Análise Das Implicações Jurídicas Do Caso “Cesare Battisti” - Internacional - Âmbito...

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Uma análise bastante elucidativa sobre um dos casos mais controversos envolvendo relações diplomáticas.

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  • 14/05/2015 AnlisedasimplicaesjurdicasdocasoCesareBattistiInternacionalmbitoJurdico

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    Internacional

    Anlise das implicaes jurdicas do caso Cesare BattistiCarina de Oliveira Soares

    Resumo: O caso Cesare Battisti um dos mais recentes casos de concesso de refgio poltico no Brasil. Battisti foi militante de um grupo armado de orientaoesquerdista durante o perodo que se convencionou chamar de anos de chumbo e foi acusado e condenado a priso perptua pela prtica de quatro homicdios.Apreendido no Brasil a extradio de Battisti foi requerida pelo Estado italiano com base no tratado de extradio firmado entre a Itlia e o Brasil. O italiano requereu ostatus de refugiado poltico alegando sofrer fundados temores de perseguio por motivos polticos e foi reconhecido como refugiado em recurso ao Ministro daJustia. A principal discusso do caso Battisti gira em torno da possibilidade de extradio de uma pessoa reconhecida como refugiada e, consequentemente, se adeciso de concesso de refgio deciso poltica e soberana do Estado concedente ou se ato administrativo passvel de reviso e controle judicial.

    Palavraschave: Extradio. Refgio. ACNUR

    Sumrio: 1. Introduo; 2. Anlise do caso Cesare Battisti 2.1 O sujeito Cesare Battisti; 2.2 A situao poltica da Itlia na decda de 1970: anos de chumbo; 2.3 Ocaso Cesare Battisti; 2.4 A deciso do Ministro da Justia; 2.5 Mandado de segurana com pedido de liminar impetrado pelo estado italiano 2.6 Implicaes jurdicas2.6.1 Requerimento da defesa de Cesare Battisti pedido de revogao da priso preventiva; 2.6.2 Inconstitucionalidade do artigo 33 da lei 9.474/97; 2.6.3 Existncia declusula de excluso do refgio: crime poltico x crime comum; 2.6.4 Controle judicial da deciso administrativa do Ministro da Justia; 2.7 Argumentos de acusao eargumentos de defesa; 2.8 O julgamento do pedido de extradio pelo supremo tribunal federal; 2.8.1 A deciso do Supremo Tribunal Federal; 3. Concluses; 4.Referncias.

    1. INTRODUO

    O refugiado definido pela Conveno das Naes Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 como a pessoa que, em razo de fundados temores deperseguio devido sua raa, religio, nacionalidade, associao a determinado grupo social ou opinio poltica, encontrase fora de seu pas de origem e que, porcausa dos ditos temores, no pode ou no quer regressar ao seu Estado.

    Dentre os direitos garantidos pessoa do refugiado fazse necessrio destacar o direito fundamental de no ser devolvido ao pas em que sua vida ou liberdade estejasendo ameaada. Tal direito constitui um princpio geral do direito internacional de proteo dos refugiados e dos direitos humanos, princpio do nonrefoulement (nodevoluo) devendo, portanto, ser reconhecido como um princpio de jus cogens.

    O Brasil um pas que tem tradio na concesso de abrigo e proteo a pessoas perseguidas por motivos polticos, raciais e sociais. Na segunda metade do sculo XX,pessoas perseguidas que se opuseram aos regimes comunistas ou aos governos de extrema direita, encontraram abrigo no Brasil sob a condio de refugiados.

    O caso mais recente de concesso de refgio poltico o do italiano Cesare Battisti que h 30 anos foi militante de um grupo armado de orientao esquerdista:Proletariados Armados pelo Comunismo (PAC). Battisti foi acusado da prtica de quatro homicdios e condenado pelo governo italiano priso perptua.

    Em recente deciso tomada pelo Ministro da Justia, Tarso Genro, foi concedido refgio poltico ao italiano Cesare Battisti, considerando que o mesmo possui fundadotemor de perseguio por motivao poltica e, consequentemente, ficou suspenso o processo de extradio solicitado pela Itlia. Dessa deciso surgiram os debatessobre a correio ou incorreio da medida, analisados sobre os pontos de vista jurdico e poltico. Nesse sentido vem sendo a disputa entre argumentos do governoitaliano que, inconformado com a deciso do Ministro da Justia, recorreu ao Supremo Tribunal Federal no intuito de que este Tribunal anule a deciso que concedeuo status de refugiado e extradite Battisti; e os argumentos da defesa do refugiado pela manuteno de sua situao.

    O ponto central do caso Cesare Battisti a discusso acerca da possibilidade de extradio de uma pessoa reconhecida como refugiada e, consequentemente, se adeciso de concesso de refgio deciso poltica e soberana do Estado concedente ou se mero ato administrativo passvel de reviso e controle judicial, emqualquer circunstncia.

    2. ANLISE DO CASO CESARE BATTISTI

    2.1 O SUJEITO CESARE BATTISTI

    Cesare Battisti nasceu no ano de 1954 na Itlia, em Sermoneta, vila industrial fundada em 1934 pelo regime de Mussolini.

    Em 1976 Cesare participou de levantes estudantis e engajouse no ativismo de extrema esquerda; o italiano era integrante do grupo de extrema esquerda conhecidocomo Proletrios Armados pelo Comunismo, PAC.

    O grupo Proletrios Armados pelo Comunismo (em italiano Proletari Armati per il Comunismo), oriundo de uma vertente do movimento autnomo conhecido comoAutonomia Operria, surgiu na Itlia em meio a uma onda de movimentos de constestao surgidos na decda de 70 neste pas[1].

    O PAC caracterizouse como um grupo armado italiano de extrema esquerda criado em 1976 durante o chamado anos de chumbo e que dissolveuse trs anos aps.Diferente das Brigadas Vermelhas, grupo armado italiano que tinha hierarquia rgida e estruturavase militarmente, o PAC caracterizavase por ser um grupo pequeno eregional, de estrutura precria, de organizao horizontal, com vrios ncleos independentes que podiam conduzir aes independentes e revindiclas como sendoaes do PAC[2]. Inicialmente as aes do grupo consistam em apoio s revindicaes operrias, como a que ocorreu na Itlia em 1978 na sabotagem contra a instalaoda Alfa Romeo em Milo.

    Os objetivos mais importantes do PAC concentravamse nas lutas nas estruturas carcerrias e contra membros ou colaboradores das foras da ordem[3].

    Dentre as aes atribudas ao PAC esto a morte do chefe da carceragem Antonio Santoro; a morte do aougueiro Lino Sabbadin em Caltana de Santa Maria di Sala,perto da cidade de Mestre e a morte do joalheiro Pierluigi Torregiani[4].

    Aps esses trs homicdios, vrios militantes da organizao foram presos e alguns deles afirmaram terem sido torturados na priso; em resposta, no dia 19 de abril de1979, em Milo, em uma nova ao do PAC, o agente de polcia Andrea Campagna, supostamente envolvido nas torturas, foi assassinado[5].

    2. 2 A SITUAO POLTICA DA ITLIA NA DECDA DE 1970: ANOS DE CHUMBO

    A expresso anos de chumbo utilizada para caracterizar um perodo na histria europia compreendido entre 1968 at o fim do anos 1970, marcado pela violnciapoltica, luta armada e terrorismo de esquerda e de direita e pelo endurecimento do aparato repressivo dos Estados ditos democrticos.

    As consequncias desse perodo ocorreram de forma mais expressiva na Itlia, Alemanha e Grcia. Essa tambm foi utilizada, posteriormente, para caracterizar esseperodo de radicalizao poltica fora da Europa.

    A situao da Itlia durante o perodo dos anos de chumbos era de total fragilidade decorrente de sua tardia formao (que ocorreu apenas no final do sculo XIX),dos efeitos da derrota do pas na Segunda Guerra Mundial (a Itlia era parte das chamadas Potncias do Eixo) e ainda pelo fato do pas estar sob o comando norteamericano durante a Guerra Fria[6].

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    A alternncia de lderes no governo italiano era constante lderes eram depostos poucos dias aps assumirem seus cargos e os principais partidos polticos italianoseram compostos por membros do crime organizado mfia siciliana e de agentes de governos estrangeiros. [7]

    Essa situao de fragilidade poltica, social e econmica do Estado italiano favoreceu o surgimento de foras polticas de esquerda que comearam a organizarse emgrupos revolucionrios.

    Essa fase foi marcada por atentados em locais pblicos com dezenas de vtimas, sequestros de personalidades pblicas, homicdios, roubos a bancos e estabelecimentoscomerciais e inmeras outras aes de extrema violncia.

    O ponto culminante desse processo histrico foi o sequestro e morte do lder democratacristo Aldo Moro, em maio de 1978; a partir de tal fato a violncia na Itliacomeou a declinar, embora ainda tenha havido episdios graves nos anos 80[8].

    As aes terroristas abalaram a Itlia nessa poca; tais aes eram reivindicadas por grupos de extrema direita (a Terza Posizione, a Avanguardia Nazionale e a OrdineNero) e, posteriormente por grupos de extrema esquerda. Dentre estas organizaes de esquerda, a mais conhecida desse perodo a chamada Brigadas Vermelhas(Brigate rosse). Na esquerda estavam ainda, dentre outras, a Nuclei Armati Proletari (NAP) e os Proletari Armati per il Comunismo (PAC)[9].

    Cumpre ressaltar que no pacfica a viso dos autores que tratam desse tema com relao existncia de uma ditadura na Itlia nesse perodo que se convencionouchamar de anos de chumbo.

    certo que existiram grupos armados de direita e de esquerda que tentaram derrubar o poder, mas a idia de um Estado italiano altamente repressivo eantidemocrtico, que atuou fortemente no sentido de restringir as liberdades democrticas, condicionar o Estado de Direito, chegando ao ponto de influenciar nosresultados de inquritos e julgamentos comprometendo, assim, a independncia do poder judicirio do pas, no clara nem unnime entre autores[10].

    2.3 O CASO CESARE BATTISTI

    No dia 26 de junho de 1979 Cesare Battisti foi detido, juntamente com outros membros do PAC, durante uma operao antiterrorista. Instaurouse um processo coletivono qual vinte e trs rus foram acusados de condutas tpicas relacionadas com a militncia poltica[11].

    Cesare foi ento acusado pela prtica dos seguintes delitos: uso de documento falso, possuir identidade falsa (com o nome de Giuseppe Ferrari), portar dois espelhosde documento de identidade (um da cidade de Npoles e outro de Milo), por participao em atividade subversiva e por aquisio e posse ilegal de armas[12].

    Em maio de 1981 Battisti foi condenado a 13 anos de recluso e 5 meses de deteno, conforme legislao italiana, por participao em grupo armado e ocultamentode armas; Cesare recorreu da condenao. Outros integrantes do PAC tambm foram condenados de acordo com a respectiva participao no grupo[13].

    Alguns meses aps a deteno de Battisti na priso de Frosinone na Itlia, ele fugiu e refugiouse na Frana por alguns meses.

    O Tribunal de Apelao julgou o recurso de Battisti, revelia, e manteve a condenao, apenas reduzindo a pena para 12 anos e 10 meses de recluso e 5 meses dedeteno.

    Em fevereiro de 1982, Pietro Mutti, cofundador do PAC, foi preso e beneficiouse do instituto da delao premiada o qual determina, conforme a chamada Lei dosArrependidos, que aquele que contribuir com a Justia esclarecendo e apontando os demais participantes de crimes dos quais o delator teve participao, serbeneficiado com a extino da punibilidade e tornarse colaborador da justia[14].

    Em 1982 Battisti fugiu da Frana para o Mxico onde viveu at 1990.

    Em 13 de dezembro de 1988 a Corte de Assise de Milo, com base principalmente na delao premiada de Pietro Mutti, condenou Cesare Battisti priso perptua porquatro homicdios praticados entre 1978 e 1979: homicdio doloso praticado em Mestre em 6 de junho de 1978 contra o agente de custdia Antonio Santoro; homicdiodoloso praticado em Mestre em 16 de fevereiro de 1979 contra Lino Sabbadin; homicdio doloso praticado em Milo em 16 de fevereiro de 1979 contra PierluigiTorregiani; homicdio doloso praticado em Milo em 19 de abril de 1979 contra Andra Campagna, agente da polcia[15].

    Conforme investigaes realizadas no mbito do inqurito policial, ficou constatado que Cesare foi o autor material dos crimes cometidos contra Antonio Santoro e LinoSabbadin; quanto ao homicdio de Pierluigi Torregiani e Andra Campagna apurouse que a deciso de matlos foi tomada de maneira colegiada pelo grupo formado proBattisti e outros integrantes do PAC, dentre eles, Pietro Mutti; ainda que Cesare no tenha participado da execuo material desses crimes, teria participado dadeciso colegiada para a sua realizao[16]

    Os advogados de Cesare recorreram da sentena prolatada em 13 de dezembro de 188 todavia, a sentena condenatria foi confirmada em segundo grau pela Corte deAssise de Apelao de Milo em fevereiro de 1990.

    Em recurso perante a a Suprema Corte de Cassazione, em 1991, foi anulada a sentena anterior apenas no que dizia respeito ao homicdio de Pieruluigi Torregiani,condenando Cesare apenas pela prtica de trs homicdios.

    Ocorre que, foi determinada a baixa dos autos para novo juzo a outra Seo do Tribunal do Jri de Apelao de Milo sobre o item concernente ao concurso nohomicdio de Torregiani e, em 31 de maro de 1993, a Corte de Assise de Apelao de Milo confirmou a condenao de Cesare Battisti pela prtica dos quatrohomicdios, mantendo a condenao incial[17].

    Na Frana, no ano de 1985, foi criada a chamada Doutrina Miterrand, nome pela qual ficou conhecida a prtica poltica do governo do presidente francs, FranoisMiterrand; prtica no escrita, atravs da qual o Estado francs assumiu o compromisso de concesso de asilo poltico e no extradio dos exativistas italianos deextrema esquerda que rompessem com a luta armada; tal proteo tinha como exceo aqueles que cometeram os denominados crimes de sangue [18].

    Em 1990 Battisti retornou Frana, agora na condio de refugiado protegido pela Doutrina Miterrand[19].

    Com base na sentena condenatria contra Cesare, a Itlia requereu Frana a sua extradio. O pedido foi negado por deciso da Corte de Apelao de Paris emmaio de 1991.

    Embora Cesare estivesse protegido na Frana em razo da Doutrina Miterrand, em 1995 foi eleito para presidente da Frana Jacques Chirac, sucessor de Miterrand,que cancelou a aplicao da doutrina no pas[20].

    Em 2002, doze anos aps o primeiro pedido de extradio, a Itlia requereu novamente a extradio de Cesare e, em 2004, a pedido da justia italiana, ele foi preso emParis sendo posteriormente libertado, mas mantido sob vigilncia[21].

    Em junho de 2004 a Cmara de Instruo da Corte de Apelaes de Paris declarouse favorvel extradio[22].

    Cesare recorreu da deciso que determinou a sua extradio, porm deixou de se apresentar polcia, conforme exigido pelo sistema de vigilncia judicial e passou aviver na clandestinidade[23].

    O recurso interposto por Cesare foi rejeitado, sua extradio para a Itlia tornouse definitiva[24]; Cesare fugiu, ainda em 2004, para o Brasil.

    Os advogados de Cesare apresentaram em 2005 um recurso perante a Corte Europia de Direitos Humanos[25] contra o decreto de extradio emitido pelo governofrancs. Todavia, a Corte entendeu que a extradio era cabvel e que Battisti, ao fugir da Itlia, teria renunciado ao direito de comparecer e defenderse perante ajustia italiana[26].

    No dia 18 de maro de 2007 Cesare Battisti foi preso no Rio de Janeiro em uma operao empreendida pelas polcias federal brasileira, italiana e francesa e a Interpol.

    Aps a priso de Cesare Battisti no Brasil, o Estado italiano, com base no tratado de extradio firmado entre a Repblica Italiana e a Repblica Federativa do Brasil,realizado em Roma em 1989[27] visando cooperao na rea judiciria em matria de extradio entre os dois pases, solicitou a extradio do italiano[28].

    O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu o pedido de extradio feito pelo governo da Itlia.

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    No curso do processo de extradio, em trmite no Supremo Tribunal Federal, o italiano Cesare Battisti solicitou ao Comit Nacional para os Refugiados (CONARE),alegando ser refugiado poltico nos termos do art. 1, inciso I da Lei 9.474/97[29], o reconhecimento da sua condio de refugiado.

    O Supremo Tribunal foi comunicado do pedido de refgio e suspendeu a tramitao do processo de extradio, nos termos do artigo 34 da Lei 9.474/97[30].

    O CONARE, na reunio plenria do dia 28 de novembro 2008, indeferiu o pedido de refgio por 3 votos a 2 argumentando no haver provas de perseguio contra oitaliano em seu pas de origem, no podendo, assim, ser ele considerado um refugiado; da deciso do CONARE Cesare Battisti interps recurso ao Ministro da Justia, naforma do artigo 29 da Lei 9.474/97, que o proveu, contra a deciso do CONARE, reconhecendo o status de refugiado ao italiano.

    Cesare Battisti, embora reconhecido como refugiado poltico em janeiro de 2009, encontrase at a presente data preso preventivamente na Penitenciria da Papuda,em Braslia, aguardando a deciso do STF em relao ao pedido de extradio solicitado pelo governo italiano.

    2.4 A DECISO DO MINISTRO DA JUSTIA

    Diante da deciso negativa do CONARE, afirmando a carncia da hiptese prevista no art. 1 da Lei 9.474/97, a defesa de Cesare Battisti recorreu para o Ministro daJustia.

    O Ministro da Justia Tarso Genro modificou a deciso do CONARE e reconheceu a condio de refugiado poltico Cesare fundamentando sua deciso em basicamentedois argumentos: o requerente corre risco de ser perseguido pelo cometimento de um crime poltico, fato este que autoriza, conforme art. 1 da Lei 9.474/97, aconcesso do estatuto do refugiado; e h dvidas sobre a observncia do devido processo legal nos processos que culminaram com a condenao de Cesare Battisti,levando em considerao o fato de que Battisti foi julgado e condenado revelia e a condenao teria se dado unicamente com base na delao premiada.

    Para caracterizar o fundado temor de perseguio fazse necessria a comprovao dos elementos objetivo, relacionado com as razes concretas que justifiquem otemor, e subjetivo, relativo ao foro ntimo do requerente.

    Na verificao do elemento objetivo o Ministro levou em considerao o contexto poltico da poca dos supostos delitos em que Cesare teria incorrido.

    Nesta anlise o Ministro considerou que nas dcadas de 1970 e 1980 na Itlia o contexto poltico era de represso legtima, por parte do Estado italiano, militncia deesquerda que pretendia atravs de armas derrubar o regime; sendo, portanto o momento histrico no qual Cesare foi condenado pela Justia italiana, de acentuadaconvulso social[31].

    O Estado italiano reagiu, como possvel e necessrio diante da situao instaurada no pas, aplicando no s as normas jurdicas em vigor poca, mas tambm criandoexcees, por meio de leis de defesa do Estado que reduziram as prerrogativas de defesa dos acusados e instituram tambm a delao premiada que beneficiou oprincipal denunciante de Cesare Battisti[32].

    Todavia, o Ministro em sua deciso ressalta que mesmo em perodos de excees fundamental que jamais seja aceita a derrogao dos fundamentos jurdicos quesocorrem os direitos humanos[33].

    Ademais, diversos pases, inclusive no europeus, levando em conta os fatores referidos anteriormente, recusaram a extradio de ativistas italianos e/ou os abrigaramem seus territrios, bem como outros evadidos da Itlia por motivos polticos vinculados situao do pas na dcada de 70 e incio dos anos 80 no foram extraditadospelo STF[34].

    Analisando o elemento subjetivo do fundado temor de perseguio Tarso Genro entende que o mesmo est claramente configurado haja vista o contedo dasacusaes de violao da ordem jurdica italiana e das movimentaes polticas que ora deram estabilidade ao italiano, durante os 15 anos em que viveu na Franareconhecido como refugiado poltico pela Doutrina Miterrand, ora deram preocupao e instabilidade ao recorrente, por motivos polticos foi revogada a suaproteo na Frana e o mesmo viuse obrigado novamente a fugir

    Por motivos polticos o Recorrente envolveuse em organizaes ilegais criminalmente perseguidas no Estado requerente. Por motivos polticos foi abrigado naFrana e tambm por motivos polticos, originrios de deciso poltica do Estado Francs, decidiu, mais tarde, voltar a fugir. Enxergou o Recorrente, ainda, razespolticas para os reiterados pedidos de extradio ItliaFrana, bem como para a concesso da extradio, que, conforme o Recorrente, estariam vinculadas situao eleitoral francesa. O elemento subjetivo do fundado temor de perseguio necessrio para o reconhecimento da condio de refugiado est, portanto,claramente configurado.[35] (grifos)

    O segundo argumento legitimador da deciso do Ministro foi a falta de oportunidade para que Cesare desenvolvesse sua ampla defesa, uma vez, segundo entendimentodo Ministro, as acusaes no se fundamentaram em provas periciais, mas to somente em uma testemunha de acusao implicada pelos prprios fatos delituosos,Pietro Mutti[36].

    Por fim, o Ministro afirma que a qualificao do indivduo como refugiado ato soberano do Estado que concede refgio e que, tendo em vista o carter humanitriodo refgio deverse aplicar a tal instituto o princpio do in dubio pro reo: na dvida, a deciso de reconhecimento dever inclinarse a favor do solicitante dorefgio[37].

    O Ministro Tarso Genro entendendo que no h condenao do Estado requerente por crimes impeditivos do reconhecimento da condio de refugiado, bem comolevantando a dvida quanto ao fato de ter tido o requerente direito ao devido processo legal diante do contexto em que ocorreram os delitos a ele imputados e ascondies nas quais se desenrolaram os seus processos decidiu, no dia 13 de janeiro de 2009, dando provimento ao recurso reconhecendo a Cesare Battisti a condiode refugiado, nos termos do art. 1, inc. I, da Lei n. 9.474/97[38].

    2.5 MANDADO DE SEGURANA COM PEDIDO DE LIMINAR IMPETRADO PELO ESTADO ITALIANO

    O Estado italiano impetrou mandado de segurana com requerimento de suspenso liminar[39] contra o ato do Ministro da Justia que concedeu refgio ao italianoCesare Battisti[40].

    A Itlia requereu a concesso de liminar para suspender os efeitos do ato impugnado e, no mrito, a concesso de segurana a fim de que seja declarada ainsubsistncia ou a anulao da deciso que concedeu o status de refugiado a Cesare Battisti[41].

    O Estado italiano fundamenta seu pedido alegando que o ato de soberania praticado pelo Ministro da Justia violaria a competncia do Supremo Tribunal Federal paraapreciar o pedido de extradio em curso[42].

    A Itlia requer a anulao da deciso do ministro afirmando que a concesso do refgio caracterizouse como ato manifestadamente ilegal, pois teria sido prolatada emdesacordo com as provas documentais contidas nos autos e se fundado em motivos inexistentes e/ou falsos, pois a Itlia era poca dos fatos e uma democracia; talfato, por si s, inviabiliza o entendimento de que o italiano Cesare Battisti sofre temor de perseguio.

    A Itlia alega ainda que Cesare foi condenado pelo cometimento de crimes comuns por tribunais regulares, com garantia do devido processo legal e que a deciso nosofreu qualquer contaminao poltica[43].

    Conforme a defesa do Estado italiano, Battisti no praticou apenas crimes polticos, ainda que militasse na base da organizao Proletariados Armados pelo Comunismo,mas foi condenado por crimes comuns no se tratando, portanto, o julgamento de Cesare na Itlia, de perseguio poltica, mas sim de legtima persecuo judicial paraexecuo de penas criminais decorrentes da prtica de crimes comuns desvinculados, absolutamente, de qualquer base polticoideolgica[44].

    2.6 IMPLICAES JURDICAS

    Da deciso do Ministro da Justia que concedeu refgio Battisti surgiram diversas implicaes jurdicas e questionamentos acerca da legalidade da manuteno dapriso de Battisti mesmo aps o italiano ser reconhecido pelo Ministro da Justia como refugiado poltico; da constitucionalidade do artigo 33 da Lei 9.474/97 que, aodeterminar que a concesso de refgio obstar o seguimento de qualquer pedido de extradio estaria adentrando na competncia constitucional do Supremo TribunalFederal para processar e julgar a extradio solicitada por Estado estrangeiro, nos termos do artigo 102, inciso I, alnea g da Constituio Federal; da existncia ouno de clusula de excluso da concesso do refgio, qual seja, a prtica de crime comum; da natureza jurdica do ato administrativo que concede refgio, se

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    vinculado ou discricionrio e dos limites do controle judicial sobre atos administrativos discricionrios.

    Tais questionamentos sero analisados a seguir.

    2.6.1 Requerimento da defesa de Cesare Battisti pedido de revogao da priso preventiva

    A defesa do italiano Cesare Battisti, aps a deciso do Ministro da Justia reconhecendo Cesare a condio de refugiado poltico, requereu a revogao da prisopreventiva decretada nos autos da Extradio (Ext 1085) considerando no haver mais motivos que justifiquem a manuteno da mesma[45].

    A priso preventiva foi decretada a pedido do governo italiano e com base no tratado de extradio firmado entre o Brasil e a Itlia que autoriza a determinao dapriso preventiva para fins de extradio[46].

    O art. 33 da Lei n. 9.474/97 apresenta como causa legal impeditiva da extradio o reconhecimento da condio de refugiado, sendo assim, diante da deciso doMinistro da Justia, a defesa de Battisti requereu a revogao da priso preventiva, pois com a concesso do status de refugiado a manuteno da priso tornouse semfundamento.

    No caso em anlise, embora o Ministro da Justia tenha concedido Cesare Battisti o status de refugiado poltico, Cesare ainda continua preso para fins de extradio.

    Tal fato ocorre porque existe a possibilidade de o Supremo modificar seu entendimento acerca da constitucionalidade da Lei 9.474/97 e considerar que oreconhecimento da condio de refugiado pelo Poder Executivo no impede o julgamento do pedido de extradio pelo Poder Judicirio; ou ainda considerar presenteclusula de excluso da concesso do refgio e, ento, realizar o controle do ato administrativo do Ministro; podendo, portanto, mesmo reconhecido como refugiadopoltico, tal situao ser modificada e Cesare ser ento extraditado para a Itlia[47].

    O art. 84 do Estatuto do Estrangeiro determina que a priso para fins de extradio perdurar at o julgamento final do Supremo Tribunal Federal[48]; tal entendimentotambm est sufragado em norma regimental (art. 208 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal RISTF[49]) e reafirmado em decises do STF[50] quedeterminam que a priso condio para o processamento da extradio.

    Portanto, enquanto no extinto o processo ou julgada improcedente a pretenso, impese a manuteno da priso de Cesare para fins de extradio[51].

    Como fundamento justificador da manuteno da priso at o julgamento final da extradio pelo STF, o Estatuto do Estrangeiro prev como um dos compromissosformais que o Estado requerente dever se obrigar, para que seja decretada a extradio, retrao penal, ou seja, ser computado o tempo de priso que no Brasilfoi cumprido por fora da extradio.

    2.6.2 Inconstitucionalidade do artigo 33 da Lei 9.474/97

    competncia constitucional do Poder Executivo, nos termos do artigo 84, inciso VII da Constituio Federal, conduzir as relaes internacionais do pas; as decisestomadas nesse mbito so soberanas do Estado brasileiro.

    Na conduo da poltica externa caber ao Poder Executivo decidir sobre a concesso de refgio, naturalizao e autorizao para ingresso ou sada de pessoas doterritrio nacional.

    No que concerne ao reconhecimento da condio de refugiado, a Lei 9.474/97 expressamente determina a competncia do Poder Executivo, atravs do rgoadministrativo CONARE que atua no mbito do Ministrio da Justia e, em grau de recurso, o Ministro da Justia, para reconhecer a condio de refugiado, bem comodeterminar a cessao ou a perda de tal condio[52].

    O reconhecimento da condio de refugiado , portanto, competncia poltica do Poder Executivo e, de acordo com o artigo 33 da Lei n 9.474/97, a concesso dorefgio gera a extino do processo de extradio, desde que haja pertinncia temtica entre a motivao do deferimento do refgio e o objeto do pedido deextradio.

    Todavia, o artigo 102, inciso I, alnea g determina que compete, originariamente ao Supremo Tribunal Federal, apreciar a extradio solicitada por Estado estrangeiro.

    Ademais, o artigo 77 da Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro) estabelece que:

    Art. 77. No se conceder a extradio quando:

    VII o fato constituir crime poltico

    2 Caber, exclusivamente, ao Supremo Tribunal Federal, a apreciao do carter da infrao.

    3 O Supremo Tribunal Federal poder deixar de considerar crimes polticos os atentados contra Chefes de Estado ou quaisquer autoridades, bem assim os atos deanarquismo, terrorismo, sabotagem, seqestro de pessoa, ou que importem propaganda de guerra ou de processos violentos para subverter a ordem poltica ou social.(grifos)

    Ou seja, a ordem jurdica vigente especifica que, para fins de extradio, a ltima palavra compete ao Supremo quanto configurao, ou no, da natureza poltica dodelito imputado ao extraditando.

    Diante do tema da diviso constitucional de competncias, surgiram os questionamentos: o ato de concesso de refgio pelo CONARE ou, em grau de recurso, peloMinistro da Justia, inviabiliza o deferimento da extradio pelo STF? A norma atingiria a independncia do Poder Judicirio, ao qual foi confiado pela Constituio(artigo 102, I, g) o julgamento dos pedidos de extradio, na medida em que condiciona o prosseguimento do processo no Supremo Tribunal Federal deciso decarter administrativo e poltico do Poder Executivo?

    O primeiro questionamento a possibilidade da concesso de refgio obstar, em definitivo, o julgamento pelo Supremo da extradio j foi colocado em discusso noSTF[53].

    O CONARE realizou um trabalho de conscientizao junto ao STF com o intuito de salvaguardar os preceitos da proteo internacional da pessoa humana e do direitointernacional argindo, para tanto, com respaldo na Constituio brasileira, que o instituto da extradio um instituto de cooperao judiciria entre Estados, poroutro lado, o instituto de refgio um instituto de proteo vida humana; no havendo, portanto, grau de comparao para equiparar os dois institutos.

    Com base no trabalho realizado pelo CONARE, a deciso do STF foi no sentido de que o pedido de refgio suficiente para sustar a extradio na fase em que estaestiver, inclusive, quando esta j houver sido concedida, pois tratase da aplicao do princpio da norma mais favorvel, ou seja, o STF ressaltou o fato de que, em setratando da afirmao da dignidade humana, prevalecer a norma que melhor proteja o ser humano[54].

    O tema da extradio, dentro da temtica dos refugiados, gerou discusses no Supremo Tribunal Federal ao ser questionada a constitucionalidade do artigo 33 da Lei9.474/97, sob a alegao de que o mesmo viola o princpio da separao dos poderes[55].

    O artigo 33 da Lei 9.474/97 foi recentemente declarado constitucional pelo Supremo, quando do julgamento da extradio do padre Olivrio Medina, acusado de crimesrelacionados participao do extraditando em ao militar das Foras Armadas Revolucionrias da Colmbia (FARC), por entender que vlida a lei que reserva aoPoder Executivo (a quem incumbe, por atribuio constitucional, a competncia para tomar decises que tenham reflexo no plano das relaes internacionais doEstado), o poder privativo de conceder asilo ou refgio[56].

    O ato de concesso de refgio pelo Poder Executivo no significa invaso da rea do Poder Judicirio, pois est compreendido na esfera de competncia daquelepoder.

    Nesse sentido foi o voto do Ministro Seplveda Pertence na Extradio 1.0085[57]:

    A condio de refugiado, enquanto dure, elisiva, por definio, da extradio que tenha implicaes com os motivos do seu deferimento.No existe ai nenhumaafronta competncia do Tribunal para julgar do processo de extradio.O processo instrumento de composio jurisdicional de um conflito presente: se

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    desaparece o seu objeto, extinguese o processo sem julgamento de mrito.A circunstncia de o prejuzo do processo advir de ato de um outro Poder desde quecompreendo na esfera de sua competncia no significa invaso da rea do Judicirio. (...) Mas, data venia, o problema no est em que a deciso prejudicial sejatomada, no por outro rgo judicirio, mas sim por rgo do Poder Executivo, mas sim em indagar se do Executivo, e no do Judicirio, a competncia para tomla.

    E suponho no haver dvida de validade da lei que a exemplo da generalidade dos ordenamentos nacionais , reserva ao Poder Executivo rgo das relaesinternacionais do Estado o poder privativo de conceder asilo e refgio. (grifos)

    Ademais, tendo em vista que a deciso de concesso de refgio proferida no mbito administrativo, embora no haja previso na Lei 9.474/97, sempre ser possvelrecurso ao Poder Judicirio diante da previso constitucional do artigo 5, XXXV que determina que a lei no excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ouameaa direito.

    2.6.3 Existncia de clusula de excluso do refgio: crime poltico x crime comum

    A Constituio Federal veda, em consonncia com as garantias constitucionais da manifestao do pensamento, a liberdade de conscincia, crena e de convicofilosfica e poltica (art. 5, IV, VI e VIII) a extradio por crimes polticos ou de opinio[58].

    Por outro lado, a Conveno de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados, prev em seu artigo 1, pargrafo 6, alneas b e c que no ser reconhecido comorefugiado e, consequentemente, no estar obstada a possibilidade de extradio, aquele que cometeu um crime grave de direito comum fora do pas de refgio antesde ser nele admitido como refugiado e o culpado de atos contrrios aos fins e princpio das Naes Unidas.

    No caso Cesare Battisti, tendo em vista a concesso de refgio com base no artigo 1, inciso I da Lei 9.474/97 fundado temor de perseguio por motivos de opiniespolticas discutese o fato de Cesare ter sido condenado na Itlia pela prtica de quatro homicdios, o que no se caracterizaria como crime poltico, mas sim crimecomum; existindo, assim, uma clusula de excluso da concesso do refgio.

    Ocorre que, em certas situaes, a prtica de um crime pode, simultaneamente, constituir a prtica de infrao comum e poltica.

    Essa a situao na qual o caso em anlise se insere: Battisti foi condenado pela prtica de crimes comuns relacionados participao do italiano em ao militar dogrupo Proletrios Armados pelo Comunismo PAC.

    Para resoluo dessas situaes, o Estatuto do Estrangeiro, adotou o critrio da preponderncia[59], ou seja, ser concedida a extradio quando o fato for,principalmente, delito comum ou quando o fato principal for delito comum e este for conexo com o delito poltico[60].

    Para determinar se uma infrao de direito comum ou se, pelo contrrio, constitui um crime poltico, preciso ter em conta em primeiro lugar a natureza e afinalidade do delito: se foi cometida por motivos genuinamente polticos e no apenas por razes pessoais ou em proveito prprio. Deve tambm haver um nexo decausalidade estreito e direto entre o crime cometido e os propsitos e objetivos polticos invocados[61].

    O elemento poltico da infrao deve prevalecer sobre o seu carter de direito comum. Tal no acontecer se os atos cometidos forem manifestadamentedesproporcionados relativamente aos objetivos visados. A natureza poltica da infrao tambm mais difcil de aceitar se envolver atos de atrocidade[62].

    As pessoas que fogem de procedimentos judiciais ou punio por infraes comuns no so normalmente refugiados. Todavia, dependendo das circunstncias do casoconcreto, podero ser assim considerados.

    Nesse sentido o Manual de procedimentos e critrios a aplicar para determinar o Estatuto do Refugiado[63]:

    O procedimento judicial por uma infrao pode, dependendo das circunstncias, ser um pretexto para punir o infractor pelas suas opinies polticas ou pelaexpresso dessas opinies. Tambm pode haver razo para acreditar que um infractor comum estaria exposto a uma pena excessiva ou arbitrria pelo alegado delito.Essa pena excessiva ou arbitrria ser equivalente a perseguio. (sic)

    Ser necessrio, para avaliar se os procedimentos judiciais realmente equivalem a uma perseguio, analisar as leis do pas em questo, uma vez que a aplicao de taisleis poder ser discriminatria ou as prprias leis podero estar fora dos padres aceitos em matria de direitos humanos.

    Para solucionar tal questo o Manual de procedimentos e critrios a aplicar para determinar o Estatuto do Refugiado[64] ensina:

    Em tais casos, tendo em conta as dificuldades bvias que se apresentam na avaliao das leis de outro pas, as autoridades nacionais sero, com freqncia, levadas atomar uma deciso tendo por referncia a sua prpria legislao nacional. Alm disso, pode ser til o recurso aos princpios enunciados nos diversos instrumentosinternacionais relativos aos direitos humanos, em particular nos Pactos Internacionais de Direitos Humanos, que tm fora obrigatria para os Estados Partes e que soos instrumentos aos quais aderiram muitos dos Estados Partes da Conveno de 1951.

    Conforme a Lei 9.474/97 cabe ao Poder Executivo, atravs dos rgos competentes, analisar o pedido de refgio e verificar, no caso concreto, se o requerentepreenche os requisitos necessrios para ser reconhecido como tal.

    O Ministro da Justia, em grau de recurso, verificou que o italiano Battisti preenchia o requisito do fundado temor e perseguio por opinio poltica, garantidor daconcesso de refgio.

    Se o ato do Ministro de concesso de refgio ato vinculado e a incidncia da clusula de excluso prtica de crime comum no foi, no caso concreto,devidamente observada; ou se ato discricionrio e cabe, exclusivamente ao Ministro, de acordo com os requisitos previstos em lei e segundo seu prprio juzo acercada convenincia e oportunidade, decidir reconhecer uma pessoa como refugiada, j configura uma nova discusso que ser analisada no prximo tpico.

    2.6.4 Controle judicial da deciso administrativa do Ministro da Justia

    A doutrina costuma distinguir os atos administrativos em atos expedidos no exerccio de competncia vinculada e atos praticados no desempenho de competnciadiscricionria.

    A atuao vinculada ocorre quando a norma a ser cumprida j predetermina e de modo completo, em termos que no ensejam dvidas alguma quanto ao seu objetivoreconhecimento, qual o nico comportamento possvel que o administrador estar obrigado a observar nos casos concretos[65].

    A atuao discricionria resulta para o administrador, em decorrncia do modo pelo qual o Direito regulou a atuao administrativa, um campo de liberdade em cujointerior cabe interferncia de uma apreciao subjetiva sua quanto maneira de proceder nos casos concretos[66].

    Os atos administrativos tero aspectos vinculados e discricionrios, variando o grau de cada um deles.

    No caso concreto em anlise surgiu a discusso acerca da natureza do ato administrativo de concesso de refgio: vinculado ou discricionrio?

    Aqueles que consideram ato vinculado entendem que a Lei 9.474/97 enumera, objetivamente, os casos em que uma pessoa ser reconhecida como refugiada, bem comoos casos em que dever ser excluda tal concesso.

    Sendo ato vinculado, a deciso do Ministro da Justia no escapa ao controle jurisdicional sobre eventual observncia dos requisitos de legalidade, sobretudo aferio de correspondncia entre sua motivao necessria declarada e as fattispecie normativas pertinentes[67].

    Portanto, a fundamentao utilizada pelo Ministro para a concesso de refgio Cesare Battisti de que a Itlia poca dos fatos atuou por meio de leis de defesa doEstado que reduziram as prerrogativas de defesa dos acusados havendo, dessa forma, dvidas quanto a observncia do devido processo legal nos processos queculminaram com a condenao de Cesare Battisti, bem como a caracterizao dada pelo Ministro dos crimes cometidos pelo italiano como crimes polticos, podero,caso seja entendido que no foi observado estritamente o que a lei determina ou que a deciso se fundou em motivos falsos ou inexistentes, ser revistos e controladospelo Poder Judicirio.

    Outros entendem ser a deciso de concesso do status de refugiado ato discricionrio do Ministro da Justia que, ao analisar os fatos e as provas apresentadas,decidir de acordo com o seu juzo de convenincia e oportunidade[68].

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    Para esses autores, no caso da concesso de refgio, a discricionariedade decorre do comando da norma que abre para o agente pblico alternativas de conduta porhaver atribudo ao mesmo competncia para resolver sobre qual ser a medida mais satisfatria perante as circunstncias.

    As expresses perseguio poltica e fundados temores de perseguio so conceitos jurdicos indeterminados o que deixa para o intrprete da norma um espaopara valorao subjetiva[69]. Para alguns autores como Celso Antnio Bandeira de Mello em tais situaes, nas quais cabe a interferncia de um juzo subjetivo doadministrado, h tambm discricionariedade[70].

    Importante ressaltar que, embora seja ato discricionrio, o Judicirio poder sempre apreciar os aspectos de legalidade e verificar se a Administrao ultrapassou oslimites da discricionariedade; neste caso, pode o Judicirio invalidar o ato, porque a autoridade ultrapassou o espao livre deixado pela lei e invadiu o campo dalegalidade.

    Em um Estado de Direito o exerccio dos poderes regulado pela ordem jurdica e por isso todas as decises do Poder Pblico so submetidas a exigncias jurdicas;tais exigncias sero sempre passveis de reviso judicial.

    Todavia, a Constituio Federal reserva certas decises de forma privativa aos diferentes Poderes. Em tais casos, o Poder Judicirio poder exercer controle sobre aobservncia das exigncias constitucionais e legais relacionadas ao devido processo legal, mas no podero, em regra, rever o mrito da deciso[71].

    entendimento do Supremo Federal que no lhe cabe rever o mrito de decises tomadas pelos outros Poderes quando, na distribuio de competncias, aConstituio atribuir certa competncia de forma privativa a um outro Poder[72].

    Para os autores que consideram o ato de concesso de refgio ato discricionrio, no legtimo o controle da valorao da autoridade decisria sobre os fatos ecircunstncias que lhe deram a convico de que no caso concreto o requerente estava sofrendo de perseguio poltico por opinies polticas.

    A motivao poltica dos crimes foi determinada dentro de um juzo prprio do Ministro da Justia e, embora possa no haver concordncia quanto a esta qualificao,o Ministro decide conforme suas convices e no fica vinculado s qualificaes eventualmente dadas pelos Estados estrangeiros.

    A anlise do mrito da deciso do Ministro, deciso de natureza jurdica poltica, violaria o princpio da separao dos poderes, pois as discusses sobre questesreferentes poltica internacional competem nica e exclusivamente ao Poder Executivo no cabendo, portanto, ao Poder Judicirio reavaliar o amplo conjunto deelementos apresentados para o reconhecimento da condio de refugiado e atrair para si a deciso poltica inserida na esfera de atribuio de outro Poder.

    Somente caberia o controle judicial se a deciso apresentasse manifesta violao aos princpios constitucionais[73]; no h espao para interveno judicial quando oPoder Executivo atuou dentro do considerado como razovel.

    2.7 ARGUMENTOS DE ACUSAO E ARGUMENTOS DE DEFESA

    Segue abaixo quadro esquemtico elencando os principais argumentos da acusao, favorveis reviso da deciso do Ministro da Justia que concedeu o refgio Battisti e a consequente concesso da extradio requerida pelo Estado italiano; e os argumentos da defesa de Cesare Battisti pela manuteno da deciso do Ministroda Justia e no extradio do italiano.

    2.8 O JULGAMENTO DO PEDIDO DE EXTRADIO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

    No dia 09 de setembro de 2009 o Supremo deu inicio ao julgamento de Cesare Battisti.

    O voto do Ministro Cezar Peluso foi no sentido de deferir a extradio de Cesare Battisti para a Itlia, sob a condio formal de comutao da pena perptua porprivativa de liberdade por tempo no superior a trinta anos, em consonncia com o artigo 5, inciso XLVII, letra b da Constituio Federal[74].

    O ministro analisou de incio a questo preliminar ao pedido de extradio e concluiu pela ilegalidade e pela ineficcia do ato do Ministro da Justia que concedeu orefgio.

    Para o ministro relator embora o Supremo tenha reconhecido o carter polticoadministrativo da deciso que concede refgio (Ext. 1008/Governo da Colmbia (DJE de17.8.2007)) e ainda o fato de o poder ou dever de outorga ser atribuio reservada competncia da prpria Unio, por representar o pas nas relaes internacionais,tais fatos no retiram a possibilidade de controle jurisdicional de legalidade dos atos jurdicoadministrativos (judicial review)[75].

    Cezar Peluso considerou o reconhecimento da condio de refugiado ato vinculado aos requisitos expressos e taxativos determinados na Lei 9.474/97; dessa forma, adeciso do Ministro da Justia no fugiria ao controle jurisdicional sobre eventual observncia dos requisitos de legalidade, em especial da verificao dacorrespondncia entre sua motivao necessria e as fattispecie normativas pertinentes[76].

    O ministro entendeu que o ato administrativo vinculado que outorgou o benefcio do refgio Battisti foi realizado contra legem, uma vez que no fundado em nenhumade suas hipteses legais.

    O ministro conclui que o extraditando no se apresenta como vtima de alguma injustia, mas como algum que foge da punio legal por crimes de natureza comumno sendo possvel, dessa forma, o reconhecimento do mesmo como refugiado[77].

    O ministro ressalta ainda que os crimes cometidos pelo extraditando no apresentam nenhum trao de conotao poltica, ao contrrio, caracterizamse como crimescomuns graves qualificados como hediondos, nos termos do art. 1 da Lei 8.072/90[78].

    O relator considerou que, no caso em anlise, no ocorreu a causa impeditiva de extradio prevista no art. 77, inciso VII e da Lei 6.815/80, garantia constitucionalconsagrada no art. 5, inciso LII da Constituio Federal (no ser concedida extradio de estrangeiro por crime poltico ou de opinio).

    Peluso reafirmou a competncia exclusiva do STF para determinar o carter das infraes que informam o pedido de extradio e julgou como comuns os crimescometidos por Battisti (homicdios dolosos perpetrados com premeditao, os quais no guardariam relao com fins altrustas que caracterizam movimentos polticosvoltados implantao de nova ordem econmica e social, mas revelariam, pelo contrrio, puro intuito de vingana pessoal), levando em considerao o princpio da

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    preponderncia (art. 77 1 da Lei 6.815/90)[79].

    2.8.1 A deciso do Supremo Tribunal Federal

    Os ministros Ellen Grancie, Carlos Ayres Britto, Carlos Levandowski e Gilmar Mendes seguiram o voto do relator: votaram pela extradio com a condio de que Battistino seja enviado priso perptua, j que essa pena no est prevista na legislao brasileira. A pena dever ser de, no mximo, 30 anos.

    Por outro lado, os ministros Eros Grau, Carmem Lcia, Joaquim Barbosa e Marco Aurlio de Mello votaram contra a extradio de Battisti argumentando que a Corte nopoderia julgar o caso de uma pessoa reconhecida como refugiado poltico.

    Por cinco votos a quatro o Supremo Tribunal Federal entendeu que o refgio concedido pelo governo brasileiro a Battisti foi irregular e autorizou a extradio do exativista Battisti para a Itlia.

    Decidido pela extradio coube ainda aos ministros decidirem sobre a possibilidade do Presidente da Repblica no aceitar a deciso do STF e decidir pela noextradio j que a deciso final nesses casos do presidente da Repblica que tem competncia constitucional para manter relaes com Estados estrangeiros.

    O Supremo definiu, novamente por cinco votos a quatro, que quem decide se extradita um estrangeiro preso no Brasil o presidente da Repblica. Os ministrosentenderam que a deciso do Judicirio de mandar extraditar no obriga, necessariamente, o Poder Executivo a fazlo.

    No caso Battisti o ento Presidente da Repblica Luis Incio Lula da Silva politicamente entendeu que, apesar da deciso do STF favorvel extradio, no caberiaa extradio de Battisti para a Itlia, pois Battisti seria um militante poltico e no um criminoso comum e, sendo assim, a proteo constitucional conferida contra aextradio por delitos polticos prevalece sobre o tratado de extradio firmado entre Brasil e Itlia.

    3. CONCLUSES

    O caso Cesare Battisti apresentou como questionamento jurdico fundamental a possibilidade de um refugiado ser extraditado.

    Conforme artigo 33 da Lei 9.474/97 fundamentado no princpio do nonrefoulement (nodevoluo) que determina que os refugiados no podem ser enviados paralocais em que sua vida, liberdade ou segurana corram risco, as pessoas reconhecidas como refugiadas no podero ser extraditadas, desde que haja pertinnciatemtica entre a motivao do deferimento do refgio e o objeto do pedido de extradio.

    O refgio tem natureza de direito humanitrio e est consagrado na Conveno das Naes Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951, ratificada pelo Brasil,que determina o impedimento da extradio de refugiados.

    No caso Cesare Battisti a aplicao da legislao vigente clara: concedido o refgio no mais poder ter prosseguimento o pedido de extradio no STF, tendo emvista que o pedido de extradio baseiase nos mesmos fatos que fundamentaram a concesso do refgio.

    Todavia, a Itlia requereu a extradio de Battisti com base em condenao definitiva do extraditando pela prtica de quatro homicdios premeditados, ocorridos entre1977 e 1979.

    A deciso do Ministro da Justia considerou os crimes cometidos por Battisti como delitos polticos.

    Ocorre que, os homicdios podem ser considerados como graves crimes de delito comum ou ainda serem enquadrados como atos contrrios aos princpios e propsitosda ONU e, com base na Conveno Internacional de 1951, bem como na Lei nacional 9.474/97, a prtica de crimes assim caracterizados impedem o reconhecimento deuma pessoa como refugiado.

    A possibilidade de anulao do ato do Ministro da Justia depende da caracterizao do ato de concesso de refgio como ato declaratrio vinculado aos preceitosdas normas (Lei 9.474/97 e Conveno de 1951). Sendo considerado ato vinculado, no caso do reconhecimento no observar o fundamento legal, haver a possibilidadede exame pelo Judicirio (judicial review).

    Ademais, o reconhecimento da condio de refugiado no definitivo; poder ocorrer ainda a verificao de clusulas de cessao ou de perda da condio pordeciso do CONARE ou do Ministro da Justia (conforme arts. 38, 39, 40 e 41 da Lei 9.474/97); verificandose uma das condies elencadas fica restabelecida apossibilidade de extradio.Sendo anulado o ato do Ministro da Justia, Cesare Battisti volta a ser considerado um estrangeiro no protegido pelo refgio e s entoser possvel, aps o trnsito em julgado da sentena anulatria, considerar o pedido de extradio para a Itlia.

    A extradio de um refugiado, bem como o uso indevido da proteo do refgio pelo reconhecimento fora das hipteses legais representa um descumprimento da regraprevista na Conveno de 1951, o que pode gerar conseqncias negativas no plano internacional, pois, criando um precedente negativo, poderia debilitarinternacionalmente a instituio do refgio, seja pelo descrdito daqueles que buscam o refgio ou por contribuir com o aumento da discriminao enfrentada pelosrefugiados no pas de acolhida[80].

    Na anlise do presente caso o Judicirio brasileiro deve zelar pela observncia das normas s quais o Estado brasileiro se obrigou ao ratificar a Conveno de 1951.

    Por fim, caso as partes no consigam resolver o litgio perante o Poder Judicirio brasileiro, o artigo 38 da Conveno de 1951 determina que a controvrsia poder ser,a pedido de uma das partes, submetida Corte Internacional de Justia[81].

    RefernciasLivro:BRASIL. M inistrio da Justia. Secretaria Nacional de Justia. Departamento de estrangeiros. A extradio. Tratados de extradio celebrados pelo Brasil. 3. ed.Braslia, 2004.MELLO, Celso Antnio Bandeira. Discricionariedade e Controle Judicial. 2ed. So Paulo: Malheiros, 2006.PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 19ed. So Paulo: Atalas, 2005.Artigo de revista eletrnica:KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e crticas delao premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 987, 15 mar. 2006. Disponvel em:. Acesso em: 09 set. 2009Documento eletrnico/internet:ACNUR. Manual de Procedimentos e Critrios a Aplicar para Determinar o Estatuto do Refugiados de acordo com a Conveno de 1951 e o Protocolo de 1967relativos aoACNUR. Nota de orientao sobre extradio e proteo internacional de refugiados. Genebra, 2008. Disponvel em:

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    ONU. ACNUR. Estatuto dos Refugiados. Genebra, 1992. Disponvel em: Acesso em: 07 de abril de 2009.ONU. ACNUR. Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados. 1967. Disponvel em: . Acesso em: 07 de abril de 2009VELLOSO, Carlos Mrio da Silva. Parecer elaborado a pedido da Itlia. Disponvel em: Acesso em: 02 de setembro de 2009.Peas Processuais:CONJUR. Deciso do Ministro da Justia: concesso de refgio Cesare Battisti. Processo Administrativo n 08000.011373/200883). Disponvel em: Acesso em: 03 de junho de 2009.CONJUR. Memoriais apresentados pela defesa de Cesare Battisti. Referentes ao Mandado de Segurana 27.875 e Extradio 1.085. Disponveis em: Acesso em: 07 de julho de 2009.STF. Extradio 1.0085 Repblica da Colmbia. Disponvel em: Acesso em: 07 de julho de 2009.STF. Voto do Ministro Relator Cezar Peluso no julgamento da Extradio n 1.085 (Cesare Battisti). Disponvel em: Acesso em: 12 de setembro de 2009.Notas:[1] Estado: Veja a cronologia do caso Cesare Battisti: deciso deve repercutir na relao Brasil e Itlia. Informaes disponveis em Acesso em: 10 de maro de 2009.[2] Jusbrasil Notcias: Confira a cronologia e entenda o caso Cesare Battisti. Informaes disponveis em Acesso em 11 de maro de 2009.[3] Idem.[4] Estado: Entenda o caso Cesare Battisti. Informaes disponveis em Acesso em 11de maro de 2009.[5] A autoria dos quatro homicdios atribudos como aes do PAC foi imputada Cesare Battisti o qual foi condenado em 1988 pela prtica de tais crimes.[6] GOYOS, Durval de Noronha. A Itlia dos anos de chumbo e a questo do asilo poltico a Cesare Battisti. Disponvel em: Acesso em: 4 de setembro de 2009.[7] Idem.[8] Idem.[9] Idem.[10] Nesse sentido, o voto do Ministro Relator Cezar Peluso na Extradio 1085 (caso Cesare Battisti):Ningum o ignora, tal ordem, que compreendia sistemaparlamentar de governo, de ntida colaborao entre os poderes Executivo e Legislativo, era, na poca, caracterizada por ampla liberdade poltica, forte ativismo social,consistente representatividade popular, sistema pluripartidrio,eleies peridicas e temporalidade no exerccio do poder, cujo regular domnio peridico por algum oualguns partidos polticos refletia apenas a preferncia momentnea do eleitorado. A liberdade poltica foi particularmente notvel nas eleies de 1976, quando,confirmado por seu expressivo desempenho nas urnas, o pas experimentou o fortalecimento do Partido Comunista. Assim, como j sucedera nas legislaturas anteriores,formouse, na de 19761979, nova mas controversa coalizo parlamentar de centro esquerda,agora integrada pelo Partido Democrata Cristo e pelo PartidoComunista,liderado por Enrico Berlinguer, e cuja feio polticoideolgica impressa nos rumos do governo dificilmente poderia confundida com a da chamada extremadireita antidemocrtica. (...) Passar desse contexto objetivo de incontveis dificuldades socioeconmicas e polticas, mas enfrentadas por sucessivos governosdemocrticos, indisfarvel insinuao de que leis, indispensveis para responder s graves condies de emergncia e votadas por parlamento de centroesquerda comestrita observncia formal e material do ordenamento constitucional democrtico, tipificariam estado paralelo de exceo que reduziu as prerrogativas de defesa doextraditando, negandolhe garantias do justo processo legal, exerccio de pura especulao ou manifestao do mais radical subjetivismo. No guarda compromissoalgum com a verdade histrica. A Itlia no era nem encobria regime de exceo, no derrogou os fundamentos jurdicos de tutela dos direitos humanos, nemtampouco e isto decisivo aplicou ao extraditando, em dano de sua defesa, nem de qualquer outro direito seu, poderes de polcia e leis de exceo que, naspalavras da autoridade administrativa, compuseram todo um arsenal de que o prprio ordenamento jurdico forjado nos anos de chumbo dotou a magistraturaitaliana, como, p. ex., inveno de novos delitos, cuja dilatao teria garantido a estratgia de abusos judicirios. (grifos) Disponvelem p. 41/42 e 54. Acesso em: 24 de setembro de 2009.[11] Estado: Veja a cronologia do caso Cesare Battisti: deciso deve repercutir na relao Brasil e Itlia. Informaes disponveis em Acesso em: 10 de maro de 2009.[12] Idem.[13]Idem.[14] O instituto da delao premiada na legislao italiana passa a ser aplicado atravs da Lei misure per la difesa dellordinamento constituzionale, criada em 1982,como um instrumento de desarticulao do crime organizado na Itlia. A delao premiada na Itlia apresentase de duas formas: os arrependidos e os dissociados. Osarrependidos so criminosos que antes da sentena condenatria retiramse da associao e fornecem informaes acerca da estrutura da organizao Justia.Quando a veracidade de suas denncias comprovada, so beneficiados com a extino da punibilidade e, tanto o colaborador quanto seus parentes prximos, passama receber salrio, moradia e plano de sade do Estado, que se torna responsvel por sua integridade fsica. Os dissociados, por outro lado, esforamse para, antes dasentena, impedir ou diminuir as conseqncias danosas ou perigosas de crimes, obtendo a diminuio de um tero da pena. Os benefcios concedidos atravs dadelao premiada so aplicados na Itlia principalmente para os crimes cometidos contra a segurana interior do Estado como por exemplo, crime de seqestro pormotivo de terrorismo ou subverso, e contra a liberdade individual.O instituto da delao premiada na legislao brasileira surgiu em decorrncia, principalmente, dainfluncia da legislao italiana ( KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e crticas delao premiada no direito brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n.987, 15 mar. 2006. Disponvel em: . Acesso em: 09 set. 2009.) A delao premiada no Brasil consiste na garantia de umbenefcio como a reduo de pena, perdo judicial, aplicao de regime penitencirio brando, para o associado ou partcipe que, voluntariamente ouespontaneamente, entregar seus companheiros; uma forma de estmulo elucidao e punio de crimes praticados em concurso de agentes[15] VELLOSO, Carlos Mrio da Silva. Parecer elaborado a pedido da Itlia. Disponvel em: Acesso em: 02 de setembro de 2009, pp. 6/9.[16] Idem.[17] Jusbrasil Notcias: Confira a cronologia e entenda o caso Cesare Battisti. Informaes disponveis em Acesso em 11 de maro de 2009.[18] Estado: Veja a cronologia do caso Cesare Battisti: deciso deve repercutir na relao Brasil e Itlia. Informaes disponveis em Acesso em: 10 de maro de 2009.[19] Importante destacar que Cesare, que vivia na Frana h mais de uma dcada, teve seu pedido de naturalizao francesa deferido em 2003, porm tal deciso foianulada em julho de 2004.[20] Jusbrasil Notcias: Confira a cronologia e entenda o caso Cesare Battisti. Informaes disponveis em Acesso em 11 de maro de 2009.[21] Idem.[22] Idem.[23] Idem.[24] Idem.[25] A Corte Europia de Direitos Humanos foi criada em 1959 e sua sede est localizada em Estrasburgo. A Corte tem como funo verificar o respeito aos princpios daConveno Europia dos Direitos Humanos; a Conveno visa proteo dos Direitos Humanos e liberdades fundamentais. Ressaltase que a Corte s efetua julgamentosdos Estados que assinaram a referida Conveno[26] VELLOSO, Carlos Mrio da Silva. Parecer elaborado a pedido da Itlia. Disponvel em: Acesso em: 02 de setembro de 2009, p. 10.[27] Departamento de estrangeiros. A extradio. Tratados de extradio celebrados pelo Brasil. 3. ed. Braslia, 2004.BRASIL. M inistrio da Justia. Secretaria Nacionalde Justia.[28] Conforme artigo I do mencionado tratado de extradio, cada uma das partes obrigase a entregar outra, mediante solicitao, segundo as normas e condiesestabelecidas no tratado, as pessoas que se encontrem em seu territrio e que sejam procuradas pelas autoridades judiciais da parte requerente, para seremsubmetidas a processo penal ou para execuo de uma pena restritiva de liberdade pessoal. O art. II, n 1 do tratado de extradio determina que ser concedida aextradio por fatos que, segundo a lei de ambas as partes, constiturem crimes punveis com uma pena privativa de liberdade pessoal cuja durao mxima prevista foisuperior a um ano, ou mais grave. Departamento de estrangeiros.

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    [29] Art. 1 Ser reconhecido como refugiado todo indivduo que: I devido a fundados temores de perseguio por motivos de raa, religio, nacionalidade, gruposocial ou opinies polticas encontrese fora de seu pas de nacionalidade e no possa ou no queira acolherse proteo de tal pas. (grifos)[30] Com a solicitao de refgio o processo de extradio, baseado nos fatos que fundamentaram a concesso de refgio, fica suspenso at deciso definitiva,conforme art. 34 da Lei 9.474/97: A solicitao de refgio suspender, at deciso definitiva, qualquer processo de extradio pendente, em fase administrativa oujudicial, baseado nos fatos que fundamentaram a concesso de refgio.[31] Deciso do Ministro da Justia.. Disponvel em: Acesso em: 03 de junho de 2009, p. 3.[32] Idem, p. 6[33] Nesse sentido, um excerto da deciso do Ministro, p.6/7: A preocupao com os limites do poder de exceo deve ocorrer mesmo nos seus momentos maisduros tanto no que se refere s normas de ordem material, como naquelas de ordem processual. Todas as normas, sejam excepcionais ou no, carregam, no sistemade direito orgnico democracia, o permanente apelo razoabilidade e proporcionalidade. fundamental, portanto, que aos que desobedecem a lei sejamestendidas todas as garantias da ordem jurdica democrtica. Disponvel em: Acesso em: 03 de junho de 2009.[34] Idem, p. 6/7. .[35] Idem, p. 10/11.[36] Concluo entendendo, tambm, que o contexto em que ocorreram os delitos de homicdio imputados ao recorrente, as condies nas quais se desenrolaram osseus processos, a sua potencial impossibilidade de ampla defesa face radicalizao da situao poltica na Itlia, no mnimo, geram uma profunda dvida sobre se orecorrente teve direito ao devido processo legal. Disponvel em: , p. 11.Acesso em: 03 de junho de 2009.[37] bom que reste claro que o carter humanitrio, que tambm princpio da proteo internacional da pessoa humana, perpassa o refgio, implicando o princpioin dubio pro reo: na dvida, a deciso de reconhecimento dever inclinarse a favor do solicitante do refgio. Disponvel em:, p.11 Acesso em: 03 de junho de 2009.[38] Idem, p.12/13.[39] O mandado de segurana est previsto no artigo 5, inciso LXIX da Constituio Federal e impetrado para proteger direito lquido e certo, no amparado porhabeas corpus ou habeas data quando o responsvel pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pblica ou agente de pessoa jurdica no exerccio de atribuiesdo Poder.[40] O art. 105, inciso I, alnea b da Constituio Federal determina a competncia do Supremo Tribunal de Justia para processar e julgar mandados de seguranacontra ato de Ministro de Estado, todavia, no caso em anlise, a competncia para julgar o mandado de segurana impetrado do STF, embora o mandado ataquedeciso proferida por um Ministro de Estado, Ministro da Justia Tarso Genro. Tal excepcionalidade decorre da competncia originria do STF para processar e julgar aextradio solicitada por Estado estrangeiro e de entendimento pacfico no Supremo de que tambm competncia do STF julgar as questes relacionadas com aextradio independentemente da qualidade da autoridade coatora, tratandose de habeas corpus e de mandado de segurana. O entendimento do STF de que huma relao de prejudicialidade entre a ao e a extradio, pois eventual deciso suspendendo e desconstituindo o ato que concedeu refgio repercutir sobre ajurisdio do Supremo Tribunal Federal na apreciao e julgamento do processo de extradio.[41] STF. Itlia questiona refgio concedido a Battisti e entra com Mandado de Segurana contra ato de Tarso Genro. Disponvel em : Acesso em: 10 de julho de 2009.[42] Idem.[43] Idem.[44] Idem.[45] STF: Chega ao Supremo pedido de liberdade em favor de Cesare Battisti. Disponvel em: Acesso em: 02 de junho de 2009.[46] Cf. art. XIII do Tratado de Extradio: 1 Antes que seja entregue o pedido de extradio, cada parte poder determinar, a pedido da outra, a priso preventiva dapessoa, ou aplicar contra ela medidas coercitivas; 2 No pedido de priso preventiva, a parte requerente dever declarar que, contra essa pessoa, foi imposta umamedida restritiva de liberdade pessoal, ou uma sentena definitiva de condenao pena restritiva de liberdade, e que pretende apresentar pedido de extradio.Alm disso, dever fornecer a descrio dos fatos, a sua qualificao jurdica, a pena cominada, a pena a ser cumprida e os elementos necessrios para a identificaoda pessoa, bem como indcios de existentes sobre a sua localizao no territrio da parte requerida. O pedido de priso preventiva poder ser apresentado parterequerida tambm atravs da Organizao de Polcia Criminal Interpol. BRASIL. M inistrio da Justia. Secretaria Nacional de Justia. Departamento de estrangeiros. Aextradio. Tratados de extradio celebrados pelo Brasil. 3. ed. Braslia, 2004.[47] Nesse sentido o parece do Procurador Geral da Repblica N 5280 PGRAF EXTRADIO N 1.085. Na hiptese de ocorrer a modificao e a superao dacompreenso adotada no julgamento da Extradio n 1008 e, assim, vier a ser julgado o mrito do pedido, a minha manifestao, coerente com o que foi externadonos pareceres de fls. 2318/2331 e 2792/2794, no sentido da procedncia do pedido de extradio.Porque relevante, destaco que nos termos dos artigos 38 e 39 daLei n 9474/97 pode ocorrer a cessao ou a perda da condio de refugiado por deciso do CONARE ou do Ministro da Justia (arts. 40 e 41 do Estatuto dosRefugiados). Verificandose uma ou outra, desde que no baseadas na sada do territrio nacional, fica restabelecida a possibilidade da extradio. Finalmente, apriso do extraditando, segundo norma regimental (art. 208 RISTF) reafirmada por entendimento dessa Corte (Habeas Corpus n 90070, rel. Min.Eros Grau, DJ 30/03/2007 e extradio n 977, rel. Min. Celso de Mello DJ de 14/04/2005) condio para o processamento da extradio, demodo que, enquanto no extinto o processo ou julgada improcedente a pretenso, impese a sua manuteno (grifos) p.5/6. Disponvel em: Acesso em: 03 de junho de 2009.[48] Cf.. art. 84 da Lei n 6.815, de 19 de agosto de 1980 (Estatuto do Estrangeiro): Efetivada a priso do extraditando, o pedido ser encaminhado ao Supremo TribunalFederal. Pargrafo nico: A priso perdurar at o julgamento final do Supremo Tribunal Federal, no sendo admitidas a liberdade vigiada, a priso domiciliar, nem apriso albergue.[49] Art. 208 RISTF No ter andamento o pedido de extradio sem que o extraditando seja preso e colocado disposio do Tribunal[50] Habeas Corpus n 90070, rel. M in. Eros Grau, DJ 30/03/2007 e Extradio n 977, rel. M in. Celso de Mello DJ de 14/04/2005 Disponvel em: .[51] Nesse sentido o parecer do Procurador Geral da Repblica. N 5280 PGRAF EXTRADIO N 1.085. Disponvel em: Acesso em: 03 de junho de 2009, p. 5.[52] Cf. art. 12, incisos I, II e III e art. 29 da Lei 9.474/97.[53] EXT783/MEMxico, EXT784/MEMxico e EXT785/MEMxico. Disponvel em . Acesso em: 10 de julho de 2009.[54]Cf. EXT783/ MEMxico: EXTRADIO. QUESTO DE ORDEM. PEDIDO DE REFGIO. SUSPENSO DO PROCESSO. LEI N 9.474/97, ART. 34. Questo de ordemresolvida no sentido de que o pedido de refgio, formulado aps o julgamento de mrito da extradio, produz o efeito de suspender o processo, mesmo quando jpublicado o acrdo, impedindo o transcurso do prazo recursal. Disponvel em . Acesso em: 10 de julho de 2009.[55] Extradio 1.0085 Repblica da Colmbia. Disponvel em: Acesso em: 07 de julho de 2009.[56]Idem.[57] Extradio 1.0085 Repblica da Colmbia. Disponvel em: ttp://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(Ext$.SCLA.%20E%201008.NUME.)%20OU%20(Ext.ACMS.%20ADJ2%201008.ACMS.)&base=baseAcordaos>Acesso em: 07 de julho de 2009, p. 251/259.[58] Nesse mesmo sentido, o artigo 77 inciso VII da Lei 6.815/80.[59] Nesse sentido o voto do Ministro Celso de Mello Ext. 1.008/Repblica da Colmbia: inegvel a delicadeza do tema concernente aos crimes comuns conexos comos delitos polticos. Essa questo resolvese pelo critrio da preponderncia ou da prevalncia. Se os crimes comuns, dentro desse vnculo de conexidade, ostentaremcarter hegemnico porque mais eminentes e expressivos ou subordinantes, at, da prtica dos ilcitos polticos deixar de incidir qualquer causa obstativa dodeferimento da postulao extradicional. Extradio 1.0085 Repblica da Colmbia. Disponvel em: ttp://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(Ext$.SCLA.%20E%201008.NUME.)%20OU%20(Ext.ACMS.%20ADJ2%201008.ACMS.)&base=baseAcordaos>Acesso em: 07 de julho de 2009, p.p 278/283.[60] Cf. art. 77, inciso VII, pargrafo I do Estatuto do Estrangeiro.[61] Manual de Procedimentos e Critrios a Aplicar para Determinar o Estatuto do Refugiado de acordo com a Conveno de 1951 e o Protocolo de 1967 relativos aoEstatuto dos Refugiados. Genebra, 1992. Disponvel em: p.p 34. Acesso em 01 de junho de 2009.[62] Idem.[63] Idem.[64] Manual de Procedimentos e Critrios a Aplicar para Determinar o Estatuto do Refugiado de acordo com a Conveno de 1951 e o Protocolo de 1967 relativos aoEstatuto dos Refugiados. Genebra, 1992. Disponvel em: p.p 16. Acesso em 01 de junho de 2009.[65] Celso Antnio Bandeira de Mello, Discricionariedade e Controle Jurisdicional, 2006, p. 9.[66] Idem.[67] Nesse sentido o voto apresentado pelo Ministro Relator Cezar Peluso no julgamento da Extradio n 1.085/Repblica da Itlia (Cesare Battisti): Depois, pela razo

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    bvia de que, para usar as palavras da lei, o reconhecimento da condio de refugiado constitui ato vinculado aos requisitos expressos e taxativos que a lei lhe impecomo condio necessria de validade, ao capitular as hipteses em que pode o refgio ser deferido e aquelas em que, sem lugar para formulao discricionria dejuzo de convenincia ou oportunidade, no pode slo, sem grosseiro abuso ou carncia de poder jurdico. Em suma, a deciso do Senhor Ministro da Justia noescapa ao controle jurisdicional4 sobre eventual observncia dos requisitos de legalidade, sobretudo aferio de correspondncia entre sua motivao necessriadeclarada e as fattispecie normativas pertinentes, que terreno em que ganha superior relevo a indagao de juridicidade dos motivos, at para averiguar se no tersido usurpada, na matria de extradio, competncia constitucional exclusiva do Supremo Tribunal Federal. Diponvel em: Acesso em: 12 de setembro de 2009, p. 14/15.[68] A existncia de parmetros jurdicos para a concesso de refgio no afasta a natureza essencialmente poltica da deciso que aprecia o pedido. Em um Estado deDireito, natural que o exerccio do poder seja regulado pela ordem jurdica e, portanto, que todas as decises do Poder Pblico, inclusive as inerentes soberania, sejam submetidas a determinadas exigncias jurdicas. E, quanto a esses aspectos, sempre seropassveis de reviso judicial. Isso no significa, porm, que no haja decises reservadas de forma privativa pela Constituio aos diferentes Poderes ou que o PoderJudicirio esteja legitimado a rever o mrito de toda e qualquer deciso, substituindose aos agentes polticos de forma indiscriminada. Essa a pacfica jurisprudnciado Supremo Tribunal Federal.(...) Essa uma tpica competncia poltica do Poder Executivo, explicitada pelo legislador brasileiro. O fato de a lei instituirprocedimentos e requisitos no transfere o juzo acerca do mrito da questo para o Poder Judicirio.[69] Dentro do conceito indeterminado h uma zona de certeza positiva e outra de certeza negativa, tais zonas so controladas pelo Poder Judicirio. Porm, dentro doespao intermedirio a autoridade competente ter liberdade para apreciao. A discricionariedade decorrente da existncia de conceitos indeterminados encontrasua margem de liberdade no campo onde existam dvidas sobre o cabimento dos conceitos utilizados que no possam ser eliminadas; fora desse campo de dvidashaver vinculao.[70] Esse entendimento no consensual. Parte da doutrina entende que a existncia de conceitos indeterminados ou imprecisos de modo algum autorizaria concluirpela existncia de uma esfera de discricionariedade. A moderna doutrina alem, conforme refere Eduardo Garcia Enterra, sustenta que os conceitos indeterminadosou fluidos s apresentam tal caracterstica considerados em abstrato; no porm diante de casos concretos, isto , por ocasio de sua aplicao. Entendendo deforma diferente Celso Antnio ensina: Em suma: muitas vezes exatamente porque o conceito fluido impossvel contestar a possibilidade de convivereminteleces diferentes, sem que, por isto, um delas tenha de ser havida como incorreta, desde que quaisquer delas sejam igualmente razoveis. Celso Antnio Bandeirade Mello, Discricionariedade e controle jurisdicional, 2006, P.22 e 23.[71] O controle judicial de atos discricionrios possvel, mas ter que respeitar a discricionariedade administrativa nos limites em que ela assegurada por lei. Nessesentido Maria Sylvia Zanella di Pietro, Direito Administrativo, 2006, p. 227 Isso ocorre pelo fato de ser a discricionariedade um poder delimitado previamente pelolegislador; este, ao definir determinado ato, intencionalmente deixa um espao para livre deciso da Administrao Pbica, legitimando previamente a sua opo;qualquer delas ser legal. Da por que no pode o Poder Judicirio invadir esse espao reservado, pela lei, ao administrador, pois, caso contrrio, estaria substituindo,por sues prprios critrios de escolha, a opo legtima feita pela autoridade competente com base e razes de oportunidade. Todavia, a discrio administrativa nopode significar campo de liberdade para que o administrador, dentre as vrias hipteses abstratamente comportadas pela norma, escolha qualquer uma delas no casoconcreto. A discricionariedade outorgada ao administrador tendo em vista que seria impossvel o legislador fixar previamente para todos os casos concretos qual anica opo que atendesse perfeitamente o interesse pblico. O administrador dever, portanto, tendo em vista o seu dever jurdico funcional de acertar, diante dassituaes concretas, decidir qual a soluo que melhor ir atender a finalidade da lei. Ocorre que em alguns casos concretos cabero dvidas acerca da melhorsoluo e podero existir opinies divergentes que se apresentaro como razoveis e tambm admissveis para aquele caso concreto. Nestas hipteses, a deciso doadministrador inatacvel, pois corresponder a uma opo de mrito. Nesses casos h realmente discricionariedade, pois h o problema de no se saber qual asoluo tima para o caso concreto. Em outras situaes diante do caso concreto, para alm de qualquer dvida, qualquer sujeito de inteleco normal e razovelpoder concluir que, apesar da discricionariedade outorgada pela norma, a situao s comporta apenas uma providncia ou, mesmo que comporte mais de umaprovidncia, reste claro que uma delas no deve ser aplicada. Barroso, LusRoberto. Memoriais apresentados pela defesa de Cesare Battisti. Referentes ao Mandadode Segurana 27.875 e Extradio 1.085. Disponveis em: , p.14/16.Acesso em: 07 de julho de 2009.[72] Extradio 1.0085 Repblica da Colmbia. Disponvel em: Acesso em: 07 de julho de 2009.[72] Extradio 1.0085 Repblica da Colmbia. Disponvel em: ttp://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(Ext$.SCLA.%20E%201008.NUME.)%20OU%20(Ext.ACMS.%20ADJ2%201008.ACMS.)&base=baseAcordaos>Acesso em: 07 de julho de 2009.[73] Nesse sentido o Memorial do extraditando Cesare Battisti apresentado por seu advogado Lus Roberto Barroso referente ao Mandado de Segurana n. 27.875, p. 13:O fato de algum poder divergir da valorao da autoridade competente diz respeito ao mrito do ato, aos seus motivos. E o mrito, isto , a convenincia,oportunidade e a soluo escolhida, quando se trate de uma deciso essencialmente poltica, somente h de ser revisto quando se trate de situaes teratolgicas, demanifesta violao dos princpios constitucionais. Do contrrio, estarseia substituindo o juzo poltico do Poder competente pelo juzo poltico de outro Poder,criandose uma instncia hegemnicacondenada pela jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal.[74] STF. Voto do Ministro Relator Cezar Peluso no julgamento da Extradio n 1.085 (Cesare Battisti). Disponvel em: Acesso em: 12 de setembro de 2009.[75] STF. Voto do Ministro Relator Cezar Peluso no julgamento da Extradio n 1.085 (Cesare Battisti). p.02/3. Disponvel em: Acesso em: 12 de setembro de 2009[76] Idem. P. 3/4.[77] Idem.[78] Idem. P. 49/54: Sem avanar cognio sobre a questo da dupla tipicidade e de outros requisitos de extradio, esta sntese basta para evidenciar que, perantenosso ordenamento jurdico, tais delitos, sobre no apresentar nenhum trao de conotao poltica, entram com folga na classe dos crimes comuns graves, qualificadosde hediondos nos termos do art. 1 da Lei n 8.072/90.[79] Idem. p. 114/138: Como se v, a natureza dos delitos pelos quais o extraditando foi condenado, marcados sobremaneira pela absoluta carncia de motivaopoltica, intensa premeditao, extrema violncia e grave intimidao social, no se afeioa de modo algum ao modelo conceptual de delito poltico que impede aextradio de sditos estrangeiros, ao menos nos contornos definidos e consolidados pela Corte nos precedentes j mencionados (...)No ignoro que a extremaviolncia ou a excepcional crueldade que envolveu os crimes comuns atribudos ao extraditando, por si ss, no teriam fora para deferimento do pedido, se, tendopor vtimas outras pessoas, houvessem sido produto de uma ao poltica concebida em ambiente de luta aberta contra regime totalitrio, seja no contexto de umacomoo ou rebelio poltica, seja no de uma guerra civil, seja em circunstncias anlogas (...)Os homicdios dolosos, cometidos com premeditao pelo oraextraditando, no guardam relao prxima nem remota com fins altrustas que caracterizam movimentos polticos voltados implantao de nova ordem econmica esocial. Revelam, antes, puro intuito de vingana pessoal, enquanto praticados contra dois policiais, cujas funes eram exercidas em presdios que abrigavam presospolticos e comuns (i), e dois comerciantes que teriam reagido a anteriores tentativas de assalto a seus estabelecimentos (ii).[80] Nesse sentido o entendimento do ACNUR, compartilhado pelo presidente do Comit Nacional para Refugiados, Luiz Paulo Barreto: a modificao da legislaobrasileira abriria um precedente negativo capaz de desencadear um retrocesso com conseqncias amplas no que diz respeito proteo dos refugiados no Brasil etambm no mundo, pois uma mudana de entendimento poder representar um precedente perigoso para a prtica internacional acerca do tema, podendo levar maispases a recorrerem ao Judicirio, debilitando assim, internacionalmente, a instituio do refgio.[81] Cf. art. 38: Qualquer controvrsia entre as Partes nesta Conveno relativa sua interpretao ou sua aplicao, que no possa ser resolvida por outros meios,ser submetida Corte Internacional de Justia, a pedido de uma das Partes na controvrsia.

    Carina de Oliveira Soares

    Advogada; Mestranda em Direito Pblico pela Universidade Federal de Alagoas

    Informaes Bibliogrficas

    SOARES, Carina de Oliveira. Anlise das implicaes jurdicas do caso Cesare Battisti. In: mbito Jurdico, Rio Grande, XIV, n. 88, maio 2011. Disponvel em: . Acesso em maio 2015.

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