Análise do poema

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Análise do poema “Gaivota” de Alexandre O’Neill Um poema canção, que graficamente apresenta seis estrofes, alternando entre sextilhas e quadras, em que estas últimas funcionam como refrão, ainda que na última haja pequenas alterações. Ainda assim, os versos são regulares, heptassílabos ou redondilhas maiores (Se u/ma/ gai/vo/ta/ vi/esse ). A rima abacbc/deded(…), cruzada em a, c, d e e e interpolada em b, confere ao poema o ritmo e a musicalidade necessários para ser musicado. O sujeito poético começa com uma conjunção subordinativa condicional “Se”(que, aliás, inicia todas as sextilhas), que remete para uma suposição, que esconde efetivamente um desejo – “Se uma gaivota viesse”. Utilizando a personificação, acrescenta “trazer-me o céu de Lisboa”, apontando para a ideia de contemplação do céu, contemplação essa que lhe terá despertado o desejo de ser presenteado com o céu que a gaivota poderia trazer-lhe “no desenho que fizesse, /nesse céu”, desenho realizado pelo próprio voo da gaivota no céu, como que a lembrar os versos “como essas aves que gritam /em bebedeiras de azul”, do poema “Pedra Filosofal”, de António Gedeão, traçando involuntariamente desenhos através dos seus voos alegres e despreocupados. O sujeito poético contempla esta gaivota com o seu olhar, que define como “asa que não voa”, uma metáfora expressiva do poder da imaginação (“dar asas à imaginação”), que, no entanto, não é total ou tão perfeito como o da gaivota, pois “esmorece e cai no mar”, falta-lhe a força, a espontaneidade, a capacidade da gaivota. Se o seu desejo se concretizasse, o coração que no seu “peito bateria” seria um “perfeito coração”, seria capaz de confessar/entregar o seu amor, como uma gaivota no veu voo sem limites. A segunda estrofe constitui, então, o refrão, repetindo-se na quarta e sexta estrofes.

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Análise do poema “Gaivota” de Alexandre O’Neill

Um poema canção, que graficamente apresenta seis estrofes, alternando entre sextilhas e quadras, em que estas últimas funcionam como refrão, ainda que na última haja pequenas alterações. Ainda assim, os versos são regulares, heptassílabos ou redondilhas maiores (Se u/ma/ gai/vo/ta/ vi/esse). A rima abacbc/deded(…), cruzada em a, c, d e e e interpolada em b, confere ao poema o ritmo e a musicalidade necessários para ser musicado.

O sujeito poético começa com uma conjunção subordinativa condicional “Se”(que, aliás, inicia todas as sextilhas), que remete para uma suposição, que esconde efetivamente um desejo – “Se uma gaivota viesse”. Utilizando a personificação, acrescenta “trazer-me o céu de Lisboa”, apontando para a ideia de contemplação do céu, contemplação essa que lhe terá despertado o desejo de ser presenteado com o céu que a gaivota poderia trazer-lhe “no desenho que fizesse, /nesse céu”, desenho realizado pelo próprio voo da gaivota no céu, como que a lembrar os versos “como essas aves que gritam /em bebedeiras de azul”, do poema “Pedra Filosofal”, de António Gedeão, traçando involuntariamente desenhos através dos seus voos alegres e despreocupados. O sujeito poético contempla esta gaivota com o seu olhar, que define como “asa que não voa”, uma metáfora expressiva do poder da imaginação (“dar asas à imaginação”), que, no entanto, não é total ou tão perfeito como o da gaivota, pois “esmorece e cai no mar”, falta-lhe a força, a espontaneidade, a capacidade da gaivota.

Se o seu desejo se concretizasse, o coração que no seu “peito bateria” seria um “perfeito coração”, seria capaz de confessar/entregar o seu amor, como uma gaivota no veu voo sem limites. A segunda estrofe constitui, então, o refrão, repetindo-se na quarta e sexta estrofes.

Na terceira estrofe, segunda sextilha, o sujeito poético volta a manifestar um desejo através da conjunção “Se”, desta vez de ser o primeiro a ouvir “o que inventasse” “um português marinheiro/dos sete mares andarilho”. Se assim fosse, talvez o seu olhar fosse enlaçado com “um olhar de novo brilho”, metáfora para um novo sentido para a vida, uma capacidade de ver as coisas com outros olhos, ou pelo menos com um entusiasmo (“brilho”) diferente.

Na quinta estrofe a conjunção “Se” é agora utilizada para manifestar o desejo de “ao dizer adeus à vida”, ao morrer (como menciona através do eufemismo e perífrase “Se ao dizer adeus à vida”), ser contemplado com o “olhar derradeiro” do ser amado, proporcionado pelas “aves todas do céu”. No seu voo, elas poderiam muito bem desenhar no céu, pela última vez, o rosto do ser amado, para poder ao menos ser contemplado um última vez (“o teu olhar derradeiro”).

Como realça na última estrofe, o que está ainda relacionado com esta sextilha, só assim morreria no seu peito um coração perfeito, um coração que coube na mão do ser amado (note-se a passagem do pretérito imperfeito “nessa mão onde cabia” para o pretérito perfeito

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“nessa mão onde perfeito/bateu o meu coração”, realçando o fim desejado pelo sujeito poético). Depois de cumpridos os seus desejos, já poderia morrer em paz e feliz, com um “perfeito coração”, uma vida amorosa realizada e feliz.

A contribuir para a sonoridade do poema, temos a aliteração em s/z “Se …viesse…trazer-me…céu, desenho…fizesse…nesse céu…asa…esmorece…”) que dá a ideia do som das gaivotas a voar sobre o mar.