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ANAIS

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PROGRAMAÇÃO

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FICHA CATALOGRÁFICA

Obs. Os conteúdos e a forma dos textos são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

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COMISSÃO ORGANIZADORA Cecília Maria Ghedini - UNIOESTE Francisco Beltrão - Coordenadora do Evento

Carla Cattelan - UNIOESTE - Francisco Beltrão

Carlos Antônio Bonamigo - UNIOESTE - Francisco Beltrão

Franciele Soares dos Santos - UNIOESTE - Francisco Beltrão

João Paulo Danieli – UTFPR – Francisco Beltrão

Marciane Maria Mendes – UFFS - Campus Laranjeiras do Sul – PR

Rosane Berté - UNIOESTE - Francisco Beltrão

EQUIPE DE APOIO

Ana Mariéli dos Santos Luedke (Colaborador)

Angelita Cristine dos Santos (Colaborador)

Carlos Narciso Bridi (Colaborador)

Claudiney de Oliveira (Colaborador)

Daiane Peluso (Colaborador)

Elaine Fabiane Gaiovicz (Colaborador)

Elenice Fernandes de Aguiar de Lima (Colaborador)

Fabiane Zanini dos Santos (Colaborador)

Francieli Pontes Bordignon (Colaborador)

Gian Carlos Foss (Colaborador)

Indianara Presotto Grzeca (Colaborador)

Jaíne Franzen Dalsotto (Colaborador)

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João Maria Rodrigues da Silva (Colaborador)

Keissiane Mechelotti Geittenes de Avila (Colaborador)

Maiara Tibola (Colaborador)

Marcia Educarda Kielba (Colaborador)

Marinez da Silva Mazzochin (Colaborador)

Nubia Andrade da Silva (Colaborador)

Raquel Antunes da Silva (Colaborador)

Rosangela Fernanda Fogues (Colaborador)

Shirley Manera Balastrelli (Colaborador)

Tauãn Medino Gomes da Silva e Sá (Colaborador)

COMISSÃO CIENTÍFICA – AVALIAÇÃO

DOS TRABALHOS

André Paulo Castanha

Ângela Maria Silveira Portelinha

Carla Cattelan

Carlos Antônio Bonamigo

Cecilia Maria Ghedini

Clésio Acilino Antonio

Franciele Soares dos Santos

Karin Cozer de Campos

Sueli Ribeiro Comar

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APRESENTAÇÃO

O I Encontro Nacional das Escolas Públicas do Campo: Formação Humana e

Conhecimento Escolar – I ENEPUC - foi promovido e organizado pelo Grupo de Estudos em

Formação Humana, Educação e Movimentos Sociais Populares – GEFHEMP da Universidade

Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE - Campus de Francisco Beltrão e realizou-se nos dias 27

e 28 de novembro de 2018. I INEPUC objetivou oportunizar a socialização de experiências em

curso nas Escolas Públicas do Campo, advindas de diversos Projetos de Extensão assim como de

Secretarias Municipais de Educação e outras organizações. Buscou também articular os educadores

que atuam nestas escolas criando um espaço coletivo de formação continuada, possibilitando um

espaço de diálogo sobre a Educação do Campo e as Escolas Públicas do Campo, tendo em vista a

necessidade de novas formas de ação a fim de enfrentar a ofensiva de fechamento destas escolas,

em curso no país.

Além disso, o I Encontro Nacional das Escolas Públicas do Campo teve como propósitos:

construir espaços de discussão sobre as Escolas Públicas do/no Campo na relação com a Educação

do Campo e a concretização da legislação conquistada nos últimos anos; socializar e articular

referências e experiências de processos em curso nas Escolas Públicas do Campo sistematizando

bases de conteúdo e forma à modalidade educacional da Educação do Campo e incentivando a

pesquisa sobre estas temáticas; fomentar a necessidade da formação permanente e continuada de

professores despertando para o aporte da Rede de Formação de Educadores e possibilitar encontros

e trocas entre sujeitos e processos, universidade, escolas e Movimentos Sociais de modo a fortalecer

diálogos e compromissos com a Escola Pública do Campo enquanto espaço e oportunidade de

formação humana e transformação social.

O I Encontro Nacional das Escolas Públicas do Campo: Formação Humana e

Conhecimento Escolar – I ENEPUC teve mais de cinquenta trabalhos científicos submetidos em

diferentes eixos temáticos: Escolas Públicas do Campo, práticas pedagógicas e processos coletivos

e iniciativas estudantis; Escolas Públicas do Campo, Níveis de Ensino e Políticas Públicas; Escolas

Públicas do Campo e Formação de Professores; Escolas Públicas do Campo Gestão, Instâncias

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Colegiadas e Espaços da Comunidade; Educação do Campo, Trabalho, Agricultura

familiar/camponesa e Agroecologia; Educação do Campo e Historiografia das Instituições

Escolares; Movimentos Sociais Populares e a Formação dos Trabalhadores; A Educação do Campo,

suas Diversidades e Organização Social. Foram mais de duzentos participantes, distribuídos em

todas as atividades do Evento, incluindo palestras/conferências, mesa redonda, rodas de conversas,

apresentação de trabalhos, exposições das histórias das instituições escolares do campo, mística,

apresentações culturais e deliberações.

Ao apresentar estes Anais do I ENEPUC, desejamos que as possibilidades de diálogos e

debates que surgiram neste encontro se multipliquem com as leituras dos trabalhos, distribuídos

entre os Trabalhos Completos e Resumos/Relatos de Experiência. Trata-se de um rico material que

pode ser objeto de estudo e aprofundamento nas instituições escolares do campo de nossa região.

Inúmeras conquistas foram relatadas e discutidas, neste ENEPUC, na luta pela manutenção

e construção das Escolas Públicas do Campo, contra o fechamento destas Escolas, pela defesa da

agricultura camponesa, de sua identidade sociocultural, das práticas produtivas da agroecologia e de

todas as práticas educativas construídas em cada escola do campo no Sudoeste do Paraná e em

tantas outras experiências espalhadas por todo o Brasil. Destaca-se, nesse sentido, a aprovação na

Plenária Final do Encontro, do “Manifesto do I ENEPUC”, abaixo publicado, para orientar as

estratégias de enfrentamento e de luta pela construção das escolas públicas do campo para os

próximos dois anos, até a realização do próximo Encontro.

Esperamos que todos/as os/as participantes deste I ENEPUC se engajem cada vez mais

nesta temática e multiplique as ações em defesa das Escolas Públicas do Campo. Por isso,

agradecemos a todos/as os/as participantes, aos pareceristas, à equipe de apoio que garantiu a

realização de todas as tarefas do Encontro. Contamos com todos/as para próximo ENEPUC a ser

realizado em 2020!!!

Boas leituras!

Francisco Beltrão-PR, dezembro de 2018.

Comissão Organizadora.

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MANIFESTO DO I ENCONTRO NACIONAL DAS ESCOLAS

PÚBLICAS DO CAMPO: FORMAÇÃO HUMANA E

CONHECIMENTO ESCOLAR

Nos dias 27 e 28 do mês de novembro de 2018, as 28 Escolas Públicas do Campo e sete instituições

educativas reunidas no I ENEPUC, vêm manifestar-se por meio desta Carta e assumir o processo de

fortalecimento das Escolas Públicas do Campo para os próximos dois anos, com as seguintes

afirmações, metas e ações:

Afirmações:

1. O primeiro fundamento a ser seguido no processo de fortalecimento das Escolas Públicas do

Campo é “não tirar a criança e o jovem do campo”, do lugar onde vive para que possa

estudar. Isso significa garantir o direito já estabelecido em lei de estudar próximo ao lugar

onde vive. Constitui-se, assim, numa tarefa urgente a potencialização e a construção de

caminhos de fortalecimento e resistência ao fechamento das Escolas Públicas do Campo.

2. A escola do campo deve garantir o direito ao conhecimento científico, o direito a uma

estrutura adequada para dar conta da apropriação deste conhecimento e das ferramentas de

ensino e estudo que promovam a leitura da realidade, a fim de conhecê-la e articulá-la ao

conhecimento escolar, construindo uma leitura do mundo.

3. É uma ação vital, nos municípios e comunidades, a aproximação efetiva e o avanço em

ações concretas como o transporte escolar e a relação entre níveis, etapas e turmas das

escolas da rede estadual com as escolas da rede municipal de Educação, pois, o fechamento

da escola de uma destas redes, significa o prenúncio do desaparecimento da outra.

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4. É comum a compreensão de que o fechamento das escolas tem uma relação direta com o

desenvolvimento e a vida das comunidades. Cabe, nesse sentido, a clareza de que ambas

podem se comprometer a valorizar a história das comunidades e da escola que acolhe suas

crianças e jovens, fortalecendo uma identidade comum, a fim de se alcançar a meta legal de

que todos os alunos que ali vivem também estudem nesta escola do campo.

5. A Articulação Sudoeste e a Articulação Estadual de Educação do Campo são espaços

efetivos e legítimos de debate e proposição para as políticas públicas, as lutas e as

reivindicações das Escolas Públicas do Campo.

Metas e Ações:

1. Estudo e produção, na perspectiva de política pública/educacional, de uma proposta de

reorganização das escolas públicas do campo que têm um número de alunos abaixo do

estabelecido pela legislação com risco de fechamento, a fim de negociar junto aos órgãos

oficiais dos governos do estado e/ou municípios, construindo reformulações/criações para os

instrumentos burocráticos/jurídicos, com outras formas às escolas públicas do campo. Para isso,

organizar e acompanhar um Grupo de Trabalho – GT, com tarefas em três dimensões:

a) a reorganização da escola: níveis, etapas, turmas e turnos na relação com o território e

suas dimensões geográficas, as rotas do transporte escolar e os limites (georreferenciamento)

das matrículas em escolas do campo ou da cidade;

b) a organização do trabalho pedagógico (forma escolar) e a proposta curricular

(organização dos conteúdos e metodologia) embasada nas referências já existentes (inclusive

em curso na rede pública estadual);

c) o financiamento da educação, a lotação dos professores e as relações entre a rede

municipal e estadual nas mesmas escolas (dualidade administrativa) e/ou comunidades; o

SERE (Sistema Estadual de Registro Escolar) e o fechamento de turmas e turnos.

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2. Sistematização de bases de conteúdo e forma à modalidade educacional da Educação do Campo

pela articulação e pesquisa das referências, experiências e processos em curso nas Escolas

Públicas do Campo;

3. Participação ativa na Articulação Sudoeste e Estadual de Educação do Campo com debate sobre

as Políticas Públicas de Educação do Campo no contexto atual e os desafios às Escolas Públicas

do Campo, compartilhando os processos em curso e dando corpo à resistência necessária na

conjuntura atual;

4. Possibilitar novas formas de encontros e trocas entre os estudantes, os professores, as escolas e

outras instituições educativas de modo a fortalecer diálogos e compromissos com a Escola

Pública do Campo;

5. Promover formação continuada às escolas por meio de programas de Extensão Universitária,

das organizações dos trabalhadores, da Refocar entre outros;

6. Vincular a educação do campo à agroecologia e a um projeto de campo com lugar para a

produção de alimentos livres dos agrotóxicos, pelas práticas que articulem a comunidade e o

trabalho do campo nos entornos da escola de onde vêm os alunos, criando vínculos com as

famílias e suas organizações.

7. Criar um canal virtual de comunicação que permita socializar e comunicar as agendas, as

práticas, as ações, as trocas entre as escolas públicas do campo.

Francisco Beltrão, 28 de novembro de 2018.

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO...........................................................................................................................06

MANIFESTO DO I ENEPUC.........................................................................................................08

I TRABALHOS COMPLETOS

EIXO TEMÁTICO 1: ESCOLA PÚBLICA DO CAMPO, PRÁTICAS PEDAGÓGICAS,

PROCESSOS COLETIVOS E INICIATIVAS ESTUDANTIS........................................................19

A ESCOLA DO CAMPO E OS DESAFIOS DO CONHECIMENTO ESCOLAR:

ACOMPANHAMENTO AOS ESTUDANTES COM NECESSIDADES ESPECÍFICAS DE

APRENDIZAGEM

Marcia Eduarda Kielba e Rosane Berté..............................................................................................20

ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS NO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA VISÃO DOS

PROFESSORES DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE MUNDO NOVO/MS

Beatriz Cristina Bencke, Cristiane Beatriz Dahmer Couto e Vilmar Malacarne...............................29

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO: PLANEJAMENTO COLETIVO

INTERDISCIPLINAR E REDE DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES

Cecília Maria Ghedini........................................................................................................................44

EIXO TEMÁTICO 2: ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO, NÍVEIS DE ENSINO E

POLÍTICAS PÚBLICAS...................................................................................................................55

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EDUCAÇÃO DO CAMPO E AVALIAÇÃO ESCOLAR: CLASSIFICATÓRIA X

EMANCIPATÓRIA

Marcos Willian da Silva Santos e Carlos Antônio Bonamigo...........................................................56

O ACESSO E A PERMANÊNCIA À EDUCAÇÃO ESCOLAR NO MUNICÍPIO DE

RENASCENÇA-PR: UM ESTUDO DE CASO SOBRE O DIREITO À EDUCAÇÃO DO

CAMPO

Iliane Bavaresco Groff e Clésio Acilino Antônio..............................................................................70

EIXO TEMÁTICO 3: ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E FORMAÇÃO DE

PROFESSORES.................................................................................................................................87

A IMPORTÂNCIA DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA FORMAÇÃO ACADÊMICA

DE ESTUDANTES DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA

CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA EM UMA ESCOLA DO CAMPO

Roberto Gonçalves Ferreira e Vladileia Tochetto Gonçalves Ferreira...............................................88

O PROCESSO DE FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DAS ESCOLAS NO CAMPO EM

ITAPEJARA D´OESTE/PR: REFLEXÕES E RESULTADOS INICIAIS

Ivania Piva Mazur, Clésio Acilino Antônio e André de Souza Fedel................................................99

EIXO TEMÁTICO 4: ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO, GESTÃO, INSTÂNCIAS

COLEGIADAS E ESPAÇOS DA COMUNIDADE

ESCOLA MUNICIPAL BASÍLIO TIECHER: EDUCAÇÃO DO CAMPO E IDENTIDADE

Aline Tortora de Oliveira e Sônia Maria dos Santos Marques.........................................................109

O FECHAMENTO DAS ESCOLAS PÚBLICAS MUNICIPAIS E ESTADUAIS DO CAMPO,

NO CONTEXTO DA MERCADOLOGIZAÇÃO DA VIDA HUMANA

Vitor de Moraes e Katia Leite Costa................................................................................................119

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EIXO TEMÁTICO 5: EDUCAÇÃO DO CAMPO, TRABALHO, AGRICULTURA

FAMILIAR/CAMPONESA E AGROECOLOGIA.........................................................................130

PRINCÍPIOS DA AGROECOLOGIA: A AMPLIAÇÃO DA BIODIVERSIDADE DOS

AGROECOSSISTEMAS E O RESGATE E VALORIZAÇÃO DOS SABERES

TRADICIONAIS E POPULARES DOS CAMPONESES

Carlos Antônio Bonamigo................................................................................................................131

EIXO TEMÁTICO 6: EDUCAÇÃO DO CAMPO E HISTORIOGRAFIA DAS INSTITUIÇÕES

ESCOLARES...................................................................................................................................141

“ERA MAIS FÁCIL TRAZER UM PROFESSOR DO QUE LEVAR TODOS OS ALUNOS”:

SOBRE O FECHAMENTO DA ESCOLA ISOLADA BARRO BRANCO E A NUCLEAÇÃO

EM ALFREDO WAGNER (SC)

Eliandra Carla Sebold e Juliano Batista ..........................................................................................142

A PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA E A EDUCAÇÃO DO BRASIL:

APROXIMAÇÕES COM A EDUCAÇÃO DO CAMPO

Marcos Willian da Silva Santos ......................................................................................................152

MEMÓRIA E HISTÓRIA DOCENTE: ESCOLA RURAL DE VILA GUANABARA E

ESCOLA RURAL DE LINHA LISTON – FRANCISCO BELTRÃO/PR - POR:

PROFESSOR LUIZ BEDIN (1961 – 1990)

Carla Cattelan...................................................................................................................................171

EIXO TEMÁTICO 7: MOVIMENTOS SOCIAIS POPULARES E A FORMAÇÃO DOS

TRABALHADORES.......................................................................................................................181

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A FORMAÇÃO DO ACAMPAMENTO HERDEIROS DA TERRA DE 1º DE MAIO E A

CONQUISTA DA ESCOLA ITINERANTE HERDEIROS DO SABER COMO FORMA DE

RESISTÊNCIA E COLETIVIDADE

Rose Riepe de Souza e Ana Cristina Hammel.................................................................................182

ALGUMAS REFLEXÕES ACERCA DA EDUCAÇÃO E DO PROCESSO DE FORMAÇÃO

HUMANA

Dorisvaldo Rodrigues da Silva e Vilmar Malacarne………………………………………………193

ESCOLA ITINERANTE DO MST: ANÁLISE SOBRE O PROCESSO DE

TRANSFORMAÇÃO DA ‘ESCOLA DO ENSINO’ À ‘ESCOLA DO TRABALHO’

Rose Riepe de Souza e Clésio Acilino Antônio...............................................................................204

MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST) E EDUCAÇÃO:

“NOSSA LUTA É NOSSA ESCOLA”

Ana Marieli dos Santos Luedke.......................................................................................................215

OS FUNDAMENTOS DO NEOLIBERALISMO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A LUTA

DE UMA EDUCACÃO EMANCIPADORA

Denner Wynderson Weber e José Luiz Zanella…………………………………………………...230

II RESUMOS E RELATOS DE EXPERIÊNCIA

EIXO TEMÁTICO 1: ESCOLA PÚBLICA DO CAMPO, PRÁTICAS PEDAGÓGICAS,

PROCESSOS COLETIVOS E INICIATIVAS ESTUDANTIS......................................................247

APONTAMENTOS PARA UMA EXPERIÊNCIA FUTURA DE ENSINO

COLABORATIVO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Michaelli Maria Pires e Margarette Matesco Rocha........................................................................248

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ARTE E MATEMÁTICA, UMA APROXIMAÇÃO PRÁTICA

Regiane Maria Kielba e Raquel Antunes da Silva...........................................................................252

ESCOLA PÚBLICA DO CAMPO E LUTA PELO NÃO-FECHAMENTO: GANHOS E

APRENDIZADOS QUE FORTALECEM A ESCOLA

Vilson Jaques de Oliveira.................................................................................................................256

GÊNEROS TEXTUAIS A PARTIR DA REVOLTA DOS POSSEIROS

Aline Bernartt...................................................................................................................................260

IDENTIFICAÇÃO DE PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO EM CURSO NAS

ESCOLAS: MAPAS DE CONTEÚDOS E CONCEITOS

Cecília Maria Ghedini e Nubia Andrade da Silva............................................................................263

INFORMÁTICA NO ENSINO DE FILOSOFIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA

Wagner Hoffmann e Felipe Theodoro Guimarães...........................................................................267

METODOLOGIA DE CONSTRUÇÃO DO DOSSIÊ DO INVENTÁRIO DA REALIDADE

DAS ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO DO MUNICÍPIO DE VERÊ - PR

Elaine Fabiane Gaiovicz...................................................................................................................270

VIDA SAUDÁVEL EM UMA ESCOLA DO CAMPO: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Neusa Aparecida de Lima................................................................................................................274

EIXO TEMÁTICO 2: ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO, NÍVEIS DE ENSINO E

POLÍTICAS PÚBLICAS.................................................................................................................278

O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO ENSINO MÉDIO NA ESCOLA ESTADUAL DO

CAMPO VISTA ALEGRE – ENÉAS MARQUES/PR

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Ana Marieli dos Santos Luedke, Vandecléia Aparecida Ribeiro Soares e Wagno Antonio da

Silva..................................................................................................................................................279

EIXO TEMÁTICO 3: ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E FORMAÇÃO DE

PROFESSORES...............................................................................................................................283

FORMAÇÃO DOCENTE E A PRÁXIS NA EDUCAÇÃO DO CAMPO

Maria Lucivane de Oliveira Morais.................................................................................................284

EIXO TEMÁTICO 5: EDUCAÇÃO DO CAMPO, TRABALHO, AGRICULTURA

FAMILIAR/CAMPONESA E AGROECOLOGIA.........................................................................287

COMIDA TAMBÉM É GEOGRAFIA? O USO DE MAQUETES COMESTÍVEIS COMO

POSSIBILIDADE DIDÁTICA EM ESCOLAS DO CAMPO

Nayara Pasqualotto e Elis Modena...................................................................................................288

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E A AGROECOLOGIA

Rosangela Fernanda Fogues.............................................................................................................291

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E AGROECOLOGIA: SEMENTES CRIOULAS TÊM

PODER

Kelly Regina Oliveira e Cecília Maria Ghedini...............................................................................294

EIXO TEMÁTICO 6: EDUCAÇÃO DO CAMPO E HISTORIOGRAFIA DAS INSTITUIÇÕES

ESCOLARES...................................................................................................................................298

A LUTA PELA CONSTRUÇÃO E CONQUISTA DA ESCOLA MUNICIPAL IRMÃO

CIRILO E DA ESCOLA ESTADUAL PAULO FREIRE

Maiara Tibola e Rosane Berté..........................................................................................................299

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COLÉGIO ESTADUAL DO CAMPO PAULO FREIRE: A CONQUISTA DO ENSINO

MÉDIO E A MUDANÇA DA NOMENCLATURA PARA ESCOLA DO CAMPO

Claudiney de Oliveira e Jeferson Stocco..........................................................................................303

HISTORIOGRAFIA DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO DE PINHALZINHO

Simone Kieling Galvão e Ivaneidh Cirilo dos Santos......................................................................306

MÉMORIAS DA ESCOLA RURAL DUARTE DA COSTA – VILA GUANABARA-

FRANCISCO BELTRÃO/PR (1990)

Carla Cattelan...................................................................................................................................309

NUCLEARIZAÇÃO DAS ESCOLAS RURAIS: HISTORIOGRAFIA DA PRIMEIRA

ESCOLA DA COMUNIDADE SÃO PIO X – KM 20

Aline Tortora de Oliveira e Sônia Maria dos Santos Marques.........................................................313

RELATO HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO, NASCIMENTO E NUCLEARIZAÇÃO DA

ESCOLA MUNICIPAL IRMÃO CIRILO

Andressa Fachin, Carlos Narciso Bridi e Ivanir Arnaust Mendonça...............................................317

RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO DE VISTA ALEGRE –

ENÉAS MARQUES/PR.

Irene Zakaluk de Almeida e Keissiane Michelotti Geittenes de Avila.............................................321

RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO MARECHAL DEODORO

DA FONSECA SEDE PROGRESSO – VERÊ – PR – PARTE II

Tânia Regina Moreschi Fabiane.......................................................................................................325

RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO MARECHAL DEODORO

DA FONSECA SEDE PROGRESSO – VERÊ – PR – PARTE I

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Denice Beal, Elisângela Mirian Biondo, Selvina Januária Sezinandi e Tânia Regina Moreschi

Fabiane.............................................................................................................................................329

RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO TANCREDO NEVES-

LAMBEDOR-VERÊ / PR

Mara Cristina Calgarotto..................................................................................................................334

EIXO TEMÁTICO 7: MOVIMENTOS SOCIAIS POPULARES E A FORMAÇÃO DOS

TRABALHADORES.......................................................................................................................337

MÃOS SEM TERRA

Ritieli Pires da Silva e Tauãn Medino Gomes da Silva e Sá............................................................338

SISTEMATIZAÇÃO DE PRÁTICAS SOCIAIS POPULARES: ESCOLA MUNICIPAL

IRMÃO CIRILO E COLÉGIO ESTADUAL DO CAMPO PAULO FREIRE –

ASSENTAMENTO MISSÕES – FRANCISCO BELTRÃO - PR

Indianara Presoto Grzeca e Maria Cecília Maria Ghedini................................................................341

TEMPOS DE LUTA

Tauãn Medino Gomes da Silva e Sá e Ritiéli Pires da Silva............................................................344

EIXO TEMÁTICO 8: A EDUCAÇÃO DO CAMPO, SUAS DIVERSIDADES E

ORGANIZAÇÃO SOCIAL.............................................................................................................346

MONITORIA NO ENSINO SUPERIOR INDÍGENA: UM CAMINHO PARA GARANTIR A

INCLUSÃO

Cecília Maria Ghedini, Eliane da Cruz Gonçalves e Elisângela Inês Orben....................................347

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I TRABALHOS COMPLETOS

EIXO TEMÁTICO 1:

ESCOLA PÚBLICA DO CAMPO, PRÁTICAS PEDAGÓGICAS, PROCESSOS

COLETIVOS E INICIATIVAS ESTUDANTIS

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A ESCOLA DO CAMPO E OS DESAFIOS DO CONHECIMENTO ESCOLAR:

ACOMPANHAMENTO AOS ESTUDANTES COM NECESSIDADES ESPECÍFICAS DE

APRENDIZAGEM

Marcia Eduarda Kielba1

Rosane Berté2

Eixo Temático 1: Escola Pública do Campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e iniciativas

estudantis

Resumo: O presente trabalho relata as experiências vivenciadas no acompanhamento de ensino-aprendizagem dos estudantes, que no processo pedagógico, tenham sido identificados com necessidade de apropriação de instrumentos específicos das linguagens, da leitura, da escrita, dos problemas e dos cálculos. Descreve como se dá o trabalho de definição dos alunos a serem acompanhados e de como vem acontecendo esse acompanhamento pela bolsista de extensão. Debate a necessidade de compreender os determinantes do processo de ensino-aprendizagem e a importância de considerá-los na avaliação das dificuldades dos estudantes. Nota-se uma melhora muito grande de alguns dos estudantes acompanhados, tanto na rapidez para desenvolver as atividades, quanto no reconhecimento de letras e números que antes não realizavam. Observa-se maior interesse pelo estudo e de realização das atividades propostas, pois entendem o que tem que ser feito e conseguem mesmo que com muita dificuldade, realizá-las. E, por fim o processo de acompanhamento visa a construção de uma maior autonomia na realização as atividades e um maior entendimento e compreensão sobre os conteúdos a fim de superar o descompasso idade-série/nível de apropriação. Palavras-chave: Escola Pública do Campo; Acompanhamento; Necessidades de Aprendizagem.

Introdução

Este trabalho desenvolve-se com base numa atividade de extensão intitulada: “Educação

do Campo e conhecimento escolar: acompanhamento aos estudantes com necessidades de

1Acadêmica do Curso de Pedagogia e Bolsista de Extensão, Centro de Ciências Humanas, Campus de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected]. 2Mestrado, Rede Estadual de Ensino do Paraná, Centro de Ciências Humanas, Campus de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected].

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aprendizagem em descompasso com a série” e situa-se no contexto do Projeto de Extensão:

“Fortalecimento das Escolas Públicas do Campo da Região sudoeste do Paraná na perspectiva da

Educação do Campo: Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores”, que se propõe a

atender a demanda das Escolas Públicas do Campo da rede estadual de ensino - Ensino

Fundamental anos finais e Ensino Médio.

O projeto de extensão toma por base a modalidade da Educação do Campo garantida em

Lei desde 2010 (Resolução MEC/CNE/CEB 04/2010), e atua com os fundamentos e métodos da

Educação do Campo, mediada por práticas que possibilitam a (re)inserção da escola na realidade

local das famílias dos estudantes e regional (NRE) e outras organizações; promove o planejamento

coletivo com os professores e a interdisciplinaridade tendo como instrumental o Inventário da

Realidade; reafirma função social da escola na relação com o conhecimento historicamente

sistematizado; a auto-organização dos estudantes e a relação com as comunidades onde se insere

esta escola.

No plano da prática se dá na perspectiva de garantir o acesso dos estudantes ao

conhecimento historicamente sistematizado, reafirma a função social da escola que, em muitos

casos não é alcançada, pois há adolescentes que avançam na relação idade-série, mas não se

apropriam dos saberes necessários ao nível de estudo na mesma proporção.

Ensaiando passos para superar os descompassos

A busca por fortalecer o processo de aprendizagem dos estudantes das escolas públicas do

campo, tem como foco o direito à educação como acesso ao conhecimento sistematizado, ratificado

pelo Decreto Federal n. 7.352/2010 (BRASIL, 2010). Além disso, há uma preocupação que se

ancora na iminência do fechamento destas escolas, uma vez que, no contexto do campo, pode-se

considerar que grande parte das famílias ainda coloca seus filhos para estudar na cidade pois

acreditam que estas escolas têm condições de produzir melhores resultados em relação ao

conhecimento.

Esta percepção tornou-se uma crença cultural e, fortaleceu-se, também pelo processo de

nucleação. Em parte, as escolas do campo, realmente, têm apresentado menor alcance em relação

aos recursos, estrutura e acesso a tecnologias, o que pode prejudicar o processo de apropriação dos

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conhecimentos por parte dos estudantes e, certamente, gera preocupação às famílias em relação aos

estudos, inserção cultural e projetos de futuro de seus filhos.

Nesse sentido, o projeto de extensão toma como base uma concepção de escola

democrática, com um olhar a partir das pedagogias progressistas. Este enfoque teórico-

metodológico supõe espaços e instrumentos que permitam aos professores dialogar sobre os

conteúdos e as formas mais apropriadas para ensinar e organizar o trabalho de sala de aula, assim

como da parte dos estudantes, consequentemente, alcançar maior autonomia sobre seu processo de

estudo. Produz-se, assim, um cenário onde há uma dupla responsabilidade no processo de

apropriação do conhecimento: identificar o que é tarefa do professor e o que é tarefa do estudante

no processo de formação. Compreende-se que este jeito de encarar as relações de aprendizagem

supõe construir outra forma de se lidar com o ensino mediado pelo professor e o estudo a ser

desenvolvido pelo aluno de modo que, os dois momentos articulados como tempos diferentes no

processo de apropriação do conhecimento, produza a aprendizagem, ou seja se tenha um ensino-

estudo e aprendizagem.

Isso implica também um duplo compromisso dos educadores qual seja, com o

aprofundamento de seu conhecimento, assim como com a criação das condições de apropriação do

conhecimento escolar aos estudantes. Ocorre que, encontra-se razoável número deles em

descompasso com a aprendizagem exigida para acompanhar a progressão das séries, por diversos

motivos, dentre os quais, pelas situações vividas por estes sujeitos do campo e pela própria tradição

destas escolas, no sentido do trato governamental a que têm sido sujeitadas.

A realidade de aprendizagem dos alunos portanto, desafia iniciativas deste Projeto de

Extensão, para criar espaços que acompanhem suas não-aprendizagens, a fim de que sejam

superadas. Os maiores desafios encontram-se nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática.

Na Língua Portuguesa teve-se como foco a leitura e a escrita, a comunicação dos gêneros textuais e,

na matemática a decodificação de problemas, visando o desenvolvimento do estudante e sua

integração de forma plena na série em que está matriculado. Sabe-se que “[...] milhares de crianças

chegam ao final do primeiro ciclo do ensino fundamental com extrema dificuldade em certos

conteúdos escolares, como leitura, escrita e cálculo” (GALUCH, 2003, p. 418).

Yaegashi (1999) levanta a hipótese de que a função intelectual de certos alunos esteja

bloqueada em virtude das relações estabelecidas no interior da escola, pois a sala de aula é um

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ambiente social e o desenvolvimento dos estudantes é afetado conforme as relações que são

estabelecidas nesse local.

Destacam-se também os fatores internos do estudante, próprios da construção subjetiva

deste sujeito e, por vezes, também, a forma como é tratado pelo professor em sala de aula, forma

que interfere em seu desenvolvimento, interfere em seus comportamentos e em seu processo de

aprendizagem. Cabe ao professor ir desvendando estas nuances da aprendizagem e compreendendo

o desempenho individual e o tempo necessário para que o aluno possa se apropriar dos conteúdos,

não julgando-o por conta disso, mas desenvolvendo estratégias e alternativas para superar estes

descompassos, articulados ao processo pedagógico da escola.

Segundo Castro (2004), a base de todo processo de aprendizagem é a relação professor e

aluno e esta deve ser constituída tendo por base a troca de conteúdos, de conhecimentos e de afeto.

No entanto, esta relação nem sempre é igualitária. Por isso, é importante analisar quais os afetos

envolvidos no processo de ensino e aprendizagem e como o aluno com dificuldade de aprendizagem

os representa.

O estudante também pode desenvolver comportamentos inadequados ou dificuldades por

conta de sua família e seu meio social, o que vai exigir que a escola considere o contexto social em

que ele se encontra, para saber como tratá-lo no meio escolar pois, muitas vezes, a sua dificuldade

de aprendizagem está relacionada aos problemas vivenciados fora do espaço escolar. “O aprender

deve ser pensado como uma responsabilidade compartilhada, sendo afetado por fatores internos do

aluno (constituição genética, maturação) e externos (família, escola e meio social)’’ (OSTI;

BRENELLI, 2013, p. 418). Nesse sentido, “É importante aos pais e educadores estarem atentos às

dificuldades dos alunos, para que estas possam ser trabalhadas em tempo hábil, não acarretando

problemas futuros mais sérios, acabando por influenciar seu processo de construção do

conhecimento” (GALUCH, 2003, p. 418).

O processo de ensino-aprendizagem, portanto, é marcado pela reflexão constante,

levantamento de hipóteses e refutamentos até que se chegue à compreensão dos fatores que estejam

interferindo na não-aprendizagem do estudante.

Relatos do processo em curso na escola

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Nesta lógica, têm-se como objetivos principais acompanhar os estudantes que no processo

pedagógico tenham sido identificados com necessidades de apropriação de instrumentos específicos

das linguagens, da leitura, da escrita, dos problemas e dos cálculos; registrar os instrumentos

utilizados juntamente com a pedagoga da escola de modo a produzir protocolos diante das

necessidades que se manifestem recorrentes; e articular os estudantes do processo de

acompanhamento ao “Coletivo da Biblioteca e Hora da Leitura”.

Metodologicamente se desenvolve o acompanhamento dos estudantes com necessidades

específicas para superar o descompasso entre a série e o conteúdo e avançar no nível de apropriação

dos instrumentos necessários para dar conta dos objetivos e enfrentar as não-aprendizagens com

base na leitura, escrita, decodificação de problemas e comunicação de gêneros textuais, para que

assim o estudante se sinta integrado na série em que se encontra matriculado.

A pedagoga, juntamente com os professores, identifica quais são as necessidades de

aprendizagem, utilizando também como referência a avaliação psicoeducacional3 dos estudantes.

Depois, se organizam atividades para que a bolsista assista estes alunos e os acompanhe no espaço

destinado à hora da leitura, intercalado às aulas ou especificamente quando o professor solicitar.

Essas atividades, depois de analisadas pela pedagoga e os professores da série, passam a

compor um protocolo que poderá ser usado nos anos seguintes. A bolsista registra e organiza estes

“protocolos”, uma prática com o propósito de contribuir para a eficácia deste sistema. Aos poucos,

o objetivo é avançar com a constituição e acompanhamento do Coletivo da Biblioteca que passou

por um momento de formação recentemente e ficará responsável por práticas de incentivo à leitura,

por meio dos agentes de leitura.

Espera-se, então, com este trabalho aprofundar os conhecimentos dos estudantes ao

superarem as não-aprendizagens, disponibilizando-lhes um espaço de acompanhamento, a fim de

que não avancem de série sem se apropriar dos conhecimentos que necessitam. “Se o objetivo é

desenvolver nos alunos uma postura científica é preciso que o ensino ofereça-lhes condições para

perceberem a ciência como um modo de pensar e agir em busca do conhecimento” (SFORNI, 2006,

p. 9). 3A avaliação psicoeducacional consiste numa série de procedimentos realizados pelos professores, pedagogos, familiares e até mesmo o próprio aluno para que se consiga o máximo de informações que possam auxiliar o aluno a superar sua dificuldade de aprendizagem, ou a ser respeitado dentro de seus limites. Esta avaliação, por meio de intervenções na vida estudantil destes determinados alunos, deve ocorrer no âmbito escolar, para uma melhor observação do aluno, para auxiliar no processo de ensino-aprendizagem (PARANÁ, 2003).

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Acredita-se que dessa forma, o estudante terá mais comprometimento e interesse para

seguir buscando conhecimento e avançar alcançando os objetivos que cada série e nível escolar lhe

propõe. Ao mesmo tempo, do ponto de vista pedagógico, proporcionar um acúmulo de experiência

nesta atividade de acompanhamento facilitando assim a continuidade desta proposta nos próximos

anos se estas defasagens se mantiverem.

O projeto ainda está em desenvolvimento, busca-se testar alternativas a fim de encontrar a

melhor forma para que esse acompanhamento possa gerar resultados. Estas alternativas são

experimentadas e registradas pela bolsista constituindo um processo de acompanhamento do estudo

e da aprendizagem que servirá de base para os próximos anos.

No início do projeto havia um acompanhamento em sala de aula, onde a bolsista entrava

em sala juntamente com os professores de Matemática e Português, auxiliando os estudantes que

apresentavam dificuldades ou alunos avaliados. Esse acompanhamento se dava com 12 estudantes

do 6°, 7° e 8° anos e estudantes que apresentavam problemas como deficiência intelectual, indícios

de transtorno específico de aprendizagem, dificuldades na escrita e socialização.

Ao longo desse período viu-se a necessidade de mudar de estratégias, pois por esta forma

não se alcançavam os resultados esperados. Isto se dava principalmente porque, como a bolsista não

entrava em sala em todas as aulas de Matemática e Português, não conseguia acompanhar a

explicação dos professores sobre os conteúdos ministrados aos estudantes, assim não tinha

conhecimento suficiente para explicar os conteúdos de uma forma que eles compreendessem.

Planejaram-se, então atividades para serem executadas de uma forma mais concreta, com os

estudantes em outro espaço fora da sala de aula, com materiais palpáveis para aqueles que têm

maiores necessidades, e para os outros, busca-se uma adaptação curricular, explicando o conteúdo

trabalhado em sala de aula de uma forma menos complexa

Iniciou-se assim um acompanhamento fora de sala, onde a bolsista designou um caderno

para cada estudante. Neste caderno seriam feitas atividades referentes aos conteúdos trabalhados em

sala de aula, mas com um grau bem menor de complexidade, para que os estudantes conseguissem

compreendê-las e realizá-las. No momento das avaliações, a bolsista também acompanharia os

estudantes lendo e explicando o enunciado das questões de modo a auxiliar na interpretação dos

exercícios propostos.

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Nos cadernos eram feitas as atividades de Matemática e Português, mas à medida que se

desenvolvia o acompanhamento, percebeu-se que alguns desses estudantes não estavam

conseguindo apropriar-se por conta desta forma de trabalho, outros não estavam assimilando os

conteúdos para conseguir resolver as atividades.

A partir disso começou-se a aliar às atividades propostas no caderno aulas diversificadas

com materiais concretos e com jogos de alfabeto, de Matemática, etc. Pode-se notar uma grande

melhora de alguns estudantes que se tornaram participativos, mostraram-se interessados pois, as

aulas com jogos e materiais concretos ficaram mais interessantes, agora demonstram que querem

aprender fazendo os exercícios e brincando com os jogos disponibilizados.

Hoje o acompanhamento contempla cinco estudantes que estudam com atividades no

caderno quando apresentam grau menor de dificuldade e com as atividades e os jogos ao mesmo

tempo, quando apresentam maior grau de dificuldade.

A tabela abaixo demonstra série, idade dos alunos, as necessidades apresentadas e as

atividades propostas para cada estudante.

Ano Idade Dificuldade de aprendizagem Atividade/jogo realizado 7º 15 Deficiência intelectual Atividades básicas no caderno,

material dourado/jogo vamos formar palavras/jogo da memória/dominó.

7º 13 Indícios de transtorno específico de aprendizagem

Atividades básicas no caderno, jogo da memória/material dourado.

7º 14 Indícios de transtorno específico de aprendizagem

Atividades extracurriculares: produção de textos, atividades de matemática e português.

6º 12 Dificuldade de aprendizagem Atividades extracurriculares no caderno.

6º 12 Dificuldade de aprendizagem Atividades extracurriculares no caderno.

O acompanhamento está acontecendo somente com estes estudantes, os do 7º ano têm

avaliação psicoeducacional e os do 6º ano estão apresentando dificuldades para acompanhar os

conteúdos e desenvolver as atividades. Paralelamente a este processo e a partir de levantamento,

outros estudantes estão sendo avaliados por meio de avaliação psicopedagógica, a fim de identificar

e diferenciar se eles apresentam dificuldade de aprendizagem e/ou algum tipo de deficiência.

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Conclusões do acompanhamento em curso

Nota-se uma melhora muito grande de alguns dos estudantes acompanhados, tanto na

rapidez para desenvolver as atividades, quanto no reconhecimento de letras e números que alguns

não reconheciam antes. Observa-se também, agora, como muitos deles sentem vontade de estudar e

de realizar as atividades propostas, pois entendem a atividade a ser feita e conseguem ainda que seja

com muita dificuldade, realizá-la, o que antes do acompanhamento não conseguiam.

O projeto de extensão está assumido um trabalho muito importante com os estudantes da

escola pública do campo, pois tem feito com que alcancem uma maior autonomia na realização das

atividades e um maior entendimento e compreensão sobre os conteúdos. Isso é de suma

importância, uma vez que acreditamos que esses estudantes irão se apropriar dos conhecimentos

necessários a fim de superar o descompasso idade-série/nível de apropriação.

Referências

BRASIL. Decreto nº 7.352 de 4 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política de educação do

campo e o programa nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA. 05 nov. 2010.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7352.htm>.

Acesso em: 10 fev. 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 4, de 13 de

julho de 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília:

MEC, 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com

_content&view=article&id=12992&Itemid=866>. Acesso em: 31 dez. 2012.

CASTRO, Maria Luiza Garitano de. O olhar psicopedagógico na instituição educacional: o

psicopedagogo como agente de inclusão social. Rev. Psicopedagogia, 2004, vol. 2, n.65. p. 108-

116.

OSTI, Andréia; BRENELLI, Rosely Palermo. Sentimentos de quem fracassa na escola: análise das

representações de alunos com dificuldades de aprendizagem. Psico-USF [online]. 2013, vol.18, n.3,

p.417-426.

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PARANÁ. Curso de avaliação psicoeducacional no contexto escolar. Subsídios para avaliação

psicoeducacional no contexto escolar – orientações pedagógicas. SEED: Curitiba, 2013.

PARANÁ. Diretrizes Curriculares da Educação do Campo. Governo Do Estado do Paraná.

Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Curitiba, PR: SEED, 2006.

SFORNI, Marta Sueli de Faria e GALUCH, Maria Terezinha Bellanda. Conteúdos escolares e

desenvolvimento humano: qual a unidade? Comunicações: Revista do Programa de Pós-

Graduação em Educação da UNIMEP. Ano 13, Nº 2, p. 150-157. São Paulo, 2006. Disponível em

<https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/comunicacoes/article/view/946/454>

Acesso em: 10 fev. 2018.

YAEGASHI, S.F.R. As dificuldades de aprendizagem nas séries iniciais. In: SISTO, Fermino

Fernandes. O cognitivo, o social e o afetivo no cotidiano escolar. Campinas, SP: Papirus, 1999.

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ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS NO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA VISÃO DOS PROFESSORES DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE MUNDO NOVO/MS

Beatriz Cristina Bencke1

Cristiane Beatriz Dahmer Couto2

Vilmar Malacarne3

Eixo Temático 1: Escola Pública do Campo, Práticas Pedagógicas, Processos Coletivos e

Iniciativas Estudantis

Resumo: Muitos professores que atuam nas escolas não se dão conta da importante dimensão que tem o seu papel na vida dos alunos. Se pensarmos a escola como instituição demarcada, com a possibilidade da construção sistematizada do conhecimento pelo aluno e mediado pelo professor, é importante a reflexão, entre outras coisas, do ensino de Ciências Naturais na atualidade tecnologizada. Neste sentido, o presente artigo tem como objetivo investigar como as professoras dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental da Escola Estadual Castelo Branco de Mundo Novo/MS compreendem a importância desta disciplina no conjunto das disciplinas curriculares. O texto faz uma reflexão epistemológica sobre os conceitos de Ciências, ensino de Ciências e alfabetização científica e analisa dados coletados através de um questionário estruturado, no qual as professoras relatam a importância desta disciplina e as dificuldades em trabalhá-la nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Palavras-chave: Ensino de Ciências; Escola Pública; Disciplina.

Introdução

O presente artigo teve como objetivo investigar como as professoras do Ensino

Fundamental da Escola Estadual Castelo Branco de Mundo Novo/MS compreendem a importância

da disciplina de Ciências Naturais, bem como a dificuldade no trabalho de docente, voltado aos

anos iniciais do Ensino Fundamental. A pesquisa caracteriza-se como qualitativa e exploratória 1Mestranda, UNIOESTE. [email protected] 2Doutoranda, UNIOESTE. [email protected] 3Dr. em Educação Prof. Associado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. E-mail: [email protected]

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(LAKATOS; MARCONI, 2011) e se deu com a aplicação de questionário estruturado, endereçado

aos professores desta disciplina.

Com base nos autores pesquisados (BACHELARD, 1971; POPPER, 1975; JAPIASSU,

1976; CHASSOT 2003; SASSERON; CARVALHO, 2011; SASSERON, 2015; entre outros), o

acesso à educação científica escolar é um direito de todos e seu ensino pode contribuir para o

desenvolvimento intelectual das crianças, auxiliando na aprendizagem de outras áreas, trazendo

benefícios práticos para os alunos, sociedade e meio ambiente. Para Sasseron e Carvalho (2011, p.

65), “[...] não é necessário que a população em geral saiba fazer pesquisa científica, mas deve saber

como os novos conhecimentos produzidos pelos cientistas podem trazer avanços e consequências

para sua vida e sociedade”.

Nesta perspectiva, foram entrevistadas cinco professoras dos anos iniciais do Ensino

Fundamental da Escola Estadual Castelo Branco, através de questionário estruturado. Na busca de

possíveis respostas a tal questionamento, procurou-se entender o que é para aqueles professores a

Ciência, o ensino em Ciências e a alfabetização cientifica numa perspectiva de ampliar o

entendimento sobre a disciplina de Ciências na escola, problematizando suas manifestações em uma

escola pública no município de Mundo Novo/MS.

O termo disciplina, no século XIX, era expressado e designado como “´[...] a vigilância do

estabelecimento, a repressão das condutas prejudiciais a sua boa ordem e aquela parte da educação

dos alunos que contribui para isso” (CHERVEL, 1990, p. 178). Na segunda metade do século XIX,

com o conceito de “ginástica intelectual” particulariza-se seu uso passando a significar uma

“matéria de ensino” que serve de exercício intelectual para o disciplinamento da inteligência das

crianças. Os sinais dessa evolução aparecem no início do século XX, e só aí podemos falar de

diferentes disciplinas.

As disciplinas organizam o trabalho de pesquisa e do ensino. Não são estáticas, fixas e

acabadas, a própria história das Ciências nos mostra a permanente criação de especialidades e,

também, o desaparecimento de algumas que, com o passar do tempo, perdem vigor.

Toda disciplina é antes de tudo constituída por certo “campo de interesses”, o que inclui desde um interesse mais amplo, que define este campo como um todo, até um conjunto mais privilegiado de objetos de estudo e de temáticas a serem percorridas pelos seus praticantes (BARROS, 2011, p. 254).

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Conforme Kuhn (1996), os elementos que compõem a matriz disciplinar são as

generalizações simbólicas, a crença compartilhada sobre validade de certas afirmações, os valores,

que podem variar de sujeito para sujeito, e exemplos compartilhados de soluções para problemas

comuns que são referências comuns e regularmente mobilizados pelo coletivo.

Fabiani (2006) assinala que os sistemas de ensino estão assentados em sistemas disciplinares

que envolvem a superposição de uma lógica classificatória e de uma escala pedagógica, existindo

vários princípios de hierarquia, algumas vezes relacionados à localização em um currículo, ou ao

conteúdo objetivo de cada conhecimento disciplinar, possivelmente associada a uma classificação

da Ciência.

Popper (1975), corrobora dizendo que as Ciências empíricas são sistemas de teorias e a

filosofia da Ciência uma disciplina que reflete as teorias científicas, uma meta-teoria.

No entanto, Kuhn (1996) sinaliza que as revoluções científicas enfatizam a natureza

acumulativa da Ciência e que o progresso em longo prazo não só compreende no arregimento de

fatos e leis, mas também que, às vezes, o abandono de um paradigma se torna necessário, com a sua

substituição por um novo incompatível com o anterior.

Uma das características que mais marcaram o período moderno é a mudança na

compreensão sobre a Ciência. Muito se fez, e continua a ser feito, para que o entendimento sobre

esta supere as formas tradicionais (FABIANI, 2006).

O ensino de Ciências e alfabetização científica

A Ciência é o conhecimento claro e evidente de algo, fundado quer sobre princípios

evidentes de demonstrações, quer sobre raciocínios experimentais, ou ainda sobre a análise das

sociedades e dos fatos humanos.

Ao considerar ciência como um elemento do universo cultural, deve-se considerar que ela possui uma história. A produção do conhecimento científico está relacionada com os diversos momentos históricos do seu surgimento, recebendo influências das instâncias econômicas, sociais, políticas, religiosas, entre outras, e também sobre elas exercendo a sua influência (PRETTO, 1995, p. 19).

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Para Bachelard (1971), a nova Ciência, faz constantemente xeque-mate à sua constituição do

momento, superando-se num movimento dialético que vai combatendo o seu oposto ao mesmo

tempo que o conserva.

Só existe um meio de avançar a ciência; é o de atacar a ciência já constituída, ou seja, mudar a sua constituição. A ciência faz-se sempre contra o erro: contra o conhecimento científico anterior presente na própria ciência, contra as intuições, contra o senso-comum. (BACHELARD, 2015, p. 142).

O termo Ciência provém do latim “Scientia” que significa aprender ou conhecer. O

conhecimento, cientificamente falando, é resultado de uma profunda investigação que dá lugar à

reflexão, com seus métodos próprios e com uma perfeita ideia da sistemática do real.

O ato de conhecimento é, portanto, uma ruptura com o passado porque o que vem primeiro não é o principal, não é o mais importante, não é o fundante: os primeiros princípios, as primeiras ideias e intuições, as primeiras observações, aquilo que é imediato, as experiências dos sentidos, a razão razoável do senso comum (BACHELARD, 2015, p. 145).

A Ciência procura construir teorias que expliquem fenômenos que possam ser verificados e,

sempre dentro do possível, seja capaz de determinar que leis rejam o que chamamos previsibilidade.

A Ciência é um conjunto ordenado, sistematizado e organizado de conhecimento específico

com características próprias no campo do ensino, nos planos de ensino, dos métodos, de formação e

da matéria (JAPIASSU, 1976).

O ensino de Ciências não pode ser desenvolvido como um elemento independente do todo

social e, além disso, deve auxiliar o cidadão na compreensão das múltiplas questões com as quais

lidamos no nosso cotidiano e que envolvem elementos da Ciência e da técnica.

O ensino de Ciências com seus métodos, linguagem e conteúdos próprios, tem o objetivo de

promover a formação integral do cidadão, como ser pensante e atuante, e como corresponsável

pelos destinos da sociedade. A criança, desde as Séries Iniciais de escolaridade, é cidadã que se

constrói através de inúmeros atos interativos com os outros e com o meio em que vive.

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O ensino de Ciências assume, assim, um papel muito importante. Orienta-se para a

promoção da cidadania, com vistas ao desenvolvimento dos sujeitos enquanto cidadãos ativos,

consumidores e usuários responsáveis da tecnologia existente (VIECHENESKI, 2013).

[...] o ensino de ciências no primeiro grau [sic], entre outros aspectos, deve contribuir para o domínio das técnicas de leitura e escrita; permitir o aprendizado dos conceitos básicos das ciências naturais e da aplicação dos princípios aprendidos a situações práticas; possibilitar a compreensão das relações entre a ciência e a sociedade e dos mecanismos de produção e apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos; garantir a transmissão e a sistematização dos saberes e da cultura regional e local (FRACALANZA; AMARAL; GOUVEIA,1986, p. 26-27).

Fracalanza; Amaral; Gouveia (1986) afirmam também que o ensino de Ciências, além dos

conhecimentos, experiências e habilidades inerentes a esta matéria, deve desenvolver o pensamento

lógico e a vivência de momentos de investigação, convergindo para o desenvolvimento das

capacidades de observação, reflexão, criação, discriminação de valores, julgamento, comunicação,

convívio, cooperação, decisão, ação, entendidos como sendo objetivos do processo educativo.

Para Sasseron; Carvalho (2008) emerge a necessidade de um ensino de Ciências capaz de

fornecer ao aluno não somente noções e conceitos científicos, mas também é importante e preciso

que os alunos passam a “fazer ciências”, sendo confrontados com os problemas autênticos nos quais

a investigação seja a condição de resolvê-los.

Diante do exposto, faz-se necessário que no ensino de Ciências aconteça a alfabetização

científica em nossas escolas.

Segundo Sasseron (2015), o percurso histórico da alfabetização científica passou por vários

momentos. Autores como Bacon (1979), alegavam a necessidade de fazer com que as pessoas

fossem preparadas intelectualmente para o bom uso de suas faculdades intelectuais, o que, segundo

ele, se dá por meio de conhecimentos sobre as Ciências.

Semelhantemente Hurd (1998), afirma que uma vez que a sociedade depende dos

conhecimentos que a Ciência constrói, é preciso que esta mesma sociedade saiba mais sobre esta em

si e seus empreendimentos.

Laugksch (2000), propõe que não é necessário que a população em geral saiba fazer

pesquisa científica, mas deve saber como os novos conhecimentos produzidos pelos cientistas

podem trazer avanços e consequências para sua vida e sociedade.

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A Alfabetização Científica é vista como processo contínuo, assim, entendem-na como um

método no ensino de Ciências. Sendo assim, esses indicadores referem-se: (a) ao trabalho com as informações e com os dados disponíveis, seja por meio da organização, da seriação e da classificação de informações; (b) ao levantamento e ao teste de hipóteses construídas que são realizados pelos estudantes; (c) ao estabelecimento de explicações sobre fenômenos em estudo, buscando justificativas para torná-las mais robustas e estabelecendo previsões delas advindas; e (d) ao uso de raciocínio lógico e raciocínio proporcional durante a investigação e a comunicação de ideias em situações de ensino e aprendizagem (SASSERON, 2015, p. 57).

Corroboramos com Sasseron (2015) que o alfabetizado cientificamente não precisa saber

tudo sobre as Ciências (mesmo aos cientistas isso não é possível), mas que deve ter conhecimentos

suficientes de vários campos delas e saber sobre como esses estudos se transformam em adventos

para a sociedade.

Por percebermos que o ensino de Ciências emerge nos últimos tempos como uma proposta

educativa capaz de ampliar e enriquecer a visão de mundo dos sujeitos, tendo em vista a construção

de soluções para os desafios impostos pelos processos de globalização, a Alfabetização Científica é

defendida como um componente básico de uma educação cidadã responsável pelo desenvolvimento

do indivíduo com questões decisivas para o desenvolvimento da sociedade (FOUREZ, 2003).

Neste sentido algumas atividades podem ser aplicadas com o intuito de promover o início do

processo Alfabetização Cientifica nas aulas de Ciências, a saber: leituras de obras infanto-juvenis

que tenha alguma relação com a ciência, bem como de revistas ou suplemento de jornais, visitas a

museus e teatro, e aulas práticas com atividades experimentais.

Sasseron (2015), sugere que, no Ensino Fundamental, se parta da premissa de que é

necessário iniciar o processo de Alfabetização Científica desde as primeiras séries da escolarização,

permitindo que os alunos trabalhem ativamente no processo de construção do conhecimento e

debatam ideias que afligem sua realidade. Para tanto, parece-nos importante que as aulas de

Ciências naturais, já no início do Ensino Fundamental, proponham sequências didáticas e

problematizações.

Tais ações devem levar em consideração a escassa atribuição de tempo do currículo escolar

conferido à disciplina de Ciências Naturais com, em média, 4 horas-aulas semanais, quando

comparado à disciplina de Língua Portuguesa com 6 horas. Ainda, devem atender à necessidade de

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corroborar com os objetivos do ensino de Ciências no referido nível de educação como, por

exemplo, o de ampliar as relações desse ensino com as questões da sociedade.

Resultados e Discussão

Foram entrevistadas 5 (cinco) docentes do sexo femininos da escola do Ensino Fundamental de

Mundo Novo /MS. As mesmas informaram sua formação acadêmica. Assim ficou desenhada a

formação dessas profissionais: P1 – habilitada em pedagogia e letras, P2- habilitada em pedagogia e

arte, P3- habilitada em pedagogia, P4 – habilitada em pedagogia e P5 – habilitada em pedagogia. O

tempo de atuação docente de todas as professoras é mais de cinco anos de magistério.

De acordo com Resolução/SED N. 3004 de 11 de janeiro de 2016 de MS, Art. 128. São lotados(as), em cada turma, do 1o (primeiro) ao 5o (quinto) ano do ensino fundamental, 4 (quatro) professores(as), sendo: I - 1 (um/a) com habilitação para atuar nos anos iniciais do ensino fundamental, que ministra os componentes curriculares de Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia; II - 1 (um/a) com habilitação em Artes que ministra o componente curricular de Arte; III - 1 (um/a) com habilitação em Educação Física que ministra o componente curricular de Educação Física; IV - 1 (um/a) com habilitação para atuar nos anos iniciais do ensino fundamental, que ministra o componente curricular Ciências da Natureza.” (MATO GROSSO DO SUL, 2016, p.8).

O Ensino de Ciências consiste em uma disciplina escolar, cuja área é de grande relevância

para o aprimoramento dos conhecimentos e articulação com as vivências e experiências envolvendo

o meio ambiente, o desenvolvimento humano, transformações tecnológicas entre outras temáticas.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Ciências Naturais (BRASIL, 1997), o

ensino de Ciência permite introduzir e explorar as informações relacionadas aos fenômenos

naturais, à saúde, tecnologia, sociedade e ao meio ambiente, favorecendo a construção e ampliação

de novos conhecimentos.

A matriz curricular do Ensino Fundamental anos inicias, segundo a Resolução/SED n. 3.004

(2016), é ofertada no turno diurno, com semanas letivas com 5 (cinco) dias, duração da aula 50

(cinquenta) minutos, duração do ano letivo de 200 (duzentos) dias.

Foi questionado às professoras sobre qual é a importância de ensinar Ciências da natureza

para os alunos do Ensino Fundamental - anos iniciais. As cincos professoras entrevistadas

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afirmaram que é importante ao desenvolvimento dos alunos e justificarm suas respostas: a

professora P1 relatou: “é extremamente importante. Pois, através do ensino de ciências buscamos o

desenvolvimento dos educandos, que são cidadãos ativos, de modo a ampliar as possibilidades de

produção do conhecimento e assim, adotarem postura responsável em relação ao meio em que

vivem”.

Refletindo sobre a fala da professora, nos reportamos ao método da alfabetização científica

para desenvolver essa postura responsável e a capacidade de organizar seu pensamento de maneira

lógica, além de auxiliar na construção de uma consciência mais crítica em relação ao mundo que a

cerca.

De acordo com Chassot (2003), o ensino de Ciências deve proporcionar a todos os cidadãos

conhecimentos e oportunidades de desenvolvimento de capacidades necessárias para se orientarem

em uma sociedade complexa, compreendendo o que se passa à sua volta. As professoras P2 e P5, disseram ser importante, e ressaltaram que nesta fase os alunos são muito

curiosos.

As crianças são curiosas e é preciso explorar essa curiosidade, como afirma Augusto (2010),

ainda, que, nos anos iniciais do processo de escolarização, a criança apresenta uma curiosidade

natural em relação aos fenômenos do mundo físico e biológico com o qual interage cotidianamente.

Assim sendo, os docentes precisam aguçar e explorar ainda mais essa curiosidade para que

não se perca ao longo do processo de ensino aprendizagem visto que, segundo Carvalho (1998), se

as crianças gostarem especificamente de Ciências têm maior probabilidade de serem bons alunos:

[...] se fizer sentido para as crianças, elas gostarão de Ciências e a probabilidade de serem bons alunos nos anos posteriores será maior. Do contrário, se esse ensino exigir memorização de conceitos além da adequada a essa faixa etária e for descompromissado com a realidade do aluno, será muito difícil eliminar a aversão que eles terão pelas Ciências (CARVALHO et al. 1998, p.6).

Para a professora P3, ensinar Ciências da natureza no Ensino Fundamental permite que a

criança explore o conhecimento científico presente no seu dia a dia, oferece a ela oportunidade de

construir seu conhecimento através de experiências, isso tudo fará com que ela enxergue o mundo

de forma mais ampla e aprenda a pensar de forma mais eficiente identificando os conceitos

científicos em quase tudo que a cerca.

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Analisando o conhecimento através de experiências, Sasseron e Carvalho nos esclarecem

que: A distinção entre os dois tipos de racionalidade propostos esboça-se na idéia de que, comumente, a racionalidade instrumental está ligada ao caráter técnico da resolução de problemas práticos enquanto que a racionalidade crítica busca tecer relações considerando distintos argumentos e evidências e preocupando-se com os desdobramentos sociais, ambientais, econômicos e/ou políticos das soluções alcançadas (SASSERON; CARVALHO, 2011, p.66).

A apropriação desses conceitos pode contribuir (a) para o ensino teórico e prático, levando o

aluno a questionar o que vê e ouve; (b) para a ampliação das explicações acerca dos fenômenos da

natureza; (c) para a compreensão e valorização da sua cultura e (d) para intervir na natureza e saber

utilizar seus recursos.

O ensino de Ciências deve ser problematizador, levar o alunos a questionar fatos como

“manga com leite faz mal?” ou “por que é bom tomar chá de boldo quando o estômago está

doendo?”. O ensino deve ser provocador, levar o aluno a querer mais, ir além do que está posto a

ele nos livros didáticos. Sasseron; Carvalho (2011) nos dizem que devemos trabalhar atividades

problematizadoras, cujas temáticas sejam capazes de relacionar e conciliar diferentes áreas e esferas

da vida de todos nós, ambicionando olhar para as Ciências e seus produtos como elementos

presentes em nosso dia-a-dia e que, portanto, apresentam estreita relação com nossa vida.

Krasilchik; Marandino (2004) apontam a necessidade de os cidadãos serem capazes de discernir

assuntos sobre Ciências e emitir julgamentos concernentes a tais saberes e suas implicações.

Nesse sentido, a professora P4 corrobora dizendo que o aprendizado de Ciências no Ensino

Fundamental pode melhorar a qualidade de vida dos alunos quando se ensina, por exemplo,

alimentação saudável e cuidar do meio ambiente.

Para que o ensino de Ciências venha colaborar de forma efetiva na vida dos alunos, é preciso

levar em conta o currículo escolar. Sasseron; Carvalho (2011) afirmam que o currículo desta

disciplina deve ser relevante para a vida de todos os estudantes, não só para aqueles que pretendem

seguir carreiras científicas, ainda, que os métodos de instrução devem demonstrar cuidados para a

diversidade de habilidades e interesses dos estudantes.

Podemos constatar que as professoras têm conhecimento sobre a importância da

aprendizagem dos conteúdos de Ciências que são trabalhados com os alunos nos Anos Iniciais do

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Ensino Fundamental, o que é explicitado nos exemplos por elas mencionados: corpo humano, meio

ambiente, saúde, alimentação, hábitos de higiene, lixo e efeito estufa.

Outra pergunta feita às professoras foi se há dificuldade em ensinar Ciências as crianças, e

quais seriam. Elas apontaram as seguintes respostas: P1- Não digo dificuldade, mas um desafio que enfrento como professora de ciências é manter em

todos os momentos um ambiente desafiador para o aluno.

A professora está preocupada em como manter um ambiente desafiador para seus alunos, e

este ambiente será possível quando os professores se tornarem mediadores do processo de

aprendizagem de seus alunos, visto que a prática de sala de aula não é simplesmente colocar em

ação as instruções pensadas por outras pessoas. Para Sadalla (1989), o professor atua segundo sua

sensibilidade e sua crença, sem ter, muitas vezes, suficiente reflexão sobre suas ações nas práticas

cotidianas de classe.

A ZDP [...] é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VYGOTSKY, 1989, p. 97).

A resposta da professora nos remete a Libâneo (2005) que faz uma pergunta fundamental:

que tipo de reflexão o professor precisa para alterar sua prática? Para ele:

A reflexão sobre a prática não resolve tudo, a experiência refletida não resolve tudo. São necessários estratégias, procedimentos, modos de fazer, além de uma sólida cultura geral, que ajudam a melhor realizar o trabalho e melhorar a capacidade reflexiva sobre o que e como mudar (LIBÂNEO, 2005, p. 76).

Ainda pensando no ambiente desafiador que professora P1 cita, concordamos com Libâneo e

acrescentamos que os professores precisam estar constantemente estudando, refletindo sobre sua

teoria e prática, para que sua metodologia e seu processo avaliativo façam parte do processo de

ensino aprendizagem e a ação pedagógica do professor e do aluno precisa voltar-se para uma prática

histórica real. Segundo Freire (1975), o educador e o educando são sujeitos do processo educativo,

ambos crescem juntos nessa perspectiva.

P2- Uma das dificuldade é que os pais e professores não dão a mesma importância ao

ensino de ciências como as disciplinas de português e matemática.

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Chervel (1990) alerta para a tendência de se relacionar as disciplinas escolares e as

acadêmico-científicas correlatas e que, muitas vezes, esse relacionamento é no sentido de sujeitar

uma perante a outra. Assim, muitas vezes, a própria nomenclatura traz essa relação e a tradição

instituída considera as disciplinas acadêmico-científicas como disciplinas de referência para as

disciplinas escolares.

A própria organização da escola é sujeita aos ditames das comunidades disciplinares

científicas que, volta e meia, determinam “currículos”, “conteúdos”, “matérias” etc. a serem

desenvolvidos pelas escolas, muitas das vezes sem considerar a própria escola, a cultura escolar.

P3 - Para mim, a única dificuldade é a falta de alguns materiais e espaço para realizar

algumas atividades práticas. Só lembrando que elas amam ciências, amam pesquisar e aprender,

basta nós, professores, guiarmos esse momento de aprendizagem.

Dessa forma, no processo de escolarização, é importante que a criança tenha

oportunidades de participar de atividades investigativas, de realizar experimentos, testar hipóteses,

questionar, apresentar suas opiniões interagindo com os colegas. Conforme salientam Viecheneski;

Lorenzetti; Carletto (2012, p. 859-860):

[...] o papel do professor é propiciar um espaço favorável à descoberta, à pergunta, à investigação científica, instigando os alunos a levantar suposições e construir conceitos sobre os fenômenos naturais, os seres vivos e as inter-relações entre o ser humano, o meio ambiente e as tecnologias.

Ferreira et al (2017) propõem que a educação pode ser realizada em diferentes espaços,

sendo ela classificada como ‘educação formal’ - aquela desenvolvida em um espaço estruturado de

ensino; e ‘educação informal’ considerando qualquer atividade educacional organizada fora de um

sistema educacional, assim, e o espaço informal de educação não é propriamente um espaço onde

podem ser desenvolvidas habilidades como valores e atitudes:

A educação formal: cronologicamente classificada como “sistema de ensino” hierarquicamente estruturada, em execução desde o ensino primário até a universidade e incluindo, além de estudos acadêmicos em geral, uma variedade de programas e de instituições especializadas de formação técnica e profissional em tempo integral. Educação informal: o processo verdadeiramente ao longo da vida através do qual cada indivíduo adquire atitudes, valores, habilidades e conhecimentos a partir da experiência diária e das influências educativas e dos recursos em seu ambiente - da família e dos vizinhos, de trabalho e diversão, a partir do lugar de mercado, da biblioteca e dos meios de comunicação de massa (FERREIRA, et al. 2017, p. 165).

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As professoras P4 e P5 relataram que a dificuldade que encontram está relacionada ao

conteúdo do livro didático, visto que o mesmo não está de acordo com o referencial curricular e as

aulas precisam ser adaptadas/complementadas por conta disso.

Sem a pretensão de aprofundar as discussões em relação ao livro didático, iremos abordá-lo

tendo em vista que uma das fontes de informação (se não a principal) dos docentes.

Considerando a importância que tem o livro didático nas aulas de Ciências, é necessário

analisar e realizar a seleção dos mesmos de forma adequada. É inegável que este instrumento faz

parte do cotidiano das aulas de Ciências, pois muitos professores normalmente trabalham apenas o

livro didático como único recurso em suas aulas.

Dito isto, Nuñez et al. (2003) consideram que a seleção dos livros didáticos para o ensino de

Ciências constitui uma responsabilidade de natureza social e política. Por outro lado, a quantidade

de livros didáticos que circulam no mercado faz desse processo de seleção uma tarefa ainda mais

complexa e exigente profissionalmente.

No entanto, ainda de acordo com os autores, nessa etapa de escolarização, muitos docentes

sentem dificuldade em ensinar Ciências, o que pode estar relacionado com o processo da sua

formação polivalente que não dá ênfase suficientemente aprofundada a essa área.

Numa sociedade em que se convive com a supervalorização do conhecimento científico e

com a crescente intervenção da tecnologia no dia-a-dia, não é possível pensar na formação de um

cidadão crítico à margem do saber científico. Mostrar a Ciência como um conhecimento que

colabora para a compreensão do mundo e suas transformações, para reconhecer o homem como

parte do universo e como indivíduo, é a meta que se propõe para o ensino da área na escola

fundamental.

Conclusão

Ao se estabelecer uma comparação entre os dados levantados na pesquisa e os referenciais

estudados, pode-se afirmar que, por mais que haja divergências nos posicionamentos dos

educadores, existe uma preocupação de ambos os lados, em buscar caminhos cada vez mais eficazes

para o ensino de Ciências na escola. É importante considerar que, como em toda a pesquisa, esta

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revelou apenas alguns aspectos delimitados pela temática, pois a relação entre Ciências, ensino de

Ciências e a alfabetização científica vai muito além das questões aqui analisadas, o que acontece,

principalmente, devido às constantes e aceleradas mudanças que ocorrem na sociedade e refletem

no contexto escolar.

A atuação do professor é de suma importância para que os alunos sejam alfabetizados

cientificamente, para isso, seu papel deve ser de mediador da aprendizagem do aluno. Certamente é

muito importante para o aluno a qualidade de mediação exercida pelo professor, pois, desse

processo, dependerão os avanços e as conquistas do aluno em relação à aprendizagem no ensino de

Ciências.

Constata-se assim que o ensino de Ciências na Educação Básica e a formação do educador

desta disciplina são de grande relevância, uma vez que, historicamente, mudanças significativas

vêm sendo delineadas, tanto nos conteúdos metodológicos, quanto na prática em sala de aula, o que

confere a essa área o status de um campo complexo de estudos e investigações.

Com base nestas reflexões e após o aprofundamento dos estudos teóricos, esta pesquisa

permitiu adquirir conhecimentos importantes sobre o ensino de Ciências nos Anos Iniciais do

Ensino Fundamental, bem como um outro olhar em torno do papel fundamental dos professores em

relação aos conteúdos abordados e suas práticas em busca de um ensino de Ciências de forma

efetiva nos Anos Iniciais.

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ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO: PLANEJAMENTO COLETIVO

INTERDISCIPLINAR E REDE DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES

Cecília Maria Ghedini1

Eixo Temático 1: Escolas Públicas do Campo, Práticas Pedagógicas e iniciativas estudantis.

Resumo: A Educação do Campo nestes quase vinte anos, contrapôs-se à lógica da Educação Rural, foram inúmeras as referências produzidas no âmbito da Educação Pública, desde a Educação Básica até os cursos no Ensino Superior. A modalidade da Educação do Campo tomada como “ferramenta”, conta com estas referências históricas produzidas que possibilitam relações entre a educação, o projeto de desenvolvimento socioeconômico-cultural, a realidade próxima da escola e o trato do conhecimento e se dá com movimentações regulares que constituem uma tecitura formativa à escola, ancoradouro à uma forma de organizar a escola, capaz de criar fissuras à forma histórica escolar. No ano de 2015, a partir de uma necessidade de Escolas Públicas do Campo da rede estadual de ensino, na região sudoeste do Estado do Paraná, inicia-se um projeto de extensão com a Unioeste – Campus de Francisco Beltrão – PR. Dois grandes desafios se colocam a este processo que inicia: a formação continuada de professores no contexto de contratações temporárias e o fechamento de escolas, por conta da diminuição da população das áreas rurais e também pela crença por parte das famílias, de que as escolas situadas na cidade são melhores. Neste contexto, compreende-se que a modalidade, embora seja uma “faca de dois gumes”, poderia dar conta dessa situação, pois sua implementação com qualidade quem sabe, resolveria estes dois limites: lotar professores nas escolas do campo de forma diferenciada e, ao mesmo tempo, criar outras formas de espaço, tempo e trato dos conteúdos. Com este intuito passa-se a produzir um instrumental metodológico ressignificado ou mesmo produzidos neste processo de rearticulação das escolas. Estas movimentações levaram a criar a rede de formação de educadores, com base em diversas ações e atividades desdobradas pela necessidade de o acompanhamento às Escolas Públicas do Campo e formação continuada de professores. Palavras-Chave: Educação do Campo. Planejamento Coletivo Interdisciplinar. Formação de Professores.

1. Introdução

Na história do país, a Escola Pública do Campo foi “abandonada” pelos governos,

considerada e tratada como uma necessidade elementar, não como um espaço prioritário de

1 Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão – Paraná – Brasil. E-mail [email protected]

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educação e formação dos povos do campo (CALAZANS, 1993). Desse modo, culturalmente,

produziu-se uma lógica que contrapunha a escola da cidade à escola pública do campo, fazendo

com que esta passasse a ser compreendida como uma escola “mais ruim” que a escola da cidade.

A Educação do Campo, tendo como base as referências históricas da Educação Popular e

dos Movimentos Sociais Populares é batizada sob este nome no Brasil, no ano de 1998. O primeiro

dispositivo legal data de 2002 e, neste espaço de tempo, outros são promulgados até que em 2010,

tem-se um Decreto Presidencial (Nº 7.352 de 4/11/2010),2 que a eleva à categoria de política de

Estado e, uma Resolução (MEC/CNE/CEB 04/2010)3, à modalidade educacional.

Nestes quase vinte anos, contrapondo-se à lógica da Educação Rural foram inúmeras as

referências produzidas no âmbito da Educação Pública, desde a Educação Básica até os cursos no

Ensino Superior. Nos anos 2013 a 2015 vivem-se situações atípicas no país em relação à situação

política do período anterior, com confrontos da iniciativa privada neste caso, principalmente no que

se refere ao fechamento das escolas do campo, que se estende até a atualidade, com a eleição de um

governante que representa o atraso e o despreparo no sentido de projeto de país. Em relação a esta

política, estimam-se grandes retrocessos. Contudo, segue-se mantendo firmes as iniciativas e

processos em curso, apostando na resistência e enfrentamento ao desmonte ultraliberal e

conservador.

Mesmo com estas contradições e, com esta base histórica e legal se produz uma referência

com Escolas Públicas do Campo na Região Sudoeste do Estado do Paraná, iniciada no ano de 2015,

que foi tomando corpo e ampliando-se até a presente data. Tem como meta produzir referências nas

relações de conteúdo e método para a modalidade da Educação do Campo. Conta-se com seis

escolas acompanhadas diretamente e, no âmbito do Núcleo Regional de Educação (NRE) são mais

40 escolas que, indiretamente, se apropriam desta referência, também por falta de estrutura para o

acompanhamento direto.

2 BRASIL. Decreto nº 7.352 de 4 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política de educação do campo e o programa nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA. 05 nov. 2010a. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7352.htm>. Acesso em: 10 fev. 2018. 3 BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília: MEC, 2010b. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com _content&view=article&id=12992&Itemid=866>. Acesso em: 31 dez. 2012.

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2. Movimentações que solapam a forma histórica escolar da Educação Rural

A modalidade da Educação do Campo tomada como “ferramenta”, conta com as referências

históricas produzidas que possibilitam relações entre a educação, o projeto de desenvolvimento

socioeconômico-cultural, a realidade próxima da escola e o trato do conhecimento e se dá com

movimentações regulares que constituem uma tecitura formativa à escola, ancoradouro à uma forma

de organizar a Escola Pública do Campo, capaz de criar fissuras à forma histórica escolar.

Compreende-se que tal tecitura produzida ao longo dos últimos anos, carrega essa

potencialidade na medida que, pela regularidade que acontece, estabelece novos vínculos com os

coletivos individuais e sociais.

A primeira dimensão – território, lugar, trabalho e cultura – “ancora-se” no eixo da luta pela terra, pela especificidade do lugar e dos sujeitos que ali vivem, e enraíza-se no projeto de desenvolvimento socioeconômico-cultural [...]. Tratados como segunda dimensão da escola do campo, os coletivos e a auto-organização dos estudantes “ancoram-se” no eixo da luta por condições para produzir e reproduzir-se no território [...]. Referida à forma de tratar o conhecimento escolar, a terceira dimensão – tempos, espaços e trato do conhecimento – “ancora-se” no eixo da luta pela concretização do direito à educação e à escola [...] nos diversos níveis de ensino e da formação de professores (GHEDINI, 2017, p. 369).

À medida que as movimentações destas dimensões se materializam, constituem

descentramentos em relação à escola, pela dimensão formativo-educativa e pelos modos específicos

na forma de tratar o conhecimento, intencionalmente. Assim, desarruma o que está posto pela

“ordem natural” de como se “faz” a escola, pois consegue atuar nas contradições e produzir sínteses

com elementos novos, o que promove uma experiência escolar instituinte de uma escola de novo

tipo.

Acredita-se que este instrumental metodológico, tem potencial para confrontar a

internalização que se produz pelo sistema sócio-histórico-cultural hegemônico, como diz Mészáros

(2005). Esta internalização logra êxito pela lógica que a própria escola produz que, repetida e

objetivamente vivida, vai também amalgamar-se à subjetividade dos sujeitos e à lógica da vida dos

sujeitos e da própria escola.

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Thompson (1981) mostra como as produções sociais produzem consciência e cultura pela

experiência. Neste caso, a aposta é que esta experiência possibilitada por uma consciência e cultura

que descentra a escola, na medida em que vai solapando as cristalizações da escola rural, produza

avanços em relação à forma escolar da escola rural.

Ao desenvolver-se com estas movimentações, a Educação do Campo tomada como

processo, põe em curso lógicas formativo-educativas produzidas historicamente, como referências

que fazem parte do projeto educativo dos Movimentos Sociais Populares (MSP). Na atualidade, na

medida em que se rearticulam escolas públicas que estão no campo em projetos de escola que

incorporam tais referências, as relações advindas destas lógicas demarcam a diferença destas

escolas pois, ao desenvolverem estes projetos, desvelam-se também disputas de projetos maiores

em curso no campo brasileiro.

Na lógica formativa a materialidade conhecida é o ponto partida desde a realidade, suas

contradições e potencialidades, do trabalho como desvendamento da condição humana e da

desalienação das relações sociais, com potência para produzir novas subjetividades. Esta dimensão

combina-se com a lógica educativa produzida nas ações da função específica da escola pela

apropriação dos instrumentos e do conhecimento escolar, privilegiando as relações de estudo e

ensino.

Essas duas lógicas desenvolvem movimentações “para dentro” e “para fora” da escola,

através de um instrumental metodológico próprio, deste modo, as relações de aprendizagem, para

além de sua especificidade escolar, passam a construir ou reconstruir vínculos com as pessoas que

ali vivem, seu trabalho, sua cultura, suas organizações, seu espaço e tempo histórico e, assim,

produz-se conhecimento e resistência para fortalecer esta escola pública do campo.

Dois grandes desafios se colocam nesta perspectiva: a formação continuada de professores

no contexto de contratações temporárias em que a rotatividade esfacela os vínculos com o trabalho

e a identificação com as escolas e suas relações e, o fechamento de escolas por conta da diminuição

da população das áreas rurais e também pela crença por parte das famílias de que as escolas situadas

na cidade são melhores, o que gera certo conformismo, também, nas escolas, pois parece que estão

fadadas a desaparecer. Compreende-se que a modalidade, embora seja uma “faca de dois gumes”,

poderia dar conta dessa situação neste momento, pois sua implementação com qualidade que sabe

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resolveria estes dois limites: lotar professores nas escolas do campo de forma diferenciada e, ao

mesmo tempo, criar outras formas de espaço, tempo e trato dos conteúdos.

3. Referenciais que provocam a forma história escolar

No ano de 2015, a partir de uma necessidade de Escolas Públicas do Campo na região

sudoeste do Estado do Paraná, inicia-se um projeto de extensão com Escolas Públicas do Campo da

rede estadual de ensino do Ensino Fundamental II (EF II) e Ensino Médio (EM). Toma-se como

base as referências históricas da Educação do Campo no Brasil (CALDART, 2000 e 2012;

MUNARIM, 2008; GHEDINI, 2017), a legislação vigente (BRASIL, 2010a) e sua

institucionalização pela modalidade educacional (BRASIL, 2010b), para disputar o direito à

educação dos povos do campo, com o mesmo nível de acesso e aproveitamento que as escolas da

cidade.

Em 2015 inicia-se com duas escolas do município de Enéas Marques e uma escola no

município de Francisco Beltrão, no ano de 2017, três escolas do município de Verê passam a

participar do processo. Das seis escolas participantes, duas delas têm EM, ao todo se alcança

diretamente em torno de 90 docentes, 400 estudantes e umas 250 famílias.

No primeiro momento (de meados 2015 até julho 2017), centrou-se na formação

continuada dos educadores desde suas práticas, com foco na falta de vínculos entre a escola e o

grupo de professores por conta do Processo Seletivo Simplicado (PSS), num segundo plano inciam-

se algumas práticas com os estudantes buscando problematizar a fragmentação e repetição dos

conteúdos das disciplinas. Passa-se então a construir um instrumental metodológico que sustente

outras formas para conduzir o processo de ensino-aprendizagem e as práticas pedagógicas,

implementando o acompanhamento às escolas: professores e estudantes com a intencionalidade de

criar conteúdo e método para a modalidade de Educação do Campo, como trata o objetivo do

projeto de Extensão: Desenvolver um trabalho nas Escolas Públicas do Campo embasado nas

garantias legais conquistadas pela Educação do Campo, visando a criação de conteúdo e forma para

a modalidade da Educação do Campo priorizando ações de formação de professores, planejamento

coletivo interdisciplinar e, inserção da escola do campo na comunidade e articulação local e

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regional. Esta modalidade educacional, apesar de aprovada pela legislação, permanece inerte seja

nos desdobramentos da forma escolar ou das práticas pedagógicas (BRASIL, 2010b).

Neste período de tempo em que se desenvolve o processo de extensão junto às escolas,

percebe-se também que, o fato de cada ano, os professores serem obrigados a deixar a escola e o

processo construído por conta da forma de contratação do PSS, prejudicava também o trabalho e

desanimava os professores. A partir desta contradição que estrangula o processo de formação-

educação na escola, pensa-se numa mediação que os mantivesse articulados em torno da formação

em curso criando condições de identificação vículos como grupo de professores e projeto de escola

e passa-se a organizar uma rede de formação de educadores buscando responder a esta demanda que

desarticulava o trabalho.

Desse modo, a partir de setembro de 2017, o Projeto de Extensão torna-se permanente e

passa a atuar em duas frentes: a rearticulação destas escolas públicas do campo na perspectiva de

sistematizar possibilidades de conteúdo e forma à modalidade da Educação do Campo e, neste

processo intenso de formação, a organização de uma Rede de Formação Continuada de Professores

do Campo: “Rede de Formação de Educadores pelo fortalecimento das escolas públicas do campo:

caminhos de conhecimento e resistência – Refocar”.

Processualmente, desde 2015, ancorados nas referências históricas que compõem a

experiência que produziu a Educação do Campo no país (GHEDINI, 2017), e que estão em curso

em diferentes níveis e intensidades em inúmeras escolas públicas nos processos de Educação do

Campo, passa-se a produzir um instrumental metodológico. Toma-se como base o que está em

curso no estado e no país, recriando-se alguns instrumentos, assim como estratégias de formação

continuada dos professores, com base na realidade dos municípios e nas condições o trabalho nas

escolas.

Esta organização da prática pedagógica da escola pública do campo é mediada pelo

acompanhamento e auto-organização aos/dos professores e estudantes e à escola. Compõem-se por

ações regulares, com instrumentos metodológicos próprios que alcançam num primeiro plano a

formação dos professores, seguidos da sala de aula e nela, o ensino e o estudo e a organização do

espaço da escola promovendo um ambiente educativo.

Esta formação com ponto de partida no trabalho pedagógico da escola tem como foco o

Planejamento Coletivo e Interdisciplinar, pois se acredita que a interdisciplinaridade pode ampliar a

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apropriação do conhecimento pelos estudantes, na medida em que se diminui a fragmentação por

aproximar conteúdos das disciplinas. Ao mesmo tempo, se reconstroem os sentidos do trato com o

conhecimento escolar ao identificar os conceitos estudados na realidade dos entornos da escola.

Nesta movimentação, pedagogicamente, também, aumentam-se os vínculos entre escola,

comunidades, famílias, estudantes e professores.

É por estas convicções e constatações que se toma como ponto de partida a prática

pedagógica, iniciando pela forma de planejar que passa a se organizar com movimentações

coletivas e interdisciplinares, tendo como ponto de partida espaços e instrumentais conhecidos e

utilizados pelos professores e outros, novos. Estes ressignificados ou mesmo produzidos neste

processo de rearticulação das escolas como: as Trilhas Escola e Família, o Dossiê da Realidade dos

Entornos da Escola, as Varandas de Partilha, o próprio Planejamento Coletivo Interdisciplinar com

o Mapa de Conteúdos, o Círculo de Saberes e Conhecimentos, as Jornadas de Saberes e

Planejamento e a Auto-organização na sala de aula4.

Como vimos, o planejamento coletivo interdisciplinar se organiza com as movimentações

“para dentro” e “para fora” da escola. Na prática pedagógica, a certa altura do processo, estas

movimentações entrelaçam-se numa mesma movimentação: o conhecimento historicamente

sistematizado, a vida e a realidade onde se insere a escola e vivem os estudantes e suas famílias.

No Plano de trabalho construído no processo de planejamento, considerando-se as

movimentações para “dentro” da escola tem-se as disciplinas, os conteúdos e conceitos e a

avaliação. Considerando-se as movimentações para “fora” da escola, conta-se com o Inventário da

Realidade registrado no Dossiê da Realidade dos Entornos da Escola, que traz as Fontes Educativas

4 As referências históricas construídas pelos Movimentos Sociais, tendo como protagonista o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), em Educação do Campo foram várias. Podes-se destacar os Temas Geradores na perspectiva freireana, o Tempo (e espaço) Comunidade no Sistema de Alternância, os Eixos Temáticos, os Projetos de Vida entre outros. No ano de 2006, as DCEs da Educação do Campo, retomam a importância de que, no trato do conhecimento, a escola leve em conta a realidade em que se insere (SEED, 2006). Em várias escolas esta dimensão passou a fazer parte como mediação pedagógica. Mais recentemente foi desenvolvido um importante experimento e referência nas Escolas Itinerantes do Estado do Paraná, com os Complexos de Estudo (PISTRAK, 2003 e 2009) com base no Inventário da Realidade. O processo em curso neste projeto de extensão articula sentidos e significados destas referências, contudo optou-se por trabalhar de forma diferenciada, levando em conta a realidade da escola pública do campo e seu contexto. Um desses exemplos é o inventário da realidade que, se inicia em 2015 como um diagnóstico simples, mas, em 2017 incorpora parte do material sistematizado em Caldart (2016). A orientação posta no material indica que se faça uma experimentação prática nas escolas para dar continuidade a esta construção coletiva. De certa forma é o que se faz no projeto, o material foi adaptado para dar conta das condições de trabalho dos professores e do cotidiano das escolas (GHEDINI; BERTÉ, 2018).

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e as Porções da Realidade, os Encaminhamentos Metodológicos e a Atividade de Encontro das

Disciplinas.

Na movimentação do ensino do conhecimento historicamente sistematizado, se tratam dos

conteúdos, conceitos e objetivos das disciplinas a partir das Diretrizes Curriculares Estaduais

(DCEs), buscando aproximar estas disciplinas entre si, desde os conteúdos e conceitos na

perspectiva da interdisciplinaridade. Ressalta-se que esta aproximação não vem da realidade, mas

parte dos conceitos que estão postos como necessidade de aprendizagem, identificados estes

conceitos, busca-se esta realidade a fim de que possam ser potencializados e melhor apropriados.

Na movimentação com o Inventário da Realidade, se identifica uma Fonte Educativa e uma

Porção da Realidade que catalise os conteúdos e conceitos pela potencialidade presente na

materialidade da existência dos sujeitos. A partir deste trabalho na sala de aula, que articula o

ensino do professor ao estudo dos alunos, se desenvolvem os Encaminhamentos Metodológicos, a

Atividade de Encontro das Disciplinas e a Avaliação.

Em um dos momentos da auto-organização dos estudantes, eles têm acesso ao

planejamento coletivo da série, que fica exposto na sala de aula, juntamente com outros

instrumentos, a partir dos quais os estudantes se organizam para cumprir as atividades e as tarefas e

que lhes cabem, contando com a organização dos grupos em sala de aula.

As Trilhas Escola e Família, realizadas até duas vezes durante o ano letivo, tem a

intencionalidade de inserir a escola nas comunidades, conhecer a realidade, as peculiaridades da

vida, do trabalho e da cultura dos estudantes e estabelecer vínculos entre os sujeitos e a instituição

educativa. Além disso, este encontro entre professores, famílias e estudantes nas condições

concretas da vida, adensa em conhecimento para o Dossiê da Realidade dos entornos da escola na

medida em que as informações já contidas são encorpadas pelas observações nas relações e dados

concretos percebidos nos encontros e caminhadas realizados.

O Círculo de Saberes e Conhecimentos é outra mediação que se dá ao final de cada

trimestre, por meio do qual se reúnem as turmas de um mesmo período escolar e, cada uma

socializa o conhecimento apropriado através da Atividade de Encontro das Disciplinas. A cada

semestre organiza-se a Varanda de Partilha com ações culturais, de trabalho, de estudo, de

integração com as comunidades, agregando-se às festas como a Festa Junina, mostras de trabalhos,

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feirinhas de alimentos e artesanato, grupos de dança entre outros, convidam-se também escolas

próximas tanto da rede municipal quanto estadual.

Estas movimentações levaram a criar a rede de formação de educadores com base em

diversas ações e atividades dali desdobradas pela necessidade, como: o acompanhamento às Escolas

Públicas do Campo, a coordenação e execução de um Grupo Permanente de Estudos como um

espaço regular de troca, aprofundamento e produção de vínculos entre educadores, teoria e prática.

Além disso, o acompanhamento ao Coletivo de Educação das Escolas com a representação das

comunidades dos entornos da escola, das organizações sociais e instituições, os intercâmbios e

viagens de estudos que buscam conhecer escolas, projetos de trabalho e renda no campo,

manifestações culturais, espaços históricos entre outros.

Cada uma destas ações e dimensões é sistematizada buscando-se avançar de modo a

produzir referenciais em Educação do Campo dando conteúdo e forma à modalidade da Educação

do Campo. Dentre as sistematizações a serem produzidas, organizou-se um Caderno que inicia a

Série Escolas Públicas do Campo5.

4. Considerações Finais

O trabalho que se desenvolve neste projeto de extensão tem se mostrado bastante animador

no que se refere a constituir coletivos de educadores (professores, agentes e equipes diretivas das

escolas) voltados ao fortalecimento das escolas públicas do campo, contudo, ainda são grandes os

desafios a fim de se alcançar uma apropriação mais plena do conhecimento historicamente

sistematizado por parte dos alunos.

Contudo, considera-se que a criação da Rede de Formação, tende a consolidar um grupo de

professores que fortaleça e amplie as lutas por escolas públicas do campo, por dentro da escola,

fazendo frente ao não-fechamento. Que estas escolas possam garantir o acesso ao conhecimento

científico e estejam inseridas no lugar onde vivem estas famílias do campo, tenham estrutura

adequada e mediações que possibilitem a estes estudantes reconhecerem-se como sujeitos de um

tempo, de um lugar e de uma cultura específica, sem abrir mão do direito universal à educação.

5 Este instrumental foi sistematizado na forma de um caderno, com linguagem acessível trazendo o mapa de conteúdos, de forma a subsidiar o trabalho: “Cadernos Escolas Públicas do Campo – Volume I: Planejamento Coletivo Interdisciplinar e Instrumental Metodológico”.

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Além disso, a participação nos espaços coletivos da Educação do Campo como a

Articulação Sudoeste e Paranaense de Educação do Campo e do Fórum Nacional de Educação do

Campo (FONEC) possibilitou aos professores da escola pública, expressar sua luta e manter-se na

resistência, principalmente pelo fortalecimento e pelo não-fechamento das escolas públicas do

campo.

Este trabalho, portanto, constitui-se de movimentações com a pretensão de fazer avançar os

sujeitos coletivos e individuais no sentido de sua emancipação, ou seja, produzem-se sustentações

concretas a fim de ancorar estes sujeitos e fortalecê-los para que a luta maior se realize também

nestes processos e, neste caso, pela educação escolar e pública.

Referências BRASIL. Decreto nº 7.352 de 4 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política de educação do

campo e o programa nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA. 05 nov. 2010.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7352.htm>.

Acesso em: 10 fev. 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 4, de 13 de

julho de 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília:

MEC, 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com

_content&view=article&id=12992&Itemid=866>. Acesso em: 31 dez. 2012.

CALDART, Roseli Salete. Pedagogia do Movimento Sem Terra: escola é mais do que escola. Petrópolis,

RJ: Vozes, 2000.

GHEDINI, Cecília Maria; BERTÉ, Rosane (Org.). Planejamento Coletivo Interdisciplinar e

Instrumental Metodológico: Produção de referências com as Escolas Públicas do Campo –

Sudoeste do Paraná, 2018.

GHEDINI, Cecília Maria. A Produção da Educação do Campo no Brasil: das referências

históricas à institucionalização. Jundiaí: Paco Editorial, 2017.

PARANÁ. Diretrizes Curriculares da Educação do Campo. Governo Do Estado do Paraná.

Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Curitiba, PR: SEED, 2006.

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PISTRAK, Moisey. A Escola-Comuna. Trad. de Luiz Carlos de Freitas. São Paulo: Expressão

Popular, 2009.

PISTRAK, Moisey. Fundamentos da escola do trabalho. Trad. de Luiz Carlos de Freitas. 3 ed.

São Paulo: Expressão Popular, 2003.

THOMPSON, Edward Palmer. A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro:

Zahar, 1981.

MÉSZÁROS, István. A educação para além do capital. Tradução de Isa Tavares. São Paulo:

Boitempo, 2005.

MUNARIM, Antônio. Movimento nacional de educação do campo: uma trajetória em construção.

In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 31., 2008, Caxambu. Trabalhos GTs. Caxambu, 2008.

Disponível em: <http://31reuniao.anped.org.br/1trabalho/GT03-4244--Int.pdf>. Acesso em: 10 ago.

2013.

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EIXO TEMÁTICO 2:

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO, NÍVEIS DE ENSINO E POLÍTICAS

PÚBLICAS

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EDUCAÇÃO DO CAMPO E AVALIAÇÃO ESCOLAR: CLASSIFICATÓRIA X

EMANCIPATÓRIA

Marcos Willian da Silva Santos1

Carlos Antônio Bonamigo2

Eixo Temático 2: Escolas Públicas do Campo, Níveis de Ensino e Políticas Públicas

Resumo: O processo ensino aprendizagem é objeto de muitas pesquisas e reflexões em busca de melhores aprendizagens. Esta pesquisa tem como objetivo de compreender o sentido de avaliação escolar e suas concepções, para propiciar condições para que os resultados da avaliação sirvam de subsídios para a investigação e para posteriores melhorias nesse processo. O presente trabalho é resultado da disciplina Avaliação de Aprendizagem, oferecida no Curso de Especialização em Docência no Ensino Superior da Faculdade de Ampére (FAMPER), foi desenvolvido este trabalho. Utilizaram-se as contribuições de alguns pensadores brasileiros como Hoffmann, Luckesi e Libâneo. Também os estudos de Perrenoud serviram de fonte de pesquisa na construção deste estudo. Assim, procurou-se apresentar algumas considerações sobre dois tipos de avaliação: a avaliação classificatória e avaliação formativa, sendo a primeira considerada um processo de seleção em que se classificam os alunos em bons e ruins, conforme a nota da prova. Já a segunda, avaliação formativa, está a serviço das aprendizagens. Com isso, percebe-se a importância de repensar as práticas avaliativas, pois quando bem utilizada é uma ferramenta importante para obtenção das aprendizagens significativas. A pesquisa aponta para dados promissores, apesar de ainda aparecerem contradições, o grupo docente se preocupa em fazer uma avaliação que forme para a vida e não apenas que classifique os alunos em bons ou ruins. Palavras-chave: Avaliação classificatória; Avaliação formativa; Educação do Campo.

Introdução

1 Mestrando em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) campus Francisco Beltrão, bolsista da Fundação Araucária; Graduado em Licenciatura em Matemática com Ênfase em Computação pela Faculdade de Ampére (FAMPER). E-mail: [email protected] 2 Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor Adjunto da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. E-mail: [email protected]

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O presente trabalho é resultado da disciplina Avaliação de Aprendizagem, oferecida no

Curso de Especialização em Docência no Ensino Superior da Faculdade de Ampére (FAMPER), foi

desenvolvido este trabalho, como requisito parcial da nota final para adquirir a aprovação na

disciplina.

De acordo com o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro

Machado, a raiz etimológica de avaliar vem do latim valere, que significa ter saúde, vigor,

força. Resultou em Português, entre outras, em “valia”, da qual se formou avaliar.

Falar sobre avaliação não é tão simples, pelo contrário, é um tema que gera grandes

discussões e aborda vários aspectos, tanto negativos como positivos. A avaliação da aprendizagem

escolar não ocorre apenas em provas e exames que são aspectos classificatórios, essas têm por

finalidade verificar o desempenho do aluno em determinado assunto, assim, aprovando-o ou

reprovando-o. Segundo Luckesi (1996, p. 169), “a prática de provas/exames escolares que

conhecemos tem sua origem na escola moderna, que se sistematizou a partir dos séculos XVI e

XVII, com a cristalização da sociedade burguesa”.

A denominação Avaliação da Aprendizagem é recente, porém a prática continua a mesma,

em que o processo de crescimento do educando é mensurado por meio de provas e exames. Avaliar

não se restringe somente a fazer provas e aplicar trabalhos. Desde o momento que entra na sala de

aula, o professor já faz uma avaliação ao olhar para os alunos, avalia sua apresentação pessoal, seu

material de estudo, suas tarefas, a forma que se comunica com os colegas, etc. Também ao

conversar com o aluno, o professor o avalia, nos seus gestos, na sua maneira de se comportar e

pensar. A avaliação não acontece em um só momento, ela acontece o tempo todo. Segundo

Hoffmann (1996, p. 66): Quando a finalidade é seletiva, o instrumento de avaliação é constitutiva,

prova é irrevogável. Mas as tarefas na escola deveriam ter o caráter problematizador e dialógico,

momentos de troca de ideias entre educadores e educandos na busca de um conhecimento

gradativamente aprofundado.

A partir dessa citação é possível perceber que o ato de avaliar não se destina a um

julgamento, pois não é um ato seletivo. A avaliação se destina à inclusão e ao diálogo, em busca de

uma aprendizagem satisfatória. É de grande importância, que a ação avaliativa seja uma avaliação

mediadora. Assim, a escola deve ter o objetivo de propiciar condições para que os resultados da

avaliação sirvam de subsídios para a investigação e para posteriores melhorias nesse processo. É

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importante que no espaço escolar haja trocas de conhecimento, metodologia de ensino adequada aos

conteúdos a serem ministrados e interações sociais acolhedoras.

Segundo Luckesi (1996, p. 172), “a avaliação tem por base acolher uma situação, para,

então (e só então), ajuizar a sua qualidade, tendo em vista dar-lhe suporte de mudança, se

necessário.” Desta forma, percebe-se o quanto a avaliação é importante para o progresso do aluno,

pois, mesmo apresentando dificuldades, ele pode ser incluído ao círculo de aprendizagens, para que

haja um diagnóstico e assim conseguir melhores resultados.

A avaliação no contexto escolar

A avaliação escolar, além de suas prerrogativas legais, definidas na legislação

educacional, ancorada nestes princípios norteadores, precisa estar definida no âmbito da

unidade escolar. Assim, o projeto político pedagógico de cada uma das escolas é o

documento que orienta as práticas avaliativas e determina de que forma o processo

avaliativo é pensado pelos educadores. Esta construção é coletiva e representativa da

docência para cada um dos componentes curriculares.

Geralmente os procedimentos habituais de avaliação nas escolas, segundo

Perrenoud (2007), são caracterizadas da seguinte forma: 1) Após ter ensinado um

capítulo, algumas lições, o professor interroga alguns alunos oralmente ou faz uma

prova escrita para turma toda; 2) Em função de seus desempenhos, os alunos recebem

notas que são registradas e levadas aos conhecimentos dos pais; 3) Ao final do semestre

ou do ano, faz-se uma síntese das notas ou das apreciações acumuladas sob a forma de

uma média; 4) Combinando as apreciações de uma mesma natureza para o conjunto das

disciplinas ensinadas, esse balanço contribui para uma decisão final do ano escolar, e

obtenção ou não de um certificado. Desta maneira, essas características definem bons e

maus alunos, classificando-os entre si.

As características acima, baseadas nos estudos de Perrenoud (2007) apontam

para uma avaliação tradicional, baseada na comparação e em normas. Perrenoud (2007,

p.66), ainda comenta: Às vezes diz-se que essa avaliação é normativa, no sentido de criar uma distribuição normal. É também comparativa: os desempenhos de alguns se

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definem em relação aos desempenhos dos outros mais do que a domínios almejados ou a objetivos.

Com isso, percebe-se que ao fazer essas comparações, o desenvolvimento da

capacidade do aluno não é alvo do sistema educacional brasileiro, pois o foco são

somente as notas obtidas em provas. Luckesi (1996), diz que as notas são adoradas por

professores e alunos. O professor adora-as porque mostra seu poder de aprovar ou

reprovar e o aluno vive em busca dela porque precisa da mesma, não importando uma

aprendizagem satisfatória ou não, afinal é a nota que domina tudo e é em função disso

que se vive na prática escolar.

Este modo de avaliação ainda existe em muitas escolas, porém, algumas, mesmo

que parcialmente, desfizeram-se deste modo de avaliar. Atualmente, os sistemas de ensino

procuram adequar-se às normatizações do processo de avaliação e promovem amplas

discussões para avançar na compreensão de um sistema avaliativo mais abrangente das

práticas oriundas do processo ensino e aprendizagem.

Conforme Perrenoud, (2007, p. 66):

A análise desses sistemas mostra que, soltando as amarras da avaliação tradicional, facilita-se a transformação das práticas de ensino em pedagogias mais abertas, ativas, individualizadas, abrindo mais espaço à descoberta, à pesquisa, aos projetos, honrando mais os objetivos de alto nível, tais como aprender a aprender, a criar, a imaginar, a comunicar-se.

A avaliação da aprendizagem escolar deve ser um processo contínuo de ação e

reflexão por parte dos alunos e dos professores, estabelecendo diálogos entre si e

visando a construção de aprendizagens e conhecimentos significativos. Luckesi

(1996, p. 45) alerta que “é preciso que os conceitos ou notas médias de aprovação

signifiquem o mínimo necessário para que cada “cidadão” se capacite para governar”.

As concepções que permeiam a avaliação no contexto escolar

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As concepções mais presentes de avaliação, de acordo com Romão (2005) e

Pereira (2006) estão ordenadas de acordo com o tipo e a função que desempenham na

escola. Segundo eles, os tipos de avaliação podem ser:

• Avaliação Formativa – ocorre durante o processo de ensino e de aprendizagem do

aluno com o objetivo de fornecer informações do desenvolvimento dos alunos, a fim de

identificarem falhas no processo para então sugerir o melhor procedimento, o que

ajudará na superação das dificuldades. De acordo com esse tipo de avaliação, a qual

deveria ocorrer ao longo do processo de ensino e de aprendizagem do aluno, de maneira

continuada, com o intuito de verificar se os alunos estão atingindo os objetivos propostos

e quais os resultados alcançados durante o desenvolvimento das atividades de ensino.

• Avaliação Diagnóstica- permite ao professor identificar em que momento do processo

de construção do conhecimento o aluno se encontra, para identificar as atividades

pedagógicas que irão favorecer a aprendizagem, contrariando a avaliação que tem por

finalidade classificar e punir o aluno, pois a avaliação diagnóstica tem por finalidade

abolir a repetência. Entendemos que a avaliação não deve se constituir apenas em um

julgamento, mas sim num diagnóstico onde o professor possa verificar pontos positivos

e falhos desse processo, e que com isso possa refletir em melhorias na vida das pessoas.

• Avaliação Mediadora – é caracterizada pelo acompanhamento do processo de

aprendizagem do aluno, no sentido de ajudar a melhorá-la, através da discussão das

razões de sua efetivação ou não, entre aluno e professor, na busca de soluções.

• Avaliação Emancipatória – está relacionada aos programas educacionais e sociais,

sendo voltada para avaliar e transformar, para que se possam efetivar ações de

transformação e emancipação de uma dada realidade escolar.

• Avaliação Dialógica – contrapõe-se à avaliação com a finalidade de classificar e punir,

sendo identificada com uma escola democrática, transdisciplinar e plural, difundida e

defendida com base nos ideais de Paulo Freire.

• Avaliação Somativa ou Tradicional – ocorre ao final de cada etapa com a finalidade de

verificar se o aluno aprendeu; está relacionada com a nota, podendo ser sinônimo de

seleção e classificação (como os concursos de vestibulares, o Peies e os concursos

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públicos em geral), está associada aos padrões universais de conhecimento.

Examinar e medir para avaliar

Nesta perspectiva da Pedagogia Tradicional em que a avaliação é feita por meio de

provas e exames ganhou um grande espaço no processo ensino aprendizagem. Conforme

aponta Luckesi (1996, p.17):

A característica que de imediato se evidencia na nossa prática educativa é de que a avaliação da aprendizagem ganhou um espaço tão amplo nos processos de ensino que nossa prática educativa escolar passou a ser direcionada por uma “pedagogia do exame”.

O mais visível desta pedagogia está na prática de ensino em que todas as

atividades estão voltadas para a resolução de provas e exames. Esta prática ainda está

presente em muitas escolas hoje em dia. Segundo Luckesi (1996, p. 18): “o nosso

exercício pedagógico escolar é atravessado mais por uma pedagogia do exame que por

uma pedagogia do ensino/aprendizagem”.

Avaliar para classificar ou para regular

A avaliação classificatória, herdada da pedagogia tradicional, durante sua

vigência nomeou os alunos em bons ou ruins. Nesse contexto Perrenoud (2007, p.11)

afirma:

A avaliação é tradicionalmente associada, na escola, à criação de hierarquias de excelência. Os alunos são comparados e depois classificados em virtude de uma norma de excelência, definida em absoluto ou encarnada pelo professor e pelos melhores alunos.

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Com isso, o ato de avaliar não serve para pensar os conteúdos ensinados, mas sim

para classificar os alunos, conforme seu desempenho, marcando a vida do educando.

Luckesi (1996, p.35) aponta que:

O educando como sujeito humano é histórico; contudo, julgado e classificado, ele ficará, para o resto da vida, do ponto de vista do modelo escolar vigente, estigmatizado, pois as anotações e registros permanecerão, em definitivo, nos arquivos e nos históricos escolares, que se transformam em documentos legalmente definidos.

Avaliar para qualificar

Adota-se, neste estudo, que o processo de avaliação deva se dar numa concepção

mediadora e formativa. Quando se pensa na avaliação da aprendizagem escolar como

momento para qualificar o educando, percebe-se que prevalecem os aspectos qualitativos

sobre os aspectos quantitativos. Desta maneira é deixado de lado o instrumento

simplesmente de classificação. Para isso precisa-se recuperar a função diagnóstica da

avaliação. A orientação dada pela LDB diz que:

V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios:

a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais; b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar; c) possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado; d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito; e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos (LDB 9394/96 Art. 24, inciso V, 1996).

Concordando com os preceitos normativos da LDB, Luckesi (1996, p.43) comenta

que:

Para não ser autoritária e conservadora, a avaliação terá de ser diagnóstica, ou seja, deverá ser instrumento dialético do avanço, terá de ser instrumento da identificação de novos rumos. Enfim, terá de ser o instrumento do

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reconhecimento dos caminhos percorridos e da identificação dos caminhos a serem perseguidos.

Uma avaliação feita por diagnóstico e não somente por meio de notas e exames não

quer dizer que será menos rigorosa, será apenas menos autoritária e mais em busca de

transformação. Luckesi (1996, p.44) afirma:

Ao contrário, para ser diagnóstica, a avaliação deverá ter o máximo possível de rigor no seu encaminhamento. Pois que o rigor técnico e cientifico no exercício da avaliação garantirão ao professor, no caso, um instrumento mais objetivo de tomada de decisão. Em função disso, sua ação poderá ser mais adequada e mais eficiente na perspectiva da transformação.

Educação do Campo e a avaliação na docência dos anos iniciais e finais

Nos anos iniciais do ensino fundamental, o processo ensino e aprendizagem

visa atender às necessidades escolares de cada aluno, inserindo-o no processo de

alfabetização e letramento. Por se tratar de um processo individual, a prática docente é

imprescindível para que as potencialidades possam ser desenvolvidas de forma

gradativa e plena. Assim, a avaliação precisa atender a estas características, primando

pelo aspecto emancipatório, conforme diz Saul (1995, p.61):

A avaliação emancipatória caracteriza-se como um processo de descrição, análise e crítica de uma dada realidade, visando transformá-la. [...] Está situada numa vertente político-pedagógica cujo interesse primordial é emancipador, ou seja, libertador, visando provocar a crítica, de modo a libertar o sujeito de condicionamentos deterministas. O compromisso primordial desta avaliação é o de fazer com que as pessoas direta ou indiretamente envolvidas em uma ação educacional escrevam a sua “própria história” e gerem suas próprias alternativas de ação.

A perspectiva emancipatória objetiva formar um sujeito, ator de seu próprio

aprendizado, libertando-o dos modelos classificatórios, para que se apropriem dos saberes

de melhor forma.

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Além da avaliação na perspectiva emancipatória, há, também, a avaliação de

caráter formativo, que de acordo com Macedo (2007, p. 118) é:

Uma avaliação formativa ajuda o aluno a compreender e a se desenvolver. Colabora para a regulação de suas aprendizagens, para o desenvolvimento de suas competências e o aprimoramento de suas habilidades em favor de um projeto. Um professor comprometido com a aprendizagem de seus alunos utiliza os erros, inevitáveis sobretudo no começo, como uma oportunidade de observação e intervenção. Com base neles, propõe situações-problema cujo enfrentamento requer uma nova e melhor aprendizagem, possível e querida para quem a realiza.

Para obter essa prática docente crítica, construtiva e formativa, é fundamental

que haja uma avaliação feita com qualidade e com o objetivo de formar os educandos

para que eles aprendam e se desenvolvam individual e coletivamente.

O acesso universal ao ensino, a permanência na escola e a qualidade

satisfatória da educação são elementos básicos para garantir uma educação que visa o

desenvolvimento do aluno. Todavia, Luckesi (1996) afirma que nem todas as crianças

têm acesso ao ensino, as que têm não permanecem e as que permanecem nem sempre

obtêm um ensino de qualidade.

Para obtenção da prática docente crítica, construtiva e formativa além de um bom

planejamento é necessária uma avaliação fundamentada nos estudiosos da mesma e que

preencha os requisitos previstos na legislação de ensino, pois além de ajudar os alunos no

processo ensino e aprendizagem, ela serve também como um sistema de crítica do próprio

projeto elaborado pelo professor. A avaliação tem um olhar crítico, capaz de analisar e

verificar em que se deve melhorar nos planos de ação, ou seja, no processo ensino

aprendizagem. Para confirmar isso, Luckesi (1996, p. 117) diz que:

Neste nível, a avaliação é um constante olhar crítico sobre o que se está fazendo. Esse olhar possibilita que se decida sobre os modos de como melhorar a construção do projeto no qual estamos trabalhando. Aqui a avaliação contribui para identificar impasses e encontrar caminhos para superá-los; ela subsidia o acréscimo de soluções alternativas, se necessárias, para um determinado percurso de ação, etc.

A avaliação é um instrumento da prática educativa que permite constatar se os

métodos que vêm sendo praticados estão tendo eficácia na consecução dos objetivos

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propostos. É de grande relevância que o professor discuta com os alunos sobre as

atividades propostas para a concretização dos objetivos que se pretende alcançar, pois o

processo avaliativo é parte fundamental do fazer pedagógico.

Dessa forma, podem-se perceber duas lógicas do sistema: a avaliação formativa, e

a classificatória. A mais tradicional e conhecida, voltada às exigências burocráticas é a

classificatória, que privilegia as notas dos alunos, valor mínimo exigido para o sucesso ou

exclusão do processo. Já a necessária para realmente formar o aluno é avaliação

formativa que se volta especificamente à aprendizagem do aluno e continuamente quando

o professor lhe confere valores para alcance do mínimo exigido legalmente para sua

promoção.

Sobre essas duas lógicas do sistema, Perrenoud (1999, p. 18) afirma que:

A avaliação tradicional, não satisfeita em criar fracasso, empobrece as aprendizagens e induz, nos professores, didáticas conservadoras e, nos alunos, estratégias utilitaristas. A avaliação formativa participa da renovação global da pedagogia, da centralização sobre o aprendiz, da mutação da profissão do professor: outrora dispensador de aulas e lições, o professor se torna o criador de situações de aprendizagem “portadoras de sentido e regulação”.

A avaliação para Hoffmann (2003) deve ser um elemento que subsidie o professor

dando‐lhe informações sobre a evolução dos educandos, para que possa a partir dessas rever

mecanismos e melhores caminhos a ajudá‐los em sua aprendizagem.

Procuramos saber ainda a respeito de como acontece o planejamento9 e os encontros

pedagógicos na instituição de trabalho. Os três professores informaram que ambos (planejamentos

e encontros pedagógicos) se sucedem quinzenalmente, e neles além de cumprirem com os

objetivos traçados, estudam casos e peculiaridades de sua prática e da sociedade, relacionando com

fundamentos teóricos, ampliando as chances de compreenderem e encontrarem alternativas para

os problemas presentes à sua ação pedagógica.

Os docentes precisam desenvolver capacidades de aprendizagem da relação, da convivência, da cultura do contexto e da interação de cada pessoa com o resto do grupo, com seus semelhantes com a comunidade que envolve a educação. (IMBERNÓN, 2010 p.19)

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O educador deve na práxis pedagógica agir como agente reflexivo, se tornar reflexivo

diante dos fatos e dos acontecimentos, não ser passivo ao conhecimento, e sim, interagir com o

mesmo de forma autônoma, dinâmica, criativa e investigadora.

Esta capacidade de interagir com o conhecimento de forma autônoma, flexível e criativa é a melhor preparação para a vivência no nosso mundo supercomplexo, incerto, sempre pronto a exigir novo saberes, inspiradores de novas ações. (ALARCÃO, 2008 p. 30)

Adquirindo esta capacidade de reflexão e interação com o conhecimento sua consciência

transcenderá e deixará de ser um instrumento manipulado pelo poder das ideologias10 dominantes.

Por fim, pedimos aos professores que destacassem dois pontos negativos e positivos no programa

em discussão, elucidando nos pontos positivos suas contribuições à aprendizagem dos alunos e

também a sua práxis educativa.

As respostas dos educadores em alguns momentos foram convergentes, pois dois dos três

docentes informaram, que dentre os pontos positivos poderiam destacar: a aproximação dos

conteúdos teóricos ao contexto social e a proposta pedagógica de caráter interdisciplinar que o

programa oferece com materiais e recursos didáticos (mapas ilustrativos, livros literários e

científicos, globos terrestres, maquetes, ábacos e etc.).

A educação, enquanto se propõe a formar o cidadão para viver uma vida em sentido mais pleno possível de modo que possa conhecer e transformar sua situação social e existencial marcada pela complexidade e globalidade, mostra a necessidade de adotar o fenômeno da interdisciplinaridade. (FAZENDA, 2008 p.03)

Desenvolver uma educação que trilhe pelo caminho da interdisciplinaridade para Fazenda

(2008) é proporcionar a escola um trabalho que possibilite ao aluno construir um conhecimento

aplicável ao contexto prático da vida, oferecendo subsídios para que utilize como instrumento para

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ler o mundo, interpretá‐lo e nele intervir com segurança e responsabilidade, despertando o gosto e

o prazer pelo saber.

Para os docentes, os pontos mencionados anteriormente, possibilitam saírem das práticas

tradicionais (que durante um longo período esteve arraigado nas práticas de muitos professores

que lecionavam no campo), oferecendo agora uma maior conexão entre a realidade e o fazer

educação, esta consciente e também vivencial.

Ademais, outro entrevistado acrescentou que o programa também favorece um maior

contato entre os discentes, visto que eles atuam juntos nos grupos de estudos, criando relações de

amizade e companheirismo.

Sobre os pontos negativos o que mais se destacou, sendo citado pelos três professores diz

respeito à dificuldade de se atuar com turmas multisseriadas e alunos com idades irregulares.

Um dos professores em seu discurso utilizou a seguinte expressão sobre o problema

abordado: “Não adianta termos materiais diversos, encontros e mais encontros discutindo os

problemas dos alunos, se nada é feio para mudar a realidade da sala.”.

Para ele, o programa tem muito a oferecer a aprendizagem dos discentes, contudo o

problema das turmas multisseriadas minimizam algumas vezes as chances de sucesso, gerando

assim desmotivação em ambos os sujeitos (alunos e professores) do processo educativo.

Contudo, pontuamos que o cenário apresentado pelos professores nos faz acreditar que o

programa Escola Ativa, atualmente mencionado, como uma esperança e oportunidade de efetivar

uma melhor educação às populações do campo contribui positivamente à aprendizagem dos alunos

e ainda à prática educativa dos docentes logo, busca desarraigar‐se do ensino tradicional e

enciclopédico para um ensino vivencial e dialógico.

Considerações Finais

Esta pesquisa buscou apresentar uma reflexão sobre as práticas avaliativas. Dentre elas,

focou-se na avaliação classificatória e a avaliação formativa. Percebe-se que mesmo os

entrevistados destacarem a avaliação formativa como a melhor opção para avaliar o ensino

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aprendizagem, ainda assim, é preciso rever as concepções avaliativas, pois muitos ainda tendem a

confundir o processo de avaliação com a prova/exame em si.

Urge substituir a tradicional avaliação classificatória por uma pedagogia de permanência

na escola, de sucesso e oportunidades para todos na busca de aperfeiçoar o processo de

ensino/aprendizagem, utilizando-se da avaliação formativa como um recurso relevante nesta busca

de aprender. No decorrer do trabalho percebe-se que provas e exames não devem ser considerados

avaliação, e sim instrumentos da mesma.

Referências

ALARCÃO, I. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

ARROYO, M. G.; CALDART, R. S.; MOLINA, M.C. (org.). Por uma educação do campo.

Petrópolis: Vozes, 2004.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/96 - as diretrizes e

bases da educação nacional. Brasília/DF/BRA: Diário Oficial da União, 23 de dezembro

de 1996. Disponível em http://www.presidencia.gov.br/cci vil_03/Leis/L9394.htm.

Acesso: 09 nov. 2018.

FAZENDA, I. O que é interdisciplinaridade? São Paulo: Cortez, 2008.

HOFFMANN, D. M. R; SZYMANSKI, M. L. A existência de duas lógicas da avaliação:

classificatória e formativa, no discurso do docente de ensino médio. Educere, 2007. Disponível em:

http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2007/anaisEvento/arquivos/CI-389- 05.pdf.

HOFFMANN, J. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré‐escola à universidade.

20. ed. Porto Alegre: Editora Mediação, 2003.

IMBERNÓN. F. Formação docente e profissional: formar‐se para a mudança e a incerteza. 8. ed.

São Paulo, 2010. (coleção questões da nossa época; V 14.)

LUCKESI, C. C. Avaliação da aprendizagem escolar. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1996.

MACEDO, L. de. Avaliação na educação. Marcos Muniz Melo (Organizador). 2007.

MACHADO, J. P. Dicionário da língua portuguesa contemporânea. da Academia

das Ciências de Lisboa. J.M., 2003.

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PEREIRA, D. B. O regime de progressão continuada e as implicações na

organização escolar em escolas da rede estadual de ensino do município de

Santa Maria/RS. 2006. Dissertação (Mestrado em Educação). Centro de Educação,

Universidade Federal de Santa Maria – RS. 2006.

PERRENOUD, P. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes

Médicas Sul, 2000.

ROMÃO, J. E. Avaliação dialógica: desafios e perspectivas. 6. ed. São Paulo/BRA:

Cortez. 2005.

SAUL, A. M. Avaliação emancipatória: desafio a teoria e a prática da avaliação e

reformulação de currículo. São Paulo: Cortez, 2000.

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O ACESSO E A PERMANÊNCIA À EDUCAÇÃO ESCOLAR NO MUNICÍPIO DE

RENASCENÇA-PR: UM ESTUDO DE CASO SOBRE O DIREITO À EDUCAÇÃO DO

CAMPO

Iliane Bavaresco Groff1

Clésio Acilino Antônio2

Eixo Temático 2: Escola Pública do Campo, Níveis de Ensino e Políticas Públicas

Resumo: Este artigo trata sobre um fenômeno educativo pouco comum na Região Sudoeste do Paraná, que é a unificação do acesso à Educação escolar da Pré-escola aos Anos iniciais do Ensino Fundamental em uma única escola urbana, devido ao do fechamento de todas as escolas do rurais/do campo. A situação descrita é contraditória frente a uma realidade em que metade dos habitantes do município reside no campo, como também por possuir oito assentamentos e nove acampamentos da reforma Agrária. Entre suas particularidades da discussão, o artigo apresenta questões relacionadas ao direito à educação escolar mediante o processo de nucleação e utilização do transporte escolar associado às políticas públicas de não oferta da Educação do Campo para as crianças do município. Para isso, tratou essas questões a partir de estudos que trabalham na perspectiva do direito à educação, principalmente com enfoque nas problemáticas sociais e educativas para os sujeitos do campo. Apesar dos avanços da valorização da Educação do Campo nacionais, o artigo registra os resultados da pesquisa a qual aponta para as contradições entre o que está transcrito nos parâmetros normativos da legislação educacional, como em algumas normativas complementares, em relação ao que tem sido praticado nacional e localmente como políticas de acesso e permanência das crianças às escolas do campo. Este artigo é resultado de uma pesquisa de mestrado1 que investigou as reais condições de acesso e da permanência à educação escolar de crianças do campo no município de Renascença-PR

Palavras-chave: Políticas educacionais; Direito à educação; Educação do Campo; Nucleação. 1 Mestranda em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão. Professora Pedagoga da Rede Estadual de Ensino do Paraná/ SEED. 2 Doutor em Educação. Docente nos Cursos de Pedagogia e Mestrado em Educação na Universidade Estadual do Oeste do Paraná/ UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão. 1 Este artigo é resultado da Dissertação do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação – nível de Mestrado – Área de concentração: Educação – Linha de Pesquisa 02: Sociedade, Conhecimento e Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão, defendida no ano de 2018.

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Introdução

Entre as políticas públicas de incentivo à educação escolar encontra-se as ações que

envolvem o acesso e a permanência. Não há como desvincular o direito à educação do acesso,

permanência e do sucesso escolar. Este artigo discute essas relações do direito à educação no

município de Renascença, com enfoque à Educação do Campo dos sujeitos campesinos da região.

Este artigo trata de questões envolvendo o processo de municipalização, nucleação e

fechamento de todas as escolas rurais do município. O trabalho discute sobre quais são os percursos

e as múltiplas determinações que interferem no direito à educação dos povos campesinos, em uma

realidade que não possui escolas do campo em um município considerado rural, cuja realidade

concreta apresenta inúmeros assentamentos e acampamentos da Reforma Agrária.

Esta pesquisa aponta para questões pertinentes à unificação e nucleação da educação escolar

em um município basicamente rural. A análise sobre essa realidade existente visou compreender a

dinâmica social e educativa que envolvia a escola municipal, as contradições e reações perante o

acesso e a permanência das crianças do campo em uma única instituição urbana. Por meio da

análise documental, entrevistas semiestruturadas, observações da realidade educativa e estudos

bibliográficos, buscou-se compreender as determinações que interferem no direito à educação

dessas crianças.

No primeiro momento, discute-se sobre o direito à Educação do Campo e seus significados

sociais e educacionais para o processo de escolarização. A segunda parte envolve a discussão sobre

o fechamento e nucleação das escolas no município de Renascença e as questões do acesso e

permanência à educação escolar de crianças do campo na única escola municipal, urbana. Na

terceira parte são discutidos aspectos que envolvem a questão do transporte escolar e os problemas

que são causados por essa complexa de mobilidade dos alunos à escola urbana. Por fim,

apresentam-se as considerações finais, constituídas por considerações acerca das contradições

envolvidas no caso educacional do município de Renascença para a Educação do Campo para os

sujeitos do campo.

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Educação do Campo uma questão de direito

Pensar em uma educação do campo significa valorizar todos os sujeitos que fazem parte

desse processo, sejam mulheres, homens, crianças, jovens, idosos (ARROYO, 2004), enfim, a

valorização do coletivo, pois não é um processo isolado, envolve a construção de uma nova

realidade.

O conceito Educação do Campo foi construído ao longo do tempo mediante a luta,

militância e resistência desses movimentos sociais, tendo como eixo de condução de seus

significados sociais sobre o trabalho, a cultura, o conhecimento e lutas da classe trabalhadora, que

visam ampliar as “[...] concepções de política pública, de educação e de formação humana”

(CALDART, 2012, p. 258).

Um importante marco na luta pelo direito à educação básica do campo ocorreu com o

rompimento do conceito educação rural para educação no e do campo. Em que “[...] No: o povo tem

direito a ter educação no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma educação pensada desde o

seu lugar e com sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais”

(CALDART, 2002, p. 26).

O conceito Educação do Campo contempla muito mais do que o saber escolar. Envolve todo

processo formador dos sujeitos do campo2, abrange a luta e as formas de resistência ao longo da

história, a tomada de consciência sobre os direitos sociais dos trabalhadores do campo e militância

por uma sociedade mais justa e igualitária.

Para Arroyo (2008), mais que a proposta de ensino, a Educação do Campo deve ter uma

proposta de educação. Para o autor, é necessário mais radicalidade no enfrentamento aos problemas

da expansão da Educação do Campo. Ou seja,

Fala-se de uma melhor gestão, da nucleação, do transporte, porém não se trata de gerir melhor o que não queremos e sim de se contrapor a isso. Não de dizer: "- Senhor Secretário, Senhora Secretária que não falte ônibus, nem nos dias de chuva e atoladeiro!" Não é isso! Basta de pegar nossos filhos e carregá-los para fora de seu ambiente cultural e social. (ARROYO, 2008, p. 46)

2 O Ministério da Educação caracteriza como homem do campo “[...] agricultores, criadores, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, caiçaras, quilombolas, seringueiros [...]” (BRASIL, 2007, p.9) possuem direito a uma Educação do Campo de qualidade no lugar onde vivem. O documento destaca que historicamente não houve equidade entre a educação do campo e da cidade, para os sujeitos do campo a expansão da educação ocorreu de forma precária com conhecimentos rudimentares, necessárias para o desenvolvimento de tarefas simples.

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Quanto ao direito à Educação do Campo, Arroyo é enfático ao defender “[...] que o ensino

até pode se dar na escola urbana, para os filhos do campo, mas educação não. Por que educação

não? Porque Educação do Campo só floresce no campo” (ARROYO, 2008, p.46). Consiste, assim,

o ato de educar na formação humana em todas as suas dimensões,

[...] e somente nos formamos sujeitos humanos, culturais, cognitivos, éticos, de memória, de emoção e de indignação, no lugar, na terra. O direito à terra é importante por quê? Só porque nos dá batata, feijão e arroz? Não, porque nos dá identidade, cultura, valores, porque isso faz parte de nossa formação como sujeitos humanos.

Com relação ao reconhecimento dos direitos dos sujeitos do campo, Moretti (2016, p. 253)

salienta que, “de acordo com o princípio constitucional da igualdade, grupos marginalizados devem

poder gozar dos mesmos direitos e de seus benefícios tanto quanto faz a população dominante”. No

entanto, o direito à educação dos sujeitos do campo exige a atenção constante dos movimentos

sociais populares do campo em cobrarem do poder público ações que venham a garantir e ampliar

os direitos construídos historicamente.

Os movimentos sociais populares contestam “[...] as barreiras autoritárias e ampliam

progressivamente os espaços da democratização que [...] interferem na redução das diferenças de

poder”, sendo um processo de luta social que significa discutir as ações de enfrentamento “[...] que

levam à expressão das necessidades que as classes populares do campo apresentam, de várias

formas ou possibilidades na sociedade” (ANTONIO, 2013, p. 64). Neste processo, as necessidades

populares são “[...] construídas na multiplicidade de experiências dos homens e mulheres em

coletivos presentes no movimento por uma educação do campo” (ANTONIO, 2013, p. 65), que faz

emergir novas formas de compreender o que significa o direito à igualdade e à diferença.

Aos trabalhadores do campo e da cidade, o direito à igualdade representou uma conquista

muito importante, principalmente por acabar com alguns privilégios da classe dominante (HAGE,

2016). No entanto, o ser humano é complexo, pertencente a diferentes grupos e realidades que

formam sua identidade. A padronização nos modelos de igualdade, embora pareça à proposta ideal,

não corresponde à especificidade de determinados grupos e seu direito democrático de conceber a

vida e a cultura, acabando por gerar conflitos e exclusão social, como é o caso dos povos

campesinos.

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Embora a Constituição de 1988 e a LDB 9394/96 tenham sido um importante avanço para a

educação nacional, a lei por si só não promove mudanças, pois é algo que regulamenta o que é

permitido, mas não diretamente constituído na realidade social. A contribuição dos movimentos

sociais foi fundamental na conquista de novos direitos para educação escolar, porque “[...] por essa

razão, a sociedade civil, por meio dos movimentos sociais, deve manter-se organizada para garantir

a sua efetivação e cumprimento” (PELLIN, 2017, p. 33).

Muitas leis nacionais, nas décadas de 2000 e 2010, principalmente pela ação dos

movimentos sociais populares do Campo, são aprovadas em prol do direito à Educação do Campo,

embora apresente o caráter contraditório à alteração da realidade social, foram determinados novos

marcos nacionais com a efetivação de políticas públicas em prol à Educação no e do Campo.

Alguns destaques são importantes para representar esse processo: Resolução nº 01/2002 CEB/CNE

que institui as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas escolas do campo; Parecer nº

01/2006 CEB/CNE – Pedagogia da Alternâncias; Resolução 02/2008 CEB/CNE – Diretrizes

complementares para o atendimento à Educação do Campo; Resolução nº 04/2010 CEB/CNE –

Diretrizes Curriculares Nacionais que reconhece a Educação do Campo como modalidade da

Educação Básica; Decreto nº7352/2010, Presidência da República, estabelece o PRONERA e Lei nº

12.960/2014, Presidência da República, que altera a lei 9394/1996, constando a exigência de

manifestação de órgãos normativos do sistema de ensino para o fechamento de escolas do campo,

indígenas e quilombolas.

Mesmo com essas regulamentações referentes ao direito à Educação do Campo, a

precariedade de muitas escolas do perímetro rural denuncia a ausência do Estado nessas

instituições. Os investimentos que visariam melhorias dessas escolas são racionados, sustentando a

tese de que os direitos constitucionais estão bem fundamentados, o que falta é o cumprimento por

parte dos entes federados do que está legislado. A descentralização de recursos e o processo de

municipalização, pensado sob a lógica de custo e benefício por aluno, pouco incentivaram a

expansão da Educação Básica nas escolas do campo. Ao contrário, colaboraram para o fechamento

de muitas instituições por meio da nucleação.

Para Peretti (2017, p. 105), o direito do aluno à educação escolar no/do campo é violado “a

medida que se impõe a política do transporte escolar e do processo de nucleação”, já que “educação

municipal foi nucleada em uma escola urbana e passou-se a utilizar o transporte escolar como meio

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para deslocamento das crianças do campo”, em todas as etapas da Educação Básica. Uma medida

adotada por muitos municípios no Estado do Paraná, o que decorrerá em cessação das Escolas do

Campo cada vez mais efetivada ano a ano, mesmo que leis que regulamentam e reconhecem à

Educação do Campo.

O Processo de Nucleação: Fechamento de todas as escolas rurais no município de Renascença

Geograficamente o município de Renascença localiza-se na região Sul do Brasil, no

Sudoeste do Paraná, como uma população de 6812 habitantes (IBGE, 2010). A base da economia

do município é agropecuária. Entre os habitantes do perímetro urbano, muitos concebem a renda

familiar da agricultura, que vivem na cidade e possuem terras no campo ou que prestam serviço no

perímetro rural.

No município de Renascença houve a diminuição dos habitantes do perímetro rural, com

exceção dos assentamentos e acampamentos. A expulsão dos sujeitos campesinos3 do perímetro

rural ocorreu em todas as comunidades do município. No entanto, nos últimos vinte anos houve a

intensificação das ações dos movimentos sociais populares do campo em prol a Reforma Agrária,

fomentada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), com a ocupação de terras

de antigas serrarias, fazendas e áreas pertencentes ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma

Agrária (INCRA). Atualmente o município possui oito assentamentos e nove acampamentos,

fenômeno que pode ser considerado como o retorno do homem ao campo.

Até 1998 quarenta e duas escolas rurais do município de Renascença foram fechadas devido

a múltiplos fatores, dentre os quais: a municipalização, descentralização de recursos, o processo de

nucleação e incentivo ao transporte escolar, a atuação das forças políticas administrativas do

município contrárias à manutenção de Escolas do Campo, diminuição dos sujeitos campesinos em

algumas regiões e precariedade das escolas rurais multisseriadas e unidocentes.

Além desses fatores, um dos principais para o fechamento das escolas do campo foram as

políticas para o financiamento da Educação Básica Nacional, criadas em 1998, que instituíram o

Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério

3 Sujeito campesino: povo que vive no campo. Sujeitos que faz parte das relações sociais que compões a vida do campo, em suas diferentes identidades e em sua identidade comum. São pessoas de diferentes idades, famílias, comunidades, organizações, movimentos sociais (CALDART, 2012, p.27).

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(FUNDEF), que posteriormente foi substituído pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da

Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). Os dois modelos

foram organizados para promover a redistribuição de recursos, com repasse de valores aos Estados

e Municípios com base no cálculo de gasto aluno-ano ou custo-aluno.

O repasse de recursos associado ao número de alunos da escola impactou na forma de

organização das instituições estaduais e municipais, que tiveram que se adequar ao novo modelo de

gerenciamento de recursos. Houve o incentivo à nucleação e ao fechamento de instituições,

principalmente as Escolas do Campo. Mesmo que a questão da cessação de escolas não estivesse

definida normativamente nos documentos oficiais, a lógica da administração financeira vem

tencionou a administração pública de Renascença a nuclear alunos em uma única instituição como

forma de obter mais recursos e ter menos gastos.

Atualmente (ano de 2017), de acordo com o Departamento de Obras, Viação e Urbanismo,

existem oito assentamentos e nove acampamentos. Com tantos assentamentos e acampamentos, o

município possui uma característica diferenciada em relação aos demais municípios da região

Sudoeste do Paraná. Observa-se um contexto em que novas famílias ocuparam o perímetro rural

lutando pelo direito à terra e, consequentemente, houve o aumento no fluxo de crianças no campo.

Esse fenômeno torna viável a construção de escolas no perímetro rural, podendo atender os alunos

assentados e acampados bem como das comunidades vizinhas.

No período da cessação das escolas do perímetro rural, início de ano de 1998, a medida foi

vista como um avanço. Valdameri (1998, p. 24) aborda que o município de Renascença “venceu um

grande desafio de eliminar completamente as classes multisseriadas, cumprindo a Lei Orgânica

Municipal que prevê a nuclearização das escolas multisseriadas da zona rural”. Nesse sentido,

muitas escolas do campo em todo o Brasil foram fechadas em nome da finalização da organização

escolar multisseriada, incluindo a realidade de Renascença.

De acordo com relato de quem ocupava cargo de gestão na Secretaria de Educação na

década de 90, quando foi pensado no fechamento das escolas rurais, a primeira atitude tomada foi a

reunião com a comunidade interessada. Assim, reuniam-se os pais dos alunos e era colocado a

situação, os benefícios, as dificuldades e diz-se que “ninguém foi obrigado a fazer, as escolas que

não quiseram fechar, não foram fechadas [...] todo processo, era decisão da comunidade” (SUJEITO

1, 2017).

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Outro relato de um professor, que trabalhava na época em uma escola rural, expõe que a

iniciativa de nucleação era envolvida numa justificativa de que as crianças do campo tivessem as

mesmas condições que as da cidade. Na época da nucleação existiam escolas maiores no interior,

algumas já eram seriadas, com uma equipe de trabalho comum a várias escolas, como cozinheira,

zeladora etc. De acordo com um professor do município, o fechamento das escolas rurais não foi

algo positivo “porque se tirou a criança do meio dela [...] veio pra cidade e muitas ainda hoje a

gente vê, vislumbradas com a cidade, querem viver como uma criança da cidade”, e acrescenta que

“tirando a criança de lá, ela deixou muita coisa que era própria da criança do campo pra traz, ela

não se vê mais como criança do campo, ela se vê como crianças da cidade hoje” (SUJEITO 2,

2017).

O discurso propagado ao longo do tempo incorporou a ideologia de que escola do campo

não teria como se manter, pois houve diminuição no número de alunos. Em nome da redução da

precariedade das escolas rurais, muitas escolas com boas condições de funcionamento no perímetro

rural foram fechadas. As medidas adotadas estiveram ancoradas no princípio de igualdade, na

melhoria da aplicação dos recursos, na locomoção dos professores e incentivo à educação urbana

como ideal de educação.

Os entrevistados pela pesquisa entendem que o fechamento das escolas do campo gerou

situações novas nas comunidades. No entanto, não associam que esse fechamento resultou na

expulsão dos sujeitos campesinos de suas terras, pois argumentam que há questões maiores

envolvidas e que a escola por si só não conseguiria manter as comunidades do campo.

Contraditoriamente, o fechamento das escolas rurais ocorreu frente a uma realidade com grande

demanda de alunos no perímetro rural. Como demonstra Araujo (2007), os ônibus escolares vinham

superlotados, o que sugere que a nucleação poderia ter sido organizada intracampo. Ou seja,

ocorreu uma espécie de urbanização dos sujeitos do campo.

De acordo com os relatos orais obtidos por meio de entrevistas para a pesquisa (2017),

professores que participaram do processo de nucleação da rede municipal de Renascença descrevem

que, durante as reuniões com as comunidades, a proposta dos representantes da prefeitura era de

promover a nucleação tanto intracampo como campo e cidade. Contudo, a realidade se concretizou

com a extinção de todas as escolas rurais, o que foi uma surpresa em algumas comunidades que

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serviriam de núcleo para atender alunos das comunidades vizinhas, como foi o caso do Distrito da

Baulândia e da Fazenda Jaciretã que possuíam estrutura e demanda para continuar suas atividades.

No momento que ocorreu a nucleação, não havia no município uma discussão sobre a

importância da Educação do Campo. Para alguns professores, talvez o processo não tivesse

ocorrido, como se pode observar por este depoimento:

Seria diferente. Eu acho que, porque hoje as crianças vindo, elas são obrigadas a frequentar dos quatro aos dezessete. Então se for analisar, a nucleação nesses moldes de uma escola na cidade eu acho que não teria. [...] Eu acho que fosse conversar, por exemplo, com os pais hoje, eles já teriam outro pensamento. Era outro pensamento totalmente diferente porque eu, como mãe, não traria, não deixaria meu filho de quatro anos pegar um ônibus [...] andar quarenta quilômetros pra vir pra escola sozinho [...], porque às vezes não tem nem o irmãozinho pra cuidar. Então eu não toparia se tivesse a nucleação [...] (SUJEITO 1).

A realidade que se consolidou parece não permitir aos sujeitos que fazem parte da educação

reiniciar um processo de criação de uma escola do campo. Mesmo nos acampamentos e

assentamentos há a propagação da ideologia de que a melhor educação e as possíveis condições de

para a ascensão social está no perímetro urbano. Araújo (2007) expõe que se difundiu no município

a ideia de que as escolas rurais foram fechadas por falta de qualidade na oferta do ensino. Com essa

justificativa e a propagação do discurso de que a escola do perímetro urbano seria melhor, a partir

de 1999 a educação municipal foi totalmente urbanizada em nome dessas justificativas e da

qualidade do ensino.

A nucleação possui como foco o discurso da melhoria da qualidade da educação aos sujeitos

do campo. Para evitar a multisseriação, busca a centralização física de bens e equipamentos

pedagógicos, promoção da economia em escala baseada na redução de custo médio por aluno (custo

e benefício). Para sua efetivação exige o transporte escolar, que de acordo com Vasconcelos (1993,

p.72), “podem levar a custos elevados de transporte”, ao mesmo tempo que podem “anular os

benefícios econômicos da nucleação, que podem até acabar anulando os benefícios econômicos ,

eliminando assim a economia em escala”.

Os movimentos sociais populares do campo se posicionam contrários à nucleação da

educação no perímetro urbano e defendem concretização da escola do campo e no campo, com a

formação de um espaço escolar “[...] que reconheça o modo de vida desses povos e a importância

deles para a construção da nação brasileira” (PERETTI, 2017, p.143).

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O argumento da qualidade da educação pública tornou-se o discurso oficial da administração

municipal, propagando essa ideologia em reunião com os pais para o fechamento de muitas escolas

do campo. A universalização e expansão da Educação Básica foram estabelecidas em um modelo

precário da educação urbana e com tais ideologias.

No município de Renascença alguns documentos oficiais contemplam a possibilidade de

promover a oferta da Educação do Campo. Destaca-se a Lei Orgânica Municipal nº 005/2014 que,

no Artigo 224, estabelece como prioridade a implantação de Escolas do Campo com o objetivo de

garantir aos alunos do perímetro rural um tratamento adequado à realidade da vida no campo. Entre

os artigos, pode-se destacar o que indica o Art. 224: “O Município, no âmbito de sua atuação

prioritária, [...] implantará escolas do campo, objetivando a universalização do acesso”, o que

garantiria a esses alunos conhecimentos adequados a realidade rural (RENASCENÇA, 2014, p. 53).

Sobre o direito à Educação do Campo, entre os sujeitos entrevistados na pesquisa constata-

se que houve mobilizações sociais com o MST, sindicatos de trabalhadores e outras organizações

que buscavam garantir um núcleo escolar com a oferta da Educação no Campo no Assentamento

João de Paula nos anos de 2013 a 20145. De acordo com o Sujeito 4, que participou nas reuniões no

assentamento, “as famílias do campo não quiseram; eles preferem que as crianças venham pra

cidade”. Possivelmente, entre a população do campo há a visão de que a Educação do Campo será

nos moldes da educação rural, com escolas multisseriadas e unidocentes, o que gera uma certa

resistência quanto sua efetivação. Não houve a discussão sobre uma escola do campo de qualidade,

formativa, de cunho cientifico, “omnilateral no sentido de formar o ser humano na sua integralidade

física, mental, cultural, política, científico-tecnológica” (CIAVATTA, 2014, p.190).

Quanto a mobilização dos movimentos populares do campo pelo direito a uma Educação do

Campo, o Sujeito 1 lembra: Na verdade (fala vagarosamente e compassado) sempre teve. Então geralmente o pessoal que era dos movimentos, sindicatos, os movimentos dos Trabalhadores Sem Terra, mas, mais os sindicatos, assim, eles eram, eles sempre questionaram, mas a própria população não, não quis. Como o fechamento foi feito com a

5 Por exemplo, o debate sobre o direito à Educação do Campo no município de Renascença foi discutido no Seminário sobre o Direito à Educação do Campo, realizado no Assentamento João de Paula, interior de Renascença, no dia 17 de setembro de 2013. Estiveram presentes representantes da Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (Assesoar), da Secretaria de Educação do município, UNIOESTE, assentados da Reforma Agrária do Sudoeste do Paraná, entre outros. Os participantes firmaram um compromisso de continuar na luta pela garantia da construção de uma escola de assentamento no perímetro rural do município.

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anuência da comunidade em questão, que a escola iria ser fechada, sempre, sempre se discutiu, por exemplo, sempre cobraram em, principalmente em períodos de pleitos eleitorais, eles cobravam, queriam que os prefeitos prometessem que ia voltar, mas no fundo no fundo ninguém prometia, porque sabia que era uma questão bem, bem séria. Eles sempre fizeram movimentos para conseguir uma escola específica, lá do movimento, lá do MST, mas nunca, não sei se não obtiveram sucesso, mas sempre houve, mas é interessante essa mobilização, então.

Nota-se que as mobilizações ocorrem principalmente em períodos eleitorais e depois a luta

pela efetivação da Educação do Campo não é mais fomentada. Observa-se que não há políticas para

efetivar o direito à Educação do Campo. Os espaços que se abrem são em melhorar o que já existe,

trabalhando na escola urbana questões do campo.

O Sujeito 2, destaca que atualmente (2017) a maioria dos professores são do perímetro

urbano. Considera que criar uma escola do campo poderia gerar desconforto e conflitos com os

professores, pois não vão querer se deslocar até o perímetro rural. Ter uma escola na cidade tornou-

se mais cômodo aos profissionais da escola. Para o Sujeito 4, o trabalho com as famílias flui melhor

quando os profissionais da escola vão até o campo. Ou seja, representa que ao estar na comunidade

observa-se a realidade dos alunos, ocorre uma aproximação com as famílias. No entanto, esse

trabalho nem sempre é possível por falta de recursos e tempo dos profissionais da escola.

Outra questão refere-se à rotatividade de alunos. Entre os sujeitos da entrevista, constatou-se

que os alunos dos acampamentos são os que mais pedem transferência, situação gerada pela própria

condição social em que o direito à terra não foi consolidado. Há uma morosidade nas leis que

estabelecem a Reforma Agrária, o que leva muitas famílias estarem a mais de dez anos na condição

de acampados. As situações sociais e das políticas públicas acabam interferindo na realidade da

escola e das famílias que querem permanecer no campo.

Embora em algumas regiões do município de Renascença ocorreram a expulsão dos

camponeses para a manutenção de latifúndios por parte de famílias de granjeiros, também houve a

Reforma Agrária em que mais de duzentas famílias retornaram ao campo. Isso significa o retorno

dos sujeitos campesinos ao campo, a presença ou aumento de crianças no perímetro rural, o

surgimento da necessidade social da efetivação de uma Educação no/do Campo no município.

O direito à educação escolar mediante o transporte escolar

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Entre os maiores desafios da educação municipal de Renascença encontra-se o transporte

escolar. Com o fechamento de todas as escolas rurais do município em 1998, o deslocamento das

crianças do campo para a cidade tornou-se problemático devido à má qualidade das estradas rurais e

a precariedade do transporte escolar. Em dias de chuva, devido à falta de cascalho nessas estradas,

os ônibus atolavam com facilidade, o que impede repetida vezes dos alunos chegarem à escola. Essa

é uma história comum no município, com muitos dias em que o ônibus quebra e os alunos têm que

percorrer a pé longos trechos para chegar até a escola. Conforme Araújo (2017), ocorreu o caso em

que um ônibus caiou na valeta e os alunos tiveram que sair pela janela. Como também, em vários

momentos, o ônibus do transporte escolar estava sem freio, expondo todos ao perigo de um

acidente, chegando os alunos a ter que desembarcar do ônibus em movimento. São expostas

situações em que os alunos saíam de casa de madrugada, retornando para casa duas ou três horas da

tarde. Ainda, “já houve vários casos de passageiros viajarem totalmente embriagados, algumas

vezes vomitando em cima de alunos, em bancos e até em outros passageiros” (ARAUJO, 2007, p.

23).

Atualmente no município de Renascença doze ônibus são responsáveis pelo transporte

escolar de todos os alunos da Educação Básica, sendo um destes de responsabilidade da prefeitura

com motorista concursado. Onze veículos são terceirizados por empresas privadas que participam

de uma licitação conhecida como Pregão. São as empresas contratadas que designam os motoristas

que irão realizar as rotas do transporte escolar estipuladas pela prefeitura. Para organização da rota

são adotados alguns critérios estipulados em Leis Nacionais e Estaduais.

As preocupações com o transporte escolar representam as situações em que alunos das

regiões mais distantes do município permanecem mais de duas horas no ônibus, estando fora de

casa cerca de oito horas diárias, o que é irregular se observado o tempo máximo descrito no Plano

do Transporte Escolar (2014) de duas horas diárias.

Todos os sujeitos que entrevistamos citam o transporte escolar como um dos pontos mais

problemáticos do processo de nucleação corrido no município para a sua única escola urbana, pois

muitos alunos ainda permanecem longos período no ônibus. De acordo com o Sujeito 10, “as

crianças cansam e muitas eu sei que dormem no caminho, que chegam aqui na escola e são os

motoristas que acordam ou os colegas, [...] as que almoçam muito cedo a viagem não faz bem”. O

Sujeito 2 comenta que:

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[...] se ouvir um motorista contando o trajeto que ele percorre dentro do assentamento. Ele conta assim: vocês têm que ir lá conhecer a realidade pra ver onde eu passo dentro do assentamento. Onde ele passa, que é um espaço que é muito grande, então o trajeto é difícil pra percorrer. Então têm trajetos e trajetos que o ônibus passa.

O Sujeito 1 destaca que “se eu morasse no campo eu ia querer que meu filho estudasse perto

da minha casa”.

O Transporte Escolar é um dos grandes desafios da realidade de Renascença. A grande

extensão territorial tornou-se um problema quanto ao acesso à escola. Entre todas as medidas, ainda

assim, existe o problema do tempo longo dos alunos no transporte escolar. Parece que um núcleo

escolar no perímetro rural resolveria muitos desses problemas.

A questão do transporte escolar, na forma em que a realidade se apresenta, estão associadas

a vários desdobramentos da política educacional instaurada ao longo do tempo com o fechamento

de todas as escolas rurais no município. Apesar dos problemas apresentados, como ao do excesso de

tempo que alguns alunos permanecem no ônibus, o Transporte Escolar se torna fundamental para

que os alunos do perímetro rural tenham assegurado o direito à educação. Nesse sentido, o direito à

educação escolar não pode ser pensado somente do portão da escola pra dentro. A realidade e a

forma com que os fenômenos ocorrem tornam o direito à educação mais difícil para alguns sujeitos.

Existe essa realidade em que todos frequentam a mesma escola urbana, com desigualdade de acesso

e permanência, como se comprova também pela questão do transporte escolar.

Considerações finais

Finaliza-se a discussão com inúmeras incertezas, principalmente com as novas

configurações das políticas nacionais referentes à Educação do Campo. Vive-se um cenário cada

vez mais contraditório, principalmente quanto aos direitos dos sujeitos trabalhadores.

A pesquisa demostrou que a realidade concreta não se materializa ao acaso. Existem

processos sociais e formas institucionalizadas das políticas educacionais que agem

intencionalmente, que hegemonicamente conservam as desigualdades sociais.

O fechamento das escolas do campo foi uma ação com consequências graves para a

qualidade educacional, que não levou em consideração a formação das crianças, da juventude do

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campo. A escola na comunidade não representava somente um espaço para educação escolar, pois

era o lugar do encontro da comunidade, da reunião, do lazer, das trocas de saberes.

No período que houve o fechamento de todas as escolas rurais, a idade obrigatória para as

crianças era de sete anos. Hoje isso mudou e passou a ser de quatro anos, o que tem se tornado mais

um desafio quanto ao transporte escolar. Outra situação refere-se à promoção da Educação em

Tempo Integral, visto que a dinâmica de concentrar todos os alunos em uma única instituição

tornou-se um grande impasse, principalmente com a organização do transporte escolar que atende

os alunos da rede estadual e municipal de ensino em conjunto. Tudo ainda mais agravado porque o

espaço físico da única escola não possui salas suficientes para o número de alunos, o que impõem

aos que residem à longa distância no perímetro rural ficarem longos períodos ausentes do convívio

com suas famílias.

O transporte escolar, embora sua necessidade para trazer os alunos à escola, ainda representa

um grande impasse aos municípios. Além do alto custo, também existem questões referentes à

manutenção, contratação de empresas, tempo exaustivo que os alunos permanecem no ônibus,

situações de risco em estradas em dias de chuva, muita poeira quando não chove. Enfim, por mais

que sejam desenvolvidas ações para aperfeiçoar as rotas e diminuir o tempo de permanência dos

alunos no transporte, aqueles das regiões mais distante ainda permanecerão longo tempo no ônibus,

pois existe um mundo físico com estradas e distâncias a percorrer.

A efetivação de uma Educação no/do Campo, concretizada pela luta dos sujeitos

campesinos, tem o desafio de não permitir que novas escolas sejam fechadas, pois a lógica das

políticas educacionais conservadoras trabalha também de maneira inversa quando promovem o

fechamento das escolas do perímetro rural e desqualificam a educação geral nos municípios. Ao

fechar uma escola de campo, dificilmente haverá uma política pública voltada à reabertura desta, já

que a tendência é de impedimento para que isso ocorra.

Haverá problemas quanto aos recursos, quanto à vontade política, aos professores que optam

não se deslocar até o campo pelas dificuldades que desvalorizam seus trabalhos profissionais. Na

realidade atual, a medida mais plausível é mudar a rota de algumas linhas de ônibus que levam

alunos para a cidade, o que poderia efetivamente manter um ou mais núcleo escolar no campo, e em

alguns casos a Educação em Tempo Integral pode colaborar para os propósitos da qualidade da

educação no campo.

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EIXO TEMÁTICO 3:

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

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A IMPORTÂNCIA DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA FORMAÇÃO ACADÊMICA

DE ESTUDANTES DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA

CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA EM UMA ESCOLA DO CAMPO

Roberto Gonçalves Ferreira1

Vladileia Tochetto Gonçalves Ferreira2

Eixo Temático 3: Escola Pública do Campo e Formação de Professores

Resumo: Este trabalho apresenta uma revisão bibliográfica acerca do estágio supervisionado durante a formação acadêmica de um profissional da educação, bem como da trajetória da educação do campo no cenário educacional do país. Tem como objetivo demonstrar a importância do estágio na formação acadêmica, tomando como referência uma escola do campo localizada em um assentamento de Reforma Agrária. A proposta aqui apresentada trata-se de uma pesquisa a campo onde foram acompanhados, acadêmicos de um curso de Licenciatura em Educação do Campo, durante um estágio em uma escola do campo. Para a realização do estágio, há uma necessidade em se conhecer o contexto em que a escola é criada, a realidade local onde a mesma está inserida, seus princípios e objetivos com relação a educação, dentre outros aspectos, cuja a análise se faz importante, por se tratar de um espaço relativamente novo, com uma proposta diferenciada de organização, principalmente do ensino, e que portanto, apresenta um conjunto amplo de novos desafios, tanto para os estudantes de graduação, como para os demais agentes que atuam ou atuarão nestas escolas. Tal realidade requer um conhecimento prévio que possa nortear uma atuação neste espaço escolar, tornando o trabalho mais efetivo e em consonância com a proposta da escola. Uma parcela deste conhecimento pode ser adquirida justamente, por meio do estágio curricular o que enfatiza, portanto, a importância de sua realização.

Palavras-chave: teoria e prática; conhecimento; educação do campo.

INTRODUÇÃO

O estágio supervisionado caracteriza-se como uma das mais importantes etapas da formação

acadêmica de um curso de licenciatura, pois é através do estágio que o estudante e futuro 1 Acadêmico do Curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Tecnológica Federal do Paraná -Câmpus Dois Vizinhos. E-mail: [email protected] 2 Acadêmico do Curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Tecnolégica Federal do Paraná -Câmpus Dois Vizinhos. E-mail: [email protected]

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profissional da área da educação, poderá aprimorar seus conhecimentos, interligando universidade,

escola e consequentemente, a comunidade onde a escola está inserida. Conhecer estes aspectos

através do contato direto com a escola, propicia ao acadêmico a oportunidade de contrastar a teoria

com a prática e construir uma perspectiva entorno de sua futura atuação profissional.

(SCALABRIN; MOLINARI, 2013)

O trabalho aqui descrito buscou relacionar a importância do estágio curricular, tomando

como referência um novo contexto escolar amplamente discutido na atualidade, seja em fóruns,

encontros, revistas e outros periódicos relacionados a educação, que é o contexto da Educação do

Campo e suas escolas, chamadas oficialmente de Escolas do Campo. Por se tratar de um contexto

com várias especificidades, principalmente, no tocante ao ensino, a escola do campo traz uma série

de novos desafios ao profissional da educação que venha a atuar nela. (LEMES, et al., 2011).

Tendo em vista as considerações acima mencionadas, foi necessário o desenvolvimento de

um estudo bibliográfico através de livros, cadernos e artigos que tratam de temas relacionados ao

histórico da Educação do Campo, pontuando a construção da proposta da educação do campo em

seus aspectos mais gerais e ao estágio supervisionado, levando em conta sua significativa

importância no âmbito da formação acadêmica.

A pesquisa foi realizada a campo, por meio de um acompanhamento junto à acadêmicos de

um curso de licenciatura em Educação do Campo, ao qual realizaram parte de seu estágio em uma

escola estadual do campo, pertencente ao assentamento Celso Furtado no município de Quedas do

Iguaçu – PR. Este acompanhamento buscou mostrar de que maneira o estágio se faz importante para

formação acadêmica, no contexto da escola do campo e tratou de trazer aspectos relacionados a uma

visão de quem vivenciou essa prática, bem como as dificuldades, reflexões e experiências, que

possam contribuir para ampliar a discussão teórica acerca do tema proposto.

A instituição onde se desenvolveu a pesquisa, denomina-se Colégio Estadual do Campo

Olga Benário Prestes e está situado na comunidade Dez de Maio, localizada no assentamento

citado. O assentamento é a maior área de reforma agrária da América Latina, onde existem três

escolas estaduais do campo e cerca de 1100 famílias assentadas. Tais aspectos, impulsionaram a

proposta de realização da pesquisa, cuja necessidade é demonstrar a importância do estágio,

considerando-se uma realidade que precisa ser amplamente analisada.

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Mesmo existindo muitos documentos e registros a respeito da Educação do Campo, o

estágio possibilita o contato com a realidade antes mesmo de ocorrer a atuação como profissional,

portanto, é determinante para a aquisição de novos conhecimentos, além dos adquiridos através de

leituras bibliográficas. Socializar essas novas descobertas é contribuir para que a proposta da

Educação do Campo possa ser mais conhecida e que este conhecimento possa contribuir, tanto para

própria atuação, quanto para a atuação de outras pessoas, estejam elas inseridas nestes espaços ou

fora deles.

1. O PAPEL DO ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO NA VIDA ACADÊMICA

O estágio curricular supervisionado refere-se a uma importante atividade, sendo realizada de

forma obrigatória, por acadêmicos de cursos de licenciaturas que, através do contato com a escola,

passam a desenvolver capacidades que os auxiliarão a enfrentar os desafios da profissão. É uma

etapa preparatória, um processo necessário a prática docente, além de ser um importante

instrumento de integração entre universidade, escola e comunidade. (PIMENTA, 1997)

O tradicional estágio aperfeiçoa a compreensão de conceitos que o estagiário já havia

estudado, assim ocorre uma relação com o estudo e a realidade. De acordo com Oliveira e Cunha

(2006, p. 6) “podemos conceituar Estágio Supervisionado, portanto, como qualquer atividade que

propicie ao aluno adquirir experiência profissional específica e que contribua de forma eficaz, para

sua absorção pelo mercado de trabalho”.

A prática do estágio tem por finalidade desenvolver a compreensão das teorias estudadas na

graduação. A teoria por sua vez, torna-se um mecanismo de instrumentalização, na qual sem ela a

prática deixa de realizar seu papel qualitativo. Dominar a teoria e a prática é executar com êxito as

funções pedagógicas que, sem dúvida, envolve muitos desafios, pois depende da análise real do

contexto educacional e compreensão sobre o papel do professor, bem como suas limitações.

Portanto, o estagiário deve saber quando e como agir em frente a determinadas situações

desagradáveis ou adversidades que não conferem à sua rotina, mantendo sempre o controle das

situações decorrentes da profissão futura. (CABRAL; ANGELO, 2010).

O papel da teoria é ofertar explicações provisórias sobre a realidade e instigar o sujeito a ser

ativo e dinâmico. No entanto, o aprendizado cumpre com sua função através da experiência, que

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permite a assimilação dos conteúdos que lhes foram apresentados enquanto aluno. Por isso, o

estágio é uma oportunidade de desenvolver habilidades funcionais, além de despertar ao

pensamento crítico. Tais virtudes irão promover o interesse, unido à determinação,

comprometimento, consciência e responsabilidade, assim fundamentarão a práxis do futuro docente.

A práxis é, na verdade atividade teórico-prática, ou seja, tem um lado ideal, teórico e um lado material, propriamente prático [...]. O objetivo (produto) é o resultado de um processo que tem seu ponto de partida no resultado ideal (finalidade) [...] produz-se sempre certas inadequações entre o modelo ideal e sua realização [...]. O que significa que a consciência não pode limitar-se à imprevisibilidade do processo, exige também, um dinamismo de consciência (VASQUEZ, 1968, p. 241-242).

Além de ser uma das etapas mais importante da vida acadêmica, o estágio também deve

cumprir as exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), que a partir de

2006, propôs um parecer sobre o estágio supervisionado, ressaltando sua finalidade que consiste em

oportunizar ao acadêmico a observação, a pesquisa, o planejamento, a execução e a avaliação de

suas práticas pedagógicas resultantes da utilização da teoria acadêmica unida com a prática

realizada na escola. (SCALABRIN; MOLINARI, 2013)

Desta forma, se torna possível conciliar teoria e prática durante o período acadêmico do

estudante por meio do estágio supervisionado, que pelo Decreto no 87.497, de 18 de agosto de

1982, regulamentado pela Lei nº 6.494, de 07 de dezembro de 1977, dispõe sobre o estágio de

estudantes de estabelecimentos de ensino superior e de ensino médio regular (antigo 2º grau) e

supletivo, art. 2º:

Art. 2º Considera-se estágio curricular, para os efeitos deste Decreto, as atividades de aprendizagem social, profissional e cultural, proporcionadas ao estudante pela participação em situações reais de vida e trabalho de seu meio, sendo realizada na comunidade em geral ou junto a pessoas jurídicas de direito público ou privado, sob responsabilidade e coordenação da instituição de ensino (BRASIL, 1982).

Anterior ao estágio propriamente dito, o estudante precisa conhecer o ambiente escolar e

seus arredores, este processo denomina-se de ambientação. Tal ação, possibilita ao estagiário, um

primeiro contato com a escola para socialização pessoal e análise documental (Projeto Político

Pedagógico, Regimento Escolar, etc.). Tanto a ambientação quanto as demais etapas devem

contemplar a descrição de fatos que, posteriormente, deverão ser organizados na forma de relatório,

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do contrário a contribuição permanece apenas visual e muitos aspectos importantes, com o tempo,

acabam sendo perdidos. Por isso, é importantíssimo sistematizar todas as ações realizadas durante o

as etapas do estágio. (PIMENTA, 1997)

2. ASPECTOS GERAIS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

A educação, de modo geral, passou por diversas e gradativas transformações que

englobaram vários movimentos educacionais, os quais estavam mediados por tendências. As

mudanças ocorridas buscavam sanar lacunas relacionadas ao pleno desenvolvimento dos sujeitos,

desta maneira, almejavam formar seres ativos, capazes de intervir na sociedade. No entanto, sempre

faltava algo que não permitia que essa inserção acontecesse. O resultado do trabalho destes

movimentos no senário educacional gerou uma perspectiva de educação que meramente preparava

os estudantes para o mercado de trabalho. Esse destaque se dá principalmente nas escolas públicas

localizadas no meio rural.

Segundo Santos (SANTOS, 2015 apud ARROYO; CALDART; MOLINA, 2008, p. 78-79),

esse cenário era característico de escolas rurais, cujos currículos adotados eram iguais aos das

escolas urbanas, desprezando a realidade e a cultura dessas localidades.

Além disso, as escolas do campo passavam por intensa desvalorização, por ocasião do

avanço tecnológico, que por sua vez, chegou primeiro nos centros urbanos. Divulgou-se então, a

ideia de que o campo era um espaço atrasado, portando nem se cogitava investimentos por parte das

esferas governamentais. Rosa e Caetano (2008 p. 23), confirmam tal afirmação quando discorrem

que “a educação rural era predominantemente vista como algo que atendia a uma classe da

população que vivia num atraso tecnológico, subordinado, a serviço da população dos centros

urbanos” (ROSA; CAETANO, 2008, p. 23). A educação rural esteve pautada nessas características

até a segunda metade do século XX.

Diante desta realidade, surgem iniciativas por parte de movimentos sociais, especialmente o

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que atentam para uma educação diferente,

ou seja, uma educação que atendesse os povos do campo, voltada à valorização dos sujeitos que

vivem nesses espaços (RODRIGUES; BONFIN, 2017).

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Esses movimentos se organizaram para obter uma resposta do governo em relação a essas

escolas, afirma Ghellere:

Ao longo do tempo, as escolas rurais perderam seu espaço, como referencial do campo. Podemos dizer que o MST resgata a discussão das escolas do campo, trazendo a importância de uma educação que atenda as pessoas que fazem parte de um espaço cultural, específico, e não atrasado, como muito se ouviu dizer. (GHELLERE, 2010 p. 08)

Na Constituição Federal de 1988, a discussão sobre as escolas do campo encontrava-se

restrita, porém diante das iniciativas dos movimentos sociais se inicia uma proposta educacional

voltada às especificidades dos sujeitos do campo. Tal proposta estava amparada na Lei de Diretrizes

e Bases (LDB) 9394/96, quando enfatiza a possibilidade de adequações nas metodologias e

conteúdos desde que, atendessem as necessidades e interesses das escolas rurais.

À medida que os movimentos avançam nas conquistas e mobilizações por uma educação do

campo, surge a ideia de criar uma articulação nacional voltada a Educação do Campo, realizada

através de parcerias com movimentos sociais, Fundo das Nações Unidas para a Infância

(UNESCO), Comissão Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Universidade de Brasília (UnB).

Onde teve como marco inovador a Conferência Nacional por uma Educação Básica do campo em

1998. (ARROYO; FERNANDES, 1999)

Após inúmeras discussões, foram criadas as Diretrizes para Educação do Campo pela

Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), baseadas na LDB 9394/96 passam a se referir

ao campo como sendo um “lugar de trabalho, de cultura, da produção de conhecimento na sua

relação de existência e sobrevivência”. (SEED, 2006, p. 24)

Dentro dessa proposta, começam a surgir parcerias com universidades. Isso ajudou a

fortalecer a educação do campo. O primeiro curso superior foi nas áreas da licenciatura, sendo o

curso de Pedagogia intitulado “Pedagogia da Terra”, as reivindicações passavam por constantes

avanços, surgiram então cursos voltado a área das ciências humanas, natureza e exatas. Após essas

conquistas, as escolas situadas no campo receberam em sua nomenclatura, a complementação

“Campo” por meio da Resolução nº 2998/2011, assim são reconhecidos como escola/colégio

estadual/municipal do Campo (DOSSO; BRANDÃO, 2013).

Mesmo que a proposta da Educação do Campo para as escolas do campo tenha passado por

importantes avanços é imprescindível considerar que há muitos obstáculos a serem enfrentados e

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superados, como preconceito de uma parcela considerável da sociedade, concurso público, bem

como a aceitação por parte das secretarias de educação e governo, inclusive no campo político

conceitual pelo qual sugere Caldart:

Um grande desafio para os movimentos sociais na superação desses impasses é não confundir a Educação do campo com a Pedagogia do Movimento e ao mesmo tempo não trabalhá-las em uma visão antinômica, como coisas separadas. Se os movimentos sociais entenderem a Educação do campo somente na sua dimensão de política pública e de educação escolar e continuarem a pressão, mas apenas pelo direito, recuando na disputa pelo conteúdo da política e pela concepção de campo e de educação, estarão abrindo mão da identidade que ajudaram a construir e estarão eliminando a contradição pelo polo da educação rural modernizada. (CALDART, 2009, p. 57)

Os avanços ocorridos nas escolas do campo são insuficientes e em muitos casos deficientes

por faltar em suas estruturações, discussões políticas, sociais e educacionais.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para a realização da pesquisa foi necessário acompanhar quatro estagiários, acadêmicos do

curso de Licenciatura em Educação do Campo, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná -

Câmpus Dois Vizinhos, por um período de 19 horas/aula de estágio.

A pesquisa realizou-se a campo com o acompanhamento dos acadêmicos durante o estágio,

onde foram realizadas anotações referentes a cada etapa do estágio desenvolvido, baseadas em

observações próprias e em diálogos com os mesmos durante o estágio.

Após estes procedimentos, foram analisados os relatórios que resultam na sistematização

dos dados observados e anotados durante o acompanhamento da realização do estágio e do relato de

experiência feito pelos estagiários, apontando suas percepções, sentimentos, dificuldades, e

reflexões durante o estágio, e relatando qual seria a importância deste para sua formação acadêmica.

Objetivando uma melhor compreensão do contexto onde se desenvolveu a pesquisa,

realizou-se uma consulta bibliográfica acerca da Educação do Campo no Brasil, suas origens e um

pouco da sua trajetória até os dias atuais.

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4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A proposta desta pesquisa foi discutir a importância do estágio para formação acadêmica,

associado à atuação no contexto de uma escola do campo. Para tanto foi realizado um

acompanhamento de quatro estagiários dentro de uma Escola do Campo, durante a realização de seu

estágio. O objetivo da pesquisa esteve pautado em realizar uma análise, reflexiva sobre a

importância desta atividade e ao mesmo tempo buscar conhecer a realidade de uma escola do

campo.

A possibilidade de entrar em contato com a realidade é um momento indispensável na

formação acadêmica, haja visto que cada escola, apesar de ter uma mesma proposta, apresenta

sempre realidades diferenciadas, específicas, as quais um curso de graduação por si só não consegue

contemplar, nem fazer uma abordagem teórica precisa.

Nesta atividade ficou expressa à importância do estágio, por sua característica de aproximar

o acadêmico à realidade da escola. Esta característica pôde ser observada antes da regência a ser

realizada pelos estagiários, uma vez que os planos de aula da escola eram elaborados de maneira

distinta, do qual os acadêmicos estavam acostumados a fazer e que portanto, foram auxiliados pelos

professores regentes a adequar a construção do plano de acordo com o plano feito pelos professores.

Num dado momento do relato de experiência um dos acadêmicos comentou sobre plano de aula, o

qual pensava que este seria sempre da mesma forma como lhe fora apresentado em seu curso,

porém, a partir do estágio, pôde compreender que cada plano de aula segue uma dinâmica de acordo

com a realidade e necessidade da escola em que este se aplica.

No relato de experiência surgiram reflexões referentes ao domínio de turma. Os estagiários

relataram que por muitas vezes perderam esse domínio, segundo eles, por não saberem qual seria a

ação adequada para controlar a turma. Outro fator relevante, decorrente dos relatos e da percepção

dos próprios estagiários, foi o fato de que, pela falta de estudos antecedentes, algumas perguntas

realizadas pelos alunos ficaram sem respostas e o comportamento diante dos questionamentos

demonstrou insegurança por parte dos estagiários.

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Os estagiários foram unânimes na questão de que o estágio é uma das etapas mais

importantes da vida acadêmica, pois possibilita efetivar a prática docente e vivenciar seus limites,

desafios e expectativas.

Com relação à instituição pôde-se observar que a mesma, estabelece um alto grau de

comprometimento com o ensino, e que preza por seguir de maneira responsável os objetivos que

norteiam todas as suas ações, fundamentando o trabalho da gestão, dos docentes e demais

trabalhadores que estão engajados e preocupados com o ensino.

Em suma, observou-se um grande compromisso per parte da escola no que se refere à

formação e preocupação com a ampliação do conhecimento, pois permite a realização do estágio

em suas dependências, a instituição percebe a importância do estágio, por considerar que está

preparando com mais qualidade um futuro profissional, pelo qual poderá atuar não apenas em suas

dependências, mas também em outras escolas. Este compromisso pôde ser observado também na

disposição da gestão da escola que mediou à conversa dos acadêmicos com os professores, que

prontamente se colocaram à disposição para organizar as etapas do estágio.

5. CONCLUSÃO

Foi possível através da pesquisa, conhecer a realidade da escola, acompanhar, como agente

externo, a realização de um estágio supervisionado, conhecer o trabalho dos professores, pedagogos

e direção, enfim características que se somam positivamente na formação acadêmica e profissional.

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O PROCESSO DE FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DAS ESCOLAS NO CAMPO EM

ITAPEJARA D´OESTE/PR: REFLEXÕES E RESULTADOS INICIAIS

Ivania Piva Mazur1

Clésio Acilino Antônio2

Andre de Souza Fedel3

Eixo Temático 3: Escolas Públicas do Campo e Formação de Professores

Resumo: O presente artigo abordará as reflexões e resultados iniciais do processo de formação pedagógica iniciado em 2017 com o coletivo escolar das duas únicas instituições escolares no campo do município de Itapejara D´Oeste/PR: Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes e a Escola Municipal do Campo Valentim Biazussi. A formação pedagógica em processo integra um conjunto de ações de uma longa e árdua luta da comunidade escolar e local pela garantia das escolas no campo em funcionamento. São colaboradores parceiros do processo de formação pedagógica a Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Francisco Beltrão, por meio do Projeto de formação de professores do Laboratório de Representações, Espaços, Tempos e Linguagens em Experiências Educativas – RETLEE e a Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESOAR). Ambas as entidades parceiras são integrantes da Articulação Sudoeste Por Uma Educação do Campo. Os sujeitos do processo de formação são: profissionais da educação atuantes em ambas as instituições escolares e de outras instituições escolares localizadas no município. A metodologia da formação pedagógica em processo se caracteriza enquanto participativo-colaborativa tendo como enfoque: reflexões problematizadoras e intervenções criadoras. São objetivos do processo: refletir sobre a forma escolar predominante e os limites pedagógicos de sua dinâmica educativa para a escola do campo; realizar estudos e reflexões que permitam a construção coletiva de um projeto pedagógico específico para as escolas no campo a partir da valorização, respeito e reconhecimento do contexto local; propor, planejar e executar práticas pedagógicas a partir da realidade do campo que favoreçam a aprendizagem dos conteúdos escolares pelos estudantes. O artigo aborda também alguns desafios e limitações do processo. Palavras-chave: formação pedagógica; escola no campo; práticas pedagógicas.

1 Mestra em Educação e pedagoga do Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes. [email protected] 2 Doutor em Educação e docente da Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão. [email protected] 3 Mestre em Geografia e Educador Popular na Associação de Estudos, Orientação e Assitência Rural (ASSESOAR). [email protected]

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Introdução

O presente artigo abordará as reflexões e resultados iniciais do processo de formação

pedagógica iniciado em 2017 com o coletivo escolar do Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes

e a Escola Municipal do Campo Valentim Biazussi. Ambas as instituições escolares funcionam em

dualidade administrativa e compartilham o mesmo prédio escolar localizado na comunidade de

Barra Grande, município de Itapejara D´Oeste/PR e atendem, respectivamente, anos finais e anos

iniciais do Ensino Fundamental. São as únicas instituições escolares ainda em funcionamento no

campo no município de um total de quarenta e quatro escolas no campo já existentes.

Cabe ressaltar que, de acordo com o último censo de 2010, o município em questão,

localizado na Região Sudoeste do Paraná, possui um total de 10.532 habitantes (IBGE, 2018) sendo

que 33,65% da população se concentra no campo (MAZUR, 2016, p. 35). A agropecuária se

constitui enquanto a principal fonte de renda econômica do município (Plano Diretor de Itapejara

D’Oeste, 2006) e, no entanto, praticamente cem por cento das instituições escolares no campo

foram fechadas.

A formação pedagógica em questão iniciou em agosto de 2017. Surgiu a partir da

inquietação e anseio do coletivo escolar em realizar um trabalho pedagógico a partir da realidade

local dos sujeitos atendidos pelas instituições escolares citadas.

Surgiu também num contexto em que a comunidade local e escolar se percebeu diante do

risco de fechamento gradativo do Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes. Tal risco se

apresentou, no início de 2017, quando a Secretaria de Estado da Educação já anunciava a

possibilidade de que a turma de 6º ano do Ensino Fundamental não seria autorizada a funcionar no

ano letivo de 2018 sob a justificativa de número reduzido de estudantes4. Inúmeras ações,

fundamentadas na legislação específica da Educação do Campo e em estudos científicos, foram

realizadas pela comunidade escolar e local com o intuito de conseguir a abertura da turma de 6º ano,

porém, sem resultados positivos.

4 Destaca-se que um dos motivos que contribuem para o número reduzido de estudantes nas escolas no campo é o não atendimento ao princípio do transporte intracampo, princípio este previsto na Resolução nº 02/2008, resultando também em salas de aulas lotadas nas escolas da sede.

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Cabe mencionar que o momento histórico brasileiro e internacional é de profunda crise, e

assim, ela (a crise) é respondida com duas ações dos governos de turno: grandes cortes de

investimentos públicos e adoção de medidas econômicas produtivas que privilegiam o desmonte do

Estado e das políticas sociais. A educação e a agricultura são exemplos que evidenciam esse

momento, pois o crescente número de fechamento de turmas e escolas do campo e o crescente

avanço do modelo produtivo do agronegócio para territórios antes inimaginados tem grande

consonância, podendo afirmar que se o agronegócio avança, o fechamento das escolas aumenta.

Diante dessa conjuntura, a formação pedagógica em processo nas escolas no campo no

município de Itapejara D´Oeste integra um conjunto de ações de uma árdua, longa e atual luta da

comunidade escolar e local pela garantia dessas em funcionamento.

São colaboradores parceiros do processo formativo em andamento a Universidade Estadual

do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Francisco Beltrão, por meio do Projeto de formação

de professores do Laboratório de Representações, Espaços, Tempos e Linguagens em Experiências

Educativas – RETLEE e a Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESOAR).

Unioeste e Assesoar são entidades integrantes da Articulação Sudoeste Por Uma Educação do

Campo. Os sujeitos do processo de formação são: profissionais da educação atuantes em ambas as

instituições escolares e de outras instituições escolares localizadas no município. Os encontros

foram pensados para ocorrerem mensalmente com o coletivo escolar. Anterior a cada encontro com

o coletivo, ocorre o encontro de organização do mesmo com os colaboradores e equipe diretiva das

instituições escolares. A metodologia da formação pedagógica em processo se caracteriza enquanto

participativo-colaborativa tendo como enfoque: reflexões problematizadoras e intervenções

criadoras.

São objetivos do processo: refletir sobre a forma escolar predominante e os limites

pedagógicos de sua dinâmica educativa para a escola do campo; realizar estudos e reflexões que

permitam a construção coletiva de um projeto pedagógico específico para as escolas no campo a

partir da valorização, respeito e reconhecimento do contexto local; propor, planejar e executar

práticas pedagógicas a partir da realidade do campo que favoreçam a aprendizagem dos conteúdos

escolares pelos estudantes.

O artigo abordará a proposta de formação continuada pela perspectiva da metodologia

colaborativa, pontuando as nuances e diferenças no processo em tela dos educadores e educadoras,

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suas posições políticas e papeis, demonstrando a relação da formação com o contexto em múltiplas

escalas geográficas. Abordará também os resultados e reflexões iniciais do processo de construção

da formação pedagógica das escolas no campo em Itapejara D´Oeste, bem como alguns desafios e

limitações do processo.

A formação continuada de professores pelo viés da metodologia colaborativa: Projeto de

formação de professores do RETLEE

A formação continuada de professores vem se constituindo, há alguns anos, um importante

campo de atuação para o Projeto de formação de professores do Laboratório de representações,

espaços, tempos e linguagens em experiências educativas – RETLEE.

O grupo de docentes e discentes que atua no Laboratório busca analisar e problematizar o

processo de formação continuada como um conjunto de ações e mediações em curso, que visa

promover transformações na prática pedagógica, resultando em ações objetivas no ensino escolar

dos sujeitos participantes.

A prática pedagógica é um fenômeno multidimensional, a qual interagem diversos fatores

relacionados à formação do profissional da educação para atuar com intencionalidade educativa em

diferentes realidades. Além das características mais diretamente relacionadas ao conhecimento e à

prática pedagógica, a formação profissional ainda revela as relações político-sociais de inserção do

professor no campo do trabalho.

Arroyo (1999) instiga-nos a considerar que temos pensado a formação de professores, inicial

ou continuada, nos moldes da tradição, em que um tempo precedente prepara, e outro tempo, o da

ação, coloca em prática o que aprendemos a fazer. Para o autor “essa concepção de educação

precedente polariza a vida em dois tempos: de aprender e de fazer, de formação e de ação”

(ARROYO, 1999, p. 146).

A prática de formação continuada do projeto de extensão do Laboratório RETLEE vem

buscando romper com uma prática metodológica convencional de formação continuada de

professores (GARRIDO, 2000; PIMENTA, 1996), pela qual a formação não é previamente

concebida e definida com materiais e discurso prontos, mas construída ao longo da trajetória para

motivar os participantes acerca da reflexão de elementos presentes nos contextos escolares e em

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suas próprias práticas pedagógicas. Neste sentido, a metodologia colaborativa utilizada pelo projeto

parte das necessidades de cada grupo de profissionais em formação, por meio de atividades de

assessoria pedagógica direta às escolas, oficinas, cursos e palestras, de periodicidade quinzenal e

mensal de realização, com ênfase principal no processo de reflexão da prática pedagógica

desenvolvida em escolas da Educação Básica.

Por conseguinte, as principais ações do projeto de extensão do Laboratório RETLEE

procuram efetivar práticas colaborativas de formação continuada de professores nos âmbitos da

prática pedagógica, reflexão dos projetos pedagógicos das escolas, ensino das diversas áreas de

conhecimento do currículo escolar. As necessidades de formação continuada apresentadas por

escolas municipais de Francisco Beltrão e dos Núcleos Regionais de Educação de Francisco Beltrão

e Pato Branco são assumidas pelo projeto para promover atividades de reflexão sobre a prática

pedagógica, construindo estratégias de organização do planejamento pedagógico dos professores e

da gestão político-pedagógica das escolas. ´

Nesse contexto e com esse intuito o projeto tem contribuído no processo de formação

pedagógica do Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes e Escola Municipal do Campo Valentim

Biazussi do município de Itapejara D´Oeste.

O processo de formação pedagógica das escolas no campo em Itapejara D´Oeste/PR

Os encontros da formação pedagógica iniciaram com reflexões problematizadoras sobre a

forma escolar predominante a qual é padronizada tanto em seu formato físico quanto pedagógico.

As reflexões destacaram que a dinâmica educativa da forma escolar que se universalizou é centrada

no professor, na sala de aula, no ensino simultâneo, desconectada da realidade e que concebe o

estudante enquanto ser passivo. Os profissionais integrantes da formação foram instigados a

refletirem sobre alguns limites pedagógicos de tal dinâmica, limites esses que são abordados pelo

debate educacional de forma geral, tais como: a situação desfavorável que esta dinâmica propicia

em relação ao desenvolvimento do pensamento nos estudantes; a abordagem do conhecimento

científico como informação abstrata desligada do fenômeno real; a escola desconectada do

contexto/mundo social dos sujeitos.

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Assim, durante o processo de formação, os profissionais se sentiram provocados a

desnaturalizar o formato de escola padronizado. Pesquisaram e pensaram formas de recriar

processos, práticas pedagógicas que pudessem causar impactos diferentes no processo pedagógico.

E, para além disso, tinham como desafio coletivo pensar, propor, sistematizar e executar práticas

pedagógicas que contemplassem as especificidades do contexto local e do campo, a partir dos

sujeitos trabalhadores do campo que se constituem enquanto uma parcela da classe trabalhadora.

O resultado das discussões e estudos foi se materializando no Plano de Ação das instituições

escolares no campo que norteou o trabalho pedagógico e escolar realizado durante o ano letivo de

2018. Durante os encontros de formação as ações idealizadas foram sendo sistematizadas,

executadas, aprimoradas, avaliadas e reorganizadas a partir das experiências do coletivo e a partir

do estudo de textos com o intuito de articular teoria e prática.

Com as contribuições de Oliveira (1987, p.92-93), o coletivo escolar trabalhou tendo em

vista que a função principal da escola é criar as condições para que ocorra o desenvolvimento do

processo de “transmissão-assimilação” do saber sistematizado nos educandos e, assim,

instrumentalizar os sujeitos para atuarem no meio social ao qual pertencem. Todo o conhecimento

produzido e acumulado pela humanidade surge para dar respostas às necessidades humanas da

prática social. Cabe a nós enquanto profissionais da educação, conduzir a prática educativa com os

estudantes de forma a vincular o conhecimento elaborado às necessidades da vida social, pois “a

contribuição da prática educativa escolar torna-se, desse modo, tanto mais eficaz quanto mais se

consegue identificar e efetivar os elementos mediadores (os vínculos) entre escola e sociedade,

entre prática educativa e prática social global”.

Os encontros foram enriquecidos também a partir dos apontamentos de Charlot (2000, p. 65)

o qual afirma que “todo ser humano aprende: se não aprendesse, não se tornaria humano”. Porém,

aprender não se resume a adquirir um saber, um conteúdo intelectual. Apropriar-se de um saber-

objeto5 se constitui enquanto uma das figuras do aprender. As reflexões a partir do autor levaram a

perceber que a forma escolar predominante prioriza o saber-objeto, porém, de acordo com Charlot

(2000), o aprender humano, não se limita a ele. Os indivíduos estabelecem diversas relações com o

mundo. São três formas de aprender e de relação epistêmica com o saber: “tomar posse de saberes-

5 Por “saber-objeto”, Charlot (2000) se refere ao saber depositado em objetos empíricos (livros, obras de arte...), locais (escola...), pessoas (docentes...).

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objeto” (CHARLOT, 2000, p. 68); “dominar uma atividade, ou capacitar-se a utilizar um objeto de

forma pertinente” (CHARLOT, 2000, p. 69); e dominar um sistema de condutas relacionais com os

outros e consigo mesmo. O objeto de uma educação intelectual portanto, deve ser o “processo que

leva a adotar uma relação de saber com o mundo” não estando limitado apenas à acumulação de

conteúdos intelectuais (CHARLOT, 2000, p. 64).

O plano de ação construído pelo coletivo escolar se constitui enquanto um esforço para

garantir os conhecimentos acumulados pela humanidade, porém, não permanecendo apenas no

saber-objeto.

Resultados e desafios do processo

Como resultado das reflexões coletivas, as ações pensadas foram categorizadas em quatro

dimensões que se constituíram no Plano de Ação das escolas no campo de Itapejara D´Oeste:

Dimensão 1: Evento; Dimensão 2: Produção; Dimensão 3: Práticas Pedagógicas de Sala de Aula;

Dimensão 4: Práticas Pedagógicas Extra-Sala de Aula.

Na dimensão 1 houve a intenção de promover eventos que visassem o fortalecimento das

escolas do campo no local, aproximando escola e famílias e demonstrando a importância da escola

na comunidade para além do atendimento ao direito à educação formal. Foram idealizados para

2018 dois eventos. “La Prima Gincana Di Tutte Le Persone6” ocorreu em maio de 2018, envolveu

os estudantes e suas famílias, bem como pessoas de todas as idades da comunidade local e

comunidades vizinhas. Foram desenvolvidas atividades recreativas, divertidas, relacionadas com o

trabalho do campo e cultura local e que deveriam ser realizadas por meio de trabalho de equipe. O

evento chegou a reunir em torno de mil pessoas no horário do almoço. A avaliação da comunidade

escolar e local sobre a gincana foi muito positiva.

O segundo evento é a “Mostra de Saberes e Sabores do Campo” a qual está previsto para o

mês de dezembro. Tem o intuito de valorizar e socializar as práticas pedagógicas desenvolvidas nas

escolas no campo, bem como valorizar e socializar a cultura da comunidade local.

6 “A Primeira Gincana de Todas as Pessoas”. O nome em italiano foi escolhido pela comunidade local devido à forte descendência italiana na comunidade, na qual o dialeto italiano ainda é praticado. Este evento contou com a parceira dos acadêmicos do 7º Período do Curso de Bacharelado em Educação Física da Faculdade de Pato Branco – FADEP.

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A dimensão 2 teve como resultado o “Jornal Plantão do Campo”. Surgiu com a intenção

inicial de fortalecer o processo comunicativo entre a escola e a comunidade, informando sobre a

educação no campo, fatos relevantes que ocorrem no mundo, valorizando aspectos característicos

da população camponesa, resgatando fatos históricos e promovendo a autonomia dos educandos.

Porém, o jornal impresso extrapolou as intenções revelando mais aspectos significativos no

processo de fortalecimento da escola. Resultado de um movimento de construção coletiva,

representou muito mais que um produto. Além de fonte de informação representou também um

instrumento que oportunizou aprendizado para os educandos e também para a comunidade. O

jornal, possibilitou envolver educadores, estudantes e comunidade, com a conjuntura local, regional,

nacional e internacional. A experiência com o jornal revelou potencialidades como: constituir-se

numa ferramenta simbólica de convencimento de uma posição política, no caso, a importância da

educação e das escolas do campo; cumprir algumas funções como aproximar os sujeitos; produzir

novos leitores; promover o debate público; criar ambiente favorável para fortalecer propostas ou

criar novas propostas; defender posições; estimular opiniões, debates de ideias. A partir da primeira

edição do jornal, ocorrida em outubro, para 2019, tem-se a intenção de realizar edições semestrais.

Na dimensão 3, intitulada de “Intercâmbio de Saberes” o desafio do coletivo escolar se

caracterizou por pensar práticas pedagógicas para trabalhar os conteúdos disciplinares a partir do

contexto real vivenciado e relatado por pessoas da comunidade e famílias dos estudantes de forma a

vincular os conteúdos disciplinares a necessidades e interesses de aprendizagem.

Assim, o trabalho prático nessa dimensão iniciou com a definição de temas relacionados à

cultura e contexto local que deveriam ser o ponto de partida para abordagem de conteúdos

escolares. Posteriormente os docentes estudaram o tema definido, realizaram com os estudantes

contextualização interdisciplinar sobre o mesmo, pessoas da comunidade foram convidadas a

relatarem suas experiências em relação ao assunto definido e, na sequência, os docentes

aprofundaram determinados conhecimentos específicos da sua disciplina. As experiências nessa

dimensão que puderam ser concluídas foram positivas, no entanto, a grande maioria das práticas

planejadas não foram realizadas por vários motivos que explanaremos adiante.

O “Laboratório Agroecológico” caracterizado na dimensão 4, para além de um local

pedagógico, teve a intenção de promover um espaço entre educador, educando, produtores e

técnicos que possibilitassem um aprendizado de práticas e experiências com base em um corpo

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sistematizado de conhecimento a partir da agroecologia e também dos saberes populares a respeito

da produção agrícola. Para esta dimensão foram previstas atividades no espaço da horta-pomar-

jardim consistindo em atividades voltadas à produção de alimentos saudáveis e ornamentação de

ambiente; no espaço da cozinha onde se realiza a manipulação/utilização dos alimentos; e também

foram previstas atividades na produção e consumo familiar dos alimentos.

De forma sucinta, expomos nesse artigo o processo de formação pedagógica continuada que

vem se realizando nas escolas no campo em Itapejara D´Oeste e a construção, também em processo,

de um trabalho pedagógico diferenciado. Muitos foram e ainda serão as limitações e os desafios na

continuidade desse trabalho entre eles: a articulação entre escola municipal e estadual, visto que

ambas funcionam em um único turno e em turnos diferentes; as condições de trabalho dos

profissionais que dificultam a disponibilidade de mais tempo para preparação e execução das

práticas pedagógicas/aulas e mais tempo para a organização coletiva; o fato de que nem todos se

dedicam como poderiam com envolvimento e com comprometimento com o projeto de escola em

construção; a dificuldade de atender a necessidade de reflexões semanais ou quinzenais para

aprimorar e avaliar as práticas idealizadas devido às rotinas escolares; a insegurança quanto à

permanência ou não dos mesmos profissionais nas instituições escolares no ano seguinte;

insegurança e angústia diante da iminência da concretização do fechamento gradativo do Colégio

Estadual do Campo Carlos Gomes.

Apesar dessas dificuldades, os encontros têm sido muito ricos, pois têm permitido estudos,

reflexões e a construção de práticas pedagógicas a partir da realidade do campo, têm permitido o

surgimento de movimentações pedagógicas estranhas à forma escolar predominante nessas

instituições escolares. As recentes integrações e mostra de saberes entre escolas do campo da região

sudoeste e suas comunidades tem apontado essas movimentações que, de maneira incipiente, são

um embrião de articulação e resistência frente às dificuldades internas ao processo de formação e

externas ao momento histórico de ataques à educação pública.

Referências

ARROYO, Miguel G. Ciclos de desenvolvimento humano e formação de educadores. Educação &

Sociedade, Campinas, v. 20, n. 68, p. 143-162, dez., 1999.

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BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA.

RESOLUÇÃO Nº 2, DE 28 DE ABRIL DE 2008. Estabelece diretrizes complementares, normas e

princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do

Campo. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/resolucao_2.pdf>. Acesso em: 19

out. 2018.

CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Trad. Bruno Magne.

Porto Alegre: Artmed, 2000. – Capítulo 05: O Saber e as figuras do aprender.

GARRIDO, E. Pesquisa universidade-escola e desenvolvimento profissional do professor. São

Paulo, 2000. Tese (Livre-docência) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São

Paulo, 2000.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:

http://www.cidades.ibge.gov.br/painel/historico.php?lang=&codmun=411120&search=parana|itapeja

ra-d`oeste|infograficos:-historico. Acesso em: 19 out. 2018.

ITAPEJARA D’OESTE. Prefeitura Municipal. Plano Diretor, 2006. (Documento digitalizado).

MAZUR, Ivania Piva. O processo de fechamento das escolas no campo em Itapejara

D’Oeste/PR: o caso da Escola Estadual de Lageado Bonito e do Colégio Estadual do Campo Carlos

Gomes. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Programa de Pós-

Graduação Stricto Sensu em Educação, Francisco Beltrão – PR, 2016. Disponível em:

http://tede.unioeste.br/tede/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=2540. Acesso em: 19 out. 2018.

OLIVEIRA, Betty. A socialização do saber escolar. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1987.

(Coleção Polêmicas do Nosso Tempo). p. 91-104.

PIMENTA, S. G. Formação de professores: saberes da docência e a identidade do professor.

Revista da Faculdade de Educação, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 72-89, jul./dez. 1996.

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EIXO TEMÁTICO 4:

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO, GESTÃO, INSTÂNCIAS COLEGIADAS E

ESPAÇOS DA COMUNIDADE

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ESCOLA MUNICIPAL BASÍLIO TIECHER: EDUCAÇÃO DO CAMPO E IDENTIDADE

Aline Tortora de Oliveira1

Sônia Maria dos Santos Marques2

Eixo Temático 4: Escolas Públicas do Campo, Gestão, Instâncias Colegiadas e Espaços da

Comunidade

Resumo: O presente artigo é parte da discussão realizada na dissertação de Mestrado em Educação, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, intitulada “Nono, vem aqui que tem gente”: Cultura e identidade na Comunidade São Pio X – Km 20, Francisco Beltrão, Paraná. Realizamos a pesquisa na igreja católica da comunidade, escola municipal e a festa da cultura italiana – Fest Vin, e, desta maneira apresentamos no artigo uma discussão entre a Comunidade São Pio X, pesquisas de campo na Escola Municipal Basílio Tiecher, Educação do Campo e as vivências que tivemos nestes espaços. Estabelecemos então a seguinte problemática: a Escola Basílio Tiecher, por ser Escola do Campo, explora temas de identidade e identificação em relação a Comunidade São Pio X? Para responder ao problema, utilizamos a metodologia etnográfica, juntamente com os seguintes instrumentos de coleta de dados: a) observação e descrição; b) registro fotográfico; c) análise documental; d) Diário de Campo; e) entrevistas narrativas. Como aporte teórico, utilizamos as contribuições de Caldart (2008), Hall (2015), Peretti (2017), entre outros. A Escola do Campo busca identificar e valorizar a identidade campesina do lugar, ressaltando as vivências, costumes, cultura e modo de ser dos alunos, contribuindo assim, para uma formação integral.

Palavras-chave: Educação do campo; Identidade; Comunidade São Pio X.

Introdução

A temática apresentada, deu-se pela discussão sobre a Escola do Campo e suas

características que auxiliam na forma em que as identidades são construídas no local. Assim,

estabelecemos a seguinte problemática: a Escola Basílio Tiecher, por ser Escola do Campo, explora

temas de identidade e identificação em relação a Comunidade São Pio X? A comunidade 1Mestre em educação. Graduada em Pedagogia e Artes Visuais. Pedagoga no Projeto de Extensão – Patronato. Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação. Professora Associada da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Francisco Beltrão. Docente no curso de Pedagogia e mestrado em educação. E-mail: [email protected]

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apresentada é um distrito do município de Francisco Beltrão e é considerada importante para os

demais moradores das circunvizinhanças, pois é a única que disponibiliza atendimento médico,

odontológico e formação escolar desde a pré-escola até o 9º ano do Ensino Fundamental. Residem

na comunidade 196 famílias, somando um total de 447 moradores.

Sabemos que após a fixação das primeiras famílias, houve na comunidade a preocupação de

se proporcionar acesso à educação formal aos filhos e assim, as narrativas dos depoentes,

demonstraram que era importante aprender a ler, a escrever e contar, surgiu então a escola pública

da comunidade nomeada de Escola Municipal Basílio Tiecher, que atualmente recebe alunos de

outras 19 comunidades vizinhas, somando no ano de 2017 um total de 235 alunos matriculados nos

turnos da manhã e tarde.

A relação com este objeto de estudo justifica-se pela forma como vejo o mundo, pois, passei

maior parte do meu tempo de vida na localidade e, de alguma forma, é desta experiência que

decorre a pesquisa. Assim, nossa percepção da comunidade São Pio X é entremeada pelo

conhecimento apreendido no núcleo familiar, pelas relações que estabelecemos nos espaços

contíguos a casa, pela participação nas festividades da comunidade e por um conjunto de ações que

me produziram como pessoa.

Utilizamos a metodologia etnográfica, entendendo-a como a melhor opção para responder o

problema de pesquisa, pois o estudo etnográfico busca aproximação com a cultura de um grupo,

identificando os costumes, as crenças, os hábitos, a religião e outros elementos que compõe o

contorno das identidades e identificações assumidas por determinada coletividade.

O estudo etnográfico necessita de um longo período de observações para que possamos

compreender os hábitos e crenças do grupo e, por isso, durante o período de 2016 e 2017,

realizamos a coleta de informações. Como afirma André,

[...] o período de tempo em que o pesquisador mantém esse contato direto com a situação estudada pode variar muito, indo desde algumas semanas até vários meses ou anos. Além, evidentemente dos objetivos específicos do trabalho, tal decisão vai depender da disponibilidade de tempo do pesquisador, de sua aceitação pelo grupo, de sua experiência em trabalho de campo e do número de pessoas envolvidas na coleta de dados (ANDRÉ, 1995, p. 25).

Por anos acompanhamos as atividades, principalmente escolares desta comunidade e isso

também facilitou o acesso como pesquisadora, porém, neste momento voltamos a esses lugares e os

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percebemos com outros olhos, atribuindo novos valores às experiências do grupo, produzindo novas

sensibilidades nas situações observadas.

Escola Municipal Basílio Tiecher

Enquanto criança moramos em uma comunidade do interior chamada Rio Palmeirinha, lugar

que evoca boas lembranças. Alguns afazeres de casa era nossa responsabilidade e no tempo livre

divertimo-nos, brincando com os familiares e amigos, sendo a brincadeira preferida “escolinha e

professora”. Naquele momento, mesmo desconhecendo o ambiente escolar reproduzimos algumas

ações, pois os livros, cadernos e giz eram os brinquedos preferidos. Dentro do quarto, sobre a cama

ficavam os materiais juntamente com o pote de giz, para riscarmos as portas do guarda-roupa e um

pequeno pano era transformado em apagador.

Ainda é presente na lembrança, o quanto esperamos os seis anos de idade chegar, para

começarmos os estudos na Escola Basílio Tiecher, situada na comunidade São Pio X - Km 20.

Lembro-me da lista de materiais e o momento em que meus pais chegaram com as sacolas plásticas

que mostrava os papéis crepons coloridos e os demais materiais para início do ano letivo. Lembro,

ainda, que iniciamos uma maratona de organização para que no início das aulas todos os materiais

estivessem preparados.

Eis que chegou o esperado dia. Após o banho, vestimos o uniforme, almoçamos, escovamos

os dentes, colocamos a mochila nas costas e na estrada em frente à casa, esperamos pelo horário do

ônibus. Quando ele estava se aproximando, minha mãe disse: “Vai dar tudo certo, não chore...até de

tarde”. E quando ele parou, entramos e felizes fomos conversando com os novos amigos, pois tudo

era novidade. Ao chegar, deparamo-nos com os ambientes diferentes, conhecemos a escola, os

professores e nossa ambição era aprender a ler.

Durante a tarde, realizamos algumas atividades, lanchamos, brincamos e logo chegou a hora

de retornarmos. Encontrar o ônibus era a tarefa mais difícil, mas tranquilamente localizamos e

entramos ansiosos para chegarmos a casa e relatar o quanto era divertido ir para a escola. Meus pais

tiveram pouco estudo, mas fizeram o possível para termos a oportunidade de despertar, desde cedo,

o gosto pelos estudos.

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Desta forma, há um sentimento de pertencimento a este local, pois estudamos nesta Escola

do Campo, durante a Educação Infantil e Ensino Fundamental. Crescemos envolvidas em algumas

atividades da localidade, vimos as danças típicas italianas apresentadas na escola e, mais tarde,

enquanto aluna, passamos a auxiliar na organização e na preparação do ambiente para a realização

das festividades, a fim de cultivar a origem étnica italiana demarcada pelos moradores da

comunidade, a partir de um projeto nomeado de “Projeto Raízes”.

A escola tem lugar central nos processos de identidade e identificação. A afirmação toma

por base as experiências proporcionadas pela instituição, enquanto aluna, e sua contribuição na

continuidade dos meus estudos. Sentimos, assim, a necessidade de se construir um registro formal,

acadêmico e científico, como uma forma de contribuir com o grupo de referência e esclarecer a

própria história. Compreender quem somos, faz parte da identidade que assumimos durante a vida,

as posturas que reconhecemos e os diversos marcadores sociais que assumimos como reguladores

da vida coletiva.

Realizamos várias visitas no ambiente escolar durante a pesquisa, em dias e horários

diferentes, mas, de modo especial, ressaltamos a segunda-feira, dia 24 de julho de 2017, por

considerarmos as observações importantes e condizentes com a discussão aqui proposta.

Chegamos às sete horas da manhã, para percebermos o movimento de chegada dos alunos e

professores. No saguão principal, já estavam algumas crianças aguardando pelo horário de início

das aulas. Aos poucos, os ônibus começaram a chegar, paravam em frente à escola e as crianças

desciam e adentravam o portão. Os espaços foram tomados pelas crianças, as conversas iam

aumentando, entre sorrisos, empurrões, caras de sono e desânimo, todos aguardavam pelo início das

aulas.

Às sete horas e trinta minutos, ouvimos o tão esperado barulho, em movimento de

organização, filas começaram a aparecer e os professores saíram da sala onde estavam e se

dirigiram para as turmas em que ministrariam as disciplinas. Assim que todos os alunos entraram

em suas salas, fomos convidados a adentrar na sala dos professores. Com o Diário de Campo, em

nossas mãos, anotamos vários elementos que consideramos importantes, sendo um deles o

momento em que olhamos para os cartazes que estavam expostos nas paredes da sala, com o título

“quem somos”, logo fotografamos e questionamos a diretora sobre a construção da atividade.

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A diretora Edna Tiecher, explicou que a atividade foi desenvolvida no início do ano letivo

de 2017, e se baseava na influência da escola durante a formação dos alunos, sendo que os

professores precisavam representar estas características a partir do desenho de uma árvore. Assim,

os professores construíram quatro cartazes, expostos conforme fotografia a seguir.

Fotografia 1: “Quem somos” - Atividade realizada pelos professores da Escola Basílio Tiecher.

Fonte: Registro Aline Tortora de Oliveira, julho de 2017.

Nos desenhos, a intenção das raízes era que os professores expressassem o que era preciso

para que os alunos se desenvolvessem. Percebemos nos cartazes que foram ressaltados aspectos,

como humildade, companheirismo, responsabilidade, Deus, família, educação, professores e

colegas, boa convivência e amor.

No tronco, a proposta era identificar o que era preciso para possibilitar uma formação

respeitando as diferenças. Na primeira cartolina da direita estava escrito: família, religião,

conhecimento, cultura, trabalho e experiências da vida.

Pensar que a identidade é formada a partir das diferenças, e a preocupação que os

professores demostram em respeitar as diferenças dos alunos é o que torna possível afirmar que a

escola é ambiente de construção da identidade.

Nas folhas e frutos, precisavam destacar o que gostariam de compartilhar com os alunos e o

que eles seriam capazes de conquistar através de tais conhecimentos. Encontramos, então, as

palavras: formação, equilíbrio, qualidade de vida, superação, reconhecimento e independência. Os

alunos são os protagonistas de suas ações e seus princípios, podendo, por meio da escola, construir

a identidade (Diário de Campo, dia 24 de julho de 2017).

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A identidade cultural é também uma propriedade que as pessoas têm de construir,

reconhecer e afirmar quem são e a que lugares pertencem. Sentimos que este local, fez e faz parte

da vida dos jovens da localidade, pois durante nove anos frequentamos este ambiente e, por isso,

marca de forma indelével a vida dos sujeitos.

No Projeto Político Pedagógico - PPP da escola é possível ler a seguinte afirmação:

“sabendo que a escola está inserida no contexto social de escola do campo, é preciso considerar que

os conteúdos a serem trabalhados possam resguardar a identidade cultural dos grupos que ali

produzem sua vida [...]” (Proposta Pedagógica, 2012, p. 19). Consta neste Projeto a preocupação em

se valorizar a identidade cultural dos grupos, retomando-se os valores campesinos. Percebemos que

a escola talvez não consiga atentar para a complexidade do conceito de identidade, reduzindo-a a

traços estereotipados da cultura italiana. Percebemos também que as ações são esporádicas,

descontínuas limitando-se a atividades que antecedem e sucedem a Fest Vin. Na investigação

realizada percebemos que a educação é ambiente que fornece suporte para a identidade e

identificação, pois não aparece dissonância entre o que a escola propõe e o que novos programas

favorecem, mas a proposta dos cartazes demonstrou que existe um planejamento que busca

contemplar aspectos diários dos alunos, ou como apresentado na imagem pensar as experiências da

vida, reconhecimento e independência.

Percebemos a complexidade das afirmações identitárias e, da mesma forma, a importância

dos investimentos em identidades, empreendidos pelos sujeitos e pelos grupos sociais no seu

processo de vida.

Atentos ao PPP da escola e discussões sobre a educação no campo, encontramos no site da

prefeitura de Francisco Beltrão3, a publicação que consta que na manhã de terça-feira, dia 26, foi

realizada na Escola Municipal Basílio Tiecher a cerimônia de assinatura “entre a Universidade

Federal da Fronteira Sul (UFFS) e a Prefeitura de Francisco Beltrão” com objetivo de “promover a

formação continuada de professores das Escolas do Campo que atendem o Ensino Fundamental II

(turmas de 6º a 9º anos) ”. Na ocasião a secretária municipal de Educação, Rosa Vandresen,

argumentou que o objetivo é “aprimorar conhecimentos e qualificar as práticas pedagógicas”, e

ainda mais “Pensar a educação do campo é valorizar as pessoas que residem no meio rural, a sua

3As informações foram divulgadas no site da prefeitura no dia 26/06/2018. Acesso dia 27 de junho. http://franciscobeltrao.pr.gov.br/noticias/educacao/convenio-beneficia-professores-do-campo-em-beltrao/

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cultura, os conhecimentos e as especificidades, reconhecendo sua importância na sociedade.

Precisamos preparar nossos educadores para atender de forma satisfatória estes estudantes”. Da

mesma forma o vice-prefeito e secretário de Planejamento, Antonio Pedron, comentou “Temos

priorizado o atendimento na área de educação porque sabemos que o futuro do nosso município e

do País passa pelo que oferecemos para as crianças que estão frequentando as nossas escolas”.

Com base na proposta de formação de professores de Escolas do Campo, nos

pautamos nas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para Educação

Básica, Resolução CEB/CNE nº 4/2010, que apresenta a Educação do Campo como uma

modalidade específica da Educação Básica e define também a identidade da Escola do

Campo (BRASIL, 2010).

Sobre as Escolas do Campo, os movimentos se unem contrários à nucleação da

educação no perímetro urbano e mais que isso defendem a concretização de uma Escola

do Campo e no Campo, e conforme afirma Peretti (2017, p.143) “[...] que reconheça o

modo de vida desses povos e a importância deles para a construção da nação

brasileira”. Sobre o conceito Educação do Campo, entendemos que ela

contempla muito mais do que o saber escolar, pois envolve todo processo formador dos

sujeitos do campo e as formas de resistência ao longo da história dos trabalhadores do

campo. Assim Caldart destaca que: [...] pensar a Educação do Campo como processo de construção de um projeto de educação dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo. Isto quer dizer que se trata de pensar/ projetar a educação (política e pedagogia) desde os interesses sociais, políticos, culturais de um determinado grupo social; ou trata-se de pensar a educação (processo universal) desde uma particularidade, ou seja, desde sujeitos concretos que se movimentam dentro de determinadas condições sociais de existência em um dado tempo histórico (CALDART, 2008, p. 20).

Desta forma, entendemos que para contemplar a Educação do Campo será sempre

necessário buscar aproximações com os conceitos de Identidade e Identificação, ressaltando como

os alunos constroem suas identidades no lócus da pesquisa. Sabemos que estes conceitos são

amplos e estão em constante transformação, e compreende-los é fundamental.

Assim, tomamos por base a ideia de que a identidade é formada ou transformada a partir da

diferença estabelecida com o outro e a partir do outro e Caldart afirma que a Escola do Campo

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tem a importante função de trabalhar e resgatar a identidade dos sujeitos campesinos,

sendo que o reconhecimento da identidade faz parte da essência humana.

Assumimos diferentes identidades em relação aos lugares que frequentamos e cada uma

exige uma postura. Os sujeitos criam mecanismos diferentes de comportamento, parecendo ser

sempre a mesma pessoa e de acordo com Hall (2015, p. 24), “[...] a identidade é realmente algo

formado, ao longo do tempo, através de processos inconscientes, e não algo inato, existente na

consciência no momento do nascimento”. Sendo assim, sabemos que a identidade é formada

durante toda a vida, e está em constante construção e a escola por fazer parte da vida dos jovens da

comunidade, precisa se atentar a complexidade destes temas para compreender a identidade e

identificação destes com o lugar e a maneira em que vivem.

Considerações Finais

É pertinente esclarecermos que a escola é formadora de identidade, e por ser Escola do

Campo, precisa explorar ainda mais a realidade dos alunos, atentando-se a forma em que vivem,

valorizando suas culturas, costumes e crenças. Fazer com que conheçam a historiografia do lugar,

suas histórias e narrativas, também é fundamental para o processo de identificação e afirmação da

identidade assumida.

A Escola Basílio Tiecher recebe alunos de outras comunidades que sofreram o processo de

nuclearização, que por vezes também possuem características próprias, sendo necessário a

aproximação de estudos e atividades que despertem o interesse dos alunos por conhecer o lugar

onde estão inseridos.

Estas atividades nos foram propostas em 2005, nas aulas de história. A professora solicitou

a formação de grupos com alunos da mesma comunidade, para encontrar informações sobre o local

onde cada grupo morava. Eram quatro alunos residentes na comunidade do Rio Palmeirinha e,

juntos, iniciamos nossas entrevistas com os moradores mais velhos. Por não sabermos sobre

metodologia, critérios de pesquisa, ética e, muito menos, que existia aparelhos para a gravação das

entrevistas, poderia ser considerado como uma atividade qualquer, mas foi uma experiência que nos

trouxe conhecimento e inquietações que ainda nos acompanham. Temos enorme apreço por este

trabalho, embora ele seja simples, cheio de erros ortográficos, mas ele nos estimulou e

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proporcionou o ponta pé inicial para realizarmos a pesquisa sobre a comunidade São Pio X,

tornando-nos pesquisadores.

Esta é uma discussão que merece destaque na atualidade, pois as Escolas do Campo,

atendem alunos com características diferentes dos alunos da cidade, e o fechamento destas seria

uma perca cultural e histórica do lugar. Desta maneira, salientamos a necessidade de realizarmos

mais pesquisas sobre a Educação do Campo e suas contribuições para os envolvidos.

Referências

ANDRÉ, M. E. D. A. de. Etnografia da prática escolar. 4. ed. São Paulo: Papirus, 1995.

BELTRÃO, Francisco. Escola Municipal Basílio Tiecher - Projeto Político Pedagógico –

Construção Coletiva, 2012.

BRASIL. CNE.CEB. Resolução CEB nº04/2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais

Gerais para a Educação Básica; reconhece a Educação do Campo como modalidade da

Educação Básica. Brasília, 13 de julho de 2010.

CALDART, R. S. Elementos para construção do Projeto Político Pedagógico da Educação do Campo. In: PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação.

Superintendência da Educação. Departamento de Ensino Fundamental. Cadernos temáticos: Educação do Campo / Curitiba: SEED-PR, 2008. p.19-30.

HALL, S. A identidade Cultural na pós-modernidade. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2015.

PERETTI, R. Avaliação do acesso da população aos serviços públicos de resíduos sólidos urbanos em municípios catarinenses / Ricardo Peretti – 2017. Dissertação

(Mestrado em Ciência e Biotecnologia) – Universidade do Oeste de Santa Catarina,

Campus Videira – UNOESC, 2017.

Disponível: http://www.unoesc.edu.br/images/uploads/mestrado/Disserta%C3%A7%C3%

A3o_Completa_-_Ricardo_Peretti_%281%29.pdf. Acesso em: 11 mai. 2017. Disponível:

http://franciscobeltrao.pr.gov.br/noticias/educacao/convenio-beneficia-professores-do-campo-em-

beltrao/. Acesso em: 27 jun. 2018.

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O FECHAMENTO DAS ESCOLAS PÚBLICAS MUNICIPAIS E ESTADUAIS DO

CAMPO, NO CONTEXTO DA MERCADOLOGIZAÇÃO DA VIDA HUMANA

Vitor de Moraes1

Katia Leite Costa2

Eixo Temático 4: Escolas Públicas do campo, Gestão, Instâncias Colegiadas e Espaços da Comunidade.

Resumo: Este trabalho consiste em dialogar com a realidade da Educação do Campo no Brasil na atualidade; evidenciando seu lugar social e político, as práticas de resistências e fechamentos de Escolas do Campo no contexto da mercadologização da vida humana. Esta reflexão tem a pretensão de mostrar os aspectos relevantes dessa questão, as perspectivas futuras por meio da reflexão e ação, visando aproximar o debate teórico que embasa o fechamento de escolas do campo, a realidade em que essas escolas estão emergidas e as contradições humanas e políticas que contribuem para o fechamento. Contraditoriamente ao movimento de fechamento, igualmente destaca-se o movimento político e pedagógico da Educação do Campo e o Fórum Nacional da Educação do Campo (FONEC), que junto com as articulações de cada estado permite fazer enfrentamentos, resistências e avanços em meio a essa avalanche de secção das Escolas do Campo e no campo. Palavras-chave: fechamento de escolas; mercadologização; vida humana.

INTRODUÇÃO

O referido trabalho tem como objetivo fazer uma reflexão acerca do fechamento das

escolas públicas municipais e estaduais do campo, no contexto da mercadologização da vida

humana. O tema supracitado será abordado também na palestra do primeiro dia, período da

noite, do evento: I encontro nacional de escolas públicas do campo (ENEPUC) - “Formação

humana e conhecimento escolar”.

As reflexões aqui realizadas basearam-se em referências teóricas que explicitam a

realidade e o modo de produção capitalista, a concepção da Educação do Campo, Legislação e

direitos, e quais as relações com a mercadologização da vida humana. Da mesma forma está

1 Doutorando em Sociedade, Cultura e Fronteiras, UNIOESTE FOZ; Mestre em Educação pela UNICENTRO PR; Mestre em Geografia, UNESP SP. Docente Ensino Superior na UFFS, Campus LS. E-mail: [email protected] 2 Mestranda em Ensino de Ciências Naturais e Matemática- UNICENTRO; Graduada em Interdisciplinar em Educação do Campo- Ciências Naturais, Matemática e Ciências Agrárias -UFFS

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baseado na vivência do autor como estudante de escola rural multisseriada, Professor de

Escola do Campo, Diretor de Escola do Campo, Secretário Municipal de Educação,

Coordenador Estadual de Educação do Campo na SEED PR, Professor Magistério Superior

em instituição privada durante 6 anos e atualmente 5 anos em Universidade Federal. Professor

dos componentes curriculares de Educação do Campo, Matemática, Gestão, Metodologia

dentre outros e militante social popular junto aos Movimentos Sociais Populares do Campo

(MSPC).

A DURA REALIDADE DAS ESCOLAS DO E NO CAMPO, FRENTE À

DESUMANIZAÇÃO E MERCADOLOGIZAÇÃO DA VIDA HUMANA

O tema supramencionado traz à tona o processo de fechamento das escolas do campo

no Brasil e a mercadologização da vida humana, bem como as questões que provocam essa

situação real. Apresentam-se estar diretamente ligadas às amarras do modelo capitalista

hegemônico, mundializado em sua fase mais cruel de barbárie, em todo seu desenvolvimento.

Nesse sentido pensar sobre o fechamento das escolas do campo e o tema da mercadologização

da vida humana nos remete a dialogar com as questões de fundo que provocam essa situação

de desumanização. Uma dessas questões é retratada por Ciavatta e Frigotto (2003, p.17):

Globalização excludente mediada pelas relações capitalistas: ideologia do neoliberalismo – nova era do mercado e com isso o aniquilamento da esfera pública e do campo dos direitos. Mundialização do capital: hegemonia do capital especulativo. Monopólios que centralizam e monopolizam conhecimento, ciências e as novas tecnologias microeletrônicas, genéticas e a informação. (CIAVATTA; FRIGOTTO 2003, p.17).

Essa realidade nos impõe condições de retrocesso, de impedimento de avanços e um

caráter imobilizador. Quando dialoga-se empiricamente sobre as Escolas do Campo e seu

fechamento, vem à tona uma série de questões do ponto de vista do senso comum, tais como:

“não tem mais crianças no campo”, “temos apenas grandes fazendas”, “as crianças preferem

estudar na cidade”, “Não tem mais como deixar as escolas abertas no campo com tão poucas

crianças”, “isso dá prejuízo”, enfim, esses e outros pontos acabam sendo o mote de motivação

e de consenso articulado pelos governos com a população para aceitar de forma passiva o

fechamento das Escolas do Campo. Mas porque isso está ocorrendo? Será de fato que esses

são os motivos ou será que já são consequências do projeto de campo? Para compreender este

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fato, precisamos debater questões singulares e compreender cientificamente, desvelando os

reais motivos do fechamento das Escolas do Campo.

O capitalismo é um modelo que exclui o ser humano de qualquer processo e visa

somente o seu desenvolvimento pleno com uso máximo de tecnologias e conhecimentos cujo

único objetivo é o lucro. Nesse sentido à vida humana fica em segundo plano. Não seria

diferente para os sujeitos do campo, que já estiveram excluídos do modelo da “modernidade”

por serem considerados inferiores e que iriam desaparecer. Não há na perspectiva

hegemônica, qualquer racionalidade em investir em quem está fadado ao desaparecimento

como um todo. Isso somado ao fato de que a barbárie é globalizada, se duplica quando

entendemos a lógica dominante do capital.

O perigo das fábricas de cadáveres e dos poços do esquecimento é que hoje, com o aumento universal das populações e dos desterrados, grandes massas de pessoas constantemente se tornam supérfluas se continuamos a pensar em nosso mundo em termos utilitários. Os acontecimentos políticos, sociais e econômicos de toda parte conspiram silenciosamente com os instrumentos totalitários inventados para tornar os homens supérfluos. (ARENDT, 1989. Apud REGO, 2014, p. 9).

Essa é a lógica global de desumanização, de transformação de nossas vidas em mera

mercadoria. Passamos a pertencer ao mundo das coisas, não ao mundo humano. Em uma

condição de vida desumana em que a classe trabalhadora ainda carece de direitos animais a

serem atendidos, como alimentação, casa e vestuário, a educação entra em uma lógica de que

só pode ter acesso os privilegiados, os humanizados e as classes mais abastadas. Ou seja, há

“uma mercadologização da vida humana”. Isso é o que está em disputa, não é algo natural.

A palavra “Humano” que vem do latim na forma de homine e do termo humus (“solo”,

“terra”), representa um vínculo entre o humano e a terra, propriamente dita “vida humana”

(REGO, 2014, p. 11). A compreensão de humano neste contexto articula a raiz do campo e

demonstra a relação histórica de vínculo do homem com a natureza, com a terra, com a

produção de sua existência, produção de sua vida pelo trabalho, felicitado e emancipado. Por

que então esse distanciamento entre a terra/natureza e ser humano/desumano? Porque a lógica

do capital é o uso irrestrito da terra e da natureza para a produção de lucro e nesse projeto não

cabe a vida, muito menos a vida humana. O modelo hegemônico de agricultura mundial do

agronegócio bombardeia a vida. De forma indiscriminada mata a fauna, a flora, animais e

humanos sem qualquer escrúpulo, sem qualquer ética e pudor. Para Rego (2014, p. 15), “o

“humanizar-se”, encontra-se na ordem de um constante definir-se, de um contínuo fazer-se e

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refazer-se rumo àquilo que não está dado. Por isso, a humanidade, sob essa perspectiva, é

sempre projeto”. Não há uma verdadeira humanização.

Outro caráter da dimensão humana é delegar a um suposto mundo imaterial, e a Deus

as mazelas vividas pelo povo. Há uma construção na sociedade de que existe vida infinita

após a morte e que as mazelas do capitalismo nada mais é que provações para merecermos a

vida eterna. Isso faz com que pessoas de certa forma se aniquilem, se fechem em seu mundo

esperando o tempo passar e a morte chegar. Essas questões científicas e culturais propiciam

uma pluralidade de significados e vivências que criam as condições de humanização e

desumanização. Onde entra a educação? Com seu evidente papel politizador ou

desmobilizador das massas.

[...] a educação assume o caráter de requisito essencial para o desenvolvimento das condições objetivas e subjetivas necessárias para uma maior inserção de ciência e de tecnologia nos processos produtivos [...] com vistas ao aumento da produtividade e da qualidade do trabalho, o que significa maior competitividade do capital nacional no mercado globalizado. (SOUZA, 1998, p. 66)

A educação prepara ao nível alienante da condição de entendermos que o único projeto

viável é a do capital, que temos de formar sujeitos empreendedores e competitivos para o

mundo do trabalho, mundo esse organizado e planejado pelo modo de produção capitalista.

A educação do cidadão produtivo, onde o mercado funciona como princípio organizador do conjunto da vida coletiva, distancia-se dos projetos do ser humano emancipado para o exercício de uma humanidade solidária e a construção de projetos sociais alternativos. (CIAVATTA; FRIGOTTO, 2003, p. 58).

Isso causa estranhamento ao trabalhador (ora), que não se vê humanizado nesse

processo mas que é apenas “a coisa” a disposição do mercado para vender a única “coisa” que

tem: o trabalho, e ao vender "a coisa” é “coisificado” ao deixar todo seu tempo à disposição

do capital, seja para o trabalho manual ou para o trabalho intelectual. Isso impede que o

trabalhador participe orgânica e coletivamente das atividades comunitárias e solidárias na

produção da vida, na produção social, nas sociedades de classe. É notório no capitalismo

como afirmam FRIGOTO e CIAVATTA (2014, p. 59), “sua incapacidade de distribuir e

socializar a produção para atendimento das necessidades humanas básicas e a hipertrofia do

capital financeiro especulativo que ameaça a tudo e a todos”. No entanto o Estado funciona

para cumprir a agenda do capital, mesmo em momentos de consenso com a classe

trabalhadora o que se contrapõe o estado de direito que garante a vida plena à população. No

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artigo 227 da Constituição Federal, Capítulo VII – Da família, da criança, do adolescente, do

jovem e do idoso:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010.(BRASIL, 2018).

Dialeticamente podemos perceber as contradições e os conflitos, na relação dos

sujeitos organizados em movimentos sociais com o Estado. “Parece que hoje é mais fácil

imaginar a deterioração total da terra e da natureza do que o colapso do capitalismo tardio; e

talvez isso possa ser atribuído à debilidade de nossa imaginação” (JAMESON, 1997, p. 10).

O modelo capitalista impõe uma condição única de que o que produz mais, com

rapidez, qualidade, competitividade e empreendedorismo, é o que de fato tem qualidade e

competência, desqualificando a produção da vida pelo povo que não necessariamente está

atrelado a essas questões, como os povos indígenas, quilombolas, camponeses, ilhéus,

ribeirinhos, pescadores, dentre outros; que possuem outra lógica em relação ao o que é

produzir, o que é qualidade e o que é viver. Nesse sentido devemos olhar para a realidade

como um todo para compreendermos nossas singularidades dentro de um conjunto amplo,

hegemônico e mundializado. Só assim podemos compreender o objeto em questão que está

dentro de uma realidade que não reconhece o campo e os sujeitos que não fazem parte da

classe dominante.

FECHAMENTO DE ESCOLAS: RESISTÊNCIA E PRESSÃO POR MEIO DO ESTADO

A Educação do Campo por meio da Articulação Nacional por Uma Educação do

Campo a partir de 1998 e a partir de 2012 por meio da FONEC (Fórum nacional da Educação

do Campo), passa a ser o sujeito coletivo que luta pelas políticas nacionais, estaduais e

municipais no âmbito de movimento social. Na década de 1990 foi o Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) o primeiro protagonista da educação do campo. Os

movimentos sociais têm lutado por uma educação específica e, por meio do Programa

Nacional de Educação na Reforma Agrária, conseguiram vários cursos, como Direito,

Pedagogia, Agronomia, dentre outros. Hoje mais de 40 universidades têm cursos de

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licenciatura em educação do campo. Porém nesse mesmo período os sujeitos coletivos do

agronegócio também passaram a reivindicar e implementar políticas de formação técnica.

Reconhece-se que as áreas rurais, por conta dos complexos processos de urbanização, foram historicamente colocadas à margem das políticas educacionais, fato que contribuiu para que a população que habita o meio rural não tivesse acesso a um processo educativo que considerasse as suas especificidades. Assim, a educação oferecida pauta-se, de modo geral, numa lógica urbanocêntrica, cuja prática pedagógica desenvolvida segue modelos transplantados das escolas urbanas (SOUZA, SANTOS; PINHO; ARAÚJO, 2011, p. 157).

De acordo com o Censo Escolar do Inep3, existiam 107.432 escolas em 2002. Desde

então, mais de 37 mil escolas foram fechadas porque não se investe recurso necessário, “se

precariza, fecha turmas, concentra o trabalho em apenas um período, nucleariza as escolas e

transporta os estudantes para as escolas da cidade, criando a convicção de que a escola da

cidade é melhor” Boletim da Articulação Paranaense por uma Educação do Campo (2018, p.

3). Os governos municipais e estaduais investem pouco na construção de escolas nas

comunidades rurais, utilizando os recursos para prover transporte que é majoritariamente

terceirizado, garantindo assim os conchavos eleitorais. Sobre a ótica econômica, as gestões

usam o argumento de que é mais barato deslocar do que atender o direito à educação com

qualidade próximo de casa, ou seja, no campo. Em geral, o argumento dos gestores para

fechar escolas é sempre o mesmo: corte de despesas. Preferem fechar a escola e contratar

transporte escolar do que contratar professores e merendeiras. A opção é péssima para os

trabalhadores e seus filhos e também dificulta o controle social sobre o pagamento da despesa.

Outra questão fundamental é tratada por Ferreira e Brandão (2017, p.11): “concentração de

alunos no meio urbano ofende os direitos básicos das crianças e adolescentes em idade

escolar, trazendo prejuízos à identidade cultural, à aprendizagem e ao desenvolvimento

cognitivo, pois perde a infância durante os longos trajetos até os centros urbanos”, somente

para atender critérios de gestão dos municípios e estados, sem comprovação científica e

social.

O Estado sempre negligenciou, silenciou, (e/ou) abandonou a Educação Rural (Leite,

1999, p. 11). A “Modernidade” urbanocêntrica não entende ser necessário políticas de Estado

para as áreas rurais, relegando-as ao abandono, ao esquecimento, ao silenciamento e ao

desinteresse, pelas práticas pedagógicas. Dessa forma, é necessário frear o fechamento de

escolas no campo e criar novas, que tenham toda a infraestrutura necessária: com salas 3 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.

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adequadas, computadores, internet que funcione, bibliotecas, laboratórios, dentre outras

infraestruturas mínimas. A Educação do Campo é o pressuposto para fazermos os

enfrentamentos e lutar contra o fechamento das escolas do campo. Para isso temos que ter

claro o projeto de campo que queremos. O projeto de Educação do Campo de interesse da

classe trabalhadora é um projeto de campo, com terra de trabalho, agroecológico, orgânico,

multicultivos, policultivos, mão-obra familiar, geração de renda, campo com gente, com

Escola do Campo. O fechamento das escolas no campo evidencia as disputas de projetos de

campo. O Estado está cada vez mais aparelhado para defender ao agronegócio, que tem como

princípio os grandes monocultivos, promove um campo sem gente e, por conseguinte, um

campo sem cultura e sem escola, sem igreja, sem agentes e eixos agregadores que permitem a

sobrevivência da comunidade camponesa e familiar. Essa concepção está alicerçada no

projeto globalizante de agricultura instituída pelo Banco Mundial (BM), que busca fazer com

que o Estado não promova a reforma agrária e a desconcentração fundiária por meio da

distribuição da terra e, “em vez disso, estimula o controle do território agrário por grandes

empresas” (RESENDE e MENDONÇA, 2004, P. 07).

A lógica é de subordinação das escolas, da educação, do conhecimento e da

consciência popular aos interesses comerciais e empresariais. Esse processo de fechamento

também reforça ao modelo único hegemônico de escola que está concatenado com o projeto

de desenvolvimento capitalista em que a educação é um instrumento de adequar as pessoas ao

mercado e quanto mais conservadora e enxuta, mais a educação conserva seu status. A

educação hegemônica mantém a divisão de classes, trabalha mesmo que subjetivamente

consensos de classe, o oprimido ainda fica lisonjeado por ter conseguido os méritos e ter

concluído sua escolaridade.

ARGUMENTOS LEGAIS CONTRA O FECHAMENTO DE ESCOLAS NO CAMPO

A essência dos Direitos Humanos é o direito a ter direitos (Hannah Arendt).

A classe trabalhadora camponesa já conta com elementos que reforçam a legislação,

pois em 2014 foi aprovada uma lei que contribui para o não fechamento das escolas do

campo. Isso possibilita a comunidade camponesa, de forma articulada e participativa, buscar

alternativas e argumentos para o não fechamento. No entanto, a inserção cada vez mais

efetiva das políticas ultraliberais, mantém a educação como aparelho privado da classe

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dominante, seguindo submissa ao capital em permanente processo homogeneizador da cultura

capitalista como único modo de produção e vida social.

[...] um possível primeiro passo para o rompimento da desumanização poderia ser o adotar a postura do porqueiro, que nada têm, nem mesmo o próprio nome, e cuja denominação lhe é imposta por quem o oprime; mas, por mais que ainda não saiba (e, muitas vezes, não possa) justificar seu estado de subserviência, há algo nele, inquietante, como o pulsar de coração, que não se convence da “verdade” do opressor (REGO, 2014, p. 164).

A conquista legal está embasada na Constituição da República Federativa do Brasil

(1988), Art. 6º, que coloca a Educação como direito; na Lei n º 9.394 de 20 de dezembro de

1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (LDB) e no seu Art. 28,

destaca que “na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino

promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural”. A

última conquista legal é a Lei n º 12.960 de 2014, que trata do fechamento de escolas rurais,

indígenas e quilombolas. A Lei passa fazer algumas exigências quanto ao fechamento, como a

manifestação de órgão normativo (conselhos municipais de Educação e do sistema de ensino),

manifestação da comunidade escolar, justificativas de parte da Secretaria de Educação do

estado, acerca da necessidade de encerramento das atividades da escola e também a

manifestação do Ministério Público, órgão fiscal da lei, que deverá considerar a justificativa

apresentada pela Secretaria de Educação, a análise do diagnóstico do impacto da ação e a

manifestação da comunidade escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O fechamento das escolas do campo está ligado a questões amplas da sociedade

capitalista e urbanocênctrica. Nesse sentido, precisamos urgentemente construir alternativas e

pensarmos quais as lutas a serem travadas contra a opressão, a desumanização e quais linhas

para um projeto, um caminho humanizante neste contexto mercadológico, coisificante.

O trabalho emancipado, a agroecologia, as cooperativas camponesas, a produção

orgânica, e a articulação de todos em movimento social popular do campo brasileiro podem

contribuir significativamente nesse processo. Como fazer? Não existem receitas, mas existe a

utopia, a determinação e a busca pelo eu individual valorizado para ser no indivíduo e

coletivo, utilizar a educação e formação popular nas comunidades, para dar força e poder para

construir práticas de outro projeto societário que contemple o campo com gente. O que vemos

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em relação ao projeto do capitalismo do agronegócio, é o “deus lucro”, que provoca a morte

da natureza com uso indiscriminado de agrotóxicos, o êxodo rural permanente e o

indiscriminado fechamento de escolas do campo em nome do economicismo de desculpas de

senso comum. O fechamento das escolas do campo é o fechamento da comunidade, da igreja,

do campo de futebol, do clube recreativo e dos encontros de famílias. A organização a

formação, a educação popular, as mobilizações, pressões e negociações, podem dar suporte a

luta política contra o fechamento das escolas do campo. Os estudos mostram que o Estado

somente concretiza uma política, por meio da pressão popular e quando deixam de serem

políticas de governo, transformando-se em políticas públicas permanentes.

Fica evidente que o fechamento de escolas já é consequência de um modelo de campo

instalado em que aprofunda as desigualdades de trabalho e de condições de vida. A concepção

hegemônica do capital estrategicamente, esconde, vela e aprisiona o possível desvelamento do

modo de produção capitalista, dado como único, a compreensão de que somos classe

trabalhadora, oprimida em toda sua condição de desumanização e mercadologização, exposta

a exploração, dominação e manutenção da desigualdade. Estamos vivenciando a cada dia a

complexidade do trabalho, a negação da formação plena, educação e formação técnica, e ao

mesmo tempo, vivendo um momento de fim dos direitos trabalhistas conquistados durante o

século. Os sujeitos coletivos devem buscar incessantemente, o resgate da individualidade

como parte de um coletivo, na construção do sujeito político. Por qual razão não fechar

Escolas do Campo? Por que é direito dos povos do campo a educação no lugar onde vive,

direto ao conhecimento científico produzido pela humanidade, escola politécnica que construa

conhecimento, que contribua na redução da penosidade do trabalho humano, que valorize a

vida, a cultura, a terra, que construa comunidade, solidariedade, contribua na redução da

evasão escolar, na reprovação e na redução do transporte escolar que desumaniza. A Escola

do Campo, como espaço de vivência da comunidade não só nas aulas formais, mais na

organização, produção, lazer, esporte, dentre outras necessidades da comunidade, como

organizar clube de mães, associações, cooperativas, mutirões, dentre outros elementos

eminentes da cultura camponesa que contribuem na emancipação humana e política.

Qual a tarefa? Sermos instrumentos de luta e resistência na produção da existência e

da vida, em meio às turbulências do capitalismo que esgotou sua capacidade de humanização,

se é que seria possível. Impera a barbárie, a força, destrutiva de direitos sem nem um pudor

ético-político. O consolo é histórico. Os estudos mostram que a história se repete, porém

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como farsa não permanente. Parafraseando Gramsci, “Ninguém pode governar pela força o

tempo todo, é preciso que os dominados aceitem a dominação, de que as ideias da classe

dominante façam parte de nosso senso comum”. Isso não faremos. Resistir e avançar é

possível!

REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:

Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.

BRASIL. Decreto-lei n.º12.960, de 27 de março de 2014. Altera a Lei no 9.394, de 20 de

dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para fazer

constar a exigência de manifestação de órgão normativo do sistema de ensino para o

fechamento de escolas do campo, indígenas e quilombolas.

BRASIL/MEC. Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional. Brasília, DF: 20 de dezembro de 1996.

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JAMESON, F. Pós-Modernismo. A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio. São Paulo:

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iguais em todo o mundo. IN: MARTINS, Mônica Dias. (Org). O Banco Mundial e a Terra.

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10

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EIXO TEMÁTICO 5:

EDUCAÇÃO DO CAMPO, TRABALHO, AGRICULTURA

FAMILIAR/CAMPONESA E AGROECOLOGIA

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CPRINCÍPIOS DA AGROECOLOGIA: A AMPLIAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

DOS AGROECOSSISTEMAS E O RESGATE E VALORIZAÇÃO DOS SABERES

TRADICIONAIS E POPULARES DOS CAMPONESES

Carlos Antônio Bonamigo1

Eixo Temático 5: Educação do Campo, Trabalho, Agricultura Familiar/Camponesa e

Agroecologia

Resumo: O objetivo deste artigo é construir um recorte teórico sobre dois princípios fundamentais da produção agroecológica: a ampliação da biodiversidade dos agroecossistemas e o resgate e valorização dos saberes tradicionais e populares dos camponeses. Pretende-se demonstrar que o modelo produtivo em torno da agroecologia proporciona o equilíbrio entre a produção agrícola e a sustentabilidade dos ecossistemas envolvidos na produção, instituindo-se por meio da contribuição dos saberes tradicionais das populações camponesas. O modelo produtivo da agroecologia busca, nesse sentido, a harmonização de interesses entre as demandas alimentícias e econômicas e os fatores sociais das populações envolvidas. Contemporaneamente no Brasil, a produção agroecológica contrapõe-se ao modelo produtivo dominante do agronegócio e se constitui num espaço de luta e resistência de amplos setores das populações camponesas.

Palavras-chave: Agroecologia; Princípios Agroecológicos; Biodiversidade; Saberes

populares.

Introdução

A sobrevivência da humanidade foi garantida, por milhares de anos, pelos alimentos

livres de qualquer produto quimificado. É possível afirmar que esta produção se caracterizou,

historicamente, como uma produção orgânica. Mas, com o advento da industrialização, houve

uma ruptura com o antigo modo de produção de alimentos. Ocorreram seguidas

transformações nos processos produtivos em geral e na agricultura, em especial. No Brasil,

essas alterações na produção agrícola ocorreram, sobretudo, a partir das décadas de 1960-70.

Contrapondo-se aos métodos tradicionais de produção até então existentes, a denominada

1 Formado em Filosofia e Pedagogia. Mestre e Doutor em Educação/UFRGS. Professor Adjunto da Unioeste Campus de Francisco Beltrão.

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“Revolução Verde”, caracterizou-se pela produção de monoculturas em grande escala,

aumento considerável da mecanização no campo, ascensão dos grandes produtores rurais em

detrimento dos agricultores familiares e por um processo acelerado de inclusão no processo

produtivo de variados insumos químicos.

Contrapondo-se a esse modelo agrícola dominante, desenvolvem-se, atualmente,

práticas agroecológicas voltadas para a produção de alimentos saudáveis e a inserção social

dos camponeses em suas comunidades e regiões. A agroecologia tem-se expandido

significativamente nos últimos anos e tem ganhado espaço no imaginário social. Entretanto, o

seu significado não é completamente preciso. Além disso, a literatura existente sobre o

assunto ainda dissemina compreensões pouco claras e, muitas vezes, polêmicas.

Por tratar-se de uma questão em que os consensos são quase inexistentes na área,

procuramos neste trabalho tão somente refletir sobre dois princípios que sobre os quais

repousa a produção agroecológica. Trata-se de um recorte, porque, na verdade, inúmeros

outros princípios e pressupostos constituem a agroecologia. Pretende-se aventar que o modelo

produtivo em torno da agroecologia proporciona o equilíbrio entre a produção agrícola e a

sustentabilidade dos ecossistemas envolvidos na produção, instituindo-se por meio da

contribuição dos sabres tradicionais das populações camponesas.

A ampliação da biodiversidade dos agroecossistemas

A agroecologia objetiva, de forma geral, a produção de alimentos saudáveis

combinada com práticas que não modifiquem agressivamente a natureza, diminuindo, dessa

forma, os impactos ambientais negativos da produção agrícola. Esse modelo produtivo da

agroecologia busca a harmonização de interesses entre as demandas alimentícias e

econômicas e os fatores sociais das populações envolvidas. Vincula-se à produção

agroecológica uma visão humanitária em sentido amplo, na medida em que controla os

impactos ambientais negativos e leva em conta, no seu processo produtivo, a complexidade

social e cultural das comunidades camponesas. (ALTIERI, 2006; ALMEIDA, 2008).

A agroecologia constitui-se por meio de princípios que orientam não só a produção

sustentável, mas a melhora dos aspectos sociais do campo, dando importância aos produtores

rurais, suas condições de vida e de educação. (CAMARGO, 2007). Fundamenta-se, por isso,

na produção de alimentos saudáveis, em oposição ao modelo de agricultura quimificada,

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caracterizada pela chamada “Revolução Verde” e, contemporaneamente, pelo “agronegócio”,

e a valorização dos componentes sociais e econômicos dos processos produtivos agrícolas. Ao

respeitar o ecossistema, busca viabilidade econômica e promoção de uma sociedade

camponesa (não apenas, mas também!) igualitária. (ALTIERI, 2006).

Nesse sentido, a agroecologia se encaixa num modelo sustentável de produção

agrícola na medida em que busca amenizar os impactos ambientais e diminuir a agricultura

predatória que transforma negativamente a natureza. Para atingir essa meta de

sustentabilidade é preciso uma agricultura que concilie os processos biológicos e físicos, mas

que também abranja os processos produtivos envolvendo-se em questões sociais, econômicas

e políticas. (ALTIERI, 2006; ALMEIDA, 2008).

A produção agroecológica substitui os produtos químicos industrializados pela

inserção de insumos orgânicos, produzidos a partir de processos naturais. A implementação

dessa produção alternativa sustenta-se e tem como base de seu desenvolvimento, os saberes e

as informações agrícolas tradicionais dos camponeses, passados em seu cotidiano de geração

em geração. Utiliza-se, ao mesmo tempo, das novas tecnologias que são criadas em função da

racionalidade ecológica e da preservação de ecossistemas sustentáveis. (CAMARGO, 2007).

Nesses novos agroecossistemas busca-se construir uma produção com a menor

quantidade de insumos externos, desenvolvendo os processos utilizando-se do próprio sistema

interno, potencializando os contingentes para a produção e reprodução de variedades

alimentícias, preservando a biodiversidade local dos agroecossistemas. É por meio da

variedade da biodiversidade que é possível a interação entre o solo, as plantas e os animais,

sendo assim dentro do próprio agroecossistema se produz a fertilidade do solo, não

necessitando para isso de insumos químicos externos. Essa interação e sinergismo dos

elementos internos possibilitam o aprimoramento de várias melhorias para o agroecossistema,

ampliando e fortalecendo, ainda mais, a produção agroecológica. (CAMARGO, 2007).

Para a agroecologia não interessa apenas a saúde ecológica dos ambientes, mas sim a

preservação da diversidade cultural existentes nas agriculturas locais. Nesse sentido,

fundamenta e auxilia à criação de agroecossistemas voltados para a interação interna que,

ecologicamente, interagem plantas e animais. Essa integração de recursos que acontece dentro

dos agroecossistemas acaba por contribuir com toda a produção agrícola e efetivar os

princípios agroecológicos. (CAMARGO, 2007).

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Isso acontece, em primeiro lugar, porque esse sistema valoriza e se adequa às

particularidades dos recursos locais dos produtores (como por exemplo solo, germoplasma,

água, diversidade vegetal e de fauna) além de incentivar a participação dos trabalhadores e a

inserção dos saberes tradicionais no manuseio das produções agroecológicas. Em segundo

lugar, procura estabilidade dos processos socioambientais e econômicos particulares de cada

localidade, dando autonomia às propriedades agrícolas e não massificando a produção com

pressupostos que todos os ambientes produtivos sejam iguais. (ALTIERI, 2006).

Um dos principais aspectos da agroecologia é que, tanto as orientações como as

decisões tomadas sobre os procedimentos, técnicas e produção são oriundas dos

agroecossistemas locais, partindo das particularidades de cada localidade. A interação entre

vários produtos agrícolas cultivados em um mesmo agroecossistema trazem inúmeras

vantagens como, por exemplo, a criação de uma cobertura vegetal que protege do sol, garantia

tanto de uma produção contínua como de variedade de produtos, fertilidade do solo não

precisando utilizar-se de insumos químicos vindos de fora para a produção, ajuda na

conservação do solo e de recursos naturais, entre outros. (CAMARGO, 2007).

Os pequenos agricultores e camponeses, historicamente existentes, com parcos

recursos e que foram excluídos pela dinâmica hegemônica da agricultura capitalista, são os

principais protagonistas da formação da agricultura agroecológica. Camargo (2007) formula

uma definição desses camponeses que vivem com sua família no campo, dentre os aspectos

estão: valores morais estritamente relacionados à família, ao trabalho e à terra; preocupação

na segurança alimentar da família produz um policultivo levando em consideração os recursos

da localidade em que se encontra, fazendo interações entre plantas e animais para que consiga

reduzir o uso de insumos químicos externos; boa relação de troca de recursos com vizinhos e,

mesmo quando dentro de um sistema agroindustrial, ainda possui autonomia nas decisões e

estrita relação com seu agroecossistema.

Utilizam-se, para isso, das inúmeras informações contidas nos sistemas tradicionais

de agricultura camponesa que já há algum tempo subsiste e que agora ganham impulso com a

agroecologia. Nesse sentido, a agroecologia se expande ao meio social ao dar aos agricultores

camponeses o título de arquitetos do seu próprio desenvolvimento, contribuindo na

eliminação da pobreza rural e reinserindo-os socialmente como agentes econômicos e

culturais. (ALTIERI, 2004; CAPA, 2017).

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Para o desenvolvimento de uma agricultura de e para os pequenos agricultores capaz

de trazer retorno econômico e social é preciso manter boa produtividade e qualidade da

produção. Para isso, torna-se relevante adequar as áreas produtivas aos novos plantios e

utilizar-se dos recursos naturais, enquanto que, ecologicamente, precisa-se da conservação

desses recursos naturais. Dessa forma, essa dinâmica produtiva pode ser alcançada superando

a pobreza rural, dando autonomia aos camponeses e utilizando-se de seus saberes. (ALTIERI,

2006).

O resgate e a valorização dos saberes tradicionais e populares dos camponeses

A etnociência vem estudando a diversidade dos povos camponeses e a riqueza de

seus saberes sobre a terra, os animais e seus agroecossistemas locais. A agroecologia, dando

importância a essa diversidade, tendo um enfoque social e dando protagonismo aos

camponeses, compreende os saberes tradicionais desses camponeses como um de seus

princípios norteadores e os trata como imprescindíveis para a criação de uma agricultura

viável ecológica e economicamente. Nesse sentido, a agroecologia pretende conciliar os

saberes tradicionais e as técnicas modernas para que não prejudique os recursos naturais,

gerando autossuficiência dos pequenos produtores e, ao mesmo tempo, ajudá-los nas questões

sociais, tornando-os protagonistas do seu próprio desenvolvimento econômico e social.

(ALTIERI, 2004).

Para as práticas agroecológicas terem sucesso, ou seja, para se constituírem em uma

alternativa ao modelo produtivo agrícola dominante, torna-se imperativo a construção de

processos sociais educativos entre os sujeitos sociais envolvidos no processo produtivo e,

acima de tudo, “[...] o reconhecimento da existência de saberes e de conhecimentos próprios

de um determinado sistema cultural, assim como o potencial que estes saberes podem ter

como base para outros estilos de desenvolvimento rural e de agriculturas.” (CAPORAL;

COSTABEBER; PAULUS, 2011, p. 66).

A agroecologia é uma ciência integradora de várias disciplinas e dos saberes

existentes entre a população envolvida no processo produtivo. Busca a produção de alimentos

livres de agrotóxicos, ou seja, alimentos saudáveis e naturais. Para alcançar esses objetivos a

agroecologia sustenta-se pela não utilização de agrotóxicos na produção de alimentos. Os

princípios sustentadores da agroecologia preocupam-se em criar uma nova ética ambiental,

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visando a eliminação do uso de agrotóxicos e toda forma de destruição da biodiversidade,

preservando os agroecossistemas. Desse modo, busca mudar as práticas políticas,

socioculturais e os comportamentos dos envolvidos no processo, respeitando os propósitos e

as intenções dos atores de desenvolvimento de agriculturas sustentáveis. (CAPORAL;

COSTABEBER; PAULUS, 2011).

Nesse sentido, o processo agroecológico possui seus eixos não voltados apenas na

forma de manejo ecológico, mas também engloba os mais diversos fatores, levando em conta

aspectos de caráter social, como a interação entre os indivíduos, a valorização das produções

familiares, as questões culturais, o respeito ao meio ambiente e seus recursos. (ABREU et al.,

2012).

Na agroecologia, os aspectos sociais são de grande importância, pois trata-se de um

processo de caráter social, mediado pela ação humana. Aspectos de igualdade social se

apresentam na agroecologia desde à igualdade de gênero, visando à participação das mulheres

na produção, à garantia de igualdade de acesso às práticas produtivas e que seja socialmente

justa. A matriz agroecológica preza pelo controle das questões econômicas e produtivas e

também proporciona mudanças das ações humanas, em seus valores em relação ao meio

ambiente. (CAPORAL; COSTABEBER, 2004).

É por isso que a agroecologia tem como princípio orientador a valorização de

culturas e conhecimentos locais, agregando a valorização do conhecimento existente nas

populações, que estão presentes nas mais diversas gerações, repassados sucessivamente.

Dessa forma, haverá a integração dos conhecimentos locais ao conhecimento científico, que

em conjunto, resultam em um novo composto de saberes de caráter socioambientais,

potencializador das práticas agroecológicas. (CAPORAL; COSTABEBER, 2004).

Os saberes tradicionais podem ser considerados como bases dos conhecimentos

agroecológicos e como verdadeiras fontes do saber. A agroecologia, nessa instância, pode ser

considerada como um processo gradual em que valoriza os antigos saberes populares,

oportunizando a todos serem atores da construção de uma produção mais responsável. Na

agroecologia, esses conhecimentos locais são resgatados e inseridos aos avanços tecnológicos

agroecológicos por meio de uma socialização de saberes. (CAPORAL; COSTABEBER,

2004).

Na construção de agroecossistemas sustentáveis e na introdução dos princípios

agroecológicos, torna-se importante a introdução dos conhecimentos tradicionais conservados

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e passados de pai para filho pelos camponeses residentes nas diversas regiões. Esses

conhecimentos resultam de uma longa experiência que ocorre da relação entre terra e

camponês. (ALTIERI, 2004).

A agroecologia é um conhecimento que existe e vem sendo estruturado há milhares

de anos. Representa, nesse sentido, conhecimentos advindos dos sistemas agrícolas

tradicionais e das experiências que foram sendo acumuladas de camponeses que,

historicamente, interagiam com o meio ambiente com os próprios mecanismos internos

fornecidos pelos seus agroecossistemas, não tendo acesso aos insumos externos, ou qualquer

domínio de capital tecnológico ou produtos industrializados. A agroecologia procura

compreender os fenômenos na sua totalidade e globalidade abrangendo todos os elementos

humanos e ambientais. Desse modo, enfoca a forma, a dinâmica e as funções do conjunto de

inter-relações e de processos nos quais esses elementos estão envolvidos. (ALMEIDA, 2012).

Além de proporcionar as bases científicas e metodológicas, a agroecologia promove

estilos de agricultura sustentáveis, centrados na necessidade de produção de alimentos que

sejam produzidos em quantidades adequadas e com qualidade biológica elevada para toda a

sociedade. É considerada como ciência emergente, pois é “[...] orientada por uma nova base

epistemológica e metodológica. É um campo do conhecimento transdisciplinar, que recebe as

influências das ciências sociais, agrárias e naturais.” (LEITE, 2011, p. 6).

Por todas essas questões, a agroecologia sofre forte oposição da agricultura

capitalista hegemônica, estruturada em torno do agronegócio e do latifúndio. Por isso, para a

sua efetivação, depende de sua articulação com os avanços da reforma agrária de base popular

para formular uma visão de agricultura que seja economicamente viável, ecologicamente

sadia e, ao mesmo tempo, competitiva. Nesse sentido, faz-se necessário uma transformação

profunda nos modelos de desenvolvimento rural e da própria agricultura como um todo.

(SILVA, 2012).

Para esses propósitos, a agroecologia sustenta-se em torno do princípio do resgate e

da valorização dos conhecimentos tradicionais dos camponeses dando reconhecimento ao

saber local da agricultura familiar e as potencialidades de cada ambiente, do ponto de vista

social e cultural. “Os agricultores, há milênios passam experiências aos seus descendentes e

que de alguns anos para cá, mais precisamente há 120 anos, foram quase esquecidas.”

(MORAIS, 2016, p. 4). O resgate e a valorização de práticas agropecuárias tradicionais

contribuem na construção da formação de conhecimentos agroecológicos.

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“Os agroecologistas reconhecem, hoje, que os métodos tradicionais de agricultura

imitam os processos ecológicos naturais e que a sustentabilidade de muitas práticas locais

deriva dos modelos ecológicos que elas seguem.” (ALMEIDA, 2012, p.1). Por esse motivo,

milhares de sementes estão sendo adaptadas para o uso do produtor, de acordo com as

condições climáticas e das características do solo. “Ao se planejarem sistemas agrícolas que

imitam a natureza torna-se possível otimizar o uso da luz do sol, dos nutrientes do solo e da

chuva.” (ALMEIDA, 2012, p.1).

Além disso, estão sendo resgatadas, valorizadas e recriadas técnicas de cultivo

amigáveis com o meio ambiente, potencializando formas de prevenção contra pragas e

doenças que afetam a produção agrícola. A utilização de tais conhecimentos permite o

desenvolvimento de uma agricultura condizente com os tempos contemporâneos que cada vez

mais valoriza a sustentabilidade e a vida saudável, livrando-se da dependência de pacotes

tecnológicos da indústria de produtos químicos, que se tem demonstrado inadequados à

preservação do meio ambiente e da saúde humana. (LEITE, 2011).

Considerações Finais

Com características de uma produção agrícola voltada à preservação dos recursos

naturais e produção de alimentos saudáveis, a agroecologia se fundamenta em princípios que

ampliam a biodiversidade dentro dos agroecossistemas, fazendo-os autossustentáveis e

interagindo com seus próprios componentes para a produção agrícola sem a necessidade de

insumos químicos externos. Os saberes tradicionais dos camponeses também se tornam

importantes para a construção da agroecologia, tanto pelos conhecimentos gerados e aplicados

em várias gerações, quanto pelas novas possibilidades abertas de inserção social pelas práticas

agroecológicas.

A matriz produtiva da agroecologia sustenta-se em torno da produção de alimentos

saudáveis e livres do uso de produtos químicos. Para a sua implementação, torna-se

importante levar em conta os sistemas culturais das comunidades produtivas, incorporando os

saberes sobre os agroecossistemas existentes, potencializando, a partir das características

naturais desses ambientes, o intercâmbio necessário entre ser humano-natureza-animais

visando à eliminação do uso de agrotóxicos na produção de alimentos.

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Ao mesmo tempo, enquanto possibilidade, a agroecologia emerge como uma

alternativa à agricultura tradicional, capitaneada atualmente pelo agronegócio. Baseada em

múltiplos princípios, a agroecologia é uma forma diferente de produzir alimentos, mais

saudáveis, que valorizem a produção familiar, para diminuir a evasão do campo e obviamente

a proteção do meio ambiente. A substituição da agricultura convencional para agroecologia

não é simples, requer toda uma reeducação no modo de pensar e fazer a produção agrícola.

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EIXO TEMÁTICO 6:

EDUCAÇÃO DO CAMPO E HISTORIOGRAFIA DAS INSTITUIÇÕES

ESCOLARES

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“ERA MAIS FÁCIL TRAZER UM PROFESSOR DO QUE LEVAR TODOS OS

ALUNOS”: SOBRE O FECHAMENTO DA ESCOLA ISOLADA BARRO BRANCO E

A NUCLEAÇÃO EM ALFREDO WAGNER (SC)

Eliandra Carla Sebold1

Juliano Batista2

Eixo Temático 6: Educação do Campo e historiografia das Instituições Escolares

Resumo: Este artigo tem como objetivo identificar, a partir das concepções dos sujeitos do campo afetados, as consequências do fechamento da escola multisseriada do campo Escola Isolada Barro Branco, localizada no interior de Santa Catarina, no município de Alfredo Wagner. A pesquisa é fruto das observações participantes realizadas, durante o ano de 2018, na Escola do Campo Passo da Limeira, a partir do Tempo Comunidade (TC) feito dentro da base teórica metodológica da Licenciatura em Educação do Campo, a Pedagogia da Alternância. A partir da observação participante e de conversas informais com a comunidade escolar do Passo da Limeira percebemos a necessidade de refletir criticamente sobre o fechamento da Escola Isolada Barro Branco e posterior nucleação na Escola do Campo Passo da Limeira. Para realização da pesquisa realizamos entrevistas semiestruturadas com os sujeitos do campo que participaram efetivamente de todo o processo. Nos interessa: 1) descrever como ocorreu o processo de fechamento da Escola Isolada Barro Branco e posterior nucleação das escolas do campo da região; 2) relatar quais foram as consequências (positivas ou negativas) para as famílias afetadas dando visibilidade a narrativa histórica desses sujeitos. Consideramos importante ouvir os sujeitos oprimidos do campo que viveram essa realidade a fim de visibilizar o outro lado da história. Vontade advinda, principalmente, por temos mais acesso a apenas um lado, geralmente aquele ligado às informações oficiais de órgãos estatais. A partir dos dados levantados, é possível afirmar que houve um processo de resistência ao fechamento da escola, que as famílias não foram reconhecidas como sujeitos de direitos e que a nucleação atingiu diretamente a relação entre a comunidade e a instituição escolar, prejudicando também o ciclo de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: Escola do Campo; Fechamento das escolas do campo; Nucleação.

1 Graduanda na Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected] 2 Graduando na Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected]

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Introdução

Este artigo tem como objetivo identificar quais as consequências do fechamento, no

início dos anos 2000, da Escola Isolada Barro Branco, instituição escolar pública do campo,

localizada na comunidade de Barro Branco no município de Alfredo Wagner em Santa

Catarina (SC), a partir da perspectiva dos sujeitos do campo (pais, educandos e educadora)

que compunham a comunidade escolar na época. Interessa-nos: 1) descrever como ocorreu o

processo de fechamento da Escola Isolada Barro Branco e posterior nucleação das escolas do

campo da região; 2) relatar quais foram as consequências (positivas ou negativas) para as

famílias afetadas. O tema foi escolhido a partir das experiências vividas por nós, durante o

ano de 2018, no Tempo Comunidade (TC) do curso de Licenciatura em Educação do Campo

da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Uma das características dos cursos de Licenciatura em Educação do Campo é a

Pedagogia da Alternância, a qual teve início na França e nasceu de um movimento de

camponeses e populações do meio rural que lutaram por uma educação diferenciada para seus

filhos em meio a duas guerras mundiais no século XX. Sua introdução no Brasil se dá no final

da década de 1960, sendo implantada sobre o modelo italiano, em algumas instituições

escolares rurais. A partir das diretrizes, nos anos 2000, para Educação do Campo, a Pedagogia

da Alternância se insere em vários programas e projetos educacionais e passa a ser dotada e

refletida nas políticas setoriais, como a defendida pelo Ministério do Desenvolvimento

Agrário, por meio do Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (Pronera), que se

refere a ela como tempo-escola (TE) e tempo-comunidade (TC). De acordo com Cordeiro

(2011), tal pedagogia é uma proposta educacional para garantir que o estudante do campo

consiga trabalhar sem abandonar os estudos. Isso também permite que os jovens do campo

tenham acesso aos conhecimentos tecnológicos e científicos fazendo relação da teoria com a

prática.

Sendo, portanto, a Pedagogia da Alternância uma das bases teórico-metodológicas da

Educação do Campo o nosso curso está organizado em tempo-universidade (TU) – em sala de

aula, estudando teorias e adquirindo o conhecimento científico; e tempo-comunidade (TC) –

de inserção nas comunidades escolares, nas quais conseguimos fazer a relação da teoria com a

prática.

Em nosso TC, que foi realizado na Escola do Campo Passo da Limeira (Alfredo

Wagner – Santa Catarina), realizamos observação participante com o objetivo de entendermos

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o dia-a-dia da escola. Além das observações, fizemos entrevistas e tivemos conversas

informais com educadores e estudantes as quais foram muito esclarecedoras e nos ajudaram a

enxergar as consequências decorrentes do fechamento das escolas públicas do campo e da

posterior nucleação. Vimos que esse processo trouxe problemas para os estudantes, como:

mais tempo no transporte escolar (cerca de 1 hora no acréscimo do trajeto); fome (os

estudantes principalmente do período matutino acordam cedo e saem de sua casa sem fazer

uma alimentação adequada e sua primeira refeição do dia acontece na escola); perda do dia

letivo (quando chove os estudantes não conseguem ter acesso a escola devido as malhas

viárias estarem em más condições de se trafegar).

A partir disso, sendo sujeitos do campo (no passado, estudantes de escolas públicas

do campo que foram fechadas) e graduandos em Educação do Campo, consideramos

importante ouvir os sujeitos oprimidos do campo (FREIRE, 1968) que fizeram parte do

processo de fechamento e nucleação a fim de visibilizar o outro lado da história. Vontade

advinda, principalmente, por temos mais acesso a apenas um lado da história, geralmente

aquele ligado às informações oficiais representadas pela Secretaria de Educação. Nesse

sentido, além das observações, foram realizadas entrevista semiestruturadas com três pais,

uma educadora e um educando que foram afetados com a nucleação.

No primeiro tópico, descreveremos a escola na qual ocorreu as vivências do TC, bem

como um pouco das experiências que tivemos nesse percurso, já que dentro da lógica da

Pedagogia da Alternância consideramos o TC como parte da metodologia. No segundo

narraremos, a partir dos dados coletados, como ocorreu o processo de nucleação da Escola

Isolada Barro Branco e como foi esse processo para as famílias.

O Tempo Comunidade na Escola Básica Passo da Limeira

A Escola Isolada Estadual Passo da Limeira iniciou em 1920 e funcionava numa casa

simples de madeira, construída pela própria comunidade, próxima a margem direita do Rio

Itajaí do Sul, no terreno doado pelo senhor Alcebíades Andersen. Na época, a instituição

pertencia ao município de Bom Retiro e eram os inspetores que faziam as visitas nas escolas e

assinavam um termo no qual deixavam registrados o que encontravam nas mesmas, inclusive

sobre a parte pedagógica e a atuação do professor dentro e fora da sala de aula. A educação

dava ênfase a Religião, a Disciplina e a Moral.

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Em 1962, um ano após Barracão se tornar município, a região passou a se chamar

Alfredo Wagner e a Escola Isolada Estadual Passo da Limeira passou a pertencer ao

município. Aproximadamente em 1991 foi construído o novo prédio escola de alvenaria que

funcionou até 1999. Em 1998 iniciou-se a construção da Escola Básica Passo da Limeira, no

terreno doado pelo senhor Vanderlei da Silva, nessa época secretário da saúde do município,

localizado ao lado da Igreja Nossa Senhora Mãe dos Pobres, em frente a BR-SC 350.

A Escola Básica Passo da Limeira (E. B. Passo da Limeira) tornou-se oficial através

do Parecer nº 306 /CCE de 05/10/99 Portaria 169 / SED de 10/11/99 e iniciou suas atividades

no dia 28/02/2000, atendendo a 21 comunidades com o total de 338 alunos de 1ª a 8ª séries do

Ensino Fundamental nos períodos matutino e vespertino. Desse modo, a unidade construída

foi a destinada para a nucleação das instituições escolares do campo da região.

Em 2002, a E.B. Passo da Limeira teve uma ampliação significativa do prédio no

qual foi construído mais quatro salas para atender os alunos de 1ª a 4ª séries, uma sala com

quatro banheiros adequados para atender os alunos do pré-escolar, como também uma sala

para o laboratório de informática, possibilitando assim um melhor atendimento aos alunos.

Em 2002 também o antigo prédio da escola passou a ser ocupado pelo posto de saúde que foi

implementado na comunidade e que permanece em funcionamento até os dias atuais.

Em 2003 iniciaram o ano letivo com um curso de capacitação que deu suporte na

formulação do Plano Político Pedagógico (PPP) da escola. Nesse ano estavam matriculados

419 alunos e o pré-escolar iniciou seus trabalhos com 24 alunos. No ano de 2014 a escola

passou a se chamar Escola do Campo, isso porque seus estudantes são 100% da área rural.

Alguns professores fizeram uma capacitação para trabalhar de fato conteúdos relacionados a

uma Educação do Campo e no PPP passou a constar a lei de Educação no Campo.

Os materiais utilizados para a aprendizagem dos estudantes são os seguintes: mapas,

globo, dicionários de português e inglês, televisores, data show, notebook, mimeógrafo,

aparelho de som, retroprojetor e transparências, materiais de expediente, jogos didáticos

diversos, bolas de vôlei e futebol. No entanto, ressaltamos que, de acordo com relatos dos

educadores, esses materiais foram adquiridos pelos próprios professores com o intuito de

facilitarem o aprendizado dos educandos.

As primeiras observações na Escola Básica Passo da Limeira não foram muito fáceis,

já que aquele local já fez parte do nosso cotidiano e há alguns anos éramos nós os estudantes

daquela instituição escolar. Dessa forma, foi necessário aprender a distanciarmo-nos para

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ampliar nossa visão como educadores em formação e também pesquisadores. Com o passar

do tempo no TC, a tarefa foi sendo melhor assimilada e conseguimos elaborar o dia-a-dia da

escola. Durante as observações realizadas podemos perceber a carência por falta de espaço

físico e o sinal de abandono pelo poder público por falta de recursos, vendo que aquele local

depois de sua inauguração no ano 2000 nunca passou por uma reforma significativa. A

promessa, portanto, de que a nucleação traria melhoras e mais verbas não foi cumprida. Uma

das carências de estrutura que a escola tem, por exemplo, é a necessidade de uma quadra

coberta para que os estudantes possam ter o mínimo de conforto para as práticas de Educação

Física, já que temos épocas durante o ano letivo que é muito quente, na qual eles ficam

expostos diretamente ao sol e outra época que é muito frio, principalmente nas primeiras

horas do dia, na qual temos presença de geadas na região.

Nos entendendo também como parte da comunidade escolar, procuramos ajudar de

alguma forma para a melhoria daquele local, em conversas com a direção decidimos começar

a atuar de alguma forma mais significativa dentro daquele espaço. Começamos a pintar as

faixas das quadras de futebol e voleibol para a prática de exercícios ao ar livre, junto disso

também pintamos as amarelinhas e o parquinho das crianças do Fundamental 1. Nosso intuito

era dar um ar mais alegre ao ambiente. Durante o TC, notamos como aquela simples reforma

tinha uma importância para as crianças, já que recebemos elogios e agradecimentos pelo

trabalho.

A escola possui uma horta e um jardim que está sendo cuidado pelos estudantes do

Ensino Fundamental 1, através de um projeto iniciado na Secretaria Municipal de Educação

de Alfredo Wagner-SC. É um projeto piloto chamado Meio Ambiente que aproxima os

estudantes do campo com suas realidades através de aulas mais práticas. Durante o TC,

acompanhamos algumas dessas aulas e podemos notar que eles gostam das aulas e ficam

empolgados para ir na horta: mexer com a terra, plantar. Notamos que devido ao interesse

maior, o conhecimento torna-se mais facilmente assimilado. Porém não são todos os

professores que ministram suas aulas tentando vincular teoria e prática. Alguns seguem

exclusivamente o livro didático e o currículo nacional, nessas aulas muitos dos estudantes

ficam desmotivados com os estudos e pensam em desistir. Avaliamos que a falta de

identidade com o conteúdo programático colabora com o desejo de evadir.

Nas observações realizadas notamos o quanto a relação com o transporte

(consequência do fechamento e nucleação das escolas do campo) norteia todo o cotidiano

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escolar, desde a presença nas aulas ao cansaço das horas percorridas. Diante desses fatos,

decidimos aprofundar, através de uma pesquisa qualitativa, sobre as mudanças e os impactos

que o fechamento e a nucleação trouxeram.

Sobre a nucleação e o fechamento da Escola Isolada Barro Branco em Alfredo Wagner

Segundo Peixer e Varela (2016), na última década do século XX no Brasil, ocorreu o

processo de nucleação das instituições escolares, incentivando o fechamento de escolas

multisseriadas, situadas em áreas rurais. As décadas de 1980 e 1990 foram um período de

novas legislações no país, na qual, LDB 9394/96 definiu os graus de responsabilidade

administrativa da escolarização básica a superior entre os níveis federal e municipal

(BRASIL,1996). Alguns programas educacionais antecederam o processo de nucleação,

dentre eles temos o Programa Nacional de Manutenção do Ensino Fundamental (PMDE), de

1995, que tem como um dos objetivos agilizar a assistência financeira da união para os

Estados e municípios. A base de cálculo para os repasses vincula-se ao número de estudantes

matriculados.

Em Santa Catarina, ocorreu o processo de mudança de responsabilidade no

funcionamento e manutenção das escolas de ensino fundamental, transferidas da esfera

estadual para a municipal. Em Alfredo Wagner, a nucleação também chegou e em entrevista

concedida para nós por uma educadora que lecionava nas escolas multisseriadas, obtivemos a

seguinte afirmativa: “a nucleação foi algo mal planejado (...) o Estado ofereceu transporte e

propostas que pareciam ser boas, mas hoje se gasta muito mais com o transporte escolar.

Além disso, foi um processo complicado e difícil, porque os pais não queriam”. (Tereza

Silveira, educadora, 2017)

Na entrevista, conseguimos perceber que foi um processo marcado por contradições

e resistências e que pouco se foi discutido com a comunidade escolar a respeito de suas

implicações. Fomo, por conseguinte, ouvir como aconteceu e qual a visão sobre o fechamento

da Escola Isolada Barro Branco para os sujeitos oprimidos (FREIRE, 1968) do campo da

comunidade, sendo ela 100% agricultura familiar, com pequenas propriedades nas quais é

cultivado tabaco, cebola e gado leiteiro. A comunidade tem 59 famílias e 34 estudantes que

vão para a Escola Passo da Limeira, no transporte escolar.

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De acordo com os pais entrevistados, a Escola Isolada Barro Branco teve seu

funcionamento interrompido no ano de 2006 quando possui entre 20 a 30 estudantes

matriculados. Segundo três pais entrevistados, o processo de nucleação foi decidido pelo

poder municipal e os pais não tiveram outra alternativa. No relato, explicaram que foi avisado

as famílias dias antes das aulas iniciarem que os estudantes seriam transferidos para a Escola

Passo da Limeira: a 15 km de distância da Escola Isolada.

Os três pais também trouxeram que foi marcada uma reunião onde não tiveram voz,

“não tinham como opinar”, a reunião foi apenas para oficializar que a escola seria fechada. A

diretoria da escola, formada pelos pais dos estudantes, não concordou com o fechamento. E os

representantes procuraram a Secretaria de Educação, mas não obtiveram resultado positivo.

De acordo com os entrevistados, a justificativa para o fechamento foi que na nova instituição

escolar os estudantes teriam melhor aprendizagem, já que a escola seria mais bem equipada,

com biblioteca, sala de informática. Porém os pais continuavam descontentes com a situação e

em uma conversa informal com um antigo prefeito da cidade obtiveram o conselho de não

mandarem seus filhos para a Escola Passo da Limeira, com o objetivo de obrigarem o Estado

obrigatoriamente a reabrir a escola. “Nós não queríamos que fechasse. Fomos procurar

alguém que entendesse das lei, queríamos sabe porque fechar a escola se pra nós tava bom. Só

um disse que se nós aguentasse a escola não fechava” (João, pai, 2018).

Apesar do desejo de resistência, não foi conseguido uma auto-organização

(KRUPSKAIA, 2017) coletiva de todos os pais e alguns mandaram seus filhos para a nova

escola, apenas dois pais tentaram resistir e então não tiveram força o suficiente para manter a

escola aberta. Assim, todos os educandos passaram a estudar na Escola Passo da Limeira.

Seguimos questionando sobre as consequências do fechamento da Escola Isolada

Barro Branco e a nucleação. Os pais relataram que as famílias perderam o contato direto que

tinham com a escola, já que quando ela era na comunidade os pais tinham um contato maior

com as professoras e participavam diretamente na escola, acompanhado a organização

pedagógica e também as partes administrativas. Na unidade escolar localizada na

comunidade, a relação entre professores, pais e estudantes era de companheirismo e diálogo.

“A escola perto de casa era muito bom, nós tava direto na escola, conversava com a

professora quase todos os dias, ajudava a resolver problemas, as crianças gostavam mais da

escola aqui perto de casa”. (João, pai,2018)

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Outro problema enfrentado após a nucleação foi a distância percorrida pelos

educandos, embora 15 km para alguns possa ser pouco mas, para crianças de 7 a 10 anos isso

se torna muito longe, principalmente com estradas em condições precárias que dificultam o

trajeto e o transporte chegar à escola. Na época das chuvas, inclusive, não conseguem chegar,

devido às pontes que foram arrancadas e não foram totalmente reconstruídas. Durante esse

período, os estudantes ficam até vinte dias seguidos sem aula. “Era mais fácil trazer um

professor do que levar todos os alunos”. (Joana, mãe, 2018)

Outra questão trazida foi a da escola enquanto um espaço de socialização, um ponto

de encontro das famílias. O fato promovia um comprometimento entre a escola e os pais, as

professoras não ensinavam apenas seus educandos, mas também toda a sua família, havendo

troca de conhecimentos e diálogo. Entretanto, foi contado também que nos últimos anos de

funcionamento da escola, na visão dos pais, os professores pareciam não ter mais a mesma

dedicação de antes.

Através dos relatos entendemos que a maior dificuldade para os educandos e suas

famílias foi a falta de identidade com a nova escola, apesar dela ser do campo não está na sua

localidade, possui um maior número de estudantes. O que dificulta o processo de

aprendizagem dos educandos e gera desinteresse pelos estudos. “A escola é longe, já chegam

cansados, tem mais alunos vira bagunça e eles aprende menos do que aprendiam aqui”.

(Tadeu, pai,2018)

Segundo relatos da educadora Tereza Silveira, que lecionou na Escola Isolada do

Barro Branco e hoje leciona na Escola Passo da Limeira, os pontos positivos da escola

multisseriada eram: a família estar presente e os pais se preocuparem mais com a educação de

seus filhos, já que a escola se tornava uma família e atualmente as crianças entram e saem da

escola e muitas vezes o professor não conhece os pais de seus educando; as crianças se

alfabetizavam mais rápido, visto que, para ela, os mais novos aprendiam com os mais velhos e

a troca de conhecimentos trazia celeridade. “Na escolinha era melhor, nos aprendia com os

mais grande e um ajudava o outro, era mais perto, bem mais tranquilo”. (Mário, ex-estudante

da escola multisseriada, 2018)

Considerações Finais

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A nucleação escolar é uma realidade vivida no país inteiro que afetou milhares de

famílias e os sujeitos oprimidos do campo (FREIRE, 1968). A nucleação aconteceu como

política pública educacional para contenção de gastos e possível melhoria na educação,

entretanto, notamos que para a comunidade de Barro Branco houveram muitos pontos

negativos com consequências que não viabilizam o acesso à educação e a permanência na

escola. Fica para nós claro que as famílias não foram reconhecidas como sujeitos de direitos e

não tiveram escolha. Nesse sentido, a nucleação não foi um processo democrático.

A precarização do ensino, o descaso e a perda de direitos não é realidade exclusiva

das escolas do campo do município de Alfredo Wagner, mas característica do Brasil no que

diz respeito às políticas públicas de educação. De acordo com Saviani (2010) duas limitações

comprometem historicamente a educação pública brasileira: 1) os recursos financeiros

destinados para a educação são escassos; 2) a sequência de reformas intermináveis, cada qual

começando da estaca zero e todas prometendo solução definitiva dos problemas, que

perpetuam as deficiências educacionais indefinidamente.

Ao finalizarmos a pesquisa nos questionamos: Que escola do campo está sendo

construída? Certamente não a escola esperada pelos sujeitos oprimidos do campo, que leve

em consideração suas especificidades, suas vozes. Na entrada da Escola Básica do Passo da

Limeira há uma frase de Paulo Freire, entretanto, pouco vemos no processo de fechamento,

nucleação e atual manutenção da escola um projeto que emancipe os sujeitos do campo que os

permita construírem um olhar crítico para suas realidades e com isso se entenderem como

sujeitos de direitos. Uma educação que, seguindo a concepção epistemológica da frase do

educado que emoldura a entra da Escola Básica do Passo da Limeira, permita a humanização.

(FREIRE,1968)

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SAVIANI, Dermeval. Política Educacional Brasileira Limites e Perspectivas. Revista de

Educação PUC-Campinas, Campinas-SP, n. 24, p. 7-16, junho 2008.

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A PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA E A EDUCAÇÃO DO BRASIL:

APROXIMAÇÕES COM A EDUCAÇÃO DO CAMPO

Marcos Willian da Silva Santos1

Eixo Temático 6: Educação do Campo e historiografia das Instituições Escolares

Resumo: O presente trabalho é resultado da disciplina Conhecimento Histórico e Educação, oferecida no mestrado em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) campus Francisco Beltrão, foi desenvolvido este trabalho, como requisito parcial da nota final para adquirir a aprovação na disciplina. O artigo tem como objetivo analisar os aspectos históricos da educação brasileira, assim, fazer um contraponto com a concepção pedagógica denominada de Pedagogia Histórico-Crítica. O texto está organizado de modo a apresentar duas perspectivas históricas da história da educação, a republicana e a das teorias educacionais, cujo propósito é revelar, por meio da historicidade, a necessidade histórica e contextual, de avançar nos debates sobre a proposta pedagógica da Pedagogia Histórico-Crítica. Parte-se do princípio que a educação brasileira, carece de iniciativas orientadas para a formação humana e transformação da realidade social, questão central da proposta pedagógica discutida neste texto. Palavras-chave: História; Educação do Campo; Pedagogia Histórico-Crítica.

1. Introdução

O presente trabalho é resultado da disciplina Conhecimento Histórico e Educação,

oferecida no mestrado em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná

(UNIOESTE) campus Francisco Beltrão, foi desenvolvido este trabalho, como requisito

parcial da nota final para adquirir a aprovação na disciplina.

A educação ocupa um lugar imprescindível em todo projeto histórico de uma nação.

Isto significa que seus princípios, meios e fins se constituem como partes integrantes da

estratégia econômica, política e social de um país, assim, integraliza os interesses gerais de

organização social advinda do Estado. Neste prisma, a sociedade e a educação fazem parte de

uma mesma realidade, encontram-se intimamente relacionadas e se desenvolvem em um

sistema de influência recíproca.

1 Mestrando em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) campus Francisco Beltrão; Graduado em Licenciatura em Matemática com Ênfase em Computação pela Faculdade de Ampére (FAMPER). E-mail: [email protected]

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Neste prisma, “a educação pode existir livre e, entre todos, pode ser uma das maneiras

que as pessoas criam para tornar comum, como saber, como ideia, como crença, aquilo que é

comunitário como bem, como trabalho ou como vida” (BRANDÃO, 2004, p. 10). “[...] como

outras, uma fração do modo de vida dos grupos sociais que a criam e recriam, entre tantas

outras invenções de sua cultura, em sua sociedade” (BRANDÃO, 2004, p. 10).

A educação tem como função produzir a humanidade do homem. Ela tem a ver com

conhecimentos, ideias, conceitos, valores, símbolos, hábitos, atitudes, habilidades. Saviani

(2009) a define como o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo

singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens.

Compreende-se ainda que:

É a educação que mantém viva a memória de um povo e dá condições para a sua sobrevivência material e espiritual. A educação é, portanto, fundamental para a socialização e a humanização, com vistas à autonomia e à emancipação. Trata-se de um processo que dura a vida toda e não se restringe à mera continuidade da tradição, pois supõe a possibilidade de rupturas, as quais a cultura se renova e o ser humano faz a história (ARANHA, 2006, p. 67).

Para o professor José Carlos Libâneo (apud ARANHA, 2006, p. 31), “educar (em

latim, educare) é conduzir de um estado a outro, é modificar numa certa direção o que é

suscetível de educação”. “Não há uma forma única nem um único modelo de educação [...]” (BRANDÃO, 2004, p. 9). Da família à comunidade, a educação existe difusa em todos os mundos sociais, entre as diversas e incontáveis práticas dos mistérios de aprender, em um primeiro momento, sem classes de alunos, sem livros e sem professores, a diante, em um segundo momento, com escolas, salas, professores e métodos pedagógicos (BRANDÃO, 2004).

Do ponto de vista legal, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB

9.394/96, define que a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida

familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos

movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais

(BRASIL,2018).

Tendo em vista as menções acerca do conceito de educação supracitadas, o presente

artigo tem como propósito analisar os aspectos históricos da educação do Brasil, assim,

realizar um contraponto com a proposta pedagógica da Pedagogia Histórico-Crítica.

Em visão retrospectiva, a problemática emergiu da própria história da educação, haja

vista que não há registros, antes da década de 1980, de propostas educacionais orientadas para

a formação humana e transformação da realidade. Diante disso, cabe, neste momento

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histórico, caracterizado pelo desmonte da escola pública, pela supressão dos direitos sociais,

os cortes de recursos e de vagas nas escolas e universidades, o fechamento de cursos

superiores, o esvaziamento dos conteúdos e o avanço do conservadorismo, tecer elementos

contributivos para avançar na direção de propostas, cujo objetivo se pauta na defesa da escola

pública, de qualidade e para todos.

Assim, a questão norteadora deste estudo é tecer sobre as contribuições da Pedagogia

Histórico-Crítica na educação brasileira como processo de emancipação do homem,

proposição necessária, do ponto de vista histórico e contextual, no campo educacional.

Emancipar o homem, nos termos da educação, significa torná-lo capaz de transformar a

realidade em que vive, a fim de, apropriar-se de conhecimento, uma vez que, esta tendência

constitui-se como transformadora da realidade social.

Para contemplar o objetivo proposto neste escrito, a história da educação é posta em

questão, haja vista que faz-se necessário, a priori, a interpretação da história da educação do

Brasil, para a posteriori, elencar considerações sobre as contribuições da Pedagogia Histórico-

Crítica no âmbito educacional, pois de acordo com Saviani (2006) enquanto os homens

garantiam a própria existência no âmbito das condições dominantes naturais, o que implicava

o entendimento que o meio natural lhe fornecia os meios básicos de subsistência, o que

resultava em forma de vida social estável, não se colocava a necessidade de se compreender o

sentido das transformações que se processavam no tempo, isto é: não se colocava a

problemática da história. Logo, esta não é uma realidade aplicável ao tempo presente.

Com efeito, o texto se organiza em três momentos. No primeiro, registra a história da

educação na perspectiva republicana, cujo objetivo é aferir os desígnios educacionais ao longo

do tempo. No segundo, tece considerações históricas sobre as teorias da educação presentes

no campo educacional, avaliando as suas propostas e o modo de pensar o ato de educar. Para

finalizar, faz-se um contraponto entre a teoria educacional da Pedagogia Histórico-Crítica e as

suas contribuições para a educação brasileira, assim, compreendida como uma necessidade

histórica e contextual da sociedade e do campo educacional.

2. Aspectos históricos da educação do Brasil: uma perspectiva republicana

O termo história permite diversas definições, o qual entendemos pelos fatos ou

acontecimentos que ocorreram ao longo do tempo; o campo de conhecimento que faz a

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narração desses mesmos fatos; ainda, para designar o conjunto de conhecimentos sobre as

transformações do passado; finalmente para referir-se ao conjunto das obras referentes à

história (LOMBARDI, 2003).

O dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, reforça

os diversos termos encontrados quanto a definição de história:

História. [...]. S.f. 1. Narração metódica dos fatos notáveis ocorridos na vida dos povos, em particular e na vida da humanidade, em geral: a históriado Brasil; históriauniversal. 2. Conjunto de conhecimentos adquiridos através da tradição e/ou por meio dos documentos, relativos à evolução, ao passado da humanidade. 3. Ciência e método que permitem adquirir e transmitir aqueles conhecimentos. 4. O conjunto das obras referentes à história. (FERREIRA, 1999, p. 1.055)

A sociedade é resultado de um longo período histórico, de grandes mudanças,

transformações e desenvolvimento. A história é tudo o que aconteceu, o que foi construído ao

longo dos anos, de cada período, das tradições culturais, de tudo o que vivemos.

(LOMBARDI, 2003).

Em visão retrospectiva, desde que a sociedade é percebida como grupo humano

organizado, identifica-se uma forma de agir coletiva, cujo propósito é desenvolver nas

crianças e jovens, as habilidades e conhecimentos que facilitariam o entrosamento com o

restante do grupo. Esse processo de direção e formação social no espaço e tempo constitui a

prática universalmente caracterizada como educação (BRANDÃO, 2006).

A identidade da educação como campo de produção de conhecimento se apresenta na

historiografia educacional a partir de distintas perspectivas e análises, entre elas, a educação

interpretada no viés republicano. Isto significa, examinar, as iniciativas educacionais

estabelecidas pelo Estado e suas vicissitudes, questão que recebe atenção a seguir.

No início do século XVI, o Brasil entra para a história da “civilização ocidental”,

coincidindo também, com o período caracterizado pelo surgimento e desenvolvimento da

educação pública. Dar-se-á às origens de nossa colonização as relações entre estado e

Educação no Brasil. Quando os primeiros jesuítas chegaram ao Brasil em 1549, eram

chefiados pelo Padre Manoel da Nóbrega, e cumpriam mandato do Rei de Portugal, D. João

III, que era o responsável por formular os “Regimentos”, ou seja, o que poderia ser

considerado a nossa primeira política educacional. O ensino jesuíta, constituiu a nova versão

da educação pública religiosa, pois o mesmo contava com o incentivo e subsídio da coroa

portuguesa (SAVIANI, 2000).

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Os jesuítas se empenharam no trabalho de catequese dos índios e fundaram inúmeras

“escolas de ler e escrever, ” mas deram maior ênfase à escola secundária, destinada aos filhos

dos colonos e ao encaminhamento dos futuros padres. O descaso pela educação popular se

explica pela vigência de uma economia dependente e exclusivamente agrária, que não exigia

mão de obra (ARANHA, 2006).

Após 210 anos de serviços educacionais prestados ao Brasil, os jesuítas foram banidos porque a educação jesuítica não coadunava com os interesses comerciais do Marquês de Pombal. Portugal estava decadente em relação a outras potências europeias, e o Marquês pretendia reerguer o país, colocando as escolas a serviço do Estado e não mais da fé. Com o desmantelamento do sistema jesuítico, a educação brasileira praticamente voltou à estaca zero no início do século XIX. (NASCIMENTO, 2007, p.191)

A expulsão dos jesuítas, na metade do século XVIII, pelo primeiro-ministro do Rei de

Portugal, marquês de Pombal, desencadeara as chamadas “reformas pombalinas da instrução

pública”, que eram inseridas no quadro da reforma modernizadora levada adiante por Pombal

e visava colocar Portugal à altura do século, isto é, o século XVIII, caracterizado pelo

Iluminismo (SAVIANI, 2000).

As reformas pombalinas se colocam contra as ideias religiosas e, com base nas ideias

laicas, ou seja, sem a interferência da igreja, inspirada no Iluminismo, refletem o privilégio do

Estado em matéria de instrução, dando início então, a versão da “educação pública estatal”.

(SAVIANI, 2000). Não fazia mais sentido associar a educação à religião, como acontecia nas

escolas confessionais, nem os interesses de uma classe, como queria a aristocracia. Aliás, o

Iluminismo exaltava justamente o poder da razão humana de traçar seus próprios caminhos,

suas ideias, ficando longe da tirania dos reis e das superstições religiosas. “Neste sentido, a

escola deveria ser leiga (não religiosa), livre (independente de privilégios de classe) e

universal (acessível a todos) ” (ARANHA, 2006, p. 124).

A iniciativa, porém, não chegou a se efetivar, por muitas razões, principalmente, pelo

isolamento cultural da Colônia motivado pelo temor de que, por meio do ensino, se

propagasse ideias emancipacionistas, sabendo que, a propagação das ideias iluministas por

volta de meados do século XVIII, proporcionava a influência das ideias liberais europeias em

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países americanos, alimentando assim, não apenas desejos, mas movimentos reais visando à

autonomia política desses países (SAVIANI, 2000).

Em 1822, o Brasil tinha a independência política proclamada e se constitui como um

Estado Nacional que adotara o regime monárquico sob o nome de “Império do Brasil”. A

oportunidade de configurar o novo país institucionalmente, criada com a instalação da

Assembleia Constituinte de 1823, é cancelada pelo golpe de Estado de 12 de novembro do

mesmo ano, através do qual D. Pedro I fechou a Constituinte, outorgando, em 1824, a

Constituição do Império (SAVIANI, 2000).

O parlamento foi reaberto em 1826. Assim, no ano de 1827 foi aprovada uma lei que

estabelecia que em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haveriam escolas de

primeiras letras necessárias. No entanto, na prática, pode-se dizer que esta lei permaneceu

como letra morta, sem muitos resultados no que diz respeito a expansão do ensino neste

período. Cabe mencionar que o ato adicional à Constituição do Império, promulgado em

1834, colocou o ensino primário sob a jurisdição das províncias, desobrigando o Estado

Nacional de cuidar desse nível de ensino (SAVIANI, 2000).

Com o fim do período imperial no Brasil, embora tenha se estabelecido inúmeras iniciativas no âmbito educacional, não foi possível concretizar e efetivar a oferta da educação brasileira. As ações educacionais se mantiveram escassas e divididas sem a ocorrência de um sistema de educação efetivo e com qualidade. Este período é marcado por abertura e fechamento de várias instituições educacionais. A herança do Império para a República, no que diz respeito à Educação, foi caótica: 85% de analfabetos, em 1889 (NASCIMENTO, 2007).

A Proclamação da República no ano de 1889, significou para o plano institucional,

uma vitória das ideias laicas. Com isso, foi decretada a separação entre a Igreja e Estado e,

assim, a abolição do ensino religioso nas escolas (SAVIANI, 2000).

Entretanto, a educação popular não se tornou, ainda, um problema do Estado Nacional. Dado que no Império, que era um regime político centralizado, a instrução popular estava descentralizada, considerou-se que, a fortiori, na República Federativa, um regime político descentralizado, a educação deveria permanecer descentralizada. Com esse argumento se postergou mais uma vez a organização nacional da instrução popular mantendo-se o ensino primário sob a responsabilidade das antigas províncias, agora transformadas em Estados federados (SAVIANI, 2000, p. 5).

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Ao longo da década de 1920, formularam-se muitas reformas do ensino em diferentes

Estados da Federação visando à expansão da oferta pública de ensino, ao mesmo tempo em

que a influência das ideias renovadas provocou o aparecimento de movimentos organizados

que levantam também situações e questões relativas à qualidade da educação. Foi somente

após a Revolução de 1930 que o país começou a enfrentar os problemas próprios de uma

sociedade burguesa moderna, entre eles, o da instrução pública popular de ensino. “A

educação começava a ser reconhecida, inclusive no plano institucional, como uma questão

nacional” (SAVIANI, 2000).

Do ponto de vista das ideias educacionais, o movimento renovador, desde a década de

1930, ocupou os postos da burocracia educacional oficial, tendo a oportunidade de ensaiar

várias reformas, criar escolas experimentais, implementar estudos pedagógicos, em especial, a

partir da criação do INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira em 1938, da CAPES em 1951, e do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais em

1955 (SAVIANI, 2004).

Sob a hegemonia dos ideais renovadores os anos de 1960 foram ricos em

experimentação educativa. Todavia, nesta mesma década registra-se uma reorientação

educativa decorrente do golpe militar consumado em primeiro de abril de 1964, ou seja, o

golpe visava garantir a continuidade à ordem sócia econômica do quadro político presidido

por João Goulart articulado ao projeto de modernização integradora do país ao capitalismo de

mercado associado-dependente (SAVIANI 2004).

O contexto que se segue, década de 1970 e 1980, foi se impondo a exigência de

alteração do arcabouço da educação. A oportunidade surgiu com o estabelecimento de um

governo civil, a nova república, e a elaboração de uma nova constituição, a Carta Magna de

1988.

Em síntese, é possível identificar que no período de 1890 a 1931 a concepção

educacional predominante foi o iluminismo republicano. Entre os anos de 1930 a 1960 foi o

ideário renovador que prevaleceu. Posteriormente, até meados da década de 1980, registra-se

a concepção produtivista da educação, cuja primeira formulação remonta os anos de 1950 por

meio dos trabalhos de Theodore Schults (SAVIANI, 2004).

Diante disso, constata-se a necessidade de analisar a educação na perspectiva das

teorias educacionais, cujo objetivo precípuo é identificar o ato de educar e as propostas

pedagógicas estabelecidas historicamente, assim, evidenciar a necessidade, histórica e

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contextual, de instrumentalização da Pedagogia histórico Crítica, haja vista que, a educação

examinada sob um viés republicano indica que as elites dirigentes do Brasil não priorizaram

iniciativas voltadas para a formação humana articulada com a transformação da realidade

social.

Diante disso, indaga-se: qual é a necessidade histórica e contextual da proposta

pedagógica da Pedagogia Histórica Crítica?

3. Aspectos históricos da educação brasileira a partir das teorias da educação

A história da educação pode ser compreendida por meio da perspectiva das teorias da

educação. Saviani (2008) concebe por teoria da educação o conjunto de enunciados

filosóficos referidos à educação, os quais possuem como objetivo orientar a prática

pedagógica no que diz respeito a função da escola, a concepção de educação, o papel do

professor, os conteúdos, o planejamento, a metodologia e a avaliação. Com efeito, a

historiografia educacional denomina estas teorias como: Tradicional, Escola Novista,

Tecnicista, Crítico-Reprodutivista, e mais recentemente, a Histórico-Crítica, teoria em questão

neste estudo.

Cabe neste momento, algumas considerações acerca das concepções educacionais das

teorias supracitadas, pois, a relevância da história é um fator determinante na análise em

questão, haja vista que as contribuições da Pedagogia Histórico Crítica são interpretadas como

uma necessidade histórica e contextual no tempo presente. Esta afirmação se pauta no fato da

ausência de propostas educacionais, antes da década de 1980, cuja proposição esteja orientada

para a formação humana e transformação da realidade social.

A teoria tradicional consiste na transmissão de conhecimentos acumulados. É o

conjunto de enunciados filosóficos referidos à educação, que tomam por base uma visão

essencialista do ser humano, cabendo à educação a tarefa de conformar cada indivíduo à

essência ideal e universal que caracteriza o homem. Em consequência, a prática pedagógica

tradicional será o modo como o professor irá proceder na realização da referida tarefa em

relação aos seus alunos (SAVIANI, 2008).

“A escola tradicional nasceu em um mundo ainda de certa forma estável, no qual a

educação se fazia por base em modelos ideais” (ARANHA, 2006, p. 223). À medida que a

sociedade se industrializava e tornava a vida urbana mais complexa, a educação também se

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tornava mais exigente quanto às reformas radicais em diversas teorias e experiências escolares

(ARANHA, 2006).

As críticas formuladas à pedagogia tradicional deram origem a uma nova teoria da

educação, a Escola Nova, a qual considera a prática mais importante que a teoria, devendo

assim o aluno participar ativamente do processo de ensino. Na teoria da Escola Nova, o aluno

passa a ser o centro e não mais o professor. Determina assim, que a escola é um espaço aberto

a iniciativa dos alunos, que ao interagirem com o professor, realizam a aprendizagem e

constroem conhecimento. O eixo do processo pedagógico passa a ser a atividade prática

(SAVIANI, 1999).

O movimento educacional conhecido como Escola Nova surgiu no final do século

XIX com o objetivo de propor novos caminhos à educação, o qual representa a superação da

pedagogia da essência pela pedagogia da existência. “A pedagogia da existência volta-se para

a problemática do indivíduo único, diferenciado, que vive e interage em um mundo dinâmico”

(ARANHA, 2006, p. 225).

Pode-se destacar a Escola Nova, pela sua oposição quanto à escola tradicional e pela

compreensão científica do comportamento infantil, que possibilitou que a criança tivesse

métodos educacionais de acordo com a idade, não sendo considerada “adulto em miniatura”.

A importância desta tendência vai além dos insucessos, pois favoreceu a abertura de muitos

caminhos com o intuito de buscar soluções para a educação (ARANHA).

O crescimento da industrialização, com suas rápidas transformações, requeria a

ampliação do ensino e da rede escolar, bem como um modelo de uma escola nova, que

preparasse o indivíduo para o novo, e ainda, as esperanças de uma sociedade onde seria

superada a desigualdade social, econômica e cultural que aconteceria por meio de uma

adequada escolarização (ARANHA, 2006).

A partir da década de 1960 surgiram propostas de inspiração tecnicista, baseadas na

convicção de que a escola só se tornaria eficaz se adotasse o modelo empresarial. Esta teoria

caracteriza-se pela organização racional dos meios, ocupando assim, professor e aluno, uma

posição secundária. A organização do processo de aprendizagem transforma-se na garantia da

eficiência, compensando e corrigindo as deficiências do professor, maximizando os efeitos de

sua intervenção. A partir do pressuposto da neutralidade científica e inspirada nos princípios

de racionalidade, eficiência e produtividade, essa pedagogia advoga a reordenação do

processo educativo, de maneira a torná-lo objetivo e operacional, de modo semelhante ao que

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ocorreu no trabalho fabril, pretende-se a objetivação do trabalho pedagógico. “Nessa

perspectiva, o professor é um técnico que, assessorado por outros técnicos, transmite um

conhecimento técnico e objetivo” (ARANHA, 2006, p. 231).

Ao contrário do que foi esperado, a pedagogia tecnicista contribuiu para aumentar o

caos no que diz respeito a educação. Desencadeou no campo educativo um nível de

descontinuidade, heterogeneidade e de fragmentação, que inviabilizou o ensino, contando

ainda, com um alto índice de evasão escolar (SAVIANI, 1999).

Neste embate, registra-se a teoria crítico-reprodutivista, a qual acreditava que ao

desfazer as injustiças sociais, a escola teria progresso e democratização, porém a ideia de uma

função equalizadora da escola era equivocada, porque, em vez de democratizar o ensino, a

escola reproduz as diferenças sociais, perpetua o status quo2 e, por isso, é uma instituição

onde reforça o modo de produção capitalista, repressora, autoritária, prevalecendo a ideologia

dominante (ARANHA, 2006).“Todas as reformas escolares fracassaram, tornando cada vez

mais evidente o papel que a escola desempenha: reproduzir a sociedade de classes e reforçar o

modo de produção capitalista” (SAVIANI, 1999, p. 27).

Como objetivo de ir além da proposição teórica proposta pela corrente crítico-

reprodutivista, Demerval Saviani, em meados da década de 1970-1980, estabelece novas

discussões a respeito da função da educação em nossa sociedade. “Começava-se a tentar

descobrir formas de analisar a educação, mantendo presente a necessidade de criar

alternativas e não apenas a fazer crítica do existente” (SAVIANI, 2011, p. 62). Era a gênese

da proposta pedagógica da Pedagogia Histórico Crítica emergindo no Brasil. A pedagogia histórico-crítica vai tomando forma à medida que se diferencia no bojo das concepções críticas; ela diferencia-se da visão crítico-reprodutivista, uma vez que procura articular um tipo de orientação pedagógica que seja crítica sem ser reprodutivista (SAVIANI, 2011, p. 57).

Ao falarmos do processo metodológico desta nova concepção de educação, podemos

destacar alguns pontos: o ponto de partida da pedagogia histórico-crítica não é a preparação

dos alunos, onde a iniciativa é do professor (pedagogia tradicional), nem a atividade que é de

iniciativa dos alunos (pedagogia nova), mas sim, a prática social (primeiro passo), que é

comum a professores e alunos. Como segundo passo, não é a apresentação de novos

conhecimentos por parte do professor (pedagogia tradicional), ou o problema como um

2Status quo: O termo refere-se ao estado atual das coisas, o qual é utilizado para fazer referência a uma determinada situação.

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obstáculo que interrompe a atividade dos alunos (pedagogia nova), mas a problematização, ou

seja, o ato de detectar as questões que precisam e devem ser resolvidas no âmbito da prática

social e como a educação poderá encaminhar as devidas soluções (SAVIANI, 2008).

O terceiro passo não se identifica com a assimilação de conteúdos repassados pelo

professor por comparação com conhecimentos anteriores (pedagogia tradicional), nem com a

coleta de dados (pedagogia nova), mas neste caso, se trata, da instrumentação, entendida

como a apropriação dos instrumentos teóricos e práticos necessários ao equacionamento dos

problemas detectados na prática social. Portanto, o próximo e quarto passo não coincide com

a generalização (pedagogia tradicional), nem com a hipótese (pedagogia nova). Por fim, o

quinto passo, isto é, o ponto de chegada é a própria prática social, compreendida agora não

mais em termos sincréticos pelos alunos (SAVIANI, 2008).

Acredita-se, portanto, que com a orientação do processo metodológico da pedagogia

histórico-crítica é possível recuperar a unidade da atividade educativa no interior da prática

social, articulando-se assim, seus aspectos teóricos e práticos que se sistematizam na

pedagogia concebida ao mesmo tempo como teoria e prática da educação (SAVIANI, 2008).

A Proposta da Pedagogia Histórico Crítica, compreendida no bojo das teorias

educacionais,apresenta uma proposta pedagógica de caráter revolucionário. Os aspectos

históricos da educação registram que as teorias não críticas da educação, concebiam a

educação com redentora da sociedade e buscavam entender a educação a partir dela mesma,

ou seja, não consideravam os condicionantes objetivos que sobre ela atuavam. Já as teorias

crítico-reprodutivistas se remetem aos condicionantes objetivos e determinações sociais, no

entanto, caracterizavam a educação como mero fator de reprodução da sociedade vigente.

Distintamente, a Pedagogia Histórico crítica,além de propor a formação humana,

prevê, por meio de seu caráter revolucionário, a transformação da realidade social. Saviani

(1989) assevera que os métodos tradicionais assim como os novos implicam uma

autonomização da pedagogia em relação à sociedade. Os métodos por ele preconizados

mantêm continuamente presente a vinculação entre educação e sociedade. “A centralidade da

prática social é um elemento marcante da pedagogia histórico-crítico, que a contrapõe às

pedagogias “não-críticas”, marcadas pelo caráter redentor da educação, isolando-a da

estrutura social e da luta de classes que nela se expressa (BATISTA, LIMA, 2015, p. 72).

4. A educação brasileira e a Pedagogia Histórico-Crítica: uma aproximação necessária

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Ao analisarmos as questões que detectam a crise da educação brasileira, existem

problemas que ultrapassam esse nível de discussão, pois têm em vista a própria crise da

sociedade na gestação de novos tempos. Não cabe mais pensar a educação do futuro sem

considerar a desestruturação de antigos modelos. A escola, como consequência, se encontra

defasada, incapaz de atender às novas necessidades (ARANHA, 2006, p. 293). “Após o

otimismo da Escola Nova, as denúncias das teorias crítico-reprodutivistas, as propostas das

teorias histórico-sociais e de tantas outras que surgiram nas últimas décadas do século XX, é

preciso reconhecer que pouco se conseguiu alterar no padrão da velha escola “ (ARANHA,

2006).

Com efeito, tendo em vista a história da educação, assim, a ausência de propostas

educacionais que objetivam a formação humana e a transformação da realidade social, é que

se percebe a necessidade de uma aproximação da proposta educacional ensejada pela

Pedagogia Histórico Crítica no âmbito educacional brasileiro. Concebe-se que a proposição

da teoria em questão apresenta uma contribuição para a construção de uma sociedade mais

fraterna, igualitária e que está orientada para o bem comum de todos.

Pensar a educação como processo de emancipação do homem por meio de uma

concepção histórico-crítica, é em suma, um desafio, uma vez que, é preciso quebrar

paradigmas e ideias tradicionais que se arrastam e persistem em resistir às mudanças. “De

fato, a pedagogia histórico-crítica tem, já em sua origem, relação direta com o problema da

articulação entre educação e revolução” (ORSO; MALANCHEN; CASTANHA, 2017, p.

53.).

[...] o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Assim, o objeto da educação diz respeito, de um lado, à identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos, e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas mais adequadas para atingir esse objetivo (SAVIANI, 2011, p. 13).

Emancipar o homem significa trazê-lo para a realidade e proporcionar meios para que

ele a transforme de forma que possa contribuir com a sociedade. O homem precisa alcançar a

condição de ser livre, racional e universal. É preciso que o indivíduo tome a si próprio, à sua

atividade, à sua inserção nas relações sociais com os demais indivíduos, à sociedade na qual

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vive, como objeto de reflexão crítica, de apropriação crítica, e ainda, de transformação

(ORSO et al., 2014). É uma transformação que se realiza por meio da educação. É uma transformação que se realiza, [...], por meio do outro. É uma transformação que se realiza de maneira deliberada, intencional. É um processo de transformação consciente (ORSO et al., 2014, p. 45-46).

A Pedagogia Histórico-Crítica vem sendo construída como uma teoria preocupada em

elaborar condições de organização e de desenvolvimento da prática educativa escolar como

um instrumento potencializador de transformação da sociedade atual, ou seja, articulando a

educação com a luta pelo direito como cidadão (ORSO, et al., 2014).

Ainda, defende o acesso da classe trabalhadora ao patrimônio cultural humano

historicamente desenvolvido, busca a ação reflexiva, sem a qual não haverá a superação da

desigualdade inerente ao modo de produção capitalista, por isso trata-se de uma teoria

educacional revolucionária (BATISTA, LIMA, 2015).

5. Aproximações entre Pedagogia Histótico-Crítica e Educação do Campo

Tendo em vista o exposto até o momento, surgem questões fundamentais, a saber:

como pode se concretizar essa reorganização da escola do campo? Em que modelo? Por

qual proposta pedagógica? As respostas a estas questões podem ser dadas pela análise das

principais pedagogias e teorias pedagógicas que, ao longo dos anos, povoaram o âmbito da

educação no Brasil, a saber: Pedagogia Tradicional, Pedagogia Nova, Pedagogia Tecnicista,

Teorias pedagógicas crítico-reprodutivistas e, desde ao final dos anos de 1970, a Pedagogia

Histórico-Crítica. Vários autores já se esforçaram nesta análise, chegando à conclusão de

que “Desenvolver o trabalho educativo na perspectiva de superação do modo de produção

capitalista requer uma pedagogia de inspiração marxista (...) (SAVIANI; DUARTE, 2012,

p. 5). Dessa forma, a Pedagogia Histórico-Crítica, por ter esta fundamentação, é entendida,

aqui, como a orientação pedagógica que vem corresponder aos anseios de uma escola que

tenha a prática social dos alunos campesinos como ponto de partida e chegada, tal qual é

requerida e demandada pela classe trabalhadora, ou seja, que o campo e sua realidade sejam

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analisados à luz dos conhecimentos clássicos, possibilitando que o ponto de chegada do

processo educativo se configure como uma prática já problematizada e compreendida

dentro de uma historicidade.

A Pedagogia Histórico-Crítica se baseia em um aporte teórico que se distancia de

concepções idealista de ensino e de educação. Seu distanciamento também se realiza em

relação a vises pragmáticos e imediatistas do processo de ensino-aprendizagem, bem como

das finalidades do processo educativo. Nesse sentido, o processo de objetivação e de

apropriação são entendidos como fundamentos efetivadores de um processo de formação do

homem enquanto ser histórico e social. Certamente, esta é uma diferença marcante entre o

homem e os animais (DUARTE, 1993).

A distinção entre homens e animais ressoa na reflexão de Marx e Engels (1993),

quando afirmam que tal distinção é entendida como o desenvolvimento da “atividade vital”

que cada um desenvolve. A interpretação de Duarte (1993), sobre esta definição de Marx e

Engels (1993), consiste no entendimento de que: 1- a reprodução biológica da espécie e 2- a

reprodução das condições humanas de sobrevivência historicamente efetivadas,

transmitidas de geração a geração, implicam na existência de uma sociedade organizada e

sedentária. Assim, as relações sociais de dominação se realizam quando estes dois âmbitos

da “atividade vital”, na sociedade capitalista, por meio do trabalho, servem como suporte do

processo de alienação. Segundo Marx e Engels (1993), a atividade vital consciente, como já

dito, distingue os homens dos animais. Entretanto, quando tal atividade é suficiente

somente para a sobrevivência, para a reprodução, fica alienada de seu segundo âmbito que é

a reprodução do homem enquanto ser genérico.

Quando se fala de sobrevivência do homem, Marx e Engels (1993), estão falando de

condições básicas, como comer, vestir, habitar dignamente. Sobre isso, Duarte (1993, p.

31), mostra como as condições históricas objetivas implicam em mudanças no próprio

sujeito, uma vez que a realidade humanizada possui a capacidade de humanizar o próprio

homem. Dessa forma, uma transformação objetiva implica uma transformação subjetiva. Se

for desta maneira, a prática social e a historicidade determinam o processo de objetivação e

de apropriação. O homem, então, historicamente, apropria-se das qualidades e

características dos objetos, bem como dos conhecimentos a eles subjacentes, alterando e

criando novas funções e finalidades conforme as necessidades históricas.

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O objeto, portanto, não é totalmente subtraído de sua lógica natural, mas esta é inserida na lógica da atividade social humana. O homem não cria uma realidade sua, humana, sem apropriar-se da realidade natural. Ocorre que essa apropriação não se realiza sem a atividade humana, tanto aquela de utilização do objeto enquanto um meio para alcançar uma finalidade consciente, como também e principalmente a atividade

A definição metodológica é uma resposta cara e preciosa que a PHC oferece ao

anseio de vários educadores brasileiros quando define cinco momentos do trabalho

pedagógico, a saber: primeiro momento: ponto de partida da pratica educativa-prática

social, em que é necessário ao professor se apropriar da realidade social dos alunos,

compreendendo-a e identificando o que servirá como ponto de partida do processo; segundo

momento: problematização: acontece a apresentação, pelo professor, das razões pelas quais

o conteúdo se encontra na disciplina; terceiro momento: instrumentalização: aqui, ocorre a

apropriação dos instrumentos culturais para uma prática qualitativamente superior

(MARSIGLIA, 2011); o quarto momento: a catarse, quando o aluno, pelo caminho

trilhado, tem uma visão do todo e não mais uma visão fragmentada da realidade e que lhe

possibilita avançar ao quinto momento: ponto de chegada, quando o aluno consegue

problematizar a prática social e passa de uma visão caótica (síncrese) para uma visão

organizada da totalidade (síntese), mediada pela apropriação dos conteúdos clássicos.

Segundo Saviani,

Uma pedagogia articulada com os interesses populares valorizará, pois, a escola; não será indiferente ao que ocorre em seu interior; estará empenhada em que a escola funcione bem; portanto, estará interessada em métodos de ensino eficazes. Tais métodos situar-se-ão para além dos métodos tradicionais e novos, superando por incorporação as contribuições de uns e de outros. Serão métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos sem abrir mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os interesses dos alunos, dos ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e gradação para efeitos do processo de transmissão-assimilação dos conteúdos cognitivos (2008b, p. 69).

Compreende-se, então, que a metodologia apresentada na PHC tem potencial de

garantir uma organização pedagógica que cunhe à educação do campo o indispensável

contato com os bens culturais humanos, dos quais os conhecimentos socialmente

acumulados são imprescindíveis.

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Um cuidado que se deve tomar, quando se pensa na educação do campo, é não colocar em segundo plano os conhecimentos socialmente acumulados e deixar de considerar a teoria como parte imprescindível da formação do concreto pensado, supervalorizando a prática tomada em seu aspecto fenomênico, individual e utilitarista, para que não se caia em um pragmatismo exacerbado, que se aproxime, ainda mais, das tendências pós-modernas (BEZZERA NETO e BEZERRA, 2011, p.108).

A preocupação com a qualidade da educação dos povos do campo deve estar

pautada na oferta de uma escola que realmente seja condizente com um projeto de

emancipação humana. Sem os conhecimentos adequados, tem-se o risco de que a escola

fique fadada a não sair do primeiro momento do processo: a prática social. Não se deve

perder de vista que, segundo Martins (2011, p. 56), “(...) funções complexas não se

desenvolvem na fase de atividades que não as exijam e possibilitem”, e pensando-se na

educação formal, “(...) essa tarefa deve ser assumida na prática pedagógica por meio da

transmissão dos conhecimentos clássicos”, tanto nas escolas urbanas quanto nas do campo.

6. Considerações finais

Diante do tema apresentado, é possível compreender a importância da educação no

desenvolvimento da sociedade e do indivíduo como ser social. Educação esta, que não se

restringe apenas a sala de aula, mas de maneira geral, que acontece em todos os momentos,

nas relações sociais. Apropriar-se de conhecimento permite-nos enriquecer daquilo que nos

leva a evoluir, partir de uma realidade e ter a condição de transformá-la.

A Pedagogia-Histórico-Crítica, um marco da educação brasileira, tem como objetivo a

formação humana e a partir disso transformar a realidade social. Promover o processo de

emancipação por meio da educação é acreditar que educar é libertar, é reconhecer em cada

indivíduo a sua especificidade, bem como a sua capacidade de pensar criticamente diante das

situações e decidir por si.

Referências

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MEMÓRIA E HISTÓRIA DOCENTE: ESCOLA RURAL DE VILA GUANABARA E

ESCOLA RURAL DE LINHA LISTON – FRANCISCO BELTRÃO/PR - POR:

PROFESSOR LUIZ BEDIN (1961 – 1990)

Carla Cattelan1

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições Escolares

Resumo: O trabalho esta localizado na discussão sobre as escolas rurais multisseriadas e o ensino rural a partir da memória oral docente. O objetivo é resgatar historicamente a organização educacional das escolas de Vila Guanabara e Linha Liston a partir da memória oral do professor Luiz Bedin. O resgate se mescla a vida pessoal e profissional do professor, bem como sua compreensão educacional como docente de escola rural multisseriada. O estudo tem como recorte temporal os anos de 1961 a 1990, justificado mediante ao tempo e local de docência do professor Luiz Bedin. Justifica-se o estudo específico das duas escolas pelo retrato da memória oral de forma a estabelecer relação entre a educação geral e os aspectos específico da prática docente levantados pelo professor. A metodologia esta na organização das informações, bem como as memórias docentes atrelando-as as fotografias e documentos, a fim de melhor aproximação histórica do real pedagógico. Os resultados apontam para uma organização educacional das instituições escolares rurais e a trajetória profissional e pedagógica do professor Luiz Bedin. Desta forma, apresenta como resultado a memória oral enquanto campo rico para o resgate histórico e importante metodologia de aproximação a veracidade histórica, principalmente ao que se refere às instituições escolares. Palavras-chave: Educação rural, Memória oral docente e Instituições Escolares.

INTRODUÇÃO

O presente estudo tem origem a partir de dados e entrevista, levantados na pesquisa

desenvolvida para o mestrado, que procurou compreender a organização da escola rural

primária no Município de Francisco Beltrão-PR entre 1948 a 1981 (CATTELAN, 2014). Bem

como, contribuições dos estudos efetivados no processo de doutoramento.

1 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Mestre em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Francisco Beltrão - UNIOESTE. Professora colaboradora no Colegiado de Pedagogia da mesma instituição e professora pedagoga SEED-PR. Membro do grupo de pesquisa HISTEDOPR e GEPHIESC. E-mail: [email protected]

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As Instituições Escolares Históricas, além de terem promovido a formação do sujeito

frente ao conhecimento, também se tornaram espaços privilegiados de construção de

identidades, seja ela docente ou do alunado. Pois foram permeados por relações sociais de

diferentes discursos e práticas. As memórias escolares nos permitem compreender aspectos

pertinentes a cultura escolar e a construção da identidade de uma dada comunidade.

A análise dos discursos e da memória oral, não se centra na identidade crua, mas no

seu processo de construção e o complexo conjunto de fatores estruturantes e interativos. A

identidade docente é tecida por múltiplos fios, sejam eles: institucionais, familiares,

individuais, religiosos, culturais, políticos, educacionais, dentre outros que se materializam

nas memórias do individuo a partir de um ponto de vista.

A memória se torna de suma importância para este processo, pois possibilita romper

com uma linearidade do cotidiano escolar que se apresenta, muitas vezes, mecanizado ou

normatizado pelo Estado. A narração da memória por meio da oralidade se apresenta como

possibilidade de entrelaçar e partilhar experiências que até então estavam esquecidas, ou

ignoradas pelo tempo.

Assim, a memória individual, apesar de suas particularidades, se entrelaça a uma

memória de tempo, de grupo e de comunidade. Segundo Meihy (1996) “toda narrativa é

sempre e inevitavelmente construção, elaboração, seleção de fatos e impressões” (p. 50).

Desta forma compreendemos que a “[...] narrativa para a história oral é uma versão dos fatos e

não os fatos em si” (p. 50), pois estes se apresentam a partir de um ponto de vista, ou seja, do

sujeito que os conta, [...] portanto, como discurso em eterna elaboração” (p. 50).

O texto apresenta elementos para a compreensão da educação rural, a partir da

memória oral do professor Luiz Bedin, que foi professor em duas escolas rurais multisseriadas

no interior de Francisco Beltrão a partir da década de 1960.

MEMÓRIA DOCENTE EM MEIO AO ENTRELAÇAR DO PASSADO: (RE) SIGNIFICANDO A HISTÓRIA

O professor Luiz Bedin, fez a incrível tentativa de (re) memorar fatos e

acontecimentos do processo de organização da escola primária rural nas comunidades de

Linha Guanabara e Linha Liston (se detendo mais a esta última) interior do município de

Francisco Beltrão – PR e (re) criá-las em forma de oralidade à pesquisadora. Para isso, o

relato oral foi organizado em perguntas semiestruturadas a fim de resgatar e reconstituir

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fragmentos históricos que deem corpo e se mesclem a história de vida do professor. Afinal,

somos sujeitos resultantes das múltiplas determinações da sociedade, somos parte e fazemos

história.

Luiz Bedin contou que começou a lecionar com 15 anos de idade e tinha apenas a 4ª

série, no ano de 1960 “[...] como precisava de um professor, eu tinha só o primário, comecei a

lecionar, dentro da igreja, para depois ser construída uma escola” (BEDIN, 2013). Nem

sempre a escola estava pronta quando os professores iniciavam as aulas, havia uma troca

reciproca entre igreja e município. Nos lugares onde não existia escola, a igreja oferecia o

prédio para a oferta do ensino, e onde não existia capela, o município oferecia a estrutura da

escola para as celebrações (MARTINS, 1986). Por esta razão, pode ser relacionado um

importante laço entre a igreja católica e a escola nas comunidades. O professor, ao ser

questionado, se a igreja influencia na escola o mesmo concordou que “influenciava”. “[...]

Mas se não, nos domingos e sábados a tarde a gente vivia com as crianças na Igreja” (BEDIN,

2013). Esta participação da escola na igreja fora identificada por Cattelan (2014) ao analisar a

escola primária rural de Francisco Beltrão. Este elo se dava ao fato de ambas efetivarem um

trabalho que ia além da instituição, mas se concretizava em um trabalho comunitário, próprio

da vida em comunidade.

Apesar de ter iniciado a docência com professor leigo, Luiz continuou os estudos “[...]

fazendo o ginásio em nova Concórdia e o magistério em Francisco Beltrão” (BEDIN, 2013).

O professor caracterizou que a Prefeitura Municipal de Francisco Beltrão por meio da

Secretaria de Cultura e Educação oferecia cursos para formação continuada dos professores.

[...] a gente fazia curso em Beltrão, até 1963 e 1964, curso de quarenta e poucos dias. Daí os orientadores visitavam as escolas e traziam material para gente. Daí fazia reunião com os professor, para planejar as aulas. Daí nos tinha um diário onde constava tudo que a gente passava para os alunos (BEDIN, 2013).

Luiz frisou que os “grandes encontros de professores” eram feitos com professores

da cidade e do campo. “Estes encontros grandes de quarenta dias era todos os professores”.

Da cidade e do interior e em outros momentos: “[...] nós fazia reunião com os professores do

interior da Nova Concórdia, uma vez por mês, e daí nos traçava experiências para ir

praticando nas aulas (BEDIN, 2013)”. Esta afirmativa do professor ressalta o momento de

planejamento e formação feitos no coletivo com os professores que lecionavam nas

comunidades pertencentes ao distrito e Nova Concórdia.

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Nos primeiros relatos o professor deixa claro como foi o processo de

entrada/indicação para lecionar: “Foi a comunidade quem me indicou, por que era necessário

ter um professor na comunidade. Daí os próprios vizinhos me incentivavam e eu continuei a

lecionar (BEDIN, 2013)”. Sobre esta prática de indicação de uma pessoa leiga da

comunidade, o prefeito Rubens Martins escreveu:

Onde, então, conseguir o pessoal necessário ao inicio das atividades escolares no Município? A solução foi reunir os moradores de cada núcleo populacional para que os mesmos indicassem entre os presentes, o mais capacitado para assumir o encargo. Tais pessoas, por não dependerem de hospedagem e por não terem que se deslocar a locais distantes, aceitavam a baixa remuneração, dedicando-se com esmero à atividade educacional. A Inspetoria Municipal de Ensino cumpria a difícil tarefa de ministrar treinamento adequado aos improvisados mestres, programando lhes as aulas e sabatinando-os quando de seu comparecimento à Sede Municipal para recebimento de seus parcos vencimentos (MARTINS, 1986, p.195-196).

Martins (1986) também descreveu em seu livro uma conversa que teve com um

cidadão do município, e destacou o processo de contratação dos professores. Segundo ele

várias pessoas o censuraram acusando-lhe de confiar o ensino do município a “analfabetos”,

como se referiam aos primeiros professores.

- O que o senhor está fazendo é um crime – desabafou, certa vez uma pessoa amiga - A criança que começa mal na escola, dificilmente se recupera. Eu lhe alcancei uma carta que me fora endereçada por uma das professoras municipais, pedindo-lhe para que a lesse e interpretasse. Havia erros ortográficos grosseiros, frases incompletas e termos inadequados. - É o que lhe dizia – comentou ele triunfante – A prova esta aqui. É uma barbaridade! - Mas você entendeu o que ela quer? – insisti. - claro que dá para entender. Ela esta pedindo material escolar e consulta se no próximo mês o senhor poderá mandar vacinar as crianças da escola e da vizinhança. - E esta o que quer? – Perguntei, passando a suas mãos uma folha de papel em branco. - Tá brincando – disse ele, olhando os dois lados da folha – não tem nada escrito... - Pois entre a carta mal escrita que contem uma mensagem integralmente entendida por você e a que nada transmite, eu prefiro a primeira. Não tenho outra opção e muito menos o povo do Município (MARTINS, 1986, p. 196).

Martins (1986) afirmou que tal cidadão compreendeu as razões pela qual, enquanto

prefeito havia agido, de forma a contratar os professores. Os professores leigos iniciaram os

trabalhos, em sua maioria, com a 4ª série, porém foram incentivados a cursarem o ensino

fundamental séries finais e o ensino médio. Mais tarde os mesmo cursaram o ensino normal e

cursos específicos de formação para professores.

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O professor Luiz contou que existiram algumas adversidades que enfrentava durante

sua jornada de trabalho. Pois, lecionava em duas comunidades em períodos diferentes: “[...]

Daí eu lecionei quando faltava professor na Vila Guanabara, lecionei vários anos na Vila

Guanabara. Lecionava meio dia na Linha Liston e meio dia na Vila Guanabara” (BEDIN,

2013). Quanto ao deslocamento até a comunidade de Vila Guanabara, o professor confessou

que se deslocava a cavalo, já que não havia outro meio de transporte adequado para aquelas

condições. Luiz conta que a quantidade de alunos que frequentava cada período: “[...] era a

base de 40, 50 e 60 alunos por meio dia, era classe multisseriada (BEDIN, 2013)”. O modelo

multisseriado fora utilizado para as escolas isoladas de boa parte das comunidades de

Francisco Beltrão. Algumas escolas funcionavam em dois a três turnos atendendo alunos e a

comunidade (CATTELAN, 2014).

Quando questionado sobre o lecionar, se mostrou satisfeito e com as melhores

lembranças do tempo, mas indicou uma problemática que é verificada nas escolas atuais: o

sucateamento do trabalho do professor.

[...] E naquela época era bom de lecionar, por que os pais apoiavam muito o professor. No causo que a gente tinha que castigar algum aluno, o pai era favorável ao professor, o aluno chegava em casa e contava, era para ele ter aprendido pelos pais (BEDIN, 2013).

Quanto a disciplina, toma tom de preocupação e diz: “Obedeciam. Naquela época

tinha aluno quase na minha idade, mas eram todos bons alunos. Faziam arte, mas respeitavam

muito o professor” (BEDIN, 2013). O apoio da comunidade e da família se tornou elemento

fundamental de elo com a escola rural.

O professor avalia que os momentos específicos de formação para o professor do

campo estes era “[...] algo de positivo. Por que além da orientação que a gente tinha por parte

do departamento de Educação, a gente era conhecido na comunidade. A gente morava junto

com os pais e os próprios alunos” (BEDIN, 2013). Ser da comunidade representava confiança

dos pais e também conhecimentos relativos a comunidade onde o aluno estava inserido.

Quando era aqui a gente que morava aqui sempre estava tomando chimarrão e visitando as famílias. Uma época em que a gente plantava verdura, tinha uma horta escolar com verdura e com remédios. Quase todos os tipos de remédios caseiro tinha na escola. Então os pais se reuniam ajudar o grupo a preparar a horta, a preparar o terreno. Ai ficava a tarefa para os alunos. A gente ia na casa da família toma chimarrão e visitar para ver se o aluno tinha feito a tarefa e se ele tinha dado para preparar a horta em casa. Ai tinha um incentivo da prefeitura no tempo do prefeito do João Arruda, tinha as feiras escolares em Beltrão, daí a gente participava, levava

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todo o tipo de verdura e pacotinhos de remédios, para vender na cidade. Ai este lucro era beneficio da escola (BEDIN, 2013).

A fotografia a seguir apresenta o professor Luiz Bedin com o então prefeito de

Francisco Beltrão João Arruda na abertura de uma das feiras escolares.

Fotografia 01: Abertura da feira escolar

Fonte: Acervo pessoal Luiz Bedin, 2013.

Para tanto a escola também era organizada em um sistema forma de educação,

estabelecendo um currículo a ser seguido e a avaliação. O professor identificou elementos do

processo avaliativo na escola primária rural onde lecionava:

Logo no inicio a gente teve dificuldade, mas depois dava para trabalhar muito bem. Depois o próprio exame final nas escolas, então era trocado de professor. Eu ia lá para o Cabeceira do Rio do Mato, ia para a linha São Sebastião, Nova Concórdia, fazia o exame para aqueles alunos, e o colega daquela comunidade vinha fazer o exame aqui na linha Liston. Naquela época a prefeitura ajudava. Tinha material caderno, lápis, borracha. Vinha muito material didático para o professor (BEDIN, 2013).

Os exames finais se caracterizavam como elemento de aprovação ou reprovação dos

alunos para cada série. Feitos sempre ao final do ano (CATTELAN, 2014). Quanto ao

conteúdo estudado na escola o professor identificou que os mesmos vinham de encontro com

aspectos da vida cotidiana e se relacionavam.

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[...] a gente dava um trabalho para as crianças ajudar o pai ou a mãe na horta no que eles aprendiam em sala de aula. Ai o professor visitava as famílias e via se o aluno estava realmente ajudando a família. Daí fazia experiência em sala de aula. Na comparação com a plantação de feijão, a gente fazia duas caixas, uma deixava inclinada, plantava o feijão e outra para ver o processo que a água fazia nas roças. Então a gente e o aluno já saia aprendendo desde trabalhar na roça cuidando seu terreno para não ter erosão (BEDIN, 2013). Depois a gente tirava um tempo na hora do recreio para brincar com eles, então era uma família muito unida. Daí eu trazia muita gente, a EMATER para fazer muda de eucalipto. Muita coisa que nós fizemos no terreno da escola, nos reunia os pais, naquela época os pais participavam, quando a gente convidava todos os pais para experiências aqui na escola, todos os pais colaboravam e participavam.

Ainda quanto a participação dos alunos no processo de ensino-aprendizagem o

professor considerou uma experiência feita entre escola, alunos e professor, família e a

comunidade:

Então a gente fez muita experiência. Aqui a gente fez uma plantação de pinheiro. Então reunimos os pais os alunos e foi plantado o pinhão. Todos em linha e hoje faz mais de 10 anos que nós estamos comendo pinhão dos pinheiros que foram plantados pelos alunos. Foi em reunião e conversando e surgiu a ideia (BEDIN, 2013).

Assim, a comunidade se reunia “[...] daí nós planejamos, conversemos e fizemos esta

plantação, e hoje eles estão ai” (BEDIN, 2016). Apontando para uma plantação de pinheiros

que ficava a frente de sua casa, dentro da propriedade da comunidade e próximo à escola rural

multisseriada desativada. A fotografia a seguir retrata o professor junto a plantação de

pinheiros.

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Fotografia 2: Professor Luiz Bedin, com a plantação de pinheiros

Fonte: CATTELAN, 2013.

Quanto aos pais e famílias, o professor considerou que existia uma boa participação na

escola e também da comunidade na educação desenvolvida na escola rural.

Nós fizemos varias experiências de plantação com apoio da prefeitura da EMATER e os órgãos competentes aqueles que a gente convidava para vir orientar. O interesse era que o próprio filho ficasse com os pais na roça, por isso que a gente orientava sobre erosão e sobre até a plantação que produzisse bem para não desanimar as famílias.

Quanto às matrículas o professor enfatizou:

[...] as matriculas os pais faziam na própria escola com o professor e na limpeza a gente tirava um ou dois alunas para a limpeza. Nós mesmo fazia a limpeza da escola. Então, no encerramento das aulas a gente convidada todos os pais para o encerramento e daí já aproveitava e fazia a matricula do ano seguinte (BEDIN, 2013).

O professor considerou que, “[...] por que a escola tendo na comunidade era um

trabalho de escola e igreja. Todas as promoções dias das mães, dias dos pais, dia da árvore,

então a gente sempre comemorava e todo mundo participava” (BEDIN, 2013). Luiz conta que

a escola fazia promoções e o dinheiro era revertido para melhorias na escola. Como a festa

escolar com a escolha da rainha, festa típica da escola da qual a comunidade auxiliava.

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Fotografia 3: Festa escolar com a escola da Rainha

Fonte: Acervo pessoal Luiz Bedin, 2013.

A escola também tinha sua organização: “[...] a escola sempre tinha um conselho, um

presidente que sempre trabalhava junto. Tinha um conselho. Formado pelos pais” (BEDIN,

2013). Desta forma a comunidade auxiliava na escola e a escola auxiliava a comunidade em

uma troca reciproca de conhecimentos e vivências. O professor Luiz contou emocionado que,

Depois que eu sai, eu fiquei na linha Liston mesmo. Faz mais de 50 anos que tô morando no Liston. Comecei a lecionar aqui e ainda to morando aqui. Aqui, quando foi passado para Nova Concórdia para levar os alunos, teve pontos positivo, mas teve pontos negativos, porque os alunos foram para lá e deu uma enfraquecida na própria igreja. A gente não conseguia pegar um aluno para fazer uma leitura ou alguma coisa na participação na igreja. Então foi uma alegria e uma tristeza. Uma alegria de se aposentar e tristeza de não poder mais participar. Mas, eu convivia sempre com as crianças, por que eu era também catequista, então a gente sempre vivia na comunidade. Estranhei muito quando começou ir para Nova Concórdia, que terminou a escola aqui no interior, então a gente ficou um pouco mais distanciado. A criança que passou para Nova Concórdia, depois aqui a frequência da própria criança na própria comunidade foi mais difícil (BEDIN, 2013).

A escola de Linha Liston e a de linha Guanabara foram nuclearizadas à escola seriada

do Distrito de Nova Concórdia. O transporte escolar percorria as comunidades e os alunos

enfrentavam extensas e cansativas horas de trajeto até a escola.

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Considerações finais

As contribuições da memória oral para o resgate histórico educacional são

imensuráveis. Estas nos possibilitam uma melhor aproximação com o real, dentro do ponto de

vista dos sujeitos que fizeram parte do processo. Neste sentido, nos permitem compreender

categorias elencadas por Buffa e Nosella (2013) como currículo, ensino, prédio escolar,

materiais escolares dentre outros, que se atrelam a história de vida de professores e alunos de

um determinado lugar.

De fato, a escola primária rural contribuiu significativamente para a formação de um

sujeito que compreendesse o lugar, as relações de trabalho e também o fornecimento de

técnicas e conhecimento para o trabalho no cotidiano rural. Os professores, por serem

moradores da comunidade, vislumbravam ideais próprios das famílias e do lugar, criando

relação entre escola e sujeitos, significando assim o conhecimento adquirido.

Referências

CATTELAN, Carla. Educação rural no município de Francisco Beltrão entre 1948 a

1981: a escola multisseriadas. Francisco Beltrão-PR: Universidade Estadual do Oeste do

Paraná – UNIOESTE, 2014. (Dissertação de Mestrado em Educação).

BEDIN, Luiz. Francisco Beltrão, entrevista concedida no dia: 30 de Junho de 2013 á Carla

Cattelan.

MARTINS, Rubens S. Entre Jagunços e Posseiros. 1ª ed. Curitiba: 1986.

MEIHY, José C. S. Bom. Manual de História Oral. Edições Loyola. 1996.

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EIXO TEMÁTICO 7:

MOVIMENTOS SOCIAIS POPULARES E A FORMAÇÃO DOS

TRABALHADORES

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A FORMAÇÃO DO ACAMPAMENTO HERDEIROS DA TERRA DE 1º DE MAIO E

A CONQUISTA DA ESCOLA ITINERANTE HERDEIROS DO SABER COMO

FORMA DE RESISTÊNCIA E COLETIVIDADE

Rose Riepe de Souza1

Ana Cristina Hammel2

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dos

Trabalhadores

Resumo: O presente texto faz parte da discussão desenvolvida no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), intitulado “Luta pela terra e prática pedagógica: a experiência da escola Itinerante Herdeiros do Saber”, realizado no Curso de Interdisciplinar em Educação do Campo: Ciências Sociais e Humana da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Consiste em historicizar sistematizar o processo de conquista, construção e organização do Acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio3 e da Escola Itinerante Herdeiros do Saber, município de Rio Bonito do Iguaçu (PR). Abordamos o processo de construção do Acampamento e da Escola realizado a partir de 2014, desde o Acampamento Base, para rememorar a luta erguida pelos acampados ao direito à terra e à educação no campo. Trazemos presentes relatos de acampados(as) que fizeram e fazem parte do processo de consolidação do Acampamento e da Escola como forma de valorizar os sujeitos construtores dessa história. Portanto, para atingir os objetivos propostos foi realizado uma pesquisa qualitativa através de Estudo de caso, com entrevista semiestruturada direcionada aos acampados(as). Mediante os relatos obtidos com a pesquisa, podemos compreender que o processo histórico vivido pelas famílias acampadas para além de ser uma história de resistência diante ao capital no campo e da negação ao acesso à terra e à educação; trata-se de um movimento formativo da consciência de luta e de pertença ao MST enquanto sujeito Sem Terra. Palavras-chave: Acampamento; Escola Itinerante; Sujeito Sem Terra.

1 Mestranda do curso de Pós-Graduação em Educação – Mestrado/PPGEFB pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Francisco Beltrão. Graduada em Interdisciplinar em Educação do Campo: Ciências Sociais e Humanas pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), campus Laranjeiras do Sul. E-mail: [email protected]. 2 Professora da Universidade Federal da Fronteira Sul, nos cursos de Licenciatura em Educação do Campo. Mestra em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Cascavel. Doutoranda em História -Doutorado PPH - Unioeste Marechal Cândido Rondon. E-mail: [email protected] 3 O Acampamento recebeu este nome como homenagem aos filhos dos assentados da região, pois uma grande parte aderiu à luta e são acampados.

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Introdução

A realidade vivida pelos acampados é a base para a formação da consciência do sujeito

Sem Terra. A mobilização em torno da ocupação da terra, bem como a política de

organicidade interna do Acampamento e da Escola contribuem para a formação da identidade

Sem Terra no Acampamento. Nesse processo, a sistematização da história de consolidação do

Acampamento Herdeiros da Terra de I de Maio e da Escola Itinerante Herdeiros do Saber,

tornam-se importante para rememorar e sistematizar o processo de luta ao qual levou às

conquistas atuais dos acampados, como o acesso à terra e à educação. Na mesma medida se

consolida como movimento formativo da identidade dos sujeitos dessa história, o que leva a

pertença ao movimento social em questão e permanência na resistência do Acampamento.

Garantir que o movimento da história não se perca com o tempo, que esteja passível de ser

revivido pelos acampados e por quem possa interessar, através sua sistematização, a qual nos

propomos à realizar.

Metodologia

Com a intenção de sistematizar a história da experiência vivida pelos acampados de

ocupação e construção do Acampamento e da Escola, previamente foi apropriados dos

estudos de Deslandes e Minayo (2002) para a partir de suas reflexões para projetar a pesquisa.

Desta forma, realizou-se uma pesquisa com viés qualitativo (TRIVIÑOS, 1987), alicerçada no

Estudo de Caso da escola Itinerante Herdeiros do Saber, com enfoque no histórico do

Acampamento e da Escola com utilização de entrevista semiestruturada, guiada por

questionário aos acampados(as) (YIN, 2015). Foram selecionados acampados(as) que

compartilharam as vivencias desde o início do Acampamento, no Acampamento Base, na

ocupação da terra e na reconstrução do Acampamento e construção da Escola no novo espaço,

já situado nas terras tidas como da empresa Araupel S&A.

Foram entrevistadas quatro pessoas, as quais foram identificadas ao longo do texto

sem nomes, denominando-se “entrevistado(a) 1, entrevistado(a) 2”, sequencialmente na nota

de rodapé. As entrevistas foram realizadas aleatoriamente nos meses de setembro e outubro

do ano de 2017. A compilação dos dados constituiu de forma qualitativa, pela transcrição das

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entrevistas, sistematização, comparação e seleção das questões mais ressaltadas pelos

entrevistados(as).

A formação do acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio

As organizações das lutas contra o capital no campo, sob a bandeira do MST,

desenvolveram-se a partir da década de 1980 em todo país. Ganham significante destaque as

ações na região Centro/PR, uma vez que foram mobilizações inesperadas, de grandes

proporções, resistências e que obtiveram grandes conquistas, como são os casos dos

Assentamentos Ireno Alves dos Santos, Marcos Freire, Dez de Maio e Celso Furtado,

congregando um contingente de mais de 3 mil famílias assentados.

Na última década (2000-2010), diante da conjuntura posta ao MST, de organização e

estagnação das ocupações, pauta-se a necessidade da retomada das ocupações e formação de

novos Acampamentos. No município de Rio Bonito do Iguaçu, faziam 17 anos desde a última

ocupação. Portanto, no contexto da disputa por terra entre as famílias organizadas pelo MST e

a empresa Araupel, dar-se-á continuidade na luta, como uma importante etapa na história de

enfrentamento e resistência frente à permanência do capital no campo. História, que trazemos

contada a partir daqueles que a integra.

No dia 01 de Maio de 2014 constituiu-se o acampamento Herdeiros da Terra de 1º de

Maio no município de Rio Bonito do Iguaçu/PR e, em meados do ano seguinte, 2015, ergue-

se o acampamento Dom Tomas Beduíno no município de Quedas do Iguaçu/PR. Foram duas

novas ocupações nas terras do latifúndio Araupel, o que caracteriza o desejo dos Sem Terra de

expulsar a empresa da região. Configurou-se, assim, um contexto de disputa e enfrentamento

em dois municípios da região.

Para rememorar o processo de luta pela terra, constituído na formação do

acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio, partimos das primeiras organizações que

tiveram início acerca da formação do Acampamento Base no lote de um assentado pertencente

ao Assentamento Ireno Alves dos Santos, que cedeu o espaço para o MST organizar as

famílias para a ocupação.

O Acampamento Base é um espaço estratégico de organização e massificação do povo

para a ocupação da terra, o que é afirmado nas palavras de uma educadora entrevistada, relata

que, “[...] o Acampamento Base teve por objetivo organizar as famílias que se encontravam

em diversos espaços de vida, concentrando as interessadas em lutar para a terra a se juntarem

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e organizarem sua luta, e a ocupação” (Entrevistada 1)4. Ou seja, inúmeras famílias com o

objetivo de lutar pelo direito à terra, porém com a necessidade de juntar forças e serem

organizadas. Nesse sentido, o Acampamento Base é “para reunir um número de pessoas

suficientes para a ação de ocupação, e para preparar politicamente e organizativamente as

famílias para a resistência na área ocupada, tendo em vista que os conflitos aumentam e é

necessário se entender como coletivo e não mais como indivíduo” (Entrevistada 4)5.

É um momento de incessante espera, mas traz momentos únicos de compartilhamento

de vivências. Nesse período o que se destaca-se é a organização fomentada pelos

acampados(as). De acordo com a entrevistada 4 (acampada), “cada pessoa ou família que

chegava ao Acampamento era nucleada a um grupo de base. Esses grupos eram formados a

partir das origens de seus integrantes”.

A necessidade do Acampamento Base parte do objetivo de organizar as famílias na

aproximação com a dinâmica do MST. Isso se expressa quando trazem que “toda a

organicidade do Acampamento era debatida pela coordenação que era composta por

representantes dos grupos, e encaminhadas em reuniões” (Entrevistada 1). Portanto, “através

da existência dos grupos e da formação da Coordenação do Acampamento, foi se exercitando

a construção coletiva das definições relacionadas à vida do Acampamento (Entrevistada 4).

As famílias ao se inserirem no acampamento passam a compreender os processos

organizativos e, por sua vez, atuarem na organização.

O Acampamento Base é o início do processo. Muitos dos integrantes não possuem

formação política ou até mesmo conhecimento da organização interna de um Acampamento,

tornando-se um desafio a inserção. Mas, através da coletividade, superam-se as dificuldades e

com a aproximação obtém-se o comprometimento e engajamento de todos os integrantes.

Destacam “a grande quantidade de famílias com necessidade e disposição de lutar pela terra e

pelo direito a produzir.” (Entrevistada 1). O que formou grande unidade das famílias que não

se conheciam, decorrente do objetivo que compartilhavam, levando-as a se unificarem.

Neste período, as famílias assumiam tarefas para a manutenção do Acampamento.

Estas tarefas eram direcionadas a partir “da orientação do Movimento nacional, com

organização de Grupo/Brigadas, Coordenação e Direção dos Grupos, Coordenação e Direção 4 Entrevista realizada no dia 04/09/2017, a entrevistada é educadora na Escola Herdeiros, possui ensino superior completo, contribui no acampamento há dois anos, participa do coletivo regional de mulheres da Via Campesina e não está acampada. 5 Entrevista realizada no dia 06/10/2017, a entrevistada é acampada, já contribuiu com na escola Herdeiros como educadora e atualmente contribui com a coordenação do coletivo de juventude.

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do Acampamento e a constituição de Setores os quais são Setor de Saúde, Disciplina,

Infraestrutura, Juventude, Comunicação, Coletivo de Gênero, Educação, Esporte, Finança e

Formação” (Entrevistada 1). As responsabilidades assumidas pelos acampados nos processos

organizativos, que garantem a sustentação do Acampamento, condicionam o engajamento dos

mesmos. Esta organização perdura-se no ano de 2017 e segue a mesma organicidade.

Após o processo preparatório, levando em conta que as famílias estavam organizadas

para a ocupação, na madrugada do dia 17 de julho de 2014, houve a mobilização dos

acampados para a ocupação. As famílias acampadas foram organizadas em grupos para

melhor desenvolvimento da ocupação, grupos separados de carros, motos, tratores e

caminhões com os pertences dos acampados. Neste momento, considerado muito importante

para os acampados, foi recebida a ajuda dos assentados no transporte e na garantia da

segurança das famílias (Entrevistado 3)6.

Na ocupação, ao chegar ao espaço perceberam que não seria um ponto estratégico pela

falta de visibilidade caso ocorresse uma despejo. Sendo assim, “foi encaminhado um novo

espaço com mais visibilidade e mais próximo dos Assentamentos para melhor controle e

segurança das famílias” (Entrevistado 2)7. Quando chegamos ao espaço aonde seria montado Acampamento, já era início da tarde, de baixo de chuva, o setor de infraestrutura foi organizando os acampados para a construção dos barracos, para se protegerem da chuva. Os barracos foram construídos de forma provisória de acordo com os grupos definidos no Acampamento Base, esta organização foi estabelecida previamente à ocupação (Entrevistado 2).

Na construção das moradias, “cada família se organizou com a estrutura de materiais,

porém houve um esforço coletivo de garantir a construção dos barracos para todos”

(Entrevistada 1). “Foram três dias de muita chuva, era barraco caindo, alagando, no entanto o

companheirismo entre os acampados em nos ajudaremos uns aos outros” (Entrevistada 3).

Ressaltaram que a prioridade eram as famílias que tinham crianças, muitas moradias foram

construídas quatro dias depois da ocupação. Esse processo inicial aconteceu em meio a

confronto com policiais, fato que não estava planejado pelo MST, o que demonstrou que os

imprevistos no momento da ocupação podem mudar todo o percurso planejado, bem como

tornar o momento mais sofrido. 6 Entrevista realizada no dia 21/09/2017, a entrevistada é educadora, acampada, compõe a equipe pedagógica contribuindo com a coordenação da escola, possui ensino superior completo. 7 Entrevista realizada no dia 11/09/2017, o entrevistado é acampado desde o acampamento Base e contribui na coordenação do acampamento.

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Neste momento, de acordo com os acampados, eram 32 grupos com cerca de 50 a 120

cadastrados cada. As famílias fizeram os barracos cada um de acordo com seu grupo. Esta

organização se deu para todo o Acampamento.

Já no primeiro mês de Acampamento, o anseio de produzir era muito grande entre os

acampados. Portanto, “o Acampamento discutiu coletivamente a destinação de uma parte de

terra para que cada família possa produzir principalmente os alimentos para a subsistência,

sendo a produção de alimentos diversificados” (Entrevistada 3). No início foi definido cerca

de um hectare de terra para cada cadastrado, entretanto, não era suficiente, já que toda

subsistência seria produzida no Acampamento, sem possibilidade de manter emprego fora.

Desta forma, foi discutida a ampliação da quantidade de terra para cada cadastrado.

Todavia, era necessário também marcar território. Portanto, como estratégia

organizativa para sanar as demandas de terra para plantar, ficar mais próximo as roças e de

marcar território, o “Acampamento foi dividido em quatro, sendo denominados Herdeiros 1,

também conhecido como ‘Sede’; Herdeiros 2 – ‘Alojamento’; Herdeiros 3 – ‘Lambari’; e

Herdeiros 4 – ‘Guajuvira” (Entrevistada 3).

Desde o primeiro mês da ocupação, as famílias cultivam e criam animais. Em cada ano

subsequente aumentava-se a terra para plantar e, consequentemente, a produção. Em três anos

e meio de Acampamento, o momento que mais marca esta trajetória de luta, de acordo com a

entrevistada 3 (educadora), foi a festa de comemoração de aniversário de um ano, já que

representou um ano de resistência dos Sem Terras organizados. Visto que, naquele momento,

se projetava a permanência naquele espaço e continuidade da luta. Vale ressaltar que entre os

aprendizados de se viver em um Acampamento, a entrevistada 4 (acampada) destaca “a

vivência coletiva, os aprendizados de estar em luta, e a formação humana.” O que considera

ficar para vida de todos(as) que, em meio a esta sociedade, vê a necessidade de integrar-se ao

Acampamento.

A construção da escola Itinerante Herdeiros do Saber

A luta pela terra é o ideal que move os Sem Terras. Entretanto a educação coloca-se

como fator determinante para a permanência das famílias acampadas na continuidade da luta

pela terra, considerando que “A luta pela terra vai além da conquista de um pedaço de chão;

atinge outras dimensões da cidadania, entre elas, o direito à educação e à escola” (MST, 2005,

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p. 187).

A Escola Itinerante no Acampamento, em primeiro lugar, possibilita que as famílias

possam se estabelecer no local, pois não é possível manter os filhos fora da escola. A escola é,

também, uma tática de resistência, já que expressa a organização da vivência das famílias

acampadas. O que se expressa nas palavras de uma educadora acampada:

É uma instituição do estado dentro de um território que o estado é contra, nesse sentido ele precisa pensar melhor antes de agir com violência contra a Comunidade. Ainda e talvez mais importante, é mais um espaço de formação do sujeito Sem Terra, onde é possível aprender sobre o mundo através de uma postura crítica e de luta. (Entrevistada 4).

Diante disso, compreende-se que a Escola Itinerante, para além de ter um papel

político no Acampamento, fortalece a luta dos acampadas, uma vez que é tida como alicerce

na luta pela terra. Ou seja, “a escola é um espaço de integração, fortalecimento e de

resistência do Acampamento. É um direito de todas as crianças terem acesso à escola nos seus

espaços de vivências.” (Entrevistada 1). Além disso, “é uma forma de dificultar que o Estado

não despeje as famílias acampadas, bem como garantir o processo de formação aos

integrantes do acampamento, não é só as crianças, uma vez que a escola iniciou com a

Educação de Jovens e Adultos (E.J.A) com 4 turmas (Entrevista 3).

No Acampamento Base a organização dos acampados estava em torno da ocupação.

Contudo, neste momento já se visualizava como seria a construção da escola. Como afirma o

entrevistado 5 (educador)8, “o planejamento para organização da escola deu-se ainda no

Acampamento Base, antes da ocupação. Ela foi planejada pelo MST e realizada através do

Setor de Educação juntamente com os acampados.” Acrescenta ainda que,

O MST tem como prioridade a educação nos seus diversos espaços, assim logo que o Acampamento se organiza um dos primeiros setores que é organizado é o de educação, pois as crianças chegam logo no início e tem direito ao acesso de educação. No Acampamento Herdeiro logo se iniciou a organização da educação, apresentando a demanda dos educandos para a Escola Base das escolas Itinerante, o Colégio Iraci Salete Strozak (Entrevistada 1).

Como tudo no Acampamento é muito difícil, devido às condições de trabalho, sem

recurso para investimento no cultivo da terra, bem como a falta de trabalho formal, o que

consegue é minimamente a garantia da alimentação das famílias acampadas. Nessa condição,

teve a necessidade da construção da Escola, mesmo com todos os limites os(as) 8 Entrevista realizada no dia 02/10/2017, o entrevistado é educador, atualmente atua na coordenação da Escola Herdeiros, está acampado e possui ensino superior incompleto.

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acampados(as) assumiram a Escola como responsabilidade coletiva. Por isso, a construção da

Escola deu-se, exclusivamente, pela organização da Comunidade. Sendo os acampados os

principais interessados, eles próprios constroem a sua escola. Já que esperar do Estado não é a

saída, uma vez que “a negociação com o Estado só acontece através de pressão política”

(Entrevistada 4).

A princípio, a necessidade era de uma estrutura física, esta forma, foi determinado que

“os recursos para a construção seria levantado pela Comunidade, a qual recebeu apoio de

alguns comerciantes simpatizantes da organização. Para a construção foi dividido nos grupos9

do Acampamento, sendo determinada a construção de uma sala para cada dois grupos. Esta

organização possibilitou que em uma semana a escola ficasse pronta para iniciar as aulas”

(Entrevistada 3).

Foi logo após a ocupação da área que iniciou-se a construção da estrutura física da

Escola, realizada pelos Setores do Acampamento de Infraestrutura e Educação juntamente

com a Comunidade, os pais, os(as) educadores(as), os educandos. Também receberam ajuda

externa ao Acampamento, “o comércio local, a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)

e o Setor Estadual de Educação, todos contribuindo para que a escola fosse inaugurada no dia

09 de setembro de 2014” (Entrevistado 6)10.

Dando início as atividades da Escola, “passaram a funcionar com os anos iniciais e

Educação de Jovens e Adultos (EJA) já em setembro de 2014. No ano de 2015, iniciou com

Ensino Fundamental e Médio. No final de 2015 houve a primeira formatura ocorrida no

Acampamento, com os alunos do terceiro ano do Ensino Médio” (Entrevistada 3).

A partir da demanda de ocupação do território e de reorganização do Acampamento

em outros espaços, consequentemente, houve a necessidade de reorganizar a escola. Salienta-

se que “o primeiro momento foi bem difícil, no início de 2016, sendo divididas todas as

turmas da Escola” (entrevistada 3), porém os acampados e os(as) educadores(as) tinham em

vista que era um processo temporário e necessário naquele momento, o que faz parte de sua

principal característica, a itinerância. Na divisão da escola, consolidou-se a seguinte

organização.

Quadro 1 - Número de educandos nas Escolas do Acampamento no ano letivo de 2017.

9 Os grupos trata-se de uma organização geral do Acampamentos, todos os acampados fazem parte de um grupo, cada grupo possui em média de 50 a 70 cadastrados pelo INCRA. 10 Entrevista realizada no dia 04/10/2017, o entrevistado contribui na escola Herdeiros há um ano e não está acampado, possui ensino superior completo.

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ESCOLA ITINERANTE HERDEIROS DO SABER Divisões: Herdeiros I (Sede) Herdeiros II

(Alojamento) Herdeiros III (Lambari)

Herdeiros IV (Guajuvira)

Nº de educandos:

254 103 81 66

Total: 504 Fonte: Dados fornecidos pela Escola Itinerante Herdeiros do Saber. Nota: Elaborado pela autora, 10/10/2017.

Como expresso nos quadros 1 e 2, a Escola Itinerante Herdeiros do Saber I, II, III e IV,

possui um número significante de educandos que ao todo somam-se 504. Entretanto observa-

se que não dispõe de recursos para suprir as necessidades mínimas que o processo de ensino e

aprendizagem necessita. A comunidade demonstra grande esforço para garantir a qualidade da

educação neste espaço, conta com “participação ativa, desde dar suporte financeiro como

participar do processo da gestão escolar” (Entrevistada 3).

É importante ressaltar o trabalho voluntário dos(as) educadores(as), como elemento

que acompanha a construção da Escola, o qual é apresentado por uma educadora, ao dizer que

“no início da Escola em 2014, foram 10 meses trabalhando voluntário, em seguida fomos

contratados por 18 meses. Acabou o contrato e ficamos mais 6 meses sem receber novamente,

como exemplo, este ano, 2017, fomos ser contratados a partir do mês de Maio” (Entrevistada

3). No entanto, a pertença desses(as) educadores(as) não os deixa abandonar a escola, pois a

Escola é compreendida como mais que um emprego. Ela se insere na luta por um ideal de

vida e de sociedade, está a serviço da luta social.

Nesse sentido, deve-se dizer que, o que move a escola é a coletividade, o

companheirismo e união. Como prova disso observa-se o trabalho voluntário desenvolvido

nos momentos difíceis que a Escola enfrentou, tanto pela comunidade, famílias acampadas

como pelos(as) educadores(as) e simpatizantes externos ao Acampamento.

A resistência existente na luta pelo direito à educação no Acampamento se evidência a

cada instante que a Escola consegue se manter pela coletividade. Nessa união necessária para

garantir a escola no Acampamento contribui na construção da identidade da comunidade

acampada, assim como dos(as) educadores(as). Pela organização, o cuidado, o esforço de

estar sempre buscando melhoras estruturais, organizativas, lutando por questões políticas

envolvidas a escola, encontram-se fortalecidos uns com os outros. Isso é evidencia a

importância da conscientização acerca dos conflitos vividos, desmontando o potencial

formativo das contradições da vida na prática social.

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A Escola Itinerante é fruto de um esforço coletivo. E esse esforço é recompensado

quando se alcança a produção do conhecimento nesse espaço, como é afirmado nas palavras

da entrevistada 4 (Acampada), “toda essa luta ganha sentido quando os educandos

demonstram que aprendem, além dos conteúdos, diversas outras coisas importantes para a

vida”. Entretanto, frente a esses desafios, os Sem Terra conseguem perceber que é possível

ensinar, trocar saberes e aprender nas condições que se encontram, visto que a educação está

presente em todos os espaços do Acampamento. A falta de infraestrutura é uma motivação

para se lutar e resistir cada dia mais.

Conclusões

A história de formação do acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio, traz a

ousadia em retomar o enfrentamento ao capital pela conquista da terra e junto a esse

movimento fortalecer a luta pela educação do campo.

O processo de luta pela terra é constitutivo da escola Itinerante e permeia as relações

estabelecidas no meio escolar. Para além, a realidade proporcionada pelo Acampamento é

fundante para a concretização dos princípios educativos do MST, pois trata-se de solo fértil

para a materialização de práticas educativas vinculadas a luta social e a luta de classes.

A Escola Itinerante Herdeiros do Saber foi construída no Acampamento a partir da

necessidade de os(as) educandos(as) terem acesso à educação, inseridos na realidade em que

vivem. Objetiva formar para a vida, para relações sociais mais humanizadas. Para isso,

potencializa a prática social vivida no Acampamento como elemento formativo. Entre as

quais se insere a própria luta pela consolidação da escola no Acampamento e permanência

desta diante dos percalços enfrentados no dia-a-dia.

A coletividade e solidariedade advinda do compartilhamento da vida no

Acampamento, através dos dispositivos organizativos do MST, fomenta a união entre os(as)

acampados(as), possibilidade ver a instituição escolar de outra forma, como bem comum da

comunidade e que todos têm a responsabilidade em cuidar e mantê-la em atividade. Ao

mesmo tempo, forma o sujeito Sem Terra, uma vez que na luta pela terra, ao se perceber

enquanto sujeito histórico que tem papel ativo na luta de classes, permite a ascensão ao plano

real das relações capitalistas, compreendendo de forma mais clara seu papel enquanto sujeito

Sem Terra. Portanto, é oportuno dizer que a escola no Acampamento caminha junto com a

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luta pela terra, é um instrumento que fortalece o Acampamento.

Referências BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1999.

DESLANDES, S. F. A construção do projeto de pesquisa. In: MINAYO, Maria Cecílio de

Souza. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 21. ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST). Dossiê MST

escola: Documentos e Estudos 1990-2001. Cadernos de Educação nº 13. Edição Espacial.

ITERRA/MST. Rio Grande do SUL, 2005.

TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo:

Atlas, 1987.

YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Tradução Cristhian Matheus

Herrera. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015.

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ALGUMAS REFLEXÕES ACERCA DA EDUCAÇÃO E DO PROCESSO DE

FORMAÇÃO HUMANA

Dorisvaldo Rodrigues da Silva1

Vilmar Malacarne2

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dos

Trabalhadores

RESUMO: Este texto aborda questões acerca da Educação e da Formação Humana. Tem por objetivo refletir sobre o processo educacional na formação humana. Discorre sobre questões da formação humana a partir do núcleo familiar a qual se inicia com o processo de desenvolvimento do homem natural – advento do nascimento – para o desenvolvimento de homem social – que inicia a partir do estabelecimento de relações de cuidados da mãe com a criança. Ressalta a importância da educação sistematizada e formal oferecida pela escola como um meio de promover o acesso aos conhecimentos históricos, culturais e sociais, oportunizando reflexões aos alunos no sentido de desenvolver a consciência do sujeito social capaz de conhecer os seus direitos e deveres perante a sociedade e exercitar com autonomia a sua cidadania.

Palavras-chave: Educação; Formação humana; Homem natural; Homem social; cidadania.

Introdução

O tema da Educação tem sido tratado de forma frequente no âmbito dos discursos,

tanto pela academia como pelos governantes ou, ainda, por candidatos aos cargos eletivos

durante as campanhas eleitorais. Essa situação se repete de forma intermitente a cada 4 anos,

sendo um dos eixos explorados pelos candidatos nas esferas de governo municipal, estadual e

federal. Essa atenção dada a questão da educação tem sido repetida ao longo da história

recente do nosso país. As mensagens contidas e recorrentes nos conteúdos dos discursos

demonstram que existe uma preocupação tanto do ponto de vista da academia, no que diz

respeito às questões de cunho pedagógico, filosófico ou metodológico. Nos demais setores, a

discussão gira em torno dos recursos voltados para o financiamento ou para o estabelecimento

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de políticas públicas que visam atender demandas pertinentes a área em questão.

Normalmente os discursos apontam os gargalos ou problemas presentes na área educacional e

que de alguma forma têm reflexos na vida de toda a sociedade. Não obstante, esses problemas

destacados nos discursos, comumentemente atingem, de forma mais severa, as classes mais

pobres da população.

Dados citados pelo INEP sobre a trajetória dos alunos ingressos no ensino superior

entre 2010 e 2014 demonstraram que em torno de 11,4% dos alunos abandonaram o curso no

qual foi admitido. Em 2014 esse índice chegou a quase 49% de alunos que deixaram de

estudar (INEP, 2016). Poder-se-ia aludir que este processo de evasão que ocorre é uma

condição estabelecida pela falta de condições de estudar e trabalhar ao mesmo tempo, ou

ainda pela falta de perspectiva de se colocar no mercado de trabalho após concluir os seus

estudos. Pode se alegar muitas questões, mas uma que é recorrente e está sempre presente é a

crise na educação. Mas onde está a crise? Na instituição como espaço físico e recursos

materiais e humanos? Na formação de professores? Na valorização do trabalho do

profissional da educação? Nas políticas que atendem o setor? Ou ainda na sociedade? Onde?

A partir desses questionamentos e dos possíveis argumentos que possam justificar tal

situação, a condição de crise tem-se mantido ao longo do tempo. É o que dizem os estudiosos.

Dentro desse contexto, o tema também tem sido abordado nas diversas relações

estabelecidas nas diferentes formas de conhecimento, comumentemente aqueles voltados as

questões que visam atender o mercado e que estão, de alguma forma, relacionados aos

processos produtivos e as inovações tecnológicas.

A partir dessas considerações iniciais, pode-se verificar que a questão educacional está

carregada de interconexões que a coloca na condição de prioridade em função de sua

amplitude social. Face a essas considerações, neste texto, objetiva-se explanar, minimamente,

algumas questões que possam refletir sobre a relação entre a Educação e a Formação humana.

Inicialmente convém destacar que a educação tem sido utilizada nos discursos como

uma panaceia para todos os males. Quantas vezes já ouvimos que a ação educativa deve

preparar a pessoa para a vida social. Ou ainda, para exercer a sua cidadania. Ou para atender o

mercado de trabalho. Neste sentido, Rodrigues (2001) afirma que

Ao definir os atributos do ato educativo como o de preparar os indivíduos para a vida social, institui-se um parâmetro universal sobre os fins da Educação. E esse parâmetro pode ser expresso em um outro discurso

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paralelo e a ele correspondente: o de formar os indivíduos para o exercício da Cidadania. O que se coloca como fim ou finalidade da ação educativa constitui-se, ipso facto, em seu próprio conceito. Um exame mais acurado dessas proposições indicaria que, por esse caminho conceitual, o discurso educativo acaba se convertendo numa proposição tautológica, e coopera para enfraquecer a construção de um bom entendimento a respeito do que seja a Educação (RODRIGUES, 2001, p. 234).

A citação nos remete a necessidade de apresentar os conceitos sobre o que é educação,

o que é cidadania, para poder refletir sobre a ação educativa na formação humana.

1.Conceituando Educação

Para conceituar a educação poder-se-ia fazer uma retrospectiva histórica sobre o tema.

Entretanto, o objetivo é apenas apresentar conceito(s) para servir de base para reflexão sobre o

conteúdo apresentado. Assim, dentre as possibilidades apresentamos os seguintes conceitos

Educação é uma prática social da qual cujo fim é o desenvolvimento do que na pessoa humana pode ser aprendido entre os tipos de saber existentes em uma cultura, para a formação de tipos de sujeitos, de acordo com as necessidades e exigências de sua sociedade. A Educação é um dos meios de realização de mudança social, assim tendo como finalidade a de promover a transformação social (BRANDÃO, 2005, p.)

Observa-se que a citação trata a ação educativa como uma prática social que visa

promover o desenvolvimento humano com intuito de atender as exigências da sociedade a

qual o indivíduo pertence. Além disso, nesta perspectiva, a educação pode servir como meio

de mudança e transformação social.

Já a concepção de educação de Paulo Freire traz outros elementos para reflexão,

conforme cita Costa (2015)

[...] educação é uma concepção filosófica e/ou científica acerca do conhecimento colocada em prática. (...) o conhecimento é um processo social criado por meio da ação-reflexão transformadora dos humanos sobre a realidade. (...) educação é o processo constante de criação do conhecimento e de busca da transformação-reinvenção da realidade pela ação-reflexão humana. (COSTA, 2015, p.85).

O contido na citação sobre a educação remete a uma série de reflexões, apresentando

aspectos relacionados às questões de filosofia, de ciência, de conhecimento como processo

social e de transformação da realidade. Além disso, Costa (2015) destaca que Paulo Freire

concebia a existência de duas espécies gerais de educação: a educação dominadora e a

educação libertadora, sendo que a primeira (dominadora) estaria a serviço das classes

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dominantes, e a segunda (libertadora) estaria a serviço da libertação das classes dominadas.

Nota-se que o conceito de educação tem uma amplitude que aponta aspectos

filosóficos, sociais e de classes, produzindo uma reflexão mais ampla acerca da ação

educativa. Nesta perspectiva Freire (1992) considerava a educação um ato político, pois fazia

a seguinte reflexão.

[...] a gente ainda tem que perguntar em favor de que conhecer e, portanto, contra que conhecer; em favor de quem conhecer e contra quem conhecer. Essas perguntas que a gente se faz enquanto educadores, ao lado do conhecimento que é sempre a educação, nos levam à confirmação de outra obviedade que é a da natureza política da educação. Quer dizer, a educação enquanto ato de conhecimento é também, por isso mesmo, um ato político (FREIRE, 1982, p. 97).

A partir dessa compreensão sobre a ação educativa Freire também afirmava que a

educação não é neutra. [...] não há, nem jamais houve prática educativa em espaço-tempo nenhum de tal maneira neutra, comprometida apenas com ideias preponderantemente abstratas e intocáveis. Insistir nisso e convencer ou tentar convencer os incautos que essa é a verdade é uma prática política indiscutível com que se pretende amaciar a possível rebeldia dos injustiçados. Tão política quanto a outra, a que não se esconde, pelo contrário, proclama, sua politicidade (FREIRE, 1992, p. 78).

A partir dos conteúdos expressos nas citações podemos pensar e refletir sobre a

importância da ação educativa na formação do sujeito como cidadão. Assim, nesse contexto

também se torna necessário conhecer o conceito de cidadania.

2.O que é cidadania

O autor Brito (2018) afirma que “[...] a cidadania no Brasil não tem, nunca teve e

nunca terá um conceito fixo e definitivo” (p.1). As autoras Rit; Costa, (2010) afirmam que

Cidadania, Direitos Humanos e Democracia não são conceitos estáticos, estando muito ligados e são interdependentes. Desse modo, cidadania não se resume somente em participação através de eleições, mas sim, construir a democracia politizando e participando da construção do poder (RIT; COSTA, 2010, p. 6612).

Neste sentido pode-se compreender que a cidadania é uma construída num contexto

histórico, podendo ser entendido como um conjunto de direitos estabelecidos na constituição

do País. Este rol de direitos é constituído por: Direitos civis, que incluem situações

reconhecidas juridicamente sem as quais o homem é incapaz de alcançar sua própria

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realização e desenvolvimento, consistindo o resultado da luta dos homens por um direito

ideal, justo e humano como: os direitos de liberdade, como por exemplo, a liberdade de

consciência, de propriedade, de manifestação do pensamento e associação. Os direitos de

participação política, tais como a igualdade de sufrágio, o direito de voto e de elegibilidade.

Os direitos de participação política, os direitos sociais, que abrangem os direitos de natureza

econômica, como por exemplo, o direito ao trabalho, de assistência à saúde e à educação

(BRASIL,1988).

Não basta nesta perspectiva, para ter o direito de cidadania, o sujeito deve ter

condições em termos de conhecimento e ter consciência dos seus direitos e deveres como

sujeito social para exercitar este direito. Neste sentido, Rodrigues (2001) ressalta que

O exercício de cidadania compreende duas ações interdependentes: a primeira refere-se à participação lúcida dos indivíduos em todos os aspectos da organização e da condução da vida privada e coletiva; e a segunda, à capacidade que estes indivíduos adquirem para operar escolhas. Ambos os aspectos caracterizam o sujeito identificável como cidadão. O exercício da cidadania pressupõe a liberdade, a autonomia e a responsabilidade, fica evidente que se constitui um dever dos cidadãos participar na organização da vida social (RODRIGUES, 2001, p.238).

Nessa construção, ou processo de desenvolvimento do cidadão, a educação tem um

papel fundamental, pois ela cria as condições adequadas e as melhores possibilidades no

sentido de exercitar a cidadania plena na perspectiva de garantir ou assegurar os demais

direitos sociais.

Entretanto, neste contexto, cabe refletir como ocorre este processo no homem até ele

alcançar a sua autonomia e independência, ou seja, ser capaz de fazer escolhas de forma

consciente como cidadão.

3. Desenvolvimento humano

Em relação ao desenvolvimento humano Vigotski (1997) afirma que este ocorre da

condição de homem natural para a condição de homem social. Neste contexto, todos nós

nascemos como homem natural, mas a medida que apropriamos dos ensinamentos do meio

social, vamos nos transformando, por meio da aprendizagem, em homem social. Portanto, o

processo ocorre primeiro no âmbito social (interpsíquico, ou seja, na relação mãe-criança)

para ser apropriado no plano individual (intrapsíquico, ou seja, quando eu aproprio aquilo que

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foi ensinado pela mãe). Isto significa dizer que a formação das funções superiores (atenção

seletiva, memória, raciocínio etc.) da atividade psíquica se realiza no processo de

desenvolvimento social da criança, no processo de sua inter-relação e de sua colaboração com

o meio social circundante.

Para melhor compreender essa questão do homem natural para o homem social, torna-

se necessário refletir sobre o seguinte cenário: a criança ao nascer está desprovida da

linguagem, mas consegue manifestar a sua necessidade de ser atendida, quando está com

fome ou com algum desconforto, expressando-a pelo choro que é o principal meio de

comunicação entre a criança e a pessoa da mãe. Neste processo de atendimento estabelecido

pela atividade de cuidar do filho, a mãe inicia com a criança as primeiras comunicações

verbais que muitas vezes tem a finalidade de atendê-la, de acalmá-la e de expressar o afeto.

Inicia-se assim a relação interpsíquica (mãe-filho) durante as atividades de cuidados.

Vigotski (1997) ressalta que a fala que inicialmente é externa, mas que a medida que a

interação mãe-criança avança, a criança começa a balbuciar sons na tentativa de reproduzir a

linguagem da mãe, comumente denominada de “mamanhez” pelos pediatras. A medida que se

apropria da linguagem a criança consegue manifestar a sua necessidade pela fala, mas

também a controlar as suas necessidades, pois vai aprendendo a ser comportar como homem

social. Um exemplo típico desta situação é o treino do controle de esfíncter que ocorre quando

a mãe diz a criança que está na hora de parar de usar fraldas. Normalmente a mãe combina

com a criança para avisá-la que deseja fazer “xixi” para que ela (mãe) a leve ao banheiro. A

criança sempre acaba fazendo as suas necessidades fisiológicas na roupa. Após a mãe impor,

por meio da fala, um “não” de forma enérgica, que vem acompanhado por algum tipo de

censura ou coerção, a criança se apropria do “não” que estava na fala e na intenção da pessoa

da mãe.

A apropriação do “não” pela criança faz com que ela passe do comportamento de

homem natural – que, neste exemplo, não controlava as suas necessidades fisiológicas – para

o comportamento de homem social, capaz de ter o controle consciente de suas necessidades.

Dessa forma, para Vigotski (1997) a fala que inicialmente é social, externa e que estava na

pessoa da mãe, vai sendo internalizada pela criança e, como resultado vai promovendo a

constituição do pensamento na criança.

Nesta perspectiva Vigotski (1997) afirma que com a apropriação da linguagem os

processos mais elementares vão se modificando, tornando-se mais complexos. O indivíduo

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vai se constituindo do homem natural para o homem social a medida que vai, por meio da

internalização da linguagem, produzindo modificações dos processos elementares presentes

no homem natural para os processos psicológicos superiores que vai constituindo o homem

social, humanizado. Dessa forma, a apropriação realizada pela criança representa que ela

tornou-se capaz de reproduzir em si os conhecimentos socialmente construídos, que permitirá

a ela conviver adequadamente na sociedade.

A medida que a criança cresce o processo de desenvolvimento humano também

avança. A educação informal promovida pela família passa a ser ampliada pela educação

formal desenvolvida no espaço da escola, ou seja, a criança sai do núcleo familiar onde existe

relações privadas e mais restritas em termos de estímulos, para a instituição escolar onde

passa a ter uma diversidade de possibilidades de relações com outras crianças e com

professores. Além disso, passa a ter acesso ao conhecimento cientifico e sistematizada que é

diferente daquele do seio familiar que é estabelecido no cotidiano e realizado de forma

espontânea.

Vigotski (1997) destaca que a aprendizagem se constitui como condição

imprescindível para o desenvolvimento de características humanas e que este processo ocorre

pela mediação da linguagem, de signos e instrumentos, favorecendo a apropriação do

conhecimento. Neste sentido, Vigotski cita que “[...] aprendizado não é desenvolvimento;

entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e

põe em movimento vários processos de desenvolvimento que de outra forma, seriam

impossíveis de acontecer”(VIGOTSKI, 1997. p.47). Dessa forma, Vigotski considera que o

aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções

psicológicas especificamente humanas. Assim, a ação educativa promovida pela escola é

fundamental para a construção do desenvolvimento humano e da formação humana em sua

plenitude a medida que tem acesso as questões culturais, históricas produzidas socialmente.

Vigotski (1997) também destaca que a configuração das emoções na criança sofre

mudanças à medida que o conhecimento conceitual e os processos cognitivos dela se

desenvolvem, ou seja, a medida que se organizam os processos cognitivos da criança também

se desenvolve a capacidade de regular os impulsos e as emoções mais primitivas que estavam

presentes no homem natural. Neste processo a criança vai aprendendo a controlar o choro e a

raiva, humanizando-se, e aprendendo a conviver socialmente. Entretanto, convém destacar

que os impulsos e emoções presentes no homem natural nunca deixam de existir, eles são

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encobertos pela predominância do comportamento do homem social.

Assim, para Vigotski (1997) o desenvolvimento do pensamento conceitual possibilita

a auto/inter-regulação, tanto dos modos de ser, de pensar e de agir, como também de sentir e

de expressar este sentir, sendo esse processo fruto das próprias práticas construídas

historicamente de regulação das emoções. Dessa forma, pode-se compreender que na relação

entre intelecto e afeto, cada ideia também contém uma atitude afetiva transmutada. Na relação

professor-aluno durante a ação educativa esta condição pode produzir resultados positivos em

termos de motivação para a criança no processo de aprendizagem.

Nessa perspectiva, Rodrigues (2001) afirma que

[...] a ação educativa é um processo regular desenvolvido em todas as sociedades humanas, que tem por objetivos preparar os indivíduos em crescimento (crianças e adolescentes) para assumirem papéis sociais relacionados à vida coletiva, à reprodução das condições de existência (trabalho), ao comportamento justo na vida pública e ao uso adequado e responsável de conhecimentos e habilidades disponíveis no tempo e nos espaços onde a vida dos indivíduos se realiza (RODRIGUES, 2001, p.235).

No contexto da ação educativa Duarte (1992) afirma que

[...] para que o educador possa compreender o indivíduo em sua concreticidade, precisa de mediações de abstrações, pois essa concreticidade não se apresenta ao educador enquanto decorrência imediata do fato dele estar em contato com o aluno. Além do mais, conhecer a concreticidade do indivíduo não se limita, para o caso da atividade educativa, ao conhecimento do que ele é, mas também ao conhecimento do que pode vir-a ser. Esse conhecimento, por seu lado, implica num posicionamento em favor de algumas das possibilidades desse vir-a-ser e, consequentemente, contra outras (DUARTE, 1992, p.4).

A citação nos remete a refletir que o educando é aquele com possibilidades de

aprender e desenvolver-se. Assim o sujeito que está na condição de educador deve estar

consciente de como o processo da ação educativa ocorre para ampliar as possibilidades de

aprendizagem do aprendiz.

Para Rodrigues (2001) a ação educativa não está centrada em apenas um sujeito. Em

função dessa reflexão, este autor afirma que

Nenhum indivíduo isoladamente, por melhor preparo que tenha, será capaz de oferecer a outro a plenitude da formação de que ele necessita, bem como nenhuma instituição, ainda que seja definida como educativa, poderá dar conta desse papel. Essa tarefa é de responsabilidade social. Pode ser que a sociedade não realize a melhor educação que se deseja, mas ela realizará a melhor educação possível

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(RODRIGUES, 2001, p. 243).

A relação estabelecida na ação educativa sempre será dialógica, ou seja, por meio da

comunicação entre professor e aluno.

Paulo Freire afirma que a abordagem da educação não é unilateral, mas um processo

dialético em que educador e educando estão imersos numa aventura de descoberta

compartilhada. Por isso, segundo (GAYATO, 1989, p. 12), “[...] a educação é uma concepção

revolucionária, comprometida com a libertação humana”. Convém lembrar também que o

diálogo estabelecido entre educador e educando está posto no sentido de mediação do

conhecimento. Entretanto, antes disso, está presente no ato de ensinar, a relação de gente com

gente, de pessoas com pessoas, ou seja, de relação humana de pessoas com desejos, sonhos,

vivências e experiências influenciadas por múltiplas realidades sociais.

Corroborando com esta ideia o autor Arroyo (2001) destaca que A postura [docente] mais importante será reconhecer, que cada educando é gente. E por sua vez, as relações humanas devem ser pautadas pelo diálogo, pela sensibilidade e amorosidade. Portanto, as relações docentes e as relações humanas fundamentadas e efetivadas considerando os princípios que concretizam a concepção de educação na perspectiva da humanização, compromisso ético e gnosiológico freireano (ARROYO, 2001, p. 49).

A partir das questões apontadas no texto, torna-se necessário refletir que a ação

educativa é de suma importância no processo de humanização do homem e, justamente

devido a esta condição de possibilidades de transformação humana é que o papel do educador

torna-se imprescindível, no sentido de ser o mediador do conhecimento, de ser o promotor de

relações humanas pautadas na ética, objetivando formar sujeitos críticos reflexivos e,

portanto, capazes de se reconhecerem sujeitos sociais plenos de autonomia e atitudes

transformadoras de si e de outras pessoas.

Notadamente observa-se que os movimentos sociais buscam promover a formação

humana por meio de uma educação emancipadora, principalmente produzindo reflexões

acerca das relações estabelecidas entre as classes sociais. Considerações finais

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A formação humana que se inicia no núcleo familiar, na relação entre os pais e os

filhos, por meio de ensinamentos dentro de um contexto de senso comum e numa condição de

ações cotidianas e espontâneas ganha em possibilidades a medida que a criança passa a

frequentar a instituição escolar.

A instituição escolar ao receber a criança, não desconsidera o conhecimento ofertado

pela família, mas amplia as possibilidades de acesso, por meio da sistematização de

conhecimentos científicos, históricos e culturais produzidos ao longo da história humana.

Neste contexto de interações estabelecidas no processo educacional a formação

humana será ampliada, possibilitando a transformação do homem natural em homem social

capaz de conviver e participar de forma consciente, como sujeito com direitos e deveres frente

a todas as atitudes e ações de participação na vida em sociedade, desenvolvendo dessa forma

as possibilidades mais adequadas de exercer de forma responsável e ética a sua cidadania.

Por fim resta saber ou refletir se crise na educação tem influenciado a formação

humana daqueles que frequentam os espaços escolares em nosso País. Mas, além disso,

também refletir se a crise da educação posta nos discursos não é em sua essência uma crise da

existência humana.

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Educação. Caderno pedagógico 2: Semana Pedagógica Paulo Freire. Porto Alegre: Corag,

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ESCOLA ITINERANTE DO MST: ANÁLISE SOBRE O PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO DA ‘ESCOLA DO ENSINO’ À ‘ESCOLA DO TRABALHO’

Rose Riepe de Souza1

Clésio Acilino Antônio2

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dos

Trabalhadores

Resumo: O presente estudo trata-se da sistematização do projeto de pesquisa desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado/PPGEFB da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Francisco Beltrão. Traz a enunciação da problemática a ser pesquisada e algumas reflexões iniciais. Apresentamos como objeto de estudo a escola Itinerante do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) o processo de transformação da escola do ensino à escola do trabalho. A questão principal da pesquisa diz respeito ao que os(as) educadores(as) concebem sobre o processo de transformações pedagógicas em relação à escola do ensino para a escola do trabalho que está em construção na escola Itinerante Herdeiros do Saber, acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio, município de Rio Bonito do Iguaçu (Paraná). Desta forma, para a pesquisa temos por objetivo geral analisar o processo de mudanças pedagógicas da ‘escola do ensino’ para a ‘escola do trabalho’, a partir das perspectivas dos(as) educadores(as), na escola Itinerante Herdeiros do Saber, acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio, município de Rio Bonito do Iguaçu (Paraná). Para tanto, pretendemos realizar uma pesquisa qualitativa a partir do estudo de caso, utilizando-se de instrumentos a entrevista semiestruturada, observação participante e Diário de Campo. Nesse sentido, trazemos de forma breve algumas reflexões em torno da escola Itinerante, da escola do trabalho e da escola do ensino como forma de aproximar-se da discussão no campo teórico da problemática de pesquisa e suas questões. Para o desenvolvimento desse escrito utilizamos de estudo bibliográfico. Palavras-chave: Escola Itinerante; Escola do Trabalho; Escola do Ensino; Transformação.

Problema da pesquisa

O movimento de consolidação da proposta educativa do MST é de transição. Temos a

forma escolar hegemônica e buscamos superá-la a partir da escola do trabalho, por meio da

experiência da escola Itinerante. Nesse processo, identificamos a necessidade de maior

1 Mestranda do curso de Pós-Graduação em Educação – Mestrado/PPGEFB pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Francisco Beltrão. E-mail: [email protected] 2 Professor adjunto da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Francisco Beltrão. Docente nos cursos de Pedagogia e Mestrado em Educação da UNIOESTE. E-mail: [email protected]

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caracterização da forma escolar no âmbito pedagógico. Identificar quais as configurações da

forma escolar do ensino, o que precisamos ainda deixar claro sobre a forma desta escola para

superá-la pela escola do trabalho, e, sobretudo, como se apresenta configurações desta na

escola Itinerante do MST, considerando que a escola do trabalho tem sua gênese a partir da

crítica à escola do hegemônica. Trata-se de um movimento complexo, ao qual consideramos

necessário maior detalhamento.

Neste sentido, apresentamos como objeto de estudo a escola Itinerante do MST e a

transformação da ‘escola do ensino’ à ‘escola do trabalho’. Consideramos que a

transformação da escola do ensino para a escola do trabalho configura-se em uma perspectiva

de mudanças pedagógicas aos(as) educadores(as), atuantes nas escolas Itinerantes do MST, no

Paraná. A escola hegemônica, também caracterizada como tradicional, excludente,

individualista, livresca, tem suas bases fundamentais no ensino, portanto, trataremos de escola

do ensino, e a necessidade de superação desta a partir da escola do trabalho, compreendida

mediante a Pedagogia Socialista, como escola que humaniza o homem a partir do trabalho

como princípio educativo na formação de sujeitos para a construção de uma nova sociedade.

Esse processo de transformação foi assumido pelo MST para as escolas Itinerantes,

no entanto, ainda que seja necessário os(as) educadores(as) se apropriarem da proposta

educativa do MST, é imprescindível que possuam compreensão, para sua prática, de quais são

as configurações da escola do ensino para superar pela escola do trabalho. Uma vez que, se

não tivermos claro o que superar, a superação fica mais difícil? Se os(as) educadores(as) não

têm claro qual é a escola a superar, não fica mais difícil para eles(as) saberem o que deverão

fazer para superar tal escola? Essas questões apontam a necessidade de maior detalhamento

diante do formato pedagógico da escola do ensino e suas configurações para entendermos o

processo de transformação da escola Itinerante.

Desse modo, a pesquisa buscará responder à seguinte questão geral: Quais as

compreensões dos(as) educadores(as) que atuam na Escola Itinerante Herdeiros do Saber, em

relação ao processo de mudanças pedagógicas acerca da escola do ensino para a escola do

trabalho? A partir desta questão geral, desdobram-se as demais questões complementares: 1)

Qual a forma pedagógica da escola do ensino? 2) Qual a forma pedagógica da escola do

trabalho? 2) Como se concebe a Escola Itinerante do MST, no processo de transformação da

escola do ensino para a escola do trabalho? 3) Quais são as configurações da escola do ensino

ainda presentes na escola Itinerante do MST? 4) Quais as contradições que limitam a

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transformação da escola do ensino para a escola do trabalho na escola Itinerante pesquisada?

Analisamos que estas questões contribuirá na busca de esclarecer o movimento de

transformação em que se apresenta a Escola Itinerante do MST.

Na perspectiva de pesquisa exposta, temos a intenção de apresentarmos no presente

escrito uma aproximação das discussões a serem desenvolvidas na pesquisa. Inicialmente

trazer a consolidação da escola Itinerante do MST como fenômeno atual na busca de uma

educação transformadora mediante a Pedagogia Socialista e Pedagogia do Movimento3. Em

seguida, situar a escola do trabalho e algumas de suas particularidades mediante a

sistematização das experiências na Revolução Russa, como forma escolar revolucionária. E,

por último, a escola tradicional como ‘escola do ensino’, apresentando de forma breve suas

principais características em sua construção histórica e na atualidade.

Metodologia

Para o desenvolvimento da pesquisa proposta projetamos uma abordagem qualitativa

através do Estudo de Caso (TRIVINOS, 1984; YIN, 2015). Como procedimentos cogitamos o

estudo bibliográfico, entrevista semiestruturada, observação participante e Diário de Campo.

Serão entrevistados doze educadores(as) atuantes na Escola Itinerante Herdeiros do Saber no

ano de 2019.

O presente estudo caracterizou-se pelo enfoque bibliográfico, composto por teses,

livros e artigos para a fundamentação teórica. Foi realizado a partir de autores que contribuem

para crítica à escola hegemônica, buscando a construção de uma nova escola, bem como

autores que discutem a escola Itinerante como possibilidade e contraposição a escola

hegemônica. Pretendemos enfatizar a atualidade da escola hegemônica e da escola Itinerante

do MST.

A escola Itinerante do MST: aproximações acerca da escola do trabalho e da escola do

ensino

3 A pedagogia do Movimento deve constituir-se “não como um modelo pedagógico fechado ou um método ou uma estrutura; e sim com um estilo, um jeito de ser escola, uma postura diante da tarefa de educar, um processo pedagógico, um ambiente educativo” (CALDART, 2004, p. 247).

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Identificamos que o MST é um movimento pedagógico que traz no processo de luta

que levanta a formação de seus integrantes. A escola nesse contexto assume papel

importantíssimo, pois trata-se da formação da consciência de classe desde a infância na

constituição do sujeito Sem Terra4. Embora tenhamos claro que, no Acampamento, a

educação não é forjada apenas no ambiente escolar, mas no tecido das relações sociais que

determina o aprender, nas relações de vivência, tornando esse espaço fértil para a formação, a

escola vem como forma de potencializar esse processo.

A escola é uma instituição que possui grande incisão sobre o sujeito e sua forma de

pensar e agir em sociedade, pelo processo educativo. Pensando isso, o MST destaca grande

importância à organização escolar a partir de um enfoque transformador. Para atingir a

constituição de uma escola que corresponda aos ideias de sociedade almejados pelo

Movimento, o Setor de Educação5 traz no projeto educacional das escolas Itinerantes

subsídios da educação socialista a partir da definição da escola do trabalho.

A luta pela escola Itinerante no Paraná iniciou-se em 1981 decorrente da organização

do MST enquanto movimento social. Diante a necessidade de uma escola que atendesse as

necessidades específicas das crianças acampadas, com número expressivo de crianças sem

registro escolar e a partir da iniciativa já concretizada no Rio Grande do Sul desde 1996,

inicia-se a pressão pela legalidade da escola Itinerante no Paraná. Com práticas educativas em

andamento para garantir o atendimento das crianças acampadas, foi denominada “escola de

Acampamento”6 àquelas escolas que não tinham legalidade diante do Estado, mas que no

Acampamento já era denominada escola Itinerante.

A conquista da legalidade da escola Itinerante percorreu cinco estados brasileiros

sendo estes; Paraná (2003), Santa Catarina (2004), Goiás (2005), Alagoas (2005) e Piauí

(2008). Neste ano, 2018, evidenciamos experiências de Escola Itinerante unicamente no nos

estados do Paraná e Piauí (BUENO, 2018).

4 Sem Terra, com letras maiúsculas e sem hífen, é o nome próprio que identifica os sem-terra do MST (CALDART, 2000, p. 223). 5 O Setor de educação do MST foi criado em 1987 para atender as demandas organizativas relativas a garantia da educação nos Acampamentos, possui um organização estadual, regional e interna nos Acampamentos. 6 [...] marca as primeiras iniciativas. Informal no início, até fazer as primeiras lutas por escola formal no próprio lugar, o acampamento. Ela sempre foi pensada para ser uma “escola diferente” e, mesmo estando no acampamento, o Movimento projetava a escola do assentamento [...] (GEHKE, 2010, p. 46).

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A implementação das Escolas Itinerantes ocorriam e ocorrem por meio de diálogo com

a comunidade acampada. Todas as escolas Itinerantes são vinculadas a uma Escola Base7,

desde a legalização da escola Itinerante em 2003 até 2007 havia uma Escola Base para todas

as escola Itinerantes no Paraná, o Colégio Estadual Iraci Salete Strozak, localizado no

município de Rio Bonito do Iguaçu. A partir de 2007, acerca da ampliação do número de

escolas, houve a necessidade de indicar mais uma escola para a atividade, o Colégio Centrão,

localizado no município de Querência do Norte (CAMINI, 2009). E em janeiro deste ano,

2018, o Colégio Estadual do Campo Chico Mendes se instituiu como Escola Base da Escola

Itinerante Vagner Lopes, localizada no Acampamento Dom Thomas Balduíno, Quedas do

Iguaçu.

No estado do Paraná foram construídas 28 escolas Itinerantes ao decorrer da história.

Porém, a partir da consolidação em escola de Assentamentos8 ou na medida em que sofreram

despejo, ou que foram temporárias como, por exemplo, na beira da BR, foi reduzido em 2016,

para 12 Escola Itinerantes em atividade (LEITE, 2016). Neste ano, 2018, sob a conjuntura de

golpe, de acordo com o levantamento apresentado na comemoração de 15 anos de acesso à

Educação Popular, por intermédio da legalidade institucional da escola Itinerante no Paraná,

evidenciamos 10 escola Itinerantes em funcionamento.

Atendendo a todas as modalidades do ensino, Educação infantil, Ensino Fundamental

1 e 2, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos, conforme as demandas de cada

Acampamento, as escolas Itinerantes se constituem em luta constante. Isso acontece através

da participação da comunidade na auto-gestão pela garantia da existência da escola, tanto

relativo a seu currículo e orientação político-pedagógica como atrelado à estrutura física.

Em decorrência da criação da escola Itinerante nesses 15 anos de história, permitiu-se

a consolidação de 10 escolas municipais e 6 colégios estaduais do campo no Paraná (MST,

2018, p.3). Trata-se dos frutos colhidos para a escolarização do povo no campo pela Escola

Itinerante, reafirmando sua importância na luta pelo direito à Educação do Campo, como

garantia do acesso ao conhecimento pelos povos do campo próximo ao local onde moram.

A escola Itinerante do MST é fundamentada na Pedagogia do Movimento

(CALDART, 2004) e na Pedagogia Socialista (PISTRAK, 2011; KRUPSKAYA, 2017), 7 As Escolas Itinerante tem a sua base oficial e toda parte documental e pedagógica sustentada pelas Escolas Base (SEED, 2018). 8 Um projeto de escola já mais definido, a Escola do Assentamento (MST, 1992). Ela se deu na perspectiva do assentamento e da produção agrícola, vinculada à vida do assentamento, em especial ao mundo do trabalho e da produção [...] (GEHRKE, 2010, p. 58).

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configura-se como contraposição a pedagogia tradicional, traz na realidade vivida a ousadia

de se posicionar contrário a todas as forças do capital no campo, que por sua vez, é marcada

historicamente pela exclusão. Nas especificidades da escola Itinerante materializa-se a

intencionalidade do trabalho como princípio educativo, pressupostos da escola do trabalho.

Realiza-se mediante o currículo alicerçado nos Ciclos de Formação Humana (CFH),

Complexos de Estudo, e Auto-organização dos estudantes através dos Núcleos Setoriais, aos

quais buscam ser desenvolvido pelo coletivo escolar.

A escola Itinerante apresenta, na perspectiva educacional que desenvolve,

aproximações com a escola do trabalho. Sistematizada pelos pedagogos socialista9 em meio a

Revolução Russa (1917-1931), a escola do trabalho trata-se de uma experiência de escola que

vem sendo debatida na atualidade em parcelas dos movimentos dos trabalhadores, pois traz as

bases educacionais para a produção de uma escola que tem por fins a emancipação e formação

do homem novo.

A escola do trabalho possui suas bases em Marx, origina a produção da escola

mediante a concepção de educação comunista. As transformações no contexto revolucionário

da União Soviética culminou na transformação da escola acerca do pensamento marxista.

Embasada no trabalho como princípio educativo e a politécnica para a formação omnilateral,

configurou-se como uma experiência única que hoje temos por alicerce para projetarmos uma

educação transformadora (PISTRAK, 2013).

A escola do trabalho foi pensada e experiêncizada a partir da realidade vivida no

período histórico e o trabalho educacional desenvolvido na Colônia Gorki (de 1920 a 1928) e

a Comuna Dzerjinski (de 1927 a 1935). Traz como fundamento a educação como

transformação do sujeito e da sociedade ao mesmo tempo, princípio da dialética marxista.

Com o objetivo de produzir uma escola única para todos, a escola do trabalho passou por um

período de transição. Foi se constituindo no processo, ganhando forma utilizando-se do

movimento da ação, da luta, para qualificar sua formação enquanto instituição escolar. Teve

papel fundamental e contribuinte na revolução, pois de acordo com Pistrak (2011, p. 24) “[...]

a escola é a arma ideológica da revolução”, ou seja, a escola como parte do movimento de

transformação da realidade social, também transformou-se, assegurou em sua forma

determinante da revolução, e ao incorporar a prática revolucionária no processo educativo,

altera a realidade atual.

9 Vladimir Lenin, Nadjla Krupskaia, Moisey Pistrak, Anton Makarenko e Viktor Shulgin.

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Como central na construção da escola do trabalho para a classe trabalhadora,

evidenciamos a relação com a realidade social. Trazer para a escola o trabalho e sua dimensão

educativa na formação do sujeito é desafiador, desta forma “[...] o trabalho na escola,

enquanto base da educação, deve estar ligado ao trabalho social, a produção real, a uma

atividade concreta socialmente útil” (PISTRAK, 2011, p.30). O trabalho deve estar

diretamente atrelado ao real, à forma que se organiza a vida das pessoas, e como as pessoas

correspondem a esta organização, o que diretamente nos leva a questionar o ensino posto a

nós nas escolas convencionais. Questionar a forma como se apresenta, porque a realidade nos

pede isso, porém não trata-se de anular sua importância e sentido na projeção da nova escola a

partir do trabalho.

O trabalho no processo educacional leva a aproximação da realidade. Ao entender que

“[...] o trabalho concebido do ponto de vista social, na base da qual se forja inevitavelmente

uma compreensão determinada da realidade social, o trabalho que introduz a criança desde o

início na atividade socialmente útil” (PISTRAK, 2011, p. 84). Vemos que é o meio pelo qual

podemos compreender a realidade que nos cerca e inserir-se na atividade produtiva da

sociedade, mas com consciência de nossa ação e atuação nesta como agentes no processo de

transformação.

É na prática revolucionária que conseguimos trabalhar acerca de uma formação

emancipatória, tendo em vista que a “Escola do Trabalho fundamenta-se no estudo das

relações do homem com a realidade atual e na auto-organização dos alunos” (PISTRAK,

2011, p.10), temos claro que o contexto da escola, a luta de classes, torna-se determinante na

prática de ensino e aprendizagem estabelecida no ambiente escolar. Contudo, podemos

também buscar realiza-la mediante as experiências produzidas e sistematizadas em contextos

mais fecundos, como exemplo as bases da escola do trabalho na atualidade a partir da escola

Itinerante.

Como experiência característica da escola do trabalho desenvolvida na escola

Itinerante assinalamos o complexo de estudo, uma forma de organização das atividades

concernentes ao processo de ensino-aprendizagem. Os complexos foram desenvolvidos como

um método experimental na educação socialista na busca de aproximações do trabalho

educativo numa perspectiva dialética da realidade vivida. Trata-se da forma encontrada para

trazer para a escola o trabalho atrelado aos conteúdo do ensino. Na busca da articulação entre

teoria e prática, o complexo de estudo pelo trabalho faz a articulação entre realidade,

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atualidade e auto-organização. Desta forma, “o trabalho socialmente útil é o elo, a conexão

segura, entre teoria e prática” (PISTRAK, 2011, p. 36), assim, a atualidade é a luta de classes,

a auto-organização é a forma de se fazer, e o ensino mediante a articulação do complexo traz

o trabalho como maneira de conexão com a realidade social.

Para a consolidação da escola do trabalho na atualidade mediante a experiência da

escola Itinerante, temos que ter claro que questionamos a forma de fazer tradicional, mas

possuímos muito desta nas escolas. É importante compreender que as determinações na forma

escolar está ligada a sua configuração e gênese, formação histórica, constituída mediante

mecanismos políticos e organizativos da sociedade, que vem se transformando junto à esta.

Identificar como se constitui a escola historicamente e quais são suas características atuais é

imprescindível para que possamos buscar entender sua forma, como processo necessário ao

cotejarmos a superação.

A escola como instituição que permite o acesso à educação escolarizada, mesmo que

seja por mecanismos de dominação social na formação dos sujeitos, contrário aos objetivos da

escola do trabalho, é mais bem definida, no século XVI (PETITAT, 1994). Porém, sabe-se

que sua origem permeia a Idade Média, embora seja em um sentido restrito de educar o povo,

para a tradição, não apresentando as configurações características como à conhecemos na

atualidade.

Junto a emergência e desenvolvimento organizativo dos Colégios século XV e XVI,

vemos o surgimento de características presentes na escola hegemônica hoje, modo ao qual se

realiza sua forma. Entre estas, citamos a regularidade do tempo o que leva a fragmentação dos

momentos escolares mediante a divisão em detrimento do horário, fator determinante da

organização escolar, assim como, a separação da infância e adolescência da convivência do

mundo adulto do trabalho, um distanciamento da cultura e das relações sociais adultas pela

instituição do espaço escolar (PETITAT, 1994). Consolidando-se, assim, como principais

características da escola a fragmentação dos momentos e do conhecimento, assim como o

distanciamento da vida dos educandos, da realidade social.

Nesse sentido, com traços predominantes em todas as suas manifestações, a escola

tradicional tem por características ser livresca, classista, fragmentada, repetitiva,

homogeneizadora, adaptadora, classificatória, ordenadora, individualista, competitiva. É

constituída historicamente com sua base no ensino e atualmente é tratada como escola do

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acolhimento social (LIBÂNEO, 2012). Trata-se da universalização da escola, garantia de

acesso à todos, até para àqueles para a qual não foi feita.

Na perspectiva crítica de análise da escola, é frequente observarmos o apontamento de

que a escola tradicional, como é retratada, numa configuração rígida, autoritária e excludente,

assume nova aparência. A partir da década de 1990, com os acordos internacionais relativos à

educação, acerca do movimento “Educação para todos”, a escola tradicional é direcionada ao

papel de integradora. Com a necessidade latente em torno da garantia do acesso à educação a

todos, valorizando sua realidade, é direcionado a escola o papel de garantir as necessidades

básicas de aprendizagem dos estudantes. Porém mediante a lógica de mercado, a escola

assume caráter assistencialista, acolhedora. Pauta-se pela garantia da formação mínima do

sujeito para inserção na sociedade, para cada um compreender o seu lugar no meio social,

com efeitos duráveis e sem muitas variações (LIBÂNEO, 2012).

A escola hegemônica, a escola que comporta todas as massas, com toda a abertura

advinda da universalização, traz as relações individualista característica da

contemporaneidade para o ambiente escolar concretizando determinada regulação social. Por

meio da adaptabilidade acerca da fragmentação processual do pensar e das relações humanas,

produz indivíduos com valores reducionistas, sem coletividade, e que se distanciam cada vez

mais de sua realidade.

Diante da constituição da escola e seus pressupostos na atualidade, buscamos trazer a

concepção de ‘escola do ensino’ fundamentada diante da perspectiva esclarecida por

Krupskaya (2017, p. 73) quando traz que, “a escola moderna é uma escola baseada em ensino

[...] ela afasta as crianças da vida, dos adultos, estreita o campo de sua observação”, para

entender a escola hegemônica e a experiência produzida mediante aspectos históricos

tradicionais e suas configurações contemporâneas. Assim, trataremos aqui como escola do

ensino, a escola que, entre outros adjetivos, é tratada como tradicional, hegemônica, secular,

capitalista, convencional, a qual teve sua gênese a partir dos colégios acerca do ensino para a

escolarização da população e atualmente nega-o.

Neste sentido, o ensino como é concebido está em conexão com a forma escolar, o

modo de socialização que ela instaura. O modo de transmissão do conhecimento acerca da

sistematização dos conteúdos, do ensino, da apropriação do conhecimento, da aprendizagem,

descolados da realidade, do trabalho, da produção material da vida humana, como meio para

produzir efeitos na socialização (VICENT et al, 2001). Esta forma escolar vem sendo

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questionada tanto pela teoria crítica quanto pelos movimentos sociais na busca de alterar a

forma escolar posta a nós historicamente. O MST possibilita, por meio da Escola Itinerante,

experiências importantes para refletirmos a forma escolar.

Conclusões

Apresentamos de forma sucinta a conquista da escola Itinerante do MST no Paraná, e

sua consolidação enquanto escola que atende as necessidades especificas dos acampados, bem

como a escola do trabalho como forma escolar necessária, e por fim, a escola do ensino a qual

devemos compreender melhor para supera-la. Percebemos que diante da negação da escola

hegemônica do ensino e busca de bases conceituais na escola do trabalho para produzir uma

escola para a classe trabalhadora, a experiência da escola Itinerante no contexto do MST vem

se recriando acerca das possibilidades vigentes em meio aos Acampamentos do MST, como

alternativa de forma escolar.

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MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST) E

EDUCAÇÃO: “NOSSA LUTA É NOSSA ESCOLA”

Ana Marieli dos Santos Luedke1

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dos Trabalhadores

Resumo: A proposta deste texto é apresentar discussões sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Educação como elemento crucial na formação dos sujeitos. Apontamos especificidades, objetivos, concepções, práticas e ideologias de uma luta abrangente e significativa na história do país. Deriva de pesquisa fundamentada na perspectiva histórico-cultural do desenvolvimento humano, realizada por meio de estudos bibliográficos, questionários e observações de espaços organizados pelo MST em Rio Bonito do Iguaçu, Paraná2. Por meio da luta, da educação e do trabalho, é formada a identidade Sem Terra. Essa condição pode indicar o reconhecimento e a visibilidade do MST em relação aos sujeitos que compõem sua trajetória. Fica evidente a importância do papel da escola para o MST e o processo de luta para a sua conquista e efetivação nos assentamentos e acampamentos, que aos poucos se tornou prioridade. Embora, muitas vezes, não seja possível de se efetivar em sua totalidade, a intencionalidade da proposta educativa do MST demonstra o enorme esforço empreendido e uma grande conquista na efetivação do direito à educação aos sujeitos do campo. Como fica demonstrado, o MST está presente, visivelmente, como organização, engajamento e mobilização coletiva da classe trabalhadora, e surpreende-nos, enquanto avança na luta, na prática social e na Educação. Palavras-chave: MST; Educação; Escola.

“A herança que o MST deixará para seus descendentes será bem maior do que a quantidade de terra que conseguir libertar da tirania do latifúndio; será um jeito de ser humano e de tomar posição diante das questões de seu tempo; serão os valores que fortalecem e dão identidade aos lutadores do povo de todos os tempos, de todos os lugares. Talvez seja especialmente enquanto produto de uma obra educativa que os Sem Terra possam ser vistos pela história como mais um elo que se formou em uma longa tradição de lutadores sociais que fazem a história da humanidade. Enraizamento no passado, combinado com projeto de futuro” (CALDART, 2001, p. 213).

1 Mestre em Educação. Pedagoga da Rede Estadual de Ensino do Paraná. E-mail: [email protected]. 2 Trabalho completo intitulado: “A formação da criança e a ciranda infantil do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)”. disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/122931.

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Inicialmente, nos primeiros anos do MST, sua luta tinha como prioridade a conquista

da terra. Posteriormente, essa luta passou a abranger vários setores de atuação, como a

produção, a educação, a formação, a cultura, a saúde, o meio ambiente etc. A organização do

MST estabelece-se por meio da prática, da própria luta, e não, necessariamente, de um projeto

previamente elaborado. De acordo com a necessidade, diversas frentes de atuação foram

criadas e formam uma ampla organização social entre acampamentos, assentamentos, escolas,

cooperativas, secretarias e unidades agroindustriais (MORISSAWA, 2001). A base da

consolidação dessa ampla estrutura e a qualificação da luta está em dois princípios

fundamentais e indissociáveis: organicidade e coletividade (FERNANDES; STÉDILE 1999).

Para a formação, em todas as dimensões da luta, sejam elas políticas, administrativas,

educativas, produtivas etc., o MST fomentou a produção e a publicação de cadernos de

educação, cadernos de formação, boletins, revistas e textos que subsidiaram os estudos nas

diversas frentes de atuação. Em 1984, começa a ser publicada a coleção Cadernos de

Formação, incluindo temas como a Reforma Agrária, participação da mulher, ocupação,

conquista da terra etc. Posteriormente, esses temas também são publicados no Jornal dos

Trabalhadores Sem Terra que deu origem ao Boletim Informativo da Campanha de

Solidariedade aos Agricultores Sem Terra. Nesse período de 1980 a 1990, aprofundam-se os

debates sobre a área educativa, organizados pelo Coletivo Nacional de Educação, começam a

ser editadas as primeiras “cartilhas pedagógicas” e os Cadernos de Educação (FERNANDES,

2000).

Outra necessidade estava presente na organização do MST: a educação e a escola.

Iniciaram, então, as primeiras comissões entre pais e professores para reivindicar e organizar

as escolas nos acampamentos e assentamentos. Assim, novas decisões políticas compuseram

sua forma de luta e de organização para pensar a educação em suas escolas. Dentre os

desafios assumidos para a conquista da escola, procuraram efetivar os seguintes objetivos:

conhecer a realidade educacional do Movimento; garantir acesso, qualidade e permanência

das crianças nas escolas; construção de uma proposta educacional e princípios pedagógicos

específicos para transformação social; valorização do trabalho cooperativo; capacitação e

formação de professores; alfabetização de jovens e adultos entre outros (FERNANDES,

2000). Assim, em 2012,

Em dados estimados pelo MST, sua conquista até aqui foi de aproximadamente 1.800 escolas públicas (estaduais e municipais) nos seus assentamentos e

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acampamentos, das quais 200 são de ensino fundamental completo e cerca de 50 vão até o ensino médio, nelas estudando em torno de 200 mil crianças, adolescentes, jovens e adultos Sem Terra. [...] Também desencadeou um trabalho de alfabetização de jovens e adultos que envolveu, em 2011, mais de 8 mil educandos e 600 educadores. O MST desenvolve práticas de educação infantil em seus cursos, encontros, acampamentos e assentamentos, e tem cerca de 50 turmas de cursos técnicos de nível médio e cursos superiores, em parceria com universidades e institutos federais, com cerca de 2 mil estudantes (KOLLING; VARGAS; CALDART, 2012, p.502)3.

A organização da escola nasce como base ao desenvolvimento e continuidade da luta

social proposta pelo MST, ou seja, parte do reconhecimento de que estão construindo “uma

organização duradoura e uma luta de vida inteira” (CALDART, 2001), redimensionando,

assim, o lugar e a importância da escola em sua dinâmica. Segundo Morissawa (2001):

No começo, a preocupação era o futuro de muitas crianças acampadas; depois, a conquista da escola legal; e logo em seguida, o tipo de ensino a desenvolver nessa escola, que tinha de ser necessariamente diferente em vista das circunstâncias e do tipo de alunos. [...] A continuidade da luta exigia conhecimentos tanto para lidar com assuntos práticos, como financiamentos bancários e aplicações de tecnologias, quanto para compreender a conjuntura política, econômica e social. Arma de duplo alcance para os Sem Terra e os assentados, a educação tornou-se prioridade no Movimento (MORISSAWA, 2001, p. 239 - 240).

Fica evidente a importância do papel da escola para o MST e o processo de luta para

a sua conquista e efetivação nos assentamentos e acampamentos, que aos poucos se tornou

prioridade. A relação é claramente de mútua constituição: o Movimento contribui para a

criação da escola sob outros parâmetros e essa escola contribui para a continuidade e

vitalidade do Movimento. Dalmagro (2010), em continuidade aos esforços teóricos

empreendidos, afirma que

3 Destacamos o Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (ITERRA) que, desde 1995, promove a formação em nível médio e profissionalizante de educadores e educadoras dos acampamentos e assentamentos. Localizado em Veranópolis, Rio Grande do Sul, foi criado a partir de uma parceria da Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB) e da Associação Nacional de Cooperação Agrícola (ANCA) com o Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (PRONERA), criado em 1998. Uma política do Governo Federal, executada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), que tem como objetivo ampliar os níveis de escolarização formal dos trabalhadores e trabalhadoras da Reforma Agrária. Como um instrumento de democratização do conhecimento, esse programa propõe cursos de educação básica, técnicos profissionalizantes de nível médio e diferentes cursos superiores e de especialização. Além do ITERRA, destacamos a Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), inaugurada pelo MST no ano de 2005, em São Paulo. A escola promove cursos formais e informais voltados para a produção, comércio e gestão dos acampamentos e assentamentos, e é referência como centro de educação e formação. Sua criação é um marco na história das lutas e conquistas do MST, considerada como um elemento de grande importância para o processo de formação da militância e identidade política do Sem Terra.

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Este momento inicial é marcado por duas concepções de escola: a “necessidade da escola” e a “escola como necessidade de luta”. A primeira é entendida como uma condição de acesso aos bens culturais produzidos socialmente, já a “escola como necessidade da luta” expressa a visão dessa instituição por outra perspectiva política, qual seja, da transformação social e de mudanças na escola. A primeira concepção é aquela que, em nosso entendimento, aparece com mais força e vai determinando a entrada da escola no interior da luta do MST; a segunda, ainda que possa já estar presente desde as primeiras escolas, o é de forma ainda pontual, não articulada e que, cremos, ganhará força no decorrer do tempo, tornando-se um fator a mais na opção de lutar por escola (DALMAGRO, 2010, p. 165).

A primeira escola oficial de um acampamento do MST surge na Fazenda Anonni,

localizada em Sarandi no Rio Grande do Sul, em 1985/1986. Esse foi um dos maiores

acampamentos realizados, quase 1.500 famílias e 1.000 crianças. Devido ao grande número

de crianças em idade escolar, logo o MST manifestou sua preocupação com a implantação da

escola. Antes mesmo da aprovação e da arrecadação de verbas para construção da escola

pelos órgãos estaduais, o MST iniciou suas atividades em um barracão de lona preta. Eram

três turnos, 23 professores para 600 alunos de 1ª a 4ª séries. Esse fato ganhou importante

significado, pois representou a construção de uma escola em uma área de conflito e de suposta

ilegalidade. “Essa conquista da Anonni confirmou a força de organização e chamou atenção

para a questão da escola entre todos os grupos do MST” (MST, 2005, p.15).

Na obra Pedagogia do Movimento Sem Terra, Roseli Caldart (2004) apresenta cinco

fatores que podem ser identificados como circunstâncias que ocasionaram surgimento da

escola: 1) o contexto social objetivo de precariedade educacional no Brasil e, principalmente,

no meio rural; 2) a preocupação das famílias sem terras com o baixo nível de escolaridade de

seus filhos; 3) a iniciativa de mães e professoras em levar adiante essa preocupação com a

escolaridade, assumindo a tarefa de educar e organizar atividades educacionais para as

crianças; 4) o caráter massivo e popular do MST, que induz a participação de mulheres e

crianças na sua coletividade; seu caráter político, e não apenas corporativo, que expande sua

luta para além da aquisição de terra e exigiu uma conformação organizativa aberta a um tipo

de demanda, como a educação e a escola; 5) e o perfil das pessoas que ajudaram a organizar o

MST, pelo reconhecimento do valor da escola, incluindo-a como um dos princípios

organizativos do Movimento, como tarefa do MST e como elemento crucial para a formação

humana. A preocupação com a escola inicia por meio da luta das famílias, com objetivo de

reconstrução da comunidade em todas as dimensões da vida social que isso envolve, incluindo

a presença das escolas. Assim, o MST

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[...] passou a se preocupar e a se ocupar mais detidamente com essa luta específica, e também com o que acontecia dentro das escolas conquistadas, à medida com que foi definindo com mais clareza os contornos de sua organização, de sua identidade política e cultural, e a abrangência de sua luta, onde então a formação das pessoas, a produção de novos seres humanos tornou-se um objeto tão importante quanto a conquista da terra, e exigente de integralidade e perspectiva histórica (CALDART, 2004, p. 380).

A formalização de um setor de Educação para o MST aconteceu em 1987, durante a

realização do I Encontro Nacional de Educação, em São Mateus, Espírito Santo. Educadores

do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso, Espírito Santo e

Bahia discutiram a formação de educadores e a implantação de escolas públicas nos

assentamentos. Tendo, como base, a necessidade de construção de uma sociedade igualitária e

o entendimento da educação como um elemento fundamental nos processos de transformação

social, duas questões centrais foram debatidas: O que se pretende com as escolas dos

assentamentos? Como deve ser uma escola de assentamento?

Pautando-se nos referenciais teóricos de intelectuais, como Lênin, Marx, Engels,

Leontiev, Antonio Gramsci, Rosa Luxemburgo, Pistrak, Paulo Freire, Anton Makarenko, Mao

Tse-Tung, José Martí, Florestan Fernandes, Pedro Casaldáliga, dentre outros, o coletivo de

educadores do MST passa a pensar uma proposta de educação específica para as crianças e a

formação inicial e continuada dos educadores. Uma proposta educativa voltada para “os

valores humanistas e socialistas, e que tivesse como horizonte principal a transformação

social, a justiça social e a radicalidade democrática” (MST, 1996, p.6).

A partir das práticas e reflexões sobre finalidades educativas e métodos pedagógicos,

foram formulados os princípios da educação no MST. Considerando que a educação no

Movimento perpassa questões históricas, sociais e culturais, permeadas de contradições, nas

quais os sujeitos sociais vão se constituindo, o MST foi construindo um método de propor a

formação das pessoas. Essa concepção de educação foi possível através da identificação da

intencionalidade educativa do Movimento e do conjunto de práticas vivenciadas que

propiciavam a formação humana, seja pelo trabalho, pela luta social, pela organização

coletiva, pela cooperação. Isso também permitiu pensar que “a ‘escola diferente’ que desde o

começo se buscava construir era uma escola que assumisse o vínculo com esta luta, com a

vida concreta de seus sujeitos, e partilhasse dos seus objetivos formativos mais amplos”

(KOLLING; VARGAS; CALDART, 2012, p. 508).

Destacamos um dos importantes documentos sobre educação e escola produzido pelo

MST: “Dossiê MST e Escola”, publicado em 2005. Resultado de estudos nos cursos de

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formação de educadores, Setor de educação e do conjunto do Movimento, esta coletânea

sintetiza os documentos e produções do MST do período de 1990 e 2001. Foi esse o período

em que o MST se dedicou a uma produção teórica específica sobre a escola e o ensino. O

Dossiê anuncia os treze princípios pedagógicos e os cinco princípios filosóficos, que devem

orientar a formação e a prática educativa. Os princípios filosóficos indicam: Educação para a

transformação social; Educação para o trabalho e a cooperação; Educação voltada para as

várias dimensões da pessoa humana; Educação com/para valores humanistas e socialistas; e

Educação como um processo permanente de formação e transformação humana. Em

complemento, os princípios pedagógicos reforçam os objetivos da educação no MST: Relação

teoria e prática; Combinação metodológica entre processos de ensino e capacitação; A

realidade como base da produção do conhecimento; Conhecimentos formativos socialmente

úteis; Educação para o trabalho e pelo trabalho; Vínculo orgânico entre processos educativos

e políticos; Vínculo orgânico entre processos educativos e processos econômicos; Vínculo

orgânico entre educação e cultura; Gestão democrática; Auto-organização dos/das estudantes;

Criação de coletivos pedagógicos e formação permanente dos educadores/educadoras; Atitude

e habilidade de pesquisa; Combinação entre processos pedagógicos coletivos e individuais

(MST, 2005).

Com o lema “nossa luta é nossa escola”, o Movimento destaca a educação para a

transformação social, como um instrumento de luta. Trata-se “de uma educação que não

esconde o seu compromisso em desenvolver a consciência de classe e a consciência

revolucionária, tanto nos educadores como nos educandos” (MST, 2005, p. 161). Desse

modo, o caráter da educação do MST seria um processo pedagógico que se assume político,

que visa à transformação e à construção de uma nova ordem social. A escola seria esse

espaço, intencionalmente organizado para a discussão, organização e fortalecimento das ações

coletivas. Para isso, um dos objetivos principais da proposta do MST é a educação

relacionada com a teoria e a prática, ou seja, o envolvimento e a participação social que

permitam relacionar os conhecimentos aprendidos às questões do cotidiano. De acordo com

os pressupostos, “as verdadeiras teorias são aquelas que são frutos de práticas sociais e que,

por sua vez, instrumentalizam práticas sociais” (MST, 2005, p.165).

Observa-se que os princípios educativos do MST buscam desmistificar o

conhecimento e a cultura como um processo neutro e separado das relações sociais. Para o

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MST, a educação é um processo permanente de formação e transformação humana. Por tais

princípios,

a) as pessoas não se educam da mesma maneira; daí porque a discussão metodológica de como educar, de como ensinar, de como aprender não é detalhe, mas sim elemento essencial para atingirmos nossos objetivos pedagógicos e políticos; b) a existência social de cada pessoa é o fundamento de sua educação. O que educa/transforma a pessoa não é apenas o discurso, a palavra, a teoria. É sim a vivência concreta do novo. Se o que pretendemos é transformar ou construir comportamentos, atitudes, valores em nossos educandos/nossas educandas, é preciso organizar as condições objetivas para que vivam durante o processo pedagógico estas mudanças. Será a partir desta vivência e de tomar consciência dela, que irão acontecer mudanças reais nas pessoas, e poderemos dizer que realmente estão se educando; c) [...] a educação que pretendemos é cada vez menos um processo espontâneo e mais um processo intencionalmente planejado e provocado; d) a educação não é obra apenas da inteligência, do pensamento; é também da efetividade, do sentimento. E é esta combinação que precisa estar tanto no ato de educar, como no de ser educado (MST, 2005, p. 165).

Entre as manifestações educativas do MST está a mística, a bandeira, o hino.

Representações histórias e simbólicas da luta pela terra, pela educação e pela vida, que

traduzem sonhos, esperanças e ideologias. Desde 1986, foram discutidas as simbologias para

identificação dos sujeitos na luta pela terra. A cor vermelha da bandeira representa o sangue

derramado durante as lutas pela reforma agrária, a cor branca a paz que luta, a cor verde a

esperança de vitória, e a cor preta o luto e homenagem aos trabalhadores mortos durante as

manifestações. O mapa do Brasil, no centro da bandeira, indica o MST como uma

organização nacional e que abrange todo o país. O casal de trabalhadores demonstra a

coletividade da luta feita por famílias inteiras, e o facão representa as ferramentas de trabalho,

de luta e de resistência.

Destacamos aqui a experiência de “recriação” da bandeira do MST apresentada na

obra: “Alfabetização Cultural: a luta íntima por uma nova humanidade”, Dan Baron, 20044.

Com objetivo de estabelecer o diálogo entre os diversos territórios e suas manifestações

étnicas, de gênero e de classe, entre outras experiências, o livro retrata uma atividade

realizada no período de 1998 a 1999, na Escola Agrícola 25 de Maio, localizada no

4 Dan Baron nasceu em Londres, em 1957. Formado em Literatura inglesa e com pós-graduação em Teatro Político pela Universidade de Oxford, trabalhou com os exilados políticos, sindicatos e sem-tetos ingleses. Como militante, integrou diversas atividades junto aos Sem Terras, os indígenas, ao movimento sindical e universitário, com o objetivo de formar educadores comunitários, inclusive no Brasil. Através de imagens, contos, poemas, relatos, o livro “Alfabetização Cultural: a luta íntima por uma nova humanidade” registra oito processos coletivos, além de conceitos e histórias que expressam as diferentes experiências culturais, seja no MST, na periferia urbana ou na comunidade indígena (BARON, 2004).

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Assentamento Vitória da Conquista em Fraiburgo, Santa Catarina. Com a proposta da

construção de um mural comunitário na escola, essa atividade mobilizou estudantes,

educadores e militantes no “resgate” da identidade do MST e da simbologia de sua bandeira.

A partir de encontros, estudos, histórias, desenhos, oficinas e do compartilhamento de

conhecimentos, foi organizada uma proposta coletiva com intuito de integrarem à bandeira

outros elementos que significam e enriquecem as vivências e lutas no MST.

Através do reconhecimento de seus “objetos íntimos” de trabalho, de ideologia, de

contradições e significações sociais os educadores preencheram e complementaram essa

ausência em um novo projeto para a bandeira, como um instrumento pedagógico na

transformação da realidade social. Desse modo, foi incluída na Bandeira a imagem da criança

Sem Terra com lápis na mão, representando a conquista pela educação nos acampamentos e

assentamentos, o fósforo, relembrando o fogo que era aceso para impedir a invasão da polícia

nos acampamentos, o desenho da terra e das frutas como resultados da produção do trabalho.

Essa produção inspirou inúmeros debates e reflexões nos setores de formação, educação e

gênero do Movimento e, “inevitavelmente reverberou e se tocou o limiar sensível entre

resistência e libertação” (BARON, 2004, p. 224).

Assim como a bandeira, o hino expressa a força popular, principalmente, nos

seguintes trechos: Vem, lutemos punho erguido. Nossa Força nos leva a edificar, Nossa

Pátria livre e forte, Construída pelo poder popular5. Todas as manifestações podem ser

consideradas formas de divulgação, não só ligadas às ocupações, mas às conquistas e aos

objetivos realizados nos acampamentos e assentamentos. O conjunto de ações que envolvem a

música, o teatro, a dança, durante as místicas, representam o esforço coletivo de seguir em

frente. É a força para enfrentar as dificuldades, que impulsiona, mobiliza e inspira mudanças.

Sem a mística, “não haveria história militante. As massas perderiam a esperança logo no

início e deixariam escapar a energia do combate, da resistência e da persistência” (BOGO,

2012, p. 478).

Em síntese, a mística é um ato cultural em que os Sem Terra exprimem, por

diferentes formas de linguagem, suas lutas e esperanças, expressam coragem, sofrimento e

obstinação. Essa cultura popular construída pelo MST, através das canções, das poesias, do

teatro etc. caracteriza uma dimensão pedagógica do Movimento, ou seja, uma prática de

contribuição para a formação da identidade política dos Sem Terra. “Dessa forma constroem

5 A visualização completa do hino do MST pode ser encontrada na página www.mst.org.br.

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conhecimentos, fazem filosofias e desafiam as teorias que os excluem da sociedade”

(FERNANDES, 2000, p. 91).

Esse é o processo que chamaríamos de Pedagogia do Movimento, conforme propõe

Caldart. A Pedagogia do Movimento Sem Terra “é o jeito através do qual o Movimento vem,

historicamente, formando o sujeito social de nome Sem Terra, e educando no dia a dia as

pessoas que dele fazem parte” (CALDART, 2003, p. 52). Para a autora, Trata-se de uma intencionalidade formativa produzida na dinâmica de uma luta social (pela terra, pelo trabalho, de classe), e de uma organização coletiva de trabalhadores camponeses, que pode ser pensada como um processo educativo. Sua lógica ensina sobre como fazer a formação humana em outras situações, mesmo institucionais, mas também pode ajudar a intencionalizar as próprias ações da luta na direção de objetivos mais amplos: pensar como cada ação – seja uma ocupação, uma marcha, uma forma de produção de alimentos – pode ajudar no processo de formação de seus sujeitos: como Sem Terra, como camponês, como trabalhador, como classe trabalhadora, como ser humano; que valores propõe, nega ou reforça; que postura estimula diante da luta, da sociedade, da vida; e que desafios de superação coloca à sua humanidade (CALDART, 2012, p. 549).

Esse significativo movimento do MST, considerado aqui como educativo, não

significa dizer que ele cria uma nova pedagogia, mas apresenta uma nova forma de

organização, incorporando diversas e combinadas matrizes pedagógicas, ou seja, produz uma

síntese que não é original, mas também não é igual a outras pedagogias. Foi assim que, aos

poucos, o MST foi consolidando sua convicção de que a escola deve ser tratada como lugar de

formação humana, e que uma proposta de escola vinculada ao Movimento não pode ficar

centrada no ensino pelo ensino, deve ocupar-se de todas as dimensões que constituem a

educação e não só dos elementos pedagógicos. A escola inteira deve ser pensada para educar:

em seus tempos, espaços e em suas relações sociais.

Em outras palavras, o MST em sua dinâmica tem ajudado a produzir uma matriz pedagógica que é síntese e combinação de diversas matrizes pedagógicas ao mesmo tempo, e nisto talvez esteja uma das principais lições de pedagogia que se pode extrair de sua dinâmica, para pensar as práticas de educação como um todo. Não se trata de centrar um projeto educativo, ou educacional, em uma única pedagogia, ou eleger uma determinada prática social como sendo a prática educativa por excelência; menos ainda de ir alterando esta escolha ao sabor de modismos teóricos da conjuntura. Não é assim que os seres humanos se educam. Não há uma prática capaz de concentrar em si mesma, e de uma vez para sempre, todas as virtualidades pedagógicas necessárias à formação humana (CALDART, 2001, p. 219).

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As “matrizes pedagógicas” do MST são caracterizadas pelos processos formadores

que constituem o sujeito humano, histórico e social denominado Sem Terra, uma prática de

como se educa e de como se faz a formação humana. Ou seja, essas matrizes, constituídas

pela pedagogia da luta social, pedagogia da organização coletiva, pedagogia da terra,

pedagogia da cultura, pedagogia da história, contêm em si teorias e práticas sobre formação

humana, que possibilitam uma reflexão crítica para pensar e repensar o currículo e o ambiente

educativo, seja ou não das escolas do MST. São cinco processos educativos básicos, ou

matrizes, formadores do sujeito humano, conforme apresentamos a seguir: A primeira matriz

é a Pedagogia da luta social: a luta está na base da formação dos Sem Terra, ela educa e

constitui o ser do MST, quando mobiliza o sujeito para a transformação do mundo, saindo do

seu estado passivo e conformista. A segunda matriz é a Pedagogia da organização coletiva: ao

organizar-se para lutar, os Sem Terra educam-se e transformam-se numa coletividade em

movimento que, por sua vez, enraíza-os, ou seja, quanto mais estiver enraizado na sua

coletividade mais poderá ser educado por ela. A coletividade educa, quando apresenta uma

organização, uma unidade de ação, princípios e valores comuns com o ideal de que nada se

faz sozinho. O motor é, justamente, a coletividade em movimento. A terceira matriz é a

Pedagogia da terra: o processo educativo através da relação com a terra, com o trabalho e

com a produção. A terra pode ser considerada a fonte da vida; a terra que se pretende

conquistar é o lugar do trabalho, da produção, da moradia; a terra é mais do que a simples

terra. A quarta matriz é a Pedagogia da cultura possui relações com as demais. É cultura no

sentido de processo por meio do qual práticas sociais e experiências humanas vão

constituindo um modo de vida, pelos comportamentos, convicções, valores, saberes. Está na

luta do MST, no jeito de fazê-la e na sua dinâmica, nas ideias, nas marchas, na formação, no

jeito de produzir, na mística, nos símbolos. A quinta e última matriz refere-se à Pedagogia da

história. Ou seja, a possibilidade educativa se dá no cultivo da memória e na compreensão da

história. Pela história é possível conhecer o passado, uma trajetória, e transmitir a outras

pessoas; pode-se dizer que ela mantém viva a identidade Sem Terra (CALDART, 2004). Ao

concordar com o exposto por Caldart (2001 e 2004), Dalmagro enfatiza as características da

proposta e da experiência de educação escolar no Movimento. Segundo a autora,

O Movimento possui uma proposta e uma experiência de educação escolar ousada e original, apesar das grandes dificuldades que possui para implementá-la, conseguindo apontar alternativas para muitos dos problemas enfrentados por esta instituição em nosso país. Como pontos positivos destacaria desta proposta a gestão

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democrática, a organização coletiva dos educadores, a participação ativa dos estudantes, a inter-relação escola e comunidade. Mas são dois os pontos que me chamam a atenção: 1) a ideia de trazer a totalidade da vida humana para dentro da escola, ou seja, esta não é concebida apenas como espaço onde se trata o conhecimento, mas onde as múltiplas dimensões humanas são postas em reflexão e tratadas pedagogicamente. O ser humano é o foco central da escola. 2) a vinculação estabelecida entre Movimento Social e escola permite ao MST apropria-se da escola, conseguindo ver ali um espaço importante de construção de seu projeto político (DALMAGRO, 2010, p. 22).

Desse modo, apreender a dimensão educativa das ações do Movimento e suas lições,

como referência de nossa prática e de nossa reflexão, pode também “educar o nosso olhar

para ver mais do que o MST, mais do que os Sem Terra” (CALDART, 2003, p. 52). São as

chamadas “lições de Pedagogia”, conforme propõe a autora, porque nelas há o

reconhecimento de que:

As pessoas são o maior valor produzido e cultivado pelo MST; As pessoas se educam aprendendo a ser; As pessoas se educam nas ações que realizam e nas obras que produzem; As pessoas se educam produzindo e reproduzindo cultura; As pessoas se educam vivenciando valores; As pessoas se educam aprendendo a conhecer para resolver; As pessoas se educam aprendendo do passado para projetar o futuro; As pessoas se educam em coletividades; O educador educa pela sua conduta; É necessário conceber a escola como uma oficina de formação humana (CALDART, 2003, p.52 a 58).

São essas lições que nos permitem identificar sujeitos históricos, parte de uma luta

histórica e abrangente, que apresentou mudanças significativas na conjuntura do nosso País.

Com elas, talvez, possamos reconhecer o valor da luta de um povo que, na coletividade,

encontrou forças para desbravar e resistir às desigualdades sociais. A pedagogia do

Movimento se fortalece, à medida que envolve homens, mulheres e crianças em torno de um

objetivo comum: igualdade de condições sociais para a formação do ser humano em suas

múltiplas dimensões, conforme consta em seus documentos.

A Educação e a formação dos novos sujeitos: as crianças e as educadoras

É importante destacar que a ocupação da escola6 pelo Movimento modelou a

configuração atual do Sem Terra, pois colocou em evidência a emergência de novos sujeitos:

6 No terceiro capítulo do livro “Pedagogia do Movimento Sem Terra” Caldart (2004) analisa a trajetória histórica do processo de ocupação da escola. Segundo a autora, esta ocupação parte de três elementos: reivindicação do direito à escola; a necessidade de construir a própria proposta pedagógica do MST; e a escola como parte da

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as educadoras e as crianças. Sujeitos que se tornariam novos personagens no cenário de luta

pela terra e trariam novos traços para a identidade do Movimento. Junto à Identidade do

Movimento, foi firmada a identidade da educadora que, pela significativa participação das

mulheres, conseguiu incorporar seus jeitos, valorizando sua atuação social no conjunto das

frentes de ações do MST. A educadora, que entrou na história como esposa, mãe ou

trabalhadora, agora faz parte do sujeito chamado Sem Terra e do cotidiano do MST

(CALDART, 2004, p. 221).

A participação da mulher, como sujeito participante e reconhecido pelo MST,

fortaleceu-se com a criação do Setor de Gênero, um espaço de formação e ação das mulheres.

Essa integração permitiu, principalmente, a formação política das militantes, diante do

processo de luta, de mobilização, de formação e de decisão frente às atividades. Presentes em

todos os setores e instâncias políticas, elas têm sido fundamentais no desenvolvimento das

ações em todos os níveis. Segundo Morissawa (2001), a primeira manifestação de

organização das mulheres surgiu no 1º Congresso Nacional do MST, em 1985, no qual

iniciaram os trabalhos para a formação da Comissão Nacional das Mulheres do MST. Em

março de 1986, conquistaram o direito de receberem lotes na implantação dos assentamentos,

superando a condição de serem dependentes em relação a pais ou irmãos.

Essa participação traz para o cenário do Movimento as crianças, filhas e filhos de

trabalhadores e trabalhadoras rurais, que passam a acompanhar as mães nas discussões,

organizações e debates. De acordo com os estudos de Caldart (2004), o lugar das crianças no

MST e a sua formação como sujeito Sem Terra ocorreram a partir de, pelo menos, três

configurações. Primeiro, como testemunhas da luta das famílias pela ocupação das terras,

ainda sem destaque na cena. Nessa configuração, as crianças

[...] estavam lá e acompanhavam, sofriam o desenrolar dos fatos de cada ocupação, de cada acampamento, de cada assentamento. No colo de suas mães, agarradas às suas mãos ou ainda dentro de suas barrigas, em um primeiro momento não tinham destaque na cena ou no enredo da ação, a menos que algumas de suas reações infantis espontâneas causassem espanto ou fossem notadas por algum observador mais atento. Pela sua própria condição de crianças, seu testemunho jamais conseguiria ser passivo (CALDART, 2004, p. 298-9).

dinâmica do Movimento, tanto no cotidiano e das preocupações das famílias, como na sua dimensão política de estratégia na luta pela Reforma Agrária (CALDART, 2004).

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O segundo lugar ocupado pela criança é a sua condição de criança acampada ou

criança assentada. Essa condição desdobrou no reconhecimento de sua presença e da

necessidade de atenção específica. A presença notada vem acompanhada da ocupação da

escola, ou seja, a escola traz a criança em cena, bem como a importância de um atendimento

pedagógico diferenciado. Uma das tarefas da escola é garantir o cuidado pedagógico da

infância Sem Terra. É preciso garantir um tipo de socialização das crianças que permita a estes sujeitos particulares vivenciar a pedagogia do Movimento desde as características, necessidades e desafios próprios de seu tempo de vida, e através de momentos específicos de convivência com seus iguais. E a escola mais do que a família em particular, e até pelo caráter social que o próprio convívio das famílias sem-terra acaba assumindo em uma realidade de acampamento ou assentamento, pode ser efetivamente o lugar que coordena esse processo de socialização (CALDART, 2004, p. 384)

E o terceiro fator que implicou o lugar das crianças no MST é a construção da

identidade como sujeitos Sem Terra, como parte efetiva da dinâmica do MST. É nessa nova

condição de sujeitos que a criança entra em cena, produzindo sua identidade específica, como

Sem Terrinha, como vem sendo chamada, e reforçando sua contribuição para o Movimento,

como uma organização duradoura e um projeto de futuro (CALDART, 2004).

Com objetivo de preparação de novas lideranças, além de cursos de formação

política, são realizados encontros estaduais e nacionais para discussão dos encaminhamentos

das lutas do Sem Terra, não somente para educadores, como também para jovens e crianças.

Em 1986, em São Paulo, o MST realizou o 1° Encontro Infanto-juvenil, com filhos de

assentados e acampados de vários estados brasileiros, com participação de aproximadamente

400 crianças e adolescentes. Em 1999, foi realizado o 1° Encontro Nacional do Sem Terrinha,

em Brasília, resultando em várias reivindicações, como: a construção de escolas, parques

infantis, bibliotecas, transporte escolar, merenda, formação de educadores, entre outras.

Atualmente, em alguns assentamentos, são organizados os Coletivos Infantis, também

chamados de Núcleos Infantis. Esses coletivos constituem-se como um espaço aberto à

participação de crianças de 2 a 13 anos de idade, filhos de assentados e pequenos agricultores.

É um espaço que promove atividades culturais, pedagógicas e políticas, assumidas

coletivamente entre crianças e educadores do MST.

Os novos sujeitos trouxeram para o MST a preocupação com a formação dos

educadores e com a formação das crianças. Com a participação das mulheres, houve a

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necessidade crescente de pensar um local para as crianças ficarem durante as passeatas, as

manifestações e atividades em geral organizadas pelo MST. Um local que não fosse,

simplesmente para deixar as crianças, mas um espaço que possibilitasse a formação em suas

diversas dimensões: política, organizativa, profissional, cultural, estética, afetiva ou religiosa.

Assim, foram propostas as primeiras experiências de atendimento organizado para as crianças

pequenas, as Cirandas Infantis do MST. São essas experiências que impulsionaram as

discussões sobre educação das crianças no Setor Nacional de Educação.

A partir do momento em que o MST amplia os seus objetivos de luta, ou seja, a luta

não apenas pela conquista da terra, mas também pela educação e pela escola, é possível

identificar uma nova proposta educativa com características e particularidades próprias do

Movimento. Para o MST, a educação se constrói pelos sujeitos que estão nela inseridos, seja

em um espaço formal ou informal. Desse modo, sua defesa está em um processo de

coletividade que intencione o cultivo da ideologia e da militância dos princípios do

Movimento, pautado na experiência da luta e dos conflitos sociais. Apesar dos limites e das

contradições históricas que há na proposta educacional e em algumas ações do Movimento,

nota-se que há uma grande preocupação com a formação educacional e política dos sujeitos

do campo. Embora, muitas vezes, não seja possível de se efetivar em sua totalidade, a

intencionalidade da proposta educativa do MST demonstra o enorme esforço empreendido e

uma grande conquista na efetivação do direito à educação. Por esse motivo, as ações de seus

sujeitos acabam tendo um sentido histórico e uma influência política que vai além do seu

conteúdo específico, ou seja, que vai além da luta pela terra.

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OS FUNDAMENTOS DO NEOLIBERALISMO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A

LUTA DE UMA EDUCACÃO EMANCIPADORA

Denner Wynderson Weber1

José Luiz Zanella2

Resumo: O objetivo deste artigo é compreender o neoliberalismo como política construída historicamente ao longo dos últimos 50 anos, principalmente após a década de 1970, com o acirramento da crise do capitalismo, período no qual, essa política se torna hegemônica e organiza todos os setores da sociedade. Dessa forma, se organiza e se constrói uma realidade social, moral e ética baseada nos valores do próprio mercado. Como principais idealizadores da lógica neoliberal utilizarei no artigo o pensamento de Adam Smith, Hayek e Milton Friedman. Como critérios metodológicos, temos o estudo bibliográfico das obras clássicas do neoliberalismo. Como resultado, esperamos os questionamentos da hegemonia neoliberal que naturaliza as injustiças sociais em momento de meritocracia. Palavras-chave: Neoliberalismo; Estado; Educação.

Introdução

Na atual conjuntura do mundo do trabalho é necessário entender quais são os

princípios que fundamentam a lógica neoliberal, que reduzem o papel do Estado através da

flexibilização dos direitos sociais e trabalhistas. Este processo é retomado, principalmente a

partir da década de 70, mas sua origem pode ser buscada no pensamento de Adam Smith no

século XVIII. As palavras concorrência, individualismo, egoísmo, utilitarismo, eficiência,

lucro, meritocracia, Estado mínimo, mercantilização e hedonismo se tornam palavras chaves

que moldam e formam a organização social e a consciência coletiva da sociedade.

Inspirado na frase célebre de Marx, “Não é a consciência do homem que lhe determina

o ser, mas, ao contrário, o ser social que lhe determina a consciência.”

Karl Marx (2008, p. 47) evidencio neste artigo quais são os princípios que fundamentam o

pensamento liberal e como estes se desenvolveram ao longo do processo histórico, tornando-

se um pensamento hegemônico da sociedade civil, influenciando diretamente a formação do

1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação/ Mestrado em Educação-Campus de Francisco Beltrão. 2 Professor Dr. Associado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Professor Orientador do Programa de Pós-Graduação em Educação Mestrado em Educação-Campus de Francisco Beltrão.

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ser humano. Desta forma, o pensamento liberal não é apenas uma teoria econômica de

organização do tamanho do Estado, mas é um projeto de formação social, cujo maior objetivo

é a manutenção do capitalismo.

No contexto histórico de submissão da economia aos interesses da monarquia

aristocrática, emerge o pensamento do economista escocês Adam Smith que nasceu em 1723

e escreve sua principal obra, A Riqueza das Nações, em 1776. Nessa obra, defende uma

organização social econômica na qual deveria existir maior liberdade nas relações de compra

e venda sem interferências do próprio Estado, contrariando assim, a política econômica

estabelecida no seu contexto histórico. Ele acreditava que sem a proteção do Estado ou de

corporações não haveria monopólios, ocasionando maior justiça, racionalidade, eficiência e

produção através das leis da concorrência do mercado que produziriam um mundo melhor e

mais desenvolvido para todos. Desta maneira, defendia que as atividades econômicas

deveriam ser desmembradas do Estado e colocadas para a iniciativa privada.

A teoria econômica liberal de Smith defende que a natureza do ser humano possui em

sua essência a ambição e a motivação individual em procurar constantemente ampliar lucros e

satisfazer interesses próprios, pois, o ser humano é egoísta, assim, a todo momento tende a

satisfazer suas necessidades pessoais. Desta forma, Smith traz para o pensamento liberal o

conceito de egoísmo que já havia sido desenvolvido em Thomas Hobbes sobre a natureza do

indivíduo, presente na explicação do surgimento do Estado, ou seja, de que o ser humano é

egoísta por natureza.

Para Smith, o egoísmo é algo favorável e positivo, pois, possibilita o desenvolvimento

do próprio sujeito e da sociedade através de um sistema que promove a concorrência entre os

indivíduos e que será chamado de livre mercado ou laissez faire.

Esta característica presente na essência da natureza humana, segundo Smith, faz

movimentar toda a sociedade por meio da concorrência que se torna mecanismo que estimula

o aumento de determinação dos indivíduos, da recompensa e da produção. Além disso,

possibilita o surgimento de ideias para o desenvolvimento do trabalho e de novas tecnologias.

Portanto, este sistema seria a manifestação da própria essência da natureza humana que

procura constantemente ganhar mais e satisfazer suas necessidades.

Adam Smith (1996b, V.2, p.120) defendia que por meio desse sistema social, gerido

pelos sentimentos privados e pelo egoísmo do ser humano, se daria, consequentemente, o

desenvolvimento da sociedade. Portanto, não haveria necessidade da intervenção do Estado

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para uma efetiva distribuição da riqueza. Este processo de distribuição da riqueza dentro do

sistema de livre mercado vai ser chamado por Smith de “Mão Invisível”, que será um agente

regulador invisível presente na economia, processo que possibilitará o equilíbrio necessário

para uma economia saudável.

Outro importante representante do pensamento liberal é o economista inglês David

Ricardo, nascido em 1817, o qual desenvolve o pensamento econômico das “vantagens

recíprocas” a partir da divisão social do trabalho. Ricardo (1996a) analisa que em uma

sociedade de livre mercado global, cada país vai intensificar o seu trabalho a uma atividade

que melhor lhe ajude a suprir suas necessidades econômicas. Isso porque, na sua

particularidade desenvolve a economia através da cultura ou das condições possibilitadas pela

natureza, o que faz com que essa economia seja organizada de modos diferentes de outros

países.

Nesta perspectiva não existe país que consiga desenvolver ou produzir todos os tipos

de alimentos ou tecnologias para saciar suas necessidades, precisando de outros para este

processo. Assim, a procura de um país em beneficiar-se da sua realidade para possibilitar o

seu desenvolvimento faz com que se produza produtos diferenciados dentro do mercado

internacional. O trabalho no sistema de livre mercado globalizado se divide socialmente

segundo as necessidades de cada lugar, sem que existam pressões para esta ou aquela

atividade econômica. Ricardo (1996a, p.97) globaliza a ideia de Smith de que o indivíduo é

egoísta e procura constantemente o seu bem individual o que leva ao seu crescimento e,

consequentemente, provoca a ampliação da sociedade, pois, para ele o sistema de livre

mercado global possibilita aos países a liberdade para fazer movimentar sua economia. Nesse

processo acorre a divisão do trabalho, uma vez que cada região precisa de um trabalho

específico para gerir sua economia.

Adam Smith e David Ricardo demonstraram, cada um a seu modo, que o melhor

caminho para fomentar a eficiência, a justiça e a riqueza é o livre mercado. Isso porque, no

livre mercado as leis da concorrência exigem que as potencialidades da natureza sejam

melhores utilizadas, no sentido de aumentar a produção e diminuir os custos, o que traz

melhor aproveitamento do trabalho. Além disso, demonstram que no sistema de mercado livre

o princípio da justiça acontece perfeitamente, pois, no seu interior há o estímulo e a

recompensa pelo trabalho realizado. Outro ponto importante é que no livre mercado ocorre a

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ampliação da produção mediante a concorrência, como consequência, têm-se a distribuição

dessas riquezas em benefícios para toda a sociedade.

Além das críticas às interferências políticas feitas por meio de leis que determinam a

organização da economia e, a criação de taxas, Smith volta-se para às corporações de ofício e

os privilégios dos mestres que atrapalhavam a passagem de um indivíduo para outra profissão

ou, simplesmente a possibilidade do sujeito escolher no que gostaria de trabalhar. Também

faz críticas a ideias de Guildas3, que segundo ele, era um entrave para a liberdade econômica,

pois, faziam o controle, o planejamento e o direcionamento da produção.

Smith (1996b, v.2, p.169) critica qualquer tipo de ação feita por organizações coletivas

que interfiram nas regras do sistema de livre mercado, pois, o próprio sistema através da

concorrência tem suas regras, as quais fazem com que haja crescimento e equilíbrio. As

tentativas de interferência na economia ao invés de provocar bons resultados, resultariam em

grande atraso na produção e desiquilíbrios no desenvolvimento, pois, feriria a ordem natural

do próprio sistema de concorrência, que possibilita igualdade entre os sujeitos.

Defende, também, que não há necessidade de corporações, isso porque elas não

fazem o que dizem fazer, ou seja, melhorar as condições de vida, mas ao contrário, criam

trabalhadores acomodados, que não querem trabalhar por estarem protegidos pelo grupo ao

qual pertencem. O que realmente protege o trabalhador segundo o economista, é a

concorrência que obriga o trabalhador estar sempre motivado a melhorar os seus serviços.

3 Uma guilda é uma associação de caráter solene, um grupo de pessoas que se reúnem para algum fim comum, estabelecem confrarias ligadas por alguma modalidade de juramento e expressam a vinculação entre elas por meio de formas rituais de comer e beber. Instituições desse tipo aparecem em numerosas culturas. A palavra é cognata no inglês arcaico de geld, pagamento; e, embora o pagamento de joias e taxas de filiação seja uma característica constante das guildas, há na base uma ligação mais antiga entre pagamento e sacrifício. A guilda era, contudo, uma instituição com profundas raízes, mais fácil de assimilar do que de abolir; e durante toda a Idade Média suas únicas rivais como forma de organização social eram a família, com todos os seus dependentes e servidores domésticos, e a corte. Duas manifestações da guilda serviram para distorcer sua história. Uma foi a guilda mercantil, que nos aparece quando a documentação da vida urbana se intensifica do século XI em diante, e que manteve um papel central nos negócios de algumas cidades durante séculos. Sua natureza e função foram largamente incompreendidas, porque os historiadores tentaram classificar as guildas como entidades e não como meios adaptáveis a uma variedade de fins. Quando os cidadãos procuravam obter privilégios do rei ou de algum outro senhor, era natural que usassem a guilda como símbolo e como reforço de seu objetivo comum; também era natural que os mercadores protegessem seus interesses no país e no estrangeiro do mesmo modo. O outro uso urbano da guilda foi como um meio de organizar e controlar as artes e ofícios. É quase certo que as guildas foram usadas em algumas incipientes tentativas de artesãos afirmarem uma independência corporativa em relação aos patrões comerciantes, mas na época de documentação mais completa, final da Idade Média, as guildas ou corporações de ofícios regulamentavam a qualidade, a produção e o recrutamento para os diversos ofícios visando os interesses do empregador e do artesão qualificado e estabelecido. Uma vez mais, era a finalidade da organização, não a sua forma, que a distinguia das outras guildas, e era o contexto social do momento, não alguma ideologia peculiar da guilda, o que determinava seu objetivo. (LYON, R. Henry. DICIONÁRIO DA IDADE MÉDIA. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997)

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Do exposto, percebemos que o pensamento liberal, não nasce de um espaço vazio, mas

na busca pela consolidação de grandes economias ao longo da história. Após essa exposição,

no próximo item, desenvolveremos um exame de como esse pensamento se manteve e foi

retomado pelas economias centrais, com formato de Neoliberalismo, no sentido de

reorganizar o papel do Estado e do mercado. Embora, marcado por tempos históricos

diferentes, mostraremos as similaridades e a importância do mesmo para a economia

capitalista atual.

O desenvolvimento Histórico do Neoliberalismo

A etimologia da palavra Neoliberalismo4 vem da junção entre o termo grego néo que

significa novo ou atualizado e, liberalismo que é o conjunto de ideias que defendem a

propriedade privada e o livre mercado, o pensamento neoliberal é a retomada do liberalismo

econômico clássico proposto por Adam Smith, mas com roupagem nova que visa atualizar a

aplicação dos princípios liberais em um contexto econômico e histórico diferente.

De modo geral, o neoliberalismo mantém os princípios básicos do pensamento

econômico liberal que é a defesa da economia sem intervenções realizadas pelo poder político

ou de associações de trabalhadores. Dando continuidade na crença do conceito de “mão

invisível” de Adam Smith, de que o próprio mercado através do regime de concorrência

possibilita o desenvolvimento dos indivíduos e produz benefícios para toda a sociedade.

A teoria econômica neoliberal se desenvolve principalmente após a II Guerra

Mundial com o economista austríaco Friedrich Von Hayek por meio da obra O Caminho da

Servidão em 1944. O autor faz duras críticas ao Estado de Bem-Estar Social, ao socialismo e

aos movimentos de trabalhadores que interferem na economia. Suas críticas reiteram que o

planejamento e o controle econômico levam ao desenvolvimento de regimes autoritários e

totalitários da organização social. Segundo Hayek (1977, p. 5) “Poucos estão prontos a 4 O termo Neoliberalismo leva vários significados como:- Uma corrente de pensamento e uma ideologia, isto é, uma forma de ver e julgar o mundo social; -Um movimento intelectual organizado, que realiza reuniões, conferências e congressos, edita publicações, cria think-tanks, isto é, centros de geração de ideias e programas, de difusão e promoção de eventos; -Um conjunto de políticas adotadas pelos governos neoconservadores, sobretudo a partir da segunda metade dos anos 70, e propagadas pelo mundo a partir dos organizações multilaterais criadas pelo acordo de Bretton Woods em 1945, isto é, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas todos esses significados têm uma coisa em comum: sugerem o retorno a um modelo ideal. [...] O neoliberalismo, de modo semelhante, é a ideologia do capitalismo na era de máxima financeirização da riqueza, a era da riqueza mais líquida, a era do capital volátil – e um ataque às formas de regulamentação econômica do século XX, como o socialismo, o Keynesianismo, o Estado de bem-estar, o terceiro mundismo e o desenvolvimentismo latino-americano. (Moraes, 2001, p.10).

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admitir que a ascensão do nazismo e do fascismo não foi uma reação contra as tendências

socialistas do período precedente, mas o resultado necessário dessas mesmas tendências.”

Diferente de uma economia planejada, o regime de livre mercado permite uma

estrutura que dá alternativas para se alcançar a liberdade, a partir das relações de compra e

venda estabelecidas. Nesta relação acontece a ampliação de uma estrutura social com

escolhas. Hayek (1977, p.15) demonstra que o princípio histórico que possibilita a liberdade é

o surgimento do comércio e, que o planejamento da economia leva a escravidão. Portanto, ele

assegura que “A transformação gradual de um sistema hierárquico rigidamente organizado,

em um sistema no qual os homens pudessem dirigir a própria vida, tendo a oportunidade de

conhecer e escolher diferentes formas de existência, estaria intimamente ligada a expansão do

comércio.” Para exemplificar este processo, faz referência às regiões e países da Europa, os

quais já se pautavam na perspectiva de que quanto mais o mercado se tornava livre, maior

seria o grau de liberdade vivenciada pelos indivíduos.

Desta forma, a liberdade ocorre por meio do poder de escolhas realizadas no campo

econômico, que levam os sujeitos a se responsabilizarem pelas consequências no campo

pessoal, mas que na verdade são fundadas na economia (HAYEK, 1977, p. 95). No livre

mercado os sujeitos têm o controle sobre si, e podem tomar suas decisões sabendo de suas

consequências e vantagens. Diferente do que acontece nas economias planejadas as quais

determinam o que os indivíduos devem ou não fazer, pensar e agir.

Quanto ao conceito de Estado Hayek defende que este não deve ser eliminado, pois,

tem um importante papel dentro da sociedade de livre mercado, que se resume em criar e

estabelecer uma estrutura legal que esteja sempre se aperfeiçoando para aumentar a

concorrência. Além disso, o governo deve ter a responsabilidade de investigar qualquer tipo

de ação que venha ferir as regras estabelecidas. O Estado deve indicar mecanismos para evitar

qualquer tipo de vantagem dentro do próprio sistema para certos grupos. Por este motivo

Hayek (1977, p.17) assegura que “a essência da posição liberal, está na negação de todo

privilégio, se este é entendido em seu sentido próprio e original de direitos que o Estado

concede e garante a alguns, e que não são acessíveis em iguais condições a outros.”

Outro expoente do novo liberalismo é o economista norte-americano Milton Friedman,

que nasceu em 1912 e apresenta suas principais ideias na obra “Capitalismo e Liberdade” de

1962. Diferente de Hayek, Friedman propõe medidas concretas a partir da realidade nacional,

e construção de um coletivo movido pelo livre mercado. Assim, demonstra como a

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aproximação da política com a economia pode levar a formação de uma sociedade que não

preze pela liberdade dos indivíduos, mas sim, pela submissão desses aos poderes adquiridos

pelos monopólios dos sindicatos, dos governos, industrias e outros. Quanto maior for a

concentração de poderes de grupos na sociedade e na economia, menor será a liberdade dos

indivíduos, isso porque, a concentração de poder permite que alguns grupos tenham mais

força coercitiva, e a partir disso, a vontade desses acabam prevalecendo sobre as vontades

individuais. Por esta razão, defende que a aquisição da liberdade política perpassa a dispersão

do poder dentro da sociedade através do capitalismo competitivo de livre mercado, que

possibilita separação do poder econômico do político e ao mesmo tempo contribui para que o

poder político e econômico se controle mutuamente (1988, p.18).

A existência de um livre mercado pautado na liberdade e competição segundo

Friedman (1988, p.31) não elimina a necessidade do Estado, mas pelo contrário, exige-se

ainda mais sua existência no sentido de organizar as regras e julgar os que não forem capazes

de cumpri-las. Dessa forma, o Estado se restringe a ser um legislador das regras quando não

houver consenso social, e juiz quando não forem cumpridas, mas não um interventor na

própria economia. Isso é necessário justamente, porque a liberdade absoluta não é possível,

uma vez que o ser humano não é perfeito, sendo assim, pode acontecer que as liberdades

entrem em atrito, necessitando da existência de um poder legislador que mude as regras se

necessário, e julgador para que se estabeleça a ordem e garanta o direito à liberdade de todos.

O Estado possui, portanto, as funções de mudar as leis com consenso da maioria quando

necessário, como também esclarecer e determinar o seu significado, para que sejam

entendidas e cumpridas por todos.

Assim, a ação do Estado se estende para a manutenção da lei e sua organização através

de definições que estabelecem o direito à propriedade; julga possíveis interpretações

diferentes sobre as regras; garante o cumprimento de contratos realizados; promove a

concorrência; disponibiliza a existência de uma organização monetária; cria mecanismos para

evitar o surgimento de monopólicos técnicos e evitar o surgimento de efeitos laterais para que

não seja necessário a intervenção do Estado; cria mecanismos que possibilitam proteger e

cuidar dos insanos e as crianças.

Por outro lado, Friedman (1988, p.23) analisa que o mercado livre através da

concorrência possibilita uma redução drástica de questões que devam ser decididas no campo

político, o que diminui ainda mais a participação do Estado na economia e na liberdade dos

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indivíduos. Mas a liberdade analisada por Friedman torna-se possível através da fragmentação

do poder dentro da sociedade, uma vez que quanto mais ele for concentrado, menor será a

possibilidade de formação de um coletivo que prese pela liberdade. Isso porque os interesses

dos grupos pelo poder, acabam prevalecendo sobre as individualidades o que não permite a

construção de uma sociedade livre “A preservação da liberdade requer a maior eliminação

possível de tal concentração de poder e a dispersão e distribuição de todo o poder que não

puder ser eliminado” (p.23)

Desta maneira, a concentração de poder e o controle da economia por governos e

grupos levam a inibição da concorrência e ao surgimento de uma série de taxações injustas e

empecilhos que não contribuem para a iniciativa privada a liberdade necessária para o

desenvolvimento. Ao invés de produzir o desenvolvimento e o crescimento econômico leva

ao estímulo para o mal-uso dos recursos, o que não permite o surgimento de novos

investimentos. Desta maneira a redução do papel do governo na economia com a redução de

taxas e controles torna-se essencial para sua revitalização e retomada do crescimento

econômico. O Estado continua com um importante papel de fornecer a organização estrutural

monetária que consiga produzir estabilidade e economia livre.

Além das questões ligadas a economia, Friedman, também considera o papel do

governo na educação. Julgamos interessante trazer a questão educacional porque eles ainda

podem ser reconhecidos nas políticas atuais para a educação, principalmente após a

promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9394/96.

Nesta perspectiva, a interferência estatal sobre a educação somente se justifica para

famílias que não tem condições financeira de garantir os gastos necessários para obter a

instrução (1988, p.82). Já para as famílias que possuem condições, essas deveriam pagar pela

escola de seus filhos, o que diminuiria a cobrança de impostos como também, evitaria que o

governo tivesse que cobrar o imposto por muito tempo até ressarcir os gastos neste

investimento.

Essa medida diminuiria, ao longo do tempo os gastos com educação, mas ao mesmo

tempo reduziria a cobrança de impostos o que levaria a um melhor desenvolvimento da

econômico, da vida dos indivíduos e de toda a sociedade. Além dessa justificativa, ou seja,

pagar somente para os que não tem condições, Friedman (1988, p.83) defende que o Estado

não pode financiar qualquer tipo de instrução aos indivíduos. O financiamento governamental

deve ser realizado principalmente para certos tipos de ensino que formam para “cidadania” e

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para “liderança” como os ensinos primários ou outros níveis de escolaridade do secundário.

Assim, não encontra motivos que justifiquem o financiamento do governo na instrução do

ensino Superior, principalmente, porque isso geraria um aumento de impostos, o que

implicaria em uma maior interferência do governo no mercado criando um desiquilíbrio.

Outro ponto apresentado sobre educação, refere-se à administração das instituições de

ensino que segundo Friedman (1988, p.84) deveriam ser desnacionalizadas e colocadas sobre

a direção de instituições que visam a lucratividade ou não. Portanto, o sistema educacional

não poderia ser regido somente por escolas públicas como eram a grande maioria das escolas

do seu tempo, mas deveria existir Escolas privadas também.

A defesa pela desnacionalização das instituições de ensino é justificada, neste

contexto, a partir do surgimento das escolas privadas nas quais os pais poderiam escolher em

qual instituição os filhos seriam educados. Como também, ampliaria o número de novas

instituições de ensino para satisfazer as necessidades encontradas pelos próprios pais.

O resultado desse processo seria que escolas e professores estariam sujeitos as regras

do próprio mercado e da concorrência, assim, os melhores professores manteriam o seu

emprego e a melhoria dos seus salários. Além dos professores, as escolas deveriam ser

concorrentes uma das outras, o que significa oferecer melhores serviços para conquistarem

mais educandos. A competição torna-se o ponto principal que move e qualifica o sistema sem

a necessidade de controles externos.

Esta perspectiva, lega ao processo educacional valores estabelecidos dentro de uma

sociedade de livre mercado. A educação deixa de ser uma relação de professores para com

alunos, pais com professores e escola com os pais, passando a uma relação entre clientes

(aluno/pais) e ofertadores de serviços (escola/professor), ou que chamamos na atualidade de

educação “quase mercado”. Nessa relação as leis de mercado moldadas pela concorrência

entre escolas e professores serão o princípio geradores de toda ação educativa para se manter

a concorrência.

Desse cenário de significativas mudanças na economia mundial, o novo liberalismo

introduzido por Hayek e retomado por Friedman denunciava que as formas planejadas de

economia presentes no seu momento histórico levariam a uma igualdade que provocaria a

estagnação da economia, surgimento de grandes monopólios de empresas e organizações de

trabalhadores que, por terem privilégios concedidos pelo Estado, conseguiriam ampliar o seu

poder econômico e social sobre os demais, por não estarem sujeitos a concorrência. Como

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resultado, acontece a desestabilização do mercado, pois alguns conseguem ter maiores

privilégios do que outros. Desta forma, se amplia as vantagens de certos grupos econômicos e

sociais existentes sobre os demais indivíduos, o que provocou o contrário do que havia sido

prometido, ou seja, a maior igualdade entre os indivíduos. O que se desenvolveu na verdade

foi a criação de novos monopólios que deixam o mercado e o consumidor a mercê desses

monopólios, processo que poderá gerar instabilidades e crises.

Após essas considerações sobre a teoria de Hayek e de seus seguidores, é possível

perceber que a mesma se torna cartilha de muitos governos a partir do final da década de

1970, quando políticos de direita e progressistas são eleitos em diversos países da Europa e da

América do Sul. Segundo Perry Anderson (1995, p.10) Hayek culpabiliza o surgimento da

crise ao poder elevado dos sindicatos, tendo em vista o aumento com os gastos sociais do

Estado e da folha salarial. Portanto, a expansão dessa ideologia foi em grande parte, mediada

pelos organismos internacionais, como abordaremos a seguir.

Neoliberalismo como Matriz Formativa da Política do Banco Mundial após 1990

A hegemonia adquirida pelo pensamento neoliberal não acontece de maneira

ocasional, mas sim, como fruto de um processo histórico que envolve forças econômicas que

tendem a expandir a sua economia para além de suas fronteiras para aumentar o seu mando

econômico e ideológico sobre as demais localidades. A lógica neoliberal se desenvolve por

duas dimensões, sendo a primeira, ligada a dominação da realidade econômica através da

aplicação dos princípios liberais nas políticas econômicas de diversos países, por meio de

governos ou de órgãos internacionais. A segunda seria uma consequência da primeira, devido

a ligação dialética que existe entre economia e a formação das dimensões humanas como a

ideológica social, a cultura, a religião e a política. Valores como concorrência, egoísmo,

individualismo, utilitarismo, hedonismo e lucro que fazem parte da lógica do mercado, tornar-

se-ão os princípios formativos dos sujeitos e da consciência coletiva. O neoliberalismo desta

maneira foi personificado e corporificado à “segundo natureza” dos indivíduos, como diria

Antônio Gramsci, sem haver muita contestação.

Alguns acontecimentos em meio à crise foram importantes para que as ideias

neoliberais se espalhassem e ganhassem força no sentido de uma nova estruturação do papel

do Estado dentro do sistema capitalista. O primeiro ocorre no campo político quando

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candidatos que defendiam políticas neoliberais chegam ao poder e passam a aplicar as

políticas neoliberais durante as décadas de 70 e 80, dos quais já citamos Margaret Thatcher na

Inglaterra, Reagan nos Estados Unidos e Augusto Pinochet do grupo Chicago Boys, no Chile.

O segundo, se consolida por meio da construção e implementação de programas políticos

idealizados por órgãos internacionais, embasados na concepção neoliberal de mundo, que

iniciam um processo de criação de consenso dessas ideias. Assim, uma sequência de acordos

e empréstimos são feitos aos países subdesenvolvidos para implementar suas políticas

econômicas, sociais e, posteriormente, educacionais.

Entre os eventos que contribuíram para a disseminação do novo cenário neoliberal,

está o “Consenso de Washington”, ocorrido na cidade de Washington em novembro de 1989.

Esse encontro, segundo Fiori (1996) se fortaleceu por intermédio do Instituto International

Institute for Economiy, presidido pelo economista John Williamson. Esse Instituto organizado

por vários intelectuais liberais servia como uma escola de formação liberal para políticos,

intelectuais e autoridades internacionais que procuravam obter conhecimento sobre o

liberalismo e sua aplicação.

A partir dos estudos liberais do Instituto, o economista John Williamson promove o

encontro entre funcionários do governo norte americano, organismos financeiros

internacionais como FMI, Banco Mundial e BID e economistas latino-americanos para

discutir as reformas necessárias para livrar a América Latina da estagnação, inflação, recessão

e dívida externa. Seria a promessa da prosperidade, tendo como base o neoliberalismo.

É preciso notar que o “Consenso de Washington” estabeleceu medidas consideradas

necessárias para o desenvolvimento da América Latina. As medidas foram divididas em três

níveis diferentes. A primeira está na ordem macroeconômica como meio de estabilização

monetária do país por uma política fiscal de austeridade que reduzisse os salários e a

quantidade de funcionários públicos, favorecesse a flexibilização do mercado, diminuísse

políticas públicas, restringisse o pagamento de contribuições sociais e a reforma da

previdência social, com o propósito de ampliar o tempo de trabalho e contribuição dos

trabalhadores, isso levaria ao equilíbrio das contas públicas.

Uma segunda medida, está relacionado a ordem microeconômica que é a desoneração

fiscal do capital presente no país como condição para aumentar o seu poder de competição

com outras economias vigentes. Junto com a redução de impostos para melhorar a

competitividade no mercado internacional, ocorre as desonerações fiscais, a flexibilização das

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leis trabalhistas, a diminuição da carga social com os trabalhadores e diminuição de salários.

Essas medidas estão voltadas para redução de custos dos produtos na sua produção e

fabricação para que pudessem ganhar a concorrência de outros países e atingir novos

mercados consumidores.

Como última medida, o “Consenso Washington” propõe o desmantelamento radical do

modelo econômico estabelecido na América Latina por considerá-lo retrógrado. Para desfazer

esta organização econômica seria necessário um pacote de reformas estruturais que se

resumiam na desregulação dos mercados, sobretudo, relacionados ao mercado financeiro e ao

trabalho. Além disso como medida dessa reforma estrutural estavam as privatizações de

empresas estatais, na abertura comercial dos países e na garantia do direito à propriedade

privada.

As medidas estabelecidas pelo Consenso de Washington se tornaram os princípios

norteadores das políticas econômicas e sociais que serão estabelecidas nos países periféricos.

Segundo Batista (1994) este processo ocorreu, principalmente, por meio dos empréstimos

feitos pelos governos dos diversos países da América Latina durante a década de 70, que

devido ao grande protecionismo econômico dos países desenvolvidos, fizeram empréstimos

sobre taxa de juros flutuantes para o seu desenvolvimento, o que possibilitou que ao longo do

tempo a dívida aumentasse com o sistema financeiro internacional, o que obrigava os países a

refinanciarem a dívida já existente ou fazer novos empréstimos para cobrir os rombos

deixados pelos altos juros.

O Consenso de Washington tornou-se a inspiração que faltava para que instituições

financeiras já existentes como Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento –

BIRD ou Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional – FMI desenvolvessem um projeto

político e social neoliberal. Ambas instituições segundo Fonseca (1998, p.2) possuíam papéis

diferentes quando surgiram, mas ao longo do tempo foram se alterando conforme as

necessidades. Inicialmente, ao FMI cabia fazer empréstimos de curto prazo para o

desenvolvimento da macroeconomia dos países, estes empréstimos eram realizados através de

exigências como “[...] a fixação de códigos de conduta política para os países credores e a

definição de pré-condições para os créditos do Banco”. Por outro lado, Banco Mundial

possuía um caráter de agência financiadora de longo prazo, com a viabilização de assistência

para elaboração de projetos econômicos e sociais em setores específicos.

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Quanto ao BIRD, sua função se modifica quando este se reorganiza como um órgão

político e, por meio de documentos apresentam sua concepção teoria-conceitual sobre a

política social e econômica, ou seja, emite orientações e novos modos de prosperidade. Esta

mudança realizada na função do Banco Mundial fez com que alguns conceitos começassem a

fazer parte da sua política como: “progresso”, “desenvolvimento sustentável", “realismo”,

“autonomia”, “equidade” e “pobreza”. O entendimento desses conceitos torna-se o caminho

para compreender o verdadeiro papel que o Banco passou a desempenhar nos seus países

membros.

Após a década de 1970 e início de 1980, a solução para redução da pobreza, na análise

de Fonseca (1998 p.4) passa a ser encarrada, não pelo desenvolvimento e crescimento da

nação, mas pelo aumento da produtividade dos pobres, o que possibilitaria o aumento de

distribuição dos benefícios gerados pelo progresso. Portanto, acorre uma inversão de papéis

onde o sujeito passa a ser o protagonista do seu próprio sucesso e, não o Estado. Esta

compreensão da diminuição da pobreza se dá pela lógica dos princípios neoliberais de Estado

mínimo, livre iniciativa, concorrência e livre mercado, ideias marcantes desse período.

Nesta nova compreensão de diminuição da pobreza, a partir da década de 80 o Banco

Mundial nos seus documentos e orientações desenvolvimentistas, volta-se para setores como a

educação, saúde e crescimento rural. Isso acontece pela valorização da iniciativa individual

acima da coletividade, sendo assim a saúde e a educação tornar-se-ia elementos fundamentais

para o aumento e melhoria da produtividade do trabalhador, o que levaria ao aumento salarial.

Além disso, os gastos com Educação nos anos iniciais fomentaram a procura por

níveis superiores de ensino, o que exigia maiores investimentos por parte do Estado. Na visão

do Banco, o aumento desregrado do ensino público de qualidade provocaria a ampliação do

desemprego entre os instruídos, por não haver mercado de trabalho para todos. Os

investimentos em saúde e educação colocam em perigo o desenvolvimento do sistema, isto é,

o remédio proposto, tornou-se seu próprio inimigo. Robert S. Mcnamara, então presidente do

Banco naquele período, alertou

É, talvez, a mais trágica ironia do nosso tempo que os melhores programas de saúde pública, empreendidos por motivos totalmente louváveis e humanitários, tenham provocado a explosão demográfica no mundo em desenvolvimento. O aumento da população, em virtude do decréscimo da taxa de mortalidade, precedeu a modernização e agora a obstrui. (McNAMARA, 1968, p.1055, apud FONSECA, 1998, p.9. tradução)

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Esta lógica, segundo Fonseca (1998, p.8) leva os organismos internacionais, na década

70, a desenvolver estratégias para diminuir a qualificação e os gastos com educação por meio

da formação “extraescolar ou não formal”, do “ensino de massas, via rádio e televisão e do

ensino programado”. Além disso já se discutia formas de dividir ou transferir os custos em

educação para as famílias.

O Banco Mundial indicava então que, os países mais pobres concentrassem o seu

planejamento educacional voltado para a educação rural e a formação extraescolar, com isso

diminuiria as aspirações futuras dos alunos a possíveis altos empregos da economia moderna.

Isso porque os países periféricos não tinham uma economia forte, e não conseguiriam trabalho

para todos os formados no ensino superior. Neste sentido, haveria que se criar mecanismos

que conseguissem avaliar e selecionar os melhores alunos para ingressarem nos níveis

superiores de ensino. Essa medida visava o equilíbrio entre educação, trabalho e economia do

Estado

Sugeriu-se, num estudo recente, que os jovens deveriam escolher modalidades de educação que se dirijam ao mercado e não às aspirações pouco realistas e as carreiras mais brilhantes. Para aumentar a chance de conseguir um emprego assalariado, os estudantes permanecem na escola o maior tempo possível e algumas vezes mais tempo do que o que seria exigido pelos empregos disponíveis. Em razão do custo pouco elevado da educação e da estrutura familiar numerosa, está se esforça para prover educação para a maioria dos filhos, quando na verdade deveria ficar satisfeita se apenas um dos filhos conseguisse emprego. (BIRD, 1980a, p. 9 e 46, apud FONSECA, 1998, p.10. tradução nossa)

A proposta de formação voltada para o mercado de trabalho, não se resumiria ao

aumento da produtividade, mas na formação a partir de valores presentes no próprio mercado

de trabalho, ou seja, formar hábitos, atitudes e valores para o melhor desempenho, respeito e

subordinação as hierarquias existentes.

Este contexto, o qual fizemos questão de analisar, é o que sustentará a política

econômica e ideológica do Banco Mundial após a década de 1990. Nesse período o combate à

pobreza, a afirmação do modelo de educação seletiva e o apoio ao setor privado são ainda

mais reforçados pelas orientações internacionais. A intensidade desse processo culminou na

organização da Conferência Mundial de Educação para Todos realizada na Tailândia em

1990, envolvendo mais de 155 países e 150 instituições não-governamentais e,

posteriormente, na Declaração de Nova Delhi realizada em 1993, cuja intenção foi traçar

metas e disseminar modelos para a reforma da educação.

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Interessante notar, também, que na leitura das agências multilaterais o avanço e

modernização da educação não estava no desenvolvimento humano a partir de valores e

reflexões, mas na capacidade de adaptação tecnológica de materiais utilizados para o processo

educacional. Isso impulsionou maior atenção aos financiamentos voltados para a compra de

materiais didáticos, livros e a construção de bibliotecas.

Esses e outros elementos formaram a base para a construção dos projetos econômicos

e educacionais de diferentes países, tendo em vista a organização sistêmica que define

princípios, táticas e mecanismos de controle nas decisões nacionais por órgãos internacionais.

Desta forma, a força dá espaço a chantagem, que implica em fazer escolhas para pertencer ao

sistema seguindo a cartilha programada e, tirar dessa relação, maiores benefícios. Por outro

lado, os países podem não aceitar a sujeição, o que implica perder a proteção e as vantagens

na economia, tecnologia e financiamento.

Os princípios da lógica neoliberal deixam de ser apenas uma ideologia econômica,

passando a nortear as políticas educacionais e sociais. Mas a educação básica não foi o único

alvo. Nas décadas de 1990 e 2000, a formação docente foi remodelada para atender as

demandas de um Estado mínimo para as políticas sociais e humanizadoras.

Considerações Finais

Esta reflexão objetivou o esclarecimento de que o neoliberalismo ao longo da história

deixou de ser uma teoria econômica para tornar-se uma ideologia hegemônica que constrói

uma lógica que passa a orientar a vida humana, seja na moral, na política, na economia, na

religião, na educação e na cultura. As palavras concorrência, individualismo, egoísmo,

utilitarismo, eficiência, lucro, meritocracia, Estado mínimo, mercantilização e hedonismo

acabam se tornando palavras chaves que moldam a organização social e a consciência coletiva

da sociedade. Assim sendo, o neoliberalismo se tornou uma ideologia que perpassa a

realidade econômica e social da crise do sistema capitalista. Assim sendo, o neoliberalismo

não se hegemonizou na sociedade apenas porque Adam Smith, Hayek e Milton Friedman e

outros teorizaram uma organização econômica da sociedade, mas principalmente porque

Governos e Instituições Econômicas Internacionais transformaram o pensamento dos

economistas em modelo de como o Estado e a sociedade deveria organizar-se. O pensamento

neoliberal deixa assim o campo do idealismo e se torna a realidade concreta que organiza e

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molda a vida social dos sujeitos, suas condutas e valores num processo de alienação, nem

sempre percebidos pelos trabalhadores.

Referências

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SMITH, Adam. Uma Investigação Sobre a Natureza e Causas da Riqueza das Nações.

(Coleção Os Economistas). Vol.2, 6. ed., São Paulo: Editora Nova Cultural, 1996b.

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II RESUMOS E RELATOS DE EXPERIÊNCIA

EIXO TEMÁTICO 1:

ESCOLA PÚBLICA DO CAMPO, PRÁTICAS PEDAGÓGICAS,

PROCESSOS COLETIVOS E INICIATIVAS ESTUDANTIS

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APONTAMENTOS PARA UMA EXPERIÊNCIA FUTURA DE ENSINO

COLABORATIVO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Michaelli Maria Pires1

Margarette Matesco Rocha 2

Eixo Temático 1: Escola pública do campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e

iniciativas estudantis

Palavras-chave: Ensino Colaborativo; Inclusão; Síndrome de Down.

A Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva preconiza a participação

das pessoas com deficiência nos mesmos espaços escolares, com o mesmo direito de

participar de todas as atividades, tendo as suas diferenças reconhecidas e atendidas no

decorrer de todo o processo de escolarização (MIRANDA, 2008; GLAT, 2005). A inclusão na

educação infantil pode ser considerada um momento da escolarização no qual se estruturam as

bases para o desenvolvimento global da criança em seus aspectos físicos, psicológicos,

intelectuais e sociais, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL, 1996).

Assim, a inclusão nessa fase de vida é de extrema importância, devendo priorizar a

valorização do educando e a participação ativa em todas as atividades escolares, considerando

e atendendo as suas características peculiares. Dentre as crianças com deficiência, aquelas

com Síndrome de Down (SD), geralmente, iniciam a escolarização na educação infantil com o

diagnóstico concluído e quando atendidas precocemente em suas necessidades há melhora no

seu desenvolvimento intelectual, físico e social, além do preparo para a alfabetização

(DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994). Esse trabalho origina-se da pesquisa de

Iniciação Científica Voluntária (ICV) na qual a proposta era acompanhar a inclusão de duas

crianças com SD na Educação Infantil em uma cidade do Sudoeste do Paraná.

1 Graduanda do curso de Pedagogia UNIOESTE/ Bolsista ICV. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação Especial/Docente UNIOESTE-Francisco Beltrão. E-mail: [email protected]

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Foram realizadas entrevistas com os pais, com as professoras e com a pedagoga para

conhecer a opinião deles sobre a inclusão na educação infantil. Também foram feitas

observações sistemáticas para identificar as interações entre as crianças com SD, seus pares e

professoras. Os dados obtidos junto às professoras indicaram que muitas vezes elas se

consideravam inaptas ou até mesmo impossibilitadas de realizar atividades que incluíssem

efetivamente as alunas, questionando as adaptações necessárias, a forma de trabalhar e

interagir com elas.

A partir desses dados, percebemos a importância de realizar um trabalho de formação

e apoio às professoras, tendo por objetivo auxiliá-las para a efetivação da inclusão dessas

crianças, bem como para prepará-las para futuras inclusões. A necessidade de um trabalho

junto às professoras justifica-se, por um lado, pela falta de formação inicial e continuada dada

a esses professores e, por outro, pela ausência de salas de recursos multifuncionais alojadas

dentro dos CMEIS, o que ocasiona o distanciamento entre os professores do ensino regular e

professores da educação especial, refletido no trabalho solitário do professor do ensino

regular. Uma alternativa viável para superar esses desafios é o Ensino Colaborativo,

entendido como “um modelo de prestação de serviço de educação especial no qual um

educador comum e um educador especial dividem a responsabilidade de planejar, instruir e

avaliar a instrução de um grupo heterogêneo de estudantes” (MENDES; ALMEIDA;

TOYODA, 2011, p. 85).

Para os autores, o ensino colaborativo emergiu como uma alternativa aos modelos de

sala de recursos, classes especiais ou escolas especiais, pressupondo a presença do professor

especializado na classe comum para colaborar com o professor do ensino regular e apoiar a

escolarização de estudantes com deficiência em classes comuns. Nessa proposta, a

intencionalidade reside na troca de saberes entre os professores do ensino regular e da

educação especial, buscando segundo Rabelo (2012, p. 67) “conhecimentos pedagógicos e

proposições didáticas para superar os problemas que enfrentam para desenvolver uma

escolarização qualificada”.

Considerando a proposta do ensino colaborativo e a necessidade observada no

decorrer da nossa pesquisa, a proposta futura será a implantação do ensino colaborativo nesse

CMEI. Para a efetivação da mesma, alguns encaminhamentos/estágios são sugeridos por

Gately e Gately (2001, apud RABELO, 2016, p. 63) e deverão ser seguidos: 1) Comunicação

inicial: Que se refere ao primeiro contato com a proposta; 2) Comprometimento: Se dá na

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troca de conhecimento e é onde o processo de mudança começa; e 3) Estágio colaborativo:

Aqui o conhecimento é internalizado e o ensino colaborativo se efetiva.

Todos estes se referem as etapas pelas quais os professores da educação especial e da

educação regular passam, para alcançar o ensino colaborativo. Dentro destes estágios, existem

componentes a serem analisados: a) a comunicação interpessoal: que se refere a comunicação

entre os profissionais; b) o arranjo físico: abrange a organização dos materiais, professores e

alunos; c) familiaridade com o currículo: envolve a estrutura, finalidade e desenvolvimento

do mesmo; d) metas e modificações no currículo: apontam os objetivos específicos para os

alunos e são realizadas anteriormente ao início das aulas; e) planejamento instrucional: se

refere as mudanças e a responsabilidade que os professores compartilham de ensinar a turma

toda; f) apresentação instrucional: é o trabalho desenvolvido, engloba os encaminhamentos e

a estruturação das atividades; g) gerenciamento da aula: engloba as estruturas e relações; h)

processo de avaliação: são os sistemas de avaliação individual dos alunos. Todos estes itens

passam pelos três estágios e evoluem gradativamente, pelo entendimento, do que é o ensino

colaborativo e os componentes necessários para sua construção.

Considerando as dificuldades encontradas pelos docentes no processo educativo, é

necessário ressaltar, que no geral, as formações iniciais e continuadas não fornecem os

subsídios necessários para a discussão e intervenção com a população alvo da educação

especial. Dessa forma vemos a necessidade de aplicação de propostas colaborativas desde a

Educação Infantil, para que se construam bases sólidas para as fases posteriores da

escolarização dessas crianças e proporcionando aos professores a aquisição de conhecimento

sobre as especificidades dos alunos para a sua efetiva inclusão.

Referências

BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB

9.394, de 20 de dezembro de 1996.

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA: Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das

Necessidades Educativas Especiais, 1994, Salamanca-Espanha

GLAT, R.; FERNANDES, E. M. Da educação segregada à educação inclusiva. Revista da

Educação Especial, n. 1 Out/2005.

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MENDES, E. G.; ALMEIDA, M. A.; TOYODA, C. Y. Inclusão escolar pela via da

colaboração da entre educação especial e educação regular. Educar em Revista, n. 41, p. 81-

93, jul./set. 2011.

MIRANDA, A. A. B. Educação especial no Brasil: desenvolvimento histórico. Cadernos de

História da Educação. n.7 – jan./dez. 2008, p. 29-44.

RABELO, L. C. C. Ensino Colaborativo como estratégia de formação continuada de

professores para favorecer a inclusão escolar. 2012. 200f. Dissertação (Mestrado em

Educação Especial). Universidade Federal de São Carlos, 2012.

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ARTE E MATEMÁTICA, UMA APROXIMAÇÃO PRÁTICA

Regiane Maria Kielba 1

Raquel Antunes da Silva2

Eixo Temático 1: Escola Pública do Campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e

iniciativas estudantis

Palavras-chave: Arte; Interdisciplinaridade; Matemática.

Introdução

Cada vez mais tem-se afirmado sobre os benefícios do uso da interdisciplinaridade no

processo de ensino aprendizado dos alunos durante as aulas. No entanto, na prática, ainda

pode-se afirmar que este tema é uma novidade no chão das escolas. Percebemos esta realidade

a partir da experiência docente na Educação Básica.

Pode-se dizer que a fragilidade neste processo, por vezes se dá devido a falta de

compreensão das possibilidades do trabalho interdisciplinar, ou seja, os conteúdos estão

estruturados especificamente por disciplinas, mas no contexto geral complementam-se umas

às outras.

Buscando romper com este entrave, uma professora de Matemática e uma professora

de Arte, desenvolveram o planejamento didático interdisciplinar entre os conteúdos de

Sistemas Lineares e Arte Linear aplicado na turma do segundo ano do Ensino Médio do

Colégio Estadual do Campo Paulo Freire do município de Francisco Beltrão/PR.

1Licenciada em Matemática – UTFPR Campus Pato Branco. Especialista em Educação do Campo Docente no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire. E-mail: [email protected] 2 Licenciada em Artes – FAMPER/PR. Especialista em História, Arte e Cultura - UEPG/PR. Docente no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire. Faculdade de Ampére – FAMPER. E-mail: [email protected]

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Desenvolvimento

Exercer as inúmeras possibilidades de trabalhar conteúdos de forma interdisciplinar,

como apontado por Richeter “a inter-relação entre duas ou mais disciplinas, sem que nenhuma

se sobressaia sobre as outras, mas que se estabeleça uma relação de reciprocidade e

colaboração, com o desaparecimento de fronteiras entre as áreas do conhecimento” (2008, p.

85), são maneiras de contrapor os problemas existentes no modelo de trabalho individual, que

por vezes, pode ser interpretado como um problema, conforme alertado por Santos e Teles,

A divisão do conhecimento em disciplinas, no século XIX, separou a ciência das significações históricas e contextuais, distanciando-a da realidade complexa. Dessa fragmentação do conhecimento surge o especialista, incapaz de dialogar, globalizar e contextualizar os saberes (2012, p. 03)

Frente ao problema exposto pelos autores é evidente a necessidade do trabalho

integrado que permita ao aluno a autonomia para dialogar interdisciplinarmente com os

conteúdos, se apropriando dos conceitos presentes diante das problemáticas expostas.

Diante deste mesmo contexto, no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire – E.F.M, o

qual atualmente vive um Processo de Rearticulação da Educação do Campo na Modalidade de

Educação do Campo, prezando-se pela busca da autonomia do educando, que os alunos

desenvolveram uma atividade prática aplicando os conhecimentos adquiridos sobre Sistemas

Lineares e Arte Linear, durante as aulas de Matemática e Arte.

A Arte Linear é uma expressão artística contemporânea, que se desenvolveu a partir

do uso da linha como material básico, ou seja, é uma produção artística resultada da

manipulação de linhas para construção de imagens figurativas ou abstratas. Atualmente

encontramos diversos suportes com diversas técnicas aplicadas para a Arte Linear, no entanto,

acredita-se que sua primeira aparição tenha tido relação com estudos matemáticos da

educadora Mary Everest Boole (1832-1916).

Pérez Sedeño, (2011) apud Blanco (2014 p. 13) menciona que Bolle criou um pequeno

artefato manual para que seus alunos pudessem melhor compreender a geometria dos ângulos

e espaços. Para a atividade Bolle utilizava-se de linhas, sem a intensão de criar uma nova

técnica artística para os seus alunos se expressarem, mas sim, explorar em uma técnica visual

os conceitos matemáticos presentes, permitindo uma melhor compreensão de seus alunos para

com o conteúdo.

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Para que os alunos pudessem melhor compreender essa aproximação da Arte com a

Matemática, foi proposto uma atividade, utilizando-se como suporte uma madeira quadrada

de 30 cm de lado, com pregos dispostos a 2 cm de distância distribuídos por toda a base de

madeira. Neste espaço os alunos, utilizando barbantes coloridos, desenvolveram os conceitos

relacionados ao plano cartesiano e a interpretação geométrica de um sistema linear 2x2,

construindo as retas que compunham o sistema linear em questão, para posterior análise e

classificação do mesmo quanto ao número de soluções.

Após a compreensão do conceito de linear, de formação e posições relativas entre retas

e da interpretação geométrica de sistemas lineares 2x2, foi a vez dos alunos pensar o mesmo

problema construindo efeitos visuais na base de madeira, sobreposta com pregos.

Neste momento, coube aos alunos fazer a escolha de um desenho base para esta

criação. A autonomia do aluno, mostrou-se presente também no ato da confecção do

geoplano, momento em que os alunos buscaram na propriedade que residem os recursos,

assim como, utilizaram das relações de trabalho com os familiares para a construção do

material. Durante esse processo, os conceitos matemáticos como medidas de comprimento,

ângulos – em especial o ângulo reto, distância entre dois pontos foram utilizados e colocados

em prática, reforçando a importância da matemática para o dia a dia do educando.

Na última etapa, foi a vez dos educandos utilizar-se do conteúdo matemático para

desenvolvimento de um quadro artístico, utilizando do mesmo suporte, uma base quadrada,

sobreposta com pregos, pelos quais transpassaram linhas coloridas sobre as retas lineares. Os

resultados visuais foram diversos.

Considerações Finais

Através do trabalho realizado com o geoplano, os alunos puderam visualizar a

disposição das retas que compõe um sistema linear 2x2, seja ele possível determinado,

possível indeterminado ou impossível e relacionar a interpretação geométrica ao número de

soluções do sistema linear.

O resultado visual oriundo da expressão artística encanta o olhar do expectador e o

permite compreender que o resultado da técnica utilizada para a prática relaciona-se a teoria

estudada anteriormente, bem como, fixa as relações e aproximações existentes entre

conteúdos diversos.

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Referências

BLANCO, V. C. Educación Matemática desde una Perspectiva Feminista. Algunas ideas

para aplicar en el aula. Curso de Postgrado “Ciencia, Tecnología y Sociedad: conocimiento y

participación”. CSIC, 2014

RICHTER, I. M. Multiculturalidade e interdisciplinaridade. In: BARBOSA, A. M. (Org.).

Inquietações e Mudanças no Ensino da Arte. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

SANTOS, L. F.; TELES, R. A. M. Simetria e Artes Visuais em livros didáticos de matemática

para os anos iniciais do Ensino Fundamental. Bolema, Rio Claro (SP), v. 26, n. 42A, p. 291-

310, abr. 2012.

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ESCOLA PÚBLICA DO CAMPO E LUTA PELO NÃO-FECHAMENTO: GANHOS E

APRENDIZADOS QUE FORTALECEM A ESCOLA

Vilson Jaques de Oliveira1

Eixo Temático 1: Escola Pública do Campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e iniciativas estudantis.

Palavras-chave: Escola do Campo; Fechamento de Escolas; Pedagogia de Projetos.

.

Este texto trata de alguns aspectos da observação de estágio do 3º ano do Curso de

Pedagogia da UNIOESTE – campus de Francisco Beltrão - PR, realizado no ano de 2018.

Destacam-se os desafios enfrentados pela escola pública de campo no que concerne aos

enfrentamentos com os governos pelo não-fechamento e às mudanças que dali decorrem

instituindo-se com ganho ao Projeto Político pedagógico (PPP) da escola.

O estágio foi realizado na escola do campo Juscelino Kubitschek, localizada na

comunidade do Rio Tuna - Francisco Beltrão - PR, com 150 alunos matriculados, em sua

maioria alunos vindos de famílias agricultoras, outros que moram na cidade, haja vista que a

povoação urbana já está muito próxima da comunidade em que a escola está localizada.

A escola funciona em dois turnos (matutino e vespertino), no período da manhã

adolescentes do 6º ao 9º ano e no período da trade, crianças da educação infantil de 4 e 5 anos

(pré-escola) e o Ensino Fundamental I (EF I).

Segundo informações da observação do estágio na escola e o que consta no PPP, a

equipe docente é formada por diretora, coordenadora pedagógica, secretária, seis professores

que atuam educação infantil e nos primeiros ciclos do EF I, três professores que trabalham as

disciplinas de Arte, Inglês, Educação Física, Literatura, Ciências Naturais. Ainda tem-se sala

de recursos multifuncionais com uma professora apoio, oito professores do 6º ao 9º ano, três

serventes e uma merendeira. Deste total de professores que atuam na escola, três são

estagiários e os demais possuem graduação e são concursados.

1Acadêmico do curso de Pedagogia - UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão – PR; E-mail: [email protected].

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Nas entrevistas realizadas com a equipe diretiva da escola relatou-se que no ano de

2003, a Secretaria Municipal de Educação convocou uma reunião, para qual estavam

convidados pais, mães responsáveis pelos alunos da escola e, também, de forma estratégica

convidou algumas pessoas com o objetivo de convencer a comunidade escolar da necessidade

e de possíveis benefícios para o fechamento desta escola. Relata-se que ao mesmo tempo em

que se convocavam algumas pessoas mais ligadas à situação política daquele momento,

também se convocaram outras mais ligados a escola e houve uma mobilização para alertar

toda a comunidade escolar sobre as consequências em caso de fechamento da escola.

Ainda conforme os relatos, a reunião se realizou na própria escola e contou apenas

com a presença de um assessor do então prefeito e a Secretária da Educação Municipal,

juntamente com a comitiva de imprensa e outras pessoas ligadas ao poder público.

Descreve-se que ao iniciar a reunião a direção da escola esclareceu a todos os

objetivos daquele encontro deixando claro que já se sabia quais eram as motivações daquele

chamado da Secretaria de Educação e, ao mesmo tempo, já demarcaram sua posição contrária

ao fechamento da escola, conscientizando todos os presentes das consequências que esta ação

iria gerar.

Na sequência, o assessor do prefeito juntamente a Secretária da Educação Municipal,

começaram a discursar sobre a necessidade e os benefícios que seriam gerados com o

fechamento da escola. Em contrapartida, a direção da escola questionou alguns pontos mal

esclarecidos por eles, e desenrolou-se uma certa discussão entre a secretária, o assessor do

prefeito e a direção da escola.

Neste momento alguns pais, mães e responsáveis ali presentes começaram a se

manifestar a favor da manutenção da escola na comunidade, porém, ainda assim o assessor do

prefeito continuou no intuito de convencer a comunidade, mas não conseguiu.

Solicitou-se então ao referido assessor que se retirasse da comunidade, já que, com

algumas raras exceções, a comunidade toda se pôs contra ao discurso do sujeito em relação à

necessidade de fechamento da escola. Toda a comitiva enviada até a comunidade em nome do

governo municipal abandonou o local, sem êxito no propósito de convencer a comunidade em

aceitar o fechamento da escola.

A escola continuou seu funcionamento e, como tratam os relatos, este evento

resultou teve um resultado que fez a escola avançar, por exemplo, a luta das famílias em

contribuir para o bom andamento da escola aumentou, pois o momento de impasse mobilizou

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e envolveu a quase totalidade das famílias e até os alunos passaram a valorizar cada vez mais

o seu espaço escolar, pois perceberam a luta desenvolvida pelas famílias e professores em

favor de sua escola.

Depois deste acontecimento a escola buscou o apoio da UNIOESTE – campus de

Francisco Beltrão - PR, a qual desenvolveu um projeto de extensão que contribuiu para o

fortalecimento e ampliação da escola2. A partir desta parceria, conforme consta no PPP, com

os anos iniciais do EF I, a escola passou a desenvolver a pedagogia de projetos. Esta

Pedagogia, parte do conhecimento prévio dos alunos e, com base nos conteúdos da proposta

curricular são desenvolvidos projetos de trabalho.

O trabalho metodológico de sala de aula com a pedagogia de projetos, se dá no

processo em que professor e alunos desenvolvem um mapa conceitual, com uma abordagem

interdisciplinar, a qual envolve todas as áreas de conhecimento do currículo escolar. O mapa é

montado no coletivo em sala de aula e exposto para a turma durante o período em que se

trabalha o tema, que pode variar entre duas semanas e um mês.

A maior parte das ideias que compõem o mapa parte das iniciativas dos alunos e são

complementadas de forma mais específica pelo professor regente da turma.

De acordo com o relato da coordenadora pedagógica durante as observações do

Estágio III, estas são ações que fomentam a autonomia, a coletividade e outras iniciativas dos

alunos, pois leva-os a compreender a importância do trabalho coletivo e das possibilidades de

elaborar e desenvolver projetos, a partir desta base trabalhada na escola.

O planejamento da aula do professor é elaborado com referência no mapa conceitual

produzido no coletivo da sala de aula. A prática pedagógica ocorre de forma segura e

produtiva, haja vista que, os alunos vão compreendendo a importância do aprofundamento

científico, em questões que eles mesmos levantaram.

Além disso relatou-se que a escola possui algumas características próprias, pensadas

com o objetivo de incluir toda a família no espaço escolar e no processo de ensino-

aprendizagem. Um destes exemplos é quando a escola propicia a socialização dos

conhecimentos adquiridos por parte dos alunos, com o intuito de aprimorá-los através de

2 O primeiro momento do projeto se desenvolve no Programa de Extensão Universitária “Universidade Sem Fronteiras”, Sub-programa “Apoio às Licenciaturas”, da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI). Depois deste período, a escola passa a ser acompanhada por um projeto de Extensão em Formação continuada de Professores do Grupo de Pesquisa Representações, Espaços, Tempos e Linguagens em Experiências Educativas (RETLEE) - UNIOESTE – campus de Francisco Beltrão - PR

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trocas de experiências. Não apenas isto, mas segundo os relatos da equipe diretiva, é visível a

mobilização dos alunos em tomarem iniciativas próprias para a elaboração, organização e

apresentação dos conhecimentos que já se apropriaram e isto fortalece a comunidade escolar,

ao mesmo tempo em que valoriza a identidade da escola pública do campo.

Referências

PREFEITURA MUNICIPAL DE FRANCISCO BELTRÃO. Projeto Político Pedagógico da

Escola Municipal Juscelino Kubitschek. Secretaria Municipal de Educação. Francisco

Beltrão, Pr, 2015.

UNIOESTE – Campus de Francisco Beltrão. Curso de Pedagogia. Relatório de Observação

de Estágio III. Disciplina de Prática de Ensino e Pesquisa sob a forma de Estágio

Supervisionado III. Francisco Beltrão, 2018.

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GÊNEROS TEXTUAIS A PARTIR DA REVOLTA DOS POSSEIROS

Aline Bernartt1

Eixo Temático 1: Escolas Públicas do Campo, Práticas Pedagógicas, processos coletivos e

iniciativas estudantis.

Palavras-chave: Gêneros textuais; Revolta dos Posseiros; Sudoeste do Paraná.

O presente trabalho é resultado de uma construção de conhecimento, do curso de

formação realizado no Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes, de Itapejara D’Oeste, PR,

desenvolvido com a parceria da UNIOESTE e ASSESOAR, de Francisco Beltrão.

A partir do curso de formação passamos a pensar em nossa escola uma mudança em

nossas práticas pedagógicas, para que estas fossem mais voltadas para a realidade da vida no

campo, afinal a maioria dos alunos que estudam no Colégio E. do Campo Carlos Gomes

residem e trabalham em propriedades rurais da comunidade de Barra Grande e comunidades

vizinhas.

A “Revolta dos Posseiros” foi escolhida pelo coletivo escolar como tema pelo qual os

conteúdos curriculares seriam trabalhados no primeiro trimestre de 2018. Escolhemos este

tema por ter sido um acontecimento que marcou a região Sudoeste do Paraná na luta pela

terra, e porque muitos dos colonizadores que habitavam a comunidade de Barra Grande em

meados de 1957 lutaram por suas propriedades contra as companhias de terra.

Primeiramente foi realizada uma contextualização interdisciplinar sobre o período

histórico da Revolta por meio do documentário Revolta de 57/ Revolta dos Colonos/

Posseiros – Sudoeste do Paraná e por meio de depoimentos de moradores da comunidade

local que vivenciaram o ocorrido. Em seguida, cada disciplina iniciou o aprofundamento de

seus conteúdos. Em Língua Portuguesa, nas turmas de 7º, 8º e 9º ano do Ensino Fundamental,

foram trabalhadas as músicas: “Revolta dos Posseiros” de Nino Pasa e a música “Jardim das

Araucárias” da Banda Tiregrito, além de poesias produzidas pelas professoras sobre o tema.

1 Professora de Língua Portuguesado Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes – Ensino Fundamental/ SEED/ PR. E-mail: [email protected].

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Na sequência, trabalhou-se a estrutura dos gêneros textuais poesia e música, figuras de

linguagem e de som, musicalidade, coesão e coerência, pontuação, ortografia.

Todo esse estudo resultou na produção de poesias pelos estudantes, professores e

funcionários da instituição escolar com o tema “Revolta dos Posseiros”. Tais produções serão

publicadas nas edições do jornal escolar “Plantão do Campo” bem como em um livro de

poesias, os quais estão sendo realizados em parceria com a Assesoar e Unioeste.

Os principais objetivos da realização deste trabalho voltado à historicidade da

comunidade na disciplina de Língua Portuguesa foram:

- Possibilitar a aquisição dos conteúdos curriculares propostos a partir da realidade

local do estudante;

- Identificar as características do gênero textual poema;

- Interpretar textos dos gêneros poema e letra de música sobre o tema proposto:

Revolta dos Posseiros;

- Compreender e identificar figuras de linguagem nos gêneros textuais estudados;

- Refletir sobre a Revolta dos posseiros a partir dos gêneros textuais lidos;

- Produzir textos do gênero poema sobre a Revolta dos Posseiros.

Para o processo de avaliação de aprendizagem considerou-se como critério de

avaliação o desempenho do estudante em relação à capacidade de:

- identificação das características dos gêneros textuais poesia e letra de música;

- expressar-se por meio da palavra escrita utilizando-se de: figuras de linguagem e

de som, musicalidade pontuação e ortografia adequadas;

- escrita com coesão e coerência levando em consideração o tema proposto de

redação: A Revolta dos Posseiros;

Como instrumento de avaliação foi utilizado a produção de poesia sobre o tema

estudado. As poesias produzidas pelos alunos serão publicadas em um livro de poesias

que será publicado em parceria com a ASSESOAR.

Outras informações: O Colégio Estadual do Campo Carlos Gomes e Escola

Municipal do Campo Valentim Biazussi que compartilham o mesmo prédio escolar

localizado na comunidade de Barra Grande, Itapejara D´Oeste, estão realizando, desde

2017, formação pedagógica com seus profissionais em parceria com a Unioeste e

Assesoar, entidades que integram a Articulação Sudoeste Por Uma Educação do Campo.

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A formação tem como objetivo a construção coletiva de um projeto pedagógico específico

para as escolas no campo a partir do contexto local.

Como fruto da formação pedagógica tem-se um Plano de Ação das escolas no

campo que contempla quatro dimensões: Dimensão 1: Evento – “Mostra de Saberes e

Sabores do Campo”; Dimensão 2: Produção – “Jornal Plantão do Campo”;

Dimensão 3 – Práticas Pedagógicas de Sala de Aula – “Intercâmbio de Saberes”; e

Dimensão 4: Práticas Pedagógicas Extra-Sala de Aula – “Laboratório

Agroecológico”.

A experiência aqui apresentada está situada na Dimensão 3: Práticas

Pedagógicas de Sala de Aula – “Intercâmbio de Saberes” e integra um conjunto de

ações pedagógicas exitosas que estão em processo de construção nessas instituições

escolares no campo.

Referências

Documentário: Revolta de 57/ Revolta dos Posseiros/ Colonos – Sudoeste do Paraná.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=se0lDQU--og. Acesso em: 17 out. 2018.

TIREGRITO. Música: Jardim das Araucárias. Disponível em:

https://www.vagalume.com.br/tiregrito/jardim-das-araucarias.html - Acesso em 17/10/2018.

Vídeo clip da música Jardim das Araucárias. Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=BZ6IMHjQzAo. Acesso em: 17 out. 2018.

PASA, Nino. Música: Revolta dos Posseiros. Vídeo disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=jN809spVIHg. Acesso em: 17 out. 2018.

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IDENTIFICAÇÃO DE PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO EM CURSO NAS

ESCOLAS: MAPAS DE CONTEÚDOS E CONCEITOS

Cecília Maria Ghedini1

Nubia Andrade da Silva2

Eixo Temático 1: Escolas Públicas do Campo, Práticas Pedagógicas, processos coletivos e

iniciativas estudantis.

Palavras-chave: Educação do Campo. Formação de professores. Práticas Pedagógicas.

Este texto tem como objetivo apresentar o processo de produção dos “Mapas de Conteúdos

e Conceitos” utilizados no Planejamento Coletivo e Interdisciplinar, na relação com a formação

continuada dos professores de escolas públicas do campo. Esta perspectiva justifica-se por estar

realizando um trabalho de Iniciação Científica Voluntária (ICV), no qual pesquisa-se a identificação

de práticas de Educação do Campo em curso nas Escolas Públicas do Campo3.

Tanto a Educação Rural quanto a Educação do Campo produziram cultura ao longo destes

anos no país e, na atualidade, embora a lei seja prescritiva e torne a Educação do Campo política

pública, percebe-se “um fosso” entre o que a lei diz, a forma como ela é compreendida nas escolas e

mais ainda, como chega na sala de aula, como infere no ensino e na aprendizagem das crianças e

adolescentes que vivem no campo. Caldart (2012) destaca a Educação do Campo como um tipo de

consciência de mudança e, esta dialética, colocada em curso na formação dos professores a partir

das práticas pedagógicas nas escolas, tem este fator como determinante, pois é uma tentativa de

mudar o que, em muitos momentos, parece ser imutável.

1 Doutorado, Curso de Pedagogia, Centro de Ciências Humanas, UNIOESTE - campus de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected]. 2 Graduanda em Pedagogia, Bolsista de Iniciação Científica Voluntária, Curso de Pedagogia, Centro de Ciências Humanas, UNIOESTE - campus de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected] 3 Este trabalho situa-se no Projeto de Extensão “Fortalecimento das Escolas Públicas do Campo da Região Sudoeste do Paraná na perspectiva da Educação do Campo: Rearticulação da Escola e Rede de Educadores”.

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Na perspectiva dessa mudança produziram-se algumas estratégias, como esta que pensa em

produzir um material que registre o processo de modo que, ao trocar de escola, o professor que

chega e encontra o processo de trabalho em andamento, tivesse um material para inserir-se. Outra

motivação foi subsidiar o Planejamento Coletivo Interdisciplinar operacionalmente pois, faltava um

“lugar” de onde se enxergasse os conteúdos “juntos”, pois o ponto de partida são os conteúdos e

conceitos científicos de cada disciplina em uma mesma série. A produção de um instrumento para

superar este descompasso passou a ser uma busca na formação continuada de professores.

O Planejamento Coletivo Interdisciplinar, como forma de organização ativa as

potencialidades coletivas, estabelece vínculos entre os professores de cada turma. No entanto, o

espaço “normal” da escola é muito restrito, por isso criou-se a Jornada de Saberes e Planejamento,

que acontece trimestralmente. Nela, os professores planejam e os estudantes têm oficinas com

aspectos das disciplinas ou assuntos que não estão diretamente contemplados no currículo.

No processo de formação continuada, no Grupo de Estudos Permanente da Rede de

Formação de Educadores e Fortalecimento das Escolas Públicas do Campo: Caminhos de

Conhecimento e Resistência (REFOCAR), em 2017, se tomam as produções dos Planos de

Trabalho Docente (PTDs) já utilizados nas disciplinas nos anos anteriores e se passa a trabalhar em

grupos de professores por disciplinas, com o que havia sido produzido no PTD de cada disciplina e

série. Vai-se então melhorando e complementando a síntese que iria compor o que se chamou de

“Mapa de Conteúdos e Conceitos” de cada série, tendo como base as Diretrizes Curriculares

Estaduais (DCEs), (PARANÁ, 2008) com apoio em livros didáticos e paradidáticos.

Estes “Mapas de Conteúdos e Conceitos” 4 foram organizados em forma de diagramas que

apresentam os Conteúdos Estruturantes, Básicos, Específicos e seus conceitos, num mesmo espaço,

por isso passou a ser chamado de “Mapa”. A proposta é que no planejamento se possam articular as

relações de conhecimento entre os conteúdos de uma mesma série, aproximando o olhar

fragmentado de cada disciplina na tentativa alcançar a totalidade.

Esta forma de tratar o conteúdo escolar permite pensar sobre suas relações de

conhecimento, ou seja, no coletivo que une os professores de cada disciplina de uma mesma série, a

visualização e compreensão dos conteúdos e os conceitos que os compõem, possibilita tomar

4 A partir deste ponto, este escrito toma por base as produções de Ghedini e Berté (2018), utilizando-se do material que compõe o Caderno “Escolas Públicas do Campo’ – Volume I.

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decisões sobre as “aproximações” possíveis destes conteúdos e conceitos, seus “pontos de

encontro” ou interdisciplinaridade desde esta objetividade.

Estas “aproximações” têm como objetivo “ensinar” um conhecimento menos

fragmentado, compreendendo que as disciplinas são formas que se encontrou para organizar o

conhecimento, mas que não são estanques, há uma totalidade do conhecimento que as sustenta. Esse

processo, no que concerne ao planejamento, busca retomar a ênfase na apropriação dos conceitos

científicos, compreendendo-os como “ferramentas do pensamento” (SAVIANI, 2003), diretamente

relacionados ao conteúdo em cada disciplina. De modo geral, não é uma tarefa comum ao se

desenvolver o planejamento pois, normalmente, listam-se os conteúdos de cada série e, depois

disso, a ênfase maior está na atividade a ser desenvolvida e não na apropriação do conceito. Por

exemplo, a pergunta: “que atividade vou fazer com a tal série?” acaba sendo, na maior parte das

vezes, a principal preocupação dos professores.

Os primeiros resultados das movimentações do coletivo de professores em torno do

Planejamento Coletivo Interdisciplinar, tratando das relações entre os conteúdos escolares, os

conceitos e o conhecimento, permitiu que se problematizassem diante de conteúdos de diferentes

disciplinas, sustentados numa lógica maior de conhecimento, categoria ou conceito. Por isso, do

ponto de vista da formação de professores, o processo de formação, produção do Caderno e as

relações dali produzidas, permitiu um confronto com saberes e não-saberes em relação às

disciplinas, desvelou a necessidade de formação a fim de compreender que o trabalho de sala de

aula é um momento de levar o estudante a apropriar-se de conceitos científicos.

Como já se conhece pela especificidade da escola, o ensino dos conteúdos não têm apenas

um fim em si mesmo, mas se insere num projeto de formação humana e de educação de pessoas,

que têm a escola como espaço organizado socialmente com este fim. Neste sentido, há que se ter

um projeto de escola, de ser humano e de sociedade em torno do qual todo o trabalho pedagógico e

o processo de ensino se organizam, como é o caso da Educação do Campo, que tem como primeiro

princípio proporcionar um conhecimento integral aos estudantes.

Referências

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CALDART, Roseli Salete. Educação do campo. In: CALDART, R. S.; PEREIRA, I. B.;

ALENTEJANO, P.; FRIGOTTO, G. (Org.). Dicionário da educação do campo. Rio de Janeiro:

Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio; São Paulo: Expressão Popular, 2012.

GHEDINI, Cecília Maria e BERTÉ, Rosane (Org.). Planejamento Coletivo Interdisciplinar e

Instrumental Metodológico: Produção de referências com as Escolas Públicas do Campo –

Sudoeste do Paraná, 2018.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares para os anos finais do

Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. Curitiba: SEED, 2008.

SAVIANI, Nereide. A Conversão do saber científico em Saber escolar. In: Saber Escolar,

Currículo e Didática: problemas da unidade conteúdo/método no processo pedagógico. 4. ed.

Campinas-SP: Autores Associados, 2003. (Coleção educação contemporânea).

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INFORMÁTICA NO ENSINO DE FILOSOFIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA

Wagner Hoffmann1

Felipe Theodoro Guimarães2

Eixo Temático: 1- Escola Pública do Campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e

iniciativas estudantis

Palavras-chave: Filosofia; Informática na educação; Práticas de ensino.

Introdução

A atual conjuntura escolar, em face a rápida propagação e acesso à informação de

conteúdos diversos por meio da internet, carece de novas discussões que viabilizem a adequação da

mesma e dos docentes à possibilidade de inserir a informática em suas práticas pedagógicas.

Com isso, faz-se necessária a apropriação, por parte dos docentes, das Tecnologias Digitais

de Informação e Comunicação (TDIC) como técnica para o processo de ensino-aprendizagem, para

que assim o professor consiga tornar mais atrativa e interessante a aprendizagem para seus alunos

(GUIMARÃES, 2018). De acordo com a pesquisa TIC Kids Online (CETIC, 2018), o percentual de

jovens entre 9 e 17 anos que acessa internet somente pelo telefone móvel chegou em 44%, isso sem

considerar a quantidade que acessam por computadores e/ou tablets. Este dado demonstra a

importância da escola conseguir dominar esta tecnologia em prol da educação e ensino.

Segundo Moreira (2017), é responsabilidade da escola: “ser filtro crítico do mundo

informatizado e globalizado que prepara os alunos para exercerem a liberdade de expressão e

participação política”. Com isso, levando em consideração a necessidade de incluir a informática no

ensino e, ao mesmo tempo, assumir a responsabilidade do papel escolar, entendemos que a Filosofia

é fundamental para tais discussões, visto que a mesma carrega a função de questionar, pensar e

1Licenciado em Filosofia, mestrando em Educação pela UNIOESTE. E-mail: [email protected]. 2Graduando em Licenciatura em Informática pela UTFPR. E-mail: [email protected].

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repensar sobre a realidade e o que não é real também.

Metodologia

O relato aconteceu com os alunos da turma do primeiro ano do ensino médio, na disciplina

de Filosofia, curso Formação Docente do Colégio Estadual Guilherme de Almeida, no município de

Santa Izabel do Oeste. Aproximadamente 40 alunos participaram da experiência.

Como forma de dinamizar as aulas de Filosofia, tornando-as mais atrativas aos alunos, foi

utilizado uma ferramenta chamada Kahoot!. Por meio do Kahoot! o professor pode elaborar

atividades como quiz e debates. Ao final de cada atividade no Kahoot!, a ferramenta gera relatórios

das atividades que contém informações detalhadas sobre erros e acertos de cada aluno e da turma.

Foi elaborado um plano de ensino, dividido em duas aulas, que tinha como conteúdo

estruturante a teoria do conhecimento e como conteúdo específico a possibilidade de conhecimento,

abordando os temas dos filósofos Sócrates (maiêutica e ironia); Platão (dialética) e Aristóteles

(sistemática). A atividade iniciou com uma exposição do pensamento dos filósofos que durou 15

minutos para cada filósofo, totalizando 45 minutos de aula expositiva. A partir disso, na segunda

aula, foi apresentada aos alunos a ferramenta Kahoot!.

Divididos em três equipes, onde cada uma ficou responsável por rever o que o professor

tinha explicado e, juntamente ao o livro didático, formular perguntas de múltipla escolha, que

seriam inseridas no quiz Kahoot!. Conforme as equipes finalizaram suas perguntas elas foram

inseridas no Kahoot!, até que todas as equipes concluíram as perguntas e o questionário foi

finalizado. Com o celular na mão e com as perguntas projetadas no quadro pela multimídia, os

alunos responderam, simultâneamente, o questionário acessando o endereço https://kahoot.it/.

Resultados

Por meio desta experiência, pôde ser observado que a aceitação da turma foi muito boa. Os

alunos se esforçaram para realizar com êxito as atividades propostas pelo professor. Para além das

equipes que tiraram primeiro e segundo lugar, os alunos disseram que foi a experiência em

participar da leitura, debate e reflexão sobre os textos, bem como na formulação das perguntas, que

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tornou a disciplina mais interessante.

Todos os alunos ganharam o game, uma vez que conseguiram fazer bem todas as etapas do

processo ao qual a aula foi proposta.

Conclusão

Segundo Cunha (1994, p. 29) “O ser vivo só adquire segurança quando se identifica

intelectualmente com os elementos que o circundam [...]”. A tecnologia está presente no dia a dia de

dos jovens e a educação informática pode auxiliar a filosofia a tornar-se mais próxima da realidade

dos alunos.

Por meio desta experiência foi possível testar uma maneira diferente de trabalhar a

Filosofia como disciplina na escola. Na visão de professor, foi importante e satisfatório o uso de

TDIC no ensino, preparar aulas e planos de maneira diferente faz com que o docente repense em

sua prática de ensino, e a aceitação e participação dos alunos incentivam o professor a investir em

mudanças pedagógicas.

Quanto aos alunos, o feedback sobre a prática do professor foi positivo, já houve interesse

de outros docentes em aprender a utilizar a ferramenta para suas respectivas disciplinas.

Referências

CETIC. Crianças e adolescentes, por dispositivos utilizados para acessar a internet. Cetic - Portal

de Dados, 2018. Disponível em <http://data.cetic.br/cetic/explore?idPesquisa=TIC_KIDS>. Acesso

em: 10 nov. 2018.

CUNHA, Marcos Vinícios da, Jonh Dewey: Uma filosofia para educadores em sala de aula. Vozes,

Petrópolis, 1994.

GUIMARÃES, Felipe et al. Métodos ativos de ensino aliados com tecnologia para a prática de

ensino: um relato de experiência. In: Anais do Workshop de Informática na Escola. 2018. p. 333.

MOREIRA, M. M. Práticas de ensino de filosofia: o desafio e o despertar da consciência filosófica

na contemporaneidade. 2017. 44f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Filosofia)-

Universidade Estadual da Paraíba, Guarabira, 2017.

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METODOLOGIA DE CONSTRUÇÃO DO DOSSIÊ DO INVENTÁRIO DA REALIDADE

DAS ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO DO MUNICÍPIO DE VERÊ - PR

Elaine Fabiane Gaiovicz1

Eixo Temático 1: Escola Pública do Campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e iniciativas

estudantis

Palavras-chave: Inventário da Realidade; Educação do Campo; Dossiê.

O inventário da realidade é um guia metodológico para uso nas escolas do campo, utilizado

como centralizador dos conhecimentos científicos ensinados na escola a partir dos conteúdos

garantidos pelas Diretrizes Curriculares Estaduais (DCE’s), dos planos de trabalho docente (PTD) e

do planejamento participativo realizado em cada escola pública do campo. O inventário da realidade

é uma ferramenta para levantamento e registro organizado de aspectos materiais ou imateriais de

uma determinada realidade Verê (2017), levantamentos quantitativos e/ou qualitativos. Trabalha

basicamente com aspectos do entorno da escola. No trabalho de educação e particularmente na

escola de educação básica, buscar conhecer o lugar em que a escola se insere e suas relações sociais

e ecológicas com as questões da realidade mais ampla, faz parte de uma determinada concepção de

educação e de escola.

Conforme o Dossiê das Escolas do Município de Verê, na concepção da educação do

campo, é preciso pensar na escola como parte de processos formativos que constituem a vida social

e, as relações entre ser humano e natureza. Por isso a escola não pode desenvolver sua tarefa

educativa separada da vida, das suas questões e contradições, do seu movimento. Mas esta ligação

entre escola e vida precisa de uma formulação pedagógica séria, para que os momentos de estudos

não se resumam apenas a conversas sobre a realidade, mas garantam efetiva apropriação de

1Licenciada e Mestre em Geografia pela Unioeste – Campus de Francisco Beltrão, professora da Rede Estadual de Ensino e da Escola Estadual do Campo Marechal Deodoro da Fonseca – 2018, membro do grupo de estudos REFOCAR. E-mail: [email protected]

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conhecimentos necessários à construção de novas relações sociais equilibradas entre o ser humano e

a natureza (VERÊ, 2017).

O Dossiê, como o próprio nome diz, é um material que vai organizar todo o levantamento

feito através de um inventário da realidade; é um material que deve ser utilizado para o

planejamento dos professores e para o estudo nas salas de aula.

O Dossiê que utilizamos nas escola do nosso município foi construído a partir de estudos

que contam com assessoria da Unioeste – Campus de Francisco Beltrão - PR2 e das organizações

dos trabalhadores do campo entre outras e, com a participação de educadores e estudantes, fez-se

uma conversa sobre as temáticas relevantes na realidade das comunidades do entorno da escola, do

município e da região nas diversas dimensões.

Assim, para desenvolvimento deste material, foram definidas algumas temáticas como:

levantamento do percurso histórico local e regional; biodiversidade; preservação; indústria,

comércio e tecnologias; movimentos sociais e organizações da agricultura familiar;

agroecossistemas e agroecologia; políticas públicas, entre outros.

Para dar conta destes levantamentos, o Inventário organizou-se em pelo menos cinco

momentos ou grandes ações de investigação: 1- Investigação dos Estudantes junto às famílias e suas

unidades de produção; 2 - Registros de observação e conversa com educadores durante as Trilhas;

3- Levantamento de dados referentes ao município e à região; 4 - Trabalho com professores e

estudantes para ordenação dos dados na relação com os blocos; 5 – Encontro com as comunidades

para dialogar e complementar dados levantados (GHEDINI E BERTÉ, 2018).

Contudo3, ao se realizar o Inventário da Realidade unem-se diferentes sujeitos, por isso,

torna-se também, uma oportunidade de dialogar e iniciar ações no sentido de fortalecer a escola do

campo evitando seu fechamento.

Após a realização de todas essas etapas e com base na legislação, passa-se a definir e

distribuir as ações. Então, estabeleceu-se uma equipe para trabalhar na organização do inventário e

2 Este trabalho é realizado por meio de um projeto de Extensão: “Fortalecimento das Escolas Públicas do Campo da Região sudoeste do Paraná na perspectiva da Educação do Campo: Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores” – PROEX – Unioeste – Cascavel. 3A partir deste ponto do resumo, segue-se basicamente os escritos do Caderno Escolas Públicas do Campo Volume I, organizado por Ghedini e Berté (2018).

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do questionário fechado para investigação dos estudantes, os registros de observação e da conversa

que os educadores fariam durante as Trilhas4 e, o trabalho posterior, com as comunidades.

A investigação dos estudantes junto às suas famílias e unidades de produção inicia-se com a

atividade que complementa o trabalho do dia em que não estão em sala de aula, pois vai se realizar

a Trilha. Para isso, as questões são elaboradas em forma de questionário fechado a partir dos

mesmos blocos que compõem o inventário. Tratam sobre: relações de trabalho e família, produção e

consumo, relações do cotidiano, espaços de organizações e participação, aspectos financeiros,

sustentabilidade e bens naturais, bens adquiridos, distâncias, locomoção, saúde, lazer entre outras.

Os dados referentes ao município e região são coletados pelos professores e equipe gestora,

que utilizam várias fontes de pesquisa, e assim é realizada a ordenação desses dados em grandes

blocos temáticos. Realiza-se uma socialização com o intuito de complementar as informações com

os dados, fotos, relatos entre outros registros que a comunidade possui. Por fim, todos os dados

levantados pelo inventário são organizados em um “grande caderno”, que se chama Dossiê do

Inventário da Realidade, como um material para ser usado, objetivando aproximar da realidade que,

normalmente é conhecida superficialmente. Organiza-se em Blocos Temáticos que dividem o

material em Fontes Educativas e, estas, se subdividem em partes menores, as porções da realidade.

O inventário e sua materialização no Dossiê é um processo dinâmico, em constante

movimento e transformação, não é uma realidade pronta, compõem-se de diversas fontes e registros

de dados que vão desde o que as comunidades guardam como patrimônio, até a Ciência e

Tecnologias disponíveis no município e região. Os levantamentos consideram questões da realidade

atual e visam, prioritariamente, o uso pedagógico dos dados pela escola, em suas diferentes

atividades educativas.

Referências

GHEDINI, Cecília Maria; BERTÉ, Rosane (Org.). Planejamento Coletivo Interdisciplinar e

Instrumental Metodológico. Produção de referências com as Escolas Públicas do Campo –

Sudoeste do Paraná, 2018.

4 As Trilhas são momentos em que a escola inverte o percurso do transporte escolas indo até as famílias dos estudantes, com ônibus ou a pé, para aproximar-se da sua realidade concreta de vida e trabalho.

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VERÊ. Dossiê do Inventário da Realidade das Escolas do Campo do Município de Verê.

Escola Estadual do Campo Marechal Deodoro, Linha Progresso, 2017 (Acervo Pedagógico da

Escola).

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VIDA SAUDÁVEL EM UMA ESCOLA DO CAMPO: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Neusa Aparecida de Lima1

Ayslam Moteiro2

Claudinéia Lucion Savi3

Eixo Temático 1: Escola Pública do Campo, práticas pedagógicas, processos coletivos e

iniciativas estudantis

Palavras-chave: Escola do Campo; atividade física; vida saudável.

O Colégio Estadual do Campo Vilma dos Santos Dissenha, iniciou seu funcionamento no

ano de 1994 pela Resolução nº 4632 de 26/04 de 1994. Está localizado na comunidade de

Canhada Funda, margem da BR 281, Km 11, município de Mangueirinha/PR. Atualmente atende

144 alunos, 70 são dos anos finais do Ensino Fundamental (6º, 7º, 8º e 9º ano) e 74 do Ensino

Médio (1ª, 2ª e 3ª série). A escola contempla grande diversidade de estudantes, já que, alguns são

indígenas, Kaigang e Guarani, oriundos da Reserva Indígena de Mangueirinha, outros são filhos

de pequenos agricultores e agregados das comunidades de Itá I, Itá II, Canhada Funda,

Covózinho, Linha Buscheroli, Estil e Linha Bianchesi. Das quais, as comunidades Itá I e II são

de reassentados da barragem do município de Itá-SC. A Instituição de ensino conta com uma

equipe de 23 professores entre o Ensino Fundamental e Médio, 1 Pedagoga, 3 agentes

Educacionais I, 2 Agentes Educacionais II e 1 Gestora Escolar no período de 20h. Oferta, ainda,

1 Especialista em Metodologias Inovadoras aplicadas à Educação na área específica de Gestão do Trabalho Pedagógico e Psicopedagogia. Pedagoga e Gestora Escolar lotada no Colégio Estadual do Campo professora Vilma dos Santos Dissenha pela Secretaria de Estado da Educação/SEED/PR. Email: [email protected] 2 Especialista em Treinamento Esportivo e Didática e Metodologia do Ensino Superior. Professor de Educação Física lotado no Colégio Estadual do Campo Professora Vilma dos Santos Dissenha pela Secretaria de Estado da Educação/SEED/PR. Email: [email protected] 3 Mestre em Educação pela Universidade do Oeste do Paraná e Pedagoga lotada no Departamento de Educação da Universidade Tecnológica Federal do Paraná no Câmpus de Pato Branco. Membro do Grupo de Pesquisa em Educação, Diversidade e Inclusão - GPEDI. E-mail: [email protected]

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em período de contraturno, o Centro de Línguas Estrangeiras Modernas (CELEM), Sala de

Recursos e curso JAA – Jovem Agricultor Aprendiz.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda, a prática de atividade física de

intensidade moderada por pelo menos 150 minutos durante a semana ou a realização de pelos

menos 75 minutos de atividade aeróbica com intensidade vigorosa durante a semana ou uma

combinação equivalente de atividade física de intensidade moderada e vigorosa com intuito de

melhorar o condicionamento cardiorrespiratório e muscular, a saúde óssea, reduzir o risco de

doenças não transmissíveis e depressão (COELHO, 2009).

Observamos, no contexto em que a escola está inserida, que o sedentarismo é crescente e

que crianças e jovens estão cada vez mais consumindo alimentos menos saudáveis. Por isso, a

necessidade de desenvolver um projeto que possa minimizar tais questões, contribuindo para

elevação do gasto energético, manutenção e controle de peso corporal, melhora da capacidade

cardiovascular e respiratória, redução do risco de desenvolver diabetes, hipertensão, aumento da

autoestima e o bem-estar, diminuição do estresse, estímulo do convívio social e melhora do

funcionamento do sistema imunológico. Por isso, promover a atividade física é uma ação prioritária

na promoção de hábitos saudáveis.

A atividade física na adolescência é fator importante para um adulto ativo, faz-se necessário

buscar iniciativas que estimulem os adolescentes para a prática levando em consideração a

preferência dos adolescentes para determinada atividade física. Tal conhecimento será relevante

para fomentar o esporte e a atividade física nessa faixa etária (AZEVEDO JUNIOR; ARAÚJO;

PEREIRA, 2006).

O projeto Vida Saudável é desenvolvido anualmente no período de outubro a dezembro e

envolve toda Comunidade Escolar: Estudantes, Educadores, Associação de Pais, Mestres e

Funcionários (APMF) e comunidade em geral. É uma proposta multidisciplinar que visa melhorar a

qualidade de vida dos sujeitos envolvidos, diretamente ou indiretamente. Além disso, visa ampliação do acesso às informações sobre cuidados com a saúde e medidas

preventivas, assegurando a igualdade de oportunidades e promovendo a responsabilidade social

com a saúde.

O projeto desenvolvido funciona como um desafio que visa a manutenção de hábitos

saudáveis e a realização de exercícios físicos num período de 60 dias. Neste período, os envolvidos

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deverão realizar atividade física, de pelo menos 50 minutos, 3 vezes na semana, diminuir o

consumo de sal e açúcar, evitar o consumo de refrigerantes e frituras, beber no mínimo 2 litros de

água por dia e dar preferência aos alimentos saudáveis no lanche escolar, os quais muitos são

advindos da produção da horta escolar.

O desafio visa aferir o IMC (Índice de Massa Corporal) dos participantes e, a partir desse

resultado, estabelecer uma meta em relação ao peso em determinado período.

O projeto incentiva também a aluno do Campo a produzir seus próprios alimentos de modo

mais saudável e, prevê ainda a assessoria de profissionais especializados para tratar de temas

específicos sobre qualidade de vida.

Observando o benefício da atividade física no combate da obesidade, Sabia, Santos e

Ribeiro (2004) compararam o efeito do exercício físico aeróbio contínuo e exercício anaeróbio

intermitente associado a uma orientação alimentar sobre as medidas bioquímicas e a capacidade

física de adolescentes obesos. Os resultados foram satisfatórios para os pesquisadores, pois com um

programa de treinamento e alimentação controlada conseguiram diminuir significantemente as

medidas antropométricas nos dois tipos de exercício e mantendo também em números satisfatórios

na avaliação bioquímica.

Ao final do projeto, obtivemos bons resultados. Grande parte dos alunos, professores e

familiares cumpriram suas metas e, em determinados casos, houve a perda de até dez quilos,

ou seja, sobretudo, melhoria na qualidade de vida. É preciso conscientizar e estimular, formar

grupos e introduzir ações e atividades educacionais que oportunizem o acesso às informações

sobre as medidas preventivas contra o sedentarismo.

Referências

AZEVEDO JUNIOR, M. R. de; ARAÚJO, C. L. P.; PEREIRA, F. M. Atividades físicas e

esportivas na adolescência: mudanças de preferências ao longo das últimas décadas. Revista

Brasileira de Educação Física e Esporte, v.20, n.1, p. 51-58, 2006.

COELHO, C. F.; BURINI, R. C. Atividade física para prevenção e tratamento das doenças crônicas

não transmissíveis e da incapacidade funcional. Rev. Nutr., Campinas, v. 22, n. 6, p. 937-946,

nov./dez., 2009.

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Projeto Político Pedagógico. Colégio Estadual do Campo Professora Vilma dos Santos Dissenha,

2017.

SABIA, R. V.; SANTOS, J. E.; RIBEIRO, R. P. P. Efeito da atividade física associada à orientação

alimentar em adolescentes obesos: comparação entre o exercício aeróbio e anaeróbio. Rev. Bras.

Med. Esporte. Niterói, v. 10, n. 5, set./out., p. 349-355, 2004.

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EIXO TEMÁTICO 2:

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO, NÍVEIS DE ENSINO E POLÍTICAS

PÚBLICAS

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O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO ENSINO MÉDIO NA ESCOLA ESTADUAL DO

CAMPO VISTA ALEGRE – ENÉAS MARQUES/PR

Ana Marieli dos Santos Luedke1

Vandecléia Aparecida Ribeiro Soares2

Wagno Antonio da Silva3

Eixo Temático 2: Escolas Públicas do Campo, Níveis de Ensino e Políticas Públicas.

Palavras-chave: Escola do Campo; Educação do Campo; Ensino Médio.

A Escola Estadual do Campo de Vista Alegre, localiza-se no Distrito de Vista Alegre, no

Município de Enéas Marques. Atualmente conta com aproximadamente 55 alunos de 6º ao 9º ano e

40 alunos de 1° e 2° ano do Ensino Médio. Sendo 4 turmas do Ensino Regular no período

vespertino e 2 turmas de Ensino Médio no período matutino. Em 1981, iniciou-se o antigo Ginásio,

(5ª a 8ª série), funcionando como extensão da Escola Estadual Arnaldo Busato. Em 1983, através de

Resolução fica criada e autorizada a funcionar a Escola Estadual Vista Alegre. No ano de 2014, a

Escola passou a denominar-se Escola Estadual do Campo Vista Alegre EF, de acordo com a

Resolução nº 1342/2014.

A luta pela educação do campo e no campo é histórica. O seu conceito enquanto modalidade

educacional é recente. Para manter essa modalidade e o seu funcionamento é necessário o

fortalecimento da sua identidade, dos seus objetivos e suas especificidades. Trata-se de uma luta

diária e coletiva para manter uma educação que considere a cultura, as características e as

necessidades dos sujeitos que vivem no campo. Segundo Caldart (2000,) a escola pode ser mais do

que escola, à medida que sejam considerados os vínculos que constituem sua existência nessa

1 Mestre em Educação. Pedagoga da Rede Estadual e Professora da Rede Municipal de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected]. 2 Especialista em Educação. Pedagoga da Rede Estadual e Professora da Rede Municipal de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected]. 3 Especialista em Educação. Pedagogo da Rede Estadual e Professor da Rede Municipal de Francisco Beltrão. E-mail: [email protected].

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realidade. Com esse objetivo, no ano de 2015, iniciou-se as primeiras discussões para implantação

do Ensino Médio na Escola da Vista Alegre.

No cenário de fechamento de escolas do campo, e em parceria com o projeto de Extensão:

“Rearticulação da Escola do Campo na modalidade da Educação do Campo”, esse objetivo ficou

ainda mais claro. Tornou-se crucial implementar pedagogicamente a Educação do Campo, que no

momento constava apenas nos documentos escolares e na denominação da instituição, com base na

legislação e nos fundamentos e métodos da Educação do Campo. Ou seja, evidenciar a “valorização

da identidade da escola do campo por meio de projetos pedagógicos com conteúdo curriculares e

metodologias adequadas às reais necessidades dos alunos do campo (BRASIL, 2010, p. 2).

Com objetivo de organizar-se pedagogicamente e intencionalmente para atender e valorizar

a história e os sujeitos da sua comunidade, depara-se com o fato de muitos alunos das comunidades

estudarem em escolas na cidade, até mesmo pela crença de que as escolas da cidade têm condições

de produzir melhores resultados em relação ao conhecimento. Podemos afirmar, que este foi o

ponto inicial e instigante de buscar o Ensino Médio para Escola da Vista Alegre. A partir desta luta,

requestamos a implantação do Ensino Médio junto à SEED no ano de 2016.

O Ensino Médio é/era ofertado na área urbana de Enéas Marques, no Colégio Estadual

Castro Alves, e os alunos das comunidades precisavam deslocar-se até a cidade para garantir a

sequência dos estudos. Em razão disso, muito dos princípios da Educação do Campo eram perdidos

à outra perspectiva de ensino, além da distância e deslocamento que podem desfavorecer a

continuidade e interesse pelos estudos. Entendendo que a educação é construída pelos próprios

sujeitos e a escola precisa estar vinculada aos processos de formação desses sujeitos do campo.

Assim, imperiosa foi nossa intencionalidade de ampliar e ofertar essa modalidade de ensino. Somente com a demanda de alunos que completavam o 9º ano do Ensino Fundamental seria

um número insuficiente para iniciarmos a modalidade do Ensino Médio. Nesse sentido, foi

necessário um intenso debate para demonstrar a qualidade do ensino ofertado na Escola do Campo e

justificar a volta dos alunos que estavam na cidade com as comunidades envolvidas. Ressaltou-se

também que, dessa forma, o número de alunos a serem atendidos, por se tratar de uma Educação do

Campo, seria aceitável do ponto de vista pedagógico e administrativo, levando em consideração às

razões aqui expostas sobre a necessidade de que o/a estudante esteja vinculado ao processo de

formação do sujeito do campo.

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O Ensino Médio, como última etapa da educação básica, precisa contemplar as necessidades

socioculturais, políticas e econômicas dos sujeitos que a constituem. Por isso, lutou-se pelo resgate

dos estudantes da comunidade, do conhecimento e da sua história, sem perder o vínculo com suas

raízes. Significa dizer que a escola enquanto espaço de formação interfere significativamente na

formação e fortalecimento dos sujeitos que dela participam. É esse fortalecimento que buscamos

para manter a educação inerente à sua realidade, à sua temporalidade e aos saberes próprios dos

estudantes, conforme instruem as Diretrizes Operacionais para Educação Básica do Campo,

publicadas em 2002 e reforçadas em 2006 nas Diretrizes Curriculares, quando indicam que

valorização e identidade da escola deve se dar pelos próprios povos do campo, numa atitude de

recriação da própria história.

Por fim, tal solicitação esteve de encontro aos anseios de toda a comunidade de forma

singular famílias e educadores, todos irmanados no intuito e até mesmo num esforço pessoal de

efetivar através da implantação do Ensino Médio, uma educação básica que contemple as

necessidades socioculturais, políticas e econômicas dos sujeitos que a compõem. Esta história está

sendo reescrita objetivando que os mesmos assumam o papel de protagonismo neste processo, papel

que lhes é de direito e que muitas vezes é negado pela sociedade. Esse foi/é um caminho de

fortalecimento e resistência ao fechamento das Escolas do Campo.

Referências

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 01, de 03 de abril

de 2002. Institui Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.

Diário Oficial da União, Brasília, 03 abr. 2002.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 4, de 13 de julho

de 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília:

MEC, 2010.

CALDART, Roseli Salete. Pedagogia do Movimento Sem Terra: escola é mais do que escola.

Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

PARANÁ. Diretrizes Curriculares da Educação do Campo. Governo Do Estado do Paraná.

Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Curitiba, PR: SEED, 2006.

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PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares para os anos finais do

Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. Curitiba: SEED, 2008.

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EIXO TEMÁTICO 3:

ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

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FORMAÇÃO DOCENTE E A PRÁXIS NA EDUCAÇÃO DO CAMPO

Maria Lucivane de Oliveira Morais1

Eixo Temático 3: Escolas Públicas do Campo e Formação de Professores

Palavras-chave: formação de professores; educação no campo; ensino e aprendizagem.

O objetivo geral desse resumo é compreender as especificidades da formação do professor

que atua na educação do campo. Sabe-se que no Brasil a formação docente é realizada,

inicialmente, em curso de licenciatura que permitirá a construção do saber teórico e prático

necessário para a mediação dos conteúdos contidos no currículo da educação básica, que se ajustam

a área de conhecimento escolhida.

A educação do campo, perpassa os diversos níveis e modalidades educacionais,

apresentando características específicas, legislação própria, um projeto de desenvolvimento

sustentável articulado ao meio rural, etc. De acordo com o artigo 28 da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação (9394/96) cabe aos sistemas de ensino realizar as adaptações necessárias na educação

básica, adequando-a às peculiaridades da vida rural e de cada região. Como exemplo, mencionam-

se os conteúdos curriculares e as metodologias adotadas pelo professor que devem despertar os

interesses dos educandos que vivem na área rural, a organização da escola e do calendário conforme

as fases do ciclo agrícola e as condições climáticas. (BRASIL, 1996).

Diante disso, o problema que direcionou as análises seguintes almeja compreender: Como

deve ocorrer a formação do professor para atuar na educação do campo? Sabe-se que as mediações

tecidas em salas de aula devem contribuir para que os jovens que vivem no espaço rural possam ter

acesso a uma educação de qualidade, que valorize suas experiências, saberes prévios e que

contribua para que permaneçam no campo. (ALENCAR, 2010).

1 Licenciada em Geografia e Filosofia. Mestre em Filosofia Moderna e Contemporânea pela Unioeste, Campus de Toledo. Professora da rede pública estadual de Foz do Iguaçu. Email: [email protected]

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Dessa forma, para melhor compreender as especificidades da educação do campo e da

formação docente, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, qualitativa e descritiva, em livros e

artigos cujos autores tratam da temática proposta. Dentre os resultados obtidos, cita-se o Decreto n°

7.352, que define a escola do campo como aquela que está situada em área rural ou urbana que

atende predominantemente a populações do campo. Sua construção resulta das demandas oriundas

dos movimentos e organizações sociais de trabalhadores rurais, especialmente, de representantes do

Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) que tem mantido uma postura ativa, reivindicando

do Estado o desenvolvimento de iniciativas voltadas tanto para a oferta de educação pública, quanto

para a formação de professores para exercer as práticas de ensino e aprendizagem nessas

instituições que, podem estar localizadas e/ou atender alunos que também são provenientes de áreas

de assentamento ou acampamento. (CALDART, 2009).

Nessas escolas, o educador precisa apresentar saberes específicos a sua área de formação,

mas também, outros que possam valorizar a cultura de seus educandos, as especificidades da vida

campesina e do sistema produtivo adotado na região em que a escola foi construída, dentre outros

conhecimentos que contribuam para sua formação social, política, cultural e educacional, ao mesmo

tempo em que estimula a redução do êxodo rural, promovendo o reconhecimento e o fortalecimento

da identidade campesina.

A manutenção de uma prática pedagógica crítica e reflexiva é fundamental, uma vez que, o

Brasil está inserido em um contexto neoliberal, permeado pela exclusão decorrente, dentre outros

fatores, da concentração de terras que viabiliza a formação de grandes latifúndios presentes nas

diversas regiões, impulsionando o êxodo rural e ampliando a necessidade do Estado intervir criando

condições para que os pequenos agricultores e seus filhos possam permanecer no campo. (JESUS,

2010).

Nesse sentido, para que as escolas construídas nas áreas rurais possam contar com

profissionais que apresentam competências, habilidades, compromisso, condição técnica e teórica

para compreender os inúmeros contextos que perpassam a realidade dos alunos atendidos e que vão

para além do domínio dos conteúdos contidos na matriz curricular de sua disciplina, é fundamental

a ampliação dos curso de formação inicial e continuada, alinhados ao ideal marxista que se pauta

em uma educação emancipatória, com origem na luta dos trabalhadores camponeses com o objetivo

de superar os mecanismos excludentes consolidados no capitalismo. (SANTOS, SOUZA, 2015).

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Portanto, é preciso superar a formação fragmentária consolidada em Instituições de Ensino

Superior, para compreender efetivamente a educação do campo e as especificidades dos sujeitos que

frequentam essas escolas, para a partir disso, direcionar as práticas pedagógicas.

Referências

ALENCAR, M. F. dos S. Educação do campo e a formação de professores: construção de uma

política educacional para o campo brasileiro. Ci. & Tróp., Recife, v.34, n. 2, p.207-226, 2010

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação

nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, 23

dez. 1996.

CALDART, R. S. Educação do Campo: notas para uma análise de percurso. Trab. Educ. Saúde,

Rio de Janeiro, v. 7 n. 1, p. 35-64, mar./jun.2009.

JESUS, S. M. S. A. A formação de educadores do campo e o compromisso com a emancipação da

classe trabalhadora. In: SOARES, Leôncio et al. Convergências e tensões no campo da formação

e do trabalho docente. Belo Horizonte. Autêntica, 2010.

SANTOS, A.R; SOUZA, M. A. Formação docente na perspectiva da educação do campo e em

confronto com a educação rural. XII Congresso Nacional de Educação – EDUCERE. Curitiba:

PUC, 26 a 29 out, 2015.

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EIXO TEMÁTICO 5:

EDUCAÇÃO DO CAMPO, TRABALHO, AGRICULTURA

FAMILIAR/CAMPONESA E AGROECOLOGIA

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COMIDA TAMBÉM É GEOGRAFIA? O USO DE MAQUETES COMESTÍVEIS COMO

POSSIBILIDADE DIDÁTICA EM ESCOLAS DO CAMPO

Nayara Pasqualotto1

Elis Modena2

Eixo Temático 5: Educação do Campo, Trabalho, Agricultura familiar/camponesa e

Agroecologia

Palavras-chave: Maquete comestível; Agroecologia; Educação do Campo.

O processo de modernização da agricultura acarretou transformações tanto nos sistemas

produtivos como na alimentação da população, visto que a cada dia que passa a base alimentar da

sociedade substitui alimentos in natura por produtos industrializados. Esse fenômeno, que ocorre

em áreas urbanas e rurais, é denominado de substitucionismo, no qual os produtos agrícolas são

apreendidos como insumos industriais, misturados ou substituídos cada vez mais por componentes

não-agrícolas (GOODMAN; SORJ; WILKISON, 1990).

Pensando nos efeitos de uma base alimentar pautada em produtos altamente processados e

industrializados, muitas pessoas preocupam-se em manter uma alimentação mais saudável,

priorizando alimentos frescos, sem agrotóxicos e que tenham um processo de produção junto tanto

no âmbito econômico, como no social e ambiental. Dentre esses, inclui-se muitas famílias

agricultoras que além de produzirem para seus familiares, comercializam alimentos de qualidade

para a sociedade. Muitos desses agricultores optam por práticas pautadas nos princípios

agroecológicos.

1 Doutora em Extensão Rural pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM e docente na Secretaria de Estado de Educação do Paraná – SEED/PR. E-mail: [email protected]. 2 Mestre em Geografia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE e docente na Secretaria de Estado de Educação do Paraná – SEED/PR. E-mail: [email protected]

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A Agroecologia é apreendida como a base disciplinar que possibilita o conhecimento e

processo metodológico que auxilia no desenvolvimento de uma agricultura “ambientalmente

consistente, altamente produtiva e economicamente viável” (GLIESSMAN, 2000. p.56). Desta

forma, ela auxilia na valorização dos conhecimentos locais, expandindo paradigmas para a

agricultura e permitindo a sustentabilidade no meio rural.

Considerando a relevância deste contexto no meio rural, o Colégio Estadual do Campo do

Núcleo de Santa Lúcia aderiu ao Programa Mais Educação, criado pelo Ministério da Educação; no

qual tinha por objetivo ampliar a jornada escolar por meio de atividades optativas, como por

exemplo, a educação ambiental. Dessa forma, de 2009 até 2016 o Colégio desenvolveu dois

projetos, o da Horta na escola e o de Agroecologia, ambos tinham como objetivo desenvolver

práticas sustentáveis utilizando para isso técnicas agroecológicas. Mesmo com o encerramento dos

projetos, a demanda continuou e os alunos passaram a trabalhar de forma interdisciplinar durante as

aulas com o auxilio dos professores, para que dessa forma fosse possível manter tanto a horta e o

pomar, quanto a composteira e o minhocário.

Partilhando de todas as dimensões da Agroecologia, seja enquanto ciência, prática, ação

social coletiva; o Colégio Estadual do Campo do Núcleo de Santa Lúcia buscou inserir a

Agroecologia na configuração dos meios de vida dos agricultores, pais de alunos, por meio de troca

de saberes, evidenciando assim o caráter sociológico dessa ciência. Sendo assim faz-se necessário

oportunizar espaços de diálogos entre a comunidade e a escola.

Dentro deste contexto, com o intuito de abordar as questões alimentares e como elas

influenciam nas dinâmicas sociais, ambientais e econômicas da comunidade escolar e seu entorno,

foram elaboradas maquetes comestíveis, onde os alunos de todos os anos finais do Ensino

Fundamental e Ensino Médio precisariam optar por um tema abordado durante o ano letivo na

disciplina de Geografia e confeccionar a maquete priorizando alimentos disponíveis em suas

residências. Desta forma, as maquetes deveriam evidenciar tanto a apreensão dos conteúdos

presentes na base curricular como representar parte dos alimentos que são consumidos pelos alunos

e suas famílias.

Para que a execução da atividade se tornasse possível, inicialmente foram apresentadas aos

alunos algumas imagens de maquetes comestíveis. Posteriormente, os alunos foram divididos em

grupos de até 04 componentes, os quais deveriam pensar em um conteúdo abordado durante as

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aulas de Geografia e nos alimentos que utilizariam para montar suas maquetes. Como a atividade

foi desenvolvida extraclasse, esses foram aconselhados a solicitarem auxílio dos pais ou

responsáveis para a manipulação de aparelhos domésticos cortantes e fogão.

Após o período estipulado para a organização dos grupos e montagem das maquetes, foi

proposto um dia onde todos os alunos deveriam entregar seus trabalhos e apresentá-los. Na

oportunidade, foi convidada toda a comunidade escolar, além dos professores e alunos das séries

iniciais do Ensino Fundamental para assistir as apresentações. Na ocasião, foi abordado os tipos de

alimentos que as famílias consomem, a origem dos produtos e o processo de industrialização.

Configurando assim um espaço de troca de saberes.

A utilização de diferentes linguagens para a mediação do processo de ensino e aprendizagem

se faz cada dia mais necessário. Um dos recursos didáticos utilizados nas aulas de Geografia são as

maquetes; sabemos que a produção de maquetes permite uma inserção maior do aluno no processo

de aprendizagem. Optar pela elaboração de maquetes comestíveis, no entanto, possibilitou também

que fosse possível abordar temas dentro da Agroecologia. A realização dessa atividade propiciou o

diálogo entre comunidade e escola, por meio da integração dos conteúdos geográficos e a realidade

dos alunos do campo.

Referências

GLIESSMAN, S. R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável. Porto Alegre:

Editora UFRGS, 2000.

GOODMAN, D.; SORJ, B.; WILKISON, J. Da Lavoura às Biotecnologias: agricultura e indústria

no sistema internacional. Rio de Janeiro: Campus, 1990.

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ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E A AGROECOLOGIA

Rosangela Fernanda Fogues1

Eixo Temático 5: Educação do Campo, Trabalho, Agricultura Familiar/Camponesa e Agroecologia

Palavras-chave: Escola Pública do Campo; Agroecologia; Ensino Fundamental e Médio.

Este trabalho desenvolve-se com base numa atividade de extensão intitulada:

“Acompanhamento aos Vínculos Sociais com o Trabalho e a Cultura: Hortas e Quintais

Agroecológicos” e situa-se no contexto do Projeto de Extensão: “Fortalecimento das Escolas

Públicas do Campo da Região sudoeste do Paraná na perspectiva da Educação do Campo:

Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores”, que se propõe a atender a demanda

das Escolas Públicas do Campo da rede estadual de ensino - Ensino Fundamental II e Ensino

Médio. O projeto toma por base a modalidade da Educação do Campo garantida em Lei desde 2010

(Resolução MEC/CNE/CEB 04/2010), e atua com os fundamentos e métodos da Educação do

Campo, mediada por práticas que possibilitam a (re)inserção da escola na realidade local das

famílias dos estudantes e regional com parceria de outras organizações dentre elas o Núcleo

Regional de Educação (NRE), o Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia (CAPA) e a

Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESOAR).

Uma das atividades previstas no projeto de extensão aos bolsistas e colaboradores

discentes da Unioeste é desenvolver “práticas de agroecologia, agricultura familiar e produção de

alimentos com os estudantes e a comunidade” além de participar da formação dos Grupos de

Estudos, Eventos de Educação do Campo ou da Agroecologia, Territórios, Educação Popular,

Movimentos Sociais Populares, Organizações da Agricultura Familiar entre outros.

A atividade aqui apresentada insere-se no objetivo que prevê “articular ações que

produzam vínculos sociais entre escola e comunidades desde a cultura e o trabalho mediados pela

1 Bolsista Projeto de Extensão. Graduanda em Geografia.

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agricultura familiar, os movimentos sociais populares do campo, a agroecologia e a produção de

alimentos sustentadas em parcerias com instituições específicas” (UNIOESTE-PROEX, 2017).

É um trabalho desenvolvido como atividade de extensão por uma bolsista do Programa

Institucional de Apoio a Inclusão Social, Pesquisa e Extensão Universitária - Fundação

Araucária/FA-PIBIS 2018/9, que se realiza especificamente na escola Estadual do Campo de

Pinhalzinho, Município de Enéas Marques – PR.

Tem diversas atividades, mas as principais no âmbito específico da atividade, são: a)

Acompanhar os momentos de atividades que integram a comunidade e outras escolas

conjuntamente com os acadêmicos colaboradores; b) Organizar o processo de trocas de sementes e

mudas e a Mini-Festa das Sementes na Escola, .acompanhando os estudantes no evento regional; c)

A partir da programação das escolas colaborar com a organização das Varandas de Partilha e com

os Círculos de Saberes e Conhecimentos; d) Dar continuidade ao trabalho com a horta ecológica,

juntamente com os coletivos de estudantes da escola e famílias iniciando a motivação “meu canteiro

em casa”; e) Acompanhar o trabalho, com as entidades parceiras, sobretudo o CAPA no tratamento

de resíduos sólidos como compostagem e aproveitamento de papel reciclado.

Destaca-se que este campo da Agroecologia e, no caso da região sudoeste do Paraná, da

transição agroecológica, tem como fundamentos gerais, criar um vínculo com os estudantes das

escolas do campo, com essa nova perspectiva ecológica de manusear e cultivar o solo, tendo em

mente, sempre o respeito com o meio em que estão inseridos, pois é de onde, muitos tiram seu

sustento. Esse projeto visa mostrar para os estudantes, essa forma correta de manuseio e cultivo, que

não agride o solo e o mantem sempre fértil e produtivo, com isso, ao aderir essa nova prática de

plantio, as gerações futuras ainda poderão aproveitar de uma terra produtiva.

O trabalho com as hortas ou quintais agroflorestais começa em sala de aula, onde os

estudantes recebem primeiramente as informações teóricas sobre a Agroecologia e os demais

assuntos que a cercam. Atividades complementares em sala também são passadas, para fixar o

conteúdo. Em seguida são sugeridas atividades na horta e nas demais dependências da escola. É

obrigatório cada estudante que participa do projeto tenha uma horta em casa, que seja de seus

cuidados, a participação dos familiares é importante, pois assim o conhecimento se expande, mas

faz-se a ressalva de que a horta não é dos pais do participante do projeto, o estudante é quem deve

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cuidar e ter a sua própria horta. É cobrado o acompanhamento de como está o andamento de cada

horta, por fotos ou vídeos, fica a critério de cada estudante e o que mais lhe convém.

O intuito do projeto nas escolas do campo não é apenas ensinar Agroecologia para um restrito

número de alunos, mas sim abranger a comunidade inteira, onde todos possam usufruir dos

benefícios de se ter uma horta agroecológica em casa. Os meios de produção convencional além de

maléficos para a saúde humana á longo prazo, destroem a flora local pelo excesso de veneno em

que o solo é exposto. É indispensável o ensino de uma maneira mais sustentável de se produzir uma

alimentação mais saudável para todos nós, e a melhor forma de se fazer isso é disseminar o

conhecimento nas escolas do campo.

Referências

CAPA. Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia. Disponível em: http://capa.org.br/. Acesso em: 30 out. 2018.

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ESCOLAS PÚBLICAS DO CAMPO E AGROECOLOGIA: SEMENTES CRIOULAS TÊM

PODER Kelly Regina Oliveira1

Cecília Maria Ghedini2

Eixo Temático 5: Educação do Campo, Trabalho, Agricultura

familiar/camponesa e Agroecologia

Palavras-chave: Educação do Campo, Agroecologia, Escola Pública do Campo.

O trabalho aqui apresentado desenvolveu-se no contexto de um Projeto de Extensão3, no

subprojeto “Acompanhamento das Práticas de Inserção da Escola do Campo na Comunidade e na

organização local e regional de Educação do Campo”4, no ano de 2016 à 2017 no Colégio Estadual

Paulo Freire Ensino Fundamental II e Ensino Médio. As ações deste subprojeto objetivaram criar

mediações que rearticulassem a escola do campo e a comunidade, inserindo aquela na

especificidade de trabalho e produção que caracterizam o local e constituem-se em espaços de

investigação apropriação de conhecimentos.

O trabalho contou com o respaldo de um marco legal da legislação brasileira relacionada à

agricultura orgânica: Lei n° 10.831/23/12/2013 que proibia, a partir de 19/12/2013, a utilização de

sementes e mudas obtidas em sistemas convencionais para sistemas orgânicos. Esse prazo foi

prorrogado e a partir de 2016, cada Estado deveria produzir listas definindo quais espécies e

variedades cultivadas em sistemas orgânicos teriam que ser obrigatoriamente produzidas com

sementes vindas também de sistemas orgânicos.

1 Acadêmica do curso de Pedagogia - UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão – PR; E-mail: [email protected]. 2 Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão – Paraná – Brasil. E-mail [email protected] 3 O projeto: “Processo de Rearticulação da Escola do Campo na modalidade da Educação do Campo”, iniciou-se em 2015 na rede estadual do PR, coordenado por Cecília Maria Ghedini – UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão - PR. 4 O sub-projeto realizou-se no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire e Escola Municipal Irmão Cirilo – Educação Infantil e EF I, situados no Assentamento Missões, a 21 km da cidade de Francisco Beltrão-PR.

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Pela ampliação dos resultados do trabalho, passou-se ao objetivo de fortalecer a produção

de sementes crioulas na escola e nas comunidades de seu entorno, criando referências e vínculos

entre educação e trabalho do campo, agroecologia e agricultura familiar/camponesa. Na produção

das sementes e no circuito de trocas entre as famílias e a comunidade escolar, buscou disseminar

saberes sobre produção em sistemas de base ecológica, de sementes de culturas anuais, de hortaliças

e de adubos verdes e instigaram-se alguns educandos a se tornarem guardiões de sementes crioulas.

Num destes momentos de trabalho, analisava-se a intensa produção de comercialização das

sementes transgênicas e, eis que surge a pergunta de um estudante do EF II: “Porque sementes têm

poder?” A percepção e sensibilidade das crianças e adolescentes diante das movimentações que

envolviam a educação e a essência original do trabalho do campo, representada no ato de cuidar,

guardar e conservar sementes pelo seu cultivo, levou a desenvolver ações que possibilitaram criar o

evento “I Festa das Sementes Crioulas na Escola” 5. Esta ação produziu vínculos que sustentam as

ações da escola e as parcerias com outras instituições. Dentre essas ações destacou-se o trabalho de

profissionais da Assesoar que, com base na agroecologia como ciência que potencializa a lógica do

trabalho no campo e as tecnologias sustentáveis na perspectiva defendida pela Educação do Campo,

deram base ao processo iniciado.

Ao analisarmos as escolas do campo, de modo geral, destaca-se a falta de um projeto de

escola que se paute por “formas particulares de organizar o ensino conforme a perspectiva

sociocultural dos sujeitos” (GHEDINI, 2017, p. 347). Isso implicaria ter como ponto de partida os

sujeitos, o lugar onde vivem e suas sínteses sociais, articuladas aos conhecimentos sistematizados e

suas tecnologias. Nesta lógica, convidou-se a comunidade para disponibilizar as sementes que

possuíam e a escola auxiliou nas práticas, que culmiram na troca de sementes e saberes.

Próximo ao processo da Festa Regional das Sementes6, da qual os estudantes participaram,

organiza-se I Festa das Sementes na Escola. Nela, o trabalho dos estudantes foi catalogar as

sementes com os nomes populares e científicos e organizá-las em expositores, isto promoveu

também a aproximação das famílias que contribuíram com sementes crioulas.

5 A Festa das Sementes Crioulas na Escola foi realizada inicialmente no ano de 2016, e teve outras edições no ano de 2017 e 2018, associada à Varanda de Partilha. 6 A Festa Regional das Sementes Crioulas: Sementes da Resistência Construindo o Projeto Popular realizou sua XIII edição no ano de 2016.

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Buscou-se resgatar a maior quantidade de sementes crioulas uma vez que, parte delas seria

compartilhada com os participantes da festa na escola, outra reservada para a troca na Festa e outra

ainda, para ser plantada na horta, em forma de mandala que, como tradição no Colégio Estadual e

na Escola Municipal por alguns anos, agora passa a ser potencializada e ampliada para estudo e

experimentos, reafirmando a diferença entre alimentos agroecológicos e/ou com agrotóxicos.

Essas ações articulam-se ao processo de Educação do Campo em curso, alcançando o ensino

e estudo das disciplinas, assim como as relações que vão sendo criadas entre as famílias e a escola,

potencializando a escola como espaço de produção de conhecimento com sentidos para crianças,

adolescentes e jovens. Tendo por base também a legislação (BRASIL, 2002), a escola fortalece sua

identidade quando vincula-se às questões inerentes à sua realidade e ancora-se na temporalidade e

saberes dos estudantes na busca por ressignificar as velhas práticas da escola rural.

Este projeto buscou fortalecer o processo de inserção da escola do campo na comunidade e

a criação de referências entre educação e trabalho do campo, agroecologia e agricultura

familiar/camponesa e suas tecnologias na perspectiva da produção de alimentos. Manteve-se esta

perspectiva, avançando na atualidade, para a construção de uma Agrofloresta a fim de manter a

diversidade, compreendendo e sentindo a tarefa grandiosa de fazer a terra ser mais do que terra.

Neste percurso, a organização da Festa das Sementes na Escola tem assumido um lugar de

mediação no processo em curso na escola, concretizando princípios antes assumidos apenas como

possibilidades. Esta ação alcança maior consciência aos estudantes e à comunidade escolar,

mediante os resultados das atividades, também pelo envolvimento das famílias na escola. Além

disso, possibilita-se a valorização do conhecimento científico, da política, da natureza e da cultura

de uma nova geração que tem chances de mudar a realidade de suas unidades de produção familiar.

Referências BRASIL. Lei Nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003. Dispõe sobre a agricultura orgânica e dá

outras providências. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2003/lei-10831-23-

dezembro-2003-497002-publicacaooriginal-1-pl.html> Acesso em: 02 nov. 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 01, de 03 de

abril de 2002. Institui Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.

Diário Oficial da União, Brasília, 03 abr. 2002.

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GHEDINI, Cecília Maria. A Produção da Educação do Campo no Brasil: das referências

históricas à institucionalização. Jundiaí: Paco Editorial: 2017.

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EIXO TEMÁTICO 6:

EDUCAÇÃO DO CAMPO E HISTORIOGRAFIA DAS INSTITUIÇÕES

ESCOLARES

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A LUTA PELA CONSTRUÇÃO E CONQUISTA DA ESCOLA MUNICIPAL IRMÃO

CIRILO E DA ESCOLA ESTADUAL PAULO FREIRE

Maiara Tibola1

Rosane Berté2

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições do Campo

Palavras-chave: Escola do Campo; Educação do Campo; Assentamento Missões.

A Escola Municipal Irmão Cirilo, localizada na Linha Fazendinha, Assentamento Missões

surge com o processo de ocupação da Fazenda Marrecas, no ano de 1996, vinte dias após a chegada

das famílias. “Em 26/02/1997, a escola é autorizada legalmente para funcionamento de 1ª a 4ª série

por meio da Resolução n° 791/97. Gradativamente as 10 escolas do entorno foram nucleadas e

passaram a funcionar no Assentamento Missões na Escola Municipal Irmão Cirilo3” (FRANCISCO

BELTRÃO, 2017, p. 12).

Embora a escola tivesse alunos às salas de aula ainda estavam na estrutura das antigas

casas da Fazenda Marrecas e se fazia necessária à construção de um prédio escolar que atendesse os

estudantes. “Esse momento também é marcado pelo enfrentamento com o poder público municipal,

que em sua relação de poder não admite que o MST pudesse entrar na escola para ajudar a pensar a

escola que queriam para os/as filhos/as” (FARIAS, 2013, p. 81). Como não havia interesse da

administração em manter a organização da escola, essa necessidade só foi atendida após um

1 Mestre em Geografia. Professora de Geografia da Rede Estadual de Ensino do Paraná. Professora da Rede Municipal de Ensino de Marmeleiro. E-mail: [email protected]. 2 Mestre em Educação. Pedagoga da Rede Estadual de Ensino do Paraná. Professora colaborada no Curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. E-mail: [email protected]. 3 Como forma de caracterizar a necessidade de uma educação de qualidade e crítica para os filhos dos camponeses, a escola municipal chamou-se “[…] Irmão Cirilo que era um dos fundadores da ASSESOAR. Irmão Cirilo havia dedicado sua vida a pesquisa sobre os efeitos das plantas medicinais e sempre apoiou os agricultores em sua luta pela reforma agrária. Logo após a ocupação da Fazenda Marrecas, em 26 de junho de 1996, Irmão Cirilo havia falecido. Escolhendo seu nome, a escola homenageou o seu legado e plantou a semente para uma comunidade escolar saudável e próspera” (VAN DER BRUG, 2015, p. 213-214).

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importante momento: professores, alunos e comunidade reproduziram a sala de aula, num

acampamento na praça central da cidade de Francisco Beltrão. Assim, em 2001, dá-se a conquista

dos anos finais do Ensino Fundamental na rede municipal de ensino.

A conquista dos anos finais do Ensino Fundamental desencadeou o processo de retorno dos

alunos que frequentavam a escola na cidade para o campo, marcado pelo contragosto das famílias.

Estas, baseadas numa concepção de Educação Rural, acreditavam neste retorno para estudar no

campo como um retrocesso, dada a má qualidade da educação que poderia ser oferecida na escola

do campo. Nessa deixa, o poder público municipal aproveitou para tentar desestruturar a organização existente, pois até este momento não havia divisão entre as comunidades. O primeiro passo foi escolher estrategicamente as educadoras que iriam trabalhar na escola, pois como atenderiam da 5ª a 8ª série, havia a necessidade de profissionais com formação nas respectivas áreas. A direção foi indicada pela prefeitura, com um posicionamento autoritário e sem relação com o campo e com os movimentos sociais (FARIAS, 2013, p. 81-82).

No campo pedagógico, destaca-se o acompanhamento da escola, entre anos de 2002-2004,

com a Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural – ASSESOAR que possuía parceria

com o MST e a Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE para trabalhar os

conteúdos que privilegiavam a educação do campo e os conteúdos que evidenciavam a realidade

dos sujeitos inseridos no campo. Na matriz curricular de todas as escola do campo, havia uma

disciplina de Desenvolvimento Rural Sustentável – DRS, com duas aulas semanais nas quais eram

discutidas questões que envolviam a educação do campo.

Os anos finais do Ensino Fundamental foram ofertados pela rede municipal até o ano de

2010, quando passaram a ser incorporados pelo Colégio Paulo Freire, por meio da autorização de

funcionamento, resolução nº 5646/2010, que já ofertava o Ensino Médio desde 2005, autorização de

funcionamento, parecer nº 571/2005 e resolução nº 130/2005 e obteve seu reconhecimento n°

4445/09 em 21 de dezembro de 2009 (FRANCISCO BELTRÃO, 2017).

Cabe destacar que o nome Paulo Freire, tem origem a partir do estudo do livro “Paulo

Freire: o menino que lia o mundo” e sua dramatização para apresentar na abertura da Semana

Acadêmica de Pedagogia, realizada na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE),

campus de Francisco Beltrão. Ao estudarem a história, os alunos identificaram-se com o menino

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Paulo Freire que estudava debaixo de uma mangueira, enquanto eles, no início da escola no

acampamento, estudavam em banquinhos ajoelhados no chão.

Van Der Brug (2015), lembra que essa escola, improvisada na casa de um dos trabalhadores

da Fazenda ocupada, funcionava com todas as crianças sentadas no chão. Mais tarde os pais

providenciaram longos bancos de madeira, que na verdade eram feitos para sentar, mas foram

construídos para escrever sobre eles (Figura 1). A autora ainda destaca a fala do Seu Pacheco,

grande liderança da comunidade desde o acampamento: “Fui na bodega, comprei pregos e fui fazer

bancos para as crianças escrever. Elas ficaram sentadinhas no chão e escrevendo nos bancos”.

(VAN DER BRUG, 2015, p. 212).

É desse legado que nascem duas escolas articuladas num mesmo prédio escolar: A Escola

Municipal Irmão Cirilo – Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental e o Colégio

Estadual do Campo Paulo Freire – Ensino Fundamental II e Ensino Médio. Ambas buscam

trabalhar a formação dos sujeitos do campo, desde a perspectiva dos seus direitos por uma educação

pública e de qualidade. Figura 1 – Os pais construindo os bancos para a escola.

Fonte: Acervo da Escola Municipal Irmão Cirilo, 1996.

Referências FARIAS, Maria Isabel. Os processos de territorialização e desterritorialização da educação do

campo no sudoeste do Paraná. 2013. 129 p. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual

Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia Presidente Prudente. UNESP, São Paulo, 2013.

FRANCISCO BELTRÃO. Projeto Político-pedagógico do Colégio Estadual do Campo Paulo

Freire. Francisco Beltrão, 2017.

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VAN DER BRUG, Camie. Terra, luta e lar: biografia de Ademir Dallazem e o nascimento do

sistema Cresol. Tradução Luciana Rigotto. Inverso: Curitiba- PR, 2015.

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COLÉGIO ESTADUAL DO CAMPO PAULO FREIRE: A CONQUISTA DO ENSINO

MÉDIO E A MUDANÇA DA NOMENCLATURA PARA ESCOLA DO CAMPO

Claudiney de Oliveira

Jeferson Stocco

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições Escolares.

Palavras-chave: escola do campo; ensino médio; nomenclatura.

A história da formação do Colégio Estadual do Campo Paulo Freire inicia pela luta do

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) juntamente com as comunidades rurais

vizinhas tendo em vista que a região possuía uma demanda de alunos que a cada ano concluíam o

ensino fundamental na Escola Municipal Irmão Cirilo. A realidade socioeconômica das famílias

mostra a importância do Colégio com o ensino médio, visto que nas redondezas não havia outra

escola que oferecia essa modalidade de ensino.

A partir desta luta, realizou-se um pedido em 2004 junto à SEED para a implantação do

ensino médio. Foi necessário um intenso debate para demonstrar a qualidade do ensino ofertado na

escola do campo e, assim, justificar a volta dos alunos que estavam na cidade. Quanto ao poder

público municipal, a decisão não lhe cabia mais. Os embates, em um primeiro momento, são porque

o então Colégio Paulo Freire passou a usar a estrutura da escola municipal, incluindo telefone,

lanche, água, luz. Os educandos são os mesmos, mas ao mudar de mantenedora passaram a ser

vistos de forma diferente.

Com isso, em 2005 o Colégio Estadual Paulo Freire – Ensino Fundamental e Médio obteve

sua autorização de funcionamento através do Parecer 571/2005 e da Resolução nº 130/2005, com

três turmas simultâneas de 1º, 2º e 3º anos. O Ensino Médio obteve seu reconhecimento através da

Resolução N° 4445/09 em 21 de dezembro de 2009. O Ensino Fundamental II já existia a nível

municipal desde 2001 e passa a ser incorporado pela rede estadual em 2010 através da autorização

de funcionamento pela Resolução nº 5646/2010.

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Em 2009 universidades e movimentos sociais organizam um documento no qual consta a

concepção de Educação do Campo registrada nas Diretrizes Operacionais, as Diretrizes

Complementares e as Diretrizes Curriculares da Educação do Campo do Paraná (2006), com o

intuito de ter, no Estado, uma legislação para dar continuidade nas políticas educacionais.

O Comitê Estadual da Educação do Campo assumiu-o juntamente com a Coordenação

Estadual da Educação do Campo e passou a defender o documento, para ter mais força política, uma

vez que o referido Comitê era composto pelos Movimentos Sociais, Universidades Públicas do

Paraná, organizações governamentais e não governamentais.

O Conselho Estadual de Educação - CEE discutiu, mas não aprovou como Deliberação

como era a intenção, mas sim como um Parecer. Assim, que o Parecer foi aprovado, a então

secretária Estadual de Educação publicou a Resolução nº 4783/2010 – GS/SEED, reconhecendo a

Educação do Campo como uma Política Pública de Estado, o que também havia sido pautado pela

Coordenação Estadual. O referido documento é considerado um marco importante para a Educação

do Campo no Estado.

Em 2010, a Coordenação da Educação do Campo e Comitê Estadual da Educação do Campo

(ambos nasceram de demandas dos movimentos sociais e Universidades Públicas) conseguem fazer

com que o Conselho Estadual de Educação aprove o Parecer 1011/2010, pela necessidade de ter

uma Legislação Estadual, que normatize as escolas do campo, buscando embasamento legal e

político, e que atendesse as Escolas do Campo. Compreendeu-se que era preciso usar do que o

Estado considera legal (Resolução, Parecer, Portaria, Instrução...) formalizando-se desta maneira,

um aparato jurídico – normativo, para atender as “legítimas” necessidades das Escolas do Campo.

Uma nova gestão na Secretaria da Educação elaborou uma orientação nº 09/2011, para que

as escolas soubessem organizar os pedidos de mudança de nomenclatura, que consistia em

acrescentar “do campo” no nome da escola, para que, ao chegar na SEED, estivessem todos os

documentos que o parecer solicita.

Ressaltamos que no Parecer 1011/2010 a Escola decide em conjunto da comunidade escolar,

sobre a sua identidade, com a seguinte orientação: “a identidade da escola do campo é definida pelo

contexto sociocultural no qual está inserida, entendido este como trabalho com a terra, moradia e

produção da vida cultural centralizada nas relações sociais vividas no campo. A identidade da escola

do campo deverá ser definida pela comunidade escolar em conjunto com a comunidade local,

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devendo participar do momento de definição os gestores municipais e representantes estaduais.

(PARECER 1011/2010)”.

Assim, no ano de 2011, o Colégio passou a denominar-se Colégio Estadual do Campo Paulo

Freire – EFM, de acordo com a Resolução nº 4380/2011.

No ano de 2012, para garantir o cumprimento da legislação federal 11274 de 06 de fevereiro

de 2006 que altera a LDB 9394/96 em seus artigos 6º, 32 e 87, pela resolução Estadual 03 de 03 de

agosto de 2005 e a deliberação 03/2006 que torna obrigatório o ensino fundamental de nove anos o

colégio passou a ofertar do 6º ao 9º ano do ensino fundamental de forma simultânea, permanecendo

as resoluções para seu funcionamento.

A conquista do ensino médio no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire foi marcada por

uma trajetória, além da luta e dos embates, do retorno da escola para o campo com a intenção e

busca de uma proposta pedagógica diferenciada que contemple os saberes dos sujeitos do campo.

Hoje esse processo está consolidado. A luta agora é por práticas pedagógicas que articulem o

conhecimento científico ao cotidiano escolar a partir das concepções da modalidade da Educação do

Campo. Resgatando a perspectiva de uma educação de qualidade no campo como direito ao jovem

do campo.

Referências

FARIAS, M. I. Os Processos de Territorialização e Desterritorialização da Educação do

Campo no Sudoeste do Paraná. 2014. 129 p. Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual

Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Faculdade de Ciências e Tecnologia Campus de Presidente

Prudente. UNESP, São Paulo, 2013.

CADÓ, M. C. S. (org). Colégio Paulo Freire: um sonho, uma luta, uma realidade. Francisco

Beltrão: Grafibem, 2010.

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HISTORIOGRAFIA DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO DE PINHALZINHO –

MUNICÍPIO DE ENÉAS MARQUES - PR

Simone Kieling Galvão1

Ivaneidh Cirilo dos Santos ²

Eixo Temático 6: Educação do Campo e historiografia das Instituições Escolares

Palavras-chave: Escola; agricultores; formação.

O município de Enéas Marques está localizado na região Sudoeste do Paraná, Sul do

Brasil. Atualmente, segundo IPARDES (2018), o município conta com três distritos

administrativos: Enéas Marques, Vista Alegre e Pinhalzinho. Sua economia baseia-se nas atividades

agropecuárias, característico do processo de colonização realizado na região, principalmente pela

disponibilidade de terras férteis.

No distrito de Pinhalzinho, uma das unidades administrativas do município de Enéas

Marques, segundo Nurmberg (2017), cogitou-se inicialmente tornar-se sede municipal devido à sua

importância e desenvolvimento para a época, mas optou-se por questões econômicas o lugar atual.

Quanto ao processo de colonização, ainda segundo Nurmberg (2017), contou com a participação

intensa a partir de 1950 dos imigrantes, advindos de outros municípios paranaenses, assim como de

Santa Catarina e Rio Grande do Sul, devido às características do solo.

Com a colonização acontecendo, torna-se necessário criar toda uma estrutura básica

necessária para a manutenção da vida na comunidade, e com isso surgem diferentes atividades e

estabelecimentos econômicos e sociais, uma delas foi a criação de uma escola.

A Escola Estadual do Campo de Pinhalzinho tem origem com a Escola Municipal, no ano de 1955, construída com apenas uma sala, sendo que os pais pagavam o professor para dar

1 Professora de Ensino Religioso, licenciada em Geografia, Escola estadual do Campo de Pinhalzinho. [email protected] ² Professora de Inglês, Escola Estadual do Campo de Pinhalzinho.

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aulas. A partir de 1962, o Distrito de Jaracatiá, eleva-se à categoria de município, passando a chamar-se Enéas Marques e a escola passa a receber melhorias em sua estrutura, denominando-se, a partir de então, “Escola Treze de Maio”. (PPP, 2017, p.7-8)

Imagem 01: Escola Municipal Treze de Maio, 1969.

Fonte: Acervo do Colégio Estadual Castro Alves, 2016, In:Nurmberg (2017, p. 221)

A partir de 1983, esta escola “através da resolução nº 8.297, do dia 03 de janeiro de 1984,

conforme Diário Oficial do Estado foi reconhecida com a denominação de Escola Estadual

Pinhalzinho, PPP, 2017, p.8. Sua nomenclatura deve-se às características da vegetação da região,

composta pela Mara de Araucárias, também conhecidas como Pinheiros. Neste momento, além do

atendimento às séries iniciais do Ensino Fundamental, passa a atender as séries finais (6º ao 9º ano),

o que demandou ampliação em sua estrutura física, provocada pelo aumento da demanda de alunos.

No ano de 2012, considerando a solicitação realizada pela escola, a Secretaria de Estado da Educação–SEED, através da Resolução N° 5327/12, alterou a denominação de Escola Estadual de Pinhalzinho – Ensino Fundamental Séries Finais, para Escola Estadual do Campo de Pinhalzinho – Ensino Fundamental Séries Finais. (REGIMENTO, p. 5)

Atualmente, segundo Regimento Escolar, 2017, a Escola Estadual do Campo de

Pinhalzinho está localizada no, na Rua Jucelino Pichok, sem número. Sua sede não é própria,

pertence ao município de Enéas Marques, sob concessão de uso até “31/12/2040, constituída pelo

lote no 30 da GLEBA 52 - FB, com área de terreno de 2.000,00 m 2 (dois mil metros quadrados).”

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(REGIMENTO, 2017) que até o ano de 2017 compartilhava sua estrutura com o município. Em

2018, após a construção de uma nova sede, a escola município cede o espaço para o funcionamento

das séries finais do Ensino Fundamental, que atende estudantes das comunidades de Alto Pinhal,

Aparecida do Oeste, Arroio Empossado, Boa Vista, Cristo Rei e Rio Areia.

Esta entidade tem como unidade mantenedora Governo do Estado do Paraná, código INEP

41085272, e está jurisdicionada ao Núcleo Regional de Educação de Francisco Beltrão.

Os alunos em geral são filhos e netos de agricultores, e anualmente é realizado um

levantamento por meio de questionários e visitas às casas dos estudantes para que seja possível

identificar e verificar a realidade de cada um dos alunos criando condições de melhoras no processo

de ensino-aprendizagem, atendendo às suas expectativas, e que possam retornar e contribuir com

seu aprendizado, aplicando sempre que possível na sua propriedade e em casa, visando um

fortalecimento e valorização do campo, tendo em vista o elevado índice de evasão das pessoas da

área rural, para trabalhar nas áreas urbanos

Referências

NURMBERG, M. A. História da educação do município de Enéas marques – 1960 a 1992: das

escolas rurais à nuclearização. 2017. 267 f. Tese (Especialização em Educação) Universidade

Estadual do Oeste do Paraná. Francisco Beltrão, PR, 2017.

_______. Escola Estadual Pinhalzinho - Ensino Fundamental. Projeto Político Pedagógico, 2017.

_______. Escola Estadual Pinhalzinho - Ensino Fundamental. Regimento Escolar, 2017.

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MÉMORIAS DA ESCOLA RURAL DUARTE DA COSTA – VILA GUANABARA-

FRANCISCO BELTRÃO/PR (1990)

Carla Cattelan1

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições Escolares

Palavras-chave: Memória Escolar; História da Educação; Educação Rural.

O memorial, do Latim Memoriale, é a escrita de memórias, que relata acontecimentos

memoráveis, ou lembranças vividas. Ao elaborar um memorial, ou um relato de memórias, é

como reconstruir a própria existência, e considerei esta, uma tarefa nada fácil. O desafio

proposto foi resgatar fragmentos das experiências educativas na Escola Rural Duarte da Costa,

localizada na comunidade de Vila Guanabara, na jurisdição do Distrito de Nova Concórdia –

Francisco Beltrão/PR, hoje desativada. Os elementos de relevância se enquadram nas categorias

defendidas por Buffa e Nosella (2013) para a compreensão das Instituições Escolares, como:

prédio escolar, ensino, professores, materiais dentre outros, e também o processo de

nuclearização da escola em 1995. O relato acompanha o que Meihy identifica como identidade,

da qual “[...] é um fator original redefinido mediante uma herança cultural submetida a situações

desafiadoras” (p. 73). Assim, a identidade “[...] será sempre desafiada a se construir” (p. 73). A

história educacional acompanha o processo expansão das escolas rurais e a defesa de um

ruralismo pedagógico no Brasil no final da década de 1940 e início de 1950. E por esta razão se

relaciona intimamente as políticas de institucionalização da escola primária rural da época.

A Escola Duarte da Costa2 passou a funcionar na comunidade a partir de 1952 em um

lote de terra doado pelo meu avô ao lado da casa da família. Posteriormente, o prédio escolar se

1 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Mestre em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Francisco Beltrão - UNIOESTE. Professora colaboradora no Colegiado de Pedagogia da mesma instituição. Professora pedagoga pela SEED/PR. Membro do grupo de pesquisa HISTEDOPR e GEPHIESC. E-mail: [email protected]

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fixou na sede da comunidade. A Escola Rural Duarte da Costa tem sua importância na história

não só para a comunidade, mas para a família, pois, foi onde meu pai, minha mãe e meus tios

estudaram e depois de quase 30 anos de funcionamento eu e meus primos fomos alfabetizados.

Foi na escola que depositaram o valor do conhecimento e consideraram-na como um direito a

todos os sujeitos, e não um “artigo de luxo”. A maioria das famílias que moram na comunidade

de Vila Guanabara foram alfabetizadas e estudaram até a 4ª série na escola. Os que não estavam

em idade escolar, também foram alfabetizados em curso próprio para adultos. Além disso,

várias professoras, moradoras da comunidade lecionaram na respectiva escola, como é o caso da

professora Lourdes de Lara (hoje aposentada).

Lembro-me do prédio da escola no início da década de 1990. Construção em material

com janelas altas de um dos lados, e no outro lado, baixas e amplas, que permitiam a ventilação

e a entrada de luz. A pintura era branca com cinza, com destaque horizontal na metade da

parede. Havia cinco cômodos: uma sala de aula bem ampla, com um quadro que tomava toda a

parede. Também carteiras escolares de único lugar em madeira, acoplado o acento e a mesa. A

mesa possuía um relevo para acomodar o lápis e um guarda-material na parte de baixo, também,

esta era inclinada para melhor visualização e escrita no caderno. Havia também uma cozinha

onde a professora preparava o lanche. Com uma pia, um fogão e uma mesa. A professora era

quem preparava o lanche, entre meio uma aula e outra. O lanche mais disputado era macarrão e

almondegas. Lembro ainda de ter leite em pó rosa, achocolatado e bolacha salgada. Havia

também uma salinha para guardar materiais e livros, era um depósito. Também havia um

banheiro feminino e um masculino. Além disso, uma área ampla e um piso que circundava a

frente da escola. Tanto a merenda, como a limpeza da escola, eram feitas pela professora

regente, a professora Lourdes de Lara, algumas vezes os alunos auxiliavam neste processo,

compreendendo o valor do trabalho e zelando pelo local, reconhecido como a sua “segunda

casa”.

Quanto a organização da sala de aula e o ensino-aprendizagem, a professora dividia a

turma em quatro filas, sendo cada fila uma série (1ª, 2ª, 3ª e 4ª ). A organização permitia que a

mesma transitasse entre as séries explicando os conteúdos e fazendo o atendimento

2 Segundo registros na Secretaria de Educação de Francisco Beltrão, a Escola Duarte da Costa (1952) foi uma das primeira escola construída pelo município, levando em consideração que Francisco Beltrão só teve sua emancipação em 1952 de Clevelândia.

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individualizado. Cada turma respeitava o momento de explicação, participação, exercícios e

correção. Mas sempre acompanhávamos o que a professora explicará para a turma subsequente.

As turmas acompanhavam atentamente as explicações e desenvolvia as atividades propostas

pois a professora precisava fazer explicações para os demais alunos das outras séries. O material

utilizado para os exercícios de fixação propostos pela professora era uma apostila. A apostila

tinha tema de leitura, escrita e calculo. Fui alfabetizada com “A Eva viu a uva”. O material era

escasso, e a professora utilizava variadas metodologias e também material produzido por ela.

Aprendíamos Português, Matemática, Estudos Sociais e Ciências Naturais. Em alguns dias,

íamos até o campo da comunidade e jogávamos, o mais pedido era o “caçador”.

A relação professora-alunos e alunos-alunos eram harmoniosas e de profundo

conhecimento. E a relação escola, comunidade, família e igreja católica eram perceptíveis. A

escola rural era vista como “dá comunidade” por esta razão havia uma mútua participação. A

fotografia ilustra o prédio da escola atualmente.

Fotografia nº 1: Escola Duarte da Costa (estrutura atual desativada)

Fonte: Carla Cattelan, 2015.

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Em 1993 a Escola Rural Duarte da Costa foi nuclearizada3 ao Distrito de Nova Concórdia. O

processo de nuclearização não foi aceito pela professora Lourdes de Lara, (que contou em entrevista

a pesquisadora em 2014), nem pelos pais e comunidade de Vila Guanabara. Com o tempo não teve

escolha, ou os alunos iriam de transporte até Nova Concordia ou não estudavam. E assim fomos.

Referências

NOSELLA, Paolo; BUFFA, Ester. Instituições Escolares: por que e como pesquisar. 2. ed.

revisada. Campinas, SP: Editora Alínea, 2013.

MEIHY, José C. S. Bom. Manual de História Oral. São Paulo: Loyola. 1996.

3 O processo de nuclearização das escolas multisseriadas rurais, aconteceu em todo o Sudoeste do Paraná, segundo dados levantados na Secretaria de Educação de Francisco Beltrão, até 1997, foram nuclearizadas 92 escolas rurais multisseriadas. Segundo relatórios da administração municipal neste período, o motivo foi o gasto excessivo com as escolas em sua manutenção, o transporte escolar se tornaria mais acessível aos cofres públicos.

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NUCLEARIZAÇÃO DAS ESCOLAS RURAIS: HISTORIOGRAFIA DA PRIMEIRA

ESCOLA DA COMUNIDADE SÃO PIO X – KM 20

Aline Tortora de Oliveira1

Sônia Maria dos Santos Marques2

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições Escolares

Palavras-chave: Escolas Rurais; Nuclearização; Escola Basílio Tiecher.

O resumo apresentado, utilizou-se da pesquisa de Mestrado em Educação, da Universidade

Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, intitulada “Nono, vem aqui que tem gente”: Cultura e

identidade na Comunidade São Pio X – Km 20, Francisco Beltrão, Paraná, para discorrer sobre a

historiografia das escolas rurais e o surgimento e permanência da Escola Basílio Tiecher.

Na dissertação nossa principal intenção foi realizar o levantamento histórico da comunidade

e perceber como os moradores constroem suas identidades culturais, desta maneira, selecionamos

três espaços, a igreja católica, a escola e a festa da cultura italiana – Fest Vin.

Para tanto, estabelecemos a seguinte problemática: Com a nuclearização das escolas rurais,

ampliou-se o número de alunos atendidos pela escola da comunidade São Pio X, qual foi a

vantagem que os moradores identificaram sobre isso? Na tentativa de responder a indagação,

utilizamos a metodologia etnográfica, sabendo que ela busca aproximação com a cultura dos

grupos, identificando quais são os costumes, as crenças, os hábitos e demais elementos que compõe

as identidades e identificações assumidas por esta coletividade. Os instrumentos de coleta de dados

foram: a) observação e descrição; b) registro fotográfico; c) análise documental; d) Diário de

Campo; e) entrevistas narrativas. Como aporte teórico, utilizamos nesta discussão as contribuições

de Cattelan (2014).

1Mestre em educação. Graduada em Pedagogia e Artes Visuais. Pedagoga no Projeto de Extensão – Patronato. Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação. Professora Associada da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Francisco Beltrão. Docente no curso de Pedagogia e mestrado em educação. E-mail: [email protected]

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Com a instalação da Colônia Agrícola Nacional General Osório - CANGO, na Vila

Marrecas, houve incentivo no processo migratório e muitas famílias vieram para o Sudoeste do

Paraná. Quando as famílias chegavam, a CANGO fazia o cadastro, registrando o número de pessoas

analfabetas e alfabetizadas. Assim, Cattelan (2014, p. 63) aponta que “somente 1/4 da população era

alfabetizada ou teve algum tipo de contato com a escola”, sendo estes dados utilizados para

justificar a construção de escolas rurais. Criou-se então, um decreto para garantir acesso às escolas

primárias, mantidas pela Colônia e, geralmente, eram as pessoas das comunidades que escolhiam o

local para construir a escola.

As primeiras escolas rurais que existiram ocupavam o espaço das residências dos

professores, as chamadas Casas Particulares, entretanto, por não terem registros tais informações

foram esquecidas. Com a ação da CANGO, construiu-se escolas rurais documentadas, sendo a

primeira criada em 1948, considerada um marco para o progresso do Sudoeste, pois a partir desta,

outras escolas puderam ser construídas, possibilitando educação para os filhos dos colonos.

Encontramos no Projeto Político Pedagógico - PPP da Escola Basílio Tiecher, informações

sobre a primeira escola na comunidade do km 20, as quais corroboram que ela surgiu em março de

1954. O primeiro professor foi o senhor Palotino Teixeira, e as aulas eram ministradas, para uma

turma, na sua residência. Em contrapartida, o documento disponibilizado pela Secretária de

Educação, escrito a mão, identificado por registro nº 8, afirma que o “Centro Escolar “Basílio

Tiecher”, foi criado e instalado em 1952”, dois anos antes da data citada no PPP da escola.

Buscamos mais documentos na escola, e encontramos mais manuscritos, o que reforça que o

primeiro professor lecionava em casa particular, em 1954.

Palotino Teixeira, foi destacado nos documentos como sendo o primeiro professor da

comunidade e, da mesma maneira, a entrevistada Maria Trindade Tiecher, afirma que “[...] o

primeiro professor foi o Palotino Teixeira, ele morava aqui no 20, [...] ele era meu cunhado, mas daí

ele foi dar aula no 14 [...]” eu “acho que era em 1956 por aí”.

As escolas eram construídas com os recursos e materiais disponíveis na comunidade. Desta

maneira o PPP da escola informa que foi construída uma instituição de ensino com uma sala de

aula, e o professor Palotino permaneceu lecionando neste local até 1957. Na sequência, houve a

necessidade de se ampliar a edificação, sendo construídas mais algumas salas de aula e, com

incremento no número de alunos, ocorreu a necessidade de contratação de mais professores.

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Segundo Cattelan (2014, p. 27), “as escolas foram mantidas pela Colônia até meados de

1957, a partir de então, a manutenção ficou sob responsabilidade do município de Francisco

Beltrão, bem como o quadro de professores”, sendo que, até 1957, foram construídas 27 escolas

rurais primárias. O Decreto nº 926, de 26 de julho de 1975, informa que foi autorizado o

funcionamento do 1º grau na comunidade, mas somente em 1977 foi implantado de 5ª a 8ª séries.

O PPP informa que “em 1997, houve a nuclearização das escolas rurais”, e a Escola Basílio

Tiecher recebeu alunos de 15 comunidades. A partir do crescimento da cidade, algumas famílias

abandonaram a vida no meio rural, deixando as comunidades, cada vez, com menos moradores.

Para o município, continuar mantendo todas as escolas existentes e professores, com a baixa

quantidade de alunos, tornou-se inviável, sendo esta uma das justificativas utilizada para o

fechamento das escolas rurais.

A escola Basílio Tiecher, recebeu alunos de diversas comunidades, primeiramente por ser

um distrito do município de Francisco Beltrão e por possuir o 1º grau, no qual as demais que

fecharam não possuíam. O fato de ter o 1º grau foi considerado uma conquista, porque antes disso,

as crianças dependiam de meio de transporte ou até mudar de residência para continuar os estudos

na cidade. Para grande parte dos alunos os estudos acabavam quando se concluía a 4º série.

Percebemos que para os moradores da comunidade São Pio X, o fechamento das demais escolas não

foi algo ruim, pois seus filhos estudariam em uma escola que receberia melhorias.

No ano de 2017, a escola estava com 235 alunos matriculados, nos turnos da manhã e

tarde, advindos de 19 comunidades vizinhas. Embora haja a distância entre o local de residência e a

escola, os alunos utilizam o transporte escolar fornecido pela Prefeitura Municipal de Francisco

Beltrão, no qual não seria necessário se a escola tivesse permanecido no local em que residem.

Referências

FRANCISCO BELTRÃO. Escola Municipal Basílio Tiecher - Projeto Político Pedagógico –

Construção Coletiva, 2012.

CATTELAN, C. Educação rural no município de Francisco Beltrão entre 1948 a 1981: a escola

multisseriada. Dissertação de Mestrado, Francisco Beltrão, 2014.

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TIECHER, Maria Trindade. Entrevista concedida a Aline Tortora de Oliveira, Francisco Beltrão, 05

de janeiro de 2017.

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RELATO HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO, NASCIMENTO E NUCLEARIZAÇÃO DA

ESCOLA MUNICIPAL IRMÃO CIRILO

Andressa Fachin 1

Carlos Narciso Bridi2

Ivanir Arnaust Mendonça3

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições do Campo

Palavras-chave: Educação do Campo; Historiografia; Instituições do Campo.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, surge no Brasil, na década de

1980. Entre os acontecimentos que se deram a partir de 1978 e que compõem sua história estão:

reuniões de agricultores sem terra, para discussão de seus problemas e coletivamente conquistarem

suas terras, conflitos entre fazendeiros e sem-terra, realização de diversas ocupações

(ANDREETTA, 2002).

Neste contexto, o processo de ocupação de terras pelos, dentro do plano da reforma agrária,

do MST fez surgir inúmeras escolas, entre elas, a Escola Municipal Irmão Cirilo situada no

Assentamento Missões - Linha Fazendinha, distante 22 Km da cidade de Francisco Beltrão,

pertence a região Sudoeste do Estado do Paraná, região Sul do Brasil. Assim, portanto, o processo

de constituição dessa escola, encontra-se diretamente vinculado à luta pela terra e pelo direito à

educação dos filhos dos camponeses. “A Educação do campo nasceu como crítica à realidade da

educação brasileira, particularmente à situação educacional do povo brasileiro que trabalha e vive

no/do campo” (CALDART, 2009, p. 39.)

No caso do Sudoeste do Paraná, onde encontra-se o Assentamento Missões e a Escola

Municipal Irmão Cirilo, o processo de ocupação da Fazenda Camilotti, deu-se pela articulação do

1 Mestre. Professora da Rede Estadual de Educação – SEED/PR. E-mail: [email protected]. 2 Especialista. Professor de História no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire – Francisco Beltrão – PR. E- mail: [email protected] 3 Ensino Médio. Agente Educacional I no Colégio Estadual do Campo Paulo Freire.

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Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Francisco Beltrão e da Associação de Estudos, Orientação e

Assistência Rural (ASSESOAR). Conforme informações obtidas junto ao Fórum, e até mesmo na

imprensa, tomou-se conhecimento de que a área de propriedade do grupo Camilotti estava

hipotecada no Banco do Brasil e Banestado, por estar com um grande saldo devedor sem condições

de quitar as dívidas, a área entrou em leilão para junho de 1996. Em 27 de maio de 1996, antes que

o próximo leilão acontecesse, um grupo de mais ou menos 320 famílias vindas dos municípios da

região Sudoeste do Paraná, organizadas por movimentos populares locais, fizeram a ocupação da

área. Eram todos arrendatários e viviam permanentemente perdendo o trabalho e não podendo

construir uma vida digna (ANDREETTA, 2002)

Figura 1 – Ocupação da Fazenda Camilotti

Fonte: Arquivo da comunidade, 1996

Assim que se instalaram surge a preocupação com a educação das crianças e, para tanto foi

improvisada uma escola que funcionava na casa de um dos trabalhadores da antiga fazenda, as

crianças estudavam todas sentadas no chão, mais tarde os pais construíram longos bancos e as

crianças escreviam de joelhos sobre os banquinhos (VAN DER BRUG, 2015). Em 17 de junho de 1996

iniciaram-se as aulas, após 20 dias de ocupação. Oficialmente a criação da Escola Municipal Irmão

Cirilo de 1ª a 4ª Série, deu-se por meio da resolução nº 791/97 (FRANCISCO BELTRÃO, 2017).

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As conquistas vêm marcadas por um conjunto de valores que vão se produzindo junto com a escola que funcionava nos barracões e casas da fazenda, onde as crianças estudavam de joelho escrevendo sobre os banquinhos. Conforme relato dos professores que iniciaram o trabalho, após 20 dias de ocupação as aulas já foram iniciadas pelas professoras Neusa Bastian Trento, Irone Castoldi Griz e Terezinha Ré com 74 estudantes distribuídos em 4 turmas e fechou o ano com 90 estudantes. Inicialmente a escola funcionava com o nome da escola da Fazendinha que estava desativada (FRANCISCO BELTRÃO, 2017, p. 9).

A história da Escola Municipal Irmão Cirilo que inicia suas atividades com o nome da

escola da Fazendinha e, aos poucos outra escolas do entorno vão se juntando a ela. As escolinhas

das comunidades das linhas Piracema, Bom Jesus, Formiga, Volpato, Água Vermelha, Lajeado

Grande, Santa Bárbara e Jandira encerram gradativamente suas atividades e compõe essa escola

maior, no Assentamento Missões.

A Escola da Linha Piracema se chamava Escola Rural Municipal Pero Vaz de Caminha, da

Linha Formiga Escola Rural Municipal Vereador Romeu Lauro Werlang, da Linha Volpato Escola

Rural Municipal Érico Veríssimo, da Linha Água Vermelha Escola Rural Municipal Padre

Anchieta, Linha Lajeado Grande Escola Rural Municipal São Francisco de Assis, Linha Santa

Bárbara Escola Rural Municipal Olavo Bilac, da Linha Jandira Escola Rural Municipal Presidente

Kennedy.

Algumas dessas escolas ainda existem e sua estrutura é utilizada pela comunidade para

realização de reuniões do clube de Mães e Pastoral da Criança como na Linha Formiga e Água

Vermelha e ou adaptaram-na para uso como cozinha do Centro Comunitário como na Linha

Piracema. As escolas da Linha Bom Jesus, Volpato e Jandira possuíam estrutura de madeira e foram

desmanchadas. A escola da Linha Volpato, quando aconteceu o processo de nuclearização foi

transformada em igreja juntamente com a casa da professora da época, mas hoje mesmo a igreja

está desativada.

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Figura 2 – Escolas da Linha Santa Bárbara, Lajeado Grande e Formiga

Fonte: Acervo da Escola Municipal Irmão Cirilo/Colégio Estadual do Campo Paulo Freire, 2018.

Referências:

CALDART, Roseli Salete. Educação do campo: notas para uma análise de percurso. Trab. Educ.

Saúde, Rio de Janeiro, v. 7 n. 1, p. 35-64, mar./jun.2009.

FRANCISCO BELTRÃO. Projeto Político-pedagógico do Colégio Estadual do Campo Paulo

Freire. Francisco Beltrão, 2017.

HAMMEL, Ana Cristina; COSTA SILVA, Nilton José; ANDREETTA, Ritamar (orgs.) Escola em

movimento: a conquista dos assentamentos. Editora Progressiva: Rio Bonito do Iguaçu - PR, 2007.

VAN DER BRUG, Camie. Terra, luta e lar: biografia de Ademir Dallazem e o nascimento do

sistema Cresol. Tradução Luciana Rigotto. Inverso: Curitiba – PR, 2015.

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RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO DE VISTA ALEGRE –

ENÉAS MARQUES/PR.

Irene Zakaluk de Almeida1

Keissiane Michelotti Geittenes de Avila2

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições Escolares

Palavras-chave: escola do campo; história; comunidade.

O município de Enéas Marques, no estado do Paraná, é formado por vários distritos, sendo

um deles o distrito de Vista Alegre, onde está localizado o Colégio Estadual do Campo de Vista

Alegre. O Colégio oferta aos alunos Ensino Fundamental II e Ensino Médio. As suas instalações

pertencem ao Estado do Paraná e, no ano de 2017/2018, o Colégio foi contemplado com apoios e

projetos específicos para reformas e melhorias, conforme figura 1.

Figura 1- Fotografias do Colégio Estadual do Campo da Vista Alegre – Entrada, quadra e biblioteca

Fonte: Arquivos da instituição, do Colégio Estadual da Vista Alegre.

A história da comunidade, de acordo com informações do Projeto Político Pedagógico (PPP)

do Colégio Estadual do Campo de Vista Alegre, constituiu- se a partir do povoamento denominado

1 Professora de Matemática do Ensino Fundamental do Colégio Estadual do Campo de Vista Alegre. E-mail: [email protected] 2 Professora na rede municipal de Francisco Beltrão. Pedagoga do Colégio Estadual do Campo de Vista Alegre. E-mail: [email protected].

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atual distrito de Vista Alegre. Esta comunidade foi formada por diversas famílias de agricultores,

que migraram dos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, chamados de safristas ou

paioleiros, atraídos pelas informações de solo fértil. Produziam culturas rotativas e trabalhavam

com a pecuária primitiva, criando os animais soltos, especialmente os suínos. Já em 1952, a

comunidade possuía um comércio forte e já se chamava Vista Alegre, conforme relato dos

moradores Senhor Bruno Didó e esposa Sra. Clarí Dondé Didó (PPP, 2011).

Realizando um breve resgate histórico, verifica-se que a primeira escola foi construída em

1953, somente com duas salas de aula, onde lecionavam as professoras, Plácida Adria e Elza Keki.

Depois de nove anos, em 1962, a escola recebeu a construção de mais quatro salas de madeira, e

passou a se chamar Escola Rural Municipal Hercílio Luz (ENÁS MARQUES, 2017) (Figura 2).

Figura 2 - Fotografia da Escola Rural Municipal Hercílio Luz

Fonte: NURMBERG (2017), adaptado pela autora.

Em 14 de dezembro 1964 foi instituído o município de Enéas Marques, assim a escola

deixou de pertencer ao Município de Francisco Beltrão. Conforme Nurmberg (2017, p.93): “Pelo

depoimento de Baio podemos identificar outras duas escolas no antigo Jaracatiá, e que devido ao

incêndio na prefeitura, não encontrou-se documentos sobre sua existência:....”. Essas importantes

informações ficaram somente nas lembranças das pessoas que ajudaram a construir essa história.

Na administração do Prefeito Atílio Chaves, em 1979, a escola recebeu algumas

benfeitorias, promovendo melhora na estrutura física, com implantação ginasial (ensino

fundamental II – 5° ao 8° ano). Com o tempo, a estrutura física desse local passou a ter mais salas

de aula e outros espaços, como cozinha, laboratório e biblioteca (ENÉAS MARQUES, 2017).

A escola era uma extensão da Escola Estadual Arnaldo Busato, pertencente ao Município de

Francisco Beltrão, desenvolvendo suas atividades como Escola de Vista Alegre. Em cumprimento à

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resolução administrativa do Estado de número 4346/83, desmembra-se desta e fica autorizada a

funcionar como Escola Estadual de Vista Alegre (NURMBERG, 2017).

Das doze escolas dos distritos de Enéas Marques, somente duas escolas permaneceram: A

Escola Rural Municipal Hercílio Luz, atual Colégio Estadual do Campo de Vista Alegre e Escola

Rural Municipal Treze de Maio, no distrito de Pinhalzinho, hoje Escola Estadual do Campo de

Pinhalzinho.

Através da Resolução nº 5213/11, foi alterada a denominação da Escola Estadual de Vista

Alegre – Ensino Fundamental, para Escola Estadual do Campo de Vista Alegre, a partir de

01/04/2011 (PARANÁ, 2012).

No ano de 2017, a escola teve uma nova nomenclatura, que em decorrência do mantenedor

ser o Estado do Paraná para a oferta da Educação Básica, passou a denominar-se Colégio Estadual

do Campo de Vista Alegre, por meio da Resolução nº 5806/2016. Essa resolução marcou a

implantação e funcionamento do Ensino Médio do Colégio Estadual do Campo de Vista Alegre –

Ensino Fundamental e Médio, a partir de 01/01/2017 pelo prazo de três anos, com implantação

gradativa (NURMBERG, 2017).

Por se tratar de uma vila composta de pequenos e médios agricultores, há uma demanda de

um trabalho diferenciado que contemple a realidade local e promova a apropriação do

conhecimento historicamente sistematizado. Por isso, mediante seu histórico de amplas

transformações, o desafio posto é o fortalecimento da rearticulação das práticas pedagógicas

envoltas na Educação do Campo, com uma metodologia diferenciada, que contempla estudos,

acompanhamento e reflexão coletiva de tais práticas.

Referências

ENÉAS MARQUES. Projeto Político Pedagógico. Escola Estadual do Campo Vista Alegre -

Ensino Fundamental. 2017.

NURMBERG. M. A. História da Educação do Município de Enéas Marques- 1960 a 1992: das

Escolas Rurais à nuclearização. Francisco Beltrão, 2017 (Dissertação de Mestrado – Universidade

Estadual do Oeste do Paraná, 266 f.).

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PARANÁ. Resolução nº 5213/11, de 21 de nov. de 2011. Alterar, a pedido da Escola Estadual de

Vista Alegre – Ensino Fundamental, Paraná, para Escola Estadual do Campo de Vista Alegre –

Ensino Fundamental. Secretaria de Estado da Educação, SEED. Diário Oficial nº 8625, Brasília, 06

jan. 2012.

PARANÁ. Resolução nº 5806/2016, de 22 de dez. de 2016. Autoriza o funcionamento do Ensino

Médio e adequa a nomenclatura. Secretaria de Estado da Educação, SEED. Diário Oficial nº 9849.

Brasília, 23. Dez. 2016.

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RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO MARECHAL DEODORO DA FONSECA SEDE PROGRESSO – VERÊ – PR – PARTE II

Tânia Regina Moreschi Fabiane1

Eixo Temático 6: Educação do Campo e Historiografia das Instituições Escolares

Palavras-chave: história; escola; educação

O processo de Rearticulação da Escola do Campo na modalidade da Educação do Campo

iniciou seus registros nos anos de 2015 e 2016, com o acompanhamento das práticas pedagógicas

do Colégio Estadual do Campo Paulo Freire – Francisco Beltrão/PR e Escola Estadual do Campo de

Pinhalzinho e Vista Alegre – Enéas Marques/PR.

A Escola Estadual do Campo Marechal Deodoro da Fonseca, Tancredo Neves e Regente

Feijó do município de Verê/PR iniciaram a participação nesse processo no ano de 2016, quando o

NRE de Francisco Beltrão convidou as escolas do campo de Enéas Marques e Verê para dialogar

sobre o fortalecimento destas instituições. Neste evento, as escolas apresentaram suas experiências

na modalidade de educação do campo e discutiu-se um questionário diagnóstico a respeito da vida

sócio-econômica dos alunos e suas famílias.

Assim, neste ano realizou-se a visita as famílias, intitulada “trilhas escola e família” onde

os professores e funcionários realizaram o percurso que os estudantes e suas famílias fazem no

cotidiano para chegar a escola. O objetivo dessas visitas foi conhecer a realidade das comunidades

no entorno da escola do campo constituindo vínculos entre o estabelecimento de ensino e as pessoas

que ali vivem.

Além disso, enviaram-se as famílias o questionário sobre o inventário da realidade que se

constitui, Como um instrumental que levanta e reúne informações sobre a realidade específica ou mais próxima da vida, do trabalho e da cultura dos estudantes e suas famílias. Para isso, inicia nas comunidades que compõem os entornos da escola, o município e a realidade

1 Tânia Regina Moreschi Fabiane, habilitada em Matemática, Física e Pedagogia, e-mail: [email protected] .

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regional da qual a escola faz parte. Compõem-se de diversas fontes e registros de dados que vão desde o que as comunidades guardam como patrimônio, até a Ciência e Tecnologia disponíveis no município e na região (GHEDINI & BERTÉ, 2018, p. 67).

Evidencia-se no inventário que, quanto ao grau de escolaridade dos responsáveis 49%

possuem ensino fundamental séries iniciais incompletas, 8,3% ensino fundamental séries iniciais

completas, 15,8% ensino fundamental séries finais incompletos, 10% ensino médio incompletos,

10,9% ensino médio completos, 3,6% ensino superior completo e 2,4% são analfabetos.

Os moradores do campo afirmam que é bom morar no interior porque é possível produzir a

própria alimentação, o custo de vida é menor, é lugar calmo e sossegado, há mais tempo para curtir

a família e há pouca poluição. Quanto às desvantagens em morar no campo estão as dificuldades de

acesso ao comércio, as comunicações, ao transporte, à saúde e empregos.

No ano de 2017, a formação continuada para os professores na modalidade de Educação do

Campo foi intensificada. Houve participação de professores e funcionários em várias formações

realizadas com ênfase na análise de conjuntura, legislações que envolvem a educação do campo, o

estudo da realidade do entorno da escola, estudo dos documentos que fortalecem a escola pública do

campo, bem como o instrumental metodológico para o trabalho em sala de aula. Essa formação foi

realizada pelo Grupo de Pesquisa Educação, Formação Humana e Movimentos Sociais Populares da

Unioeste - Campus de Francisco Beltrão/PR.

Além disso, participou-se da REFOCAR, rede de formação dos professores e

fortalecimento das escolas do campo, onde se estudou temas relacionados a Educação do Campo e

colaborou-se na elaboração dos mapas de conteúdos e conceitos de cada ano do ensino

fundamental, ponto de partida para relacionar as especificidades à totalidade dos conhecimentos de

cada disciplina.

Também se produziu o Dossiê do Inventário da Realidade, instrumento que traz para o

interior da escola e da sala de aula, a realidade como concretude a ser pensada ao planejar. Todos os dados levantados pelo inventário são organizados neste material em forma de um “grande caderno”. Blocos temáticos dividem o material em forma de “capítulos” chamados Fontes Educativas. Estas, se subdividem em partes menores, nomeadas Porções da Realidade. Além de ser utilizado pelos professores no planejamento, o Dossiê é usado, também, pelos estudantes durante as aulas (GHEDINI; BERTÉ, 2018, p. 71).

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Para este trabalho dividiram-se os professores pelas fontes educativas e, cada grupo, buscou

os elementos nos questionários e nos órgãos competentes para o registro escrito dos dados da

realidade. Estes dados são utilizados para o planejamento e o trabalho em sala de aula, já que o

caderno elaborado são uma compilação de pesquisas, constituindo um material para estudo e

consulta, não uma publicação que careceria de direitos autorais.

As fotos abaixo demonstram algumas das atividades de pesquisa realizadas pelos alunos por

meio desenhos a partir dos temas do Inventário da Realidade, para fazerem o exercício de unir sua

vida cotidiana aos conhecimentos aprendidos na escola. Nestas imagens foram trabalhadas as

questões do transporte escolar e os caminhos para chegar a escola.

Figura 1: Desenho dos alunos sobre os caminhos para chegar na escola

Em 2018, realizaram-se as mesmas atividades dos anos anteriores, acrescentando-se o

Planejamento Interdisciplinar Coletivo e o Círculo de Saberes e Conhecimento.

O Planejamento Interdisciplinar Coletivo aconteceu trimestralmente com a reunião dos

professores por disciplinas onde se apresentou os conteúdos estruturantes, básicos e específicos, e a

partir destes encontraram-se pontos comuns para o trabalho interdisciplinar. Após este trabalho, os

alunos mostraram a seus pares o resultado das produções de forma escrita e/ou orais. Esse momento

de mostra intitula-se “Círculo de Saberes e Conhecimento”.

Tem como ponto de partida o Planejamento Coletivo Interdisciplinar e, depois de um trimestre de trabalho, socializa-se, num mesmo período escolar, uma das atividades de Encontro das disciplinas realizadas em cada turma, para que os alunos possam comunicar seus estudos e aprendizagens... É um momento dos estudantes colocarem-se como

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protagonistas do próprio conhecimento, firmando a perspectiva de que o conhecimento é uma forma de portar-se frente ao mundo, frente à vida mesma e a realidade onde vivem. (GHEDINI; BERTÉ, 2018, p.74).

Outrossim, sempre que foram realizados os Círculos de Saberes e Conhecimentos, a

comunidade escolar se fez presente, valorizando e apreciando o trabalho dos filhos e da escola.

Esta dinâmica introduzida alterou o dia a dia da escola: maior empenho, estudo e produção

por parte dos professores. Maior desenvoltura e aprendizagem por parte dos alunos. Mudanças nas

metodologias, na reflexão, partilha da realidade e de conhecimentos. Comunidade escolar mais

participativa e gestão escolar democrática se fortalecendo, estabelecendo vínculos com a nossa

comunidade.

Referências

GHEDINI, Cecília Maria; BERTÉ, Rosane (org). Planejamento Coletivo Interdisciplinar e

Instrumental Metodológico. Produção de referências com as escolas públicas do campo –

Sudoeste do PR, Unioeste/Francisco Beltrão, 2018, 130 p.

VERÊ. E.E.C. Mal. Deodoro da Fonseca. Projeto Político Pedagógico, 2017.

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RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO MARECHAL DEODORO DA FONSECA SEDE PROGRESSO – VERÊ – PR – PARTE I

Débora Anara Didoné1

Denice Beal2

Elisângela Mirian Biondo3

Selvina Januária Sezinandi4

Tânia Regina Moreschi Fabiane5

Eixo Temático 6: Educação do campo e Historiografia das instituições escolares

Palavras-chave: história da educação; escola rural; educação do campo, Escola Estadual do Campo

Marechal Deodoro da Fonseca.

A Escola Estadual do Campo Marechal Deodoro da Fonseca iniciou suas atividades no

distrito de Sede Progresso, município de Verê, no ano de 1959. A mesma funcionava multisseriada,

em dois turnos. Conforme relato dos alunos que frequentavam a escola, em sua maioria estavam em

defasagem idade série e apresentavam indisciplina. O professor era responsável pela limpeza,

alimentação, ensino e documentação escolar. O atendimento aos alunos era de segunda feira à

sábado, sendo que o sábado era destinado para a faxina geral, inclusive do pátio, com o auxílio dos

alunos. A água não chegava até a escola, então os alunos buscavam com baldes e bacias em poços

distantes mais de 500 m, sendo que essa era usada para beber, cozinhar e limpar. Não havia

transporte escolar e os alunos, segundo eles, caminhavam vários quilômetros para chegar a escola.

O primeiro professor foi Pedro Santana, que permaneceu por aproximadamente dois anos

lecionando na escola. Muitos professores trabalharam nesta escola por um curto período de tempo,

1 Agente Educacional II, e-mail: [email protected] 2 Professora habilitada em Biologia e Química, e-mail: [email protected] 3 Habilitada em Língua Portuguesa e Inglês, e-mail: [email protected] 4 Habilitada em Peagogia, e-mail: [email protected] 5 Habilitada em Matemática, Física e Pedagogia, e-mail: [email protected]

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mas as professoras Lourdes Maria Borlin Michilin, (1959 até 1984) e Maria Pasa Antonello (1973 a

1990), sendo as professoras com maior tempo de serviço na escola.

D. Lourdes, uma das primeiras professoras, relatou que: A escola era de madeira, tinha duas salas e entre elas uma pequena área. O local onde a escola estava instalada era ruim de água e depois abriram um poço, mas a água não era muito boa. Eu dava aula o dia todo e no sábado tinha aula, cantava o hino, tomava distância. Eu adorava dar aula, quando as crianças me viam, corriam me encontrar. Um dia era muito frio, eles fizeram um fogo no pátio, era no sábado, e falaram professora venha esquentar os pés e eu fui e esquentei os pés, mas não tirei as meias. Quando percebi uma coisa que grudava era a meia pegando fogo. Cansei de dar aula com 40 alunos. (MICHILIN, 2018).

A figura abaixo representa a primeira escola construída em Sede Progresso, conforme

relato da professora Lourdes.

Figura 2. Foto da primeira escola construída em Sede Progresso

Toda a documentação e informações escritas sobre a fundação da referida escola foi

perdida devido a um incêndio na Prefeitura Municipal de Francisco Beltrão, em 1966, a qual a

escola estava jurisdicionada.

No ano de 1963, com a emancipação política do município de Verê, a Escola Estadual

Marechal Deodoro da Fonseca passou a pertencer a este município, tendo como entidade

mantenedora o Governo do Estado do Paraná e ao longo do tempo várias escolas foram sendo

implantadas nas comunidades vizinhas, pertencentes ao distrito. Todas as escolas ofertavam ensino

de 1ª a 4ª série e eram mantidas pelo Governo Estadual.

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No ano de 1964, criou-se a Escola Estadual General Osório na comunidade de Boa

Esperança, distante a aproximadamente a 4 km de nossa escola. Cessou suas atividades no ano de

1996.

No ano de 1966, três novas escolas foram criadas. A Escola Estadual Alberto Pascoalinio,

na comunidade de Maracajá. A Escola Estadual Olavo Bilac, na comunidade de Boa Vista. A

Escola Osório Duque da Estrada, situada na Linha Nardi, distantes aproximadamente a 6 km, 5 km

e 3 km respectivamente, de nossa escola. As duas primeiras escolas criadas neste ano, cessaram

suas atividades em 1996 e a última em 1997.

No ano de 1967 uma nova escola foi criada na comunidade de Plano Azul, a Escola

Estadual Frei Henrique Soares, distante aproximadamente 5 km de nossa escola e funcionou até

1997.

Em 1971, a última escola do distrito foi criada, a Escola Estadual Alberto Santos Dumont,

em Flor da Serra, distante aproximadamente 3 km de nossa escola e funcionou até 1997.

Somente no ano de 1984 a escola passou a oferecer o curso completo de 1º grau (1ª a 8ª

séries) pela Resolução n° 255/84 de 25 de janeiro de 1984 da Secretaria de Estado de Educação, que

autorizava a implantação gradativa de 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do primeiro grau, apresentada em

assembleia no dia 15/02/1984 pelo então inspetor de ensino Rovílio Renostro.

Segundo o inspetor de ensino: A implantação do ensino fundamental completo de 1º grau aconteceu quando este era inspetor de educação. A Escola Marechal Deodoro da Fonseca era estadual e oferecia ensino primário. Em 1984, durante o governo de José Richa foi implantado a complementação de 5ª a 8ª série. Esse processo foi elaborado com base na reivindicação da população, que justificava a distância até a sede do município, a clientela, pois existiam mais de 200 alunos que frequentavam a escola e tinham que se deslocar até o Verê para fazer a complementação de 5º a 8ª série. Com o apoio político, de deputados, prefeito, vereadores e professores foi feito o projeto e aprovado em 25/01/1984 (RENOSTRO, 2018).

Foram realizadas 45 matrículas de 5ª e 6ª séries. Também foi aberta uma 6ª série no

período noturno, pelo fato de haver alunos que trabalhavam durante o dia. As professoras atuantes

no ato da implantação da escola foram: Deolides Maria Bernardi Kruger, Lúcia Perardt e Vera

Lúcia Zitkoski. O curso de ensino fundamental foi reconhecido pela Resolução n° 618/87 de

19/02/1987.

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No ano de 1998, as escolas das comunidades vizinhas cessaram as atividades e os alunos

iniciaram seus estudos em nossa escola. Esse processo de nuclearização fez com que o Governo

Municipal assumisse como entidade mantenedora o ensino de educação infantil e anos iniciais do

ensino fundamental. Assim, houve a separação das escolas para atendimento dos alunos.

A Escola Municipal Viver é Aprender passou a atender a educação infantil e anos iniciais

do ensino fundamental e em dualidade administrativa, a Escola Estadual Marechal Deodoro da

Fonseca passou a ofertar somente os anos finais do ensino fundamental.

No ano de 2011 mudou sua nomenclatura para Escola Estadual do Campo Marechal

Deodoro da Fonseca, devido aos alunos, em sua maioria, provenientes de famílias de pequenos

agricultores que tem como fonte de renda a plantação de grãos, atividade leiteira e avicultura.

Atualmente, a escola oferece o ensino fundamental de 6° ao 9° ano, estando em

funcionamento no período vespertino com uma turma de cada ano. Ainda, participa do processo de

Rearticulação das Escolas do Campo em parceria com a UNIOESTE e NRE de Francisco Beltrão,

onde as atividades de visitação as famílias, tabulação de dados a partir de aplicação de questionário

sócio econômico às famílias, construção e utilização de dossiê sobre a realidade do entorno da

escola, a utilização dos instrumentos de planejamento, círculo de saberes e conhecimento e mapas

de conteúdos fazem com que a dinâmica da sala de aula seja viva, enriquecedora e (re)construtora

de conhecimentos.

Referências

GHEDINI, Cecília Maria; BERTÉ, Rosane (org.). Planejamento coletivo interdisciplinar e

instrumental metodológico. Produção de referências com as escolas públicas do campo – Sudoeste

do PR. Francisco Beltrão: Unioeste, 2018. 130 p.

MICHILIN, LOURDES M. B. Entrevista concedida a Tânia Regina Moreschi Fabiane. Verê/PR

15/04/2018.

MORESCHI, Tânia R. M.; MIOLA, Benilda (org). Fatos e boatos: perfil sócio econômico de Sede

Progresso, Verê/PR, 2000. 70 p.

RENOSTRO, Rovílio. Entrevista concedida a Tânia Regina Moreschi Fabiane. Vista Alegre do

Prata/RS, 30/04/2018.

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VERÊ, E.E.C. Mal Deodoro da Fonseca. Projeto Político Pedagógico, 2017.

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RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA ESTADUAL DO CAMPO TANCREDO NEVES-

LAMBEDOR-VERÊ / PR

Mara Cristina Calgarotto1

Eixo Temático 6: Educação do campo e Hstoriografia das instituições escolares Palavras-chave: História da Educação, educação do campo, Escola Estadual do Campo Tancredo Neves.

A Escola Estadual Tancredo Neves iniciou suas atividades em 1986 com a Resolução nº.

5231/86- DOE 15/12/1986, com implantação gradativa de 5ª a 8ª séries. Funcionava nas

dependências da Escola Municipal Joaquim Nabuco, com início das atividades no ano de 1964. A

figura a seguir retrata o edifício escola da Escola Estadual Tancredo Neves no ano de 1964.

Figura 1: Escola Estadual Tancredo Neves

Fonte: VERÊ, 2018.

Com a Resolução Nº 3922/1988 de 14/12/1988, ficou autorizado o funcionamento das quatro primeiras séries do 1º grau. A Resolução Nº 4025/1990 de 27/12/1990, autorizou o curso de 5ª a 8ª

1 Professora formada em Ciências Biológicas e Artes Plásticas. Escola Estadual do Campo Tancredo Neves. E-mail: [email protected]

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séries. Já a Resolução Nº 2705/1991 de 13/08/1991 suspendeu o ensino de 1ª a 4ª série. Em 1988, passa a chamar-se Escola Estadual Tancredo Neves – Ensino Fundamental em homenagem a este político brasileiro que se destacou na vida pública. No início de 1964, na Escola Joaquim Nabuco, reuniram-se Pais e o Prefeito senhor Luiz Paggi, para assim iniciar as atividades onde foi colocado a importância e o progresso dos filhos destas famílias, sendo assim os primeiros professores: Wilma Klassam, Inez Moraes Guandalin, Izolete Dala – Rosa e Carolina Peloso. A figura a seguir trata da Ata de criação da diretoria em 1964. Figura 2: Ata de criação da Diretoria - 1964

Fonte: VERÊ, 2018.

Os alunos que frequentavam a escola, em sua grande maioria estavam fora da idade, série e apresentavam indisciplina. O Professor era responsável pela limpeza e merenda da escola, também organizavam a horta, e com o auxílio dos Pais e a dedicação também aos sábados. Também Fundaram escolas distritais, ESCOLA VITAL BRASIL, no ano de 1966 e com término no ano de 1988. ESCOLA FREI CANECA, no ano de 1964 e com término no ano de 1993. Quando estas Escolas encerraram suas atividades, vieram para o Distrito de Lambedor, sendo que o terreno é do Munícipio e o Prédio do Estado. A escola, desde sua criação, teve o apoio das famílias através da APMF e Conselho Escolar. Sempre que a comunidade é solicitada a colaborar, ela auxilia, seja em promoções ou em atividades

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pedagógicas. A comunidade atribuiu à educação uma perspectiva de sucesso, tendo convicção unânime da importância do ensino. Atualmente, a Escola Estadual do Campo Tancredo Neves oferece o Ensino Fundamental do 6º ao 9º ano, estando em funcionamento somente no período vespertino, tendo uma turma por cada ano. Possui seis salas de aula, uma despensa, uma quadra poli-esportiva coberta, espaço coberto que serve como refeitório, laboratório de informática que comporta também a biblioteca, sala de professores, uma secretaria, uma cozinha, um sanitário para professores, dois sanitários masculinos e dois femininos. O prédio é propriedade do Governo Estadual e o terreno é cedido pela Prefeitura Municipal de Verê-PR, sendo que no período matutino a escola é cedida ao município, funcionando a Escola Municipal São Francisco de Assis, que oferta a Educação Infantil e o Ensino Fundamental do 1ºao 5º ano. A escola possui 40 alunos matriculados oriundos da comunidade sede Lambedor e também das comunidades vizinhas de Barra do Lageado, Nova União, Farroupilha, Boa Esperança, Maracajá, Barra Verde, Nossa Senhora da Salete e Barra Verde. A maioria dos alunos é proveniente de pequenos agricultores que tem na plantação de grãos, de fumo, na atividade leiteira ou na avicultura a sua principal ou única fonte de renda. O corpo docente é formado por doze professores. No administrativo, há um diretor, um técnico

administrativo e duas auxiliares de serviços gerais. Na Equipe Pedagógica há apenas um pedagogo

devido ao porte da escola.

Referências

VERÊ. Prefeitura Municipal. Fotografias. 2018.

VERÊ. Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual do Campo Tancredo Neves. 2017.

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EIXO TEMÁTICO 7:

MOVIMENTOS SOCIAIS POPULARES E A FORMAÇÃO DOS

TRABALHADORES

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MÃOS SEM TERRA

Ritieli Pires da Silva1

Tauãn Medino Gomes da Silva e Sá2

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dos Trabalhadores

Uma década que ficará marcada nos livros de história

Os anos 80 deram início à luta organizada no campo

Trabalhadores sem casa, sem emprego e sem terra

Foi assim que o MST iniciou sua trajetória.

Na mochila, ferramentas, barracas, roupas e panelas

Na mente, memórias da exclusão

No corpo, as marcas deixadas por elas

Invadir áreas desocupadas foi à forma que encontraram

Para fazer reforma agrária nessa nação.

Antes de ganharem a posse

E enfim sentir-se seguros, assentados

Os camponeses ficam acampados,

São longos meses de precariedade

Sem água encanada, morando em barracas e sem eletricidade

1 Graduada em Geografia Licenciatura Plena, pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Francisco Beltrão/PR. Pós-graduada em Educação Especial e Educação Especial: Transtorno Global do Desenvolvimento. Atualmente colaboradora do projeto de Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Educação Humana e Movimentos Sociais Populares (GEFHEMP). E-mail: [email protected]. 2 Graduado em Geografia Licenciatura Plena, pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Francisco Beltrão/PR. Acadêmico do curso de Geografia Bacharel da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Francisco Beltrão/PR, atualmente membro do projeto de Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Educação Humana e Movimentos Sociais Populares (GEFHEMP). E-mail: [email protected].

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Nos acampamentos vivem homens, mulheres e crianças nessa situação

Algumas famílias desistem,

Não aguentam esperar até a desapropriação.

Não bastando às dificuldades

Ainda são alvos fáceis da violência

E do preconceito da sociedade.

Enquanto a violência os persegue

E a mídia os transforma em vilões

As mãos sem terra trabalham

Nos campos devastados pelo agronegócio dos grandes barões.

Mãos sem terra trazendo benefícios para a sociedade futura

Diferenciando-se na forma de fazer agricultura

Uma forma de produção que distancia-se da atual lógica

Alguns assentamentos já se adaptaram

E plantam nos modelos da agricultura ecológica.

De mãos dadas com a agroecologia

Foi assim que o MST tornou-se o maior produtor de arroz sem agrotóxico

Não apenas no Brasil, no Chile ou na Argentina

Mas o maior produtor da América Latina.

Fugindo dos padrões tradicionais,

Com um sistema cooperativo

Valorizando seus agricultores

Fazendo-os receber até quinze por cento mais

Que os produtores convencionais.

E assim a luta continua,

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As mãos sem terra são a décadas o símbolo da resistência

Através da sua garra e persistência,

Mostram-nos que os benefícios dessa forma de agricultura

São para além dos assentamentos

Trata-se de saúde para quem produz

E para quem consome esses alimentos.

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SISTEMATIZAÇÃO DE PRÁTICAS SOCIAIS POPULARES: ESCOLA MUNICIPAL IRMÃO

CIRILO E COLÉGIO ESTADUAL DO CAMPO PAULO FREIRE – ASSENTAMENTO MISSÕES –

FRANCISCO BELTRÃO - PR

Indianara Presoto Grzeca1

Maria Cecília Maria Ghedini2

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dosTrabalhadores

Palavras-chave: Sistematização de Práticas Sociais Populares; Educação Popular; Educação do

Campo.

Este trabalho apresenta um projeto de Iniciação Científica Voluntária (ICV) que está

situado no projeto de Pesquisa “Problematizando as Escolas Rurais/do Campo no Brasil na

materialidade das formas de tratar o conhecimento escolar, a organização da escola e o projeto de

desenvolvimento socioeconômico-cultural” em curso no trabalho do Grupo de Estudos em

Formação Humana, Educação e Movimentos Sociais Populares (GHEFEMP). Cabe salientar que

este projeto foi recém iniciado, de modo que ainda não foram realizadas nenhuma das atividades

elencadas, e este escrito é apenas uma apresentação do que se pretende realizar.

O ICV tem como objetivos; a) Participar da investigação do processo histórico de

constituição da Escola Municipal Irmão Cirilo e do Colégio Estadual do Campo Paulo Freire,

localizado no Assentamento Missões – Francisco Beltrão – PR, pela metodologia da Sistematização

de Práticas Sociais Populares; b) Organizar os registros escritos, fotográficos e vídeos, além dos

documentos identificados e catalogar estes materiais produzindo um acervo; c) Estudar os

fundamentos desta metodologia de Educação Popular e responsabilizar-se pelos relatos e registros

ao longo do processo de investigação; d) Produzir resumos e artigos científicos participando de

eventos de Iniciação científica e outros. 1 Acadêmica do curso de Pedagogia - UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão – PR; E-mail: [email protected] 2 Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão – Paraná – Brasil. E-mail [email protected]

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O trabalho tem como base uma metodologia da Educação Popular denominada

“Sistematização de Práticas Sociais Populares” que possibilita, além investigar práticas recentes e

em curso, produzir conhecimento juntamente com os sujeitos do processo em sua prática social, no

caso aqui de professores, estudantes e famílias camponesas, além dos investigadores e acadêmicos.

Esta metodologia da Educação Popular, que se pretende utilizar para investigar a história destas escolas, é utilizada em processos populares na América Latina desde a década de 1970 e tem como potencialidade para possibilitar a apropriação de dimensões da prática social não percebidas e explicitadas naturalmente, além dos conceitos ali presentes. Dentre outros elementos, também é compreendida como um processo produtor de conhecimentos, permanente e cumulativo a partir de referências de intervenção numa realidade social (FALKEMBACH, 2006).

Segundo Jara (2006), esta metodologia pode ser compreendida como um primeiro nível de teorização sobre a prática, representando também uma articulação entre teoria e prática e serve a objetivos dos dois campos. Por um lado, mostra como melhorar a prática, a intervenção, a partir do que ela mesma ensina e, de outra parte aspira a enriquecer e confrontar o conhecimento teórico atualmente existente, contribuindo para convertê-lo em uma ferramenta realmente útil para compreender e transformar a realidade. É importante destacar que Sistematização aqui tratada, necessariamente é um processo coletivo, cuja função é produzir o conhecimento partindo de práticas sociais e, juntamente, com os sujeitos onde, “a partir da luta por satisfazer os seus interesses e suas necessidades cotidianas vá acumulando forças para também satisfazer suas necessidades históricas e estratégicas: a construção de uma sociedade mais democrática e solidária” (FALKEMBACH,1991, p. 3).

Visa-se, deste modo, por este processo de investigação, acumular força pela luta dos

movimentos sociais, de modo que também contribua para a formação do ser humano como um

sujeito político, pensante e ativo em sociedade. “[...] quando o popular se organiza, entra em

movimento e em luta, passa a ter força política e, por isso mesmo, acaba sendo temido por parte da

sociedade e, principalmente, pela classe que concentra o capital e pelos governos (SALAZAR, 1990

apud PALUDO; BEATRICI, 2007, p. 10).

Se existe trabalho popular organizado é porque existe povo para isto, ainda que com

objetivos diversos e maneiras opostas para desenvolver o trabalho popular, mantem-se firme e

afirmando sua classe e posição política. O trabalho popular nada mais é do que a labuta realizada a

fim de defender os interesses do povo e para o povo, com o intuito de aumentar o saber e o poder

desse povo em questão (FALKEMBACH,1991).

É neste sentido que se assume esta metodologia para sistematizar os 21 anos (pelo menos)

da história destas escolas. Iniciada em 1997, teve vários percalços, desde funcionar nos barracões

onde se cuidava do gado da fazenda ocupada, até sofrer uma intervenção de um governo municipal

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de direita e, superado este quadro, implantar o Ensino Médio, e ver muitos jovens que ali estudaram

desde as séries iniciais, ingressarem no ensino superior ou seguirem trabalhando e vivendo na

comunidade ou ainda tornando-se professores. “A metodologia é o caminho que seguimos para

construir o conhecimento e intervir na realidade. Ela é, ao mesmo tempo, uma concepção de

mundo, de ser humano e de sociedade e um método de interpretação e intervenção na realidade

(PALUDO; BEATRICI, 2007, p. 26)

Referências

FALKEMBACH, Elza Maria Fonseca. A arte ampliar cabeças: uma leitura transversal das

sistematizações do PDA/Ministério do Meio Ambiente, PDA/PPG7/SDS – Brasília: MMA, 2006.

JARA, Oscar Holliday. Para sistematizar experiências. Tradução de Maria Viviane B. Rezende.

2. ed. revista. Brasília: MMA, 2006

FALKEMBACH, Elza Maria Fonseca. Série Educação popular: Sistematização, Ijuí,1991.

PALUDO, Conceição; BEATRICI, Rodrigo Ferronato. Caderno práticas educativas populares:

Sistematização de experiências de trabalho popular. Ronda Alta: FUNDEP, 2007.

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TEMPOS DE LUTA

Tauãn Medino Gomes da Silva e Sá1

Ritiéli Pires da Silva2

Eixo Temático 7: Movimentos Sociais Populares e a Formação dos Trabalhadores

Palavras-chave: poesia; luta; movimento social.

O presente trabalho tem como objetivo problematizar algumas questões referentes ao contexto

social da realidade campesina no Brasil. O mesmo apresenta-se em formato de poesia, onde o papel

importantíssimo que esta forma de interpretar as experiências da vida, se transforma em arte.

Sobretudo da forma que esta apresenta-se como metodologia para a problematização e reflexão de

um tema tão importante para todos os povos que mantém uma relação com o campo, seja simbólica

ou de subsistência e econômica.

Tempos de Luta

A história se vai como a correnteza de um rio,

e com ela tudo se torna um imenso vazio.

Tristeza leva adiante as lembranças em águas verdejantes

Lembranças estagnadas, paradas, desidratadas

sem sentido, pois o agora já não é mais vivido.

1 Graduado em Geografia Licenciatura Plena, pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Francisco Beltrão/PR. Acadêmico do curso de Geografia Bacharel da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Francisco Beltrão/PR, atualmente membro do projeto de ‘Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores’, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Educação Humana e Movimentos Sociais Populares (GEFHEMP). E-mail: [email protected]. 2 Graduada em Geografia Licenciatura Plena, pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Francisco Beltrão/PR. Pós-graduada em Educação Especial e Educação Especial Transtorno Global do Desenvolvimento. Atualmente colaboradora do Projeto de “Rearticulação da Escola e Rede de Formação de Educadores”, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Educação Humana e Movimentos Sociais Populares (GEFHEMP). E-mail: [email protected]

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O capital toma conta de minha morada,

já não tenho mais nada.

Não tenho terra para plantar,

nem sequer esperança para semear.

O desgosto é a colheita em meu peito sem sentido,

me sinto sozinho, pois já está feito.

O Estado não me ajuda,

me sinto só em um mundo sem morada,

como se eu fosse um mendigo na calçada.

Em um país que me expulsa do meu cerne,

me tratam como um verme.

Quero terra para plantar,

quero uma casa para morar,

quero o campo representar.

Compartilhar da natureza os frutos que ela me dá

é isso que quero para os meus e netos,

estou lutando para lhes garantir um futuro

que agora parece tão incerto.

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EIXO TEMÁTICO 8:

A EDUCAÇÃO DO CAMPO, SUAS DIVERSIDADES E ORGANIZAÇÃO

SOCIAL

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MONITORIA NO ENSINO SUPERIOR INDÍGENA: UM CAMINHO PARA GARANTIR A

INCLUSÃO

Cecília Maria Ghedini1

Eliane da Cruz Gonçalves2

Elisângela Inês Orben3

Eixo Temático 8: A Educação do Campo, suas Diversidades e Organização Social

Palavras-chave: Ensino Superior; Educação Indígena; Monitoria Indígena.

O presente resumo busca compartilhar uma reflexão sobre a experiência com a monitoria

indígena no Curso de Pedagogia da Unioeste – campus de Francisco Beltrão PR, através de relato

das próprias autoras e indica leis que amparam o Ensino Superior Indígena e a reserva de vagas na

Universidade, pelas ações da Comissão Universidade para Índios (CUIA).

Conforme Borges e Poltronieri (2018), na lógica capitalista, onde o estado pertence a

burguesia e os meios de produção ao proletariado, as políticas públicas são formas de criar mais

oportunidades a grupos discriminados. Neste sentido, devido à crescente demanda dos povos

indígenas pelo ensino superior, ações afirmativas foram necessárias para assegurar o acesso e a

permanência dos mesmos na Universidade.

A lei 14453, de 07/07/ 2004 (PARANÁ, 2004) e a lei 14995 de 06/01/2006 (PARANÁ,

2006), asseguram seis vagas em cada universidade estadual, o ingresso é pelo vestibular indígena; a

Unioeste participa desde 2002 com o 1° vestibular indígena, na atualidade são seis estudantes. Para

eles, estar na universidade representa um desafio. No Brasil todos os sujeitos da classe popular

encontram estas mesmas barreiras para o ensino superior, contudo, aos povos indígenas, o desafio é

maior pois, além da escolaridade frágil que tiveram, há também a barreira cultural da comunicação,

1 Professora da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão – Paraná – Brasil. E-mail [email protected] 2 Acadêmica do curso de Pedagogia da Unioeste Francisco Beltrão. [email protected] 3 Acadêmica do curso de Pedagogia da Unioeste Francisco Beltrão. [email protected]

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da língua e da forma de organizar o pensamento e a vida mesma. “Quando tive conhecimento sobre

vestibular indígena em 2010, fiquei muito interessada, mas não tinha concluído o ensino médio.

Assim que concluí, em 2015, no Ceebja e me inscrevi. Consegui passar em segundo lugar na

Unioeste e escolhi o Curso de Pedagogia. Confesso que deu um pouquinho de medo, pois naquele

momento me dei conta que iria estudar com colegas mais jovens que tiveram um ensino regular ou

magistério, e que talvez já fossem formados e eu tendo apenas o Ceebja. Então pensei comigo:

como competir? Além do mais eu ouvia falar que na faculdade os professores eram desumanos e os

colegas muito competitivos e era difícil de estudar. Isso me deixou assustada, porque sabia de

indígenas que ingressaram e não concluíam o curso. Em 2016 ingressei, com o otimismo,

acreditando que daria tudo certo e que eu não desistiria, conseguiria me formar” (Eliane).

Esta lógica que tradicionalmente se construiu na universidade está relacionada ao ensino

elitizado, fruto de um processo histórico, que desprestigia as classes menos favorecidas. “Chegando

na Universidade pude perceber que os professores não eram desumanos como fiquei sabendo e que

os colegas eram, sim, competitivos, mas de certa forma, a minha primeira impressão não foi tão

ruim, dizem que é a que importa. Quanto aos conteúdos são difíceis, bem complexos, mas nada

impossível. Também tive o conhecimento de que eu tinha direito a uma monitoria, para auxiliar em

minhas dificuldades” (Eliane).

O regulamento de monitoria acadêmica nos cursos de graduação da Unioeste para

estudantes indígenas é aprovado pela Resolução n° 189/2012 – Conselho de Ensino, Pesquisa e

extensão da Unioeste (CEPE), de 29/11/2012, que delibera ser que monitoria pode ser exercida por

discentes sob orientação do docente da disciplina de forma voluntária ou remunerada. O trabalho de

monitor visa auxiliar os discentes na apreensão e produção do conhecimento, como também a

experiência com o ensino e aprendizagem por ambas as partes (CEPE, 2012). “O trabalho de

monitoria ultrapassa a relação acadêmica, desenvolve vínculos de amizade e empatia, quando se

envolve com as reais necessidades, não apenas de aprendizagem, mas de aceitação no grupo

social. É um trabalho humanizador” (Elisângela).

“A monitoria indígena foi muito importante para mim, pois ajudou que eu conseguisse

acompanhar a turma. Devido a cultura indígena, nós temos dificuldades em relação à língua e à

socialização com os não índios, e também por não termos uma educação qualificada para competir

com os demais. Minhas dificuldades particulares foram na interpretação dos textos e apresentação

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em público e, a maior dificuldade é o manejo da tecnologia, como formatar um texto, por exemplo.

Na minha opinião, a monitoria é de suma importância para acadêmicos indígenas, desde que o

monitor tenha um pouco de conhecimento sobre a cultura e, principalmente, queira monitorar.

Minha experiência com a monitora foi bem produtiva, tive a oportunidade de ter uma ótima

monitora, e com o auxílio dessas “aulas extras” consegui entender os conteúdos e acompanhar a

turma” (Eliane).

Nesse sentido a monitoria tem o objetivo de oportunizar tanto ao monitor quanto ao

discente, a experiência com o processo de ensino e aprendizagem, auxiliando-os na apreensão e

produção do conhecimento. “Acredito que, se não tivesse a monitoria, talvez teria reprovado em

algumas matérias ou quase todas ou, talvez, até já tivesse desistido, porque esse é uns dos motivos

que alguns acadêmicos indígenas acabam desistindo de concluir o curso, por não ter uma

monitoria que auxilie, ou as vezes, até tenha monitor, mas o acadêmico não se adapta a ele ou o

monitor não se adapta ao acadêmico indígena. Hoje, em 2018, já no terceiro ano do curso estou

mais evoluída, já consigo interpretar melhor os textos, desenvolver as apresentações e estou

melhorando na informática” (Eliane).

Vários fatores favorecem a desistência de acadêmicos indígenas nas Universidades:

financeiros, culturais, falta de apoio, falta de compreensão dos conteúdos, má recepção dos colegas

e, nisso, a monitoria é o apoio que desenvolve vínculos, proporcionando inclusão, parceria,

compreensão e aprendizagem.

Referências

BORGES, Paulo Humberto Porto; POLTRONIERI, Juliana. Política de Implantação das Cotas

Indígenas e Situação Atual da Ação Afirmativa na Universidade Estadual do Oeste do Paraná. In.

LOSS, Adriana Salete; VAIN, Pablo Daniel. Ensino Superior e Inclusão: palavras, pesquisas e

reflexões entre movimentos internacionais. 1. Ed. Curitiba PR, 2018. (Coleção Ensino Superior e

Inclusão, v. 2).

PARANÁ. Lei 14453/2004 que dispõe sobre a política estadual de apoio as comunidades indígenas

do Estado do Paraná. Disponível em: http://www.uel.br/prograd/divisao-politicas-

graduacao/cuia/documentos/lei_14453_07.pdf > Acesso em: 15 nov. 2018.

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PARANÁ. Lei n° 14995/2006, que dispõe da reserva de vagas para nas Universidades Estaduais.

Disponível em: http://www.uel.br/prograd/divisao-politicas-

graduacao/cuia/documentos/lei_14995_06.pdf.> Acesso em: 15 nov. 2018.

UNIOESTE. Resolução 189/2012 – Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão CEPE Disponível

em: http://www.unioeste.br/prg/download/189_2012_CEPE_Monitorias.pdf> Acesso em:14 nov.

2018.