanto, que não se confunde com a

agricultura localizada em áreas rurais típicas dos países.

Na busca de uma definição para estes conceitos afino minhas inclinações

conceituais com a revisão feita por Monteiro, Mendonça e Silva (2004) que propõe o

conceito dado por Mougeot (2000), dizendo que “a agricultura urbana se situa dentro

(intra) ou na periferia (peri) de um povoado, uma cidade ou uma metrópole, e cultiva

ou cria, processa e distribui uma diversidade de produtos alimentares e não

alimentares, (re)utilizando em grande medida recursos humanos e materiais,

produtos e serviços que se encontram dentro e ao redor dessa zona, e por sua vez

provê recursos humanos e materiais, produtos e serviços em grande parte a essa

mesma zona”.

2.2. – Aspectos da Agricultura Urbana Segundo Roese (2005), o principal aspecto no qual a agricultura

urbana difere da rural, no entanto, é o ambiente. A agricultura urbana pode ser

realizada em qualquer ambiente intra-urbano ou peri-urbano, podendo ser praticada

diretamente no solo, em canteiros suspensos, em vasos, ou onde a criatividade

sugerir. Qualquer área disponível pode ser aproveitada, desde um vaso dentro de

um apartamento até extensas áreas de terra, sob luz natural ou artificial. Exige, no

entanto, alguns cuidados especiais, como sombreamento parcial, especialmente

para a formação de mudas e onde ocorra alto insolação, e irrigação cuidadosa e

freqüente. Desta forma o autor fala que existem muitas maneiras e motivos para se

praticar a agricultura urbana, e diversas vantagens podem ser obtidas através dessa

prática, dentre elas citamos as mais comumente observadas: produção de

alimentos, reciclagem de lixo, utilização racional de espaços, educação ambiental,

desenvolvimento humano, segurança alimentar, desenvolvimento local, recreação e

lazer, farmácias caseiras, formação de micro-climas e manutenção da

biodiversidade, escoamento de águas das chuvas, embelezamento dos ambientes,

diminuição da pobreza, atividade ocupacional e aumento da renda. Todos estes são

conseqüências e características de práticas em Agricultura Urbana citadas pelo

autor.

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Desta forma percebemos que a Agricultura Urbana desempenha múltiplas

funções além da produção de alimentos. Em diversos estudos no mundo observa-se

que esta prática proporciona aumento na qualidade de vida, segurança alimentar,

benefícios ambientais, desenvolvimento local, organização e perspectivas através do

aumento da auto-estima dos praticantes.

Como relata Almeida (2004, p.26), “o uso produtivo de áreas urbanas

proporciona a limpeza destas áreas e uma melhoria considerável ao ambiente local,

diminuindo a proliferação de vetores de doenças. Muitos materiais como

embalagens, pneus e entulhos, também são utilizados para a contensão de

pequenas encostas e canteiros. Os resíduos orgânicos domiciliares são

aproveitados na produção de composto empregado nas atividades de agricultura

urbana”.

Em pesquisa realizada com moradores da periferia do Rio de Janeiro

Monteiro, Mendonça e Silva (2004) dizem que as agriculturas desenvolvidas no meio

urbano tendem a ser diversificadas, com cultivos de diversas espécies numa mesma

área, como estratégia de maximização dos pequenos espaços disponíveis...”, e

complementam dizendo, “além disso, muitas vezes são cultivadas espécies e

variedades não encontradas facilmente nos mercados, reflexos de hábitos culturais

trazidos de outras regiões e mantidos no meio urbano. Esta citação é mencionada

para percebermos como a Agricultura Urbana também promove agrobiodiversidade,

bem como, mantém práticas que justificam um verdadeiro resgate cultural através do

cultivo de determinadas plantas e seus respectivos consumos, que de certa forma,

contribuem para uma soberania cultural através da manutenção de seus costumes e

hábitos apesar de estarem fora de seus locais de origem.

A Agricultura Urbana, desenvolvida de forma planejada, promove diversas

melhorias nas estruturas sociais de uma região, pois favorece o diálogo e a

integração familiar, assim como, estimula o trabalho comunitário e coletivo, além de

ser um trabalho recreativo e útil como afirma (SIAU & YURJEVIC,1993). Ainda neste

fluxo de reflexão, Dias (s.d) relata experiências, através de trabalhos realizados na

zona leste de Belo Horizonte, de aumento significativo da saúde física e mental de

famílias pelo fato de estarem em contato com as plantas e o que isso traz como

valorização em saúde mental e espiritual, proporcionado através da fonte energética

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que é a terra. Dias (s.d.) também fala que outro aspecto relevante é a potencialidade

dos quintais em estar gerando uma economia familiar, dispensando as compras

feitas em sacolões, e com a garantia do consumo de alimentos isentos de

agrotóxicos e coliformes fecais. Além dessa economia familiar, alguns quintais,

principalmente os de maior tamanho, podem se tornar fonte de geração de renda

pela venda dos alimentos excedentes ao consumo das famílias. Estes autores

mostram que a Agricultura Urbana é realmente fonte de desenvolvimento seja para

uma região através de mudanças significativas numa comunidade, numa família por

melhores condições de relacionamentos e econômicas ou individuais através de

percepções de valores espirituais e emocionais.

Sendo assim, a Agricultura Urbana, se praticada sem a utilização de

Agrotóxicos para o controle de “pragas e doenças”, não utilizando de adubos

químicos sintéticos, pode ser considerada uma prática Agroecológica, como define

Altieri (2002, p.26) “a Agroecologia geralmente representa uma abordagem agrícola

que incorpora cuidados especiais relativos ao ambiente, assim como os problemas

sociais, enfocando não somente a produção, mas também a sustentabilidade

ecológica do sistema de produção.”

2.3 – Metodologias de trabalho em Agricultura Urbana Ao estudar este tema percebemos que existem diversas experiências

acontecendo em vários lugares de todo o mundo, principalmente em países em

desenvolvimento, como menciona a FAO. Países desenvolvidos também

apresentam projetos de Agricultura Urbana, mas a Ilha de Cuba é a expoente

máxima, com seu Projeto de Agricultura Urbana. Isto acontece devido sua estrutura

política e social, bem como, suas limitações comerciais e o histórico de seu modelo

de agricultura.

“Desde os anos 50 a agricultura cubana havia se modernizado e os

monocultivos de exportação tinham maior importância que a produção de alimentos.

Além disso, os métodos de produção dependiam de insumos e matérias primas

importadas, e muitos componentes dos produtos agrícolas eram importados o que

intensificava a dependência das importações” Aquino (2002, p.08).

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Com o forte bloqueio econômico dos Estados Unidos, o desmantelamento da

União Soviética, com que mantinha 85% de seu intercambio comercial, e com a

queda do socialismo em outros países, no final de 1989 e início de 1990, Cuba

apresenta-se numa situação de não dispor de recursos energéticos suficientes e

nem capital abundante. Devido a estes fatos ocasiona-se uma crise generalizada.

Em 1991 os cubanos tiveram um marco na sua História que chamaram de “Período

especial em tempos de paz” e segundo Aquino (2002), neste período o governo

cubano começou a somar forças para estudar saídas da crise que o país vivia, desta

forma chamaram pesquisadores do INIFAT (Instituto de Investigaciones

Fundamentales em Agricultura Tropical) que já realizavam pesquisas com substratos

orgânicos para a produção agrícola e em 1994 com a produção de hortaliças,

mediante um movimento de popularização, incorporando grandes massas da

população para produzir alimentos em cada m² das cidades e assentamentos

populacionais, utilizando o máximo dos recursos territoriais, com princípios de

agricultura sustentável, objetivando reduzir a cadeia fundamental de produção e

comercialização.

Antes desta revolução da Agricultura Cubana, a produção de hortaliças em

Cuba era de 4.200t/ha por ano, isto é, 1g per capta de hortaliças diárias, quando a

recomendação da FAO é de no mínimo 300g por dia. Conforme o Gráfico 1,

percebemos o impacto na produção de hortaliças e condimento após esta medida

que culminou na criação do GNAU (Grupo Nacional de Agricultura Urbana de Cuba). Gráfico 1: Impacto da Agricultura Urbana na produção de hortaliças e

condimentos frescos.

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Fonte: Aquino (2002, p.12).

O movimento da Agricultura Urbana em Cuba, dirigido pelo GNAU é

altamente organizado hierarquicamente, apoiado por todos os setores envolvidos na

produção de alimentos executa suas atividades através de diferentes subprogramas

que são: 12 cultivos, 7 de pecuária e 9 de apoio. Os subprogramas englobam temas

específicos como a produção de hortaliças, plantas medicinais, condimentos, plantas

ornamentais, frutíferas, arroz popular, café, cacau, banana popular, raízes e

tubérculos tropicais, oleaginosas, feijões, milho, sorgo, criação de animais (galinhas,

coelhos, caprinos, porcos, abelhas e peixes) que desenvolvem em todo o país.

No Brasil podemos verificar que existem vários projetos de Agricultura Urbana

acontecendo como em: Minas Gerais, Belém, São Paulo, Curitiba, Rio Grande do

Sul, Recife, Florianópolis, entre outros. Neste relatório citaremos as experiências

vividas através de estágios em três diferentes instituições com diferentes

metodologias de trabalho em Agricultura Urbana.

Inicialmente mostraremos o trabalho da AS-PTA, desenvolvido na cidade do

Rio de Janeiro, tendo como prioridade os quintais urbanos e eventualmente

trabalhos com hortas coletivas ou comunitárias. Embasados no que diz Monteiro e

Mendonça (2004), técnicos deste projeto, dizem que quando é abordado o tema da

agricultura na cidade, é comum a imediata referência às hortas comunitárias. De

fato, muitos projetos de incentivo às práticas agrícolas no meio urbano utilizam a

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001

4,2 16 58 140

480

876

1680

2360

0

500

1000

1500

2000

2500

1 2 3 4 5 6 7 8

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nela

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lógica da promoção exclusiva de hortas comunitárias. Isso ocorre porque, em

primeiro lugar, a palavra horta é entendida como sinônimo de hortaliças em

canteiros, o que exclui de antemão diversas possibilidades de aproveitamento

produtivo integrado dos espaços urbanos, como a utilização de árvores frutíferas, o

plantio em recipientes (potes, vasos, etc.) e a criação de animais. A perspectiva

agroecológica, por outro lado, não restringe o olhar a um sistema padronizado de

produção, com espécies predefinidas, mas procura incorporar ampla diversidade às

condições específicas de cada espaço disponível. Outro aspecto se refere ao caráter

comunitário. Na prática, ocorrem poucas experiências espontâneas deste tipo e,

além disso, existem outras formas de trabalho cooperativo e de socialização de

informações, como mutirões, os bancos de sementes, os encontros formais e

informais, etc. A horta comunitária, portanto, deve ser vista como mais uma das

possibilidades, que demanda certo grau de organização e mobilização e não tida

como fórmula única.

Madaleno (2002), em pesquisa sobre a agricultura intraurbana em Belém,

identificou que os quintais domésticos são os espaços predominantes. Na pesquisa,

cerca de 71% dos entrevistados cultivam lotes adquiridos legalmente, 20% são

ocupações ilegais, em terras públicas ou privadas e os demais se valem de espaços

emprestados. A pesquisa mostrou ainda que a maioria das iniciativas de agricultura

nos espaços intraurbanos é realizada por mulheres.

Segundo Monteiro, Mendonça e Silva (2004), a partir da análise do Programa

de Agricultura Urbana desenvolvido pela Assessoria e Serviços a Projetos em

agricultura Alternativa (AS-PTA), na Zona Oeste do Rio de Janeiro, a agricultura

praticada nos espaços urbanos (intraurbana) convive com diversas outras atividades

econômicas, e geralmente é ocupação de tempo parcial, escapando, na maioria dos

casos, das estatísticas oficiais. Quanto aos espaços em que é praticada, tipicamente

são áreas menores e mais dispersas do que no meio rural. São relevantes os

pequenos espaços domésticos (quintais) - algumas vezes sem disponibilidade de

solo - e comunitários, sendo freqüente a insegurança com relação à posse ou

usufruto da terra, com mecanismos variados com relação a essa questão. A falta de

espaço disponível é uma das principais limitações identificadas para a prática da

agricultura nos espaços urbanos.

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Este Programa de agricultura urbana desenvolvido pela AS-PTA é executado

através de parcerias com outras organizações, entidades e movimentos sociais

populares que possibilitam uma maior credibilidade e base de apoio nas

comunidades. Ou seja, existe um respaldo de que já executam atividades

comunitárias há algum tempo. Estas entidades são: a Prefeitura do Rio de Janeiro,

Rede Fitovida, Pastoral da Criança e da Saúde, Associações de Moradores e

Igrejas. Organizando suas atividades e ações conjuntamente com estas instituições,

seu foco de trabalho é sempre a formação de grupos, nunca trabalhos com

indivíduos isoladamente.

Estes grupos passam por formações e trocas de experiências temáticas,

como: farmácias caseiras, banco de sementes, compostagem, educação ambiental

com crianças, entre outras atividades. Para uma melhor compreensão da realidade

de onde estão inseridos costumam fazer diagnósticos participativos e pesquisas

para traçarem um perfil dos participantes. (ver fotos desse programa, em anexo).

Em cidades como São Paulo, as hortas urbanas têm sido alternativa para

uma alimentação mais saudável e barata. Locais como a Avenida Radial Leste, uma

das mais movimentadas da capital paulista, abrigam hortas que alimentam dezenas

de famílias de baixa renda. Essa atividade está prevista, também, no Plano Diretor

do município, pois, além de combater a fome e promover a inclusão social, contribui

para a melhoria das condições ambientais, possibilitando a ocupação de terrenos

vazios, que ao invés de acumular mato e lixo, são tratados e cultivados, fornecendo

alimento fresco e sem agrotóxicos. A lei permite redução do Imposto Predial e

Territorial Urbano (IPTU) aos donos dos locais escolhidos, e estimula a formação de

cooperativas de agricultores das hortas urbanas e a venda dos produtos cultivados

de forma orgânica, ou seja, sem o uso de agrotóxicos e demais insumos sintéticos.

(FOME ZERO, 2005)

Esta, na verdade, é uma outra metodologia de trabalho onde o poder público

está diretamente participando das decisões. Neste caso a Prefeitura de São Paulo

na Gestão da ex-Prefeita Marta Suplicy criou uma Secretaria de Agricultura Urbana,

a partir de intercâmbios e formações em projetos de Agricultura Urbana em Cuba.

Com isto, parte do orçamento municipal foi alocado para estas atividades. A

metodologia utilizada tem como foco as hortas comunitárias para o trabalho de

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17

Agricultura Urbana, formação de cooperativas de agricultores urbanos e sistemas de

comercialização. O procedimento acontecia da seguinte forma: inicialmente

escolhiam um terreno baldio preferencialmente público; se for particular se negocia

sua regularidade com o IPTU. Posteriormente inicia-se a limpeza do terreno,

retirando lixo, entulhos, capinando e até mesmo passando máquinas de

terraplanagem; O segundo passo consiste em cercar o terreno com muros ou telas,

em seguida convoca-se a comunidade para a formação da cooperativa de

agricultores urbanos; a partir disso promove-se cursos de agricultura urbana e

acompanha-se tecnicamente este grupo. Em alguns casos estes grupos já existiam

para outras finalidades, como por exemplo: grupos de mães que recebiam

benefícios da Prefeitura, ou grupos que trabalhavam com agricultura em terrenos da

igreja, ou outras instituições. Além de receber acompanhamento técnico, os

membros dos grupos têm acesso aos materiais para o trabalho, mudas e terra

adubada, que neste caso era cama de aviário proveniente de áreas próximas do

município de São Paulo. No período em que estivemos fazendo estágio neste

programa o governo da Marta Suplicy havia encerrado e o programa havia sido

abandonado na maior parte dos locais. Em apenas dois lugares dos tantos visitados

haviam atividades sendo desenvolvidas. Em anexo, apresenta-se fotos ilustrativas

dessa iniciativa pública.

Em Florianópolis, durante o período de maio a dezembro de 2004, o Centro

de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo desenvolveu o projeto chamado de

Agroecologia Urbana que teve como objetivo principal a divulgação de idéias da

agroecologia no meio urbano, a utilização de espaços/quintais urbanos para a

produção de alimento, bem como a criação de possibilidades de geração de renda

através da elaboração de produtos ecológicos como o pão e as tortas integrais,

artesanato ou outros produtos que possam ser produzidos de forma ética, solidária e

ecológica (Cepagro, 2004). Numa fase inicial, e tendo em conta os escassos

recursos financeiros, optou-se por realizar Oficinas de produção de pão integral e

Oficinas de hortas caseiras, assim denominados, como forma de aproximação e

discussão na comunidade.

3. METODOLOGIA

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18

3.1 – Como construímos um panorama sócio econômico e Histórico da Comunidade.

Este trabalho de conclusão de curso inicia-se após praticamente um ano do

Projeto Agroecologia Urbana desenvolvido pelo Cepagro nesta comunidade.

Portanto, para estar mais próximo das estruturas que compõe o universo desta

comunidade procuramos a Direção da Associação dos Moradores da Praia das

Areias com o objetivo de apresentar o projeto deste estágio de conclusão de curso

e identificar outras pesquisas já realizadas na comunidade. Uma reunião com a

diretoria da AMPA representou o marco inicial das atividades.

O segundo passo do trabalho foi resgatar um pouco do que já havia sido

empreendido na comunidade em etapas anteriores e que tivesse alguma relação

com este tema, como o Projeto Agroecologia Urbana, por exemplo. Isto se deu

através da preparação e realização do que chamamos de “Encontro de Um ano Pós-

Projeto Agroecologia Urbana”, convidamos todas as pessoas que participaram deste

Projeto como os moradores, equipe técnica do Cepagro e lideranças da

comunidade. A participação foi pequena com 10 pessoas e na oportunidade foi

discutido sobre a pesquisa que seria realizada na comunidade, pelo estágio de

conclusão de curso, através do Questionário: Diagnóstico – Agricultura Urbana na

Comunidade da Praia das Areias (em Anexo). Este momento serviu também para

avaliarmos um pouco da importância e conseqüências nas vidas destas pessoas

que participaram do Projeto Agroecologia Urbana desenvolvido há um ano.

Na busca do envolvimento comunitário tentamos inserir outros segmentos da

comunidade na execução da pesquisa, bem como, otimizar o tempo de pesquisa e

facilitar a obtenção de respostas fidedignas a partir da proximidade existente entre o

pesquisador e o entrevistado. Este envolvimento foi através dos jovens que fazem

parte do Projeto Agente Jovem da Prefeitura Municipal de Florianópolis. Seis jovens

entre 15 e 17 anos de idade que, num primeiro momento, receberam uma

capacitação para a aplicação do questionário (em anexo) e, num segundo momento,

aplicaram os questionários junto às famílias. Note-se que no decorrer do processo,

surgiu a proposta desses jovens executarem essa tarefa sob a coordenação da

Associação dos Moradores da Praia das Areias. Deste modo, os jovens dedicaram-

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19

se exclusivamente ao trabalho deste questionário proposto pela AMPA. Dados desta

pesquisa foram utilizados para este trabalho.

3.2 – Métodos utilizados para fazer a Pesquisa (Diagnóstico) e a formação do Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura em Quintais

Com a ajuda de três estudantes do curso de agronomia da UFSC, que já

estavam inseridos nesta comunidade através de outras atividades, 60 questionários

foram aplicados num espaço de tempo de um mês. Utilizando um método onde cada

entrevistador era responsável por determinadas ruas da comunidade preencheu-se

os questionários sempre que houvesse algum morador apto a respondê-lo. Deste

modo foram pesquisados aproximadamente 50% das residências da Comunidade da

Praia das Areias, sendo satisfatório para levantar informações sociais e econômicas

das famílias e criar um panorama da Agricultura Urbana nesta comunidade.

Os objetivos principais do questionário são: conhecer aspectos

socioeconômicos dos(as) moradores(as); saber se os moradores já fizeram algum

tipo de cultivo (agricultura) no quintal, se continuam ou se pararam e porque o

fizeram; saber se o entrevistado(a) havia participado ou ainda participa de algum

movimento social ou mantém algum envolvimento de cunho comunitário. Entre os

que responderam que continuam fazendo agricultura urbana, uma série de

perguntas foram feitos para desenharmos um panorama destas práticas na

comunidade. As questões nessa área tiveram como objetivo explorar os seguintes

aspectos:

• As práticas de agricultura urbana são relevantes no contexto familiar,

contribuindo especialmente na alimentação destas pessoas? Além da

alimentação, que outra(s) importância(s) é/são atribuída(s) à prática de

cultivos em quintais?

• Quais são as motivações que levam as pessoas a essas práticas?

• Quais os fatores limitantes a essas práticas (materiais, conhecimento,

motivação, espaço físico, etc.)?

• Que tipos de cultivos/práticas e estratégias de ocupação dos espaços

são adotados pelos moradores?

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20

• Conhecer o que estes moradores plantam através de grupos de

espécies como frutíferas, ornamentais ou hortaliças.

• Qual a relação destes moradores com o lixo gerado nas suas

residências.

Outro importante aspecto do questionário foi o de perceber o interesse dos

moradores em participar do que chamamos de “primeiro encontro de trocas de

experiência em agricultura em quintais”. Além de convidá-los para esse evento se

identificou os melhores dias e horários para esta prática. No próprio questionário da

pesquisa existem algumas perguntas destinadas ao interesse e disponibilidade da

formação deste grupo de trocas de experiências, inclusive com um chamado para o

primeiro encontro deste grupo. Este chamado acontecia no momento da entrevista

com os moradores.

A proposta metodológica consistia em planejar, após este primeiro encontro,

uma agenda de encontros e atividades, onde o objetivo seria a realização de

mutirões de trabalho nos quintais, encontros técnico/teórico sobre agroecologia,

compostagem, manejo de solo, práticas alternativas de controle de pragas e

doenças, economia solidária e plantas medicinais. Sem nenhum recurso financeiro

para custear essas ações contamos somente com o interesse pelo tema, bem como

em fortalecer as bases comunitárias de organização.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES 4.1 – Comunidade da Praia das Areias do Campeche: aspectos

históricos, sócio-econômicos, culturais e estruturais A população de Florianópolis passou de 138.337 habitantes em 1970 para

342.315 em 2000. Verifica-se, portanto, que em 30 anos a população quase que

triplicou, prejudicando, principalmente, as pessoas com baixa renda e pouca

qualificação profissional que acabam sentindo, com maior intensidade, os problemas

de saneamento básico5, acesso aos serviços de saúde, carência alimentar, violência

urbana entre outros problemas. A cidade de Florianópolis, apesar de ostentar o título

5 Somente 32,79% do esgoto é tratado e 2,18% do lixo é coletado de maneira seletiva (Prefeitura Municipal de Florianópolis).

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21

de capital com melhor qualidade de vida do Brasil, esconde um conjunto de mais de

50 favelas onde vivem cerca de 10% da população6, texto extraído do Projeto

enviado para Miserior (Cepagro, 2004)

A Comunidade onde se realizou esta etapa do estágio está localizada no sul

da ilha de Santa Catarina, entre os bairros Campeche e Morro das Pedras,

conhecida popularmente como Areias do Campeche. O acesso ao se dá através da

Rua Francisco Vieira, que se situa a 100 metros do Trevo do Erasmo, bifurcação da

SC-405, que dá acesso aos bairros Ribeirão da Ilha e Morro das Pedras. Situada a

100 metros da Praia do Campeche, junto à faixa de dunas de areia. Os moradores

denominam o local onde residem de Praia das Areias. O aglomerado residencial principal ocupa uma área de 29.000 m²,

relativamente plana (declividade média de aproximadamente 4%), cuja altitude varia

entre 5 e 10 metros. Apenas na faixa voltada para as dunas existem trechos com

declividades acentuadas (em torno de 20%). É nesta faixa que ocorrem os pontos

mais elevados e os mais baixos do sítio. A intensa ocupação das dunas limítrofes

impede que se tenha visuais diretos para o mar a partir das residências. A inserção

das mesmas numa área litorânea de relevo pouco acidentado, permite uma boa

captação dos ventos, configurando um microclima adequado para o uso

habitacional.

Para uma melhor compreensão das relações sociais existentes entre esta

Comunidade (expressão que passamos a utilizar como referência à área em estudo)

e seu entorno levantamos os pontos orientadores e sua ocupação: Ao sul existem condomínios horizontais de padrão elevado, que se estendem

até a praia. O condomínio voltado para a Rua Francisco Vieira – Village das Azaléias

– possui um muro alto em toda a sua extensão, impedindo as relações entre os

moradores das duas áreas residenciais. A maioria das casas destes condomínios

fica fechada fora da temporada, servindo apenas para o veraneio de seus

proprietários.

6 O critério utilizado neste estudo realizado pela Prefeitura Municipal, baseia-se nos padrões determinados pelo Instituto de Administração Municipal (Ibam), que considera favela local onde há deficiência de infra-estrutura que comprometa a qualidade de vida dos moradores, precariedade de habitação e renda familiar inferior a três salários mínimos, entre outros aspectos.

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No lado oeste foi implantado há pouco mais de um ano um grande loteamento

destinado à classe média. Até o momento, poucas residências foram construídas.

Os lotes limítrofes têm seus fundos voltados para a Rua dos Eucaliptos, o que não

favorece a relação entre os moradores da comunidade e do novo loteamento. O

bairro Castanheira, mais a oeste, é composto por vários loteamentos compridos e

estreitos, ocupados em geral por classe média. Os moradores deste bairro

praticamente não se relacionam com a comunidade em questão. Ao norte, há um amplo terreno desocupado destinado à área verde do

loteamento recém implantado a oeste. Até pouco tempo atrás, este terreno era

aproveitado pelos moradores da comunidade para atividades esportivas e

comunitárias, porém a colocação de cercas de arame farpado impediu a

continuidade destes usos. A leste, encontram-se as dunas da Praia do Campeche, intensamente

ocupadas por residências de veraneio de padrão elevado e também por residências

precárias. As dunas estão entre a Comunidade e o mar. A população que freqüenta

aquela praia se restringe aos moradores locais e surfistas, pois o mar ali é muito

agitado. O mar é utilizado pela comunidade do assentamento tanto para o lazer no

verão, quanto para a pesca, servindo assim como fonte de alimento. Sobre a história desta comunidade, faremos um resgate desde o uso inicial

destas terras que originariamente integravam uma vasta área de reflorestamento de

espécies exóticas -pinnus e eucaliptos-, de propriedade do Governo do Estado de

Santa Catarina. Há algumas décadas, uma grande área deste reflorestamento

passou para a propriedade de um particular, incluindo toda a área da Comunidade e

do loteamento vizinho recém implantado.

A ocupação do terreno pela população de baixa renda se iniciou nos anos

1980, quando surgiram as primeiras casas, bastante precárias. Desde então, uma

série de intervenções sociais e judiciais aconteceram, seguidos de uma forte

mobilização social desta Comunidade. A seguir apresentamos alguns momentos

marcantes desse processo de ocupação da área:

• A Prefeitura Municipal, através da Divisão de Ação Comunitária,

começou a atuar na Comunidade em 1991, época em que fez o

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23

primeiro cadastramento dos moradores, registrando um total de 104

famílias;

• No mesmo período, o proprietário do terreno havia acionado a Justiça

para requisitar a reintegração de posse;

Como relata uma matéria publicada no Jornal Diário Catarinense de 18/08/94:

“O prefeito de Florianópolis, Sérgio Grando (PPS), anunciou ontem a

desapropriação de uma área localizada na Rua dos Eucaliptos... para o

assentamento definitivo de 80 famílias. O terreno é reivindicado pelo advogado

Henrique Berenhausen, que em 1986 entrou com processo de reintegração de

posse, alegando invasão clandestina no local. Ontem de manhã, por decisão judicial,

oficiais da Justiça iriam executar o despejo das famílias...”;

No dia seguinte, o Jornal “O ESTADO” noticiou o assunto da seguinte forma:

... “Durante toda a manhã de ontem, mais de 100 pessoas permaneceram no

auditório da prefeitura aguardando a assinatura do decreto. ... Depois da tentativa

frustrada de reintegração de posse, na última terça-feira, o prefeito Sérgio Grando

havia garantido aos moradores que desapropriaria o terreno. Acontece que o

proprietário do terreno apresentou uma nova proposta que transferiria as famílias

para uma área sem infra-estrutura. O caso foi estudado por técnicos da prefeitura e

a decisão sairá hoje. O presidente da Associação de Moradores, Marta Reis,

garantiu que as famílias estão dispostas a pagarem seus lotes para a prefeitura,

caso saia a desapropriação. ‘Pagaremos duas vezes pelo lugar, já que todos que

moram lá, compraram o terreno e têm escritura de posse’, frisou.”

A desapropriação da área em litígio só se efetivou em março do ano seguinte,

através do Decreto Municipal nº 85/95, destinando-a para o assentamento das

famílias carentes que ali moravam. Esta grande conquista dos moradores só foi

possível graças ao seu engajamento para fazer pressão junto à prefeitura, para não

serem expulsos do local.

Mesmo com a desapropriação, nem todas as famílias conseguiram manter as

suas casas. Isto ocorreu porque algumas moradias se localizavam fora dos limites

da área desapropriada. O Jornal “O ESTADO” de 23/05/95 noticiou a demolição de

residências no local:

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“A Prefeitura de Florianópolis determinou, ontem pela manhã, a demolição de

aproximadamente 20 casas construídas ilegalmente no terreno de propriedade de

Henrique Berenhausen na Praia do Campeche. Algumas das famílias desalojadas

foram transferidas para o terreno que a prefeitura desapropriou do próprio

Berenhausen no começo deste ano. ... A força policial presente à ação de demolição

– quase 100 homens – foi justificada como ‘de rotina’. Todas as famílias já haviam

sido avisadas da demolição, a tempo de retirarem os móveis dos interiores das

casas. ... A ação demolitória de ontem transcorreu sem qualquer incidente. A única

dificuldade foi causada pela qualidade de algumas casas, construídas de alvenaria.

... A Prefeitura agora concentra esforços para a realização do projeto de

urbanização, concebido ao mesmo tempo em que a desapropriação era feita. A

intenção é oferecer toda a infra-estrutura às famílias assentadas. ...”

Mais uma vez, a comunidade demonstrou união e solidariedade, empenhando

agora esforços coletivos para construir novas casas, nos vazios existentes no interior

da área desapropriada, para abrigar as famílias que foram alvo da demolição.

Nesta época, às pressas, os moradores fizeram a redemarcação dos lotes,

atribuindo a cada família um lote entre 180 e 220 m². Nenhuma das casas existentes

dentro dos limites da desapropriação foi demolida. Não houve sorteio dos lotes; cada

família escolhia o lote onde iria construir a sua casa. Em algumas casas, residiam

várias famílias de parentes. Mesmo assim, sobraram alguns lotes, que

posteriormente foram destinados pela prefeitura a famílias que residiam em áreas

ocupadas no continente.

Os moradores entrevistados relataram que nesse período não havia

abastecimento público de água; a energia elétrica era obtida clandestinamente; o

local era esconderijo de bandidos, sendo visto até hoje pelas comunidades vizinhas

como uma área marginalizada, denominada de favela.

Depois de garantida a permanência no local, a luta da comunidade

prosseguiu, desta vez para conseguir a implantação da infra-estrutura urbana. A

Associação de Moradores da localidade conseguiu organizar uma equipe de

técnicos voluntários para elaborar um projeto de urbanização da área. Porém, essa

equipe não chegou a desenvolver o projeto, frustrando os anseios da população.

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25

O poder de mobilização da comunidade também se fez notar através da sua

atuação no orçamento participativo de 1996, no qual foram destinadas verbas para a

urbanização e construção de moradias populares nas Areias do Campeche. Porém,

o governo federal não enviou a verba destinada a estes projetos, deixando a

comunidade mais uma vez frustrada e desmotivada.

Apenas recentemente, surgiram novas perspectivas de que a Comunidade

seria alvo de um projeto de urbanização, através do convite dirigido pela prefeitura

municipal, através da sua Secretaria da Saúde e Desenvolvimento Social, à

Universidade Federal de Santa Catarina (Departamento de Arquitetura e Urbanismo/

Grupo de Estudos da Habitação e Departamento de Engenharia Civil) para

estabelecerem uma parceria entre as duas instituições e a Associação dos

Moradores da Praia das Areias.

Atualmente cerca de 120 famílias residem no assentamento da Praia das

Areias. Trata-se de uma população heterogênea, com acentuadas diferenças quanto

à origem, nível socioeconômico e composição do grupo familiar. Os levantamentos

cadastrais da prefeitura revelam que mais da metade dos moradores é procedente

de outros estados, e que aproximadamente 30% vieram de cidades do interior do

estado, principalmente do sul e do oeste de Santa Catarina. Embora em menor

quantidade, há também moradores naturais de Florianópolis. Outro dado é que mais

de 70% dos moradores atuais residem na Comunidade desde a época da

desapropriação.

A situação econômica das famílias em geral é precária, sendo que a maioria

dos moradores exerce atividade autônoma sem qualificação. Predominam os

serventes de pedreiro, artesãos, faxineiras e biscateiros. Além dos autônomos,

existem alguns moradores que são empregados em pequenas empresas, outros são

funcionários públicos e há ainda os que possuem um pequeno comércio na própria

localidade. Durante os dias de folga, é comum os moradores trabalharem na reforma

de suas casas ou ajudarem na reforma das casas dos vizinhos. A Comunidade

parece um canteiro de obras que nunca acaba.

Em relação às famílias percebe-se que os núcleos tradicionais predominam,

porém há também casos de mulheres viúvas ou separadas residindo sozinhas ou

com os filhos; de filhos casados morando com os pais; de indivíduos ou casais

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morando sozinhos. A maioria das famílias é jovem e têm-se muitas crianças e

adolescentes. A maioria das mulheres não exerce atividade remunerada. Algumas

delas fazem trabalhos eventuais como faxineiras, principalmente quando os maridos

estão sem trabalho.

Com relação aos problemas sociais destacamos o desemprego ou

subemprego que atingem várias famílias, gerando muitas carências, havendo

inclusive casos de subnutrição. Uma equipe da pastoral da criança vem realizando a

distribuição de leite e o acompanhamento mensal do peso das crianças. Além disto

também as Agentes de Saúde comunitária da Prefeitura Municipal de Florianópolis

executam trabalhos desta natureza. Aliado ao problema do desemprego e da falta

de ocupação, há um índice elevado de pessoas dependentes de drogas e/ou de

álcool. A área é um importante ponto de tráfico de drogas. Outro dado é que existem

diversos casos de analfabetismo entre os moradores.

Vale ressaltar ainda que esta análise da comunidade foi elaborada a partir

das conversas com moradores e diretoria da AMPA, bem como pela leitura de

documentos dessa Associação e da “Caracterização das Moradias da Praia das

Areias”, elaborado em novembro de 1998 pelo Grupo de estudos em Habitação

(GHab) do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade federal de

Santa Catarina.

A Comunidade da Praia das Areias do Campeche é marcada por uma forte

luta pela posse e uso da terra que compreende este assentamento, assim, um

histórico de aquisições, relocações, brigas jurídicas e negociações como poder

público resume a constituição deste assentamento. Também vale ressaltar que por

ser uma área de dunas, mais precisamente, num ecossistema de restinga, esta é

uma área ilegal para a ocupação humana como delimita o Plano Diretor da

Prefeitura Municipal de Florianópolis (PMF).

Segundo estudos da PMF esta é uma área de risco social, devido ao alto

índice de desemprego, baixa escolaridade e índices crescentes de consumo de

drogas, bem como, o aumento dos pequenos furtos que acontecem nas regiões

adjacentes ao assentamento que sempre se dirigem a esta comunidade como

oriunda dos fatos.

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27

Por estar situada no meio de condomínios residenciais de classe média alta,

sofrem discriminações e também grande pressão por conta da especulação

imobiliária, que é um fato marcante em Florianópolis, principalmente em áreas de

balneário como as Areias do Campeche. Conseqüência disto, a instabilidade e

insegurança dos moradores em relação ao uso e posse da terra é marcante entre os

moradores, atingindo diretamente a sua relação com o seu quintal ou terreno.

O fato de pesquisas anteriores feitas na comunidade não considerarem os

cultivos dos quintais como práticas e ocupações dos moradores, desconsidera-se

qualquer possibilidade destas informações estarem contidas em estratégias e

políticas públicas voltadas para esta comunidade. Esta seria uma ótima estratégia

de atuação na comunidade para ocupação de mulheres e homens

desempregadas/os, jovens e crianças.

4.2 – Principais elementos do diagnóstico sócio-econômico das famílias e suas experiência em Agricultura Urbana

A partir do questionário “Diagnóstico – Agricultura Urbana na Praia das Areias

do Campeche” foi possível observar o perfil sócio-econômico dos entrevistados e

suas relações com a temática deste trabalho. Através de perguntas chaves do

questionário que está em anexo, temos o objetivo de analisar as potencialidades em

Agricultura Urbana desta comunidade. Através de gráficos, citações de outras

pesquisas e observações serão demonstrados os principais elementos do

diagnóstico, onde, 62 entrevistados, que respondem por sua família, irão

representar as relações existentes entre Agricultura Urbana e as características da

comunidade em questão .

Inicialmente dividimos os resultados das repostas negativas e afirmativas para

os cultivos nos quintais, encontrando nas respostas positivas casos de pessoas que

pararam e que continuam a produzir.

Figura 1: Gráfico que mostra a proporção de moradores em relação a prática de Agricultura Urbana.

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28

Dos 62 entrevistados, doze (20%) responderam que “Não”, não fazem

nenhum tipo de cultivo em seus quintais. Dez (17%) responderam que “Sim”, já

fizeram algum tipo cultivo em seus quintais mas pararam por diversos motivos.

Quarenta (63%) responderam que “Sim” e continuam fazendo algum tipo de cultivo

em seus quintais. Observamos que 80% dos entrevistados tem alguma relação

agrícola com seus quintais. Estes, inicialmente são alvo desta pesquisa que tem

como objetivo conhecer melhor destes moradores para posteriormente formar um

grupo que trate deste tema na comunidade.

Para melhor conhecer a situação econômica dos entrevistados e suas

respectivas famílias, um quadro com o panorama da renda mensal dos integrantes

da família, foi aplicado ao entrevistado.

Figura 2: Renda familiar mensal.

12

40

10nãosim e continuasim e parou

Page 29: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

29

Como resultados, obtivemos 16 famílias que vivem com menos de R$ 400,00

mensais e 22 famílias que vivem com uma renda mensal entre R$600,00 e

R$1000,00 representando 61% dos entrevistados. Apenas 5 famílias vivem com

uma renda entre R$1000,00 e R$1500,00 mensais e 4 famílias vivem com mais de

R$1500,00 por mês, representando 15% dos entrevistados. Compreendemos que as

15 pessoas, representando 24% dos entrevistados, que não declaram sua renda não

o fizeram por não se sentirem confortáveis ao declararem o quanto ganham ou por

desconhecerem o valor da renda familiar.

Sabendo que quase 50% dos entrevistados têm renda mensal família menor

que R$1.000,00, pela baixa renda mensal destas famílias, percebemos que a

comunidade é realmente alvo de um projeto que vise melhorias e garantias na

qualidade de vida através da segurança alimentar, melhores condições ambientais e

um cuidado especial com a saúde desta população como objetiva um Projeto de

Agricultura Urbana.

Segundo Siau & Yurjevic (1993, p.44) “um aspecto importante da relação

entre o urbano e o rural é a migração de pessoas. O principal fluxo é o que parte do

rural, e que está constituído principalmente por jovens”. Estes jovens que o autor se

refere, foram aqueles que há 10 – 15 anos vieram de suas cidades originárias rurais

e constituíram suas famílias nos centros urbanos. Também existem os casos de

famílias que vieram já formadas para as cidades oriundas do meio rural, todas

reflexos do êxodo rural, que na sua maioria se instalam nas periferias dos centros.

Na comunidade da Praia das Areias isto está representado na Figura 3.

1622

5 4

15

menos deR$400,00

R$600,00 -R$1000,00

R$1000,00 -R$1500,00

mais deR$1500,00

nãodeclarou

Renda mensal

n° de famílias

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30

Figura 3: Gráfico da origem das famílias entrevistadas

A migração de pessoas do rural para urbano nessa comunidade tem uma

representatividade bastante significativa, onde 65% dos entrevistados é de origem

rural. Este fato acaba acarretando uma série de fatores em relação ao manejo dos

quintais, espécies plantadas e motivações de cultivarem nos quintais, sendo melhor

apresentados no decorrer desta analise do diagnóstico.

Um dos objetivos do questionário era sabermos se os entrevistados tinham

algum histórico de participações em trabalhos comunitários ou movimentos sociais e

populares, a fim de constatar facilidade ou dificuldade de empreender atividades

deste caráter na comunidade da Praia das Areias. Para isto construímos uma

pergunta que esclareceria estas dúvidas.

Figura 4: Representa a participação do entrevistado em algum trabalho comunitário, formação de grupos ou movimentos populares sociais.

40

20

20

510152025303540

rural urbana não declarou

n° de famílias

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31

A partir desta figura observamos que 48% dos entrevistados nunca participou

de atividades coletivas e 52% já participou, sendo assim, com uma diferença tão

pequena entre os resultados, não sendo parâmetro para a identificação de

potenciais para a atividade a ser proposta na comunidade sob forma de um Grupo

de Trocas de Experiência em Agricultura Urbana.

Apesar de não serem representativos para este objetivo do diagnóstico,

observamos que 52% de participação é um número bem significativo para uma

comunidade, reforçando e refletindo todo processo de lutas e mobilizações em prol

de suas moradias, já constatado neste capítulo.

Pensando nas estratégias e ações do Grupo de Trocas de Experiência Sobre

Agricultura em Quintais da comunidade, concluímos que seria de fundamental

importância sabermos do interesse dos entrevistados de estar participando, ou não.

Daqueles que responderam que teriam interesse, buscamos verificar um dia comum

para as atividades,

Figura 5: Percentagem de interessados em participar do Grupo de Trocas de Experiências Sobre Agricultura em Quintais na Comunidade.

48%

52%

Sim, já participouNão, nunca participou

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32

56%34%

10%

SimNãoTalvez

Figura 6: Dias disponíveis para os encontros e atividades.

Como constatamos nas Figuras 5 e 6, existe um grande percentual de

interessados para a atividade. A escolha do melhor dia para estes encontros foi feita

analisando que a maioria das pessoas tem disponibilidade nos finais de semana,

especialmente aos sábados, desta forma quando realizamos o primeiro encontro do

Grupo de Trocas de Experiência Sobre Agricultura em Quintais da comunidade,

escolhemos o Sábado.

4.3 – Aspectos dos entrevistados que “NÃO” praticam Agricultura Urbana

Aproximadamente 19% dos entrevistados respondeu que nunca tiveram

nenhum tipo de cultivo em seus quintas, nessa comunidade. A partir dessa reposta

9

65

3

2

21 1 1

Sábadoqualquer diafim de semanadia de semanaSegundaQuintaTerçaSextaquando o filho crescer

Page 33: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

33

devemos ser cuidadosos pois o fato de não terem experiências na atual residência

não podemos excluir a possibilidade de um dia surgir o interesse pelo assunto.

Seguindo a resposta negativa analisamos outros elementos do diagnóstico

para justificar esta posição de não praticar Agricultura Urbana, pois, estes também

são moradores que devem ser considerados. Conhecê-los é fundamental para

construirmos melhores estratégias de aproximação.

Figura 7: Renda familiar mensal das famílias que não praticam

Agricultura Urbana

0

2

4

6

menos de400,00

600,00 -1000,00

acima de1000,00

Não declarou

EM R$ POR FAMÍLIA

NºDEFAMÍLIAS

Conforme Figura 7, das 12 pessoas que responderam esta categoria, 05

delas tem renda familiar mensal inferior a R$400,00, computando 42% do total.

Este resultado mostra que estas famílias seriam realmente o alvo de ações

que promovessem segurança alimentar como faz a prática de agricultura urbana.

Em experiências com moradores da periferia do Rio de Janeiro em Agricultura

Urbana Monteiro e Mendonça (2004) falam que é comum nas famílias de baixa

renda se observar uma baixa auto-estima, o que restringe fortemente a participação

em atividades comunitárias e as desmotiva a cuidar de seus quintais.

Outro ponto relevante para a ação a ser proposta na comunidade, é o fato de

que 66% dos entrevistados que não praticam Agricultura Urbana, tem origem rural,

num trabalho de sensibilização esse indicativo pode ser utilizado como um grande

potencial para o resgate cultural.

Saber que 07 dos 12 entrevistados nunca participaram de trabalhos

comunitários ou movimentos sociais e populares, foi de fundamental importância

Page 34: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

34

para concluirmos que a maioria realmente tem um histórico de desmobilização

comunitária. Como já esperávamos 08 dos 12 não têm interesse em participar do

Grupo de Trocas de Experiência Sobre Agricultura em Quintais da comunidade.

Também foram observados pontos que são negativos nesse grupo de

entrevistados para uma articulação de trabalhos coletivos, o fato de da maioria

nunca ter participado de trabalhos comunitários ou movimentos sociais e populares,

07 dos 12 entrevistados, mostrando que a maioria realmente tem um histórico de

desmobilização comunitária, e ainda, 08 dos 12 não têm interesse em participar do

Grupo de Trocas de Experiência Sobre Agricultura em Quintais da comunidade. Figura 8: Representação das causas levantadas pelos moradores ao fato

de não plantarem em seus quintais.

3

2

22

1

1

11

não têm espaço

moradores novos

a terra é muito ruim

não responderam

casa para veraneio

não gosta de plantar

mora de aluguel

nunca pensou

A pergunta chave para esta categoria era saber por que estas famílias não

plantavam em seus quintais. Com estas respostas poderíamos criar melhores

estratégias de aproximação a estas famílias, pois sabemos que são alvo de

trabalhos com Agricultura Urbana como justificado acima. Na Figura 8 mostramos

que as justificativas para não plantar nos quintais são as mais diversas, no entanto,

as questões de falta de espaço, baixa fertilidade do solo e moradias novas são as

mais encontradas. Devemos considerar esta diversidade de motivos para

planejarmos e promoção ações em Agricultura Urbana nesta comunidade. Também,

Page 35: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

35

vale salientar que mantivemos as respostas na íntegra para haver uma maior

transparência nos resultados.

4.4 – Aspectos dos entrevistados que responderam que já praticaram Agricultura Urbana, mas pararam.

Com 10 respostas nesta categoria, computou aproximados 16% dos totais

que responderam ao questionário. Temos um interesse principal em saber o que

levaram a parar com estas práticas em suas residências. Assim verificamos que 04

entrevistados perderam o espaço que tinham para cultivar, principalmente para

construções. Como já mostramos neste trabalho, os terrenos geralmente são muito

pequenos, assim quando as famílias precisam aumentar as construções, muitas

vezes é porque os filhos casam, ou outros familiares vêm morar junto destas

famílias. Com o aumento do número de integrantes da família acabam utilizando de

todo o terreno para construírem. Ainda dentro destes 04 alguns perderam o espaço

para animais, principalmente cachorros. Vale salientar que duas destas pessoas

participaram do Projeto Agroecologia Urbana. Dos entrevistados, 04 dizem que seus

cultivos foram acabando, como justificativa falam que a terra é ruim ou faltou um

muro para proteger. Um entrevistado diz que não tem sorte e o outro fala que ainda

não fez nesta comunidade e sim onde morava antes de vir morar ali.

Em relação à Renda mensal familiar, constatou que 60% dos entrevistados

recebem entre R$600,00 e R$1000,00, o que de fato não os coloca numa categoria

muito desprivilegiada economicamente, tranqüilizando os ânimos de quem avalia

que a Agricultura Urbana é uma ótima ferramenta no combate a pobreza e geração

de soberania alimentar para as famílias praticantes.

Estas famílias são na sua maioria de origem urbana, com 60% dos

entrevistados. Também verificamos que 08 entrevistados já participaram de

trabalhos comunitários ou movimentos sociais e populares e 07 deles têm interesse

em participar do Grupo de Trocas de Experiência Sobre Agricultura em Quintais da

comunidade. Resultados que mostram um grande potencial destes famílias

retomarem às práticas de Agricultura Urbana devido à formação do Grupo e ao

envolvimento comunitário que seus históricos apresentam.

Page 36: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

36

4.5 – Aspectos dos entrevistados que responderam que fazem Agricultura Urbana.

Foram 40 entrevistas que responderam que já fez algum tipo de cultivo

(agricultura) no seu quintal e continuam fazendo, representando cerca de 60% do

total de entrevistados. Neste eixo da pesquisa observamos que a origem das

famílias exerce influência na prática da Agricultura Urbana, pois 70% destes 40

entrevistados são de origem rural e apenas 30% de origem urbana que nunca

moraram em zonas rurais ou tivessem vivido da agricultura.

Figura 9: Renda familiar mensal dos que responderam que fazem Agricultura Urbana.

Como mostra a Figura 9, a renda familiar mensal de 48% dos entrevistados é

inferior a R$1000,00, não mostrando relação direta entre os praticantes de

Agricultura Urbana e índices de pobreza. Quando mostrarmos os resultados das

motivações a praticarem agricultura urbana, serão observadas várias motivações

que não estão relacionados à carência econômica destas famílias.

Percebemos que a participação em trabalhos comunitários ou movimentos

sociais e populares teve um grande equilíbrio nas respostas com 21 respostas que

nunca participaram e 19 que já participaram. O interesse em participar do Grupo de

Trocas de Experiência Sobre Agricultura em Quintais da comunidade foi bem

relevante pois, 24 entrevistados responderam que tinham interesse, 10 não tinham e

06 talvez o tivessem, dependendo do dia, horário ou disponibilidade.

1013

4 3

10

menos deR$400,00

(16)

R$600,00 -R$1000,00

(22)

R$1000,00 -R$1500,00

(5)

mais deR$1500,00

(4)

nãodeclarou

(15)

Renda mensal

n° de famílias

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37

4.5.1 – Panorama da Agricultura Urbana demonstrado pelos entrevistados.

Neste momento entramos numa das partes mais importantes deste

diagnóstico, a constatação das práticas em Agricultura Urbana. Poderemos traçar

um perfil destas pessoas que praticam Agricultura Urbana, para que de certa forma,

possamos compreender melhor este universo na Comunidade da Praia das Areias. “Nos espaços urbanos, são comuns pequenas parcelas que mantêm diversas

categorias de cultivos, frutíferas, medicinais, cereais, hortaliças e ornamentais.”

(MONTEIRO, MENDONÇA E SILVA. s.d.)

Figura 10: Gráfico que mostra as proporções de espécies vegetais encontradas nos quintais.

Inicialmente foi identificado o que estava plantado nos quintais dos

entrevistados, procuramos categorizar as respostas em: Temperos, Chás, Frutíferas,

Flores/Ornamentais e Hortaliças ou Legumes, já que os entrevistadores eram todos

estudantes de agronomia, conseguindo assim homogeneizar a linguagem para

traduzir as respostas. Desta forma, não pudemos citar as espécies mais cultivadas

nem mesmo os casos de maior ou menor diversidade nos quintais, isto foi apenas

presenciado pelos entrevistadores nas suas visitas aos quintais. Como mostra a

Figura 10 há um equilíbrio entre as espécies plantadas nos quintais, caracterizando

quintais com uma boa diversidade vegetal.

Quando perguntados sobre o porquê ou para que fazia o cultivo em seu

quintal, vimos que o fato de serem maioria de origem rural acaba plantando porque

19%

18%

22%

21%

20%

Temperos

Chás(medicinais)Frutíferas

Flores ouOrnamentaisHortaliças ouLegumes

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38

gostam. Isto na verdade, é conseqüência das heranças rurais que os fazem gostar

desta prática, pois, oriundos do êxodo rural chagam nas cidades e no processo de

adaptação ao modo de vida da cidade acabam praticando costumes do local de

origem, sendo a agricultura uma delas. Como o espaço é bem mais reduzido, fazem

justamente pela satisfação da prática.

Figura 11: Respostas quanto aos objetivos em plantar nos quintais.

Cumprindo com dois objetivos da Agricultura Urbana, segurança alimentar e

qualidade nutricional na alimentação, 13 entrevistados responderam que utilizam

seus cultivos na casa, isto é, na cozinha para sua alimentação. Desta forma

diminuem suas despesas, pois deixam de comprar quando passam a consumir de

seus próprios quintais, bem como acessar alimentos que não teriam condições de

adquirir. Isto é evidenciado também na pesquisa participativa em segurança

alimentar e agricultura urbana realizada em Belo Horizonte nos bairros do Taquaril e

Granja de Freitas desenvolvido pela Rede de Intercâmbio em Tecnologias

Alternativas. (REDE DE INTERCAMBIO EM TECNOLOGIAS ALTERNATIVAS, s.d.).

Sobre os principais problemas encontrados pelos agricultores de quintais na

comunidade das Areias do Campeche são quase os mesmos que fizeram as

pessoas que praticavam Agricultura nos Quintais a desistirem, que são: a falta de

15

13

7

4

1

GOSTAM

UTILIZAR NA CASA

EMBELEZAR

OCUPAR O TEMPO

DOAR AOS VISINHOS E AMIGOS

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39

espaço, o fato da terra muito arenosa e consequentemente muito fraca; e problemas

com animais como cachorros e gatos.

Figura 12: Principais problemas encontrados ao fazer Agricultura Urbana na Praia das Areias do Campeche.

Com estes dados, sabemos que para implementar um trabalho com

agricultura nos quintais desta comunidade é importante estudarmos técnicas e

práticas para otimizar os pequenos e restritos espaços, além de práticas que

melhorem a qualidade do solo com adubação a partir da produção de composto e

utilização de palhada. Como mostra a Figura 12 existem também outros principais

problemas, bem como a inexistência dos mesmos. Problemas com pragas e

doenças que poderiam dificultar a Agricultura Urbana aparecem em 4° lugar,

mostrando que esta prática é diferente da Agricultura Rural que, quando

convencional, gasta uma grande quantidade de dinheiro com venenos. Quando

ecológica, é sempre motivo de grande atenção e preocupação para quem planta.

As motivações a cultivarem em seus quintais confunde-se bastante com o

porquê ou para que o entrevistado cultiva em seu quintal.

Figura 13: As motivações dos moradores em praticar Agricultura Urbana

40%

17% 10%

10%

7% 3%

13% falta de espaço

terra fraca

animais

pragas

maresia

falta de tempo

não têm problemas

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40

Percebemos que é de fundamental importância sabermos das motivações

destes moradores, portanto, a origem rural e o gosto por plantar na maioria das

famílias são fatores de motivação da prática de agricultura também nos espaços

urbanos. Com 15% das respostas o fato de ser uma terapia plantar, torna-se o

agente motivador desta prática, merecedor de uma atenção especial para

planejamento das atividades, pois mostra uma relação direta com a qualidade da

saúde mental e o bem estar dos praticantes de Agricultura Urbana como cita

Almeida (2004), “O ato de plantar, mexer na terra, conversar com as plantas e

animais é muito relacionado com a manutenção da saúde. Casos de melhoria de

pressão alta, depressão, aumento da sociabilidade e de menor necessidade de

procurar o centro de saúde são relatados.”

4.5.2 – Manejo dos quintais a) Construção dos Canteiros Como mostra na pesquisa participativa em segurança alimentar e agricultura

urbana em Belo Horizonte no bairro do Taquaril desenvolvido pela Rede de

Intercâmbio em Tecnologias Alternativas, experiências de plantios em lajes de

casas, não havendo problemas com infiltrações. Como formas de reaproveitamento

de recipientes, encontramos: geladeiras velhas, carcaças de televisão, vasos

sanitários, pneus, latas, bacias e vasilhas velhas. (REDE DE INTERCAMBIO EM

TECNOLOGIAS ALTERNATIVAS, s.d.)

27%

20% 15% 10%

10%

10% 8%

gostam

já foi agricultor

terapia

desenvolvimento das plantas

sonham em ter uma horta grande

gostam de comer o que plantam

Page 41: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

41

Figura 14: Formas utilizadas por moradores da comunidade para

construção de canteiros.

27%

19%14%13%

8%8% 8% 3%

qualquer lugarcom tijolos madeiraem vasoscaixasgarrafas PETpneusonde foi um galinheiro

Conforme Figura 14, na comunidade da Praia das Areias do Campeche,

também encontramos diversas formas de reaproveitamento de recipientes, bem

como delimitação dos canteiros com madeira ou tijolos e até mesmo sem apresentar

delimitações. Vale ressaltar que, para intervenções nesta comunidade com trabalhos

em Agricultura Urbana devemos incentivar a utilização alternativa de espaços como,

utilização de floreiras, plantios em vasos, cultivos nem cima das lajes e utilização de

espaços públicos e abandonados. b) Adubação Segundo, a Rede de Intercambio em Tecnologias Alternativas (s.d.) em

Diagnóstico nas comunidades do Taquaril e Granja do Freitas, Belo Horizonte/MG,

“quase todos os moradores fazem algum tipo de adubação, utilizando esterco

bovino, que pegam nos arredores ou utilizam o lixo doméstico para adubação, de

formas diferenciadas.” Isto também acontece na comunidade da Praia das Areias,

no Figura 15 mostraremos os resultados das formas de adubação encontradas

durante a pesquisa.

Page 42: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

42

Figura 15: Formas encontradas de adubação dos quintais.

Como a comunidade está próxima de alguns terrenos grandes, onde existem

cavalos, bois ou vacas pastando, existe a possibilidade da catação do esterco

destes animais. Outro fator importante é a presença do “Seu Chinico” que cria

alguns animais na região e tem um curral onde coleta os estercos e vende

“carroçadas” para os moradores da Praia das Areias e bairros próximos, sendo ele o

maior ou único fornecedor de esterco da região. A utilização do composto produzido

na própria casa ou o fato de enterrar os restos vegetais da cozinha, mostra a

consciência dos moradores sobre a importância da reciclagem de lixo orgânico na

própria residência.

c) Cobertura de solo Para ser sustentada nos princípios ecológicos na Agricultura Urbana devem

constar práticas conservacionistas do solo como a utilização de palhada para

diminuição das perdas de água por evapotranspiração, bem como, aumentar a

quantidade de matéria orgânica do solo.

Figura 16: Presença de cobertura do solo nos quintais.

25%

25%20%

20%10%

esterco que compram ouque catam no pasto

enterram os restos vegetais

compram terra preta emagropecuárias

não têm nenhuma forma deadubação

utilizam composto, que sãoproduzidos nos própriosquintais

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43

Como está explicito no Gráfico a maioria dos entrevistados não utilizam

palhada ou qualquer outro tipo de cobertura do solo. Os quintais são capinados e os

restos culturais na maioria dos casos ficam “amontoados” num canto do quintal,

viram composto ou são enterrados. Estas são, muitas vezes, reflexos de práticas

que desenvolviam quando eram trabalhadores rurais no manejos de suas hortas,

pomares ou lavouras. Através de um diagnóstico, dentre outras, esta reflexão foi

feita por Almeida (2004, p.27) “Em Belo Horizonte, os moradores das comunidades

urbanas e periurbanas de baixa renda são, principalmente, oriundos da zona rural de

outras regiões do estado. Muitos deles relacionam o conhecimento sobre manejo

dos quintais a uma experiência rural anterior, na qual aprenderam com os pais,

mães ou avós, sobre cultivo das roças, o uso de plantas medicinais e nativas na

alimentação e a criação de animais. Por outro lado, observamos limitações de

conhecimento sobre compostagem, cultivo em pequenos espaços, planejamento da

produção, armazenamento de sementes, manejo do solo, alelopatia, podas,

enxertia, controle de erosão e de insetos e doenças.”

d) Os solo dos quintais Já citado neste trabalho, a comunidade da Praia das Areias do Campeche

está localizada numa área de restinga, num ecossistema de dunas, caracterizando

um solo arenoso de origem. Muitos dos quintais obtiveram um incremento de “barro”

ou algum material orgânico desde a sua ocupação original modificando parte de sua

composição.

57%18%

25%

nãoapresentam

apresentaramcobertura

nãoidentificado

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44

Figura 17: característica do solo dos quintais.

Esta figura representa estas características, sabemos que o fato dos lotes

apresentarem na sua maioria solos arenosos, e que justamente este fato é causa de

desistência e limitação para a Agricultura Urbana, em metodologias de trabalho

nesta comunidade deve-se estrategiar formas de aumentar os teores de argila e

matéria orgânica destes solos.

e) O uso da Água Com o passar do tempo a escassez de água potável é cada vez maior, seu

custo está aumentando e em determinados períodos do ano é comum a falta de

água em locais urbanos. Na comunidade da Praia das Areias este fato não é

diferente, a falta de água é muito comum especialmente no verão. Isto acontece por

ser uma região de balneário onde a população aumenta consideravelmente nesta

estação e também pelo fato de acontecerem “trombas d’agua” chovendo uma

grande quantidade em pouco tempo fazendo com que a água fique turva e ocasione

problemas nas tubulações sendo necessário o que o fornecimento seja interrompido.

Figura 18: Gráfico dos moradores quanto ao costumes de regar seus quintais

50%

25%

25% Arenoso

Areno-argiloso

Nãoidentificaram

Page 45: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

45

Esta figura mostra se a prática de irrigação é feita ou não nos quintais, dos

49% que irrigam seus quintais todos utilizam mangueiras ou regadores para fazerem

a rega, isto é, utilizando água tratada e de alto custo para a mesma. Para uma

futura intervesão devemos pensar em alternativas de captação de água para estas

práticas como a captação de água dos telhados. Também devemos promover

praticas que diminuam a necessidade de irrigação.

f) “Pragas” e “Doenças” Aparecendo em 4° lugar na escala de importância nas maiores dificuldades

encontradas na prática da Agricultura Urbana. Esta despreocupação dos moradores

é explícita nesta questão do questionário onde poucas espécies de insetos, fungos

ou bactérias apareçam como causadores de problemas e com a grande maioria dos

entrevistados respondendo que não têm problemas.

Figura 19: Problemas encontrados nos quintais.

20

9

1

10

regam

não regam

solta a águada máquina de

lavar

não identificou

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46

Os tratamentos, ou formas de controle na maioria dos casos eram com caldas

de sabão e fumo e em poucos casos compravam venenos na Agropecuária.

g) Lixo doméstico Uma das preocupações e intenções deste trabalhos foi de seber o que

os moradores faziam com o lixo produzido em suas propriedade. Se a prática de

separação ou compostagem era aplicada entre os moradores. Como mostra a Figura

20, grande parte dos moradores separa seu lixo.

Figura 20: Manejo do lixo doméstico.

A separação feita por eles é enterrando cascas, dando o restante da

comida para os gatos e cachorro. Mas, não constatamos separação por materiais

papel, vidro, plástico e rejeito. Em muitos casos, metais, papel, papelão e latinhas

são separados para os catadores que passam recolhendo com suas carroças e

carrocinhas.

6 3 1

30

0

10

20

30

Lagartas Pulgões Lesma Não têmproblemas

PRAGAS E DOENÇAS

38%

62%

não separam o lixoseparam o Lixo

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47

4.6 – Aspectos do Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura em Quintais.

Após o convite realizado durante as entrevistas, no dia 24 de setembro de

2004, um sábado às 15:00h estávamos na AMPA a espera dos participantes,

tínhamos preparado uma exposição de fotos e a apresentação de um vídeo

produzido pela AS-PTA sobre Agricultura Urbana, mostrando relatos de moradores

da periferia do Rio de Janeiro.

Para nossa maior surpresa apenas três pessoas vieram para o encontro que

chamamos de “trocas de experiência em Agricultura em Quintais”. Das três pessoas,

duas haviam participado do Projeto Agroecologia Urbana desenvolvido na

comunidade.

Conversamos um pouco sobre as motivações e os reais anseios das pessoas,

comentando um pouco sobre a falta de participação nas atividades comunitárias,

falamos sobre a pesquisa realizada introduzindo o tema da Agricultura Urbana,

assistimos ao filme e planejamos as atividades posteriores.

No planejamento buscamos saber o que de fato era importante para cada

participante, e o que elas buscavam daquele grupo. Vimos que o principal interesse

era em aumentar o espaço de plantio que haviam em seus terrenos ou quintais.

Assim, combinamos de no próximo encontro, que seria no próximo sábado, faríamos

mudas de hortaliças e temperos, além de visitas aos quintais.

No segundo encontro, como combinado, fizemos as mudas, algumas

sementes elas levaram outras fomos nós quem levamos. Falamos um pouco sobre o

“poder” das sementes, transgenia e a importância de produzir a própria semente.

Visitamos os quintais e cada participante levou a bandeja de mudas que havia

plantado. Neste encontro já havia indicativos que o grupo não continuaria, devido ao

forte desinteresse das participantes, para combinarmos o terceiro encontro através

de vários obstáculos e limites que foram apontados. Mesmo assim marcamos o

terceiro encontro para fazermos um mutirão numa das casas.

Neste encontro não apareceu ninguém exceto a dona da casa, este foi o

terceiro e último encontro, devido ao desânimo e falta de interesse dos participantes

o grupo de trocas de experiência em agricultura em quintais terminou.

Page 48: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

48

O fracasso na formação do “Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura

Urbana” tem algumas hipotéticas causas que foram sendo construídas e sintetizadas

ao longo do trabalho através de conversas informais com pessoas envolvidas com a

comunidade, educadores, extensionistas e moradores.

Destas causas, a que mais chama atenção é o que diz um morador da

comunidade:

“...o pessoal já não sai mais de casa para se reunir e discutir os

assuntos da comunidade como antigamente, eles preferem ficar em

casa vendo televisão ou jogando no bar. Só aparecem se

receberem bolsa ou cesta básica, como faz a Prefeitura...”.

Este depoimento foi muito importante, pois retratou o processo de alienação e

comodismo que sofre nossa sociedade, principalmente urbana, com acesso ao

entretenimento facilitado pela televisão através de programas que não os fazem

refletir sobre sua realidade, e mais, não havendo um envolvimento com os assuntos

coletivos.

Projetos sociais ligados às políticas governamentais onde a participação

corresponde ao recebimento de bolsas ou cestas básicas, são também, fatores que

influenciaram de forma direta a dificuldade de formação deste grupo. O fato de o

participante não receber nenhum benefício não os fez interessados estimulados por

outros fatores. Estas pessoas, na sua maioria, procuram ocupações que o tragam

retornos econômico ou materiais e o fato de trocas de experiências, organização

comunitária e a temática da educação ambiental não foram suficientes para animá-

los à participação deste Grupo.

Outro depoimento foi de um educador que trabalhou no Projeto Agroecologia

Urbana e em outros projetos que acontecem na comunidade, que diz o seguinte:

“...o problema está na descontinuidade dos projetos, falta de

estrutura e de dinheiro para tocá-los, assim a comunidade não

percebe nem acompanha o desenvolvimento das atividades e dizem:

lá vem aqueles novamente, será que desta vez vai dar certo? Por

fim, acabam participando mais pela relação pessoal e afetiva que

criamos, do que pela proposta do trabalho...”

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49

Este educador refere-se ao Projeto Agroecologia Urbana que de certa forma

foi executado sem recursos financeiros e estruturais para a continuidade das

atividades. Quase um ano depois aparecemos para fazer a pesquisa e propor a

formação do Grupo de Trocas de Experiências em Agricultura Urbana. A pesquisa

foi tranqüila, mas para o Grupo apareceram três pessoas, sendo duas destas, com

fortes relações pessoais e afetivas construídas com o tempo. O cuidado que

devemos tomar ao estarmos nos inserindo nas comunidades deve ser planejado

com muita atenção e sensibilidade, mesmo que não prometemos nada e sempre

deixamos as pretensões, objetivos e planos futuros da forma mais clara possível,

devem ser intervenções muito bem estrategiadas para não serem criados traumas,

vícios ou mau entendimentos. Sabemos que o Projeto Agroecologia Urbana não foi

assim catastrófico, nem mesmo causador de má impressão pelos moradores, a ao

perceberem que esta pesquisa-ação estava sendo feita novamente sem recursos

financeiros nem estruturais, não os causou uma boa impressão, portanto não foi

estimulador o suficiente para a continuidade do Grupo.

Quando citados os problemas estruturais é para referenciar as redes de

relações que foram estabelecidas para este trabalho. O Cepagro neste momento

estava passando por dificuldades em seu quadro de funcionários, bem como, não

tendo um projeto desta natureza implementado, apenas idealizado e apresentado

para agências financiadoras. A AMPA também passava por sérios problemas com

sua direção segmentada, por um momento ficando inclusive sem Diretoria além do

baixo envolvimento dos moradores nas tomadas de decisões, ficando poucos

responsáveis respondendo pelas atividades lá desenvolvidas. Programas sociais da

Prefeitura sendo aplicados sem critérios para tornar os moradores agentes

participativos do processo, apenas cumprimento de metas. Enfim, esta era a

estrutura no qual este Estágio desenvolveu-se, acarretando suas conseqüências.

5. CONCLUSÕES Avaliando os diferentes métodos de trabalhos com Agricultura Urbana

apresentados neste Relatório, percebemos distintas formas de tratar o tema.

Algumas com sucessos numéricos, como o caso do Projeto da Prefeitura de São

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50

Paulo. Outros preocupados em fortalecer as bases e construir processos

gradativamente como faz a AS-PTA. Também apresentamos experiências que

apresentam dificuldades financeiras, estruturais e organizacionais não conseguindo

se estabelecer como o Projeto de Agroecologia Urbana do Cepagro.

Este trabalho serviu para refletimos sobre estas metodologias, suas

potencialidades e limitações, bem como, para conhecer melhor a Comunidade da

Praia das Areias do Campeche em relação as suas práticas de Agricultura Urbana,

principalmente as espontâneas.

As metodologias que valorizem processos de construções coletivas,

envolvendo estruturas e atores já estabelecidos nas comunidades como os

movimentos sociais e entidades comprometidas com os cidadãos da região de

trabalho, são realmente as mais sustentáveis, dentre as pesquisadas. Desta forma,

é importante frisarmos que os projetos que promovem inclusão e valorizem as

diferenças locais e organizacionais que cada comunidade possui, contribui com a

criação de redes comprometidas com a promoção do desenvolvimento local

humano partir de um trabalho de Agricultura Urbana. Diferente de uma visão

produtivista de Agricultura Urbana que acaba não se comprometendo com estes

aspectos.

O fato de Cuba apresentar um modelo de sucesso em Agricultura Urbana

acaba sendo fonte de metodologias para estes trabalhos em todo mundo, mas como

mostra este relatório, sabemos que Cuba apresenta diversas peculiaridades em

suas estruturas políticas, econômicas e sociais que a faz ter um Projeto de

Agroecologia Urbana tão bem sucedido.

Diferente do Brasil, e de quase toda a população mundial restante, Cuba deve

sim, ser fonte de inspiração para estes projetos e não de cópias de modelos em

Agricultura Urbana. Por constituirmos uma sociedade capitalista de consumo, nossa

população apresenta e têm acesso a diferentes bens de consumo e padrões de

desenvolvimento bem diferentes de Cuba, portanto primeiramente, devemos levar

este fator como um grande diferencial.

Um aspecto importante a levantarmos nesta conclusão é o fato de

confundirmos a Agricultura Urbana com o trabalho de hortas comunitárias, onde as

hortas comunitárias são mais um elemento da Agricultura Urbana e não a sua

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51

integridade. Devemos sim, valorizar as expressões espontâneas de agricultura

existentes nas comunidades, bem como, estarmos atentos às comunidades que

realmente demandam este trabalho, estando minimamente organizadas e

sensibilizadas para este tema ao iniciarmos um trabalho.

A comunidade da Praia das Areias é realmente uma comunidade em

potencial para o tema da Agricultura Urbana, por vários motivos que são:

• Sua forte mobilização política para a conquista de seus lotes;

• Ser uma comunidade com a maioria dos moradores de origem rural;

• Apresentar um nível socioeconômico relativamente baixo;

• Mostrar interesse e práticas significativas em cultivo nos seus quintais.

Embora não tenha sido efetivado e estabelecido o Grupo de Trocas de Experiências

em Agricultura nos Quintais da comunidade, concluo que este fato é devido há uma

série de elementos que de alguma forma já foram descritos neste trabalho, mas que

reforço em apresenta-los:

• Problemas existentes nos atores de base da comunidade como associação

de moradores;

• Metodologias assistencialistas de trabalho da Prefeitura Municipal de

Florianópolis junto às comunidades, acarretando a desmobilização das

mesmas;

• Falta de estrutura financeira, técnica e organizacional do Cepagro, durante a

execução do Projeto Agroecologia Urbana, acarretando num possível

descrédito perante a comunidade.

Todos estes aspectos se forem trabalhados estrategicamente na comunidade

podem fortalecê-la e torná-la apta e capaz de ancorar um trabalho de Agroecologia

Urbana que traga grandes benefícios sócio-econômicos, ambientais e estruturais

para a Comunidade da Praia das Areias do Campeche.

Fazendo parte de um quadro de poucas entidades no Brasil dispostas a

refletirem, planejarem e implementarem projetos, o Cepagro com este trabalho,

recebe subsídios para reflexões sobre metodologias e estratégias de atuação em

comunidades, principalmente periféricas e excluídas. No intuito de desenvolver

trabalhos de Agricultura Urbana, este Relatório faz uma série de reflexões técnicas e

metodológicas sobre o tema de grande valia ao Cepagro.

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6. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

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Page 56: AGRICULTURA URBANA: Diagnóstico e Educação Ambiental na Comunidade da Praia das Areias do Campeche – Florianópolis (SC)

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ANEXOS Anexo I : DIAGNÓSTICO – AGRICULTURA URBANA NA COMUNIDADE DAS AREIAS

DO CAMPECHE.

RUA: N°:

NOME:

HISTÓRICO DA FAMÍLIA

ORÍGEM: URBANA( ) RURAL( )

QUAL(IS) CIDADE(S):

QUADRO FAMILIAR

Parentesco Idade Escolaridade Profissão Renda

JÁ FEZ ALGUM TIPO DE CULTIVO (AGRICULTURA) NO SEU QUINTAL?

SE NÃO, POR QUÊ?

SE SIM, CONTINUA FAZENDO? POR QUE PAROU?

O QUE PLANTA?

POR QUE OU PARA QUE PLANTA?

QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS PROBLEMAS QUE VOCÊ ENCONTRA?

QUAIS SÃO AS SUAS MOTIVAÇÕES?

SOBRE O MANEJO:

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CANTEIROS

ADUBAÇÃO

COBERTURA

SOLO

ÁGUA

“PRAGAS”

“DOENÇAS”

OBSERVAÇÕES:

DE ONDE VEM A MATÉRIA ORGÂNICA (SE UTILIZAR)?

QUAL O DESTINO DO LIXO DOMÉSTICO?

JÁ PARTICIPOU DE ALGUM TRABALHO COMUNITÁRIO, FORMAÇÃO DE GRUPOS OU

MOVIMENTOS POPULARES E SOCIAIS?

GOSTARIA DE PARTICIPAR DE UM GRUPO DE TROCAS DE EXPERIÊNCIAS SOBRE

AGRICULTURA EM QUINTAIS NESTA COMUNIDADE?

QUAIS OS DIAS QUE VOCÊ ESTARIA DISPONÍVEL PARA OS ENCONTROS?

OBS: CONVIDAR PARA PARTICIPAR DO PRIMEIRO ENCONTRO DE TROCAS DE

EXPERIÊNCIAS EM AGRICLTURA EM QUINTAIS NA AMPA, DIA 24/SET AS 15:00H, PRÓXIMO

SÁBADO.

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Anexo II: Fotos do Projeto de Agricultura Urbana da AS-PTA na cidade do Rio de Janeiro.

Foto 1: Aproveitamento de pequenos espaços urbanos acimentados.

Experiência do quintal da D. Marília

Foto 2: Visita no quintal urbano da D. Mercedes.

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Foto 3: Encontro de Promoção da Agricultura Urbana

Foto 4: Curso para Agentes comunitárias de saúde. Comunidade Alagado/RJ

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Foto 5: Visita de intercambio entre grupos de diferentes

comunidades.comunidade Rolas X Comunidade do Jardim Guaratiba.

Foto 6: Mutirão na Horta coletiva da comunidade do Mendanha/RJ.

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Foto 7: Encontro da Rede Fitovida

Anexo IV: Projeto Agroecologia Urbana desenvolvido na Comunidade da Praia das Areias do Campeche pelo Cepagro durante maio e dezembro de 2004.

Fotos I: Oficina do Pão como tema gerador

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Fotos 2: Oficina de Hortas Caseiras.

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a) Quintal da Dona Bete

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b) Quintal da Noeli

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c) Trabalho de educação ambiental e Agricultura Urbana com as crianças do

PETI na Associação dos Moradores da Praia das Areias

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