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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental II-365 – ANÁLISE DE COMPONENTES PRINCIPAIS DE UM SISTEMA DE TERRAS ÚMIDAS CONSTRUÍDAS Celeide Maria Belmont Sabino Meira (1) Arquiteta e Engenheira Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Doutora em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande. Professora Titular do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual da Paraíba. Beatriz Susana Ovruski de Ceballos Bioquímica pela Universidade Nacional de Tucumán, Argentina. Mestre em Microbiologia e Imunologia Ambiental pela Escola Paulista de Medicina. Doutora em Microbiologia Ambiental pela Universidade de São Paulo. Professora Adjunta da Universidade Federal de Campina Grande. Rui de Oliveira Engenheiro Civil pela Escola de Engenharia do Maranhão. Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. PhD em Engenharia Civil pela Universidade de Leeds, Inglaterra. Professor Adjunto da Universidade Federal de Campina Grande. Annemarie König Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Carlos. PhD em Botânica pela Universidade de Liverpool, Inglaterra. Professora Adjunta da Universidade Federal de Campina Grande. Mônica de Amorim Coura Graduada em Química pela Universidade Regional do Nordeste, Campina Grande, Paraíba. Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Doutora em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande. Professora Adjunta da Universidade Federal de Campina Grande. Endereço (1) : Rua José de Alencar, 1111 - Prata – Campina Grande – PB - CEP: 58108-561 - Brasil - Tel: (83) 341- 2385 - e-mail: [email protected] RESUMO Este trabalho descreve a análise fatorial de componentes principais aplicada aos dados de 16 variáveis físico- químicas e microbiológicas medidas nos efluentes de sistemas de terras úmidas construídas, com substrato de brita, vegetados com Typha sp., tratando águas superficiais poluídas com esgoto doméstico, visando uma descrição mais eficiente da estrutura de correlação dessas variáveis. Os ecossistemas experimentais foram construídos no Campus da Universidade Federal de Campina Grande, PB, tendo sido levados a efeito dois experimentos, o primeiro entre Janeiro e Dezembro de 2000 e o segundo entre Janeiro e Julho de 2001, ambos caracterizados por tempos de detenção hidráulica entre 5 e 10 dias. Nos dois experimentos, foram definidos três componentes artificiais principais responsáveis por mais de 52% da variância do sistema. Na comparação dos experimentos pode ser verificado que no primeiro, o fator relacionado aos nutrientes foi o principal, respondendo pela maior parte da variância (25,24%), seguido pelo fator associado à concentração de sais (18,15%), enquanto que no segundo experimento, houve uma inversão; o principal foi o fator associado à concentração de sais (28,39%), seguido pelo fator associado aos nutrientes (15,17%). No terceiro lugar, em ambos os experimentos, ficou o fator associado à temperatura respondendo por uma explicação um pouco superior a 9% da variância total. PALAVRAS-CHAVE: Terras úmidas, Leito cultivado, Componentes principais, Análise de componentes, ACP INTRODUÇÃO O elevado nível de urbanização da população brasileira associado à falta de saneamento básico, especialmente sistemas de esgotamento sanitário, tem contribuído para o surgimento de graves problemas ambientais e de saúde pública. A contaminação do solo e das águas superficiais e subterrâneas pelo lançamento de águas residuárias in natura ou somente parcialmente tratadas tem se constituído em fonte de preocupação das autoridades de saúde e dos órgãos de gerenciamento do meio ambiente. Um grande número de corpos receptores próximos de áreas urbanas tem experimentado processos de degradação severos exigindo a implementação de políticas públicas voltadas à sua melhoria e ações que incluam o desenvolvimento de sistemas de tratamento de águas residuárias que sejam de operação simples, não mecanizados, de baixo custo ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

II-365 – ANÁLISE DE COMPONENTES PRINCIPAIS DE UM SISTEMA DE TERRAS ÚMIDAS CONSTRUÍDAS

Celeide Maria Belmont Sabino Meira (1)

Arquiteta e Engenheira Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Doutora em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande. Professora Titular do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual da Paraíba. Beatriz Susana Ovruski de Ceballos Bioquímica pela Universidade Nacional de Tucumán, Argentina. Mestre em Microbiologia e Imunologia Ambiental pela Escola Paulista de Medicina. Doutora em Microbiologia Ambiental pela Universidade de São Paulo. Professora Adjunta da Universidade Federal de Campina Grande. Rui de Oliveira Engenheiro Civil pela Escola de Engenharia do Maranhão. Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. PhD em Engenharia Civil pela Universidade de Leeds, Inglaterra. Professor Adjunto da Universidade Federal de Campina Grande. Annemarie König Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Carlos. PhD em Botânica pela Universidade de Liverpool, Inglaterra. Professora Adjunta da Universidade Federal de Campina Grande. Mônica de Amorim Coura Graduada em Química pela Universidade Regional do Nordeste, Campina Grande, Paraíba. Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Doutora em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande. Professora Adjunta da Universidade Federal de Campina Grande. Endereço (1): Rua José de Alencar, 1111 - Prata – Campina Grande – PB - CEP: 58108-561 - Brasil - Tel: (83) 341-2385 - e-mail: [email protected] RESUMO

Este trabalho descreve a análise fatorial de componentes principais aplicada aos dados de 16 variáveis físico-químicas e microbiológicas medidas nos efluentes de sistemas de terras úmidas construídas, com substrato de brita, vegetados com Typha sp., tratando águas superficiais poluídas com esgoto doméstico, visando uma descrição mais eficiente da estrutura de correlação dessas variáveis. Os ecossistemas experimentais foram construídos no Campus da Universidade Federal de Campina Grande, PB, tendo sido levados a efeito dois experimentos, o primeiro entre Janeiro e Dezembro de 2000 e o segundo entre Janeiro e Julho de 2001, ambos caracterizados por tempos de detenção hidráulica entre 5 e 10 dias. Nos dois experimentos, foram definidos três componentes artificiais principais responsáveis por mais de 52% da variância do sistema. Na comparação dos experimentos pode ser verificado que no primeiro, o fator relacionado aos nutrientes foi o principal, respondendo pela maior parte da variância (25,24%), seguido pelo fator associado à concentração de sais (18,15%), enquanto que no segundo experimento, houve uma inversão; o principal foi o fator associado à concentração de sais (28,39%), seguido pelo fator associado aos nutrientes (15,17%). No terceiro lugar, em ambos os experimentos, ficou o fator associado à temperatura respondendo por uma explicação um pouco superior a 9% da variância total. PALAVRAS-CHAVE: Terras úmidas, Leito cultivado, Componentes principais, Análise de componentes, ACP INTRODUÇÃO

O elevado nível de urbanização da população brasileira associado à falta de saneamento básico, especialmente sistemas de esgotamento sanitário, tem contribuído para o surgimento de graves problemas ambientais e de saúde pública. A contaminação do solo e das águas superficiais e subterrâneas pelo lançamento de águas residuárias in natura ou somente parcialmente tratadas tem se constituído em fonte de preocupação das autoridades de saúde e dos órgãos de gerenciamento do meio ambiente. Um grande número de corpos receptores próximos de áreas urbanas tem experimentado processos de degradação severos exigindo a implementação de políticas públicas voltadas à sua melhoria e ações que incluam o desenvolvimento de sistemas de tratamento de águas residuárias que sejam de operação simples, não mecanizados, de baixo custo

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental e que possam ser incorporados à paisagem local, utilizando materiais de construção de fácil aquisição e mão de obra não especializada. A tecnologia de terras úmidas construídas é uma alternativa de baixo custo para tratar águas superficiais poluídas. As terras úmidas construídas, como sistemas de tratamento, são projetadas para utilizar e otimizar processos naturais envolvendo vegetação, substrato sólido e microrganismos associados (VYMAZAL et al., 1998). Nesses sistemas, os poluentes são removidos por uma combinação de processos físicos, químicos e biológicos otimizados, incluindo sedimentação, precipitação, adsorção de partículas no solo, assimilação pelo tecido das plantas e transformações microbianas (BRIX, 1993). A seleção do tipo de substrato e da vegetação é o fator fundamental para o bom desempenho de terras úmidas construídas no tratamento de águas superficiais poluídas. Comumente a análise do desempenho de unidades de tratamento de esgotos é feita com base em critérios de eficiência de remoção de espécies físico-químicas e biológicas. Embora útil na avaliação do desempenho operacional da instalação, tal abordagem não contribui para uma descrição eficiente do funcionamento dos reatores. Devido à complexidade dos processos que intervêm no funcionamento de sistemas de terras úmidas construídas, caracterizada pela grande quantidade de fatores influentes no processo, convém adotar ferramentas estatísticas poderosas que levem a uma melhor interpretação dos fenômenos que ocorrem nesses sistemas. A análise estatística fatorial tem como objetivo a explanação de relações entre numerosas variáveis correlacionadas em termos de um pequeno número de fatores artificiais conservando a máxima variância das variáveis originais. A análise de componentes principais (ACP) é uma técnica de extração de fatores artificiais na análise fatorial que deve ser empregada quando o objetivo é descrever diferenças entre indivíduos de uma amostra heterogênea. Na prática estatística a ACP é usada para definir um pequeno número de combinações lineares com grande variância capaz de descrever o comportamento das variáveis originais num espaço multidimensional (SILVA FILHO, 2001). Este trabalho tem como objetivo apresentar uma descrição mais eficiente da estrutura de correlação das variáveis de monitoração de sistemas de terras úmidas construídas tratando águas superficiais poluídas com esgoto doméstico aplicando a análise fatorial de componentes principais aos dados dos efluentes. MATERIAIS E MÉTODOS

O sistema experimental, em escala piloto, instalado na Universidade Federal de Campina Grande (7º 13´ 11” Sul; 35º 52´ 31” Oeste; 550 m acima do nível médio do mar), estado da Paraíba, era formado por unidades experimentais constituídas de tanques cilíndricos de cimento amianto com capacidade para 250 litros (diâmetro de 76,8cm, altura de 54cm e área interna de 0,44m2). Cada unidade foi preenchida até a altura de 40cm com substrato de brita (B) e provida de dispositivos de alimentação, distribuição e saída. Num primeiro experimento (Experimento 1), conduzido de Janeiro a Dezembro de 2000, foram avaliados três tempos de detenção hidráulica (5, 7 e 10 dias) e num segundo (Experimento 2), de Janeiro a Julho de 2001, somente foram pesquisados os tempos de detenção hidráulica de 5 e 10 dias, uma vez que o tempo de detenção de 7 dias apresentou, no experimento anterior, resultados próximos aos encontrados para o tempo de detenção de 5 dias. A Tabela 1 define a terminologia adotada para as unidades do sistema de terras úmidas no experimento 1 sendo que cada código identificador é iniciado pelo número que representa o tempo de detenção hidráulica seguido pela letra representativa do substrato utilizado, pela letra representativa da vegetação e pelo número da replicata da unidade.

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental Tabela 1 – Terminologia adotada para o sistema experimental de terras úmidas construídas, experimento 1.

TERMINOLOGIA TDH (dias) CARACTERÍSTICAS 5B 5 Sem vegetação – controle

5BT1, 5BT2, 5BT3, 5BT4. 5 Vegetado com Typha 7B 7 Sem vegetação – controle

7BT1, 7BT2, 7BT3, 7BT4. 7 Vegetado com Typha 10B 10 Sem vegetação – controle

10BT1, 10BT2, 10BT3, 10BT4. 10 Vegetado com Typha TDH = Tempo de detenção hidráulica.

No Experimento 1 (Figura 1), foram utilizadas 15 (quinze) unidades experimentais distribuídas entre os 3 (três) tempos de detenção hidráulica (TDH): 5 (cinco) tanques com TDH de 5 dias, 5 (cinco) com TDH de 7 dias e 5 (cinco) com TDH de 10 dias. No experimento 2 (Figura 2), o sistema foi constituído por 10 (dez) unidades experimentais, sendo 5 (cinco) com TDH de 5 dias e as demais com 10 dias. Em ambos os experimentos, para cada tempo de detenção hidráulica, 4 (quatro) unidades foram vegetadas com Typha sp. (T) e 1 (uma) foi mantida sem vegetação, como unidade controle.

Figura 1: Esquema do sistema de terras úmidas construídas, experimento 1.

Figura 2: Esquema do sistema de terras úmidas construídas, experimento 2.

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental A alimentação era realizada diariamente em regime de batelada, de forma subsuperficial, a uma profundidade de 20cm do fundo do tanque, utilizando o efluente de uma lagoa natural (ecossistema natural de terras úmidas) poluída com esgotos domésticos, situada no Campus da UFCG. A Figura 3 mostra, em primeiro plano, uma unidade experimental típica do sistema de terras úmidas, vazia, destacando-se os dispositivos de alimentação e de coleta de amostras e, em segundo plano, uma unidade vegetada com propágulos de Typha sp., destacando-se o substrato de brita. As variáveis físico-químicas e microbiológicas analisadas foram temperatura, pH, fósforo total, ortofosfato solúvel, amônia, nitrato, demanda bioquímica de oxigênio, demanda química de oxigênio, condutividade elétrica, alcalinidade total, dureza total, turbidez, sólidos totais, sólidos suspensos totais, coliformes termotolerantes e estreptococos fecais. Os métodos analíticos seguiram as recomendações de APHA et al. (1998). Tabela 2 – Variáveis físicas, químicas e microbiológicas analisadas no sistema de terras úmidas construídas.

VARIÁVEL MÉTODO ANALÍTICO Temperatura da água (ºC) Leitura direta com termômetro de filamento de mercúrio, escala

de 0 a 60ºC. pH Método potenciométrico, com medidor de pH marca

ANALYSER, modelo 300, calibrado com soluções tampões de pH 7 e 9.

Fósforo total (mg P/L) Método espectrofotométrico, técnica do ácido ascórbico e pré-digestão com persulfato de amônio. Leitura em espectrofotômetro COLEMAN a 880nm.

Ortofosfato solúvel (mg P/L) Método espectrofotométrico usando amostras pré – filtradas (0,45μm) e leitura em espectrofotômetro COLEMAN a 880nm

Amônia (mg N/L) Método semi-micro Kjeldahl, titulação com ácido sulfúrico 0,02N Nitrato (mg N/L) Método de salicilato de sódio com leitura a 420nm em

espectrofotômetro COLEMAN. Demanda bioquímica de oxigênio (mg/L)

Método dos frascos padrões, com incubação a 20ºC por 5 dias.

Demanda química de oxigênio (mg/L) Método da refluxação fechada de dicromato de potássio Condutividade elétrica (μS/cm) Método eletrométrico, com condutivímetro da marca

ANALYSER, modelo 600 série 1751/95. Alcalinidade total (mgCaCO3/L) Método da titulação potenciométrica com solução de ácido

sulfúrico à 0,02N. Dureza total (mgCaCO3/L) Método titulométrico de complexação com solução de EDTA

0,02N. Turbidez (UNT) Método nefelométrico, com turbidímetro HACH modelo 2100A. Sólidos totais (mg/L) Método gravimétrico com secagem a 103-105ºC. Sólidos suspensos totais (mg/L) Método gravimétrico com filtros de fibra de vidro tipo Whatman

GF/C e secagem a 103-105ºC. Coliformes termotolerantes (UFC/100mL)

Técnica da membrana filtrante, com meio de cultura m-FC e incubação a 44, 5ºC (24h).

Estreptococos fecais (UFC/100mL) Técnica da membrana filtrante, com meio de cultura (UFC/100mL) KF-Streptococus Agar (OXOID) e incubação a 37ºC (48h).

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Figura 3: Unidade experimental de terras úmidas construídas, experimento 1. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os dados brutos das 16 variáveis monitoradas foram submetidos ao teste não paramétrico de Kolmogorov-Smirnov (SOKAL & ROHLF, 1995) para testar a normalidade. As variáveis temperatura, pH e ortofosfato solúvel apresentaram distribuição normal e às outras variáveis foram aplicadas transformações logarítmicas decimais para induzir à normalidade, pressuposto básico da ACP, ou seja, foi aplicada a transformação do tipo log Y para as variáveis DQO, condutividade elétrica, alcalinidade total, dureza, sólidos totais, sólidos suspensos totais, coliformes termotolerantes e estreptococos fecais, a transformação do tipo log (Y+1) para fósforo total, amônia, nitrato, DBO e a transformação do tipo log (100Y) para turbidez. Em seguida, os dados foram submetidos à análise de componentes principais tendo as 16 variáveis monitoradas sido reduzidas a um conjunto de somente três fatores ou componentes artificiais principais com autovalores maiores que 1, os quais, em ambos os experimentos, explicaram mais de 52% da variância do sistema o que, comumente, é considerado bastante satisfatório. A Tabela 3 mostra os autovalores e os percentuais da variância explicados pelos respectivos fatores artificiais principais extraídos. Tabela 3: Autovalores e percentuais da variância das variáveis explicadas por cada fator artificial extraído na análise (autovalor maior que a unidade) do sistema de terras úmidas construídas.

Fator Autovalor % Variância total

Autovalor acumulado

Percentual acumulado

Experimento 1 1 4,038512 25,24070 4,038512 25,24070 2 2,904843 18,15527 6,943356 43,39597 3 1,459645 9,12278 8,403001 52,51876

Experimento 2 1 4,543139 28,39462 4,543139 28,39462 2 2,428050 15,17531 6,971190 43,56994 3 1,493072 9,33170 8,464262 52,90163

A Tabela 4 fornece os fatores de carga ou coeficientes de correlação entre as variáveis e os fatores artificiais extraídos para os dois experimentos após a análise dos autovalores. Com os fatores de carga, é possível interpretar os fatores artificiais, pois as variáveis de maior influência na sua definição apresentam os mais altos coeficientes de correlação com esses fatores. Na interpretação das componentes principais, as variáveis são consideradas bem relacionadas com a componente quando os fatores de carga são maiores que 0,70 (valor adotado pelo programa Statistica), assinalados em negrito, na Tabela referida.

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental Tabela 4: Fatores de carga ou coeficientes de correlação entre as variáveis e os fatores artificiais resultantes da análise de componentes principais nos experimentos 1 e 2.

Variável Experimento 1 Experimento 2 Fator 1 Fator 2 Fator 3 Fator 1 Fator 2 Fator 3 Temperatura 0,1894 0,1857 0,7415 -0,0511 0,2587 0,6775 Potencial hidrogeniônico 0,0412 0,2489 0,2039 0,0437 -0,0107 0,5329 Fósforo total 0,5309 0,1969 0,1571 0,0012 0,5670 0,2112 Ortofosfato solúvel 0,8195 -0,0974 0,2080 -0,0551 0,8183 0,0924 Amônia 0,7567 -0,0807 -0,0068 -0,0079 0,7201 -0,0843 Nitrato -0,1012 -0,2106 -0,5341 -0,0787 -0,1568 -0,5586 DBO 0,5750 -0,0453 -0,0378 -0,0583 0,4753 0,0363 DQO 0,3118 0,1024 -0,4661 0,0035 0,0849 -0,5043 Condutividade elétrica -0,0235 0,8706 -0,0469 0,8803 -0,1376 0,1187 Alcalinidade total -0,2416 0,8861 0,0533 0,8914 -0,2137 -0,0276 Dureza -0,0419 0,9135 -0,0899 0,9071 -0,1252 0,0468 Turbidez 0,5229 -0,1847 0,4902 -0,0869 0,6673 -0,0169 Sólidos totais -0,0799 0,6960 0,2488 0,6938 -0,0726 0,1635 Sólidos suspensos totais 0,2708 0,3825 -0,2524 0,6483 0,1902 -0,3605 Coliformes termotolerantes 0,4594 -0,3032 0,6445 -0,4382 0,6332 0,1999 Estreptococos fecais 0,4670 -0,3480 0,3681 -0,4850 0,5699 -0,0687 Autovalor Percentagem explicada

2,8452 0,1778

3,4640 0,2165

2,0937 0,1308

3,7466 0,2341

3,1275 0,1954

1,5900 0,0993

No experimento 1, o fator 1 respondendo pela maior parte da variância apresentou uma alta correlação positiva com as variáveis ortofosfato solúvel e amônia, que são variáveis descritivas das concentrações de nutrientes. Essa alta correlação define o caráter desse primeiro fator, como associado aos “nutrientes”. O segundo fator foi mais fortemente correlacionado às variáveis condutividade elétrica, alcalinidade total e dureza, que são descritivas do “teor de sais” na massa líquida. Dessa maneira, o fator 2 pode ser denominado de componente associada à concentração de sais. O terceiro fator apresentou boa correlação com a variável ”temperatura”. A Figura 4 ilustra a dispersão das 16 variáveis estudadas, em sistemas de eixos constituídos pelo fator 1 com o fator 2 e o fator 1 com o fator 3, para o sistema de terras úmidas construídas, experimento 1.

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-1,0 -0,8 -0,6 -0,4 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0

F ato r 1

NIT

ALC

EFCF

DUR

CEST

PH T

SST

ORTOTUR

AMDBO

PT

DQO

(a)

-1,0

-0,8

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0,2

0,4

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-1,0 -0,8 -0,6 -0,4 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0

F ato r 1

ALC

NITDQO

ST ORTO

AMDBO

SST

CE

PH

T CF

TUREF

PT

(b)

DUR

Figura 4: Diagramas de dispersão das variáveis do sistema de terras úmidas construídas, experimento 2. (a) nutrientes x concentração de sais (b) nutrientes x temperatura.

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental No experimento 2, o fator mais importante (Tabela 4) foi associado à concentração de sais pela sua alta correlação com condutividade elétrica, alcalinidade total e dureza, enquanto que o segundo fator foi associado aos nutrientes, pela sua alta correlação com ortofosfato solúvel e amônia. O terceiro fator, que explicou 9,33% da variação (Tabela 3), não teve nenhum coeficiente de correlação superior ou igual a 0,7. O coeficiente (0,6775) mais significativo foi o da temperatura, que pode, no entanto, ser considerado uma boa aproximação do valor 0,7. A Figura 5 apresenta os diagramas de dispersão para o sistema de terras úmidas construídas, experimento 2.

-1,0

-0,8

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-0,2

0,0

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-1,0 -0,8 -0,6 -0,4 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0

F ato r 1

EF

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ST

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DQO

DURCE

(a)

-1,0

-0,8

-0,6

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0,6

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1,0

-1,0 -0,8 -0,6 -0,4 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0

F ato r 1

CECF

EF

NIT DQO

SST

ST

T

PH

PT

ALCDUR

AMTURDBO

ORTO

(b)

Figura 5: Diagramas de dispersão das variáveis do sistema de terras úmidas construídas, experimento 1. (a) concentração de sais x nutrientes (b) concentração de sais x temperatura.

Na comparação dos dois experimentos pode ser verificado que no primeiro, o fator relacionado aos nutrientes foi o principal, respondendo pela maior parte da variância (25,24%), seguido pelo fator associado à concentração de sais (18,15%), enquanto que no segundo experimento, houve uma inversão; o principal foi o fator associado à concentração de sais (28,39%), seguido pelo fator associado aos nutrientes (15,17%). No terceiro lugar, em ambos os experimentos, ficou o fator associado à temperatura respondendo por uma explicação da variação do sistema um pouco superior a 9%. Portanto, apesar de, em ambos os experimentos, as 16 variáveis de monitoração terem sido descritas com a utilização dos mesmos três fatores ou componentes artificiais houve uma inversão de importância entre os dois primeiros deles o que pode ter sido influenciado por fatores associados ao período experimental. Embora em ambos os experimentos unidades experimentais idênticas, preenchidas com o mesmo tipo de substrato e vegetadas com Typha sp. tenham sido operadas na mesma faixa de tempo de detenção hidráulica, o primeiro experimento foi levado a efeito ao longo do ciclo hidrológico completo (Jan-Dez 2000), enquanto que o segundo foi realizado entre Janeiro e Julho de 2001. Tais diferenças no período do ciclo hidrológico respondem por diferenças na qualidade da água afluente do sistema de terras úmidas construídas. Os resultados do primeiro experimento, certamente, exprimem melhor uma condição de operação média do ciclo hidrológico, na qual as médias das concentrações de nutrientes tendem a ser mais elevadas, enquanto que os resultados do segundo exprimem condições operacionais mais típicas do período chuvoso do ciclo no qual os poluentes, particularmente as espécies nutrientes, das águas superficiais afluentes das terras úmidas construídas tendem a se apresentar mais diluídos. Um outro aspecto relevante deste trabalho é que análise de componentes principais demonstrou que a concentração de sais é um fator de grande importância no estudo de sistemas de terras úmidas construídas, importância esta que, na literatura, só tem sido dada aos nutrientes.

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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental CONCLUSÃO

A análise fatorial de componentes principais foi eficaz na descrição da estrutura de correlação das variáveis físico-químicas e microbiológicas de monitoração de sistemas de terras úmidas construídas e sugeriu eixos ou pontos de vista principais através dos quais tais sistemas podem ser analisados. Nos dois experimentos os três fatores principais, concentração de sais, nutrientes e temperatura, responsáveis por mais de 52% da variância total do sistema, foram capazes de descrever o comportamento de 16 variáveis de monitoração sem perder as informações contidas nos dados brutos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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