AMOR SEM FRONTEIRAS - ieacen.files.wordpress.com · Por que esperar? Seu tutor é um grande amigo...
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AMOR
SEM
FRONTEIRAS Texto de Rosalvino Rodrigues Gouveia
PERSONAGENS
CARLOS
VERA
GAROTO
DAVID
GLÓRIA
DEJANIRA
CLARA
1º MOMENTO
Entra o Garoto, cantando uma canção. Pára de cantar, ao
ouvir a conversa de Carlos e Vera, vinda da casa do Sr.
David.
CARLOS – Que perfume forte você está usando!
VERA – Especialmente para você.
GAROTO (Consigo mesmo) – Mas a voz deste homem é
estranha! (Tenta espiar.).
VERA – Sabia que você não pode demorar aqui, senão o papai
chega e vai querer bater em você?
CARLOS – Então, me dê mais uns beijos, e mãos à obra!
VERA – Não! Não: e se o papai chegar?
GAROTO (Consigo mesmo) – Ih: vai dar coisa errada! (Tenta
subir num cepo, para espiar, e cai.).
VERA – Chega: você tem que ir embora!
CARLOS – Então, eu vou enfiar o ferrinho no buraquinho.
VERA – Então, vamos botar o preto no branco, de uma vez!
CARLOS – Aqui na mesa?
VERA – Na cama: que dá para trabalhar melhor.
GAROTO (Consigo mesmo) – Legal! Vou assistir essa ao vivo
e a cores!
CARLOS – Aqui na mesa é melhor.
VERA – Na mesa é perigoso.
CARLOS – Se cair, do chão não passa.
VERA – Rápido: antes que papai chegue! Mas eu só quero ver
se você vai conseguir!
CARLOS – Claro que consigo: é só abrir bem as pernas, que eu
enfio, com os olhos fechados!
VERA – Pode enfiar: estou esperando!
GAROTO (Consigo mesmo) – Legal... Vai dar pau na
bodeguinha! (Tenta espiar, novamente.).
VERA – Ai, ai, ai! Você me machucou!
CARLOS – Desculpe eu ter empurrado com muita força! (Cai da
mesa, e derruba a parede, ficando com um tripé na mão.).
GAROTO – Ué... O que vocês estavam fazendo?
CARLOS – Repondo um parafuso no tripé, que eu tinha
estragado.
GAROTO – Não me convenceu! Mas por que é que tu querias
que fosse na mesa e ela na cama?
CARLOS – Porque nesta casa não tem banco: só tem cama e
mesa. Agora que você já teve a sua informação, vá embora!
GAROTO (Triste) – Me machuquei todo para ver um casal
arrumando um tripé! (Sai.).
CARLOS – Agora temos mais uma preocupação: arrumar esta
parede!
VERA – Não precisa se preocupar: ela é só encaixada. Não se
preocupe que o papai arruma.
CARLOS – Então, pegue aquele pacote, e abra! Ele é para
você!
VERA (Abre e vê um vestido) – Parece que você adivinhou
que eu estava precisando de um vestido: ainda mais com este
decote gracioso!
CARLOS – Desculpe-me por não ter trazido um melhor!
VERA – Mas por que este vestido?
CARLOS – É porque eu sei que hoje, você está completando os
seus quinze anos.
VERA – Carlos...
CARLOS – Sem comentários!
VERA – Obrigada por ter lembrado de mim.
CARLOS – Que é isso?... Se você quer me agradecer, deixe-me
lhe amar!
VERA – Por que não o deixaria?
CARLOS – Eu acredito que você também me ame!
VERA – Eu?
CARLOS – Sim: quem mais está nesta sala a não ser eu e
você?
VERA – Acho que não devo: tenho medo de te perder e depois
sofrer muito.
CARLOS – Ótimo! Mas... será que me ama o suficiente para me
beijar?
VERA – Claro que sim. (Os dois beijam-se.).
CARLOS – Hoje mesmo, antes de partir, falarei com o Seu
David.
VERA (Grilada) – Espere um pouco.
CARLOS – Esperar? Por que esperar? Seu tutor é um grande
amigo meu, e não vai deixar de permitir o nosso namoro.
VERA – Espere um pouco: tem tempo, não se afobe!
CARLOS – Tá bem... mas, me diga por que esta preocupação
toda?
VERA – Por causa do Marcos...
CARLOS – Marcos? Não precisa explicar nada: eu já entendi...
VERA – Espera: deixa, pelo menos, eu falar...
CARLOS – Está bem: então, fale!
VERA – Sempre pensei que Marcos gostasse de mim, apenas
como prima. Fomos criados juntos: eu me acostumei com sua
afeição e não poderia calcular que ele fosse apaixonado por
mim. Ele me ama... Eu gosto dele, e não quero magoá-lo... pelo
menos, por enquanto...
CARLOS – Afinal, você ama ele ou não? Quanto mais ficar
dando tempo, maior será o seu sofrimento! Desse jeito, ele vai
guardando esperanças!
VERA – Eu não sei como dizer...
CARLOS – Eu acho que isso não é verdade: você tem coragem
bastante, não quer é ser sincera, porque quer ver os homens
sofrerem por você! Isso lhe diverte! Você só pensa em você, e
não pensa nos problemas que pode causar aos outros!
VERA – Também não é assim.
CARLOS – Mas se você quer me ver triste, abandonar todas as
outras mulheres,... (Ela olha-o, surpresa.) Eu faço isso: eu
também sei ser como alguns homens...
VERA – Como você tem coragem de gozar do sofrimento de
seu amigo?
CARLOS – Ele é meu amigo, longe daqui, mas no amor somos
inimigos! Mas, a maior culpada, eu acho que é você, que faz ele
sofrer.
VERA – Então você quer que eu fale com ele?
CARLOS – Sim... Seria muito melhor.
VERA – Ele vai ficar tão abalado quando souber: ainda mais
sabendo que amo outro.
CARLOS – Ele me conhece muito bem, e, se souber que é por
minha causa, ele entenderá, porque ele sabe que, mesmo
pobre, posso fazer você muito feliz!
VERA – Oh: com que calma você fala tudo isso!
CARLOS – Ora, ora: não vamos entrar em detalhes! Eu hoje
falarei com o Seu David: direi a ele que o mais importante neste
momento, entre mim e você, é o amor!
VERA – É que eu não disse tudo, ainda...
CARLOS – Não importa o que você tem para me dizer: eu amo
você e não deixarei de te amor, por comentários.
VERA – David não é só o meu tutor: é também tio de Marcos, e
sabe do amor dele por mim... e...
CARLOS – E o quê?
VERA – Sabe também que eu te amo e que você me ama.
CARLOS – Mas, isso é sério?
VERA – Ele percebeu muito antes de mim, que você me amava.
Não sei por que eu sou tão pacata assim! Eu quero que você
não fique bravo com ele. É natural que ele prefira o Marcos para
casar comigo: ele acha que com você, o meu casamento não
daria certo, porque você é muito sedutor, mas é muito orgulhoso
e pobre!
CARLOS – Mas, até aqui, é uma preferência apenas, que pode
ser mudada, desde que você e eu queiramos.
VERA – Não, não é tão fácil assim. Ele fará tudo o que puder e
o que não puder também, para que o nosso casamento não
saia.
CARLOS – Azar será o dele, porque terá eu como adversário!
Eu não sou o Marcos, que ele faz e acontece. Eu não sou
moleque, para alguém se atravessar no meu caminho. Não me
interessa o que vai acontecer: o meu amor é mais forte do que
qualquer ameaça dele, ou pretexto. Você será minha, e ninguém
poderá impedir que isso aconteça!
VERA – Não devemos temer sua violência, mas a sua
persistência e sedução.
CARLOS – Só temo a sua sedução...
VERA – Seu poder de sedução é muito forte.
CARLOS – Ele nunca poderá me convencer que não te amo.
VERA – Eu quero casar com você.
CARLOS – Mas, antes de tudo, você deve estar certa de que
tipo de amor você sente pelo Marcos: se ama ele apenas como
seu primo.
VERA – Claro que é só como primo.
CARLOS – Explique que tipo de amor você sente por ele.
VERA – Por exemplo: não gosto que ele me beije as mãos –
prefiro que ele me beije no resto.
CARLOS (Em dúvida) – Bem, mas isso não será o amor
verdadeiro?
VERA – Acho que não.
CARLOS – Você acredita em você mesma? E em seu amor?
VERA – Claro que eu acredito.
CARLOS – Você acredita em mim?
VERA – Por que não haveria de acreditar?
CARLOS – Então, hoje à noite, sem esperar pelas preferências
do Sr. David, eu vou levar você comigo. Você terá um ranchinho
legal, com pássaros cantando nas figueiras, frutas, alimentos
sadios, com você sempre sonhou! Você só precisa de um
pretexto para sair! Diga que tem que ir lá...
VERA – Julga-me sem imaginação? O pretexto que você
arrumou agora, de nada valeria, porque dentro de cinco minutos
ele chegará. (Sorri e beija Carlos.) Deixe isso comigo!
CARLOS – Isto não garante nada! Não é o suficiente para um
futuro marido!
VERA – Primeiro tenho que contentar o meu noivo...
CARLOS – Até já, meu amor: o trem nos levará até Novo
Hamburgo, e lá, na Igreja Matriz, o Padre João nos casará!
VERA – Eu te amo, Carlos... Tenho pena do Marcos.
CARLOS – Se quer falar no Marcos e ficar com pena dele, não
escolha a hora que fala que me ama. Nunca faça as duas coisas
ao mesmo tempo: faça primeiro uma, e depois a outra.
VERA – Eu te amo!
CARLOS – Vou embora feliz... Até a noite! (Beijam-se.) Eu já
vou indo, para não encontrar o Sr. David.
DAVID (Entrando) – Por que não queria me encontrar?
CARLOS – Ora, meu querido amigo, porque eu...
DAVID – Sentiria vergonha de falar comigo?
CARLOS – Por quê? A não ser que o senhor estivesse atrás da
porta!
DAVID – Não, não estava atrás da porta: é que eu sou
adivinhão!
CARLOS – Espiando, até eu me torno adivinhão!
DAVID – Vera: me fale com sinceridade – então é verdade que
você ama ele?
VERA – Claro que o amo.
DAVID – Parta senhor! Parta o mais depressa possível! Faça
como se não tivesse me encontrado, segundo o desejo que
exprimiu há pouco. É tão desastrado, que eu acabei sabendo
tudo, dentro de três minutos. Ainda se ao menos pronunciasse
algumas palavras contra mim, eu lhe daria uma surra e tudo
bem: mas não é do senhor que quero saber a verdade. Boa
noite! (Carlos sai, rapidamente, apenas com um olhar
silencioso para Vera.).
VERA – É de mim que quer saber a verdade? Pergunte: estou
esperando. Se quiser saber, eu amo o Carlos, e sei
perfeitamente o desgosto que causo ao senhor. Mas é que me
sinto, sempre, igual a ele. Eu sei que o senhor quer o melhor
para mim, mas o senhor esquece que não é só o dinheiro que é
importante: precisa existir amor, e eu amo o Carlos!
DAVID – Não, não consigo entender! Deixar de amar um
homem rico por um mendigo e leviano!
VERA – Sem essa, agora: eu tenho certeza que só ele me
diverte!
DAVID – Não podes partir com ele hoje, mas ele voltará!
VERA – O senhor tem certeza?
DAVID – Ele te ama e não vai te deixar de mão beijada para o
Marcos.
VERA – Esta paixão me deixa com medo.
DAVID – Por que não escuta música para se distrair?
VERA – Eu não consigo tirar ele da minha cabeça. O senhor
não tem mais nada para me perguntar?
DAVID – Não. Já fiz tudo o que tinha que fazer.
VERA – Não vai tentar impedir minha saída?
DAVID – Vou impedir qualquer tentativa de aproximação dele.
VERA – Eu vou descansar. (Vai para o quarto.).
DAVID – Descansa e tira ele da idéia! (Toca a campainha.
David sai para atender, voltando em seguida, com um
telegrama, que lê em voz alta.) “Por uma melancia o Marcos
morreu. Eu estou quebrado. Estou muito mal. Desejaria vê-la
ainda, pelo menos, uma vez antes de morrer. Venha, até as 12h
de amanhã. Assina Carlos Tavares Pichachau de Oliveira Pinto
da Silva. Rua B – Casa 3 – Quarto C1”. (Pausa.) Vera: venha
até aqui!
VERA – O que foi?
DAVID – Fica aí, e não vá a lugar algum, e nem deixe ninguém
entrar nesta casa. Eu vou dar umas voltas, e já venho. Se eu
pegar alguém aqui, eu mato! (Pega o chapéu e sai.).
2º MOMENTO
Carlos está deitado, com diversos remédios próximos a ele.
Está todo enfaixado. Glória acompanha-o.
GLÓRIA (Olhando para o relógio) – Não tenho mais dúvidas:
você perdeu a aposta.
CARLOS – Já são doze horas?
GLÓRIA – Não: faltam trinta minutos.
CARLOS – Enquanto não forem doze horas, eu não me dou por
derrotado.
GLÓRIA – Francamente, eu não acredito que você ainda tenha
esperanças que ela venha até aqui.
CARLOS – Você vai ver ela entrar correndo, me abraçar forte e
dizer: eu te amo, Carlos!
GLÓRIA – Que idiotice! Se ela tivesse que vir, já teria vindo.
Coitadinho: perdeu tempinho enviando o tal telegrama!
CARLOS – Eu estou certo de que se ela recebeu o telegrama,
virá me ver!
GLÓRIA – Eu não acredito.
CARLOS – Em trinta minutos pode acontecer muita coisa!
GLÓRIA – A coisa que eu acho mais linda numa pessoa é ela
ter esperanças. Mas, se a tua querida não vier, eu não sei o que
poderá acontecer.
CARLOS – Ela virá.
GLÓRIA – Mas se ela tinha que vir, já estaria aqui.
CARLOS – Mas ela não é obrigada a chegar na hora certa!
GLÓRIA – Mas, pelo telegrama, a esta hora, você já estaria
morto!
CARLOS – Mas eu garanto que ela tem rezado bastante para
chegar a tempo de me ver vivo.
GLÓRIA – Mas ela não vai vir aqui. (Toca a campainha.).
CARLOS – Oh, eu não te disse? Ela me ama: tu sabes que o
nosso amor não tem fronteiras! (Glória vai abrir a porta.) O
quê: o senhor David?
DAVID – Sim, eu mesmo.
CARLOS – Onde está Vera?
DAVID – Ela não pode vir...
CARLOS – Pobre de mim... Estou com a cabeça toda quebrada!
DAVID – Com a cabeça quebrada? A Vera não sabe disso.
CARLOS – Então ela não recebeu o telegrama que eu mandei?
DAVID – Não, não recebeu: quem recebeu fui eu! Eu vim no
lugar dela, porque achei que ela ia ficar muito triste. Por isso eu
vim: para saber o que estava acontecendo!
CARLOS (Bravo) – Mas o senhor não devia ter feito isso: se ela
souber, vai ficar muito zangada!
DAVID – Pelo contrário: vai ficar muito contente por eu ter
resolvido este problema por ela.
CARLOS – Então ela não gosta de mim?
DAVID – E por que haveria de gostar?
CARLOS – Porque o senhor disse que ela não ficaria alegre
com o meu acidente. É porque ela gosta de mim.
DAVID – Não, não é porque ela gosta de ti, e sim porque
ninguém se quebre, ou morre...
CARLOS (Joga longe os cobertores e sai só de pijama) –
Glória: vem cá! Eu confesso que tu venceste a aposta. Mas, por
outro lado, me sinto curado, sem dor e sem sangue. (Enquanto
Carlos paga a aposta que fez com Glória, David sai sem
entender nada. Glória sai. Blecaute.).
3º MOMENTO
Abre a luz em David, sentado em volta da mesa, pensando.
Entra Vera.
VERA – O que está acontecendo, papai?
DAVID – Eu estou pensando um pouco.
VERA – Mas pensando em quê?
DAVID – É que a Dejanira chega hoje, e eu terei três inimigos!
VERA – Como três inimigos?
DAVID – Porque tu gostas daquele mendigo e ele gosta de ti: e
a tua mãe sempre é a teu favor! (Toca a campainha. Vera vai
atender e volta abraçada em sua mãe, que está carregada
de malas,) Como está, querida? Que saudades! (Beijam-se.).
DEJANIRA – Tudo bem! E contigo, querido?
DAVID – Mais ou menos.
DEJANIRA – Por que mais ou menos?
DAVID – É que tem um mendigo apaixonado por nossa filha!
DEJANIRA – E como se chama?
VERA (Alegre) – Carlos!
DEJANIRA – Bonito nome! Mas por que ele te preocupa David?
DAVID – É que a faísca da nossa filha não se dá o valor, e se
diz apaixonada por este vagal.
DEJANIRA (Abraça a filha) – Que coisa mais linda: dois
pombinhos que se amam! Convide ele para vir aqui...
DAVID – Não senhora! Eu não quero este mendigo aqui!
DEJANIRA – Mas querido: o que tu tinhas quando nós
casamos?
DAVID – Nada.
DEJANIRA – E agora, vinte anos depois, o que é que temos?
DAVID – Nada.
DEJANIRA – Se nós não temos nada e somos felizes, por que
eles não podem ser?
DAVID – Não aceito e tá acabado!
DEJANIRA – Mas por quê? Tem que haver um motivo mais
forte!
VERA – Mãe: é que o pai sabe que o Marcos é apaixonado por
mim, e acha que eu também tenho que me apaixonar por ele.
DEJANIRA – Mas se o Marcos te ama, o teu pai tem razão:
deixar de casar com um homem rico só porque ama um pobre, é
pura burrice!
DAVID – Viu minha filha, como até a tua mãe sabe das coisas?
VERA (Irritada) – Sabe o que vocês são? Vocês são dois
pirados, egoístas. Se vocês se casaram e não tinham nada, por
que o Carlos é obrigado a ter? Só por que o Marcos tem? Mas
quando ele morrer, para onde ele vai levar o dinheiro que tem?
O Carlos é pobre, mas é honesto. O Marcos é rico, porque é
tramposo, que nem o senhor... meu pai!
DAVID – É: mas o Carlos também é tramposo... Olhe só este
telegrama, dizendo que estava quebrado, e não tinha nada. Era
só para te ver!
VERA – É para o senhor ver como ele me ama. O senhor é que
é um traidor, pois recebeu o telegrama e escondeu, só pra eu
não ir ver o Carlos!
DAVID (Bravo) – Cale-se, antes que eu tenha que te bater! E
caminha já para o teu quarto! (Vera sai, chorando. Dejanira sai
atrás dela. David debruça-se sobre a mesa. Blecaute.).
4º MOMENTO
A luz abre em Carlos que está lendo um livro com o título
“Como Amansar o Futuro Sogro”. Entra Glória, trazendo um
traje.
GLÓRIA – Está aqui o traje do vizinho. Ele te emprestou, e
mandou dizer que é para ti cuidar bem, porque foi com este traje
que ele se casou.
CARLOS (Feliz) – Este Seu João até merece um beijo! (Carlos
veste o traje por cima de uma cueca furada. Coloca uma
meia, rasgada e coloca um sapato. Pega o jornal e lê o
horóscopo.) Áries: um bom dia para realizar negócios. Terá
uma idéia brilhante, que lhe ajudará a conquistar a pessoa
amada. Saúde boa. Conselho do dia – tome cuidado, pois
poderá sofrer lesões nas costas. (Olha a página policial e vê
uma foto de Marcos.) Jovem sai morto com um tiro no peito,
dado por um desconhecido. Segundo testemunha, o assassino
vestia um traje preto com listras brancas, camisa branca e
gravata vermelha. (Carlos pula de alegria e ao mesmo tempo
fica triste porque Marcos era seu amigo. De tanta emoção,
não se dá conta que o seu traje é idêntico ao do assassino.
Sai. Blecaute.).
5º MOMENTO
Abre a luz com Dona Dejanira sentada, escolhendo feijão,
quando Carlos entra correndo sem apertar a campainha.
Dejanira leva um susto.
CARLOS – Onde está a Vera?
DEJANIRA – Primeiramente, quem é o senhor que se atreve a
entrar em uma casa, sem pedir licença?
CARLOS – Desculpe minha senhora: é que eu preciso
urgentemente falar com a Vera. Meu nome é Carlos.
DEJANIRA – É como o David falou: você é muito desajeitado.
Espere que eu vou chamá-la! (Sai e volta com Vera, que salta
no pescoço de Carlos, beijando-o.).
CARLOS – Desculpe, mas eu não trago notícias boas. Olhe
aqui. (Abre o jornal na página policial.).
VERA – Mamãe: o Marcos foi assassinado! (Lê a notícia em
voz alta, enquanto Dejanira observa Carlos. Quando Vera
descreve as roupas do assassino, Dejanira pega um cabo
de vassoura e parte para cima de Carlos.).
DEJANIRA – Foi você que matou Carlos para não ter
concorrente?
CARLOS – Mas eu não fiz nada! (Leva uma paulada na
cabeça e desmaia.).
VERA (Desesperada) – Eu não acredito que o Carlos fizesse
esse tipo de coisa! Eles eram grandes amigos. (Vera procura
levantar Carlos.) Viu o que a senhora fez: ele está morto!
(Dejanira, desesperada, chama David, que entra correndo,
com uma roupa igualzinha a de Carlos.).
DAVID – O que foi?
DEJANIRA (Olhando para Davi, estupefata) – Ou será que foi
tu? (Cai desmaiada. Entra correndo a vizinha, Clara.).
CLARA – O que foi que aconteceu?
DAVID (Boquiaberto) – Não sei vizinha: estou chegando agora.
VERA – Foi o Marcos que foi assassinado por um homem, que
estava vestido com roupas iguais as dele.
DAVID – Foi ele!
VERA – Assim como pode ser o Carlos o assassino, também
pode ser o senhor.
DAVID – Mas não fui eu.
VERA – Veremos.
CLARA – Mas este Marcos não é o que foi enterrado ontem?
VERA – Sim, este mesmo.
CLARA – Então, não precisa ficar se acusando mutuamente,
porque o verdadeiro assassino já está preso.
VERA – Você tem certeza?
CLARA – Absoluta! (David levanta Dejanira e joga água em
seu rosto, até acordá-la. O mesmo faz Vera em Carlos, que
volta a si e olha em torno, vendo Dejanira.).
CARLOS – Segurem esta cascavel!
DEJANIRA – Cascavel é a tua mãe!
CARLOS – Se minha mãe é cascavel, então eu vou casar com
a Vera, que fica tudo em família. A senhora não acha?
DEJANIRA – Eu não acho nada. Se tu não fosses tão atrevido -
analisando bem a situação: o Marcos já morreu, tu já andas bem
vestido -, o que é que você acha querido David?
DAVID – Mas eu tenho que ver se é verdade que o Marcos
morreu. Isso pode ser conversa fiada. Pode ser que o Carlos
tenha pagado o jornal para publicar esta matéria!
CARLOS (Irritado) – O que o senhor está dizendo? Eu não sou
tão descarado! Não sou do seu tipo! Olhe bem para mim, senhor
David: eu lhe conheço há muito tempo! O senhor foi meu amigo,
até descobrir que o falecido Marcos estava apaixonado pela
Vera. O senhor, muitas vezes, estava em encrenca, e quem o
salvava era eu. Se eu sou tão sujo como o senhor procura fazer
com que os outros acreditem, então o senhor é muito mais. Eu
acho que não devia ter vindo aqui, e por isso, já vou indo. (Faz
menção de sair. Dejanira e Vera saltam, pedindo que ele
fique.).
DEJANIRA – Desculpe querido: ele não sabe o que quer!
VERA – Se você for embora, eu vou com você!
CARLOS – Eu fico só se o senhor David pedir desculpas por
todas as palavras desaforadas que já me disse!
DAVID – Isso não! Aí já é humilhação!
CARLOS – Então, o senhor quer que eu abra a boca?
DAVID – Pode abrir.
CARLOS – Tem certeza? A Vera também já sabe?
DAVID – Deixa de ser chantagista!
DEJANIRA – Deixem de brigar, ou será que vai começar tudo
outra vez?
VERA – Dê uma chance ao papai!
6º MOMENTO
Entra Glória correndo, e salta no pescoço de Carlos. Motivo
da alegria: o carnê dele foi contemplado com 20 milhões.
Carlos se mostra feliz, só para ganhar Vera, pois sabe que o
carnê está atrasado. David e Dejanira se abraçam. Todos
parabenizam Carlos.
CARLOS – Para quem não me conhece, essa é Glória, minha
irmã!
TODOS – Muito prazer!
DEJANIRA – David: peça desculpas ao Carlos.
DAVID (Abraçando Carlos, como antigamente) – Grandes
amigos?
CARLOS – Sim. (Todos dão ‘Vivas’, e se abraçam.).
VERA – Obrigado querido por desculpar meu pai.
CARLOS – Que é isso? Para que agradecimentos?
VERA (Enquanto os outros falam ao fundo) – Aproveite,
agora, as emoções, e peça ao papai a minha mão em
casamento!
CARLOS – É exatamente o que vou fazer. (Carlos vai até
Dejanira e David.).
DAVID – Agora folgadão, hein?
CARLOS – Eu quero aproveitar este momento de alegria, para
marcar o casamento da Vera comigo!
DAVID – Com todo o prazer.
DEJANIRA – Pode ser amanhã!
VERA – A gente só vai ao Cartório: sem festas! O que vocês
acham?
GLÓRIA – Uma boa idéia! Festas são só para os outros saírem
falando mal!
CARLOS – Então, está combinado.
VERA – Eu e o meu querido vamos lá ao Cartório! (Todos se
despedem deles.).
7º MOMENTO
Em uma mesa grande estão todos festejando o casamento
realizado.
DAVID – E daí, Carlos, já recebeu o teu prêmio?
CARLOS – Não: o carnê estava atrasado.
DEJANIRA – Seu vagabundo: nem dinheiro tem para pagar um
carnê!
VERA – Agora não adianta brigar: nós já estamos casados!
DAVID – Seu patife: nos traiu!
DEJANIRA – Corre Glória! Fora daqui, traidora!
VERA – Eu te amo, Carlos!
CARLOS (Abraça Vera) – Nosso amor não tem fronteiras!
(Beijam-se. Blecaute.).
FIM