ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DE MISTURAS DE SOLOS … · Quadro 1: Exigências físicas e químicas...

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Departamento de Engenharia Civil ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DE MISTURAS DE SOLOS COM CINZA VOLANTE DE CARVÃO MINERAL E CAL Aluno: Julia Figueiredo Genovesi Orientadora: Michéle Dal Toé Casagrande Co-Orientadora: Amanda Maria Chrispim Meliande 1 - Introdução Na engenharia geotécnica o solo nem sempre atende a todas as necessidades que demandam uma obra. Uma das alternativas, e boa solução também para a preservação de recursos naturais, é a aplicação de resíduos em obras geotécnica. Diante da crescente busca de soluções visando a preservação dos recursos naturais, o aproveitamento e a aplicação de resíduos em obras geotécnicas está se destacando, evitando então a sua disposição inadequada e reduzindo a geração de impactos ambientais. Atualmente, o emprego de resíduos em processos de estabilização dos solos tem sido foco de diferentes pesquisas que visam substituir parte do uso de materiais com alto custo por de menores custos, que consistem nos resíduos, como é o caso da utilização da cinza volante. A cinza volante, resíduo pesquisado em misturas com solo e cal, é um resíduo proveniente da queima do carvão mineral em usinas termelétricas. Pela sua abundância e propriedades pozilânicas, esta vem sendo muito utilizada em vários países. No Brasil seu principal aproveitamento tem sido proveniente da fabricação de cimento pozolânico. Já a cal, material muito utilizado na antiguidade, é um econômico estabilizante e o mais utilizado. É importante pontuar que, para a concepção de novos materiais é necessário estudar as propriedades físicas, químicas e mecânicas dos materiais de constituição, bem como suas combinações. O conhecimento do mecanismo de estabilização é vital para a compreensão da resposta da mistura. 2 - Objetivo Esta pesquisa tem como objetivo analisar os efeitos da cinza volante quando misturada com solo argiloso. As misturas foram realizadas em ensaios laboratoriais com a cinza proveniente da usina de carvão Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, localizada no município Capivari de Baixo, no estado do Rio Grande do Sul. Esse estudo analisa a grande

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Departamento de Engenharia Civil

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DE MISTURAS DE SOLOS COM

CINZA VOLANTE DE CARVÃO MINERAL E CAL

Aluno: Julia Figueiredo Genovesi

Orientadora: Michéle Dal Toé Casagrande

Co-Orientadora: Amanda Maria Chrispim Meliande

1 - Introdução

Na engenharia geotécnica o solo nem sempre atende a todas as necessidades que

demandam uma obra. Uma das alternativas, e boa solução também para a preservação de

recursos naturais, é a aplicação de resíduos em obras geotécnica.

Diante da crescente busca de soluções visando a preservação dos recursos naturais, o

aproveitamento e a aplicação de resíduos em obras geotécnicas está se destacando, evitando

então a sua disposição inadequada e reduzindo a geração de impactos ambientais.

Atualmente, o emprego de resíduos em processos de estabilização dos solos tem sido

foco de diferentes pesquisas que visam substituir parte do uso de materiais com alto custo por

de menores custos, que consistem nos resíduos, como é o caso da utilização da cinza volante.

A cinza volante, resíduo pesquisado em misturas com solo e cal, é um resíduo

proveniente da queima do carvão mineral em usinas termelétricas. Pela sua abundância e

propriedades pozilânicas, esta vem sendo muito utilizada em vários países. No Brasil seu

principal aproveitamento tem sido proveniente da fabricação de cimento pozolânico. Já a cal,

material muito utilizado na antiguidade, é um econômico estabilizante e o mais utilizado.

É importante pontuar que, para a concepção de novos materiais é necessário estudar as

propriedades físicas, químicas e mecânicas dos materiais de constituição, bem como suas

combinações. O conhecimento do mecanismo de estabilização é vital para a compreensão da

resposta da mistura.

2 - Objetivo

Esta pesquisa tem como objetivo analisar os efeitos da cinza volante quando misturada

com solo argiloso. As misturas foram realizadas em ensaios laboratoriais com a cinza

proveniente da usina de carvão Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, localizada no

município Capivari de Baixo, no estado do Rio Grande do Sul. Esse estudo analisa a grande

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importância do reaproveitamento destes resíduos, que atualmente é depositado em bacias de

sedimentação a céu aberto, podendo gerar impactos ambientais.

Com e sem a adição de cal hidratada, as misturas solo-cinza foram testadas para

analisar a viabilidade de sua aplicação em obras geotécnicas, por isso é de grande relevância a

adição de cal e dos teores de cinza nas misturas. Além disso, é necessário avaliar o

comportamento mecânico do solo e das misturas estudadas, e realizar ensaios de

caracterização física e química do solo.

3 - Metodologia

Inicialmente foi preciso definir as porcentagens de cinza adotadas em cada mistura,

para isso foi necessário ter como base trabalhos realizados anteriormente. Após essa etapa,

foram realizados ensaios de caracterização física dos materiais como argila, cinza volante e

misturas destes com a cal. A partir desse processo foi possível conhecer a granulometria dos

mesmos e obter o valor exato da densidade real dos grãos.

Para analisar a umidade ótima e o peso específico seco máximo da argila, foram

utilizados ensaios de compactação. Assim foi possível definir a moldagem de cada corpo de

prova para o ensaio de cisalhamento direto. Os ensaios de cisalhamento foram executados

para as misturas solo-cinza e solo-cinza-cal.

4 - Materiais Utilizados

4.1 - Solo Argiloso

O solo que foi utilizado é um solo maduro, de origem coluvionar, argilo-arenoso, não

saturado, proveniente do Campo Experimental II da Puc-Rio. O material utilizado foi retirado

de aproximadamente 2 metros a partir da superfície da encosta.

Figura 4.1: Solo argiloso

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4.2 - Cinza Volante

A cinza volante é resultado do processo de queima do carvão mineral no Complexo

Termelétrico Jorge Lacerda, situado no município Capivari de Baixo, no estado de Santa

Catarina. O Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, pertencente à Companhia Tractebel

Energia, é considerado o maior complexo termelétrico movido a carvão mineral da América

Latina.

Após o processo de queima do carvão, aproximadamente 80% do material não

queimado, obtido de uma combustão incompleta, é recuperado em tubulações de exaustão de

gás. Este material é chamado cinza volante, que é constituída por partículas extremamente

finas (menor que 0,15mm). Esta foi transportada para o estado do Rio de Janeiro por meio da

SATC – Associação Beneficente da Industria Carbonífera de Santa Catarina, e foi depositada

em tonéis no Laboratório de Geotecnia e Meio ambiente da PUC-Rio.

Figura 4.2: Cinza volante

4.3 Cal

A cal que foi utilizada nas misturas foi a cal hidratada calcítica, conhecida por “cal

hidratada Itaú”.

Quadro 1: Exigências físicas e químicas para a cal (NBR 7175).

Exigências físicas

Compostos Limites

CH-I CH-II CH-III

Finura (% retida

acumulada)

Peneira 0,600mm 0,5 0,5 0,5

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Peneira 0,075mm 10 15 15

Retenção de água 75 75 70

Incorporação de areia 3,0 2,5 2,2

Estabilidade Ausência de cavidades ou protuberâncias

Plasticidade 110 110 110

Exigências químicas

Anidrido carbônico Fábrica (máx) 5% 5% 13%

Depósito (máx) 7% 7% 15%

Óxidos de cálcio e magnésio não hidratado

calculado (CaO + MgO) (máx)

10% 15% 15%

Óxidos totais na base de não voláteis (CaOt +

MgOt) (mín)

90% 88% 88%

4.4 Misturas solo-cinza e solo-conza-cal

As porcentagens de cinza usadas nas misturas foram definidas com base na análise dos

teores utilizados em pesquisas anteriores. Estas foram: 15% e 30% de cinza volante em solo

argiloso, já o teor de cal foi definido em 3% em relação ao peso seco das cinzas.

A tabela 4.1 apresenta os teores de cada material utilizados nas misturas, assim como

as siglas que as descrevem.

Tabela 4.1: Teores e símbolos utilizados para os materiais.

Material/Mistura Solo (%) Cinza de

Fundo

(%)

Cinza

volante

(%)

Cal (3%) Símbolo

Solo argiloso 100 - - - S

Cinza Volante - - 100 - CV

Mistura 6 70 - 27 3 S70/CV27/C3

Mistura 7 85 - 12 3 S85/CV12/C3

Mistura 8 70 - 30 - S70/CV30

Mistura 9 85 - 15 - S85/CV15

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5 - Métodos e procedimentos de ensaio

5.1 - Ensaios de Caracterização física

Os ensaios de caracterização física se desenvolveram a partir dos ensaios de análise

granulométrica, densidade específica dos grãos e limites de Atterberg e tiveram como

finalidade a determinação das propriedades-índice.

Forma seguidas as metodologias das seguintes normas:

-NBR 6457 (1986) – Amostras de Solos – Preparação para ensaios de compactação e

caracterização;

-NBR 7181 (1984) – Análise granulométrica;

-NBR 6508 (1984) – Determinação da densidade real dos grãos;

-NBR 6459 (1984) – Solo – Determinação do limite de liquidez;

-NBR 7180 (1984) – Solo – Determinação do limite de plasticidade.

-NBR 12004 (1990) – Solo – Determinação do índice de vazios máximos de solos não

coesivos;

-NBR 12051 (1991) – Solo – Determinação do índice de vazios mínimos de solos não

coesivos;

-NBR 7182 (1986) – Solo – Ensaio de compactação.

Através dos resultados obtidos dos limites de liquidez e plasticidade, é possível

determinar o índice de plasticidade do solo, expresso pela equação eq. XX

eq. (XX)

5.2 - Ensaios de caracterização química e ambiental

Tendo em vista a proposta deste trabalho de reutilização de cinza volante para outras

aplicações, foram realizados ensaios de caracterização química e ambiental com a finalidade

de analisar a viabilidade do emprego deste resíduo sem causar danos à saúde humana e ao

meio ambiente.

Estes ensaios foram realizados em conjunto com o Departamento de Química, de

acordo com as metodologias das seguintes normas:

-NBR 10004 (2004) – Classificação de Resíduos Sólidos;

-NBR 10005 (2004) – Lixiviação de Resíduos Sólidos;

-NBR 10006 (2004) – Solubilização de Resíduos Sólidos;

-NBR 13600 (1996) – Determinação do teor de matéria orgânica por queima a 440°C.

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5.3 - Ensaios de Caracterização Mecânica

5.3.1 - Ensaio de compactação Proctor Standard

Foram realizados ensaios de compactação para o solo puro e para as misturas com

teores de 12%, 15%, 27% e 30% de cinza volante, com a finalidade de determinar a umidade

ótima de compactação bem como o peso específico seco máximo dos materiais. Para estes

ensaios foram utilizados a energia de compactação Proctor Normal, houve o reuso de material

e eles seguiram as metodologias da norma NBR 7182 (1986).

O material foi seco em estufa a 60°C, destorroado e passado na peneira #4 como

determina a norma NBR 6457 (1986). Depois, foi determinado quantidade de água a ser

adicionada ao material de forma que ele ficasse com cerca de 5% de umidade abaixo da

umidade ótima. O ensaio de limite de plasticidade permite estimar com maior precisão este

valor, por apresentar um resultado que pode ser próximo da umidade ótima. Após a adição de

água às misturas de solo com as diversas porcentagens de cinza, homogeneizou-se bem o

material.

Após esta etapa, colocou-se o material dentro do molde cilíndrico pequeno (cilindro

Proctor), aplicando uma energia de 26 golpes a cada uma das três camadas necessárias para

preencher totalmente o volume do molde. Para que houvesse uma boa aderência entre as

camadas já compactadas, estratificou-se cada um delas antes de adicionar o solo equivalente à

próxima. Atinge-se um volume superior ao do molde devido o emprego do anel

complementar, com o auxílio de uma régua biselada este excesso é removido.

Terminada a compactação, pesa-se o cilindro juntamente com o solo, e são retiradas

três amostras da região central do corpo de prova com a finalidade de obter-se a umidade

média após a secagem na estufa e assim como seu peso específico seco correspondente. Este

processo é repetido para a preparação de novos corpos de prova, acrescentado água de forma

a aumentar a umidade da mistura em aproximadamente 2%. Obtendo-se então, após a

compactação destes, novos pares de valores de umidade e peso específico seco.

Após um total de cinco repetições para cada mistura, cinco pares de valores foram

obtidos divididos entre os ramos seco e úmido da curva de compactação. A partir desses

dados, têm-se a curva de compactação, de onde são extraídos os valores de umidade ótima e

peso específico máximo, correspondentes ao ponto máximo das curvas. Estes valores foram

utilizados para a moldagem dos corpos de prova utilizados nos ensaios de cisalhamento

direto.

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5.3.2 - Ensaio de cisalhamento direto

Os ensaios de cisalhamento direto foram realizados com 15% e 30% de cinza volante,

e as misturas com cal contaram com a presença de 12% e 27% de cinza, contudo não foram

submetidas ao processo de cura.

O objetivo destes ensaios foi o de determinar a resistência do cisalhamento direto do

solo através da obtenção dos parâmetros coesão e ângulo de atrito. Assim buscou-se analisar a

influência do teor de cinza e da presença de cal nestes parâmetros, verificando a viabilidade

do emprego destes para aplicações geotécnicas. Os procedimentos para a execução dos

ensaios estão descritos na norma ASTM D 3080 (2004).

Para a confecção dos corpos prova do solo argiloso e das suas misturas, compactou-se

um corpo de prova cilíndrico na energia Proctor Normal com umidade ótima e peso específico

seco máximo, obtidos por meio do ensaio de compactação. Por causa das dimensões da caixa

de cisalhamento (10,2cm x 10,2 cm x 2,5cm) a compactação do corpo de provo teve de ser

realizada no cilindro grande (15,08cm x 17,78cm, diâmetro x altura), utilizando-se o soquete

grande (4,53kg) e ajustando-se o número de golpes e o número de camadas de modo que a

energia de compactação fosse similar à do cilindro pequeno. Dessa forma foram feitas 5

camadas e aplicados 12 golpes a cada uma delas, de acordo com a norma NBR 7182 (1986).

A partir do cilindro compactado (Figura 5.1), foram moldados 3 corpos de prova para

o ensaio de cisalhamento direto. O procedimento se dá através da cravação de um anel

metálico cujas dimensões são aproximadamente as mesmas da caixa de cisalhamento, no

cilindro obtido. Esta cravação é feito uniformemente, escavando as laterais para o alívio de

tensões. É importante que as laterais estejam untadas com vaselina antes da cravação para que

o corpo de prova não seja danificado com o processo de transferência para o equipamento. A

transferência é realizada com o auxílio de um cap de acrílico, a Figura 5.2 mostra o corpo de

prova moldado.

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Figura 5.1: Cilindro de solo argiloso compactado.

Figura 5.2: Corpo de prova com argila, cinza e cal moldado para o ensaio.

A caixa de cisalhamento é dividida horizontalmente por duas metades e a força normal

é aplicada no corpo de prova a partir do topo da caixa de cisalhamento. Está força é aplicada

de modo a mover uma metade da caixa em relação à outra até provocar a ruptura. As caixas

distam entre si de 5,0mm antes de iniciar a fase de cisalhamento do ensaio, para que o

deslocamento relativo entre elas possa ocorrer. Acima e abaixo do corpo de prova, placas

ranhuradas são colocadas de modo a fornecerem atrito ao solo e impedindo que este deslize

quando a força horizontal é aplicada. Papéis de filtro e pedras porosas também são colocados

para impedir o carreamento de partículas e para que a drenagem possa ocorrer livremente,

estando o corpo de prova completamente ou parcialmente saturado.

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O ensaio de cisalhamento direto realizado ocorreu com o controle da deformação,

onde uma taxa constante de deslocamento cisalhante é aplicada na metade superior da caixa

por um motor que atua por meio de engrenagens, a uma velocidade determinada por um fator

que vai de acordo com a carga aplicada verticalmente. Essa velocidade é calculada através dos

dados da fase inicial do ensaio, chamada fase de adensamento, onde o corpo de prova é

submetido somente à tensão vertical, sendo medida a variação de altura com o tempo, até que

esta se estabilize. Através de um gráfico de deslocamento vertical versus raiz do tempo (t),

obtém-se o valor de t100, correspondente a 100% do adensamento, e calcula-se a velocidade a

ser adotada na fase de cisalhamento. Para as misturas com o solo argiloso, o tempo de

adensamento foi estipulado em 24 horas.

Na fase de cisalhamento, a ruptura sofrida pelo corpo de prova ocorre ao longo do

plano de divisão da caixa. O deslocamento horizontal da metade superior da caixa é medido

por um LVDT (Linear Variable Differential Transformer) horizontal, que funciona como um

sensor para medição de deslocamento linear. As variações da altura do corpo de prova, ou

seja, as variações do volume do mesmo ao longo do ensaio são obtidas através das leituras no

LVDT vertical. O anel de carga mede a força horizontal variável à qual o corpo de prova está

sendo submetido.

Houve a repetição dos ensaios em corpos de prova similares para o solo e cada uma

das misturas. Para o solo argiloso, aplicou-se 200kPa. Assim, pelo gráfico da Tensão

Cisalhante Maxima, que indica o momento de ruptura versus Tensão Normal, pré-definida,

determina-se as envoltórias de ruptura e os parâmetros de resistência ao cisalhamento do solo.

A Figura 5.3 ilustra o equipamento de cisalhamento direto utilizado na pesquisa.

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Figura 5.3: Prensa utilizada para os ensaios de cisalhamento direto.

6 – Discussão dos Resultados

6.1 – Ensaios de caracterização física

6.1.1 – Densidade real dos grãos (Gs)

O valor da densidade real dos grão do solo argiloso foi 2,72, obtido através da média

aritmética de quatro determinações com uma variação máxima de 1,1%.

A tabela 6.1 apresenta, em síntese, os trabalhos realizados com o solo do Campo

Experimental II.

A tabela 6.2 mostra os resultados de densidade real dos grãos das misturas. Já a Figura

6.1 mostra a variação da densidade real dos grãos com relação aos teores de cinza utilizados

nas misturas com o solo argiloso. Observando uma redução da densidade real dos grãos com o

aumento dos teores de cinza volante.

Tabela 6.2: Densidade real dos grãos das misturas.

Material/Mistura Densidade real dos grãos

S 2,720

S85/CV12/C3 2,665

S70/CV27/C3 2,587

S85/CV15 2,651

S70/CV30 2,566

Figura 6.1: Variação da densidade real dos grãos com o teor de cinza de volante para o solo argiloso

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6.1.2 – Análise granulométrica

Os resultados do ensaio de análise granulométrica estão presentes na mesma tabela

6.1, juntamente com os dados de pesquisas anteriores com o mesmo solo. Já a curva

granulométrica é apresentada na Figura 6.2.

Tabela 6.1: Pesquisas realizadas com o solo do Campo Experimental da PUC-Rio.

Autor Prof. (m) Gs Ped.+areia

(%)

Silte

(%)

Argila

(%)

LL LP IP SUCS

Sertã

(1986)

1,00-1,45

2,00-2,45

3,00-3,45

2,75

2,73

2,74

26,25

28,13

45,63

73,75

71,87

54,37

71

75

72

35

49

45

36

26

27

MH

MH

MH

Marinho

(1986)

3,60 2,75 35,00 3,00 62,00 65 38 27 MH

Lins

(1991)

2,00-2,40

3,00-3,40

2,74

2,74

34,00

34,00

4,00

4,00

62,00

62,00

78

73

32

34

46

39

MH

MH

Daylac

(1994)

3,00

6,00

2,77

2,76

24,00

31,00

5,00

6,00

71,00

63,00

70

82

30

43

40

39

MH

MH

Beneveli

(2002)

1,50 2,76 33,00 9,00 59,00 56 31 25 CH

Soares

(2005)

1,00 2,74 41,00 5,50 53,50 54 28 26 CH

Meliande

(2014)

2,00 2,72 36,40 10,80 52,70 53 39 14 CH

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Figura 6.2: Curva granulométrica do solo argiloso.

As curvas do solo argiloso e da cinza volante estão representadas na Figura 6.3, assim

como as misturas como 15% e 30% de cinza volante na Figura 6.4.

Figura 6.3: Curvas granulométricas do solo argiloso e da cinza volante.

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Figura 6.4: Curvas granulométricas do solo argiloso, da cinza volante e das suas misturas.

Com o auxílio das figuras, pode-se observar que a cinza volante apresenta um elevado

teor de finos, que correspondem a granulometria silte, além de uma fração de areia de

granulometria fina.

Quanto à granulometria das misturas com solo argiloso, observa-se que elas adquirem

uma granulometria intermediária às do solo puro e da cinza, sendo que na mistura de maior

teor de cinza (S70/CV30), o teor de argila tende a reduzir-se e a presença de fração de silte se

torna mais representativa.

6.1.3 – Limites de Atterberg

Foram obtidos para limites de liquidez e plasticidade, respectivamente, os valores de

53% e 39%, resultando em um índice de plasticidade de 14%. De acordo com o Sistema

Unificado de Solos (SUCS), normatizado pela ASTM D 2487 (1983), o solo é classificado

com CH, argila arenosa de média plasticidade. Na tabela 6.1 estão expressos os limites de

Atterberg obtidos a outras profundidades.

Pela cinza volante ser composta por uma granulometria com alto teor de material

granular, sendo isenta de características plásticas, não foi possível a determinação dos limites

de Atterberg dela.

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6.2 – Ensaios de caracterização química e ambiental

Tendo sido feitos os ensaios de composição química, determinação de teor de matéria

orgânica, ensaio de lixiviação e solubilização. Através dos resultados obtidos através de

pesquisas anteriores e de ensaios realizados com o auxílio do Departamento de Química, foi

possível obter as seguintes conclusões:

Com os ensaios de composição química, foi possível analisar uma grande quantidade

de Al2O3 e Fe2O3 encontrada no solo, indicando que este sofreu um processo de

laterização. Já a pequena quantidade de CaO, MgO, K2O e Na2O encontrada sugere

tratar-se de um material altamente intemperizado, devido à lixiviação intensa dos

álcalis. Por fim, os valores de pH indicam que o solo é ácido.

Sabe-se que os principais componentes da cinza são o silício, alumínio e ferro.

Conclui-se então que como nas misturas com solo argiloso a representatividade de

todos estes elementos foi mantida, há possiblidade que eles estejam presentes em

grande quantidade no solo utilizado.

A determinação do teor de matéria orgânica do solo argiloso foi feita por Quispe

(2013) através da técnica de oxidação com dicromato de potássio em meio sulfúrico,

no Laboratório de Geotecnia/Química de Solos da COPPE/UFRJ. Obteve-se um valor

de 0,85%.Ubaldo (2005) verificou um teor de matéria orgânica na cinza volante de

1,03%, o que é um fator positivo, uma vez que a presença de matéria orgânica tende a

retardar ou até mesmo inibir a ocorrência das reações pozolânicas.

Através da análise dos resultados dos ensaios de lixiviação, conclui-se que todos os

parâmetros analisados apresentaram concentrações adequadas às indicadas no Anexo

F da norma NBR 10004 (2004).

A partir dos ensaios de solubilização, a cinza volante foi classificada com um resíduo

não inerte, porém isto não inviabiliza a sua utilização como agente cimentante em

misturas com o solo, já que no ensaio de lixiviação, que representa a infiltração da

água da chuva no solo, todos os parâmetros analisados encontram-se dentro dos

limites permitidos pela norma. Em termos dos danos causados à saúde humana,

verificou-se que a concentração de alumínio da cinza volante encontra-se dentro do

valor máximo permitido em reservatórios de água subterrânea, correspondente a 3500

µg/L (CONAMA, 2009). Dessa forma, a concentração apresentada pela cinza não

causa dano à saúde humana.

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6.3 – Ensaio de caracterização mecânica

6.3.1 – Ensaio de compactação

Foram realizados ensaios de compactação para o solo argiloso e para as misturas sob

energia Proctor normal. A Tabela 6.3 apresenta um resumo dos valores de umidade ótima e

peso específico seco máximo do solo e das misturas e as Figuras 6.5 e 6.6 as curvas de

compactação.

Tabela 6.3 Resultados dos ensaios de compactação para as misturas com solo argiloso.

Material/Mistura wotm (%) γd máx(g/cm³)

S 26,3 1,55

S85/CV15 24 1,55

S70/CV30 23,5 1,5

S85/CV12/C3 24 1,55

S70/CV27/C3 25,5 1,49

CV 22,8 1,925

Figura 6.5: Curvas de compactação do solo puro e das misturas sem a adição de cal.

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Figura 6.6: Curvas de compactação do solo puro e das misturas com a adição de cal.

6.3.2 – Ensaio de cisalhamento

Os ensaios de cisalhamento direto foram realizados para o solo puro, as misturas com

15 e 30% de cinza volante, e as misturas com cal, sem cura. Os corpos de prova foram

moldados nas condições de umidade ótima e peso específico seco máximo.

Tabela 6.4: Dados específicos dos ensaios de cisalhamento direto para misturas com solo argiloso.

Material/

mistura

Massa

aplicada

(kg)

Tensão

vertical

aplicada

(kPa)

Velocidade

da

engrenagem

(mm/min)

Duração

do ensaio

(horas)

Intervalo

de leitura

(min)

S

7 50

0,0819 3 0,17 30 160

60 300

S85/CV15

7 50

0,098 2,54 0,17 39 200

60 300

S70/CV30

7 50

0,174 1,43 0,17 39 200

60 300

S85/CV12/C3

7 50

0,393 0,63 0,17 39 200

60 300

S70/CV27/C3

7 50

0,098 2,54 0,17 39 200

60 300

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6.3.2.1 – Comportamento tensão cisalhante vs deslocamento horizontal

As Figuras 6.7, 6.8 servem para exemplificar alguns um comparativo entre as misturas

solo-cinza e solo-cinza-cal com o solo puro, estão representadas nelas o desenho das curvas

tensão cisalhante vs deslocamento horizontal de cada uma das misturas.

Figura 6.7: Curvas tensão cisalhante x deslocamento horizontal do solo argiloso e misturas S70/CV30 e

S85/CV15.

Figura 6.8: Curvas tensão cisalhante x deslocamento horizontal das amostras S e misturas S85/CV12/C3 e

S70/CV27/C3.

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Tendo sido feitos comparativos para tensões de 50kPa, 200kPa e 300kPa das misturas

solo-cinza, solo-cinza-cal e do solo puro, pode-se observar que para baixos deslocamentos

horizontais o comportamento do solo puro é melhor que o das misturas. Já para um

deslocamento horizontal de aproximadamente 3mm, a mistura com 12% de cinza é a que

apresenta melhor comportamento, para baixas e altas tensões.

6.3.2.2 – Influência dos teores de cinza e de cal

Comparando as misturas, foi possível perceber que, de forma geral, para

deslocamentos superiores a 6mm, a mistura com 15% de cinza volante foi a que apresentou

um melhor comportamento, tanto para altas como para baixas tensões normais.

Figura 6.9: Envoltórias de ruptura do solo puro e das misturas S85/CV12/C3 e S70/CV27/C3.

O objetivo da adição de cal às misturas foi de aumentar a ocorrência de reações

pozolânicas entre o solo e a cinza, melhorando então os parâmetros de resistência do solo.

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Figura 6.10: Influência da cal nas misturas S70/CV27/C3 e S70/CV30.

7 – Conclusão

Com os resultados obtidos nesta pesquisa, foi possível concluir que a adição de cinza

volante ao solo argiloso proporcionou melhores resultados, devido às reações desencadeadas

entre a cinza e os minerais argílicos.

A partir dos ensaios de compactação, foi possível verificar que a cinza exerce

influência sobre os parâmetros de compactação. Em geral, observou-se que houve uma

redução do peso específico seco máximo e da umidade com a adição de cinza ao solo.

Já com os ensaios de cisalhamento direto foi possível comprovar a influência do teor

de cinza e do teor de cal. As misturas em que foi verificado um melhor comportamento, em

relação ao teor de cinza, foi em torno de 15% para solo-cinza e 12% solo-cinza-cal. Para

teores de cinza mais elevados, o ganho de resistência diminui, o que sugere que para efeitos

de estabilidade não seria necessário adicionar grandes quantidades de cinza. Já em relação ao

teor de cal, a adição foi benéfica para a mistura S85/CV15, potencializando as reações

pozolânicas; o que não ocorreu na mistura S70/CV30, evidenciando que a adição de Cal é

efetiva para menores teores de cinza.

Departamento de Engenharia Civil

8 – Bibliografia

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resíduo sólido urbano sob carregamento estático. Dissertação (Mestrado em

Engenharia Civil) – Pontifícia Universidade Católica, Rio de Janeiro, 2013.

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6. SZELIGA, L. Estudo experimental de um solo arenoso estabilizado com cinzas de

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11. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7180: Solo – Determinação do limite de plasticidade. Rio de Janeiro, 1984.

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