Análise de conjuntura DIEESE - 05-11
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Diante das incertezas globais, Brasil deve dobrar aposta na distribuição de renda
A grande diferença da América Latina é o emprego. Na Europa, mas também nos EUA, o ciclo de recuperação não
está criando os empregos necessários. Isso atinge diretamente os pilares do Estado de bem-estar social e é difícil de
resolver, como mostrou a crise dos anos 30. E esse desemprego está muito concentrado nas faixas mais jovens, de
20 a 40 anos, o que gera tensões sociais complicadas (economista uruguaio Enrique Iglesias).
Incertezas globais e política recessiva na Europa
A crise financeira segue forte no mundo, especialmente na Europa, onde o desempenho das
economias, que já vem mostrando grande disparidade nos últimos meses, tende a se tornar cada
vez mais assimétrico. Portugal foi socorrido com um pacote financeiro que pode chegar até 78
bilhões de euros, acordo firmado em meados de maio, no interior do chamado Eurogrupo (17
países) mais a União Europeia. A assistência financeira a Portugal foi assumida em partes iguais
de 26 bilhões de euros pelo Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF), Mecanismo
Europeu de Estabilização Financeira (MEEF) e Fundo Monetário Internacional (FMI),
totalizando os referidos 78 bilhões. Em troca, Portugal terá que tomar medidas duríssimas de
contenção de gastos, que, possivelmente, conduzirão o país a um profundo processo recessivo
nos próximos anos.
O acordo prevê, por exemplo, congelamento dos salários do setor público e das
aposentadorias até 2013, bem como um imposto especial sobre aposentadorias acima de € 1,5
mil por mês. A previsão de economistas europeus é que o desemprego no país alcance percentual
acima de 12% nos próximos meses, próximo de um nível recorde. O acordo prevê ainda redução
de 30 para 10 dias na remuneração paga, para cada ano trabalhado, aos trabalhadores que forem
demitidos e a redução do número de meses do pagamento do seguro desemprego, que cai de três
anos para 18 meses.
Apesar da realização do acordo com Portugal, a instabilidade continua predominando na
Europa e o risco da crise no continente contaminar outras regiões do mundo ainda é bastante
forte. Uma das razões da instabilidade é a persistência da crise grega, apesar do acordo feito há
alguns meses entre o país e as instituições multilaterais. Calcula-se que a Grécia vá precisar de
quase 30 bilhões de euros a mais em financiamento para 2012. Porém, a ampliação do pacote
grego está condicionada ao alcance de suas metas de redução da dívida pública. Recentemente,
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se divulgou que também Itália e Bélgica têm grandes necessidades de financiamento em relação
ao Produto Interno Bruto (PIB). Os analistas têm falado até em "default" na zona do euro. Por
outro lado, nos países mais atingidos pela crise (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha), a sociedade
tem reagido fortemente às medidas e têm sido crescentes os protestos populares, alguns bastante
violentos. Na Espanha, milhares de manifestantes acamparam em Madri em protesto contra as
medidas anticrise econômica, um movimento que vem sendo chamado por alguns de a
"revolução dos indignados", num contexto em que a taxa de desemprego alcançou 21,3% (mais
de 4,9 milhões de desempregados). Manifestações semelhantes a de Madri vêm ocorrendo em
Barcelona, Granada, Valência, Sevilha e Zaragoza e outras cidades.
A recessão no Japão continua. O PIB caiu 0,9% no primeiro trimestre se comparado ao
trimestre anterior. Essa queda foi de 3,7% se a comparação for com o mesmo período do ano
passado. Além dos efeitos dos problemas naturais e da crise nuclear, o país tem sofrido com o
aumento dos preços internacionais de commodities. O Banco de Desenvolvimento da Ásia
publicou um relatório mostrando que o aumento da inflação de alimentos no continente pode
ocasionar um aumento significativo na pobreza. Além dos efeitos negativos sobre a expansão do
consumo, o estudo mostra que a inflação atinge muito mais as famílias pobres asiáticas, uma vez
que elas gastam até 60% da renda em comida. Os países em desenvolvimento da Ásia possuem
quase 70% da população pobre mundial - cerca de 600 milhões de pessoas -, que vive com US$
1,25 ou menos por dia.
A China tem utilizado diversos instrumentos para controlar a inflação, como o aumento da
taxa de juros, expansão dos depósitos compulsórios e restrição ao crédito. No mês de maio,
como forma de tentar reduzir a oferta de crédito, a Comissão de Regulamentação Bancária da
China fixou metas e “gatilhos” diferenciados para os níveis de capitalização dos cinco bancos, e
a meta de todos os índices de capitalização dos bancos não deve ser menor que o mínimo de
11,5%.
A mudança na estrutura de custos da China está afetando o aumento dos preços tanto de bens
industrializados como das commodities. Nos últimos anos, a manutenção dos preços das
manufaturas em patamares relativamente baixos teve relação com os custos menores de
produção dos países asiáticos, notadamente a China. Todavia, o recente aumento dos salários –
que devem chegar a 80% em alguns setores nos próximos cinco anos – tem impulsionado o
aumento da inflação desses produtos. Ademais, os trabalhadores chineses estão começando a
consumir mais, com seus salários maiores. Isso contribui para a alta de commodities como
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algodão e petróleo, que já estavam subindo, em parte, por causa da desvalorização do dólar. A
decisão chinesa de permitir uma lenta valorização do yuan – algo buscado perseverantemente por
seus parceiros comerciais nos países ricos – alimenta ainda mais esse movimento.
Nos EUA, Obama vem conseguindo elevar seus índices de popularidade, decorrência da
operação militar que matou Osama Bin Laden, no dia no dia 1º de maio, após tropas
estadunidenses invadirem sem autorização a casa em que se escondia na cidade de Abbottadab
no Paquistão. A caçada, que durou quase dez anos, envolveu duas guerras e implicou em um
gasto de US$ 1,2 trilhão para o Govrno dos EUA. A morte de Bin Laden, muito bem capitalizada
pela equipe de marketing da Casa Branca, melhora a performance do presidente estadunidense
nas pesquisas para as eleições do ano que vem, desviando um pouco, pelo menos neste
momento, as atenções sobre o fraco desempenho da economia do país e a impotência de Obama
diante do poder econômico de Wall Street, que se mantém mesmo depois das fraudes colossais
que levaram à crise das hipotecas.
Mas talvez Obama necessite mais do que fatos sensacionais, para desviar a atenção dos
eleitores, das mazelas da economia. Cresce o medo nos EUA de o governo ter que adotar a
moratória da dívida pública, já que no mês de maio foi atingido o teto de endividamento
permitido, de US$ 14,3 trilhões. Para ganhar margem de manobra em função do atingimento do
teto legal da dívida, o governo foi forçado a tomar uma série de medidas emergenciais, e vem
procurando negociar com o congresso a elevação do teto da dívida. Mas o congresso está
condicionando a aprovação a apresentação de planos concretos para reduzir o déficit fiscal, que
deve chegar neste ano ao recorde de US$ 1,5 trilhão. O risco de ter que declarar moratória é real,
assim como as conseqüências para a economia mundial, com elevação dos custos de
endividamento, redução dos investimentos e aumento do desemprego. Se até o inicio de agosto o
governo não conseguir aprovar a expansão do limite de endividamento, o risco de o tesouro dos
EUA ter que escolher quais compromissos pagar é muito concreto.
Outro problema recente na economia estadunidense são os efeitos colaterais da política
monetária do Fed, de juros próximos de zero e grande expansão monetária via compra maciça de
títulos do governo americano. Em função da importância da economia dos EUA no contexto
internacional, esse tipo de política atingiu todo o mundo, valorizando taxas de câmbio, causando
pressões inflacionárias e formando bolhas especulativas. Ocorre que essa política está se
voltando contra o próprio EUA, desvalorizando a moeda e provocando a elevação do preço das
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commodities, com efeitos dramáticos na sociedade estadunidense. A elevação do petróleo, por
exemplo, atingiu diretamente a renda dos consumidores, dificultando o processo de retomada do
crescimento, que irá depender muito da capacidade de consumo da sociedade.
Impactos da crise em Nossa América: desindustrialização e reprimarização exportadora?
Os indicadores econômicos dos países da América Latina vêm mostrando tendências mais
promissoras, no período recente. O México divulgou seu sétimo trimestre consecutivo de
crescimento econômico, com alta de 4,6% no PIB dos três primeiros meses deste ano em
comparação com o início de 2010. A Venezuela teve alta de 4,5% no PIB do primeiro semestre
comparado com o ano anterior. O Peru, por sua vez, teve alta de 7,9% no PIB em março
comparado com um ano antes. O Congresso Brasileiro vem dando apoio a idéia de triplicar os
preços da energia pagos ao Paraguai, o que deve favorecer o deslanche de políticas sociais mais
ativas naquele país. Por outro lado, a elevação dos preços de petróleo e gás repercute em
melhorias nos indicadores em países mais dependentes desses produtos na região, como México,
Venezuela, Trinidad e Tobago, Equador e Bolívia, por exemplo.
Segundo a Comissão Econômica da ONU para América Latina e Caribe (Cepal), a América
Latina bateu recorde de entrada de investimentos estrangeiros em 2010, fator de valorização das
moedas nacionais e perda de competitividade dos produtos industriais da região. O investimento
externo direto nos países da região expandiu 40%, chegando a US$ 112,6 bilhões. A China, que
praticamente não vinha investindo na região até 2009, respondeu por 9% do total de
investimentos diretos no ano passado. Outro destaque importante foi a expansão de
investimentos entre os próprios países latino-americanos. Em document divulgado recentemente,
a Cepal apontou um problema muito preocupante, que é a “especialização produtiva” dos países
latino-americanos, a partir do padrão de investimentos realizado na região. Para a secretária-
geral da Cepal, a econonomista Alícia Bárcena, os dados revelam o risco de "reprimarização" nas
economias da região, principalmente nos países da América do Sul, cujos produtos básicos têm
se beneficiado mais da alta de preços internacionais.
A preocupação da secretária geral da Cepal pode ser ilustrada pelos dados mais recentes da
balança comercial brasileira, por exemplo. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento
(MDIC), no primeiro quadrimestre de 2010 a China comprou 29,14% do total de produtos
básicos exportados pelo Brasil. Enquanto a participação da China aumentou em quase três
pontos percentuais em relação ao primeiro quadrimestre do ano passado, a fatia dos EUA na
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exportação brasileira de produtos básicos recuou de 8,07% no primeiro quadrimestre do ano
passado para 6,24% para o mesmo período deste ano. A participação das exportações para a zona
do euro apresentou pequeno recuo de 23,8% para 23%.
Brasil: impactos da valorização do câmbio na indústria e conjuntura do emprego
Conforme temos destacado neste espaço de debates, o problema não é exportar produtos
básicos, mas sim a crescente dependência da nossa balança comercial desse tipo de produto.
Alguns analistas estão projetando o déficit comercial do setor de manufaturados para este ano no
Brasil em US$ 100 bilhões1. Como se sabe, além da reprimarização da pauta de exportação, está
havendo também uma crescente substituição da produção doméstica por importados, colocando
em risco a produção industrial nacional.
A indústria reduziu sua produção em 2,1% em abril com relação a março, após acumular
crescimento de 3,3% nos últimos três meses (janeiro a março). Dos 27 ramos da indústria, 13
apresentaram queda na produção em abril. Os segmentos que apresentaram maiores quedas
foram o de maquinas e equipamentos (-5,4%), após quatro meses de crescimento; veículos
automotores (-2,8%), refino de petróleo e produção de álcool (-1,4%), produtos de metal (-
9,3%) e máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-7,6%).
Entre as atividades que aumentaram a produção em abril de 2011 encontram-se: produtos
farmacêuticos (3,3%), equipamentos médico-hospitalares, ópticos e outros (6,6%), indústrias
extrativas (2,5%), outros produtos químicos (1,1%), fumo (20,6%), metalurgia básica (1,4%). A
produção industrial recuou 1,3% na comparação com abril de 2010, confirmando a queda que já
havia ocorrida na comparação entre março de 2011 e março de 2010, quando foi interrompida
uma série de 16 resultados positivos neste tipo de comparação. O índice de abril (na comparação
com abril de 2010) foi pressionado negativamente pelo recuo das quatro categorias de uso; queda
em 16 dos 27 ramos pesquisados; diminuição em 44 dos 76 subsetores industriais e em redução
de 52% dos 755 produtos pesquisados.
Quanto às categorias de uso, na comparação com o mês anterior (março), e já considerados os
efeitos sazonais, o setor produtor de bens de consumo duráveis apresentou recuo de (-10,1%),
tendo a queda mais acentuada do mês, eliminando o crescimento de 4,5% registrada em março.
O setor de bens de capital, depois de avançar 7,7% nos últimos três meses, apresentou redução
1 Ver o artigo “Um acordo pela indústria brasileira”, divulgado em 26.05.2011.
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na produção de (-2,9%), acima da média da indústria, cujo recuou foi de (-2,1%). Os bens de
consumo semiduráveis e não duráveis recuaram em (-1,5%). O setor de bens intermediários teve
decréscimo na produção de (-0,6)%. No acumulado dos 4 primeiros meses do ano, todas as
categorias de uso apresentaram variações positivas: bens de capital (6,2%), bens intermediários
(1,1%), bens de consumo duráveis (2,3%) e bens de consumo não-duráveis e semiduráveis
(0,1%).Houve, como se pode constatar, um recuo generalizado na produção industrial, o que se
refletiu, também, na queda da utilização da capacidade instalada. Por enquanto não houve
impacto no nível de emprego. De qualquer forma, e isso ainda precisa ser confirmado com as
informações dos próximos meses, as medidas “macroprudenciais” adotadas pelo governo para
reduzir a inflação a partir da desaceleração da economia já tem resposta no setor industrial.
O comércio varejista, por seu turno, segue crescendo. Em março registrou alta de 1,2% no
volume de vendas e 1,4% na receita nominal frente ao mês anterior. Ao analisar os índices de
março de 2011 com o mesmo mês do ano anterior, o incremento no volume de vendas foi de
4,1% e na receita nominal de 8,5%. No acumulado do ano, de janeiro a março de 2011, as vendas
cresceram 6,9% em volume e 11,6% em receita nominal. Nos 12 meses, o acréscimo no volume
de vendas acumula alta de 9,5% no volume e 13,5% na receita nominal. Quando comparados os
índices de volume de vendas de março de 2011 com o mesmo mês do ano anterior, com exceção
do segmento de veículos, motos, partes e peças (-12,8%), todos os demais registram resultado
positivo. Os setores com maior incremento nas vendas foram: equipamentos e materiais para
escritório, informática e comunicação (18,2%) e móveis e eletrodomésticos (11,1%).
A taxa de desemprego total, conjunturalmente, permaneceu relativamente estável, ao passar
de 11,2% da PEA em março para 11,1% em abril. Já a tendência nos últimos 12 meses é de
expressiva redução da taxa de desemprego, uma vez que abril de 2010 ela situava-se em 13,3%.
O rendimento médio real dos ocupados apresentou, também conjunturalmente, retração de 1,2%
em março de 2011 – encerrando o período em R$ 1.371. Já nos últimos 12 meses a tendência é
positiva: entre março de 2010 e de 2011 o rendimento médio real dos ocupados cresceu 4,7%.
Nos últimos 12 meses, findos em março de 2011, verifica-se que a massa de rendimentos dos
ocupados se expandiu em 7,3%, resultado do crescimento do nível de ocupação e do rendimento
médio. Tendência também de queda mostrou o nível de desocupação pesquisado em seis regiões
metropolitanas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que ficou em 6,4% em
abril, a menor taxa para o mês desde que a pesquisa teve a sua metodologia revista em 2002.
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Produção industrial e comércio em alta, com crescimento da massa salarial, têm levado a um
desempenho excepcional da arrecadação federal. A arrecadação de impostos federais atingiu R$
85,15 bilhões em abril , crescimento de 10,34% na comparação com o mesmo período do ano
passado e 19,95% superior a março deste ano. No acumulado do ano, o montante arrecadado
chegou a R$ 315,06 bilhões, apontando crescimento de 11,51% em relação aos quatro primeiros
meses do ano passado. O aumento da arrecadação vem se refletindo na melhoria das contas
públicas. O superávit primário do setor público consolidado alcançou R$13,6 bilhões em março,
o melhor resultado para o mês desde o início da série, em 2001. No ano, o superávit primário do
setor público consolidado atingiu R$39,3 bilhões (4,20% do PIB) e em doze meses, esse
superávit alcançou R$121,9 bilhões (3,23% do PIB). No acumulado em doze meses o déficit
nominal atingiu (2,31% do PIB). A dívida líquida do setor público chegou a R$ 1,518 trilhão em
abril deste ano, segundo o Banco Central, correspondente a 39,8% do PIB. Na comparação com
março deste ano, houve uma redução de 0,1 ponto percentual, decorrente, segundo o BC, do
crescimento da economia e do superávit primário. A previsão do BC é que em maio a dívida caia
para 39,3% do PIB.
Inflação desacelera e desindexação ganha espaço no debate
A inflação continua no radar das preocupações conjunturais, apesar da desaceleração (ou
estabilização) em abril2 e da previsão de desaceleração em maio. Interessado em uma solução
mais estrutural para o problema, o governo designou um grupo de economistas do Banco Central
e dos ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento, para pensar na formulação de propostas
para a desindexação da economia. O projeto do grupo é abrangente, pegando investimentos
financeiros indexados ao DI3, rentabilidade da caderneta de poupança, preços administrados, e
outras formas de indexação existentes na economia.
A verdade é que desindexação mesmo, só foi feita dos salários, através da Medida Provisória
(MP) nº 1.053, de julho de 1995, uma espécie de complementação do Plano Real, lançado um
2 O ICV-DIEESE, por exemplo, foi de 0,80% em abril, diferença de 0,11 ponto percentual em relação a março
(0,91%) e em maio caiu para 0,04%. A estimativa do BC do INPC-IBGE. 3 Taxa média diária das operações no mercado interfinanceiro. Diariamente, para fechar as suas operações, os
bancos muitas vezes necessitam de dinheiro para fechar a sua contabilidade ou outra operação que exija valores
monetários muito elevados. Para resolver o problema os bancos pegam dinheiro emprestado de outras instituições,
em prazo muito curto, normalmente de um dia, tendo como referência a taxa do Certificado de Depósito
Interfinanceiro ou Depósito Interbancário.
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ano antes. A referida MP proibiu o uso da correção monetária e de índices de reajustes de preços
nos contratos de até um ano e determinou a livre negociação dos salários. Mas o processo de
indexação no Brasil é muito mais amplo, como vêm constatando os técnicos do governo que
estão analisando o problema. Existe a chamada indústria de DI, que pega todas as operações de
crédito, a dívida pública mobiliária é indexada em 34% à taxa Selic e boa parte dos contratos de
preços administrados são indexados a índices gerais de preços. O mesmo ocorre com os aluguéis,
contratos ligados ao setor educacional, tarifas de energia elétrica4, tarifas de telefonia e assim por
diante. Uma das alternativas que se tem falado para a indexação de preços de bens e serviço é a
adoção da meta de inflação, a exemplo do que foi feito com a Tabela do Imposto de Renda, que
está com correção garantida de 4,5% até 2014, política baseada no centro da meta de inflação.
Tudo indica que a luta pela desindexação da economia será longa e irá requerer muitas ações
integradas. Ademais, a desindexação não ocorrerá pura e simplesmente através da elaboração e
votação de uma lei, e sim muito mais por uma mudança cultural dos chamados agentes
econômicos. É certo também que a indexação hoje é um mecanismo de defesa contra uma
inflação que ainda é muito elevada. Uma taxa de inflação no centro da meta (4,5%), ou ainda
mais baixa do que isso, mantida de forma sustentada, certamente poderia facilitar bem mais a
transição para uma economia desindexada. De qualquer forma, é importante levar em conta que,
a própria indexação atual atrapalha a redução da inflação a patamares inferiores.
Política de combate à miséria
Destaque na conjuntura para o “Plano Brasil Sem Miséria”, que o governo federal deverá
divulgar oficialmente no dia 02 de junho. O Plano aponta para um público de 16,2 milhões de
pessoas estimado a partir da linha de extrema pobreza (renda familiar per capita de até R$
70,00). Em decorrência desse diagnóstico, o foco será dado às pessoas que residem nas regiões
Nordeste (59% do total) e Norte, em domicílios rurais (48,4%), negras (70,8%), analfabetas
(25,8%) e jovens (39,9% tem até 19 anos). As dificuldades dessa população, segundo o governo,
advém dos seguintes fatores:
1) vivem em territórios de baixo dinamismo econômico;
4 Os contratos de energia têm seus custos gerenciáveis (depreciação e manutenção, entreoutros) reajustados pelo
IGP-M menos um fator determinado que leva em conta ganhos de produtividade. Os custos não gerenciáveis
(encargos e custo da energia) são corrigidos pela variação do IPCA.
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2) tem reduzido grau de escolaridade e qualificação; e
3) tem acesso precário a recursos, oportunidades de emprego e atividades produtivas e serviços
públicos básicos.
A premissa é que há um déficit de direitos e que não se combate a miséria com apenas uma
medida. O objetivo geral a ser atingido até 2014 é "Promover a inclusão social e produtiva da
população extremamente pobre, tornando residual o percentual dos que vivem abaixo da linha da
extrema pobreza" e os objetivos específicos são:
elevar a renda familiar per capita
ampliar o acesso aos serviços públicos, ações de cidadania e bem estar social
ampliar o acesso às oportunidades de ocupação e renda através de ações de inclusão
produtiva nos meios urbano e rural.
Esta é uma medida fundamental pelo seu caráter humanista, de atendimento a milhões de
brasileiros que passam fome. Mas é também uma medida essencial de política de
desenvolvimento, especialmente importante neste momento em que, em face de uma conjuntura
mundial extremamente adversa e incerta, mais do que nunca a aposta do Brasil deve ser na
ampliação do mercado interno.
Bom seria se houvesse mais ousadia por parte do governo para atrelar às políticas
focalizadas e conjunturais ações que alterassem a estrutura geradora de desigualdadae no Brasil.
Vale lembrar que o Fome Zero, extinto programa de combate à miséria lançado no início do
governo Lula, para ampliar e unificar os anterirores programas de trasferência de renda do
governo FHC (bolsa-escola, vale gás, etc), previa Reforma Agrária massiva e ações de inserção
nos direitos do trabalho para os miseráveis que passariam a receber a bolsa-família. Infelizmente,
as ações estruturantes foram postas de lado e, de certa forma, a persistência das desigualdades
estruturais da economia brasileira, recolocam, 8 anos depois, a necessidade de mais um
programa focalizado de transferência de renda.
GT Conjuntura, 01/06/2011.