Anais do II Seminario Brasileiro Educação Musical Infantil

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A ISBN 0 Uni ANAIS N: 978-85-60667-72-7 01 a 03 de agosto de 2011 iversidade Federal da Bahia Salvador - Bahia 7

Transcript of Anais do II Seminario Brasileiro Educação Musical Infantil

ANAISISBN: 978

01 a

Universidade Federal da Bahia

ANAIS

ISBN: 978-85-60667-72-7

01 a 03 de agosto de 2011

Universidade Federal da Bahia

Salvador - Bahia

7

Anais do

II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil

V Encontro Internacional de Educação Musical

ISBN: 978-85-60667-72-7

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

Reitora

Profª. Dora Leal Rosa

Vice-Reitor

Prof. Luiz Rogério Bastos Leal

Pró-Reitor de Ensino de Pós-Graduação

Prof. Robert Evan Verhine

Diretor da Escola de Música

Prof. Heinz Karl Schwebel

Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Música

Profª. Ana Cristina Gama dos Santos Tourinho

Diana Santiago, Angelita Broock e Tiago Carvalho

Editores

Anais do

II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil

V Encontro Internacional de Educação Musical

ISBN: 978-85-60667-72-7

Universidade Federal da Bahia

Escola de Música da UFBA

Programa de Pós-Graduação em Música

Salvador, 01 a 03 de agosto de 2011

Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil(2.: 2011:

Salvador, BA)

S471Anais doSeminário Brasileiro de Educação Musical Infantil,VEncontro Internacional de Educação Musical,01 a 03 de agosto de 2011,[recurso eletrônico] / Coordenação Diana Santiago; Angelita Maria Vander Broock Schultz. –Salvador, BA : Universidade Federal da Bahia, 2011.

1 CD-ROM : il.color ; 4 ³/4 pol. Inclui Bibliografias. Evento realizado pela Universidade Federal da Bahia, Escola

de Música da UFBA e Programa de Pós-Graduação em Música. 1. Música. 2. Música instrução e estudo – Infanto-juvenil. 3.

Professores formação. I. Santiago, Diana Título. II. Broock Schultz, Angelita Maria Vander. III. Título. IV. Título: Encontro Internacional de Educação Musical (5. : 2011 : Salvador, BA). III. . Santiago, Diana. IV.

CDD: 780.77

Coordenação Geral: Profa. Dra. Diana Santiago

Profa. Ms. Angelita Maria Vander Broock Schultz

Comitê Científico

Profa. Dra. Diana Santiago

Profa. Ms. Angelita Maria Vander Broock Schultz

Profa. Dra. Alda de Jesus Oliveira

Profa. Dra. Beatriz Senoi Ilari

Profa. Dra. Taís Helena Palhares Foloni

Profa. Dra. Ana Cristina Gama Santos Tourinho

Profa. Dra. Zuraida Abud Bastião

Profa. Dra. Mara Pinheiro Menezes

Profa. Dra. Leila Dias

Prof. Ms. Tiago Quadros Maia Carvalho

Comissão Organizadora:

Profa. Dra. Diana Santiago

Profa. Ms. Angelita Maria Vander Broock Schultz

Profa. Dra. Alda de Jesus Oliveira

Profa. Dra. Beatriz Senoi Ilari

Prof. Dr. Ricardo José Dourado Freire

Profa. Dra. Zuraida Abud Bastião

Profa. Dra. Mara Pinheiro Menezes

Profa. Dra. Ana Cristina Gama Santos Tourinho

Prof. Ms. Tiago Quadros Maia Carvalho

Profa. Kamile Santos Levek

Profa. Larissa Padula Ribeiro da Fonseca

Monitores

Ana Luiza Tomich

Ana Luisa Barral

Gabriel Macedo

Letícia Bartholo

Luan Sodré de Souza

Roseane Ramos Mota

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APRESENTAÇÃO

A Escola de Música e o Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal da

Bahia têm a honra de realizar o II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil /

V Encontro Internacional de Educação Musical, entre os dias 01 e 03 de agosto de 2011.

A motivação inicial em realizar este evento foi a comemoração aos 5 anos do Projeto

Musicalização Infantil da UFBA, pretendendo, através de uma comemoração

acadêmica, promover um intercâmbio de informações entre professores, pesquisadores e

estudantes que se dedicam à área já há alguns anos, além de contribuir para a formação

de professores de educação musical qualificados a atenderem à faixa etária em foco,

necessidade premente no momento em que a legislação torna obrigatória a educação

musical no contexto escolar.

Através de mesas redondas, palestras, workshops, comunicações de trabalhos,

pôsteres e aulas práticas com as crianças, pretendemos nos reunir em três dias intensos,

compreendendo, debatendo, aprendendo, cantando, tocando e, principalmente, vivendo

e trocando grandes experiências com nossos colegas de área. Dentre eles, cumpre

ressaltar a presença de mestres com grande experiência no ensino da música para

crianças, que aceitaram nosso convite para compartilharem suas experiências.

Agradecemos em especial a Alda Oliveira, Beth Bolton, Ilza Joly, Leda Maffioletti, Liu

Man Ying, Luis Bourscheidt, Maria Betânia Parizzi, Ricardo Dourado Freire, Teresa

Mateiro, Ana Favaretto e Márcio Coelho.

A realização deste encontro só foi possível graças ao envolvimento de todos os

membros da comissão organizadora e comitê científico, além do professores do Projeto

Musicalização Infantil da UFBA. Agradecemos especialmente à Professora Beatriz

Ilari, que mesmo estando longe, contribuiu para o evento de forma significativa . Faz-se

necessário também agradecer os nossos apoiadores: CAPES, SONARE, Projeto

“Música para crianças” da Universidade de Brasília, Alecrim Dourado Formação

Musical, Editora Saraiva e Escola Dorilândia, além do Programa de Pós-Graduação em

Música e da Escola de Música da UFBA.

Desejamos boas vindas a todos os participantes e fazemos votos que este

encontro possa gerar bons frutos para a área de Educação Musical Infantil, fortalecendo

a área de Educação Musical no Brasil.

Salvador, 26 de julho de 2011.

Diana Santiago e Angelita Broock - Coordenadoras gerais do evento

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Abertura, Conferência e Mesas Redondas

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Abertura

Musicalização Infantil da UFBA: 5 anos

Angelita Broock PPGMUS/UFBA

[email protected]

Este é um ano de comemoração para o projeto de Extensão Universitária Musicalização

Infantil da Escola de Música da UFBA, pois, embora as aulas para o público infantil

venham sendo ministradas nesta escola desde a década de 60 para crianças a partir de 4

anos, em 2006 iniciou-se um curso voltado aos bebês da comunidade soteropolitana.

Atualmente o projeto contempla aproximadamente 170 crianças de 0 a 6 anos, divididas

por idade em 17 turmas, sendo uma delas o Conjunto Instrumental para crianças de 6 a

10 anos. A equipe de professores, coordenado pela doutoranda Angelita Broock, conta

com alunos do curso de graduação e pós-graduação da Escola de Música da UFBA e

está sempre de portas abertas para receber novos integrantes. Com o intuito de trocar

experiências, todas as aulas são dadas em pares, sendo um professor com mais

experiência que o outro. Ao longo dos 5 anos muitas pessoas já passaram pelo projeto.

Inicialmente foi coordenado pela Profa. Dra. Leila Dias, e durante um ano pela

professora Marineide Costa. Desde o início o projeto teve uma boa aceitação entre os

pais e as crianças de Salvador. Por esta razão, tendo em vista o aperfeiçoamento dos

professores do projeto e visando a qualidade das aulas, sempre antes do início de cada

semestre organizamos uma vivência musical, onde convidamos algumas pessoas da área

para um encontro. O final deste encontro sempre é movido pelo planejamento do

semestre. Desde 2008 optamos por escolher um tema em comum para todas as turmas

durante o semestre. Sendo assim, além do planejamento de conteúdos musicais,

buscamos um repertório musical em comum para todas as turmas. Durante o período de

aulas, realizamos reuniões semanais, com o intuito de compartilhar o que vem sendo

feito em sala de aula, considerando os sucessos e as dificuldades encontradas durante o

percurso, tanto em relação ao grupo quanto em relação às crianças individualmente.

Aproveitamos estes encontros também para discutir aspectos da organização do projeto

e solucionar eventuais problemas. Ou seja, os professores e estagiários tem um

acompanhamento contínuo durante o trabalho. Acreditamos que a Extensão

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Universitária pode ser uma prática muito eficiente para a formação do licenciando em

Música, sendo o espaço propício para pesquisa, experimentações e trocas de

experiências, ou seja, um laboratório escola. A prática docente na extensão

universitária, somada à prática docente na escola regular, pode complementar a

formação do licenciando, que, por sua vez, poderá compartilhar e discutir com o colega

de turma e com o grupo suas certezas e incertezas pedagógicas, que normalmente

refletirão diretamente na sua prática na escola regular.

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Conferência de Abertura

Touch the Future: Make Music with Babies

Beth Bolton

Music provides an ideal medium for the most important aspects of work with children:

listening, and observing, interacting and communicating. Children younger than age 2

years are pre-verbal and are learning about their world through the senses. Sound, sight,

movement, posture, tone, inflection serve as interactive tools as a child learns music as a

first language.

A música é um meio ideal para os aspectos mais importantes do trabalho com crianças:

escuta, observação, interação e comunicação. As crianças com menos de 2 anos são pré-

verbais e estão aprendendo sobre seu mundo através de seus sentidos. Som, visão,

movimento, postura, timbre e inflexão servem como ferramentas interativas enquanto a

criança aprende música como uma primeira língua.

Mesa redonda 1 Educação Musical Infantil: o professor

O Professor de Música e as Articulações Pedagógicas

Alda Oliveira UFBA

[email protected]

Nesta participação sobre o professor para a musicalização infantil, ressalto o que

considero saberes relevantes como articuladores do desenvolvimento musical e geral, da

afetividade, do gosto e alegria pelo fazer musical e artístico, do relacionamento humano

e da criatividade. Na sua formação humana, o professor precisa antes de tudo, ser. Na

sua formação técnica, precisa saber, ser, sentir, ver, saber dar e receber. Precisa

conhecer aquilo que vai ajudar a desenvolver o aprendente naquela área de

conhecimento. Saber observar o outro e o contexto, sentir a tudo e todos que o rodeiam.

Saber respeitar as músicas de todas as culturas, envolver-se com naturalidade com as

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pessoas, com as familias, com as comunidades e com as obras artísticas. Saber confiar

na intuição criadora para desenvolvê-la, saber demonstrar o afeto e o respeito para a

construção de seres humanos mais íntegros, cidadãos e desenvolvidos em todos os

sentidos.

A Música e as Experiências de Compreensão do Outro

Leda Maffioletti FACED/ UFRGS

[email protected]

Neste trabalho discuto alguns fundamentos sobre a capacidade intersubjetiva dos bebês,

o caráter precoce de suas habilidades musicais e o papel que elas desempenham no seu

desenvolvimento sócio-afetivo. Procuro mostrar que as relações interpessoais mediadas

pela música promovem o desenvolvimento sócio-afetivo, com possibilidades de

constituírem-se como modelo intersubjetivo de comunicação, capaz de ajudar a criança

a estruturar suas relações com o mundo. Por outro lado, acredito que o conhecimento

sobre as capacidades dos bebês pode ser uma forma de o adulto perceber-se como

pessoa expressiva e capaz de conectar-se com o outro através da música. Com base nos

argumentos apresentados convido os ouvintes a se comprometerem um pouco mais com

a difusão do conhecimento científico, a fim de transformar o conhecimento que detemos

sobre música em atos responsáveis em favor do acesso de todas as crianças à Educação

Musical.

Professor de Educação Musical Infantil: o generalista e o especialista

Teresa Mateiro Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil

Universidade de Örebro, Suécia [email protected]

A formação profissional para a educação infantil é um tema que abre

possibilidades de discussões múltiplas, desde a própria história do professor como

profissional docente, reconhecido e valorizado até as necessidades formativas em

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educação musical para a formação inicial de professores generalistas1 e de professores

especialistas em música. É a partir da lei 9394/96 que a formação de profissionais de

educação infantil começa a ser realmente discutida. O debate maior encontra-se junto

aos cursos de pedagogia. Primeiro, por ser uma formação até há pouco oferecida pelos

antigos Cursos Normais, em nível médio, que habilitava o profissional para atuar no

ensino primário (7 a 10 anos), jardins de infância (3 a 6 anos), escolas maternais (2 a 3

anos), classes pré-escolares (6 anos) e creches (0 a 6 anos ou até 10 ou mais). E

segundo, pela possível falta de identidade dos cursos de pedagogia, questão discutida

desde a década de 60, e reconstruída com a LBD de 1996 que assegura a formação

docente paralelamente às outras funções do campo pedagógico (Kishimoto, 1999).

A formação musical dos estudantes dos cursos de pedagogia tem sido discutida

principalmente por Bellochio (2004, 2008a, 2008b) e Figueiredo (2004, 2007).

Bellochio (2008a) argumenta que nos primeiros anos de escolarização as crianças

aprendem de “modo conjunto e não em compartimentos nos quais cada área apresenta

proposta independente” (p.2) e, por isso, propõe uma formação pedagógico musical

mais qualificada para o professor generalista de educação infantil. Figueiredo (2004)

acredita que os professores generalistas podem contribuir significativamente com a

educação musical, uma vez que os professores especialistas em música raramente atuam

nas primeiras séries do ensino fundamental. Ambos ressaltam que não se trata de

substituir o professor licenciado em música.

Acerca dos cursos de Música-Licenciatura, ao realizar uma pesquisa durante o

ano de 2008, não identifiquei um programa que priorizasse a formação docente para a

educação infantil (Mateiro, 2009, 2011). Entretanto, não posso deixar de mencionar

trabalhos de extensão relacionados ao ensino e à pesquisa realizados na área de

educação infantil, como por exemplo, o Projeto de Musicalização Infantil iniciado por

Beatriz Ilari em 2005 na Universidade Federal do Paraná, que motivou estudantes de

licenciatura em música a se identificarem como professores da infância (Ilari, 2010).

Naquela ocasião afirmei que no Brasil temos um único modelo de profissional

apesar dos projetos políticos pedagógicos expressarem intenções de formar profissionais

com diferentes perfis. Penso que os professores que irão trabalhar na educação infantil

não poderão receber exatamente a mesma formação daqueles que serão regentes de

corais adultos. Por isso, tenho proposto que os programas curriculares de formação

1 Outros termos são também utilizados na denominação desse profissional: unidocente, professor de classe, regente de classe, não especialista, entre outros.

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docente em música sejam elaborados vislumbrando diferentes perfis para os futuros

professores de música (Mateiro, 2009, 2011).

Os estudos sobre a formação de professores e os estudos acerca da organização

de currículos tem utilizado o conhecimento pedagógico do conteúdo como uma

ferramenta de pesquisa, criando possibilidades para compreender o conhecimento do

professor sobre a forma de pensar o ensino. O professor é visto, portanto, como alguém

que elabora conhecimentos e não apenas como alguém que transmite conteúdos

aprendidos a priori. Este é um tema que tem me interessado.

Pesquisas especificamente na área de educação musical sobre o conhecimento

profissional de professores de música no ensino fundamental e médio e professores de

instrumento (Ballantyne e Packer 2004; Ballantyne 2006; Jorquera Jaramillo 2008),

assim como com estudantes em formação docente (Campbell e Burdell 1996; Mateiro,

2003), têm sido levados a cabo em diversas partes do mundo. Esses estudos analisam o

conhecimento necessário ao ensino de música nas escolas relacionando-o, por vezes, ao

programa de formação docente. As pesquisas mostram que a dicotomização entre os

conhecimentos musicais e pedagógicos parece ser um aspecto comum apontado tanto

por professores de música recém-formados quanto por estudantes em formação, ou seja,

aspectos relacionados ao conhecimento pedagógico do conteúdo é uma área que

necessita maior atenção. O conhecimento pedagógico do conteúdo contempla a

combinação entre o conteúdo da matéria e a prática pedagógica, ou seja, a forma como

o professor ensina.

Saber sobre o que se ensina e saber como ensinar é, sem dúvida, fundamental na

formação de qualquer professor. Tanto as disciplinas de pedagogia da música quanto o

período de práticas dos estudantes durante o período de formação docente deveria

desenvolver habilidades e competências para que os futuros professores sejam capazes

de articular efetivamente o conhecimento do conteúdo (o que) e o conhecimento

pedagógico de conteúdo (como). Esse processo educativo do estudante em formação

implica o domínio de conhecimentos técnicos musicais, o conhecimento de diversos

métodos e abordagens de educação musical, a reflexão sobre a prática pedagógica de

profissionais da área e sobre sua própria prática como professor em sala de aula.

Portanto, a construção desse conhecimento na estrutura curricular dos cursos de

Música-Licenciatura não pode estar restrita às aulas de disciplinas curriculares como

metodologia de ensino, didática da música ou outras disciplinas afins, pois trata-se de

um conhecimento criado na ação, ou seja, em situações de ensino e aprendizagem.

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Consequentemente, torna-se imprescindível a valorização das disciplinas relacionadas

aos estágios curriculares que privilegiam a formação de novas competências,

estimulando o estudante a ser um professor criativo e reflexivo sobre sua própria

prática. É importante no desenvolvimento da formação profissional tanto do estudante

em formação quanto do professor em exercício que eles possam ser autores de novos

conhecimentos que integrem conteúdos, atividades e contextos.

Diante do exposto caberia discutir modelos de formação profissional, qualidade

da formação profissional, valorização do profissional da educação infantil, concepções

de educação musical para a infância, a oferta de competências necessárias ao educador

no interior dos programas curriculares, tanto de Pedagogia quanto de Música-

Licenciatura ou, ainda, quais as perspectivas que se vislumbram para a formação do

profissional de educação infantil em nível superior considerando a necessidade de

expansão dessa formação.

Predisposições e Neurociência: que devemos ensinar na educação

musical do pré-escolar?

Diana Santiago UFBA

[email protected]

Revisitando um trabalho anterior de minha autoria que trata das predisposições a serem

ensinadas na aula de música ao pré-escolar, apresento aspectos biológicos do desenvolvimento

cerebral conforme a literatura específica. Pretendo, assim, contribuir com uma discussão sobre

os conhecimentos que fundamentam a elaboração do currículo musical para esta faixa etária.

Mesa redonda 2

Educação Musical Infantil: a criança

A Música e o Desenvolvimento Cognitivo-Musical na Educação Infantil

Maria Betânia Parizzi UFMG

[email protected]

A Música exerce profundas influências no ser humano. Estudos recentes

realizados por neurocientistas confirmam questões que já vinham sendo colocadas por

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pesquisadores da psicologia da música e da educação musical: a música provoca estados

emocionais, promove alterações fisiológicas, provoca reações motoras e promove

modificações cognitivas (PERETZ et al, 2009; PERETZ e ZATORRE, 2005; TURNER

e IOANNIDES, 2009; ILARI, 2006; PANKSEPP e TREVARTHEN, 2009; SACKS,

2007; LEVITIN, 2006)

Essa influência pode ser nitidamente percebida desde muito cedo na vida. O

comportamento dos bebês frente a estímulos musicais manifesta características

singulares, bem diferentes daqueles observados frente a outros estímulos. Por esta

razão, a música passou a ser considerada um importante veículo capaz de atrair a

atenção do bebê muito precocemente na vida (REIGALDO et al, 2008). Mesmo antes

dos três meses, os bebês já se mostram capazes de desenvolver “protoconversas

expressivas” com seus pais ou cuidadores por meio de gestos e vocalizações, o que

reflete uma predisposição da criança em compartilhar impulsos, interesses, ações e

significados com o adulto (MALLOCH e TREVARTHEN, 2009). Essa pré-disposição

para a comunicação, que se manifesta nas vocalizações e na alta sofisticação de

movimentos de cabeça, rosto e de membros dos bebês durante seus momentos de

interação com os adultos, é uma manifestação da “Musicalidade Comunicativa” do

bebê: “habilidade inata e universal que se ativa ao nascimento, vital para a comunicação

entre as pessoas, que se caracteriza pela capacidade de se combinar o ritmo com o gesto,

seja ele motor ou sonoro” (MALLOCH, 1999/2000; MALLOCH e TREVARTHEN,

2009).

A musicalidade comunicativa está na base da comunicação humana e impulsiona

o desenvolvimento da criança. Essa forma de interação do bebê com as pessoas

apresenta características nitidamente musicais e tem sido objeto de estudos recentes

(SHIFRES, 2007; MALLOCH e TREVARTHEN, 2009; PARIZZI, 2006, 2009, 2010;

BEYER, 2003a, 2003b, 2005). Os bebês parecem ser dotados de uma capacidade

musical diferenciada de outros aspectos de seu desenvolvimento psicológico

(REIGALDO et al, 2008) e esta é uma importante razão para se justificar o aprendizado

da música desde os meses iniciais de vida, (BEYER, 2005; CARNEIRO, 2006;

REIGALDO et al, 2008; PARIZZI, 2010). Este aprendizado tem se configurado como

um processo capaz de estimular não apenas o desenvolvimento musical da criança,

como também o refinamento de outras habilidades físicas e mentais (PARIZZI, 2010;

CARNEIRO e PARIZZI, 2011). A prática sistemática da música envolve um

refinamento sensorial variado, desenvolve habilidades motoras complexas, alimenta a

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criança com sonoridades que serão vitais na aquisição da linguagem e em sua

capacidade expressiva ao longo da vida (PARIZZI, 2010; CARNEIRO e PARIZZI,

2011).

Reforçando o pressuposto de que todo ser humano é dotado de uma habilidade

inata para se comunicar – “a musicalidade comunicativa” (MALLOCH, 1999/2000;

TREVARTEN, 1999/2000), é importante que o educador musical ofereça ao bebê

experiências musicais expressivas que terão como objetivo “provocar” e “ativar” o

desejo do bebê de se comunicar com as pessoas, por meio de gestos, seja o gesto motor

(movimentos de cabeça, membros ou de todo o corpo) ou sonoro (balbucios)

(CARNEIRO E PARIZZI, 2011).

A partir do segundo ano de vida, o bebê expande, cada vez mais, o seu repertório

de recursos para se comunicar com o mundo. Um recurso poderoso instala-se de forma

gradual e definitiva: a capacidade de utilizar símbolos (PIAGET, 1982/1966). Essa

grande conquista se manifesta principalmente na aquisição da linguagem, nos jogos de

faz-de-conta ou jogos imaginativos, nos desenhos e nos cantos espontâneos. Esses

recursos revelam “o que se passa na cabeça da criança”. O canto espontâneo evidencia

não apenas como ela “pensa” a música, mas também como ela percebe o tempo, uma

vez que as características temporais da música se manifestam nessa forma de expressão

da criança.

O jogo de faz-de-conta representa o prazer da criança em praticar tudo o que ela

já assimilou do mundo. Através do jogo, ela pratica e amplia sua capacidade de utilizar

símbolos (PIAGET, 1982/1966). A criança usa a voz, o corpo e os objetos para se

expressar e o canto espontâneo é uma forma de jogo de faz-de-conta. Ela cria seus

cantos enquanto brinca. Assim, os jogos de faz-de-conta integram-se aos cantos que,

muitas vezes, narram eventos da vida da criança ou “cantam” histórias criadas por elas.

Os jogos de faz-de-conta contribuem não apenas para o desenvolvimento de

habilidades cognitivas como também sociais. Vygotsky (1978, p. 108) já antecipara esta

idéia afirmando que, “sob uma lente de aumento, o jogo contêm todas as possibilidades

de desenvolvimento de uma forma condensada, constituindo-se ele próprio numa grande

fonte de desenvolvimento”.

O desenvolvimento da linguagem falada abre para a criança possibilidades

inovadoras. A internalização do comportamento proporcionada pela linguagem acelera

o ritmo com o qual as experiências podem ocorrer (PIAGET, 1982/1966).

17

Todas essas formas de representação devem ser consideradas no processo de

desenvolvimento musical da criança na educação infantil. A linguagem, o jogo de faz-

de-conta, o desenho e a música são suas mais importantes formas de expressão e

representam sua maneira de perceber e de se integrar ao mundo. Diante desse contexto,

o educador musical deve considerar que o jogo de faz-de-conta deve ser o ponto de

partida de experiências musicais prazerosas que devem privilegiar, principalmente, a

performance corporal e instrumental, a audição de obras musicais e a criação de cantos

espontâneos; essas experiências podem ser verbalizadas pelas crianças que, assim,

manifestam o que perceberam e sentiram, podendo criar relações com outros eventos de

suas vidas; finalmente, elas podem registrar ou desenhar suas experiências musicais por

meio de garatujas, roteiros ou outras formas livres de grafia (BAMBERGER, 1990).

Outro fator que contribui ainda mais para a eficácia dessa abordagem pedagógica é a

possibilidade da interação entre os alunos mediada pelo educador musical, o que

certamente promoverá o desenvolvimento cognitivo-musical e habilidades de interação

social dessas crianças.

Esse conjunto de experiências consolida de forma integrada o desenvolvimento

cognitivo-musical da criança nesta etapa da vida: a música mobiliza emocionalmente,

provoca reações motoras e fisiológicas, promove modificações cognitivas na criança.

Cabe ao educador musical o importante papel de mediador neste processo.

Música na Infância: influências e desdobramentos no desenvolvimento infantil

Ilza Zenker Joly UFScar

[email protected]

A proposta dessa mesa redonda tem por objetivo trazer subsídios para reflexão das

possíveis contribuições da música para o desenvolvimento infantil, em especial aqueles

relacionados à crianças com idades entre 08 meses e 04 anos de idade. Autores que

contribuem para a área de educação musical, psicologia, desenvolvimento humano e

educação fazem a base para essa discussão, que surgiu da necessidade de conhecer os

prováveis desdobramentos das atividades de sala de aula na vida das crianças, tendo em

vista as possíveis influências da música no desenvolvimento global destas e a melhoria

na oferta dos cursos oferecidos para a comunidade, ampliando com isso o leque de

possibilidades de aplicação e produção da educação musica param esta faixa estária.

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Um olhar específico sobre as relações entre crianças e adultos, pensando na relação que

se dá, por meio da música, entre os bebês e seus pais ou cuidadores será discutido, de

maneira que possamos refletir coletivamente sobre a importância da música na

constituição dos laços afetivos construídos na primeira infância. Um resgate das ações

musicais que são realizadas no Laboratório de Musicalização da Universidade Federal

de São Carlos, por meio de inúmeras pesquisa lá realizadas será o ponto de partida dessa

reflexão.

Elaboração de Metodologia Brasileira para Ensino Coletivo de Violino

Liu Man Ying ECA - USP

[email protected]

O presente artigo apresenta uma nova proposição metodológica do ensino coletivo de

violino, com uso de elementos musicais das melodias folclóricas brasileiras na

confecção de exercícios para a aprendizagem do instrumento; a grande maioria das

escolas e projetos sociais que empregam o ensino coletivo de violino utiliza apenas

métodos estrangeiros, onde constatamos o intenso uso de música regional e folclórica

destes países, que são muitas vezes desconhecidas pelos nossos alunos brasileiros. A

música folclórica auxilia na identificação musical do aluno com o material, facilita o

aprendizado do instrumento além de fornecer um variado e abundante escopo técnico

para o ensino do violino. Diante de tal panorama, constatamos a necessidade de

estabelecer bases e diretrizes para uma metodologia de ensino coletivo de violino

fundamentada nos elementos da música brasileira; escrita em língua portuguesa para

facilitar a compreensão dos alunos quanto às propostas técnicas e metodológicas

apresentadas; que apresente passo a passo os fundamentos da técnica do violino pelo

método de ensino coletivo através de melodias folclóricas brasileiras.

A Criança e o Outro: interações significativas na infância

Prof. Dr. Ricardo Freire

UNB [email protected]

19

As aulas de musicalização, em muitos casos, oferecem as primeiras atividades de

interação da criança em um ambiente educacional coletivo. O professor passa a

compartilhar a atenção da criança, que antes estava focada principalmente na mãe e na

família. Durante as aulas são realizadas atividades com várias outras crianças e seus

familiares, sendo que nesses momentos são estabelecidas importantes relações de troca

com o ambiente social. Na aula existe uma comunicação verbal e não-verbal constante

entre os diversos atores no processo: a criança, as mães/pais, o professor, os monitores,

outras crianças e outros adultos. De acordo com Lev S. Vigotski, a alteridade é a base

para a emergência da consciência do eu. É a partir da relação significativa com o outro

no contexto da experiência mediada que ocorre o desenvolvimento dos processos

psicológicos. Na relação entre duas pessoas, a interação é parte essencial para a

formação da consciência do eu, e neste caso do eu musical. Edwin Gordon (2000)

caracteriza a fase de internalização de conteúdos musicais e as primeiras tentativas de

explorações vocais como fase de Balbucio Musical. Da mesma maneira que a criança

desenvolve a fala a partir das interações balbuciadas na troca com o outro mediada pela

linguagem discursiva, torna-se essencial a interação e desenvolvimento da linguagem

musical por meio do balbucio musical em um contexto socialmente compartilhado.

Interações significativas entre o professor e a criança, entre os familiares e a criança ou

entre crianças são fatores fundamentais para o desenvolvimento completo da criança,

tanto na dimensão afetiva, social, cognitivo como na dimensão musicais.

Comunicações

II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil Escola de Música da UFBA, PPGMUS - Salvador, de 01 a 03 de agosto

21

Professoras de séries iniciais e a obrigatoriedade do ensino da música: impactos e primeiras impressões

Poliana Carvalho de Almeida [email protected]

Resumo: Vence neste ano de 2011, o prazo legal para o cumprimento efetivo da lei federal que tornou, em 2008, o ensino da música obrigatório em todos os níveis da educação brasileira. Infelizmente, é perceptível que somente agora, vencido o prazo, as discussões sobre esse novo dispositivo legal alcançam os espaços escolares e seus profissionais. Este artigo tem como objetivo refletir sobre as primeiras impressões de professoras unidocentes da rede pública de Santo Amaro sobre a Lei 11.769/08. Baseio-me para tanto em três frases proferidas por professoras participantes do curso para formação continuada em música, oferecido pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia – Campus Santo Amaro a professores de séries iniciais da educação básica. Após a introdução deste texto segue-se os três tópicos nos quais cada uma das frases será analisada de forma a estabelecer sob que circunstâncias e cotidianos escolares elas se fundamentam.

Palavras chave: Educação musical, escola pública, formação de professores

Introdução

Com a aprovação da Lei 11.769/08 surgem, entre os educadores musicais,

manifestações que vão desde uma euforia crédula de que agora, amparados legalmente, a

música ocupará um lugar importante na escola, até um sentimento de desesperança por parte

dos que ao longo dos anos tem vivenciado o vai e vem das políticas públicas educacionais que

constroem e desconstroem ações e quase sempre são determinantes do fracasso da educação

musical brasileira.

Após a leitura de algumas publicações sobre a Lei 11.769/08, resolvi posicionar-me

ativamente em favor de sua implementação efetiva nas escolas públicas. Acredito, porém,

que a existência de uma determinação legal não basta por si só para mudar determinada

realidade, neste caso a situação do ensino da música.

As políticas públicas para a educação musical e artística não têm contribuído para uma mudança significativa na situação dessas áreas atualmente. Mesmo depois das novas legislações (LDB, PCN, Diretrizes Estaduais e Municipais) as artes em geral continuam a ser tratadas de maneira irrelevante, mesmo quando alguns sistemas educacionais já adotaram a contratação de profissionais específicos para cada linguagem, o que já é um avanço com relação aos tempos da polivalência. (PENNA, 2008, p. 25).

Como então fazer cumprir-se tal dispositivo legal se o cenário é de uma demanda de

escolas muito superior à quantidade de profissionais qualificados para o ensino da música

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nestes espaços? Se pensarmos na situação das séries iniciais do ensino fundamental o quadro

ainda piora, pois aí temos um único professor responsável pelo ensino de todas as disciplinas,

inclusive Artes, função para a qual nem sempre recebeu formação, em nível de graduação,

suficiente.

Cabe, então, as administrações públicas, aliadas a instâncias formadoras, promoverem

a capacitação destes profissionais para o ensino da música, uma vez que muito dificilmente

veremos surgir milagrosamente até 20111 quantidade suficiente de licenciados em música que

atendam a demanda das escolas públicas brasileiras de educação infantil de ensino

fundamental I.

Por ter formação em educação musical e ensinar numa instituição pública2 que me

possibilita a atuação nas áreas de extensão e pesquisa, me senti co-responsável pela

implementação da lei 11.769/08, elaborei um curso de formação3 para professores

unidocentes das séries iniciais do ensino fundamental da rede pública de Santo Amaro-Ba.

A seguir destacarei em três tópicos algumas falas de professoras participantes do

curso, a fim de discutir suas primeiras impressões sobre a Lei 11.769/08.

Impressão 1: “Além de tudo, ainda tenho que ensinar música”

Em nosso primeiro contato, no grupo de formação, procurei saber o quanto as

professoras sabiam sobre a lei 11.697. Elas, de forma geral, responderam que nunca tinham

lido o texto da determinação, mas sabiam que o ensino da música tornou-se obrigatório em

todas as séries. Algumas demonstraram certo descontentamento, pois, além de terem que lidar

com questões desafiadoras como alfabetização nas séries iniciais, dentre outras, deverão agora

se incumbir do ensino de uma disciplina para a qual o curso de pedagogia não as preparou, e,

para a qual se sentem incapazes.

Este descontentamento deixa patente o lugar pouco privilegiado que ocupa a Música e

as Artes na hierarquia das disciplinas escolares e também nos cursos de formação de

professores para séries iniciais.

Pais e responsáveis de crianças da educação infantil e séries iniciais preocupam-se

quando constatam “falhas” no processo de alfabetização, mas não se importam muito com o

1 Período em que expira o prazo para implementação da lei segundo seu Art. 3º: “ Os sistemas de ensino terão 3 (três) anos letivos para se adaptarem às exigências estabelecidas nos arts. 1° e 2° desta Lei.” 2 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia – Campus Santo Amaro 3 O curso teve início em junho de 2011, com 14 professoras da rede pública matriculadas, terá carga horária de 80h com previsão de término em setembro de 2011. Este curso é um projeto da Coordenação de Pesquisa e Extensão do IFBA- Santo Amaro.

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desenvolvimento artístico de seus filhos. Desde 2004, como professora de musica em escolas

públicas, nunca ouvi de um pai: “Por que meu filho ainda não consegue cantar afinado?”

[...] o professor que é responsável pelas matérias consideradas “nobres” no programa escolar (matemática, por exemplo) é diversamente avaliado pela administração escolar, pelos alunos e pelas famílias. Entretanto, os que são responsáveis por matérias pouco valorizadas no cômputo geral devem fazer prova de maestria para “prender” a atenção dos alunos e estimular seu empenho nos saberes transmitidos.(VASCONCELOS, 2002, p. 309)

Quando falamos sobre realidade no sentido educacional, nos remetemos ao ambiente

escolar, à instituição escola. Nesta “realidade” constrói-se o que denomina-se cultura escolar

que é definida por Júlia (2001) como:

[...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas, finalidades religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de socialização. (JULIA, 2001, p. 41)

Ao colocar a cultura escolar como mediadora da prática profissional docente, Júlia

leva-nos a crer que as singularidades da mesma produzem diferentes perfis profissionais, em

outras palavras, culturas escolares específicas de determinados contextos escolares podem ser

relacionadas à construção de diferentes práticas profissionais.

A cultura escolar, que reproduz e ao mesmo tempo questiona a sociedade, carrega

alguns preconceitos. Um deles, fundamentado na hierarquia dos conhecimentos e disciplinas

escolares. A citação abaixo exemplifica algumas conseqüências dessa hierarquia:

Recorramos ao que por vezes ocorre nos Conselhos de Classe: a “hierarquia” que se encontra no currículo faz com que se valorizem diferentemente os conhecimentos escolares e “justifica” a prioridade concedida à Matemática em detrimento da Língua Estrangeira ou da Geografia. Nessa hierarquia, se supervalorizam as chamadas disciplinas científicas, secundarizando-se os saberes referentes às artes e ao corpo. Nessa hierarquia, separam-se: a razão da emoção, a teoria da prática, o conhecimento da cultura. Nessa hierarquia, legitimam-se saberes socialmente reconhecidos e estigmatizam-se saberes populares. Nessa hierarquia, silenciam-se as vozes de muitos indivíduos e grupos sociais e classificam-se seus saberes como indignos de entrarem na sala de aula e de serem ensinados e aprendidos. Nessa hierarquia, reforçam-se relações de poder favoráveis à manutenção das desigualdades e das diferenças que caracterizam nossa estrutura social. (MOREIRA e CANDAU, 2006, p. 23 e 24).

Cláudia Bellochio (2003) confirma a existência de uma cultura estabelecida no

contexto educacional baseada na tradição de não valorizar determinadas disciplinas do

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currículo. Tal tradição, segundo a autora, atinge as disciplinas artísticas, que quando presentes

na escola “servem, na melhor das hipóteses, para deixar o ambiente mais bonito e agradável”

ou como apoio as disciplinas mais nobres do currículo.

A cultura escolar hierarquiza conhecimentos baseando-se em critérios estabelecidos

pela sociedade sobre o que é importante ser aprendido e, portanto, ser ensinado. A música,

segundo o discurso pedagógico brasileiro corrente, é importante, mas na prática escolar

prevalece a idéia de que ela não é tão necessária quanto língua portuguesa e matemática.

Sendo assim o professor elegerá também suas prioridades a partir do que lhe é cobrado

socialmente, seguindo uma hierarquia disciplinar historicamente construída, mantendo uma

lógica circular de desvalorização do conhecimento musical e artístico que concretizada a cada

nova geração de estudantes.

Impressão 2 – “Será que isso vai dar certo?”

Em sua maioria o grupo de formação é composto por professoras que atuam sistema

público há mais de cinco anos, portanto estão acostumadas a verem suas práticas pedagógicas,

de tempos em tempos, atingidas pelo vai e vem político ideológico das políticas educacionais

brasileiras. Mal nos adequamos ao anterior eis que chega um novo pacote, pronto; neste ponto

minhas colegas professoras questionam ao se depararem com a 11.769/08: Será que isso vai

dar certo? E algumas, menos esperançosas, mas não menos experientes em matéria de sala de

aula, afirmam: Isso não vai dar certo.

Após uma atividade de musicalização4 uma das professoras perguntou se eu elaboraria

um manual de atividades musicais e outra disse: “Eu nem quero tentar. Com meus alunos?

Na minha sala? Olha gente, vocês não sabem como é lá na escola. Se eu fizer essa atividade

lá os meninos acabam com tudo.”

Para quem não tem os pés no chão de uma sala de aula de uma escola pública, a fala

dessa professora revela descompromisso e acomodação apenas. Proponho olharmos por outro

ângulo.

A constatação de que nenhuma instituição pública educacional participou ou foi

consultada durante o processo de elaboração e aprovação da lei 11.769/08 é extremamente

preocupante. Sendo assim não podemos ser intolerantes com a professora que afirma que

4 No programa do curso de capacitação em questão constam atividades musicalização para os professores com objetivo de desenvolver e potencializar suas habilidades musicais através de atividades de canto, movimento e percussão corporal.

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“isso não vai dar certo”. Está fadado a não dar certo, pois, os atores principais do processo,

aqueles que porão em prática a lei, foram postos a parte de sua construção.

O debate envolveu músicos atuantes na mídia, entidades musicais diversas, políticos e educadores musicais, mas causa estranheza a ausência de representantes das escolas públicas. O locus de efetivação das propostas não foi presença efetiva nos debates, fazendo pressupor que o consenso podia não ser tão amplo como se aparentava e que o dispositivo legal seria imposto às escolas, e não resultado de suas demandas. (SOBREIRA, 2008, p.47).

A oposição à idéia de projetos educacionais elaborados como receitas culinárias

prontas e acabadas, não se resume a nos negarmos a fazer um manual de atividades musicais.

Devemos transformar essa oposição em ações de forma que possamos nos unir a nossas

colegas professoras unidocentes num esforço colaborativo para a construção de seus próprios

manuais de atividades musicais, adequados a suas realidades.

O educador musical que se propõe a capacitar professores para o trabalho com música

deve estar envolvido na realidade da sala de aula. Não é fazer do grupo em formação um

laboratório de pesquisa experimental, mas tomar parte no cotidiano escolar de seus

participantes, acompanhando o desenvolvimento de suas práticas pedagógico-musicais.

A impressão de incerteza e desconfiança explicitadas no questionamento “será que

isso vai dar certo?” estará a poucos passos de ser substituído nos discursos dos professores

pela afirmação “isso pode dar certo”, quando as instituições formadoras de educadores

musicais envolverem-se com a escola pública e seus profissionais de tal forma que sejam

capazes de juntos elaborarem planejamentos educacionais musicais executáveis.

Impressão 3 - “Preciso aprender isso direito porque eu vou ter que ensinar depois”

A frase acima foi dita por uma das colegas professora participante do curso quando

estávamos conceituando as propriedades sonoras.

Como podem ensinar o que não sabem? Talvez este seja um dos argumentos mais

utilizados pelos que acreditam que não permitir a professores unidocentes ensinar conteúdos

musicais é garantia de que teremos nossos “empregos” como licenciados em música

garantidos e também certa “qualidade” no ensino da música nas escolas.

O discurso academicista tem, há muito tempo, pregado objetivos inatingíveis para os

não iniciados musicalmente. Por vezes ouvimos relatos de pessoas que se frustraram ao

tentarem se aproximar de uma educação formal na área de música. Mas se por um lado não

podemos cobrar virtuosismo musical dos professores unidocentes, por outro lado é necessário

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garantir que eles possuam habilidades musicais e pedagógicas suficientes para o ensino de

música.

De forma alguma pretendo com o comentário acima compartilhar com a idéia da

mensagem 622 de 18 de agosto de 2008, que justifica o veto5 ao artigo 2º da Lei 11.697,

transcrita em parte a seguir: “Vale ressaltar que a música é uma prática social e que no

Brasil existem diversos profissionais atuantes nessa área sem formação acadêmica ou oficial

em música e que são reconhecidos nacionalmente. Esses profissionais estariam

impossibilitados de ministrar tal conteúdo na maneira em que este dispositivo está proposto.”

A música é uma linguagem e, como tal, possui códigos específicos capazes de

produzir discursos, em certos níveis, acessíveis apenas àqueles que detêm o conhecimento de

tais códigos. Os saberes musicais são transmitidos de geração a geração graças também a

esses códigos. Um bom músico, mesmo dominando os códigos da linguagem musical, nem

sempre pode ser considerado um professor de música em potencial, pois, cada vez mais,

tomam corpo as especificidades técnicas e metodológicas para o ensino da música, em

especial quando destinadas a escola básica. Tais conhecimentos pedagógicos específicos que

vem destacando a Educação Musical concedendo-a status de área do conhecimento6 precisam

ser estudados por professores de música. Sobre isso comenta a educadora musical e

pesquisadora Cláudia Bellochio:

Esse campo de saberes carrega especificidades de conhecimento musical e de conhecimento pedagógico, sem, no entanto, delimitar prescrições de como agir na situação educacional, que é carregada de situações específicas da prática. Para ensinar, é preciso que se compreenda a educação e esta em seus constituintes psicológicos, filosóficos, antropológicos, sociológicos, pedagógicos. Para ensinar música, é preciso que se compreenda música nos constituintes acima apontados. (BELLOCHIO, 2003, p. 22).

Sendo assim, temos como objetivo, que professoras participantes do grupo de

formação desenvolvam habilidades musicais adequadas à demanda de sua realidade e também

adquiram conhecimentos de metodologias da música que possam alicerçar uma prática

pedagógica musical significativa. Ao contrário do que esperava nosso grupo de formação

mostrou-se muito disposto a realizar as atividades de musicalização. As professoras gostam

de música, de cantar e tentam, na medida do possível, fazer a música presente em suas salas

5 Ao ser sancionada a lei 11.769/2008, teve vetado o parágrafo 2ª que afirmava: “O ensino da música será ministrado por professores com formação específica na área.” 6 Luciana Del Ben discute esta questão no artigo “A delimitação da Educação Musical como área do conhecimento: contribuição de uma investigação junto a três professoras de Música do Ensino Fundamental” publicado em 2001 na revista Em Pauta, v. 12, n. 18/19, p.65-93.

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de aula. Enxergar na música, obra de arte apreciada, conteúdos musicais educacionais é um

passo seguinte de uma longa caminhada, difícil, mas possível.

O cenário ideal em que cada escola pública terá um licenciado em música no seu

corpo docente ainda está longe de ser vislumbrado, e se tornará cada dia mais utópico se nós,

educadores musicais nos fecharmos nos limites de nossa área com atitudes territorialistas e

excludentes.

Considerações finais – “Eu quero música na escola”

Durante o primeiro módulo do curso de capacitação em música para professores das

séries iniciais, deparei-me com expressões reveladoras sobre que tipo de impressões a

aprovação da lei de obrigatoriedade do ensino da música nas escolas brasileiras causou fora

dos círculos da educação musical. As expressões comentadas são de professoras unidocentes

de escolas públicas de educação infantil e ensino fundamental. Ao comentá-las procurei partir

do meu olhar com professora da rede pública, tentando, assim, expandir a discussão sobre a

Lei 11.769/08, para além da dos limites restritos da área de música.

Apoiada por outros educadores, defendo que uma medida legal não é suficiente por si

só para garantir mudanças significativas no cenário educacional brasileiro.

As inquietações que as falas analisadas deixam transparecer podem ser justificadas (1)

por uma cultura escolar que impõe à música um lugar desprivilegiado dentro da hierarquia das

disciplinas e saberes escolares, (2) pela insuficiência ou ausência do ensino das linguagens

artísticas e suas metodologias de ensino nos cursos de formação de professores para séries

iniciais e (3) pelo distanciamento entre as instancias formadoras de educadores musicais e

cotidiano escolar brasileiro.

Garantir a educação musical dos pequenos brasileiros que freqüentam as escolas de

educação infantil e ensino fundamental, mais que lei, deve ser compromisso dos educadores

musicais.

Para além das polêmicas sobre quem deve ou quem pode ensinar música na escola,

devemos estar atentos aos que realmente podem fazer a lei sair do papel. Como não nos é

possível realizar o milagre da multiplicação dos licenciados em música, cabe-nos o

engajamento em ações que promovam a formação e capacitação dos profissionais da

educação que poderão nos ajudar na tarefa de musicalizar. Não propondo aos unidocentes

pacotes prontos, como se tais profissionais não tivessem nada a oferecer, mas buscando a

construção colaborativa de propostas em educação musical adequadas ao chão da sala de aula.

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Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro. A formação profissional do educador musical: algumas apostas. Revista da Abem, n. 8, p. 17-24, mar. 2003. DEL BEN, Luciana. A cultura escolar como objeto histórico. Em Pauta, Rio de Janeiro, v.12, n. 18/19, p. 65-93, 2001. JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História da Educação, Campinas, n. 1, p. 9-44, 2001. MOREIRA, Antônio Flávio B.; CANDAU, Vera. Maria. Currículo, conhecimento e cultura. In: BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. Indagações sobre currículo. Brasília: 2006. PENNA, Maura. Caminhos para a conquista de espaços para a música na escola: uma discussão em aberto. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 19, 57-64, mar. 2008. SOBREIRA, Sílvia. Reflexões sobre a obrigatoriedade da música nas escolas públicas. Revista da Abem, Porto Alegre, V. 20, 45-52, set. 2008. VASCONCELLOS, Maria Drosila. O trabalho dos professores em questão. Educ. Soc. [on-line], Campinas, v. 23, n. 81, Dec. 2002.

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Construção de Instrumentos de Percussão: uma experiência na educação

infantil

Maria Luiza Feres do Amaral UNIVALI

[email protected]

Laísa Carvalho da Silva Soares

Eduardo Venturini de Souza

Resumo: Este artigo relata a experiência de Estágio Supervisionado realizada no Centro de Intervenção e Estimulação Precoce – CIEP- Vovó Biquinha, instituição educacional sem fins lucrativos que atende crianças com necessidades educacionais especiais, crianças de risco social e no padrão normal de desenvolvimento, em Itajaí – SC. Os sujeitos envolvidos nesta experiência foram os dois acadêmicos do 4° período do Curso de Licenciatura em Música da Universidade do Vale de Itajaí - UNIVALI. Nesta instituição todas as turmas têm como nome um animal e a turma LEÃO foi o público alvo, composta de 15 alunos com idades entre 5 e 6 anos. O tema escolhida para desenvolver as atividades musicais foi a construção de instrumentos de percussão com materiais recicláveis objetivando trabalhar e desenvolver a coordenação motora a partir de brincadeiras de ritmo, promovendo o interesse, o contato com a música e a consciência ambiental. Especificamente se pensou em compor uma canção para a turma leão, apresentar os instrumentos de percussão, conhecer os sons dos instrumentos confeccionados, diferenciar timbres dos instrumentos, divisão rítmica, relacionar o ritmo das sílabas dos nomes dos animais, apreciar os elementos rítmicos da musica africana e melhorar a coordenação motora. Como resultados se podem apontar o trabalho com a música de uma maneira ampla, despertando o interesse pela mesma, o contato com diversos instrumentos de percussão e o desenvolvimento da criatividade de forma individualizada das crianças, bem como e cooperação em grupo. As atividades foram fundamentadas em Jeandot (1997); Brito, (2003), Almeida & Pucci (2003) e Del Ben, Luciane & Hentschke (2002).

Palavras - chave: Educação infantil, construção de instrumentos, educação musical

Apresentação

A criança mesmo antes de nascer já tem contato com uma grande variedade de sons.

Sons estes produzidos pela própria mãe como o som do coração, som da voz, entre outros,

que mesmo sem perceber está estabelecendo um tipo de linguagem com seu filho. Quando a

criança nasce se depara com um universo de sons produzidos pelos seres vivos e por objetos,

pois, na maioria dos povos é muito comum que a mãe cante para seu bebê e assim passa

acontecer os primeiros contatos com a música.

Para Jeandot (1997) “a criança não é um artista, nem um ser meramente

contemplativo, mas antes de tudo um ser rítmico-mímico, que usa espontaneamente os gestos

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ao sabor da sensação que eles despertam.” (JEANDOT, 1997, p.19) Partindo deste

pensamento, podemos dizer que é através destes estímulos sonoros e da experimentação dos

sons que a criança desenvolve seus sentidos e constrói seu conhecimento sobre música.

Tendo em vista a importância da música no desenvolvimento da criança se objetivou -

se especificamente trabalhar a partir da prática de atividades musicais que obtivessem o

conhecimento básico sobre propriedades do som e ritmo, uma vez que é de suma importância

na formação do aluno.

Existe uma estreita relação entre a música, educação, e as pessoas com necessidades

de educação especial. Pois, as atividades musicais têm papel importante na formação e no

desenvolvimento do individuo como um todo, justificando sua inclusão no contexto

educacional e social. Muitas manifestações artísticas como a música, aparecem predominantes

em diversos relatos de experiências e pesquisa como ferramenta na qualidade de vida e na

mudança de comportamento das pessoas como o trabalho de Louro (2003) as adaptações a

favor da inclusão do portador de deficiência física na educação musical: um estudo de caso.

Desta forma, o aprendizado musical do mesmo modo como a criação são essenciais

para que as crianças tenham acesso e vivenciem de forma integral as informações e o

conhecimento mediante avaliação continua e formativa. O ensino de música deve ser

construído a partir do fazer musical e da “realidade” dos alunos, contemplando seus

interesses, preferências e saberes. Desenvolver habilidades, atitudes e valores considerados

necessários para a formação do individuo como cidadão. (DEL BEM; HENTSCHKE, 2002).

Neste sentido Correia comenta que,

O som e, conseqüentemente a musica, tem um impacto direto sobre as funções motoras e o sistema vegetativo passando a construir um valioso instrumento auxiliar no diagnostico medico e na promoção do desenvolvimento de potencialidades físicas, mentais, emocionais e sociais do homem. (CORREIA, 2001, p.38).

Na busca de um aproveitamento efetivo da música na escola, através do tema

escolhido foi possível trabalhar com a música de uma maneira ampla e compartilhar com as

crianças as experiências vivenciadas e desenvolvidas até o momento no processo de formação

acadêmica.

O objetivo central do trabalho a ser desenvolvido seria a construção de instrumentos

de percussão culminou com a filosofia da escola. Pois a escola realiza atendimento

educacional, social, nutricional, psicopedagógico; estudo e pesquisa para a clientela de alto-

risco e necessidades educacionais especiais. Além disto, capacitação de recursos humanos

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através de cursos e treinamentos para professores e campo de estágio, bem como grupo de

pais para troca de experiência e orientações específicas.

Assim, na escola há muitos materiais para se trabalhar com as crianças, principalmente

instrumentos musicais confeccionados pelas mães dos alunos. Pois, na escola existe um

projeto chamado “Uma conversa salva uma Vida” que atende a comunidade em geral,

orientando pais ou responsável pela criança. Com isso as mães fazem um trabalho de

“voluntariado” uma vez por semana confeccionando instrumentos através de materiais

recicláveis.

Procedimentos

Para atingir os objetivos, esta experiência partiu de uma visita técnica com o objetivo

de colher dados e conhecer a estrutura física e pedagógica da escola Vovó Biquinha.

Em uma segunda etapa uma aula diagnóstica permitiu aos professores conhecer o

público alvo que era formado por crianças de 5 e 6 anos num total de 15.

Com objetivo de trabalhar e desenvolver a coordenação motora a partir de brincadeiras

de ritmo e confecção de instrumentos de percussão com materiais recicláveis, promovendo o

interesse, o contato com a música e a consciência ambiental, se optou por atividades

interativas, de cooperação e criatividade.

Os materiais didáticos usados foram: Violão, flauta, garrafas plásticas, cabos de

vassoura, latinhas de alumínio, palitos de churrasco, fitas adesivas, cola, tinta guache, cd de

áudio, desenhos e partituras

As avaliações se deram por meio de participação, colaboração, criatividade,

reconhecimento dos elementos trabalhados e percepção auditiva.

Os registros das intervenções se deram por meio de relatórios, fotografias e vídeo.

Relato de Experiência: o fazer musical na educação infantil

Na visita técnica se pode conhecer o espaço escolar, que atende crianças de 0 a 6 anos

e realiza atendimento educacional, social, nutricional, psicopedagógico; estudo e pesquisa

para a clientela de alto-risco e necessidades educacionais especiais; capacitação de recursos

humanos através de cursos e treinamentos para professores e campo de estágio; grupo de pais

para troca de experiência e orientações específicas.

As professoras da turma LEÃO, comentaram aos estagiários que utilizam à música nas

aulas através das canções, onde as crianças dançavam, pulavam e também interpretavam a

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música no papel por meio de desenhos. Assim, a primeira intervenção teve como objetivo a

interação e socialização entre todos e a apresentação do planejamento das aulas de música

para que todos pudessem ter maior conhecimento sobre ela.

A primeira atividade planejada foi a criação de uma canção com o nome da “Turma

Leão” e assim se pediu para as crianças dizerem o que elas sabiam sobre o as características

do leão com o propósito de formas frases e compor a letra da música. Assim através das ideias

apresentadas foram sendo formadas as frases e sendo harmonizadas pelos professores ao

violão. Além da composição foi sendo adicionada para as crianças uma pequena coreografia

que representasse o rugido do leão.

Na segunda intervenção se deu inicio a confecção de instrumentos de percussão

divididos em 3 aulas e os escolhidos foram a clava, chocalho, reco – reco e o maracá. Toda a

atividade contou com o auxilio dos professores para a organização com atenção e cuidado

diante de sua execução. Desta forma, em um primeiro momento foi feita a apresentação da

clava e reco-reco, partindo dos conceitos básicos que os caracterizam e as crianças puderam

em seguida manuseá-los, assim eles puderam experimentar conhecendo as formas e como são

tocados. Logo após se começou a confecção da clava e do reco- reco pelas crianças e

concordando com as palavras de Brito quando diz que “as crianças devem ser estimuladas a

pesquisar materiais e objetos que produzam sons interessantes, pois, antes de construírem

instrumentos musicais, elas os descobrem em materiais que se transformam a um simples

toque”. (BRITO, 2003, p. 72).

Esta etapa foi consideravelmente difícil, pois se tratava do manuseio de materiais

como: tintas guache, papéis coloridos e fitas adesivas, o que exige certa cautela. A confecção

dos instrumentos foi terminada, mas não se conseguiu concluir a decoração de todos os

materiais, faltando poucos detalhes por conta do tempo de aula. Na terceira intervenção se deu

continuidade à confecção de instrumentos de percussão, sendo confeccionado neste módulo o

chocalho. Apresentado os conceitos básicos que o caracterizam se passou para o manuseio de

alguns chocalhos, a fim de experimentarem e conhecerem as formas e como são tocados.

Nesta tarefa as dificuldades foram às mesmas da aula anterior, pois se tratava do manuseio de

materiais como latinhas feitas de alumínio fino e com isso um maior cuidado para não cortar a

pele da mão das crianças. Para completar o proposto se deu a construção deste instrumento.

Para Brito,

O trabalho na área de música pode (e deve) reunir grande variedade de fontes sonoras. Podem-se confeccionar objetos sonoros com as crianças, introduzir brinquedos sonoros populares, instrumentos étnicos, materiais

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aproveitados do cotidiano etc., com o cuidado de adequar materiais que disponham de boa qualidade sonora e não apresentem nenhum risco à segurança de bebês e crianças. (BRITO, 2003, P. 64).

Pôde-se observar a cada intervenção, o aproveitamento e a resposta positiva por parte

das crianças sobre a atividade, havendo muita colaboração de todos em cada processo da

tarefa. Além disto, se observou características específicas das crianças, algumas mais ativas,

participativas, enquanto outras precisavam de um acompanhamento mais expressivo por

serem mais quietas e naturalmente acomodadas, outra com dificuldade de locomoção o que

exigiu maior atenção. A partir desta intervenção se procurou abrir novas possibilidades de

estratégias de aula que se adaptassem a esta realidade, solucionando algumas deficiências dos

professores quanto à diversidade encontrada.

Dando continuidade, o instrumento trabalhado em sala de aula foi o Maracá. Esse

talvez tenha sido o instrumento de maior dificuldade para a sua confecção, por utilizar mais

materiais e pelo processo longo e detalhado que os demais instrumentos construídos

anteriormente. Antes de começar com a confecção dos instrumentos foi revisada a música

Turminha do Leão com as crianças para maior fixação da letra e melodia e para surpresa dos

professores a música estava na “ponta da língua”, eles já cantavam sozinhos sem

acompanhamento instrumental. Com o ensaio finalizado foi feito uma exposição do

instrumento para que as crianças conhecessem a forma e o timbre, após a demonstração passo

a passo e auxiliando as crianças em um processo lento que exige paciência e disposição, tanto

dos alunos quanto de nós estagiários. Foram utilizados pedaços de madeiras de 30 cm,

garrafas plásticas de aproximadamente 500 ml, arroz para a emissão do som dentro da garrafa,

e materiais decorativos como: fitas adesivas coloridas, papéis coloridos, durex e fita isolante

branca. Ao final de todo o trabalho se pode perceber que utilizamos mais de 1 hora com todo

o processo. Conseguindo finalizar o trabalho pode observar uma melhora quanto ao

comportamento de algumas crianças, na turma temos um aluno imperativo, que em quase

nada das atividades queria participar, visto que quando confeccionado a clava, ele participou

pintando com tintas guaches, nas histórias contadas ele tocava a clava ou chocalho. Esse

instrumento foi o que as crianças mais gostaram, pois estavam bem animadas e participativas.

“Muitos outros instrumentos poderão ser descobertos se as crianças tiverem a chance de

contar com materiais variados e também com a orientação e o estímulo do educador ou da

educadora.” (BRITO, 2003, p. 74).

Dando seqüência ao planejamento, o próximo objetivo foi de experimentar os

instrumentos confeccionados mostrando a divisão silábica de cada instrumento com sílabas de

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palavras e figuras dos animais como: a monossílaba rã correspondia a semínima, a dissílaba

ga – to correspondia a duas colcheias e a polissílaba pas – sa – ri – nho correspondia a quatro

semicolcheias. Assim, se trabalhou em cima dessas divisões, porém não se conseguiu alcançar

o objetivo das crianças tocarem na divisão correta, mas elas conseguiram marcar a pulsação

quando solicitada. Ao final da intervenção se pode avaliar que se atingiu o alvo principal que

era de instigar a percepção musical das figuras rítmicas e dos sons que as crianças têm desde

quando nascem.

Diante de tudo o que foi desenvolvido nesta experiência musical as palavras de

ALMEIDA e PUCCI (2003) justificam o trabalho realizado, pois, “concebemos a música

como uma das expressões humanas, uma das muitas linguagens utilizadas pelo homem para

falar de si, do seu grupo social e de suas impressões sobre o mundo. (ALMEIDA; PUCCI,

2003, p.15). Essas atividades foram de suma importância no desenvolvimento integral das

crianças, pois se pode realizar um trabalho interdisciplinar, o que nos abre uma dimensão de

outras áreas e só tem a acrescentar em nossa experiência acadêmica e profissional.

Ao dar inicio a intervenção (análise e pesquisa do corpo docente, no qual busca – se

através de pesquisas, levantar dados qualitativos e quantitativos visando a eficiência e

abrangência educacional), se pode observar o quanto houve progresso das crianças e mesmo

com as dificuldades encontradas n esta diversidade, os conteúdos foram bem aproveitados.

Logo se deu a prática da nova etapa de aula a partir da música de origem africana YAYÈ

BÖBÖ do livro “Outras Terras Outros Sons” de Almeida e Pucci (2003). Assim que foi

colocada a música no aparelho de som se despertou a curiosidade das crianças por se tratar de

um repertório desconhecido para elas. O mais incrível disso tudo é que com poucos minutos

de ensaio as crianças já haviam absorvido o conteúdo e já estavam acompanhando cantando a

melodia. Para declarar sobre a devida importância da influência de outras culturas através de

repertórios musicais ALMEIDA e PUCCI comentam que

Para ouvir e cantar canções de outros povos, com sonoridades diferentes das que estamos habituados, faz-se necessário que despertemos em nós a curiosidade pelo novo e pelo outro, isto é, pelo que não conhecemos, mas somos capazes de entender. (ALMEIDA; PUCCI, 2003, p.10).

Desta forma, dando continuidade se começou a ensaiar a música YAYÈ BÖBÖ com o

objetivo final de utilizar os instrumentos percussivos preparados nas primeiras aulas e com o

acompanhamento da música. Além disto, as crianças estariam trabalhando o cantar a melodia,

e também obtendo a noção básica de pulso e organizar uma apresentação final para a escola

deste conteúdo. Em que com poucos minutos de ensaio as crianças já haviam absorvido o

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conteúdo e já estavam nos acompanhando cantando a melodia junto. Dando continuidade a

respeito da organização da turma colocamos todos juntos somente em um canto da sala para

que tivéssemos melhor visão deles e assim simular a apresentação que ocorreria desta mesma

forma, porém no lado de fora da sala. Alguns alunos colaboraram como de costume, outros se

distraíam facilmente, mas apesar de convivermos com essas barreiras desde o início do nosso

estágio percebemos que em geral todos aproveitaram a aula. Um ponto interessante que

observamos durante o ensaio, foi o fato de que os alunos entenderam rapidamente onde

queríamos chegar. Com certeza acreditamos que o peso que se deu através do planejamento

da apresentação fez com que eles tornassem mais preocupados com o andamento em que

tinham de se preparar.

Nesta última intervenção consistiu unicamente da apresentação organizada e ensaiada

na aula anterior. Deu-se inicio com um curto ensaio para deixá-los confiantes e preparados

antes de se apresentarem para toda a escola. Alunos de outra Escola estavam visitando o

CIEP. Por este motivo a apresentação ganhou uma proporção maior do que a esperada e

superou nossas expectativas diante dos objetivos pensados para a última intervenção. Logo

após com a turma sentada, onde os meninos sentados atrás e as meninas sentadas na frente

com os instrumentos em suas mãos. Feita uma breve explicação dos objetivos da apresentação

e se deu o ponto e partida que foi onde as crianças tocam e cantaram as duas músicas

trabalhadas no ambiente escolar. Se pode considerar que as crianças tiveram sucesso absoluto,

além do fato que toda a escola, contando com os alunos, direção e visitantes, pareceram

aprovar a amostra dos trabalhos desenvolvidos em sala de aula, criando laços musicais e

servindo ao futuro dessas crianças.

Considerações Finais

O estágio supervisionado é de grande importância para o crescimento do acadêmico

como profissional e como ser humano por ser a melhor maneira de ele aplicar seu

conhecimento obtido nas diversas áreas do curso.

Foi gratificante dedicar todo este tempo para as intervenções mesmo sendo um

trabalho exaustivo e que exige bastante do aluno como profissional.

O que mais impressionou, foi que apesar de todas as dificuldades impostas antes de se

iniciar as intervenções, se concluiu esta etapa com maior consciência da preparação que o

docente deve ter e conhecer mediante a uma diversidade de pessoas.

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Trabalhos como este são de suma importância na escola para que as crianças possam

se desenvolver de forma integral e com qualidade.

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Referências

ALMEIDA, M. Berenice; PUCCI, Magda Dourado. Outras Terras Outros Sons. São Paulo, 2003. BRITO, Teca Alencar. Música na educação infantil. São Paulo, Peirópolis, 2003. CORREIA, C. Musica e saúde. In: I Fórum Catarinense de Musicoterapia, 2001, Florianópolis. Anais... Florianópolis, 2001. DEL BEN Luciane; HENTSCHKE, Liane. Educação Musical escolar: uma investigação a partir das concepções de três professoras de música. Revista da ABEM Porto Alegre, n. 7, p. 49-57, setembro 2002. JEANDOT, Nicole. Explorando o Universo da Música. São Paulo: Scipione, 1997.

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O Brincar no Processo de Escolha de um Instrumento Musical

Larissa Rosa Antunes UnB - Projeto Música para Crianças

[email protected]

Samara Pires da Silva Ribeiro UnB - Faculdade de Educação

[email protected]

Ricardo Dourado Freire UnB - Projeto Música para Crianças

[email protected]

Resumo: Dentro de um processo de escolha o ato de brincar pode ser uma ferramenta importante, pois envolve a relação do imaginário com o real, a função afetiva e principalmente pode proporcionar uma vivência significativa, pois é um ato inerente de todo ser humano, principalmente da criança. Pensar em um processo de escolha de um instrumento musical envolve as experiências musicais da criança e a sua relação com o instrumento que se conhece. O conhecimento pode ser dado por diversas práticas, como as relatadas neste trabalho, que exemplificam a atuação com crianças que irão optar por um instrumento musical.

Palavras chave: Instrumento musical, jogo pedagógico musical, educação musical infantil

No processo de escolha de um instrumento pode ser valorizada uma postura de

curiosidade pelo novo. Cada instrumento oferece um tipo de relação física e social com a

música. A afinidade entre crianças e instrumento pode ser o elemento inicial para despertar o

interesse para a escolha. Uma experiência inicial de conhecimento dos instrumentos e suas

características — apreciação do som, da forma e do movimento — pode oportunizar uma

vivência real e concreta antes da escolha final.

A escolha do instrumento musical por crianças de 5 a 6 anos de idade envolve a

curiosidade pelo novo, e neste contexto as atividades realizadas por meio da brincadeira

adquirem uma forma de expressão da música e de ludicidade deste processo. Entre as

questões que surgiram para a realização deste trabalho, destacam-se: Até que ponto as

experiências lúdicas que a criança tem ao longo do seu desenvolvimento são importantes para

a escolha de um instrumento musical? Como a utilização de recursos pedagógico-musicais

pode auxiliar no processo de escolha de um instrumento musical?

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Contexto

O presente trabalho é a continuação de uma pesquisa desenvolvida, no ano de 2010, no

contexto do programa de extensão “Música para Crianças” da Universidade de Brasília, que

atende crianças de 0 a 10 anos. O programa “Música para Crianças” proporciona aos

integrantes vivências musicais separadas por cursos. No curso destinado a crianças de 5 a 6

anos, denominado Pré Instrumental (PI), são oferecidas oficinas vivenciais trabalhando os

fundamentos da linguagem musical e propiciando o contato com diversos instrumentos

musicais. Um dos seus objetivos é preparar as crianças para a escolha e prática dos

instrumentos (ANTUNES et al, 2010).

Essa pesquisa foi referente ao processo de escolha de um instrumento musical em um

curso de educação musical infantil. Os objetivos foram a identificação dos fatores que atuam

no processo de escolha do instrumento musical por crianças entre quatro e seis anos de idade,

integrantes de um curso de educação musical e a análise da importância da mediação de um

projeto de orientação vocacional para a escolha do instrumento por essas crianças e suas

famílias. Ao final do trabalho os autores apontam que a influência da família deve ser

considerada, bem como suas expectativas quanto ao futuro da criança, sem uma pretensão

quanto a um determinismo entre a experiência musical na infância e o futuro profissional de

seus filhos. Foram discutidas também a preocupação com a liberdade de escolha e a

oportunização do diálogo promovendo uma motivação pessoal, por parte da criança, na

aprendizagem instrumental (ANTUNES et al, 2010).

Posterior a esse trabalhado, foram promovidas vivências pedagógico-musicais que são

apresentadas como em forma de um relato de experiência que envolve o processo de escolha

de um instrumento musical e a perspectiva do jogo musical inserido nesse contexto.

Brincar e Brincar na música

Ao brincar, as crianças desenvolvem a imaginação, trabalham diversos papéis,

podendo construir relações reais entre elas e elaborar regras de organização e convivência. Na

brincadeira as crianças constroem a consciência da realidade e vivenciam a possibilidade de

modifica-la. A brincadeira propicia oportunidade de aprendizagem, mas o professor deve

assumir o papel de orientador. Para Kishimoto (1996, apud Cória-Sabini; Lucena, 2004):

A utilização do jogo potencializa a exploração e a construção do conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico, mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a influência de

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parceiros bem como a sistematização de conceitos em outras situações que não jogos (KISHIMOTO, 1996 apud CÓRIA-SABINI, 2004, p. 43).

A criança leva para a brincadeira aquilo que faz parte da sua realidade, expressa as

suas emoções e assimila as regras e comportamentos sociais, através da representação da

realidade em que vive sendo passada em forma de brincadeira. O brincar possibilita a

transição entre o mundo real e o imaginário. Por meio da brincadeira ela pode desenvolver o

papel que lhe agrada. Teles (1997) afirma, com relação à criança e a brincadeira:

Brincando, ela explora o mundo, constrói o seu saber, aprende a respeitar o outro, desenvolve o sentimento de grupo, ativa a imaginação e se auto-realiza (...) brincando, a criança, também, coloca para fora as suas emoções e personaliza os seus conflitos (...). A criança reproduz na brincadeira a sua própria vida. Através dela, ela constrói o real, delimita os limites frente ao meio e o outro e sente prazer de poder atuar ante as situações e não ser dominado por elas (TELES, 1997, p.14).

Os princípios do jogo e a utilização de materiais na educação musical foram discutidos

por educadores musicais. Willems (1962) considera apenas os materiais auditivos, como

instrumentos, músicas e fontes sonoras, enquanto Martenot (1970) considera jogo como

“conduta de ação (energias corporais), ferramenta pedagógica (parlendas, jogos de criação) e

material de jogo (objetos produtores de som ou relacionados à notação gráfica musical)”.

(MORAIS, 2009, p. 903-904). O jogo musical é uma atividade semelhante ao brincar

constituída de regras intrínsecas e objetivos musicais, constituindo o fazer musical.

(MORAIS, 2009).

Por meio dos Jogos Pedagógicos para Educação Musical, França e Guia (2005)

apresentam uma proposta para o ensino dos conteúdos visando a realização musical de

crianças a partir dos 6 anos de idade. Nessa proposta o jogo não visa a competição e sim os

processos psicológicos, promovendo a aprendizagem e o desenvolvimento musical da criança

(FRANÇA; GUIA, 2005).

A prática do jogo musical no contexto de um curso de música pode promover o

desenvolvimento musical individual da criança. Para Brito (2003) a promoção desse

desenvolvimento não exclui as intervenções educativas, e o professor deve promover

vivências a fim de proporcionar um ambiente estimulante, visando não só a música e sim a

formação integral da criança (BRITO, 2003).

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A orientação no processo de escolha

Considerando o desenvolvimento da criança, um programa de orientação deve

embasar seu trabalho nos múltiplos fatores que atuam na escolha. A criança pode fazer uma

escolha considerando suas experiências, seus interesses, e, principalmente, sua imaginação.

Para a escolha do instrumento não é diferente. A criança terá condições de escolher se tiver

contato com diversos instrumentos. Tomando o instrumento como uma ferramenta cultural, as

experiências são fundamentais para construir uma representação do som, da ação, da relação e

das possibilidades na relação sujeito-objeto.

Para acontecer uma escolha consciente é importante o papel de um orientador,

professor e de ações pedagógicas planejadas que visem “ampliar a consciência que o

indivíduo possui sobre a realidade que o cerca” (BOCK; AGUIAR, 1995 apud

PASQUALINI; GARBULHO; SCHUT, 2004, p. 72).

Relato de experiência

No 1º semestre de 2011, as aulas do curso são divididas por módulos, sendo que

quatro delas foram destinadas às famílias de instrumentos. A primeira aula foi sobre a família

de Percussão, seguida pela de Cordas e finalizando com a de Sopros. As imagens dos

instrumentos eram relacionadas ao som, alguns instrumentos foram apresentados fisicamente.

Ao final, como forma de sistematização, foi realizado um jogo pedagógico-musical. As

crianças conheceram diversos instrumentos e suas famílias, como violoncelo, violino, violão,

teclado, piano, flauta transversal, a família da flauta doce e a família percussão. Foram feitas

aulas especiais com os instrumentos, dando-lhes a oportunidade de manusear e interagir com

o instrumento e com o/a instrumentista.

Durante as aulas ocorreram dois momentos: 1) espontâneos, por parte das crianças; e

2) direcionados.

Os momentos espontâneos ocorreram de diversas maneiras, entre eles a exploração do

violão ao final das aulas e a sonorização dos instrumentos, por parte das crianças, em canção

sem palavras.

Dentre os momentos direcionados destacam-se a apresentação dos instrumentos por

meio de apreciação, com a visita de instrumentistas e também com a apresentação das

professoras, um jogo envolvendo o reconhecimento da imagem com o som do instrumento e o

manuseio de alguns instrumentos.

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Na primeira aula houve uma contextualização de todas as famílias. A professora

iniciou com o violão, que é o instrumento utilizado em todas as aulas. Assim ela questionou

as crianças o que é necessário para tocar o violão e um aluno respondeu que preciso de uma

“parlenda”, a professora confirmou dizendo que era uma palheta. Ao perguntar se sem a

palheta poderia tocar, o mesmo aluno respondeu que não, então houve a demonstração do

tocar com palheta e sem palheta, com essa explicação a professora explicou que a família do

violão era de cordas, depois perguntou sobre a flauta para depois focar na família de

Percussão. Para essa família foram apresentadas, primeiramente as imagens de instrumentos

em fotos e projeções para depois o instrumento real.

O primeiro instrumento apresentado foi o pandeiro. A professora ao perguntar de qual

família ele fazia parte, questionou o nome. Perguntou se o instrumento era da família de

sopro, e as crianças responderam que não. Em seguida uma criança citou que a família do

pandeiro era a “família de bater”, outra disse que era a “família de pandeiro”, então, a

professora explicou que o nome da família era de Percussão. Após a apresentação dos

instrumentos uma criança sugeriu a continuidade da atividade da seguinte forma: “pessoal tive

uma ideia, vamos montar uma banda?”, seguindo-se a exploração livre dos instrumentos.

Na segunda aula, sobre a família de Cordas, foram apresentados vários instrumentos,

dentre eles o piano. Ao gerar confusão por parte de algumas crianças viu-se a necessidade de

apresentar o piano e a sua estrutura física, abrindo-o e vendo o seu funcionamento.

Primeiramente, a professora exemplificou tocando-o, enquanto as crianças viam a articulação

do martelo com as cordas. Em seguida houve exploração individual.

Na aula destinada à família de Sopro foi apresentada a família das Flautas Doces. Por

meio da escuta atenta as crianças perceberam os contrastes sonoros (grave e agudo) e a

percepção de diferentes melodias. As flautas foram nomeadas segundo as suas

especificidades: Flauta Doce Soprano, Contralto e Tenor.

Ao final desse processo foi realizado o jogo Bingo Sonoro e Orquestra Vocal. Este

recurso pedagógico musical foi produzido por uma das professoras e tem por objetivo

reconhecer os sons dos instrumentos musicais associando à imagem de cada um, por meio de

um desenho representativo. Dentro dos objetivos específicos estão o despertar o interesse em

conhecer o instrumento de acordo com o som e a imagem, estimular o interesse por um

instrumento e analisar a representação dos instrumentos executados pelos participantes,

através de uma “orquestra”.

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Em sala de aula realizamos a primeira parte do jogo, destinada ao Bingo Sonoro. Antes

de começar o jogo e explicar os comandos da atividade, nós apresentamos os sons e as

imagens, aproveitando para perguntar sobre as famílias dos instrumentos. A atividade contou

com intervenções pedagógicas por parte dos professores e, principalmente com o trabalho

colaborativo entre as crianças tanto na identificação sonora e quanto iconográfica.

O jogo visa a experiência musical por parte das crianças, para proporcioná-las uma

escolha consciente. Pasqualini, Garbulho e Schut (2004) afirmam que:

os processos de internalização da realidade social iniciam-se já na primeira infância, mediados pelas relações sociais que a criança estabelece com os adultos (e demais crianças), nos diversos contextos em que está inserida, como a escola, a família, a comunidade. Neste sentido, embora este seja um processo em constante movimento ao longo da vida dos indivíduos, as concepções de mundo, valores e opiniões principiam sua formação nesta fase do desenvolvimento (PASQUALINI; GARBULHO; SCHUT, 2004, p. 72)

Com isso, constata-se a importância de oportunizar para a criança experiências que

auxiliem em uma escolha consciente e significativa, considerando, principalmente, o contexto

e história do sujeito que escolhe, no caso, a criança.

Considerações Finais

Considerando que a ludicidade é intrínseca da criança, em um processo de escolha de

um instrumento musical é importante a utilização de recursos pedagógicos musicais, visto que

a escolha deve ser significativa e consciente e não necessariamente definitiva. Essa escolha

pode ser modificada, de acordo com as experiências vivenciadas pela criança, alterando assim

seus gostos e preferências. O que é imaginado antes do brincar pode ser modificado após a

experiência com o instrumento propriamente dito. A experiência e o envolvimento com os

instrumentos e com as atividades continuam em casa e o uso de diferentes recursos, como

jogos e brincadeiras, bem como novas tecnologias como sites, vídeos, podem ser facilitadores

para uma experiência significativa.

As atividades concretas servem como parâmetro para a posterior escolha de um

instrumento musical. O trabalho dos instrumentos em famílias permite que a crianças vejam

um conjunto de instrumento com características similares e possam escolher dentro de um

conjunto de possibilidades.

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Referências

ANTUNES, Larissa Rosa; RIBEIRO, Samara Pires da Silva; FREIRE, Sandra Ferraz C. D. & FREIRE, Ricardo Dourado. O processo de escolha do instrumento musical em um curso de educação musical infantil. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 19, 2010, Goiânia. Anais ... ABEM, 2009. p. 1637-1647. BRITO, Teca Alencar de. Música na Educação Infantil: propostas para a formação integral da criança. São Paulo: Peirópolis, 2003. CÓRIA-SABINI, Maria Aparecida; LUCENA, Regina Ferreira. Jogos e Brincadeiras na Educação Infantil. Campinas: Papirus, 2004. FRANÇA, Cecília Cavalieri; GUIA, Rosa Lúcia dos Mares. Jogos Pedagógicos para Educação Musical. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005. MORAIS, Daniela Vilela de. O material concreto do ensino de música: jogo ou brinquedo? In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 18, 2009, Londrina. Anais... ABEM, 2009. p. 903-909. PASQUALINI, Juliana C.; GARBULHO, Norma F.; SCHUT, Tannie. Orientação Profissional com Crianças: Uma Contribuição à Educação Infantil. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 2004, 5 (1), p.71-85. TELES, Maria Luiza Silveira. Socorro! É proibido brincar! Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

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Construindo um Modelo de Plano Para Aulas de Musicalização Infantil: a

experiência do Curso de Musicalização Infantil da UFPR

Vivian Dell’ Agnolo Barbosa UFPR

[email protected]

Tiago Madalozzo UFPR

Resumo: Com o presente relato pretendemos apresentar um modelo de estruturação de atividades em aulas do Curso de Musicalização Infantil da UFPR. De construção coletiva pelos professores-estagiários atuantes no curso, esta estruturação acabou por ser formatada em um modelo de plano de aula adotado a partir de 2009 para todas as turmas do curso. Baseamos a argumentação em definições da abordagem fundamental do curso: a musicalização infantil e o jogo musical. A partir dos relatos de Ilari (2010) e Freire & Freire (2008), trabalhamos os conceitos de community of practice e construção colaborativa, que definem a organização logística do curso da UFPR. Ao apresentarmos o modelo de plano de aula, procuramos analisar a sua gênese e seu layout inicial a partir dos conceitos de estrutura, conteúdo e andamento, conforme sugeridos por Russell (2005), destacando ainda contribuições do pensamento de França & Swanwick (2002) e Palheiros & Wuytack (1995). Por fim, estabelecemos uma crítica a respeito da aplicação do modelo, ou seja, uma análise da prática em sala de aula a partir do planejamento.

Palavras chave: Musicalização, planejamento, relato

Introdução

Atuando junto à comunidade de Curitiba-PR entre 2003 e 2010, o Curso de

Musicalização Infantil da UFPR, extensão universitária, foi concebido como um laboratório-

escola para prática dos acadêmicos do curso de Música – Educação Musical da instituição,

que, na época, não tinham número relevante de opções para estágio em Educação Infantil.

Ao longo dos anos, a estrutura física e humana do curso se ampliou: em setembro de

2003, havia cerca de vinte e cinco alunos – crianças da comunidade curitibana – e cinco

professores-estagiários – discentes do curso de licenciatura – atuando em uma sala de aula; já

no final do primeiro semestre de 2010, quando o curso foi suspenso, eram cerca de trezentos

alunos atendidos pelo curso e mais de cem em lista de espera, e trinta instrutores divididos em

19 turmas.

O sistema de ensino-aprendizagem entre os professores-estagiários é ponto crucial na

estrutura logística que se implantou desde o início: em cada sala de aula, um grupo de três

professores era responsável pela turma. Desta forma, combinava-se sempre professores mais

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experientes com novos professores, o que promovia um fluxo de ideias, conhecimento,

repertório e experiência dos mais valiosos, num processo de aprendizagem por pares, ou

peer-learning system, conforme apontado por Beatriz Ilari (MADALOZZO et al, 2008, p. 71;

ILARI, 2010, p. 54), criadora e primeira coordenadora do projeto.

Com o decorrer das atividades do Curso de Musicalização Infantil da UFPR, os

instrutores constataram a emergência de um modelo de plano de aula que, entendemos, foi

autoconstruído. Embora uma versão padrão deste modelo tenha sido adotada por todos os

professores do curso a partir de 2009, alguns anos antes seria impossível apontar “o autor” do

modelo, uma vez que a construção foi coletiva e, desta forma, resultou em um produto

original e possível apenas com a interferência de diferentes modos de ensinar e entender o

curso, a partir de constantes avaliações do dia-a-dia de sala de aula.

Com este relato, pretendemos descrever e analisar este modelo de plano de aula,

apontando certas concepções teóricas que a partir dele ficam evidentes.

Construindo um modelo de plano de aula de musicalização infantil

A partir da estruturação do curso em turmas com trios de professores, a cada semestre

realizava-se uma reunião para definição de um tema gerador, comum a todas as turmas. Este

tema não só seria uma espécie de fio condutor para os planos de aula, mas também para a

organização de uma Aula Pública de encerramento, no final dos quatro meses de curso, em

que todas as turmas de uma determinada faixa etária apresentariam duas ou três músicas

trabalhadas ao longo deste tempo.

Com a definição coletiva do tema gerador, enfim os trios se reuniam para organizar

em linhas gerais o planejamento semestral da turma, e a partir disso começavam as reuniões

semanais, fosse presencialmente ou com auxílio da internet, para elaboração de cada plano de

aula. Por este motivo é que, a partir de um dado momento, adotou-se uma versão padrão do

modelo de planejamento em discussão neste trabalho: depois de alguns semestres em que

cada turma registrava os planos de forma particular, e a partir de diversas reuniões para troca

de ideias e repertório entre turmas de professores, aos poucos definiu-se a versão final que

todos deveriam seguir para facilitar inclusive a preparação de material para pesquisa – é

preciso destacar que muitos dos participantes acabaram voltando suas pesquisas acadêmicas a

estudos ligados a musicalização, muitas vezes utilizando planos de aula arquivados como

material para estudo de caso.

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A abordagem de ensino no Curso de Musicalização Infantil da UFPR

Quando nos referimos ao curso da UFPR, o título Musicalização Infantil faz referência

a uma abordagem específica de educação musical que é definida no 3º volume do Referencial

Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998, p. 45-51): trata-se da

abordagem da musicalização, em que a partir de canções, jogos, danças, exercícios de

movimento, relaxamento, prática instrumental, improvisação e audição, certas noções básicas

de ritmo, melodia, compasso, métrica, som, tonalidade, leitura e escrita musicais são

apresentadas à criança, sempre se reportando ao universo lúdico da infância – portanto, a

partir do jogo musical.

Maura Penna (2010, p. 22) afirma que musicalizar é “desenvolver os instrumentos de

percepção necessários para que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la,

recebendo o material sonoro/musical como significativo”. Desta forma, a musicalização é um

processo em que “as potencialidades de cada indivíduo são trabalhadas e preparadas de modo

a reagir ao estímulo musical” (PENNA, 2010, p. 21). Em outras palavras, a estimulação

musical desde cedo tem por objetivo dotar as crianças de elementos característicos da música

de uma determinada cultura, desenvolvendo não só o ouvido, mas também o movimento

corporal e a expressão verbal, para que ela reaja a estes estímulos. Mesmo que tudo seja

apresentado e aprendido de forma “implícita” – por exemplo, chacoalhando caxixis para

entender o conceito de pulso de forma ativa –, nunca se deixa de utilizar em sala de aula o

conceito musical correto – neste caso, pulso –, e é a partir do aprendizado destes conceitos

básicos que busca-se formar indivíduos que mais tarde possam conhecer e expressar-se com

música, e sejam capazes de emitir um juízo de valor sobre aquilo que produzem e ouvem.

Recuperando o final da definição do RCN, destacamos o papel do jogo musical no

processo de musicalização, e isto se deve a um fator fundamental: a brincadeira é uma espécie

de interface natural da criança com o mundo – nas palavras de Ilza Joly (2003, p. 116), a

criança, a partir da brincadeira, “relaciona-se com o mundo que descobre a cada dia e é dessa

forma que faz música: brincando”.

Neste caso, é importante destacar aquilo que Tizuko Kishimoto (1994, p. 19) apresenta

como “paradoxo do jogo educativo”. Segundo a autora, o que define o jogo educativo é a

presença concomitante de duas funções que parecem antagônicas: a função lúdica e a função

educativa. Ou seja, por um lado, o jogo serve para propiciar a diversão e o prazer; por outro,

deve ter um objetivo pedagógico claro. Se o equilíbrio entre as duas funções não for atingido,

ou não haverá ensino, apenas jogo; ou não haverá hedonismo, apenas ensino.

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Já que o trabalho de musicalização no curso da UFPR é intimamente ligado à ideia do

jogo musical, é importante não se deixar cair no perigo de as aulas serem momentos de

“recreação”, ou seja, tomando cuidado para não perder de vista o objetivo pedagógico em

todas as atividades que se propõem.

O trabalho coletivo de planejamento e organização no Curso de Musicalização Infantil da UFPR

A estrutura logística do Curso de Musicalização Infantil da UFPR, à qual fizemos

referência anteriormente, não era composta somente pelos trios de instrutores. Assim como

apresentado por Ilari (2010, p. 48), o organograma era dividido em três níveis: a) coordenador

(professor do Departamento de Artes da UFPR, proponente do projeto); b) monitores (três

instrutores que se dispõem, a partir de indicação do coordenador, a organizar as questões

burocráticas de matrículas, divisão de turmas, contatos com os pais dos alunos e organização

da Aula Pública de encerramento); e c) professores-estagiários (discentes do curso de

licenciatura organizados em trios).

Deixando de lado o papel dos monitores, que se ocupam de questões burocráticas, a

tomada de decisões pedagógicas era coletiva porém supervisionada: coletiva porque acontecia

no âmbito do grupo como um todo (para estruturação do tema gerador do semestre e troca de

ideias entre turmas de mesma faixa etária) e no contexto de cada turma a partir do sistema de

trocas entre o trio de professores-estagiários; mas nada disso deixava de ser acompanhado

muito de perto pelo coordenador do curso, que participava do projeto ativamente visitando as

aulas, tecendo comentários para os trios, e coordenando todos os momentos de reunião do

grupo.

Desta forma, tendo o curso uma organização coletiva e uma atuação coletiva

supervisionada, podemos resgatar o conceito de community of practice empregado por Ilari

(2010, p. 52), ao entendermos que havia um engajamento mútuo, mas não homogêneo; ou

seja, cada membro do grupo (ou, mais especificamente, do trio) contribuía para a prática de

sala de aula a partir de diferentes graus de envolvimento, conhecimento e participação. É

desta forma que emergem questões como a de liderança e real envolvimento dos participantes

para um mesmo fim pedagógico, conforme analisadas por Ilari.

Esta estrutura é extremamente importante ao analisarmos a questão do planejamento,

uma vez que os professores-estagiários tinham, de certa forma, livre arbítrio para organizarem

o semestre de sua turma da forma como acharem mais relevante. Ou seja, por mais que a

coordenação procurasse fiscalizar o trabalho realizado em sala de aula, a discussão sobre as

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linhas do planejamento a longo prazo muitas vezes ficava restrita ao trio; ou ainda, era

subordinada à forma como os indivíduos mais experientes do trio, justamente por seu maior

conhecimento prático, enxergavam os objetivos do semestre.

Sobre o planejamento coletivo, cabe destacar o que Ricardo e Sandra Freire

registram sobre a organização do Curso de Musicalização Infantil da Universidade de

Brasília. Segundo os autores, não é interessante massificar as aulas ao se propor planos de

aula padrão: um planejamento “construído no diálogo entre os agentes”, portanto integrativo e

flexível, aproveita melhor “a potencialidade dos professores em agenciar o desenvolvimento

de seus alunos com competência” (FREIRE; FREIRE, 2008, 157).

Ainda que o sistema de aulas seja visivelmente diferente do curso da UFPR, esta visão

sobre a qualidade de um planejamento coletivo é ponto em comum com a nossa análise.

Segundo os autores, o planejar é um “processo relacional”, ou ainda uma “construção

colaborativa que inclui e integra” (FREIRE; FREIRE, 2008, p. 158) as características pessoais

de cada professor, aproveitando a diversidade de repertórios, propostas, modos de pensar e

agir em sala de aula etc.

É a partir dessa diversidade, mas sempre reportando-se ao grupo, que percebemos a

construção coletiva de um modelo de plano de aula. O conteúdo de cada aula do curso da

UFPR nunca foi copiado ou imposto para todas as turmas; mas a forma de se agir em sala de

aula é tão coesa que possibilitou a origem de um modelo de plano de aula comum, que será

apresentado em seguida.

Além das questões de planejamento, que são exemplo característico desse sistema de

atuação coletiva supervisionada, é importante destacar duas outras produções originadas a

partir do mesmo sistema de organização: um CD com trinta e oito canções e um livro com

quarenta e quatro propostas de musicalização infantil, lançados ao final do primeiro e do

segundo semestres de 20081, respectivamente, em que todos os professores do curso tiveram a

oportunidade de gravar/publicar materiais de uso cotidiano no Curso ou ainda propostas e

composições inéditas, sempre com igualdade de condições de participação, mas sob

supervisão de uma pequena equipe. Assim, além da experiência de estágio, o Curso de

Musicalização originou produções acadêmicas diversas como os materiais acima e algumas

monografias de conclusão de curso de graduação.

1 O livro, intitulado “Fazendo Música com Crianças”, está sendo reeditado pela Editora da UFPR neste ano.

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A gênese e o layout final do plano de aula

Antes que um modelo de plano fosse adotado como padrão, os professores

costumavam anotar as atividades em cadernos. Em trio, muitas vezes definiam a ordem das

atividades da aula utilizando apenas uma estrutura em tópicos. Dessa forma, havia uma

estrutura básica, com início, meio e fim.

Entendemos que a gênese do modelo final de plano tenha sido justamente a estrutura

da aula em tópicos, ou seja, a estrutura básica da aula. A partir de trocas de ideias entre os

professores, aos poucos esta estrutura foi sendo adotada por todas as turmas, sendo possíveis

pequenos ajustes naturais. Abaixo apresentamos um quadro em que se resume a variedade de

tópicos abordados em aula.

Tabela 1: Tipos de atividades – os tópicos iniciais que deram origem a um plano comum

Estrutura da aula Tipo de atividade

Início Saudação /

Limpeza de ouvidos

Meio

Escala musical Contorno melódico

Percussão instrumental Gestual

Percussão corporal Dança

Audição ativa Apresentação de

instrumento musical

Fim Relaxamento

Audição Despedida

As atividades de saudação são canções em que, em geral, destaca-se o nome de cada

criança da turma; da mesma forma com as atividades de limpeza de ouvidos2, o objetivo é

criar um pequeno momento de separação entre as atividades cotidianas das crianças e a aula

da música; ou seja, é um marco musical de início do período de aula.

A partir daí, as outras atividades, a “aula propriamente dita”, são organizadas de

acordo com a variedade de possibilidades exposta no quadro; mas nem sempre na mesma

2 ver as considerações de R. Murray Schafer sobre o assunto em SCHAFER, R. M. Limpeza de ouvidos. In: O

ouvido pensante. São Paulo: UNESP, 2001. p. 67-118.

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ordem, e não necessariamente utilizando toda essa variedade em cada aula3. Por fim, as

atividades finais têm o mesmo objetivo das iniciais: marcarem musicalmente o término da

aula.

O modelo a que nos referimos neste relato encontra-se na página 11, em seu layout no

ano de 2010. Destacamos duas informações importantes de início: o espaço para registro dos

objetivos da aula, bem como o tema específico; e a organização das atividades em tabela, em

uma variação a partir de vários modelos, em especial o empregado por Joan Russell (2005, p.

82).

Na tabela, cada linha representa uma atividade da aula. A título de comparação, nas

turmas com crianças entre 0 e 4 anos, que vão às aulas junto com os pais, os professores

utilizavam uma média de doze atividades; já nas turmas de crianças mais velhas, entre 6 e 10

anos, a média cai para seis a oito atividades. O motivo é a maior complexidade e possibilidade

de variação dentro da mesma atividade, no caso das crianças mais velhas, e o menor tempo de

foco das crianças menores, por outro lado.

Nas colunas, inicialmente havia apenas: 1) tipo de atividade; e 2) desenvolvimento.

Assim, a tabela nada mais era que uma nova formulação daquilo que já se fazia

“informalmente” nos cadernos dos professores. Mais adiante, porém, foram incluídas novas

colunas: 3) o condutor das atividades (já que era um trio, e não seria pedagógico que os três

dessem ordens ao mesmo tempo); 4) o tempo médio de duração estimada, para controlar o

andamento da aula; e 5) referências das atividades, para que, se o material fosse utilizado para

fins de pesquisa, se tornasse mais fácil encontrar a autoria das atividades, uma vez que cada

professor tinha conhecimento de estratégias e repertórios diferentes.

Além disso, cada vez mais procurou-se enfatizar a importância de um complemento

escrito: “observações gerais depois da aula”, campo localizado no rodapé do plano.

Avaliando em termos de estrutura, conteúdo e andamento

A pesquisadora canadense Joan Russell publicou em 2005 um trabalho em que

descreve uma aula de música cuja abordagem é a musicalização infantil. A partir da prática, a

autora estabelece três conceitos segundo os quais analisa a aula: estrutura, conteúdo e

andamento (RUSSELL, 2005, p. 83-85). É importante destacar que, no texto de Russell, estes

3 Freire e Freire (2008, p. 160) apresentam uma estrutura em tabela em que enfatizam algumas atividades como

de: aquecimento e concentração; movimento; elaboração; avaliação individual; brincadeiras; avaliação coletiva; e despedida.

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conceitos foram definidos para análise “pós” aula, a partir da prática; já neste relato,

tomaremos cada um deles teoricamente para avaliar a proposta do plano de aula apresentado.

Em termos de estrutura, é importante que a aula tenha seções pré-estabelecidas e bem

marcadas. Ganha destaque o momento de saudação, uma vez que é necessário marcar o início

do momento pedagógico. Além disso, a partir da alternância de atividades em aula, com o

passar do tempo as crianças começam a entender que a aula tem uma sequência básica, e que

há momentos específicos para cantar, tocar, dançar e ouvir. Além disso, um senso de

comunidade é explorado, uma vez que em certos momentos é necessário dividir instrumentos

com os colegas, ou mesmo entregar um determinado instrumento para pegar outro e dar

sequência à aula. Este entendimento faz com que as crianças se sintam muito confortáveis na

sala de aula depois de algumas semanas. Por estes motivos é que consideramos a estrutura

apresentada na página 6 como o principal resultado pedagógico a que se chegou no curso ao

longo dos anos, uma vez que ela auxiliou na caracterização do “jeito UFPR” de se ensinar

música a crianças.

Esta ordem de tipos de atividade, porém, pode ser analisada por outro conceito, o de

conteúdo. A aula de música deve ser uma espécie de tapeçaria, segundo um princípio básico:

o da unidade na variedade (RUSSELL, 2005, p. 83-85). A partir da contribuição coletiva do

trio de professores, uma boa aula deve ser construída a partir da maior variedade de atividades

e propostas possível, mas sem se perder o fio condutor.

Em termos de variedade, destacamos, mais uma vez, os diferentes tipos de atividades

propostos; mas também podemos registrar a variedade de: repertório; configuração das

crianças (sentados, em roda, em pé, em duplas, com os pais etc); e a alternância das

modalidades do fazer musical.

Sobre este último tópico, citamos o pensamento de Cecília França e Keith Swanwick,

quando destacam a importância de equilíbrio e interação entre atividades de composição,

apreciação e performance; ou criação, audição e execução musical, segundo eles, “facetas

essenciais de uma educação musical abrangente” (FRANÇA; SWANWICK, 2002, p. 15-17).

Ainda neste sentido, sempre procurou-se enfatizar a importância de um cuidado com

os momentos de apreciação musical, afastando-se ao máximo de atividades passivas ao se

discutir o conceito de audição musical ativa conforme apresentado por Graça Boal Palheiros

e Jos Wuytack (1995, p. 12-13): um “processo que implica o envolvimento activo [sic] do

ouvinte, e para o qual são necessárias a experiência e a aprendizagem”, e que acontece a partir

da associação de outros tipos de atividades à de escuta, tais como: movimentos;

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acompanhamento instrumental; acompanhamento verbal; apresentação ou confecção de

gráficos; ou tudo isso junto, de forma a tornar possível a “visualização” do evento musical.

Ainda dentro do conceito de conteúdo, em termos de unidade é necessário destacar o

que Russell chama de “elos conceituais ou temáticos”: apesar da miscelânea de estratégias,

conceitos e repertórios trabalhados, a aula tem uma profunda lógica interna pela existência de

ligações entre as atividades que garantem a transição suave entre as atividades. Exemplos de

elos de ligação são: padrões rítmicos; intervalos ou contornos melódicos; ou quaisquer

conceitos musicais que são trabalhados em ao menos duas músicas, fazendo com que fique

óbvia a ligação entre as atividades.

Por fim, Russell define como andamento a capacidade do professor em conduzir a aula

com o maior nível de concentração possível dos alunos, ou seja, dosando o tempo de cada

atividade, percebendo exatamente o momento de se passar para a próxima atividade sem

haver dispersão. Trata-se, portanto, de algo que se constrói com a experiência em sala de aula.

No curso da UFPR havia três pensamentos que procuravam auxiliar para um bom

andamento: a) a estratégia do “senta-levanta”; b) a economia de linguagem verbal; e c) o

planejamento de atividades extras. A partir de uma alternância de atividades em disposições

espaciais diferentes, procurando agir mais e dar regras de menos, e tendo sempre “cartas na

manga” para momentos em que o número de atividades planejadas era insuficiente,

procurava-se ter uma maior garantia de que a aula seria mais eficiente do ponto de vista do

andamento.

Crítica a respeito do dia-a-dia de planejamento de aulas e considerações finais

Tecemos abaixo algumas críticas a partir da aplicação do modelo em aula.

Em primeiro lugar, é muito difícil o estabelecimento de elos conceituais ou temáticos

entre todas as atividades, e muitas vezes a ligação passa a ser menos um elo musical do que

um elo “temático” extra-musical. Por exemplo: duas músicas que tratam de animais, sendo o

elo temático os animais, e não um conceito teórico musical. Ainda assim, sempre houve elos

entre atividades reunidas sob um mesmo tópico; portanto, de qualquer forma, era natural a

ocorrência de uma unidade entre atividades nos planos.

Por mais que o curso sempre tenha sido o ponto de partida para um encaminhamento

profissional de muitos professores-estagiários, nem sempre houve um comprometimento geral

com o momento do planejamento, fazendo com que o estabelecimento de metas para o

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semestre fosse algo secundário, bem diferente da importância dada a isso a partir do registro

de Freire e Freire no curso da UnB (2008, p. 158-160). Além disso, mesmo que um

determinado trio de professores tivesse esta preocupação, muitas vezes não havia uma efetiva

troca de ideias entre os trios de uma mesma faixa etária, o que poderia possibilitar um ganho

considerável.

Com o passar dos anos, a estrutura humana do curso aumentou muito, e, infelizmente,

o grande número de professores-estagiários dificultou a manutenção de uma uniformidade em

termos de estratégia de ensino – aquilo a que nos referimos como “jeito UFPR” de

musicalizar.

Ainda assim, o modelo de plano de aula – e mesmo de planejamento geral,

considerando-se a força do critério de conteúdo na gênese do modelo, conforme destacamos –

nos parece bastante efetivo, havendo vasto material padronizado para pesquisa nos arquivos

do curso.

Também não podemos perder de vista que sempre se procurou promover as “rodas de

repertório”, tardes de sábado em que todos os professores-estagiários se reuniam para discutir

ideias e principalmente trocar repertório. Ainda, o curso sempre promoveu oficinas de

capacitação e atualização com professores de renome nacional e internacional para contribuir

com a formação e reciclagem contínua de estratégias e repertório de seus instrutores.

É preciso destacar especialmente a presença de um forte pensamento teórico que

dominou toda uma geração de professores do curso: as ideias de Jos Wuytack e sua pedagogia

Orff, de conhecimento de alguns dos instrutores desde 2005, e fortificada a partir da

realização de grandes cursos de pedagogia musical ativa entre 2007 e 2010, principalmente

nas estratégias de jogos, na diversidade de repertório e com o conceito de audição musical

ativa.

Por fim, concluímos ao destacarmos a utilização do modelo de plano construído ao

longo desse tempo na UFPR em outros projetos de musicalização, já que vários dos

professores-estagiários, após o término da graduação, passaram a gerenciar cursos de

musicalização em escolas e universidades espalhadas em várias regiões do país.

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FIGURA 1 – Modelo de plano de aula adotado pelos professores-estagiários do Curso de Musicalização Infantil da UFPR – versão do primeiro semestre de 2010.

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Referências

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FREIRE, Ricardo D.; FREIRE, Sandra F. Planejamento na Educação Musical Infantil. In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO (ANPPOM), 18., 2008, Salvador. Anais... Salvador: Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade Federal da Bahia, 2008. p. 157-161. Disponível em: <http://www.anppom.com.br/anais/anaiscongresso_anppom_2008/comunicas/COM383%20-%20Freire%20et%20al.pdf>. Acesso em: 12 mar. 2011. ILARI, Beatriz S. A community of practice in music teacher training: The case of Musicalização Infantil. Research Studies in Music Education, v. 32, n. 1, jun. 2010. p. 43-60. Disponível em: <http://rsm.sagepub.com/cgi/content/abstract/32/1/43>. Acesso em: 13 set. 2010. JOLY, Ilza. Educação e educação musical: conhecimentos para compreender a criança e suas relações com a música. In: HENTSCHKE, Liane; DEL BEN, Luciana (orgs.). Ensino de música: propostas para pensar e agir em sala de aula. São Paulo: Moderna, 2003. p. 113-126. KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O jogo e a educação infantil. São Paulo: Pioneira, 1994. MADALOZZO, Tiago; ILARI, Beatriz S.; ROMANELLI, Guilherme; BOURSCHEIDT, Luís; KROKER, Fabiane; PACHECO, Caroline B. (org.). Fazendo música com crianças. Curitiba: DeArtes/UFPR, 2008. PALHEIROS, Graça Boal; WUYTACK, Jos. Audição Musical Activa. Porto, Portugal: Associação Wuytack de Pedagogia Musical, 1995. PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2010. RUSSELL, Joan. Estrutura, conteúdo e andamento em uma aula de música na 1ª série do ensino fundamental: um estudo de caso sobre gestão de sala de aula. Revista da ABEM, Porto Alegre, 2005. v. 12. mar. 2005. p. 73-88. Disponível em: <http://www.abemeducacaomusical.org.br/Masters/revista12/revista12_artigo10.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2009.

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Proposta Pedagógica de Ensino Coletivo do Violino para Crianças de 5

Anos na Escola de Música da Universidade Federal do Pará

Joziely Brito [email protected]

Resumo: Há cerca de uma década esta autora vem desenvolvendo, um trabalho voltado para a iniciação ao violino de crianças de 5 anos na Escola de Música da Universidade Federal do Pará. A proposição de uma metodologia voltada para o ensino coletivo do violino com crianças de 5 anos, se dá devido a dificuldade desta autora encontrar material pedagógico voltado para a faixa etária em questão. Sendo assim, este artigo representa um recorte de pesquisa em andamento para a obtenção do título de doutora em educação musical pela Universidade Federal da Bahia cujo objetivo é sistematizar e aplicar uma metodologia de ensino coletivo voltada para a iniciação musical infantil no violino. Para isso, será necessário reunir fundamentações teóricas e empíricas sobre ensino coletivo do violino o que enriquecerá e respaldará essa proposta. Buscar conhecimentos na área da educação e da cognição musical também se faz necessário para conhecer de forma aprofundada o público alvo da investigação que são crianças de 5 anos. Com base na pesquisa qualitativa e no estudo de caso, serão utilizados como instrumentos de coleta de dados questionários, observação participante, vídeogravações e juízes independentes. A análise de dados contará com técnicas de triangulação o que promoverá maior fidedignidade nos resultados. Espera-se que esta investigação proporcione uma maior discussão sobre o ensino coletivo de instrumentos musicais para crianças em especial no violino, visando não só aspectos técnicos, mas com perspectivas de aspectos cognitivos e sociais.

Palavras - chave: Educação musical infantil, ensino coletivo de instrumentos musicais, ensino coletivo do violino

Introdução

A comunidade acadêmica da área musical com freqüência vem se dispondo a

pesquisar e publicar artigos com referentes ao ensino coletivo de instrumentos musicais

(ALMEIDA, 2004; CRUVINEL; ORTIS; LEÃO, 2004; MONTANDON, 2004; TOURINHO,

2004)1. A partir dos anos 90 o tema começa e ser incluído e debatido de forma abrangente em

seminários e encontros de educadores musicais, que pretendem pesquisar a fundo os

benefícios do ensino coletivo de instrumentos musicais (BARBOSA, 2006; CRUVINEL;

MARQUES, 2006; GONÇALVES, 2006)2.

O ensino coletivo na educação musical, por possuir um forte caráter social, pode ser

utilizado para promover a interação entre as pessoas e a comunicação social, integrando

aspectos afetivos, estéticos e cognitivos. Sendo a música uma das grandes formas de

1 Anais do I Encontro de Nacional de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais. 2 Anais do II Encontro Nacional de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais.

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expressão humana, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI,

1998) defende a sua presença no contexto da educação, de um modo geral e particularmente,

na Educação Infantil.

Neste contexto, em estudos anteriores realizados com a classe de violino infantil na

Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA), Brito (2002) buscou, por

meio de pesquisa de campo, fundamentos teóricos e empíricos que norteassem o ensino

coletivo do violino com crianças de 4 e 5 anos. A busca para tentar propiciar um aprendizado

eficaz que proporcionasse ao aluno uma formação lúdica, crítica e social, resultou em um

relato de experiência que motivou a elaboração de uma metodologia específica para atender as

necessidades da faixa-etária trabalhada. Para dar respaldo a essa proposta pedagógica, Brito

(2010), em sua dissertação de mestrado, se propôs a investigar e catalogar trabalhos

científicos que discutissem sobre o ensino coletivo de cordas friccionadas. Brito (2010) optou

por pesquisar sobre cordas friccionadas devido à escassez de trabalhos científicos voltados

para o ensino coletivo de violino. Por sua vez, a presente pesquisa tem em vista mais uma vez

colaborar com tais trabalhos, ao sistematizar uma experiência de ensino coletivo do violino

para crianças de 5 anos de idade, na EMUFPA. Sendo assim, esta proposta de pesquisa

justifica-se pela necessidade de publicações de trabalhos científicos e de material pedagógico

sobre educação musical coletiva do violino para crianças de 5 anos.

A presente proposta de investigação não pretende discutir sobre métodos e tampouco

discutir sobre metodologias de ensino coletivo de violino, porém não será descartada a

hipótese de consultá-los como material referencial. As discussões estarão centralizadas na

proposição de uma metodologia voltada para a iniciação ao violino de crianças de 5 anos na

Escola de Música da Universidade Federal do Pará. Tal pesquisa também possibilita a

ampliação das discussões sobre o ensino coletivo do violino e sua utilização como ferramenta

metodológica eficaz na iniciação musical instrumental.

Assim, delineia-se como objetivo geral a sistematização e aplicação de uma proposta

pedagógica de ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos na Escola de Música da

Universidade Federal do Pará visando desenvolver não só aspectos técnicos, mas também

proporcionar uma formação com perspectivas à verificação de aspectos cognitivos e sociais.

Como objetivos específicos em princípio se estabelecem: desenvolver aspectos técnicos

referentes ao ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos; verificar o desenvolvimento

de aspectos cognitivos no ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos e verificar o

desenvolvimento de aspectos sociais no ensino coletivo do violino para crianças de 5 anos.

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É imprescindível que a Educação Musical, no contexto social contemporâneo, apoie

seu entendimento dos processos pedagógicos em suas relações com a sociedade para o auxilio

da criação de metodologias inovadoras que auxiliam a transformação social. Oportunizar uma

formação que permita uma prática pedagógica musical que valorize e respeite o

desenvolvimento do indivíduo como um todo, permite uma iniciação musical mais prazerosa

e eficiente principalmente no que se diz respeito ao lado humanístico do individuo.

Revisão de Bibliografia

O Encontro Nacional de Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais – ENECIM, desde

sua primeira edição em 2004, reúne pesquisadores com interesse na área que vem discutindo

o assunto para uma melhor compreensão sobre questões pertinentes ao ensino coletivo de

instrumentos musicais, buscando por meio de trocas de experiências soluções e atribuições

para enriquecimento científico e pedagógico da área. Dentre os pesquisadores podemos

destacar: José de Almeida, Joel Barbosa, Flávia Cruvinel, Maria Isabel Montandon, Fernanda

Ortis, Ana Cristina Tourinho, Diana Santiago entre outros.

Pesquisadores reconhecem que o indivíduo que passa por uma musicalização coletiva

na infância, além de adquirir sensibilidade sonora, desenvolve outras qualidades, como a

concentração, a coordenação motora, a socialização, o respeito a si e ao grupo, e outras

características que colaboram na formação do indivíduo (CAUDURO, 1989; GAINZA, 1988;

MÁRSICO, 1982; SUZIGAN, 1986).

[...] a aprendizagem musical deve ser repensada, visto que para o processo de musicalização ser importante e significativo, faz-se necessário que nos primeiros anos de vida o contato musical seja intuitivo, criativo e espontâneo e de preferência com um repertório de qualidade que vá além das músicas expostas pela mídia [...] (BAGATIN; DIAS; MAIA; RIBEIRO; RONDEL; 2006 p.1791)

O curso de violino da Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA)

atualmente esta estruturado em três níveis: módulo (duração de cinco anos), básico (duração

de quatro anos) e técnico (duração de três anos). A EMUFPA prevê em seu plano acadêmico

que a partir dos 5 anos de idade o aluno já pode ingressar no curso preparatório de violino.

Sendo assim, a necessidade de direcionamento de metodologia específica para atender essa

clientela de baixa faixa-etária se faz indispensável.

O trabalho com crianças exige em especial o conhecimento de fatores psicológicos,

que envolvem o desenvolvimento biológico e do pensamento (PIAGET, 2001; GORDON,

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2000; SLOBODA, 2008; ILARI, 2006). Para a sistematização de uma metodologia que atinja

essa criança de 5 anos de forma a contribuir com sua formação não só técnica referente ao seu

aprendizado no violino, mas também cognitiva e social deve-se primeiramente buscar

entender: quem é a criança de 5 anos e como se forma seus processos cognitivos e sociais?

Para isso, será muito importante compreender a natureza do conhecimento musical, do

processo de aprendizagem e do social ao qual o aluno dessa faixa-etária é submetido. Logo, a

busca por referências que discutam sobre os processos de aprendizagem de crianças de 5 anos

será de suma importância para a elaboração da proposta de pesquisa.

Além de gerar possibilidades de discussão sobre aspectos técnicos, aspectos cognitivos

e aspectos sociais para o ensino coletivo infantil do violino, será importante selecionar alguns

tópicos para discussão sobre personalidades do meio musical, que através de suas

contribuições reinventaram conceitos e quebraram paradigmas para desenvolver técnicas e

métodos de ensino coletivo da música que pudessem transformar indivíduos não só como

músicos preparados, mas também como indivíduos capazes de viver socialmente de forma

saudável e produtiva. Dentre algumas dessas personalidades podemos citar: Villa-Lobos e o

canto orfeônico, Alberto Jaffé e o projeto espiral que muito contribuiu para a formação de

jovens instrumentistas no Brasil e não esquecendo Shinishi Suzuki e seu método da educação

do talento. Faz-se necessário ressaltar que discutir sobre técnicas e métodos de ensino do

violino não é um dos objetivos da proposta de pesquisa, todas as informações serão tratadas

como aquisição de respaldo teórico para essa investigação.

Como já foi mencionado anteriormente3, Brito em 2010 realizou como proposta de

pesquisa para sua dissertação de mestrado uma catalogação crítica onde pode reunir trabalhos

científicos sobre o ensino coletivo de cordas friccionadas e obteve em seus resultados fatores

que podem contribuir para um bom desempenho do aluno. Apesar da proposta de pesquisa ter

centralizado suas investigações nas cordas friccionadas, entende-se que devido ao fato de o

violino fazer parte desta família pode-se utilizar esses fatores como pontos de discussão

também para essa investigação que consiste no ensino coletivo infantil do violino

possibilitando, assim, mais um ponto para se desenvolver como respaldo teórico o que

enriquecerá esta proposta de pesquisa.

Um ponto muito importante que deve ser levado em consideração é o perfil do

professor para atuar no ensino coletivo infantil do violino. Um profissional que compreenda

as características da faixa-etária proposta nesta investigação e que saiba utilizar recursos

3 Verificar página 5.

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metodológicos adequados de forma motivadora propiciando um aprendizado de qualidade

será de fundamental importância para a pesquisa. Portanto, observar o mediador (professor) e

submetê-lo a um processo de avaliação proporcionará a esta investigação resultados que

contribuirão para a formação do perfil do professor para atuar na área de ensino coletivo

infantil do violino.

Reunir fundamentos que sustentam o envolvimento da família no processo de

aprendizagem musical coletiva do ensino do violino da criança de 5 anos respaldará a

importância da presença da família na educação musical da criança gerando na mesma

segurança para continuar seus estudos no violino.

Quanto aos aspectos sociais, percebe-se a importância de um estudo conceitual à

compreensão do meio enquanto fator motivador de hábitos, atitudes, enfim de

comportamentos. O ensino coletivo infantil do violino pode beneficiar o aluno não só em sua

formação como instrumentista mais também em sua formação humanística.

Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais

Os conservatórios e as escolas de música no Brasil, ainda atendem em sua maioria

uma clientela específica que abrange a classe média e alta, o que transforma o ensino da

música elitista, (CRUVINEL; LEÃO, 2003). Enquanto que nas escolas públicas, segundo as

mesmas autoras, “A Educação Musical ainda é vista, simplesmente, como parte integrante

das atividades complementares e não como parte das disciplinas prioritárias na formação do

aluno” (CRUVINEL; LEÃO, 2003, p.2). Percebe-se que ainda há, em sua maioria, uma

leitura equivocada sobre a forma com que se deve inserir o estudo da música na vida do

indivíduo.

Com a crescente procura da população pelo aprendizado musical, conservatórios e

escolas de música para atender a demanda, criaram projetos de ensino coletivo de

instrumentos com o objetivo de absorver um público maior no início de seu aprendizado

musical, além de propiciar interação social, despertar maior interesse nos alunos iniciantes e

incentivar para a continuação dos estudos através da dinâmica estimulante de classe de aula

(YING, 2007).

O ensino coletivo de instrumentos musicais, além de possibilitar um acesso de maior

número de pessoas ao aprendizado musical, também contribui para um desenvolvimento

sócio-crítico e cognitivo criando aspectos que estimulem uma interação muito maior no

grupo, que não se restringe só à absorção de conhecimento, mas se amplia à compreensão e

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socialização de aprendizado (CRUVINEL, 2004). Um aspecto considerado importante nas

práticas pedagógicas coletivas de instrumentos musicais é a motivação, que proporciona ao

aluno um maior interesse tornando-o participativo, criativo, competitivo (de forma saudável)

e assíduo às aulas.

Segundo Flávia Cruvinel (2003), o ensino coletivo de instrumentos musicais agrega

em seu processo de aprendizagem vários benefícios. Dentre eles, destaca-se no

comportamento social do aluno, a melhora na disciplina, na organização, na cooperação, na

solidariedade, no respeito mútuo, na concentração, no desempenho técnico-musical, na

consciência corporal, na assimilação e acomodação dos conteúdos, na interação entre os

alunos despertando a socialização, a motivação. Sendo assim, pode-se dizer que o ensino

coletivo de instrumentos musicais pode ser utilizado como uma alternativa motivadora e

socializadora nos conservatórios, nas escolas de música e nas escolas públicas.

Em relação ao repertório, Cruvinel (2003) destaca o desenvolvimento de maneira mais

rápida; o desenvolvimento do ouvido harmônico do aluno; a economia de tempo no processo

de aprendizagem nos aspectos instrumentais e musicais. Há também, um maior rendimento do

aluno em sala de aula, baixo índice de desistência, melhora da auto-estima, maior estímulo,

desinibição, ou seja, os alunos passam por uma transformação não só no que diz respeito ao

comportamento, mas também no processo de aprendizagem coletiva (CRUVINEL, 2003, p.

217).

No ensino coletivo de instrumentos de musicais o aluno pode ser visto como um

indivíduo que faz parte do processo de aprendizagem, onde não apenas recebe os

ensinamentos como também participa ativamente das aulas. Valorizar o aluno e estimular sua

participação em sala de aula de forma criativa e produtiva é apenas um dos vários pontos

importantes para proporcionar ao indivíduo uma formação educacional na música prazerosa e

sem traumas.

Metodologia

Para a elaboração e aplicação da proposta pedagógica de ensino coletivo do violino

para crianças de 5 anos, utilizarei o estudo de caso, que de acordo com Adelman e Kemp

(1995) consiste em uma descrição detalhada dos acontecimentos ocorrentes durante a

pesquisa e suas relações internas e externas, desde que estejam dentro dos limites escolhidos e

bem delimitados pelo investigador. Sendo que, caso ocorra algo que fuja dos limites

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estabelecidos deve-se dar uma explicação adequada preservando assim, a pesquisadora e sua

proposta de pesquisa.

De acordo com Flick (2009), entende-se que a pesquisa qualitativa pode proporcionar

a investigação possibilidade de formulação de estratégias de pesquisa de campo contínua,

experimentação e uma exploração profunda da avaliação dos resultados de forma a

contemplar não somente aspectos quantitativos. Sendo assim, entende-se que em princípio, as

estratégias de estudos qualitativos melhor se adequarão a proposta de pesquisa aqui

apresentada, o que não anula de fato a possibilidade da utilização de estratégias quantitativas

caso se faça necessário. Utilizar-se-á também da observação participante devido a

pesquisadora ser a professora que atuará em sala de aula.

Como instrumentos de coleta de dados serão utilizados: questionários (aplicados aos

pais antes e depois do processo), observação participante (cuja professora será a ministrante e

a observadora que anotará as ocorrências em sala), vídeogravações (possibilidade de registrar

em áudio e vídeo as aulas e retiradas de dúvidas posteriormente) e juízes independentes (para

trazer legitimidade nas anotações e vídeogravações).

Após a coleta de dados todo o material será analisado buscando similaridades e

discordâncias entre si. Para isso se faz necessário utilizar de uma técnica metodológica

chamada triangulação.

A triangulação é uma técnica metodológica que visa ampliar o leque de informações (dados), colocando informações provenientes de diferentes fontes em interação, na interpretação realizada pela pesquisa (FREIRE, 2010.p.32)

A utilização da técnica de triangulação possibilitará a busca de confiabilidade e

aprofundamento nos resultados dos dados o que promove uma maior fidedignidade na

proposta de pesquisa.

Diferentes fontes de informações (sujeitos internos ou externos ao processo, documentos etc.) propiciam diferentes ângulos de visão e, portanto, favorecem o aprofundamento e o enriquecimento das conclusões de pesquisa, o que torna a triangulação uma estratégia metodológica interessada para as abordagens qualitativas em especial (FREIRE, 2010.p.32)

Segundo Fagundes (1999, apud. BELEI; MATSUMOTO; NASCIMENTO;

PASCHOAL, 2008, p.5), para se considerar o processo de triangulação como ferramenta

metodológica eficaz na análise dos dados, a margem aceitável quando a classificação do

pesquisador e dos juízes atinge um índice de concordância mínimo de 70%. Sendo assim, será

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considerado para essa pesquisa, o percentual de 70% como referência de cálculo de

concordância entre as observações do pesquisador/participante e os juízes independentes.

Conclusão

O ensino coletivo de instrumentos musicais pode propiciar ao indivíduo uma formação

musical integradora com benefícios que se estendem para a formação social do indivíduo,

além de oportunizar um acesso maior da comunidade no processo de formação musical.

É imprescindível que a Educação Musical, no contexto social contemporâneo, apóie

seu entendimento dos processos pedagógicos em suas relações com a sociedade para o auxilio

da criação de metodologias inovadoras que auxiliam a transformação social. A elaboração de

projetos voltados ao ensino coletivo de instrumentos musicais com propostas pedagógicas

inovadores e eficientes pode contribuir com novas vertentes do ensino de música

especialmente no Brasil.

Oportunizar uma formação que permita uma prática pedagógica musical que valorize e

respeite o desenvolvimento do indivíduo como um todo, permite que o ensino da música não

seja individualista e competitivo o que gera em sua maioria frustração nos alunos que não

desejam a profissionalização. De acordo com discussões realizadas anteriormente neste

trabalho, podemos dizer que a música exerce uma influência na vida do indivíduo, sendo

assim se torna pertinente afirmar que o processo pedagógico do ensino coletivo de

instrumentos musicais deve ser considerado como um dos fatores primordiais na formação do

indivíduo. Estimular criação de projetos que proporcionem um aprendizado abrangente nos

aspectos técnico e social é de suma importância para obtenção de sucesso no decorrer da

aplicação dos mesmos.

Faz-se necessário descrever algumas considerações vislumbrando perspectivas que

possam contribuir para uma proposta de ensino coletivo de instrumentos musicais. Percebe-se

a importância de um estudo conceitual à compreensão do meio enquanto fator motivador de

hábitos, atitudes, enfim de comportamentos. A cultura que o indivíduo carrega dentro de si até

a sala de aula deve ser considerada como um fator positivo para a sua formação. Respeitar a

individualidade sugere ao aluno um ambiente de aprendizagem confortável e seguro.

É pertinente dizer que a proposta de ensino coletivo de instrumentos musicais, não

vem de maneira alguma anular o ensino considerado “tradicional de música instrumental”.

Sabe-se que cada indivíduo possui características diferentes, assim adequando-se a diferentes

formas de aprendizado. Sendo assim, permite-se dizer que o ensino coletivo de instrumentos

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musicais, pode ser uma ferramenta de trabalho que oportuniza ao indivíduo a aquisição de

benefícios que vão além de aprimoramentos técnicos. A prática coletiva de instrumentos

musicais atinge também aspectos sociais como, por exemplo, a integração com o grupo,

respeito e atenção para com o próximo e a sociabilidade com outros indivíduos.

Considera-se também importante deixa-se registrado o quanto o ensino coletivo pode

contribuir para a educação musical como uma proposta de ensino aprendizagem eficiente que

beneficia o indivíduo não somente em aspectos técnicos, mas também contribui para uma

formação mais integradora, social e motivadora.

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Referências

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ENCONTRO NACIONAL DE ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS, 2. 2006. 270p. Goiânia. Anais... Goiânia: ENECIM, 2006. FLICK, Uwe. Introdução à Pesquisa Qualitativa. 3º Edição. Porto Alegre: Editora Artmed, 2009. FREIRE, Vanda B. Horizontes da Pesquisa em Música. Rio de Janeiro: Editora 7 Letras, 2010. GAINZA, Violeta Hemsy de. Estudos de Psicopedagogia Musical. São Paulo: Ed. Summus, 1988. GORDON, Edwin E. Teoria de aprendizagem musical: competências, conteúdos e padrões. Lisboa: Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 2000. ILARI, Beatriz. Em busca da mente musical: ensaios sobre os progressos cognitivos em música – da percepção à produção. Curitiba: Editora UFPR, 2006. MÁRSICO, Leda Osório. A criança e a música. Rio de Janeiro-Porto Alegre: Editora Globo, 1982. PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. 24º Edição. São Paulo: Editora Forense Universitária, 2001. SLOBODA, John. A mente musical a psicologia cognitiva da música. Londrina-PR: Editora EDUEL, 2008. SUZIGAN, Maria Lucia Cruz; SUZIGAN, Geraldo de Oliveira. 1986. Educação musical: um fator preponderante na construção do ser. 2º.Edição. Cadernos Brasileiros de Educação. São Paulo: CLR Balieiro e G4 Editora, 1986. YING, Liu Man. O ensino coletivo direcionado no violino. 225f. Dissertação de Mestrado – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2007.

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Adoniran Barbosa: educação e samba

Ana Claudia Cesar Universidade Presbiteriana Mackenzie

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Resumo: O Samba como escola é uma reflexão sobre a cultura popular, é uma das muitas histórias sobre aquisição de conhecimento e propagação dos mesmos de maneira totalmente alternativa aos meios estabelecidos pela educação formal. Para isto busquei como exemplo o sambista Adoniran Barbosa, que nos revela em suas músicas a cidade de São Paulo sobre a ótica dos moradores que não estão inseridos nos planos de desenvolvimento desta grande metrópole.

Palavras chave: Educação, cultura popular, samba

Introdução

O processo de ensino e aprendizagem tem considerado dentre outros fatores os saberes

que vão além dos conteúdos educacionais oficiais que na sua grande maioria não revela todas

as facetas e aspectos de transformação social, especialmente por focalizar e relevar apenas os

interesses daqueles que detém o poder.

No entanto, é mais que reconhecido em nossos dias que há saberes que se

desenvolvem além das esferas educacionais tradicionais e que compõem a cultura de um povo

levando-o a se reconhecer como sujeitos da história e não apenas como meros participantes

passivos da mesma.

Dentre outros lugares, encontramos nas músicas populares esse conteúdo crítico de um

povo que ao cantar a sua história revela seus sentimentos, suas frustrações e esperanças,

transmitindo assim, oralmente suas convicções sejam elas de ordem política, religiosa ou

social. Tomando isso como base de pesquisa podemos compreender as transformações sociais

que tomaram parte na história da cidade de São Paulo entre os anos 1950 a 1960 mirando

especialmente o estabelecimento da região central que forçou a saída de imigrantes e negros

que viviam naquela região. Para tanto, nos valemos das canções escritas e interpretadas pelo

sambista Adoniran Barbosa que, além de ser considerado aquele que estabelece o samba

paulista, interpreta seu tempo de forma criativa e profunda denunciando não apenas a

ocupação espacial do centro de São Paulo mas também a segregação social existente no

processo de desenvolvimento social.

Adoniran Barbosa: educação e Samba

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Talvez a maior discussão para Bourdieu esteja na dificil tarefa de desvendar os

mecanismos da reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação. Para

empreender esta tarefa, Bourdieu desenvolve conceitos específicos, retirando os fatores

econômicos do epicentro das análises da sociedade, a partir de um conceito concebido por ele

como violência simbólica. Esta violência seria efetivamente legitimada pelas forças

dominantes, que se expressam através dos gostos e de estilos destas classes.

A roda de Samba e o Samba de Roda

O samba desde a sua origem, é uma manifestação popular que narra a história não

oficial. Desde que os negros chegaram ao Brasil que seus hábitos e costumes pouco a pouco

foram se incorporando à cultura dos habitantes deste novo País. Os negros nas senzalas em

seu pouco tempo livre aproveitavam para realizar seus rituais e pedir que o sofrimento da

escravidão tivesse prazo pra acabar. Os negros formavam rodas e com vozes e palmas

cantavam e dançavam num ritual onde um par entrava no centro da roda e com um gesto

característico de umbigada iniciavam um solo da dança, na troca do par acontecia novamente

o encontro dos umbigos. Este ritual foi tão marcante que o nome “Samba” teria sua origem

em um dialeto africano de “Semba”, que significa umbigo.

É o que nos confirma o historiador, pesquisador e escritor André Diniz: “O samba de

roda da Bahia, o lundu, o coco, o calango e o cateretê são tradições musicais e coreográficas

ligadas ao universo do negro que podem ser definidas como samba de umbigada”. (DINIZ,

2008, p.47)

Hoje a roda de samba é um lugar para se divertir, mas a brincadeira pode ser o desafio

de versar, um participante lança um verso provocativo aos demais, e quem conseguir

responder pode desafiar os outros. Estes versos improvisados são sempre intercalados por um

refrão que é repetido por todos como parte da brincadeira, assim se caracteriza uma das

formas mais populares da nossa música: o “Samba de Roda”.

Para se fazer samba não é preciso possuir conhecimentos formais como ler e escrever,

a narrativa é construída pela canção, que pode narrar o cotidiano de qualquer indivíduo que

possua inspiração para cantar versos ritmados sobre qualquer assunto de seu universo

existencial, totalmente inserido na tradição oral, característica inerente à cultura. A letra de

um samba pode revelar o cotidiano do autor, mas pode também narrar a história não oficial da

resistência dos negros oprimidos desde o início da colonização.

O historiador e escritor Francisco Rocha nos ajuda a refletir sobre o tema:

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Assim, em seu fazer artístico, o cancionista não tem de requisitar, necessariamente, um capital cultural relativo ao universo da cultura letrada, e uma vez que sua habilidade está em produzir ao canto, sua obra pode até renunciar à escrita, mas não pode prescindir da cultura oral, das representações do mundo que, entre outros suportes, fixam-se em narrativas orais. (...) Ao afirmar o paradoxo entre a boa letra de um samba e a condição de se ignorar o código escrito, caminha-se no campo de um discurso ambíguo, mas, por outro lado, delimita-se a relação de oposição entre dois universos culturais: cultura popular / cultura letrada ou oficial (ROCHA, 2002, p. 107-108).

O samba surge como resistência, como a voz de uma classe que não tem direito nem

oportunidade de se manifestar, e que cria essa possibilidade artística para dizer o que sente e

pensa, e isto pode se transformar na grande oportunidade de manifestação dos excluídos.

Segundo Paulo Freire, “Faz parte do pensar certo a rejeição mais decidida a qualquer

forma de discriminação. A prática preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofende a

substantividade do ser humano e nega radicalmente a democracia.” (FREIRE, 1996, p.36)

O termo escola de samba surge pelo simples fato de estar próxima de uma escola

formal. O surgimento da escola de samba é sem dúvida a necessidade de se ter um lugar para

reunir pessoas da mesma classe social, que eram constituídas por negros, mulatos e brancos

pobres. É um lugar onde as pessoas encontravam respaldo e diversão além do respeito mútuo,

era também um lugar propício para desenvolver e fomentar a própria cultura.

As escolas de samba fazem parte da nossa história cultural e se preservam desde 1928,

data da formação da primeira escola, que logo serviu de exemplo para a formação de várias

outras em outros bairros cariocas.

Grosso modo, o que pode ser um preconceito contra os compositores de samba, impondo a eles a condição do desconhecimento da linguagem escrita para a produção de sua arte, pode estar camuflado a revelação de um saber que se inscreve na arte do sambista. De fato, o domínio da palavra escrita não é o elemento primordial de tal arte (ROCHA, 1978, p. 106).

A cidade de São Paulo também foi um celeiro de cultura popular, pois com a vinda de

negros para a cidade as manifestações ligadas ao samba se fizeram cada vez mais presente.

Mas a cidade também era um lugar de planejamento para um ideal de progresso, com o

objetivo de alavancar a economia do País. Devido a este plano de progresso e

desenvolvimento a cidade foi se reestruturando e se ampliando de forma marcante e

avassaladora. Mas mesmo com todo este ideário a cultura popular continuou se manifestando

com muita propriedade e personalidade, muitos são os compositores de samba que podem ser

citados. Vou me ater a uma grande personalidade: Adoniram Barbosa.

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Assim, estruturas sociais e agentes individuais se alimentam numa engrenagem de caráter conservador. É o caso da maneira como cada um lida com a linguagem. Tudo que a envolve - correção gramatical, sotaque, habilidade no uso das palavras e construção etc - está fortemente à posição social de quem fala e à função de ratificar a ordem estabelecida. Para Bourdieu, todas essas ferramentas de poder são essencialmente arbitrárias, mas isso não costuma ser percebido (FERRARI, 2008).

Adoniran fazia parte da classe de brancos pobres, e com muita criatividade e humor

revela uma outra cidade, que em sua crítica é desumana e cruel, pois não perdoa os que não

estão incluídos no seu plano de progresso.

Adoniran é o sambista das malocas, e narra pouco à pouco a expulsão de seus

moradores, que sem ter muita alternativa acabam muitas vezes morando nas ruas.

Em seu livro Almanaque do Samba , o escritor André Diniz fala sobre o sambista

Adoniran Barbosa:

“Adoniran percebia as mudanças na cidade e particularmente a perda de memória

coletiva dos antigos espaços de sociabilidade, substituídos pelas modernas construções. Como

um cronista privilegiado, registro também o linguajar do paulistano menos favorecido”

(DINIZ, 2006, p. 81-82).

Adoniran é o artista, o crítico, o cronista da cidade, é a história não oficial, e também é

um formador de opinião com muito saber, pois revela em suas canções as mudanças e

transformações arquitetônicas, e a expulsão dos que não estão incluídos neste projeto de

desenvolvimento.

Isto me remete a outra fala de Paulo Freire:

Não posso virar conivente de uma ordem perversa, irresponsabilizando-a por sua malvadez, ao atribuir a forças cegas e imponderáveis os danos por elas causados aos seres humanos. A fome frente a frente à abastança e o desemprego no mundo são imoralidades e não fatalidades como o reacionarismo apregoa com ares de quem sofre por nada poder fazer. O que quero repetir, com força, e que nada justifica a minimização dos seres humanos, no caso das maiorias compostas de minorias que não perceberam ainda que juntas seriam a maioria. Nada, o avanço da ciência e/ou da tecnologia, pode legitimar uma ordem desordeira em que só as minorias do poder esbanjam e gozam enquanto às maiorias em dificuldades até para sobreviver se diz que a realidade é assim mesmo, que sua fome é uma fatalidade do fim do século. Não junto a minha voz à dos que, falando em paz, pedem aos oprimidos, aos esfarrapados do mundo, a sua resignação. Minha voz tem outra semântica, tem outra música. Falo da resistência, da indignação, da justa ira dos traídos e dos enganados. Do seu direito e do seu dever de rebelar-se contra as transgressões éticas de que são vítimas cada vez mais sofridas (FREIRE, 1996, p. 100-101).

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Com este texto procuro criar uma ponte entre os estudos de Bourdieu e de Paulo

Freire, pois ambos falam sobre classes dominantes e injustiças sociais, para isso construí uma

ponte até o samba que é um representante da opressão social de uma classe não privilegiada, e

desde sua origem é tido como a voz do povo.

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos, todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: Educação? Educações (BRANDÃO, 1995, p.7).

Seja por qualquer via e das formas mais diversas e variadas, ninguém está livre de

aprender. A existência é um eterno aprendizado.

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Referências

DINIZ, André. Almanaque do Samba: a história do carnaval, o que ouvir, o que ler, onde curtir. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2006. ______. Almanaque do Carnaval: a história do carnaval, o que ouvir, o que ler, onde curtir. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2008. FERRARI, Marcio. Educar para crescer. Disponível em: <http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/pierre-bourdieu-307908.shtml>. Acesso em: 18 out. 2009. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários á pratica educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. ROCHA, Francisco. Adoniran Barbosa: o poeta da cidade. São Paulo: Ateliê Editorial, 1978 BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação? São Paulo: Brasiliense, 1995.

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Aprendizagem Significativa / Aprendizagem Musical

Ana Claudia Cesar Universidade Presbiteriana Mackenzie

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Resumo: A aprendizagem significativa é sem dúvida uma forma efetiva de aprender, partindo de conhecimentos prévios do indivíduo é possível criar pontes cognitivas para novos conhecimentos. Para que isto aconteça temos que ter uma intencionalidade de todos os envolvidos nesta nobre missão, pois a intencionalidade é a peça fundamental desta engrenagem.Tanto o educador como o aluno tem que ter a intenção para que o conhecimento se consuma.Estudando este conceito descobri que o ensino da música é um ótimo exemplo para a demonstração efetiva da aprendizagem significativa. Para isto cito um grande educador musical húngaro, Kodály.Zoltan Kodaly defendia a ideia de que a música tinha que fazer parte da educação integral do ser humano desde o jardim de infância, com o mesmo número de horas e mesma ênfase dada às matérias convencionais durante toda a vida escolar dos jovens cidadãos.

Palavras Chaves: Ensino, aprendizagem, intenção, música

Introdução

Assim como a educação formal, a educação musical sempre buscou modos para

desenvolver novos métodos a fim de tornar cada vez mais acessível a aquisição de novos

conhecimentos, buscando também na educação formal ajuda e possibilidades para se

desenvolver e para atingir todos aqueles que desejam estudar a linguagem musical.

Visto que eu trabalho com música, sempre tive interesse em pesquisar diversos

educadores, principalmente os que desenvolveram métodos específicos para a aprendizagem

musical.

O estudo da aprendizagem significativa de Ausubel (1968) remeteu-me de imediato a

um método musical que pesquisei e utilizo no desenvolvimento do meu trabalho como

educadora musical.

É o método de aprendizagem musical do húngaro Kodály. Tanto Ausubel como

Kodály, estudiosos e pesquisadores contemporâneos, criaram e desenvolveram um método

que era mais acessível à maioria dos alunos, partindo de conhecimentos prévios que os alunos

já traziam em sua bagagem pessoal, e que a partir destes, estabelecessem novos

conhecimentos. Este foi o ponto de partida que utilizei para o desenvolvimento deste trabalho

entre educação formal e educação musical.

Aprendizagem Significativa

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Ausubel (1918–2008) desenvolveu a teoria da aprendizagem significativa. Considero

relevante comentar sua experiência infantil de insatisfação com as condições que a escola

oferecia para o desenvolvimento e aprendizagem. Sua experiência pessoal, talvez, tenha sido a

origem de seus estudos sobre a relação professor-aluno e os “caminhos a serem oferecidos

para que a capacidade de perceber, compreender, elaborar fosse facilitada em situação de

educação formal” (MASINI, 2008, p. 64). Em uma escola pública no bairro do Brooklin em

Nova York, frustrou-se com os estudos e com o tratamento recebido. Filho de imigrantes

judeus, Ausubel, aos seis anos, soltou um palavrão, o que bastou para sofrer represálias: além

de ter sua boca lavada com sabão, foi exposto durante toda a aula de pé para que a humilhação

servisse de exemplo para os demais alunos. Sua revolta levou-o a declarar que a escola era um

verdadeiro cárcere para meninos. O vivido, talvez, tenha sido inspiração para um novo olhar

sobre a educação. Este fato, sem dúvida, ajudou a definir o objeto de estudo de Ausubel, que

assinala a importância da relação professor-aluno e da atenção do professor ao que o aluno

sabe para ocorrência da aprendizagem, conforme afirma: “O mais importante fator isolado

que influencia a aprendizagem é o que o aprendiz já sabe. Determine isto e ensine-o de

acordo” (Ausubel, 1968, p. VI).

O diálogo entre professor e aluno sem dúvida é a melhor forma de pesquisa de dados

para a ocorrência da aprendizagem significativa, pois é através dele que se pode promover a

interação com os alunos de uma classe. Uma conversa descontraída e informal pode ser fonte

de um relevante acúmulo de dados sobre o que o aluno conhece para daí pinçar o que de fato

pode ser usado como base para introduzir as novas informações. A revelação de gostos

pessoais do cotidiano, como o time que torce, o filme que mais gostou de assistir, a

reportagem jornalística que mais chamou a atenção ou o estilo de música preferida, sem

dúvida pode ajudar o professor a criar pontes para o ensino propiciando elaboração cognitiva

para um novo conhecimento.

A aprendizagem é dita significativa quando uma nova informação (conceito, idéia,

proposição) adquire significados para o aprendiz através de uma espécie de ancoragem em

aspectos relevantes da estrutura cognitiva preexistente do indivíduo, isto é, em conceitos,

idéias, proposições já existentes em sua estrutura de conhecimentos (ou de significados) com

determinado grau de clareza, estabilidade e diferenciação (MOREIRA, 1997).

São muitos os assuntos que podem servir de prévios pontos de apoio para aquisição de

um novo conhecimento, isso envolverá a criatividade de cada professor.

De acordo com Moreira (2008, p. 15-16), para Ausubel:

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a aprendizagem significativa é aquela em que o significado do novo conhecimento é adquirido, atribuído, construído, por meio da interação com algum conhecimento prévio, especificamente relevante, existente na estrutura cognitiva do aprendiz. Interação é a palavra chave: interação entre conhecimentos novos e conhecimentos prévios. Se não há interação não há aprendizagem significativa.

Os conhecimentos prévios são fundamentais para a aquisição de novos conhecimentos.

Estes conhecimentos são chamados de subsunçores, e podem ser uma imagem, um símbolo,

um conceito, ou qualquer outro tipo de dado que já esteja confortavelmente armazenado.

Mas não basta ter estes conhecimentos, é fundamental que o educador desenvolva

condições para ligar os conhecimentos que o aluno já possui, com os novos conhecimentos. O

educador tem que propiciar pontes entre estes conhecimentos, pontes cognitivas que façam

esta conexão. Se o material a ser introduzido é totalmente novo para o aluno, Ausubel propõe

o recurso do uso dos organizadores prévios - materiais introdutórios apresentados com a

principal função de servir de ponte entre o que o aprendiz já sabe e o que o professor irá

ensinar. Os organizadores facilitam a aprendizagem na medida em que propiciam condições

para o aluno compreender a nova informação. O educador, neste aspecto, partindo do que o

aluno conhece, propicia a ele ser o construtor destas pontes cognitivas para aquisição do que é

ensinado, concretizando assim a assimilação dos novos conhecimentos.

É, portanto, fundamental ter acesso ao conhecimento prévio do aprendiz, para o

aprendizado do novo conhecimento. O educador precisa coletar o maior número de

informações sobre conhecimentos já existentes que sirvam de ponte para o novo

conhecimento. Dei-me a liberdade de imaginar esta ponte como um arco-íris por algumas

conexões que fiz com esta imagem, que além de ser bela, ainda traz vários significados.

Como esclarece Moreira (2008, p. 19): “Os significados não estão nos materiais

educativos. Eles estão nos alunos, nos professores e nos autores. Os materiais são apenas

potencialmente significativos”.

Uma questão relevante é a predisposição tanto dos alunos como dos professores. Se

não houver esta predisposição de ambas as partes, nem o melhor dos professores e nem o

mais aplicado aluno, conseguirá realizar esta árdua tarefa, pois essa é a questão fundamental

para a aprendizagem.

A predisposição para aprender não é exatamente aquilo que chamamos de motivação. É claro que implica motivação, mas é, antes, uma intencionalidade, um esforço deliberado para relacionar o novo conhecimento a conhecimentos prévios, mais inclusivos, mais diferenciados, existentes na estrutura cognitiva com certa estabilidade e clareza. É um

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compromisso afetivo – não no sentido de gostar, mas sim de querer – de relacionar novos conhecimentos a conhecimentos prévios (Ibid, p. 20).

Esta é sem dúvida a questão principal de qualquer aprendizagem: só se aprende se

quiser aprender, se houver a intencionalidade, pois sem isto se torna impossível aprender

qualquer coisa, e se o aluno não estiver predisposto e aberto à nova informação, será

dificílimo realizar esta tarefa. Parece, assim, que a questão do resgate do prévio conhecimento

poderá contribuir para a predisposição dos alunos; se o educador achar o elo pessoal que

ligará o que o aluno já sabe com o novo conhecimento, esta tarefa poderá facilitar a

construção dessa ponte cognitiva. Podemos, no entanto, dizer que não há aprendizado se não

houver disposição para a aprendizagem: poderão ser apresentados organizadores prévios,

conhecimento em diversos segmentos, mas não haverá aprendizagem se não houver interesse

do aluno em relacionar e significar o conhecimento já existente com o novo que se apresenta.

A intencionalidade se faz fundamental no processo de aprendizagem, mas podemos

considerar também que os organizadores prévios poderão ser uma ferramenta (ponte) para que

o professor possa trazer esse aluno para o aprendizado, descobrindo no aluno quais seus

conhecimentos prévios particulares com os quais estará fazendo as ligações necessárias para

auxiliar o aluno no entendimento de um novo conceito.

Por isso uma educação que apenas pretenda transmitir significados que estão distantes da vida concreta dos educandos, não produz aprendizagem alguma, é necessário que os conceitos (símbolos) estejam em uma conexão com as experiências dos indivíduos. Voltamos assim à dialética entre o sentir (vivenciar) e o simbolizar. Este é o ponto fundamental no método de alfabetização do educador brasileiro Paulo Freire: Aprende-se a escrever quando as palavras se referem às experiências concretamente vividas. Aprender não é decorar. Aprender é um processo que mobiliza tanto os significados, os símbolos, quanto os sentimentos, as experiências a que eles se referem (DUARTE JR., 1991, p. 25).

Para que o ensino se consuma, alunos e professores compartilham significados. A

aprendizagem significativa ocorrerá se os professores propiciarem condições apropriadas para

os alunos reconhecerem e resolverem problemas, compreenderem um novo fenômeno e

construírem modelos mentais a respeito e, utilizando-os em novas situações, ampliar seus

objetivos e sua própria aprendizagem.

Uma Experiência de Aprendizagem Significativa de Música

Para fazer uma breve conexão com o meu objeto de estudo, a música, escolhi dar o

exemplo de um grande educador musical húngaro, Kodály (1882–1967).

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Kodály defendia que a música tinha que fazer parte da educação integral do ser

humano desde o jardim de infância, com o mesmo número de horas e mesma ênfase dada às

matérias convencionais durante toda a vida escolar dos jovens cidadãos. (GUEDES, 2009)

A música é uma manifestação do espírito humano, similar à língua falada. Os seus praticantes deram à humanidade coisas impossíveis de dizer em outra língua. Se não quisermos que isso permaneça um tesouro morto, devemos fazer o possível para que a maioria dos povos compreenda esse idioma (KODÁLY, 1966, apud GOULART, 2001)1.

Kodály sustentava que, assim como na linguagem e na literatura, um país deve

começar com a “musical mother tongue”, isto é, língua musical nativa, que para ele era a

canção folclórica, e através dela ir expandindo até alcançar a compreensão da literatura

musical universal.

Considerava o canto como fundamento da cultura musical: para ele, a voz é o modo

mais imediato e pessoal de nos expressarmos em música. Mesmo o acompanhamento

harmônico é feito por vozes, pois o método enfatiza o canto coral. O canto não é apenas um

meio de expressão musical, mas ele ajuda no desenvolvimento emocional e intelectual

também. Para ele, quem canta com frequência obtém uma profunda experiência de felicidade

na música. Através das nossas próprias atividades musicais, aprendemos conceitos como

pulsação, ritmo e forma da melodia.

Para Kodály a base da educação musical era o canto, mas não qualquer canto, e sim o

ensino de músicas folclóricas húngaras para as crianças pequenas, como o início da

alfabetização musical.

Temos que educar músicos antes de formar instrumentistas. Uma criança só deve ganhar um instrumento depois que ela já sabe cantar. Seu ouvido vai se desenvolver somente se suas primeiras noções de som são formadas a partir de seu próprio canto, e não conectadas com qualquer outro estímulo externo visual ou motor. A habilidade de compreender música vem através da alfabetização musical transferida para a faculdade de ouvir internamente. E a maneira mais efetiva de se fazer isto é através do canto (Ibid.).

Esse conhecimento era transmitido de forma espontânea, pois estas músicas podiam

ser ensinadas por pais e professores, sem a preocupação do ensino formal de leitura de notas

musicais. Este era o primeiro passo para o ensino da música em todas as escolas da Hungria.

Kodály acreditava que a música era fundamental para o desenvolvimento do intelecto, das 1 KODÁLY, Zoltán. Conferência sobre O Papel da Música na Educação, Universidade da California, 1966.

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emoções, e de toda a personalidade do homem. Não podia ser entendida como um luxo para

poucos, pois acreditava que a música é um alimento espiritual para todos. Por esta razão se

dedicou a estudar uma forma de tornar a música uma linguagem acessível a todos os

estudantes húngaros, e enfrentou essa questão de forma ideológica até conseguir realizar seu

intuito. Depois de aprender as músicas folclóricas húngaras, as crianças estavam prontas para

aprender a distinguir os sons de cada nota, em outras palavras, a distância entre os sons.

Quando as crianças já tinham assimilado estes conhecimentos, elas então estavam prontas

para serem alfabetizadas formalmente, isto é, pela leitura de partituras (GOULART, 2001).

Neste caso específico, saber cantar as músicas folclóricas serviu de conhecimento

prévio (subsunçores) para a aquisição de novos conhecimentos, que neste caso era aprender a

distância entre os sons das notas destas canções, e isso finalmente serviu de âncora para a

aprendizagem da música formal (leitura de partituras).

Zoltán Kodály conseguiu, depois de muita insistência, a implantação do ensino de

música no currículo formal de todas as escolas da Hungria. O resultado efetivo deste trabalho

é que todos os estudantes húngaros saem das escolas totalmente musicalizados, podendo optar

ou não pela profissionalização musical, afinal Kodály acreditava que o ensino musical era

fundamental para a formação intelectual básica de um indivíduo.

Considerações Finais

Ao conhecer o método Kodály, comecei a trabalhar com o repertório de músicas que o

aluno naturalmente trazia em sua memória. Sem ter conhecimento sobre a aprendizagem

significativa, desenvolvi um trabalho musical ilustrativo da teoria da Aprendizagem

Significativa de Ausubel: resgatei, da prática de conjunto, o que os alunos possuíam de

prévios conhecimentos para a construção de um repertório musical específico. Trabalhar uma

música para tocá-la em grupo é, sem dúvida, uma experiência essencial para todos os

estudantes de música; para que isso se realize é preciso ficar em silêncio, estar atento, ouvir o

outro, e muitas vezes até respirar junto para que a música aconteça.

A reflexão sobre esta experiência de aprendizagem significativa de música é um

exemplo vivo e atual de como a ideologia de um grande mestre, Kodály, conseguiu de fato

transformar um país, e como esta transformação manifesta-se na concepção humana de cada

cidadão húngaro. Hoje este método é muito difundido pelo mundo por ser possível e viável.

Não podemos evidentemente esquecer que, em tudo, está presente a intencionalidade, não só

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de quem aprende, mas de quem ensinam e, principalmente, de quem luta por uma idéia, com a

certeza de que aquela idéia vai transformar os indivíduos e com isto transformar o mundo.

A idéia do professor construtor é uma idéia viva, o professor é propiciador de

construção de pontes cognitivas. Imagino estas pontes como arco-íris, talvez por intuir que no

final do arco-íris existe de fato um pote de ouro, que simbolicamente é a maior riqueza da

humanidade, o conhecimento.

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Referências

AUSUBEL, David Paul. Educational psychology: A cognitive view. New York: Holt, Rinehart &Winston, 1968. DUARTE JÚNIOR, João Francisco. Porque arte-educação? 6. ed. Campinas: Papirus, 1991. GOULART, Diana. Dalcroze, Orff, Suzuki e Kodály: Semelhanças, diferenças, especificidades. Disponível em: <http://www.dianagoulart.pro.br/english/artigos/dkos.htm>. Acesso em: 08 mai. 2009. GUEDES, Chico Moreira. Kodály Zoltán, mestre da música. Disponível em: <http://hungaromania.wordpress.com/2009/04/01/kodaly-zoltan-um-mestre-magiar-da-musica/>. Acesso em: 08 mai. 2009. MASINI, Elcie F. Salzano. O aprender na complexidade. In: MASINI, Elcie F. Salzano; MOREIRA, Marco Antonio. (Org.). Aprendizagem significativa: condições para ocorrência e lacunas que levam a comprometimentos. São Paulo: Vetor, 2008. MOREIRA, Marco Antonio. A teoria da Aprendizagem Significativa segundo Ausubel. In: MASINI, Elcie F. Salzano; MOREIRA, Marco Antonio. (Org.). Aprendizagem significativa: condições para ocorrência e lacunas que levam a comprometimentos. São Paulo: Vetor, 2008. MOREIRA, Marco Antonio. Mapas conceituais e aprendizagem significativa. Disponível em: <http://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapasport.pdf>. Acesso em: 09 mai. 2009.

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Um Estudo Sobre a Educação Musical Para a Pequena Infância no Brasil

Aruna Noal Correa1 [email protected]

Resumo: Este artigo é proveniente de pesquisa em nível de doutorado pelo PPGEdu/FACED/UFRGS, e contempla como temáticas centrais as áreas de educação musical e educação infantil. Constituindo-se a partir de questionamentos acerca de como foi e como vem sendo organizada a educação musical para a pequena infância brasileira. Pretende-se investigar a organização da educação musical para a pequena infância no Brasil através das narrativas de pesquisadoras/educadoras musicais brasileiras. Optou-se por realizar uma investigação de caráter qualitativo, utilizando-se como método a pesquisa narrativa. O estudo prevê entrevistas com pesquisadoras/educadoras brasileiras da área de Educação Musical acerca de suas produções voltadas a crianças pequenas no país, construindo um apanhado a cerca do ensino da música e considerando suas percepções acerca da educação para a pequena infância no país nos espaços escolares de educação infantil atuais. A análise culminará em um entrelaçamento com a pedagogia italiana, visando-se confrontar a perspectiva de construção músico-pedagógica brasileira com a visão italiana de vínculo da infância com as artes, em especial nesta pesquisa, com a música. Ao final, visa-se contribuir com a efetivação do trabalho musical a ser contemplado nas matrizes curriculares das escolas de educação infantil na medida em que possibilitaremos através das narrativas das educadoras/pesquisadoras musicais uma perspectiva de como a educação musical brasileira poderia ser organizada e conduzida atualmente entre os espaços escolares de educação para a pequena infância no Brasil. Refletindo, consequentemente, na formação musical e pedagógico-musical dos professores unidocentes.

Palavras chave: Educação musical, educação infantil, unidocentes

O presente artigo é proveniente de pesquisa em desenvolvimento a nível de doutorado

através do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande

do Sul, e contempla como temáticas centrais as áreas de educação musical e educação infantil.

A mesma vem constituindo-se a partir do questionamento acerca de como foi e como vem

sendo organizada a educação musical para a pequena infância brasileira. Entendendo pequena

infância como a faixa etária entre zero e três anos de idade.

Pretende-se com esta, investigar a organização da educação musical para a pequena

infância no Brasil a partir das narrativas de pesquisadoras/educadoras2 consideradas na

pesquisa pessoas-chave para a educação musical brasileira. Procurando sistematizar

cronologicamente as narrativas das participantes acerca de suas propostas e práticas musicais,

compreender o processo de musicalização infantil organizado pelas mesmas e, identificar em

1Acadêmica do Doutorado em Educação da PPGEdu/FACED/UFRGS. Orgão financiador: CAPES. 2Termo utilizado no feminino pela constituição da pesquisa ser de maioria feminina.

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suas narrativas perspectivas para a educação musical infantil nos espaços escolares e práticas

musicais unidocentes3 atuais.

No âmbito da educação e da educação musical no país, diferentes pesquisas e práticas

relativas a área de música foram e são produzidas sobre e para a educação infantil. Algumas

destas, desenvolvidas pelas pesquisadoras/educadoras musicais Josette Feres, Walkyria

Passos Claro, Lydia Hortélio, Carmen Mettig Rocha, Elvira Drummond, Esther Beyer (in

memorian), Maria Teresa Alencar de Brito, Beatriz Ilari, Ilza Joly, Maria Cecília Cavalieri

França, Leda Maffioletti, Ricardo Freire, Luciana Ostetto4. Parto do pressuposto de que

pesquisas anteriores, assim como essa, presenciaram uma lacuna no que se refere a trajetória

histórica da educação musical para a primeira infância do Brasil, em especial voltada as

crianças de zero a três anos de idade, e pontuada pela atuação das professoras acima citadas.

O Brasil é um país com vasta diversidade cultural, diversidade esta proveniente das

diferentes influências advindas de nosso processo de colonização, do tamanho de nosso

território e as influências originadas por nossas fronteiras, e os processos de povoamento dos

diferentes momentos históricos que vivenciamos. Com vistas a esta multiplicidade,

emergiram historicamente no país inúmeras práticas musicais diferenciadas, que muitas vezes

passaram a contemplar também um trabalho musical com crianças pequenas.

A partir de então, as práticas organizadas por essas educadoras musicais para a

pequena infância no país em contextos diferentes, passaram consequentemente a ser base para

novas práticas músico-educativas. Práticas estas, que deveriam fazer parte do processo

reflexivo de formação profissional também dos professores unidocentes que trabalham

diretamente, e em muito exclusivamente, com as crianças dessa faixa etária. Ou seja, banindo

práticas que possam ser descontextualizadas e superficiais.

Com base na Lei 11.769 de 2008, a música passou no corrente ano de 2011 a compor

o currículo do ensino fundamental, instigando a reflexão sobre este tema. Contribuindo com

as pesquisas que vem sendo desenvolvidas nessa direção, vide estudos de Bellochio (2000,

2001, 2004), Figueiredo (2004), Spanavello (2005), Correa (2008), Furquim (2009),

Oesterreich (2009), Werle (2010).

Com isso, volto a enfatizar como em estudos anteriores, a necessidade de ações

integradas entre as áreas e os diferentes profissionais para que estabeleçam-se mudanças

3No que se observa da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – 9.394/96) e do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI/1998), o professor unidocente é a figura central para trabalhar educacionalmente com as crianças todas as áreas do conhecimento. 4São estas pesquisadoras/educadoras musicais que, dentro do possível, serão convidadas a narrar suas histórias profissionais para a presente pesquisa, constituindo a base de dados.

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efetivas no interior das instituições e de cada comunidade escolar. Foi em virtude destes e

outros aspectos, que emergiu a necessidade de conhecer como se estabeleceu no país a relação

entre música, primeira infância, ensino e suas relações com a formação do unidocente ao

construir práticas músico-educativas com crianças de educação infantil.

O professor unidocente, figura central em turmas de crianças pequenas, tem suas

práticas impregnadas por atividades musicais, no entanto, desconhece que estas ultrapassem

momentos de cantar ou tocar algum instrumento musical, e ignoram que brincar de roda ou

contar histórias, dentre outras atividades, envolvem também a formação musical das crianças.

Em especial, porque na maioria das vezes, as práticas estão envoltas por atividades musicais

que não são associadas a um trabalho dessa natureza, afirmando-se que o cotidiano das

crianças está desvinculado de práticas musicais. Contudo, o que se apresenta é uma realidade

totalmente avessa.

Como a necessidade de refletir a respeito da prática e da função da música nem sempre é clara [...], muito do que existe em educação musical não se apresenta, na verdade, como musical ou artístico, mas, antes, como um conjunto de atividades lúdicas [...] O fato de a música ter ou não seu valor reconhecido coloca-a dentro ou fora do currículo escolar, dependendo de quanto é ou não considerada pelo grupo social. Se, em determinada cultura, a música for uma das grandes disciplinas do saber humano, o valor da educação musical também será alto [...] Esta é a questão crucial com que se depara [o] Brasil: o resgate do valor da música perante a sociedade, único modo de recolocá-la no processo educacional. (FONTERRADA, 2005, p. 12-13)

Dentre os fatores que desencadearam a realização dessa pesquisa estão ainda: a

ausência de licenciados em música suficientes para o trabalho com música nas escolas, a

necessidade de organização de um trabalho musical mais reflexivo e acessível aos pedagogos,

a relevância do trabalho musical com crianças de educação infantil, em especial entre zero

três anos de idade, a construção de uma perspectiva diferenciada de trabalho musical com

bebês nesta faixa etária, a contribuição para a formação cultural e estética de bebês, a

permanente formação musical e pedagógico-musical de pedagogos e as consequentes

mudanças com relação as práticas musicais.

Dentre os autores utilizados para o embasamento teórico desta investigação foram

utilizados até o momento: Pinto e Sarmento (1997), Kohan (2007) e Cerisara (2002) voltados

a sociologia da infância; Fuks (1991) e Borges (2007) relativos a trajetória histórica da

educação musical no país; Planillo (2004, 2006) e Gandini e Edwards (2002) voltadas a

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trajetória da proposta de Loris Malaguzzi; e, relacionado a metodologia foram base para essa

proposta Josso (2004), Souza (2006) e Malaguzzi (1999), dentre outros autores.

A educação musical na pequena infância

Ao salientar que a música nunca esteve ausente dos espaços escolares e nem mesmo

das salas de aula, destaco a impossibilidade de se entrar em uma sala de educação infantil sem

cantar com as crianças. Influenciada, sobremaneira, pelas narrativas obtidas em meu

mestrado, no qual, as professoras unidocentes entrevistadas, ressaltaram a intrínseca relação

entre educação musical e a prática educativa na educação infantil, a necessidade de formação

específica em música no curso de Pedagogia, e ainda, a presença do licenciado em Música na

escola para um trabalho conjunto com as professoras unidocentes.

Esse aspecto é, ainda hoje, relevante para refletir sobre a necessidade de uma base

teórica consistente que permeie o trabalho musical com crianças pequenas, especificamente

entre a faixa etária de zero a três anos, que ampare as professoras unidocentes e, especialistas

em música para atuar nesse campo.

Para as crianças nessa faixa etária, as descobertas acontecem em grande parte através

do contato sonoro com nosso entorno. Ainda no útero materno, bebês identificam e

familiarizam-se com o mundo que o cerca através dos sentidos, “o bebê já está em interação

com seu meio externo desde suas vivências uterinas, o que lhe permite trazer uma bagagem

significativa de conhecimentos quando ele nasce” (BEYER, 2005, p. 96).

Aliás, assim também é com relação a música. Antes mesmo de nascermos, já tivemos

nossas primeiras experiências sonoras. Apesar de estar ciente que os primeiros contatos com o

mundo se dão basicamente pelo olfato, paladar e audição, é este último que instiga a pesquisar

sobre as práticas músico-educativas para os espaços escolares no país, respeitando as questões

sonoro-musicais que envolvem as descobertas e desenvolvimento de crianças pequenas em

ambientes familiares e escolares.

A educação musical frente a perspectiva italiana de educação da pequena

infância

Para o desenvolvimento da presente pesquisa tomo como base para sua estruturação,

reflexão e análise, a experiência italiana organizada por Loris Malaguzzi, pedagogo italiano

que junto as comunidades da Emilia Romagna, uma região ao norte da Itália, construiu

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colaborativamente um trabalho inovador para a pequena infância. E, é de seu modo de

compreender os indivíduos que organizo esta pesquisa.

Este autor destacou aspectos obsoletos da educação, a necessidade de pesquisas que

inviabilizassem cair na rotina improvisada, e uma atitude que deveria ser dotada de

inconformismo, respeitando sempre os direitos das crianças.

A educação em Reggio é descrita como qualquer coisa menos linear, foi organizada

como uma espiral sem fim, na qual as crianças retomam incessantemente as diferentes

experiências, reavaliando todo o processo. Nesta direção, as constantes transformações,

experimentações e reexames excluem do processo educativo a rotina e a rigidez, jamais se

tornando fixo. Com isso a abordagem recusa o termo modelo, enfatizando-a como projetos ou

experiências.

Na estrutura da proposta reggiana, o ano escolar não começa do zero, mas as escolas

não possuem um currículo planejado seguindo unidades e subunidades. Ao contrário, a cada

ano são elaborados projetos de diferentes proporções, dos quais os temas possibilitam um

suporte, como uma linha condutora, mas são as crianças que direcionam a construção de

maior ou menor relevância e a direção a ser tomada. “[...] O que sabemos realmente é que

estar com crianças é trabalhar menos com certezas e mais com incertezas e inovações. As

certezas fazem com que entendamos e tentemos entender” (MALAGUZZI, 1999, p. 101).

A escola para a pequena infância de acordo com Malaguzzi deve se distanciar de um

modo preparatório e de continuidade com o ensino fundamental, porque assim, estariam

presos a um modelo que visa um único fim, estar apto a alguma coisa, estar preparado para

alcançar, para ser capaz de. Visando os aspectos a serem alcançados para poder desempenhar

uma outra tarefa que não a própria que se está envolvido. Como é o caso de distanciar a

formação de músicos dos objetivos mais amplos que envolvem as práticas musicais escolares.

Ainda, Malaguzzi contemplou em seu trabalho a perspectiva de uma pedagogia da

escuta, pela qual o próprio autor instiga os professores mencionando que temos de admitir que

falamos muito das crianças, falamos pouco com elas e muito menos as escutamos

(MALAGUZZI, 1999). É imprescindível em sua perspectiva, que pratiquemos a escuta, estar

atento e dar ouvidos, com todos os sentidos, a infância.

Esta vem proporcionar ferramentas ao adulto, como o espanto, a maravilha, a reflexão

e a alegria de estar com as crianças (PLANILLO, 2004b, p. 130). Uma pedagogia da escuta

além do nível da audição, que faça o ouvinte refletir, apreciar, contemplar com uma postura

ética e estética. Levando-nos a questionar a maneira como as crianças elaboram seus

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pensamentos, desejam, etc. Uma atitude de escuta que transforma a observação, a

interpretação e a aprendizagem, em vista de respeitar a cultura infantil.

A proposta é ouvir aqueles que cotidianamente não temos tempo e nem mesmo

paciência para ouvir. Na proposta de ouvir a criança, também ouvimos os mundos que as

cercam, e isso pode ser explorado através das sonoridades, da sensibilização auditiva, da

acuidade sonora do todo e das partes, trabalhar com o respeito em ouvir o mundo, ouvir o

outro, ouvir-se.

Nessa direção, a proposta italiana poderá fornecer subsídios para compreender em que

proporção o trabalho musical que vem sendo desenvolvido no Brasil considera a visão das

crianças, respeitando as suas potencialidades e necessidades.

Os caminhos metodológicos

O projeto de pesquisa em questão, propõe-se a investigar a educação musical para a

pequena infância brasileira através dos relatos de algumas pesquisadoras/educadoras musicais

do Brasil. Para tanto, optou-se por realizar uma investigação de caráter qualitativo, utilizando-

se como método a pesquisa narrativa.

Inicialmente foi realizado um levantamento em publicações na área da educação e

educação musical em vista de identificar pesquisadores e/ou educadores brasileiros com

produção na temática da pesquisa, seja esta de educação musical infantil entre zero e três anos

de idade. Ao considerar um número reduzido de profissionais que investiram seu trabalho

musical com crianças pequenas (citados anteriormente no presente texto), será possível buscar

o contato com todos, para a possibilidade de entrevista.

O estudo prevê entrevistas gravadas em áudio com pesquisadoras/educadoras

brasileiras da área de Educação Musical acerca de suas produções voltadas a crianças

pequenas no país, construindo um apanhado a cerca do ensino da música e considerando suas

percepções acerca da educação para a pequena infância nos espaços escolares de educação

infantil atuais.

A análise culminará em um entrelaçamento com a pedagogia italiana, em especial com

o trabalho produzido na região de Reggio Emilia e conhecido através da atuação de Loris

Malaguzzi, visando-se confrontar a perspectiva de construção músico-pedagógica brasileira

com a visão italiana de vínculo da infância com as artes, em especial nesta pesquisa, com a

música.

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Contribuições

Ao final, viso contribuir com a efetivação do trabalho musical a ser contemplado nas

matrizes curriculares das escolas de educação infantil na medida em que possibilitaremos

através das narrativas dos educadoras/pesquisadoras musicais da pesquisa, uma perspectiva de

como a educação musical brasileira poderia ser organizada e conduzida atualmente entre os

espaços escolares de educação para a pequena infância no Brasil. Refletindo,

consequentemente, na formação musical e pedagógico-musical dos professores unidocentes.

Não objetivo de forma alguma criar novas formas de ensinar música, ou simplesmente

colocar no papel a história de grandes pesquisadoras/educadoras musicais de nosso país.

Entretanto, procurarei refletir como as crianças gostariam de construir seus conhecimentos

musicais nos espaços escolares.

Através dessa pesquisa, objetivo integrar as temáticas da educação infantil e educação

musical de maneira diferenciada, contribuindo na medida em que a criança será observada em

todo o seu potencial, de forma integral, a partir de suas realidades, para vivenciarem

musicalmente o contato com outras crianças, e com os professores, unidocentes e músicos, de

forma lúdica e desafiadora.

É importante ver as experiências musicais durante as primeiras fases das criancas

como aliada para o desenvolvimento global. Este é “um caminho que passa pela aceitação a

novos itinerários, a explorar velhos-novos territórios, dentro de si e a seu redor, arriscando

novos olhares [...] (OSTETTO, 2006, p. 234)

Propondo reflexões sobre o tema, talvez nós possamos organizar musicalmente o

universo das crianças pequenas. Ostetto (2006) enfatiza que “alimentar o universo imaginário

do educador, provocando o desejo, que faz mover a busca, implica tempo de espera. Não se

dá instantaneamente. Talvez por isso a escassez de propostas educativas que incluam as

múltiplas linguagens[...] (p. 234).

E sobretudo, as pesquisas/práticas produzidas no país que comporão as narrativas das

participantes da pesquisa, poderão representar, ao menos inicialmente, a trajetória histórica da

educação musical para a pequena infância brasileira. O que viabilizará um panorama geral

que poderá refletir sobre esta nova fase que vivencia a educação musical no ensino

fundamental do país, desenvolvendo nas crianças brasileiras, dentre outros fatores de modo

geral, uma mentalidade estética diferenciada.

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Referências

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Caminhos da Musicalização Infantil na UFBA

Marineide Marinho Maciel Costa UFBA

[email protected]

Resumo: Pretende-se através deste artigo, apresentar um pouco da história do Curso de Musicalização Infantil na UFBA, concebida através de: consulta a documentos dos arquivos da EMUS, entrevistas com ex-alunos, professores e coordenadores, atores do processo educativo em questão, que serão apresentados ao longo do texto. Organizado por períodos de acordo com a política pedagógica da instituição, observando principalmente a mudança da coordenação pedagógico-administrativa , o texto mostra os caminhos percorridos desde os anos de 1954 a 2011.

Palavras chave: Musicalização, história, educação

Primeiro Período: 1954 a 1969

Era o ano de 1954, quando o então Reitor da Universidade da Bahia1, Edgar Santos,

incentivado pela Professora Rosita Salgado Goes, institui o I Seminário Internacional de

Música como cursos de extensão. Constatando nos programas dos Seminários Internacionais,

que eram cursos de férias promovidos pela então Universidade da Bahia, percebe-se a

preocupação desta instituição, para com a iniciação musical das crianças, visto que um dos

cursos ministrados era o de Pedagogia e Iniciação Musical, ministrado pela Professora Maria

Rosita Salgado Góes.2.

Supondo a existência, de cursos para crianças buscou-se depoimentos de professores

que participaram daquele momento, ou seja, da criação dos cursos de extensão geridos pelo

então Seminários Livres de Música. Maria Angélica Bahia Koellreuter quando numa

entrevista por telefone, foi questionada sobre o atendimento a crianças menores de seis anos,

responde:

O curso não tinha o nome de Iniciação Musical ou Musicalização Infantil, mas atendíamos a crianças de 6 anos, com as quais desenvolvíamos atividades de introdução ao instrumento com iniciação musical. O curso era chamado Pré-Universitário nos anos

1Até a primeira Reforma Universitária Decreto 62.241 de 13/02/1968 quando passou a UFBA. 2 Folder do I Seminário Internacional de Musica (em anexo e powerpoint).

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1956 e 1957. Eu tive alunos de 6 anos, como aluna do curso superior de piano sob a orientação do professor Benda.3

A presença da criança era constante, e na década 60, houve uma mudança no olhar e

na postura dos professores quanto ao processo de educação, buscando conhecer e utilizar uma

metodologia baseada nos princípios de psicologia aplicada ao ensino, respeitando o do

desenvolvimento do sujeito como um todo. Os elementos básicos da música passam a ser

transmitidos de maneira adequada ao nível cognitivo, afetivo, psicomotor e social do aluno e

os métodos considerados ativos que defendiam a vivência como base para a construção do

conhecimento teórico musical que surgem na Europa, com renomados teóricos, pedagogos e

psicólogos, como J.Dalcroze, C.Orff, Edgard Willems entre outros chegam à Bahia.

A Bahia estava na frente!

Foi assim... pela primeira vez o renomado Pedagogo Edgard Willems veio à Bahia a convite do compositor e então diretor dos seminários Livres de Música, Hans Joachin Koellreuter, foi um curso intensivo de seis semanas; uma demonstração inigualável de competência, amor à música e às crianças (Carmen Mettig, site Congresso de Educação Musical Willems Brasil 2009, acesso em 24 jun. 2011).4

A professora Alda Oliveira conta que, em 1964, quando do seu ingresso SLM5, como

aluna do curso de graduação, teve a oportunidade de ministrar aulas. Comenta posteriormente,

referindo-se a Willems:

ele me introduziu aos seus livros e me deu uma turma de crianças a partir de 6 anos de idade. Eram sempre turmas pequenas, de no máximo 12 crianças. De início, eu fazia as preparações e planejamentos das minhas aulas baseada no método Willems, que foi o início da minha formação em educação musical feita com o professor e compositor Ernst Widmer, que, como Edgard Willems, era também Suiço.6

Mais tarde, no final da década de 60, Oliveira comenta sua interessante experiência

com crianças a partir de 3 anos de idade:

3Informação obtida através de entrevista pessoal. (Realizado em 25/06/2011). O questionamento enquanto entrevista a Maria Angélica foi: Havia atendimento ou cursos destinados à crianças menores de seis anos, no Seminários Livres de Música? 4N.A.Sobre este curso foram encontradas no Arquivo da EMUS, as cadernetas contendo os nomes dos alunos das duas turmas de crianças, sendo uma turma de 4 a seis anos e outra de 7 a 10, assim como participação de 30 professores oriundos de várias Escolas de música de Salvador. 5 SLM Seminários Livres de Música. 6Depoimento escrito de Alda realizado em 17/07/2011.

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Nesse período aceitei como desafio na Escola de Música (sempre gostei de enfrentar problemas educacionais e artísticos), tomar uma turma de iniciação musical com crianças de 3 anos de idade. No princípio, comecei a fazer aulas no mesmo estilo, usando canções, improvisações etc. Mas com o passar do tempo, percebí que eu tinha de mudar a abordagem, pois elas não ficavam muito tempo na mesma atividade. Queriam mudar, pegar nos objetos, correr. Tive de me adaptar a isso e conseguir dar aula sozinha, sem nenhuma ajuda7.

Convém ressaltar que Edgar Willems que aqui chegou em 1963 para ministrar um

curso intensivo retornou em 1971 dando continuidade ao trabalho. Entretanto, oficialmente o

professor que se preocupou com as questões de educação musical para aquele tempo, no

SLM, era Ernst Widmer, que aqui chegou, convidado por Koellreutter em 1956.

Vários foram os alunos do curso de graduação que tiveram a oportunidade de

experimentar educação musical para crianças sob a orientação do professor E.Widmer, e em

conversa com as Professoras Alda Oliveira e Carmen Mettig, elas lembravam nomes das

colegas que também ministravam aulas de iniciação musical e iam citando, com naturalidade,

como se estivessem vivendo aquele momento: Maria Amélia e Maria Amália Martins

(Melinha e Malinha), Maria da Graça Santos, Aida Zollinger, Ida Meireles, Rosa Lúcia Mares

Guia. Estes depoimentos demonstram que os estudantes sempre tiveram oportunidade de

experimentar as teorias e metodologias estudadas durante curso.

A década de sessenta termina com uma grande vitória para Educação Musical no

Brasil e em especial na Bahia, com a criação do Curso de Licenciatura em Música mediante

os documentos: Decreto nº 43/804 de 23/05/1958; pelo Parecer nº 1.284/76 e pela Resolução

nº 10 de 10/10/1969. Sua primeira turma ocorreu em 1969, quando aconteceu o primeiro

vestibular unificado. Graduação Licenciatura em Música.

Curso de Iniciação Musical continua sendo o laboratório para o licenciando, aliás uma

característica específica desta Escola quando utiliza, desde 1954, oportunidades na formação

de professores para experimentação prática do que aprende e do que ele mesmo cria.

A partir daí coordenado pela professora Carmen Mettig, tem em 1973 a primeira

estagiária, a licencianda Jane Souza Palma que realizou seu estágio da disciplina Prática de

Ensino em uma turma de crianças de 6 (seis) anos, sob a orientação da professora Carmen

Mettig.8 Conta a professora Carmen sobre o estágio:

7Idem. 8Depoimento da Professora Jane Palma em entrevista por telefone dia 24/06/2011e confirmado em entrevista com a Professora Carmen Mettig em 15/07/2011 no IEM Instituto de Educação Musical.

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O estágio acontecia após o licenciando observar durante um ano as minhas aulas e durante o tempo de observação iam realizando atividades até ministrar a aula inteira, sempre sob meu olhar. Quando assumia a classe sabia dar aula!9

A metodologia usada era baseada no método Willems sob a orientação do próprio, que

estava preparando a Professora Carmen Mettig, para mais adiante entregar-lhe o título de sua

representante no Brasil e na América Latina.

Segundo Período: 1970 a 1986

Com a realização do primeiro vestibular para o curso de Licenciatura em Música,

ocorrido em dezembro de 1969 a então Escola de Música e Artes Cênicas- EMAC recebe a

sua primeira turma. Vale ressaltar que a EMAC não se adequou à Lei de Diretrizes e Bases de

1971, que instituiu o ensino da Educação Artística nas escolas públicas, pelo fato de acreditar

que cada uma das linguagens de Arte tem os seus conteúdos e objetivos específicos.

Em 1971, a professora Carmen Mettig, então coordenadora do Curso de Música,

ainda impactada com o que absorveu sobre o método Willems em 1963, solicita ao Diretor da

EMAC, Ernst Widmer, o retorno do Pedagogo Willems para ministrar um curso na Semana

de Educação Musical. 10Contando com o apoio do coordenador do curso de Dança da UFBA,

Rolf Gelewski, a solicitação foi atendida e a Semana de Educação Musical contou com a

participação de Educadores de varias instituições do país.

A Semana de Educação Musical acontecia anualmente com o objetivo de melhorar o

desempenho dos professores de Educação Musical. Este movimento fortalecia a equipe de

professores da UFBA e o curso de Iniciação Musical continuava sob a coordenação da

Professora Carmen Mettig. A demanda por parte das crianças era grande e filas enormes se

formavam na porta da Escola na ânsia para conseguir uma vaga. Nessa época se cobrava uma

taxa simbólica que era administrada pela FAPEX e eram atendidas 200 (duzentas crianças

entre 4 a 10 anos) no Projeto que na época se chamava “Iniciação Musical / Coral Infantil”.

Os próprios professores e estagiários efetuavam as matrículas. A equipe era formada por

estagiários do curso de Licenciatura, em Música entre as quais, lembra Carmen Mettig:

Heloisa Leone, Isa Valois, Jane Palma de Souza, Marialva Rios, Doraneide.

9 Entrevista com Carmen Mettig 15/07/2011 no IEM. 10Depoimento de Carmen Mettig no site do Congresso de Educação Musical Willems Brasil 2009e em entrevista no IEM dia 15/07/2011.

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Ao final de cada semestre eram realizadas as apresentações na Reitoria ou no Teatro

Castro Alves, sempre privilegiadas pelos reitores Germano Tabakof e Rogério Vargens, que

apreciavam e prestigiavam com as suas presenças.

Ainda em conversa com Carmen, perguntando como eram escolhidos os estagiários,

responde:

Os estagiários levavam um ano observando as minhas aulas e aos poucos iam assumindo atividades até ficar responsável pela classe. Quando terminavam, sabiam elaborar o seu plano de aula e executá-lo sem dificuldade.

Terceiro Período: 1987 a 1993

Em 1987, o então diretor da Escola de Música, Paulo Costa Lima reestrutura o Curso

preparatório, transformando em curso básico de Música, dividido em: Pré-básico, com foco

na Iniciação Musical e no ensino dos instrumentos para crianças até 12 anos e o curso Básico,

com focos em Licenciatura, Composição, Regencia, Canto e Instrumentos a partir de 13 anos.

Vale salientar que esta divisão era flexível tanto para o Pré-Básico quanto para o Básico

Alda Oliveira nos relata no seu depoimento: 11

Somente quando fomos fazer Mestrado em Boston (1977-1979) e Doutorado no Texas (1983-1986) é que não dei aulas e nem orientei na EMUS/UFBA. Em todos os demais periodos, trabalhei com isso. Carmem e eu dividíamos as responsabilidades de orientar, pois ambas trabalhavam com as disciplinas principais do curso de Licenciatura. Carmen, usando o método Willems e eu, tentando levar os professores para desenvolver os próprios projetos assim como as minhas idéias e propostas, como por exemplo as turmas de Iniciação Musical com Flauta Doce (com Barbara, do Instituto de Música, que já faleceu), as turmas de Iniciação Musical com Maratona Musical, a turma de Iniciação Musical com Capoeira, as turmas de Iniciação Musical com Introdução ao Teclado, o IMIT.

As aulas aconteciam no mesmo espaço da graduação, até que as crianças foram

transferidas para a casa em anexo onde funciona o Acervo do Grupo de Compositores da

Bahia - Memorial Lindembergue Cardoso. O aumento do espaço proporcionou o aumento do

número de alunos que chegou a ser de 450 (quatrocentos e cinqüenta crianças, distribuidas em

3 (três) grandes projetos: IMMAR - Iniciação Musical com Maratona, a, IMCOR – Iniciação

Musical/ Coral para e IMIT- Iniciação Musical com Introdução ao Teclado. A criança entrava

na escola aos seis anos, sem teste de seleção em um dos cursos de Iniciação Musical, IMCOR

ou IMMAR e depois de um ano de iniciação va musical, passa para o IMIT ou outro projeto

11 Depoimento por escrito de Alda Oliveira em 17/07/2011.

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de iniciação ao instrumento (em grupo). Mediante o seu desempenho, ela

seria indicada para submeter-se ao teste de ingresso ao pre-basico, cujas aulas de

instrumento eram individuals.

Com a aposentadoria da Professora Carmen Mettig em 1991, a coordenação passa ser

da professora Alda Oliveira que depõe:12

eu fiquei responsável, mas também dividia as orientações dos estagiários com Profa. Celina Lopes, com Profa. Ana Margarida Lima, que trabalhava com violino, e até mesmo com o Prof. Horst Schwebel, quando o aluno era de instrumentos de sopros, de Banda. Sempre o nosso curso de Liceniatura em Música teve essa possibilidade de orientação específica para a tendência de especialização musical do aluno. Isso sempre ajudou muito a aproveitar os diversos talentos musicais dos estagiários. Entre os meus estagiários e pessoas que trabalharam comigo estão Adálvia Borges, Kátia Cucchi, Robertinho Castro (de construção de instrumentos), Marialva Rios, Regina Cajazeira, Juracy “Bemol” e muitos outros. Teve um período que criei até um curso Básico de Educação Musical (quem dava aula era eu mesma), que servia para preparar adultos que queriam fazer vestibular para Licenciatura em Música. Na primeira turma desse curso, participaram mais de 30 alunos, dentre eles Leila Dias (quando ainda era médica), Zezinho (cursou Licenciatura, fez Mestrado em Etnomusicologia), Lara Morelli, Ilma Nascimento, Patricia Hita, etc. Foi um curso muito proveitoso para a Escola. Depois eu não tive mais tempo de dar essas aulas e o departamento não teve interesse em continuar. Eu tinha muitas turmas do IMIT com crianças de várias idades e ainda os estagiários.

Ainda em 1991, uma nova proposta para Iniciação Musical!

“Aulas para bebês foram introduzidas na Escola de Música da UFBA como parte da disciplina Educação Musical Especial ministrada pela Profa. Diana Santiago nos anos de 1991, 1992 e 1996 no então curso de Mestrado em Música da UFBA. Foram ministradas pelos alunos da disciplina durante a segunda parte de cada um dos semestres letivos em que a disciplina foi oferecida, pelo período de 8 semanas em várias turmas e consistiam num encontro semanal dos professores, das crianças e seus pais. (A primeira parte dos semestres consistia em aulas teóricas sobre Educação Musical para a Primeira Infância). O formato das aulas foi baseado no MUSICTIME criado pela Profa. Dra. Donna Brink-Fox na Eastman School of Music (New York, USA) na década de 1980, com quem Diana Santiago estudou enquanto realizou seu Mestrado nos EUA. As aulas – em várias turmas – consistiam em 15 minutos de atividades lúdicas espontâneas, para as quais eram disponibilizados brinquedos musicais e instrumentos de percussão leves e seguros para serem manuseados pelas crianças, e cerca de 30 minutos de atividades conduzidas pelo (a) aluno (a) de mestrado que atuava como professor (a) da turma. Essas atividades incluíam atividades musicais para entrosamento, canções, lengas-lengas, atividades rítmicas e atividades musicais para imitação e locomoção. As aulas aconteceram na sede da EMUS.

12 Idem.

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Além das atividades desenvolvidas com os alunos da pós-graduação, alunos da graduação (concluintes de curso e bolsistas de iniciação científica) também trabalharam com bebês, tendo sido treinados no método. Aulas para bebês, supervisionadas por Diana Santiago, foram por eles ministradas durante os anos de 1994 a 1997, na Organização de Auxílio Fraterno (OAF, entidade que atende a crianças carentes), na Creche da UFBA e na Escola Dorilândia, como parte dos projetos de pesquisa Padrões do desenvolvimento psicomotor e comportamentos musicais de resposta em crianças de classe social menos favorecida (1994-1995) e Atividades rítmicas e melódicas apropriadas à 1ª infância (1995-1997), bem como dos estágios de conclusão de curso das licenciandas em música Lara Morelli e Ilma Nascimento”. (Texto concedido por email pela Professora Doutora Diana Santiago em 22/07/2009).13

Quarto Período: 1994 a 2011

A professora Leila Dias, que retornava da Inglaterra onde fora realizar o seu mestrado

em Música, assume a coordenação do curso de iniciação Musical por solicitação da então

diretora da EMUS-UFBA, Prof. Dra. Alda Oliveira. Em 1996 convida a professora Marineide

Costa recém aposentada pela Secretaria de Educação do Município de Salvador, para

colaborar com a professora Leila no curso de Iniciação Musical que continuava atendendo a

crianças de 4 anos e meio a 6 anos.

As aulas eram ministradas pela professora Marineide. Eram cinco turmas de até 25

(vinte e cinco crianças, sendo 2 turmas pela manhã e 3 turmas pela tarde, organizadas por

idade cronológica. As do turno matutino uma de 4 e 5 anos e a outra de 6 anos. As do

vespertino como a demanda era sempre maior, uma turma de 4 anos,uma de 5 anos e uma de

6 anos, que eram observadas pelos alunos dos cursos de Licenciatura em Música da UFBA,

assim como dos dos licenciandos do Instituto de Música da Universidade Católica de

Salvador, por solicitação da professora Terezinha Requião, então orientadora e professora da

disciplina Prática de Ensino.quanto da UCSAL.

Nesse período, a observação dos licenciandos era realizada sob a supervisão dos seus

professores, da disciplina Iniciação Musical II, que solicitavam um relatório da aula

observada com a assinatura da professora que havia ministrado. No decorrer das aulas, os

licenciandos que observavam, também participavam de algumas atividades, sem perder o

olhar de observador, para que depois pudessem relatar e até realizar críticas. Após cada aula, a

professora Marineide se reunia com os licenciandos para tirar dúvidas, fundamentar as

atividades realizadas. Somente após um período de um ou dois semestres de observação,

13 Coordenadora - Núcleo de Pesquisa em Performance Musical e Psicologia Escola de Música da UFBA.

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podiam escolher uma turma para realizar o estágio exigido pela disciplina Prática de Ensino.

Por esta experiência de observação passaram dezenas de estagiários, mas poucos se

habilitavam a realizar o seu estágio nas turmas dos pequeninos de 4 a 6 anos, a exemplo:

Micheline Fontal, Glicéria Santos, NelzaSuzart, Carmelito Lopes, Sérgio Teixeira e muitos

outros.

Vale a pena salientar que Sérgio Teixeira participou como estagiário da implantação

do IMAV – Iniciação Musical com introdução ao Violino, em 1997 sob a orientação dos

professores Dilson Peixoto e Marineide Costa. Esse projeto chegou a atender crianças a partir

de 3(três) anos, quando foi utilizado o método Suzuki.14

Ainda na sua gestão como diretora da EMUS, Alda Oliveira cria o NEM- Núcleo de

Educação Musical, com objetivos de:

1. Atender às necessidades do curso Licenciatura em Música especialmente no que se

refere às disciplinas pedagógicas, quer teóricas, ou práticas que são: � Iniciação Musical I - Disciplina Teórica que fundamenta métodos e teorias da Educação Musical � Iniciação Musical II-Disciplina Teórico-prática - Vivência dos métodos e

teorias estudadas em Iniciação Musical I � Prática de Ensino - Estágio - Disciplina Prática � Orientação Para Prática de Ensino.

2. Funcionar como laboratório dos cursos de Graduação e Pós-Graduação , através do programa de Extensão “Iniciação Musical” que oferece cursos para crianças e adolescentes. � M.I. Musicalização Infantil para crianças de 4 a 6 anos � IMIT Iniciação Musical com Introdução ao Teclado de 7 a 12 anos � IMIV Iniciação Musical com Introdução ao Violão de 7 a 12 anos � IMAV Iniciação Musical através do Violino de 7 a 12 anos � IMAF Iniciação Musical através da Flauta Doce de 7 a 12 anos � IMIP Iniciação Musical através da Percussão de 7 a 12 anos (novo,

1ª experiência em 2003) Pré-básico de Piano após o 4º ano do IMIT

desde 2004 3- Atender a demanda da comunidade infantil, cumprindo assim o papel da extensão na Universidade. Os cursos oferecidos pelo Programa de Extensão “Iniciação Musical” têm como

objetivo iniciar a criança ao conhecimento da música, preparando-a para participar de etapas

mais avançadas do conhecimento musical, tanto nas oficinas quanto no curso básico, e,

atualmente, estão com duração de 4 anos, com exceção de Musicalização Infantil que tem

uma duração mínima de dois anos, podendo usar o tempo necessário para o amadurecimento

das crianças. É um curso que não deve ser realizado com pressa, pois é a base da construção

14 Método criado pelo Japonês Shinichi Suzuki.

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do conhecimento musical, que em países desenvolvidos começa muito antes dos 4 anos, idade

mínima para os nossos cursos da EMUS.

A coordenação do NEM é realizada por Marineide Costa, desde 2000 e cada projeto

tem o seu coordenador.15

Em 1999, o espaço físico da Escola é modificado. O então diretor Oscar Dourado,

transforma o antigo Salão de Orquestra em 3 salas de aula, sendo uma delas destinada às aulas

de Iniciação Musical para as crianças também usada pela graduação para as disciplinas

teóricas.

Com a coordenação alternando entre as professoras Leila Dias e Marineide Costa, os

vários cursos do NEM se mantinham com um número grande de alunos sendo necessário a

inclusão de monitores, os estagiários que não faziam a disciplina Prática de Ensino

começaram também a assumir turmas pelas quais recebiam uma quantia por hora aula

ministrada. O processo para assumir uma turma continuava o mesmo. Primeiro observar no

mínimo um semestre para depois assumir a turma. Nesse período, ou seja, a partir do ano

2000, passaram vários monitores e estagiários que atualmente estão bem inseridos no

mercado de trabalho como bons profissionais, ex: Carmelito Lopes, Jaqueline Leite, Michele,

Valéria Badaró, Amélia Dias e outros.

Em 2006, sob a coordenação da Professora Leila Dias o curso é ampliado com a

implantação do curso de Musicalização de Bebês, atendendo crianças de 0 a 3 anos, e as aulas

eram ministradas pela professora Angelita Broock, recém chegada na Bahia, vindo de

Curitiba.

A partir daí o curso de Musicalização Infantil que atendia crianças de 4 a 10 anos

desde os anos 50, passa a atender crianças de 0 a 10anos.

Em 2007, com a saída da professora Leila Dias para o doutorado fora de Salvador,

assume a coordenação a professora Marineide Costa. O trabalho prossegue, bem aceito pela

comunidade servida e começam a surgir trabalhos com a comunidade fora da escola,

cumprindo assim a proposta da Universidade de servir à comunidade. Como por exemplo uma

tarde de oficina com os bebês e suas mamães na Maternidade Climério de Oliveira,

maternidade Escola da UFBA, oficinas pontuais em uma loja de móveis e decoração para

bebês

Em 2008, por conta de assumir a Coordenação Pedagógica dos Cursos de Extensão, a

por solicitação do então diretor da EMUS Professor Horst Schwebel,a professora Marineide

15 Informações obtidas através do Relatório escrito em 2004 para a Comissão de Extensão da EMUS em 2004.

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entrega à Professora e Doutouranda Angelita Broock a coordenação do Musicalização

Infantil, curso que atende crianças de 0 a 6 anos, que até agora tem assumido com muita

competência criatividade e seriedade.

O curso continua sendo o laboratório dos cursos de graduação, tanto para os alunos de

Licenciatura, quanto de Instrumento, ou composição, onde têm a oportunidade de

experimentar os conhecimentos teóricos adquiridos durante o curso. As turmas são

organizadas por idade e as aulas tem duração de quarenta e cinco minutos por turma.

As aulas das crianças de 0 a 2 anos são realizadas em companhia dos pais ou

responsável e a partir de 3 anos já ficam sem os seus acompanhantes, que ficam do lado e

fora da sala esperando

Durante o caminho percorrido e relatado aqui, lá se vão cinco décadas de Musicalização Infantil na Escola de Música da UFBA. Um projeto que foi crescendo e amadurecendo junto com a Escola, adotando nomes diferentes, mas sempre com o objetivo de dar o melhor do mundo da música às crianças que aqui chegam.Leila dias parantão diretor dos Seminários Livres de o(1963) à convite do c

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Referências

ALDA DE JESUS OLIVEIRA. Entrevista realizada em 24 de junho2011. CARMEN MARIA METTIG ROCHA. Entrevista realizada em 25 de junho 2011. ______. Entrevista realizada em 13 de julho 2011. DIANA SANTIAGO. Entrevista realizada em 22 de julho de 2011. LEILA DIAS. Entrevista realizada em 24 de junho 2011. HELOISA LEONE. Entrevista realizada em 24 de junho 2011. JANE PALMA. Entrevista realizada em 21 de junho 2011. OLIVEIRA, Alda de Jesus. Escola de Música da Universidade Fedral da Bahia: Cursos de Extensão. Salvador-Bahia. Revista ABEM, n’ 1, p. 53-56. PERRONE, Maria da Conceição Costa . Música, Contexto e Tradição: estudo sobre a criação de uma Instituição de Ensino. Tese de Doutorado em Música da UFBA. Salvador-Bahia, 2008. ROCHA, Carmen Maria Mettig: Foi assim... Contato Método Willems no Brasil- Site do Congresso Internacional Willems Brasil 2009. Disponível em: <http://www.musicaiem.com.br/congressowillemsbrasil>. Acesso em: 24 jun. 2011. SÉRGIO EMMANOEL TEIXEIRA. Entrevista realizada em 8 de julho de 2011.

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O Sapo Não Lava o Pé: cantando, tocando e escrevendo música com estudantes da educação infantil

Cássia Vanessa O. Cotrim1 FUNORTE

[email protected]

Resumo: Este relato de experiência é uma proposta educativa para alunos da educação infantil do segundo período desenvolvida com crianças por volta de cinco anos no ano letivo de 2010. A proposta não se encerra no âmbito da educação infantil, podendo ser utilizada nos diversos níveis da educação básica, desde que haja adequação à idade, repertório e exigência do conteúdo trabalhado com outros alunos. O objetivo da proposta foi trabalhar iniciação à escrita musical tradicional, unindo o gesto corporal à prática coral, desenvolvendo habilidades principalmente de leitura rítmica e corpórea com cerca de trinta crianças. Outros conteúdos extrínsecos à música fizeram parte do trabalho como socialização, leitura imagética, desenvolvimento do letramento e outros. Habilidades essas citadas no Referencial Curricular para a Educação Infantil- RCNEI, documento oficial do estado brasileiro para esta fase da educação básica. A canção utilizada foi “O sapo não lava o pé” de domínio público resultando na confecção de partitura alternativa e interpretação corporal e vocal da canção escolhida com muito entusiasmo.

Palavras- Chave: Educação infantil, canção popular e notação musical

Introdução

Temos visto a crescente discussão em torno da música na escola, como por

exemplo: quais são as concepções que devem estar inseridas no planejamento? Como

devemos direcionar a construção do currículo? E ainda, quais profissionais que devem

atuar em seu ensino? Tais indagações podem ser percebidas em anais de congressos e

em textos diversos como Queiroz; Marinho (2009); Bellochio; Figueiredo (2009) e

Beyer; Kebach (2009), entre tantos outros. Refletir sobre a música na escola é pertinente

principalmente quando consideramos cada contexto educativo, pensando numa proposta

que atenda à necessidades de cada local em que a música deverá ser ensinada, levando

em consideração as especificidades de cada escola e clientela. O espaço da música

perpassa todos os níveis do ensino básico brasileiro, seja com finalidade de

aprendizagem musical ou não.

1 Graduada em Artes/ Música pela Universidade Estadual de Montes Claros- UNIMONTES e pós-graduanda em Metodologia do ensino das Artes/ Processos Pedagógicos em Educação Musical pela Faculdades Unidas do Norte de Minas- FUNORTE/ SOEBRAS.

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A presença da música na educação infantil é relatada em diversos trabalhos do

campo da educação, pedagogia, educação musical e afins, pois se configura como

prática enraizada no cotidiano desta fase da educação básica. “Nas escolas de educação

infantil, devido aos programas de ensino serem abordados com uma certa flexibilidade,

a música encontra-se presente no cotidiano da sala de aula de várias maneiras”

(CISZEVSKI, 2010, p. 24). Pensando nestas questões, partimos para o registro de uma

prática em educação musical na educação infantil que ao mesmo tempo contempla a

realidade de uma escola particular e que também pode ser aplicada em diversas

localidades de nosso país sendo adaptada a cada realidade de ensino.

Esta proposta surgiu a partir da reflexão e necessidade de sistematização de

nossa prática docente junto a alunos da Educação Infantil de uma escola da rede

particular de ensino na cidade de Pirapora, situada na região norte do estado de Minas

Gerais. O mesmo retrata o desenvolvimento das aulas de música com exploração do

conteúdo de iniciação à escrita musical a partir do cancioneiro infantil brasileiro. Além

de habilidades como pulsação em conjunto, percussão corporal e canto coral. As

práticas em questão envolveram ainda a aprendizagem de conhecimentos extrínsecos à

educação musical, como coordenação motora e gestual, linguagem visual e imagética, e

ainda consciência de corpo e espaço.

A proposta perpassou tais objetivos com a finalidade de ampliação de

conhecimentos e habilidades para além do universo musical, uma vez que o limite entre

“disciplinas” ou conteúdos não são bem delimitados na educação infantil como bem

retrata Ponso (2008, p. 13). Dessa forma, a exploração dos conteúdos musicais não se

encerrou nesta questão apenas. A proposta buscou reafirmar vários objetivos,

desenvolvendo aptidões e capacidades diversas que por sua vez ajudam a preparar o

estudante para avaliações futuras, em que mais de um conteúdo e habilidade são

previstos.

Entre as atribuições para além do universo musical temos o desenvolvimento do

letramento com reconhecimento e leitura de palavras simples, a representação gráfica de

palavras além de acentuação das mesmas, todos relacionado à área de linguagens e

códigos.

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“O Sapo Não Lava o Pé... Não Lava Porque Não Quer!” Definições da atividade

A escolha dos elementos que compuseram a proposta foi definida a partir dos

propósitos gerais e específicos das aulas, porque acreditamos que toda a metodologia de

ensino deve estar associada ao contexto de produção do conhecimento, os objetivos

traçados e abordagens escolhidas pelo educador. Desta forma escolhemos a canção

popular “O sapo não lava o pé” que é comum às crianças, parte do repertório deles e já

foi trabalhada por outros professores em outros momentos com objetivos variados como

letramento, treino de palavras simples, e outros. Sobre escolha, ampliação e

desenvolvimento de repertório, Lima e Stencil recomendam:

Devemos levar em consideração não só as diversas maneiras de nos relacionarmos com a música, num verdadeiro contexto interdisciplinar, como também associarmos a ela os diversos contextos culturais, por meio de um repertório que tenha significado e que parta dos alunos, valorizando a vivência das crianças, trazendo benefícios a outras áreas do currículo (LIMA; STENCEL, 2010, p. 90).

Os aspectos rítmicos da peça foram facilitadores da realização desta prática, pois

o acompanhamento da linha melódica foi facilmente adaptado à performance corporal

que propusemos. O trabalho perpassou alguns dos aspectos que poderiam ser

explorados através desta canção. O principal deles foi iniciação à escrita musical e

desenvolvimento da prática interpretativa em conjunto. Sobre o primeiro aspecto,

buscamos inicialmente trabalhar somente duas das figuras tradicionais: a mínima e a

semínima. A exploração das mesmas se deu de forma gradual. Iniciamos mostrando

quais elementos fazem parte das figuras (cabeça e haste) o que diferencia uma da outra

(a cabeça cheia e outra vazia) bem como poderíamos representar cada uma delas.

Fizemos ilustrações, descobrimos que com as mãos é possível fazer o desenho das duas

figuras para somente depois disto tocá-las. Ao propor a execução, fizemos percussão

corporal tocando duas semínimas batendo na coxa, uma de cada vez e a mínima com

uma palma que se estendia pelo ar.

As duas figuras musicais permitiram o desenvolvimento de variação rítmica de

maneira simples, porém, estruturada de modo a ampliar o universo rítmico dos alunos e

ainda compor um novo jeito de vivenciar a canção do sapo. O RCNEI- Referencial

Curricular nacional para a Educação Infantil aponta:

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O trabalho com Música proposto por este documento fundamenta-se nesses estudos, de modo a garantir à criança a possibilidade de vivenciar e refletir sobre questões musicais, num exercício sensível e expressivo que também oferece condições para o desenvolvimento de habilidades, de formulação de hipóteses e de elaboração de conceitos (BRASIL, 1998, v.I, p. 48).

Esta sensibilidade foi estimulada através da apreciação e exploração do contexto

musical, explorando desenhos livres sobre a canção, versões gravadas, desenhos das

figuras, exercícios rítmicos trazendo variações com as duas figuras até chegarmos à

confecção de cartaz com a partitura já escrita e a maneira de execução e assim

consolidar o conhecimento construído de maneira coletiva.

O segundo aspecto citado: a prática interpretativa em conjunto, nos remete à

formação musical em grupo que entre outras habilidades estimulam: solidariedade,

confiança, companheirismo, amplia a visão de mundo dos envolvidos, desenvolve

harmonia em grupo (COSTA, 2009, p. 84) e tantas outras habilidades que justificam

este tipo de proposta de maneira bem consistente.

O desenvolvimento das habilidades previstas no texto do RCNEI foi real na

prática com a canção do sapo, pois os alunos uniram gesto corporal, acentuação rítmica

e canto coral. No tocante ainda a interpretação, propomos a união do gesto corporal à

música, prática que nos surgiu a partir da influência do movimento na canção. Para

Rodrigues (2009, p. 37) é comum o uso do gesto como recurso pedagógico em aulas de

música por ser esta uma das formas de vivenciar a própria música. Trazendo o sentido

literal da canção escolhida, o sapo é um animal que constantemente se movimenta, ao

explorarmos os deslocamentos do sapo já pretendíamos trazer à tona a pulsação contida

na canção, alvo de nosso estudo a partir da perspectiva da distribuição dos sons em duas

figuras musicais. Assim:

A influência da música sobre o movimento é iniciada nas suas respectivas gêneses, pois quando Wisnik (op.cit) explica o pulso da música, utiliza para isso uma metáfora corporal, colocando que o universo sonoro e a música passam por padrões somáticos e psíquicos, trazendo à tona uma idéia fundamental: a música como fenômeno corporal (RODRIGUES, 2009, p. 39 e 40).

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“Ele Mora Lá na Lagoa...” Estratégias de trabalho

Escolhida a canção, as figuras musicais e após a sensibilização para a proposta,

escolhendo a canção, ouvindo versões, interpretando-a cantando e com desenhos,

partimos para a execução da proposta apresentada: Primeiro aprendemos a canção com

a boa repetição típica do trabalho com esta faixa etária. Após a escola da música do

sapo, cada um cantou as versões que conhecia, cantamos juntos, marcando a pulsação,

dançando e explorando parâmetros do som: forte e fraco, grave e agudo e ainda o

andamento, rápido e devagar. Exploramos toda a expressividade vocal que poderíamos

utilizando os parâmetros citados acima, imitamos o som do sapo, inventamos a voz

dele, o gesto que ele emitia ao falar entre outros. Tais estímulos trouxeram mais

significado e verdade à interpretação das crianças nesta etapa da atividade.

Após descobrirmos o sapo que “existia” dentro da cada um, partimos para a

sensação do pulso da música para então apresentar a variação rítmica escolhida com as

figuras mínima e semínima. O desenvolvimento do pulso foi estimulado através de

brincadeiras circulares, marcação acompanhando a cação em cd e cantada pelos alunos,

utilizamos a mesa, o corpo, pulos e palmas para marcar, sempre na perspectiva binária

da canção: um tempo mais forte e outro fraco. Experimentamos a maneira de distribuir

as figuras explorando variantes. Fizemos isto cantando esta e outras canções somente

tocando a semínima com o corpo (batendo nas coxas alternadamente) tocando a

semínima e a pausa, em andamentos diferentes. Daí, incluímos a mínima (com uma

palma prolongada), juntamos as duas figuras em variações executadas com o corpo

como: uma mínima e duas semínimas; pausa e mínima; semínima, pausa mínima;

mínima e duas semínimas e tantos que eles mesmos foram criando. Até chegar ao

resultado final apresentado na imagem abaixo em duas etapas da canção:

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Imagem 01- Variação rítmica utilizada no acompanhamento corporal da canção “O sapo não lava o pé”, nas duas primeiras estrofes.

A célula rítmica apresentada na Imagem 01 foi executada utilizando as coxas nas

semínimas e uma palma prolongada pelo ar na mínima, sendo tocadas nas duas

primeiras estrofes da canção:“O sapo não lava o pé / Não lava porque não quer”.

A Imagem 02 traz o acompanhamento corporal (batidas nas coxas

alternadamente nas semínimas e a palma prolongada na mínima) executado na segunda

parte da canção, no trecho:“Ele mora lá na lagoa / Não lava o pé porque não quer /

Mais que chulé!

Imagem 02- Variação rítmica utilizada no acompanhamento corporal da canção “O sapo não lava o pé” nas três últimas estrofes.

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“Não Lava o Pé Porque Não Quer...” definindo caminhos

Façamos agora uma breve justificativa sobre as possibilidades que poderiam ter

sido trabalhadas mas, que não exploramos nesta proposta, a fim de esclarecer objetivos

e definir os caminhos trilhados pelos envolvidos (professora de música, monitora e

crianças).

Não nos preocupamos em entrar no estudo da fórmula de compasso, ficando esta

sugestão para um outro trabalho com estudantes maiores. Prova disso é o final da

canção que traz uma discrepância entre o valor das últimas figuras, possível de observar

na análise da Imagem 02. Nosso objetivo foi utilizar as figuras não incorporando ao

trabalho os valores das pausas nesta etapa do trabalho, acreditando da gradação de

aquisição de conhecimentos como meio de conseguir uma aprendizagem significativa e

não excludente. Trabalhamos as pausas anteriormente no processo de experimentação

de variação das figuras musicais escolhidas, não na execução da peça do sapo.

Exploramos anteriormente a notação não tradicional, extremamente importante

para o trabalho tradicional, de maneira alguma inferior. Ciszevski já aponta um

direcionamento quanto à utilização deste recurso pedagógico explicando que já em

partituras contemporâneas há o uso de símbolos e desenhos bem próximos aos

produzidos por crianças da educação infantil e séries iniciais (CISZEVSKI, 2010, p.

28). Entretanto, apesar deste trabalho introdutório e não menos importante partimos

para a escolha da notação tradicional como norteadora da proposta. Fica aqui o

apontamento para possíveis desdobramentos.

A imagem tem auxiliado muito na aprendizagem infantil, pois aproxima o tema

da canção ao cotidiano dos alunos uma vez que estes representam a canção com

símbolos específicos de seu repertório imagético. Em nossa proposta buscamos

relacionar a canção à escrita das figuras musicais e não à ilustração da canção como é

feito muitas vezes. Trabalho esse que sem dúvida dá subsídio à construção da

apreciação musical bem como registro de músicas diversas com crianças de todas as

idades. Eles perceberam através desta experiência, que podem escrever (representar) a

música de outras formas, não mais somente por meio de desenhos. Esta experiência foi

sem dúvida uma novidade para eles que anteriormente em sala de aula com professoras

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não especialistas em música haviam explorado somente no âmbito do letramento e

desenhos sobre o tema.

“Mais que Chulééé...” finalizando!

A construção da partitura (a ilustração das figuras musicais) foi feita pela

professora de música, o que não impede a sugestão da confecção em conjunto com os

alunos, estratégia até já utilizada com êxito em outros momentos. Utilizamos cartolina,

pincel, régua e a ilustração de um sapo, colorido por uma das alunas. Para facilitar a

associação da imagem ao gesto, organizamos a disposição das figuras exatamente aonde

executaríamos o movimento corporal.

A imagem a seguir é a foto da partitura pronta, após todo o processo exposto

conseguimos:

Imagem 03- Partitura da canção o sapo não lava o pé a partir da proposta apresentada.

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Treinamos a execução juntamente com a leitura corporal da peça, unindo o gesto

ao auxílio visual, expondo a partitura pronta para que todos pudessem ver e

acompanhar. Primeiro analisamos todos os elementos contidos nela: as figuras, a letra

da canção e a figura do sapo. Após essa exploração executamos a percussão corporal e o

canto individualmente, depois incentivamos os alunos a cantarem sozinhos e

produzirem os gestos separadamente para daí unirem tudo, sempre lembrando que a

partitura estava presente em sala de aula para ser vista e lida por eles. Após duas

semanas de “treino” apresentamos a canção à comunidade escolar por mais de uma vez,

com aprovação dos pais, alunos e funcionários da escola.

A experiência foi fruto de acesso a poucas alternativas para o trabalho com

música na educação infantil, uma vez que o sistema de ensino que a escola adota, não

oferece material didático específico de educação musical nesta fase de ensino. A escola

nos disponibilizou o material necessário para a construção da partitura e ofereceu ainda

o estímulo ao desenvolvimento e construção de atividades para executar com os alunos

da EI, além do apoio nas apresentações, demonstrando interesse na divulgação das

práticas educativas desenvolvidas nas aulas de música.

Acreditamos que a busca por propostas educacionais para o trabalho com a

música na escola deve ser contínua e constantemente renovada a partir das vivências de

cada grupo de estudantes.

Esperamos desta forma que este trabalho contribua para a prática incessante de

professores de músicas de todo o país que pretende construir decididamente uma

educação musical de qualidade em seu contexto de atuação. É válido ressaltar que esta

proposta não se esgota nela mesma, sendo base para outras práticas e facilitadora da

busca por alternativas condizentes com as perspectivas da área da educação musical

brasileira, sendo apenas uma idéia a ser discutida e repensada em todo o tempo.

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Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro; FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira. Cai, cai balão... Entre a formação e as práticas musicais em sala de aula: discutindo algumas questões com professores não especialistas em música. Música na educação básica. Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 36- 45. Outubro de 2009. BEYER, Ester; KEBACH, Patrícia (Org.). Pedagogia da Música: experiências de apreciação musical. Porto Alegre: Mediação, 2009. BRASIL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: Conhecimento de Mundo. Brasília: MEC/SEF, 1998, v.3. CISZEVSKI, Wasti Sivério. Notação musical não tradicional: possibilidade de criação e expressão musical na educação infantil. Música na educação básica. Porto Alegre, v. 2, n. 2, p. 22- 33. Setembro de 2010. COSTA, Patrícia. Coro Juvenil nas escolas: sonho ou possibilidade? In: Música na educação básica. Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 83-91. Outubro de 2009. LIMA, Ailen Rose B. de; STENCEL, Ellen de Albuquerque B. Vivência musical no contexto escolar. Música na educação básica. Porto Alegre, v. 2, n. 2, p. 88- 103. Setembro de 2010. PONSO, Caroline Cao. Música em diálogo: ações interdisciplinares na educação infantil. Coleção Músicas. Porto Alegre: Sulina, 2008. QUEIROZ, Luis Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho. Práticas para o ensino de música nas escolas de educação básica. Música na educação básica. Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 60- 75. Outubro de 2009. RODRIGUES, Márcia Cristina Pires. Apreciação Musical através do gesto corporal. In: BEYER, Ester; KEBACH, Patrícia (Org.). Pedagogia da Música: experiências de apreciação musical. Porto Alegre: Mediação, 2009. P. 37- 67.

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Planejamento de atividades musicais para bebês com Síndrome de Down e

suas famílias

Ricardo José Dourado Freire UnB

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Resumo: As atividades musicais propostas em um curso de música visam estimular aspectos específicos do desenvolvimento dos bebês com Síndrome de Down (SD), visando superar dificuldades fisiológicas congênitas além de contribuir para o estabelecimento de vínculos afetivos essenciais ao desenvolvimento. O planejamento das atividades musicais em grupo tem como objetivo a criação de um modelo de referência com boa colocação vocal e um rico repertório de padrões melódicos e rítmicos a partir da interação do adulto com a criança. O trabalho é realizado junto à família com bebês entre dois meses e dois anos. A aula é organizada em quatro momentos: 1) recepção e aquecimento, 2) movimento, 3) interações individuais e 4) carinho e acolhimento. As atividades realizadas são escolhidas entre canções sem palavras, parlendas, interações melódicas e rítmicas, colocação da voz de cabeça, canções conhecidas com sílabas específicas, interação com instrumentos e objetos musicais, histórias e livros musicais, canções do folclore e do cancioneiro infantil. A atuação em grupo permite a troca de informações entre as famílias e também a interação entre crianças da mesma faixa etária. O trabalho de estimulação musical é uma parceria do professor com as famílias em benefício da criança e as atividades são conduzidas de forma que a família possa utilizá-las em sua rotina, pois as aulas são apenas um pequeno momento da rotina semanal da criança. A verdadeira estimulação ocorre em casa de forma contínua, quando mães, pais, irmãos e cuidadores passam a “musicalizar” a vida das crianças.

Palavras chave: Síndrome de down, educação musical, atividades musicais

O Projeto de Extensão “Música para Crianças”, da Universidade de Brasília, oferece

aulas de musicalização para 850 crianças desde o nascimento até o início do aprendizado de

um instrumento musical (FREIRE, 2008). O curso teve inicio em agosto de 2002, com aulas

de musicalização para crianças de 0 a 5 anos, e a partir de 2004 foi criada uma turma

específica para bebês com Síndrome de Down (SD), desde o nascimento até os dois anos de

idade. Este grupo também está aberto para crianças com outras necessidades especiais e teve a

participação de crianças com paralisia cerebral, cegueira, e outras síndromes não

diagnosticadas.

A turma para crianças com Síndrome de Down surgiu a partir da necessidade de se

oferecer um serviço de estimulação precoce e acompanhamento diferenciado para bebês e

suas famílias. O acolhimento de uma família com bebê portador de Síndrome de Down é

fundamental nos primeiros meses de vida, tanto para a integração da criança em um grupo

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com atividades musicais, quanto para o contato da família com outras famílias de crianças

SD.

O trabalho com bebês e crianças portadores de Síndrome de Down (SD) é

significativamente marcado pelas relações afetivas dessas crianças com seus pais, mães e

irmãos (MATIAS; FREIRE, 2005). A aceitação da criança e a superação do “luto” pela

família são aspectos fundamentais para que o acompanhamento e estimulação precoce da

criança SD tenha êxito. A partir dos relatos das mães e observação das respostas das crianças,

foi possível verificar que as atividades musicais tornaram-se muito importante para as

famílias como mediadoras das relações afetivas. Além de estimular o desenvolvimento

musical, cognitivo, social e psicomotor dos bebês, a música também teve impacto no

desenvolvimento dos pais e mães, auxiliando estes na superação do “luto”.

Voivodic (2004) considera importante que, desde os primeiros anos de vida da criança

com Síndrome de Down, seja realizada uma estimulação precoce que "leve em conta seus

diferentes modos e ritmos de aprendizagem, em função de suas necessidades especiais"

(p.31). Considera também que a família tem um papel de fundamental importância no

desenvolvimento social, emocional e cognitivo durante o período crítico (primeiros meses de

vida) das crianças SD. Segundo diretrizes do MEC/SEESP de 1995, estimulação precoce "é o

conjunto de atividades e recursos humanos e ambientais incentivadores que são destinados a

proporcionar à criança, nos seus primeiros anos de vida, experiências significativas para

alcançar pleno desenvolvimento no seu processo evolutivo" (s.p.).

A turma realiza as aulas todas as sextas-feiras, no período da tarde, com duração de 50

minutos. Quando as crianças completam 2 anos e já andam, são encaminhadas para a

integração nas turmas com crianças comuns da mesma idade cronológica. A participação

nesta turma é considerada fundamental como preparação para a integração efetiva nas turmas

regulares, pois as crianças que participam da turma para bebês SD já conhecem a rotina da

aula e conseguem acompanhar com ótimo desempenho as turmas da mesma faixa etária.

Os conceitos e as referências para a montagem da estrutura de aula se baseiam na

proposta de Dourado e Millet para o trabalho na área de artes cênicas: “Para uma melhor

dinamização da aula, o mais eficaz seria dividi-la em quatro etapas sequenciadas: 1)

aquecimento, 2) relaxamento-concentração, 3)elaboração e, 4) avaliação” (DOURADO;

MILLET, 1998, p. 30). Estes conceitos são observados como diretrizes e adaptados aos

objetivos de cada semestre para incluir e combinar etapas no processo, dessa forma, foi

possível estabelecer um modelo próprio de rotina de aula que tem se mostrado produtivo para

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o trabalho na turma específica. A estrutura da aula consiste em quatro momentos: recepção e

aquecimento, 2) movimento, 3) interações individuais, e 4) carinho e acolhimento.

Atividades musicais

As atividades realizadas em aula são concebidas de forma que mães, pais e cuidadores

também possam realizar atividades musicais em casa. O professor estimula as crianças em

sala e orienta as famílias sobre como realizar brincadeiras musicais em casa. A criança com

SD necessita de modelos consistentes e bem realizados em casa, uma vez que a repetição de

um bom modelo irá facilitar a aprendizagem da criança.

O repertório musical consiste de canções do universo infantil brasileiro, baseadas no

folclore de diversas regiões, parlendas faladas, brinquedos musicais e canções da MPB.

Dentro do Projeto “Música para Crianças”, foi criado um repertório especifico para

musicalização infantil, formado por canções sem palavras nas quais são utilizadas músicas em

diversos modos e também parlendas rítmicas em compassos irregulares. De acordo com

Gordon (2000), a variedade de métricas e modos é fundamental para o desenvolvimento

cognitivo musical da criança.

1- Recepção e Aquecimento

A chegada da criança e o início da aula podem ser considerados com uma transição

entre as atividades cotidianas e o ambiente da musicalização. A aula é iniciada com a

formação de uma roda, com as pessoas sentadas no chão, e começa com a canção de abertura

que estabelece o padrão de interação musical entre as pessoas presentes. Cada semestre possui

uma canção própria, sendo que todas as canções permitem a apresentação de cada criança e

adulto presente na roda. O professor deve dar atenção a todos os participantes, mantendo

contato visual e falando o nome de cada pessoa. Neste momento o professor estabelece o

primeiro contato com a criança e sua família, abrindo as portas do relacionamento e

permitindo que seja criado um vínculo de confiança entre ambas as partes.

a) Respiração e Concentração

A respiração, além de sua importância na expressividade musical, é um aspecto que

deve ser muito estimulado com as crianças SD. Devido à fisiologia do nariz e uma propensão

a irritações nas vias aéreas, as crianças SD apresentam tendência a desenvolver uma

respiração curta e com pouco consumo de oxigênio. Nas aulas são realizadas atividades de

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respiração acompanhadas do movimento dos braços para representar o fluxo da respiração. A

aula inicia com o som de uma respiração profunda, realizada pelo nariz, acompanhada da

movimentação dos braços se abrindo ou se movimentando para cima e para baixo. Em

seguida são feitas várias brincadeiras com a movimentação das mãos acompanhadas de

diversos tipos de respiração: rápida e devagar, funda e rasa, sibilar e nasal, utilizando vários

sons e sílabas.

O foco na respiração visa ilustrar a importância do ato de respirar antes de cantar ou

falar. Esta abordagem também auxilia na concentração, uma vez que o grupo começa a

respirar junto e o silêncio torna-se um fator de concentração coletiva. Todos acompanham o

ato de inspirar e expirar, focalizando nos movimentos do grupo e despertando para a

importância do outro dentro da roda.

b) Voz de Cabeça

Crianças com SD apresentam como característica a hipotonia muscular. Sua

musculatura é mais flácida e apresenta maior dificuldade para criar tônus muscular. No caso

do desenvolvimento da linguagem, os músculos da laringe também apresentam hipotonia e

necessitam de um cuidado específico para o desenvolvimento do registro agudo. As vozes

infantis apresentam nos primeiros anos uma tessitura específica entre Ré 3 (297 hz) e Lá

3(440hz) sendo possível estender esta tessitura para uma oitava, até Ré 4 (594 hz). Algumas

crianças SD apresentam uma voz muito grave e fora do registro infantil, sendo que a tessitura

grave não permite uma definição de altura e prejudica muito a afinação musical. Torna-se,

assim, muito importante trabalhar com as mães a construção de um modelo vocal que valorize

o registro agudo e as crianças possam interagir com vozes agudas em casa, estimulando a

procura de um timbre que utilize a “voz de cabeça” e não o timbre grave da “voz de peito”.

Atualmente, na cultura brasileira, existe uma valorização extrema da voz feminina

muito grave, sendo que as principais cantoras da MPB utilizam o registro de peito para cantar.

Podemos observar o uso da voz grave em cantoras como: Ivete Sangalo, Ana Carolina, Zélia

Duncan e Maria Bethânia. No entanto existem poucos modelos de vozes agudas e muitas

mães se mostram desconfortáveis ao cantar com a voz aguda. Para que a criança possa

desenvolver o registro agudo são realizadas várias atividades enfatizando a importância da

“voz de cabeça”. Atividades específicas consistem em começar uma música mais grave e

modular por graus conjuntos ascendentes até chegar ao registro infantil. Outra atividade visa

explorar vozes de personagens ou animais que fazem sons agudos. O estimulo do uso do

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registro agudo é fundamental para conseguir desenvolver o senso de afinação nas crianças, e o

desenvolvimento da voz de cabeça precisa da participação e engajamento das mães na

valorização da voz aguda da criança.

c) Interação com instrumentos e objetos musicais

A utilização de instrumentos musicais de sopro, corda ou percussão permite um foco

em uma fonte sonora específica. Cada instrumento apresenta um timbre único que chama a

atenção da criança, principalmente quando a frase musical é acrescentada de um gesto ou

movimento. Instrumentos de sopro (flauta-doce, flauta, clarineta) possuem um

direcionamento específico que permite a identificação do local de onde o som é gerado. Os

instrumentos de percussão (pandeiros, tambores, chocalhos, agogôs) possuem uma

característica visual muito forte e chamam atenção pela movimentação das mãos e do corpo.

Os instrumentos de cordas dedilhadas (violão e cavaquinho), em geral oferecem apoio

harmônico e rítmico para as canções, e atraem o contato direto das crianças que apreciam

sentir a vibração das cordas. Permite-se que a criança entre em contato com os instrumentos,

desde que haja cuidado para criança não se machucar ou haver dano para o instrumento.

Algumas crianças SD desenvolvem perda auditiva devido ao acúmulo de secreção no

canal auditivo e faz-se necessário verificar a lateralização auditiva das crianças,

principalmente ao usar instrumentos que possam ser tocados atrás das crianças e observar se a

criança acompanha o direcionamento do instrumento com os ouvidos. Neste caso, é

importante não mostrar os instrumentos musicais na frente da criança, pois ela irá acompanhar

o movimento do som com os olhos. Uma estratégia é colocar o estímulo musical por trás e

observar se a criança tenta localizar com os olhos a fonte sonora que está tocando.

Durante as aulas é possível observar a capacidade de reorganização emocional da

criança, para tanto acontecem pequenos sustos durante as aulas. O professor pode exagerar na

dinâmica de uma palavra ou tocar um instrumento um pouco mais forte. Muitas vezes as

crianças choram nos primeiros encontros, mas o período de recuperação emocional torna-se

cada vez mais rápido e as crianças passam a não se desequilibrar emocionalmente quando

ocorrem sons inesperados.

2- Movimento e Dança

O movimento do corpo é essencial para o desenvolvimento da musicalidade, sendo

que bebês e crianças são muito beneficiados da movimentação com um adulto. Podem ser

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realizadas diversas atividades de movimento com os adultos dançando com as crianças em pé.

Canções de roda permitem que todos se movimentem juntos, já a dança em pares permite uma

interação muito íntima entre adulto e criança. Outra atividade é brincar de estátua: dançar

quando tem música e parar quando houver pausa, neste caso enfatiza-se a relação entre

música e movimento. Dançar vários tipos de ritmos oferece uma possibilidade de interação

única, na qual a comunicação corporal é o elemento central na relação adulto-criança.

3- Interações Individuais

A interação individual professor-criança é um aspecto essencial nas aulas com bebês e

crianças pequenas. O ato de olhar no olho, cantar e estabelecer uma comunicação não-verbal

de cunho musical modifica a relação com a criança. A interação musical permite a troca de

sons, balbucios, sílabas e movimentos entre professor e criança, possibilitando que o

professor entre em sintonia com as expressões da criança. A partir das interações individuais é

possível estabelecer um diálogo sonoro que favoreça a organização do material musical em

pequenas unidades: os padrões musicais. Um padrão musical ocorre quando dois ou mais

sons/ritmos são organizados como uma unidade musical. Por exemplo, dois sons que juntos

fazem o movimento Lá – Ré ou duas sílabas (pa-pa) que juntas formam duas colcheias.

Os bebês entre 6 e 18 meses estão na fase inicial de aquisição da linguagem, este

período de tentativa no uso de sílabas e palavras é denominado balbucio e Gordon (2000)

considera que existe também um período de tentativas na utilização dos elementos musicais à

qual denomina balbucio musical. Nesta fase a criança começa a explorar os sons do ambiente

e a organizá-los em pequenas unidades, para as quais serão associados significados musicais.

A criança começa a emitir sons que podem ser relacionados com as notas de determinadas

músicas ou padrões melódicos que estão sendo cantados na aula, ou interagir dentro de um

acorde de tônica ou dominante. Do ponto de vista rítmico existe um balbucio específico,

quando as crianças começam a criar grupos de sons que podem ser relacionados a figuras

rítmicas e frases rítmicas. A realização de parlendas com sílabas neutras estimula que as

crianças a emitirem sons que podem ser imitados pelo professor como um padrão rítmico. A

emissão de qualquer som pode ser o início de um diálogo musical no qual, muitas vezes o

professor inicia a comunicação e a crianças imita o professor, mas também acontecem

situações nas quais a criança toma iniciativa e o professor imita a criança.

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a) Histórias e livros musicais

Crianças com necessidades especiais terão um processo de alfabetização próprio, serão

alfabetizadas a partir das suas capacidades e precisarão desenvolver recursos de leitura de

diversos códigos visuais. A estimulação da leitura também começa com os bebês, e a

preparação da família para a alfabetização pode ser iniciada nos primeiros anos. A partir do

momento que a criança começa a fixar o olhar, é possível a interação por meio de livros

infantis. O uso de ilustrações claras, que ofereçam um foco visual por página, permite a

criação de uma trilha sonora para os personagens e objetos que reforçam o conteúdo do livro.

O livro pode ser considerado como um brinquedo interativo, que deverá ser mediado por um

adulto. A leitura de histórias e poesias também reforça a capacidade de concentração da

criança, pelo ritmo da leitura e pela musicalidade das frases que embalam as histórias.

b) Canções com sílabas específicas

Em geral, o trabalho de desenvolvimento da linguagem é realizado com especialistas

da área de fonoaudiologia, que são os responsáveis diretos por estimularem a colocação da

língua, o desenvolvimento dos músculos faciais e promoverem a articulação das sílabas. A

aula de música faz uma estimulação indireta, ao promover a articulação e a expressividade da

palavra cantada e das músicas que são apresentadas em aula. Uma atividade que promove a

intersecção das duas áreas é a realização de músicas conhecidas dos adultos com o uso das

sílabas recomendadas pelos fonoaudiólogos. Em cada aula existe um momento em que os

adultos escolhem uma música que todos conhecem, olham diretamente para as crianças e

cantam repetindo a mesma sílaba do começo ao final da música. As sílabas mais comuns para

o uso com crianças pequenas são PA, DA, MA e BA, mas existem variações na utilização das

vogais E, I, O e U. Esta estimulação é feita para que a música cantada com sílabas específicas

seja inserida nas atividades cotidianas de estimulação da criança.

4- Canções de acolhimento e carinho

O processo de aceitação de uma criança SD é diferente para cada uma das famílias. A

realização de canções de acolhimento em grupo é um forte estímulo para as famílias

superarem o luto e fortalecerem os vínculos com a criança. Canções de carinho permitem a

expressão musical de pequenos atos de amor para com a criança. As atividades de carinho são

realizadas ao final da aula, quando o professor pede para que as mães e pais sejam os

protagonistas das atividades musicais e o professor passa a oferecer o acompanhamento

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musical para as interações dos adultos com as crianças. Neste momento, a aula adquire a

característica de promover os encontros autênticos entre crianças e adultos, sendo estes

encontros mediados pela música, que se torna muito significativa para as famílias

participantes na aula.

Conclusão

A música pode ser parte do processo de estimulação de bebês e crianças com SD

desde os primeiros meses de vida. Sabe-se que a maior parte do tratamento clínico é realizado

de maneira individual e as famílias possuem poucas oportunidades de observar o

comportamento de outras crianças da mesma idade. Aulas de música para bebês com

Síndrome de Down podem ser a primeira experiência escolar da criança. Nas aulas de música

a interação entre crianças e entre famílias é um aspecto muito positivo que permite a troca de

informações tanto sobre as crianças, como também sobre clínicas de acompanhamento e

escolas que oferecem serviços de boa qualidade.

Entretanto, trabalhar a estimulação precoce de crianças SD exige um planejamento

rigoroso e cuidadoso. Os planos de aula visam valorizar a concentração e a interação durante

as atividades realizadas na aula. Cada bebê é visto como capaz de estabelecer uma

comunicação musical e estimulado a responder aos estímulos feitos em grupo e

individualmente. Qualquer som emitido pelo bebê é incorporado nas atividades e o contato

visual torna-se elemento fundamental para que a criança possa imitar os adultos e crianças

presentes na aula. Bons modelos vocais e rítmicos são fundamentais para que a criança possa

construir sua experiência musical de maneira sólida. A colocação da voz de cabeça e

valorização do movimento corporal são elementos que preparam a crianças para serem

integrados de maneira efetiva tanto em atividades musicais futuras quanto na escola regular.

O trabalho de estimulação musical é uma parceria do professor com as famílias em

benefício da criança, e as aulas são apenas um pequeno recorte na vida da criança. A

verdadeira estimulação ocorre em casa, quando as mães, pais, irmãos e cuidadores passam a

“musicalizar” a vida das crianças, colocando música em vários momentos do dia. Desde a

hora de acordar, passando pelas brincadeiras do dia a dia, os passeios no carro, hora de comer,

hora de tomar banho e também na hora de dormir. As atividades musicais podem ser um

elemento de alegria e descontração, ao permitir pequenos prazeres musicais que são essenciais

no cotidiano das famílias.

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Referências

DOURADO, Paulo; MILLET, M.E. Manual de Criatividades. Salvador: EGBA, 1998. FREIRE, R. J. D. Implementação e estruturação de um projeto de musicalização infantil: relato de experiência. In: XVII ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 2008, São Paulo. Anais… São Paulo- SP: Editora da Unesp, 2008. v.1. p.1 - 9 FREIRE, R. J. D., FREIRE, S.F. de C.D. Parents’ conferences in early childhood music learning process: A case study. In: ECME [EARLY CHILDHOOD MUSIC EDUCATION] COMMISSION13TH INTERNATIONAL SEMINAR OF ISME [INTERNATIONAL SOCIETY FOR MUSIC EDUCATION, 2008, Frescati - Itália. Proceedings... ROMA, ISME- Internation Society for Music Education, 2008a. v.1. p.22 – 25 FREIRE, R. J. D., FREIRE, S.F. de C.D.. Planejamento na Educação Musical Infantil. In: XVIII CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA, 2008, Salvador- BA. Anais... Salvador, ANPPOM, 2008a. v.1. p.1 – 8 FREIRE, R. J. D., PRESTES, C., PORTO, C., ROSA, L. Aspectos da avaliação do desenvolvimento musical. In: ENCONTRO REGIONAL DA ISME AMÉRICA LATINA 2007, 2007, Campo Grande. Anais... Campo Grande, Editora da UFMS, 2007. v.1. p.1 – 9. GORDON, Edwin E. Teoria de Aprendizagem Musical para Recém-nascidos e Crianças em Idade Pré-escolar. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa, 2000. MATIAS, R.B., FREIRE, R. J. D. A importância da música no fortalecimento de vínculos afetivos em famílias com bebês com Síndrome de Down. ICTUS, v.6, p.41 - 52, 2005. VOIVODIC, M. A. Inclusão Escolar de Crianças com Síndrome de Down. Petrópolis: Vozes, 2004.

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O Educador Musical no Ensino Infantil: sua presença na rede regular de

ensino

Carolina Chaves Gomes [email protected]

Resumo: Este trabalho objetiva apresentar um levantamento das escolas que oferecem aulas de música com um educador musical nas aulas regulares da educação infantil na cidade de Natal. Trata-se de um recorte da primeira etapa de uma pesquisa em nível de mestrado que buscou analisar as concepções e práticas pedagógicas que caracterizam a atuação dos professores de música na educação infantil em escolas públicas municipais e privadas da cidade de Natal/RN. Foram contatadas 208 escolas privadas e 71 da rede pública municipal de ensino, dentre as quais verificou-se uma demanda para o educador musical nas escolas que possuem esse nível de ensino na rede privada, bem como a distribuição de 1 ou 2 educadores em cada região na rede pública municipal.

Palavras chave: Educação infantil, educador musical, levantamento

A educação musical constitui-se hoje como um campo diversificado. Mais

recentemente, a pesquisa em educação musical tem aprofundado questões diversas e, como

aponta Figueiredo (2010, p. 173) “crescido sistematicamente, como se pode observar através

das produções bibliográficas que tratam das mais diversas temáticas e estão cada vez mais

disponíveis”.

Dentro da abrangência da área de educação musical na atualidade, este trabalho

apresenta resultados de uma pesquisa em nível de mestrado que se insere no âmbito da

educação musical para o ensino infantil. Tendo como objetivo analisar as concepções e

práticas pedagógicas que caracterizam a atuação dos professores de música na educação

infantil em escolas públicas municipais e privadas da cidade de Natal/RN, a pesquisa

realizada foi dividida em duas etapas: a primeira identificando as escolas de Natal que

oferecem aulas específicas de música na educação infantil, bem como aspectos gerais de seus

espaços, práticas, concepções, formação, dentre outros; e a segunda realizando dois estudos

de caso para verificar com maior profundidade essas características.

Para este artigo apresento o início da primeira etapa da pesquisa, que trata

especificamente da identificação das escolas que oferecem aulas de música com um educador

musical nas aulas regulares da educação infantil. Espera-se que essa pesquisa auxilie no

delineamento dos atuais espaços de atuação do educador musical, além de apresentar

especificamente a realidade natalense acerca de suas demandas emergentes no que diz

respeito ao ensino de música.

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Com efeito, foi considerado como educador musical ou professor de música, aqueles

que atuam no ensino da disciplina específica de música na escola regular, possuem formação

na área, ou conferem ênfase à música em sua prática na disciplina Artes de modo a constituir

uma disciplina específica. Assim, foram incluídos docentes que lecionavam a disciplina há

mais de cinco anos e que possuíam alguma formação mínima em música, bem como

graduandos do curso Música-Licenciatura que também eram responsáveis pela disciplina

específica na escola regular.

1. Contexto e metodologia de pesquisa

Na cidade de Natal apesar da Licenciatura em Música ser um curso recente (até o ano

de 2004 ainda ingressavam alunos no curso de Educação Artística-Música), a Secretaria

Municipal de Educação (SME) admite a necessidade de um professor específico de Arte na

educação infantil quando esta estiver presente no projeto político pedagógico da escola,

aspecto previsto pela Resolução 002/08 SME/PMN (PREFEITURA MUNICIPAL DE

NATAL, 2008).

Para identificação dos educadores musicais recorreu-se à abordagens específicas para

a rede pública e rede privada. Para as escolas públicas municipais solicitei através de ofício

autorização da Secretaria Municipal de Educação, apresentando a pesquisa e o objetivo geral,

seguido dos procedimentos metodológicos que seriam realizados posteriormente

(questionário, entrevistas, observação), explicando a relevância desse estudo para a SME e

afirmando que, ao final, disponibilizarei os dados analisados sobre a situação do ensino de

música na educação infantil na cidade de Natal, como forma de auxílio no estabelecimento

das estratégias municipais.

Recebi a autorização a qual permitia a realização da pesquisa e comunicava às escolas

e Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) a realização do estudo. Junto a esse

documento me foi concedida uma lista com 28 escolas e CMEIs que possuem professor de

Artes atuando na Educação Infantil. Ainda assim, complementarmente foi utilizada a lista

geral de escolas e centros municipais de ensino disponibilizada no site da Secretaria.

Posteriormente, para identificar o professor de música atuante na educação infantil, foco desta

investigação, utilizei contato telefônico com as escolas, participei da primeira reunião mensal

de professores de Artes do Município e da Mostra de Arte, Cultura e Conhecimento das

escolas municipais, bem como recorri a contatos pessoais.

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Para as escolas privadas optei em fazer contatos por telefone, de acordo com a lista

telefônica, Listel on-line dos anos 2009 e 2010, da cidade de Natal. Foi realizado também

contato telefônico, bem como autorizado pelas professoras da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte o acesso às escolas que eram campos de estágio de observação das duas

turmas da disciplina “Atividades Orientadas I: metodologia do ensino da música na educação

infantil e fundamental”. Assim, a lista final de escolas privadas totalizou 208 instituições de

ensino.

2. Identificando escolas e professores: caracterização do universo de pesquisa na rede pública e privada

2.1 O ensino de música na rede privada na cidade de Natal

As escolas privadas da cidade de Natal investigadas para constituição do universo de

pesquisa perfizeram um total de 208 escolas. O GRAF. 1 apresenta as categorias surgidas

desses contatos:

Gráfico 1: Total de escolas privadas.

As “instituições que não foi possível contatar” são aquelas cujo número de telefone

não existe, não atende ou a ligação não é completada. Para cada uma dessas escolas foram

feitas no mínimo três tentativas de contato telefônico em dias e horários distintos.

“Escolas sem educação infantil” refere-se às que são apenas ensino fundamental,

cursinho, aulas de reforço dentre outros. Ainda assim, nessa categoria, foram encontradas

duas escolas de ensino regular que possuíam professor de música.

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“Escolas com educação infantil sem professor de música” contabilizaram 85

instituições ou 40,9% do total. Ressalte-se que neste grupo encontram-se escolas que possuem

ensino infantil, fundamental e médio, ou ensino infantil e fundamental, ou somente ensino

infantil.

“Escolas com professor de música sem atuar na educação infantil”, compreendem

aquelas que possuem educação infantil e docente em música, contudo, este atua com

atividades extracurriculares ou apenas a partir do fundamental.

Por fim, as “escolas com professor de música atuando na educação infantil”

contabilizam 24 instituições, correspondentes a 11,54% do total de escolas pesquisadas.

Assim, do total de 208 escolas, encontrou-se 114 que possuem educação infantil e

apenas 24 com educador musical atuando nesse espaço. Contudo, apesar de representarem 24

escolas da rede privada, são apenas 15 docentes encontrados que atuam nas aulas regulares da

educação infantil na cidade de Natal. Considerando apenas as escolas que possuem educação

infantil, conforme o GRAF. 2, a maioria ainda não possui educador musical atuante (74,6%).

Gráfico 2: Total de escolas privadas com educação infantil.

Contudo, dentre as escolas que possuem educação infantil e um educador musical

(GRAF. 3), percebe-se a predominância do espaço infantil para atuação desse profissional.

A atuação do educador musical no ensino infantil, provavelmente é uma solicitação

advinda da própria escola, que cria esse espaço e demanda para profissionais capacitados

nesta categoria de ensino, demanda verificada também através dos questionários.

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Gráfico 3: Total de escolas privadas com educação infantil e professor de música.

Sobre essa questão, Beyer (2001) já afirmava que:

São pouquíssimos os Centros públicos de Educação Infantil. No entanto, há milhares de escolas particulares de Educação Infantil [...]. Quantas destas tem Educação Musical? Talvez 2 a 5%, muito pouco em relação ao número imenso de crianças que deixarão de ter aulas de música na Educação Infantil. Mesmo assim, há muita procura atualmente para a música nestes espaços” (BEYER, 2001, s.p.).

Felizmente na cidade de Natal essa projeção de até 5% foi superada se verificarmos

apenas as escolas que possuem educação infantil. Ou seja, dentre as escolas privadas

pesquisadas na cidade de Natal, percebe-se claramente uma demanda para aulas de música na

educação infantil nas instituições que possuem esse nível de ensino. Algo que, enquanto

educadora musical, vinha percebendo empiricamente ao longo da minha formação, tanto em

virtude das propostas de empregos quanto em conversas com gestores e pais.

Cabe, portanto atenção para esse nível de ensino durante a formação de professores,

para que contemplem as especificidades que lhe cabem enquanto espaço institucional de

ensino e aprendizagem de crianças de até cinco anos (GOMES, 2009). Especificamente no

curso de Licenciatura em Música na UFRN há um componente curricular exclusivo para

ensino infantil e fundamental denominada Atividades Orientadas I - Metodologia do ensino

da música na educação infantil e fundamental (MUS5011), cuja ementa diz que é realizada

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“atividade de observação de metodologias de ensino de música utilizadas na Educação infantil

com subsequente desenvolvimento de atividades práticas a partir dessas observações”

(UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, 2011), ou seja, é uma

disciplina do tipo atividade que enfatiza a relação teoria-prática neste universo. Contudo,

ressalta-se que apenas os profissionais que ingressaram a partir do ano de 2005 tiveram acesso

a esse componente curricular.

2.2 O ensino de música na rede pública na cidade de Natal

As escolas públicas municipais da cidade de Natal investigadas para constituição do

universo de pesquisa foram agrupadas por zonas de distribuição, seguindo a organização da

lista disponível no endereço eletrônico da SME.

Buscou-se abranger a maior quantidade possível de escolas, sendo que, do total de

cada região foi investigado o seguinte número de escolas (GRAF. 4):

Gráfico 4: Total de escolas públicas versus escolas públicas pesquisadas.

Na Zona Norte, contatou-se 27 dentre 54 escolas da rede; na Zona Sul, 17 dentre 19

escolas; da Zona Leste, 9 dentre 17 instituições; da Zona Oeste, 24 dentre 46 estabelecimentos

de ensino. Assim, de um universo de 136 instituições, foram investigadas um total de 71

escolas da rede pública municipal de ensino, correspondente a 52,2%.

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Ainda assim, dentre a lista entregue pela SME de escolas e CMEIs que possuem um

professor de Artes atuando na Educação Infantil, foram investigadas todas as 28 escolas

mencionadas no documento. Investigar os demais 43 estabelecimentos – que totalizam 71

escolas - foi iniciativa própria em virtude da pequena representatividade do número de escolas

apresentado no documento pela Secretaria.

Dentre as escolas investigadas, foram identificados pelo menos 1 professor de música

atuante na educação infantil em cada região, sendo que na Zona Oeste há 2 educadores

musicais e um deles lecionava na educação infantil de 2 escolas distintas, totalizando 5

docentes na rede pública municipal (GRAF. 5).

Gráfico 5: Escolas públicas com ensino de música na educação infantil versus professores de música atuantes na educação infantil.

Totalizando 6 escolas públicas com ensino de música na educação infantil, tal

realidade corresponde à apenas 4,41% do total de escolas, ou 8,45% do total de escolas

pesquisadas.

Em virtude da organização e funcionamento do sistema público, ainda não foram

absorvidos os profissionais advindos das licenciaturas específicas, já que a primeira turma da

Licenciatura em Música da Universidade Federal do Rio Grande do Norte concluiu no ano de

2009, e o primeiro concurso com vagas destinadas à profissionais com habilitação específica

em Música realizado em 2010. Assim, a maioria dos profissionais que atuam no ensino de

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Artes da rede pública municipal de ensino são aqueles formados na Educação Artística, que

permite uma atuação polivalente da qual as licenciaturas específicas vêm findar.

Acredito que tal fato também esteja relacionado aos poucos profissionais da música

atuantes na educação infantil. Entretanto, recentemente (11 de fevereiro de 2011) foram

convocados 21 novos professores específicos de música para atuarem no município de Natal,

dentre os quais estão profissionais formados em Educação Artística habilitação Música e os

primeiros alunos egressos do curso Música Licenciatura.

Outros fatores que provavelmente estão relacionados é a falta de educadores, em geral,

e em Artes, o que levou a Secretaria Municipal de Educação a criar o cargo professor de

Múltiplas Linguagens, nome que surgiu diversas vezes durante os contatos com as

instituições. Tal profissional caracteriza-se por ser responsável pelas aulas de Artes, Educação

Física e recreação (como mencionaram alguns gestores). Em alguns casos é um pedagogo, um

fisioterapeuta ou um professor de Arte (formado e atuando com linguagem distinta da

música). Contudo, a tendência é que esses profissionais sejam substituídos por professores de

Arte ao longo do tempo, fazendo valer a Resolução 002/08 SME/PMN, que afirmar que, se

contemplado no Projeto Político Pedagógico da educação infantil, as aulas de Artes e

Educação Física deverão ser ministradas por professor específico.

Desse modo, no contexto do ensino de música na rede pública municipal da cidade de

Natal, percebe-se que existe pelo menos um educador musical atuando na educação infantil

em cada região, sendo esses professores formados em Educação Artística. É notável também a

falta de professores com formação em Arte na rede municipal de Natal, considerando a falta

desses profissionais na educação infantil – o que é previsto na legislação municipal – e a

criação do cargo “professor de Múltiplas Linguagens” – com formação diversificada – para

atender essa demanda.

3. Considerações Finais

A cidade de Natal vem traçando um delineamento de políticas, ações e demandas que

se identificam com o momento de ressignificação da música na escola a partir da Lei

11.769/08. A legislação que especifica professor específico de Artes atuando no ensino

regular da educação infantil, a oferta de licenciatura específica e a demanda verificada pelo

profissional no espaço infantil escolar, são alguns exemplos.

Foram percebidos diferentes configurações da presença do educador musical a partir

da rede de ensino que se encontra: pública municipal ou privada. Na rede pública municipal

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de ensino percebe-se uma participação mais tímida dos educadores musicais no ensino

infantil. Contudo, mostra-se representado por ao menos 1 docente em cada região da cidade,

que, em geral se apresenta em escolas que possuem o nível fundamental e infantil no mesmo

prédio, e no qual o educador leciona em ambos os níveis.

Verificou-se que o contexto do ensino de música na escola privada da cidade de Natal

apresenta-se com uma demanda para aulas de música na educação infantil nas instituições que

possuem esse nível de ensino. Portanto, pelo fato de ser um espaço que vem solicitando a

presença de um educador musical, faz-se necessário uma atenção a esse nível de ensino

durante a formação de professores, aspecto minimamente revelado na estrutura curricular do

Curso de Licenciatura em Música da UFRN.

Assim, percebe-se que o ensino de música na educação infantil na cidade de Natal é

uma realidade emergente, que parte das configurações atuais desse contexto e apresenta-se

como um campo diversificado a partir das dinâmicas de seus educadores, escolas e

legislações.

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Referências

BEYER, Esther. O formal e o informal na educação musical: o caso da educação infantil. In: IV Encontro Regional da ABEM-Sul e I Encontro do Laboratório de Ensino de Música. Anais... Santa Maria/RS, 23 a 25 mai 2001. FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira de. Considerações sobre a pesquisa em educação musical. In: FREIRE, Vanda. Horizontes da pesquisa em música. Rio de Janeiro: 7Letras, 2010. p. 155-175. GOMES, Carolina Chaves. Perspectivas para atuação do professor de música na Educação Infantil. In: II FÓRUM PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 2, 2009, João Pessoa. Anais...João Pessoa: UFPB, 2009. p. 35-41. PREFEITURA MUNICIPAL DE NATAL. SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. Referenciais Curriculares para Educação Infantil. Natal, RN: SME, 2008. Disponível em: <http://www.natal.rn.gov.br/sme/> Acesso em: 27 abr. 2009. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. SISTEMA INTEGRADO DE GESTÃO DE ATIVIDADES ACADÊMICAS. Dados Gerais do Componente Curricular: MUS5011-Atividades Orientadas I - Metodologia do ensino da música na educação infantil e fundamental. Disponível em: <http://www.sigaa.ufrn.br/sigaa/public/componentes/busca_componentes.jsf> Acesso em: 21 jan. 2011.

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A Resposta Emocional à Música

Kamile Santos Levek Universidade Federal da Bahia

[email protected]

Diana Santiago Universidade Federal da Bahia

[email protected]

Resumo: Alguns estudos procuraram demonstrar como a música provoca emoções nos seres humanos. Porém, este é um tema bastante espinhoso, pois é sabido que existem vários fatores além da própria música, que também podem ser determinantes para a resposta emocional à música. O presente estudo é uma revisão de literatura sobre o assunto, e tem por objetivo esclarecer alguns aspectos relacionados ao tema, como a definição de emoção, quais os elementos musicais que influenciam as respostas emocionais à música, e quais outros elementos também podem determinar essas respostas emocionais, como a memória do ouvinte e a cultura em que este está inserido.

Palavras chave: emoção, música, educação musical

Introdução

Os estudos relacionados às emoções são bastante complexos, já que a própria

definição de emoção ainda é muito vaga, e isso se deve a diversos fatores. Um deles é que as

emoções são difíceis de serem mensuradas (JUSLIN; SLOBODA, 2001) e, segundo Damásio

(2000), existem mais emoções do que palavras para defini-las. Quando tratamos de emoção

em música, o assunto se torna ainda mais dificultoso.

A maioria das pessoas conhece emoções como sinônimo de sentimentos, e alguns

estudiosos da psicologia, por vezes, tratam dessa maneira. Porém, segundo alguns

pesquisadores, existe uma certa diferença com relação às emoções e aos sentimentos.

Goleman sugere que "a emoção se refere a um sentimento e seus pensamentos distintos,

estados psicológicos e biológicos, juntamente com suas combinações, variações e matizes.”

(GOLEMAN, 1995, p. 303). Segundo Delgado (1971), o sentimento é algo que apenas o

sujeito pode notar, ou seja, é percebido apenas interiormente, e a emoção é expressa, na

maioria das vezes, por mudanças fisiológicas no corpo, podendo ser percebida pela expressão

externa do sujeito. Já Reeve aponta que os sentimentos são apenas uma parte da emoção, e

que as emoções podem ser sentimentos subjetivos, pois nos fazem sentir de determinado

modo, tal como zangados ou alegres (REEVE, 2006).

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De acordo com Damásio (1996), alguns sentimentos estão relacionados com as

emoções, mas muitos não estão. Segundo o pesquisador, "todas as emoções originam

sentimentos, se se estiver desperto e atento, mas nem todos os sentimentos provém de

emoções" (DAMÁSIO, 1996). Segundo Oatley e Jenkins (apud JUSLIN, 2001; ZENTNER,

2002), o termo emoção refere-se a reações mais breves e intensas, que levam a mudanças

relevantes no estado da pessoa. Em outras palavras, o termo será definido, para este estudo,

como reações breves (no estado emocional da pessoa) a determinado estímulo.

Emoção

Emoção Versus Razão

Antigamente a emoção era considerada algo irracional, oposto à razão. Porém, nos

dias de hoje, a emoção é entendida como um elemento determinante para o raciocínio

(DAMÁSIO, 2000; DELGADO, 1971; FILLIOZAT, 1998). Segundo Goleman (1995),

temos duas mentes, a que raciocina e a que sente. A mente racional é mais destacada na

consciência, mais atenta e capaz de ponderar e refletir. Já a mente emocional é considerada

como um sistema de conhecimento impulsivo e poderoso, embora às vezes ilógico. Contudo,

a mente emocional e a racional trabalham juntas, mas é a emocional que guia nossas decisões,

e quando se trata de moldar nossas decisões e ações a emoção é, por vezes, mais significativa

que a razão. Isso pode ser comprovado por acontecimentos em que uma ação ocorre devido a

uma determinada emoção, que surge antes mesmo de qualquer pensamento. Em outras

palavras, a reação à emoção provocada é muitas vezes imediata, portanto, é bastante provável

que o fator emocional seja predominante em algumas decisões racionais. Portanto, o

conhecimento sobre as emoções é fundamental para o ser humano. Segundo Goleman (1995),

ser emocionalmente alfabetizado é tão importante quanto a matemática e a leitura.

Inatas ou Aprendidas?

Existe também a possibilidade de algumas respostas emocionais à música serem

inatas, pois as crianças já nascem com capacidade de sentir emoções consideradas básicas

como alegria, tristeza e zanga (HARRIS, 1996). Em estudos mais recentes relacionados à

emoção em música, alguns pesquisadores consideram alegria, tristeza, raiva e medo como

emoções básicas (ver ESPOSITO; SERIO, 2007).

Alguns estudiosos ainda sugerem a possibilidade de as emoções serem aprendidas

(LEDOUX, 1998; SLOBODA, 1985) e de que o fator cultural altera as respostas emocionais

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(MEYER, 1956). Apesar disso, um determinado estímulo é capaz de provocar a mesma

resposta emocional em culturas diferentes quando as emoções primárias ou universais são

consideradas (DAMÁSIO, 2000). Porém, não se sabe ainda se essas asserções são válidas

quando consideramos a percepção de emoção em música.

Emoção em Música

Todas as culturas experienciam a música, em suas distintas funções, sendo esta um

comportamento universal e social bastante complexo (CROSS, 2001; TRAINOR, 2010), que

instiga muitos pesquisadores devido às suas respostas emocionais. Segundo Krumhansl

(2002), o efeito emocional provocado pela música é a principal motivação para ouvir música,

e o fato de a maioria das pessoas gostarem de música também pode ser explicado por esta

provocar emoções (JOHNSON-LAIRD; OATLEY, 1992).

Há indícios de que a percepção de emoção em música se inicie já nos primeiros dias

de vida (MILLIGAN et al., 2003; TRAINOR; AUSTIN; DESJARDINS, 2000; citados em

LEVEK; ILARI, 2005), talvez pela influência do canto e da fala direcionada aos bebês (ver

SLANEY; MCROBERTS, 2003; citado em SCHUBERT; MCPHERSON, 2006). Essa fala

tem como uma das características a afetividade para com a criança, podendo ser fundamental

para o desenvolvimento emocional. Contudo, estudos experimentais vêm confirmando que os

bebês, apesar de possuírem experiências relativamente limitadas com a música, exibem certas

capacidades perceptivo-musicais bastante semelhantes às dos adultos (ver ILARI, 2006;

NAWROT, 2003), inclusive no que diz respeito à percepção de emoção (TREHUB, 2001;

NAKATA, 2002; KASTNER; CROWDER, 1990, citado em NAWROT, 2003). Segundo

Izard et al. (1995; citado em SCHUBERT; MCPHERSON, 2006), aos 7 meses de idade, os

bebês são capazes de reconhecer as seguintes emoções: alegria, tristeza, raiva, prazer (joy),

surpresa e medo. Alguns pesquisadores consideram essas emoções básicas, já que são

possíveis de serem experenciadas pelas crianças de mesma idade, em todas as culturas (ver

MALATESTA et. al, 1989; CAMRAS, 1992 citados em SCHUBERT; MCPHERSON,

2006).

Em um estudo, pesquisadoras verificaram as respostas emocionais à música por

crianças de 6 anos de idade e compararam as respostas com adultos (ESPOSITO; SERIO,

2007). Os participantes ouviram 8 excertos musicais que representavam alegria, tristeza, raiva

e medo, com aproximadamente 20 segundos de duração cada. Os resultados do estudo

sugerem que não há diferenças significativas no reconhecimento de emoções em música por

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adultos e crianças. Isso demonstra que algumas respostas emocionais à música podem ser

inatas, porém sabe-se que muitas dessas respostas são aprendidas (Sloboda, 1985), incluindo-

se as convenções pré-estabelecidas pela psicologia da música (Meyer, 1956).

Outro estudo, realizado no Brasil (BUENO; MACEDO, 2004), procurou verificar a

percepção de emoção em música por 82 crianças de 5 a 9 anos de idade, com relação ao

reconhecimento das emoções alegria, tristeza, espanto, raiva e medo. Este reconhecimento foi

realizado através de carinhas expressivas onde as crianças deveriam associar as carinhas aos

estímulos musicais ouvidos. Diferente da maioria dos estudos relacionados à emoção em

música, onde os estímulos musicais são provenientes de músicas eruditas, este estudo utilizou

14 trechos de músicas populares, com enfoque principal no estilo musical. Os resultados

apontaram que as emoções alegria e tristeza foram mais facilmente associadas pelas crianças.

Segundo Swanwick (2003), quando uma música provoca emoção é porque essa tem

alguma relação com as experiências humanas já vividas, e que, por sua vez, se fundem com

novas experiências. Portanto, as respostas emocionais à música variam de pessoa para pessoa

dependendo de suas experiências passadas, que são múltiplas e pessoais. Entretanto, ouvintes

sem uma cultura musical geralmente concordam com o caráter emocional de uma

determinada peça musical mesmo sem tê-la ouvido antes (HEVNER, 1936 apud SLOBODA,

1985), o que contrasta com a idéia de que as respostas emocionais à música têm, como fator

decisivo, experiências já vividas pelo ouvinte (SWANWICK, 2003).

Contudo, não se pode esquecer-se de considerar a diferença de percepção entre as

pessoas. Por exemplo, se uma pessoa é consciente de altura e outra não, a que não é

consciente estará sujeita a perceber apenas o que ouve de acordo com seu estudo musical, ou

seja, suas respostas emocionais estarão de acordo com o que ouve. A pessoa que percebe

altura estará sujeita a respostas afetivas à altura, e a outra nem tanto. Imagens de altura,

memórias de altura, pensamentos relacionados à altura, emoções provocadas por altura, entre

outros, evocam fortes sentimentos de atração ou repulsão, de concordância ou discordância. O

mesmo acontece com andamento, intensidade e timbre (SEASHORE, 1967).

Há ainda aqueles que questionam a percepção de emoção por pessoas. Por exemplo,

Hindemith (1961) nega que a música provoca efeito emocional no ouvinte, devido à rapidez

com que a composição musical muda seu caráter emocional. Aponta que as pessoas não têm

capacidade de mudar o estado emocional tão rapidamente. Hanslick (1989) sugere que, na

música, não existe um conteúdo único cujo entendimento é compartilhado por todos os

ouvintes. Portanto, como linguagem “indeterminada” não consegue traduzir conceitos, então a

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conclusão de que ela pode expressar sentimentos determinados é psicologicamente irrefutável

(HANSLICK, 1989).

Convenções

De acordo com a psicologia da música, os elementos musicais mais importantes na

distinção entre feliz e triste são o tempo e o modo. As convenções pré-estabelecidas sugerem

que o andamento rápido pode representar felicidade, enquanto o andamento lento pode

representar tristeza. O mesmo acontece com a tonalidade: uma música em tonalidade maior

tende a ser percebida como feliz, enquanto uma música em tonalidade menor tende a ser

percebida como triste (DALLA BELLA et al, 2001). Algumas pessoas percebem uma relação

com os acordes também, onde os acordes menores soam “tristes” e os maiores “felizes”.

Segundo Wisnik (1989), as cores do modo maior e menor são, respectivamente, “luminosas”

ou “sombrias” e “alegres” ou “tristes”. Uma vez que essas associações se tornam habituais, a

presença do próprio estímulo musical irá provocar respostas emotivas convencionais

(MEYER, 1956). Isso pode ser observado com frequência em programas de televisão ou

filmes, sendo pouco freqüente a sonoplastia de uma cena triste conter uma música em

tonalidade maior e andamento rápido. Cabe citar que os estudos sobre essas convenções ainda

são recentes, e existe a possibilidade de a atribuição de emoções relacionadas à música

diferenciar-se substancialmente, dependendo do lugar, região e cultura (MEYER, 1956). Por

exemplo, um estudo realizado no Brasil (LEVEK; ILARI, 2005) demonstrou que as

convenções pré-estabelecidas pela psicologia da música não são concretas na idade dos 5 aos

7 anos, e que não há diferença significativa se comparadas as respostas de meninos e meninas.

Contudo, na faixa etária dos 8 aos 10 anos já há diferença significativa por gênero. No estudo

supracitado (LEVEK; ILARI, 2005), as meninas de 8 a 10 anos apresentaram um melhor

rendimento em relação aos meninos da mesma idade, de acordo com algumas convenções

pré-estabelecidas pela psicologia da música. Talvez haja, portanto, um aprendizado das

convenções com maior intensidade, nessa faixa etária, por parte das meninas, o que reflete o

modo de como as meninas e os meninos aprendem nesta idade. Vale ressaltar que a diferença

cultural pode ser um fator relevante em estudos como este, ou seja, talvez o resultado

encontrado nesse estudo não seja o mesmo de estudos similares realizados em outros países.

Todavia, dificilmente um elemento musical designa respostas emocionais quando

utilizado separadamente, mas são feitas associações e combinações onde um elemento reforça

o outro. A altura, por exemplo, não é suficiente para designar uma conotação emocional

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complexa: outros aspectos como andamento, dinâmica, tonalidade, caráter rítmico e textura

também são importantes. Se o compositor deseja escrever uma obra que possua um caráter

religioso, ele não irá apenas empregar o instrumento (timbre) apropriado, mas também irá

utilizar técnicas específicas de composição como modalidade, polifonia, e outras que tenham

a mesma conotação. É o conjunto de elementos combinados que causa determinada

“impressão” (MEYER, 1956). Essas conotações, porém, mudam com o decorrer do tempo.

Na música ocidental, por exemplo, a harpa já não é mais associada aos assuntos religiosos

como era na Idade Média (MEYER, 1956). Portanto, é provável haver um desenvolvimento

na percepção de emoção em música com o decorrer do tempo. Neste sentido, é de extrema

importância que novos estudos sobre a percepção de emoção em música sejam realizados,

sobretudo em populações de culturas e faixas etárias variadas.

Além dos elementos musicais já citados, há outros elementos que influenciam essa

distinção: o timbre do órgão, como exemplo, é associado muitas vezes à religião; a escala

pentatônica foi muito utilizada no século XIX para representar elementos pastorais; e alguns

intervalos também foram e continuam sendo usados para indicar certas idéias ou estados de

espírito (MEYER, 1956). Um exemplo é o trítono ser freqüentemente chamado de “intervalo

do diabo”. Ainda há a possibilidade de a música imitar sons de objetos ou eventos com

conotações emocionais (KRUMHANSL, 2002), o que implica em uma possível memória do

ouvinte, capaz de influenciar na resposta emocional à música. Segundo Swanwick (2003), é

possível que os padrões musicais também “estejam em movimento”, assim como nossos

pensamentos e sentimentos constantemente mudam. A habilidade da música em sugerir esse

movimento sem apontar para um evento determinado pode nos levar, erroneamente, a pensar

que a expressão musical é um tanto vaga e sem “conteúdo”.

Contudo, o uso de música na infância é universal tem seu início nos primeiros anos de

vida. As crianças utilizam a música para brincar, dançar, entre outras coisas e, com o decorrer

do tempo, a finalidade de ouvir música vai mudando. É provável que a percepção de emoção

em música também mude juntamente com as funções e a maneira de se ouvir música ao longo

da vida.

Fatores que Influenciam a Percepção de Emoção em Música

Levinson (1997) sugere a existência da "emoção estética" ("aesthetic emotion"), sendo

esta diferente das emoções cotidianas, especialmente provocada pela percepção de trabalhos

artísticos (LEVINSON, 1997). Portanto, as emoções provocadas pela música são diferentes, e

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as experiências e características do ouvinte são determinantes para as respostas emocionais à

música. Segundo Juslin & Sloboda (2001), a música é sempre ouvida em um contexto social,

em determinado momento e lugar, com ou sem outras pessoas presentes, e com ou sem outras

atividades acontecendo, tendo sua própria fonte de significado e emoção. As respostas

emocionais podem ser influenciadas ou até mesmo determinadas por esse contexto. Em outras

palavras, as respostas emocionais à música dependem das situações em que a música é ouvida

(JUSLIN; SLOBODA, 2001).

A tabela seguinte, com base nos estudos já citados, sugere alguns fatores

determinantes para as respostas emocionais à música:

Tabela 1: Fatores que influenciam a percepção de emoção em música

ALGUNS FATORES QUE INFLUENCIAM AS RESPOSTAS EMOCIONAIS À MÚSICA convenções pré-estabelecidas:

padrões estabelecidos para determinar certas

emoções, o que o compositor procurou expressar através da

música e padrões possivelmente aprendidos.

humor (estado de espírito):

junto com a

emoção provocada pela música ouvida,

provoca determinada

emoção.

memória:

as experiências vivenciadas

anteriormente pelo ouvinte podem ser relembradas por

músicas ou elementos musicais,

provocando determinada emoção.

gosto musical:

padrões já estabelecidos pelo ouvinte que o farão

gostar ou não de determinada música e,

consequentemente, sentir uma emoção

positiva ou negativa.

A partir da tabela, pode-se entender que esses fatores se interligam, e é a junção dos

mesmos que provocará determinada resposta emocional à música ouvida:

convenções + humor + memória + gosto + música ouvida =

emoção provocada pela música

Portanto, são muitos os elementos "extra-musicais" que influenciam a resposta

emocional à música, sendo necessária a realização de diversos estudos para verificar até que

ponto as experiências vividas e os conhecimentos adquiridos pelo ouvinte são fundamentais

para a resposta emocional à música. Além disso, é importante verificar também quais os

elementos musicais capazes de provocar emoções, e se existem aqueles que são comuns para

diversas culturas.

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Educação Infantil e Música: o que dizem as pesquisas?

Mônica Luchese Marques Universidade de Brasília

[email protected]

Maria Cristina de Carvalho Cascelli de Azevedo Universidade de Brasília

[email protected]

Resumo: Como tema recorrente em estudos da Educação e da Educação Musical, a relação entre a Música e a Educação Infantil está presente em diversas pesquisas dessas áreas. Como recorte da revisão de literatura da pesquisa de mestrado em andamento fez-se um levantamento no banco de teses e dissertação da CAPES com o intuito de verificar o que as pesquisas sobre a temática estudada estão trazendo em seus resultados. Com isso esta comunicação tem os seguintes objetivos: 1) verificar o que dizem os resultados das pesquisas brasileiras sobre a relação Música e Educação Infantil; e 2) Identificar o que esses resultados trazem em comum e divergem. Com o mapeamento realizado, em um total de 40 teses/ dissertações, podemos perceber a predominância de trabalhos que relatam a prática musical de professores generalistas e especialistas. As principais necessidades apontadas por esses trabalhos foram: a presença do profissional especializado em Música na Educação Infantil e a formação continuada e musical de professores generalistas.

Palavras chave: Estado da arte, música e educação infantil, pesquisas

Introdução

A relação Música e Criança é tema recorrente em estudos da Educação e da Educação

Musical considerando-se diferentes abordagens teóricas e metodológicas de pesquisa. Em

levantamento1 realizado para pesquisa de mestrado em andamento, cujo objetivo é

compreender a ação pedagógica de professor(a) de música em escola regular de Educação

Infantil, foi possível constatar um total de 40 teses e dissertações que envolvem o tema

Música e Educação Infantil e a sua relação com o desenvolvimento musical. Entre as

temáticas encontradas percebemos uma predominância em trabalhos que focam a prática

docente (40%). Nestes, o professor é a principal fonte de informação e de dados. Outros

trabalhos discutem o desenvolvimento musical infantil (15%), o repertório musical (15%), o

papel da Música na Educação Infantil (15%), a formação de professores (7,5%), a importância

da Música na Educação Infantil (5%) e os materiais didáticos (2,5%). A partir dessas

temáticas buscou-se aprofundar quais são as principais questões e debates nessa área, como

1 Esse levantamento buscou caracterizar as pesquisas que envolvem a Música e a Educação Infantil de acordo com as universidades e áreas aonde foram realizadas, sua abordagem metodológica e suas temáticas. O artigo foi publicado nos anais do X Encontro Regional Nordeste da ABEM.

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elas estão sendo investigadas e que resultados estão sendo divulgados. Dando origem assim

aos seguintes questionamentos: o que dizem os resultados das pesquisas brasileiras sobre a

relação Música e Educação Infantil? O que os resultados trazem em comum e como eles

divergem? Até que ponto esses resultados contribuem com a ação pedagógico-musical de

professores de Educação Infantil? Até que ponto esses resultados definem uma prática

pedagógico musical na educação Infantil?

Para responder as seguintes questões foi realizado um mapeamento de cunho

bibliográfico enfatizando o que essas pesquisas destacam e privilegiam dentro desse conjunto

de investigações que permeiam o universo infantil em que se encontra a pesquisa de mestrado

em andamento. Esse tipo de estudo caracteriza um levantamento denominado “Estado da

arte”. Segundo Ferreira (2002),

Nos últimos quinze anos tem se produzido um conjunto significativo de pesquisas conhecidas pela denominação “estado da arte” ou “estado do conhecimento”. Definidas como de caráter bibliográfico, elas parecem trazer em comum o desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários. Também são reconhecidas por realizarem uma metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e científica sobre o tema que busca investigar, à luz de categorias e facetas que se caracterizam enquanto tais em cada trabalho e no conjunto deles, sob os quais o fenômeno passa a ser analisado (FERREIRA, 2002, p. 258).

Para realizar esse “mapeamento” das pesquisas que envolvem Música e Educação

Infantil, adotou-se como referência a base de dados de Teses e Dissertações da CAPES2, fonte

legítima de pesquisas realizadas no âmbito nacional. A metodologia utilizada para busca

seguiu os seguintes passos: 1) digitação das palavras-chaves: Educação Musical e Educação

Infantil e Música, com a seleção do tópico “todas as palavras”; 2) seleção da opção de

“expressão exata” com os termos: Educação Musical e Educação Infantil, Música e Educação

Infantil, Música na Educação Infantil, Educação Infantil e Música e Educação Musical

Infantil. Todos os termos foram digitados na categoria “assunto”. Optou-se assim, partir de

um assunto mais amplo e com a análise quantitativa dos resultados obtidos seguir realizando

um recorte mais específico por meio do tópico “expressão exata”. Dos resultados encontrados,

um total de 86 teses/dissertações, foi realizado um recorte para a análise, e somente as

2 Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

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investigações que abordam a Música e a Educação Infantil foram levantadas sendo

desconsiderados, para este mapeamento, os trabalhos que tinham apenas uma dessas áreas

como eixo de pesquisa. Assim, após esse recorte tivemos um total de 40 teses/dissertações

para a análise sendo dessas 6 teses de doutorado e 34 dissertações de mestrado.

A Música e a Educação Infantil

A Música é muito presente nas instituições infantis e essa presença é descrita pelo

Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil (RCNEI) com diversas finalidades:

disciplinares; para desenvolver atitudes e valores; comemorar datas e festividades do

calendário escolar; memorizar conteúdos e executar instrumentos de “bandinhas”

reproduzindo e imitando padrões sonoros e rítmicos (BRASIL, 1998, p.46). Ou seja, a Música

está presente em vários momentos da rotina das crianças visando diferentes objetivos, porém

como afirma o mesmo documento, a presença da Música nessas instituições não pode ser

restrita a apenas essas práticas, ela deve ser contemplada como uma linguagem e deve ser

vivenciada pela produção, apreciação e reflexão (BRASIL, 1998, p. 43).

A forma como a Música vem sendo abordada e a sua função nas instituições infantis

são apontadas pelas pesquisas levantadas, assim como o RCNEI, de acordo com suas diversas

finalidades na escola associada a rotina com ênfase: no controle disciplinar, no lúdico, no

entretenimento e em objetivos pedagógicos. A presença e importância da Música nessas

instituições de ensino são relatadas a partir da prática de professores, da fala de coordenadores

e da análise de repertório musical e do papel da Música. Os estudos destacam a ausência de

objetivos musicais na rotina das crianças, o que é explicado pela falta de um profissional

especializado e pela insegurança das professoras unidocentes em trabalhar com conteúdos

musicais. Assim, as pesquisas enfatizam a importância desse profissional na Educação

Infantil e a necessidade de uma formação básica em Música e formação continuada para os

professores generalistas.

A prática docente nessa faixa etária é pesquisada por Tiago (2007), Piva (2008), Soler

(2008), Toledo (2004), Oliveira (2007), Stavracas (2008), Diniz (2005), Loureiro (2009),

Tozetto (2003), Abrahão (2006), Cunha (2006), Vieira (2004), Paiva (2009), Sugahara

(2008), Darezzo (2004), Beaumont (2003), Mosca (2009), Wrobel (1999), Siqueira (2000),

Moraes (2009), Pires (2006), Bonna (2006), Martins (2003), Guimarães (2003), Brook (2009)

e Carvalho (2005).

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Com relação às práticas de professoras, alguns trabalhos abordam os professores

unidocentes e têm como foco a formação continuada e a necessidade de conhecimentos

básicos musicais em sua formação. Dentre eles, as pesquisas de Pacheco (2005), Makino

(2003), Krobot (2006) e Aquino (2007) relatam experiências de pesquisa-ação e de análise de

currículo de cursos superiores de pedagogia. Fernandes (2009) e Luly (2000) apontam para a

formação continuada de professores de música

O repertório musical que está presente na Educação Infantil é focado e analisado por

Bessa (2007), Souza (2007) e Furlanetto (2006).

Todas essas pesquisas enfatizam a importância da Música para o desenvolvimento

infantil e por isso a necessidade da presença dessa na escola, os trabalhos que retratam o

desenvolvimento infantil também enfatizam essa importância, dos estudos listados temos:

Soares (2007), Pacheco (2009), Jordão (1997), Stifft (2008) e Fonseca (2009).

Resultados: Análise e Descrição das pesquisas

Pela análise da prática docente de professores generalistas e especialistas em Música

as pesquisas retratam a rotina musical das crianças na Educação Infantil. Diniz (2005) e Soler

(2008) realizaram um survey para investigar como a Música é inserida e utilizada nas práticas

pedagógicas de professoras da Educação Infantil. A primeira realizou seu estudo na rede

municipal de Porto Alegre (RS) e a segunda na rede municipal e em escolas privadas da

cidade de Indaiatuba (SP). As autoras afirmam que a música é muito presente nas práticas

pedagógicas das professoras unidocentes e que ela é utilizada de diversas formas de acordo

com os contextos e a formação dessas professoras. As respondentes afirmam não se sentirem

seguras para trabalhar com conteúdos musicais e destacam a necessidade e a importância do

profissional específico de Música na escola. A análise das práticas musicais confirma a

presença da música para desenvolver atitudes e valores, comemorar datas e festividades;

memorizar conteúdos e executar instrumentos de “bandinhas”, como é apontado pelo RCNEI.

Em sua pesquisa, Soler (2008) investiga ainda o professor de Música e os professores

generalistas de escolas particulares, esses dois grupos afirmaram a importância da presença de

profissionais especializados em Música nessas instituições. Esses resultados revelam que os

professores unidocentes não abordam conteúdos específicos de música porque não têm

formação qualificada. Assim, podemos afirmar que a presença de um professor de música na

Educação Infantil é fundamental sob os seguintes aspectos: o desenvolvimento de habilidades

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e conhecimento musical, a atuação colaborativa entre os professores especialistas e

unidocentes e a formação continuada de professores generalistas.

Essa função da Música, para desenvolver atividades sem objetivos musicais, nas

instituições infantis também foi relatada nos resultados encontrados por Oliveira (2007),

Stavracas (2008) e Loureiro (2009). As duas últimas autoras realizaram suas pesquisas com

professores da cidade de São Paulo (SP) e investigaram como a música está sendo utilizada na

Educação Infantil. Sob essa mesma perspectiva, porém com sujeitos de pesquisa diferente,

Oliveira (2007) coletou seus dados por meio de entrevistas com a Supervisora Estadual da

Superintendência Regional de Ensino e com a coordenadora da área de Artes do Município de

Uberlândia (MG). A autora afirma que a situação do ensino de Música na Educação Infantil e

no Ensino Fundamental ainda não contempla as orientações oficiais, e enfatiza a utilização da

música para diversos fins não musicais, visto que essa é ministrada por professores

unidocentes e que não existe a disciplina Música como integrante do currículo escolar. Essas

investigações nos mostram que o papel restrito da Música na Educação Infantil está ligado

não somente a prática educativa do professor, mas também a necessidade de políticas públicas

educacionais voltadas a inserção da Música nessa modalidade de ensino.

A análise das práticas musicais de professores também foi investigada com o intuito

de verificar a presença, consciente ou inconsciente, de princípios construtivistas (WROBEL,

1999). A análise da utilização do construtivismo na ação pedagógica dessas professoras foi

realizada por meio de entrevistas e questionários. Siqueira (2000), nessa mesma abordagem

teórica, investigou esses princípios nas canções utilizadas nas escolas de Educação Infantil e

de Ensino Fundamental. Seus resultados apontam que a canção é composta por importantes

elementos musicais (instrumentação e arranjo) e extra musicais (contextualização histórica da

letra e de compositores) que a caracterizam como uma rica fonte de conhecimentos musicais

essenciais para a formação básica e cultural da criança. Esses conhecimentos são

experienciados e adquiridos em um processo construtivo de ensino e aprendizagem. Apesar

de Siqueira (2000) investigar as canções da rotina infantil e destacar suas possibilidades

pedagógicas para o ensino e aprendizagem da música na Educação Infantil, o processo de

construção do conhecimento depende da ação pedagógica do(a) professor(a).

A prática relacionada com os saberes docentes foi pesquisada por Tiago (2007) e

Beaumont (2003), com o foco também nos relatos de professores. Tiago (2007) realizou sua

pesquisa com três professoras generalistas que atuam na Educação Infantil em uma escola

municipal de Uberlândia (MG), por meio de entrevistas e observação participante seus

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resultados mostram que as professoras trabalham muito com a música e que esta é muito

importante para suas práticas, porém as atividades musicais se restringem ao cantar. Por isso a

autora afirma a necessidade de formação continuada a essas professoras e enfatiza a

necessidade de profissionais especializados em Música, recursos materiais e estrutura

adequada para as atividades com Música na Educação Infantil. Beaumont (2003) buscou

compreender a inter-relação entre os saberes e as práticas por meio de cinco entrevistas, três

com professoras da Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental e duas com

professoras de musicalização. Por meio dessa inter-relação ela aponta a expectativa de

professoras unidocentes e especialistas para trabalharem com a Música de modo integrado às

demais disciplinas escolares. Seus resultados apontam para a necessidade de uma formação

musical reflexiva inserida no contexto atual e no curso de formação das professoras

generalistas. Para a pesquisadora é importante que esses cursos conheçam, ampliem e

aprofundem tanto os saberes que esses profissionais possuem, quanto as práticas que

desempenham com a Música. A relação entre os saberes e as práticas musicais dos

professores generalistas pesquisados nos mostra que a formação desses docentes não esta

contemplando a Música como um fim de suas ações educativas, não a contempla de forma

reflexiva dentro de seu corpo de conhecimentos necessário para sua atuação docente.

A importância da formação de professores dentro desse cenário atual e real da

Educação Infantil também é abordada por Aquino (2007) que buscou investigar a Música na

formação inicial do pedagogo dos cursos localizados no Centro-Oeste. Diante do quadro

encontrado pela autora, com poucas instituições de nível superior que possuem disciplinas

ligadas a Artes e Música, ela afirma que os pedagogos da região Centro-Oeste não são

formados, ou seja, preparados para lidar com a Música na escola regular. Essa necessidade de

formação musical para o aluno de pedagogia também é enfatizada por Krobot (2006) que

pesquisou a inclusão da modalidade Música no curso de pedagogia em Jaraguá do Sul (SC).

Por meio das práticas de professores e de observação da rotina escolar alguns

trabalhos focaram o repertório musical que permeia as crianças em seu ambiente de

aprendizagem, como as investigações de Bessa (2007), Souza (2007) e Furlanetto (2006).

Bessa (2007) pesquisou o uso das músicas “politicamente corretas” nas instituições infantis, a

partir dessas observações a autora relata a presença da memória afetiva nas práticas docentes.

Souza (2007) e Furlanetto (2006) pesquisaram a canção infantil. O primeiro realizou sua

pesquisa na cidade de São Paulo e investigou a canção infantil urbana: sua história, sua

estrutura, meios de produção e divulgação e sua utilização prática em sala de aula. A segunda

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pesquisadora buscou as concepções de infância presentes no processo histórico da Educação

Infantil, e como elas se articulam às canções ensinadas nessa tipologia de ensino. Como

resultados vemos a utilização de canções como meio de manifestação do conceito de infância

presentes nas políticas educacionais brasileiras correspondente a um determinado período

histórico social. A utilização de canções sem a reflexão do docente sobre seus elementos

musicais e não musicais em sua ação educativa pode gerar equívocos ou a não exploração do

conteúdo em sua atuação. A ação educativa é caracterizada por Sacristán (1999) como sendo

pessoal e social, ou seja, ela traz consigo as crenças e individualidades do professor como um

ser único que compartilha, colabora e é influenciado por toda a cultura educativa e social em

que está inserido.

Soares (2007) investigou os movimentos de bebês, de quatro a vinte e quatro meses de

idade, em uma creche pública em Goiânia (GO). Analisando seus movimentos, a partir dos

critérios de Wallon, pode-se perceber como os bebês se movimentam e se expressam por

meio da Música, os benefícios trazidos pelas atividades realizadas e identificar as

possibilidades e os limites para o trabalho de musicalização para bebês. Em seus resultados a

autora também enfatiza a importância da qualificação profissional como um dos fatores mais

importantes para a promoção de padrões de qualidade de ensino. Sobre a prática de

musicalização para bebês Stifft (2008) analisou a influência das relações interpessoais no

desenvolvimento musical de bebês, sua investigação foi realizada nas aulas de musicalização

do projeto de Extensão do Departamento de Música da Universidade Federal do Rio Grande

do Sul (UFRGS).

Ainda sobre o desenvolvimento musical infantil, Pacheco (2009) realizou um estudo

correlacional que buscou investigar as relações entre as habilidades musicais e a consciência

fonológica em crianças de quatro e cinco anos de idade. Seu estudo buscou replicar

parcialmente o estudo de Anvari et al. (2002) com crianças brasileiras. Em seus resultados a

autora traz a correlação entre as habilidades musicais e a consciência fonológica, com isso

pode-se sugerir o compartilhamento de mecanismos auditivos e/ou cognitivos entre a Música

e a linguagem. Fonseca (2009) estudou o canto espontâneo de crianças entre dois e seis anos

de idade com o intuito de analisar os conteúdos musicais presentes neles como: ritmo,

direcionamento, forma, estruturação melódica, caráter expressivo, contrastes, texto e

influências culturais específicas. A partir desses elementos a pesquisadora investigou a

construção da percepção do tempo dessas crianças. Como resultados a autora aponta que o

tempo é a característica do canto espontâneo mais influenciado pela idade da criança e coloca,

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de acordo com as características do canto espontâneo, que esse, assim como a Música, pode

ser considerado um instrumento metodológico importante para investigações acerca do

desenvolvimento da criança. Essas pesquisas sobre o desenvolvimento musical infantil nos

ajudam a compreender como esse é construído a partir de diferentes abordagens teóricas e

experiências de campo. A importância da Música no desenvolvimento infantil, apresentado

nessas investigações, enfatizam a necessidade do ensino de qualidade dessa nas instituições

de ensino infantil.

Conclusão

A partir da análise das pesquisas levantadas com a temática Educação Infantil e

Música podemos verificar como esses assuntos estão sendo abordados nas diversas

investigações. Desse modo, nos permite avaliar a contribuição da pesquisa de mestrado em

andamento para os estudos na área de Educação Musical e discutir o que as investigações

realizadas acrescentam a pesquisa.

A forma como a Música é inserida na Educação Infantil, em diversas cidades e estados

do Brasil, pode ser percebida pela descrição e análise de práticas docentes, do repertório

musical, do papel e importância dessa nessas instituições de ensino. Como resultados

recorrentes dessas pesquisas temos a necessidade de formação musical aos professores

generalistas e a presença do professor especialista na Educação Infantil. A troca de

conhecimentos e experiências entre esses profissionais pode consolidar a prática musical de

qualidade nessas escolas, pois a socialização da ação docente permitirá práticas e vivências

musicais explicitadas nos documentos legais. Porém, essa realidade ainda está distante do

contexto atual, visto que são poucas as políticas públicas que contemplam o professor

especialista na Educação Infantil. Assim, com a obrigatoriedade do ensino de Música na

Educação Básica, temos que cuidar o como a Música esta sendo inserida nessas escolas,

buscando sua inserção com qualidade, surgindo assim os seguintes questionamentos: Quem

deve ministrar a aula de Música na Educação Infantil? Qual será sua formação? Qual é a

função do profissional especialista nessas escolas? Quais são os saberes e habilidades

necessários a esses professores de Música para atuarem em instituições infantis?

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Referências

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A Música e o Jogo na Educação Infantil

Elizabeth Carrascosa Martínez UNICAMP

[email protected]

Beatriz Senoi Ilari University of Southern California

Resumo: Este artigo descreve uma experiência interdisciplinar realizada em uma escola pública na Espanha durante o ano letivo de 2008-2009. O projeto chamado "Brincando fazemos amigos: brincadeiras de 5 continentes” permitiu trabalhar o multiculturalismo, desenvolver valores e promover a convivência entre os alunos da escola. Usando os jogos não-competitivos em sala de aula, nos quais os alunos devem trabalhar juntos para alcançar um objetivo, estamos incentivando a coesão do grupo e ajudando a criar laços afetivos entre os alunos. Este projeto teve como objetivo implementar os princípios estabelecidos pela nova lei de educação, usando o jogo como ferramenta metodológica no ensino de música na escola regular.

Palavras chave: A música no sistema educativo espanhol, o jogo na musicalização infantil, projetos interculturais

Introdução

Neste artigo descrevemos o projeto intercultural “Brincando fazemos amigos: jogos de

5 continentes”, que foi realizado no Centro de Educação Infantil e Ensino Fundamental Nove

de Outubro de Alcàsser, escola localizada em Valência (Espanha) durante o ano escolar 2008-

2009.

Primeiramente, examinaremos brevemente a situação da música no sistema educativo

espanhol, com ênfase na etapa da educação infantil. Em seguida, discutiremos a importância

da brincadeira para o desenvolvimento integral das crianças e suas implicações para a

educação musical. Por fim, descreveremos os detalhes da experiência e suas contribuições.

A Música no Sistema Educativo Espanhol

A música foi introduzida como disciplina obrigatória nas escolas espanholas, graças à

Lei Orgânica 1/1990 de 3 de outubro, de Ordenação Geral do Sistema de Educação (LOGSE),

que estabeleceu a escolaridade obrigatória em um período de 10 anos. Como resultado desta

lei, a educação musical passou a ser obrigatória nos níveis de ensino fundamental (6-12 anos)

e médio (12 a 16 anos).

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A LOGSE substituiu a antiga lei de 1970, comumente chamada de lei Villar Palasí,

que estabelecia o ensino básico (EGB) até os 14 anos de idade e não considerava a música

como disciplina obrigatória. Nessa lei (Lei 14/1970, de 4 de agosto da Educação Geral) a

música era introduzida nas atividades escolares à mercê da vontade, disposição e capacidade

dos professores. Na grande maioria das escolas, a presença da música era praticamente

inexistente, e nas poucas em que estava presente, esta se reduzia à aulas extracurriculares de

flauta doce, violão ou canto coral.

A partir da LOGSE, se abriram novas perspectivas para a educação musical na

Espanha. A obrigatoriedade da música nas escolas permitiu que se criassem nas universidades

espanholas as titulações específicas de educação musical, visando atender às exigências da lei

no artigo 16:

O ensino fundamental será ministrado por professores, que terão competências em todas as áreas deste nível. O ensino da música, da educação física, das línguas estrangeiras ou de outras matérias que se determinem, será ministrado por professores com a especialização em questão (ESPANHA, 1990).

Seguindo essa nova demanda uma infinidade de vagas para professores de educação

musical nas escolas e colégios em todo o estado espanhol foram abertas. Com a chegada dos

novos especialistas o cenário da educação musical começou a mudar na Espanha.

A situação específica da música em Valência

A Comunidad Valenciana, uma das dezessete regiões espanholas, está localizada na

região do Mediterrâneo e tem pouco mais de 5 milhões de habitantes. Esta região da Espanha

tem duas línguas oficiais: valenciano e castelhano (espanhol), ambos integrados no sistema

educativo.

A situação da música nesta pequena região da Espanha é notável. A música tem um

papel particularmente importante na cultura e na sociedade, como parte de celebrações, e

manifestações culturais tradicionais. A região de Valência tem mais de 500 sociedades

musicais e escolas de música federadas, mais de 100 coros que incluem mais de 3.000

membros do coro, 33 Conservatórios Profissionais de música e 3 Conservatórios Superiores

de Música. De acordo com a Associação de Professores de Música (AULODIA) "Valência

tem mais de 200.000 músicos com titulação superior (de nível profissional), incluindo mais de

1.000 que trabalham na principais orquestras espanholas e estrangeiras."

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Devido a essas circunstâncias, o Departamento de Educação estabeleceu o

fornecimento de materiais didáticos e equipamentos específicos1 para todas as escolas

públicas, a fim de garantir uma educação musical de qualidade. O Departamento também

criou cargos de especialista nos centros de formação de professores2, a fim de organizar e

ministrar cursos de educação musical, contribuindo deste jeito para a formação dos

professores de música.

Devido à mudança de governo em 2000, em 2002 foi aprovada a LOCE, Lei Orgânica

10/2002 de 23 de dezembro de 2002, de Qualidade da Educação. As consequências da

aplicação desta lei não foram muito favoráveis para a educação musical, posto que o número

de horas dedicadas ao ensino de música no nível fundamental e médio foi reduzido.

A mais recente reforma educacional teve lugar em 2006, na sequência de outra

mudança de governo em 2004, que introduziu a Lei Orgânica de Educação, LOE (Lei 2 /

2006, 03 de maio). Esta lei, que define os objetivos, conteúdos e critérios de avaliação para as

diferentes áreas em todas as etapas da educação, se baseia em três princípios fundamentais: 1.

proporcionar educação de qualidade a todos os cidadãos em todos os níveis da educação; 2.

promover a colaboração entre todos os membros da comunidade educativa; e 3. Seguir as

metas para o século 21 estabelecidas pela União Europeia (ESPANHA, 2006a).

Após a aprovação desta legislação foi adotado na Espanha a aprendizagem por

competências. De acordo com Philippe Perrenoud, sociólogo da Universidade de Genebra, a

competência é "a capacidade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos

(conhecimentos conceituais, procedimentais e atitudinais) para lidar com pertinência e

eficácia em diferentes situações problemáticas” (GENTILE e BENCINI, 2000, p. 19).

Os decretos que se desenvolvem na LOE no ensino fundamental (RD 1513/2006) e

médio (RD 1631/2006) estabelecem, no Anexo 1, as oito principais competências:

competência em comunicação linguística, a competência matemática, competência do conhecimento e interação com o mundo físico, processamento de informação e competência digital, competência social e cívica, a competência cultural e artística, competência para aprender a aprender e autonomia e iniciativa pessoal (ESPANHA, 2006b, p. 43).

1Na maioria das escolas e colégios da região de Valência, a música é ministrada em uma sala específica equipada com instrumentos Orff, instrumentos de pequena percussão, teclado ou sintetizador, aparelho de som, livros, Cds e em alguns casos computador, televisão e vídeo. 2Centros de formação, inovação e recursos educacionais (CEFIRES) dependente do Serviço de Formação de Professores de Valência.

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A música se encontra principalmente no contexto da competência artística e cultural.

A Música na Educação Infantil

A educação infantil na Espanha é uma etapa não obrigatória que compreende a faixa

etária dos 0 aos 6 anos de idade. Esta etapa está dividida em dois ciclos: de 0 a 3 anos, e de 3

a 6 anos, sendo o segundo de ensino gratuito.

De acordo com a LOE, “a educação infantil, tem como objetivo primordial contribuir

para o desenvolvimento físico, emocional, social e intelectual das crianças, em estreita

cooperação com as famílias" (ESPANHA, 2006a, artigo 12). Para isso a LOE estabelece que

as crianças devem desenvolver 6 habilidades básicas dentre as quais duas estão

especificamente relacionadas com a educação musical: desenvolver habilidades de

comunicação em diferentes linguagens e formas de expressão, e iniciação ao movimento, no

gesto e no ritmo (ESPANHA, 2006c, p. 17167).

Para o desenvolvimento das capacidades mencionadas acima, os conteúdos do ensino

fundamental estão organizados em três áreas: autoconhecimento e autonomia pessoal,

conhecimento do ambiente e das linguagens, comunicação e representação. Todas elas devem

ser abordadas de maneira globalizada (ESPANHA, 2006d, p.475). Cada área é dividida em

vários blocos de conteúdo, apresentados na Tabela 1:

Tabela 1: Blocos de conteúdos

Conhecimento de si mesmo e autonomia

pessoal

Conhecimento do meio Linguagens: comunicação e representação

O corpo e a própria imagem

Meio físico: elementos, relações e medida

Linguagem verbal

Jogo e movimento Aproximação à natureza Linguagem audiovisual e tecnologias da informação e

da comunicação A atividade e a vida

cotidiana Cultura e vida em

sociedade Linguagem artística

O cuidado pessoal e a saúde

Linguagem corporal

A educação musical está incluída no contexto da área de linguagens (mais

especificamente no bloco de conteúdo da linguagem artística e linguagem corporal), com base

em uma abordagem que integra música e movimento, conforme sugerido por Orff e Keetman

(GOODKIN, 2002).Sendo assim, as atividades de musicalização infantil sugeridas no RD

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1630/2006 incluem: cantar, tocar, manipular e experimentar com instrumentos e objetos

sonoros, criar, brincar com sons, ouvir, dançar, entre outros (ESPANHA, 2006d).

A LOE (2006a) estabelece também como devem ser tratados os conteúdos e as

atividades na educação infantil: "Os métodos de trabalho se basearão em experiências,

atividades e jogos e serão aplicados em uma atmosfera de afeto e confiança, para melhorar a

autoestima e a integração social" (p. 17167). Destaca-se nesse texto a importância de

atividades práticas e lúdicas para garantir a aprendizagem significativa. Mais adiante

aprofundaremos a discussão sobre o valor educativo do jogo como ferramenta metodológica

na educação.

O Jogo no Desenvolvimento Integral do Indivíduo

O homem só joga quando é plenamente homem e é plenamente homem quando joga Friedrich Schiller

Segundo Huizinga (1971) o jogo é uma atividade de grande importância para o

desenvolvimento da civilização. Trata-se de uma necessidade "antropológica e cultural"

(BUSQUÉ; PUJOL, 1996, p. 12). Da pré-história às grandes civilizações da antiguidade e aos

dias de hoje, os seres humanos têm utilizado atividades lúdicas para diversos fins. Jogamos

para nos divertir, relaxar, passar o tempo, para descobrir nossos próprios limites, para

desenvolver habilidades específicas ou para nos relacionarmos com os outros.

Jogar não depende de idade, e o jogo está presente durante a infância, adolescência,

idade adulta e velhice. “No homem, o jogo aparece desde muito cedo, a partir das primeiras

etapas do período sensório-motor. [...] Depois, experimenta uma longa evolução que vai

cedendo lugar a diferentes tipos de jogos e que se prolonga até a idade adulta” (DELVAL,

1998, p. 90). Porém, seu papel é especialmente importante durante a infância e assim é

considerado em 1977 pela Associação Internacional pelo Direito de Brincar da Criança (IPA)

e desde 1989, pela Convenção sobre os Direitos da Criança, assinada pela Assembleia Geral

das Nações Unidas, conforme o artigo 313:

1. Os Estados Membros reconhecem o direito das crianças a repouso e lazer, a brincar e a realizar atividades recreativas adequadas a sua idade e assim como o direito de participar livremente na vida cultural e as artes.

3� IPA- Espanha, Associação Internacional pelo direito das crianças a brincar http://www.marinva.es/; Nações Unidas- Direitos Humanos http://www.ohchr.org/

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2. Os Estados Partes respeitarão e promoverão o direito da criança a participar plenamente na vida cultural e artística e encorajarão oportunidades apropriadas, em condições de equidade, de participar de atividades culturais, artísticas, recreativas e de lazer.

Como apontado por Louro (2006, p. 105), "filósofos como Platão, Aristóteles e,

posteriormente, Quintiliano, Montaigne e Rousseau, destacaram o papel do jogo na

educação". Grandes autoridades da psicologia do desenvolvimento, tais como Piaget,

Vygotsky e Bruner salientam a importância do brincar no desenvolvimento do indivíduo”.

Vygotsky (2001) afirma que o jogo contribui para o desenvolvimento mental, emocional e

sociocultural, ou seja, o desenvolvimento integral do indivíduo.

Na educação infantil, foi Froebel (1989) quem estabeleceu o jogo como ferramenta

pedagógica. Para as crianças é muito motivador aprender através de jogos. Segundo Louro

(idem, p. 106) "o jogo em si possui componentes do cotidiano e o envolvimento desperta o

interesse do aprendiz, que se torna um sujeito ativo do processo".

O Jogo na Educação Musical

Para a área de educação musical, o jogo desempenha um papel fundamental. Os

principais educadores do século 20, concordam com a necessidade de utilizarmos o jogo

como ferramenta didática na educação musical. Podemos, inclusive, encontrar muitas

referências a este respeito nos trabalhos de Dalcroze (apud BACHMANN, 1998), Orff-

Keetman (apud GOODKIN, 2002), e Willems (2002), entre outros.

O jogo é um ato espontâneo e voluntário. As crianças estão dispostas a jogar pelo

simples prazer, o que torna o jogo um recurso ideal para levar música para os estudantes.

Jogos com música permitem desenvolver determinados competências musicais ao mesmo

tempo em que proporcionam uma experiência real e contextualizada da música.

Em muitas culturas, há uma grande variedade de jogos que usam a música como

elemento essencial. Podemos classificar os jogos musicais de diferentes maneiras. Busqué e

Pujol (1996), os classificam como: jogos com deslocação, sem deslocação, jogos dançados, e

jogos com objetos. Delalande (1984 apud BRITO, 2003, p. 31) "relaciona as formas de

atividades lúdica propostas por Piaget à três dimensões presentes na música: jogo sensório-

motor, jogo simbólico e jogo com regras.” Ao agruparmos os jogos com base em seu

elemento musical mais significativo, podemos encontrar:

1. Jogos vocais: ecos, provérbios, rimas, adivinhações, jingles, trava-línguas e

brincadeiras de escolhas que desenvolvem a capacidade respiratória, a emissão, a articulação,

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a impostação, a ampliação da tessitura, que permitem o trabalhar elementos melódicos

específicos, desenvolver audição interior, construir vocabulário, reforçar a aprendizagem de

idiomas, facilitar a compreensão da forma musical e criatividade.

2. Jogos rítmicos: com instrumentos, com objetos, percussão corporal que

desenvolvem o senso rítmico, a memória, a identificação de células rítmicas, a técnica

instrumental, a descoberta das possibilidades sonoras dos instrumentos e a improvisação.

3. Jogos com movimento: canções com gestos, canções de pular a corda, canções de

roda, jogos de mãos, jogos de dedos, jogos de equilíbrio, jogos pulados, jogos de velocidade,

jogos de perseguição e jogos de improvisação de movimentos que permitem o

desenvolvimento de habilidades motoras, o desenvolvimento espacial, a coordenação, a

lateralidade e o esquema corporal.

4. Jogos educativo-musicais (ou didático-musicais): jogos com os nomes das notas,

jogos para distinguir entre o som e o silêncio, a origem/direção do som, timbres, alturas,

durações, intensidades, que permitem aprender as grafias da linguagem musical e discriminar

as propriedades do som.

Entre os jogos que contêm a música como elemento principal destacam-se os jogos

tradicionais e folclóricos. "Através de jogos populares, podemos conhecer certas tradições e

costumes que compõem a nossa herança cultural, e que formam parte de nosso passado e

conformam a nossa identidade" (SOLÉ, In: BUSQUÉ; PUJOL, 1996, p. 9). Infelizmente,

porém, muitos desses jogos tradicionais estão se perdendo nos tempos atuais. Devido às

mudanças do modo de vida na sociedade contemporânea, "a criança vem perdendo as

referências educativas do jogo e da brincadeira para ficar imersa num mundo consumista e

alienante [...]" (RAMOS, 2008, p. 13).

Como dito acima, jogar é uma necessidade e um direito, mas para que nossos alunos

possam exercer este direito na sua totalidade, pais e educadores precisam fomentar a

utilização deste tipo de atividades lúdicas no tempo livre das crianças.

A experiência descrita adiante exemplifica como a escola pode contribuir para

expandir o repertório de jogos e brincadeiras infantis das crianças. O uso destes recursos de

forma voluntária e espontânea permitirá a interação entre os alunos nesta etapa crucial do

desenvolvimento da socialização.

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Brincando na Sala de Aula: uma experiência na Espanha

O projeto intercultural "Brincando fazemos amigos: jogos de cinco continentes" foi

realizado na escola de ensino infantil e fundamental “9 de Outubro” na cidade de Alcàsser em

Valência. Este projeto foi realizado durante todo o ano letivo 2008-2009, e de forma

interdisciplinar com todas as áreas do currículo de ensino infantil e fundamental.

O objetivo principal do projeto foi recuperar os jogos tradicionais de diversas partes

do mundo, especialmente da região de Valência, e dos países de origem dos estudantes

estrangeiros da escola. O intuito secundário foi de promover o respeito pelas diferenças e

conscientização de todos os alunos em relação à outras culturas, bem como o de fornecer uma

ampla gama de jogos para as crianças brincarem no horário do recreio escolar.

A ideia de resgatar os jogos tradicionais teve como justificativa os problemas de

convivência detectados na escola após a chegada de um número considerável de famílias

estrangeiras à localidade. Para ser trabalhado em cada curso foi selecionado um país de um

continente diferente. A equipe de professores da escola preparou um dossiê com informações

sobre os diversos países, contendo mapas, rimas, poemas, obras de arte, jogos tradicionais,

canções e danças a serem trabalhados em sala de aula com seus respectivos grupos.

Tomando como referência os objetivos, capacidades e conteúdos estabelecidos nos

currículos da educação infantil e do ensino fundamental foram propostos pequenos projetos

ou tarefas integradas.

Atividades realizadas no segundo ciclo da educação infantil

No segundo ciclo da educação infantil foi trabalhado o tema Espanha, mais

especificamente a Comunidad Valenciana, com o intuito de partir da realidade mais próxima

à criança de 3 a 5 anos de idade e contribuir para uma aprendizagem significativa. Com base

em uma abordagem abrangente, foi utilizado como elemento motivador a tela Kinderspiele

(Jogos de crianças) do pintor flamengo Pieter Brueghel4.

4A ideia de utilizar esta pintura foi tirada de uma oficina de música ministrada pela professora Sofía López-Ibor durante a Conferência Nacional Orff-Schulwerk nos Estados Unidos, em 2007.

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Figura 1 - Jogos de crianças (1560), Pieter Brueghel, Kunsthistorisches Museum de Viena. 118 x 161 cm. óleo sobre tábua.

Esta tela retrata 86 jogos tradicionais do século 16 representados por 249 personagens,

que foram catalogados por Navacerrada (2007). Algumas das atividades iniciais se

concentraram na descrição da cena, na localização de uma determinada atividade ou a

imitação dos movimentos representados pelas figuras na imagem, conforme demonstra a

figura 2.

Figura 2 e 3 - Jogo da bola. Aluna da Escola 9 de Outubro e detalhe da tela de Brueghel.

Visando partir dos conhecimentos prévios dos alunos, foi realizada uma lista de suas

brincadeiras preferidas. Cada aluno teve que ensinar um jogo novo para seus companheiros.

Também foi solicitado aos alunos que descobrissem um jogo popular com música, pedindo

ajuda a seus pais ou avós e eles tiveram que explicar e mostrar o jogo para o restante da

classe. Essa experiência ajudou a desenvolver valores e atitudes de respeito entre alunos e

reforçou os laços de amizade entre eles (vide figuras 3 e 4).

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Figuras 3 e 4. Alunos da Educação Infantil (5 anos) aprendendo a brincadeira tradicional catalã “A comprar Peix”

Ao longo do ano letivo os alunos do terceiro ao quinto anos aprenderam diversos jogos

representados na pintura de Brueghel que ainda estão presentes na cultura Valenciana como

galinha cega, “la piñata”, boliche, cadeira da rainha, fazer bolhas de sabão, o peão, entre

outros (vide figuras 5 e 6).

Figura 5 e 6. Jogo da cadeira da Rainha. Detalhe da pintura de Brueghel.

Os jogos musicais tradicionais serviram para trabalhar diferentes aspectos musicais do

currículo da educação infantil. Abaixo está uma lista de jogos ensinados na educação infantil

e no primeiro ano do fundamental:

Jogos musicais da Espanha: Al pasar la barca , Al Corro la Patata, Chocolate

molinillo, ¿Dónde están las llaves?, El juego chirimbolo, El patio de mi casa, en Salamanca

tengo, En el salón del Prado, Este corro es un jardín, Pasimisí, Soy la reina de los mares, Un

Cocherito leré.

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Figura 7. Brinquedo de roda “Chocolate molinillo”

Jogos musicais de Valência: A la cadireta, Peu regató, Pissi -pissiganya, La Xata

Merenguera, Palmeja, La tia Monica, Aserrín aserrán, El sambori, La Caterineta, Els quatre

llauradors, En Joan Petit, Volta cap aquí, El ball de la civada, El ball de Sant Corneli, Els

esclops d´en Pau.

Figuras 8. Brinquedo de roda “Pissi, pissiganya”

Para atingir o objetivo de envolver as famílias na vida escolar, conforme estabelecido

pela LOE, os pais e os avós dos alunos tiveram a oportunidade de participar em várias

atividades do projeto, contando histórias e ensinando brincadeiras tradicionais a todos. Os

alunos concluíram que eles conheciam uma quantidade menor de jogos do que seus pais e

avós, e que estes brincavam com objetos simples, como pedras ou paus enquanto eles utilizam

brinquedos sofisticados e caros.

Como ponto culminante do trabalho desenvolvido ao longo do curso, os alunos

tiveram a oportunidade de compartilhar o aprendizado com os colegas, pais e parentes em

uma apresentação musical. A atividade final consistiu na representação de brincadeiras

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musicais de vários países aprendidas na aula de música, e concluiu com uma dramatização

coletiva da pintura "Jogos de Crianças", com representantes de todos os cursos da escola.

Esta apresentação consistiu em uma "viagem musical ao redor do mundo", integrando

diferentes linguagens: corporal, verbal, musical e plástica. Os alunos recitaram versos e

poemas, cantaram, tocaram instrumentos, dançaram e dramatizaram os jogos selecionados

(vide figura 9).

Figura 9. Atividade final, dramatização da pintura de Brueghel.

Conclusão

A partir deste projeto, foi possível recuperar uma grande quantidade de jogos

tradicionais. Os alunos e alunas da escola aprenderam jogos de diferentes países, o que

facilitou uma aproximação à cultura de seus pares. Os estudantes gradualmente incorporaram

esses jogos em seu tempo livre e estreitaram suas relações interpessoais. Na aula de música,

os alunos trabalharam conteúdos e habilidades por meio dos jogos e aprenderam a desfrutar

da música brincando.

Vivemos em uma sociedade multicultural. Acreditamos que ensinando aos alunos

jogos populares pertencentes ao seu meio bem como jogos de outros países, estamos ajudando

a restaurar e manter as nossas tradições, oportunizando o conhecimento de aspectos de outras

culturas, criando assim um ambiente intercultural que pode ajudar a torná-los mais tolerantes

e solidários.

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Referências

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LÓPEZ-IBOR, Sofía. Playing the Old Games. The Orff Echo Volume XL, Number 1 (Fall): 9-10, 2007. LOURO, Viviane dos Santos. Educação musical e deficiência: propostas pedagógicas. Sao José dos Campos, SP: Ed. do Autor, 2006. NAVACERRADA, Ricardo. 2007. Jeux d´enfants: una visión detallada del juego tradicional en el Renacimiento europeo. Buenos Aires: www. efdeportes.com/ Revista Digital. RAMOS, José Ricardo da Silva. Dinâmicas, brincadeiras e jogos educativos. Rio de Janeiro: DP&A, 2008. VIGOTSKY, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In El Desarrollo de los procesos Psicológicos Superiores. Barcelona: Ed. Crítica, 2001 WILLEMS, Edgar. El valor humano de la educación musical. Barcelona: Paidos ibérica, 2002. ZARAGOZÁ, Josep Lluís. Didáctica de la música en la educación secundaria. Competencias docentes y aprendizaje. Barcelona: Graó, 2009.

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A Educação Musical e o Universo Radiofônico Infantil

Melissa Lima UFBA

[email protected]

Mara Pinheiro Menezes UFBA

[email protected]

Resumo: O presente relato tem como foco agregar a educação musical infantil e o universo radiofônico na comunicação, expressão e desenvolvimento humano. A meta do projeto Educação Musical e Rádio Infantil, projeto de estágio da graduanda Melissa Lima, supervisionado por Mara Menezes e dado início em março do ano de 2011, é auxiliar e incentivar o aluno a pesquisar, criar e produzir dois programas radiofônicos infantis, os quais serão veiculados na Rádio Educadora FM, 107.5, através do Programa Rádio Legal. A Rádio Legal é um projeto de 54 programas radiofônicos infantis, inscrito para o Edital do IRDEB e aprovado em 2008. A data prevista para início da veiculação dos programas é agosto de 2011. O objeto do projeto de estágio Educação Musical e Rádio Infantil é um grupo de oito alunos, que se encontram semanalmente no espaço de educação musical “A Casa da Música” participando de vivências, produções e discussões tanto especificamente musicais quanto de um contexto artístico integrado. Algumas produções são capturadas, selecionadas e arquivadas, para ao fim do projeto, fazerem parte da edição do programa radiofônico. Dentre os resultados parciais do projeto podemos citar, além do desenvolvimento musical, as respostas de cunho humano, que são claramente percebidas a cada encontro, desde auto-reflexões, desinibições e aumento da liberdade e força de expressão musical, como a sutileza com que os sons e produções musicais são geradas e observadas por seus geradores. Nas atividades de captura do áudio das produções musicais e no registro da imagem de momentos singulares de socialização em sala de aula, os alunos demonstraram ser capazes de fazer gerar autoanálises e autodisciplina, percebendo a importância, por exemplo, do som e silêncio (do saber ouvir e expressar-se em momentos distintos).

Palavras chave: Educação musical, rádio infantil, estágio supervisionado, desenvolvimento musical e humano

A Educação Musical, o Rádio e o Desenvolvimento do Ser Humano

O fazer musical é um fenômeno universal, pois está presente em todos os tempos e

grupos sociais (PENNA, 2010, p.22). Porém, cada cultura percebe a música como uma

linguagem distinta, e por que não dizer, uma linguagem cultural. A música comunica,

expressa e ainda estabelece-se como identidade cultural para a sociedade que a produz e

reproduz. Nota-se atualmente, que muitas culturas já tratam a estética musical como algo

naturalmente enraizado e ligeiramente rígido desde a escuta musical na infância. A criança

como ser, ainda no início da formação das suas capacidades cognitivas e intelectuais, deveria

ser incentivada a manter-se aberta a construções próprias acerca do fazer e do apreciar

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musicalmente. Conforme Gurdjieff (2011), a música, acima de tudo, deve servir para conduzir

a humanidade a um despertar.

Muito do que ouvimos, contudo, é música "subjetiva". Não apenas ela flui do estado subjetivo do compositor, mas ela afeta cada ouvinte de acordo com o estado subjetivo no qual, por acaso, ele se encontra. Infinitamente mais rara é a música "objetiva", que requer um conhecimento objetivo da natureza humana, mais especificamente, da função e propriedades do sentimento e de como o sentimento é afetado pela "qualidade" específica de cada vibração. A música objetiva afeta todas as pessoas da mesma maneira. Ela não só toca os sentimentos como os transforma, trazendo o ouvinte a um estado unificado ou "harmonioso" dentro de si mesmo e, dessa maneira, a uma nova relação com o Universo que é em si um campo de vibrações. (INSTITUTO GURDJIEFF BRASIL, 2011).

De acordo com Schafer, “O rádio é uma voz invisível, e como é uma voz invisível,

tem poder e tem influência que pode ser amigável ou aterrorizante...” (1998, p.83). Esse

pensamento nos permite mergulhar em um mar de possibilidades educativas que permeia o

universo radiofônico. É preciso, de antemão, conceber a importância do compromisso com o

conteúdo e o formato das informações que serão passadas através do rádio como um veículo

de comunicação em massa e ater-se à qualidade. O rádio propõe ao ouvinte desenvolver um

ambiente de construção de pensamentos críticos, educacionais, culturais, sociais e humanos,

porém é notório que não é normalmente usado com esse intuito. Sabendo-se desse potencial,

vale ressaltar um pensamento defendido por Schafer:

O rádio poderia ser um instrumento educacional muito mais forte do que é.. A televisão é fria, o rádio é quente... quer dizer, o rádio tem mais impacto imediato que a televisão. A televisão é mais textura e cor, mas não tão forte e imediata como uma voz súbita no rádio pode ser. (SCHAFER, 1998, p.87).

O universo radiofônico estimula na criança seu potencial natural: o poder criativo no uso do

imaginário. Apesar de estimulada diretamente por apenas um canal de aprendizagem, o auditivo, a

criança inconscientemente aciona outros meios que poderão ajudá-la a formular um entendimento

mais elaborado ou satisfatório. A relação entre essa percepção auditiva e o imaginário estabelece-se

através de visualizações cênicas, remetendo-se a cores, cheiros, texturas e lembranças. Com isso, é

notória a importância qualitativa com a resposta que a paisagem sonora radiofônica passará para o

ouvinte infantil. Se observarmos pontos de interesse para o público adulto, principalmente pedagogos,

pais, dentre outros interessados, podemos constatar duas principais atuações advindas do universo

radiofônico. Uma, é aquela em que o adulto ouvinte consegue agregar novas técnicas didáticas

intrinsecamente sugeridas ao longo do programa. A outra é a resultante das diversas abordagens

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culturais e musicais, agregando valores sociais e educacionais, satisfazendo pedagogicamente tanto ao

adulto ouvinte quanto à demanda infantil a qual ele julga necessária.

O Projeto “Rádio Legal” e a Prática de Ensino

Diante da meta final do projeto de Rádio e Educação Musical, que é a produção de

dois programas radiofônicos infantis, será disponibilizado espaço para veiculação dos

programas na Rádio Educadora FM, 107.5, inseridos no Programa Radiofônico Infantil:

Rádio Legal. Em suprimento da aprovação do edital do IRDEB (2008) de Programa

Radiofônico Infantil, o projeto Rádio Legal é encarregado de criar o tema, conteúdo, roteiro e

gravação de 54 programas radiofônicos voltado para o público de 5 a 10 anos. Esses

programas já estão sendo gravados e editados desde o começo de 2011. Cada programa

precisa ter 30 minutos de edição e será veiculado aos sábados às 9 horas da manhã (horário

que poderá sofrer alterações segundo a programação interna da Educadora FM) na Rádio

Educadora FM, 107.5. A estrutura do programa integra blocos fixos com músicas, sempre

respeitando e dialogando com o tema proposto no dia. Como exemplo de estrutura, temos:

1. Vinheta (vinheta de entrada da Rádio Legal gravada);

2. “Apresentação” (vinheta específica do bloco e apresentação do tema);

3. “Vamos Ouvir Música!” (vinheta específica do bloco e músicas relacionadas

ao tema);

4. “Curiosidades” (vinheta específica do bloco e curiosidades ou entrevista com

participação das crianças);

5. Músicas;

6. “Contação de Histórias” (vinheta específica do bloco e contação de história

literária relacionada ao tema com participação das crianças);

7. Músicas;

8. “Trava-língua” (vinheta específica do bloco e trava-línguas gravados por

crianças);

9. “Paisagem Sonora” (vinheta específica do bloco e instantes de sonoridades

capturadas em ambientes diversificados, lançando a pergunta: “Que paisagem

sonora é essa?”);

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10. “Brincadeiras” (vinheta específica do bloco e brincadeiras de crianças,

gravadas por elas);

11. “Fazendo Som!” (vinheta específica do bloco e improvisações de sons e

músicas gravadas pelas crianças);

12. “Poesias” (vinheta específica do bloco e recital de poesias compostas e

gravadas pelas crianças);

13. Músicas;

14. “Agenda Cultural” (vinheta específica do bloco e divulgação cultural sem

datas, apresentando lugares e movimentos culturais fixos pela cidade);

15. (Gravações engraçadas – “erros de gravação de blocos e comentários, risadas,

fechando uma sessão bem descontraída e engraçada”);

16. Créditos.

O programa é pensado, construído respeitando o formato do roteiro e o tema escolhido

para o mesmo, gravado e editado. Somente depois disso é enviado para a Rádio Educadora

para futura veiculação. Os programas são elaborados por adultos (em sua maior parte) e

crianças. As gravações contam com crianças de escolas públicas e privadas de toda Salvador.

Profissionais de cada área de tema abordado são convidados especialmente para a sessão de

entrevista, onde as crianças fazem as perguntas.

Ao iniciar a veiculação do primeiro programa será lançada a proposta de parceria com

a diretoria e o grêmio acadêmico das escolas regulares de Salvador, disponibilizando parte do

programa para divulgação de feiras e projetos culturais e de ciência (ocorridos nas escolas),

onde crianças envolvidas nos mesmo trarão conclusões experimentais, informações. Assim,

estará sendo permeada a inter-relação dos conteúdos e disciplinas escolares no

desenvolvimento do tema de cada programa.

A partir de todas essas informações anteriormente citadas, é válido pontuar que os

programas gerados como produto do projeto Rádio e Educação Musical aderem ao formato

estipulado pelo programa infantil Rádio Legal. Julga-se, a partir disso, que estará sendo

estimulado o comprometimento das crianças, enquanto produtores de programas radiofônicos

profissionais, em manter essa formatação. O resultado humano é o desenvolvimento da

responsabilidade.

O projeto Educação Musical e Rádio, atual prática de ensino da graduanda Melissa

Lima, orientada por Mara Menezes, busca agregar momentos de produção musical e de

experimentos especificamente pedagógicomusicais, como jogos e atividades musicais e de

II Seminário Brasileiro de Educação Musical Infantil

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elementos do som por exemplo, com o universo radiofônico. Essa tarefa nem sempre é fácil,

pois há a demanda humana (individual e social) e dos prazos a serem cumpridos.

Percebe-se assim, necessidade de avaliação do quão necessário e importante é o

processo dos encontros das aulas e suas produções. Com a escolha do tema do programa já

brota um arsenal de possibilidades de músicas, brincadeiras, travalínguas, parlendas, histórias,

questionamentos para a entrevista, dentre outros elementos. Os alunos trabalham a apreciação

musical através da seleção das músicas a fazerem parte do programa. Ampliam seu repertório

musical e sonoro, além de conhecerem e se apropriarem de novos significados e

experimentações musicais e lúdicas.

O Rádio Como Ambiente do Pensar, Fazer e Comunicar Musical e Sonoramente

O processo de elaboração de um programa de rádio tendo como fator a educação

musical mostra-se efetivo em suas metas educacionais e humanas. Uma das mais prazerosas

observações é a avaliação que surge a cada encontro. Durante esses momentos em sala ou

estúdio, são notórias as transformações de comportamento. A proposta é claramente quebrar

os condicionamentos de conduta. O aluno com baixa autoestima é estimulado delicadamente e

didaticamente para posicionar-se, encontrar-se no grupo e expressar-se verbalmente e

musicalmente. Sente-se valorizado e importante ao ouvir suas colocações e produções

gravadas. O mesmo acontece com o aluno muito agitado e com dificuldade de concentração.

Ele precisa (mesmo que não seja a prioridade para ele no momento) ouvir, esperar, silenciar

para conseguir atingir sua meta: ouvir-se nas gravações. Sutilmente são trabalhados fatores

terapêuticos.

A “Natureza” foi o primeiro tema escolhido pelas crianças. Esse tema foi discutido,

pesquisado e desenvolvido pelos alunos dentro e fora da sala de aula através de interessantes

experiências de diálogos e vivências sonoras. Curiosidades foram aparecendo ao longo das

aulas (o que continua até o momento presente) e dando asas a confecções de poesias,

sonorizações e ensaios de diálogos. Muitos momentos desse processo foram registrados. As

crianças puderam mergulhar no universo radiofônico com a intenção de repassar o que

aprenderam e descobriram sozinhas ou coletivamente, através das trocas de informações com

o grupo.

Perante a vastidão de oportunidades que o universo radiofônico pode sugerir, há a

conexão entre os temas abordados na rádio e o desenvolvimento do seu conteúdo e a

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interdisciplinaridade das escolas regulares. Aproveitando as feiras de ciências e feiras

culturais das escolas, alunos, diretores e professores poderão ser convidados a participar de

entrevistas elaboradas e conduzidas pelos alunos e em concordância com o tema. Assim, tanto

estará sendo trazido para dentro do contexto radiofônico a abordagem escolar, quanto o

contrário. Percebe-se a importância para a formação do pequeno aprendiz como ser pensante e

mobilizador de ideias e divulgador de conceitos.

A Educação Musical Antroposófica

Se trouxermos o olhar para a importância da criação e da expressão artística das

crianças, constatamos que uma educação musical antroposófica as deixa mais livres para

experimentar, pois há, prioritariamente, o cuidado com o conteúdo humano. O pesquisador,

educador, músico e biólogo Marcelo Petraglia afirma que:

Quando pensamos agora em uma real formação do indivíduo, queremos acima de tudo desenvolver suas potencialidades. Torná-lo apto a, no futuro, aprender tudo que quiser e precisar, ter à disposição infinitas formas de pensar, sensibilidade para perceber sua relação com os outros e o mundo e vontade de agir e transformar seu meio ambiente. Isto significa que a criança em fase escolar deveria ter a possibilidade de desenvolver as potencialidades de sua alma, sem contudo dar a seus processos uma forma cristalizada e definitiva. (...) nesse sentido, as artes e em especial a música são uma ferramenta poderosa e indispensável (PETRAGLIA, 2011).

Uma educação musical com olhar antroposófico visa otimizar a relação do ser humano

com seu desenvolvimento holístico e com a natureza, através da linguagem musical. Há então

o despertar de novos conceitos e pontos de vista, onde a música é uma pura forma de

expressão e autoconhecimento. Nessa busca devem-se quebrar os parâmetros convencionais

do fazer musical, assim como a estética musical (pré) existente. Isso se amplia para a forma

como os instrumentos devem ser tocados, possibilitando criativamente a curiosidade e

nascimento de novas formas de experimentar e conduzir sonoridades de instrumentos

convencionais e não convencionais.

Apesar da proliferação de novos métodos, teorias e abordagens para o ensino de

música, ainda vemos prevalecer o ensino tradicional focado na leitura e escrita musicais.

Percebemos que há um universo equivocado onde, para uma boa educação musical, o aluno

deve, indispensavelmente, dominar a escrita e leitura da partitura formal. Devemos

reconhecer outras necessidades implícitas que há por trás desta formalidade da escrita

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musical. A expressão musical no aspecto criativo nos permite ir além. Olhar as necessidade e

buscar supri-las também com criatividade.

Dentre muitas alternativas, a simbologia musical se constitui como uma rica

possibilidade pedagógico musical. Elementos, desenhos, cores, gráficos, texturas, paisagens

sonoras, entre tantos outros, podem ser considerados argumentos de comunicação musical. O

aluno, enquanto pequeno compositor, elaborando suas próprias peças sonoras e/ou musicais,

pode ser encorajado a registrá-las. Mas como, se o mesmo ainda não lê “as bolinhas pretas”?

Seria o objetivo final da educação musical a leitura e escrita da notação tradicional?

Músicas, sons e sonoridades, num sentido mais amplo da palavra, podem ser

transcritas para o papel, sem que haja pentagrama, notas ou figuras de tempo conhecidas ou

reconhecidas por músicos acadêmicos. Surge então a importância de, criativamente, achar ou

adequar elementos que mais auxiliem o pequeno músico a registrar seus sons e músicas

produzidos. Que textura tem esse instrumento? É forte ou piano? Qual movimento sonoro ele

produz? E quanto à dinâmica? Onde há o silêncio? Quando o som retorna? E através, de

perguntas como essas, podemos fazer com que a criança mergulhe em um mar de

possibilidades descritivas do som por ela produzido.

Vale salientar que um dos blocos radiofônicos é a Paisagem Sonora, onde o fator

pedagógico musical permeia na escuta do ambiente sonoro. A criança ouvinte se remete a

uma viagem de espaço, tempo e memórias ao lidar com o poder da imaginação auditiva.

A Música Enquanto Fator de Desenvolvimento Holístico do Ser

Se ampliarmos nosso olhar, percebemos que há um diálogo regido entre a música e o

ser humano. Esse diálogo promove alterações de estados do campo emocional, físico e mental

do indivíduo, enfatizando a importância da relação entre a música, a natureza e o homem.

Holisticamente, os diferentes timbres são capazes de produzir reações e conexões com

aspectos humanos peculiares e que estão associados à melodia, ritmo e harmonia e aos

elementos da natureza. O som, antes mesmo de ser formatado por nosso cérebro como tal, é

vibração sonora. De acordo com Petraglia “o fenômeno externo e presente em toda a natureza

é vibração. Quando somos tocados por ela temos uma sensação e, se conseguimos extrair do

fenômeno um sentimento artístico, estamos diante de um fato musical.” (2010, p.186). Assim,

a vibração sonora além de captada por nosso ouvido interno é percebida por todo nosso corpo.

Ela é capaz de produzir ressonâncias com nossa estrutura física e nosso campo energético.

Sobre a percepção humana para os fatores sonoros e musicais Petraglia defende que:

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Esta percepção que se dirige ao eterno observador dentro de nós é recebida em diversos níveis, desde uma suave sensação de movimento, a evocação dos mais variados sentimentos até o reconhecimento de um significado que revela a essência do fenômeno percebido. Devemos reconhecer também que a impressão recebida do mundo externo é altamente modulada por nossos próprios processos e memórias subjetivas (PETRAGLIA, 2010).

Estudos de sonocitologia tem mostrado que as células sadias do corpo humano

mantém vibrações. Essas, quando colocadas em escala audível formam um padrão constante

de som. Sabe-se ainda que uma célula cancerígena, por exemplo, expressa um “ruído”, pois

não estabelece um padrão de vibração, por ter sido “quebrado”. Hoje, a Massagem Sonora

tenta (re)organizar esse padrão vibratório através de estímulos de vibrações sonoras no

paciente. Geralmente são utilizados instrumentos de vibração sonora direta (Mesa-lira ou

Monochord Table ou ainda os Bowls Tibetanos) onde instrumentos são colocados sobre ou

sob o corpo humano e instrumentos de vibração sonora indireta (Flautas, Tambores,

chocalhos, Carrilhão de Tubos metálicos, Didgeridoo, entre outros), havendo o cuidado com a

frequência de cada instrumento usado. Cada paciente recebe vibratoriamente e sonoramente

sua composição.

A música nos permite sensações subjetivas incríveis. Podemos acessar memórias

sonoras, podemos promover a sensação hedônica da curiosidade, do prazer ou ainda da

tristeza. Com a música podemos acender ou apagar o interesse e com isso ganhar ou perder

chances de promoção do bem-estar ou de ensinamentos sociais e humanos. Podemos ainda

auxiliar para autorreflexões do ouvinte. Gurdjieff, quando amplia o pensamento sobre a

vibração acústica, a música e a relação de ambas com o ser humano ressalta que:

Quando se toca uma determinada nota num instrumento, outro instrumento próximo ressoa a mesma nota. É uma lei. Quando uma melodia toca a música do universo, o universo ressoa, da mesma forma. Quando uma melodia toca a música do universo e o universo ressoa, nosso universo interior também ressoa, matematicamente na mesma medida (Instituto Gurdjieff Brasil, 2011).

Diante disso, percebemos que a troca musical se dá em um contexto mais amplo, o que

implica uma maior responsabilidade para os agentes envolvidos nos processos da produção

radiofônica, tanto para quem cria e veicula o programa, quanto para quem recebe essa

produção, ou seja, o ouvinte.

Conclusão

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Os resultados preliminares da nossa Prática de Ensino indicam que a metodologia

utilizada tem se mostrado eficaz à medida que proporciona ao aluno a oportunidade de criar e

manipular ideias musicais criativamente dentro do contexto radiofônico. Tem sido percebida a

expansão da expressão musical, corporal, oral, poética e social de cada criança durante os

momentos da prática pedagógica. Em autoavaliações os alunos trouxeram entusiasmo e

emoção ao perceberem-se indo além em suas colocações e atuações individuais e coletivas.

Faz-se notório o universo radiofônico como contexto de atuação de amplo conceito

pedagógicomusical, assim como meio de exercícios e reflexões para melhor desenvolver os

potenciais do ser humano.

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Musicalização Infantil na Escola Pública: um relato de experiência

Roseane Ramos Mota UFBA

[email protected]

Resumo: Este artigo trata de um relatório de estágio que aconteceu na Escola Municipal de Paripe, em Salvador - BA no ano de 2010. O trabalho foi desenvolvido com crianças entre 5 e 6 anos de idade, de classe econômica e social menos favorecida. O objetivo geral do trabalho foi promover uma vivência musical com estas crianças, onde se utilizou diversos instrumentos, músicas de várias etnias, contextos culturais, estilos e épocas. Foram desenvolvidas atividades práticas envolvendo conceitos de música e vivenciados de forma lúdica e intuitiva.

Palavras chave: Musicalização infantil, escola pública, bairro de Paripe

Introdução

O presente artigo relata uma experiência com musicalização infantil vivenciado na

Escola Municipal de Paripe, localizada no subúrbio ferroviário de Salvador- BA. Tratou-se de

um estágio supervisionado com carga horária de 68h de aulas teóricas com o professor

orientador e 68h de aulas práticas. Este teve início em março de 2010 e finalizado em

dezembro do mesmo ano.

O objeto do estágio foi a abordagem da educação musical na escola pública –

musicalização para crianças entre 5 e 6 anos de idade. O relatório de estágio, assim como este

artigo, procurou trazer as reflexões realizadas durante o processo de musicalização das

crianças e os resultados alcançados nessa prática de ensino, além de ser uma forma de

observar e estruturar uma metodologia adaptada à realidade dessas crianças e ao contexto no

qual ocorreu o estágio.

A Escola Municipal de Paripe

A Escola Municipal de Paripe, localizada no subúrbio ferroviário de Salvador é uma

instituição de médio porte que atende a comunidade durante os turnos matutino, vespertino e

noturno. Nessa escola é oferecida a educação básica que se inicia do pré-escolar (Grupo 5) e

vai até o 5º ano do ensino fundamental I no período diurno. Durante o período noturno é

oferecida uma educação voltada para jovens e adultos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental.

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A Turma

A turma era composta por 21 crianças entre 5 e 6 anos que cursavam o pré-escolar, ou

seja, o primeiro nível que a escola oferece, atualmente chamado de Grupo 5.

As crianças durante o período do estágio sempre se mostraram participativas e

entusiasmadas em realizar as atividades, algumas mais animadas do que outras, porém todas

queriam desfrutar daquele momento que não era comum nos outros dias de aula da semana.

Metodologia

As aulas foram realizadas na escola Municipal de Paripe, na sala de aula das crianças

do Pré-escolar, Grupo 5. Aconteceram às quartas-feiras e esporadicamente às segundas-feiras

com duração de 1h, iniciando às 13h 30 min.

As atividades propostas foram baseadas nos métodos Willems, Dalcroze, Kodály e

Martenot com influências de teóricos como Swanwick, Schafer e do educador Paulo Freire.

Estrutura das aulas

As aulas seguiam uma estrutura que variava de acordo às necessidades da turma e das

atividades desenvolvidas em cada aula. Adaptou-se esta estrutura com base em estudos de

Broock (2009), e criou-se uma forma que organizasse melhor as aulas, principalmente porque

os alunos desta faixa etária necessitam de organização e rotina, isto segundo algumas

educadoras musicais (BEYER, 2000; JOLY, 2003; FERES, 1998 apud BROOCK, 2009,

p.44), que consideram a rotina como algo importante na educação das crianças. Acredita-se

que essa importância possibilita sentimentos de estabilidade, segurança e facilidade de

organização espaço-temporal.

A sequência de atividades das aulas eram as seguintes:

1) Acolhida- Novidades: Todos se sentavam no chão em forma de roda. Cada criança

contava uma novidade. Exemplo: Como foi o final de semana, se viajou, fez algo que gosta

muito, etc;

Este momento era proposto para que a criança se sentisse recepcionada e pudesse

compartilhar com os demais uma novidade.

2) Canção de boas-vindas: Cantava-se a música do “Boa Tarde” no qual o nome de

cada criança era pronunciado;

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Neste momento além da canção de boas-vindas marcar o início da aula, era também

para as crianças se sentirem presentes e importantes por estarem ali.

3) Atividade de locomoção ou expressão corporal (roda, dança, brincadeira):

Cantava-se ou ouvia-se uma música que sugeria movimentos;

Este também era um momento de integração no qual as crianças, de acordo com

Willems, são estimuladas a alongar o corpo, colocando-as prontas para cantarem, tocarem e

criarem juntas. Dalcroze também traz o movimento corporal como importante para o trabalho

da motricidade, socialização, memória, concentração, ouvido interior, criatividade.

(FONTERRADA, 2008)

4) Atividade de pulsação: Cantava-se ou ouvia-se uma música que era acompanhada

por um instrumento de percussão ou pelo corpo;

Este momento tinha como objetivo trabalhar e desenvolver o sentido de pulsação e

também a apreciação musical propiciando o desenvolvimento auditivo.

5) Execução musical: Tocava-se um instrumento de percussão onde era feita a

execução de uma canção ou leitura de gráfico sonoro, etc;

Neste momento era trabalhado o desenvolvimento auditivo como também a execução

musical. Willems sugere que em uma aula de música deve conter atividades que possam

trabalhar a escuta musical de diversas maneiras. Swanwick traz a execução como um dos

aspectos musicais que devem ser trabalhadas em sala de aula, assim como a técnica,

composição, literatura e apreciação musical. (FONTERRADA, 2008)

6) (Re)Conhecimento de um instrumento da orquestra ou algum outro: A cada

aula apresentava-se um instrumento e apreciava-se o seu som;

Neste momento as crianças tinham contato direto ou indireto (através de imagens e

áudio) com instrumentos diversos, (re)conhecendo o seu som e explorando diferentes

maneiras de fazê-lo soar, sendo este um instrumento que todos pudessem experimentar.

7) Relaxamento: Todos deitavam no chão e apreciavam uma música. A professora

passava para fazer um carinho (cafuné) em cada criança;

Neste momento a professora sugeria que as crianças pensassem nas atividades que

fizeram, o que aprenderam e mais gostaram. Também “sussurrava” para cada criança o seu

aproveitamento na aula.

8) Auto-avaliação: Relembrar atividades realizadas na aula para que cada criança

relatasse aquela em que gostou de fazer.

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Este momento marcava o final da aula no qual as crianças faziam críticas e citavam

atividades que mais gostaram de realizar durante o encontro. É necessário salientar que essa

estrutura de aula era apenas uma sugestão a seguir, sendo que se podia suprimir ou

acrescentar momentos no decorrer da aula, dependendo do interesse da turma e da

flexibilidade do professor.

Materiais Didáticos

Nas aulas de musicalização infantil com as crianças do pré-escolar foram usados em

sua grande maioria instrumentos de percussão como pandeiros de tamanhos menores,

confeccionados especialmente para o trabalho com crianças, caxixis, ovinhos de percussão,

agogô, xequerê, maraca, tamborzinho, cabuletê, pau-de-chuva, clava, além de metalofone,

xilofone, teclado, flauta doce, dentre outros.

É necessário salientar que a professora estagiária dispõe dos instrumentos de

percussão que foram utilizados nas aulas, principalmente os pandeiros e caxixis que tem em

maior quantidade, em que todas as crianças podiam tocar o mesmo instrumento numa

determinada atividade. Dispõe também de instrumentos que foram supracitados.

A instituição de ensino dispõe de diversos instrumentos que também foram utilizados

nas aulas, como o teclado, o metalofone, o atabaque, as clavas. Esses instrumentos foram

adquiridos através de uma solicitação realizada pelo professor de música dessa instituição do

período noturno.

Havendo necessidade, a professora estagiária utilizava além dos instrumentos musicais

outros materiais alternativos como fitas, lencinhos de cores diversas, bonecos de pelúcia,

gravuras, gráficos sonoros e jogos musicais. Além desses materiais utilizou-se o aparelho de

som e CDs.

Repertório

Nas aulas de musicalização o repertório abrangeu músicas de várias etnias, contextos

culturais, estilos e épocas, como abarca também o Referencial Curricular Nacional para

Educação Infantil (RCNEI, 1998), considerando a flexibilidade do professor à inserção destas

nas aulas e os objetivos específicos em relação aos conteúdos musicais a serem trabalhados.

O RCNEI (1998, p. 64), também sugere que sejam trabalhados nas aulas de

musicalização abrangendo crianças de quatro a seis anos: o “reconhecimento de elementos

musicais básicos: frases, partes, elementos que se repetem etc. (a forma) e informações sobre

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as obras ouvidas e sobre seus compositores para iniciar seus conhecimentos sobre a produção

musical”.

“O trabalho com a apreciação musical deverá apresentar obras que despertem o desejo

de ouvir e interagir, pois para essas crianças ouvir é, também, movimentar-se, já que as

crianças percebem e expressam-se globalmente” (RCNEI, 1998, p. 64).

Conceitos

Nas aulas as crianças vivenciaram os conceitos musicais de forma lúdica e intuitiva.

Eram trabalhados elementos como o som e suas propriedades, andamento, silêncio, forma

musical, escala diatônica, pulsação, improviso, instrumentos diversos, dentre outras

habilidades como socialização, respeito, psicomotricidade e regras.

Avaliação da Turma

A avaliação feita durante o processo de musicalização se deu de forma processual, no

qual se avaliou o desenvolvimento musical de cada criança, o seu desenvolvimento social,

afetivo e motor. Também avaliou-se a participação das mesmas em aula, na realização das

atividades e a assiduidade.

Geralmente, quando se pensa em avaliação logo se associa a aplicação de testes,

provas e a atribuição de notas, no entanto, de acordo com Sant’ana (1995, p. 17)

Para avaliar podemos usar instrumentos que testem e/ou meçam, mas é muito mais do que atribuir um número, quantificar, pesar, qualificar e atribuir um valor quantitativo e/ou qualitativo; é, acima de tudo, confirmar a validade de um empreendimento. É constatar se a estratégia escolhida, na busca de algo, funcionou, era a mais adequada à situação e compensou, isto é, satisfez nossas expectativas.

Partindo destas considerações podemos dizer que o educador é levado a pensar e

refletir em diferentes pontos de avaliar o desenvolvimento e progresso de um aluno.

O projeto de musicalização proposto e relatado aqui objetivou promover uma vivência

musical ativa na qual o processo de avaliação não se submeteu a provas e atribuição de uma

nota. Preocupou-se, principalmente em realizar observações constantes considerando as

diferenças e peculiaridades de cada criança, o seu tempo de responder e reagir aos estímulos

pelos quais estavam sendo expostas, possibilitando auxiliá-las em suas necessidades e pontos

a serem superados. De acordo com Hoffmann (1993, p. 43),

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O aluno constrói o seu conhecimento na interação com o meio em que vive. Portanto, depende das condições desse meio, da vivência de objetos e situações, para ultrapassar determinados estágios de desenvolvimento e ser capaz de estabelecer relações cada vez mais complexas e abstratas.

Assinala-se que a vivência da linguagem musical requer uma avaliação que vai além

de provas, notas, conceitos, sendo que o trabalho de musicalização é sucessivo e infinito para

o indivíduo. A busca pelo novo nos possibilita criar, recriar, adaptar, alterar, no qual o

desenvolvimento musical e capacidade de criação passam por diferentes etapas de

aprimoramento e amadurecimento, sendo um processo inacabado.

É necessário salientar que todas as aulas foram filmadas e o professor estagiário pode fazer

uma segunda avaliação mediante os vídeos assistidos, podendo observar com mais atenção

episódios que no momento não foram percebidos.

Os critérios utilizados para avaliação foram: Relacionamento com o grupo;

Participação, atenção e concentração nas aulas; Desenvolvimento nas atividades individuais e

em grupo; Desenvolvimento do canto; Percepção e discriminação dos sons; Percepção e

execução rítmica; Leitura, interpretação e execução de gráfico sonoro.

Resultados

As crianças durante o processo de musicalização puderam treinar e desenvolver a

atenção, concentração, memória e principalmente o hábito de parar para ouvir, escutar o

outro, ouvir a si mesmo, ouvir atentamente os sons em geral para, posteriormente reconhecer

e discriminar diferenças e semelhanças de alturas, durações, intensidades e timbres, sendo que

a princípio foi mais trabalhoso obter e manter a atenção e uma concentração proveitosa da

turma.

As crianças desenvolveram também o sentido de pulsação, a percepção rítmica e

melódica através de exercícios de imitação e criação. O desenvolvimento do canto deu-se com

a conscientização das crianças com relação à intensidade com que se empregava na entoação,

o que foi mais trabalhado durante as aulas, pois estas tinham o hábito de cantar da mesma

forma que falavam, geralmente aos gritos. Foi trabalhada também a forma musical, na qual as

crianças vivenciaram a partir da mudança de movimento corporal, tanto enfatizados pela letra

da música quanto por movimentos sincronizados e sugeridos pela professora estagiária ou

pelas próprias crianças.

Com a vivência musical, as crianças puderam desenvolver maior confiança na

realização das atividades avançando para a leitura, interpretação e execução dos gráficos

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sonoros. Foram realizadas atividades de prática instrumental em conjunto, em que pudessem

desenvolver o hábito de ouvir e tocar com o outro, respeitando o seu tempo e o do colega, o

que de fato alcançaram êxito. As crianças conseguiram perceber a necessidade de parar para

ouvir, escutar com atenção e assim lograr nas atividades que envolvem basicamente a

percepçãoauditivo musical.

Todos esses pontos supracitados serviram de base e estratégias eficazes para o trabalho

e desenvolvimento das habilidades musicais durante o processo de alfabetização musical.

Com isso, pode-se notar uma melhor compreensão e desenvoltura da turma na realização das

atividades musicais propostas.

Considerações Finais

Durante o estágio buscou-se promover uma vivência musical ativa com as crianças

participantes do projeto, para estas desenvolverem durante o processo de musicalização tanto

habilidades musicais como também linguísticas, psicomotoras, cognitivas e sócio-afetivas.

Houve também a preocupação em oferecer as crianças um leque de variedades em relação as

suas vivências musicais anteriores, considerando que todos nós estamos expostos ao que é

mostrado, oferecido ou imposto pela mídia, tanto como positivo ou negativo.

Feita uma observação prévia das necessidades da turma e dos alunos individualmente,

foram propostas atividades nas quais as crianças pudessem desenvolver principalmente o

hábito de ouvir, de escutar atentamente.

Durante o processo tornou-se nítido o desenvolvimento das crianças com relação à

escuta consciente. Para este fim foram realizados, além de atividades musicais, momentos em

que cada criança pudesse comentar algo, compartilhar uma canção, ou seja, tanto atividades

musicais que despertassem na criança o interesse em ouvir e escutar atentamente, como

também momentos em que era necessário ouvir o outro, ouvir a si mesmo.

Pode-se concluir que a maioria dos objetivos específicos foi alcançada e as crianças do

Pré-escolar, Grupo 5, iniciaram um processo de vivência musical consciente, a fim de

futuramente se optar por um gosto musical, tornando-se apreciadoras musicais conscientes,

desenvolvendo também o seu lado crítico em relação à música.

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Referências

BROOCK, Angelita Maria Vander. A Abordagem Pontes na Musicalização para Crianças entre 0 e 2 anos de idade. Dissertação (Mestrado em Música). Escola de Música, UFBA, Salvador, 2009. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. 3 v,: il. FONTERRADA, Marisa Trench de Oliveira. De Tramas e Fios: Um ensaio sobre música e educação. 2.ed. - São Paulo: Editora UNESP; Rio de Janeiro: Funarte, 2008. HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade. Porto Alegre. Editora Mediação, 1993. 20ª Edição revista, 2003 SANT’ANA, Ilza Martins. Por que avaliar? Como avaliar? Critérios e instrumentos. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

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“Poemas para Cantar”: uma proposta para a ampliação do repertório

musical na educação infantil. Relato de experiência a partir do estágio

supervisionado

Maria Teresa de Souza Neves Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES

[email protected]

Resumo: O presente texto trata de um relato de experiência sobre um trabalho realizado em torno de poemas de Vinícius de Moraes, durante a prática do estágio supervisionado, com uma turma do 2º período do ensino infantil de uma escola municipal da cidade de Montes Claros, entre maio e junho do ano de 2011. Durante o estágio supervisionado, após a observação da turma, foi elaborado o projeto “Poemas para Cantar” com o intuito de ampliar o repertório musical das crianças, incentivando a apreciação musical e o aprender a ouvir, bem como conhecer algumas obras literárias musicadas. Observou-se ao final do processo um grande interesse das crianças pelas músicas estudadas e a viabilidade em trabalhar projetos temáticos em educação musical infantil sobre uma determinada obra musical.

Palavras Chaves: Estágio supervisionado, música na escola, educação musical infantil

Introdução

Na área de educação musical nas últimas décadas, questões relacionadas à

importância da música nas escolas de educação básica, aos desafios que marcam a trajetória e

a prática docente nesse contexto, bem como aos conteúdos e metodologias que devem

alicerçar a atuação do educador musical nessa realidade têm sido amplamente debatidas.

Queiroz e Marinho (2009) afirmam que:

tal fato se deve, sobretudo, ao reconhecimento da necessidade e da importância de propostas consistentes de educação musical nas escolas. Propostas que permitam estabelecer, de maneira abrangente, um cenário musical educativo coerente, consistente e contextualizado com o que se almeja para a formação plena do indivíduo (QUEIROZ e MARINHO, 2009, p. 61).

A música na escola pode adquirir um papel relevante se tratada como uma área de

conhecimento que requer estudo, diversidade, prática e reflexão, de forma que esteja inserida

nos planejamentos e no cotidiano escolar de maneira significativa, compondo com as demais

áreas um conjunto de saberes fundamentais para o desenvolvimento sociocognitivo e humano

dos alunos. No dizer de Bellochio e Figueiredo (2009),

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Ensinar música na escola envolve a experiência musical de forma direta, ouvindo, apreciando, cantando, tocando, compondo, improvisando, dentre outras. Falar sobre música com os alunos é uma atividade que também envolve conhecimentos musicais, mas não os coloca em contato direto com a linguagem musical. Ensinar música envolve fazer música, produzir sonoramente e estar atento a essa produção sonora. Estar atento implica apreciar e entender o que se está fazendo, buscar alternativas para fazer melhor (BELLOCHIO e FIGUEIREDO, 2009, p.39-40).

Dentro dessa proposta de apreciação musical, durante o estágio supervisionado na área

de música, foi elaborada uma proposta para ampliar o repertório musical das crianças do 2º

período, de uma escola municipal a partir da realidade observada. ‘’O estágio em licenciatura

(...) constitui o alicerce para a formação de profissionais de todas as categorias e,

principalmente, daquelas que exigem formação acadêmica” (BIANCHI, ALVARENGA,

BIANCHI, 2009, p.5). O Estágio Supervisionado é de grande relevância, pois através dele o

acadêmico estabelece a relação entre a teoria e a prática.

O estágio é onde é concedida a oportunidade de vivenciar tudo aquilo que (não)

aprendemos em sala de aula. É a oportunidade de refletir sobre nossas “escolhas” a partir da

observação de um meio e estabelecer as formas mais adequadas para atingir os objetivos, o

que ensinar e quais as formas de agir no futuro ambiente de trabalho. O estágio deve ser

pensado como uma forma de unir o saber com o fazer. Porém antes da aplicação do saber é

necessário que se faça uma leitura da realidade estudada para saber o que fazer. O “fazer”

deve proporcionar mudanças nesse meio, de formar a atenuar as discrepâncias sociais, de

modo que o educando seja capaz de atuar na sociedade de maneira crítica e transformadora.

Desenvolvimento

O Estágio Supervisionado I (Ensino Infantil)

A escola escolhida para desenvolver o estágio supervisionado foi a Escola Municipal

Professora Maria da Conceição de Almeida Costa CEMEI - Cintra, na cidade de Montes

Claros - MG. Fui recebida pela diretora da escola, e expliquei a ela a proposta do estágio

supervisionado, área de concentração Artes-música, e assim como a professora orientadora do

estágio da universidade sugeriu, foi solicitada a classe das crianças maiores do Ensino

Infantil. A Turma do 2º período (nascidos até 31/03/2006, 5 anos) foi indicada para o

desenvolvimento das atividades de observação e regência.

Iniciei o estágio de observação, no período matutino, acompanhando o trabalho

pedagógico desenvolvido, bem como a rotina das crianças. A turma composta por 17 crianças,

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sendo uma delas portadora de necessidades especiais (cadeirante). Devido a esse motivo além

da professora regente, havia uma professora especialista que acompanhava esse aluno e estava

presente durante a aula. Observei um ambiente escolar de muita afetividade e respeito entre

todos, o que proporcionava às crianças acolhimento e segurança ao se sentirem amadas e

respeitadas.

O trabalho pedagógico desenvolvido pela professora regente, na área de música,

esteve voltado à concepção tradicional, onde a música estava reduzida a forma canção,

servindo sempre como estratégias para obtenção de padrões de comportamento, hábitos e

atitudes, tais como formar fila, iniciar aula, memorizar dias da semana, lanchar (músicas de

comando). Outra prática observada foi a utilização da música dentro do calendário de

festividades: música para o dia das mães.

Em um primeiro momento de regência também quis reduzir minha prática às

festividades. Adentrando ao mês de junho propus trabalhar o baião, escolhi uma música do

gênero e quis mais uma vez reproduzir movimentos estereotipados sem considerar a riqueza

do processo de exploração e expressividade. Porém não obtive sucesso. No dizer de

Nachmanovitch (1993), se não cometermos erros, provavelmente não chegaremos a fazer

nada. Ele afirma que:

os erros e acidentes são grãos de areia que se transformarão em pérolas; eles nos oferecem oportunidades imprevistas, são em si fontes frescas de inspiração. Aprendemos a considerar novos obstáculos como ornamentos, oportunidades a serem aproveitadas e exploradas. (...) Prática é autocorreção e refinamento, é trabalhar em busca de uma técnica mais clara e mais confiável. Mas, quando um erro ocorre, podemos encará-lo como uma informação sem valor sobre nossa técnica ou como um grão de areia a partir do qual será possível produzir uma pérola” (NACHMANOVITCH ,1993, p.87-88).

A partir do erro, comecei a questionar: como trabalhar o ensino musical com crianças

pequenas? O que ensinar?

De acordo com a educadora musical Gainza (1988) “O objetivo específico da

educação musical é musicalizar, ou seja, tornar o indivíduo sensível e receptivo ao fenômeno

sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo, respostas de índole musical” (p.101). Para Penna

(2008) apud Souza e Joly (2010) musicalizar é:

[...] desenvolver os instrumentos de percepção necessários para que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la, recebendo o material sonoro/musical como significativo. Pois nada é significativo no vazio, mas apenas quando relacionado e articulado ao quadro das experiências

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acumuladas, quando compatível com os esquemas de percepção desenvolvidos. (p. 31).

O ensino de música nas escolas tanto de Educação Infantil, pode contribuir não só para

a formação musical dos alunos, mas principalmente como uma ferramenta eficiente de

transformação social. As educadoras musicais Hentschke e Del Ben (2003) apud Souza e Joly

(2010) destacam que:

é importante que a educação musical escolar, seja ela ministrada pelo professor unidocente ou pelo professor de artes e/ou música, tenha como propósito expandir o universo musical do aluno, isto é, proporcionar-lhe a vivência de manifestações musicais de diversos grupos sociais e culturais e de diferentes gêneros musicais dentro da nossa própria cultura. (p. 181).

Dentro dessa proposta de expandir o universo musical, proporcionar a ampliação e o

enriquecimento de saberes à produção da área, foi elaborado o projeto “Poemas para Cantar”,

como uma forma de ampliar o repertório musical, através da apreciação musical, e permitir

acesso a práticas lúdicas, visando estimular a criatividade e a expressividade da criança.

O RCNEI refere-se a apreciação musical como a audição e interação com músicas

diversas e propõe escuta de obras musicais de diversos gêneros, estilos, épocas e culturas, da

produção musical brasileira e de outros povos e países, bem como informações sobre as obras

ouvidas e sobre seus compositores para iniciar seus conhecimentos sobre a produção musical.

Projeto “Poemas para Cantar”

Faixa etária: 4-5 anos

Conteúdo: linguagem musical

Introdução: Nessa sequência de atividades, além de ampliar seu repertório musical, as

crianças podem conhecer um pouco mais sobre a canção, uma composição normalmente

curta, que combina música (uma melodia), com poesia (letra), bem como seus compositores.

Objetivos:

- Ampliar o repertório musical das crianças;

- Aprender a ouvir/apreciar músicas diversas;

- Conhecer alguns poemas ou obras literárias musicadas.

Conteúdos específicos:

Escuta musical, repertório musical, poesias e canções.

Desenvolvimento da Atividade:

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Fazer um levantamento dos conhecimentos prévios da criança sobre o tema do poema ou

texto.

Ler o poema, texto ou a letra da canção

Ouvir a canção em roda (áudio ou vídeo).

Estimular a criatividade da criança sobre o tema (Dramatizações, desenhos livres,

sonoridades.)

Elaborar Cd com as canções trabalhadas e um livreto contendo as letras das canções e as

atividades (dobraduras, desenhos...) realizados pelas crianças.

Poema 1. O Relógio

Composição: Vinícius de Moraes/ Paulo Soledade

“Sensibilização”

-Fazer o levantamento prévio dos conhecimentos sobre a função do relógio (levar um relógio

grande).

-Levar a criança a perceber a noção de dia e de noite.

-Perguntar às crianças o que elas fazem normalmente nas horas do dia (6hs, 7hs, 8hs, 9hs

etc.). Pedir q elas façam mímica. (Tempo e Ação)

-Incentivar as crianças a imitar o som do relógio (tic-tac).

-Ler o poema enquanto elas fazem tic-tac. Ouvir a canção

- Dramatizar o poema utilizando expressões corporais e sonoridades do texto.

-Estimular a criatividade da criança através de criação de desenhos espontâneos sobre o

poema.

Poema 2: A Casa

Composição: Vinicius de Moraes

“Sensibilização”

-Fazer o levantamento prévio dos conhecimentos sobre “casa” (todas as casas são do mesmo

tamanho? São da mesma cor? De que material é feita?).

-Levar gravuras de casas, réplicas de casas (casa de pedra), casas de animais (João de Barro).

-Refletir sobre a importância da casa (lar), independente do seu tamanho..

- Escutar o audio da música “A Casa”

-Indagar sobre como é a casa apresentada na música

-Entender o significado de cada frase da música.

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-Ler o poema “A Casa” de Vinícius de Moraes.

-Estimular a criatividade da criança através de dobraduras de casas.

- Assistir vídeo da música.

Poema 3. O Pato

Composição: Vinícius de Moraes/Toquinho/Paulo Soledade

“Sensibilização”

-Assistir DVD da música O pato

-Conversar com as crianças: O Pato é igual a gente? O que o pato tem de diferente? Como é a

voz do pato?

-Imitar o Pato

-Estimular a criatividade da criança através de criação de desenhos espontâneos sobre o

poema.

Considerações Finais

De acordo com Bianchi, Alvarenga e Bianchi (2009), ”(...)‘O aluno não pode ser

insensível aos problemas do mundo contemporâneo’ e deve contribuir com todas as suas

forças para dar respaldo e solução, no que lhe compete, à sociedade que atuará” (p.4).

A Escola é uma das organizações da sociedade onde o conhecimento científico

fundamenta o saber humano. Cabe ao professor/acadêmico lançar de todas as disciplinas da

licenciatura para elaborar sua proposta de trabalho de forma a conscientizar o aluno da

importância social do seu papel enquanto educador.

Durante o período em que foram desenvolvidas as aulas com as crianças, pude

constatar que como educadora, as minhas ações devem ser planejadas e estudadas antes de ir à

frente da turma, assim como o processo de reflexão não apenas após o término, mas também

durante a ação. Dessa maneira, valorizar os conhecimentos prévios dos alunos e fazer com

que tivessem a liberdade para apresentá-los tornou-se uma ferramenta valiosa em minha

prática educativa.

A escolha pelas músicas do gênero infantil a partir da obra literária de Vinícius de

Moraes, “A Arca de Noé”, foi feita propositalmente com o intuito de apresentar músicas que

talvez as crianças não teriam acesso se não fosse no meio escolar, ampliando seu repertório e

proporcionando também acesso a práticas lúdicas visando estimular a criatividade e a

expressividade.Ao fim do projeto observei um grande interesse das crianças pelas músicas

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estudadas. Foi confeccionado um livreto com as atividades realizadas por cada uma das

crianças e gravado um cd com as músicas trabalhadas e outras da mesma obra, com a

finalidade de permitir que as crianças continuassem a expandir seu universo musical em casa.

Outra observação significativa na minha prática foi a viabilidade em trabalhar um projeto

temático na educação infantil, através de uma determinada obra literária musical.

Verificar a transformação na minha prática foi algo muito relevante para minha

formação. Como ressalta Moita “Ninguém se forma no vazio. Formar-se supõe troca,

experiência, interações sociais, aprendizagens, um sem fim de relações”. (MOITA, 1992, p.

115). Sendo assim, estamos em constante formação se nossa ação estiver sempre

acompanhada da reflexão durante e depois da prática. De acordo com Freire “Ninguém

começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro horas da tarde. Ninguém nasce

educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como

educador, permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática”. (FREIRE, 2000, p. 58).

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Referências

BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro; FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira de. Cai, cai balão… Entre a formação e as práticas musicais em sala de aula: discutindo algumas questões com professoras não especialistas em música. Revista Música na Educação Básica. Porto Alegre, v. 1, n. 1, outubro de 2009. p 36-45. BIANCHI, Ana Cecília de Moraes; ALVARENGA, Marina; BIANCHI, Roberto. Manual de Orientação-Estágio Supervisionado. Editora Cengage Learning 4º edição, 2009. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil . Brasília, MEC/SEF, v.3, 1998. FREIRE, Paulo. A Educação na Cidade. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2000. GAINZA, Violeta Hemsy. Estudos de Psicopedagogia Musical. Tradução de Beatriz A. Cannabrava. São Paulo: Summus, 1988. MOITA, Maria da Conceição. Percursos de formação e de trans-formação. In: NÓVOA, Antônio (Org.). Vidas de Professores. Porto: Porto Editora, 2º edição, 1995. p 111-140. MORAES, Vinicius de. A Arca de Noé. Companhia das Letrinhas, 2º edição, 1991. MORAES, Vinicius de. A Arca de Noé. Vol. 1. Polygram, 1980. NACHMANOVITCH, Stephen. Ser Criativo – O Poder da Improvização na Vida e na Arte. Tradução de Eliana Rocha. São Paulo: Summus, 1993. QUEIROZ, Luis Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho. Práticas para o ensino da música nas escolas de educação básica. Revista Música na Educação Básica. Porto Alegre, v. 1, n. 1, outubro de 2009. p 60-75. SOUZA, Carlos Eduardo de; JOLY, Maria Carolina Leme. A Importância do Ensino Musical na Educação Infantil. Cadernos da Pedagogia. São Carlos, Ano 4 v. 4 n. 7, jan -jun. 2010, p 96 – 110.

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A Improvisação Livre na Educação Infantil: algumas reflexões a partir das

ideias da Prof.ª Dr.ª Chefa Alonso

Débora Niéri [email protected]

Resumo: Objetiva-se refletir sobre a importância da improvisação musical livre na Educação Infantil (EI), a partir das ideias apresentadas no Seminário “Técnicas Básicas de Improvisação Musical Livre e Orquestra de Improvisadores” pela professora Chefa Alonso da Espanha, em abril de 2011 no Instituto de Artes da Unesp. Essa reflexão justifica-se pela necessidade de fomentar propostas pedagógico-musicais que atentem para o desenvolvimento da musicalidade da criança, por meio da atuação do professor generalista, oportunas nesse momento de implantação legal da música como conteúdo obrigatório no ensino básico, o que instiga a contemplação do Eixo Música apontado nos Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (1998).

Palavras chave: Música, improvisação livre, educação infantil

Introdução

A improvisação livre é um dos campos da Educação Musical que apesar de “presente

há mais de quarenta anos no mundo musical da maior parte dos países da Europa, Estados

Unidos e Canadá” (ALONSO, 2008, p.8), segue marginalizada tanto no meio artístico-

musical, como no campo do ensino da música.

A improvisação livre consiste em outra forma de fazer música mais ligada à expressão

do corpo, voz ou instrumento pela exploração sonora e escuta do que ao apego a um

determinado repertorio estilo ou sintaxe musical. Baseia-se num conceito de música que

contempla sonoridades diversas, formas de composição diferentes das tradicionais, incluindo

o ruído, as explorações sonoras e as variações timbrísticas como elementos chave no processo

de criação.

Caracteriza-se pela “ausência de um marco normativo”, onde é só para lugar o melhor

é no qual os limites impostos pela presença de uma gramática ou de um contexto regulado por

regras do contraponto ou da harmonia, são substituídos “pelo desejo de criar no momento e

coletivamente uma música nova” (ALONSO, 2008, p. 8).

O processo de criação baseado na improvisação livre não possui relações hierárquicas,

nem estimula a competitividade e tampouco se sujeita às convenções. O prazer estético não

consiste no esperado, e sim, no imprevisto.

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A improvisação livre reveste-se de um posicionamento político contestador,

questionador das convenções estabelecidas. Sem território fixo, assim como os nômades,

“alimentam o imaginário coletivo de um mundo igualitário, sem fronteiras, a existência de

uma irmandade universal” (apostila do curso, p.7). Os improvisadores desafiam a relação

preestabelecida com o tempo cronológico, medido pelo relógio, demorando-se,

perambulando, vagueando, testando, experimentando, prescrevendo um tempo irregular,

impreciso, desinteressado que busca as possibilidades do tempo real.

Há nessa postura músico-pedagógica uma preocupação com a ampliação dos conceitos

de composição musical e do ensino musical baseado no repertório tradicional, principalmente,

o europeu. A improvisação livre inspira-se no desejo de aproximar a música das pessoas, de

“democratizar” o fazer musical, buscando relações com as atividades e experiências do

cotidiano. Coloca em jogo a subjetividade do improvisador, uma vez que ele tem de

relacionar-se não só com a música, numa atitude individualista, mas com os outros, num

processo coletivo.

Opostamente ao pensamento de que improvisar é ‘fazer qualquer coisa’ a

improvisação livre guia-se pelo sentir e ouvir o outro, num processo de profunda

concentração e respeito pelo grupo, ampliando as possibilidades de exploração, de liberdade e

criatividade musicais.

Sentir e ouvir o outro, dentro de uma perspectiva coletiva e criativa. Essa concepção

pedagógica sempre me impulsionou enquanto educadora. Mas, minha formação musical como

pianista dentro da tradição erudita, pautada principalmente pelo repertório romântico do

século XIX, não respaldava minha atuação didático-musical nas classes da Educação Infantil.

Sempre à procura por cursos, tive a oportunidade, em abril deste ano, de participar do

Seminário “Técnicas Básicas de Improvisação Musical Livre e Orquestra de Improvisadores”,

ministrado pela saxofonista e improvisadora Prof.ª Dr.ª Chefa Alonso (La Coruña - Espanha)

de 11 a 28 de abril de 2011, no Instituto de Artes da UNESP. O curso foi organizado pelo

GEPEMIA, Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Musical do IA/UNESP sob liderança

da Prof.ª Dr.ª Marisa Trench Fonterrada. Destinado a instrumentistas de qualquer nível,

envolveu alunos dos cursos de Licenciatura e Bacharelado em Música, e de Pós-Graduação

em Música (Mestrado e Doutorado) de diversos lugares da capital paulistana.

O curso viabilizou o entendimento dos princípios educacionais, tangenciando também

objetivos políticos, da improvisação livre, e permitiu, também, uma vivencia prática com a

Orquestra de Improvisadores. Nesse conjunto, a ênfase era desaprender o aprendido, e, ao

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mesmo tempo, ampliar as referencias sonoras, entender o espaço individual e o momento de

atuar, descobrir novos materiais ou maneiras de desenvolver o já estabelecido, e empreender

um trabalho em grupo.

Discussão

Com base nas ideias de Chefa Alonso, trago à discussão alguns princípios da

improvisação livre que podem ser pertinentes para os contextos educativo, musical e infantil.

O primeiro refere-se à arte como provocadora de mudanças sociais, o segundo, à

improvisação livre no ensino musical, e o terceiro enfatiza a improvisação livre na Educação

Infantil.

A arte (e a improvisação livre) na educação como promotora de mudanças sociais e políticas

Para Chefa Alonso a música não pode ser entendida desvinculada de seu contexto

histórico, social e politico, uma vez que reflete o espirito de uma época, de uma sociedade ou

de um grupo social, seus conflitos e tensões.

Baseada no conceito de Andrei Tarkovsky (2005) de que a sociedade tende à

estabilidade enquanto o artista busca a mudança, almeja à transformação (p. 217) e nas ideias

de Jacques Attali veiculadas em seu livro Ruido: la politica econômica de la musica (1977),

no qual toma a música como metáfora do real, Alonso observa que essa arte “prevê” o futuro,

adiantando-se aos acontecimentos sociais que se desenrolarão (p.65). Alonso coloca em pauta

o papel social do artista de violar as regras do sistema estabelecido, instaurando novas

possibilidades formais e exigências de sensibilidade. Observa que o artista tem de perturbar a

estabilidade, provocar o desequilíbrio, gerando novas formas e maneiras de ver o mundo. Tem

de estar atento às transformações sociais e fazer a música do seu tempo.

O ponto que Alonso quer estabelecer é o caráter desafiador e contestador da prática da

improvisação: está à margem do consumo massificado, por isso não interessa ao mercado; não

busca a fragmentação, a especialização que pode gerar a competitividade e, como tal, nem

interessa às políticas públicas. Seu sentido é promover um engajamento que representa

desestabilidade e desequilíbrio na manutenção do poder.

Numa perspectiva educacional, o desafio que se impõe no século XXI é o de

integração de saberes, religando a multiplicidade de dimensões fragilizadas pela fragmentação

tão eficazmente perpetuada pelo paradigma cartesiano vigente. Essas expectativas emergentes

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impõem um paradigma conectado ao pensamento em rede, não linear, e baseia-se no

processo, na construção, na diferença, no vir a ser, no não estabelecido, em outra relação de

tempo, em alianças. Alinhada à perspectiva ideológica e política, a improvisação livre

apresenta-se como um caminho para o ensino de música, pois reflete possibilidades de novas

formas de ser, pertencer e estar no mundo, tendo “relações com o pensamento político da auto

gestão, da autonomia e da democracia radical” (ALONSO, 2008, p.6) e caracterizando-se

como prática de uma sociedade alternativa. Constitui-se, portanto, numa verdadeira ‘ameaça’

às políticas que visam à o controle social.

Os princípios de uma educação para a paz (KOELLREUTTER, 1997, p.60), estão

embutidos nos preceitos e ideais da improvisação livre.

A improvisação livre na educação musical

A improvisação livre para Chefa Alonso (2008, p. 8-21) se define como um modo de

fazer música baseado em atividade coletiva e com ênfase na perspectiva criativa.

O ensino de musica calcado na tradição europeia, de maneira geral, segrega o tocar da

atividade de compor, de criar, de experimentar. Essa concepção fortalece os mitos arraigados

na cultura de que música “é difícil” ou “para poucos”, ou para os “gênios” ou ainda, para

quem “tem dom”, o que pode provocar um distanciamento do das pessoas em relação ao

aprendizado e interesse na linguagem. Alonso observa que “é fácil encontrar um compositor

que não toca nenhum instrumento, um intérprete que não sabe improvisar ou um improvisador

que não escreve música” (2008, p. 10). Critica esse ensino musical padronizado, fragmentado,

limitado ao repertório do passado e cunhado fundamentalmente na atividade individualista,

pela ausência da improvisação nos currículos escolares como técnica básica de aprendizagem

musical, pessoal e social, pois pela improvisação o aluno pode aprender a aceitar o diferente,

a buscar soluções, a confiar em si mesmo e nos outros, e a adquirir uma linguagem própria e a

técnica necessária para expressar-se.

A improvisação tornaria a formação do estudante de música (escolas especificas de

música) e do aluno (na escola regular) mais completa, pois contemplaria tanto a abordagem

intuitiva, com o foco na escuta e na organização centrada no momento, como a orientação

para a atividade analítica, de cunho individualista, com base na memória e na forma, com a

música escrita.

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O educador musical e compositor Koellreutter alertava sobre a necessidade da

educação musical que fosse estética e crítica de forma a levar o aluno à investigação, à

especulação, à pesquisa.

um ensino que indica caminhos para a invenção e criação de novas ideias, novos conceitos e novos princípios de ordem; que treina o ouvido como exercício de ler e ouvir, produzir, distinguir e definir qualquer fenômeno sonoro, incluindo o ruído e o som artificial; que faz o aluno improvisar sem determinação do material a ser usado (...) (KOELLREUTTER, 1994, p.13).

A preparação e o aprendizado da improvisação livre se dão pela exploração do próprio

instrumento, que passa a ser uma fonte de material. A técnica não é considerada um fim em si

mesmo, mas sujeita aos aspectos criativos, dando-lhe suporte, pois “desprovida de sua relação

com o instrumentista e com as suas necessidades de expressão, conduz apenas a uma

profissionalização fria e desumanizada” (ALONSO, 2008, p.15). Busca-se o

desenvolvimento de habilidades como flexibilidade, adaptabilidade, eficiência,

expressividade, fluidez, tolerância, independência, coerência e inventividade.

A integração, a exploração das relações entre os músicos, a generosidade para

sacrificar as preferencias individuais e a capacidade para agir e tomar decisões são as

características marcantes dos improvisadores.

E mais ainda, como o improvisador é responsável pelo resultado sonoro do grupo, é

imposto a ele a necessidade de concentração, de respeito, habilidade de escuta, e liderança

para tomadas de decisões durante o processo de criação. Segundo Alonso, o grupo tem que se

descobrir, sentir-se junto, compondo e improvisando em tempo real, seja nos ensaios ou frente

ao publico, em uma atitude coletiva e que revele integração.

A improvisação livre na Educação Infantil

A conexão entre música e cotidiano que a improvisação livre busca estabelecer

contribui para a aproximação e construção de significados musicais por parte da criança, pois

é principalmente durante a infância que se dá a apropriação do mundo social pelo

engajamento em trocas recíprocas que permitem compartilhamento de experiências sociais, de

apropriação cultural, de elaboração de significados, que constituem o referencial, os valores e

a identidade do sujeito. A experiência e a aprendizagem, que se dão a partir da perspectiva

cultural, do cotidiano, da realidade social, exercem papel preponderante no desenvolvimento.

Assim, pela ação e experiência, a vivencia musical propiciada pela improvisação, permite a

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construção e reconstrução em nível cognitivo de esquemas sensoriais, motores e operatórios

que, em relação com a cultura, constituirão a referencia musical das crianças.

A educadora musical argentina, Violeta Gainza, também observa que a improvisação

esta implicada no processo da cultura infantil por contribuir ativamente para a “mobilização e

metabolismo das estruturas musicais internacionalizadas, promovendo a absorção de novos

materiais e estruturas mediante a exploração e manipulação criativa dos objetos sonoros” 1.

No sistema público de ensino no Brasil, o trabalho com a música na Educação Infantil

é enfatizado pelo eixo especifico apresentado no III volume dos Referenciais Curriculares

Nacionais da Educação Infantil (1998). Fundamentado em uma concepção musical

contemporânea, que atenta para o “criar instantaneamente, o eixo música orienta-se por

alguns critérios pré-definidos, mas com grande margem a realizações aleatórias, não

determinadas” (p. 57) e contempla o fazer musical baseado nos jogos de improvisação,

entendidos como “ações intencionais que possibilitam o exercício criativo de situações

musicais” (p.57).

Nesse sentido a improvisação livre pode ser um caminho para que a música venha a

ser trabalhada na EI pelo professor generalista, pois não necessita de um conhecimento prévio

e especifico da sintaxe musical. Pode ser trabalhada por meio de jogos e brincadeiras que

envolvem elementos sonoros básicos e diversos conforme a percepção do professor.

A proposta de improvisação livre na Educação Infantil corrobora o objetivo especifico

da educação musical que segundo Gainza (1988, p. 101) “é de musicalizar, ou seja, tornar o

individuo sensível e receptivo ao fenômeno sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo,

respostas de índole musical” (1988, p. 101), pois tem como foco principal a relação do

individuo com o som e com o grupo.

A “paisagem sonora” da Educação Infantil torna-se um gancho para o aprendizado

musical, como aponta Arianna Sedioli (2003) “a natureza oferece aos bem pequenos as folhas

caindo, a chuva, o trovão, entre outros sons que privilegiam os parâmetros sonoros, uns mais

que outros” (p.27).

Sedioli (2003, p.27) afirma que as crianças pequenas são atraídas pela sonoridade

daquilo que os circunda e iniciam uma interação com o ambiente em forma de jogo

explorativo. Demonstram que passam por um processo de construção, desenvolvimento e

formação de repertório sonoro, uma vez que se apropriam das descobertas sonoras e a

utilizam em seu cotidiano imitando-as e ampliando-as. Sendo assim, se tornam

1 IN Cadernos de Estudos de Educação Musical n.1. s/d. Disponível em www.atravez.org.br. Acesso em 25/04/2010.

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simultaneamente, consumidores, produtores e reconstrutores dos sons do ambiente que os

cercam.

A própria produção sonora das crianças, tais como o balbucio, a lalação (sons com

lábios e boca), o choro, os gritos, a experimentação com os sons do corpo, o olhar atento, a

expectativa do silencio, o toque, pode ser transformada em criações musicais pela mediação

do professor, pois a criança pequena está sempre atenta, interagindo consigo e com seus

pares, com movimentos corporais diversos, demonstrando interesse por situações e estímulos

novos.

Mas a relação do tempo medido pelo relógio, que entra em conflito com os propósitos

da improvisação livre pela necessidade de tempo para explorar, descobrir, analisar, criar e se

apropriar, também se modifica com o aprendizado e as descobertas infantis. A criança precisa

de tempo para brincar, jogar, descobrir, inventar e reinventar, construir significados e pontes

com o conhecimento musical, pois é “mediante a expressão do corpo, mente, emoções e

sentimentos que a criança manifesta suas necessidades e expressa seu conhecimento; há um

outro tempo e um outro espaço na relação adulto-criança” (HADDAD, 2006, p.539). Segundo

a educadora musical Teca Alencar de Brito “o modo como as crianças percebem, apreendem e

se relacionam com os sons, no tempo-espaço, revela o modo como percebem, apreendem e se

relacionam com o mundo que vêm explorando e descobrindo a cada dia” (2003, p.41).

Além da construção do conhecimento musical por meio do professor generalista, a

improvisação livre pode viabilizar uma formação instigadora de novas maneiras de estar e ser

no mundo. Além de ampliar as possibilidades sonoras das crianças, uma formação integral,

ativa e participativa contribui para o desenvolvimento da autonomia, pois como afirma

Moema Craveiro de Campos “improvisar é ter coragem de se colocar, expor-se musicalmente

de acordo o momento, de maneira muito própria, única, expressando o sentimento vivido no

instante” (2000, p.93).

Para Abramowicz, Levcovitz e Rodrigues “uma educação não fascista concebe a

infância como experiência, aceita um currículo pautado no pensamento nômade e vê no

espaço-tempo da aula a possibilidade do ato de criação” (2009).

É certo há de se “romper com a resistência das condutas pré-estabelecidas no bloqueio

e nas fixações pedagógicas” (GAINZA, ibid) e isso não constitui tarefa fácil. Mas, diante

desse desafio,

podemos nos agarrar ao que esta passando ou já passou, ou podemos nos manter abertos e acessíveis - até mesmo entregues - ao processo criativo, sem insistir em conhecer de antemão o resultado final que nos advirá - para

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nós, para nossas instituições, para nosso planeta. Quem aceitar esse desafio estará acalentando a liberdade, abraçando a vida e encontrando um sentido para ela (NACHMANOVITCH, 1993, p.170).

Pois, a improvisação “não propõe o absoluto, o estável, o certo e o errado, mas a

mutação, e por isso, é também vida. É a oportunidade de renovação da educação musical”

(CAMPOS, 2000, p.94).

Considerações Finais

O ensino de música hoje, na educação infantil, encontra-se em processo de construção

diante das grandes transformações pelas quais essa arte passou no século XX e continua

passando no nosso tempo.

Há, atualmente no Brasil, políticas públicas voltadas para esse segmento escolar,

políticas que apontam diretrizes, referenciais e incentivam expectativas de aprendizagens.

O momento é propicio para que pesquisas teóricas e de campo sejam realizadas, para

que as atuações nesse nível de ensino venham a corresponder às expectativas da educação

para o século XXI: educação baseada na diversidade, na flexibilidade, na pesquisa, e na

valorização dos conhecimentos culturais- locais e mundiais.

Por tudo o que foi levantado, considera-se que a improvisação musical livre alinha-se

a essa postura educacional, atendendo a esses princípios educacionais contemporâneos, e

poderá constituir-se em mola propulsora de pesquisas, projetos e realizações sonoro-musicais

no contexto da educação infantil. Os fundamentos da improvisação musical livre respondem

(ou atendem) ao princípio contemporâneo da educação geral, uma vez que contempla, na

prática, o educar, o brincar e o integrar-se socialmente.

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Referências

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A Compreensão das Funções Harmônicas Básicas (Tônica e Dominante)

Através da Aprendizagem de Acordeom: um olhar a partir do fazer

musical de crianças

Jonas Tarcísio Reis Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS)/PPGEDU/CAPES -EDUCAMUS/CNPq [email protected]

Leda de Albuquerque Maffioletti Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)/PPGEDU - EDUCAMUS/CNPq

[email protected]

Resumo: O presente trabalho trata de um projeto de pesquisa em andamento que tem como objetivo compreender e explicar como as crianças de seis a oito anos chegam a compreender as funções harmônicas básicas (tônica e dominante) no contexto da aprendizagem de acordeom. A pesquisa está sendo realizada com três crianças de idade entre seis a oito anos, em um Lar para crianças e adolescentes, localizado na cidade de Porto Alegre – RS. O desenho metodológico da pesquisa se apóia em princípios do método clínico piagetiano. Os dados estão sendo coletados através de entrevistas e observações clínicas. O registro dos dados se dá por meio de diários de campo e filmagens das aulas. Escolheu-se este espaço educativo-musical pelo fato de os educandos estarem imersos em um processo de educação musical com acordeom apianado. Utilizaremos como subsídio teórico o conceito de tomada de consciência proposto por Piaget et. al. (1977; 1978). As questões complementares a serem respondidas são: Quais as estratégias empregadas pela criança para definir a mudança de função harmônica no acompanhamento da melodia em estudo, e a natureza das explicações construídas para justificar suas próprias escolhas? Quais as noções que prefiguram ou estão implicadas na compreensão das funções harmônicas básicas (tônica e dominante) na aprendizagem de acordeom?

Palavras chave: Acordeom, harmonia, tomada de consciência

1. Introdução

É notório que as músicas e o ensino e aprendizagem de instrumentos populares no

Brasil, tais como acordeom, gaita de boca, viola caipira, cavaquinho, bandolim, entre outros,

somente agora vêm adquirindo mais espaço no ensino superior.

O acordeom foi um instrumento inventado para ser usado na interpretação de música

tonal (com harmonia tonal), embora, também, seja utilizado na interpretação de repertório

atonal na atualidade, principalmente em países onde ele já foi amplamente incorporado aos

circuitos da música erudita, como na Europa e Ásia.

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A baixaria do acordeom é a parte onde se toca o acompanhamento rítmico-harmônico.

Foi organizada considerando o círculo das quintas, possibilitando o fácil deslocamento entre

as funções harmônicas básicas do sistema tonal, a saber: Tônica, Subdominante e Dominante.

Complementarmente, é necessário frisar que a baixaria do acordeom está disposta fisicamente

de modo igual em todos os modelos, variando apenas em números de botões (baixos). A

técnica para a construção de acompanhamento nessa parte do instrumento é semelhante nas

diferentes culturas musicais que fazem uso do acordeom. Porém, algumas variações são

encontradas de acordo com a cultura musical propagada (REIS, 2010a, p. 29). Muitos são os

conhecimentos musicais a serem produzidos na aprendizagem de acordeom, a harmonia é um

deles. E ela vem sendo pouco abordada nas pesquisas da área de Educação Musical.

“Acordes maiores, menores, de sétima da dominante e sétima da diminuta são obtidos

ao apertar apenas um baixo. Tal mecanismo facilita a construção dos acompanhamentos

rítmico-harmônicos na baixaria” (REIS, 2010a, p. 23). O acompanhamento é como se fosse

uma espécie de plataforma por onde andam os sons principais presentes na melodia. O que

fica em nossas mentes em um primeiro momento são as melodias, mas, embora muitas vezes

não tenhamos consciência, elas estão escritas, construídas com base em um suporte

harmônico consciente ou inconscientemente concebido pelo compositor (LEVITIN, 2010).

Parece que a peculiaridade concebida ao acordeom pelo fato de a baixaria ter de ser

tocada sem podermos visualizar as ações motoras nela empregadas têm implicações na

aprendizagem das funções harmônicas básicas (Tônica e Dominante) da harmonia tonal. Esta

peculiaridade oportuniza ao aprendiz a criação de outros mecanismos para usar a baixaria com

eficiência, por não poder ver o que está fazendo. É possível olhar a baixaria caso se queira,

mas é dificílimo fazê-lo durante a interpretação musical com o instrumento.

Assim, esta pesquisa buscará trazer avanços conceituais e teóricos para a área de

Educação Musical. Terá implicações diretas na minha formação profissional, pois poderá

revelar a natureza das dificuldades que os alunos enfrentam na interpretação de música tonal

no acordeom1 ao ter de conciliar a interpretação simultânea de melodia (no teclado) e

acompanhamento rítmico-harmônico (na baixaria). Procurará trazer para o campo da

psicologia da aprendizagem musical, novas reflexões acerca da compreensão e da

aprendizagem de harmonia no acordeom, bem como sobre a conceituação harmônica por

parte de crianças. Servirá também para compreendermos como a aprendizagem de harmonia

funciona neste instrumento para podermos exercitá-la com base em um conceito claro, uma

1 Existem vários modelos de acordeom. Nesta pesquisa usamos o acordeom apianado de 24 baixos que facilita o manuseio por parte de crianças pelo seu tamanho reduzido.

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vez que dominar alguns princípios da lei harmônica tonal subsidia: a atividade de “tirar

música de ouvido”, muito presente na prática musical popular; o acompanhamento

instrumental de canções na figura das improvisações; como requisito à prática composicional

tonal.

2. Objetivo Geral

Compreender e explicar como as crianças de seis a oito anos chegam a compreender as

funções harmônicas básicas (tônica e dominante) no contexto da aprendizagem de acordeom.

2.1 Objetivos específicos

Identificar as estratégias empregadas pela criança para definir a mudança de função

harmônica no acompanhamento da melodia em estudo, e a natureza das explicações

construídas para justificar suas próprias escolhas.

Identificar as noções que prefiguram ou estão implicadas na compreensão das funções

harmônicas básicas (tônica e dominante) na aprendizagem de acordeom.

3. Justificativa

A prática musical com acordeom é um fato muito presente na Música Popular

Brasileira (MPB) - maiormente nos regionalismos compostos por gêneros musicais mais

antigos, anteriores a década de 1950, como na: Música Popular Gaúcha (MPG); Música

Caipira; Música Nordestina; etc. Contudo, a sua discussão no âmbito acadêmico é

severamente escassa. Isso é explicado pela ausência significativa do acordeom no contexto da

música erudita, que ainda impera como atriz principal no palco das graduações em música

desta nação.

Com isso, são poucos os trabalhos de discussão sobre os fenômenos culturais e

educacionais envolvendo o acordeom. Na literatura brasileira temos três monografias relativas

à processos educativo-musicais com acordeom (PERSCH 2006; MACHADO, 2009; REIS,

2010a) nove artigos (REIS, 2009, 2010b, 2010c, 2010d, 2010e, 2010f; REIS; BEYER, 2010;

REIS; BÜNDCHEN, 2010; WEISS; LOURO-HETTWER, 2010), e uma dissertação

(ZANNATA, 2005) escrita no campo das ciências sociais. Assim, na condição de professor-

pesquisador, seguimos empreendendo esforços para compreender melhor o ensino e a

aprendizagem de acordeom em contextos brasileiros. Mas, agora, o foco estará mais voltado

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para a compreensão da aprendizagem de acordeom do que para o ensino deste instrumento,

diferentemente de empreitadas anteriores (REIS, 2009, 2010a).

A discussão sobre cognição musical no campo da harmonia requer fôlego e novas

investidas investigativas, uma vez que a área, ainda, é carente de pesquisas nesse sentido.

Poucos são os trabalhos acerca da aprendizagem e compreensão harmônica musical. Destaca-

se o trabalho realizado por Pecker (2009), que buscou compreender os processos cognitivos

que asseguram as conquistas das crianças de dois a cinco anos de idade sobre os modos do

sistema tonal. Pecker (2007) também traz reflexões nesta mesma linha temática. Na literatura

internacional os trabalhos de Costa-Giomi (1994a; 1994b; 2001a; 2001b; 2003) sobre o

desenvolvimento da percepção harmônica na infância igualmente podem ser mencionados

como relevantes para as reflexões que queremos projetar nesse estudo. Do ponto de vista

cognitivo entendemos, neste estudo, percepção como um primeiro reconhecimento, por parte

do sujeito, de algo existente em objetos com os quais interage.

A harmonia é o eixo central da música. Ela estabelece as relações entre os objetos

sonoros que formam as obras musicais, e por isso, cada indivíduo que manipula e cria algo

que pode ser chamado de música estará fazendo uso singular de leis harmônicas já existentes,

ou, então, estará promovendo uma nova invenção. Foi através desse tipo de promoção que os

novos sistemas harmônicos emergiram e emergem no mundo atual. Nesse sentido, do ponto

de vista educacional que nos apetece, levar o educando à compreensão do aspecto individual

da invenção harmônica consiste em uma das mais importantes tarefas de um ensino de

harmonia para a produção artística (MOTTE, 1994, p. 18). A eficácia, aplicabilidade e

receptividade das relações harmônicas criadas ou reproduzidas em novas obras musicais é

fruto direto da interação entre o sujeito - seja este, alguém que crie, recrie, aprecie, dance, ou

interaja de algum outro modo possível com os conglomerados sonoros - e o material musical

em foco. Assim, a compreensão de determinadas elaborações harmônicas contidas nas

músicas de específicos grupos humanos depende dos mecanismos cognitivos social e

culturalmente desenvolvidos destes.

Nessa perspectiva, como educadores musicais e pesquisadores, nosso desejo se

encontra numa circunscrição que aponta e reside na inquietação de compreender e explicar

como as crianças de seis a oito anos chegam a compreender as funções harmônicas básicas

(tônica e dominante) no contexto da aprendizagem de acordeom. Trata-se de uma temática

ainda não interpelada pela área de educação musical. E é necessário sabermos como o sujeito

aprende tal elemento da linguagem musical, desvelando os possíveis obstáculos que podem

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emergir no processo de ensino-aprendizagem, para posteriormente subsidiarmos a

estruturação de práticas pedagógico-musicais que facilitem os processos de construção de

conhecimento musical. O estudo sobre como as crianças aprendem é necessário para melhorar

a educação musical.

4. Desenho metodológico

Esta pesquisa se caracteriza pela sua natureza qualitativa. Qualitativa por que

buscaremos compreender, interpretar e apreender a estrutura do pensamento da criança. Sem

com isso almejar mensurações ou quantificações como pressupõe as pesquisas de natureza

quantitativa, muito menos usar classificações de modo a enquadrar os sujeitos em modelos de

certo ou errado estritamente. Pelo contrário, queremos aprofundar-nos no estudo das causas

que levam o sujeito a pensar de modos específicos, nos atendo aos detalhes que lhe são

inerentes no que tange a compreensão harmônica musical via aprendizagem de acordeom.

Tal investida é desafiadora, porque sabemos que fazer pesquisa sobre a construção de

conhecimento em crianças é difícil, uma vez que a clareza no discurso delas é uma

característica quase ausente para subsidiar a compreensão do pesquisador acerca de como elas

aprendem e pensam. E isso já fora constatado pelos estudiosos da Epistemologia Genética,

liderados por Jean Piaget. Tendo essa premissa como fato consumado, a alternativa que se

apresenta com melhores sinalizações de viabilização da compreensão do pensar infantil, é o

uso de alguns princípios do Método Clínico como estratégia básica para a presente pesquisa

em comum acordo com os alinhavos teóricos que sustentarão a interpretação dos dados e

exposição dos resultados.

Kebach (2003), Maffioletti (2005) e Pecker (2009) já fizeram uso deste método em

pesquisas no campo da cognição musical. Ele engloba observação, experimentação e

entrevista clínica. A experimentação é uma situação criada para observar a ação do sujeito

diante de um objeto específico. A entrevista foca a representação verbal do sujeito acerca de

suas ações (KEBACH, 2002).

O método clínico é um procedimento de coleta e análise de dados para o estudo do

pensamento humano. A coleta é realizada por meio de “entrevistas” ou “situações muito

abertas”, onde a meta é acompanhar o curso do pensamento do sujeito diante de uma situação-

problema, “fazendo uso de novas perguntas para esclarecer respostas anteriores. Consta,

portanto, de algumas perguntas básicas e de outras que variam em função do que o sujeito vai

dizendo e dos interesses que orientam a pesquisa que esta sendo realizada” (DELVAL, 2002,

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p. 12). Usa-se da contra-argumentação “do seu ponto de vista para captar a lógica mais

profunda sobre a qual se apóia” e “compreender sobre quais bases assenta-se seu raciocínio”

(MAFFIOLETTI, 2005, p. 137-136).

O estudo será feito com três crianças2 de seis a oito anos de idade, de um Lar para

crianças e adolescentes situado na cidade de Porto Alegre, com consentimento legal para

participarem da pesquisa. A entidade fora escolhida por ser o local onde são desenvolvidas

atividades pedagógico-musicais com acordeom para crianças desta faixa etária. É uma

entidade não-governamental que presta serviços de amparo a crianças e adolescentes menores

de dezoito anos de idade.

4.1 Coleta de dados

Os dados serão coletados através de entrevistas semi-estruturadas e observações do

fazer musical dos educandos nas aulas individuais de acordeom. Esse tipo de entrevistas se

constitui de perguntas básicas comuns para todos os sujeitos, que irão sendo “ampliadas e

complementadas de acordo com as respostas dos sujeitos para poder interpretar o melhor

possível o que vão dizendo” (DELVAL, 2002, p. 147).

As entrevistas serão feitas durante os eventos educativo-musicais, mais precisamente

no momento da aprendizagem da conjugação das duas mãos na interpretação musical com

acordeom, instigando as crianças a explicar o que estão fazendo, o que fizeram, e o que

pensaram em fazer para desempenhar tal tarefa musical. Isto será feito durante doze semanas

de aulas, com uma hora de aula de acordeom por semana com cada criança, totalizando doze

horas de aulas por sujeito.

Durante estas aulas as crianças aprenderão três músicas (três valsas compostas

exclusivamente para este fim) com evolução harmônica idêntica (quatro compassos iniciais

feitos com acompanhamento de acorde de Tônica, seguidos de quatro compassos com

acompanhamento de acorde de Dominante, e um nono compasso na Tônica, finalizando a

composição), porém em tonalidades diferentes, para verificarmos a construção de

conhecimento harmônico. Durante a aprendizagem, as atenções do professor-pesquisador

estarão voltadas para a compreensão das estratégias empregadas pelas crianças para chegar à

interpretação tocando melodia e acompanhamento rítmico-harmônico concomitantemente.

2 Para preservar a identidade dos sujeitos de pesquisa, usaremos letras escolhidas aleatoriamente para referir-nos aos mesmos.

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As entrevistas serão usadas para que as crianças verbalizem sobre as estratégias

empregadas no curso da sua aprendizagem, e comuniquem as suas representações mentais

acerca do seu fazer para compreendermos como elas pensam. Para as entrevistas, as perguntas

básicas serão:

- Como você sabe quando tem que mudar o acompanhamento na baixaria?

- No que você se baseia para tocar as duas partes juntas (acompanhamento e melodia)?

- Como você sabe o momento de mudar?

- Esta música tem algo de parecido com a outra que tocastes?

- Nos baixos tem alguma coisa que você faz baseado na outra música, ou é tudo novo?

Quando o sujeito estiver tocando a segunda e terceira músicas, será questionado por

que razão achou que devia trocar o acompanhamento em determinado momento a fim de

identificarmos os processos cognitivos envolvidos e se faz relações entre as evoluções

harmônicas das músicas. Posteriormente, será colocado aos educandos o desafio de identificar

semelhanças entre as obras estudadas e o que se faz igual ou não em termos de

acompanhamento nelas, valendo-se estritamente de suas memórias.

Quando envolvidas no seu fazer musical com acordeom questionarei as crianças sobre

quais estratégias estão empregando para saber quando mudar o acompanhamento. Procurarei

apreender o nível de compreensão que as crianças contraem sobre seu próprio fazer, e que

mecanismos elas põem em ação para saber o momento exato de mudar o acompanhamento do

campo da Tônica para a Dominante e vice-versa, e a natureza das explicações construídas

para justificar suas próprias escolhas. Buscarei tornar explícitas: as possíveis causas da

estruturação do saber harmônico como necessário a continuação da aprendizagem no

acordeom, identificando o que das ações anteriores fora generalizado; as coordenações

inferenciais e de ações que possibilitam a aprendizagem harmônica no uso do acordeom; as

noções que prefiguram ou estão implicadas na compreensão das funções harmônicas básicas

(tônica e dominante) na aprendizagem de acordeom; a composição de generalizações acerca

dos encadeamentos idênticos entre as funções harmônicas básicas presentes no repertório

tonal em estudo.

4.2 Registro dos dados

Os dados serão registrados através de diários de campo de acompanhamento

individualizado, e gravação audiovisual das aulas e entrevistas para podermos rever as ações

dos sujeitos. Serão doze horas de gravação de aulas por educando. Desse total serão

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recortadas partes onde as entrevistas clínicas foram realizadas. Nos diários de campo serão

registradas as análises das aulas de acordeom, e todas as atitudes e manifestações dos

educandos que possam implicar na estruturação do conhecimento harmônico. Com base nos

dados registrados, far-se-á a composição de protocolos únicos para cada sujeito pesquisado

descrevendo a sua aprendizagem.

Os procedimentos para a composição dos protocolos serão:

- Degravação integral das entrevistas, e parcial das aulas (partes onde a problemática

harmônica se mostrar evidente na aprendizagem musical com acordeom);

- Síntese analítica das sequências de ações dos educandos durante as aulas a partir dos

registros no diário de campo, com identificação do sujeito e datação do acontecimento

educacional;

- Avaliação das entrevistas e observações com base nos conceitos teóricos (adaptação,

assimilação, acomodação, esquema, coordenações de ações, inferência, generalização,

compreensão, tomada de consciência, conceituação, fazer e compreender) adotados à

pesquisa. Esse procedimento irá permitir o mapeamento das peculiaridades identificadas no

fazer e compreender dos indivíduos pesquisados, viabilizando a construção de articulações

entre o processo de compreensão das funções harmônicas básicas dos três sujeitos

pesquisados.

4.3 Parâmetros das análises

O desenvolvimento da compreensão das funções harmônicas básicas (Tônica e

Dominante) será analisado a partir do fazer musical das crianças com o acordeom, dos

diálogos verbais estabelecidos com o professor na sala de aula, e pelas condutas dos alunos

frente aos questionamentos colocados nas entrevistas clínicas realizadas nas aulas. Isso

permitirá destacar a conduta do educando frente aos desafios da aprendizagem de acordeom,

procurando perceber no que o sujeito baseou-se para aprender a música em questão na aula.

Será possível identificar se o apoio encontra-se em aspectos motores estritamente, decorando

por contagem de tempos o momento de mudar de função harmônica no acompanhamento

rítmico-harmônico, ou se fundamenta na cadência e na sensação de tensão e repouso existente

na melodia para guiar a interpretação do acompanhamento. Assim, identificaremos, o apoio

sobre a noção de ritmo harmônico, caracterizando, por conseguinte e, com efeito, a efetuação

de generalizações a partir das experiências de aprendizagem construídas com as três músicas

empregadas no estudo. Desse modo será possível desvelar os enlaces lógicos que constituem a

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compreensão das funções harmônicas como conhecimento estruturado e também como

subsídio a aprendizagem de outras obras musicais, ancorado no aparato teórico

epistemológico que embasa esta pesquisa.

Os parâmetros para as análises dirigem a atenção diretamente para as ações das

crianças frente à junção da interpretação da melodia com o acompanhamento rítmico-

harmônico das músicas em estudo. Através das próprias ações das crianças no fazer musical

poderemos observar as relações e conexões do seu pensamento, podendo, eventualmente,

pedir esclarecimentos sobre como conseguiram desempenhar determinada tarefa, ou superar

um obstáculo posto em evidência. O interesse é explicar o desenrrolar da compreensão das

funções harmônicas básicas no acordeom, sabendo que é preciso fazer para compreender, e

tendo a hipótese de que é preciso ter construída as noções tensão, repouso e cadência da

harmonia tonal, estando envolvidas as noções de consonância e dissonância (sons que

combinam ou não). A observação clínica será baseada nestes princípios teóricos previamente

estabelecidos pelo pesquisador, do contrário ficaríamos a observar qualquer coisa.

Tendo o pesquisador acompanhado o desenrolar do fazer musical dos educandos,

buscará a coerência entre o fazer musical deles durante as aprendizagens e a maneira como

refletem sobre elas, como as verbalizam. Na análise visaremos à interpretação: das reações do

sujeito frente às atividades propostas; das explicações fiduciosas e hesitosas dadas sobre como

fazia para aprender; dos seus comentários arbitrários durante as aulas, revelando momentos

ricos do seu pensar e refletir. Buscar-se-á, sempre, coerência entre os dados analisados e o

corpo teórico proposto, o que caracterizará o grau de confiabilidade da novidade trazida pelo

estudo.

Na análise dos dados, mediante as leituras dos protocolos, pretende-se estabelecer

paralelos entre o pensamento de um e de outro aluno no sentido de identificar patamares

comuns na estruturação do conhecimento sobre as funções harmônicas básicas. O

procedimento comparativo é necessário para aprofundar a compreensão a respeito de um

fenômeno específico para, verdadeiramente, compreender possíveis nuances e diferenças na

aprendizagem musical harmônica, sem, com isso, almejar hierarquizações ou quantificações.

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A Recriação Musical no Teclado: reflexões pedagógico-musicais com “O

Filho do Piano”

Jonas Tarcísio Reis Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS)/PPGEDU/CAPES -EDUCAMUS/CNPq [email protected]

Filipe Batista Minho Secretaria Municipal de Educação

de Porto Alegre (SMED) [email protected]

Resumo: A conjuntura atual de efervescência tecnológica resulta em efeitos diretos no ensino de música, implicando novas possibilidades de vivência e construção de conhecimento musical. Neste sentido, este trabalho congrega reflexões sobre possibilidades de ensino e aprendizagem de teclado com crianças, tendo como campo empírico aulas particulares realizadas por dois professores de música na região metropolitana de Porto Alegre - RS. Discute-se a importância de considerar o desejo do educando e o seu saber musical informal na recriação musical no teclado. Abordam-se os recursos disponíveis no instrumento para o enriquecimento da prática pedagógico-musical, visando a aproximar o aluno do “filho do piano” (teclado) através de recursos tecnológicos disponíveis nele.

Palavras chave: Teclado, ensino e aprendizagem musical, recriação musical

Introdução

No tempo atual borbulham abundantemente novas informações e surgem, cada vez

mais, novas tecnologias. Isso repercute diretamente na aula de música. Nesse contexto, que

não é novo, o teclado emergiu no cenário do ensino e aprendizagem de instrumentos musicais.

Surgiu não de forma a tomar o espaço do piano - que já está consolidado na cultura musical

ocidental, principalmente -, mas, sim, em um movimento em que as novas tecnologias

permeiam frequentemente as aulas de instrumentos musicais. Esse momento histórico, onde a

tecnologia é grande atriz, leva ao surgimento de interesses diferentes pela aprendizagem

musical, onde a possibilidade de trabalhar e brincar com timbres e outras características do

som e da música, em um instrumento musical harmônico ligado ao nosso tempo, insere os

alunos em um contexto que é inevitável: o de seu cotidiano, da modernidade, da diversidade,

dos sons eletrônicos, etc.

Levando em consideração tais ponderações, este artigo busca trazer reflexões sobre o

ensino de teclado para crianças em alguns contextos específicos, apresentando considerações

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para a área de estudos sobre a recriação1 musical à luz do legado teórico de Jean Piaget e de

discussões realizadas na área de educação musical acerca do ensino do referido instrumento

(SANTOS, 2005, 2006; AMARAL e TAVARES, 2011; VERHAALEN, 1989; OBA e

LOURO, 2010; PEREIRA, 2004; NEVES, 2002). A base empírica advém de aulas realizadas

em escolas particulares de música de Porto Alegre, e também de aulas desenvolvidas no

LARCAMJE (Lar da Criança e do Adolescente Menino Jesus)2, localizado na mesma cidade.

Como as aulas foram desenvolvidas pelos autores, todas as reflexões partem diretamente da

prática destes.

A discussão buscará evidenciar os específicos caminhos seguidos durante a prática

docente que visa a aproximar o aluno do instrumento através de recursos tecnológicos que

estão disponíveis no “filho do piano”. Chamamos “filho do piano” porque o teclado advém

desta necessidade, por razão da evolução tecnológica, de suprir aspectos não saciados no

piano e em seu ensino, sem desconsiderar a técnica e o legado histórico deste. Ou seja,

consideramos que o teclado é a continuação (ramificação) do piano em um contexto moderno

– que está em constante inovação e transformação –, assim como uma família constitui sua

descendência através do nascimento de filhos. Diante disto, encontra-se uma das principais

características do ensino de teclado. As novas possibilidades educacionais musicais

influenciadas pela evolução tecnológica também se tornaram um fator de inclusão de muitos

alunos, tendo também importância a emergência do acesso em larga escala a instrumentos

mais baratos, pois produzidos em grande quantidade.

Considerando o Desejo do Aluno na Recriação Musical no Teclado

No LARCAMJE a proposta de educação musical desenvolvida visa a propiciar o

acesso dos moradores do Lar à educação musical formal, em uma perspectiva construtivista e

1 Ao invés de usar o conceito de execução musical como comumente se tem empregado na área científica de Educação Musical no Brasil, optou-se pelo termo recriação, pelo fato de que nenhuma obra musical pode ser apresentada, tocada ou cantada duas vezes da mesma maneira, do ponto de vista psicológico. Toda execução musical, embora possa ser da mesma música, nunca será idêntica a anteriores, principalmente pelo fato de cada interprete aplicar os seus conhecimentos musicais no fazer musical específico. Então, cada execução, verdadeiramente, trata-se de uma recriação musical, visto que emerge visual e sonoramente com variações. Estas variações podem ser facilmente observadas e identificadas, ou surgir tão sutilmente que somos capazes de dizer que uma interpretação se dera de modo igual à outra específica apresentação que tomamos por base. Todavia, os elementos presentes em uma apresentação sempre se diferenciam em algum ponto dos elementos que constituíram modelos anteriores. Portanto, por mais que determinado professor, sendo adepto de uma visão epistemológica empirista, queira que a interpretação da obra musical específica, que é objeto de estudo em determinado momento, seja uma “reprodução mecânica” (KEBACH, 2008), pura, feita pelo aluno, ela não ocorrerá, por causa dos fatores supracitados. 2 Entidade filantrópica que presta serviços de amparo a crianças e adolescentes menores de dezoito anos de idade oriundos de situações de vulnerabilidade social.

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libertadora, fundamentada em alguns dos pressupostos teóricos piagetianos e freirenianos, tais

como o respeito ao tempo de aprendizagem do aluno, a valorização do saber informal e das

interações sociais e a autonomia e liberdade para aprender, propiciando uma postura

educativo-musical fomentadora de aprendizagens significativas para os educandos. O foco

principal do ensino é a musicalização por meio da prática de conjunto de flauta doce, canto e

percussão, e individual de teclado e acordeom, enfatizando atividades calcadas no eixo

triádico formado por apreciação, recriação e criação musical3. As músicas usadas para se

aprender a tocar, e aprofundar o nível de domínio sobre o teclado, são as mesmas utilizadas

no ensino dos instrumentos supracitados. São músicas folclóricas e obras musicais retiradas

do cancioneiro popular brasileiro. Isso acontece desta maneira porque o conhecimento prévio

das melodias e dos ritmos das obras musicais tocadas naqueles instrumentos permite a

dedicação maior a outros elementos da música, como harmonia e forma, e da técnica

específica de tocar teclado por parte das crianças. Portanto, no aprendizado a atenção se volta,

inicialmente, para a formação de esquemas motores próprios para a interpretação musical no

teclado das obras que são escolhidas pelos alunos dentre aquelas que já conhecem.

Um dos princípios das aulas de teclado é não expor o aluno à aprendizagem de uma

série grande de elementos musicais ao mesmo tempo, mas sim desenvolver cada conteúdo

musical para promover a construção do conhecimento musical, de forma que a criança se

aproprie e compreenda cada aspecto musical trabalhado em aula. Destarte, também a busca

não é por ensinar a tocar por partitura, compreendendo esse instrumento na sua complexidade

imediatamente, ou fazer com que os alunos sejam detalhistas ou ensinar desde as primeiras

aulas as obras musicais nos seus mais variados elementos formadores, nos mínimos detalhes.

Os processos de ensino e aprendizagem ocorrem com agregação gradual de elementos

musicais que, ao final, resulta na interpretação quase fiel4 da obra tomada como conteúdo. O

indivíduo é levado, através da prática pedagógica e da manipulação ativa do objeto musical a

sucessivas tomadas de consciência (PIAGET et al., 1977; 1978), que o conduzem ao domínio

cada vez mais aprofundado da linguagem musical.

Sabemos que cada sujeito manipula o objeto musical de uma forma diferente, visto

que possui esquemas mentais diferentes (BEYER, 1996). Desta forma, por desenvolverem

diferentes processos de aprendizagem, vários indivíduos que compõem um mesmo corpo

discente assumem objetivos musicais diversos. Por isso, uma recriação musical em conjunto,

3 Para aprofundamentos sobre o ensino musical no LARCAMJE, ver REIS, 2009a; 2009b; 2009c. 4 Usa-se a expressão quase fiel, por tratar-se de uma interpretação que contém elementos e intenções de cada indivíduo.

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por exemplo, é o somatório das interpretações semelhantes dos interpretes envolvidos. A

recriação musical de uma mesma música por diferentes pessoas carrega características

próprias, principalmente quando aliada a liberdade expressiva, culminando no

desenvolvimento de condutas criativas no fazer musical coletivo.

No entanto, esta recriação musical coletiva normalmente não acontece na escola de

música. Somente ocorrerá se em tal instituição forem oferecidas aulas em grupo que

oportunizem tal vivência aos seus alunos. No entanto, uma das principais características da

aula particular de um instrumento musical, principalmente no ensino do teclado, é a recriação

musical individual.

Em um modelo pedagógico mais clássico, o professor disponibiliza, ao início da aula,

a partitura da nova música que deve ser aprendida até o fim da aula, e o produto final

satisfatório é a simples reprodução do que está escrito na pauta. Por causa de ações docentes

como estas, muitos são os alunos que se decepcionam, porque não vêem relação daquilo que

fazem em aula com o que, verdadeiramente, desejam vivenciar como indivíduos ativos

musicalmente. Desta forma, não há interesse para fazer e, consequentemente, o aluno não

ativa instrumentos cognitivos para resolver problemas e transcender dificuldades.

Portanto, como professores libertadores conscientes de nosso papel educacional,

sabemos que o desejo discente é fundamental para o processo de aprendizagem e, muitas

vezes, este anseio está explícito em frases constantemente ouvidas nas aulas, como “quero

formar uma banda de...”, “ vim aprender porque entrei em grupo”, “ quero só tocar com

minha família e amigos”, “ quero tocar porque gosto do som...”, entre outras, seja da resposta

mais simples a mais complexa, são recorrentes nos discursos de alunos particulares de

instrumento. Entretanto, no ensino tradicional, o professor nem ao menos oportuniza ao aluno

um espaço de liberdade para conhecer sua vivência musical, perguntando sobre suas cobiças e

experiências prévias relacionadas à música. E é neste ponto que se encontra uma das

principais diferenças entre o modelo tradicional e a abordagem construtivista e libertadora.

Neste sentido, levá-lo até a exaustão com reproduções individuais constantes, sem

proporcionar liberdade expressiva e o desenvolvimento da capacidade criativa, ou não

oportunizar momentos onde o aluno possa vislumbrar sua interpretação individual no âmbito

coletivo, pode não produzir relações de significado e, consequentemente, frustrar as

expectativas geradas pelo aluno a respeito do próprio aprendizado musical. E, assim, muitos

são aqueles que, por causa destes motivos, não permanecem nem ao menos seis meses em

uma aula particular de instrumento.

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Na contramão disto, o ensino do teclado reaproxima este aluno, em sala de aula, do

contexto modernizado no qual ele está inserido no dia-a-dia. Através dos recursos disponíveis

no teclado, que podem ser utilizados para ampliar a ludicidade como fator preponderante nas

aulas para as crianças, o professor desenvolve práticas que abordam diversos conteúdos, como

pulsação, ritmo, acompanhamento na interpretação musical, reconhecimento de timbres e

estilos, parâmetros do som, etc., de modo ímpar.

Tudo isso se torna mais prático quando contemplamos uma situação típica de uma aula

de teclado. Cada indivíduo cultiva suas preferências musicais e as leva para o aprendizado do

instrumento (sobre o ensino centrado no aluno, ver GLASER; FONTERRADA, 2006). Se o

professor em questão tiver sua ação pedagógica baseada no pensamento construtivista, ele

trabalhará também com o conhecimento e gosto musical trazido pelo aluno, compreendendo

que nunca se aprende algo novo do nada, nunca se parte do zero, pois as bases para as novas

construções, de alguma forma, mesmo sendo esta elementar, já estão lançadas. Nisso, o

diálogo saber formal e saber informal musical (ARROYO et al. , 2000; WILLE, 2003; REIS,

2009d) surge na aula de música como uma ferramenta e uma prática indispensável para a

construção do conhecimento musical do educando de maneira significativa, pois permite o

estabelecimento de relações entre o que se sabe, o que se quer saber, e o que é necessário

saber para atingir um fim que é construído democraticamente entre docente e discente.

Os Desafios do Repertório

Abordar o ensino de músicas pertencentes a estilos musicais recorrentes nos discursos

dos alunos, como o rock, o pop, o pagode, etc., evidencia outra problemática, visto que há a

necessidade de mais instrumentos e pessoas para alcançar o produto sonoro desejado pelo

aluno através de sua interpretação. É neste aspecto que o teclado se encaixa perfeitamente,

evidenciando algumas de suas possibilidades para o trabalho com esse tipo de repertório.

Neste caso, a bateria da versão original da música estudada pode ser programada no teclado.

Podemos programar, também, outros instrumentos musicais, como baixo, guitarra, violão,

entre tantos outros encontrados no instrumento teclado. Logo, o aluno é levado a um processo

de recriação musical em nível de produção de arranjo musical, uma interpretação individual

diferente, que contempla características da música original.

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Outro aspecto constantemente vivenciado nesta recriação musical no teclado concerne

à instrumentação da música escolhida. Muitas das grandes obras da música erudita ocidental5

foram compostas para orquestra. Dessa forma, utilizar esse repertório no piano nem sempre

gera o resultado sonoro esperado pelo aluno. As notas que devem ser tocadas, a pulsação

imprimida e a expressão podem estar perfeitas, de acordo com o que foi estipulado, mas “não

é este som que está na música que eu ouço...”, “ não está igual à música do CD”, “ está

faltando alguma coisa”, são algumas das frases que os alunos costumam afirmar. Como

exemplo, pode-se citar “Assim Falou Zaratustra”, de Richard Strauss, e a “5ª Sinfonia”, de

Ludwig van Beethoven, como obras da música erudita que permanecem no cotidiano musical

da sociedade, seja através da mídia ou relacionamentos familiares ou de amizade. Isto nos

leva a acreditar que este repertório não está distante dos ouvidos das crianças, e que o teclado,

através de seus recursos, pode reaproximar cada vez mais o aluno de estilos musicais que não

seriam contemplados em outras abordagens. Por exemplo, ao interpretar músicas como estas

no piano, a sensação do aluno é que, por mais que as notas estejam corretas, a música não está

completa ainda. Ora, em parte, ele está certo!

Por conseguinte, sendo os alunos de teclado também conhecedores do produto sonoro

destas músicas, muitas vezes, não estarão satisfeitos em ouvi-las somente com a sonoridade

do piano. Nesse ponto se encontra mais um recurso disponível no teclado: a seleção de

timbres. Dessa forma, a mesma interpretação, de uma obra para orquestra, que seria feita no

piano tem um produto sonoro mais aproximado do original, gerando outro significado para o

aluno quando feito no teclado com a seleção de timbres de cordas.

Outro recurso trazido pela evolução tecnológica é a gravação. Assim como acontece

com a voz cantada, tocar e logo após ouvir a interpretação serve como ferramenta para a

correção de erros e lapidação dos resultados obtidos. Isso é possível também no ensino do

teclado, permitindo o acompanhamento da construção do conhecimento musical do aluno a

partir da análise da recriação musical gravada. E, acima de tudo, essa análise não é feita

somente pelo professor, mas, sim, e muito mais, pelo próprio aluno que, ao ouvir sua

recriação, julga quais ações foram corretas e quais devem ser reformuladas na próxima vez,

em um processo constante de ação-reflexão-ação. De tal modo, este recurso tem sido cada vez

mais utilizado pelos professores com o intuito de mostrar para o próprio aluno o

5 Utiliza-se como exemplo a música erudita ocidental com o intuito de fomentar estratégias educativo-musicais no teclado, trabalhando o repertório comumente utilizado no ensino do piano, mostrando uma abordagem diferente desse repertório.

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desenvolvimento do seu processo de construção do conhecimento musical: as etapas pelas

quais passa até a obtenção de um produto final.

Nessa linha reflexiva, convém lembrar que o caminho da aprendizagem é regado

também por dois aspectos indispensáveis para qualquer aula de música, seja individual ou

coletiva: interesse e significação. Por exemplo, o aluno que está na aula de teclado ou piano

por que este é o sonho dos seus pais poderá não demonstrar a mesma vontade daquele que

descobriu por si mesmo a preferência em tocar um ou outro instrumento musical. Não basta

estar presente em aula: é necessário o interesse em fazer. Isso produz significado para toda e

qualquer ação discente e gera efetividade para toda e qualquer ação docente. E, atualmente, o

aluno está inserido em um tempo onde o conhecimento sobre o avanço e a evolução

tecnológica é essencial para a sua convivência social. Por esta razão, dentre outras, como a

necessidade de saber mais e de ser mais (FREIRE, 2005), seu desejo em continuar

conhecendo está relacionado com a significação e com a constante construção de novos

conhecimentos a cada aula, a cada instante em que age musicalmente sobre os objetos

musicais e estes sobre ele.

Ao oferecer um ensino em que a cada nova aula coloca-se um novo desafio a ser

superado para o aprofundamento no saber musical, uma nova informação para ser convertida

em conhecimento, e um novo conceito para ser construído, estamos gerando movimentos pela

busca no aperfeiçoamento da arte de tocar teclado. Constantemente, o aluno se sente

desafiado e munido do desejo de superar barreiras e de contornar problemas, que quando

efetivamente resolvidos, fazem com que o aluno passe a acreditar com mais segurança no seu

poder de realização de determinadas tarefas. O indivíduo passa a crer com mais força, com

convicção nas suas capacidades, não só como músico, mas também como ser humano que faz,

que é capaz, que é ativo como aqueles com os quais convive ou dos quais tem informações

(FREIRE, 2005).

Considerações Finais

Refletindo a respeito do aproveitamento das aulas e da transformação das informações

em conhecimento pelos educandos, também fazemos a seguinte aferição: não basta termos

instrumentos, boa infra-estrutura, ótimas intenções pedagógicas e excelente metodologia, pois

o aluno precisa ser cúmplice nesse processo de acreditar no valor da música e do

conhecimento musical para a vida, estando motivado (no sentido de ter desejo de fazer) para

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agir sobre a música e dela retirar elementos para a complexificação da sua cognição musical.

Desse modo, a proposta de educação musical significativa será concretizada.

Por exemplo, Mansion (1999, p. 17) fala sobre a voz, que não basta tê-la, é necessário

fazê-la vibrar melodiosamente, “e para isso se requer muitas condições, mas primeiro e,

sobretudo, o desejo de cantar e o amor ao canto” (idem, tradução nossa). Transportando e

generalizando essa ideia no âmbito da educação musical, entende-se que os alunos, em nosso

caso específico as crianças, precisam ter vontade de tocar, cantar ou fazer atividades

relacionadas à música. Do contrário, estar-se-á desenvolvendo uma prática de ensino

infrutífera, pois os alunos não estarão construindo o conhecimento musical da forma mais

sadia, visto que ninguém aprende aquilo que não quer aprender. Além disso, também não se

estará transformando as vivências musicais em experiências significativas na sala de aula, nas

quais infelizmente o professor obriga, muitas vezes, seus alunos a determinadas práticas e

atividades distantes do interesse e das preferências deles.

A propósito, o gosto por estudar música e por conhecer mais detalhadamente esta área

do conhecimento humano precisa ser cultivado e incentivado desde os primeiros momentos de

vida de uma criança, não basta querer que ela aprenda um ou outro instrumento no momento

que o adulto deseja, como acontece com muitos pais de alunos nossos. Na educação musical

formal isto não deve ser diferente, visto que é dever do educador musical mobilizar recursos

próprios da arte de ensinar ao organizar estratégias que possibilitarão o diálogo do educando

(e tudo aquilo que ele almeja e que, consequente e umbilicalmente, está diretamente ligado às

possibilidades de seu tempo histórico) com a arte musical, com os objetos musicais em

destaque na sala de aula e fora dela, primando pela manutenção em longo prazo deste contato

(REIS, 2010). Esse diálogo é sinônimo de manipulação ativa do objeto musical, de construção

do conhecimento musical subjetivo e também coletivo. Nesse sentido, a prática democrática

da recriação musical individual e em conjunto contribui para a construção de conhecimento

musical de forma efetiva e singular, pois considera o aluno na sua individualidade e lhe

oferece maneiras de expressar a sua subjetividade musical na aula, sem necessariamente estar

ligado a uma prática reprodutivista musical essencialmente.

Ou seja, a necessidade primeira é estruturar um modelo didático-pedagógico

específico em um ambiente democrático para se alcançar a realização de vivências

significativas com a música e de música deveras, contemplando um processo de ensino e

aprendizagem musical progressivo, onde a interação sujeito-objeto é premissa para a

construção de conhecimento musical. Para isso, é crucial estabelecer um diálogo sadio entre o

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saber musical do educando e os conteúdos a serem tratados nas aulas de teclado. Mais do que

aprender e ensinar a tocar teclado é preciso fazê-los dialogando com o professor sobre música

e com música, fomentado uma educação musical onde o processo de ação-reflexão-ação tem

espaço privilegiado e a aprendizagem se dá significativamente por que docente e discente

traçam objetivos juntos.

Por fim, cabe lembrar que,

ao professor de música lhe está reservada uma importante e difícil tarefa. Seu papel deve ser o de um discreto observador e o de um hábil condutor que descubra nas atitudes de seus alunos aqueles elementos válidos e, com singular sutileza focado atue, sem imposições autoritárias caprichosas, de tal maneira que a criança, trabalhando em um ambiente de liberdade não se sinta submetida a uma atividade na qual tudo se reduz a repetição de elaborações alheias (GONZÁLEZ, 1963, p. 19, tradução nossa).

Enfim, cabe ressaltar que este texto é pontual, é sobre um determinado modelo de ação

pedagógico-musical com o teclado. Ele configura-se como um patamar e foco específico das

reflexões dos autores, suscitadas a partir de suas práticas profissionais de educação musical

através do teclado, embasadas na visão epistemológica construtivista piagetiana, que perpassa

todo o texto e a ação em sala de aula dos professores. Acreditamos que as supracitadas

informações e pensamentos sobre práticas pedagógicas com o referido “filho do piano” (assim

chamado o teclado, por derivar diretamente do piano), situadas social e culturalmente, possam

contribuir para novas e produtivas realizações no campo da educação musical, não só no

âmbito da educação infantil, de onde advém a base empírica das menções anteriormente

expostas, mas também em outros níveis de ensino.

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Reflexões Acerca do Ensino Musical para Crianças do LARCAMJE:

práticas musicais em um contexto não-escolar

Jonas Tarcísio Reis Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS)/PPGEDU/CAPES Lar da Criança e do Adolescente

Menino Jesus (LARCAMJE) [email protected]

Resumo: Este trabalho revela reflexões acerca de práticas educativo-musicais ocorridas no LARCAMJE (Lar da Criança e do Adolescente Menino Jesus), localizado em Porto Alegre - RS. A proposta de educação musical desenvolvida nessa instituição busca propiciar o acesso de crianças e adolescentes, moradores do Lar, à educação musical formal. O foco principal do ensino é a musicalização através da prática musical com flauta doce, canto, teclado, acordeom e percussão, enfatizando atividades de apreciação, interpretação e criação musical. O artigo visa contribuir com a área de educação musical, baseado no exame dos acontecimentos educativo-musicais realizados na instituição, que foram registrados na forma de relatórios e gravações das aulas. Tem por meta, também, cooperar com o alargamento das discussões que vêm acontecendo no âmbito da educação musical não-escolar infantil e infanto-juvenil, e os desafios de se trabalhar a música com classes heterogêneas de crianças e adolescentes.

Palavras chave: Ensino instrumental e vocal, espaço não-escolar, educação musical infantil

Introdução

Com a promulgação da Lei 5.692, de 1971, o ensino de música passou a perder seu

espaço nos currículos escolares e na educação básica de um modo geral. Diante da

problemática da polivalência trazida pela referida lei, e pela histórica desvalorização da

profissão de professor da educação básica, os profissionais da educação musical passaram a

ocupar mais extensiva e intensivamente os espaços alternativos para o ensino da música.1

Assim, a educação musical se projetou de forma determinante nos espaços não-escolares,

consolidando um campo de atuação que hoje, expressivamente, se apresenta rico em

experiências. Nesse sentido, abordaremos práticas de educação musical realizadas em um

destes espaços tidos como não-escolares, denominado LARCAMJE (Lar da Criança e do

Adolescente Menino Jesus).

O LARCAMJE é uma ONG onde acontecem práticas de educação musical não-

escolar, porém formais. Esta instituição, além de sanar as necessidades básicas de alimentação

1 Com a promulgação da LDB de 1996 (BRASIL, 1996), e da Lei 11.769/2008 (BRASIL, 2008), a música vem retomando gradativamente o seu espaço no âmbito da educação básica formal (ver SOBREIRA, 2008).

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e habitação dos residentes, oferece aulas de reforço escolar, de artes plásticas, artesanato,

acompanhamento psicológico, recreação e, logicamente, aulas de música, tudo no contra-

turno escolar. Dessa forma, as crianças e adolescentes que residem na entidade não possuem

tempo ocioso. Eles vivem uma situação semelhante a um regime escolar de tempo integral.

Isso se dá por que a maior preocupação da instituição é formar cidadãos humanos, ativos e

críticos, munidos da maior bagagem possível de conhecimentos para viverem de forma

autônoma na vida adulta, serem donos de seus destinos e poderem escolher uma profissão que

lhes agrade quando ingressarem na fase adulta.

Nesse ambiente as aulas são desenvolvidas com flauta doce, teclado, acordeom,

percussão e canto, ora coletivamente, ora individualmente. O número de alunos varia de três a

doze nas aulas coletivas de música. A faixa etária predominante é de crianças de seis a dez

anos. No texto que segue trataremos de alguns elementos pontuais extraídos e refletidos a

partir da prática de dois anos de educação musical desenvolvida nesse ambiente social,

focando com mais profundidade a prática de canto.

Delineamentos da Educação Musical no LARCAMJE

As concepções de didática e de ensino musical que compõem a metodologia

pedagógica buscam privilegiar a natureza interativa dos alunos, sendo preocupação dominante

que eles participem na procura, no entendimento e elaboração do saber musical, procurando-

se, simultaneamente, atingir a dimensão do saber fazer música, ou seja, proporcionar aos

indivíduos experiências musicais que os ajudem no seu processo de humanização, na sua

busca pelo “ser mais” (FREIRE, 1996), tocando, cantando, criando, recriando, apreciando

música e discutindo sobre ela. Nisso, o trabalho pedagógico-musical apetecido constrói uma

base que abre novas portas para a real aproximação desses educandos com o universo sonoro

desenvolvido e criado pela humanidade ao longo da sua evolução e nas suas diferentes

culturas.

Como na instituição a flauta doce é abordada, cabe lembrar que muitos autores já

falaram sobre o ensino dela, perspectivando diferentes enfoques e em diferentes espaços, com

diversas faixas etárias. Dentre os trabalhos mais recentes podemos destacar Beineke (1997;

2003), Beineke, Torres e Souza (1998), Garbosa (2009), Cuervo (2009), Garcia (2003),

Santos (2007), Souza, Massirer e Garbosa (2010), Weiland (2006), Weiland e Valente (2007),

Diniz e Morato (2005), Vechi e Uriarte (2009), Amaral et. al. (2009), Reis (2009a; 2009b;

2009c; 2011), Fernandes (2009), entre outros que nos ajudam a refletir sobre as possibilidades

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de se trabalhar o ensino desse instrumento, que hoje se encontra bastante difundido na área de

educação musical, sendo parte integrante ou carro chefe de inúmeras propostas de

musicalização espalhadas pelo país.

Como a musicalização formal tem, muitas vezes, sido iniciada pelo ensino da flauta

doce, seja na educação básica ou em espaços não-escolares, existe uma grande quantidade de

material didático para o ensino desse instrumento, entre os quais se encontram Suzigan e

Mota (2001; 2002), Frank (2005; 2006), Videla (1985), Tirler (1993, 2006a; 2006b), Beineke

e Freitas (2006), Beineke (2001; 2002), Velloso (2006), para citar apenas os materiais que são

utilizados para a pesquisa de repertório para ser interpretado pelos alunos do Lar.

Existem algumas rotinas no Lar, que às vezes são quebradas, mas em geral a prática de

conjunto de flauta doce é a primeira coisa que acontece. Eles acompanham na partitura a

leitura das alturas das notas musicais, e o ritmo é aprendido por imitação. Em alguns casos um

ou outro aluno toca teclado acompanhando os demais colegas nas flautas e na percussão. O

canto acontece concomitantemente às aulas de flauta doce. Algumas canções não são

cantadas, embora possuam letras, pois os alunos demonstram maiores interesses pela

interpretação instrumental, e também por termos a intenção de montar uma mini orquestra de

flautas doces com um repertório próprio, para posteriormente fazermos apresentações. Mas

não nos enganemos, porque a intenção basilar é formar indivíduos educados musicalmente no

sentido holístico da expressão.

O ensino de percussão também é trabalhado. Os instrumentos de percussão como

pandeiro, bombo, agogô, triângulo e chocalho, aparecem para possibilitar o enriquecimento

da massa sonora obtida na interpretação conjunta dos arranjos, que são construídos

principalmente com obras musicais do folclore nacional e do folclore de outros povos também

(ver REIS, 2009c). O ensino e a aprendizagem de ritmos típicos de gêneros populares como

marchinha, samba e valsa, é facilitado com a utilização de instrumentos de percussão por

permitir que o sujeito se preocupe exclusivamente com o ritmo, o que não acontece através do

canto nem através da flauta doce. Isso traz resultados musicais quase que imediatamente,

gerando cada vez mais desejo ao estudo musical.

O Canto Como Possibilidade Educativo-Musical Ampla

Como afirmado anteriormente, o ensino do canto acontece juntamente com o ensino

de flauta, intercalando um e outro. Ele se dá através das mesmas canções interpretadas na

flauta doce. Além de fixar as melodias e outros parâmetros das músicas trabalhadas na flauta

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doce, a aprendizagem de canto por meio de canções tem implicações diretas na construção e

expansão do vocabulário dos alunos, bem como no seu modo de falar, entoar a voz e articular

as palavras com boa dicção, facilitando a comunicação no dia-a-dia - são habilidades e

competências extramusicais adquiridas com a prática do canto e técnica vocal. “Por meio de

uma canção se põe em prática mecanismos que permitem relacionar logicamente

conhecimentos que de outra maneira a criança acumularia de forma isolada, sem integrá-los

adequadamente no complexo utilitário da sua vida” (GONZÁLEZ, 1963, p. 12, tradução

nossa).

Mansion (1999) fala que o estudo do canto resulta em um desenvolvimento físico e

moral mais saudável da criança:

Primeiro porque a obriga a conquistar uma boa postura do corpo e desenvolver sua caixa torácica, por meio dos exercícios de cultura física; segundo porque provoca uma imensa oxigenação, por intermédio dos exercícios respiratórios; terceiro porque durante a exploração dos ressonadores, se acusam, nas crianças cujos ressonadores estão enfraquecidos, deformações e outros problemas, que reclamam os cuidados de um fonoaudiólogo e/ou um laringologista; quarto porque a prática da articulação corrige desde o princípio os defeitos de pronunciação das palavras; e quinto porque o estudo do canto desenvolve o gosto artístico e por meio do canto em conjunto, cria na criança o espírito de grupo (idem, p. 22, tradução nossa).

Pensando sobre a prática do canto, podemos notar que o trabalho e a utilização da

memória acontecem não só pelo processo de decorar as letras das canções, mas também inclui

a memorização das melodias e movimentos rítmicos das obras musicais. Decorar a letra, a

melodia e o ritmo propiciam a ativação de redes maiores de neurônios entre as diferentes

partes do nosso cérebro. Isso ocasiona uma construção mais concreta, consolidada a nível

cognitivo do conhecimento musical, pois se o indivíduo quiser se lembrar de uma canção que

canta ou já cantou, terá a possibilidade de acessá-la recordando-se do ritmo e/ou melodia e/ou

letra, para citar os três pontos mais evidentes e presentes de uma canção e sem limitar o

incontável número de relações ou informações que nos permitem lembrar algo.

Segundo Janzen (2008, p. 44), muitos estudos que foram realizados sobre a memória e

a aprendizagem musical mostraram “que a memória musical requer memórias associativas,

como por exemplo, aquelas que resgatam informações acerca do gênero, título, compositor,

forma e estrutura dos eventos musicais, mudança de instrumentação, modulações”.

Numa perspectiva semelhante, González (1963) ressalta pontos importantes sobre o

canto, a memória e a aprendizagem musical e seus problemas. Mas creio que o problema

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central não seja o mau uso da memória nas atividades de canto. Acredito que o problema

resida no fator denominado má emissão das alturas. Pois os alunos de canto podem ter

bastante atenção, de modo que estejam suficientemente concentrados na obra musical que está

sendo estudada, também podem estar ouvindo e memorizando perfeitamente, mas ainda não

possuem a capacidade de emitir as notas e as melodias através da sua voz de modo idêntico ao

professor ou como pede a partitura, mesmo que, às vezes, eles não percebam que estão

errando as notas ao cantar, desafinando. Uma hipótese para isso é que eles não possuem

esquemas mentais2 para desempenhar essa função de afinação conforme os padrões e o

modelo de escalas e alturas convencionadas socialmente, nem possuem um domínio vocal

sobre a emissão de notas mais agudas ou graves, pois - no caso de nossos alunos - em muitos

momentos conseguem cantar afinadamente as notas centrais das melodias, sem muitos saltos.

Quanto à desafinação, González (1963) destaca que as causas para ela podem se

condensar em quatro principais, sendo a primeira a falta de atenção do aluno, a segunda a

memória pouco cultivada, onde “os alunos desafinam porque não chegaram a apreender tudo

o que fora escutado e, em consequência, inventam o que não puderam lembrar” (idem, p. 23,

tradução nossa). A terceira é a má audição, “seja ela por má formação orgânica do aparato

auditivo ou por razões patológicas. Uma má audição tem como resultado uma repetição

defeituosa: a criança repete o que ouve” (idem). E a quarta é a má emissão, “também por má

formação orgânica, defeitos no aparato fonador, ou falhas no mecanismo da voz. É

relativamente fácil encontrar casos de alunos que ouvem bem, mas não podem repetir com

exatidão devido a uma falha de seu aparelho fonador” (idem).

Um elemento que ajuda na afinação das notas cantadas é o fato de os alunos do Lar já

tocarem na flauta doce as obras musicais utilizadas no canto. Desse modo, o aprendizado das

canções ocorre de maneira tranquila, pois os alunos têm, apenas, que transportar para o canto

os esquemas metais que já possuem acerca do contorno melódico e rítmico das músicas.

Assim, o principal desafio é decorar as letras das canções. Nota-se que os alunos procuram as

alturas certas das notas com a voz, eles notam que existe uma forma certa de repetir com a sua

voz a canção ouvida, mas ainda não tem consciência do que seja afinação, o propósito é ir

criando essa consciência primeiramente através da prática e posteriormente teorizar acerca

dela.

2 Quanto à definição de esquemas mentais, Beyer (1995, p. 25) afirma que, “os esquemas são um modo prático da atividade de assimilação do indivíduo. [...] São conjuntos de ações generalizáveis ou possíveis de serem repetidas e aplicadas a diversas situações ou objetos”.

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A Reflexão Constante Sobre o Fazer Pedagógico-Musical do Docente

Complementarmente às informações discutidas até agora, se faz oportuno falar que os

alunos são sempre ouvidos durante e depois das aulas, de modo que estas se desdobram de

acordo com as suas intenções, seus pedidos, enfatizando e aperfeiçoando aquilo que eles mais

têm apreço, que mais gostam de fazer. Entender o aluno como um ser ativo na sala de aula e

como foco principal do ensino é militar por uma educação humana, libertadora e que permite

aos educandos a tomada de consciência de que eles não são objetos, mas, sim, sujeitos nos

eventos educativo-musicais e sujeitos da sua aprendizagem.

Com certeza, este processo ao qual chamamos aprendizagem é infinito e ininterrupto.

Todos os seres que possuem vida estão constantemente aprendendo e apreendendo algo do

meio ao qual estão inseridos. O aprender à que me refiro, diz respeito ao aprendizado que

afeta diretamente a vida do indivíduo, aquele que acontece através de nossas experiências, dos

problemas para os quais buscamos soluções. A todo o momento necessitamos aprender mais,

precisamos nos atualizar para lidar com as exigências do mundo externo para com nós, tendo

como finalidade a nossa sobrevivência. Para concluir este pensamento, poderíamos dizer que

o ser humano é o próprio processo do aprender, pois ele se auto-constrói, e se modifica para

seguir aprendendo.

O ser humano só aprende aquilo que quer, aquilo que é necessário, aquilo que

provocará modificações significativas na sua vida, na sua personalidade ou nas suas atitudes.

Por isso a importância de considerar a opinião do educando no processo de ensino-

aprendizagem, visto que o interessado maior é ele. Ele experimentará uma educação musical

mais significativa quando os seus anseios estiverem sendo contemplados na pedagogia

musical de seu educador, pois aprender é buscar o que há de melhor para nós, buscar a

felicidade - em nosso caso através do fazer musical - e todas as outras formas de realização

humana.

O problema que ocupa um ponto central nas reflexões desencadeadas durante e depois

das aulas, e diríamos também que este é o foco principal e desencadeador dos processos de

formulação e reformulação da proposta metodológica e pedagógico-musical desenvolvida

com os educandos do Lar, se defini pela busca da compreensão acerca do desenvolvimento

cognitivo, afetivo e comportamental desses indivíduos. A lógica central dessas reformulações

reside na procura de soluções para problemas técnicos, práticos e expressivos no tocante ao

ensino e à aprendizagem musical.

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Nesse sentido, se origina a procura por um ensino que avalia o desenvolvimento

musical dos alunos, que observa as suas participações em aula, as suas atitudes frente aos

diferentes modos de se abordar e vivenciar a música nesse espaço, bem como o

aproveitamento e a transformação de informações em conhecimento concreto e consolidado a

nível cognitivo e exteriorizado.

A meta norteadora é identificar possíveis problemas cognitivos, comportamentais e

emocionais que têm implicações diretas e determinantes, não só na aprendizagem musical,

mas no desenvolvimento global dos alunos. Essa meta coaduna-se com o sentimento de

comprometimento social e humano que todo o educador precisa nutrir na sua prática diária

pelo seu público alvo, os alunos, almejando atingir e suscitar o desenvolvimento do ponto de

vista intelectual, ético e humano, no sentido mais intenso dessas palavras. Aqui, toma forma e

força o objetivo idealizado de promover o acesso a educação musical formal, e

consequentemente a uma gama inumerável de saberes que refletirão de forma decisiva na

formação individual desses alunos.

Busca-se, também, interpretar os acontecimentos de aula, focando-se ora em um aluno

ora em outro, procurando compreender como esses alunos estão sentindo a aula. Se eles estão

aproveitando consideravelmente as aulas. Se as atividades são interessantes, ou se elas estão

aquém daquilo que os educandos são capazes de realizar, e se os saberes discutidos em aula

estão sendo compreendidos, assimilados, interiorizados pelos educandos.

Em muitos momentos, solicita-se para os alunos explicações sobre determinada

passagem musical, sobre determinada entrada, sobre dinâmicas específicas, sobre a existência

ou não de acidentes musicais nas melodias, sobre a mudança de andamento, entre outros

questionamentos para mensurar na prática o nível de compreensão das informações

trabalhadas em aula. Eis aí a busca pela construção de saber musical autêntico, definido dessa

forma pelo jeito como emerge. Surge a partir da prática e vai em direção a explicitação verbal

dos conhecimentos adquiridos. Não que a construção desse saber não seja notada nos gestos

musicais durante as práticas em conjunto, mas, sim, pela objetivação da construção teórica,

conceitual acerca de fenômenos musicais.

Considerações Finais

Entender o mundo interno de cada indivíduo do grupo em questão, e como esse mundo

se estrutura, pressupõe ouvir os alunos, ficar a par de suas angústias, desejos, quereres,

anseios e objetivos de vida, mesmo que em um processo de metamorfose constante, não só

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quanto à música em específico, mas, também, em relação às suas expectativas de vida futura e

presente, suas metas pessoais quanto a sua existência e atuação num futuro próximo.

As limitações, sejam da ordem mental ou motora, podem gerar na aula de música o

sentimento de solidariedade com o outro, a construção mútua do conhecimento musical

acontece à medida que as pessoas vão interagindo, umas ajudando as outras. Existe certo

companheirismo crucial para a consolidação de uma educação musical de qualidade. Com

base nessa aferição podemos pensar na busca pelo “ser mais” de cada indivíduo (FREIRE,

1996), que se transforma também, pela transformação do “ser mais” dos outros, onde a

experiência do colega influencia na concretização de sua própria experiência. Principalmente

quando estamos tratando de interpretação musical e aprendizagem em conjunto. Nessas

práticas há a relevância e a importância em se aprender não só com a própria experiência, mas

do mesmo modo com os erros e acertos de nossos pares.

Considera-se, também, com base me nossa experiência no LARCAMJE, que não se

pode mais sustentar um ensino musical baseado em atividades específicas e repetitivas, pois

com isso o interesse dos alunos pela busca e aperfeiçoamento na linguagem musical se

apresenta comprometido. O ensino e aprendizagem formal de música só acontecem

efetivamente quando as proposições da instituição, do professor e dos alunos culminam em

uma única meta. Conteúdos de música só são aprendidos quando estes passam a fazer sentido

para os educandos. Ou seja, se a música não assume uma aplicabilidade própria na vida dos

educandos, o trabalho pedagógico-musical perde força e eficácia na busca por impactar

significativamente a construção humana, cognitiva e intelectual dos sujeitos educandos.

É mister para o educador musical, independentemente do contexto institucional,

social e cultural em que desenvolva seu trabalho, pensar com dedicação e observar com

acuidade o modo como os educandos estão agindo em sala de aula e fora dela também. Temos

notado a importância disso no LARCAMJE. Saber se a aula fora agradável do ponto de vista

deles; procurar compreender como realmente se dera o desenvolvimento da aula; quais foram

as dificuldades e facilidades apresentadas durante o processo educativo; quem gostou disso,

quem gostou daquilo; o que funcionou, o que não funcionou com esse grupo, são todos

questionamentos que precisam estar presentes na práxis do professor de música. Assim o

processo de ação-reflexão-ação é um caminho a ser percorrido sempre que o objetivo de

desenvolver uma prática de ensino musical atual, comprometida e significativa for um

pensamento norteador.

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Notação Musical na Infância: um processo gerador de subjetividade

Sandra Rhoden [email protected]

Resumo: a presente comunicação é um recorte da minha pesquisa de Mestrado que aborda a subjetividade presente no fazer musical infantil. De modo específico, busca compreender os processos subjetivos das notações musicais, de um grupo de nove crianças, com idade entre 4 a 6 anos, alunos de musicalização da FUNDARTE. A epistemologia da pesquisa qualitativa e subjetividade, defendida por Gonzáles Rey, orienta a escolha metodológica e os conceitos relevantes da investigação, adotando-se o estudo de caso como estratégia de pesquisa. A subjetividade das notações musicais das crianças foi compreendida, a partir de núcleos configurados em torno da materialidade, das narrativas, das relações interpessoais e simbologias compartilhadas no processo dialógico que envolveu as crianças participantes e o pesquisador. Os aportes teóricos de Silvia Helena Cruz e colaboradores (2008) possibilitaram que as interações dessa pesquisa fossem guiadas pela voz das crianças, para então apreender os fundamentos de sua subjetividade.

Palavras-Chave: Notação musical, subjetividade, pesquisa com crianças

Introdução

Compreender o que meus alunos estavam representando no papel, e qual o sentido e o

significado subjetivo, para si mesmos, dessas representações, passou a ser uma inquietação

para mim no decorrer da minha prática pedagógica. Para entender melhor suas produções,

procurei dialogar com as crianças, buscando saber um pouco mais sobre a presença de

elementos, não necessariamente musicais, que surgiam nos registros de suas criações

musicais. Solicitei que as crianças falassem sobre o que tinham anotado, e pude perceber que

suas explicações ultrapassavam as questões musicais, parecendo estar completamente absortas

ao registro dos elementos formadores da música (altura, duração, intensidade, timbre, ritmo e

melodia).

A partir das inquietações sobre as notações musicais, realizadas pelos meus alunos, e,

considerando, principalmente, os comentários que faziam sobre as notações musicais que

realizavam, percebi que essas informações eram preciosas e que necessitavam de um maior

questionamento: por que as crianças trazem elementos de sua vida pessoal e social para as

notações musicais? O que ocorre durante o processo da atividade de notação musical? Qual o

sentido e o significado subjetivo das notações musicais das crianças?

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Estudos Sobre a Notação Musical da Criança

Revisando a literatura sobre a notação musical, encontrei pesquisas recentes e

importantes para a área da educação musical, dedicadas à alfabetização musical

(BAMBERGER 1990; CESTARI 1983; FREY-STREIFF 1990; LINO 1998; SALLES 1996).

As pesquisas focalizam a compreensão da criança ao realizar a notação musical do ritmo e da

melodia, buscando também uma explicação para o desenvolvimento cognitivo que ocorre

nesse processo. Também chamam a atenção sobre as formas de organização e reorganização

que o sujeito realiza ao apreender e realizar a notação musical. Além de traduzir o seu

conhecimento musical, ao realizar notações, adquire e desenvolve o conhecimento cognitivo.

Refletindo sobre os estudos, verifica-se que não foi intenção dos autores analisarem o

lado subjetivo do sujeito e, sim, como ele representa graficamente aspectos relacionados à

música, juntamente com as contribuições para o seu desenvolvimento cognitivo. De acordo

com Cruz (2008, p. 12) “os julgamentos, os desejos, os receios, as preferências das crianças,

geralmente não têm sido alvo de interesse de estudo”. Nesse sentido, percebi a necessidade de

ampliar o olhar da pesquisa, prestando atenção no que a criança revela, em todo o processo de

notação, uma vez que o contexto das crianças é evidente e presente nas suas grafias.

Estudos Sobre o Método

A pesquisa qualitativa orienta-se pela produção de sentidos subjetivos e significados

do sujeito participante, no espaço em que ela ocorre. Por esse motivo, compreende a

importância da subjetividade inserida no método.

A subjetividade é caracterizada pelo mundo interno do ser humano, através do seu

íntimo, expressando emoções, sentimentos e pensamentos, que serão responsáveis pelas

relações com as outras pessoas.

De acordo com Gonzáles Rey (2005b, p. 36), o termo subjetividade é definido como

“um sistema complexo de significações e sentidos subjetivos produzidos na vida cultural

humana”. A subjetividade está presente tanto no sujeito individual, como nos vários espaços

sociais em que ele se insere, sendo, tanto o individual quanto o social, aspectos constituintes

da subjetividade.

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Subjetividade: sentido e significado

A nossa realidade é constituída por elementos objetivos, que influenciam a formação

da nossa subjetividade. Essa mesma realidade não deixa de ser subjetiva, quando os elementos

objetivos ganham um sentido subjetivo, a partir das significações já construídas, que fazem

parte da nossa história e das significações do momento atual. Essa relação forma uma

complexidade, dificilmente, compreensível fora do terreno das significações.

O sujeito se expressa e se integra no processo de fazer sentido no que Gonzáles Rey

chama de “configurações”, tornando-se capaz de agir, de modo colaborativo. A dimensão

social da subjetividade não significa que ela é externa, mas que forma, com a dimensão

interna, uma só configuração, capaz de gerar vários sentidos e significados. Para debater sobre

o sentido e o significado é preciso compreender para apreender a complexidade que esses

termos geram.

Para Aguiar e Ozella (2006, p. 225), “os significados são produções históricas e

sociais, são eles que permitem a comunicação, a socialização de nossas experiências”. Desse

modo, qualquer atividade realizada pelo sujeito gera significados, pois ele “transforma a

natureza e a si mesmo na atividade”. O significado também pode ser compreendido pelas

apropriações que o sujeito constitui e compartilha, a partir da sua subjetividade. Sob o ponto

de vista de Gonzáles Rey (2004, p. 60), “os significados não geram emoções de forma direta”,

sendo o contrário do sentido que transcende o significado, pois não pode ser entendido como

uma dialética natural externa do sujeito.

De acordo com Aguiar e Ozella (2006, p. 227), “o sentido coloca-se em um plano que

se aproxima mais da subjetividade que, com mais precisão, expressa o sujeito, a unidade de

todos os processos cognitivos, afetivos e biológicos”. Da mesma forma, Gonzáles Rey

(2005a) amplia o seu olhar pelo sentido, quando diz que:

O sentido não aparece de forma direta na expressão intencional do sujeito, mas sim diretamente na qualidade da informação, no lugar de uma palavra, em uma narrativa, na comparação das significações atribuídas e conceitos distintos de construção, no nível de elaboração diferenciado no tratamento dos temas, na forma como se utiliza a temporalidade, nas construções associadas a estados anímicos diferentes nas manifestações gerais do sujeito em seus diversos tipos de expressão (GONZÁLES REY, 2005a, p. 116).

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Partindo das contribuições teóricas sobre o sentido e o significado, podemos

compreender que o significado é o ponto de partida para a configuração do sentido subjetivo

do sujeito. A determinação de um espaço simbólico, onde o sujeito realizará alguma

atividade, oportunizará a produção de sentido. Para abordar o sentido e o significado das

representações sociais do sujeito, intrínsecas na subjetividade social e individual, Gonzáles

Rey sugere a criação de um cenário de pesquisa

Com a finalidade de compreender o sentido e o significado subjetivo da notação

musical das crianças, esta pesquisa foi construída, na perspectiva da pesquisa qualitativa e

subjetividade experimentada e defendida por Gonzáles Rey1. Para este autor, o estudo da

subjetividade está vinculado aos métodos de pesquisa, que tornam possíveis a sua observação.

No caso da presente pesquisa, as manifestações empíricas dos sujeitos assumem o valor de

informação, a partir do qual o pesquisador construirá novos conhecimentos.

Outro fator importante abordado na Epistemologia Qualitativa é a legitimação do

singular como instância de produção de conhecimento científico. A singularidade na produção

de conhecimento está intimamente conectada à compreensão subjetiva do sujeito investigado,

à sua cultura e à sociedade na qual se insere.

Seguindo os passos da pesquisa qualitativa e subjetividade, compreendi que a

construção do conhecimento, a partir das manifestações empíricas, é um processo vivo e

constante, uma descoberta que acontece entre o pesquisador e os sujeitos participantes da

pesquisa, sendo assim possível atribuir o sentido e o significado ao que se constrói.

Para a realização das notações, inicialmente, deixei as crianças vivenciarem,

individualmente ou em pequenos grupos, os instrumentos de percussão (coco, clavas, pau-de-

chuva, caxixi, tambor, metalofone, xilofone, entre outros). Para Maffioletti (2005), esta é uma

das etapas em que o professor deve ter um olhar direcionado. Nas palavras da autora:

A exploração livre dos instrumentos musicais é um espaço para muitas aprendizagens, tanto para o aluno como para o professor. Nem tudo o que a criança realiza traduz-se em aprendizagem, porque ela poderá ou não integrar suas experiências; poderá modificar ou não sua forma de interação com os instrumentos musicais (MAFFIOLETTI, 2005, p. 34).

Após explorarem os instrumentos e escolherem um para trabalhar, solicitei que

formassem duplas ou trios para a realização da composição musical. Para Leite (2008, p.

124), o trabalho em grupo favorece os ecos e vozes diferentes, bem como “a concepção de 1 Fernando Luis Gonzáles Rey – é doutor em Psicologia, pelo Instituto de Psicologia Geral e Pedagógica de Moscou e doutor em Ciências (pós-doutorado), pelo Instituto de Psicologia da Academia de Ciências da União Soviética.

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linguagem e o papel do outro na constituição do sujeito e na formação da consciência”.

Procurei colocar sempre uma dupla ou trio de crianças em frente à câmera de vídeo, para

capturar todo o processo de trabalho realizado por eles, bem como os momentos de

intervenção do pesquisador. Sem ter que deslocar a câmera, enquanto circulava pelos outros

grupos, tinha em mãos um gravador MP4, pois a gravação em áudio garantiria a captura do

processo dialógico das crianças, ao elaborarem suas criações musicais e notações. Minha

intervenção nos grupos não tinha caráter de entrevista, pois não estava prevista, na

metodologia, uma relação de perguntas fechadas; porém, realizei algumas questões que

puderam ampliar o processo dialógico.

Ao tocarem e narrarem suas produções, o sentido e o significado subjetivo, eram

traduzidos pelas emoções vividas e proporcionadas, na atividade de notação musical.

Observei minuciosamente suas vozes, seus gestos e a intenção em revelar suas produções, de

maneira viva.

A maneira como as crianças se organizavam, nos grupos de trabalho, as ações que

realizavam, as concordâncias e as divergências, levaram-me aos indicadores necessários para

a construção dos futuros núcleos de análise.

Os indicadores, presentes nos trechos de informação, me possibilitaram a identificação

de conteúdos importantes, que surgiam com frequência nos momentos analisados. De acordo

com Aguiar e Ozella (2006, p. 231), a partir da “articulação dos conteúdos semelhantes,

complementares ou contraditórios seria possível verificar as transformações e contradições

que ocorrem no processo de sentido e significado”. Conforme essa orientação, a análise dos

núcleos, na minha pesquisa, estaria alicerçada em trechos de informações, com relação à

maneira como o sujeito pensa, age, sente e se expressa, em todo o processo da notação

musical.

A Construção dos Núcleos

Partindo dos indicadores que expressavam regularidades, na expressão das condutas

das crianças, e que pudessem revelar a presença de sentido e significado subjetivo, intrínsecos

em todo processo referente à notação musical, foram identificados quatro núcleos para

análise. Esses núcleos compreendem os conteúdos principais expressos pelas crianças que, de

alguma maneira, traduzem o envolvimento emocional, dos sujeitos participantes.

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Baseando-me nos estudos de Correia e Meira (2008), elaborei os meus núcleos. Esses

núcleos foram categorizados como materialidade, narrativa, relações interpessoais e

simbologia.

Os núcleos geradores da subjetividade

Os núcleos tornaram inteligíveis os processos de construção de sentido e significado

subjetivo produzidos pelas crianças. Para valorizar as informações em que os núcleos se

fazem presentes, recortei dos protocolos os trechos dialógicos que anunciavam a presença da

materialidade, da narrativa, as relações interpessoais e simbologias. Retomando as leituras

sobre a pesquisa qualitativa e subjetividade, defendida por Gonzáles Rey (2005a), a

articulação entre o material empírico e a teoria deu lugar ao processo construtivo-

interpretativo do conhecimento, gerado por essa pesquisa. A partir desse momento, as

manifestações empíricas foram compreendidas como informações essenciais, na interpretação

da realidade analisada.

Com base nas análises realizadas, entendo que o sentido subjetivo e o significado da

notação musical das crianças não pode ser identificado em um núcleo apenas, mas estão

presentes em todo o processo que inclui a escolha dos instrumentos, a criação de narrativas, as

relações interpessoais e a simbologia. Às vezes, com maior intensidade, em um momento do

que em outro.

A subjetividade, que a criança expressa em suas notações, são reveladas no modo

como ela constrói suas notações musicais, na maneira como se organiza, como desenvolve

suas narrativas, pelo seu imaginário, pelo seu contexto individual e social. Também se

expressa no modo como se relaciona com seus pares, até eleger um símbolo, onde representa

suas vivências como uma totalidade integrada.

Conclusões

Sendo a subjetividade um tema de grande complexidade, entendo que minhas

inquietações não se esgotariam nessa investigação, e, por isso, procurei delimitar, ao máximo,

minhas expectativas, adotando um único referencial teórico que abordasse, em sua

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metodologia, estudos sobre a subjetividade, procedimentos e conceitos relevantes sobre o

tema.

A materialidade, a narrativa, as relações interpessoais e a simbologia são modelos de

interpretação teórica, que tornaram inteligíveis os processos de sentido e significado subjetivo

das notações musicais das crianças, porque valorizaram o sujeito individual concreto, sua

história e sua capacidade de reflexão e construção.

A materialidade apareceu como primeiro núcleo, pois foi o momento em que as

crianças escolheram os instrumentos para a atividade de notação musical e definiram, a partir

do som de cada instrumento, os personagens ou elementos que dariam vida à notação musical.

A construção do significado depende da significação que cada criança atribui para o

instrumento de sua preferência.

A narrativa teve como objetivo principal gerar subjetividade. O corpo da notação

musical foi construído, a partir da narração de vivências, histórias e imaginação, trazidas da

subjetividade individual e social de cada criança, como parte de um único sistema, gerando

sentido e significados, através do que a criança falou, e na maneira como se expressou.

As relações interpessoais foram responsáveis pelo surgimento dos recursos subjetivos

empregados pelas crianças frente às possíveis situações de conflitos. O acolhimento das

sugestões entre os participantes, a liderança e a negação em participar da atividade de notação

musical, o modo de agir, falar ou se expressar corporalmente, foram formas de manifestação

das emoções vividas e geradoras de sentido.

A simbologia traduziu, através do desenho, o resultado de todo o caminho que foi

percorrido pelo grupo de trabalho, da materialidade à simbologia. Cada integrante pertencente

a um grupo de trabalho foi representado e significado simbolicamente, trazendo um contexto

de sentido para cada uma das notações. Várias condições subjetivas foram retratadas nestes

contextos.

Ao realizarem a atividade de notação musical, as crianças trouxeram elementos de sua

subjetividade individual, atreladas à subjetividade social, que são os diferentes espaços por

onde ela transita. O individual e o social de cada criança estiveram presentes em todo o

processo, sendo possível perceber este elo na maneira como se expressaram e o que disseram,

gerando, assim, sentidos e significados subjetivos para as notações musicais.

A elaboração desta investigação também possibilitou o contato com pesquisas e

artigos relacionados à Psicologia e à Sociologia da Infância, que enfatizam a importância de

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ouvir e realizar pesquisa com crianças, bem como as bases metodológicas para a sua

realização.

A presente pesquisa foi um estudo de caso realizado com um grupo de crianças

dotadas de uma singularidade própria. Por essa razão, não pode ser enquadrada em uma

concepção única sobre a subjetividade das notações musicais, realizadas pelas crianças.

Ao identificar o sentido e o significado das notações musicais das crianças, desenvolvi

um novo olhar para as suas produções. Acredito que esta pesquisa poderá contribuir como um

referencial para futuras pesquisas, a serem realizadas em outros contextos e áreas da

educação, contemplando o sentido e o significado.

Retomando e reforçando a importância da voz da criança nesse processo, recomendo o

desenvolvimento de pesquisas que enfoquem, em sua concepção epistemológica, a

investigação com crianças e não sobre crianças.

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Notação Musical ou Alfabetização Musical: perspectivas para a atuação na

educação musical infantil

Samara Pires da Silva Ribeiro UnB - Faculdade de Educação

[email protected]

Ricardo Dourado Freire UnB - Projeto Música para Crianças

[email protected]

Resumo: Dentro do conceito da musicalização e se tratando da linguagem musical, são apresentadas discussões conceituais sobre a notação musical e a alfabetização musical, no contexto das áreas de pedagogia e educação musical. O artigo relata ainda como que estes conceitos são entendidos no ambiente musical e como é compreendida o conceito de notação nos documentos e na literatura utilizada neste trabalho, bem como o conceito de alfabetização, considerando o contexto de letramento e de processo de alfabetização.

Palavras chave: Alfabetização musical, notação, musicalização

O ensino de música na escola é regulamentado pelos documentos bases da educação

sendo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Artes e o Referencial Curricular

Nacional da Educação Infantil (RCNEI) as principais referências para o ensino de música nas

escolas. Foi realizada uma discussão dos termos alfabetização musical e notação musical no

contexto das áreas de educação musical e pedagogia a partir dos documentos oficiais.

O contato visual com uma partitura ou com um texto desperta o interesse e a

curiosidade, por parte das crianças, em entender o que está escrito. Ao vivenciar o processo de

musicalização, como sendo um processo orientado visando o desenvolvimento da linguagem

musical, e partindo das experiências em sala de aula, eis os questionamentos que foram feitos:

Como o processo de aquisição da leitura e escrita musical está relacionado com a

alfabetização? Em termos conceituais como é vista a alfabetização musical e a notação

musical no contexto da educação musical?

O presente trabalho tem por objetivo discutir a relação entre conceitos de alfabetização

e notação musical com base nos documentos oficiais e na literatura das áreas de música e

pedagogia.

A partir da reflexão das propostas conceituais será possível estabelecer um referencial

teórico para orientar as práticas pedagógicas. No contexto da educação infantil, a

musicalização envolve a linguagem musical e o fazer musical e faz-se necessário a discussão

das concepções de alfabetização presentes tanto na pedagogia quanto na educação musical. O

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contexto da pesquisa foram aulas de música do Programa de Extensão Música para crianças

da Universidade de Brasília com crianças de 5 a 7 anos, que estão iniciando também o

processo de alfabetização nas escolas, a partir da interação destas crianças com o processo de

leitura e escrita musical gerou-se o interesse em discutir o assunto neste artigo.

Alfabetização Musical ou Notação Musical?

Rubem Alves (2002), em seu livro “Por uma educação romântica”, mostra como nos

dias de hoje o conceito de alfabetização é utilizado de forma simplista. Ele afirma que

“Alfabetizar é ensinar a ler. A palavra alfabetizar vem do “alfabeto”. “Alfabeto” é um

conjunto das letras de uma língua, colocadas numa certa ordem” (p. 39). Para reforçar esse

pensamento ele ainda faz uma comparação com o termo para o ensino de música. No capítulo

“O prazer da leitura”, Alves (2002) coloca:

Se é assim que se ensina a ler, ensinando as letras, imagino que o ensino da música deveria se chamar “dorremizar”: aprender o dó, o ré, o mi... Juntam-se as notas e a música aparece! Posso imaginar, então, uma aula de iniciação musical em que os alunos ficassem repetindo as notas, sob a regência da professora, na esperança de que, da repetição das notas, a música aparecesse... (ALVES, 2002, p. 40)

A proposta de Alves é adotada na prática a partir da perspectiva do ensino da notação

musical, que advém de uma atuação descontextualizada, sem considerar uma discussão

conceitual de princípios de aprendizagem ou ação de alfabetização.

O processo histórico da alfabetização está vinculado com a compreensão e a reflexão

da linguagem, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa. O

processo de alfabetização, segundo o PCN, no início dos anos 80, mudou seu foco do que se

ensina para o que se aprende. Um dos principais trabalhos destinado a compreender o

processo da leitura e da escrita foi a psicogênese da língua escrita. Com o deslocamento do

foco para o aprendizado foi possível identificar a relação da criança com o processo de

alfabetização, na qual, compreendeu-se que a criança possui um conhecimento adquirido fora

da escola (BRASIL, 1997).

Ferreiro (1985), uma das pioneiras desse trabalho, considera que a alfabetização deve

ser um processo contínuo e que não está restrito à sala de aula. Um dos pontos principais na

pesquisa dessa psicóloga é a compreensão do processo de alfabetização independente dos

métodos. Deve-se considerar que a criança aprende porque ela possui uma curiosidade inata e

vontade de conhecer o mundo. A partir daí, a criança tem condições suficientes de assimilar a

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247

leitura e escrita. “através da teoria de Piaget [o] sujeito (...) procura ativamente compreender o

mundo que o rodeia, e trata de resolver as interrogações que este mundo provoca.”

(FERREIRO, 1985, p.26).

O sujeito, primeiramente, tem um contato com o que quer apreender, por meio da

interação com o mundo, transformando, assim, a realidade em experiências. A aprendizagem

é uma conseqüência, uma síntese realizada pelas funções psíquicas e físicas.

Ainda segundo Ferreiro (2001), há a denominação de escrita alfabética, como sendo

“sistemas de representação cujo intuito original – e primordial – é representar as diferenças

entre os significantes.” (FERREIRO, 2001, p.13). Ao falar de escrita alfabética, faz-se

necessária a referencia à notação alfabética, que segundo Morais (2006)

constitui em si um domínio cognitivo, um objeto de conhecimento com propriedades que o aprendiz precisa reconstruir mentalmente, a fim de vir a usar, com independência, o conhecimento de relações letra-som, que lhe permitirá ser cada vez mais letrado (MORAIS, 2006, p.3).

Nos Parâmetros Curriculares Nacional da Língua Portuguesa, o termo notação é

compreendido com relação ao ensino da ortografia da língua. Ao discutir a conceituação de

notação, porém no contexto da educação musical, observa-se o vínculo com a grafia musical.

O termo nos PCNs de artes aparece vinculado à linguagem musical e ao sistema de escrita

musical tradicional (BRASIL, 1997)

Em relação a alfabetização, Soares (2010) coloca que “em seu sentido próprio,

específico [é o] processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita.”

(SOARES, 2010, p. 15) Essa primeira conceituação sobre o termo implica a aquisição de um

código, sendo ele pertencente de uma linguagem que pressupõe organização e compreensão.

Um conjunto de palavras sem organização não pode ser considerada linguagem enquanto não

apresentar regras que combinem formando orações. (FERREIRO 1985)

O conceito de Alfabetização discutido por Magda Soares (2010) “é um processo de

representação de fonemas em grafemas, e vice-versa, mas é também um processo de

compreensão/expressão de significados por meio do código escrito.” (SOARES, 2010, p.16).

Além disso, o processo de alfabetização

deve levar à aprendizagem não de uma mera tradução do oral para o escrito, e deste para aquele, mas à aprendizagem de uma peculiar e muitas vezes idiossincrática relação fonemas-grafemas, de um outro código, que tem, em relação ao código oral, especificidade morfológica e sintática, autonomia de recursos de articulação do texto e estratégias próprias de expressão/compreensão. (SOARES, 2010, p. 17)

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248

Alves (2009) discute que em qualquer sistema de comunicação escrita deve-se

considerar as experiências sociais dos sujeitos e também refletir sobre o papel do professor e

demais instâncias ao longo do processo. A “alfabetização como o aprendizado do alfabeto e

de sua utilização como código de comunicação” (ALVES, 2009, p.3) necessariamente implica

a compreensão e a utilização nas práticas sociais, pois a comunicação por meio desse código

pressupõe socialização. Ser alfabetizado pressupõe a aquisição de habilidades tanto

“habilidades mecânicas (codificação e decodificação) do ato de ler, mas da capacidade de

interpretar, compreender, criticar, resignificar e produzir conhecimento.” (ALVES, 2009, p.

3). Soares (2003), afirma que:

uma teoria coerente da alfabetização deverá basear-se em um conceito desse processo suficientemente abrangente para incluir a abordagem "mecânica" do ler/escrever, o enfoque da língua escrita como um meio de expressão/compreensão, com especificidade e autonomia em relação à língua oral, e, ainda, os determinantes sociais das funções da aprendizagem da língua escrita (SOARES, 2003, p. 18).

É interessante pensar na resignificação e unificação do conceito de alfabetização, ao

invés de criar outra palavra para tentar explicar o que a alfabetização já faz. O que se deve

pensar, como já foi muito estudado, é tratar a alfabetização como um processo e não como o

objeto que ao nos apropriarmos dele não temos mais nada a aprender sobre esse objeto. O

principal motivo para afirmar o processo é considerar que o sujeito que aprende está em

constante transformação e ao adquirir um conhecimento tem a capacidade de resignificá-lo de

acordo com as suas experiências e vivencias, pois os sujeitos são seres culturais, sociais e

históricos.

Além disso, o sujeito deve compreender que o processo de alfabetização, mais

especificamente a aquisição da leitura e escrita, é a representação de uma linguagem, como

explica o PCN de língua portuguesa:

que a alfabetização não é um processo baseado em perceber e memorizar, e, para aprender a ler e a escrever, o aluno precisa construir um conhecimento de natureza conceitual: ele precisa compreender não só o que a escrita representa, mas também de que forma ela representa graficamente a linguagem (BRASIL, 1998).

Este é o conceito utilizado neste trabalho que compreende o processo de aprendizagem

e transformação do conhecimento em escrita. O aluno deve ter a oportunidade de levar a

música para a sala e aula, dentro de uma proposta de ensino que considere os aspectos

culturais e as diversidades de meios de comunicação devido aos avanços tecnológicos. As

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atividades devem ser significativas para os alunos possibilitando a abertura da diversidade

cultural, no entanto, sem deixar de ser um ensino contextualizado. (BRASIL, 1998)

A música e a língua materna são linguagens presentes na sociedade, sendo a música a

primeira forma de expressão. “A música é a nossa forma mais antiga de expressão, mais

antiga do que a linguagem e a arte; começa com a voz e com a nossa necessidade

preponderante de nos dar os outros” (MENUHIN E DAVIS 1981, p.1 apud PENNA 2008).

Penna (2008) coloca a “musicalização como um processo educacional orientado que se

destina a todos que, na situação escolar, necessitam desenvolver ou aprimorar seus esquemas

de apreciação da linguagem musical” (PENNA, 2008, p. 44)

Uma criança no processo de apropriação da linguagem, tanto verbal quanto musical,

passa pelo reconhecimento do mundo por meio da linguagem em que está aprendendo. No

contexto da educação musical a apropriação dessa linguagem ocorre por meio da

musicalização. Penna (2008) afirma

o indivíduo se torne capaz de apropriar-se criticamente das várias manifestações musicais disponíveis em seu ambiente – o que vale dizer: inserir-se e, seu meio sociocultural de modo crítico e participante. Esse é o objetivo final da musicalização, na qual a música é o material para um processo educativo e formativo mais amplo, dirigido para o pleno desenvolvimento do indivíduo, como sujeito social (PENNA, 2008, p.49).

Watanabe (2009) afirma que “a Música enquanto linguagem tem um sistema de

códigos de grafia. O processo de codificação e decodificação desta linguagem torna

necessária a sua alfabetização” (p.20). Por alfabetização essa autor entende que é “um

processo de apropriação de instrumentos de interpretação de significantes.” (WATANABE,

2009, p.21) Significante é o sistema de significação do som em forma de registro, podendo ter

registro do som da palavra ou da música.

Com a invenção da escrita gráfica e musical os signos vieram substituir os desenhos e assim, iniciou-se toda a teorização para a sua aprendizagem. [...] A gênese da grafia sonora é comparativamente semelhante à gênese dos vocábulos, das funções classificatórias e da imitação (ABRAHÃO, 2005, p.91 apud WATANABE, 2009).

Watanabe (2009) na citação acima apresenta uma relação entre a alfabetização e a

alfabetização musical convergente na necessidade do homem em criar um registro gráfico

para significar o som.

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Considerações Finais

O conceito de notação parte de princípios de organização do material gráfico,

principalmente após as experiências de linhas ativas nas quais a criança representa o som que

compreende de maneira livre. As diferentes posturas entre construção livre da notação e

aprendizagem da notação tradicional muitas vezes entram em conflito, mas na gênese

pedagógica apresentam conceitos diametralmente opostos.

O processo de aprendizagem dos códigos de uma linguagem passa pelo domínio dos

símbolos que constituem a própria linguagem. No caso da escrita, o código é o alfabeto, mas

no caso da música o código refere-se a conjunção de elementos melódicos e rítmicos usados

na partitura musical.

Os documentos oficiais oferecem uma conceituação clara do processo de alfabetização

da língua materna, definindo-o como o processo de aquisição da linguagem. No entanto os

conceitos de notação são limitados por tentar focar na grafia de elementos musicais. No caso

da música a alfabetização musical possa ser considerada um processo de construção do

conhecimento de natureza conceitual, no qual a criança precisa compreender o que a escrita

musical representa e principalmente como a escrita representa graficamente a linguagem

musical.

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Referências

ALVES, Bruna Pereira. As distintas concepções acerca dos conceitos de alfabetização. Revista Urutágua – revista acadêmica multidisciplinar, n,17. Maringá: Paraná dez.2008/jan./fev./mar. 2009. Disponível em: <http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/Urutagua/article/viewFile/5280/3797>. Acesso em: 25 out. 2010. ALVES, Rubem. Por uma Educação Romântica. Campinas: Papirus, 2002. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. B823p Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: DF. 144p. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro02.pdf> Acesso em: 22 nov. 2010. FERREIRO, Emília; Teberosky, ANA. Psicogênese da língua escrita. Trad. de Diana Myriam Lichtenstein, Liana Di Marco e Mário Corso. Porto Alegre: Artes Médicas, 1985. 284p. FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização. 24. ed. São Paulo: Cortez, 1981. PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. 2. Ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Sulina, 2010. 246p. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 4.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. 128p. WATANABE, Maria Kyoko Arai. A leitura e a escrita do som na educação infantil. Universidade Estadual de Londrina. Disponível em: < http://alb.com.br/arquivo-morto/edicoes_anteriores/anais17/txtcompletos/sem14/COLE_11.pdf>. Acesso em 20 mar. 2011

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A Canção no Contexto Escolar: filosofia, linguagem, cultura escolar e

práxis

Alexandre Rebouças de Santana Mestrando pelo Programa de

Pós-graduação em Educação - UFBA

Resumo: Este artigo discute a Música no contexto escolar tendo como recorte a canção em uma abordagem fenomenológica, considerando cultura, cultura escolar e práxis pedagógica face à implantação da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Iniciamos com um breve relato histórico da educação musical no Brasil. Para tal, definimos um conceito de cultura, relação entre linguagem e linguagem musical, fenomenologia como aporte teórico e filosófico, análise temática de alguns compositores infantis e apresentação de parte de nossa produção e estudos advindos da nossa prática profissional na esperança de apontar novas possibilidades de utilização da canção no contexto escolar frente aos desafios contemporâneos de educar para o século XXI.

Palavras-chave: Educação, música, canção

1. Introdução

Este trabalho é fruto da reflexão e estudos centrados na cultura, práxis, linguagem e

música no contexto escolar sob o enfoque das perspectivas e desafios da educação no século

XXI.

Visa-se encontrar outros enfoques que podem assumir a práxis pedagógica da música,

ou melhor, a canção, face a implantação da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996,

discutindo, principalmente, o seu conteúdo textual. O tema passa por uma reflexão sobre

cultura, cultura escolar, perspectiva história da educação musical no Brasil, semelhança entre

linguagem musical e verbal, perspectiva da construção de uma possibilidade de abordagem

filosófica para a educação musical e aponta alguns compositores infantis que se dedicam a

investigar novas propostas musicais para a Educação Infantil.

2. Educação Musical no Brasil

Com a aprovação da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996 a ABEM (Associação

Brasileira de Educação Musical) preocupou-se em debater sob qual enfoque se daria a

educação musical em sala de aula. Colaborando com este debate vislumbramos algumas

perspectivas para a utilização da música, especificamente a canção no contexto escolar.

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253

Para compreendermos melhor a educação musical da canção em sala de aula

buscamos, através da história, retomar alguns momentos nos quais a música se fez presente

para, assim, refletirmos sobre suas perspectivas filosóficas, culturais e suas possíveis

implicações pedagógicas.

De acordo com Salvarez destacamos, dentre muitos movimentos históricos, três

períodos relevantes como marco inicial das nossas reflexões sobre a educação musical dentro

da realidade brasileira. São eles: Período Colonial, Período Independente e Metodologias

Contemporâneas, conforme classificação do autor.

No Período Colonial, destacamos a influência jesuítica na música, tendo o Auto da

Pregação Universal (1555) como a primeira peça musical brasileira cujo título já define a

filosofia e ideologia musical dominante da época.

No Período Independente, temos dois marcos importantes regulamentados através de

leis. O primeiro, em 1847, que estabelece os conteúdos musicais para serem ensinados sendo

divididos em solfejo, instrumentos de sopro, instrumentos de orquestra e harmonia. Em 1851,

a lei 650 estabelece o ensino de música nas escolas primárias e secundárias, todas duas leis

sancionadas por D. Pedro II.

No início do século XX, em que surgem as Metodologias Contemporâneas,

influenciado por tendências educativas advindas de outras áreas do conhecimento, inicia-se

outra fase na qual temos como expoente brasileiro o maestro Villa Lobos.1 Atualmente,

podemos observar o ecletismo de tendências pedagógicas nas quais cada educador possui seu

princípio filosófico e teórico que fundamentam suas práticas educativas. Dentre muitos que

desenvolveram métodos, abordagens ou filosofia destacamos o próprio Villa Lobos, além de

outros como Suzuki, Dalcroze, Willems, Swanwick, Sá Pereira, Martenot etc.

Diante do que foi visto historicamente, passemos agora a compreender como esta

cultura vai se modificando e, consequentemente, a sua práxis, em função de movimentos

históricos, ideológicos, políticos e filosóficos. Não nos interessa abordar todos estes

segmentos, mas apenas recortá-los para compreensão de como se fundamenta e norteiam a

nossa perspectiva e estudos frente aos desafios para o século XXI.

3. Cultura Escolar, Práxis Pedagógica e Linguagem

1 Não é de interesse, neste momento, discorrer sobre seu envolvimento com a ideologia e política deste período,

apenas o citamos por sua influência pedagógica e musical internacionalmente reconhecida, apesar deste fato se constituir também como grande relevância social.

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254

Apontamos três tendências em que linguagem, cultura escolar e práxis se

entrecruzam para formar uma concepção pedagógica para o exercício profissional do

educador. Baseado em autores que discutem esses temas, como Grideon, Inbert, Peréz,

Sacristan, Silva, dentre outros, reproduzimos abaixo, em função das perspectivas pedagógicas,

este cruzamento entre linguagem, cultura escolar e práxis.

Quadro 1: Cruzamento entre cultura, linguagem, práxis e perspectivas educativas.

Uma vez compreendida como cultura escolar, práxis e linguagem interagem nesta

discussão acreditamos ser necessário definirmos um conceito de cultura que permeei todas

estas relações. Para isto, compreendemos a cultura como “o tecido de significados,

expectativas e comportamentos discrepantes ou convergentes que um grupo humano

compartilha” (PERÉZ, 2001, p. 15). Nessa perspectiva, este movimento

[...] requer, ao mesmo tempo, tomar consciência do caráter flexível e plástico do seu conteúdo. As produções simbólicas não podem ser entendidas como as produções materiais. As relações mecânicas entre os elementos confundem mais do que esclarecem a verdadeira natureza das interações humanas.[...] A cultura é um texto ambíguo, inacabado, metafórico, que requer constante interpretação. (PERÉZ, 2001, p. 15).

A cultura, como fenômeno radicalmente interativo e hermenêutico, requer

interpretação mais do que explicação casual. De acordo com a autora

Conhecer, inclusive, a própria cultura é um empreendimento sem fim. O próprio fato de pensá-la e repensá-la, de questioná-la ou compartilhá-la supõe seu enriquecimento e sua modificação. Seu caráter reflexivo implica

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255

sua natureza cambiante, sua identidade auto construtiva, sua dimensão criativa e poética. (PERÉZ, 2001, p. 15).

Esta definição de cultura nos ajuda a compreender a importância da música inserida na

escola e no processo de sensibilização dos atores envolvidos na cultura escolar.

Passemos, assim, a compreender como a linguagem se entrelaça neste contexto para

dialogar com a canção na escola. Lembremos que a canção é, necessariamente constituída por

melodia e texto, por isso seu recorte dentro da música e a escolha feita por nós como objeto de

reflexões.

4. A Linguagem Musical

De acordo com Fonterrada (1994), a educação musical segue duas tendências,

atualmente: a primeira delas é a “[...] ‘tradicional’ que se ocupa do ensino de instrumentos

musicais e, para isso, se serve de técnicas e práticas mundialmente aceitas como eficazes para

que seus objetivos sejam atingidos”. Esta tendência tem por objetivo o de

[...] promover a formação de instrumentistas, cantores, compositores e regentes através da vivência musical, obtida pelo contato com o som e com instrumentos musicais; proporcionar ao aluno a aquisição de técnicas de execução e leitura, bem como o domínio técnico necessário à sua formação.

Desta forma, a autora continua esclarecendo que, dentro desta perspectiva, sua forma

de arte é reprodutora e não há muito espaço para o desenvolvimento do pensamento criativo.

Sendo assim, o papel do professor pode ser “caracterizado como o de um determinador e

orientador da ação: seu principal objetivo é ensinar”. (FONTERRADA, 1994).

A segunda tendência entende a Música como derivada da Arte-educação e é chamada

de “alternativa” e isso implica dizer que

Esta forma de educação musical não está especificamente interessada na formação do músico profissional, mas, sim, de apreciadores de música. A vivência musical se dá através do contato com o som, instrumentos de percussão pequenos, ou fabricados com sucata. (FONTERRADA, 1994).

A arte é considerada como inerente a todos os seres humanos e o pensamento criativo

predomina sobre a aquisição de técnicas. Além disso, o papel do professor é o de “coordenar a

ação com o mínimo de interferência”. (FONTERRADA,1994).

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256

Neste momento, torna-se relevante aproximarmos a linguagem musical a linguagem

verbal quando tratamos de inseri-los no contexto escolar através da canção transformando

assim a cultura escolar e a práxis.

Existe uma tendência na área da Música a classificar, de acordo com a linguagem

verbal, a linguagem musical. Sendo assim, muitos músicos se expressam e analisam as obras

seccionando-as em frases, períodos, etc. assim como fazemos nas orações literais. Logo, um

ponto, vírgula e interrogação também têm seu respectivo na linguagem musical, porém

Fonterrada (1994) vai tratar este assunto em uma perspectiva fenomênica e hermenêutica. Ela

parte desta visada, fenomênica existencial, e dialoga, com base neste referencial, sua

influência e proximidade com a linguagem musical. O resultado dessa visão é que linguagem,

aprendizagem e a experiência musical se assemelham, logo podemos obter uma visão

filosófico-experencial-fenomênica aplicada à educação musical.

5. Filosofia e Música

Considerando-se que a diretriz política também influencia a perspectiva cultural

escolar e a práxis pedagógica, nossas reflexões e estudos fenomenológicos buscam

compreender a linguagem musical e verbal dentro da cultura escolar vigente apontando novas

possibilidades no trato da música neste contexto, valendo-se da canção. Neste percurso, faz-se

necessária uma reflexão dos conceitos filosóficos de Ponty (2011), no que se refere ao ato

vivencial e experiencial do ser no mundo e implicado no mundo, de onde importantes

referências podemos assumir frente à música e, de um modo geral, da música enquanto Arte.

De acordo com Ponty (2011, p. 244),

[...] toda linguagem se ensina por si mesma e introduz seu sentido no espírito do ouvinte. Uma música ou uma pintura que primeiramente não é compreendida, se verdadeiramente diz algo, termina por criar por si mesma seu público, quer dizer, por secretar ela mesma sua significação.

Quando analisado o fenômeno da fala, este autor afirma que

É preciso reconhecer em primeiro lugar que o pensamento, no sujeito falante, não é uma representação, quer dizer, que este não põe expressamente objetos ou relações. O orador não pensa antes de falar, nem mesmo enquanto fala; sua fala é seu pensamento. (PONTY, 2011, p. 244).

Assim Ponty (2011, p. 245) conclui que

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257

[...] não temos um pensamento à margem do próprio texto, as palavras ocupam todo o nosso espírito, elas vêm preencher exatamente nossa expectativa e nós sentimos a necessidade do discurso, mas não seríamos capazes de prevê-lo e somos possuídos por ele. O fim do discurso ou do texto será o fim de um encantamento.

Queremos situar este encantamento como, dentro da própria filosofia de Ponty, entre o

ser no mundo e aberto para o mundo onde nesta relação de abertura vivemos a experiência de

sermos ou do vir a ser, ou seja, tornar-se. Vejamos o que o autor comenta sobre a relação

entre palavra, fala e o artista

[...] a palavra é um certo lugar de meu mundo linguístico, ela faz parte de meu equipamento, só tenho um meio de representá-la para mim, é pronunciá-la, assim como o artista só tem um meio de representar-se a obra na qual trabalha: é preciso que ele a faça. (PONTY, 2011, p. 246).

Quando aproximamos o fenômeno da fala a expressão, operação da expressão e

potência da expressão associadas à música, Ponty (2011, p. 248) nos ajuda a compreender que

A operação de expressão, quando é bem-sucedida, não deixa apenas um sumário para o leitor ou para o próprio escritor, ela faz a significação existir como uma coisa no próprio coração do texto, ela a faz viver em um organismo de palavras, ela a instala no escritor ou no leitor como um novo órgão dos sentidos, abre para nossa experiência um novo campo ou uma nova dimensão. Essa potência da expressão é bem conhecida na arte e, por exemplo, na música.

Esta aproximação parece limitar a capacidade de percebermos a música, pois

Se nos parece sempre que a linguagem é mais transparente do que a música, é porque na maior parte do tempo permanecemos na linguagem constituída, damo-nos significações disponíveis e, em nossas definições, limitamo-nos, como o dicionário, a indicar equivalências entre elas. (PONTY, 2011, p. 255).

Diante do que foi visto sobre a fenomenologia podemos situar a escola como este

espaço multicultural e multi referencial em que as relações sociais se estreitam e se

entrecruzam para formar um contexto vivencial e experiencial no qual cada aluno está exposto

a uma ampla possibilidade do vir-a ser. É neste espaço que suas ações-reflexões ganham

“vida”, ou seja, no contato do seu corpo com o mundo e aberto para o mundo onde há a

possibilidade de vivenciar novas experiências.

Considerando este enfoque vejamos como a arte, corpo, ser humano e significações

são apresentadas por Ponty (2011, p. 210):

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[...] um romance, um poema, um quadro, uma peça musical são indivíduos, quer dizer, seres em que não se pode distinguir a expressão do expresso, cujo sentido só é acessível por um contato direto, e que irradiam sua significação sem abandonar seu lugar temporal e espacial. É nesse sentido que nosso corpo é comparável à obra de arte. Ele é um nó de significações vivas e não a lei de um certo número de termos co-variantes.

Observamos como a abordagem filosófica da fenomenologia pode contribuir e

embasar uma possibilidade diferente de percepção do fenômeno musical ampliando assim a

visão sobre sua utilização no contexto escolar frente a educação para o século XXI.

6. A Canção Na Escola

Passemos agora a analisar a canção, gênero musical que contém letra e melodia dentro

das tradições ou cultura escolar, atualmente utilizada nas salas de aulas. Na busca por

pesquisadores preocupados com este tema, no que se refere a canções e conteúdos

pedagógicos em sala de aula, encontramos em Maffioletti (2003) a confirmação de que a

música não é devidamente trabalhada por não oferecer objetivos claros. No desenvolvimento

do seu texto, a autora utiliza a canção “De olhos vermelhos de pelo branquinho...” para

descobrir, junto às professoras, os possíveis conteúdos trabalhados nesta canção. Desta forma,

ela afirma que estes conteúdos levantados pelas professoras – esquema corporal, coordenação

motora, lateralidade, expressividade e criatividade – não alcançam o objetivo principal, que

seria “[...] permitir a criança conhecer o coelho, fazendo relações entre a forma do seu corpo

com o modo como ele se movimenta, sua alimentação e seus hábitos.”, ou seja, não possibilita

a criança conhecer o objeto em suas características fundamentais e não contempla nem a

motricidade sugerida, pois os movimentos corporais geralmente são estereotipados em uma

coreografia criada por um adulto. Logo, a criatividade e a expressividade também não são

trabalhadas.

Uma vez tomado isso como verdade, deveríamos nos preocupar com os tipos de

relações que são construídas quando se utiliza a música em sala de aula, pois, muitas vezes,

estamos distantes de uma aprendizagem significativa para a construção da inteligência das

crianças, além de perdermos a oportunidade de ampliar o vocabulário, a compreensão de

mundo, criar novas significações simbólicas, experiência estética, desenvolvimento do

pensamento, dentre outros.

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7. Para Além das Aparências

Encontramos na obra de Ponty (2011) a identificação com a música, no sentido de não

se separar o objeto do sujeito. Acreditamos, assim como Ponty, que o corpo no mundo aberto

ao mundo é o espaço de estar no mundo vivenciando-o, assumindo-o e se responsabilizando

por sua permanência no próprio mundo, ou seja, assumindo as suas escolhas nesse mundo

complexo, dinâmico, multi referencial, multilingual, etc.

Como acabamos de ver, podemos, através da canção, oferecer uma possibilidade quase

infinita de relações culturais, vivenciais e experienciais para o sujeito. Podemos caminhar

tanto na letra como na música em si para diversas áreas de conhecimento, por isso,

enumeramos alguns compositores cujo foco recai nos conteúdos mais relevantes da sua

produção artística descritos assim: Esquema corporal – Bia Bedran; Universo infantil –

Palavra Cantada; Alfabetização – Teco Treco; Multi referencial sonoro – Hélio Ziskind,

dentre outros.

8. Nossa Pesquisa

Assim como alguns dos artistas citados acima que são compositores, intérpretes e/ou

músicos e, considerando a nossa experiência profissional em sala de aula, apresentamos uma

das nossas composições desenvolvidas com o objetivo de exemplificar os conceitos discutidos

ao longo deste artigo. Esta canção busca equacionar a problemática entre cultura escolar,

cultura musical, práxis pedagógica e filosofia em sua utilização na sala de aula.

VAMO DANÇÁ

Letra e Música:

Alexandre Rebouças

Olha a quadrilha, João

Fazendo o balancê

An avant tour no salão (Bis)

Damas prum lado

Cavalheiros pro outro

Vai começar o namoro

Paquera moça

Pisca e beija meu bem

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Lá vem o túnel

Simbora no trem

A festa é boa

O rasta pé tá animado

O corpo todo suado

E o sapato furado (Bis)

Nesta canção, abordamos a festa junina, uma de nossas manifestações culturais, de

forma lúdica e com ampla possibilidade de exploração textual. Quanto a parte vivencial

deixamos a critério dos professores regente ou de música chamando a atenção para a ideia da

expressão corporal da dança, ou seja, a quadrilha, formação típica da festa de São João.

Assim, acreditamos que os conteúdos textuais, musicais, experienciais e vivenciais, centrados

no corpo, serão valorizados e contribuirão para uma aprendizagem integrada e significativa

dos participantes da atividade.

9. Conclusão

Acreditamos, desta forma, poder contribuir para as indagações sobre a ampliação das

possibilidades educativas no século XXI frente aos novos desafios encontrados na área da

Educação. Tecemos algumas reflexões, que acreditamos serem relevantes, para a utilização da

canção no contexto escolar, e assim, colaborarmos para que a Arte e a Música sejam mais

participativas e atuantes neste contexto, pois muitas vezes, observamos durante a nossa

prática profissional, que estas áreas de conhecimento são utilizadas de forma estereotipada e,

em alguns casos, menosprezadas por diversos grupos sociais dentro da própria escola.

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Referências

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Humanizando, Socializando e Intervindo Através da Musicalização Infantil

Felipe Rocha Santos1 [email protected]

Resumo: O educador Paulo Freire deixou a todos nós educadores um legado inestimável de como educar e substantivamente formar. Aplicamos a Pedagogia Freireana a Educação Musical Infantil, afim de através da prática musical, acolher e valorizar a Cultura Ancestral Africana de nossas crianças. Utilizar as concepções freireanas na musicalização infantil permitiu que promovêssemos um real acesso a arte e a cultura e contribuíssemos na construção de uma sociedade de com relações étnico-racias e culturais mais justas e iguais.

Palavras chave: Freire, cultura, música

Introdução

Humanizar, socializar e intervir era o que desejamos realizar através da musicalização

infantil na Escola Municipal Irmã Elisa Maria da Secretária Municipal de Educação e Cultura

de Salvador, localizada em uma região carente da cidade. As atividades de musicalização são

realizadas por educadores provenientes do Brasil, da Argentina e do Chile, que através dos

estudos em cultura africana encontraram uma maneira de musicalizar levando em

consideração a cultura ancestral contida na comunidade em que a escola está inserida.

Os educadores fazem parte de programas educacionais desenvolvidos nessa instituição

e realizam o voluntariado educativo como tecnologia social e ferramenta pedagógica. O

objetivo da prática voluntária, utilizando o fazer artístico-musical é criar um currículo

integrador e inovador e ajudar a criança a respeitar as diferenças e viverem a diversidade

musical presente em sua cultura e na de outros povos.

Para estimular a criatividade e tornar mais completa a formação da criança, optou-se

por criar um ensino musical infantil que fosse além do lúdico e do passageiro e que ajudasse a

perpetuar a cultura da criança e de sua comunidade. Assim, as atividades de musicalização

distribuídas entre quatro educadores, além de possuir as ações musicalizadoras comumente

utilizadas incluem canto africano e música percussiva que se unem as aulas de canto coral,

jogos rítmicos e ensino de instrumento. Esse trabalho oferece uma rotina diária de estudos e

vivências que ocorrem no contra-turno e fins de semana e são monitoradas por regentes,

solistas e coreografas psicomotricistas com vasta experiência internacional na pesquisa e

ensino de música, canto e dança africana.

1 Escola Municipal Irmã Elisa Maria.

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O trabalho atinge mais de 150 crianças entre cinco e oito anos de idade que cursam o

Ensino Fundamental I e são originárias de famílias negras e afro-descendentes. As atividades

ocorrem desde o primeiro semestre de 2011 com um total até então de 400h de atividades

artísticas.

Todo e qualquer trabalho nessa área visam à constituição do sujeito e soerguimento de

sua personalidade e sensibilidade através da música e do movimento corporal com pano de

fundo a sua cultura ancestral.

As contribuições do educador Paulo Freire

Para Paulo Freire (2001) devemos construir o nosso “ser no mundo com os outros”

pela relação com as pessoas, com a sociedade e com sua cultura. Helena Trope (1993, p.108)

diz que “o educador, ou o músico-educador ou o educador-músico é membro de um grupo

social. E, por isto, tem compromisso com a música e com a sociedade.” Assim para Paulo

Freire e Helena Trope a escola e as atividades que nela ocorrem, o que inclui a educação

musical, deveria acolher a cultura, a história da comunidade e do povo. Por isso encaramos a

metodologia freireana uma um aspecto importante nas atividades de musicalização infantil, já

que a mesma incentiva o engajamento do educador com a comunidade popular, com sua

música e cultura.

Paulo Freire muito destaca o papel da escola na promoção da cultura popular e a

importância dos conhecimentos prévios. Nas nossas atividades musicalizadoras colocamos

como referência de trabalho a Cultura Africana e Afro-brasileira presente no patrimônio

imaterial da cidade de Salvador como meio de valorização dos conhecimentos prévios e da

cultura do aluno que em geral está relacionada a essa manifestação cultural.

Para esse fim, de acordo com as orientações pedagógicas encontradas na Pedagogia

Freireana, construímos um currículo musicalizador que estivesse em compasso com os

conceitos, filosofias e modos de vida da comunidade baiana que é basicamente formada por

descendentes de africanos. Conforme abordado por Alicia Loureiro (2003, p. 190) “é

necessário interagir e complementar práticas pedagógicas, como procedimentos organizados

com os modos de pensar e agir, com as experiências vividas e os estímulos diversos que

cercam o mundo das crianças e dos jovens.”

Utilizando o Método Paulo Freire

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Em 1962, Paulo Freire desenvolveu o que hoje é conhecido como “Método Paulo

Freire”, um método educacional usado inicialmente na alfabetização de jovens e adultos que

visava à valorização da Cultura do Povo. O professor era um animador de debates que sempre

ensinava, ou melhor, desenvolvia suas atividades, a partir de conhecimentos prévios e das

experiências vividas por eles, isso era um estimulo o seu desenvolvimento cognitivo,

emocional e cultural. Para esse fim, os educadores utilizavam três momentos: (1) Investigação

Temática, (2) Tematização e (3) Problematização.

Nós educadores, na Escola Municipal Irmã Elisa Maria construímos o currículo

musical da instituição através dessa metodologia. Apresenta-se agora como o método foi

utilizado.

No momento de Investigação Temática cada um preocupou-se em conhecer as

influências musicais presentes no cotidiano da criança a fim de tornar o ensino de música

mais integrado com a comunidade social e sua cultura. Através de vivências e Rodas

Musicais, o educador buscava compreender o modo de pensar musical da criança e as

manifestações artísticas de sua comunidade. Paulo Freire (1996, p. 41) disse que “uma das

tarefas mais importantes na prática educativo-crítica é propiciar condições em que os

educandos em suas relações com o professor ou professora ensaiam a experiência profunda de

assumir-se.” Percebeu-se devido a alguns fatos e no decorrer de vivências musicais que a

criança necessitava assumir-se como ser social, criador, transformador, pensante e cultural.

Ela necessitava individualmente assumir a sua identidade como pertencente à Comunidade

Negra, e para conseguirmos isso se decidiu utilizar referências musicais da cultura ancestral.

Na Tematização estudamos um meio de elaborar um tema gerador interdisciplinar

que buscasse o reconhecimento da identidade cultural (FREIRE 1996, p. 41). O tema “Cultura

Musical e Dançante Africana e Afro-brasileira” nos fornece a possibilidade de instituir um

significado social à música dentro da escola. Esse tema ajuda cada criança a melhor

compreender a sua cultura e identidade, já que a música em si, como linguagem artístico-

cultural é uma pratica social. A memória, historia e saberes do povo negro tornou-se objeto de

educação musical infantil. Hentschke (1991, p. 59) nos recorda que o valor multicultural da

música é ‘tentar evitar o isolamento de sub-culturas, bem como a imposição ás mesmas da

cultura dominante do país em que se situam'.

A fase de Problematização é o momento em que usamos, para fazer do educador

musical um problematizador e orientador de aprendizagem o que ajuda a criança a colocar-se

pessoalmente como construtora de conhecimento e saberes musicais, nós nos 'educamos em

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comunhão' (FREIRE 1981, p. 79). Aqui buscamos musicalizar através de valores culturais

africanos e estimulamos a criatividade, a excussão e a composição utilizando instrumentos,

canções e gêneros da cultura ancestral. A problematização é importante para desafiar a

criança a novas aprendizagens através da prática musical, ao ser estimulada, ela percebe que

necessita aprender mais, “seus modos de perceber, suas formas de ação e pensamento” são

aguçadas (FONTERRADA, 1994, p.141). E isso é importante, pois Porcher (1982, p.15) nos

esclarece que “não existe espontaneidade natural nem liberdade imediatamente criativa. É

preciso dá a criança os instrumentos necessários para sua auto-expressão”.

As idéias democráticas de Freire muito nos ajudam a musicalizar crianças. Tais

conceitos nos ajudam a perceber cada criança e família como fazedores de cultura e valorizar

tais saberes. Além do mais, colocar as artes negras como objeto de estudo musical contribuí

para desfazer a visão etnocêntrica de alguns e construir uma Pedagogia Musical Anti-racista e

Multicultural.

Paulo Freire também destaca a necessidade da dialógicidade no momento educativo ao

dizer que “a educação é comunicação, é diálogo” e utilizar o método dialógico-pedagógico

contribui muito para que sempre elaboremos atividades musicais voltadas para o

desenvolvimento social, cultural e integral da criança (FREIRE 1982, p. 69).

No entanto, a grande contribuição de Freire nos trabalhos é a sua insistência de que a

escola deveria tornar-se um espaço cultural e que toda cultura deveria ser acolhida como meio

de apreensão de conhecimentos. Como disse ainda Koellreutter (1997 p. 38-39) a arte é um

“instrumento de libertação” e não de “alienação social” e Freire (1996, p. 81) ainda contribui

em dizer que não podemos 'de maneira alguma, nas nossas relações politico-pedagógicas com

grupos populares desconsiderar seu saber e experiência feito' e nós não desconsideramos nem

mesmo a sua música, sua arte e cultura. Procuramos valorizar a diversidade musical dos

povos negros na África e na diáspora.

A Arte Negra e Educação Musical Infantil

Jusamara Souza (1996, p. 26) disse que o significado musical é “construído

culturalmente, em dadas condições contextuais, e ignorá-las pode implicar a projeção de

preconceitos e distorções, por isso entendemos que considerar a diversidade musical na

educação de crianças é construir um modelo pluridimencional da música.

Um currículo musicalizador que busca referências na Cultura de Matriz Africana tem

sido importante na valorização das concepções estéticas baseadas na cultura de nossas

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crianças negras, presente, no entanto, no cotidiano de pessoas negras e não-negras da escola e

da comunidade em que realizamos o trabalho de educação musical. Isso se mostra positivo,

pois a maioria das escolas em suas atividades musicalizadoras “não inclui em suas atividades

pedagógicas, referências do patrimônio cultural e artístico africano e, quando contempla a arte

afro-brasileira, geralmente, o faz de modo folclorizado ou sem devida menção de que se trata

de uma manifestação oriunda da matriz africana, valorizando-a” (SECRETARIA

MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E CULTURA DE SALVADOR 2005, p. 67).

Corpo, Cultura e Música

Na arte negra o corpo é o centro é o centro da produção artístico-musical. Ele é

essencial para criar e recriar. De acordo com determinada publicação “sobre o corpo se

assenta toda uma rede de sentidos e significações” (MEC, 2010 p. 58). O corpo, portanto, é

um espaço importante para concepção, produção e recriação da vida. Trabalhar o corpo na

musicalidade africana é ir além do teórico e pratico a fim de alcançar uma dimensão holística.

Paulo Freire também nos fala sobre a importância do corpo ao dizer que “nas culturas

em que o corpo não foi submetido a um intelectualismo racionalizante (...) em que o corpo

consciente encontrando-se em maior liberdade em suas relações com a natureza, move-se

facilmente de acordo com seus ritmos” (FREIRE, 1978 p. 111).

Em nosso trabalho musical o corpo assumiu essa dimensão integral e integrante do

processo de musicalização. Através de vivências a música corporal foi sendo trabalhada para

produção de sons, diferentes ritmos, tonalidades e intensidades.

Nas aulas de instrumento e canto coral focalizou-se a necessidade de “ouvir” a música

do próprio corpo. Ele (corpo) tornou-se o centro das produções musicais. Fazer isso era

importante, pois a criança, ao compreender que seu corpo produzia diferentes sons, aprendeu

de maneira mais concreta que a sua própria voz ou os instrumentos são capazes de

semelhantemente expressar-se em diferentes sons, ritmos, intensidades e tonalidades.

A cultura foi uma questão e continua sendo, muito trabalhada na educação musical

infantil. Procuramos de todos os modos evitar o isolamento de sub-culturas dando a cada

criança a oportunidade de conhecer e executar gêneros de diferentes grupos étnico-culturais

africanos formadores de nossa brasilidade. Por isso, ela teve a oportunidade de se familiarizar

com gêneros musicais do oeste e sul africano, do recôncavo baiano e da cidade de Salvador.

Também buscamos inspiração em Freire para tornar a educação musical algo

nitidamente musical para as crianças. Ele nos ensinou que a cultura é resultado do trabalho e

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do acréscimo humano de algo ao mundo que ele não fez. E essa realidade cultural de trabalho

e acréscimo pode manifestar-se em diferentes linguagens, inclusive na música. Por isso cada

povo ou comunidade produziu e produz cultura, cultura que deve ser valorizada e trabalhada

pelo educador. (FREIRE 1983, p. 108-109). Portanto a construção de um currículo musical

infantil que dá significado e valor a cultura ancestral da criança é um meio de tornar a escola

mais envolvida com a vida e história do educando e de seu povo, nosso povo na verdade.

Saberes Prévios

Para Freire o educador teria de levar em conta os saberes e experiências de vida do

educando, pois ninguém é vazio de conhecimento. Para esse fim, fazia-se necessário um

esforço dele de se comunicar com o educando. Essa relação dialógica seria capaz de buscar

significados e ressignificados (FREIRE 1982, p. 69). Isso é importante na educação musical

infantil, pois Penna (1990, pp. 19-20) disse que não adianta colocar o aluno “submerso na

escola com uma malha de conteúdos e metodologias desconexos”

Tomados por esse modo de pensar freireano procuramos valorizar os saberes prévios e

experiências musicais da criança. Portanto, a musicalização sempre parte de estilos

conhecidos pelas crianças. Nas aulas de Linguagem Musical Percussiva, por exemplo, o

educador musical tem o cuidado de associar determinados gêneros musicais africanos a

produções musicais conhecidas pelas crianças, comparações com o tão difundido pagode são

mais comuns.

As crianças na comunidade crescem ouvindo pagode, estilo que nasceu e se

desenvolveu nas regiões periféricas de Salvador. Como se utilizou esse estilo popular na

musicalização infantil? De modo geral a criança sabia executar em instrumentos percussivos

esse estilo musical, daí o educador ao ensinar formas de execução de gêneros originários do

oeste africano, comparava os estilos em sua intensidade e diferenciava a tonalidade. Além do

mais o educador não se negava a ouvir e executar a música ouvida pela criança fora da escola,

aprimorando, no entanto, o seu modo de executá-la e senso crítico-musical. Como nos disse

Snyders (1992, p. 88) “a aula de música constitui uma ocasião bastante privilegiada de

colocar-se em ‘uníssono’ com os outros, de escutar uns aos outros, com habituais

ressonâncias de conhecer-se, apreciar-se, aceitar-se”.

Portanto a educação musical infantil em nossa experiência procura emergir do próprio

meio do educando ou senão, aproximar-se ao máximo dele. Esse esforço está em harmonia

com o comentário de Loureiro (2003, p. 176) que disse:

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Compreender o modo como os jovens se relacionam com a música, seus gostos e estilos, significa uma abertura ao diálogo permanente com a realidade sócio-cultural na qual estão engajados os mais diferentes grupos socais, inclusive do professor.

Resultados e Conclusões

“Como educador preciso ir lendo cada vez melhor a leitura do mundo que os grupos

populares com quem trabalho fazem de seu contexto imediato e do maior de que esse é parte”,

disse Freire (1997 p. 90). Por isso a tarefa do educador é “Ler o mundo” dos educandos,

conhecê-los, respeitá-los e valorizar a sua cultura, acolhendo as suas diferenças.

Através de educação musical infantil a escola tem dado as crianças negras o apoio para

que elas possam construir de maneira positiva a sua identidade social e cultural como

pertencente ao grupo afro-descendente. E de uma maneira geral contribuímos para que todos

reconheçam a Arte Negra e sua musicalidade como saber socialmente construído e

reconhecendo a África como uma das matrizes legitimas da cultura humana e especialmente,

da brasileira.

A valorização de tradições musicais e costumes da cultura da criança e de seu povo

têm dado suporte ao aprendizado musical. E o trabalho com música africana e afro-brasileira é

um meio de acolher para o seio da escola a diversidade cultural.

Acolher a Pedagogia Freireana na musicalização infantil nos fornece o desafio diário

de “promover o real acesso ao saber, a cultura e a arte” (PENNA 1996, p. 23). Acesso este

que é dado através da valorização das memórias, histórias e artes do povo negro, que

majoritariamente compõem nossa clientela. O Método Paulo Freire nos permiti conhecer de

maneira mais profunda o modo de pensar musical da criança e sempre partir de suas

experiências musicais, permitindo a nós, mergulhar em sua cultura e ajudá-la a prezar suas

raízes ancestrais.

Destaca-se também que essa perspectiva musical diversificada, construída em direção

a um processo aberto e dialógico contribui para a aproximação das crianças a nós educadores,

ao saber, as artes e a música. Considerado aspectos formativos da personalidade da criança

acreditamos que o acesso a arte e a música na vida de cada criança tem se transformado “num

instrumento de soerguimento da personalidade e de estimulo a criatividade”

(KOELLEREUTTER 1997, pp. 38-39).

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A educação para Freire (1997, p. 100-105) era uma forma de intervenção no mundo.

Portanto a musicalização infantil por nós desenvolvida contribui para reforçar o projeto de

construção de uma sociedade com relações étnico-raciais e culturais mais igualitárias.

Assim em nossa experiência estamos comprovando a responsabilidade que nós

educadores musicais temos de ‘abrir portas, de dar acesso ao conhecimento

musical’(SWANWICK 1993, p.29-30), mais também, o nosso maior dever com a sociedade

brasileira em perpetuar a sua cultura, a sua ancestralidade e de fazer com que esses

importantes elementos constituintes de nossa identidade façam parte da musicalização

infantil.

Referências

BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Orientações e Ações para Educação das Relações Étnico-raciais. Brasilia: SECAD, 2010 FONTERRADA, Marisa T. de Oliveira. “Linguagem verbal e linguagem musical”. In: Cadernos de Estudo: Educação Musical, n. 4 e 5. São Paulo, p. 41, 1994 FREIRE, Paulo. Cartas a Guiné-Bissau: registros de uma experiência em processo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. FREIRE, Paulo. Ação cultural para liberdade. 15. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981 FREIRE, Paulo. Extensão e Comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982 FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996 e 1997 HENTSCHKE, Liane. “A educação musical: Um desafio para a educação”. Educação em Revista, n° 13 jun. Belo Horizonte, p. 51, 1991. KOELLEREUTTER, Hans J. Cadernos de Estudo: Educação Musical, n°6. São Paulo, pp. 1-210, 1997. LOUREIRO, Alicia Maria Almeida. O ensino da música na escola fundamental. Campinas SP: Papirus, 2003. PENNA, Maura. Reavaliações e buscas em musicalização. São Paulo: Loyola, 1990. PORCHER, Louis. Educação Artística: Luxo ou necessidade? São Paulo: Sammus, 1982.

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SOUZA, Jusamara. Contribuições teóricas e metodológicas da sociologia para a pesquisa em educação musical. V ENCONTRO ANUAL DA ABEM. V SIMPÓSIO PARANAENSE DE

EDUCAÇÃO MUSICAL. Anais... Londrina: Abem, pp. 11-40, 1996. SNYDERS, George. A escola pode ensinar as alegrias da música? São Paulo: Cortez, 1992. SWANWICK, Keith. Permanecendo fiel a música na educação musical. II ENCONTRO ANUAL DA ABEM. Anais... Porto Alegre: Abem, pp.19-32, 1993. TROPE, Helena R. As músicas da America Latina e a educação Musical. VI ENCONTRO ANUAL DA ANPPOM. Anais... Rio de Janeiro: Anppom, pp. 47-53.

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Música e Cultura Popular com Crianças na Educação Básica

Leila Cristina Pereira dos Santos Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES)

[email protected]

Valéria Poliana Silva Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES)

[email protected]

Resumo: A cultura popular brasileira é ampla e diversificada, refletindo diretamente nas formas de expressão cultural dos sujeitos. A compreensão dos elementos culturais e sua diversidade são importantes dispositivos de entendimento dos sujeitos inseridos em processos de ensino e aprendizagem, tornando assim o âmbito escolar apropriado para o desenvolvimento de atividades que valorizem elementos da cultura popular. Na relação cultura-educação é possível proporcionar aos envolvidos o autoconhecimento e o respeito à diversidade. Nessa perspectiva, o presente trabalho tem como objetivo principal, estimular a presença da cultura popular através da educação musical na educação básica, buscando entender à adoção dessa temática em projetos de extensão universitária. A realização desse trabalho foi possível, através da revisão bibliográfica e pela participação no Projeto Tesouros do Tempo.

Palavras chave: Cultura popular, educação musical, extensão universitária

1. Introdução

O presente trabalho aborda a presença da cultura popular no contexto escolar da

educação básica, seguindo de descrição sobre a importância da valorização cultural e do

respeito à diversidade na formação do aluno. As ações são articuladas com o GPAM (Grupo

PET Artes Música) 1 programa vinculado ao MEC e financiado pela CAPES no intuito de

produzir conhecimento em torno da temática música na escola.

É perceptível que a cultura popular encontra-se conectada à diversidade social do

nosso país, que segundo Lima (2002, p. 23) configura-se como uma das mais diversificadas

sendo assim, a mesma torna-se importante instrumento que juntamente com a música pode

auxiliar de forma intensa e eficaz no ensino-aprendizagem no âmbito escolar. Compartilhando

com, Cristina Rolim Wolffenbüttel a sala de aula é um local interessante para se tratar da

cultura popular, pois apresenta uma grande diversidade cultural entre os alunos presentes

1 Grupo Pet Artes Música da Unimontes, sob tutoria do Prof. Ms. Luciano Cândido e Sarmento têm como objetivo desenvolver as ações de ensino, pesquisa e extensão em música, bem como compreender e desenvolver a educação musical e assim promover o desenvolvimento sócio cultural dos sujeitos, destacando a importância da música no contexto escolar.

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(WOLFFENBÜTTEL, 2000, p. 31). Além disso, trabalhar a cultura popular em sala de aula é

a oportunidade do autoconhecimento e do respeito à diversidade.

Diante disso, nota-se que as universidades brasileiras vêm adotando a cultura popular

como base em projetos de extensão universitária. Dessa forma, o projeto Tesouros do Tempo2

vinculado ao Pólo Arte na escola da Universidade Estadual de Montes Claros –

UNIMONTES se propôs a retratar a história cultural da cidade de Montes Claros com

crianças em cinco escolas públicas municipais, no período de outubro a dezembro de 2009.

Fundamentado na participação no projeto Tesouros do Tempo e em pesquisas bibliográficas

(Corrêa 2007, Kater 2004, Laraia 2010, Lima 2002, Queiroz 2004, Queiroz 2009, Santos

2011, Souza 2010, Wolffenbüttel 2000), como em livros e artigos científicos. Buscamos nesse

estudo estimular a presença da cultura popular através da educação musical na educação

básica, procurando entender à adoção dessa temática em projetos de extensão universitária.

Esperamos que esse trabalho contribua para valorização da cultura popular na

formação do aluno e para exemplificar através do projeto Tesouros do Tempo, o papel da

extensão universitária para os acadêmicos e sociedade. Contribuindo ainda, para o

fortalecimento das pesquisas relacionadas à educação musical, cultura popular e extensão

universitária o que é de grande relevância para nosso constante desenvolvimento. Pois

acreditamos que através da pesquisa ampliamos os conhecimentos e encontramos respostas as

nossas inquietações.

2. Desenvolvimento

Sabemos que a cultura de um povo é constituída por vários elementos, crenças valores,

mitos, jeito de falar, modo de vestir, alimentação, dança, música, folclore, entre outros. Mas

vale ressaltar que, a cultura popular não se limita às manifestações festivas e tradições, esta

também se refere à organização e expressão de todos os elementos citados anteriormente.

Diante do exposto, concordamos com Freire (2003), citado por Gabriel:

Quando falamos de cultura popular estamos nos referindo não apenas às manifestações festivas e às tradições orais e religiosas do povo brasileiro, mas ao conjunto de suas criações, às maneiras como se organiza e se expressa, aos significados e valores que atribui ao que faz [...] (FREIRE apud GABRIEL, 2005, p.5).

2 Tesouros do Tempo refere-se a um projeto desenvolvido de um musical com o mesmo nome.

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Para a continuidade deste estudo é importante compreender a valorização da

identidade cultural e sobre o meio em que ela é disseminada, como afirma Laraia:

O homem é o resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquiridos pelas numerosas gerações que o antecederam. A manipulação adequada e criativa desse patrimônio cultural permite as inovações e as invenções. (LARAIA, 2001, p.41)

Baseado na afirmação de Laraia, podemos concluir que a cultura popular não muda de

um dia para o outro, ela advêm de um processo acumulativo que percorre gerações. Como

podemos observar, a cultura refere-se a uma temática ampla e complexa, porém o foco deste

trabalho é em específico na área musical.

2.1 Música e cultura popular na sala de aula

A cultura musical se relaciona com inúmeros aspectos da vida humana, baseado nos

resultados de Queiroz quando o mesmo afirma que “a música na e como cultura representa

uma forte e complexa fonte de significados, sendo parte intrínseca da experiência de cada

sujeito”. (QUEIROZ, 2004, p.105/106). Por conseguinte, observamos que por meio da música

é possível identificar elementos da identidade cultural da realidade em que foi desenvolvida.

No que se refere ao ensino aprendizagem em sala de aula, a música vem sendo

trabalhada de diferentes maneiras com diversas finalidades, uma dessas possibilidades é a de

valorização da cultura popular e o respeito pela diversidade cultural. Souza enfatiza que:

A cultura popular, além de apresentar elementos de riquíssimas possibilidades para o trabalho com a música na sala de aula, nos faz entender sobre diferenças culturais, nos faz sair de cada experiência, de cada brincadeira, mais felizes e principalmente mais humanizados (SOUZA, 2008, p.80).

Em torno de trabalhos culturais através da educação musical na educação básica,

Queiroz e Marinho (2009) vem nos dizer que, “lidar com diferentes expressões culturais

permite contemplar uma série de objetivos fundamentais para o ensino da música nas

escolas.” (QUEIROZ; MARINHO, 2009, p. 66). Mas para que isso aconteça e necessário

estarmos cientes que não basta simplesmente abordar a cultura popular, é imprescindível que

se faça de forma eficaz, desenvolvendo práticas significativas, que contemplem a realidade

dos alunos. Proporcionando aos envolvidos um real entendimento das atividades

desenvolvidas, para assim, possibilitar a valorização e o respeito as diversidades culturais

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presentes nesse contexto. Seguindo esse pensamento, é possível afirmar a importância da

relação cultura e educação. Assim concordamos com Kater (2004), quando mesmo diz que a

união de música e educação contribui para ampliação do conhecimento e do

autoconhecimento, pois se tornam ferramenta de formação.

Música e educação são, como sabemos, produtos da construção humana, de cuja conjugação pode resultar uma ferramenta original de formação, capaz de promover tanto processos de conhecimento quanto de autoconhecimento. Nesse sentido, entre as funções da educação musical teríamos a de favorecer modalidades de compreensão e consciência de dimensões superiores de si e do mundo, de aspectos muitas vezes pouco acessíveis no cotidiano, estimulando uma visão mais autêntica e criativa da realidade (KATER, 2004, p.440).

Deste modo, é compreensível o envolvimento da música em projetos que visam à

educação, humanização e que prezam tanto pelo respeito à diversidade, quanto pela

valorização da cultura popular.

2.2 Extensão Universitária

Nota-se que nas universidades brasileiras há uma crescente adoção da cultura popular

como base na confecção de projetos de Extensão Universitária. Os mesmos visam difundir e

recriar os elementos do cotidiano local, fazendo assim um diálogo entre universidade e

sociedade.

Conforme Corrêa (2007 p.17), “A Extensão Universitária é o processo educativo,

cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a

relação transformadora entre a Universidade e a Sociedade”. Logo, podemos afirmar que a

Extensão Universitária possibilita um novo espaço de aprendizagem. Concordamos com

Santos (2010, p.13), pois além de formar profissionais as Instituições de Ensino Superior,

devem promover a socialização e democratização do conhecimento, fazendo uma difusão

entre universidade e sociedade. Segundo o mesmo, complementa a formação dos discentes e

docentes é uma das oportunidades onde os acadêmicos colocam em prática os conhecimentos

que vem adquirindo em sala de aula, ou seja, vivenciam o fazer profissional. Dessa forma é

possível afirmar que a extensão não beneficia apenas a sociedade, e sim, todos os envolvidos

O Projeto Tesouros do Tempo vinculado ao Pólo Arte na escola da Universidade Estadual de

Montes Claros – UNIMONTES foi uma dessas formas de diálogo entre universidade e

sociedade.

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275

Esse projeto foi idealizado pela professora Raquel de Paula3, na execução contou com

a participação das professoras Raiana Maciel e Fátima Mendes do departamento de Artes e

departamento de Estágio e Práticas Escolares da Universidade Estadual de Montes Claros -

Unimontes e com acadêmicos de Música e Teatro da mesma instituição juntamente com a

parceria entre Secretária Municipal de Educação de Pró-Reitoria de Extensão. Vale ressaltar,

que essa participação para alguns acadêmicos foi à primeira experiência no que se refere à

extensão e estágio, já que o convite para se integrar no projeto se estendeu aos alunos de todos

os períodos.

Esse projeto foi desenvolvido em cinco escolas municipais da cidade de Montes

Claros, sendo elas, Escola Municipal Jair de Oliveira, Escola Municipal Jason Caetano, Escola

Municipal Professora Maria de Lourdes, Caic do Maracanã (Escola Municipal Dominguinhos

Pereira) e Caic do Renascença (Escola Municipal Dominguinhos Pereira). A proposta foi

transmitir através de canções, parlendas e brincadeiras a história cultural da cidade de Montes

Claros no contexto escolar e assim prestar uma homenagem ao centenário de Hermes de

Paula4. Em torno disso, Paula (2009) 5 diz: “poderemos homenageá-lo acreditando que a

escola possa e deve ser um espaço de formação ampla do educando. Acreditando, podemos

contribuir para o processo de humanização, através de experiências culturais significativas”.

Vale destacar, que entendemos cultura popular como várias manifestações que

resultam de interações entre pessoas, o que reflete nas diversidades culturais. Diante

disso, torna-se perceptível a importância do trabalho com a cultura popular na escola, pois

nesse contexto lidamos com a diversidade, devido à cultura que cada um carrega consigo.

Visando trabalhos educativos com a cultura popular, é importante conscientizar os alunos as

concepções de significados que as manifestações culturais apresentam para aqueles que estão

inseridos nessa cultura. Contribuindo para o respeito e melhor convívio em grupo.

3. Considerações finais

Com base nas discussões apresentadas nesse estudo e através da participação no

projeto Tesouros do Tempo, podemos concluir que o trabalho com a cultura popular através

da música pode ser considerado importante fator para formação do indivíduo crítico, criativo

e participativo. Lembrando que a educação musical é importante instrumento de socialização,

3 Idealizadora e coordenadora geral do projeto “Tesouros do Tempo”. 4 Médico, escritor, historiador, importante folclorista da cidade de Montes Claros. 5 Citação retirada do projeto “Tesouros do Tempo”, organizado pela Professora Raquel Helena Mendonça de Paula no ano de 2009. Esse documento não foi publicado.

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e que através da música podemos vivenciar manifestações culturais, possibilitando contato

com outras realidades.

Sabendo que a escola é detentora de valores que auxiliam diretamente nessa formação,

acreditamos ser relevante articular a cultura popular nesse contexto de ensino e aprendizagem.

Assim, para desenvolver ações com essa temática, se faz necessário abrir os olhos para as

muitas vertentes da diversidade cultural, presente nos distintos contextos. Portanto,

percebemos que a convivência entre alunos e professores em sala de aula contribui

diretamente na formação da identidade cultural dos indivíduos.

Quanto ao Projeto Tesouros do Tempo, consideramos o trabalho satisfatório uma vez

que, desenvolveu um trabalho grandioso em pouco tempo alcançando um grande número de

pessoas. Um fator significativo foi que além de ensinar o repertório, as equipes envolvidas

tiveram a preocupação em saber se as crianças sabiam o que estavam trabalhando. Para tanto

à medida que o roteiro era transmitido, a história de Montes Claros era contada para as

crianças, e elas também compartilhavam o conhecimento que já tinham sobre a cidade, o que

reforça a idéia de que a extensão universitária é mesmo uma forma de diálogo entre a

Universidade e a Sociedade uma troca de saberes. Diante disso, explica-se a adoção da

temática em projetos de extensão que possibilitam a integração da teoria com prática, fazendo

chegar à sociedade o resultado do conhecimento construído na universidade.

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Referências

CORRÊA, Edilson José. Extensão Universitária: organização e sistematização / Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras. Belo Horizonte Ed. Coopemed., 2007. KATER, Carlos. O que podemos esperar da educação musical em projetos de ação social. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 10, p. 43-51, 2004. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. LIMA, Sonia Regina Albano de. As rupturas ideológicas do processo cultural brasileiro e seus reflexos na educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, V.7, p. 21-29, 2002. QUEIROZ, Luis Ricardo Silva. Educação musical e cultura: singularidade e pluralidade cultural no ensino e aprendizagem da música. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 10, p. 99-107, 2004. QUEIROZ, Luiz Ricardo Silva; MARINHO, Vanildo Mousinho. Práticas para o ensino da música na educação básica. Música na educação básica. Porto Alegre, v.1, n.1, p.60-75, 2009. SANTOS, Marcos Pereira dos. Contributos da Extensão Universitária Brasileira à formação acadêmica docente e discente no século XXI: Um debate necessário. Revista Conexão UEPG, Ponta Grossa, V.6, n1, p. 10-15, 2010 - ISSN 1808-6578. Disponível: http://www.uepg.br/revistaconexao/revista/edicao06/1.pdf. Acesso: 29 abr. 2011. SOUZA, Fernanda de. O brinquedo popular e o ensino de música na escola. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 19, p.75-81, mar. 2008. Disponível em: www.abemeducacaomusical.org.br/Master/reevista19/revista19_artigo8.pdf Acesso em: 10 mar. 2010. WOLFFENBÜTTEL, Cristina Rolim. A Presença das Raízes Culturais na Educação Musical. Revista da ABEM, V. 5, p.31-37 setembro 2000.

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Produção Fonográfica “A Turma da Maré”: um relato de experiência

Elaine Maria da Silva Ufal

[email protected]

Elias Pereira Laurentino Júnior

Resumo: Este trabalho tem como objetivo apresentar A Turma da Maré, projeto iniciado em 2009 pelos alunos da disciplina Projetos Integradores IV do curso de Licenciatura em Música da Universidade Federal de Alagoas - UFAL. Este projeto resultou em composições musicais que estão sendo utilizadas nos conteúdos de educação musical nas escolas de ensino fundamental em Maceió. A Turma da Maré é um trabalho fonográfico em CD disponibilizado, também, em um livro didático. Tem, ainda, como uma das propostas, a utilização de ritmos nacionais e internacionais integrados a elementos e/ou espécies da fauna aquática em geral.

Palavras chave: Educação musical, produção musical e cultura

A Turma da Maré

Este relato de experiência tem por objetivo destacar o projeto de educação musical, A

Turma da Maré, que surgiu em 2008 com os alunos da disciplina Projetos Integradores I na

Universidade Federal de Alagoas – UFAL.

A disciplina Projetos Integradores IV do curso de Licenciatura em Música da

Universidade Federal de Alagoas - UFAL está presente em oito semestres, sendo incluída na

grade curricular de todas as licenciaturas da UFAL. Em música, os professores da graduação

têm autonomia para o planejamento do conteúdo desta disciplina de acordo com o plano

político pedagógico. Com isso, em 2008 participamos do primeiro PI-11 ministrado pela

docente especialista em educação musical que nos apresentou como proposta: a elaboração de

atividades educativo-culturais, tendo como principal objetivo a construção de atividades

relacionadas à educação musical, com foco nas peculiaridades de nossa geografia referenciada

nos elementos e/ou espécies da fauna marítima, lagunar e fluvial. Os discentes elaboraram

canções com temas relacionados a animais aquáticos e parâmetros com objetivos didáticos e

adequados para cada faixa etária. Após essa construção produzimos os arranjos para cada

canção.

Esse trabalho integrou disciplinas como metodologia, história da música, harmonia,

percepção e prática de conjunto. No segundo semestre de 2009 no PI-4 foi possível editar a

1 Projetos integradores: disciplina.

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proposta do PI-1. Com isso, reelaboramos o projeto com o seguinte objetivo: a produção de

um CD com 10 faixas e um livro com as informações didáticas para cada canção.

Justificativa

Mas como produzir se não há recursos? Sabemos que uma produção fonográfica e

elaboração de livros didáticos requerem investimentos elevados. Todavia, não foi obstáculo

para que os alunos elaborassem uma logística para a realização deste projeto. Um dos

discentes que é arranjador e produtor musical propôs patrocinar este projeto com idealização

do trabalho em estúdio próprio para gravação de cada canção como forma de minimização

dos custos de produção. Das etapas do cronograma de execução: 1) revisão das composições

realizadas em 2008 no PI-1; 2) elaboração dos arranjos; 3) a gravação em estúdio e; 4) a

produção das atividades didáticas em um livro.

O professor de música deve possuir uma capacidade que o habilite a realizar a sua

tarefa com êxito e com máximo de rendimento. Essa capacidade compreende o conhecimento

profundo sobre a matéria que se ensina e sua preparação pedagógica para tanto. (JOLY, 2003,

p. 123). É importante que o professor compreenda que o ensino da música na escola não é só

feito por materiais conjugados aos métodos ativos, é preciso que a criação seja de acordo com

a necessidade do aprendizado.

Em Maceió cerca de 110 escolas privadas do ensino básico, 10% exploram em seu

currículo o conhecimento musical no ensino fundamental 1 e 2, já a rede pública promove

projetos de música com a participação de docentes formados em licenciatura em musica. Em

visita a biblioteca do setor de artes, observamos que grande a carência de material didático na

área de educação musical. Após a Lei 11.769/08, constatou-se que algumas instituições de

ensino têm se manifestado, por meio de seus docentes, sobre os materiais que poderiam ser

trabalhados na sala de aula no ensino regular. Logo, percebemos que a intervenção desta

referida lei nos permitiria a criação de trabalhos didáticos para ajudar e capacitar os trabalhos

já existentes na cidade de Maceió.

Objetivos

Compor canções com objetivos didáticos para faixa etária infantil e uma atividade

teórico musical que evidencie a estética e os objetos das canções, utilizando referências dos

métodos ativos e contemporâneos na produção contextualizados dentro da realidade temática

da nossa cultura.

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A criação do arranjo construirá o molde do Cd com 9 faixas, todas voltadas para o

conteúdo teórico musical, brincadeiras e curiosidades sobre a geografia e cultura de Alagoas.

Fundamentação teórica

A partir desses conteúdos sentimos a necessidade de elaborar as canções que

abordassem conceitos como lúdico, criatividade e apreciação musical. Do caráter lúdico a

música permite o clima infantil, mesmo possuindo conteúdos complexos, por que isso se

torna uma forma de inserção da criança na familiarização com a linguagem musical utilizando

aquilo que faz parte da infância, o divertimento e a brincadeira. “A arte infantil é

essencialmente lúdica. Porém, não apenas como livre brincadeira ou enquanto brincadeiras, o

lúdico na linguagem artística envolve o expressivo, o sensível, o estético e introduz a criança

na esfera do artístico.” (CORAGEM, 2002, p. 90).

O fazer musical pressupõe uma atitude ativa do pensamento humano, pois é neste

momento que o indivíduo busca as soluções frente aos desafios proporcionados pela música.

É uma oportunidade de adquirir novas perspectivas e fazer descobertas. Já da criatividade

segundo (GAINZA, 1988 p. 107) não surge de improviso na pedagogia moderna. Quase todos

os métodos da primeira época da nova pedagogia musical do século XX (Dalcrose, Orff,

Kodály, Willems) preocuparam-se em estimular e desenvolver a capacidade criadora da

criança. A visão de criatividade exposta na afirmação seguinte exprime este ideal:

Na educação, e considerando o aspecto da transmissão de conhecimentos, o professor tem todas as respostas, e os alunos, a cabeça vazia – pronta para assimilar informações. Numa classe programada para a criação não há professores: há somente uma comunidade de aprendizes. O professor pode criar uma situação com uma pergunta ou colocar um problema; depois disso, seu papel de professor termina. Poderá continuar a participar do ato de descobertas, porém não mais como professor, não mais como a pessoa que sempre sabe a resposta (SCHAFER, 1992, p. 286).

Sob outro aspecto é possível inferir que a criação é uma ferramenta de formação da

identidade cultural do ser, é um instrumento de auto-reconhecimento e de comunicação. Isto

pode ser corroborado nesta ótica:

Criar é transformar. Perceber, sentir, mobilizar-se relacionar-se internamente e formalizar-se para se comunicar com o exterior – a criatividade permite ao indivíduo estar atualizado consigo mesmo, renovando-se e consequentemente sentindo-se presente ao se comunicar com o externo (CAMPOS, 2000, p. 80).

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Constitui-se também num trabalho de apreciação musical, já que é um trabalho

embasado no contexto músico-cultural de nosso país e uma oportunidade de aproximar as

crianças e professores, contribuindo para o distanciamento do pensamento da música

unicamente com o caráter de entretenimento largamente oferecido pela mídia cada vez mais

crescente. Essa preocupação pode ser vista na seguinte afirmação:

O abandono da educação musical por parte das escolas e do governo foi acompanhado por profundas modificações na sociedade, que se abriu para o lazer e os entretenimentos ofertados pelos meios de comunicação de massa, afastando-se a população escolar, cada vez mais, da prática da música como atividade pedagógica, aderindo, em vez disso, aos hits do momento e ao consumo da música da moda, do conjunto instrumental da moda, do cantor da moda (FONTERRADA,2008 p. 13).

O contato com a apreciação musical é um passo primordial para o bom

desenvolvimento musical, pois na fase inicial do aprendizado ele se tornará um mecanismo de

aguçar a percepção musical em todas suas nuances. Isso é defendido por Beyer e Kebach, haja

vista:

A apreciação permitirá às crianças construírem esquemas mentais que possibilitem novas produções sonoras, ou seja, organizações posteriores sobre forma, timbres, ritmos intensidades e variações na dinâmica para obter determinados resultados em execuções ou criações, como terminar uma criação, etc. (BEYER; KEBACH, 2009, p. 35).

Metodologia

A primeira etapa consistiu em revisões dos temas escolhidos pelos alunos, uns dos

requisitos desta revisão foram: rima, atividade didática e arranjo. Foram produzidas dez

canções com caráter educativo para o cd intitulado A Turma da Maré, são elas: o tema a

turma da maré, maré, a peleja do pescador, o tubarão, a escala do polvo, a baleia e o

golfinho, cavalo marinho, o caranguejo, a piranha Morgana e mororó – um peixe dançarino.

Apresentaremos os objetivos de cada canção partindo da prática da aprendizagem musical do

trabalho em geral.

Na segunda etapa do processo, pesquisamos sobre a diferença entre canções infantis e

canções para educação infantil. Após a análise das canções infantis, percebemos que na

maioria dos casos possuem ênfase em ritmos acelerados e atribuindo à letra da música uma

função pouco significante sob o ponto de vista pedagógico-musical. Já as canções para

educação musical, o ritmo e o arranjo têm a função de acompanhamento propriamente dito e a

letra, por sua vez, passa a ser o principal fator para apropriação do lúdico e o educacional.

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Baseados nessas informações, os arranjos foram trabalhados para que os conteúdos fossem

transmitidos a partir do caráter lúdico e apreciativo. Para Luis Maria Pescetti (apud

BEINEKE, 2007, p.3), há três elementos para a produção musical infantil: (1) as letras que se

referem ao mundo infantil; (2) o trabalho com elementos musicais reduzidos/essenciais e (3) a

presença do jogo.

A produção, terceira etapa, durou cerca de dois meses e para os arranjos utilizamos um

sistema totalmente seqüenciado, onde simulamos através de um teclado arranjador, baterias,

baixos e sons sintetizados para fazer o acompanhamento. Dando foco aos instrumentistas

deste trabalho, utilizamos instrumentos acústicos e elétricos como violão, flauta, sax, guitarra

e clarinete. E, para interdisciplinar esse conjunto, convidamos dois cantores: um interprete

feminino do curso de bacharelado em canto e um interprete masculino que já era integrante do

grupo. É importante salientar que a figura do produtor musical, decisivamente, influenciou na

plasticidade do produto musical no momento de sua gravação, assumindo o papel de

executivo nas funções administrativas para viabilização de todo o desempenho do projeto.

Na quarta etapa produzimos atividades didáticas para cada canção, de acordo com

todos os conteúdos sugerimos algumas atividades, sempre com o pensamento voltado para o

lúdico. Foi pensado também em composições que valorizassem a rima, permitindo-se uma

maior proximidade e interação da criança com este gênero literário comum em nosso país

como forma de interdisciplinaridade. A preocupação inicial foi sempre fazer tudo em contato

com a diversão, porém diversão aqui mencionada é concernente à ludicidade através da

aprendizagem coletiva, logo, pois, estas canções poderão ser executadas com instrumentos ou

com a voz. Por isso deixamos um espaço flexível às atividades para possíveis recriações de

cada docente ou apreciador do nosso trabalho.

Dos conteúdos teórico-musicais encontraremos figuras rítmicas como: síncope,

colcheia, semínima, mínima, semibreve; propriedade sonora: sons onomatopaicos;

instrumentos como guitarra, trompa, sax, clarinete, flauta transversal, flauta doce e piano;

escala de Dó maior; ritmos como frevo, baião, coco de roda, country, swing, pop, rock, valsa

e improvisação. Contando com esse conteúdo A Turma da Maré oferece o uso do play-back

para cada atividade.

Resultados do trabalho

O trabalho concluiu-se com dez canções lúdicas e divertidas para o ensino/

aprendizagem seguindo o objetivo da temática alagoana, vejamos:

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1. A canção que inicia caracteriza o tema e chama-se A Turma da Maré, e tem por

objetivo a chamada de cada canção, exemplo: quando diz: Cai na rede caranguejo que chegou

a sua vez, coloca-se o nome do animal da próxima música no lugar da palavra caranguejo.

Ela pode ser cantada em semicírculo, com os alunos de mãos dadas caminhando para

frente na primeira frase e retornando na segunda. No verso: é um é dois é três, é quatro é

cinco é seis, pode usar palmas. E na última frase, posiciona-se a turma para a próxima canção.

2. A segunda faixa tem como tema A Maré, onde se utiliza uma grande brincadeira de

roda cuja simulação do movimento das águas compreende alguns elementos da dinâmica

musical, tais como crescendo e decrescendo. E esses elementos podem ser articulados através

da voz, palmas entre outros.

3. A Peleja do Pescador, nesta faixa utilizou síncopes e o grupo de quatro

semicolcheias como caracterização dos ritmos nordestinos - o coco e o baião. Durante o solo

de flauta, sugeri-se que sejam feitas rápidas coreografias, semelhante ao uso de objetos como

a rede de pescador, simulando uma pesca.

4. O Tubarão, essa canção utiliza-se de ações onomatopéicas, pois o compositor, por

meio do conhecimento da espécie marinha, inseriu os sons para os diversos tipos de tubarões,

como: tubarão tigre, tubarão lixa e tubarão gato. A Intenção é produzir os sons e ruídos. Nesta

música há momentos de silêncio antes dos ruídos de cada tipo de tubarão, por tanto o

professor pode iniciar a idéia de pausa, mostrando a importância dela numa composição.

5. A Escala do Polvo, o animal citado é da ordem octopoda, que significa oito pés.

Inserimos esse animal ao conteúdo de escala musical, onde a criança pode associar às oitos

pernas com oitos sons numa escala musical. Com dinâmica executamos a escala ascendente e

descente, pois vimos que as crianças obtêm dificuldade em entoar a escala da direção

ascendente para descendente.

6. A Baleia e o Golfinho é uma canção que propõe trabalhar com dois grupos de

alunos ou dois alunos de cada vez, divididos entre “baleias e golfinhos”. A intenção não é

fazer com que os alunos imitem o som da respiração em si, mas que criem a cada repetição

um novo ruído ou timbre com a utilização da voz, o corpo ou instrumentos musicais. Há ainda

a possibilidade de ser cantada com duas vozes se aproveitando dos dois grupos, uma primeira

voz, mais aguda, e mais grave, no trecho em que se canta “faz a baleia” “faz o golfinho”.

7. Cavalo Marinho, em estilo de ninar, esta canção utiliza figura rítmica, (mínima,

semínima e colcheia), além da execução da flauta doce. É também uma música que foi

pensada com o objetivo de mostrar que existem vários tipos de andamentos na música, mas

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que para esta composição foi escolhido o andamento, andante, andamento nem lento nem

rápido.

8. O Caranguejo, com a presença do ostinato poderá ser valorizado a unidade de

tempo, unidade de compasso e o movimento por fraseado que a música oferece. As crianças

poderão andar na unidade de tempo e bater palma do ritmo do ostinato ou andar neste ritmo

para os lados imitando o andar do caranguejo.

9. A Piranha Morgana, a intenção é fazer com que o ritmo dançante do rock conduza a

criança a movimentos livres, como os da piranha na busca por seu alimento, afim de que a

criatividade seja o ponto máximo do fazer musical. Na parte: destemida, atrevida (...) até (...)

querendo ser sua amiguinha, dá-se a ideia de um ostinato rítmico que por meio da repetição se

criem movimentos de ranger de dentes, pular, bater com as mãos, com os pés etc...

10. O mororó, esta música foi criada para ser cantada e dançada com um ritmo

ternário conhecido como valsa. Há nesta música a possibilidade de se trabalhar o uso das

terças, como percepção melódica, além de inserir um timbre de instrumento de metal, a

trompa, para mostrar o uso das oitavas no trecho posterior em que se canta “solfejando

assim:”. Têm basicamente três pulsações, configurando o ritmo valsa, cuja complementação

se dá com um pequeno trecho de uma valsa bastante conhecida de um exímio compositor de

valsas que foi John Strauss. A valsa é também um ritmo dançante, partindo disso, a sugestão é

que os alunos formem-se aos pares e dancem a valsa, mas que não se limitem apenas a esta

possibilidade de expressão corporal dançante. O professor poderá fazer pulsações rítmicas

com palmas, pulos e solfejar a segunda parte da música tocada pelos instrumentos, permitindo

a todos solfejarem juntos os mesmo trechos.

O Serviço Social da Indústria – SESI promoveu um evento intitulado 24 HORAS DE

CULTURA, cuja programação consistiu de apresentações infantis e a convite da instituição, A

Turma da Maré testou o trabalho com 25 crianças com idade de 2 a 6 anos de escolas da rede

privada da cidade de Maceió. O objetivo do projeto citado era recriar e proporcionar o lúdico

às crianças através da música. Compreendendo o objetivo do projeto citado, elaboramos uma

apresentação musical com tempo máximo de 40 minutos. Escolhemos quatro canções,

prevendo o tempo de 10 minutos para cada uma delas, as canções foram: A Maré, A Escala do

Polvo, O Tubarão e Piranha Morgana. Elaboramos nossa metodologia de apresentação da

seguinte forma: 1) interpretação das canções através do play-back pelos cantores do cd A

turma da Maré; 2) a repetição das frases das canções utilizando movimentos corporais para

memorização da música; 3) a brincadeira e a interpretação coletiva. O objetivo foi apresentar

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as canções do cd A Turma da Maré com o intuito de observar a aceitação das crianças com o

ritmo e letra. Dos resultados, constamos que as crianças de 2 a 4 responderam sem inibição

aos nossos objetivos. Já as crianças de 5 e 6 anos ficaram tímidas com a utilização do

movimento corporal, mas com interpretação da letra o objetivo foi alcançado.

Conclusão

A Turma da Maré é um trabalho musical educativo com dez canções que enaltece a

cultura alagoana. E, neste atual contexto de música nas escolas vale salientar o papel da

universidade como viabilizadora do conhecimento necessário para ações como A Turma da

Maré. Nossa experiência com este projeto foi muito relevante porque nos permitiu conhecer

de perto a realidade educacional vivida em Maceió, onde constatamos que existem programas

sociais promovidos pelos governos de Alagoas como o Primeiro Tempo e no município o

PET (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) e, que utilizam as aulas de música

através dos professores já existentes na rede pública que possuem licenciatura em música e

não estão no ensino regular.

Verificamos que as lacunas no âmbito da educação musical ainda são latentes em

Maceió, seja pela carência de professores e com uma boa formação musical acadêmica

presentes nas escolas privadas, seja pela falta de um bom planejamento no tocante ao projeto

político pedagógico para o desenvolvimento do ensino e aprendizagem nas escolas públicas.

No entanto, iniciativas como a Turma da Maré são os primeiros passos e exemplo afim de

transformar essa realidade.

Não pretendemos esgotar todo conteúdo musical nas atividades propostas, no entanto

objetivamos mostrar que o aprender música pode ser algo prazeroso e atrativo. Fornecemos

apenas mais um subsídio necessário para educação musical fortalecendo sua práxis.

Nosso trabalho, a Turma da Maré, é apenas um exemplo de como podemos fazer um

trabalho voltado para o ensino e aprendizado musical é necessário um conhecimento

fundamentado na apreciação musical e na criação. Em se tratando de um trabalho direcionado

à criança, tornar-se-á indispensável haver uma proposta baseada, também, na ludicidade.

O transcorrer de toda produção do cd nos mostra um desafio para a comunidade

acadêmica em geral, a necessidade das universidades terem seus próprios laboratórios de

produção musical, entendemos que isso oportunizará um maior contato com as tecnologias

próprias de estúdios de gravação, que na verdade está no atual contexto musical e deve fazer

parte da formação acadêmico-musical. Este projeto foi contemplado pelo Edital de número

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003/09 de incentivo à produção de CDs e/ou DVDs de música em Alagoas realizado pela

Secretaria de Estado da Cultura – SECULT, com recursos do Fundo de Desenvolvimento de

Ações Culturais – FDAC em 09 de abril de 2010.

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Referências

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Aula de Música na Escola Municipal Martagão Gesteira: música e

alfabetização para uma aprendizagem significativa

Ana Luiza Lemos Tomich [email protected]

Resumo: Este artigo relata a experiência em andamento do estágio do curso de Licenciatura em Música da UFBA, que está sendo realizado na Escola Municipal Martagão Gesteira, onde o ensino de música auxilia o processo da alfabetização. A partir do diagnóstico feito da turma do 3° ano do ensino fundamental, com faixa etária de 8 a 14 anos, onde a maioria sabe copiar, mas não sabe ler e escrever, sendo considerados pela escola pré-silábicos ou silábicos, procurei caminhos onde a música e a alfabetização se convergem, com o objetivo de melhorar a qualidade da aprendizagem nesta fase tão crucial para o desenvolvimento da inteligência. Todo o processo tem por base a apreensão da cultura oral: o repertório de canções, ritmos, brincadeiras, trava-línguas, estórias, cordéis, dentre outras manifestações populares do Brasil, com o intuito de trazer para o cotidiano destes alunos o conhecimento de sua própria cultura e, a partir desta apropriação cultural, construir uma ambiência favorável para uma aprendizagem significativa que envolva a música e a alfabetização. A fundamentação teórica é de caráter transdisciplinar, conciliando idéias da área da Educação Musical e da Linguística, dentre outras que permeiam estas.

Palavras-chave: Música e alfabetização, cultura oral, aprendizagem significativa

Música na Escola Martagão Gesteira

Ao chegar no ambiente escolar, o professor de música se depara com inúmeras

dificuldades, desde a falta de recursos materiais à questão: como ensinar música na escola

regular de modo significativo? Compreender o conceito de aprendizagem significativa de

David Ausubel é de suma importância para a compreensão dos rumos tomados nesta

experiência. De acordo com Ausubel, (1963; 1968), aprendizagem significativa é o processo

através do qual um novo conhecimento se relaciona de maneira não-arbitrária e substantiva à

estrutura cognitiva do aprendiz (p.1). Ou seja, para que o material potencialmente

significativo interaja com as estruturas cognitivas do indivíduo, é necessário que seja

especificamente relevante. Para isso, é necessário que haja um conhecimento prévio, que

servirá como ponto de ancoragem; e, o que é incorporado à estrutura cognitiva é a substância

do novo conhecimento, e não o “veículo” de sua expressão: as formas de signos (p.2).

Respondendo a pergunta acima, cada situação terá muitas possibilidades de caminhos

a percorrer, sendo que, nas palavras de Maura Penna (2010, p.28), da parte do professor cabe

ter “disposição de buscar e experimentar alternativas de modo consciente; e, encarar a

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música em sua diversidade e dinamismo”. A experiência relatada neste artigo trata-se de uma

adequação das aulas de música de acordo com o perfil do professor e a realidade da turma.

A Escola Municipal Martagão Gesteira, fica no bairro Engenho Velho de Brotas, na

cidade de Salvador. O bairro tem em torno de 25.000 moradores, que são na maior parte

negros. A desigualdade social é uma das marcas do bairro, pois no mesmo, encontram-se

vários condomínios, onde vivem pessoas da classe média e, ao redor, existem casas

construídas sem planejamento urbano, com saneamento básico precário. Quando cheguei à

escola, não pude deixar de notar a falta de um espaço de lazer, portanto, os alunos não têm o

horário do recreio e merendam dentro da sala. É uma escola que não tem professor de artes e

nem de esportes. O diagnóstico da turma foi logo se apresentando nas primeiras aulas: alunos

com dificuldade de aprendizagem; alunos que sabem copiar, mas não sabem ler e nem

escrever; índice alto de violência dentro da sala de aula; muita resistência ao novo, no caso, às

atividades propostas na aula de música. Senti nestes alunos uma infância sem identidade, pois,

no início das aulas a maioria achava sem graça as brincadeiras e canções que eu propunha,

como se fossem infantis demais para eles, mas quando se permitiam participar, tudo fluía

prazerosamente. Percebi que estes alunos tinham medo de se exporem e dos outros colegas

rirem (o clima entre eles é bastante conflituoso); que preferiam negar a participar de uma

atividade alegando não saber fazer do que tentar; e a falta de conhecimento relacionado à

própria cultura, demonstrando o domínio da cultura de massa, e também, cada vez mais a

preferência pela Igreja Evangélica, discriminando a cultura afro-brasileira e os rituais do

Candomblé, numa cidade onde a maior parte da população é afro-descendente. A partir de

tantas complexidades, percebo que a entrada da música nas escolas deve estar mais de acordo

com a realidade brasileira, podendo estar auxiliando outros aspectos de relevância social,

como a melhoria do rendimento escolar, a valorização da cultura, a não violência, dentre

tantos outros assuntos que devem ser conscientizados no ambiente escolar. Por isso, decidi

mudar o programa que havia elaborado para o estágio, trazendo a música para este contexto

escolar como um instrumento de auxílio à alfabetização. Não deixaria a música ficar em

segundo plano, apenas enfatizaria os pontos de convergência entre estas. Minha decisão em

fazer este trabalho também se deve a oportunidade que tive de assistir a palestra do professor

de metodologia do ensino da língua portuguesa, Claudemir Belintane, onde coordena o

projeto “Ensinando a leitura a partir de diagnósticos orais”.

“Como se observou nas duas fases da pesquisa, a renitência do aluno diante da escrita é progressiva, tornando-se cada vez mais complexa ao longo dos anos. (...) O que fica claro é que o foco das pesquisas e das ações

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pedagógicas deve se centrar mais nas singularidades pessoais e culturais da criança brasileira.” (BELINTANE, 2009, p.1).

Para o professor Claudemir, aquele aluno que não aprendeu a ler depois de passar da

1°, 2° e 3° série, quando chega na 4° está totalmente fechado à aprendizagem, cria

resistências, dizendo, por exemplo, que não quer aprender a ler (p. 1). Esse é um dos possíveis

motivos da evasão escolar. De acordo com os dados do INEP, Instituto Nacional de Estudos

Anísio Teixeira, a cada 100 alunos que ingressam na escola na 1° série, apenas 5 concluem o

ensino fundamental, sendo, 20,3% da população analfabetos funcionais, que são aqueles que

freqüentaram até 4 anos de escolaridade (IBGE, 2007). E, 9,7% da população acima de 15

anos são analfabetos, que corresponde a 14,1 milhões de pessoas, sendo o maior índice na

região nordeste (IBGE,2010).

Musicalização e Alfabetização: pontos de convergência

As perguntas que nortearam este trabalho foram: Como a música pode auxiliar a

alfabetização? E, como a aquisição da linguagem verbal, pode auxiliar a musicalização? E

outra pergunta veio posteriormente: Qual é o ponto de convergência entre as duas áreas?

Com o objetivo de visualizar tais semelhanças, trago à reflexão o termo - linguagens

artísticas, que também é empregado na música. Atualmente existem discussões acerca do

conceito linguagem, se é correto ou não utilizar o termo para outras áreas que não seja a da

lingüística. Maura Penna (2010) abre a discussão no capítulo 4, “Contribuições para uma

revisão das noções de arte como linguagem e como comunicação”, com o objetivo de tornar

este conceito preciso e consistente, sem ambigüidades. Baseado em análises dos

posicionamentos diametrais de Susanne Langer (1989) e Marcuschi (1995), Maura Penna

conclui:

Em contraposição à visão dos significados lingüísticos como fixos, permanentes e literais, articulados em sucessão no discurso, como defendido por Langer, Marcuschi concebe, portanto, a significação como resultante de um conjunto de fatores, entre eles a inserção contextual. Dessa forma, são possíveis múltiplas leituras de um mesmo texto, mas não qualquer leitura, uma vez que, entre os diversos fatores envolvidos, atua também o próprio sistema lingüístico. Em suma, embora a significação dependa dele, ela não se esgota no funcionamento do sistema lingüístico (PENNA, 2010, p. 71).

Outra discussão que aproxima a música e a linguagem verbal é feita por Jonh A.

Sloboda (2008), onde ele examina dois teóricos: o lingüista Chomsky e o musicólogo

Schenker, no qual os dois argumentam em suas respectivas áreas que “o comportamento

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humano deve ser sustentado pela capacidade de formar representações abstratas

subjacentes”. Sloboba faz uma revisão destes trabalhos empíricos que demonstram que a

música e a linguagem compartilham não só de elementos comportamentais como também

formais (p.17). O esquema analítico que Sloboba utiliza é baseado na subdivisão da

linguagem e da música nos termos da lingüística: fonologia, sintaxe e semântica. Ele também

faz outras comparações mostrando as principais semelhanças entre musica e linguagem.

A melhor analogia lingüística para a composição musical não é tanto a enunciação de uma sentença nova, mas a enunciação de uma não sentença (como o poema); neste caso, o enunciador leva em conta as competências lingüísticas de seu ouvinte; por isso, a não sentença (o poema) é significativa para o ouvinte (SLOBOBA, 2008, p.67).

Com o objetivo de acrescentar a esta discussão, vou apresentar as comparações feitas

por Sloboba, e em seguida as comparações feitas por mim:

(a) Tanto a linguagem quanto a música são características da espécie humana.(...); (b) Tanto a linguagem quanto a música são capazes de gerar um número ilimitado de seqüências novas.(...); (c) As crianças parecem possuir uma habilidade natural de aprender as regras da linguagem e da música através da exposição a exemplo das mesmas.(...); (d) O meio natural de transmissão, tanto da linguagem quanto da música é auditivo vocal.(...); (e) Embora o modo auditivo-vocal seja o primário, muitas culturas desenvolveram maneiras de escrever música. (...) O analfabetismo é reconhecido como um problema social enorme em quase todas as culturas letradas, e a habilidades de ler à primeira vista atormenta um número grande de performers.(...); (f) As habilidades receptivas precedem as habilidades produtivas no desenvolvimento infantil. (...); (g) As formas adotadas pela linguagem natural e pela música natural diferem entre as culturas mas existem elementos universais que restringem essas formas. (...); (h) É comum considerar a linguagem humana como composta de três componentes: a fonologia(...), a sintaxe(...), e a semântica(...). A música parece dividir-se exatamente nos mesmos três componentes (...). (SLOBOBA. 2008, pp. 25-31).

Quando comecei a pensar sobre as semelhanças entre música e linguagem verbal, a

primeira coisa que veio em minha mente foi: tanto a música quanto a palavra são constituídas

por som e sentido. No caso da música, temos o som com sentido subjetivo que prevalece

sobre o objetivo, pois a interpretação vai estar mais de acordo com o ouvinte. Para a música

ter um som com sentido objetivo, tem que haver algum som com sentido simbólico, como por

exemplo, o piar dos pássaros, a sirene da polícia ou o próprio instrumento musical ou vocal

imitando estes sons que são simbólicos para nós, seres humanos. Na linguagem verbal

acontece exatamente o contrário, o som com sentido objetivo prevalece, representando

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palavras com significado simbólico, mas quando se trata de uma poesia passa a ser subjetivo,

pois o significado pode não ter tanta importância quanto o sentido do som ou da interpretação

do leitor ou ouvinte. As duas utilizam a representação de signos, portanto passam a ser

imagens sonoras com sentido. Temos, portanto, a capacidades de ler um texto ou uma

composição musical e escutar estes sons em nossa mente, que são carregados de sentido. O

resultado deste raciocínio foi bastante matemático: um está contido no outro! Então, comecei

a pensar nas atividades que trabalham as duas áreas simultaneamente. No caso, o objetivo não

é de fato ensinar a notação musical. Eu não poderia atravessar o carro na frente dos bois! Os

alunos não tiveram a oportunidade de serem musicalizados o suficiente para estarem

aprendendo a escrita musical. Mas eles estão precisando aprender a ler e a escrever a língua

falada com urgência, pois estão na fase escolar em que são cobrados por isso.

Música, Alfabetização e Oralidade

Indispensável ouvir qualquer som. A manhã, sem pássaros, sem folhas e sem ventos, progredia num silêncio de morte. (...) Sinhá Vitória precisava falar. Se ficasse calada, seria como um pé de mandacaru, secando, morrendo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas.)

A cultura oral é aquela transmitida oralmente de geração a geração, e que abarca

narrativas, brincadeiras, canções, sabedorias, manifestações populares tradicionais, e diversas

informações da própria cultura. É o nosso patrimônio cultural oral. A oralidade é vista neste

trabalho como alimento para as estruturas cognitivas do aprendiz, de David Ausubel (1963,

1968), pois, como poderíamos ensinar música, ou, a ler e escrever se não tiver onde ancorar

tais conhecimentos? Segundo Belintane (2008), o aproveitamento da oralidade constitui

estratégias indispensáveis na preparação das bases da alfabetização e da leitura.

Se o aluno sabe ouvir, contar e relacionar histórias (intertextualidade temática) se tem textos lúdico-poéticos na memória e aprendeu a identificar os elementos estéticos de cada gênero oral (paralelismos, aliterações, assonâncias, rimas e outras iterações), muito provavelmente sua leitura e seu manejo da escrita se tornará mais dinâmicos e significativos (BELINTANE, 2010 p.695).

As atividades que foram selecionadas para serem desenvolvidas em sala de aula têm

como característica e objetivo central alcançar a área de convergência entre a música e a

linguagem verbal. Para isso, foi utilizado o vasto repertório já conhecido da oralidade

brasileira, e atividades adaptadas por mim.

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Tabela 1: Atividades de música e alfabetização Atividades Características Objetivos

Estórias musicadas

São narrativas acompanhadas por instrumentos musicais.

Enriquecer o repertório oral dos alunos e estimular a percepção dos diversos sons.

Literatura de cordel

São poesias cantadas, acompanhadas pela viola, que falam do cotidiano e do imaginário nordestino.

Trabalhar a rima, o verso, e discutir sobre o tema do cordel.

Cantigas de roda

São cantigas cantadas em roda, que pode haver uma brincadeira.

Trabalhar o canto, o ritmo e a coordenação motora de forma lúdica, além de enriquecer o repertório oral do aluno.

Trava-línguas

São desafios orais em forma de versos, com o agrupamento de palavras difíceis de pronunciar.

Trabalhar o desenvolvimento da fala e a sonoridade das palavras

Parlendas

São versos com o objetivo de aprender novas palavras e a contar.

Trabalhar o ritmo do verso e enriquecer o repertório oral

Jogos de mãos e copos

Brincadeiras de mãos e de copos que trabalham o canto, o ritmo do verso e a coordenação motora.

Trabalhar a coordenação motora,o ritmo dos versos, o canto, e enriquecer o repertório oral.

Percussão brasileira

Ritmos e instrumentos que fazem parte das manifestações musicais do Brasil.

Conhecer as diversas manifestações e seu contexto histórico; tocar os instrumentos; aprender as células rítmicas através das palavras (ex: tum tum ta).

Fichas

São fichas que contém os nomes dos instrumentos e dos sons onomatopéicos dos ritmos e dos diversos sons ao nosso redor.

Reconhecer os nomes dos instrumentos e os sons onomatopéicos de cada ritmo e outros sons.

Gráficos sonoros silábicos

São gráficos que representam as intensidades, alturas e duração com a utilização de sílabas.

Desenvolver a leitura dos gráficos sonoros utilizando diversas sílabas. Trabalhar a leitura musical e a formal simultaneamente.

Apreciação musical com desenho

Escutar música e desenhar

Desenvolver a habilidade de expressar a apreciação musical por meio do desenho(o desenho é a pré-escrita).

Cantigas de Versos

São cantigas que possibilitam a entrada de versos, criados espontaneamente.

Desenvolver a composição espontânea de versos; trabalhar o canto.

Diagnóstico da memória

Percepção musical e Memória oral

Reconhecer a música através da melodia; lembrar as canções trabalhadas nas aulas anteriores; e compartilhar seu repertório oral.

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Conclusão

Já consigo perceber mudanças positivas no que se refere à receptividade dos alunos, ao

interesse e ao desenvolvimento da aprendizagem, tanto musical quanto na aquisição da leitura

e escrita verbal. A professora Nilzete, que acompanha esta turma desde o 1° ano, afirmou que

está tendo resultados positivos, e fazia questão de anotar as atividades que aconteciam nas

aulas de música para poder dar continuidade em suas aulas. Pude notar tais mudanças, a partir

das atividades: de apreciação e desenho, que foram se tornando mais criativos e coloridos; de

memória, pois, sempre eles lembravam quais músicas cantamos na aula anterior, e alguns

deles compartilhavam do seu repertório oral; na atividade de fichas, onde ocorre a associação

das palavras onomatopéicas ao objeto sonoro e dos sons onomatopéicos às palavras; e, na

realização de gráficos musicais. Espero alcançar mais resultados positivos. Para isso, sei que

ainda tenho disponibilidade, criatividade e consciência para planejar aulas interessantes e

cheias de significâncias.

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As Culturas Musicais em Turmas Multietárias na Educação Infantil

Kelly Werle1 [email protected]

Cláudia Ribeiro Bellochio2 [email protected]

Resumo: O presente trabalho faz parte de um projeto de pesquisa vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria (PPGE/UFSM) e ao grupo Formação, Ação e Pesquisa em Educação Musical (FAPEM). Tem por objetivo investigar como o professor percebe o protagonismo infantil e a produção de culturas musicais no cotidiano de uma turma multietária de educação infantil. Os pressupostos teóricos, que orientam a pesquisa, se sustentam basicamente nos estudos de Vygotsky (1984), de Prado (2006), os quais abordam a construção de conhecimentos a partir da interação social entre crianças de diferentes idades; e Lino (2008) no que diz respeito às culturas musicais da infância. Como abordagem metodológica, optou-se pela pesquisa participante, a qual será realizada através de observações, entrevistas e registros no diário de campo. A pesquisa está em fase inicial de construção e de revisão de literatura.

Palavras chave: Culturas musicais; educação infantil; agrupamento multietário

Agrupamentos multietários na educação infantil

A interação social e a produção de culturas infantis, através das relações estabelecidas

entre crianças maiores e menores, têm sido um tema tratado em pesquisas no campo da

Educação Infantil, a exemplo de Prado (2005). A autora em questão aponta como

possibilidade a riqueza das interrelações das crianças, buscando superar concepções

tradicionais psicogenéticas que estabelecem fases do desenvolvimento, tendo como critério

fixo a idade cronológica da criança. Prado entende que as teorias desenvolvimentistas criam

falsas categorias acerca do desenvolvimento infantil, ao fixar idades e períodos cronológicos

para a superação de determinadas etapas. A crítica que se faz é que, a partir dessa concepção,

crianças maiores não poderiam brincar com crianças menores e vice-versa, porque não se

entenderiam, já que estão em fases diferenciadas de desenvolvimento. Essa acepção é

superada...

[...] dado que a idade não corresponde a uma variável natural e que a variabilidade de desenvolvimento biológico, psicológico e social nem sempre permite estabelecer uma correspondência coerente entre tamanho,

1 Doutoranda em Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE, Universidade Federal de Santa Maria/UFSM. 2 Profª Drª adjunta do Departamento de Metodologias de Ensino/MEN, Universidade Federal de Santa Maria/UFSM.

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idade e competências, o fato de se ser mais frágil do ponto de vista físico não significa, necessariamente, ser mais novo, nem implica, do ponto de vista das interações, uma menor competência cognitiva ou social (FERREIRA, 2004 apud PRADO, 2005, p. 685).

Nesse contexto, emergem pesquisas que tratam de uma nova concepção de infância, a

qual transcende os limites etários e compreende as crianças como produtoras de cultura,

reinventoras da realidade.

O fato de nem sempre encontrarmos uma correspondência coerente entre tamanho, idade e competências entre as crianças pequenas (não só das crianças) coloca, pois, em questão, a própria noção de infância e de educação infantil. Se as crianças nos surpreendem, propondo o inusitado, o imprevisto num espaço previsto, planejado e organizado, então, não detemos o controle sobre seus pensamentos e atitudes como ousamos supor (PRADO, 2005, p. 3).

Os resultados da pesquisa de doutoramento de Prado (2006), através da análise de uma

variedade de materiais coletados junto às crianças (desenhos, histórias, canções, etc) apontam

para a impossibilidade de precisar as idades em um coletivo de crianças maiores e menores.

“Nas diversas produções das crianças foi possível observar a diversidade de formas, estilos,

cores, figurações e elementos presentes, sem que fosse possível identificar as idades das

crianças. O que isso significa?” (PRADO, 2005, p. 3).

Em consonância com esse entendimento sobre as diversas possibilidades de

construção e expressão infantil - não limitadas à categoria etária, recorre-se às teorias sócio-

interacionistas (VYGOTSKY, 1984) para sustentar a relevância da interação entre crianças

maiores e menores no que diz respeito à construção do conhecimento. As trocas realizadas

entre crianças com diferentes idades permitem que a aprendizagem possa ocorrer na zona de

desenvolvimento proximal (ZDP), que é a distância entre o nível de desenvolvimento real

(que se constitui em função daquilo que a criança já pode fazer sem auxílio) e o nível de

desenvolvimento potencial (que se entende como sendo aquilo que a criança poderá fazer sob

orientação de um adulto ou com o auxílio de outro par). A ZDP compõe um conjunto de

informações que a criança tem a potencialidade de aprender, mas ainda não completou o

processo, isto é, conhecimentos fora de seu alcance atual, mas potencialmente atingíveis

(VYGOTSKY, 1984).

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Culturas musicais infantis

Compreender as crianças pequenas, como produtoras de culturas infantis, implica em

considerar seu protagonismo diante da construção do conhecimento. Diferentemente do que

durante muito tempo se acreditava, as crianças não são receptores passivos da realidade; elas

são sujeitos ativos que interagem, descobrem e recriam possibilidades, buscando representar e

compreender situações cotidianas da vida, construindo variadas hipóteses, até chegar à

sistematização de conhecimentos mais elaborados. “As manifestações infantis são

provenientes de uma cultura própria das crianças. Suas expressões, nas variadas linguagens

decorrem da relação com a cultura que as cerca, ou seja, dos bens culturais que a sociedade

disponibiliza para elas” (COUTINHO, 2005 p. 8).

Na medida em que as crianças brincam, (re)criando espaços e (re)inventando a

realidade, elas reelaboram os conhecimentos construídos socialmente, produzindo, assim,

culturas infantis, que são representativas de vivências culturais mais amplas. Portanto, “as

culturas infantis não nascem no universo simbólico exclusivo da infância, esse universo não é

fechado – pelo contrário, é, mais do que qualquer outro, extremamente permeável – nem lhes

é alheio à reflexibilidade global” (PINTO; SARMENTO, 1997 apud COUTINHO, 2005, p.8).

Deste modo, assim como há diferentes infâncias, coexistem também diferentes

culturas infantis, as quais são influenciadas por questões de gênero, etnia, contexto social,

crenças religiosas, etc. “[...] A criança não é só produto, mas também criadora de cultura, [...]

possui desejos, sonhos, paixões. Que se expressa fundindo sentimento e linguagens, ações e

reações, fantasia e realidade” (COUTINHO, 2005, p.12).

No que diz respeito às culturas musicais infantis, elas constituem um tema que ainda

carece investigação no campo da educação musical. Posterior ao contexto de aprovação da

Lei 11.769/08, a qual estabelece a obrigatoriedade da Música como conteúdo do componente

curricular Arte, muitas pesquisas têm se destinado a problematizar o ensino de música na

escola, tanto na perspectiva de professores especialistas em Música (HENTSCHKE;

AZEVEDO; ARAÚJO, 2006; PENNA, 2007), quanto na de professores unidocentes

(BELLOCHIO, 2000; FIGUEIREDO, 2004; SPANAVELLO, 2005; CORREA, 2008;

WERLE, 2010). Embora essas pesquisas sejam relevantes para a constituição do campo da

educação musical na escola, se faz necessário, também, investigar a música a partir da ótica

das crianças, buscando conhecer suas culturas, preferências e vivências musicais.

Lino (2008) pesquisou a música da infância na escola através do cotidiano de um

grupo de crianças da educação infantil. Em sua tese, ele afirma que

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[...] Ainda conhecemos muito pouco a respeito da música das crianças, seus valores, crenças e compreensões sonoras do mundo. A pesquisa em educação musical ainda tem dedicado todo um corpo teórico a pensar como tornar as crianças mais afinadas, mais adaptadas à destreza instrumental, mais sujeitas à intervenção e conduta aos esquemas de aprendizagem e desenvolvimento instrumental (LINO, 2008, p. 32).

A autora caracteriza a música das crianças como barulhar, que corresponde a uma

dimensão ficcional em que a música não opera somente com sons; mas também, com a

escuta. “Todas as crianças produziram insistentemente barulhadas, vivendo o descontínuo

como presença na natureza sonora ao expor uma miríade de explorações com a música como

experimentação, jogos de escuta ou narrativas sonoras” (LINO, 2008, p. 8).

Percebe-se que, para as crianças, a música está vinculada ao brincar. Isso demonstra o

caráter lúdico da música na infância. As crianças não brincam porque gostam de criar e

imaginar. Brincam porque, através do brincar, tem a possibilidade de representar e

compreender a realidade. Brincando, as crianças produzem culturas. Segundo Pinto e

Sarmento (1997, apud COUTINHO, 2005, p. 10) “o que caracteriza a cultura das crianças é a

relação sempre presente entre fantasia e realidade, entre o possível e o impossível, entre o

presente e o imaginário. Para as crianças, a realidade é fantasiosa”.

As culturas musicais da infância estão interrelacionadas a um contexto sociocultural

que influencia as vivências e os gostos musicais das crianças. A música é trazida para o

cotidiano da educação infantil, independente da vontade ou das intervenções dos professores,

por meio das manifestações das crianças, que muitas vezes, estão imersas na cultura midiática

e contexto sociocultural. Contudo, ressalta-se que

A música da infância não é apenas a folclórica, a disciplinar, a erudita, a mpb, a cantiga de roda, a gaúcha, a pequeninha, a com mensagem e texto reduzido, etc. A música é essa e aquela simultânea e heterofonicamente, porque, como um substantivo plural, ela acolhe e se nutre de vários repertórios que lhe conferem um identidade multicultural (GARBIN, 2001) e servem a diversão e a alegria, expondo a necessidade de experimentar sentidos. Música que movimenta o ator plural nas redes complexas e múltiplas de significações, crenças e hábitos das culturas infantis dados na socialização possível nos tempo de ser a música da infância, essa ação inabordável e encantadora de conjugar diversidade, multiplicidade e escutas num só corpo de sonoridades (LINO, 2008, p. 31).

Nesse contexto, esta pesquisa está organizada com vistas a problematizar, junto a

educadores infantis, um olhar para as culturas da infância que estão sendo produzidas no

cotidiano de determinada instituição de educação infantil. “Escutar sensivelmente a música

nas culturas da infância requer que contemplemos o ponto de escuta das crianças em seu

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300

encontro com o mundo, buscando uma aproximação com a complexidade desse encontro”

(LINO, 2008, p. 35).

Considera-se relevante que os professores possam aguçar seu olhar para as culturas

construídas na coletividade das relações estabelecidas entre crianças de diferentes faixas

etárias. Assim, com o decorrer da pesquisa, objetiva-se investigar como o professor percebe o

protagonismo infantil e a produção de culturas musicais no cotidiano de uma turma

multietária na educação infantil.

Delineamentos metodológicos

A pesquisa está em fase inicial de elaboração e revisão de literatura. Pretende-se

adotar uma abordagem participante com a finalidade de possibilitar a discussão e reflexão

junto a professores que atuam na educação infantil no Núcleo de Educação Infantil Ipê

Amarelo (NEIIA), locus da pesquisa.

O Ipê Amarelo está vinculado à UFSM e vem desenvolvendo suas atividades junto a

grupos de crianças, construindo sua trajetória há 22 anos, demonstrando e demarcando

possibilidades de construções e de descobertas na educação infantil. Dentre o trabalho que

vem sendo realizado, destaca-se a proposição de turmas de crianças a partir do critério de

agrupamento multietário; ou seja, crianças de 01 a 05 anos convivendo no mesmo espaço,

interagindo, construindo e produzindo culturas infantis, constituindo, assim, uma turma

composta na/pela diversidade.

Há três anos, foi criada a primeira turma composta por crianças de 1 a 5 anos, a qual se

denominou de “Integração”. A partir das constatações, observação atenta e avaliação das

conquistas obtidas, no corrente ano, foram criadas mais três turmas “Integração” (nos turnos

manhã e tarde). As turmas “Integração” têm se constituído um verdadeiro desafio aos

professores e aos pais, que necessitam ressignificar a importância atribuída em demasia às

idades, no que se refere ao desenvolvimento infantil, buscando considerar que crianças

maiores e menores aprendem umas com as outras, independente de faixa etária, mediadas

pelas problematizações e pelas intervenções do professor.

Dessa forma, o Ipê Amarelo constitui-se locus de realização desta pesquisa em função

da proposição de turmas multietárias. Como instrumentos metodológicos, têm-se observações

participantes nas turmas, entrevistas semi-estruturadas com as professoras, registros no diário

de campo e filmagens.

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Estão sendo realizadas inserções e observações participantes no contexto das turmas

de Integração do NEIIA, como parte de uma pesquisa de campo com a finalidade de perceber

as múltiplas relações e construções das crianças, tendo por base o protagonismo infantil e as

mediações realizadas pelos professores.

Pretende-se realizar observações e gravações, buscando verificar as interações das

crianças em diferentes momentos do cotidiano, suas construções e produções de culturas

musicais. Essas gravações serão usadas posteriormente para discutir e problematizar os

recortes de cenas do cotidiano junto às professoras, a fim de analisarmos como elas percebem

o protagonismo infantil e a produção de culturas musicais no contexto do agrupamento

multietário.

Algumas considerações iniciais

A partir das inserções da pesquisa de campo que estão sendo realizadas junto às

turmas multietárias do NEIIA, foi possível observar as interações e construções das crianças

em momentos de atividades dirigidas e mediadas pelas professoras, bem como momentos de

atividades livres, em que as crianças organizavam suas brincadeiras. Percebe-se que o

trabalho pedagógico realizado tem foco nas crianças, de modo que são suas curiosidades e

questionamentos, os quais ao serem problematizados pelas professoras, que constituem o(s)

tema(s) do projeto da turma (BARBOSA; HORN, 2008). Desta forma, torna-se visível o

protagonismo da criança diante da elaboração e dos encaminhamentos da proposta de

trabalho.

Nos momentos de atividades mais livres, os quais também são entendidos como

relevantes para o desenvolvimento infantil, é possível observar a forma como as crianças se

organizam para brincar, as questões de poder e de liderança, a representação dos papéis

sociais e das regras acordadas. São comuns brincadeiras que envolvam um grupo de meninos

e meninas, o qual representa uma organização familiar, e eles desempenham a função de

mamãe, papai, irmão(ã) mais velho(a) ou mais novo(a), tio(a), primo(a), etc.

Nesse jogo simbólico de representar as relações estabelecidas no cotidiano de uma

família, as crianças constroem e expressam variadas relações que envolvem gênero, classe,

etnia, poder, etc. Neste contexto, manifestações musicais também adentram e fazem parte do

brincar. Como, por exemplo, certa menina que desempenhava papel de mãe cantora e

realizava um show para os seus filhos e amigos. Todos resolvem fazer parte do show, subindo

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numa parte mais elevada do terreno, imaginando estar segurando microfones ou instrumentos

musicais enquanto cantavam “fada, fada querida, dona da minha vida”.

Constata-se, portanto, que as crianças pequenas da educação infantil produzem

culturas musicais; todavia, há que se problematizar e questionar, junto a esses professores da

infância, o modo como percebem essas culturas no cotidiano de seu fazer pedagógico – foco a

que se destina a presente pesquisa.

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Referências

BARBOSA, Maria Carmen Silveira; HORN, Maria da Graça Souza. Projetos pedagógicos na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2008. BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro. A educação musical nas séries iniciais do ensino fundamental: olhando e construindo junto às práticas cotidianas do professor. Tese (Doutorado em Educação), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação, Porto Alegre, 2000. CORREA, Aruna Noal. Programa LEM: Tocar e Cantar: Um estudo acerca de sua inserção no processo músico-formativo de unidocentes da Pedagogia/UFSM. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Educação, Santa Maria, 2008. COUTINHO, Ângela Maria Scalabrin. Culturas infantis: conceitos e significados no campo da pesquisa e no cotidiano da educação infantil. Zero-a-seis. Florianópolis, n. 12, jul./dez. 2005. Disponível em: <http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/zeroseis/article/view/9713/10369>. Acesso em: 10 jun. 2011. FIGUEIREDO, Sérgio Luiz Ferreira de. A preparação musical de professores generalistas no Brasil. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, p. 55-62, 2004. HENTSCHKE, Liane; AZEVEDO, Maria Cristina de Carvalho C. de; ARAÚJO, Rosane Cardoso de. Os saberes docentes na formação do professor: perspectivas teóricas para a educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 15, p. 49-58, 2006. LINO, Dulcimarta Lemos. Barulhar: a escuta sensível da música nas culturas da infância. Tese (Doutorado em Educação), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação, Porto Alegre, 2008. PENNA, Maura. Não basta tocar? Discutindo a formação do educador musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 16, p. 49-56, 2007. PRADO, Patrícia Dias. Contrariando a idade: condição infantil e relações etárias entre crianças pequenas da educação infantil. Tese (Doutorado em Educação), Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, 2006. ______. “A gente gosta é de brincar com os outros meninos!” Relações sociais entre crianças num jardim de infância. Educação e Sociedade, Campinas, v. 26, n. 91, p. 683-688, Maio/Ago. 2005. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 13 maio 2011. SPANAVELLO, Caroline da Silveira. A educação musical nas práticas educativas de professores unidocentes: um estudo com egressos da UFSM. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Educação, Santa Maria, 2005. VYGOTSKY, Lev Semenovitch. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

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WERLE, Kelly. A música no estágio supervisionado da Pedagogia: uma pesquisa com estagiárias da UFSM. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Educação, Santa Maria, 2010.

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Sonorizando Histórias e Discutindo a Formação e as Práticas Musicais de

Pedagogas na Educação Infantil

Kelly Werle1 [email protected]

Cláudia Ribeiro Bellochio2 [email protected]

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo discutir a formação e atuação pedagógico-musical de pedagogas na educação infantil, apontando para a sonorização de histórias como uma possibilidade metodológica para o trabalho com a educação musical. O relato decorre de uma pesquisa de mestrado vinculada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Santa Maria (PPGE/UFSM) e ao grupo Formação, Ação e Pesquisa em Educação Musical (FAPEM) que objetivou investigar como as estagiárias concebem, organizam e potencializam a música no processo de construção da docência, através de um grupo composto por quatro estagiárias e mestranda (ou pesquisadora). A partir dos resultados obtidos se identificou as histórias sonorizadas como práticas recorrentes adotadas pelas estagiárias no trabalho com a educação musical, foco metodológico que será abordado no decorrer deste texto.

Palavras chave: Educação musical, educação infantil, sonorização de história

Introdução

O presente texto decorre de uma pesquisa de mestrado desenvolvida junto ao

Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria e ao

grupo Formação, Ação e Pesquisa em Educação Musical (FAPEM). A pesquisa buscou

investigar como estagiárias do curso de Pedagogia/UFSM concebem, organizam e

potencializam a música durante a realização do estágio supervisionado na educação infantil3.

Como abordagem metodológica utilizou-se a pesquisa participante, a qual foi realizada por

intermédio de um grupo composto por quatro estagiárias da Pedagogia e a mestranda. Como

instrumentos metodológicos foram utilizados: entrevistas semi-estruturadas, observações,

caderno de registros dos encontros do grupo e das observações e caderno de registro das

participantes.

Este texto constitui um recorte de parte dos resultados da pesquisa e focaliza a

sonorização de histórias, prática recorrente adotada pelas estagiárias no trabalho com a

1 Doutoranda em Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE, Universidade Federal de Santa Maria/UFSM. 2 Profª Drª adjunta do Departamento de Metodologias de Ensino/MEN, Universidade Federal de Santa Maria/UFSM. 3 Na ocasião deste texto está sendo enfocada a educação infantil, mas a pesquisa também abarcou os anos iniciais do ensino fundamental.

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educação musical durante o estágio supervisionado na educação infantil. Pretende-se discutir,

ao longo do texto, acerca da educação musical na formação acadêmico-profissional4 do curso

de Pedagogia apontando para a sonorização de histórias como uma das possibilidades para o

trabalho com a educação musical, através de um relato, registrado no caderno de uma das

participantes da pesquisa, envolvendo uma atividade vivenciada com uma turma de crianças

da educação infantil.

A Formação Musical e Pedagógico-Musical no Curso de Pedagogia

A música está presente em nossa vida e permeia nossas relações e construções com o

mundo, desde muito cedo. Basta exercitarmos um pouco nossa memória para percebermos

que crescemos e nos constituímos humanos envoltos por um ambiente sonoro e musical

característico de nosso cotidiano e contexto social e cultural, repleto de sentidos e significados

que nos são únicos e também se mesclam com experiências musicais de outros sujeitos.

Somos seres musicais e temos a capacidade de responder sonoramente e musicalmente

à cultura em que estamos inseridos. Algumas pessoas afirmam “não ter dom para música”,

sem ter a consciência, contudo, que o fazer musical, não é algo concedido naturalmente sem

influência do meio ou esforço próprio. Portanto, a música não é um dom concedido a uns e

negado a outros, o que ocorre é que, no decorrer de nossas trajetórias de vida possuímos

maiores ou menores oportunidades de estarmos nos desenvolvendo musicalmente.

Assim, não existe uma pessoa amusical, pois “a musicalidade é uma característica da

espécie humana e [...] todos os seres humanos estão aptos a se desenvolverem musicalmente”

(FIGUEIREDO; SCHMIDT, 2008).

Essa concepção acerca da música também pode ser levada para a discussão quando

pensamos na professora5 que atua com a educação infantil e anos iniciais. Pois, refletir sobre

o trabalho com a educação musical na escola, implica em considerar essas múltiplas relações

e construções acerca da música que perpassam pela trajetória pessoal e profissional.

Neste contexto, é importante que na formação acadêmico-profissional as futuras

professoras possam ter a oportunidade de ampliarem seus conhecimentos musicais e

pedagógico-musicais. Para que, a partir de suas experiências, em consonância com novas

4 Tomo por formação acadêmico-profissional o conceito adotado por Diniz-Pereira (2008), o qual opta por esse termo em detrimento da formação inicial porque acredita que a formação inicia-se muito antes da entrada em um curso superior. Assim, o autor defende a utilização do termo formação acadêmico-profissional para a etapa da formação que acontece no interior das instituições de ensino superior. 5 Utilizo o gênero feminino devido à expressividade de mulheres atuando como professoras nesses níveis de ensino.

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vivências possam desenvolver conhecimentos, que as possibilitem trabalhar com a educação

musical na docência.

É relevante lembrar que, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais para o

curso de Pedagogia, o egresso deve estar apto a “ensinar Língua Portuguesa, Matemática,

Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às

diferentes fases do desenvolvimento humano” (BRASIL, 2006).

Recentemente, as diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental de nove

anos orientam em seu artigo 31, que “do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, os

componentes curriculares Educação Física e Arte poderão estar a cargo do professor de

referência da turma, aquele com o qual os alunos permanecem a maior parte do período

escolar, ou de professores licenciados nos respectivos componentes” (BRASIL, 2010). No

parágrafo 2º deste artigo orienta-se que “nos casos em que esses componentes curriculares

sejam desenvolvidos por professores com licenciatura específica (conforme Parecer

CNE/CEB n 2/2008), deve ser assegurada a integração com os demais componentes

trabalhados pelo professor de referência da turma”.

Considerando que mediante a homologação da Lei 11.769/2008 fica determinada a

obrigatoriedade da Música como conteúdo do componente curricular Arte, o egresso em

Pedagogia também necessita ter conhecimentos acerca da música para poder desenvolvê-la e

integrá-la ao seu contexto de docência, o que implica em formação neste campo do saber.

Certamente que essa formação musical e pedagógico-musical na Pedagogia não substitui a

necessidade de um professor especialista em música atuando nas escolas, trabalho que poderá

ser construído conjuntamente nesses níveis de ensino. Mas, salienta-se a importância da

professora da infância desenvolver um trabalho musical com desempenho mais qualificado,

maior clareza e criticidade junto aos alunos.

A Universidade Federal de Santa Maria tem uma trajetória formativa em educação

musical no curso de Pedagogia há 25 anos. Desde 1984, o curso de Pedagogia possui

disciplinas obrigatórias de educação musical, as quais foram reconfiguradas e mantidas após

as reformulações e adaptações curriculares ocorridas em 2004 e 2006. A formação

proporcionada pelas disciplinas vem sendo ampliada e complementada pelas oficinas

musicais ofertadas pelo “Programa LEM: Tocar e Cantar”6 desde 2003. Esse espaço

formativo da educação musical na Pedagogia tem propiciado um ambiente fértil para a

6 Projeto de extensão coordenado pela Profª Drª Cláudia Ribeiro Bellochio e pela Profª Drª Luciane Wilke Freitas Garbosa, o qual oferta gratuitamente oficinas musicais, ministradas por licenciandos em Música, para acadêmicos do curso de Pedagogia e outras graduações, bem como comunidade em geral.

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produção de pesquisas tendo como lócus a formação musical do curso de Pedagogia da

UFSM, como Bellochio (2000), Spanavello (2005), Correa (2008), Furquim (2009) e

Oesterreich (2010); Werle (2010).

Embora, o trabalho com a educação musical possa representar um grande desafio para

as professoras de educação infantil, já que na maioria das vezes tiveram poucas vivências

musicais formais em sua trajetória de vida, acredita-se que através de um processo

longitudinal de vivências musicais e acompanhamento das práticas, seja possível que as

pedagogas possam potencializar a educação musical junto aos alunos.

A seguir são apresentados partes dos registros de uma história sonorizada a qual foi

criada por uma estagiária participante da pesquisa e desenvolvida em uma turma de educação

infantil, com crianças de 3 anos de idade.

“ Vamos Passear na Floresta?”: sonorizando histórias

Parte I Olhos curiosos e atentos à organização da sala que estava diferente. Em um canto da sala, um tapete grande com alguns objetos sonoros, no outro uma caverna construída com panos e cadeiras, e interligando os dois, um amplo espaço livre sem qualquer objeto. Cortinas abertas... luzes apagadas... um estranho mistério no ar. A professora, então, convida como quem se propõe a iniciar uma aventura: - Vamos passear na floresta? Eis que no segundo seguinte a sala se transforma por completo! Tudo foi tomado por árvores e plantas que cresciam, não se sabe de onde, tornando o ambiente inusitado e desconhecido. A possibilidade de haverem animais e feras na floresta aumentava a cada instante. Ouvidos muito atentos à jornada que estava para começar (Caderno de registro, estagiária Dora, set. 2009).

Como já sabido, as histórias são muito importantes para o desenvolvimento e

construção do pensamento simbólico das crianças. Segundo Brito (2003, p. 161)

Ouvindo e, depois, criando histórias, elas estimulam sua capacidade inventiva, desenvolvem o contato e a vivência com a linguagem oral e ampliam recursos que incluem o vocabulário, as entonações expressivas, as articulações, enfim, a musicalidade da própria fala.

Neste sentido, as histórias podem se tornar metodologia para o trabalho com a música,

a partir do momento que se busca torná-las mais expressivas e sonoras. A forma como se

narra uma história, variando a entonação de voz conforme as diferentes partes: ora mais

grave, mais agudo, pronunciando mais rápido ou lentamente, suave ou mais forte, enriquecem

a história e despertam as crianças para as variações sonoras que estão ocorrendo.

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As histórias sonorizadas são uma possibilidade para o trabalho com música de fácil

acesso para professoras da educação infantil, pois essas professoras conhecem o contexto de

suas turmas, sendo possível identificar os elementos e temas que lhes são mais significativos e

que possam aguçar ainda mais a imaginação e a criatividade, contribuindo para a construção

da história sonorizada.

Além disso, neste tipo de atividade não se faz necessário habilidades vocais ou o uso

de instrumentos musicais convencionais, podendo ser utilizados uma variedade de objetos

sonoros.

Durante a realização da pesquisa constatou-se que trabalhar com histórias sonorizadas

foi uma prática utilizada por todas as estagiárias que participaram do estudo. As histórias

surgiam a partir de interesses demonstrados pelas crianças e de temáticas que estavam sendo

desenvolvidas.

É importante que o ambiente a ser realizado a história possa ser pensado, organizado e

planejado, a fim de que possa ser convidativo às crianças adentrarem na história proposta,

contribuindo assim com a criação durante o processo de sonorização.

Parte II - Vamos passear na floresta? - Vamos!! E o passeio começa com todas as crianças sentadas no tapete, que já não era mais um tapete, mas sim um barco que navegava pelo rio da floresta. - Vocês estão ouvindo o som do rio? Como podemos fazer o som do rio? Rapidamente as crianças passam a explorar os sons dos instrumentos e objetos sonoros, e a cada desafio proposto pela professora, iam sonorizando e vivenciando a história, ora com os objetos disponíveis, ora com sons do próprio corpo. Uma cascata se aproxima, é chegada a hora de abandonar rapidamente o barco, nadar até a margem. Na medida em que se movimentavam por todos os espaços iam desvendando os mistérios da floresta. A caminhada, o trecho do mato fechado, a trilha de pedrinhas, a escalada nas árvores, a colméia, o encontro com os macacos, tudo ia somando muita sonorização e estimulando a imaginação com as situações que as próprias crianças iam sugerindo. Até que, copiosamente, começou a chover, a trovejar e a ventar... E agora? Para onde ir? (Caderno de registro, estagiária Dora, set. 2009)

Realizar uma história sonorizada junto aos alunos implica em elaborar um enredo e

um cenário sonoro pelo qual a mesma será contada ou vivenciada, conforme a situação

exemplificada. A história a ser sonorizada pode ser alguma já conhecida de livros infantis,

uma adaptação e construção da professora ou uma construção coletiva da turma. Na situação

relatada, a história foi uma adaptação realizada pela professora a partir de “Vamos passear na

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floresta?” (faixa 8 do CD que integra guia prático para professores Música 1 – editora Lua,

2006).

Os elementos a serem utilizados para sonorizar uma história podem variar conforme as

possibilidades de materiais disponíveis. Nessa atividade foram usados objetos sonoros

confeccionados, anteriormente, pelas próprias crianças, como por exemplo: tambores feitos

com latas de diversos tamanhos; chocalhos feitos com potes de iogurte acrescido de pedrinhas

e sementes; móbiles feitos com chaves; reco-reco e claves feitos com pequenos bastões de

madeiras; lixas; pau de chuva. Também foram utilizados negativos de exame de raios-X e

pedaços de mangueiras amarelas usadas em construções, pois costumam causar um bom

efeito semelhante ao som de trovoadas e do vento – quando a mangueira é segurada em uma

das extremidades e balançada rapidamente em movimentos circulares.

Por outro lado, quando não houver objetos sonoros, está atividade também pode ser

realizada utilizando objetos da própria sala de aula dos quais seja possível extrair algum tipo

de som, como, por exemplo, passar o lápis ou caneta na mola do caderno, abrir e fechar o

estojo ou mochila, friccionar o giz no quadro, dentre outros. Pode-se desafiar os alunos a

explorar as possibilidades sonoras da sala de aula para criar um cenário sonoro para a história.

Parte III - A caverna! Vamos correr para a caverna! Protegidos da chuva, inicia-se a exploração da caverna e dos sons deste inusitado lugar. Que criatura habitaria a caverna? - Gente, olha lá! É peludo, tem rabo comprido... Que cheiro é esse? - É um gambá! Todos corriam para fora da caverna fugindo do gambá. Era necessário fazer todo o caminho de volta e muito rápido.

* * * No dia seguinte, uma criança chega à sala de aula acompanhada de um gambá de pelúcia. A turma revive a história e agora ganha um novo mascote que passa a acompanhá-los nas próximas atividades. “O gambá de pelúcia virou o mascote da turma. As crianças disputavam ele, tratavam ele como uma pessoa, tudo por causa da história ‘Vamos passear na floresta’. Até no banheiro levaram o gambá junto” (Caderno de registro, estagiária Dora, set. 2009).

A história sonorizada teve como dispositivo a mediação da professora buscando

desafiar as crianças a explorar as diferentes possibilidades sonoras dos objetos

disponibilizados. Na medida em que, a professora contava a história também conduzia a

sonorização da mesma, de modo que todas as crianças pudessem participar da trilha sonora.

Além disso, as intervenções da professora possibilitaram que as crianças pudessem

pensar ao produzir os sons, realizando pequenas variações, como por exemplo, no trecho da

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história em que começou a chover: a chuva iniciou lenta, aos poucos foi aumentando a

intensidade até que se tornou um temporal com chuva forte, ventos e trovadas.

Percebe-se que a problematização da professora é fundamental, para que as crianças

possam ser estimuladas não só a produzir sons, mas também a ouvir os sons que estão sendo

produzidos pelos colegas, de modo atento, organizado e reflexivo. Após a história foram

feitos questionamentos acerca dos efeitos produzidos por esses sons, bem como comparações

entre as propriedades dos mesmos: longo ou curto (diz respeito à duração), fraco ou forte

(intensidade), agudo ou grave (altura7), etc. A professora propôs diferentes organizações para

que os sons não fossem produzidos somente de modo concomitante, e assim seus efeitos

pudessem ser explorados separadamente e alternadamente.

Algumas Considerações

Entende-se que as histórias sonorizadas têm potencial metodológico para o trabalho

sonoro-musical a ser realizado junto às crianças. Contudo, é importante que a professora, ao

conceber a relevância da educação musical como parte do desenvolvimento integral da

criança, possa colocar-se em um constante movimento de busca por alternativas diferenciadas

as quais possam estar contemplando em sua prática docente. Para isso, é preciso ressignificar

a sua relação com a música, não restringindo ou limitando a sua atuação por não ter o domínio

de certa habilidade vocal ou com instrumentos musicais convencionais.

A possibilidade da professora de educação infantil trabalhar com a música em suas

práticas amplia a capacidade de contextualização e significação a ser construída acerca da

música pelas crianças. Na medida em que a professora organiza seu projeto e sua ação

pedagógica e articula as áreas do conhecimento, integrando à música, as aprendizagens

passam a ter mais sentido para as crianças.

7 Para que essa propriedade possa ser compreendida mais facilmente pela criança, pode-se fazer referência ao som agudo associando-o a um som mais “fino”, ao passo que um som grave pode ser referido como um som mais “grosso”.

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Referências

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DINIZ-PEREIRA, J. A formação acadêmico-profissional: compartilhando responsabilidades entre universidades e escolas. In: EGGERT, E. et al. Trajetória e processos de ensinar e aprender: didática e formação de professores. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008. P. 253-266.

FIGUEIREDO, S. L. F. de.; SCHMIDT, L. M. Refletindo sobre o talento musical na perspectiva de sujeitos não-músicos. In: SIMPÓSIO DE COGNIÇÃO E ARTES MUSICAIS, 4., 2008, São Paulo, SP. Anais... São Paulo: SIMCAM, 2008. Disponível em: <http://www.fflch.usp.br/dl/simcam4/anais_simcam4.htm>. Acesso em: abr. de 2009.

FURQUIM, A. S. dos S. A formação musical de professores em cursos de Pedagogia: um estudo das universidades públicas do Rio Grande do Sul. 2009. Dissertação – Curso de Mestrado em Educação, Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria. OESTERREICH, F. A história da disciplina de música no curso de Pedagogia da UFSM (1984-2008). 2010. Dissertação – Curso de Mestrado em Educação, Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria. SPANAVELLO, C. da S. A educação musical nas práticas educativas de professores unidocentes: um estudo com egressos da UFSM. 2005. Dissertação – Curso de Mestrado em Educação, Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria.

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Pôsteres

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Corridos de Capoeira na Creche: prática pedagógica musical e diversidade

étnico-cultural

Flávia de Jesus Damião1 Creche da UFBA

[email protected]/[email protected]

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo identificar ações e interações de meninas e meninos entre 1 e 2 anos a partir da inserção dos corridos de capoeira na prática pedagógica musical em sala a fim de verificar se os mesmos se configuram como uma ferramenta educativa que contribui para o desenvolvimento musical, na construção de identidade étnico-cultural, bem como, na formação e ampliação de um repertório musical infantil plural pautado na contribuição do legado dos afro-brasileiros para música brasileira. O presente estudo privilegia a interface de estudos nas áreas da educação infantil: Brasil, 1998; Rocha,1998; da educação musical infantil: Santiago e Nascimento, 1996; Ilari, 2002; Brito, 2003; Russell, 2006, da história e cultura afro-brasileira: Oliveira, 2003; 2005; Cunha, 2005; Munanga, 2004; da educação das relações étnico-raciais: Cavalleiro, 2000; Machado, 2002(a); Brasil, 2004(a); Brasil, 2004(b) dentre outros. Metodologicamente, o trabalho caracteriza-se pela abordagem qualitativa da pesquisa-ação. A escolha por tal abordagem deve-se ao fato da inserção da pesquisadora no lócus da pesquisa, e por considerarmos as crianças como atores sociais que participam do processo de pesquisa. O lócus do trabalho é a creche da Universidade Federal da Bahia em Salvador. Os sujeitos da pesquisa serão 20 crianças entre 1 e 2 anos que freqüentam o grupo I e seus pais. Nosso ponto de partida é que a prática pedagógica na creche deve atuar no sentido de fomentar a construção positiva de identidades, das crianças negras, brancas, indígenas através do acesso aos referenciais sócio-históricos e das matrizes culturais que nos constitui.

Palavras chave: Educação em creche, prática pedagógica musical, diversidade étnico-cultural

Introdução

A conformação histórica, política e social do Brasil, sinalizam para a existência de um

país multi-étnico e pluricultural. Entretanto, a sociedade brasileira negou-se como

pluricultural, escondeu a questão étnica e estabeleceu um projeto de Estado destacando

valores hegemônicos oficiais brancos (Nery, 2004).

De acordo com Munanga (2004) o discurso de formação do povo brasileiro, de forte

caráter ideológico, esteve ligado a construção da idéia de nação e de identidade nacional

ocorrido nos fins do século XIX até meado do século XX. Para forjar essa idéia de nação,

elegeu-se o biótipo do homem branco e a cultura ocidental européia como modelo sobre o

1 Pedagoga-UFBA; Especialista em Educação Infantil- UNEB; Mestre em Educação-UFC; Professora do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico na Creche da UFBA

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qual erigir-se a nação brasileira. À indígenas, africanos foram relegados a periferia da historia

e cultura do Brasil.

Dada a impossibilidade de negar a existência da população negra e indígena, vários

intelectuais brasileiros se dedicaram ao projeto de construção da idéia do povo brasileiro. Um

povo que resultaria da mestiçagem - mistura - entre as três raças (branca, negra e índia).

Pensando com Marques (1994) compreendemos que neste processo o que estava em jogo era

o controle social, a homogeneização. Era preciso “administrar” a diversidade.

A construção dos discursos e de práticas de invisibilização das diferenças e da

diversidade no país reverberou em todas as dimensões da vida dos brasileiros. Desde as

esferas das micro-relações, como as relações afetivas, por exemplo; até o âmbito do acesso

aos bens sociais, econômicos, políticos e culturais.

No campo da educação, a conseqüência dessas práticas de negação do outro se

traduziu de muitos modos: proibição de acesso à educação; práticas pedagógicas racista e

discriminatórias com prevalência da pedagogia do embranquecimento; silenciamento e

negação do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro; práticas de desqualificação da

identidade étnica; política de baixo investimento em sistemas públicos de educação, quando a

população negra, começou a ter acesso a ele; dentre outros.

O cenário acima descrito, nos revela da omissão do Estado brasileiro em oportunizar à

parcela da população afro-brasileira condições dignas de acesso e permanência à educação de

qualidade. No vácuo institucional deixado pelo estado, os afro-brasileiros vêm ao longo dos

tempos se (pre)ocupando com a educação dos seus. Assim, os negros, de modo individual, ou

articulados em movimentos se incumbiram da tarefa de educar-se e de cuidar da educação dos

seus.

Ao longo dos cinco séculos da presença de africanos e seus descentes em terras

brasileiras, estes sempre reivindicaram o acesso à educação, bem como, propuseram

estratégias educacionais ora mantidas por eles mesmos, ora de responsabilidade do Estado. A

partir do século XX, os movimentos negros, passaram a apontaram de modo mais enfático: a

necessidade de políticas e diretrizes educacionais públicas de reparação a população negra, o

reconhecimento e valorização da história e cultura afro-brasileira, ações afirmativas, e

relações étnico-raciais positivas na educação. (Brasil, 2004(a).

Essa demanda da comunidade afrodescendente brasileira pela afirmação do direito a

educação foi contemplada/apoiada com a promulgação da Lei 10.634/2003, que alterando a

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº9.394/1996 (LDB), torna obrigatório o

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ensino sobre a História e Cultura Afro-Brasileira nos estabelecimento de ensino fundamental

e médio. Ainda, seguindo a referida Lei, tais conteúdos serão ministrado no âmbito de todo

currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História

Brasileiras.

Apesar da Lei 10.639/2003 não se referir a Educação Infantil, dois marcos legais

incluem a Educação da Relações Étnico-raciais e o Ensino da História e Cultura Afro-

Brasileira desde a educação infantil. São eles; o Parecer do CNE/CP nº3 de 2004 e a

Resolução nº 1 de 2004 do Conselho Nacional de Educação(CNE).

No Parecer nº03/2004 isso fica explicito quando aborda diz que a História e Cultura

Afro-Brasileira precisa ocorrem em todos os níveis e âmbitos da Educação. “O ensino de

História e Cultura Afro-brasileira e Africana, a educação das relações étnico-raciais, tal como

explicita o presente parecer, se desenvolverão no cotidiano das escolas, nos diferentes níveis e

modalidades de ensino,(...)”. E, quando fala das responsabilidades dos níveis de ensino para

com o cumprimento da Lei. “Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de

Educação Básica, nos níveis de Educação Infantil, Educação Fundamental, Educação Média,

Educação de Jovens e Adultos, Educação Superior, precisarão providenciar (...)”. (Brasil,

2004(a).

Já na Resolução nº 1 de 2004 do Conselho Nacional de Educação(CNE) que institui as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação da Relações Étnico-Raciais e para o

Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, e, também o Parecer do CNE/CP nº3

de 2004 inclui a História e Cultura Afro-Brasileira e a Educação da Relações Étnico-raciais

desde a educação infantil.

Nesse contexto, compreendemos que a inserção da cultura de matriz africana, na

prática educativa de creches e escolas de educação infantil, é um movimento indispensável no

sentido de buscarmos superar o etnocentrismo europeu e desalienar os processos pedagógicos

desde o primeiro âmbito da educação infantil. Fundamentalmente, porque as crianças de 0 a

3 anos são sujeitos de direitos, e, como tal tem direito de freqüentar uma ambiência educativa

onde o respeito às diferenças, a diversidade étnica, a pluralidade cultural e alteridade do ser

sejam elementos basilares de sua ação.

É necessário que a prática pedagógica na creche atue no sentido de fomentar a

construção positiva de identidades, das crianças negras, brancas, indígenas, etc; através do

acesso aos referenciais sócio-históricos e das matrizes culturais que nos constitui, de modo

equânime. Essas ações, são estratégias necessárias, para que as instituições de educação da

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primeira infância em Salvador, sejam, efetivamente espaços democráticos e plurais nos quais

a diversidade não seja trascodificada em desigualdade.

Justificativa

Partindo da compreensão apresentada anteriormente, é que o presente trabalho busca

dar conta de uma lacuna, qual seja: articular discussões acerca da educação de crianças em

creches, práticas pedagógicas musicais, cultura de matriz africana e diversidade étnico-racial.

Quando pensamos na presença da cultura de matriz africana na prática pedagógica na

creche, vislumbramos sua inserção através das múltiplas linguagens simbólica. Primeiro,

porque é através delas que a criança pequena realiza o duplo movimento de lançar-se no

mundo, e ao mesmo tempo, tomá-lo para si. Segundo, porque as a cultura de matriz africana

utiliza-se de inúmeras elementos simbólicos para assegurar sua existência. A música é uma

das linguagens quais os afrodescendentes (re)elaboraram no Brasil a cultura originária no

continente africano.

As práticas pedagógicas musicais das creches precisam contemplar a música

produzida no continente africano, bem como, aquela elaborada pelos afrodescendentes em

terras brasileiras. O importante é assegurar que as crianças de 0 a 6 anos possam ter

oportunidade de produzir, apreciar e sentir diferentes ritmos e sonoridades de modo lúdico e

prazeroso.

Pressupostos Teóricos

De caráter interdisciplinar, o presente estudo privilegiará a interface de estudos e

pesquisas nas áreas da educação infantil Brasil, 1998; Rocha, 1998; Brasil, 1999; Rosemberg,

1999, Machado, 2002(b); Dahlberg; Moss e Pence, 2003; Quinteiro, 2002, da educação

musical infantil Santiago e Nascimento, 1996; Brasil,1998; Ilari, 2002; brito, 2003; Oliveira,

2006; Russell, 2006, da história e cultura afro-brasileira Oliveira, 2003; 2005; Cunha, 2005;

Munanga, 2004; Adriano, 2006, da educação das relações étnico-raciais Oliveira, 1994; Dias,

1997; Lopes, 2001; Cavalleiro, 2000; Machado, 2002(a); Gusmão 2003; Brasil, 2004(a);

Brasil, 2004(b); Brasil, 2005. Nessa perspectiva, os referidos trabalhos serão nossos guias no

processo de produção de novos conhecimentos em educação infantil.

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Objetivo Geral

A presente pesquisa tem por objetivo identificar ações e interações de meninas e

meninos entre 1 e 2 anos a partir da inserção dos corridos de capoeira na prática pedagógica

musical em sala a fim de verificar se os mesmos se configuram como uma ferramenta

educativa que contribui para o desenvolvimento musical, na construção de identidade étnico-

cultural, bem como, na formação e ampliação de um repertório musical infantil plural pautado

na contribuição do legado dos afro-brasileiros para música brasileira.

Questões de Pesquisa

Diante do exposto, o presente trabalho teve por objetivo responder as seguintes

questões:

Quais as ações e interações são produzidas por meninas e meninos entre 1 e 2 anos de

idade a partir da inserção dos corridos de capoeira na prática pedagógica musical em sala?

Os corridos contribuem para o desenvolvimento musical de crianças entre 1 e 2 anos?

De que forma?

Os corridos favorecem a construção da identidade étnico-cultural? Como?

Os corridos se configuram como musicas que podem integrar e/ou ampliar o repertório

musical infantil destacando sua origem ligada aos afro-brasileiros?

Quais as compreensões, posturas, reações, dos pais das crianças acerca dos corridos de

capoeira e da inserção dos mesmos na prática pedagógica musical em sala?

Metodologia

Metodologicamente, o presente trabalho caracteriza-se como uma abordagem

qualitativa da pesquisa-ação. Para Thiollent (1988) “a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa

social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou

a resolução de um problema.”. A escolha por tal abordagem deve-se ao fato de que estamos

interessadas em melhor compreender um aspecto do processo educacional em creche, pela

inserção da pesquisadora no lócus da pesquisa, pelo compromisso da pesquisadora com a

população pesquisada, e, principalmente, por considerarmos as crianças como atores sociais

que, possuindo ação e voz, participam do processo de pesquisa.

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Sujeitos e Lócus

Sujeitos da pesquisa serão 20 crianças entre 1 e 2 anos que freqüentam mesmo grupo

em uma creche e seus pais. O lócus do trabalho é a creche da Universidade Federal da Bahia

em Salvador.

Dimensão ética

Nas questões éticas de investigação com crianças deve considerar-se uma trilogia entre

direitos, deveres e danos/benefícios, devendo o trabalho do investigador social orientar-se pela

observância destes três pilares fundamentais. (Alderson,1995),

Partindo de tal compreensão inicialmente o projeto será apresentado a coordenação geral

da creche e as profissionais que trabalham no grupo I; No momento seguinte far-se-á uma reunião

com pais das crianças para apresentar o projeto de pesquisa, solicitá-los a autorizar a participação

dos filhos(as) e convidá-los também a participarem; A participação das crianças do grupo terá

como eixo a observação cuidadosa das reações faciais, corporais e verbais de bem-estar das

mesmas. Sob nenhuma hipótese as crianças serão obrigada a realizarem uma atividade que não

desejem.

Ferramentas metodológicas

A fim de alcançarmos os objetivos a que esta pesquisa se propõe usaremos um amplo

conjunto de ferramentas metodológicas a fim de nos aproximarmos do fenômeno a ser

estudado. Da interação das crianças serão privilegiadas: desenhos infantis; observação de

situações de brincadeiras; observação do seu movimento corporal; fotos e filmagens; diários

de observação. Na parte da pesquisa que envolver os pais serão usados questionários.

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Referências

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Oficinas de música no Projeto de Extensão Multicampi da Universidade

Estadual de Montes Claros

Talita Daniele Alves Gomes [email protected]

Resumo: O presente trabalho relata uma experiência pedagógico-musical realizada a partir do Projeto de extensão “Multicampi” da Universidade Estadual de Montes Claros-MG. As vivências musicais foram desenvolvidas no primeiro semestre de 2011, mais especificamente entre os meses de abril e junho, nas cidades de Salinas e Almenara, respectivamente. No projeto foram atendidos alunos provenientes de escolas públicas municipais (que apresentavam baixo IDH - índice de desenvolvimento humano) com faixa etária de 06 à 10 anos de idade. Este trabalho musical se insere em um conjunto mais amplo de atividades extensionistas que incluem práticas voltadas à educação infantil, a saúde e a atividades esportivas. O trabalho teve como objetivo proporcionar aos alunos momentos musicais lúdicos e significativos que pudessem contribuir na sua formação básica. As oficinas foram realizadas em contextos diversificados e assim, não ficaram restritas à sala de aula. Acredita-se que os relatos aqui transcritos poderão contribuir para a reflexão sobre trabalhos que vêm sendo realizados com vistas ao desenvolvimento de atividades musicais nos espaço escolares.

Palavras chave: Educação infantil, música, oficinas

Introdução

Sou acadêmica bolsista do PET (Programa de Educação Tutorial) que é um projeto do

MEC, financiado pela CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino

Superior). A ação tem por objetivo propiciar aos alunos participantes, sob a orientação de um

tutor, a realização de atividades extracurriculares que complementem a formação acadêmica

do estudante e atendam às necessidades do próprio curso de graduação (BRASIL, 2006).

Buscando aprofundar minha formação acadêmica, elaborei o projeto “Oficinas

Itinerantes”. A proposta tem como principal objetivo realizar capacitações para futuros e já

atuantes, professores de música no contexto escolar.

As atividades são desenvolvidas por meio de oficinas com aplicação de temas práticos

e teóricos. Assim, as atividades buscam desenvolver práticas musicais dentro do próprio

contexto visando à mobilização e sensibilização dos alunos contemplados.

O projeto visa unir a proposta extensionista do Multicampi com a prática exercida nas

oficinas itinerantes. Assim, reestruturei o projeto de forma que atendesse às demandas

solicitadas pela Coordenadoria de Apoio ao Estudante, a qual é responsável pela orientação e

realização das oficinas dos Multicampis, a fim de atender a crianças da educação infantil com

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idade entre 06 e 10 anos com oficinas de curta duração dentro das áreas de educação, saúde,

esporte e cultura.

Realizadas no 1º semestre de 2011, as oficinas itinerantes de música no projeto

Multicampi se destacam por propiciar aos alunos contemplados uma nova experiência com a

música no contexto escolar, diferente do que estão acostumados vivenciando a prática e a

escuta musical em um pequeno espaço de tempo.

Este artigo buscará relatar como as oficinas foram realizadas e assim, serão apontados

os objetivos, a metodologia, os recursos e as concepções pedagógicas que nortearam o

trabalho.

Detalhamento da experiência pedagógica

O projeto Multicampi é um projeto extensionista da Coordenadoria de Apoio ao

Estudante vinculado à Pró-Reitoria de Extensão Cultural da Universidade Estadual de Montes

Claros e tem como principal objetivo levar às cidades que possuem campus da Unimontes

oficinas práticas e rápidas de áreas diversas bem como saúde, esporte, educação, cultura e

lazer. O Multicampi é realizado durante dois dias nas cidades contempladas durante todo o

período diurno atendendo às crianças da faixa etárias de 06 a 10 anos matriculadas em escolas

publicas e/ou municipais.

Segundo Gonçalves (São Paulo, Brasil 2009) a música é uma ferramenta que contribui

para formação integral do ser humano. Por meio dela a criança entra em contato com o mundo

letrado e lúdico. Ensinar utilizando-se da música ajuda a criança a valorizar uma peça

musical, teatral, concertos, pois, dando a oportunidade do conhecimento dos vários gêneros

musicais ela tem a oportunidade de construir sua autonomia, criatividade, aquisição de novos

conhecimentos e criticidade.

Essa proposta teve como objetivo de desenvolver um trabalho prático e rápido nas

oficinas que se desenvolvem no projeto Multicampi. Assim, relato experiências que vivi no

mesmo, com o intuito de mostrar uma realidade que encontramos hoje no segmento da

educação infantil de algumas cidades do estado de Minas Gerais, tendo como objetivo ainda

relatar algumas atividades realizadas nas oficinas como forma de dissociação das idéias

utilizadas.

Presentes em todo o trabalho extensionista as práticas metodológicas estão ligadas

diretamente com o lúdico, imaginário e recreativo sendo desenvolvidas atividades práticas

com utilização de materiais informativos de tal forma que os alunos recebam o maior número

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de informação possível em um curto espaço de tempo. São utilizados recursos audiovisuais

como o data show, reais como instrumentos musicais e ainda recursos lúdicos como desenhos,

pinturas e retratos do imaginário.

Nas oficinas de música foram realizadas algumas atividades de diferentes objetivos.

Iniciou-se com a sensibilização das crianças cantando músicas do cancioneiro infantil as quais

as crianças têm um momento de recreação. É realizado também um trabalho de coordenação

motora com batidas alternadas nas pernas e palmas acompanhando a melodia da música

trabalhada. Após a sensibilização é realizado uma atividade que trabalha a identidade dos sons

onde se é cantado uma música que fala de uma fazenda onde se citam nomes de animais onde

as crianças projetam os sons referentes aos animais citados. Segue a letra da música com a

idealização da dinâmica:

A fazenda Na fazenda pato tem (quém quém)

Tem um cão (au au) Tem peru (glu glu)

Carneiros brancos como algodão (béééé) Ainda tem um galo se achando um valentão (cocoricóóó)

Tem um gato angorá (miau miau)

Passarinhos sempre a cantar (assobios) Quando o boi se põe a mugir (muuuuu)

A casa ameaça até cair. (nesta hora se levanta os dois braços na intenção de não se deixar a casa cair)

Bem cedinho de manhã (duas palmas)

Quando o sol (duas palmas) Levantar (duas palmas)

Todos os bichos vão acordar (nesta hora os meninos fazem o movimento de espreguiçar e imitam vários bichos ao mesmo tempo)

É hora da fazenda trabalhar (duas palmas)

Após esta atividade pedimos às crianças que retratem em forma de desenho os bichos

citados na música ensinada pelos acadêmicos.

Realizando estas atividades práticas percebi que a metodologia utilizada pela equipe

sendo trabalhada de uma maneira mais informal possibilitava uma maior recepção dos alunos

com a música. As crianças eram recepcionadas em sala de aula e a maioria das vezes

apresentavam um comportamento agitado o qual era trabalhado pelos oficineiros do curso de

música, por meio da sensibilização, prática rítmica e de coordenação motora e percepção da

identidade dos sons bem como sua intensidade, altura e timbre. Dentro de todas as condições

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possíveis a equipe realizava um trabalho especial com as crianças com forma de possibilitar

um momento de sensibilização e aproveitamento da música infantil.

Para Siqueira (São Paulo, Brasil, 2009) As atividades musicais realizadas na escola

não visam à formação de músicos, e sim, através da vivência e compreensão da linguagem

musical, propiciara abertura de canais sensoriais, facilitando a expressão de emoções,

ampliando a cultura geral e contribuindo para a formação integral do ser.

Outra atividade também realizada pela equipe era a brincadeira de “Qual é a música?”.

Nesta prática musical uma parte dos oficineiros apresentava melodias de músicas do

cancioneiro infantil, MPB, sertanejo com ênfase nas músicas cantadas por eles. A música se

representava com forma real onde os oficineiros executavam instrumentos bem como o

violão, a flauta transversa e alguns instrumentos de percussão tocando a melodia onde as

crianças dividas por equipes deveriam realizar uma corrida para estourar um balão o qual

dava direito à criança de responder qual era o nome da música e marcar ponto para sua

equipe. Ao final presenteamos a todos agradecendo pela participação e aproveitamento das

atividades oferecidas.

Conclusão

A elaboração de oficinas rápidas e práticas no Projeto Multicampi da Universidade

Estadual de Montes Claros contribuiu de forma favorável às crianças que participam uma vez

que as mesmas realizam contato direto com práticas musicais, e estas permitem uma

integração com outras áreas, além de servirem como forma de recreação e desenvolvimento

de percepção auditiva e rítmica.

Segundo Almeida (2005) o bom senso, a humildade em reconhecer sua incompletude,

o aprender com o aluno, a paciência, a tolerância, a responsabilidade, a preocupação com o

social e o respeito aos alunos e à comunidade são também reconhecidas como necessidades na

atuação do professor de música.

Tendo como foco deste trabalho o relato de uma experiência vivida no Projeto

Multicampi, enfatizo a importância destas oficinas para a formação acadêmica dos alunos do

curso de graduação da Universidade Estadual de Montes Claros, as quais proporcionam uma

vivência mais ampla com uma realidade da educação básica como forma de experiência com

diversos tipos de alunos e locais. Esta proposta possibilita ao acadêmico uma significativa

experiência com o cotidiano vivido pelas crianças da educação infantil.

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Referências

GONÇALVES; SIQUEIRA; SANCHES, Adriana Rodrigues; Geyza Mara; Thiago Palma. A importância da música na Educação Infantil com crianças de 5 anos. Lins, SP, 2009 ALMEIDA, Cristiane Maria Galdino de; DEL BEN, Luciana Marta. Educação musical não-formal: Um estudo sobre a atuação do profissional em projetos sociais de Porto Alegre – RS Ministerio da educação – Secretaria de Educação Superior; Departamento de Modernização e programas de Educação Superior. Manual de Orientações básicas. Brasília – DF, dezembro de 2006.

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A Música na Educação Infantil em Pelotas: mapeando as escolas privadas

Isabel B. Hirsch [email protected]

Vitor H. R. Manzke [email protected]

Marilúcia D. da Silva [email protected]

Janaina P.V. Cruz [email protected]

Resumo: Este texto apresenta elementos de uma pesquisa em andamento e faz parte de um mapeamento do ensino de música em toda a educação básica das redes pública e privada de Pelotas – RS após a Lei 11.769/08. Nesta comunicação, será mostrado apenas o projeto de pesquisa nas escolas infantis privadas do município de Pelotas na zona sul do estado do Rio Grande do Sul. Tem por objetivo geral mapear o ensino de música nas escolas infantis privadas e por objetivos específicos identificar quem é o profissional que trabalha com a música nas escolas; reconhecer quais as atividades musicais que são desenvolvidas nas escolas; e, identificar quais são as necessidades dos profissionais que trabalham com música nas escolas. O método desenvolvido é o survey de desenho interseccional e o instrumento de coleta de dados é o questionário auto-administrado. A pesquisa encontra-se na fase de coleta de dados e pretende contribuir com a compreensão do trabalho musical realizado nas escolas.

Palavras-chave: educação musical em escolas privadas, educação infantil, mapeamento

Introdução

Muito se tem discutido sobre o ensino de música nas escolas desde que a Lei nº 11.769

foi homologada em 18 de agosto de 2008 instituindo a obrigatoriedade da música como

conteúdo do componente curricular da educação básica.

De acordo com Figueiredo (2010),

Apesar do avanço que a legislação pode trazer, ainda restam diversas questões sobre a educação musical na escola a partir da nova lei. A questão do professor adequado para ensinar música na escola ainda não está definida com toda a clareza necessária, pois a lei 11.769/2008 é genérica; cabe aos estados e municípios, estabelecerem os detalhes desta questão. A prática polivalente para o ensino das artes ainda está muito presente nos sistemas educacionais brasileiros e, para vários deles, a nova lei não acrescenta modificações (FIGUEIREDO, 2010, p.4).

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Pelo que se pode observar, o que mais deixou dúvidas em boa parte da população

brasileira é sobre quem será o profissional que irá trabalhar com a música nas escolas: o

professor especialista ou o não-especialista?

De acordo com Verle & Bellochio (2009), o professor de educação infantil tem papel

fundamental para fazer com que a música seja uma realidade nas escolas. Além disso, as

autoras complementam que

É imprescindível que o professor tenha conhecimentos musicais suficientes para que possa trabalhar com esta área do saber. Todavia, é bom destacar que esse professor não é especialista em música e sim no desenvolvimento de crianças pequenas, é responsável pela educação da criança numa perspectiva integral, evitando fragmentações curriculares, trabalhando com todas as áreas do conhecimento de maneira articulada, incluindo-se, portanto, a educação musical (VERLE; BELLOCHIO, 2009, p.106).

Nem sempre as escolas da rede pública ou da rede privada de ensino dispõem de um

profissional habilitado para desenvolver atividades musicais. Além disso, não há informação

de que todos os cursos de formação inicial de futuros pedagogos tenham também alguma

disciplina sobre metodologia da educação musical no currículo. De acordo com Pacheco

(2007),

a Educação Musical não tem recebido atenção no que se refere a sua inclusão nos currículos de formação de futuros professores pedagogos. Ainda são poucos os cursos de graduação que oferecem essa disciplina na sua matriz curricular (PACHECO, 2007, p.89).

Mesmo assim, sem esta devida atenção, Pacheco (2007) propõe ao professor

unidocente

a possibilidade de pensar e discutir como a música pode-se tornar [...] um elemento importante do processo educativo das crianças destes níveis da educação básica (PACHECO, 2007, p.95).

Para ambos os autores, o professor não-especialista pode sim contribuir com o

professor especialista nas atividades musicais nas escolas, desde que tenham condições de

fazê-lo.

De acordo com Gomes (2010), sobre o espaço de trabalho nas escolas,

a educação musical infantil tem contemplado abordagens metodológicas diversas e, apesar de ser espaço do professor unidocente, o educador musical tem encontrado lugar na instituição (GOMES, 2010, p. 815).

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331

Além da preocupação sobre o profissional que irá trabalhar nas escolas, também se

questiona quais conteúdos serão abordados e em que contexto. A educação musical não

possui um currículo obrigatório e nem a Lei 11.769/08 definiu o que deverá ser trabalhado e

abordado nas escolas. Neste sentido, Figueiredo (2008) afirma que

temos valorizado a diversidade ao invés da busca de modelos únicos para todos, compreendendo e respeitando as diferenças locais e regionais. Creio que esta é a direção que deveríamos assumir daqui para frente para o estabelecimento de orientações ou diretrizes para as escolas brasileiras. A diversidade deve ser respeitada em primeiro lugar, e isto inclui a diversidade de músicas e a diversidade de abordagens para o ensino de música (FIGUEIREDO, 2008, p.7).

Tendo o autor comentado a respeito da diversidade, é importante também que o

trabalho desenvolvido seja de qualidade para a contribuição da formação dos alunos.

Para que os alunos das escolas tenham um ensino de qualidade, é necessário que os

professores também tenham uma formação de qualidade. Para isso, pensa-se que a formação

continuada busca um aperfeiçoamento para a atuação dos profissionais para as possíveis

mudanças na educação. Para Queiroz & Marinho (2007), a formação continuada é entendida

como

um projeto contínuo, que possibilita aos professores caminhos para que, de forma coletiva e contextualizada com o universo de atuação de cada profissional, possam criar alternativas para (re)discutir, (re)definir e transformar o seu pensamento e, consequentemente, a sua prática docente (QUEIROZ; MARINHO, 2007, p.1).

Com este contexto, de formação e atuação dos professores, sentiu-se a necessidade de

pesquisar como a música está presente nas escolas de educação infantil da rede privada do

município de Pelotas – RS. Por rede privada de ensino entende-se que

É um sistema caracterizado por possuir instituições de ensino privadas, assim entendidas as mantidas e administradas por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado, conforme estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. A rede particular de ensino geralmente é mantida por recursos próprios ou através de anuidades pagas pelos alunos, englobando escolas abertas e outras de vários tipos, como as de orientação religiosa, as mantidas por sindicatos de classe ou grupos empresariais ou, ainda, as escolas cooperativas, mantidas por grupos de pais de alunos (MENEZES; SANTOS, 2002).

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Objetivos

Esta pesquisa tem por objetivo geral mapear o ensino de música nas escolas infantis

privadas e por objetivos específicos identificar quem é o profissional que trabalha com a

música nas escolas; reconhecer quais as atividades musicais que são desenvolvidas nas

escolas; e, identificar quais são as necessidades dos profissionais que trabalham com música

nas escolas.

Justificativa

Esta pesquisa se justifica porque, ao darmos continuidade às pesquisas já realizadas

e/ou em andamento pelo grupo de pesquisa Formação Docente e Educação Musical,

apresentaremos um panorama geral sobre a presença da música em parte da rede privada de

ensino de Pelotas. As pesquisas na rede privada são muito escassas fazendo com que haja a

necessidade, também, de mapear a presença da música nesta rede de ensino. Além disso,

resultará em dados que subsidiem parcerias entre a UFPel e as escolas privadas, para que

venham atender as necessidades destas escolas e de seus professores.

Metodologia

De acordo com os objetivos da pesquisa, o método utilizado foi o survey de desenho

interseccional. Para Cohen e Manion (1994),

os surveys agrupam dados em um determinado momento com a intenção de descrever a natureza das condições existentes, ou de identificar padrões com os quais essas mesmas condições existentes podem ser comparadas, ou de determinar as relações que existem entre eventos específicos (COHEN; MANION, 1994, p.83).

Como os dados desta pesquisa serão coletados em uma única vez, num determinado

período de tempo, este trabalho caracterizou-se como um survey de desenho intersecccional.

De acordo com Babbie (2005, p. 101), o survey de desenho intersecccional permite descrever

uma população maior na mesma ocasião.

Foi selecionado como unidade de análise (Babbie, 2005, p.98) o profissional que

trabalha com a música nas 97 escolas de educação infantil privadas do município de Pelotas –

RS. As 97 escolas selecionadas para esta pesquisa são escolas oficialmente regularizadas no

Conselho Municipal de Educação de Pelotas.

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Antes da coleta de dados, entraremos em contato com todas as 97 escolas para

averiguar se estão todas em funcionamento, se os endereços estão corretos e, ainda, se existe a

figura do professor de música, ou, se existe outro profissional que trabalha com a música. A

partir destes dados iniciais é que serão distribuídos os questionários auto-administrados. Para

Babbie (2005), o questionário é “um documento com perguntas e outros tipos de itens que

visam obter informações para análise” (BABBIE, 2005, p. 504). Esse instrumento parece ser

o mais adequado, pois o universo de professores a serem pesquisados é num total de 97. Para

Laville e Dionne (1999), uma das vantagens do questionário é que “permite alcançar rápida e

simultaneamente um grande número de pessoas” (LAVILLE; DIONNE,1999, p. 184).

O questionário, construído com base nos questionários elaborados Hirsch (2007),

inclui questões que fornecem dados sobre formação inicial e continuada dos professores,

tempo e áreas de atuação, atividades musicais desenvolvidas nas escolas, recursos disponíveis

para a realização das atividades musicais bem como necessidades dos professores.

Os questionários serão entregues aos professores das escolas e, juntamente com ele,

uma carta para a direção e outra carta ao professor, explicando os objetivos da pesquisa, a

necessidade da participação e a garantia da não-exposição do nome da escola e nem do

professor no trabalho. Neste documento também será incluída uma provável data de

devolução do questionário para a validação do mesmo. Após, os dados serão analisados,

principalmente, com base na literatura da área de educação musical, focalizando estudos que

investigaram a presença da música, especificamente, nas escolas de educação infantil em

diversas regiões do país.

Considerações finais

Espera-se que, com essa investigação, possamos mapear a situação do ensino de

música nas escolas de educação infantil da rede privada do município de Pelotas. Levantando

dados sobre a presença da música, mais especificamente sobre os profissionais que trabalham

com música nestas escolas, as atividades que eles desenvolvem e suas necessidades,

esperamos poder contribuir com parcerias que venham colaborar na formação continuada

desses profissionais, visando estratégias para o fortalecimento da educação musical nas

escolas.

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Referências

BABBIE, Earl. Métodos de Pesquisas de Survey. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2005. COHEN, Louis.; MANION, Lawrence. Research Methods in Education. London: Rutledge, 1994. FIGUEIREDO, Sérgio. A ABEM e o projeto nacional de música na escola. 2008. Disponível em:<http://www.jacksonsavitraz.com.br/abemco.ida.unb.br/admin/uploads/pdf/palestra_sergio_figueiredo.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2011. ______. O processo de aprovação da Lei 11.769/2008 e a obrigatoriedade da música na Educação Básica. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, 15, 2010, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: ENDIPE, 2010. GOMES, Carolina. Educação Musical para o Ensino Infantil: levantamento acerca das produções brasileiras. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 19, 2010, Goiânia. Anais... Goiânia: ABEM, 2010. p 814-821. HIRSCH, Isabel B. Música nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio: um survey com professores de arte/música de escolas estaduais da região sul do Rio Grande do Sul. Dissertação (Mestrado em música) - Instituto de Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2007. LAVILLE, Christian; DIONE, Jean. A construção do saber: manual da metodologia da pesquisa em ciências humanas. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1999. MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Dicionário Interativo da Educação Brasileira – EducaBrasil, 2002. Disponível em <http://www.educabrasil.com.br/eb/dic/dicionario.asp?id=194>. Acesso em: 26 jun. 2011. PACHECO, Eduardo. Pedacursão: uma experiência de formação em Educação Musical na pedagogia. Cadernos de Educação, FaE/PPGE/UFPel, Pelotas [29]: 89 - 104, julho/dezembro 2007. VERLE, Kelly; BELLOCHIO, Cláudia. A educação musical e o professor de educação infantil e anos iniciais: um mapeamento das produções da ABEM. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 18, 2009, Londrina. Anais... Londrina: ABEM, 2009. p.104-110 .

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Música na Escola: um musical infantil para alunos do ensino fundamental I

Gabriel Alamino Martins Iglesias [email protected]

Felipe Veiga de Lara Gomes [email protected]

Lineu Formighieri Soares [email protected]

Regina Helena Cunha Mota Maier [email protected]

Resumo: O presente trabalho relata um projeto de pesquisa em andamento, realizado por professores e alunos do curso de Educação Artística – Habilitação em Música – do Centro Universitário Adventista de Ensino, campus Engenheiro Coelho, interior de São Paulo. O grupo reúne-se há um ano, com o intuito de estudar temas ligados à criação musical. Como primeiro projeto, decidiu-se por música direcionada às crianças do Ensino Fundamental I, a ser realizado em três etapas. A primeira, foi uma apreciação do material disponível para utilização em salas de aula dessas séries. Como segunda etapa, passou-se à composição musical em si, com a criação de um enredo e canções que contam uma história através da qual são trabalhados aspectos musicais, noções de respeito à natureza e conhecimentos da fauna e flora brasileiras. A terceira fase consiste numa pesquisa de campo. O objetivo, ao término do projeto, é contribuir com o ensino de música em escolas, oferecendo opções para o dia a dia em sala de aula, bem como possibilidades de produções culturais envolvendo a escola como um todo.

Palavras chave: Música na escola, canto infantil, criação musical

1. Introdução

Com a Lei No. 11.769/2008, que complementa a LDB homologada em 1996, surge, no

Brasil, uma demanda redobrada por professores de música. Com isso, as escolas precisam

buscar profissionais que possam oferecer aos alunos uma base musical integrada a outros

conteúdos do currículo, garantindo o bom aproveitamento das aulas. Na experiência vivenciada

por este grupo como professores, regentes, alunos de música e estagiários em escolas públicas e

particulares, observa-se que parte do material utilizado na educação musical não é apropriado

para este fim. Funcionam como lampejos repentinos, apenas visando a descontração e não

utilizando a música como meio de ensinar valores e proporcionar o desenvolvimento cognitivo

do aluno em vários níveis. Segundo Dewey, é importante não haver separação entre a vida e a

educação, fomentando, assim, uma contínua reconstrução de experiências (apud CUNHA,

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2007, p. 22).

Por outro lado, levando em consideração o docente, parece ser fundamental a produção

de materiais que venham somar-se àqueles que têm dado suporte ao ensino, mantendo

princípios pedagógicos sem perder o potencial da experiência musical. O professor precisa

buscar a interação entre a vida social e a escolar, levando em consideração o discurso musical

do aluno (SWANWICK, 2003) e estimulando sua criatividade e interesse. É essencial uma

atualização constante dos materiais produzidos, pois se “hoje não se ouvem mais os mesmos

ruídos do tempo de Mozart,” é preciso “fazer a música do nosso tempo” (ZAGONEL, 1999, p.

3).

2. Etapa inicial: pesquisa

O projeto ora relatado começou em 2010, quando três alunos e dois professores de

licenciatura em música decidiram formar um grupo de estudos com o intuito de compor e

produzir material para crianças. Como primeira atividade, o grupo iniciou uma revisão do

material fonográfico direcionado às crianças e produzido no Brasil nos últimos vinte anos. Em

encontros semanais, paralelamente à pesquisa auditiva, iniciou-se a leitura de textos de

referência na área de educação musical. O foco foram os relatos de experiências e pesquisas

sobre o ensino de música escritos nos últimos dez anos. Entre as inúmeras publicações

passíveis de estudo, o grupo aprofundou-se nos textos de PENNA, 2008, ZAGONEL, 1999,

ILARI, 2006, e MATEIRO, 2008. Esse levantamento de material visava uma construção de

conhecimento daquilo que tem sido produzido no Brasil recentemente, gerando parâmetros

que delimitariam a criação musical.

Uma terceira vertente do projeto envolve, ainda, uma pesquisa de campo,

entrevistando – até o momento – vinte e dois (22) professores de música de treze estados do

país. Os entrevistados advém de distintas realidades: sala de aula e prática coral em escolas

públicas e particulares, bem como conservatórios. Os resultados da pesquisa, nestas três

frentes da primeira etapa, têm possibilitado, até agora, uma idéia parcial daquilo que está

disponível aos professores em escolas de várias partes do país. A reflexão sobre as

descobertas feitas até o momento, corroboram os objetivos iniciais do grupo, que incluem a

criação e viabilização de material que venha a acrescentar ao que atualmente é oferecido aos

professores de música. Lembrando que, por mais que tenha havido crescimento nos últimos

anos, não existe, ainda, abundancia de material musical à disposição dos professores do

ensino básico. O grupo crê que a diversidade de opções é um fator de motivação para o

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docente, que, na fartura de alternativas poderá escolher aquelas que melhor se adaptam à sua

realidade.

2. Criação: fase de composição e escrita do musical

No cronograma de trabalho do grupo, após a fase inicial, exclusivamente de pesquisas,

teve início a segunda etapa: criação de um musical infantil para os alunos do Ensino

Fundamental 1. O projeto propõe uma integração entre música, artes cênicas e artes plásticas

(criação de figurinos e cenário). Além das expressões artísticas, busca-se abranger, no

trabalho, conceitos de ética, ciência e ecologia. Não pretende-se algo que acarrete simples

entretenimento, ou apenas apreciação musical, embora estes também façam parte do conjunto

dos objetivos. O grupo tem observado que o essencial é ensinar música através do próprio

fazer musical, justificando, assim, a idéia de integrar vários conhecimentos num programa

com roteiro fechado. A prática demonstra que a possibilidade de reunir música e encenação

pode tornar o aprendizado musical mais interessante e proveitoso para os alunos.

O primeiro passo da criação foi a concepção de um argumento. A partir dele, o

trabalho dividiu-se em criação do roteiro e composição de canções que integram-se ao

mesmo. O trabalho era feito individualmente e, mais tarde, apresentado ao restante do grupo.

Assim, num primeiro momento, roteiro e composições surgiam da soma de criações

independentes. Com o texto do roteiro finalizado, o grupo – atualmente composto de dois

professores e dois alunos – iniciou uma fase de criação colaborativa, reunindo-se para compor

letra e música juntos. As canções ainda não escritas já têm temas definidos e cada

componente tem liberdade para trazer novas contribuições, as quais são desenvolvidas em

grupo.

O roteiro conta a história de uma menina da cidade – Paloma – que um dia, de repente,

encontra-se numa fazenda. Lá, é abordada por um pica-pau e um burro, que a levam para um

passeio, mostrando a realidade e as dificuldades dos animais em conseqüência de uma

queimada num canavial. No desenrolar da trama, os bichos da fazenda e os animais silvestres

passam por situações em que a união de todos e o fazer musical em conjunto ajuda-os a

vencer os problemas. Na história, a música aparece como um meio de superação e contribui

para reforçar mensagens de respeito à natureza, em geral, e às plantas e animais,

especificamente.

As canções que já foram compostas tiveram como referência a música brasileira, já

que a valorização da música de raiz – suas características regionais e os diferentes estilos

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existentes em distintos estados do Brasil – está dentro dos objetivos do grupo a longo prazo.

Além disso, as peças têm caráter poético, facilitando a memorização das letras através de

rimas, assonâncias e outros recursos literários. Tanto este, como os aspectos ligados à fauna e

flora brasileiras, podem ser trabalhados de forma interdisciplinar com os programas de

português/literatura e ciências.

3. Objetivos musicais e pedagógicos

No plano pedagógico, a intenção é que as melodias apresentem noções de percepção

de forma progressiva. Assim, nas primeiras canções aprendidas, as melodias, saltos de

intervalos, figuras rítmicas, andamento e harmonia dos instrumentos, são simples e fáceis para

que o crescimento do conhecimento musical do aluno aconteça de forma gradual. Porém, para

que não deixe de ser significativo, a proposta é que, no decorrer do aprendizado,

gradualmente os aspectos musicais se tornem mais complexos e desafiadores. Além disso, a

instrumentação de cada peça tem sido planejada no sentido de aumentar as referências

musicais dos alunos, ampliando o espectro de referencias auditivas.

A progressão na construção do conhecimento também será enriquecida com o fato de

as canções, utilizadas em sala, poderem ser reunidas em forma de musical ao final de um

período. O objetivo é que o professor explore, no dia a dia das aulas, as competências

musicais previstas nas canções, enriquecendo o ensino de cada uma delas com atividades

variadas. Ao final do ciclo – ano letivo, semestre, ou outro período definido pelo professor de

acordo com sua realidade – a montagem do musical poderá funcionar como revisão e

fechamento de todos os elementos musicais trabalhados com os alunos.

Como laboratório inicial do material criado até aqui, o grupo pretende trabalhar na

escola básica do próprio campus em Engenheiro Coelho, a partir do segundo semestre de

2011. A escola, que é particular e já trabalha com música em seu currículo há vários anos, faz

parte do trabalho de estágio dos alunos de licenciatura. Os alunos do grupo de pesquisa fazem

estágio nos 3o e 4o anos do ensino fundamental e as crianças destas classes serão as primeiras

com as quais o grupo testará as composições musicais.

Os objetivos do grupo, a médio e longo prazo, incluem a produção de material para

utilização em escolas de ensino fundamental. Durante os três primeiros anos, o objetivo é

gerar um livro ilustrado, partituras das canções e manual para o professor, bem como um

CD/DVD, este último utilizando uma escola da região – ainda a ser definida – como

laboratório de ensaios e montagem do musical.

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Referências

CUNHA, Marcus V. John Dewey: uma Filosofia para Educadores em Sala de Aula. 4ª ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2007. ILARI, Beatriz Senoi. Desenvolvimento Cognitivo-Musical no Primeiro ano de Vida. In: ________. (org). Em Busca da Mente Musical: ensaios sobre os processos cognitivos em musica – da percepção à produção. Curitiba: Editora UFPR, 2006, cap. 8. MATEIRO, Teresa da Assunção Novo. Educação Musical nas Escolas Brasileiras: Retrospectiva Histórica e Tendências Pedagógicas Atuais. Arte Online: Periódico online de Artes. Volume 2: novembro 1999/fevereiro 2000. Disponível em: <http://www.ceart.udesc.br/Revista_Arte_Online/Volumes/artteresa.htm>. Acesso em: 21 fev. 2008. PENNA, Maura. Caminhos para a conquista de espaços para a música na escolar: uma discussão em aberto. Revista da ABEM, Universidade Estadual Paraíba (UEPB), No. 19, p. 57-64, Março, 2008. SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003. ZAGONEL, Bernadete. Em Direção a um Ensino Contemporâneo de Música. Revista Ictus. Salvador, no. 1, p. 1-15, 1999.

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Ensinando a Ensinar Música: experiências de prática de ensino em uma

relação espelhada de ensino-aprendizagem

Tiago Madalozzo UFPR

[email protected]

Resumo: Neste relato procuro registrar aspectos relacionados à prática de ensino na disciplina de Metodologia do Ensino das Artes para o 3º ano do curso de Formação de Docentes em um colégio estadual de Curitiba. A partir de pesquisas teóricas e documentais, observações e questionários, construiu-se um panorama teórico, chegando-se a uma questão: o que era possível fazer para que minhas aulas fossem produtivas, já que talvez fossem os únicos momentos em que a turma teria aulas específicas de música? E quais procedimentos utilizar para “ensinar a ensinar” música, uma vez que se tratava de uma turma de professores em formação? O tema gerador do plano de ensino foi a percepção do som como matéria-prima de todo evento musical, tendo como objetivos a apresentação dos elementos sonoros e sua organização em torno da forma musical, além da ênfase na discussão de metodologias de aplicação destes conteúdos teóricos a partir de jogos musicais e da apreciação musical ativa, sempre com variado repertório (França, 2002; Joly, 2003; Palheiros e Wuytack, 1995; Schafer, 2001). Desta forma, foi possível promover a sensibilização musical dos alunos-professores em formação, mostrando novas possibilidades de ensino e de construção de planos de aula musicalmente ricos e criativos.

Palavras chave: Prática de ensino, formação de docentes, metodologias de ensino

Introdução

A disciplina de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado para o curso de Música –

Educação Musical da UFPR engloba dois semestres, o primeiro voltado à prática no Ensino

Médio, e o segundo, no Ensino Fundamental. No primeiro semestre de 2009, tive a

oportunidade de realizar o estágio com uma turma do curso de Formação de Docentes de um

colégio em Curitiba.

O início da prática foi justamente um período de questionamentos: como funciona um

curso de Formação de Docentes? O que se aprende em música neste caso, e como se aprende

a ensinar música? É suficiente o contato com a música em uma disciplina de poucas horas

dividida, teoricamente, entre as quatro áreas artísticas? E por onde começar um trabalho de

ensino de música frente a estas especificidades?

A partir de leituras iniciais e atividades práticas como observações de aula e aplicação

de questionário aos alunos, construí um panorama teórico cujos principais apontamentos estão

registrados abaixo. Isso serviu como ponto de partida para novo questionamento: frente a

várias possibilidades, o que escolher para ensinar aos futuros professores em uma curta

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unidade didática com seis aulas (meu tempo de contato com eles)? A abordagem escolhida e o

tema gerador da prática estão especificados neste relato, destacando-se ainda a curiosa relação

de simetria de condições que se estabeleceu em sala de aula, afinal, os alunos eram

professores em formação.

Apresento a seguir as principais conclusões do panorama teórico inicial e os

desdobramentos da prática, registrando questionamentos e possíveis soluções encontradas ao

longo do trabalho, tendo em vista a ideia de que aqueles breves momentos de prática

poderiam ser os únicos destinados a aulas exclusivas de música em toda a vida acadêmica da

maioria dos alunos.

Panorama Teórico

De acordo com a LDB (1996), a Formação de Docentes se dá em vários níveis;

entretanto, é admitida como formação mínima para o ensino do magistério na educação

infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental a oferecida em nível médio, na

modalidade Normal. Dessa forma, o contexto de prática de ensino descrito neste trabalho é

uma das habilitações oficiais para a formação docente.

Entre as possibilidades de trabalho destes professores em formação, a Arte, enquanto

disciplina do currículo básico do colégio, é bastante valorizada de acordo com informações

contidas no Projeto Político-Pedagógico do colégio: considera-se a escola como espaço de

formação de indivíduos com uma identidade cultural e de democratização do acesso dos

alunos às linguagens artísticas e manifestações culturais (GOVERNO, 2007).

A ementa da disciplina de Metodologia do Ensino de Artes, oferecida para o 3º ano do

curso de Formação de Docentes, é voltada para as quatro linguagens artísticas (música, teatro,

artes visuais e dança), com uma grande quantidade de conteúdos – apenas em Música, resumo

da seguinte forma: toda a história, os gêneros, as técnicas de composição e execução.

Por se tratar de uma disciplina de Metodologia, desde o início procurei dar ênfase para

a parte específica de estratégias de trabalho e prática com as linguagens artísticas, tendo a

intenção de apresentar o maior número de ideias possíveis para que os alunos pudessem

oportunamente desenvolver ainda novas ideias para seus planos de aula (tipo de trabalho

comum da disciplina).

Cabe salientar que, de acordo com dados dos questionários, nenhum dos alunos

possuía formação musical, e poucos já haviam trabalhado com música em suas aulas. Além

disso, a partir das observações constatei que a turma era bastante interessada nas estratégias

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de ensino de conteúdos de outras disciplinas, e estava bastante ansiosa para o trabalho com

Música.

Musicalização: um caminho metodológico

Há várias abordagens para o ensino da Música; contudo, a partir de experiências

pessoais anteriores em educação musical, procurei insistir na valorização da sensibilização

musical dos alunos, o que está relacionado à ideia de musicalização. Para alguns autores, a

musicalização é um processo de educação musical em que noções teóricas são ensinadas aos

alunos a partir de atividades lúdicas; portanto, toma-se o jogo musical como suporte para

transmissão de conteúdos. Isto faz sentido ao se pensar que, para o ensino infantil – o

“público” dos docentes formados no curso –, o jogo é a forma de expressão, é a atividade

fundamental da infância, conforme considera Ilza Joly (2003, p. 116): “A criança, por meio da

brincadeira, relaciona-se com o mundo que descobre a cada dia e é dessa forma que faz

música: brincando”.

A sensibilização pode começar, então, por um conceito fundamental: nas palavras de

R. Murray Schafer (2001, p. 61-62), “abrir os ouvidos” para os sons que nos cercam, pois a

partir de exercícios de “limpeza de ouvidos” é possível trabalhar as ideias de som, silêncio e

ruído. Ou seja, a partir da densa paisagem sonora que nos cerca todos os dias, é preciso

prestar atenção para aquilo que é a matéria-prima de qualquer trabalho musical: o som. Desta

forma, considerei que o tema gerador da unidade didática deveria ser baseado no

entendimento das propriedades do som, uma vez que seria lógico que um futuro trabalho

destes professores em formação tivesse uma estruturação semelhante em torno do som.

Após um trabalho minucioso com o som, seria possível discutir com a turma uma

definição de “música” enquanto organização de sons, e, a partir daí, trabalhar-se com

estruturas musicais maiores – e por isso escolhi apresentar noções de forma musical, a

alternância de momentos de tensão e relaxamento que caracteriza boa parte da música

ocidental.

Para que isso acontecesse de forma eficiente, outro conceito de grande importância é a

apreciação musical ativa, ou seja, a audição musical através de um processo de escuta não-

passiva por parte do ouvinte, conforme apresentado por Graça Boal Palheiros e Jos Wuytack

(1995, p. 9-13), em que os autores sugerem a associação de outros elementos ao ato de escuta

a fim de tornar o evento musical “palpável” ou “visível”, e dessa forma facilitar o

entendimento do conceito de forma musical.

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A Estruturação do Plano de Ensino

A fim de discutir a estratégia de ensino e a abordagem metodológica, registro abaixo o

eixo temático da unidade didática, os objetivos e os conteúdos do plano de ensino.

Eixo temático: Apreciação ativa, entendimento, compreensão e reflexões sobre a

aplicação metodológica do som como elemento que faz parte do cotidiano de todos, e é a

gênese de qualquer fazer musical.

Objetivos: 1) apresentar e estimular a compreensão e a apreciação das propriedades do

som e da forma musical; 2) fornecer referencial teórico para pesquisa dos conteúdos acima,

além de metodologias e repertórios-modelo para a sua aplicação; 3) esclarecer informações

relativas à legislação que regulamenta as especificidades do ensino da música no Brasil.

Conteúdos: 1) propriedades do som: ruído, som, silêncio, timbre, altura, intensidade,

dinâmica, duração, densidade, ritmo, melodia, música; 2) forma musical: organização dos

sons segundo o princípio básico da alternância de repetição e contraste, unidade e variedade: a

forma A B A e variações; 3) metodologias de ensino de música: canções de saudação, limpeza

de ouvidos, escala musical, apreciação musical ativa, danças, canções com gestos, cânones

rítmicos e melódicos, construção de instrumentos, imitação rítmica, canções de despedida.

Trabalhando Numa Relação Espelhada de Ensino-Aprendizagem Para a Educação Musical Infantil

Toda a experiência de ensino foi pensada para um contexto bastante específico, em

que destaco esta “relação espelhada” de ensino-aprendizagem: meus alunos eram professores

em formação. Por este motivo, procurei trabalhar a partir da abordagem da musicalização

infantil, uma vez que dizia respeito diretamente ao universo com o qual os futuros professores

trabalhariam, a educação infantil.

Quando me refiro a este abordagem, listo alguns fatores importantes que procurei

destacar: a) o trabalho em sala de aula a partir da atividade – ou seja, o fazer musical como

foco; b) as atividades construídas sempre a partir de um suporte lúdico; c) uma grande

variedade de repertório para ser usada em sala – lembrando que, concordando com uma série

de pesquisadores, a música levada para crianças pequenas não deve ser, de forma nenhuma,

música “simples” mas, pelo contrário, se deve trabalhar com muitos tipos diferentes de

música; e d) principalmente, não se deve deixar que a aula de música seja “recreação” – deve,

sim, ser muito bem estruturada em termos de objetivos e conteúdos claros, sendo estes

objetivos e conteúdos ligados a elementos musicais. Sobre este último fator: é importante que,

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no contexto da educação musical infantil, não se trabalhe com objetivos extramusicais, mas

sim, com metas muito claras de desenvolvimento e formação musical. Por este motivo é que

optei por mostrar uma possibilidade aos alunos: conteúdos relacionados às propriedades do

som, ou seja, claramente “musicais”.

Há várias formas de se trabalhar com música. Algumas insistem na teoria; outras, na

notação musical (escrita na partitura). Mas há, também, a musicalização, em que os

conhecimentos musicais devem ser trabalhados através dos exercícios práticos. Não se pode,

porém, fazer isso sem o estabelecimento de objetivos claros.

Procurei mostrar que repertórios variados são interessantes, mas um trabalho com

músicas do cancioneiro tradicional brasileiro – ou músicas diferentes que conhecemos, que

lembramos da nossa infância – é igualmente importante, pois podemos estabelecer uma

ligação clara com o universo infantil, além de eventualmente ter mais segurança a partir de

um trabalho com músicas bem conhecidas.

Tudo com que trabalhei foi discutido intensamente com os participante do curso:

desde conversas sobre a abordagem da musicalização, passando pela legislação e chegando a

experiências sobre o uso de instrumentos musicais contruídos em sala junto com as crianças.

Enfim, procurei ligar todas as propostas levadas com a realidade de sala de aula dos futuros

professores, trabalhando com exemplos musicais relevantes.

Discussão e considerações finais

Os planos de aula reuniram atividades em que não só procurei ensinar música aos

alunos, como também ensinar a ensinar tais conteúdos. Um ponto positivo do trabalho foi a

introdução de conteúdos de forma intuitiva, ou seja, chegando-se à teoria a partir da prática –

a metodologia da “sensibilização musical”. Absolutamente todos os conceitos trabalhados

foram comentados e discutidos a partir das atividades musicais, e apenas depois nomeados

teoricamente.

Optei por insistir na expressão corporal e vocal, incluindo nas aulas repertório de

conhecimento pessoal dos alunos, principalmente cantigas de roda que remetiam à sua

infância, por acreditar que teriam mais segurança ao trabalhar com repertório conhecido.

Ainda assim, procurei enfatizar a importância de uma pesquisa constante por novos

repertórios; mas as canções de domínio público pareceram ser um bom ponto de partida.

Alguns conteúdos foram modificados ou inseridos nos planos de aula ao longo da

prática, de acordo com questionamentos e demanda dos próprios alunos. A prática levou em

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conta atividades de apreciação ativa, fazer musical (a parte que é deixada um pouco de lado

nas atividades normais da disciplina) e reflexão sobre estas duas para se chegar à teoria, de

forma a contemplar a chamada “proposta triangular” de trabalho com Arte. Isso garantiu certa

coerência estrutural ao trabalho.

Como exemplo de conteúdo inserido oportunamente, destaco a noção de pulso, que

acabou permeando boa parte das atividades musicais desempenhadas pelos alunos, e também

foi um conceito apresentado a partir da prática. Outro tópico solicitado pelos alunos foi a

construção de instrumentos com materiais alternativos, que acabou originando um trabalho

avaliativo.

A notação musical não foi a ênfase do trabalho, mas houve a necessidade de se

registrar as atividades de forma não-convencional (utilizando materiais alternativos como

cartolinas e gráficos). Um ponto de grande interesse dos alunos foi minha escolha por gravar

todas as canções em sala de aula. Isso possibilitou a confecção de um CD que foi

posteriormente entregue a todos, e auxiliou no cumprimento de uma expectativa registrada

nos questionários aplicados aos alunos antes da prática: a aquisição de repertório.

A avaliação foi além da simples participação em aula: em três trabalhos, solicitei aos

alunos que pesquisassem repertórios, criassem estratégias de aplicação de conteúdos musicais

aprendidos nas aulas através de atividades lúdicas, e construíssem instrumentos também com

objetivos musicais e pedagógicos, além de estéticos. Com estes trabalhos procurei estimular a

criação de atividades de aplicação de conteúdos da disciplina de forma ativa, não se

resumindo à escrita de planos de aula, prática comum nos outros bimestres.

Experimentar fazer música acabou abrindo precedente para o ensino de conteúdos

musicais básicos, que não só foram interessantes para os alunos em sua vida acadêmica, mas

também para sua formação docente, porque a variedade de atividades que foram apresentadas

para trabalhar esses conteúdos poderá abrir caminho para a construção de planos de aula mais

criativos.

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Referências

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A Música de Casa na Aula de Música: a proposta do projeto "Música para

Bebês" da UEM

Vânia Gizele Malagutti DMU – UEM

[email protected]

Resumo: Este trabalho tem por objetivo apresentar a proposta de aulas de música para crianças de zero a cinco anos realizada no projeto de extensão “Música para Bebês”, da Universidade Estadual de Maringá. Iniciado em 2009, tem por objetivo oportunizar a iniciação musical de crianças por meio de atividades de apreciação, criação e execução musical. A ação, além de promover o contato da Universidade com a comunidade, tem oportunizado a formação de professores reflexivos, já que procura refletir sobre metodologias e fundamentos do ensino de música para crianças. O projeto utiliza como referencial teórico autores como Souza (2000) e Delgado e Müller (2005), que consideram as crianças como “atores sociais plenos”, bem como autores que discutem o desenvolvimento musical infantil, como Ilari (2006) e Beyer (2003). Dessa forma, o curso conta com uma metodologia que procura entrelaçar duas propostas: o cotidiano e o cognitivo.

Palavras chave: Educação musical, cotidiano, criança

A universidade é uma instituição social e tem como principais tarefas “o

desenvolvimento de conhecimentos, a educação e a cultura” (MARQUES, 2004, 114). Para

tanto, constrói-se a partir de um tripé indissociável: o ensino, a pesquisa e a extensão

(MARQUES, 2004). Dentro desse tripé, a extensão assume a função de oportunizar os

conhecimentos produzidos na universidade à comunidade, e, segundo Penna (2006),

oportuniza a formação de professores, uma vez que possibilita uma maior compreensão da

realidade, bem como a solução de problemas nela encontradas (PENNA, 2006, p. 41).

Com o objetivo de atender a essa prerrogativa, a Universidade Estadual de Maringá

mantém, desde 2006, o projeto de Extensão “Educação Musical, Escola e Comunidade”. O

projeto atua em frentes distintas e complementares, oferecendo aulas de música para a

comunidade (alunos da educação básica, pessoas com deficiência visual e bebês),

proporcionando cursos de formação continuada à professores da educação básica e

configurando-se em um espaço de ações pedagógico-musicais para a formação do educador

musical (FIALHO, 2009).

Dentro da proposta de extensão, é oferecido à comunidade de Maringá o curso de

“Música para Bebês”. O curso foi iniciado em 2009 atendendo crianças de zero a três anos e

nesse ano, o projeto foi estendido a crianças de até cinco anos. As aulas têm como objetivo

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estimular o fazer musical das crianças por meio do canto, movimento, criação, apreciação e

execução musical.

O projeto se justifica a partir de pesquisas como a de Ilari (2006), que considera que os

benefícios da música para as crianças vão além do desenvolvimento cognitivo. A autora

aponta que a música traz benefícios psicológicos, fisiológicos, culturais, auditivo-

educacionais e estético-musicais (ILARI, 2006). Beyer e Braga (2006), afirmam que, no caso

dos bebês, as experiências sonoras podem auxiliar o desenvolvimento da fala e do canto.

Cerca de dezesseis crianças participam do projeto, e são divididas em três turmas, de

acordo com a faixa etária. São aulas semanais, de aproximadamente 40 minutos, ministradas

por acadêmicas do terceiro e quarto ano de licenciatura em música, que trabalham em duplas

e com uma co-repetidora ao piano. Na turma de crianças de até dois anos, os pais ou

responsáveis acompanham as atividades.

Isso porque, entendemos que essa presença traz segurança às crianças, e, além disso,

possibilitam que os pais também aprendam como estimular musicalmente seus filhos. Dessa

forma, possibilita trocas de conhecimento e incentivo, que, de acordo com Bandura (1994)

citado por Cavalcanti (2009), torna as experiências das crianças mais eficazes. Como relata

uma mãe que participou do projeto no ano de 2009,

ao compartilhar o que aconteceu na aula, ao querer cantar as músicas e mostrar o que aprendeu temos um momento só nosso, de troca de olhares, toque, elogios e incentivo, ampliando nosso vínculo de mãe e filha (MALAGUTTI; GÓES, 2009, p. 6)

As bases metodológicas do projeto consideram as crianças como “atores sociais

plenos” (DELGADO; MÜLLER, 2005, p. 352). Sem a idéia do “reducionismo biológico,

substituído pelo reducionismo sociológico” (PROUT, 2004, citado por DELGADO E

MÜLLER, 2005, p. 1-2), procuramos uma interdisciplinaridade entre as áreas. Dessa forma,

as aulas estão fundamentadas dentro de uma linha da sociologia que é ouvir o cotidiano e

estar atento a ele. Isso possibilita que as aulas sejam planejadas levando em consideração,

além das especificidades de cada faixa etária (ILARI, 2006; BEYER, 2003), também as

preferências musicais das crianças e suas vivências musicais fora das aulas de música

(SOUZA, 2000).

Após dois anos de projeto, nesse ano surgiram diversos questionamentos sobre a

forma de planejar as aulas. Isso foi muito significativo pois, como corrobora Souza (2003, p.

48), “toda prática educativa tem como condição básica ser reflexiva, porque é saindo da

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349

prática, indo para a reflexão e voltando para a prática que o professor fortalece a sua ação,

renova sua competência e ganha mais segurança”.

A partir de discussões e reflexões, optamos por não utilizar uma estrutura pré-

estabelecida para as atividades, como acontecia nos anos anteriores. De acordo com as

ministrantes de 2009, a metodologia consistia em uma rotina

Essa rotina foi dividida em partes que se realizavam na seguinte seqüência: canto de entrada; expressão corporal; movimento com locomoção; movimento sem locomoção; percussão corporal; socialização; execução instrumental; relaxamento e hora da despedida. Dentre essas partes, foram inseridas criações e apreciações musicais (MALAGUTTI e GÓES, 2009, p. 7).

Essa metodologia é decorrente dos estudos de educadoras como Feres (1998) e Beyer

(2003). Decidimos por deixar como rotina apenas o “canto de entrada e a hora da despedida”,

possibilitando uma maior flexibilidade para adptar as atividades a cada turma e a cada

professor. Russell (2005), a partir da análise de uma aula de música para crianças com uma

proposta semelhante a nossa, fala sobre a função desses itens em uma aula de música

A introdução teve um valor social e musical, pois assinalou o início da aula e ajudou as crianças a ajustarem-se rapidamente às tarefas da aula de música. No decorrer da seção de conteúdo básico as crianças vivenciaram conceitos e habilidades musicais. O encerramento marcou o final da aula e também teve uma função social (RUSSELL, 2005, p. 84).

Deixando como rotina apenas o canto de entrada e a hora da despedida, optamos por

construir as aulas a partir de temas. Com um tema escolhido, criaram-se histórias para serem

contadas durante as aulas, para que, por meio da narrativa, as atividades musicais sejam

ligadas, um “senso de Gestalt ou totalidade”, evitando a fragmentação das atividades

(RUSSEL, 2006, p. 83). O primeiro tema escolhido foi “carrinhos e bonecas”, para ser

trabalhado durante quatro aulas e os objetivos estabelecidos foram a exploração de sons,

percepção, execução, apreciação e criação musical. Dessa forma, a aula é realizada de

maneira contínua, trazendo

Os planejamentos também são flexíveis no sentido de levar em consideração o

interesse demonstrado pelas crianças, possibilitando explorar ao máximo as vivências que as

mesmas trazem para as aulas de música. Nosso objetivo é que, a partir das aulas de música, as

crianças estabeleçam um vínculo com seu cotidiano, e promovam trocas entre a vivência

musical em casa e as aulas de música no projeto. Para tanto, são utilizados materiais

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diversificados, desde instrumentos musicais a sacolas plásticas, e, freqüentemente, é

solicitado aos pais que tragam materiais do cotidiano das crianças, como seus brinquedos ou

objetos, oportunizando a exploração de materiais em casa, juntamente com os pais.

Segundo Souza (2000), “ao tentar se aproximar do “mundo vivido”, o interesse da aula

de música não está nas atividades padronizadas, mas sim, nas experiências musicais que os

alunos realizam diariamente fora da escola”. (SOUZA, 2000, p. 40). Para a aproximação entre

o cotidiano das crianças e a aula de música, foram realizadas entrevistas com os pais para

investigar quais as músicas que os bebês gostam de ouvir e como é a vivência musical da

família. Esse procedimento de investigar o ambiente musical das crianças em cursos para

bebês também é verificado em trabalhos como de Broock (2008) e Beyer (2009). Para Beyer

(2009), esse diagnóstico traz reflexões acerca da forma como planejar aulas para bebês e

questionamentos acerca de qual repertório abordar nas aulas.

Considerando que é nossa a primeira experiência com aulas de música para crianças

com esse formato, ainda há muitas dúvidas e reflexões. Cada aula aplicada é refletida e

discutida para que possamos fazer aulas prazerosas e produtivas no que diz respeito ao

aprendizado musical dos alunos. Como afirma Parizzi (2006), a educação musical “deve

procurar enfatizar a estimulação da criança através de experiências musicais plenas e

prazerosas, capazes de motivá-la a levar adiante seu entusiasmo e alegria com relação à

música” (PARIZZI, p.47, 2006).

O projeto também tem sido um importante espaço para a formação de professores

reflexivos. A partir das reflexões de metodologias e mudanças na forma de planejar e

conduzir as aulas pretendemos a formação de professores que não sejam repetidores de ações

pedagógicas, mas que reflitam, questionem e experimentem novas formas de trabalhar

objetivando a qualidade de ensino. Como Libâneo (2002) recomenda, é na reflexão sobre a

sua prática que o professor adota teorias que se configuram como um marco para as melhorias

das práticas de ensino e avaliação dos resultados.

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Referências

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Trabalhando Interdisciplinarmente o Sentido da Audição: música e ciências

na educação infantil

Vitor H. R. Manzke [email protected]

Isabel B. Hirsch [email protected]

Joséti R. Manzke [email protected]

Vitor H. B. Manzke [email protected]

Resumo: Este trabalho é um relato de experiência que integra parte do curso de Formação Continuada ministrado aos professores de educação infantil da rede pública de ensino da região sul do Estado do Rio Grande do Sul. O curso é desenvolvido no âmbito da Rede Regional de Ciências promovida pelo NECIM – Núcleo de Estudos em Ciências e Matemáticas – do Campus Pelotas Visconde da Graça – CAVG/IFSul, localizado no município de Pelotas – RS. Teve por objetivo subsidiar os professores da educação infantil com metodologias alternativas para o desenvolvimento do tema “sentido da audição”. Além disso, compreender os parâmetros do som; estimular a percepção auditiva por meio de atividades musicais, criando estratégias para o desenvolvimento da percepção auditiva em sala de aula. As atividades foram desenvolvidas durante uma tarde com professores da rede de ensino público pertencentes à área de abrangência da Rede Regional. Dada a especificidade do trabalho com professores não especialistas em música, consideramos que os resultados foram satisfatórios dentro da proposta do Núcleo, que é refletir sobre as diferentes formas de trabalhar as ciências da natureza e a matemática de forma interdisciplinar utilizando-se dos mais diversos conteúdos em cada etapa da educação infantil.

Palavras chave: Educação infantil, interdisciplinaridade, música, formação de professores

Introdução

Muitos são os trabalhos que têm focado o professor não-especialista em música, como,

por exemplo, Bellochio (2002, 2007, 2008, entre outros), Figueiredo (2003, 2004, 2007, entre

outros) e Pacheco (2007). Mesmo que cada autor dê um enfoque diferente em seus contextos,

os textos revelam a necessidade que os professores dos cursos de pedagogia têm de uma

formação inicial e continuada em música para atender uma demanda que, cada vez mais, está

sendo solicitada. Pacheco, 2007 afirma que,

A área de Educação Musical vem assumindo um grau de importância nas discussões referentes à formação de professores e a relevância da Educação

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Musical nas práticas escolares das crianças das Séries Iniciais e Educação Infantil (PACHECO, 2007, p.89).

Com a instituição da obrigatoriedade da música como conteúdo do componente

curricular da educação básica, homologada pela Lei nº 11.769/08, o professor unidocente tem

um papel preponderante para que a educação musical seja desenvolvida nas escolas. De

acordo com Figueiredo (2004),

Professores especialistas (em música) e generalistas (unidocentes) poderiam ser preparados para entender a escola nas suas múltiplas perspectivas. Um profissional não substituirá o outro. É preciso que se busquem mais ações que propiciem o desenvolvimento de uma escola integrada, interdisciplinar, onde cada profissional desempenha um papel único e relevante na formação escolar (FIGUEIREDO, 2004, p.60).

Embora não seja proposta de trabalho do NECIM atuar com a educação musical, o

convite para ministrar uma oficina de percepção auditiva para integrar o curso de formação

continuada com professores da educação infantil vai ao encontro do pensamento destes

autores.

As ciências em muitos casos são vistas como única e de maior importância entre “as

ciências”. Entretanto, um olhar mais holístico sobre o tema por certo levará a uma discussão

mais ampla sobre as diversas formas de ver uma determinada realidade. O aluno em sua

individualidade deve ter a possibilidade de interpretar o conteúdo da maneira que mais lhe

interessar. A interação entre este, o aluno, e o seu cotidiano, por certo, lhe mostrará vários

caminhos para alcançar o objetivo traçado pelo professor.

Formação continuada com os professores de educação infantil

Sou acadêmico do Curso de Música – modalidade Licenciatura da Universidade

Federal de Pelotas – UFPel e este relato, especificamente, contempla o trabalho desenvolvido

com os professores da educação infantil da rede municipal da cidade do Capão do Leão-RS e

São Lourenço do Sul minha participação no curso foi realizada na sede do NECIM/CAVG/IF-

Sul no dia 02 de março de 2011. Nenhum dos professores participantes possuía algum tipo de

formação musical.

A proposta inicial do curso de formação continuada em Ciências é instigar os

participantes refletirem sobre as diferentes formas que temos de trabalhar os mais diversos

conteúdos específicos referentes às atividades desenvolvidas em cada etapa da educação

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infantil, buscando assim, formas alternativas de trabalhar temas tradicionais, desde a forma de

abordar cada tema até a escolha dos materiais didáticos a serem utilizados.

Pensei em como trabalhar música e ciências de uma forma interdisciplinar. De acordo

com Jupiassu,1976 interdisciplinaridade é, também, uma prática coletiva, onde se faz um

diálogo com outras disciplinas reconhecendo a necessidade de aprender com outras áreas do

conhecimento (JAPIASSU, 1976, p. 82).

Parte do conteúdo do Curso de Formação Continuada em Ciências para os professores

de educação infantil é trabalhar os cinco sentidos, e, fui convidado a desenvolver atividades

voltadas para o sentido da audição. Foi a primeira vez em que a música integrou o programa,

interdisciplinarmente, e, como forma de projeto piloto, foram desenvolvidas atividades

musicais, mais especificamente, com a percepção auditiva.

De acordo com a proposta do curso, organizei o conteúdo e a forma de como deveria

ser trabalhado de modo que as professoras participantes pudessem vivenciar as atividades

para que, posteriormente, viessem a desenvolvê-las em sala de aula com as crianças. Neste

relato, descreverei, além dos passos iniciais da oficina, duas das seis dinâmicas trabalhadas

com os alunos.

Primeiramente, de uma forma bastante simples, trabalhei os conceitos de som e dos

parâmetros do som, conforme Med 1996, já que nenhum dos professores tinha qualquer

conhecimento musical. Desta forma, para eles, ficou mais fácil de entender qual era minha

proposta de trabalho.

Após esta introdução com a apresentação breve dos conceitos, passei para a primeira

parte prática da proposta de trabalho, que foi a confecção de um chocalho. Optei por construir

este instrumento, não só em função de sua simplicidade de confecção e manuseio, mas

também porque apesar de ser um instrumento relativamente simples, proporciona diversas

formas de aplicabilidade em atividades lúdicas e é feito de material alternativo, sendo fácil de

encontrar. Segundo Pacheco 2007,

O trabalho com materiais alternativos propõe para os seus participantes uma atuação que implica um exercício de pesquisa e de criatividade. Tocar, fazer música com material alternativo exige que se procure, que se investigue, buscando possibilidades sonoras (PACHECO, 2007, p.92).

Para a confecção do chocalho, utilizamos garrafas PET, sendo o tamanho de cada

garrafa escolhido por cada aluno, e porções de areia e pó de brita. Normalmente trabalha-se

com grãos, porém, optei por trabalhar com areia e pó de brita pela função educativa de não

trabalhar com alimentos.

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Cada aluno confeccionou dois chocalhos, sendo um com garrafa e areia e o outro com

garrafa e pó de brita. Após cada aluno confeccionar seus dois chocalhos, iniciei a proposição

de atividades a seres trabalhadas com o a utilização do instrumento confeccionado. A primeira

atividade proposta foi à diferenciação dos parâmetros timbre, altura, intensidade e duração.

Para isso, solicitei aos participantes que, por sua conta, descobrissem as mais variadas

formas de produção de sons possíveis com os dois chocalhos e, que, junto com essas

possibilidades, fossem se familiarizando com os sons que cada forma de manuseio produzia.

Após alguns minutos de livre utilização do chocalho, propus uma atividade que

chamei de Fantoches Musicais. Esta atividade consiste em criar uma história com duração de

30 segundos, com tema de livre escolha, utilizando os chocalhos como fantoches. Para esta

atividade separei o grande grupo em duplas, e, foi dado de 10 a 15 minutos com o intuito de

que criassem e ensaiassem a história. Em cada história, além do enredo criado, deveriam ser

utilizados todos os parâmetros do som trabalhados.

Ao término do tempo dado para a criação e ensaio, cada dupla apresentou o seu

trabalho ao grande grupo. Embora tenha sido proposto que fosse uma história criada por cada

dupla, duas das duplas não se sentiram em condições de criar e solicitaram então que

representassem histórias clássicas infantis, já que durante nossa apresentação da proposta de

trabalho com os fantoches musicais, expus que o trabalho poderia ser iniciado com as crianças

através das representações das fábulas já conhecidas por elas, inclusive com a caracterização

de cada fantoche, até que as crianças se sentissem a vontade com a atividade para que então

criassem suas próprias histórias.

Após a apresentação de cada dupla, solicitei ao grande grupo que apontassem a

utilização de cada um dos parâmetros do som que estavam presentes em cada uma das

histórias apresentadas. É importante salientar que o grande grupo apontou não só os

parâmetros presentes em cada uma das histórias apresentadas, mas também apontou, sem que

fosse solicitado, os parâmetros que não foram apresentados, pois algumas duplas não

utilizaram todos os parâmetros.

Além disso, devo registrar que, talvez pela preocupação em utilizar os parâmetros do

som, todas as duplas deixaram bem marcados os momentos em que elas tinham consciência

que estavam usando algum parâmetro.

A segunda dinâmica proposta, chamada de Memória Auditiva, trata de um jogo onde

os alunos são chamados individualmente frente ao grande grupo, posicionam-se junto à mesa

onde existem dois chocalhos construídos da mesma forma, porém com materiais diferentes.

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Nesta atividade os dois eram de garrafas PET de 500 ml, porém, um continha em seu interior

areia e o outro continha pó de brita. Por serem de materiais diferentes, o resultado sonoro de

seu manuseio também era distinto. Tendo em vista essa diferença, a cada aluno que era

chamado, era dado até um minuto para que se familiarizasse com as possíveis sonoridades

emitidas por cada um dos chocalhos. Após este minuto, solicitava ao aluno que se voltasse de

costas para os chocalhos e de frente para o restante da turma, e a cada som emitido, o aluno

deveria dizer qual chocalho foi utilizado para aquele resultado sonoro. Cada chocalho foi

utilizado para produzir sons no mínimo de três formas diferentes, e cada forma era repetida no

máximo três vezes. Foi possível fazer com que todos os alunos passassem por essa

experiência, e por se tratar de um grupo pequeno, podemos fazer com que os alunos

tomassem a posição de professor e manuseassem os chocalhos para que os colegas de curso

concluíssem de qual dos dois chocalhos estava sendo produzido o som.

Conclusão

Após esta primeira investida, ainda que se tratando de um “experiência piloto”,

percebi que mais do que possível, é necessário que todas as ciências, que teimam em sustentar

suas unanimidades e individualismos, unam-se em prol dos alunos. Pois como já tratamos

acima, o objetivo que devemos atingir enquanto educadores não devem depender de uma

única e exclusiva forma de ensino-aprendisagem, devemos ofertar aos alunos os mais diversos

meios, para que então ele escolha a forma mais confortável e de fácil assimilação para

chegarmos juntos aos objetivos traçados. E uma das formas que acredito seja adequada a este

formato de ensino-aprendisagem, é a interdisciplinaridade, pois através da união dos

conhecimentos específicos de cada área, neste caso de música e ciências, foi possível

trabalhar o sentido da audição não só enquanto teoria dos cinco sentidos, mas principalmente

como forma de dar subsídios às professoras da educação infantil afim de que trabalhem em

sala de aula o estímulo a percepção auditiva.

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Referências

BELLOCHIO, C. R. A formação musical de professores da infância no ensino superior: alguns pressupostos e desafios. In: TRAVERSINI, C. et al. (Org.) Trajetórias e processos de ensinar e aprender: práticas e didáticas. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008. _____. As necessidades formativas em educação musical: um estudo na formação inicial da Pedagogia UFSM. In: X ENCONTRO REGIONAL DA ABEM SUL, 10., 2007, Blumenau. Anais... Blumenau: ABEM SUL, 2007. p. 1-8. _____. Escola - Licenciatura em Música – Pedagogia: compartilhando espaços e saberes na formação inicial de professores. Revista da ABEM, Porto Alegre, n 7, p. 41- 48, 2002. FIGUEIREDO, S. L. F. de. A pesquisa sobre a prática musical de professores generalistas no Brasil: situação atual e perspectivas para o futuro. Em Pauta, Porto Alegre, 2007. _____. A preparação musical de professores generalistas no Brasil. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, p.55-62, 2004. _____. A formação musical nos cursos de pedagogia. In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 12., 2003, Florianópolis. Anais... Porto Alegre: ABEM, 2003. Disponível em CD-ROM. JAPIASSU, Hilton. Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976. MED, Bohumil. Teoria da música. Brasília: MusiMed, 1996.

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Classe Hospitalar HUPES: educação musical em ambiente hospitalar

Luciano Medeiros de Moraes Universidade Federal da Bahia

[email protected]

Resumo: A educação musical com crianças e adolescentes em ambiente hospitalar tem como objetivo essencial, proporcionar aos alunos-pacientes o contato com o universo sonoro através das percepções auditiva, visual e tátil. Fazê-los reproduzir os sons com o corpo e ter contato com os instrumentos musicais, observando-se a maneira como se expressam individualmente e coletivamente pela música. Contribuir à promoção do desenvolvimento cognitivo e psíquico desses pacientes hospitalizados e/ou portadores de doenças crônicas, afastadas das rotinas acadêmicas de ensino-aprendizagem, sendo possível, ainda, o uso da música como uma ferramenta terapêutica que controla a ansiedade e o estresse.

Palavras chave: Classe hospitalar; educação musical; terapia musical; aluno-paciente

FIGURA 11 - Acervo do Autor FIGURA 2

A Classe Hospitalar é uma modalidade de atendimento escolar prestada às crianças e

adolescentes internados em hospitais. É oficialmente reconhecida pelo MEC e estimulada

pelas políticas de humanização do SUS. Existem aproximadamente treze Classes Hospitalares

na cidade do Salvador, mas nem todas possuem professor de música especializado na área. No

Hospital das Clínicas a educação musical já está presente há dois anos.

Os alunos da UFBA, bolsistas do PROAE - Programa Permanecer, são beneficiados

em seus currículos pela proposta da Educação Musical em Classe Hospitalar. Aos

alunos/professores é dada a oportunidade de compreender a docência como um exercício

desafiador de flexibilidade de métodos e técnicas pedagógicas que caracterizam o ambiente

no qual estão inseridos.

1 Fig.1 e 2 - O professor orienta sobre as particularidades de cada instrumento musical, escolhe um ritmo e uma canção para ser executada junto com os alunos. Nesse contexto, o papel da música é atuar como uma ferramenta que educa, diverte e possibilita de modo terapêutico a melhora da saúde física e mental dos alunos-pacientes.

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O trabalho didático de escolarização no Hospital das Clínicas (HUPES) com crianças

internadas tem de ser bastante adaptado, por isso o professor de uma classe hospitalar deve

interar-se de tudo um pouco: de jogos recreativos; de música, de artes plásticas; de contação

de histórias, de dramatizações, de material audiovisual, de brinquedos educativos, da internet,

de jogos eletrônicos, de passeios, de muito recurso lúdico e de tudo mais que sua criatividade

e flexibilidade sugerirem.

Nesse contexto e de acordo com as referências curriculares da educação brasileira, a

musicalização infantil torna-se obrigatória, possibilitando de maneira privilegiada uma

atuação como área do conhecimento que desenvolve o psíquico e o cognitivo. A música

também age de modo terapêutico, na medida em que diminui o estresse ocasionado pela

condição de hospitalização.

FIGURA 32 FIGURA 4

A vivência musical em ambiente hospitalar torna-se imprescindível, na medida em que

esta possibilita a inserção de momentos de entretenimento, ludicidade e descontração, em

busca de melhorar e amenizar sensivelmente as condições físicas e psíquicas do aluno-

paciente. A intenção é ainda fazer a música atuar como “antídoto” de efeito positivo e

terapêutico que reverbera na saúde do corpo e do espírito, considerando-se, também, que cada

elemento que constitui a música possa está despertando de maneira particular ou generalizada

sob o indivíduo, desenvolvendo, portanto, sua psicomotricidade, sensibilidade e/ou cognição.

A aprendizagem musical é garantida oportunamente com exercícios e atividades

pedagógicas adequadas à realidade do ambiente hospitalar, levando-se em consideração a

condição de cada paciente e sua enfermidade. O nosso intuito é também promover o bem-

2 Fig. 3 e 4 - A música como objeto de integração social, realizando o encontro com o próximo, fortalecendo os laços de amizade e afetividade.

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estar do paciente, diminuir o estresse e a ansiedade, buscando aliviar a dor e

consequentemente fazê-lo reagir aos estímulos causados pela música.

Práticas pedagógicas que possibilitem a expressão individual e coletiva devem ser

estimuladas como: a percepção dos sons ao nosso redor, o ritmo do corpo coordenado, a

interpretação musical, o contato com os instrumentos musicais e a audição de repertório

variado. O papel do professor é reinventar maneiras de ensinar a música, observando as

reações comportamentais dos alunos-pacientes através dos exercícios propostos.

FIGURA 53

Nesse contexto, o papel responsável do professor enquanto agente transmissor e

transformador é o de ter a capacidade de enxergar no outro as possibilidades de sempre

assimilar algo. Aprender primordialmente é entender que aquilo existe saber fazer e entender

será num outro momento. Por isso, a música existe, deve-se agora despertar o interesse em

conhecê-la, saber da dimensão dela e da sua influência em nossos comportamentos, deixá-la

tocar no corpo e no espírito - envolvendo nossos pensamentos e sentimentos - fluindo por

vibrações sonoras revitalizantes.

3 Fig. 5 - A música tem a capacidade de adentrar ambientes nem sempre convencionais, entretanto torna-se necessária a sua presença para alimentar nossas esperanças.

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Referências

ALVIM, Neide; BERGOLD, Leila; Cabral, Ivone. O lugar da música no espaço do cuidado terapêutico: sensibilizando enfermeiros com a dinâmica musical. Texto e Contexto Enferm. Florianópolis, 2006. p. 262-269. CARMO, Rosângela; CUNHA, Eudes. Educação musical em ambiente hospitalar: uma experiência no município de Salvador. IX Encontro Regional da ABEM Nordeste. Anais... Junho/2010. Rio Grande do Norte. CARVALHO, Ana Maria; VALLADARES, Ana Claudia. A arteterapia e o desenvolvimento do comportamento no contexto da hospitalização. Revista Esc. de Enfermagem – USP. São Paulo, 2006. p.350-355, 2006. FONSCECA, Eneida. Atendimento escolar no ambiente hospitalar. São Paulo: Menon, 2003. MATOS, Elizete. Escolarização hospitalar: educação e saúde de mãos dadas para humanizar. Rio de Janeiro. Petrópolis, 2003. MOTTA , Maria; RAVELLI, Ana Paula. O lúdico e o desenvolvimento infantil: um enfoque na música e no cuidado de enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem – REBEN. Brasil, p. 611-613, 2005. RUUD, Even. Caminhos da musicoterapia. Tradução Vera Wrobel. São Paulo: Summus, 1990. SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003.

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Musicalização Infantil da UFPB: primeiros passos

Andréa Matias Queiroz Universidade Federal da Paraíba

[email protected]

Samara Rodrigues de Oliveira Universidade Federal da Paraíba [email protected]

Caroline Brendel Pacheco Universidade Federal da Paraíba

[email protected]

Resumo: Este artigo trata-se de um relato de experiência que tem como objetivo além de promover uma breve reflexão acerca da musicalização infantil, descrever a experiência do ensino de música para crianças de zero a seis anos promovido pelo do Grupo de Estudos de Educação Musical Infantil da Universidade Federal da Paraíba – UFPB. A primeira parte deste trabalho traz um relato das aulas. Posteriormente são apresentadas algumas discussões acerca da literatura referente a musicalização infantil e, por fim, serão apontados os próximos passos da musicalização infantil na cidade de João Pessoa – PB, bem como as suas implicações para a educação musical.

Palavras chave: Musicalização infantil, desenvolvimento infantil, musicalização na UFPB

Introdução

O presente trabalho aborda a nossa experiência no Grupo de Estudos de Educação

Musical Infantil da Universidade Federal da Paraíba, que teve início no ano de 2010 sob a

coordenação da professora Ms. Caroline Pacheco. Trazemos aqui, além da reflexão sobre

nossas experiências no decorrer das aulas, uma breve discussão acerca do ensino de música

para crianças de zero a seis anos de idade.

Refletir acerca da importância do ensino de música para as crianças é de suma

importância, pois como apontam alguns estudos existentes na área (FREIRE; PRESTES;

PORTO, 2007; PARIZZI, 2006; GONÇALVES, 2004; FERREIRA, 2010; ILARI, 2009) as

crianças possuem um grande potencial para desenvolver musicalmente, que deve ser

estimulado desde cedo, beneficiando também o desenvolvimento geral da criança. Nesse

sentido, Freire, Prestes e Porto (2007) explicam que,

A musicalização tem como objetivos oferecer a crianças de zero a cinco anos e suas famílias uma experiência musical significativa que sirva como elemento enriquecedor para o desenvolvimento da criança. Os aspectos afetivo, social, psicomotor e cognitivo são valorizados como os alicerces do

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processo de construção do conhecimento musical (FREIRE; PRESTES; PORTO, 2007, p. 04).

Deste modo, as aulas oferecidas para as crianças na Musicalização Infantil da UFPB

buscaram proporcionar uma vivência musical bastante rica e proveitosa não só para as

crianças da comunidade, mas igualmente aos seus pais e/ou cuidadores que também

participaram das atividades.

A seguir apresentamos um relato das atividades e do contexto em que aconteceram as

primeiras aulas de musicalização infantil, uma breve reflexão acerca de alguns estudos

realizados a musicalização e as crianças pequenas, e posteriormente, as implicações para a

educação musical, especialmente no contexto da cidade de João Pessoa/ PB.

As Aulas de Musicalização Infantil

A proposta de dar aulas de música para crianças surgiu da necessidade de se criar um

ambiente que abordasse a musicalização para crianças de zero a seis anos, tendo em vista que

as escolas de música da cidade de João Pessoa oferecem aulas apenas para crianças a partir

dos sete anos.

O projeto de Musicalização Infantil da UFPB teve início, no ano de 2010, como um

grupo de estudo coordenado por uma professora especialista na área e constituído por alunos

do curso de Licenciatura em Música da UFPB, uma professora de música da rede básica de

ensino da cidade João Pessoa e colaboradores.

Nos encontros semanais efetuados pelo grupo eram realizadas diversas leituras,

reflexões, discussões e também atividades práticas sempre direcionadas à educação musical

infantil. Além dos encontros semanais, o grupo realizou quatro aulas abertas de musicalização

infantil para a comunidade. Essas aulas iniciais funcionaram como um meio de praticar

nossos conhecimentos adquiridos durante os encontros semanais, além de beneficiar a

comunidade com a socialização desses conhecimentos adquiridos.

As duas primeiras aulas fizeram parte da programação da I Semana de Ciências,

Tecnologia, Esporte, Arte e Cultura – SECITEAC, evento interno realizado anualmente na

UFPB. Como as atividades programadas eram aulas abertas, não foi necessário realizar

inscrições prévias. As crianças que chegavam eram divididas de acordo com a faixa etária e

participaram de aulas com cerca de 40/50 minutos de duração.

As atividades e canções eram diferenciadas para cada turma. Os bebês estavam

acompanhados de seus pais ou cuidadores, pois, como explica Parizzi (2006), eles são

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fundamentais nesse processo de aprendizagem. Segundo a autora a forma como articulam

com os filhos é um modelo de predisposição inconsciente, ou seja, ao se dirigir às crianças, os

pais se comunicam de uma maneira diferenciada, utilizando distintos timbres, alturas,

contornos melódicos, mudanças de intensidade e padrões rítmicos, que serão os primeiros

estímulos musicais na vida delas. Já as crianças maiores participaram da roda de atividades

sozinhas, mas sob o olhar atento dos pais e também de outras pessoas da comunidade que

vieram para conhecer esta nova atividade, ainda pouco divulgada no estado da Paraíba.

O Que a Literatura Nos Diz Sobre a Musicalização

Alguns estudos da neurociência apontam para a infância como um período favorável

para o desenvolvimento do cérebro (KOTULAK, 1997 apud ILARI, 2003; CARDOSO;

SABATINI, 2000). Do nascimento aos 10 anos de idade, o cérebro da criança está em pleno

desenvolvimento e apresenta as melhores condições de aprendizado (ILARI, 2003).

Alguns autores (CARDOSO; SABATINI, 2000; ILARI, 2002; 2003; 2009) sugerem

que a música pode ser um estímulo importante para o desenvolvimento cerebral da criança.

Para isso, se faz necessário um ambiente bastante estimulante, onde a criança possa vir a ter

um desenvolvimento satisfatório.

A educação de crianças em um ambiente sensorialmente enriquecedor desde a mais tenra idade pode ter um impacto sobre suas capacidades cognitivas e de memória futuras. A presença de cor, música, sensações, [...] variedade de interação com colegas e parentes das mais variedades idades, exercícios corporais e mentais podem ser benéficos (desde que não sejam excessivos) (CARDOSO; SABBATINI, 2000).

Antes mesmo de nascer, os bebês têm contato com diversos sons presentes no útero

materno, como explica Soares (2008) “desde a vida intra-uterina, o bebê é cercado por um

ambiente sonoro, convive tanto com ruídos externos quanto com os sons interiores causados

pelo funcionamento do corpo da mãe e pela sua voz” (SOARES, 2008, p.80). Ilari (2003)

acrescenta ainda que, após o nascimento,

O hábito de cantar e dançar com bebês e crianças, presente em praticamente todas as culturas do mundo, auxilia no aprendizado musical, no desenvolvimento da afetividade e socialização, e também no progresso da aquisição da linguagem (ILARI, 2003, p. 14).

Quando o bebê nasce, essa relação sonora se amplia. Os sons percebidos com

limitadas ações motoras passam a ser reagidos. Eles também passam a responder aos

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estímulos musicais por meio de movimentos corporais e de algum tipo de produção sonora.

Em seu estudo sobre os balbucios musicais, Beyer (2005) explica que, “a exploração sonora

do bebê contempla todos os parâmetros sonoros, mas que vai variar conforme o contexto

sonoro-musical em que o bebê está inserido” (BEYER, 2005, p. 101).

Deste modo, apesar de ainda haver quem pense no bebê apenas como um ouvinte

passivo, as reflexões a respeito da musicalização para crianças já existentes na área, nos

mostram que elas também são capazes de reagir e responder aos estímulos sonoros (ILARI,

2002).

O trabalho com os sons nesta idade é fundamental, pois a criança explora várias

capacidades musicais, estimulando seu desenvolvimento musical e geral. Logo, a

musicalização de crianças de zero a três anos tem o objetivo de trabalhar com a música

desenvolvendo competências como ouvir, perceber, discernir e interagir com diferentes

universos sonoros. Com as crianças de quatro a seis anos os objetivos a serem explorados são

basicamente os mesmos, embora sejam trabalhados de forma mais aprofundada. Nesse

sentido, Penna (2008) acrescenta que,

Musicalizar é desenvolver os instrumentos de percepção necessários para que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la, recebendo o material sonoro/musical como significativo. Pois nada é significativo no vazio, mas apenas quando relacionado e articulado ao quadro das experiências acumuladas, quando compatível com os esquemas de percepção desenvolvidos (PENNA, 2008, p.31).

Alguns estudos confirmam que a musicalização infantil é importante para a formação

das crianças, pois ela desenvolve aspectos sociais, afetivos, psicomotores e cognitivos

(ILARI, 2002; GONÇALVES, 2004; FERREIRA, 2010). Gonçalves (2004) ainda comenta

que, “as atividades físicas realizadas nessa faixa etária resultam em maior domínio do corpo,

desenvolvendo a força, a resistência, a flexibilidade, a destreza e a autonomia”

(GONÇALVES, 2004, p. 34).

Assim sendo, a prática musical nesta fase é essencial para o processo do

desenvolvimento infantil, pois permite que as crianças experimentem e vivenciem a música,

as atividades realizadas na musicalização infantil fazem com que elas passem a explorar e

desenvolver o seu universo sonoro.

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Implicações Para a Educação Musical: como seguiremos aqui em João Pessoa

Os estudos e as atividades extensionistas ligadas a musicalização infantil vêm sendo

desenvolvidos em algumas universidades do Brasil - como UFPR, UFBA, UNB, UFRGS,

entre outras - mas, pelo que se tem notícia, ainda não existia nenhuma proposta semelhante no

estado da Paraíba.

Os motivos que levaram à criação do grupo de Musicalização Infantil da UFPB foram

o interesse de seus participantes na área de educação musical infantil, assim como a ausência

de projetos e/ou escolas que ofereçam atividades musicais para essa faixa etária na cidade de

João Pessoa. Embora o ensino de música para crianças pequenas seja de fundamental

importância para o desenvolvimento infantil, as principais escolas de música da cidade só

oferecem musicalização para crianças a partir de sete anos de idade.

Este trabalho teve como objetivo relatar a nossos primeiros passos com a

musicalização infantil. Acreditamos que a iniciativa de realizar aulas abertas foi de grande

importância, pois além de beneficiar as crianças da comunidade, nos deu a oportunidade de

vivenciar o nosso aprendizado obtido ao longo dos encontros do Grupo de Estudos de

Educação Musical Infantil. A partir dessa experiência, pudemos observar como as atividades

acontecem realmente, pois é também na prática, com todas as particularidades existentes e até

mesmo com a risada e o choro de cada criança, que vemos de fato, como é gratificante e

proveitoso participar da atividade.

Recentemente o nosso grupo tornou-se projeto de extensão universitária

(FLUEX/PROBEX), com o propósito de ampliar a oferta de atividades de musicalização

infantil para a comunidade pessoense e contribuir para a formação profissional dos alunos da

UFPB. Como parte desse projeto, ofereceremos a partir do mês de agosto, aulas semanais de

musicalização para as crianças de zero a seis anos de idade.

Portanto, além de oferecer musicalização para bebês e crianças da nossa comunidade e

colaborar para o desenvolvimento musical infantil, o projeto contribui como um laboratório

para formação de educadores musicais especializados no atendimento à infância.

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Referências

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Música na Educação Infantil: um mapeamento das práticas pedagógico-

musicais da rede municipal de ensino de Belo Horizonte

Rosa Maria Ribeiro UFMG

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Resumo: Na observância da lei de inclusão da música no currículo das escolas do nosso país e com a conseqüente necessidade de se construir propostas de educação musical adequadas a realidade brasileira, torna-se imprescindível esclarecer a real situação do ensino da música na escola regular. Diante deste contexto, esta pesquisa visa mapear o ensino de música nas Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI’s) da Rede Municipal de Educação da Prefeitura de Belo Horizonte/MG. Para isso, serão delineados os perfis dos professores que ministram atividades musicais nas UMEIs; será analisado o status da música utilizada como componente dos currículos escolares; serão identificados os tipos de atividades musicais desenvolvidas e os recursos disponíveis para a realização dessas atividades; serão levantadas as necessidades dos professores para desenvolver o ensino de musica na educação infantil. A metodologia utilizada é o survey, sendo que os dados serão coletados por meio de questionário junto aos professores das Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI).

Palavras chave: Educação musical, educação infantil, formação de professores

Introdução

Educadores musicais têm manifestado sua preocupação com a observância da Lei

Diretrizes e Base da Educação Nacional nº 9394/96, da Lei nº 11.769/08 de inclusão da

música no currículo das escolas do nosso país e com a construção significativa de uma

educação musical adequada à realidade brasileira e às necessidades e características do aluno.

Na LDBEN de 1996, a educação infantil, recebeu destaque inexistente nas legislações

anteriores, sendo tratada como primeira etapa da educação básica, com finalidade de

desenvolver de forma integral a criança até os seis anos de idade, em seus aspectos físico,

psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Em agosto de 2008, a Lei nº 11.769 veio acrescentar a obrigatoriedade do ensino de

música na educação básica. Visando assegurar o cumprimento dessa Lei, a Fundação

Nacional de Artes (Funarte) tem firmado parceria entre o Ministério da Cultura e o Ministério

da Educação e está organizando encontros regionais com acadêmicos, especialistas,

Secretarias de Educação e Associações de Estudos Musicais para realizar mapeamentos do

ensino de Música nos estados brasileiros.1

1 Revista Nova Escola. Disponível em (http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/legislacao/musica-sera-conteudo-obrigatorio-educacao-basica-541248.shtml) acessado no dia 27 de abril de 2010.

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Conjuntamente, a Prefeitura de Belo Horizonte tem promovido reuniões com o intuito

de discutir a política educacional expressa na rede de ensino, bem como examinar as possíveis

marcas que revelem a postura da instituição diante da prática musical nas escolas e político-

pedagógicas entre os docentes desde a sua obrigatoriedade. Nessa intenção, em 2009,

elaborou-se um documento que apresenta as Proposição Curriculares para a Educação Infantil

em que o ensino de música foi contemplado. Para efeito de organização didática, esse

documento apresenta a Natureza, Sociedade e Cultura e o Brincar como eixos estruturadores

em torno das quais as sete linguagens2 se desenvolvem e, estas não se apresentam

fragmentadas nem isoladas, mas, na prática, se interligam e se complementam.

Apesar da existência das Proposições Curriculares, a Rede Publica de Belo Horizonte

não dispõe de dados mais abrangentes sobre a prática do ensino de música nos diferentes

níveis da educação básica. Diante deste contexto, surgiram as seguintes questões para

delineamento desta pesquisa: qual a real situação do ensino de música na Unidade Municipal

de Educação Infantil (UMEI’s) de Belo Horizonte? Como a música está presente? Quais são

as necessidades para desenvolver o ensino de música? As condições de trabalho são

favoráveis? Os profissionais sentem-se capazes de atuar frente à realidade encontrada nas

escolas? Os professores têm formação específica para lecionar esta área do conhecimento?

Como capacitar os professores generalistas3 a atuarem de maneira eficaz no ensino de

música?

2 Linguagens: Artes plásticas visuais; Corporal; Digital; Escrita; Musical; Matemática e Oral) 3 Com formação em curso Normal (Nível Médio) e/ou com nível superior em Pedagogia (Graduação)

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FIGURA 1 – UMEI BH / MG

Justificativa

É incontestável a influência da música no desenvolvimento da criança, confirmada por

inúmeras pesquisas desenvolvidas em diferentes países e épocas, particularmente nas décadas

finais do século XX e, principalmente, no Brasil no início do século XXI (CARNEIRO &

PARIZZI, 2011; PARIZZI, 2010, 2009; CARNEIRO, 2006; BEYER, 2005, 2003a, 2001a,

2001b; MARINO, 2005; FIGUEIREDO & SCHMIDT, 2005; ARROYO, 2004; DEL BEN,

2003; BRITO, 2003; PENNA, 2002a; SOUZA ET AL, 2002; ARAUJO, 2001)

Para implementar um retorno consciente e consistente do ensino de música, torna-se

imprescindível o esclarecimento das questões relativas à real situação da escola regular na

atualidade. Esse mapeamento é, pois, de grande interesse para diversas vertentes que

discutem, analisam e pesquisam questões relativas à fundamentação para o ensino de música

na educação infantil, formação do professor para esse segmento da educação básica, práticas

pedagógicas e alternativas metodológicas adequadas para a atuação do profissional em

consonância com a realidade social.

FIGURA 2 – UMEI BH / MG

Objetivos

Geral

Mapear a situação do ensino de música no contexto das Unidades Municipais de

Educação Infantil (UMEI) da Rede Municipal de Educação da Prefeitura de Belo

Horizonte/MG.

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Específicos

• Identificar quem são os professores que atuam na área, sua formação e suas

demandas em relação à sua atuação;

• Analisar o status da música como componente dos currículos escolares;

• Levantar as atividades musicais predominantes;

• Identificar os recursos disponíveis nas escolas para a realização das aulas de

música.

Metodologia

• A metodologia escolhida é o survey que busca coletar dados sobre populações

amplas, visando descrever e compreender uma determinada situação social, verificando

condições existentes, bem como fazendo comparação de condições para resolver um

problema prático (BABBIE, 2005).

• Núcleo fornecedor de informações: o educador que atua nas 57 unidades

municipais de educação infantil (UMEI’s ) das 7 regionais da Rede Municipal de Educação;

• Tamanho da amostra: 292 professores. Este número foi determinado por meio

de um estudo estatístico que considerou para o calculo o número total de 1.202 professores;

• Os dados serão coletados por meio de questionários com questões fechadas e

abertas, respondidos por 292 educadores infantis;

• Está sendo realizado um levantamento bibliográfico com uma maior atenção à

análise conjunta de estudos semelhantes já realizados em outros estados do Brasil.

• Após a coleta, será feita a análise, interpretação dos dados, consubstanciados

pela fundamentação teórica estudada.

Resultados Esperados:

Espera-se que esta pesquisa possa identificar “onde acontece”, “como acontece”,

“quem faz acontecer” a educação musical infantil na rede municipal de educação em Belo

Horizonte. Assim, haverá maior segurança, clareza e delineamento na orientação dos caminhos

a seguir para construção de práticas pedagógico-musicais eficazes voltadas para essa faixa

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etária. Este fato trará contribuições para a formação e ações de cada um dos educadores,

considerando os processos indissociáveis do cuidar e educar de cada criança4.

FIGURA 3 – UMEI BH / MG

4 Proposições Curriculares Educação Infantil:<http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=por tlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=educacao&tax=8489&lang=pt_BR&pg=5564&taxp=0&>.

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