Agricultura Vazanteira guiada pelas idas e vindas do Rio São Francisco

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Ano 7 - n° 1278 Setembro/2013 Matias Cardoso AGRICULTURA VAZANTEIRA GUIADA PELAS IDAS E VINDAS DO RIO SÃO FRANCISCO Na zona rural de Matias Cardoso/MG, famílias de agricultores e agricultoras localizados à beira do Rio São Francisco estão acostumadas a exercer agricultura nas vazantes. É característico da região o plantio seguindo o regime do rio, estabelecendo interações com a pesca e o transporte fluvial. Esses agricultores e agricultoras são chamados de vazanteiros. Com uma dinâmica de conhecimento profundo do rio e da terra, os vazanteiros são pescadores por natureza que, numa relação de respeito, observam o comportamento do rio nos períodos de seca, vazante e de cheia. Os vazanteiros do Quilombo da Lapinha, Pau de Légua e Ilha da Ressaca estão envolvidos em um processo de fazer da união e dos cuidados com a terra, uma porta para aprimorarem a sustentabilidade de suas agriculturas pois, garantem, a terra é excelente. A vazanteira da comunidade Pau de Légua, Dalva Assunção Santos, apaixonada por horta e pelo rio repara que, após a cheia do rio, o plantio fica melhor. Ela afirma que a terra fica naturalmente rica em nutrientes e o plantio e a colheita é certa. Na região vazanteira a terra é fertilizada pelo rio, característica que beneficia as comunidades localizadas nas zonas rurais do município de Matias Cardoso e Manga. No Quilombo da Lapinha, na Ilha Pau de Légua e na Ilha de Pau Preto diversas iniciativas vêm sendo aprimoradas envolvendo horticultura orgânica, criação de pequenos animais e padaria. Estas atividades estão associadas também com a luta pelo reconhecimento do território tradicional. Antigamente foram muito pressionados pelos fazendeiros, o único lugar que lhes sobrou foram as ilhas e as vazantes do rio. Agora é o Instituto Estadual de Florestas – IEF que pressiona, criando parques em cima Uso da Bomba D’água típico da agricultura Vazanteira A agricultura Vazanteira une famílias

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Ano 7 - n° 1278

Setembro/2013

Matias Cardoso

AGRICULTURA VAZANTEIRA GUIADA PELAS IDAS E VINDAS DO RIO SÃO FRANCISCO

Na zona rural de Matias Cardoso/MG, famílias de agricultores e agricultoras localizados à beira do Rio São

Francisco estão acostumadas a exercer agricultura nas vazantes. É característico da região o plantio seguindo o

regime do rio, estabelecendo interações com a pesca e

o transporte fluvial. Esses agricultores e agricultoras

são chamados de vazanteiros.

Com uma dinâmica de conhecimento profundo do rio e

da terra, os vazanteiros são pescadores por natureza

que, numa relação de respeito, observam o

comportamento do rio nos períodos de seca, vazante e

de cheia.

Os vazanteiros do Quilombo da Lapinha, Pau de Légua e

Ilha da Ressaca estão envolvidos em um processo de

fazer da união e dos cuidados com a terra, uma porta para aprimorarem a sustentabilidade de suas agriculturas

pois, garantem, a terra é excelente.

A vazanteira da comunidade Pau de Légua, Dalva

Assunção Santos, apaixonada por horta e pelo rio repara

que, após a cheia do rio, o plantio fica melhor. Ela afirma

que a terra fica naturalmente rica em nutrientes e o

plantio e a colheita é certa.

Na região vazanteira a terra é fertilizada pelo rio,

característica que beneficia as comunidades localizadas

nas zonas rurais do município de Matias Cardoso e Manga.

No Quilombo da Lapinha, na Ilha Pau de Légua e na Ilha

de Pau Preto diversas iniciativas vêm sendo aprimoradas

envolvendo horticultura orgânica, criação de pequenos

animais e padaria. Estas atividades estão associadas também com a luta pelo reconhecimento do território

tradicional. Antigamente foram muito pressionados pelos fazendeiros, o único lugar que lhes sobrou foram as

ilhas e as vazantes do rio. Agora é o Instituto Estadual de Florestas – IEF que pressiona, criando parques em cima

Uso da Bomba D’água típico da agricultura Vazanteira

A agricultura Vazanteira une famílias

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de seus territórios.Esta luta levou à constituição dos “Vazanteiros em Movimento”, articulação que

envolve diversas outras comunidades ribeirinhas. E conta com o apoio de outras organizações como a

Comissão Pastoral da Terra - CPT,

professores e pesquisadores da

Universidade Estadual de Montes Claros

– Unimontes e da Universidade Federal

de Minas Gerais – UFMG, do Ministério

Público Estadual e Federal. O mais

importante: eles não estão sozinhos.

O vazanteiro Antônio Correa Ramos, da

comunidade Ilha Mãe Preta, no

município de Itacarambi, está muito

animado pois a Comissão Pastoral da

Terra – CPT, e o Centro de Agricultura

Alternativa do Norte de Minas – CAA/NM chegaram até a comunidade para apoiar a o trabalho de

produção de hortaliças agroecológicas. O Sr. Antônio explica que é muito bem vinda esta iniciativa de

poder aprender a plantar e cuidar da horta com remédios naturais, sem causar danos a sua saúde e de

sua família.

Há cerca de 1 ano, as atividades dos vazanteiros no

plantio, na roça, ficou mais fácil, pois foi implantado

a Bomba D’água Solar para a irrigação das hortas.

Eles informam que o aparelho tem capacidade de

puxar água do rio de 750 a 8 mil litros, de acordo com

a altura, possibilitando melhor aproveitamento no

processo de irrigação.

Para o vazanteiro e quilombola, José Teodorico

Borges, do Quilombo da Lapinha, com a implantação

do aparelho é possível ter o controle para não

desperdiçar água do caminho do rio até a horta. E os

plantios são bem diversificados, os agricultores

plantam abóboras, batatas, feijão, milho, mandioca,

beterraba, alface, rúcula, cenoura, quiabo, além de

temperos e remédios homeopáticos, todos

cultivados nos moldes agroecológicos.

Dona Dalva mostra, com alegria, as flores na horta comunitária

As famílias valorizam a horta comunitária