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“AI CARUARU, DO MEU TEMPO DE MENINO”: levantamento do estado de conservação e preservação do patrimônio cultural material de Caruaru-PE. MONTEIRO, Amanda R. C. (1); TEIXEIRA, Nícolas M. M. (2); MORAES, Adja G. (3); VALENTIM, Josyele C. S. 1. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected] 2. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected] 3. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected] 4. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected] RESUMO “Ai Caruaru, do meu tempo de menino” é uma frase da letra da música Caruaru do Passado do cantor conterrâneo Azulão, nela ele rememora a cidade e seus espaços representativos. Caruaru, conhecida pela sua famosa feira, sempre teve o perfil progressista e a visão de desenvolvimento em detrimento da preservação de sua história e tradição. A Caruaru do Passado perdeu exemplares importantes da sua história, apesar disso, a pesquisa Conhecer para Preservar: Inventário do Patrimônio Cultural Material de Caruar u encarou o desafio de conhecer o que ainda existe do acervo na cidade e sua atual condição. A partir disso, a pesquisa teve por objetivo, portanto, desenvolver um inventário dos edifícios de valor histórico e arquitetônico dos séculos XIX e XX, ainda presentes no Bairro Nossa Senhora das Dores, da cidade de Caruaru a fim de conhecer o patrimônio local e subsidiar a criação de uma Legislação de Patrimônio Histórico e Artístico no município, ainda inexistente. Para atingir o objetivo do trabalho iniciamos os estudos pelo levantamento histórico da ocupação do município e teórico da arquitetura e urbanismo do Brasil nos séculos XIX e XX. Após o conhecimento teórico do objeto, iniciou-se o levantamento de campo das edificações que deveriam ser inventariadas, foram aplicadas fichas e realizado levantamento fotográfico das casas encontradas o objetivo era catalogar todas as casas ainda existentes e depois escolher as mais representativas e com maior risco de perda para fazer o inventário. Foram os dados dessas fichas e da experiência em campo que o

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“AI CARUARU, DO MEU TEMPO DE MENINO”: levantamento do estado

de conservação e preservação do patrimônio cultural material de Caruaru-PE.

MONTEIRO, Amanda R. C. (1); TEIXEIRA, Nícolas M. M. (2); MORAES, Adja G. (3); VALENTIM, Josyele C. S.

1. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected]

2. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected]

3. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected]

4. UNIFAVIP/Devry e FBV/Devry. Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Av. Adjar da Silva Casé, Indianópolis, Caruaru-PE. [email protected]

RESUMO

“Ai Caruaru, do meu tempo de menino” é uma frase da letra da música Caruaru do Passado do cantor conterrâneo Azulão, nela ele rememora a cidade e seus espaços representativos. Caruaru, conhecida pela sua famosa feira, sempre teve o perfil progressista e a visão de desenvolvimento em detrimento da preservação de sua história e tradição. A Caruaru do Passado perdeu exemplares importantes da sua história, apesar disso, a pesquisa Conhecer para Preservar: Inventário do Patrimônio Cultural Material de Caruar u encarou o desafio de conhecer o que ainda existe do acervo na cidade e sua atual condição. A partir disso, a pesquisa teve por objetivo, portanto, desenvolver um inventário dos edifícios de valor histórico e arquitetônico dos séculos XIX e XX, ainda presentes no Bairro Nossa Senhora das Dores, da cidade de Caruaru a fim de conhecer o patrimônio local e subsidiar a criação de uma Legislação de Patrimônio Histórico e Artístico no município, ainda inexistente. Para atingir o objetivo do trabalho iniciamos os estudos pelo levantamento histórico da ocupação do município e teórico da arquitetura e urbanismo do Brasil nos séculos XIX e XX. Após o conhecimento teórico do objeto, iniciou-se o levantamento de campo das edificações que deveriam ser inventariadas, foram aplicadas fichas e realizado levantamento fotográfico das casas encontradas o objetivo era catalogar todas as casas ainda existentes e depois escolher as mais representativas e com maior risco de perda para fazer o inventário. Foram os dados dessas fichas e da experiência em campo que o

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patrimônio ainda existente da cidade será apresentado nesse artigo. Além da feira, patrimônio imaterial brasileiro, o São João e o artesanato de Caruaru são conhecidos e reconhecidos pelos habitantes e turistas, mas o patrimônio edificado ainda não é percebido nem por esses nem por aqueles. O acervo de mais de 400 casas apresenta exemplares ecléticos ricos e art decó de duas tendências fortemente arreigada na cultura nordestina. O art decó, estilo advindo da França, chega a Caruaru como composição de fachada, referências trazidas da capital pelos mais ricos e pelos mestres de obra. A implantação colonial denuncia que as fachadas foram produzidas por reformas ao gosto da época. Caracteriza-se o predomínio do art decó, principalmente o popular, mas também presente as variações escalonada e aerodinâmicas. O estudo da conservação e preservação apresenta dados animadores, quantitativamente o resultado é positivo, no entanto a rápida dinâmica de mudança faz com que seja a cada dia mais difícil encontrar esses exemplares pela perda da noção de conjunto. A falta da noção de conjunto e a simplicidade do acervo dificultam o reconhecimento da população pelo acervo ainda existente, por não formarem um sitio os edifícios tornam-se invisíveis no cotidiano da cidade progressista e por ser em estilo art decó popular, uma composição simples, não é percebido ser valor histórico.

Palavras-chave: Patrimônio Vernacular; Art Decó, Conservação e Preservação

1.Introdução

“Ai Caruaru, do meu tempo de menino” é uma frase da letra da música Caruaru do Passado

do cantor caruaruense Azulão, nela ele rememora a cidade, a importância do Morro Bom

Jesus, as lembranças das “festanças na Matriz” e do “velho chafariz”, obviamente que a

festa de São João e quadrilhas também são mencionados. A cidade que teve sua origem

atrelada ao comércio, advindo da feira de Caruaru, sempre teve o perfil progressista e a

visão de desenvolvimento em detrimento da preservação de sua história e tradição. Então, a

“Caruaru do Passado” perdeu exemplares importantes da sua história, apesar disso, a

pesquisa Conhecer para Preservar: Inventário do Patrimônio Cultural Material de Caruaru

encarou o desafio de conhecer o que ainda existe do acervo na cidade e sua atual condição.

A origem de Caruaru é documentada a partir do início do século XVIII. Caruaru, situada a

134 km de Recife (PE), teve sua origem na época do Ciclo de Couro (1654-1816), no

Nordeste, tornando-se acomodação dos tangedores e do gado no percurso do “caminho das

boiadas” (LEITE, 2003). Além dos caminhos do gado, outro forte responsável pelo

crescimento da fazenda Caruru foi a construção da Capela de Nossa Senhora da

Conceição, pois além dos moradores da Fazenda e das redondezas, muitos visitantes

passaram a frequentar o lugar ocasionando em um considerável crescimento populacional.

Esse crescimento permitiu a construção de casas à margem da estrada e próximo a igreja

dando origem a primeira rua do povoado, a rua da frente da Igreja. A Rua da Frente se

caracterizava pela ocupação linear conformando um adro onde foi instalada a feira, a

famosa feira de Caruaru, que se configurava de casas térreas de porta-e-janela e sobrados

construídos de acordo com implantação e estética colonial brasileira.

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A elevação à cidade (1858), a chegada da linha férrea (1895) e a implantação de fábricas de

Algodão (1930) constituíram-se como um grande fator de progresso para Caruaru. Esse

desenvolvimento promoveu um aumento do tecido urbano que se espraiou pelo rio Ipojuca,

que corta a região, e por percursos-matrizes, como sua ligação a outras fazendas como a de

Santa Rosa e do Salgado, hoje bairros da cidade, além de espaços intersticiais das vias já

consolidadas. Os edifícios foram se “modernizando” de acordo com as estéticas que

chegavam junto com os visitantes da capital se definido por exemplares ecléticos,

representativos do século XIX, e art decó e modernos, frutos do século XX.

Atualmente, Caruaru é a cidade mais populosa do interior do estado com 314.912 habitantes

(IBGE, 2010), possui o sétimo maior PIB e é o segundo polo educacional e médico do

estado, assim como centro comercial, de serviços e cultural para os municípios

circunvizinhos. Este crescimento é refletido em grandes transformações do espaço urbano,

materializado na expansão da malha viária, com processos de verticalização e surgimento

de novos núcleos urbanos.

Por meio de todo esse crescimento a antiga Rua da Frente, hoje Rua 15 de Novembro

localizada no Bairro Nossa Senhora das Dores (conhecido como Centro), passou por

diversas transformações e muito exemplares de valor histórico se perderam. No Centro essa

mudança é mais perceptível pelo uso do casario pelo comércio, vocação essa mantida

desde a fundação da cidade. A necessidade de adequação aos novos padrões de compra e

o conforto do cliente faz com que muitos dos edifícios restantes do período sejam

descaracterizados ou simplesmente demolidos para dar lugar a lojas maiores e com melhor

infraestrutura.

A partir disso, a pesquisa teve por objetivo, portanto, desenvolver um inventário dos edifícios

de valor histórico e arquitetônico dos séculos XIX e XX, ainda presentes no Bairro Nossa

Senhora das Dores, da cidade de Caruaru a fim de conhecer o patrimônio local e subsidiar a

criação de uma Legislação de Patrimônio Histórico e Artístico no município, ainda

inexistente.

Para atingir o objetivo do trabalho iniciamos os estudos pelo levantamento histórico da

ocupação do município e teórico da arquitetura e urbanismo do Brasil nos séculos XIX e XX.

Após o conhecimento teórico do objeto, iniciou-se o levantamento de campo das edificações

que deveriam ser inventariadas, foram aplicadas fichas e realizado levantamento fotográfico

das casas encontradas o objetivo era catalogar todas as casas ainda existentes e depois

escolher as mais representativas e com maior risco de perda para fazer o inventário. Foram

os dados dessas fichas e da experiência em campo que serão apresentados nesse artigo.

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2. Levantamento do Patrimônio Cultural Material de Caruaru

O levantamento de campo foi realizado com fichas de reconhecimento, nelas continham

informações de uso, implantação no lote, número de pavimentos, sistema construtivo,

revestimento, elementos decorativos de fachada, tipos de esquadrias, coberta, piso e estilo.

O objetivo era levantar todas as edificações residenciais ou comerciais que possuíam valor

histórico e em seguida escolher as que deveriam pelo seu alto valor serem inventariadas. A

decisão de levantar todas as edificações ainda existentes partiu da velocidade das

modificações ou perdas na área central, então para se ter o mínimo de documentação e

registro iniciou-se o levantamento por meio de uma ficha.

Para o início das atividades do Levantamento de Campo a equipe foi preparada com

instrução da ficha, explicação dos conceitos e comportamento durante o levantamento. No

entanto, após ir à primeira visita de campo, dúvidas estilísticas ou de materiais surgiram,

realizamos exposições das fichas executadas e as analisamos para que todos

compreendessem os conceitos e analisassem as edificações corretamente. Outras revisões

foram necessárias para que fossem entendidos os termos e os procedimentos do

levantamento fotográfico, onde foca-se nas fachadas frontais e laterais das edificações.

As visitas a campo (mapa 1) iniciaram no segundo semestre de 2013 com um grupo

formado de quatro estudantes e perdurou até o final do ano, em seguida o ano de 2014 foi

desenvolvido por outro grupo de alunos, com o total de oito estudantes, no entanto esse

grupo diminuiu durante a pesquisa para cinco que continuam trabalhando na mesma.

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Mapa 1: Mapa dos percursos realizados

Fonte: Mapa base: COMPESA e prefeitura de Caruaru (2009)

Foram realizadas várias visitas de campo, devido a área de estudo possuir mais de 100

hectares, os roteiros eram definidos a priori pelos grupos, que faziam o roteiro preenchendo

as fichas, fotogravam, digitalizavam as fichas e passavam as casas encontradas para o

mapa. Com a finalização do levantamento, a área foi dividida em quatro partes de acordo

com sua formação e traçado urbano (AE-01, AE-02, AE-03 e AE-04) para melhor

compreensão da mesma (mapa 2):

AE-01: foi a área em que a Feira de Caruaru se formou e onde permaneceu até

1966, portanto é a área mais antiga da cidade, compreende a Rua 15 de Novembro bem

com a Rua Tobias Barreto, Rua do Sapateiro, Rua dos Guararapes, Rua Duque de Caxias e

Rua Sete de Setembro. Esta área foi delimitada, principalmente, devido os aspectos

herdados do período em que a feira se estabeleceu no local.

AE-02: nesta área estão presentes a Estação Ferroviária e o pátio de eventos Luiz

Lua Gonzaga, onde caracterizou-se a segunda área de expansão da cidade com o advento

da linha férrea, por isso possui a peculiaridade de ter lotes grandes. Há exceção desse

padrão no entorno do pátio de eventos, pois trata da franja do bairro Salgado, bairro antigo e

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popular da cidade e é nessa área que se encontram quase todos os edifícios estudados

desta região.

AE-03: nesta área se encontra a Praça do Rosário é para onde, historicamente, o

uso residencial da cidade expandiu no início do século XX, por esse motivo há uma grande

quantidade de casas e sobrados.

AE-04: esta região também é resultado da expansão residencial que aconteceu na

AE-03 e também tem grande quantidade de imóveis históricos, porém essa região se

distingue da AE-03 por dois motivos, o seu traçado segue a topografia do Morro Bom Jesus

e por ser uma área de interesse social, muitos edifícios permanecem preservados.

Mapa 2: Mapa das áreas de estudo.

Fonte: Mapa base COMPESA e prefeitura de Caruaru (2009), editado pelos autores.

Como resultado do ano de 2014 tem-se a conclusão do levantamento de campo e duas

casas inventariadas. Foram identificadas 466 casas que ainda resistem, essas foram

analisadas de acordo com o estilo, identificamos o ecletismo e o art decó no nosso recorte

temporal, o uso, dividido entre residencial, comercial, misto, serviço e institucional, o

gabarito, de 1 a 5 pavimentos, e o estado de conservação e preservação das mesmas. A

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partir desses dados apresentaremos o estado de conservação e preservação do Patrimônio

Cultural Material do bairro Nossa Senhora das Dores em Caruaru.

3. Estilo das edificações

Caruaru tem a forma de ocupação das cidades coloniais do país, mesmo sendo

desenvolvida no século XIX. A cidade apresentava ocupação edilícia da típica casa colonial,

ou seja, em lotes retangulares estreitos sem recuos laterais e frontais, apenas com recuo de

fundos, o qual servia como quintal. Os telhados tinham duas águas, direcionadas para a rua

e para o fundo do lote, observando quase uma unidade de ocupação, diferenciada apenas

pela altura das casas, que de acordo com a ocupação definiam a rua.

As edificações produzidas na Rua da Frente esteticamente possuem vínculo com o Colonial

com contribuições advindas no século XIX, como as platibandas e a presença de ferro e

vidro. As casas são em porta e janela ou meia morada, nota-se a presença de esquadrias

com duas folhas em madeira e vidro, pinhas de louças e vasos nas platibandas, fachadas

pintadas e algumas azulejadas, conforme pode se ver na imagem abaixo. Era comum a

casa térrea de comércio configurando-se por três ou quatro portas em verga reta ou

arqueada e o sobrado com o térreo comercial e os demais pavimentos residenciais.

A estética, no século XIX, apresentou uma feição eclética e no século XX, foi inserido o

gosto art decó. Como a mudança de padrão foi grande, atualmente tem-se 25 exemplares

em estilo eclético e 433 em art decó. Devido a expressiva quantidade de casas art decó,

dedicamo-nos a seu estudo. O Art Decó advém da Exposition Internationale de Arts

Décoratifs et Industriels Modernes, em Paris, no ano de 1925. O movimento vem como uma

resposta ao anseio de uma arquitetura nova, sem a carga decorativa do Eclético, ele se

constitui como uma busca por modernidade. O estilo caracteriza-se pela geometrização dos

volumes, vínculo formal com navios, por meio das formas aerodinâmicas e elementos como

janelas em escotilha, simplificação de linhas, racionalização, uso do concreto e do

ornamento, boa inserção no lote com valorização das fachadas.

De acordo com Segawa (1998, p.60), o Art Decó no Brasil é “uma manifestação

essencialmente decorativa que propriamente construtivo – embora em certas situações as

fronteiras entre a decoração e a tectônica sejam tênues”. Além disso, o Art Déco imprime

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uma identidade própria local e regional nas cidades brasileiras. O autor ainda argumenta

que

o Art Déco conquistava adeptos populares ao ser adotado, em linhas mais simplificadas, nas vilas operárias em singelas moradias conhecidas como “porta e janela”, em todos com quadrantes do Brasil. Cidades construídas nos anos de 1930-1940 são verdadeiras concentrações de Arquitetura popular de gosto déco, nas mais variadas interpretações possíveis e imagináveis (SEGAWA, 1998, p.72).

De fato, a forma que o Art Déco se manifesta no Brasil varia de região a região tornando-se

mais particular de acordo com as necessidades da população da época. É o que acontece

no Nordeste, o estilo tem suas particularidades na região levando em consideração o clima,

necessidades, custo de vida entre outros fatores que diferenciam a produção nordestina das

demais regiões do Brasil em que o estilo se manifestou.

Na dissertação de Fernanda Farias (2011), a autora identifica três tipos de manifestação do

Art Déco: a Popular, a Streamline/Aerodinâmica e a Escalonada. O Art Decó Popular define-

se por ser resultado de reforma de fachada, com ocupação e implantação representativa

dos edifícios coloniais e ecléticos, implantação no limite do lote, sem recuos, com elementos

de fácil assimilação, como bossagem, chapisco, cimalhas, entre outros elementos.

O Art Decó Escalonado caracteriza-se por edificações que possuem o escalonamento na

composição de fachada, “a implantação na maioria ainda é no limite do lote, mais se

diferencia das “populares” por apresentarem outras características do Art Déco

principalmente o Escalonamento” (FARIAS, 2011, p.45). A maioria dos exemplares é

verticalizada, de dois a três pavimentos e geralmente com o térreo de uso comercial. O Art

Decó Streamline ou Aerodinâmico são muito semelhantes a corrente escalonada, mas

diferem na composição pela marcação horizontal dos volumes, a diferença é meramente

decorativa, não sendo tão relevante na análise. Por isso, a análise de deterá ao Popular e

Escalonado, as variações mais encontradas em Caruaru.

O Art Déco em Caruaru se destaca pela simplicidade das formas, o despojamento dos

elementos decorativos identifica à cultura local e o padrão de vida da população da época,

já que a grande maioria dessas edificações pertencia às classes mais baixas. Assim,

estilisticamente o art decó é mais encontrado em Caruaru na sua variação popular.

Nessa variação há duas origens de composição de fachada: a oriunda de reformas, casas

que eram de outros estilos e foram adaptadas para o gosto em voga e as que já foram

pensadas nesse estilo, sendo essas com implantação recuada. As casas do centro original

possuem fachadas frutos de reforma, sua implantação no lote rememora o tecido colonial,

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com ocupação quase total do lote, volume único marcado com telhados de duas águas e

fachada com composição de porta e janela. Percebeu-se que quanto mais afastado do

núcleo central mais simples a composição ornamental das fachadas das casas e a

implantação inicia a liberação de recuos.

As fachadas da variação popular se caracterizam por sua leveza e simplicidade nas formas,

não há uma busca por simetria total, mas é percebida em suas partes, conforme imagem 4.

A composição base, corpo e coroamento é presente, a base é apresentada na marcação em

chapisco (imagens 1 e 2), o corpo pela área das esquadrias e o coroamento pela platibanda.

É na platibanda que se encontra a maior identidade da variação popular com o estilo art

decó. Nota-se no uso de ornamentos geométricos (elementos 1 e 3 das imagens 1 e 2)

como circunferências e retângulos, além das convencionais marcações horizontais (imagem

1) e verticais (imagem 2) que apresentavam a racionalidade advinda da modernidade.

Imagens 1 e 2. Casa na Rua Jornalista Aníbal Fernandes e Casa na Rua Três de Maio.

Fonte: Acervo da pesquisa, 2014.

O art decó escalonado tem sua implantação e ocupação do lote igual a variação popular, a

diferença entre eles está na composição de fachada. O escalonamento é percebido no

coroamento, a platibanda com a marcação de linhas horizontais e verticais destacadas por

volume e cor delimita e marca uma busca por verticalização. O uso do escalonamento passa

a ideia de grandeza, alongamento, seja ele vertical ou horizontal (como acontece nas

aerodinâmicas). Os exemplares escalonados possuem em sua maioria mais de 1 pavimento

com linhas horizontais definindo-os, quando possuidor de duas fachadas há continuidade na

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composição da fachada frontal e lateral, conforme apresenta-se na imagem 6, o

escalonamento é marcado nas duas fachadas em cima de cada esquadria.

Volumetricamente, o uso de marquises (imagem 3) e varandas (imagem 4) garantem mais

dinamicidade na fachada, somado a isso há uma maior quantidade e variedade de

ornamentação. Além da marcação da cimalha, linhas horizontais e verticais marcam as

vergas, ornamentos geométricos (retângulos e losangos, imagem 3) e esquadrias em

escotilha estão presentes na composição.

Imagens 3 e 4: Sobrado na Rua Duque de Caxias e Sobrado na Rua da Conceição

Fonte: Acervo da pesquisa, 2015.

O acervo art decó ainda presente em Caruaru exibe duas variações importantes que

mostram a cultura estilística da época em que foram construídas. Destaca-se que Caruaru é

uma cidade do interior de Pernambuco e que tinha como referência Recife, no entanto nem

todos os habitantes tinham acesso direto ao que se estava produzindo na capital. Com isso,

tem-se os exemplares escalonados que trazem diversidade nas fachadas, por meio de

volumes, aberturas e ornamentos e os exemplares vernaculares que apresentam como a

sociedade dos séculos XIX e XX apreendiam as “novidades” trazidas pelos turistas e mais

ricos das cidades nas suas casas. Ambos exemplares são ricos por trazerem a análise e

escolha estilística de uma época e de uma sociedade.

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4 Conservação e Preservação das Casas de Caruaru

Esse artigo compreende conservação como o ato de manter em bom estado um bem, a

conservação na arquitetura é de caráter estrutural, é manter um bem em boas condições de

uso para que possam perpetuar. Para análise do estado de conservação das casas

levantadas classificamos o estado de Conservação como integridade física da edificação em

seu caráter estrutural e patológico. Assim, têm-se três estados:

Bom, são aqueles que estão com suas características estruturais intactas e bem

conservadas e apresentam pintura e reboco em boas condições além de integridade

física e boa condição de moradia.

Regular, são aqueles em que parte da estrutura está exposta ou possua rachaduras

nas paredes, porém sem perigo de ruir, a pintura e o reboco podem estar

deteriorados em algumas partes, contudo a edificação não apresenta risco à

integridade física ou a saúde do habitante.

Precário, são aqueles em que a estrutura está danificada e ofereça risco de ruir, a

pintura e o reboco não existem em partes ou no todo oferecendo risco de

deterioração da estrutura, além do risco à integridade física e a saúde do habitante.

Tabela 1: Relação do estado de conservação dos bens por área de estudo

Estado de Conservação dos Bens

Área de Estudo Imóveis

Levantados

Classificação:

Bom

Classificação:

Regular

Classificação:

Precário

AE-01 141 (100%) 109 (77,3%) 29 (20,57%) 3 (2,13%)

AE-02 48 (100%) 46 (95,83%) 2 (4,17%) 0

AE-03 109 (100%) 94 (86,24%) 15 (13,76) 0

AE-04 173 (100%) 138 (79,77%) 34 (19,65%) 1 (0,58%)

TOTAL 471 (100%) 387 (82,15%) 80 (17%) 4 (0,85%)

Fonte: Acervo da pesquisa (2015)

Em análise com a tabela 1, a área em maior número de bens conservados é referente a AE-

02, tendo 95,83% dos bens conservados, nesse recorte do bairro não há grande

especulação comercial, é uma parte residencial próximo ao pátio do forró e a linha férrea. A

AE-1 devido ao grande adensamento de comércio possui a menor porcentagem de edifícios

conservados (77,3%), pois muitas edificações com tipologia comercial foram reformadas ou

ainda residências que se transformaram em comércio para poder adaptar-se a nova

dinâmica econômica.

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Em Caruaru, por meio do levantamento (ver mapa 3), sabe-se que os bens em bom estado

são a maioria com 82,15% do total levantado, os que estão em estado regular constituem

17% do total e os bens em estado precário constituem menos de 1%. Importante frisar que o

trabalho se deteve a levantar edificações que ainda possuíam boas condições físicas, não

levantando ruinas, por exemplo.

Mapa 3: Mapa do estado de conservação dos imóveis.

Fonte: Mapa base da COMPESA e prefeitura de Caruaru (2009), editado pelos autores.

Dentre as características que levaram os edifícios a serem taxados como regulares, a

principal é o desgaste do reboco ou a inexistência dele em algumas partes do edifício,

causada principalmente por infiltrações, salina e a própria ação do tempo, a argamassa de

revestimento se desfez deixando a estrutura em alvenaria aparente, porém sem apresentar

risco de colapso.

A falta de partes da platibanda ou marquises, que caíram com a deterioração desses

elementos também ocorre e rachaduras, principalmente nas marquises, aparecem com

menos frequência. A imagem 5 exemplifica o desgaste do reboco (marcação 1) sob a janela,

causado pela ação do tempo e dos agentes físico-ambientais, também há ausência de

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reboco em algumas partes (marcação 2) expondo parte da estrutura ou neste caso da

alvenaria. Na imagem 6 percebe-se algumas características de bens classificados como

regulares, uma pequena parte da platibanda se perdeu (marcação 1) fruto de deterioração, e

parte da armadura da marquise está exposta (marcação 2), esta, que teve parte do reboco

perdido, provavelmente causado por infiltrações.

Imagens 5 e 6: Estado de conservação de casa na Rua Primeiro de Maio e 3 de maio.

Fonte: Acervo da pesquisa, 2015.

Edifícios em estado precário são raros, porém existentes, e se encontram nessas situações

principalmente por abandono do imóvel, o que é um pouco raro no bairro Nossa Senhora

das Dores, que tem grande valorização do solo devido à intensidade do comércio, então

essas casas se situam principalmente em partes residenciais do bairro, bem como em

regiões periféricas. Um dos exemplares de conservação precária (imagem 7) apresenta a

queda da marquise (marcação 1) que ruiu, a presença de grandes rachaduras nas paredes

(marcação 2) exibindo problemas estruturais, e a esfacelamento do reboco em estado mais

avançado (marcação 3), onde os tijolos também começam a se desfazer.

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Imagem 7: Estado de conservação de casa na Rua Cônego Luís Gonzaga.

Fonte: acervo da pesquisa, 2015.

No geral o estado de conservação das edificações levantadas é satisfatório, e nota-se que o

estado de conservação dos edifícios comerciais é maior, porém esses mesmos edifícios

apresentam pouco interesse em preservação do estilo arquitetônico existente, e pretende

cada vez mais “modernizar” a edificação como forma de atração e bem estar dos clientes.

Quanto à preservação, neste trabalho será entendido pela integridade das características

morfológico-estilísticas predominantes no bem, o respeito e mantimento do caráter de

arquitetura histórica e patrimônio da edificação. Levando em conta textos estudados no

decorrer da pesquisa. As edificações foram classificadas como:

Preservadas: é a casa que mantém suas características originais, é um edifício com

clara definição estilística da fachada, levando em conta as reformas e mudanças nas

quais o edifício sofra atualizações como pintura ou troca de esquadrias, estas últimas

desde que não sofram alteração de dimensões.

Modificadas: é uma casa na qual a fachada sofreu alterações perceptíveis, porém

que não interfiram muito na identificação estilística. São edifícios que geralmente

sofrem alterações como a troca do revestimento da fachada ou da coberta, ou a

mudança das dimensões das esquadrias, que tenham sofrido mudança volumétrica,

como a construção de anexos, além da remoção de elementos decorativos, desde

que não descaracterizem a obra, são imóveis que podem se tornar preservados

mediante restauro.

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Descaracterizadas: são casas com fachadas muito difíceis de denominar o estilo ou

que possui fachadas de estilos diferentes, não tem quase nenhuma característica

original mantida, tão pouco possa se tornar preservado mediante restauro.

Em Caruaru, por meio do levantamento, sabe-se que 77,49% dos bens estão preservados,

21,87% estão modificados e 0,64% dos bens descaracterizados (ver tabela 2). Levando em

consideração o zoneamento da área, nota-se que todas as zonas, com exceção da AE-01,

possuem grande maioria de seus edifícios levantados preservados, enquanto a AE-01

apresenta cerca de 67% classificados como preservados e quase 92% de seus imóveis

classificados como modificados.

Tabela 2: Relação do estado de preservação dos bens.

Estado de Preservação dos Bens

Área de Estudo Imóveis

Levantados

Classificação:

Preservado

Classificação:

Modificado

Classificação:

Descaracterizado

AE-01 141 (100%) 95 (67,37%) 45 (31,92%) 1 (0,71%)

AE-02 48 (100%) 41 (85,42%) 7 (14,58%) 0

AE-03 109 (100%) 87 (79,82%) 22 (20,18%) 0

AE-04 173 (100%) 142 (82,08%) 29 (16,76%) 2 (1,16%)

TOTAL 471 (100%) 365 (77,49%) 103 (21,87%) 3 (0,64%)

Fonte: Acervo da pesquisa (2015).

Deve-se levar em conta que a AE-02 apresenta apenas 10% dos edifícios levantados em

toda a área de estudo, significando que a área perdeu quase todo o seu patrimônio histórico,

devido, principalmente, às mudanças de usos e a descaracterização que o comércio

proporcionou. Além de também apresentar um grande déficit de edificações levantadas na

região central da zona, essa em que a predominância é de edificações modernas e

contemporâneas, caracterizando reformas e a perca do patrimônio eclético e art decó no

decorrer da história para a modernização estilística que a área sofreu.

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Mapa 4: Mapa do estado de preservação dos imóveis.

Fonte: Mapa base COMPESA e prefeitura de Caruaru (2009), editado pelos autores.

Na AE-01 constatou-se que o percentual de edificações classificadas como modificadas é

maior que nas demais, é uma preocupação, já que é a área mais antiga da cidade e os

resultados mostram que a região vem sendo bastante modificada, com a perca quase que

total das edificações dentro de nosso recorte estilístico das ruas 15 de Novembro, antiga rua

da frente, e Duque de Caxias, paralela à primeira. Essas modificações devem aumentar com

a modernização do comércio na área central e com o aumento do uso comercial, que

descaracteriza o casario residencial.

Os edifícios classificados como preservados (imagem 8), se encontram nessa situação

principalmente por estarem situados nas regiões periféricas do bairro ou por haver uma

consciência de preservação por parte do proprietário, o que ocorre raramente. Poucas

mudanças são encontradas nessas edificações, ocorrendo frequentemente apenas a

mudança da cor, seja das paredes, esquadrias ou elementos decorativos.

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Imagem 8: Casas na Rua Dácio Espósito de Lima.

Fonte: Rodrigo Macêdo (maio, 2015).

Nos imóveis classificados como modificados, as mudanças são mais drásticas que nos

preservados e tornam a percepção estilística mais difícil, a construção de anexos às

edificações é bastante comum, principalmente garagens, demanda moderna que antigos

sobrados não tinham. Outra mudança bastante frequente é a criação de comércios nos

antigos recuos frontais e jardins das casas, muitas vezes isolando-as da paisagem urbana

(ver imagem 9).

Imagem 9: Antes e depois da casa na rua 13 de maio

Fonte: Acervo Laboratório da Imagem UNIFAVIP/Devry e Acervo da Pesquisa, 2015.

Ainda ocorrem outros tipos de mudanças como a aplicação de cerâmicas ou porcelanatos

sobre a fachada (imagem 10), sem descaracterização estilística do edifício, essas mudanças

são frutos de uma busca de modernização das edificações pelos proprietários. Apesar disso,

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as características formais e estilísticas dessa edificação ainda são muito marcantes, por isso

foram classificadas como modificadas.

Imagem 10: Aplicação de Cerâmica na fachada de casa na Rua Vidal de Negreiros.

Fonte: Acervo da Pesquisa, 2015.

Mudanças de esquadrias são bastante frequentes e se devem por vários motivos,

desde a degradação da original que levou à troca, até a modernização desejada pelo

proprietário, nessa troca ocorre muitas vezes a mudança das dimensões e dos

materiais, bem como a perda de elementos como bandeiras e beirais sobre a janela.

Nas casas que as esquadrias foram modificadas, mas respeitaram as dimensões e

materiais originais estas não foram inseridas na categoria modificada, mas as que

tiveram mudanças de proporção e modernização total desses elementos foram

definidas como modificadas.

Na imagem 11 abaixo, percebe-se nesse conjunto as mudanças de esquadrias,

proporção e ornamento na composição das fachadas. As esquadrias foram

modificadas por outros modelos e materiais na primeira e terceira casas, só de

modelo continuando com o material madeira na quarta casa e mantém a porta e

janela originais a segunda casa. A terceira casa é a única que ainda contém os

ornamentos e molduras das esquadrias, no entanto também foi a única a modificar a

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proporção das aberturas. Percebe-se a dificuldade da noção de conjunto pela falta

de conhecimento e vontade dos moradores em mantê-la.

Imagem 11: Modificações ocorridas no decorrer do tempo em casas da Rua Vinte e Sete de Janeiro

que eram idênticas no passado.

Fonte: Acervo da Pesquisa, 2015.

Modificações menos frequentes são a troca do revestimento do telhado e a remoção

de alguns elementos decorativos. A troca do material do telhado se deu pela

substituição das telhas cerâmicas, que se degradaram com o tempo, por telhas de

fibrocimento, ou até pela troca do telhado com estrutura de madeira por laje de

concreto armado. Já os elementos decorativos, como jarros, compoteiras, cimalhas

ou pinhas foram retirados pela desvalorização desses elementos decorativos pelo

proprietário ou pela deterioração ou furto desses elementos e que não houve

interesse do proprietário em substitui-los.

Os imóveis classificados como descaracterizados, como já dito, foram os perdidos

no decorrer da pesquisa, são edifícios em que ainda era perceptível a presença de

ornamentos originais, porém tiveram suas características modificadas radicalmente,

descaracterizando sua arquitetura. Por opção dos pesquisadores esses edifícios não

foram levantados, já que o objetivo da pesquisa é realizar um inventario do

patrimônio ainda existente no bairro.

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Imagem 12: Loja na Rua quinze de Novembro em que resta somente uma “casca” da edificação

histórica.

Fonte: Acervo da Pesquisa, 2015.

Ao fim do levantamento, percebe-se que apesar da perda do casario que havia no século

XIX, Caruaru ainda tem muitos exemplares conservados e preservados. No entanto, como

não há um conjunto, só monumentos isolados, é difícil sua compreensão, identidade e

respeito. Os principais problemas de conservação são o interesse em manter e o

entendimento do valor do bem pelos moradores e sociedade e os principais problemas de

preservação dos bens são as reformas de expansão e modernização.

Conclusão

A cidade de Caruaru surge da Feira, e há nela uma “cultura” de feira, ou seja, a

busca pelo novo, a rápida dinâmica, o forte apelo comercial e econômico e o valor

ao efêmero. Assim, proteger o passado em detrimento de uma visão de progresso é

muito difícil. Antes Azulão cantava nas rádios “Caruaru do Passado” rememorando

os espaços e tradições importantes da cidade, hoje há poucos cantores que

relembrem esse momento, em sua grande maioria focam no apelo das relações

sociais atuais.

Além da feira, patrimônio imaterial brasileiro, o São João e o artesanato de Caruaru

são conhecidos e reconhecidos pelos habitantes e turistas, mas o patrimônio

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edificado ainda não é percebido nem por esses nem por aqueles. O acervo de mais

de 400 casas apresenta exemplares ecléticos ricos e art decó de duas tendências

fortemente arreigada na cultura nordestina. O art decó, estilo advindo da França,

chega a Caruaru como composição de fachada, referências trazidas da capital pelos

mais ricos e pelos mestres de obra. A implantação colonial denuncia que as

fachadas foram produzidas por reformas ao gosto da época. Caracteriza-se o

predomínio do art decó, principalmente o popular, mas também presente as

variações escalonada e aerodinâmicas.

O estudo da conservação e preservação apresenta dados animadores,

quantitativamente o resultado é positivo, no entanto a rápida dinâmica de mudança

faz com que seja a cada dia mais difícil encontrar esses exemplares pela perda da

noção de conjunto. A falta da noção de conjunto e a simplicidade do acervo

dificultam o reconhecimento da população pelo acervo ainda existente, por não

formarem um sitio os edifícios tornam-se invisíveis no cotidiano da cidade

progressista e por ser em estilo art decó popular, uma composição simples, não é

percebido ser valor histórico.

A “Caruaru do nosso tempo de menino” pouco a pouco se esvai e a pesquisa luta

pelo reconhecimento e pelo interesse do poder público em criar uma legislação

municipal de proteção a esses bens ainda inexistente. Nota-se que os principais

danos que levam a perda do patrimônio residencial em Caruaru são intervenções

mal sucedidas, reformas de expansão ou modernização, e o principal deles a falta

de conhecimento e valorização pela sociedade do patrimônio material da cidade.

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